UNIVERSIDADE DOS AÇORES ESCOLA SUPERIOR DE ENFERMAGEM DE ANGRA DO HEROÍSMO 9º CLE – 4º ANO
Mastectomia “Impacto do procedimento na vida da mulher”
Ensino Clínico em Cuidados de Enfermagem Continuados e Promoção da Qualidade de Vida Serviço: Cirurgia II
Angra do Heroísmo, 2011
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UNIVERSIDADE DOS AÇORES ESCOLA SUPERIOR DE ENFERMAGEM DE ANGRA DO HEROÍSMO 9º CLE – 4º ANO
Mastectomia “Impacto do procedimento na vida da mulher”
Ensino Clínico em Cuidados de Enfermagem Continuados e Promoção da Qualidade de Vida Serviço: Cirurgia II EE: Lénia Pacheco Tutora: Enf.ª Lúcia Freitas Orientadora:
Enf.ª Aradna Mangi
Angra do Heroísmo, 2011
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“Os dias Prósperos não vêm por acaso. Nascem de muita fadiga e muitos intervalos de desalento.” Camilo Castelo Branco, (s/d)
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SÍMBOLOS, SIGLAS E ABREVIATURAS %: por cento; /: e; ou; >: superior a; ≤: menor ou igual a; ≥: Superior ou igual a; Cit.: citado; CLE: Curso de Licenciatura em Enfermagem; EE: Estudante de Enfermagem; Enfª.: Enfermeira; Fig.:Figura; ICN: International Council of Nurses; RE-: receptors de estrogénio negativo; RE: receptors de estrogénio; RE+: receptors de estrogénio positivo; RP: Receptores de progesterona; RP+: Receptores de progesterona positivo; s/d: sem data; TNM: Sistema de Classificação de Tumores Malignos; 4
EXPRESSÕES GRECO-ROMANAS Ektoméé: ablacção; Et all: entre outros; Et: e; In situ: em sitio (localizado); In: em; Mastos: mama; Per si: por si só;
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ÍNDICE INTRODUÇÃO 1. CANCRO DA MAMA
10 12
1.1.FISIOPATOLOGIA DO CANCRO DA MAMA
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1.2.FACTORES DE PROGNÓSTICO
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1.3.MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
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1.4.CLASSIFICAÇÃO DO ESTADIO DO CANCRO DA MAMA
16
2. TRATAMENTOS PARA O CANCRO DA MAMA 2.1.CIRÚRGICO/MASTECTOMIA
18 19
2.1.1. Cuidados de enfermagem à mulher submetida a mastectomia
20
2.1.2. Normas e recomendações de cuidados após mastectomia
24
2.1.3. Seguimento da mulher submetida a mastectomia
24
2.1.4. Reconstrução da mama/implantes
25
2.2.QUIMIOTERAPIA
28
2.2.1. Radioterapia
29
2.2.2. Terapia Hormonal
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3. FASES DO PROCESSO ONCOLÓGICO VIVENCIADAS PELO DOENTE ONCOLÓGICO 32 3.1.PROCESSO DE COPING FACE AO PROCESSO ONCOLÓGICO E DE PERDA DA MAMA 34 4. A MULHER SUBMETIDA A MASTECTOMIA
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4.1.SIMBOLOGIA DA MAMA
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4.2.ALTERAÇÕES NA VIDA DA MULHER MASTECTOMIZADA
39
4.2.1. Alterações físicas
39
4.2.2. Alterações psicológicas
40 6
4.2.3. Alterações familiares
40
4.2.4. Alterações sociais
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4.3.AUTO-CONCEITO E AUTO-IMAGEM DA MULHER MASTECTOMIZADA 42 4.4.SEXUALIDADE EM MULHERES MASTECTOMIZADAS
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CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ÍNDICE DE QUADROS Quadro 1.- Factores de risco para o desenvolvimento de cancro da mama
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Quadro 2.- Classificação TNM
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ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1: Quadrantes da mama
14
Figura 2: Glândula mamária e gânglios linfáticos
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Figura. 3. Utilização do Musculo grande dorsal para reconstrução da mama
27
Figura. 4. Utilização do Musculo recto-abdominal oblíquo para reconstrução da mama 27
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INTRODUÇÃO O cancro da mama é uma doença que afecta profundamente o equilíbrio físico e emocional da mulher, não só por ser considerado como uma sentença de morte, mas também por provocar alterações na imagem corporal que causa na maioria das vezes, sentimentos de perda e mutilação. A mastectomia pode representar não só a mutilação do corpo, como também a mutilação da condição feminina (Rodrigues, Silva e Rodrigues, 2002). A mama é um órgão repleto de representatividade para cada mulher e a falta dele pode acarretar num sentimento de vazio, desestruturando emocionalmente a utente (Schávelzon, 1992). Assim, No âmbito do Ensino Clínico em Cuidados de Enfermagem Continuados e Promoção da Qualidade de Vida, realizado no Serviço de Cirurgia II, no Hospital de Santo Espírito de Angra do Heroísmo, elabora-se o presente trabalho, onde se pretende abordar o impacto de uma mastectomia na vida de uma mulher. Devido à importância desta temática e sua sensibilidade, esta tinha sido inicialmente pensada para elaboração de um Estudo de Caso. Como não surgiu a possibilidade para tal, foi decidido abordar este tema como um trabalho teórico, onde se aprofundasse os aspectos inerentes ao cancro da mama e essencialmente, à mulher submetida a mastectomia total. De acordo com Amorim, C. (2007), o cancro da mama assume cada vez mais importância entre diversas patologias crónico-degenerativas, causando na mulher, família e sociedade modificações a diversos níveis. Inicialmente, o cancro da mama é assintomático, só sendo detectado por vigilância precoce, onde por vezes quando se manifestam os sintomas e este é detectado, já se encontra num estádio avançado, sendo necessário recorrer à mastectomia, embora estas mulheres tenham de recorrer a mais que um tipo de tratamento.
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Segundo Phipps, et all., (2003), apesar da evolução técnico-cientifica, a mastectomia continua a ser o tratamento de eleição para o tratamento do cancro da mama, apesar de todas as repercussões que causa na vida da mulher. Assim, para uma melhor compreensão desta temática e do impacto do procedimento na vida da mulher, este trabalho encontra-se estruturado em quatro capítulos principais. No primeiro capítulo, abordar-se-á a vertente fisiopatológica do cancro da mama, assim como a sua classificação. No segundo capitulo, em decorrência da classificação, abordar-se-á os tratamentos para o cancro da mama, dando especial ênfase ao tratamento cirúrgico/mastectomia, nomeando os cuidados de enfermagem à mulher mastectomizada, o seu seguimento e as opções para reconstrução da mama. De seguida, no terceiro capítulo, encontrar-se-ão descritas as fases do processo oncológico vivenciadas pelo doente oncológico, segundo Ross, K., (1969), assim como a adaptação à doença oncológica e os processos de coping face ao processo oncológico e à perda da mama. O quarto capítulo traduz-se como o capítulo fundamental do trabalho, pois este contempla, de forma integral a mulher submetida a mastectomia. Neste, será abordada a simbologia da mama feminina, para uma melhor compreensão da sua importância para a mulher. De seguida no mesmo capítulo, serão abordadas todas as alterações vividas pela mulher mastectomizada, assim como as modificações no seu auto-conceito e auto-imagem e vivencia da sexualidade após a mastectomia. Ao papel do enfermeiro não foi atribuído nenhum capitulo em especial, uma vez que este se encontra inerente e distribuído ao longo de todos os capítulos a abordar. A forma como o enfermeiro percepciona as alterações e as necessidades de uma mulher submetida a mastectomia, influencia directamente a sua prestação de cuidados e a sua capacidade de suporte à mesma, pelo que este trabalho é fundamental para mim, de forma a melhor compreender todo o processo vivenciado por estas utentes.
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1. CANCRO DA MAMA Há mais de trinta anos, o cancro da mama vem sendo o tipo de cancro com mais prevalência e mais temido pelas mulheres, representando 30% dos cancros ocorridos em mulheres, sendo também o que causa mais mortes por ano (Phipps, et all, 2003). Amorim, C., (2007), afirma que o cancro da mama, vem a assumir uma preponderância cada vez maior entre as patologias crónico-degenerativas que afectam a mulher, causando repercussões a nível físico, emocional e social, não só nesta mas também na sua família e respectiva sociedade. A DGS define o cancro da mama, como sendo: “um tumor maligno, que se desenvolve em células de tecido mamário, com maior incidência nas mulheres, sendo o seu prognóstico melhor quanto mais precoce for feito o diagnóstico inicial” (cit. por Barbosa, J., 2008: 22) Segundo Otto (2000), citado por Barbosa, J., (2008), de todas as doenças oncológicas, o cancro da mama é dos cancros malignos mais frequentes nas mulheres, sendo a principal causa de morte nas mulheres com idades entre os trinta e cinto e cinquenta e quatro anos. Em Portugal, o cancro da mama ocupa actualmente, o terceiro lugar dentro dos tumores que afectam a população feminina (Amorim, C., 2007). A etiologia concreta do cancro da mama, continua por descobrir. No entanto, existem alguns factores apontados como sendo factores de risco (Phipps, et all, 2003), encontrando-se estes resumidos no quadro seguinte: Factor
Risco
Sexo Feminino
Elevado
Antecedentes familiares de cancro da mama
Elevado
Antecedentes pessoais de cancro da mama Idade > 40 anos
Elevado Elevado
Observações 99% do cancro da mama ocorre em mulheres e apenas 1% em homens; O risco duplica ou triplica, dependendo da proximidade do familiar, e se ainda o cancro foi ou não bilateral; O risco de desenvolver cancro da mama é 5 vezes superior; A incidência aumenta com a idade (atingindo o 12
Menarca precoce/ menopausa tardia
Elevado
Núliparidade ou primeiro filho após os 30 anos
Elevado
Dieta
Controverso
Obesidade
Controverso
Exposição a radiação ionizante
Elevado
seu máximo na quinta década de vida); O risco do cancro da mama aumenta em função do aumento entre a menarca e a menopausa; Na mulher nulípara, o risco é tão elevado, quanto o da mulher primípara perto, ou após os 30 anos; Dados recolhidos sobre estudos em animais, sugerem que uma dieta rica em gorduras comporta um maior risco para o desenvolvimento de cancro da mama; Tem sido referido como estando associado a um risco acrescido de desenvolvimento do cancro da mama; Especialmente se expostas em idade jovem.
Quadro 1.- Factores de risco para o desenvolvimento de cancro da mama.
Braid SB et all (1991) in Phipps, et all, (2003) 1.1.FISIOPATOLOGIA DO CANCRO DA MAMA A história natural do cancro da mama caracteriza-se por “ser uma doença heterogénea com padrões de diferenciação e de crescimento diversificados de pessoa para pessoa e, ainda, na mesma pessoa, de área para área, generalizando-se frequentemente a outros órgãos ou sistemas, aquando do diagnóstico inicial não atempado” (Amorim, C., 2007:15). Independentemente da exposição (ou não) a agentes cancerígenos, as células sofrem processos de mutação espontânea, que pode condicionar estabilidade do genoma de cada célula. Esta mutação é crucial nos processos iniciais da carcinogénese, podendo iniciar-se de forma espontânea ou ser provocada pela acção de agentes carcinogénicos (químicos, físicos ou biológicos), conduzindo à indução de alterações mutagénicas e não-mutagênicas nas células (Phipps, et all, 2003). As células malignas e as “normais” dividem-se mais rapidamente quando os volumes das massas/tecidos ou tumorais são menores, e mais lentamente, se esses volumes são maiores, o que explica a diferença no crescimento de um tumor ao longo do tempo (Phipps, et all, 2003). Uma das características das células malignas é que estas perdem a sua diferenciação (ou semelhança com a célula original) (Phipps, et all, 2003).
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Os tumores da mama (ou carcinomas) têm origem nas células epiteliais do tecido lobular ou dos ductos lácteos. Quando um tumor está restrito a um ducto ou lóbulo, diz-se que este é “localizado” ou “in situ”. Por vezes isto não ocorre e o tumor dissemina-se directamente para o tecido circundante, sendo denominado “infiltrativo”.
Estes podem
originar metástases à distância e penetrar nos gânglios mamários ou da axila, ou até mesmo atingir a circulação sistémica (Phipps, et all, 2003). A maioria dos tumores localiza-se no quadrante superior externo da mama (B). Dos tumores invasivos da mama, o tumor infiltrativo dos ductos, é o que apresenta maior prevalência, seguido pelo tumor infiltrativo lobular. Os subtipos de cada um destes, abrangem os restantes tumores da mama (Phipps, et all, 2003).
(A) (B) (C) (D)
Quadrante Superior Interno; Quadrante Superior Externo; Quadrante inferior Externo; Quadrante Inferior Interno.
(Phipps, et all, 2003) Figura 1: Quadrantes da mama
1.2.FACTORES DE PROGNÓSTICO Os factores utilizados para determinar o prognóstico global do cancro da mama são variados, sendo analisados aquando do diagnóstico da patologia. Entre esses factores, encontram-se o envolvimento (ou não) de gânglios axilares, o tamanho do tumor e o estado do receptor de hormonas (Phipps, et all, 2003). Há muito que o envolvimento dos gânglios axilares é utilizado como indicador de prognóstico, devido à frequente metastização do cancro nos gânglios linfáticos. Quanto maior for o numero de gânglios envolvidos, maior será a probabilidade de metástases distantes, e pior será o prognóstico (Phipps, et all, 2003). Figura 2: Glândula mamária e gânglios linfáticos;
Relativamente ao tamanho do tumor, quanto mais pequeno, menor será o número de gânglios envolvidos, e consequentemente, menor será a probabilidade de metástases (Phipps, et all, 2003). No que concerne ao indicador sobro o estado do receptor de hormonas, sabe-se que os receptores de estrogénio (RE) e progesterona (RP) constituem um prognóstico de sobrevida de longo prazo, na mulher com cancro da mama. A presença de 10 ou mais receptores numa 14
célula tumoral, confere-lhe um estado positivo (+). Um tumor RP (+) ou RE (+) tem um prognóstico mais favorável, e um tempo de sobrevida, sem doença, mais longo (Phipps, et all, 2003). Um dos benefícios em possuir um tumor que seja RE ou RP positivos, é que se poderá utilizar a manipulação hormonal para tratar o tumor (se o cancro evoluir para estádio III ou metastizar). Cerca de 78% destes casos, respondem positivamente à terapia hormonal (Phipps, et all, 2003). De acordo com Oliveira (2004), citado por Barbosa, J., (2007), qualquer que seja a localização, tratamento ou prognostico do cancro, o seu diagnóstico é por si só uma ameaça à sobrevivência, expondo a vulnerabilidades internas e externas da mulher. 1.3.MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O cancro da mama, aquando da sua fase inicial é assintomático, só podendo ser detectado no exame físico da mama ou através de uma mamografia, sendo difícil de o distinguir de um tumor benigno. Nos estádios mais avançados, surgem uma série de sinais e sintomas, que podem ajudar a distinguir o tumor maligno de um benigno (Phipps, et all, 2003). Os tumores benignos tem geralmente contornos bem definidos, sendo encapsulados o móveis. Os tumores malignos são geralmente mais difíceis de definir. Estes são menos móveis à palpação, não possuindo contornos bem definidos (Phipps, et all, 2003). À medida que o tumor se vai fixando no tecido circundante, pode provocar uma retracção da pele subjacente, criando por vezes a sensação de pele rugosa. Este aspecto rugoso sugere a obstrução linfática causada pelo crescimento do tumor, podendo resultar em edema (Phipps, et all, 2003). O mamilo também pode sofrer alterações, nomeadamente retracção ou alterações do seu próprio ângulo, podendo existir secreção mamilar (Phipps, et all, 2003). Todos estes sintomas sugerem que o cancro já se encontra em estádio avançado (Phipps, et all, 2003).
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1.4.CLASSIFICAÇÃO DO ESTADIO DO CANCRO DA MAMA O Sistema TNM para a classificação dos tumores malignos foi desenvolvido por Pierre Denoix (França), entre 1943 e 1952 (Ministério da Saúde, 2004). Actualmente, a classificação do cancro da mama é feita através dos factores TNM [Classificação de Tumores Malignos], onde (T= dimensão do tumor; N: envolvimento de gânglios regionais; M: existência de metástases) (Phipps, et all, 2003). O grau de malignidade tumoral baseia-se na observação da lesão ou microscópio, sendo-lhe atribuída uma classificação. Quanto maior for o grau atribuído, pior é o prognóstico (Phipps, et all, 2003). O quadro seguinte mostra a aplicação da classificação TNM: T – Tumor Primário TX O tumor primário não pode ser avaliado; T0 Ausência de sinais de tumor primário; Carcinoma (in situ) intraductal, lobular ou doença de Paget do mamilo com Tis nódulo; T1 Tumor com tamanho ≤ 2 cm; T2 Tumor com tamanho compreendido entre 2 e 5 cm; T3 Tumor com tamanho> 5 cm; T4 Tumor de qualquer tamanho, com extensão à parede torácica ou à pele. N- Gânglios linfáticos regionais NX Os gânglios linfáticos regionais não podem ser analisados; N0 Não existem metástases nos gânglios linfáticos regionais; N1 Existem metástases nos gânglios linfáticos axilares, homolaterais e móveis; Existem metástases nos gânglios linfáticos axilares, homolaterais, fixados entre si N2 ou a outras estruturas; N3 Existem metástases nos gânglios linfáticos mamários internos, homolaterais; M – Metástases à distância MX A presença de metástases à distância não pode ser avaliada; M0 Não existem metástases à distância; M1 Metástases à distância existentes; Agrupamento dos estádios Estadios T N M Estadio 0 Tis N0 M0 Estadio I T1 N0 M0 Estadio II a T0 N0 M0 T1 N1 M0 T2 N0 M0 Estadio II b T2 N1 M0 T3 N0 M0 Estadio III a T0 N2 M0 16
Estadio III b Estadio IV
T1 T2 T3 T3 T4 Qualquer T Qualquer T
N2 N2 N1 N2 Qualquer N N3 Qualquer N
M0 M0 M0 M0 M0 M0 M1
Quadro 2.- Classificação TNM
Bearhs OH et all (1992) in Phipps, et all, (2003) O objectivo do sistema de classificação TNM é definir categorias para todos os casos existentes, sendo esta classificação fundamental para a decisão sobre o tratamento a efectuar. Esta decisão tem por base o estádio do cancro, bem como os factores de prognóstico acima mencionados (Phipps, et all, 2003).
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2. TRATAMENTOS PARA O CANCRO DA MAMA De acordo com Phipps, et all, (2003:1796), “o tratamento do cancro da mama é tão complexo quanto controverso”. As alternativas de tratamento disponíveis, estão em constante actualização devido aos avanços técnicos e científicos, novas associações terapêuticas de citostáticos e conhecimentos mais precisos sobre o desenvolvimento e disseminação do cancro da mama. Nos dias de hoje, as mulheres com cancro da mama têm várias opções de tratamento. Estes tratamentos incluem cirurgia, quimioterapia, radioterapia, terapêutica hormonal e terapêuticas dirigidas, onde na maioria dos casos, o factor mais importante na escolha do tratamento, é o estadio da doença (Info Cancro, s/d). Geralmente, as mulheres recebem mais do que um só tipo de tratamento. Por vezes podem ser administrados medicamentos para controlar a dor e outros sintomas decorrentes do cancro, bem como para aliviar os efeitos secundários causados pelo tratamento. Estes tratamentos utilizados para controlo dos sintomas são designados como tratamentos de suporte ou paliativos (Info Cancro, s/d). O tratamento para o cancro pode ser local ou sistémico: como tratamento local considera-se a cirurgia e a radioterapia. Estes tratamentos removem ou destroem as células cancerígenas localizadas. O tratamento sistémico, consiste na quimioterapia e terapêutica hormonal que entram na corrente sanguínea e destroem ou controlam as células cancerígenas, sendo especialmente utilizadas no caso de existência de metástases (Info Cancro, s/d). Algumas mulheres com cancro da mama podem, ainda, receber terapêutica sistémica para diminuir o tamanho do tumor, antes da cirurgia ou da radioterapia, para que a intervenção seja menos extensa, sendo esta modalidade denominada de terapêutica adjuvante. Por vezes as mulheres podem também receber terapêutica sistémica após a cirurgia e/ou radioterapia, para prevenir que alguma célula cancerígena tenha permanecido e seja responsável pelo retorno do cancro (Info Cancro, s/d).
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2.1.
TRATAMENTO CIRÚRGICO /MASTECTOMIA
Desde o final do século XIX, a cirurgia tem sido o tratamento tradicional do cancro da mama, sendo que a mastectomia radical clássica permaneceu como o tratamento de escolha por aproximadamente 60 anos (Júnior, R., 2001). A palavra mastectomia, deriva do grego “mastos” que significa mama e “ektomée” que significa ablação, sendo esta portanto a ablação da glândula mamária (Gil.J. s/d). Segundo Mentor, (2005:1) “Mastectomia é a remoção do tecido mamário devido à presença de um desenvolvimento cancerígeno ou pré-cancerígeno”. Com o evoluir das técnicas e tecnologias, na segunda metade do século XX, a mastectomia clássica foi sofrendo algumas alterações, nomeadamente, técnicas de preservação do músculo grande peitoral ou de ambos os peitorais (Júnior, R., 2001). Ainda nos dias de hoje, segundo Phipps, et all, (2003), a cirurgia é o tratamento de sustentação do cancro da mama, especialmente se este é localizado (sem metástases distais). Segundo o mesmo autor, quando se efectua o diagnóstico de cancro da mama localizado, existem duas alternativas cirúrgicas: mastectomia radical modificada (com ou sem reconstrução da mama), ou procedimentos preservadores da mama (lumpectomia). Existem vários tipos de cirurgia para o cancro da mama, que são indicados de acordo com a fase evolutiva do tumor, a sua localização ou o tamanho, sendo estes: Tumorectomia: cirurgia que remove apenas o tumor (localizado). Por vezes, os gânglios linfáticos das axilas são retirados como medida preventiva, sendo este tipo de intervenção aplicada em tumores mínimos. Quadrantectomia: cirurgia que retira o tumor, uma parte do tecido normal que o envolve e o tecido que recobre o peito abaixo do tumor. É um tratamento que preserva parte da mama. Mastectomia simples ou total: cirurgia que remove apenas a mama., onde por vezes os gânglios linfáticos mais próximos também são removidos. Esta é aplicada em casos de tumor difuso.
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Mastectomia radical modificada: cirurgia que retira a mama, os gânglios linfáticos das axilas e o tecido que reveste os músculos peitorais. Mastectomia radical: cirurgia que retira a mama, os músculos do peito, todos os gânglios linfáticos da axila, alguma gordura em excesso e pele, sendo apenas aplicada em casos extremos. (Ministério da saúde, 2005) O principal objectivo da intervenção cirúrgica na mastectomia radical modificada ou lumpectomia é o controlo regional da doença, determinar o estádio preciso da doença para identificar as doentes com risco de recorrência, aliado a um melhor resultado a nível estético. No entanto mesmo que o tumor seja localizado, nem sempre a lumpectomia é aconselhável (no caso de gravidez, lesões em vários quadrantes da mama, tumor situado sob o mamilo, entre outros casos) devido à necessidade de efectuar tratamentos adjuvantes, como a quimioterapia e radioterapia (Phipps, et all, 2003). 2.1.1. Cuidados de Enfermagem à Mulher Submedida a Mastectomia A reabilitação da mulher submetida a uma mastectomia requer uma assistência multidisciplinar, onde é fundamental a importância do papel da enfermagem. Durante o processo de reabilitação, a utente deverá receber informações a respeito dos cuidados a serem prestados antes e após a cirurgia, orientações e informações sobre as diferentes etapas de recuperação, cuidados a ter com o membro superior afectado, exercícios de recuperação da capacidade funcional do braço e do ombro, além de informações sobre outros tratamentos, como radioterapia, quimioterapia, hormonoterapia e hipóteses de reconstrução da mama (Mamede, M., 2000). Cuidados Pré-operatórios Durante o período pré-operatório os cuidados de enfermagem centram-se essencialmente no ensino do doente sobre o que esperar da cirurgia. O ensino a uma utente submetida a mastectomia (com ou sem reconstrução) passa por preparar a mesma para o tipo de sutura que esta pode esperar, bem como o tipo de penso, drenos ou cuidados imediatos (Phipps, et all, 2003).
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Antes do momento cirúrgico per si, a fase de descoberta de um nódulo mamário desperta na mulher diversas emoções e sentimentos que podem ser devastadores. Como tal, o enfermeiro que está em contacto com a mulher durante o período do diagnóstico, tem de ter consciência das repercussões que algumas das possíveis descobertas podem causar na vida da mulher. Este, tem de estar preparado para proporcionar à mulher e seus familiares, apoio emocional e de informação (Phipps, et all, 2003). Aquando do diagnóstico de cancro da mama, a mulher tem de ser informada não só do seu estado clínico, mas também das suas alternativas disponíveis. É fundamental que o enfermeiro em consonância com o médico, apurem quais os conhecimentos que a mulher possui acerca do seu diagnóstico, para fornecerem informações precisas e adequadas, a fim de a mulher estar consciente das suas opções de tratamento (Phipps, et all, 2003). A inclusão da família nesta fase, é também de vital importância, de forma a esta dar apoio emocional à mulher e a auxiliar na responsabilidade da decisão de tratamento (Phipps, et all, 2003). Com a possibilidade da perda da mama instala-se o processo de luto. Geralmente, no momento da decisão do tratamento cirúrgico (lumpectomia ou mastectomia), as mulheres referem que a sua imagem corporal ou sexualidade não constituem um factor decisivo, sendo a sua maior preocupação a erradicação do cancro (Phipps, et all, 2003). No entanto, as questões relacionadas com a imagem corporal e com a sexualidade surgem após o procedimento cirúrgico, apesar de maioria das mulheres supera bem a cirurgia e a perda da mama (Phipps, et all, 2003). Assim sendo, na fase pré-cirúrgica é fundamental que os elementos de uma equipa multidisciplinar avaliem o impacto que o cancro da mama e a eventual perda da mesma pode causar na mulher. As mulheres com problemas ao nível da sua sexualidade ou relações íntimas, devem ser reencaminhadas para psicoterapia (Phipps, et all, 2003). O luto instalado pela perda da mama é normal, pelo que deve ser dado à utente tempo necessário para esta o ultrapassar. Nesta fase, o enfermeiro deve tranquilizar a utente que expressar os seus sentimentos de perda é algo natural, aceite e compreendido pela equipa. Aqui é também importante estimular a família, para que esta proporcione apoio emocional na medida que a utente necessite (Phipps, et all, 2003). 21
O encaminhamento das utentes para programas de associações de suporte e apoio, é outra das formas de ajudar a utente a enfrentar o luto e a ansiedade após a mastectomia (Phipps, et all, 2003). No pré-operatório imediato, são reforçados os ensinos e clarificações à utente. Esta é novamente informada de que os movimentos do braço do lado afectado ficaram elevado (numa almofada) para facilitar o retorno venoso e drenagem linfática. Também deve ser feita uma demonstração dos exercícios respiratórios e das técnicas de mobilização, a fim de preparar a utente para que esta possa participar de forma activa na sua recuperação (Phipps, et all, 2003). Cuidados Pós-operatórios Após a realização da mastectomia, os cuidados pós-operatórios centram-se essencialmente na promoção de conforto físico, apoiar emocionalmente, apoiar na nutrição, prevenir complicações e preparar a utente para a alta e os cuidados no domicílio (Phipps, et all, 2003). •
Controlo da dor:
A dor cirúrgica no período após a mastectomia deve-se geralmente à incisão cirúrgica, que na maioria dos casos se estende desde o externo até à axila. O alívio da dor após mastectomia é promovido pela administração de analgésicos (ou outras medidas de conforto prescritas) (Phipps, et all, 2003). Uma avaliação completa e pormenorizada da dor e a administração imediata de analgésicos permitem o alívio da dor, assim como fomentam um sono e repouso adequados (Phipps, et all, 2003). Além da dor, pode também existir um desconforto localizado, associado ao traumatismo de nervos dorsais ou intercostais (Phipps, et all, 2003). Quando ocorre o traumatismo dos nervos da região operada, a mulher pode sentir alterações sensoriais, tais como: formigueiro, alterações na sensibilidade cutânea do local e região circundante, ou até a sensação de dor fantasma da mama. O desconforto varia de utente para utente, e de acordo com o seu grau de tolerância à dor (Phipps, et all, 2003).
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A utente deve ser informada que as sensações acima descritas são normais após a cirurgia e que desaparecerão no espaço de alguns meses (Phipps, et all, 2003). A manutenção do conforto físico da mulher mastectomizada (e não só), contribui para diminuir o elevado nível de stress a que esta se encontra sujeita (Phipps, et all, 2003). Durante os primeiros dias do pós-operatorio (ou pelo menos durante as primeiras 24 horas), deve ser proporcionado apoio ao lado operado. Uma vez que os movimentos do braço e do ombro desse lado vão estar limitados. Deve-se ensinar a utente a sair da cama pelo lado não afectado, para reduzir a dor e a tensão do lado operado (Phipps, et all, 2003). De uma forma geral, maioria dos utentes já não possuem dor no momento da alta (Phipps, et all, 2003). •
Prevenção da infecção:
Após a realização de uma mastectomia, podem existir diversos focos promotores de infecção. A acumulação de fluidos na parede torácica ou região linfática axilar, a formação de linfedema e a existência de uma solução de continuidade são alguns desses focos (Phipps, et all, 2003). Devem ser avaliadas as características do conteúdo drenado, assim como a sua quantidade. A mudança do penso deve ser feita de forma asséptica e deve-se ter em conta as características da ferida (sinais inflamatórios e sua evolução) (Phipps, et all, 2003). •
Promoção da mobilidade do braço e ombro do lado afectado:
Uma das intervenções prioritárias em enfermagem, após a realização de uma mastectomia, é manter a mão, braço e ombro (do lado intervencionado) elevados após a cirurgia. Esta acção deve ser feita quer a mulher se encontre na cama ou no cadeirão, a fim de evitar a estase linfática e venosa. A fim de controlar esta existência de estase, o braço deve ser medido (15 cm a cima e abaixo do cotovelo), e comparado com a medida no pré-operatório e com a medida do braço do lado oposto (Phipps, et all, 2003). O braço do lado operado deve ser mantido imóvel por 24 horas após o procedimento, reduzindo assim qualquer pressão sobre a sutura (Phipps, et all, 2003).
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Após este período pode-se dar inicio aos exercícios da mão (que consistem em abrir e fechar a mão apertando uma bola e flectir e estender o antebraço, várias vezes por hora). Estes exercícios facilitam o retorno venoso e linfático (Phipps, et all, 2003). Os exercícios de mobilização do braço mais exigentes, devem ser iniciados por recomendação médica, geralmente após remoção dos pontos e dos drenos, em 7 a 10 dias após a intervenção.Tais exercícios destinam-se a restabelecer a mobilização completa do ombro (Phipps, et all, 2003). 2.1.2. Normas e Recomendações de Cuidados Após a Realização de Mastectomia Após a realização de uma mastectomia, a mulher terá de ter alguns cuidados na realização da sua vida quotidiana, nomeadamente: •
Certificar-se que a Tensão arterial jamais é avaliada no braço afectado (braço correspondente ao lado em que se efectuou a mastectomia);
•
Não utilizar roupas apertadas ou relógio no braço afectado;
•
Não efectuar esforços acrescidos ou transportar pesos com o braço afectado;
•
Utilizar luvas de borracha para lavar louça ou efectuar alguma actividade semelhante;
•
Utilizar como instrumento na cozinha apenas o braço não-afectado ou utilizar luva própria;
•
Evitar picar-se (como por exemplo a cozer ou a jardinar);
•
Hidratar bem a pele, com creme hidratante, para manter uma boa elasticidade e hidratação;
•
Evitar queimaduras solares;
•
Tratar imediatamente de cortes ou escoriações, aplicando protecção. (Phipps, et all, 2003)
2.1.3. Seguimento da Mulher Submetida a Mastectomia Segundo Amorim, C., (2007), a American Joint Commitee of Cancer (2000) recomenda que a mulher submetida a mastectomia seja seguida em regime de ambulatório após o tratamento inicial.
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O plano de seguimento destas doentes deverá atender à especificidade de cada caso, embora as directrizes internacionais recomendem que: •
Até aos vinte e quatro meses após a cirurgia, deve-se proceder a uma observação trimestral, acompanhada de história clínica minuciosa e observação cuidada;
•
Dos 25 meses até aos 60 meses deverá ser submetida trimestralmente a observação clínica;
•
Após os 60 meses, deve ser submetida a uma observação clínica de forma anual. (Amorim, C., 2007)
Devem também ser efectuados exames complementares de diagnóstico para acompanhamento (Raio X ao tórax, resultados analíticos com marcadores enzimáticos especificos e Mamografia Bilateral) (Amorim, C., 2007). Decorridos 5 anos após o diagnóstico, aconselha-se também a prescrição de uma cintilografia óssea (Amorim, C., 2007). Este tipo de acompanhamento exige um conhecimento da história natural da doença e uma vigilância adequada, de forma a que seja possível detectar precocemente recidivas locais ou generalizadas (Amorim, C., 2007). A mastectomia e os tratamentos adjuvantes utilizados no tratamento do cancro da mama, causam modificações nos hábitos de vida destas mulheres, sendo necessário também ajudá-la na adaptação à mudança e a adopção de novos comportamentos, e se necessário recomendar apoio psicológico. (Amorim, C., 2007). 2.1.4. Reconstrução da Mama/Implantes A reconstrução mamária é um processo que requer a tomada de muitas decisões por parte da utente, todas elas dependentes de inúmeros factores, como por exemplo: •
A saúde e estilo de vida;
•
O género de corpo;
•
O tamanho da mama;
•
A sua preferência pessoal;
•
A quantidade de pele e tecido que restam após a mastectomia;
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(Mentor, 2005) Existem dois tipos de procedimentos para a reconstrução da mama: a colocação de implantes ou a utilização e retalho de tecido autólogo (do próprio) (Phipps, et all, 2003). A reconstrução mamária pode ser feita durante o procedimento da mastectomia (sendo denominada de reconstrução imediata) ou pode ser feita algumas semanas após a intervenção cirúrgica (reconstrução tardia) (Mentor, 2005). A vantagem de uma reconstrução imediata da mama é que sendo feita durante a mastectomia, ajuda a evitar o impacto psicológico e o choque da perda da mama. Por outro lado, a reconstrução tardia permite que a utente se concentre na recuperação da doença, proporcionando mais tempo a esta para reunir informações e decidir sobre as opções de reconstrução que dispõe (Mentor, 2005). Os implantes mamários são bolsas moles (preenchidas com silicone) que se colocam numa cavidade por baixo do musculo grande peitoral. O tamanho e a forma do implante correspondem ao da mama oposta (Phipps, et all, 2003). O outro tipo de implantes existentes é chamado de próteses expansoras de tecido. Estas são colocadas da mesma forma que os implantes de silicone, onde a bolsa pode ser preenchida com 100 a 200 ml de solução salina (cloreto de sódio) no momento da cirurgia, e posteriormente com cerca de 30 a 100 ml semanalmente, ate se atingir o tamanho da mama desejado. O cloreto de sódio é injectado no implante através de uma agulha (por um acesso subcutâneo). A expansão gradual do implante faz alargar a bolsa, dando assim a forma e o tamanho à nova mama (Phipps, et all, 2003). Durante o período de dilatação, não são necessárias limitações da actividade, e a dor ou o desconforto gerado, são facilmente controláveis. Ao fim de alguns meses (altura em que a prótese se encontra totalmente expandida), a bolsa é retirada e substituída por um implante de silicone (Phipps, et all, 2003). O uso de implantes de silicone pode comportar algumas complicações. Dentre estas encontram-se as contracções capsulares fibrosas à volta do implante, causando dor e sensibilidade da parede torácica, podendo promover também a própria adesão do implante à parede torácica (Phipps, et all, 2003).
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A utilização de um retalho de tecido autólogo para reconstrução da mama, consiste na utilização do músculocutâneo do grande dorsal, para recriar uma mama. Pode também ser utilizado o tecido miocutâneo do recto abdominal oblíquo da parede inferior do abdómen (Phipps, et all, 2003). Este método de reconstrução pode ser efectuado aquando da mastectomia ou em procedimento posterior. Este vai suprimir a necessidade de utilização de um implante de silicone (a menos que o tecido existente seja insuficiente para formar a mama) (Phipps, et all, 2003). Com o recurso a este método, evita-se o choque psicológico da perda da mama para a mulher, ao mesmo tempo que se diminui a necessidade de limitação da actividade e o custo de um novo internamento. No entanto este método possui algumas desvantagens, sendo uma delas a visualização Fig. 3. Utilização do Musculo grande dorsal para reconstrução da mama;
da cicatriz nas costas (aquando da utilização do músculo grande dorsal para a reconstrução).
A utilização do músculo recto-abdominal oblíquo tem a vantagem de este possuir uma elasticidade idêntica à da mama e de estar presente em quantidade suficiente para a formação da nova mama. Contrariamente à utilização do grande dorsal, a cicatriz abdominal é facilmente ocultada (Phipps, et all, 2003).
Fig. 4. Utilização do Musculo rectoabdominal oblíquo para reconstrução da mama;
A reconstrução do mamilo da mama afectada requer um novo procedimento cirúrgico, podendo ser feita através da utilização de tecido obtido na estrutura auréolo-mamilar da mama do lado oposto ou na pele da parte superior da face interna da coxa. A mulher poderá também recorrer o uso de tatuagem na pele, de forma a que este condiga com o pigmento natural da mama (Phipps, et all, 2003). Quando a mastectomia sem reconstrução da mama é a alternativa escolhida, é necessária uma prótese mamária, que pode ser problemática para algumas mulheres. Esta pode ser desconfortável e todos os dias as confronta com a perda da mama. As mulheres que usam prótese mamária podem sentir algum desequilíbrio devido ao peso da mama oposta, possuir limitações quanto a uso de algum vestuário ou relativamente à participação em actividades físicas (Phipps, et all, 2003).
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2.2.QUIMIOTERAPIA A quimioterapia consiste na utilização de fármacos para tentar eliminar as células cancerígenas que possam existir no organismo. De uma forma geral, esta é constituída por uma associação de fármacos, que podem ser administrados oralmente ou por via endovenosa (Portal de Oncologia Português, s/d). Actualmente, defende-se a introdução de protocolos farmacológicos o mais inicialmente possível. Estes fármacos podem ser administrados aquando do diagnóstico de cancro da mama, antes da cirurgia, o que pode permitir que se opte por lumpectomia em vez de mastectomia total. A quimioterapia no pré-operatório pode também tornar tumores grandes e inoperáveis em tumores mais passíveis de extracção cirúrgica (Phipps, et all, 2003). A quimioterapia é também usada como uma medida de profilaxia para prevenir o crescimento de células cancerígenas remanescentes após cirurgia ou radioterapia, e como terapia paliativa, quando já não é possível controlar o curso natural da doença (Langhorne, 2000, citado por Coelho, C., 2008). A quimioterapia adjuvante é normalmente administrada a seguir a um tratamento local como a cirurgia e/ou radioterapia e tem como objectivo reduzir o risco de doença metastática (Coelho, C., 2008). Sendo este tratamento de natureza química, possui uma grande probabilidade de causar efeitos secundários, não só a nível físico, mas também psíquico e social, causando sofrimento e limitações, podendo dificultar a adesão do doente ao tratamento (Coelho, C., 2008). Regra geral, os efeitos secundários da quimioterapia dependem dos fármacos utilizados e das doses administradas (Phipps, et all, 2003). Os químicos constituintes da quimioterapia, actuam numa determinada fase da divisão celular, não tendo capacidade de distinguir as células cancerígenas, das células “normais”, danificando por vezes células saudáveis do corpo humano (Coelho, C., 2008). A quimioterapia afecta, essencialmente, as células que se dividem rapidamente (Info Cancro, s/d). Assim, os efeitos secundários da quimioterapia vão estar relacionados com a
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actuação em células do organismo cuja replicação celular foi mais rápida (Rodrigues, 2001, citado por Coelho, C., 2008), tais como: •
Células sanguíneas: Quando estas são afectadas, existindo a diminuição do seu número total em circulação, poderá haver uma maior probabilidade de infecções, hematomas, hemorragias, ou ainda causar mais facilmente fadiga.
•
Células dos folículos pilosos: a quimioterapia pode provocar a queda do cabelo e pêlos do corpo. Este efeito é reversível e o cabelo volta a crescer, embora o novo cabelo possa apresentar cor e textura diferentes.
•
Células do aparelho digestivo: a quimioterapia pode causar falta de apetite, náuseas, vómitos, diarreia e feridas na boca e/ou lábios. (Info Cancro, s/d)
Durante o tratamento com quimioterapia, pode existir diminuição da libido (podendo estar atribuído à fadiga, ansiedade e alterações da auto-imagem sofridas pela mulher) (Coelho, C., 2008). A maioria dos tratamentos de quimioterapia, são realizados em hospital de dia, não sendo necessário internamento (Coelho, C., 2008). O enfermeiro tem a responsabilidade de avaliar e desenvolver um plano de acção que lhe permita fornecer informação necessária à mulher sobre o tratamento e suas complicações, assegurando a continuidade dos cuidados (Coelho, C., 2008). Os enfermeiros possuem um papel fundamental da educação para a saúde ao utente em relação ao despiste e controlo dos efeitos secundários provocados pela quimioterapia (Eckert, 2001, citado por Coelho, C., 2008). Estes devem explicar quais os potenciais sinais e sintomas que a utente deve saber identificar e prevenir, assim como actuar para controlar os mesmos. O enfermeiro deve também direccionar o ensino para o uso correcto da medicação (Coelho, C., 2008). 2.3.RADIOTERAPIA A radioterapia, ou terapêutica por radiações, consiste na utilização de raios altamente energéticos para matar as células cancerígenas (Coelho, C., 2008).
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Nos Estados Unidos é actualmente o tratamento de referência após uma lumpectomia. As radiações erradicam as células cancerígenas que podem ficar após a manipulação do tumor durante a cirurgia (Phipps, et all., 2003). No entanto, dependendo da dimensão do tumor e de outros factores, a radioterapia pode também ser usada como um recurso de tratamento depois de uma mastectomia total (Coelho, C., 2008). Apesar da prática comum consista na aplicação de radiações após da cirurgia, esta pode também ser aplicada antes do procedimento cirúrgico (Phipps, et all., 2003). Esta terapêutica é aplicada neste contexto com a finalidade de destruir células cancerígenas e diminuir o tamanho do tumor. Esta situação é mais utilizada quando o tumor é de grandes dimensões ou a sua remoção por cirurgia não é fácil. Nestes casos, a mulher pode fazer apenas radioterapia ou pode fazer radioterapia com quimioterapia ou terapêutica hormonal (Coelho, C., 2008). Para tratar o cancro da mama, podem ser utilizadas dois tipos de radioterapia: •
Radiação externa: a radiação provém de uma máquina e são realizados em hospital ou clínica. Geralmente, os tratamentos são realizados durante 5 dias por semana, durante várias semanas.
•
Radiação interna: a radiação é aplicada por implante (provém de material radioactivo contido em finos tubos de plástico, colocados directamente na mama). Para fazer radiação por implante, a doente fica no hospital. Os implantes permanecem no local durante vários dias e são retirados antes de a utente ir para casa. (Info Cancro, s/d)
Algumas mulheres com cancro da mama podem recorrer aos dois tipos de radioterapia (Info Cancro, s/d). A radioterapia geralmente obtém melhores resultados em tecidos bem irrigados e com elevado teor de saturação de oxigénio (Phipps, et all., 2003). Os efeitos secundários decorrentes da radioterapia incluem reacções cutâneas (rubor, secura, sensibilidade e prurido), edema, fadiga. A fadiga é geralmente consequência da depressão da medula óssea, devido à incidência de radiações no tórax (Phipps, et all., 2003). 30
Segundo Coelho, C., (2008) estes efeitos são geralmente moderados e reversíveis, podendo também estar presente a dor, que pode estar relacionada com inflamação temporária dos nervos ou dos músculos peitorais no campo da radiação. A extensa radiação axilar poderá agravar o linfedema ou dificuldades relacionadas com a amplitude dos movimentos (Crane, 2002, citado por Coelho, C., 2008). 2.4.TERAPIA HORMONAL “A terapia hormonal tem sido uma modalidade de tratamento do cancro da mama há várias décadas” (Phipps, et all., 2003:1801). Este tipo de terapia é dirigida às células cujo o desenvolvimento depende do estrogénio, impedindo que estas tenham acesso à hormona, impedindo assim a formação de tumores RE+ (Phipps, et all., 2003). Na terapêutica hormonal são utilizados medicamentos que bloqueiam os receptores hormonais. Para além destes medicamentos, se ainda não estiver na menopausa, a mulher poderá fazer uma cirurgia para remoção dos ovários (Coelho, C., 2008). O tamoxifeno é um fármaco (não esteroíde) que compete pelo receptor do estradiol na célula RE+, eliminando assim o estímulo do estrogénio para o desenvolvimento do tumor, tendo também um efeito (mínimo) nas células RE- (Phipps, et all., 2003). Hoje em dia, o tamoxifeno é considerado a terapia hormonal de eleição (para as mulheres na pré-menopausa e na pós-menopausa), sendo utilizado em mulheres com cancro da mama em fase inicial, com ou sem metástases ganglionares (Phipps, et all., 2003). Os efeitos secundários do uso do medicamento são idênticos aos sintomas da menopausa. Estes incluem afrontamento, menstruação irregular, náuseas, retenção de líquidos e corrimento vaginal (Phipps, et all., 2003).
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3. FASES DO PROCESSO ONCOLÓGICO VIVIDAS PELA DOENTE ONCOLÓGICO A doença oncológica, seja de que “classe” for, é acompanhada por sofrimento psicológico, que atinge quer o doente, quer seus familiares. A partir do momento do diagnóstico, o doente enfrenta um conjunto de mecanismos e tarefas de adaptação à doença e às circunstâncias geradas por esta. Parte do sofrimento atribuído à doença oncológica, é atribuído de acordo com a vivência de cada fase e mecanismo de adaptação (Cardoso, G, et all., 2010). Geralmente, os utentes confrontam-se com a incerteza do curso da sua doença e do seu futuro. A ideia da própria morte torna-se mais realista e quaisquer sintomas que surjam podem ser interpretados como um possível agravamento do quadro clínico, causando repercussões a nível psicológico e emocional (Cardoso, G, et all., 2010). Como tentativa de uma melhor aceitação, quer os utentes quer seus familiares tendem a procurar uma explicação ou um sentido para a existência da doença, em que a comunicação surge como sendo um dos aspectos mais fundamentais para este tipo de utentes. Segundo Cardoso, G, et all., (2010), o “secretismo” e a “aversão ao tema oncológico” pode dificultar a adaptação do utente à doença e aumentar o seu isolamento, e onde a possibilidade do diálogo possibilita ao utente receber apoio emocional. Como fases de adaptação à doença oncológica, podem ser identificadas 5 fases: 1. Fase da negação: quando o utente é confrontado com a notícia da doença (potencialmente mortal), este recusa-se a aceitar a totalidade ou parte da informação que lhe é fornecida. Na maioria dos casos, esta fase é transitória, e tem como função permitir uma progressiva aceitação da realidade. Em alguns casos, a transitoriedade não se verifica, onde os utentes podem negar a sua situação até à morte, buscando sempre alternativas em procura de um diagnóstico diferente. 2. Fase da revolta: nesta fase o utente reconhece a existência de uma doença grave, mas não a aceita. Geralmente visualizam-se reacções de raiva e revolta por parte dos utentes.
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Esta é uma das fases mais complicadas quer para a família quer para os profissionais de saúde. Como consequência dos comportamentos vividos nesta fase, as pessoas podem tender a distanciar-se do utente. No entanto, é importante que os sentimentos de revoltam sejam exteriorizados e aceites, uma vez que estes se tratam de reacções frequentes e praticamente inevitáveis. A tolerância perante estas manifestações de revolta é extremamente importante, uma vez que estas vão proporcionar um alívio e uma mais rápida aceitação por parte do utente. 3. Fase da negociação: nesta fase o utente admite a existência da doença, mas tenta “negociar” a sua cura, sendo uma fase fundamental na manutenção da esperança. Nesta etapa é frequente o utente seguir rigorosamente o seu tratamento e adoptar um estilo de vida saudável, fazer promessas pela sua cura e dedicar-se à prática religiosa (se este for religioso). 4. Fase da depressão: esta instala-se quando os mecanismos anteriores falham, e o utente tende a exibir um quadro depressivo grave (desânimo, inquietações, privação de sono, perda de apetite, entre outros). 5. Fase da aceitação: nesta etapa o doente compreende que a doença e a sua evolução são reais e inevitáveis, podendo reagir de diversas formas, de acordo com a sua personalidade. Alguns doentes aceitam a doença desde o seu diagnóstico, e outros levam mais tempo a atingir esta fase. (Ross, K., 1969, cit. por Cardoso, G, et all., 2010) A adaptação à doença oncológica é influenciada por diversos factores pessoais, familiares, socioculturais e clínicos. Entre estes factores destacam-se a personalidade, maturidade, mecanismos de coping habitualmente utilizados, experiencias anteriores, apoio social, status económico, atitudes sociais face à doença, prognostico clínico, entre outros (Cardoso, G, et all., 2010). Em todas as fases de adaptação e vivência do processo oncológico, existe um traço comum, sendo ele a esperança. É esta que ultimamente permite que os utentes se submetam a exames a tratamentos na perspectiva de um melhor prognóstico (Cardoso, G, et all., 2010).
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3.1.PROCESSO DE COPING FACE AO PROCESSO ONCOLÓGICO E DE PERDA DA MAMA Qualquer que seja a origem de uma “perda”, esta origina uma mudança na vida da pessoa. Dependendo do tipo da “perda”, o luto e o sofrimento são sentimentos que acompanham frequentemente este tipo de acontecimento, devendo ser vistos como algo dinâmico, que exige dos profissionais de saúde, utentes e familiares uma constante adaptação (Varela, M., et Leal, I., 2007). Ao deparar-se com a existência de uma doença e com o stress por ela gerada, existe a necessidade de recorrer a um conjunto de esforços desenvolvidos pelo indivíduo para confrontar a situação, a que se dá o nome de processo de coping (Stum, E., et all, 2009). Segundo a ICN, (2000:80) o coping representa: “Atitude com as características específicas: Disposição para gerir o stress que desafia os recursos que cada indivíduo tem para satisfazer as exigências da vida e padrões de papel auto-protectores que o defendem contra ameaças, percebidas como ameaçadoras da auto-estima positiva; acompanhada por um sentimento de controlo, diminuição do stress, verbalização da aceitação da situação, aumento do conforto psicológico”. Para Varela, M., et Leal, I., (2007), o conceito de coping contempla uma variedade de estratégias a desenvolver para que seja possível enfrentar uma série de problemas que vão surgindo ao longo do ciclo vital. Embora o diagnóstico de cancro seja vivido emocionalmente de formas diferentes de indivíduo para indivíduo, este constitui para todos uma ameaça à vida e integridade pessoal, com a qual tem de se lidar (Rowland, 1989, cit por Varela, M., et Leal, I., 2007). Lazarus e Folkman (1984), citado por Varela, M., et Leal, I., (2007:479), foram os autores que elaboraram a definição de coping mais referida na literatura. Para estes, o coping diz respeito a: “conjunto de esforços cognitivos e comportamentais que permitem gerir as exigências específicas, internas ou externas, que são percepcionadas como penosas ou como estando para além dos recursos do indivíduo”. De acordo com os autores acima citados, é o processo de avaliação cognitiva que vai determinar o potencial stressante de uma situação, assim como, os recursos de coping necessários para lidar e ultrapassar a mesma. 34
O coping possui duas funções: permite o controlo das emoções, que leva à resolução do problema emocional. (Lazarus e Folkman, 1984 cit por Varela, M., et Leal, I., 2007). O coping que permite o controlo das emoções, sendo geralmente utilizado quando nada pode ser feito para alterar a ameaça ou o perigo. Assim sendo, este serve como a alternativa para diminuir o desconforto emocional e o sofrimento, recorrendo-se à fuga, ao distanciamento do problema, à atenção selectiva e à desvalorização dos acontecimentos negativos. Estas são algumas estratégias que permitem a manutenção da esperança e do optimismo (Varela, M., et Leal, I., 2007). Para Kann (1995) citado por Varela, M., et Leal, I., (2007), o coping face à doença permite a resolução do distúrbio associado à ameaça ou perda, preservando a integridade física do indivíduo, ajudando a manter as relações e o desempenho dos diferentes papéis, assim como, permite a manutenção de um auto-conceito positivo Rowland (1989) citado por Varela, M., et Leal, I., (2007:481) salienta que “as estratégias de coping são influenciadas pela duração e intensidade da exposição ao acontecimento stressante”. Olhando à natureza da doença oncológica, sendo esta uma patologia que se prolonga ao longo do tempo, esta conduz ao desgaste dos recursos físicos e sociais que o indivíduo dispõe, afectando por sua vez a eficácia das estratégias de coping. Para (Amorim, C., 2007) o coping procura cima de tudo promover um ajustamento dos problemas ligados à saúde, implementando medidas no sentido de gerir o problema e ajudar a pessoa a alterar, modificar, aceitar a situação. Os aspectos envolvidos da promoção e sucesso das estratégias de coping durante a vivencia de um processo oncológico prendem-se com aspectos internos ao indivíduo, tal como a flexibilidade (controlo exercido de acordo com as diferentes situações); a adaptabilidade à natureza de cada situação; e a efectividade (quando os indivíduos vêem os seus comportamentos de coping como fundamentais para atingir os seus objectivos e metas (Amorim, C., 2007) Geralmente, os mecanismos de coping não são utilizados de modo consciente pelo indivíduo, sendo este processo dinâmico ao longo do seu desenvolvimento, de acordo com a avaliação e reavaliação do evento feito pelo próprio indivíduo (Stum, E., et all, 2009).
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Assim, a capacidade que cada pessoa possui de enfrentar a doença, depende da avaliação e dos mecanismos dispensados por ela, de maneira particular ou colectiva, ou seja, esta capacidade vai depender dos recursos pessoais, bem como dos recursos proporcionados pela família e profissionais da saúde, ou por toda a sociedade (Stum, E., et all, 2009). No âmbito do processo oncológico e de “perda”, é importante salientar o papel do enfermeiro no cuidado ao auxiliar o utente, pois este é o profissional de saúde que está em constante contacto com o utente e com quem estabelece uma relação de respeito e confiança, estando apto a esclarecer dúvidas, diminuindo assim a ansiedade, o medo e a insegurança da utente (Stum, E., et all, 2009). Deste modo, torna-se imperativo que o enfermeiro conheça as estratégias de coping utilizado por mulheres mastectomizadas, com o objectivo de favorecer e qualificar os cuidados prestados (Stum, E., et all, 2009).
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4. A MULHER SUBMETIDA A MASTECTOMIA De acordo com o autores Jerónimo e Henriques (2002) citados por Barbosa, J., (2008) para a maioria das mulheres, o cancro da mama é considerado a pior coisa que lhes podia ter acontecido, vivendo sentimentos de tristeza, desespero, raiva, angustia e medo, dentre eles o medo de morrer e de perder a sua sexualidade. Segundo Oliveira (2004), citado por Barbosa, J., (2008:37) “a mastectomia invade a mulher no seu todo, como um ser bio-psico-sócio-cultural e espiritual”, existindo um aspecto fundamental na base dos problemas inerentes à intervenção cirúrgica, sendo este a alteração da imagem corporal. A hipótese de perda ou a própria perda de uma mama para a mulher, compromete não só a sua integridade física, como também a relação que a mulher estabelece com o seu próprio corpo e mente, pois a mama é vista como um símbolo de beleza, feminilidade, atractivo sexual, zona erógena e de amamentação. A mastectomia provoca na mulher alterações da imagem corporal, onde os conceitos como a auto-estima e a auto-confiança influenciam o modo como a mulher percepciona a sua própria situação (Amorim, C., 2007). Nunes e Neves (1997) citado por Amorim, C., (2007) identificaram três tipos de reacções à mastectomia, sendo estas: a apreensão, a rejeição e negação. Segundo estes autores, as mulheres transparecem a apreensão quando verbalizam o medo da doença, o medo de morrer e as incertezas do prognóstico e do tratamento. A rejeição constata-se sobretudo, através dos constrangimentos em aceitar a doença, e a negação surge essencialmente num primeiro momento, reaparecendo mais tarde. De uma forma geral, a mastectomia comporta para a mulher uma situação traumatizante, dolorosa e geradora de ansiedade, desespero, angústia e medo, pelo que a mulher terá de desenvolver as suas capacidades de adaptação (Barbosa, J., 2008).
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4.1.SIMBOLISMO DA MAMA FIMININA Ao longo dos tempos, a moda e os padrões de beleza foram-se modificando, reflectindo a forma como a mama era e é observada por diferentes sociedades. Desde muito cedo a mama feminina tem sido fonte de inspiração de artistas, poetas, músicos e escultores, sendo também um dos maiores símbolos de atracção sexual (Amorim, C., 2007). Os vários significados atribuídos à mama feminina passam por: •
Símbolo de adoração;
•
Símbolo de aconchego e carinho;
•
Fonte de vida (devido ao leite materno);
•
Objecto de tortura;
•
Objecto de prazer;
•
Cartaz artístico;
•
Objecto de atenção;
•
Objecto de culto. (Amorim, C., 2007) Em todas estas representações femininas, a mama era o símbolo da atracção por
excelência como órgão sexual e o símbolo da maternidade/fertilidade (Amorim, C., 2007). O conceito de “mama” refere o próprio órgão anatómico ou a ideia (representação objectiva) da sua experiência na mente do sujeito (Amorim, C., 2007). Rycroft, (1972), citado pelo mesmo autor (2007:88), refere-se a mama como sendo um “objecto de desejos, impulsos, fantasias, ansiedades orais e, também, como sinónimo de maternidade”. Estas assumem uma importância particular por constituir uma forte vinculação mãe/filho, através do acto de amamentar. “O leite materno era simultaneamente reconhecido como alimento material e espiritual” (Amorim, C., 2007:86). A mama, está intimamente ligada aos afectos e sensualidade feminina ou masculina, podendo ser também vista como uma fonte de excitação e agressão. A sua visão está profundamente relacionada com a combinação de sexo e violência, podendo esta visão ser
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encontrada em obras contemporâneas do cinema, televisão, publicidade e pornografia (Amorim, C., 2007). As mamas estão não só intimamente ligadas ao prazer sexual e amamentação no estádio adulto, relacionando-se também com as transformações observadas nas adolescentes aquando da sua transição para o estádio adulto (Amorim, C., 2007). No caso da doença oncológica da mama, o simbolismo desta passa a associar-se à doença, ao sofrimento e à morte (Amorim, C., 2007). O verdadeiro significado para a mulher e sociedade de uma mutilação a um seio (como
no caso da mastectomia) torna-se difícil de descrever, pois cada mulher vivencia o processo de forma diferente, atribuindo à própria mama, significados pessoais diferentes (Amorim, C., 2007). 4.2.ALTERAÇÕES NA VIDA DA MULHER MASTECTOMIZADA A mastectomia é inevitavelmente exigente e complexa para a vida da mulher, desencadeando além de alterações físicas, um conjunto de alterações psicológicas, emocionais, sociais, familiares e sexuais. 4.2.1. Alterações Físicas O cancro origina no ser humano, alterações físicas visíveis, tais como diminuição de peso, anorexia, astenia, entre outras. Tais alterações, muitas das vezes ao serem percepcionadas pelos doentes, geram um aumento de ansiedade, onde por vezes a degradação física visível leva à perda da auto-estima (Alarcão, 1989, citado por Barbosa, J., 2008). No caso especifico do tratamento cirúrgico do cancro da mama, a mastectomia altera negativamente a aparência física da mulher, transformando assim o auto-conceito que esta possui do próprio corpo (Barbosa, J., 2008). Assim sendo, a imagem corporal da mulher mastectomizada, desempenha um papel fundamental na relação que esta estabelece com o seu próprio corpo, e consequentemente com aqueles que a rodeiam (Barbosa, J., 2008) Após a mastectomia, surgem ainda outros aspectos, que podem levantar-se como problemas para as mulheres, como é o caso da assimetria corporal (mesmo após a 39
reconstrução do seio). Segundo Guerra et Retes (2004) citado por Barbosa, J., (2008), a mulher que usa prótese mamária, fica muitas vezes renitente a olhar a própria mama, devido à sensação de se sentirem incompletas comparativamente com outras mulheres. Muitas das mulheres sentem dificuldades em usar determinado tipo de vestuário, uma vez que algumas roupas não são capazes de esconder as assimetrias e cicatrizes decorrentes da mastectomia, sendo que outras mulheres sentem-se incapazes de se despirem em locais públicos, como nas praias ou piscinas (Barbosa, J., 2008). 4.2.2. Alterações Psicológicas As alterações psicológicas que acompanham o diagnóstico e o tratamento do cancro, iniciam-se no momento em que a mulher começa a suspeitar da sua existência (Maluf, M., 2005, citado por Silva, T., et all., 2010). Face a um processo de cancro da mama e possibilidade de realização de uma mastectomia, as repercussões psicológicas são inúmeras, uma vez que se geram incertezas, sofrimento, dor, ansiedade e o medo (Barbosa, J., 2008). A mulher mastectomizada sofre inúmeras alterações psicológicas, que estando associadas com o medo e o estigma causado pela própria doença, originam sentimentos de impotência. Jerónimo e Henriques, 2002, citado por Barbosa, J., 2008). As alterações psicológicas, estão presentes em todas as mulheres, sendo estas manifestadas por situações de depressão, ansiedade, afastamento, apatia, entre outras (Nunes e Neves, 2004, citado por Barbosa, J., 2008). Assim sendo, a mastectomia constitui um traumatismo psicológico para as mulheres, onde a amputação pode provocar a perda da integridade corporal e consequentemente alterações da identidade pessoal (Bruges, 2007, citado por Barbosa, J., 2008). 4.2.3. Alterações Familiares A família é profundamente afectada pela doença aguda e crónica dos seus membros, sendo que a doença oncológica é aquela que implica um maior envolvimento (Cardoso, G, et all., 2010).
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Ao mesmo tempo que a mulher sofre alterações decorrentes do cancro da mama, as alterações existentes não se condicionam apenas a esta. Todos os indivíduos que convivem com a mulher (especialmente filhos e conjugues), são afectados pelo problema, sendo que estes exercem um papel fundamental para o suporte emocional e combate à doença (Silva, T., et all., 2010). A doença oncológica fomenta uma nova dimensão para o utente e família, onde as suas actividades do quotidiano e papéis se modificam, da mesma forma que o estado de saúde se modifica (Cardoso, G, et all., 2010). Da mesma forma, Dias e Durà (2001) citado por Barbosa, J., (2008) referem que o cancro da mama provoca alterações no seio famílias, uma vez que a díade conjugal sofre o impacto directo da doença. De acordo com os mesmos autores, não e apenas o doente que é confrontado pelo choque da doença, mas também o seu conjugue, pois este é confrontado pela incerteza do binómio vida/morte e saúde/doença, gerando-se também para este, sentimentos de ansiedade e depressão. Pereira e Lopes (2002) citado por Barbosa, J., (2008:40) afirmam que “existem casos em que a doença oncológica aproxima a família, e em outros, separa-a, mas nenhuma consegue ficar indiferente a esta problemática”. De uma forma geral, a família além de actuar como suporte emocional, é muita vez indicada como cuidadora, estando implícita na decisão sobre os tratamentos e acções a que a mulher com cancro da mama será submetida (Ogden, 2004, citado por Barbosa, J., 2008). Na perspectiva de Pereira e Lopes (2002) citado por Barbosa, J., (2008:41), “a família desempenha um papel fundamental na saúde e na doença de um indivíduo, e cada família encontra o seu próprio estilo de comunicação, as suas regras, crenças, bem como a forma de manter a sua estabilidade”. 4.2.4. Alterações Sociais Por si só, o diagnóstico de cancro provoca inúmeras alterações quer nas rotinas pessoais e sociais, nas regras e rituais, e na redistribuição de papais, comportando assim um acréscimo de novas responsabilidades e competências (Barbosa, J., 2008).
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Desta forma, o doente tem de se adaptar e adquirir novas competências ao longo do processo, implicando assim ajustamentos sociais relevantes. Como exemplos de ajustes sociais pode ser apontada a cessação da actividade profissional, podendo isto causar um acréscimo de dificuldades económicas (Pereira e Lopes, 2002). No entanto, as reacções e sentimentos vivenciados pela mulher mastectomizada, vão depender de vários factores relacionados com a própria pessoa. Por exemplo, no caso de uma jovem que recorre ao tratamento do cancro por quimioterapia, onde os efeitos adversos visíveis são vividos, geralmente, de forma mais intensa e notável do que numa mulher em idade avançada (Barbosa, J., 2008). O isolamento social que por vezes ocorre, a falta de capacidade para desempenhar a actividade profissional, a repulsa por o seu aspecto físico e os sentimentos vivenciados, são dos factores que mais repercussões podem causar ao nível social (Barbosa, J., 2008). Desta forma, a integração social e a reabilitação social da mulher mastectomizada, deve ocorrer o mais rapidamente possível, para que esta se sinta útil e socialmente aceite pela sociedade (Otto, 2000, citado por Barbosa, J., 2008). 4.3.AUTO-CONCEITO E AUTO-IMAGEM DA MULHER MASTECTOMIZADA A mama feminina está estreitamente relacionada com a identidade, maturidade, sexualidade e maternidade de uma mulher. Deste modo, a perda da mama para algumas mulheres pode causar consequências negativas na sua imagem corporal e no seu auto-conceito (Pilker & Winterowd, 2003, citado por Amorim, C., 2007). Vaz Serra (1989), citado por citado por Amorim, C., (2007), refere que o autoconceito trata-se de uma percepção que o ser humano tem de si próprio, nas suas diversas vertentes (emocional, social, física ou académica), afectando a forma como este se relaciona com o ambiente envolvente. Para a autora, o auto-conceito “não existe de forma isolada” sendo determinado pelo contexto onde se encontra inserido, e pelas crenças e convicções inerentes. Segundo Bolander (1998), citado por Amorim, C., (2007:53) “ (…) o auto-conceito afecta a maneira como o indivíduo olha o mundo e o lugar que nele ocupa e influência a forma como os outros o vêem e como se comporta consigo (…)”. Desta forma auto-conceito está intimamente relacionado com a auto-estima pessoal, e assim sendo, com a imagem corporal. 42
De acordo com Amorim, C., (2007:95), “a imagem corporal é o conceito que cada pessoa tem do seu corpo e suas partes”. Para a autora, para que este conceito se forme, é necessário o conhecimento tanto das estruturas anatómicas como das relações entre as partes do corpo, bem como dos movimentos e funções de cada parte do corpo possui. A imagem corporal é um dos factores mais importantes na formação do auto-conceito, emergindo como uma visão mental do físico pessoal e das expectativas que a mulher tem face ao seu corpo. É nesta imagem que se incluem as atitudes e percepções relacionadas com a aparência física, o estado de saúde, estratégias e sexualidade (Pilker & Winterowd, 2003, citado por Amorim, C., 2007). A mastectomia, através de todas as alterações que provoca na vida da mulher, geralmente, altera negativamente o auto-conceito do próprio corpo, levando a mulher a ter uma auto-imagem diminuída (Barbosa, J., 2008). Esta representação pessoal está relacionada com aspectos gerais de autoconfiança e auto-estima que cada mulher possui, sendo que a influência das experiencias vividas na infância, os afectos e emoções, as relações desenvolvidas podem afectar a forma como a mulher reage face a essas representações, sendo que a imagem corporal faz parte da autoimagem, sendo um factor essencial ao desenvolvimento da auto-estima da mulher (Amorim, C., 2007). Para Oliveira (2004), cit. pela mesma autora (2007:96), “a imagem corporal desempenha, sem margem de dúvida, um papel central não só na relação que temos com o nosso corpo, mas também na relação que temos connosco e com os outros”. Para Barbosa, J., (2008), a imagem corporal, não se reduz apenas à vertente da aparência física e estética, mas sim, contempla a experiência de sensações, funções e aptidões corporais, assim como concepções de saúde/doença. Segundo Fisher (cit. in Oliveira, 2004), citado por Barbosa, J., (2008:38), “a imagem corporal não é só uma construção cognitiva, mas também reflexo de desejosos, atitudes emocionais e interacções com os outros”. Assim, pode-se concluir que a imagem corporal é a auto percepção que o indivíduo (ou mulher) tem da sua imagem, estrutura e função corporal. Esta é a ideia mental que uma pessoa formula do seu próprio corpo, num momento da sua vida.
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Barbosa, J., (2008), defende que a auto-imagem da mulher mastectomizada desempenha um papel fundamental na relação que a mulher estabelece com o seu próprio corpo e com aqueles que a rodeiam. De facto, o cancro da mama implica um elevado grau de comprometimento na autoimagem corporal, o que pode acarretar danos no conceito que a mulher tem sobre si própria. Esta mudança de imagem corporal, de forma inesperada e não planeada, envolve sentimentos e emoções que podem gerar na mulher ansiedade, medo, tristeza, culpa, vergonha e depressão. Na mulher mastectomizada, todos estes sentimentos e emoções são, ainda, acompanhados de receios relacionados com a aceitação pelo parceiro, pela sociedade, medo da morte ou recorrência da doença, podendo gerar distúrbios envolvendo o seu auto-conceito e a sua auto-imagem (Amorim, C., 2007). Para Carpenito (1997), citado por Amorim, C., (2007:54) o distúrbio do auto-conceito é ”(…) um estado em que o indivíduo apresenta risco real ou potencial de apresentar uma mudança negativa na maneira de sentir, pensar ou de se ver a si mesmo (…)”. Este distúrbio pode causar mudanças em um ou vários dos cinco componentes pessoais, sendo eles a imagem corporal, auto-idealização, auto-estima, desempenho de papéis e identidade pessoal. A natureza das alterações causadas pode ser variada, manifestando-se das seguintes formas: •
Recusa em olhar ou tocar parte do corpo afectado;
•
Recusa em olhar-se ao espelho;
•
Sinais de pesar, choro, desespero e raiva;
•
Recusa em actividades de auto-cuidado;
•
Isolamento social;
•
Comportamentos auto-destrutivos. (Amorim, C., 2007) Estes distúrbios podem surgir como reacções a vários problemas de saúde, situações
de vida ou conflitos pessoais (Amorim, C., 2007). Da mesma forma Carpenito (1997) define distúrbio da imagem corporal “ (…) como um estado em que o indivíduo apresenta, ou corre o risco de apresentar, uma perturbação na 44
maneira como percebe a sua imagem corporal (…) “ e cujos sinais e sintomas são a resposta verbal ou não verbal, como por exemplo manifestações de vergonha, embaraço, culpa e repugnância (citado por Amorim, C., 2007:55). Além destes, podem ainda estar presentes sentimentos negativos sobre o corpo, sentimentos de desamparo, desespero, impotência e vulnerabilidade (Carpenito, 1997, citado por Amorim, C., 2007:55). O distúrbio na imagem corporal resulta, sobretudo, de mudanças na aparência resultantes de situações de tratamentos, de hospitalização, cirurgia ou restantes tratamentos inerentes ao processo de recuperação/manutenção (Amorim, C., 2007). 4.4.SEXUALIDADE EM MULHERES MASTECTOMIZADAS Segundo Costa e Reis (2003) citado por Barbosa, J., (2008:39), “as mamas representam o símbolo maior da sexualidade e feminilidade” onde qualquer ameaça à sua integridade exerce sobre as mulheres um profundo impacto. Assim sendo, após a mastectomia, a mulher pode apresentar alterações não só ao nível físico, psicológico, familiar e social, como pode apresentar alterações ao nível sexual (Barbosa, J., 2008) A sexualidade foi definida pela OMS como sendo “(…)uma energia que nos motiva para encontrar amor, contacto, ternura e intimidade”. Esta integrasse no modo como as pessoas se sente, movem, se tocam e são tocados (Barbosa, J., 2008:42). Com os acontecimentos e alterações decorrentes do processo de cancro da mama, como o temor da morte, a mudança da imagem corporal e o medo da rejeição por parte dos parceiros, a mulher submetida a mastectomia, vê-se confrontada com vários problemas de adaptação, sendo que para a maioria das mulheres, a mama é símbolo de feminilidade, relacionando-se com a atractividade e desejo sexual (Azevedo et all, 1995, citado por Barbosa, J., 2008). A sexualidade constitui-se como uma das principais preocupações da mulher após a mastectomia, pois a perda da mama para estas mulheres, associa-se muitas vezes à perda da feminilidade, comprometimento sexual, desfiguramento e mutilação do corpo, diminuição da atracção sexual e perda do parceiro, prejudicando a sua qualidade de vida e satisfação sexual (Almeida, 2007, citado por Barbosa, J., 2008).
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De acordo com Dias et all., citado por Barbosa, J., (2008:43), “a sexualidade sofre desequilíbrios devido à diminuição do desejo sexual, à ansiedade e a períodos de depressão potenciados pela alteração da imagem corporal”. A mama feminina é uma zona erógena por excelência, sendo portanto fonte de prazer. Acariciar as mamas é uma prática comum durante os preliminares do acto sexual. “Sempre que é diagnosticado um nódulo mamário suspeito, que obriga a uma intervenção cirúrgica para a sua remoção, a mulher pode passar por um processo no qual tem que saber lidar com uma nova imagem corporal, sendo que esta exerce um impacto sexual” (Amorim, C., 2007:98). Bruges (2007), citado por Barbosa, J., (2008), afirma que o facto de não se possuir uma mama, não altera o modo de funcionamento sexual, mas no entanto pode afectar a sensação da mulher sobre a sexualidade. Todos os eventos que decorrem da mastectomia, podem causar na mulher sentimentos de vergonha, de inadequação e culpa, afectando assim a forma como ela vive a sua sexualidade. Para além das consequências directas da mastectomia, existem também diversos efeitos secundários decorrentes dos tratamentos, como a quimioterapia que provoca efeitos como a alopécia e a astenia, fazendo com que a mulher se sinta estranha e manifeste dificuldades de relacionamento, e de repulsa sexual, evitando assim o contacto sexual (Arán et all., cit in Almeida, 2007, citado por Barbosa, J., 2008). De igual forma, para Lim (cit. In Almeida 2007), citado por Barbosa, J., (2008), a mastectomia não é a única causa do desconforto sexual sentido pelas mulheres mastectomizadas. Existem um conjunto de outros factores que intervém na sua disponibilidade ao contacto sexual, como é o caso dos antecedentes de diagnóstico, problemas financeiros, sociais e conjugais, da idade da mulher e da falta de informação sobre a doença. É também importante considerar que a mulher mastectomizada, que não tem um parceiro regular, vive imensamente a angústia de ser rejeitada. A adaptação a uma nova imagem corporal tem sobretudo, quatro vertentes distintas: a auto-imagem feminina, a imagem do parceiro relativamente a ela, a imagem que a mulher percepciona que o companheiro tem dela e a imagem na vivência sexual (Amorim, C., 2007). 46
A mulher mastectomizada parece assim, viver permanentemente num estado de insegurança acerca da aceitação por parte do parceiro e o grau de desejo que ainda pode criar nele. O medo de retomar a vida sexual está frequentemente presente devido ao medo das alterações na partilha do prazer associado à dor física, podendo mesmo chegar à rejeição do cônjuge na partilha do leito conjugal (Amorim, C., 2007). No entanto para Oliveira (2004), citado por Barbosa, J., (2008:45), refere que “a mastectomia pode despertar uma série de sentimentos ao nível da sexualidade, podendo existir ausência de alterações ao nível do relacionamento sexual. Este facto pode estar relacionado com o tipo de relacionamento anterior à mastectomia, sendo crucial a atitude do parceiro sexual” (que por vezes actua como facilitador e noutros casos como dificultador do contacto). Desta forma, a sexualidade vivenciada pela mulher mastectomizada depende de vários factores, tais como, a sua personalidade, a sua sexualidade anterior à mastectomia e o seu ambiente familiar, especialmente o seu relacionamento com o cônjuge (caso este exista ou não) (Amorim, C., 2007). Para Pádua (2006), “a qualidade do relacionamento existente entre o casal, será responsável não só pelo alcance e a manutenção da estabilidade emocional da mulher, mas também pelo interesse sexual, numa fase mais tranquila da doença”. Assim, após a mastectomia e com a estabilidade da doença, o casal pode procurar uma maior intimidade, troca de afectos, prazer e novas formas de adaptação às condições actuais da mulher, com a finalidade de tornar o relacionamento sexual o mais agradável, confortável e prazerozo possível (citado por Barbosa, J., 2008:45). Assim, o homem desempenha um papel fundamental no que concerne a adaptação da mulher à sua própria sexualidade. Desta forma, a afectividade como parte integral da sexualidade, torna-se fundamental para que as mulheres superem esta fase da sua vida, com o apoio do parceiro (Barbosa, J., 2008). A comunicação, assume-se também aqui, como uma parte fundamental na adaptação da mulher à sua sexualidade e durante todo o processo de doença. Seguindo esta linha de pensamento, Segal (cit. in. Almeida, 2007), citado por Barbosa, J., (2008:46), afirma que “os casais que tentam vencer a dor e o sofrimento sozinhos, isolados um do outro e não compartilham a tristeza, tendem a considerar o processo de doença e tratamento mais 47
difícil”, dificultando assim a adaptação da mulher. Da mesma forma, sendo citado pelo mesmo autor, Oliveira (2004) constata que a atitude do parceiro, em todas as fases após a remoção da mama, é um factor que interfere fortemente na relação da mulher com o seu corpo. Sendo assim, pode-se concluir que a pratica sexual para a mulher mastectomizada, está inevitavelmente diferente do que era quando esta possuía um corpo saudável, completo e sem cicatrizes, sendo a adaptação à sexualidade dependente de inúmeros factores intrínsecos e extrínsecos à mulher.
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CONCLUSÃO Com este trabalho pode-se concluir que a experiência de cancro na mama é um acontecimento de vida, que requer uma adaptação não só por parte da mulher, mas também por parte da sua família e sociedade em que se insere. O cancro da mama é, não só a doença com mais prevalência entre as mulheres, mas também o mais temido por elas. Após a sua detecção, qualquer que seja a localização, tratamento ou prognóstico do cancro, o seu diagnóstico é por si só uma ameaça à sobrevivência, expondo as vulnerabilidades da mulher, onde a esta vivencia sofrimentos e incertezas, passando por várias fases de adaptação. O cancro da mama, é classificado segundo o sistema TNM, sendo esta classificação indicadora do prognóstico e do tratamento a ser seguido. A mulher ao longo do tratamento, pode recorrer a várias alternativas, sendo elas o tratamento cirúrgico, quimioterapia, terapia hormonal ou radioterapia, embora apesar de todos os avanços técnico científicos, a mastectomia continue a ser o tratamento de eleição de forma a prevenir o reaparecimento do tumor. Existem vários tipos de cirurgia para o tratamento do cancro da mama, que são indicados de acordo com a fase evolutiva do tumor, onde a mastectomia radical, quando necessária, causa um série de alterações dolorosas na vida da mulher. Estas alterações envolvem não só a vertente física, psicológica e social, mas também a sua auto-imagem, autoestima e comprometimento da sexualidade, visto a mama ser um órgão repleto de simbolismo, quer para a mulher quer para a sociedade. Para ultrapassar as dificuldades impostas, a mulher e seus familiares (ou ate mesmos elementos da sociedade em que se insere), adoptam mecanismos de coping, que as auxilia a resolver o problema de saúde e a controlar as suas emoções. A forma como cada mulher ultrapassa e vivencia a doença, depende de imensas circunstancias e factores internos e
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externo, dependendo também do grupo etário, suporte familiar e social e maturidade de cada uma. É possível a reconstrução da mama após a mastectomia, sendo esta feita durante o próprio procedimento ou algumas semanas após a mastectomia. Quando feita durante o procedimento, evita todo o impacto da visualização da perda da mama, e consequências que isso pode acarretar. A reabilitação da mulher submetida a uma mastectomia requer uma assistência multidisciplinar, onde é fundamental a importância do papel da enfermagem, tendo o enfermeiro de estar capacitado e plenamente consciente das implicações que todo o processo acarreta para a mulher e seus familiares. Só assim, este poderá detectar correctamente as necessidades de cada uma, de forma a intervir para colmatar cada necessidade apresentada. Este tem de possuir não só informação, mas também a capacidade desenvolver empatia, de cuidar integralmente da utente, atendendo a todas as vertentes da definição de saúde.
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