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JOSÉ ORLEANS COSTA
JOSÉ ORLEANS DA COSTA
Um dos maiores médicos na área de pediatria no Brasil, nasceu no povoado Olho D'Água.
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LASAN, Léo. ENTREVISTAS44
Sou de Paraibano nasci no Olho D Água, depois me criei no povoado Campestre e na Serra, meus pais são Dito Ferreira e Dona Antonia (já falecida), sou médico pediatra, na área de neonatologia, terapia intensiva pediátrica, embora nos últimos anos eu tenha estudado gestão tanto de saúde como de educação superior, sai um pouco da área da Medicina e venho investindo na área de gestão pública e privada de faculdade de medicina. Eu comecei a estudar aqui no Buriti, com o professor Antonio de Sousa Reis, que foi um grande professor; depois eu vim estudar aqui no Epitácio Pessoa, e também estudei no Colégio Bandeirantes, na época de irmã Gema, irmã Taís, professoras Madalena, Dona Josefina Vieira, pessoas muito boas, tinham grandes professores naquela época, a Maria Helena Carneiro também foi professora minha no Epitácio... Daí eu fui para Balsas onde tive oportunidade de estudar, por que naquele momento era muito difícil da gente sair de Paraibano para estudar, por que ou você tinha dinheiro para ir estudar em São Luis ou Teresina ou ficava aqui em Paraibano, na verdade a perspectiva de quem era de família pobre era muito pequena, e naquele momento eu era coroinha da igreja local e com os trabalhos na igreja nós conhecemos o Padre Ângelo que veio e levou um monte de meninos de Paraibano para o seminário em Balsas, entre esses meninos tinha gente de famílias simples e meninos de famílias ricas, amigos como, por exemplo, o Paulo do Carvalho, o Cícero do Seu Divaldo, o Toim do Divaldo o Zé do Dário, o José Rodrigues (Dr. Zequinha) esses meninos e também outros que foram estudar em Balsas, era uma oportunidade você estudar, e a princípio a idéia era a de ser padre, a gente ia com aquela formação de ser padre, éramos muito jovem, mas foi uma grande oportunidade nas nossas vidas,
44 LASAN, Léo. ENTREVISTAS. "SÓ O ESTUDO NOS TIRA DA POBREZA" DIZ O MÉDICO PARAIBANENSE JOSÉ ORLEANS. IN paraibanonews, PUBLICADO EM 14/01/2014, DISPONÍVEL EM http://paraibano-maranho-paraibanomanews.blogspot.com.br/2014/01/entrevista-com-medico-dr-joseorleans.html.
117 eu acho que se eu não tivesse saído daqui para ir estudar em Balsas eu poderia ter ficado e trabalhado na roça e não ter desenvolvido as coisas que eu desenvolvi... Eu acredito que a grande questão foi eu ter ido para Balsas.
71, 73? Por que eu me formei em 1981 em Medicina, já no Rio de Janeiro... Então na verdade era bem antes, porque eu terminei o terceiro grau em 1975, o científico, então era bem antes, acho que em 1970, 71 por aí, por que eu fiquei seis a sete anos em Balsas e fui concluir o terceiro grau em São Luis no Colégio Marista e comecei medicina em 1976, então na verdade foram nos anos 70... [alguém de Paraibano se tornou padre?] De Paraibano não! Mas tivemos pessoas que sim, inclusive teve um, que hoje é bispo em Coroatá que é o Dom Sebastião, que é de Riachão, teve o padre Pedro (já falecido) que foi padre em Paraibano... Mas de Paraibano não... Acredito por que tenha havido uma grande mudança no seminário, tínhamos uma direção que era o padre Ângelo que era um santo homem e com essa mudança praticamente todos os alunos saíram e que foi um grande momento de perdas de pessoas que saíram... Eu acho que é uma geração que abriu caminhos, eu li o livro da Dra. Eliza e ela registra que a nossa geração foi a que abriu caminhos, da minha geração fez parte também o Zé Rodrigues, que hoje é médico em TeresinaPI, e ex-prefeito de Paraibano, então eu acho que é primeira geração de gente pobre que conseguiu “estudar”... Na verdade a primeira vez que filhos de pobres conseguiram se formar foi a nossa geração, por que a geração anterior era de filhos de famílias bem situadas, da elite da cidade45... uma elite econômica, financeira, cultural, é diferente da nossa geração que era de gente que rompeu barreira e não estou puxando nenhuma coisa não, mas na verdade é isso! Por que o caminho junto à igreja (católica) por Balsas foi a grande ponte... Eu acho que a grande intenção minha naquele momento foi perceber que a gente precisa estudar e quando eu cheguei ao seminário eu encontrei um ambiente propício ao estudo... O seminário era um local que “estudava”... Estudava o dia inteiro, tinha oração, e muito estudo... Os padres eram muito inteligentes, os professores todos formados em filosofia, teologia, história, geografia, tinham doutores, professores brilhantes... Eu lá em Balsas além de ser aluno, também fui dar aula... Eu sempre tive essa veia de professor... A minha família praticamente toda é de professor... Sou professor universitário, minha irmã é professora universitária, meu irmão é professor em Paraibano, então, então essa tendência acho que veio da minha mãe, que na verdade não sabia ler nem escrever, mas sempre achou que nós devíamos estudar... O seminário foi uma oportunidade que eu tive para estudar, aqueles livros bacanas, a biblioteca, eu queria fazer redações, eu me lembro de que fazia redações e as pessoas elogiavam, eu também corrigia redações, e aquilo me levou ao mundo dos estudos... [...] quando eu fui para São Luis e fui fazer medicina na UFMA, onde fiquei até o 5º ano em um bom curso de medicina e que depois fui terminar no Rio de Janeiro, em um Hospital do
118 Ministério da Saúde, grande centro formador de pediatria, e no Rio eu tive uma sensação muito interessante onde pensei: “Bom! eu não pretendo voltar ao Maranhão...” Por que naquele momento eu percebi que o Maranhão só conseguia crescer se fosse à base de apadrinhamento político... Eu me lembro de São Luis que era muito, do ponto de vista assim: se você pertence a uma elite você consegue alguma coisa, mas isso era o meu sentimento naquele momento e eu percebi que no Rio de Janeiro não... Se eu fosse bom tecnicamente, se eu trabalhasse muito, eu poderia ter um mundo... Engraçado eu percebi isso lá, por que em São Luis os meus amigos do curso de medicina eram quase todos os filhos de elite, tinha gente de Pastos Bons que era elite também, era praticamente o pessoal da elite, mesmo de Paraibano tinha colega de turma também, aí eu percebi: eu não vou precisar de apadrinhamento político, eu não quero precisar disso... Sempre tive horror a esse tipo de coisa, e pensei: eu preciso fazer a minha história... Mas os anos de São Luis foram anos difíceis por que em Paraibano eu morei em casas de pessoas, em São Luis eu morei em casas de pessoas, a gente não tinha dinheiro... Eu estudei em colégio caro, que era o Marista, então o meu dinheiro dava apenas para pagar o Marista, todo o restante eu vivia em dificuldade, morando em pensionato, morando em casa de um, ou dividindo e com muita dificuldade mesmo, sem carro, não existia carro a gente andava de ônibus ou a pé, e eu trabalhava em São Luis, fui professor do Colégio Santa Teresa, como professor de Biologia, onde fui coordenador do curso... Então eu trabalhava de dia, no intervalo das onze horas ao meio dia e duas da tarde, por que a faculdade era o dia inteiro, e fiz um concurso para auxiliar de serviços operacionais, era o cargo mais baixo do Ministério da Saúde, nesse concurso que era federal eu passei a trabalhar à noite e que me deu renda, então eu trabalhava a noite, trabalhava nos intervalos das aulas e estudava, isso ainda em São Luis... Quando eu fui para o Rio de Janeiro eu levei esse vínculo que foi o que me ajudou a me manter no Rio e com esse vínculo de serviços operacionais eu fiz concurso para médico do Ministério da Saúde, que hoje é o cargo que eu exerço no qual estou próximo a me aposentar, mas foi interessante por que na verdade em São Luis foi muito difícil... Foram anos difíceis, por que a minha turma era a federal, mas só que só de elite, praticamente a grande parte tinha carro... [...] eu liderava o meu grupo, na verdade eu sempre fui um aluno respeitado na minha sala, por que eu estudava muito, tinha uma inteligência digamos razoável e isso me tornava uma pessoa diferenciada, nunca tive problemas, às vezes os caras falavam: Ah! Vou viajar passar seis meses nos Estados Unidos, nunca achei que fosse tão importante... O que eu achava é que devia ser reconhecido como um bom estudante de medicina, como um bom médico, na verdade eu sempre foquei nisso; por que o restante... Eu já ocupei vários cargos políticos em Minas Gerais, assim vários, eu tive vários cargos públicos, atualmente estou ocupando o cargo de secretário de saúde de Barbacena cidade de Minas Gerais... No Rio eu terminei o meu curso de medicina, na verdade eu fiz uma prova de um concurso do Ministério da Saúde disputando uma vaga para ir para o Rio, uma disputa pesadíssima, e eu acredito que Deus ajuda a gente
119 em alguns momentos, por que eu me lembro de que quando eu fui para o Rio de Janeiro fazer a prova, eles fizeram uma lista dos pontos que cairiam e ficaram de mandar para a gente, mas como eu estava morando em São Luis eu não recebi essa lista... Então ao chegar ao Rio eu vi a lista de todos os pontos que todos os outros candidatos já tinham recebido e sabiam quais os pontos que cairiam na prova, prova oral e prova escrita, e aí uma lista de trinta pontos pregada na parede com a informação: Esses pontos são de amplos conhecimentos dos candidatos... Ora! Eu não tinha recebido, eles não tinham enviado para mim, eles mandaram para os candidatos do Rio, de São Paulo, não mandaram nem para mim nem para um colega do Pará... Na verdade eles não deram bolas para nós que éramos do norte... Acho que eles nem acreditaram que nós iríamos... Mas aí eu olhei na lista e vi um ponto e eu pensei: Gente!! Esse ponto eu sei muito... o ponto era semi nefrótica... esse ponto eu acabei de fazer prova dele, e eu vou sortear esse ponto, você vai ver... quando eu enfiei a mão na vasilha para tirar o ponto, sorteei semi nefrótica, aí eu falei, agora vocês estão perdido comigo que eu vou ganhar essa vaga e aí tirei dez na prova escrita, dez na prova oral, eu acho que essas coisas um pouco ajuda, não sei, eu queria muito, e disse essa vaga é minha, tinha setenta caras disputando e dez vagas a maioria do Rio e São Paulo e apenas eu do Maranhão e o cara do Pará...
[...] por que eu vi se eu estudasse muito eu podia fazer o meu nome no Rio de Janeiro… E eu descobri que eu tinha uma defasagem muito grande da faculdade do Maranhão para a faculdade do Rio de Janeiro, isso foi uma coisa assim, impressionante! Quando eu saí de Balsas e fui para São Luis não houve diferença nenhuma do colégio... Quando eu saí daqui do Colégio Bandeirantes para Balsas, também não houve essa diferença, dava para acompanhar... Mas saindo do Maranhão para o último ano de medicina no Rio de Janeiro eu fiquei tão impressionado com a diferença de conhecimentos que meus colegas tinham em relação a mim, que era uma coisa impressionante e olha que eu era um bom aluno... Fiquei impressionado com a defasagem de conhecimento, com a falta de raciocínio, de aprender a raciocinar, por que a gente aprendia a decorar na faculdade do Maranhão, impressionante isso... Eu fiquei chocado e pensei: Meu Deus como o ensino no Maranhão está ruim! Estou falando de faculdade federal naquele momento... e aí eu disse: só tem uma saída, eu preciso estudar, mais do que os outros, é óbvio! E trabalhar mais que os outros... Então na verdade quando todo mundo ia dormir eu ficava até três horas da manhã estudando... Por que eu precisava recuperar aquilo, e eu me lembro de que em seis meses eu começava a ter um espaço dentro dos internatos, dos alunos, no final do primeiro ano eu fui eleito o representante dos internos por que eu recuperei estudando...
Já era o último ano de medicina o sexto ano e estágio no Hospital Instituto Fernandes Figueira que é do Ministério da Saúde que hoje é um grande centro de maternidade e pediatria... Esse era um grande hospital de referencia no Rio de padrão internacional (repetiu as diferenças do Maranhão para o Rio de Janeiro)... Mas as diferenças não me paralisaram não... os primeiros dois meses aquilo me deixou assim fora do chão, mas eu disse: é isso que eu quero, vou superar...
120 Eu vim lá do interior, de Paraibano e estou aqui sendo chefe dos residentes desse hospital... E olha! eu posso fazer mais ainda... Já caminhei muito, mas falta muito para caminhar. Por que as dificuldades são muitas, se você imaginar o que é uma pessoa inserir em São Luis depois inseri no Rio de Janeiro, era muito difícil, eu me lembro de que para eu ir para o Rio fazer a prova eu tinha que ir de avião e eu não tinha dinheiro para ir de avião... e aí a mãe de uma aluna minha do Santa Teresa (escola em São Luis) ficou sabendo que eu ia e ela tinha uma agência de viagem, a agência Baluz, e ela me ofereceu a passagem de ida e volta ao Rio e eu aceitei...e deu certo.
Depois você imagina a inserção no Rio e Janeiro?. Foi uma parada! Uma coisa foi meus amigos que foram para o Rio já com apartamentos comprados ou alugados, com uma estrutura toda montada, eu fui de ônibus com todos os meus livros, alguns maranhenses também foram, mas somente com o tempo é que houve aproximação, agora essa coisa de lembrar eu só pensava assim: se a gente chegou até aqui à gente pode mais. Por que eu sempre achei que o conhecimento é quem faz a gente sair da pobreza. A diferença é o conhecimento e o empenho de cada um. Se você trabalha bem você faz a diferença. Há médicos e médicos. Professores e professores... No Rio eu fiquei 1981, fiquei trabalhando em um dos maiores centro de neonatologia e terapia intensiva neonatal que estava começando no Rio de Janeiro, o Brasil estava despontando para isso, tinha um professor que veio dos Estados Unidos e montou um serviço muito bom chamado URP no RJ, e eu era um residente que ele me identificou entre os estudantes para ser estagiário dele, e foi aí que eu descobri o mundo da tecnologia em salvar prematuros, recém-nascidos, foi outro universo, um deslumbramento para mim por que eu vi que tinha habilidade para mexer com prematuros (eu tinha 25 anos na época, portanto muito novo) e eu gostava de ler, estudar e de trabalhar, então o CTI (Centro de Terapia Intensiva) é para quem gosta de trabalhar muito, e foi aí onde eu fiz meu nome no Rio de Janeiro... Eu trabalhei nas melhores UTIS do Rio, com grandes mestres da terapia intensiva neonatal e aí como o meu primeiro casamento foi com uma mineira eu acabei indo para Belo Horizonte (em 1983) quando recebi um convite para ir a Minas, onde comecei a perceber que a área de CTI Neonatal era muito incipiente, estava começando lá, e ali eu vi aquele universo no qual eu podia crescer... Eu era novo e comecei a formar equipes, trabalhar em hospitais públicos, fui para a Maternidade Odete Valadares onde me tornei médico diarista, chefe de berçário e depois me tornei diretor da instituição e também diretor de toda a rede da FHEMIG (Federação de Hospitais do Estado de Minas Gerais) que tem 21 hospitais [...] Vou fazer um paralelo, no ano em que eu nasci no Maranhão... Sabe qual é a grande questão, que eu fiz quando eu tomei posse como presidente da Sociedade Mineira de Pediatria, eu disse: “Eu sou sobrevivente, por que no ano em que eu nasci à taxa de mortalidade era de 200 a cada mil, hoje estamos em 16... Em 1955 quando eu nasci à taxa de mortalidade no Maranhão era quase de duzentos por mil... Então eu sou um sobrevivente disso... Por que filho de pais analfabetos, pobre, nascer no interior, a sobrevivência era quase como um milagre, aí sim eu classifico como milagre...
121 Bom! Na minha história toda eu fui secretário adjunto de saúde da cidade de Belo Horizonte, fui diretor geral da rede Fhemig- Fundação Hospitalar de Minas Gerais, com 21 hospitais, fui diretor do Hospital Odete Valadares-BH. Fui secretário municipal de saúde da cidade de Sete Lagoas-MG. E agora secretário municipal de saúde de Barbacena-MG. Fui diretor da faculdade de medicina de Barbacena (UNIPAC) e da Faculdade de Medicina de Araguari e sou médico consultor do Ministério da Saúde e assessor de medicina das universidades de Minas Gerais... Então na verdade é uma vida sempre lidando na área de gestão... Há cinco anos que eu parei de fazer terapia intensiva... Eu nunca fui pediatra de consultório... Eu sempre fui pediatra de hospital, CTI, Terapia intensiva, pacientes graves, prematuros...