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Descubra um mundo de histórias, escaneie e direcione a câmera para a capa.
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Descubra um mundo de histórias, escaneie e direcione a câmera para a capa.
Trono de Vidro
Ilustrações
LARA CALVETTE Tradução
MARIANA KOHNERT
Aelin esfregou o rosto, depois apoiou a mão no ombro de Rowan ao ficar de pé, sentindo a pele macia e quente sob os dedos calejados.
— O pai de Nesryn. Petdiremos que cuide dela hoje.
Arobynn fizera aquilo. Uma última carta na manga.
Ele sabia. Sobre Lysandra... sobre a amizade das duas.
Não gostava de dividir seus pertences.
Chaol e Nesryn irromperam no armazém um nível abaixo; Aedion já estava a meio caminho deles antes de sequer perceberem sua presença ali.
Tinham mais notícias. Um dos homens de Ren entrara em contato com eles minutos antes: uma reunião aconteceria no dia seguinte em Carvalhal, entre o rei, Dorian e a Líder Alada da cavalaria aérea.
Com a entrega de mais um prisioneiro para Morath.
— Precisam tirá-la dos túneis — disse Aelin a Chaol e Nesryn, disparando escada abaixo. — Agora mesmo. São humanos; não vão ser notados a princípio. São os únicos que podem entrar naquela escuridão.
Chaol e Nesryn trocaram olhares.
Aelin caminhou até os dois.
— Precisam tirá-la de lá agora mesmo.
Por um segundo, Aelin não estava no armazém. Por um segundo, estava de pé em um lindo quarto, diante de uma cama ensanguentada e do corpo destruído jogado ali.
Chaol estendeu as mãos.
— É melhor gastarmos o tempo montando uma emboscada.
O som da voz dele... A cicatriz no rosto do capitão se destacava à luz fraca. Aelin fechou os dedos em punho, as unhas — as unhas que tinham destruído o rosto dele — se enterraram.
— Eles podem estar se alimentando dela — retrucou ela, com dificuldade.
Atrás de Aelin, Evangeline soltou um soluço. Se fizessem Lysandra suportar o que ela suportara quando enfrentara o príncipe valg...
— Por favor — pediu Aelin, a voz sumindo com a palavra.
Chaol reparou, então, onde os olhos estavam concentrados no rosto dele. O capitão empalideceu, a boca se abriu.
Mas Nesryn tocou a mão de Aelin, os dedos finos e bronzeados estavam frios contra as palmas das mãos suadas da jovem.
— Nós vamos trazê-la de volta. Nós a salvaremos. Juntos.
Chaol apenas encarou Aelin, esticando os ombros ao falar:
— Nunca mais se repetirá.
Ela queria acreditar nele.
Algumas horas depois, sentada no chão de uma pousada em ruínas do outro lado de Forte da Fenda, Aelin olhou para um mapa no qual tinham assinalado a localização da reunião: cerca de 800 metros do templo de Temis. O minúsculo templo ficava dentro do abrigo da floresta Carvalhal, no alto de uma rocha alta e fina, no meio de uma ravina profunda. Era acessível somente por duas pontes oscilantes presas a cada lado do despenhadeiro, o que poupara o local de exércitos invasores ao longo dos anos. A floresta ao redor provavelmente estaria vazia, e, se serpentes aladas chegariam até lá voando, sem dúvida iriam sob o manto da noite anterior à reunião. Aquela noite.
Aelin, Rowan, Aedion, Nesryn e Chaol estavam em volta do
mapa, afiando e polindo as lâminas conforme discutiam o plano. Tinham deixado Evangeline com o pai de Nesryn, junto a mais cartas para Terrasen e a Devastação... e o padeiro não fizera perguntas. Apenas beijou a filha mais nova na bochecha, então anunciou que ele e Evangeline assariam tortas especiais para o retorno do grupo.
Se eles retornassem.
— E se ela tiver um colar ou um anel? — perguntou Chaol, do outro lado do pequeno círculo.
— Então perderá uma cabeça ou um dedo — disse Aedion, diretamente.
Aelin disparou o olhar para ele.
Apenas beijou a filha mais nova na bochecha, então anunciou que ele e que Evangeline assariam tortas
Não fale com ela!
O príncipe inclinou a cabeça.
— Jamais estive com uma bruxa.
Que ela rasgasse o pescoço dele por aquilo. Que acabasse com tudo.
Uma fileira de presas de ferro se projetou sobre os dentes da bruxa conforme seu sorriso cresceu.
— Já estive com muitos homens. São todos iguais. Têm o mesmo gosto. — A bruxa o olhou de cima a baixo, como se ele fosse a próxima refeição.
— Quero só ver — conseguiu dizer o rapaz.
Os olhos dela se semicerraram, o dourado era como brasa viva. Ele jamais vira alguém tão lindo.
Aquela bruxa fora feita da escuridão entre as estrelas.
— Acho que não, príncipe — disse ela, a voz de meia-noite. A bruxa farejou de novo, enrugando o nariz levemente. — Mas será que sangraria vermelho ou negro?
— Eu sangrarei com a cor que você mandar.
Afaste-se, fuja. O príncipe demônio dentro dele deu um puxão tão forte que o rapaz deu um passo. Mas não para longe. Na direção da bruxa de cabelos brancos.
Ela soltou uma risada baixa e cruel.
— Qual é seu nome, príncipe?
O nome dele.
Ele não sabia qual era.
A bruxa estendeu a mão, as unhas de ferro reluzindo sob as
tonalidades da luz do sol. Os gritos do demônio eram tão altos dentro de sua cabeça que ele se perguntou se as orelhas sangrariam.
Ferro tilintou contra pedra quando a bruxa roçou o colar ao redor do pescoço do homem. Mais alto... se ao menos cortasse mais alto...
— Como um cão — murmurou ela.
— Acorrentado ao mestre.
A mulher passou o dedo pela curva do colar, e o rapaz estremeceu: com medo, com prazer, com antecipação pelas unhas que rasgariam sua garganta.
— Qual é seu nome. — Uma ordem, não uma pergunta, enquanto olhos de ouro puro encaravam os dele.
— Dorian — sussurrou ele.
Seu nome não é nada, seu nome é meu, sibilou o demônio, e uma onda do grito daquela mulher humana o varreu para longe.
Agachada na vegetação a apenas 6 metros do veículo da prisão, Aelin congelou.
Dorian.
Não podia ser. Não havia chance, não quando a voz com a qual ele falara era tão vazia, tão oca, mas ao lado dela, os olhos de Chaol estavam arregalados. Será que ouvira a leve mudança?
Agachada na vegetação a apenas 6 metros do veículo da prisão, Aelin congelou.
Dorian.
Não podia ser. Não havia chance, não quando a voz com a qual ele falara era tão vazia, tão oca, mas ao lado dela, os olhos de Chaol estavam arregalados. Será que ouvira a leve mudança?
A Líder Alada inclinou a cabeça, a mão ainda tocava o colar de pedra de Wyrd com as unhas de ferro.
— Quer que eu o mate, Dorian?
O sangue de Aelin gelou.
Chaol ficou tenso, a mão tocou a espada. A jovem agarrou as costas da túnica dele, como um lembrete silencioso. letal para a garganta da Líder Alada.
— Quero que faça muitas coisas comigo — respondeu o príncipe, percorrendo o corpo da bruxa com os olhos.
A humanidade sumira de novo. Aelin a imaginara. O modo como o rei agira... Aquele era um homem que tinha total controle sobre o filho, confiante de que não ocorria nenhuma luta interna.
Uma risada baixa e sem alegria soou, então a Líder Alada soltou o colar de Dorian. O manto vermelho oscilou ao redor do corpo da bruxa com um vento fantasma quando recuou.
— Venha me ver de novo, príncipe, e veremos quanto a isso.
Um príncipe valg habitava
Dorian, mas o nariz de Aelin não sangrou em sua presença e não havia névoa rastejante de escuridão. Será que o rei abafara aqueles poderes para que o filho pudesse enganar o mundo ao redor? Ou será que a batalha ainda era travada dentro da mente do príncipe? Agora... precisavam agir agora, enquanto a Matriarca e o rei estavam naquele vagão pintado.
Rowan levou as mãos em concha à boca e sinalizou com o chamado de um pássaro, tão real que nenhum dos guardas se moveu. Mas, do outro lado da clareira, Aedion e Nesryn ouviram e entenderam.
Aelin não sabia como tinham conseguido realizar aquilo, mas, um minuto depois, as serpentes aladas da aliança da Grã-Bruxa rugiam em alarme, as árvores estremeciam com o som. Cada guarda e sentinela se virou na direção da comoção, afastando-se do vagão da prisão.
Era toda a distração de que Aelin precisava.
Ela passara duas semanas em um daqueles veículos. Conhecia as barras da pequena janela, conhecia as dobradiças e as trancas. E Rowan, felizmente, sabia exatamente como se livrar dos três guardas posicionados na porta dos fundos sem fazer barulho.