Raízes - A Arqueologia das Mídias no Brasil

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RAÍZES A arqueologia da multimídia no Brasil


SUM

ÁRIO


ANDRÉ ABUJAMRA

12

ANTÔNIO JOSÉ SANTANA MARTINS

22

ARRIGO BARNABÉ

32

FERNANDO VELÁZQUEZ

46

GILBERTTO PRADO

54

GISELLE BEIGUELMAN

64

GUTO REQUENA

74

JOSÉ ROBERTO AGUILAR

84

KIKO GOIFMAN

98

KIKO MISTRORIGO E CÉLIA CATUNDA

106

LENORA DE BARROS

122

LUCAS BAMBOZZI

132

LUCIO JOSÉ DE SÁ LEITÃO

140

PRISCILA ALMEIDA CUNHA ARANTES

150

REGINA SILVEIRA

166

RICARDO ANDERÁOS

174

TADEU DA FONSECA JUNGES

186

WILTON LUIZ DE AZEVEDO

194




APRE SENTA ÇÃO


É com imenso prazer que apresentamos o projeto Raízes: A arqueologia da multimídia no Brasil, desenvolvido pelos formandos do curso de Tecnologia em Produção Multimídia, do Centro Universitário SENAC. Neste livro, que pode ser considerado um eterno beta, como praticamente tudo que é digital, são (re) apresentados ao grande público, alguns dos mais importantes ícones da multimídia do Brasil, em suas mais diversas vertentes: música, animação, tipografia, vídeo, poesia, intervenções diversas e outras tantas experimentações que foram fundamentais para a construção da identidade dos profissionais das multimídias atuais. Até o início deste século a experimentação do digital era um desafio enorme: recursos restritos, tecnologias muito novas e de difícil manipulação, softwares nada amigáveis… Mas, por outro lado, havia uma grande curiosidade e criatividade, natural dos artistas, levando ao extremo as explorações de tudo o que aparecia: do fax à internet, de sintetizadores aos recortes da cultura tradicional brasileira e sua relação com essa nova configuração de mundo, cada vez mais globalizada e permanentemente conectada.

Aproveitem a viagem!!! Beatriz Pacheco e Simone Freitas




ANDRÉ ABUJAMRA ATOR, CANTOR, COMPOSITOR E MULTI-INSTRUMENTISTA

ESCRITO POR: HENRIQUE FERREIRA DA SILVA


O MULTI-ARTISTA André Abujamra é um artista independente brasileiro, compositor, ator e multi-instrumentista. Possui uma notável contribuição cultural multimidiática para o Brasil, já compôs trilhas sonoras para diversos filmes brasileiros como Carandiru, Bicho de 7 cabeças, e Domésticas. Nascido em São Pauloe, 1965, André é bastante conhecido também, por ser filho do falecido Antônio Abujamra, diretor de teatro e apresentador brasileiro que comandava o programa “Provocações”, na TV cultura. Como músico solo já lançou quatro discos: O infinito de pé (2004), Retransformafrikando (2007), Mafaro


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(2010) e O homem bruxa (2015). Já fez parte também de bandas como “Os Mulheres Negras” e “Karnak”. Como ator, já participou de seriados e novelas como: A Grande Família (2005), Beleza Pura (2008) e Saramandaia (2013). No cinema estrelou filmes como: Boleiros - Era uma Vez o Futebol (1998), Castelo Rá-Tim-Bum, o Filme (1999) e É Proibido Fumar (2009). Em suas apresentações procura sempre utilizar recursos da multimídia para impactar o espectador, como na sua apresentação mais recente chamada “O Homem Bruxa” ou no espetáculo “Família LovBorgs: os russos transcomunicadores” de 2013. Suas influências culturais são bem distintas e muitas vezes até pitorescas, tem interesse pela cultura de vários países, como a cultura russa arcaica, por exemplo, e também pelo Candomblé, religião derivada do animismo africano. Essas influências estão sempre presentes em suas composições e apresentações. É responsável também pela trilha sonora de muitos filmes e programas de TV brasileiros, já ganhou diversos prêmios por suas trilhas como o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. André Abujamra é um grande exemplo de “artista completo”, já explorou vários campos da arte de forma independente e também já experimentou usar diversos elementos da multimídia em suas apresentações, por isso podemos considerá-lo como um “multiartista”. TRILHAS SONORAS André chegou a cursar regência na FAAM de São Paulo e apesar de não ter concluído o curso, continuou a carreira criando trilhas sonoras para diversos filmes brasileiros e internacionais, e trilhas para vários programas


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de televisão brasileiros. Em sua carreira acumula prêmios importantes como o prêmio Candango, Kikito, Guarnicê, e o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.

Reprodução / Tv Cultura

Compôs trilha-sonora para mais de 50 filmes, como “Carandiru”, “Bicho de 7 cabeças”, “Dois Coelhos”, “I love Rio”, e o mais recente “Trinta” (filme brasileiro sobre a vida do carnavalesco Joãosinho Trinta), entre muitos outros. Criou a trilha de abertura do seriado infantil “Castelo Rá-tim-bum” nos anos 90, música que até hoje está na boca das pessoas. Foi responsável também pela trilha dos episódios do seriado, e segundo entrevista dada ao site “Uol”, André disse que a criação dessas trilhas (para os episódios) foram bastante trabalhosas, devido a tecnologia da época. Em 2015 no Rock in Rio, André teve a oportunidade junto com o músico


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André Moraes, performar músicas temas de filmes de terror para um público de mais de 40 mil pessoas, na cidade do rock. Na apresentação foram tocados temas de filmes clássicos como: Psicose, O Bebê de Rosemary, A Profecia, entre outros. O HOMEM BRUXA Em seu mais recente espetáculo “O Homem Bruxa”, André Abujamra em comemoração aos seus 50 anos, promove o seu disco de mesmo nome do espetáculo, e instiga o público tocando todos os instrumentos no palco ao mesmo tempo, criando a trilha sonora ao vivo de vídeos que foram criados e editados por ele mesmo, e ainda promete levitar em palco.

O Homem Bruxa / Rreverbnation

André se propõe a tocar vários instrumentos ao mesmo tempo mesmo não sabendo tocar “direito” alguns desses instrumentos, mas segundo ele essa era a intensão do projeto, criar musicas que soassem diferentes e “fora da caixinha”. Para tocar todos os instrumentos ao mesmo tempo, André utiliza bases pré gravadas e outros recursos eletrônicos. O espetáculo é composto


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também por projeções que auxiliam o artista criar uma experiência diferente para espectador. “O Homem Bruxa” é com certeza um espetáculo multimídia que explora vários elementos audiovisuais.

Elenize Dezgeniski/Divulgação

FAMÍLIA LOVBORGS: OS RUSSOS TRANSCOMUNICADORES Em 2013, André propôs uma experiência multimídia em palco com o espetáculo “Família LovBorgs: os russos transcomunicadores”, um espetáculo pitoresco que misturava música, cinema e teatro, com referências da música balcânica e austro-húngara.

A peça contava a história de uma família russa que fala russo arcaico e reúne no palco personagens atípicos, com passados curiosos, além de músicos, técnicos de luz e som e uma atriz. O show, narrado por uma intérprete em russo arcaico, conduz a apresentação e descrição dos personagens. O cenário do espetáculo, composto por televisões de tubo antigos e telão, exibiam uma combinação de vídeo e ruídos (sonoros e visuais), como que estivem sem sinal. As imagens do espetáculo foram gravadas e exibidas ao vivo no telão e nos televisores enquanto os músicos se apresentavam, criando assim uma experiência visual bastante criativa e nostálgica. Os televisores também representavam a conexão com as almas passadas, por esse motivo eram exibidas colagens de filmes antigos que reforçavam ainda mais a proposta de criar uma experiência multimídia completa. MAFARO Em “Mafaro” seu terceiro disco (2010), André Abujamra mais uma vez não se limitou em lançar apenas um CD de música, criou um show-filme para


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complementar a sua obra, utilizando recursos da multimídia para reforçar a sua experiência musical. “Mafaro” se configura como uma experiência audiovisual megalomaníaca e impactante com diversas referências culturais do artista. Enquanto as músicas eram apresentadas em palco, telões exibiam uma colagem de vídeos de creative commons, junto com imagens que foram criadas especialmente para o show e que simulavam uma holografia de músicos convidados como Zeca Baleiro, Paula Pretta e Luís Caldas. Criando assim uma atmosfera bastante interativa entre os músicos e as imagens que eram exibidas em tela por um VJ. Esta obra sintetiza bem o perfil multifacetado do artista e oferece uma experiência multimídia completa. Ele procura explorar vários elementos artísticos e culturais que fazem parte de sua bagagem. Há espaço também, para brincar com idiomas que André provavelmente não domina.

Mafaro / André Abujamra


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André Abujamra é um artista independente brasileiro, compositor, ator e multi-instrumentista. Possui uma notável contribuição cultural multimidiática para o Brasil, já compôs trilhas sonoras para diversos filmes brasileiros como Carandiru, Bicho de 7 cabeças, e Domésticas. Nascido em São Pauloe, 1965, André é bastante conhecido também, por ser filho do falecido Antônio Abujamra, diretor de teatro e apresentador brasileiro que comandava o programa “Provocações”, na TV cultura. Como músico solo já lançou quatro discos: O infinito de pé (2004), Retransformafrikando (2007), Mafaro (2010) e O homem bruxa (2015). Já fez parte também de bandas como “Os Mulheres Negras” e “Karnak”. Como ator, já participou de seriados e novelas como: A Grande Família (2005), Beleza Pura (2008) e Saramandaia (2013). No cinema estrelou filmes como: Boleiros - Era uma Vez o Futebol (1998), Castelo Rá-Tim-Bum, o Filme (1999) e É Proibido Fumar (2009). Em suas apresentações procura sempre utilizar recursos da multimídia para impactar o espectador, como na sua apresentação mais recente chamada “O Homem Bruxa” ou no espetáculo “Família LovBorgs: os russos transcomunicadores” de 2013. Suas influências culturais são bem distintas e muitas vezes até pitorescas, tem interesse pela cultura de vários países, como a cultura russa arcaica, por exemplo, e também pelo Candomblé, religião derivada do animismo africano. Essas influências estão sempre presentes em suas composições e apresentações. É responsável também pela trilha sonora de muitos filmes e programas de TV brasileiros, já ganhou diversos prêmios por suas trilhas como o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.


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André Abujamra é um grande exemplo de “artista completo”, já explorou vários campos da arte de forma independente e também já experimentou usar diversos elementos da multimídia em suas apresentações, por isso podemos considerá-lo como um “multiartista”.


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REFERÊNCIAS DO SANTOS, ANDRÉA. André Abujamra Release. Disponível em: https://www.reverbnation.com/andreabujamra. Acesso em: 10 de Maio de 2016. ZENDRON, MARIANE. Entrevista para o site Uol; São Paulo; 2014. Disponível em: http://musica.uol.com.br/noticias/redacao/2014/08/01/musicosrelembram-trabalho-heroico-em-trilha-do-castelo-ra-tim-bum.htm. Acesso: 20 de Maio de 2016. ROLLING STONES, SITE. Artigo para o site da revista Rolling Stones sobre o Rock in Rio 2015. Disponível em: http://rollingstone.uol.com.br/noticia/rock-rio-2015-abujamrae-moraes-comandam-mais-um-show-de-homenagens-desta-vez-filmes-deterror/#imagem0. Acesso em: 20 de Maio de 2016. UOL, SÃO PAULO. Artigo “Peça multimídia traz músicas de André Abujamra ao Ibirapuera”. Disponível em: http://guia.uol.com.br/sao-paulo/teatro/noticias/2013/02/14/pecamultimidia-traz-composicoes-ineditas-de-andre-abujamra-no-auditorio-ibirapuera. htm. Acesso em: 22 de Maio de 2016. RELEASE, CARTASE. Release de “O Homem Bruxa” no site Cartaze. Disponível em: https://www.catarse.me/pt/ohomembruxa. Acesso em: 22 de Maio de 2016.


ANTÔNIO JOSÉ SANTANA MARTINS COMPOSITOR, CANTOR, PERFORMER, ARRANJADOR E ESCRITOR

ESCRITO POR: LUCAS AMARO VERNARECCIA MORADEI


TOM ZÉ VIDA E OBRA Antônio José Santana Martins nasceu na cidade de Irará, no sertão da Bahia, em 11 de outubro de 1936, numa família economicamente favorecida, pois seu pai, comerciante, tirou a “sorte grande” da loteria federal. Passou a infância em sua cidade, com vida cultural e musicalmente intensa para aqueles não-letrados que amavam a cultura dos avós e viviam praticando-a em termos próprios. Sua relação com seus pais era tão conturbada quanto suas ideias, exóticas para com a sociedade. Tom conta que conquistou sua mãe após crises incessantes de asmas na infância. Na escola já demonstrava intimidade com ciências humanas, em especial com a musicalidade da língua


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portuguesa. Em uma eventual aula de geografia, Tom conta que respondeu a pergunta de sua professora corretamente por que se lembrou do ritmo musical que a frase de resposta possuía e isto o livrou da palmatória, método de correção naquela época. Durante a juventude mudou-se para a capital, Salvador, para estudos ginasiais. Como qualquer rapaz, interessava-se pelas moças da capital. Relembra em graça sua timidez ao cantar serenatas para Dalva. Pela sensibilidade com a música, cursou por seis anos a graduação na Escola de Música da Universidade de Música da Bahia, depois de ter passado em primeiro lugar no vestibular. Essa escola excepcional contava com professores como Ernst Widmer, Walter Smetak e Hans Joachim Koellreutter. Após algumas experiências no mundo da música, participando do programa de calouros na TV Itapuã e no programa Escada para o Sucesso, aliou-se a Gilberto Gil, Gal Costa, Caetano Veloso, Maria Bethânia e Djalma Corrêa no espetáculo “Nós, Por Exemplo”, no Teatro Castro Alves, em 1968. No mesmo ano, em São Paulo, participa de “Arena Canta Bahia”, musical dirigido por Augusto Boal, e conclui gravação do disco “Tropicália ou Panis et Circensis”, tornando-se definidor para a construção do movimento tropicalista da época. Neste período deu aulas de música para Moraes Moreira, que viria a formar a banda Novos Baianos. Leva o primeiro lugar no IV Festival de Música Popular Brasileira, da TV Record, com a canção “São São Paulo, Meu Amor”. Grava seu primeiro disco, “Tom Zé, Grande Liquidação”, que tematiza a vida urbana brasileira em música e texto renovadores. Em 1973 lança “Todos os Olhos”, cuja ousadia, só assimilado por crítica e


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público muito tempo depois, o afastou dos meios de comunicação “mas me fez escutado pelos melhores ouvidos do País” – diz o artista. Lança o disco “Estudando o Samba” em 1976, recebido com certa perplexidade, por sua ousadia formal. Casualmente no final dos anos 80 o disco “Estudando o Samba” foi ouvido pelo multi artista David Byrne, ex-Talking Heads, que perguntou por telefone a Arto Lindsay: “- Que país é esse, que tem um artista assim e que tão poucos conhecem?” e lançou sua obra nos Estados Unidos, com total sucesso de crítica e público. De certa forma desiludido com a carreira pensava em abandonar tudo e voltar para a terra natal, mas um anônimo vendedor de discos contribuiria involuntariamente para sua volta. David Byrne, um interessado em world music que em viagem ao Brasil, em 1986, comprou o disco “Estudando o

MARTINS, Antonio José Santana. Tom Zé Vida e Obra


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Samba” de Tom, sem compromisso algum com a obra. De volta aos Estados Unidos, Byrne ficou pasmo quando ouviu o trabalho ilustre desconhecido e imediatamente entrou em contato com Arto Lindsay—músico americano que já viveu no Brasil. Conheceu então a história do movimento tropicalista e em como ele não havia se tornado popular. Em 1990, produziu a coletânea “Massive Hits - The Best of Tom Zé”, que além de recuperar o seu trabalho no Brasil, o lançou para o mundo. A compilação foi o único álbum brasileiro a figurar entre os dez discos mais importantes da década nos E.U.A. Tom passou a ser mais ouvido no Brasil e seu extraordinário desempenho no palco repercutiu no País e nas turnês europeias e americanas. Em Londres, por exemplo, no Barbican Festival, foi o sucesso de público do festival que contou com Stockhausen, Werner Herzog e Enio Morricone. E então recebeu o Prêmio de Criatividade concedido pelos compositores do festival Composer to Composer, em Telluride, EUA, 1990. Em meio a tantos acontecimentos, por ser torcedor fanático do Corinthians, escreveu música em homenagem ao jogador Neto, o Xodó da Fiel, em alusão à sua não convocação para a Seleção Brasileira que disputaria a Copa do Mundo. Compôs “Parabelo” para o Grupo Corpo, com José Miguel Wisnik em 1997. Em 1998 lançou “Com Defeito de Fabricação”, disco que fala sobre o homem do Terceiro Mundo, listado entre os dez mais importantes do ano pelo The New York Times e no mesmo ano ganhou o prêmio da APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Chamado de gênio pelos críticos musicais de publicações como “The New York Times” e “The Rolling Stone”, Tom Zé recuperou o antigo prestígio que, de certa forma, nunca teve. É tema de três documentários, premiados: “Tom Zé, ou Quem Irá Colocar


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Uma Dinamite na Cabeça do Século?”, por Carla Gallo (2000); “Fabricando Tom Zé”, por Décio Matos Júnior (2006) e “Tom Zé – Astronauta Libertado”, por Igor Iglesias, cineasta espanhol. Compôs “Santagustin” para o Grupo Corpo (2002). Ganhou o Prêmio Shell pelo conjunto da obra – 2003, é o Artista do Ano – Revista Bravo, 2006 e escreveu os livros “Tropicalista Lenta Luta” (Publifolha, 2003), “Ilha Deserta – Discos” (Publifolha – 2003), “Cidades do Brasil – Salvador” (Publifolha, 2006). PAPEL NO CONTEXTO MUSICAL BRASILEIRO A riqueza cultural dos anos 70, marcada pelo período ditadura militar e contracultura, agregado às mudanças no mercado fonográfico, alteraram a dinâmica da produção musical da época.

Performances e gestos de Tom Zé no programa Ensaio da TV Cultura em 2013 MARTINS, Antonio José Santana. Tom Zé Vida e Obra

O cantor Tom Zé, com cinco discos lançados na década, através do caráter singular de sua obra, cativou o público por conta dos festivais de música popular na televisão, que começaram no fim dos anos 1960. Aliado ao tropicalismo, movimento musical que colocou em xeque os limi-


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tes da criação na canção e questionou tanto a ditadura quanto as esquerdas que usavam a música popular nos festivais para sua luta política, ele trouxe em seu experimentalismo e radicalismo o exercício dos padrões poético-musicais da canção e as soluções inventivas que construiu nas letras e nos arranjos com inovação e criatividade. O CORPO MULTIMÍDIA DE TOM ZÉ A conduta corporal dos cantores populares distancia-se da nossa vivência cotidiana. O palco, o cenário e o aparato sonoro, constituintes de um espetáculo de grandes proporções, são elementos que conferem uma espécie de ritualidade aos gestos dos intérpretes. Tom Zé se porta corporalmente no programa “Ensaio” no momento em que interpreta algumas de suas canções. Fazer-se presente em uma situação como essa implica, antes de mais nada, uma competência, uma consciência de que o dispositivo televisivo torna capaz uma figuração específica de quem Tom pode vir a ser. Outro aspecto que diz respeito ao modo como o cantor se dá a ver e ouvir por meio da tevê é algo que diz respeito a uma espécie de gramática da linguagem corporal. Cantores em performance colocam-se em constante negociação com normas e regras de interpretação. No caso de Tom Zé, não estamos diante de um corpo dócil, subjugável a coordenadas que tendem a enrijecer suas performances. Sua gestualidade corporal apresenta-se, na maioria dos casos, como algo desrespeitoso e desmesurado, mas isso não quer dizer que não exista coerência entre suas aparições. Seu corpo, assim, parece funcionar como um instrumento em que se imprime parte de seu projeto estético: tal como este compositor coloca-se em constante debate com os modos mais institucionalizados de se fazer canção popular no Brasil, seu corpo se presta a questionar os modos mais usuais de se portar corporalmente enquanto cantor/compositor. Tal procedimento dá a impressão de que o próprio acontecimento da


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interpretação, em Tom Zé, é marcado pela abertura polissêmica do gesto corporal, pois, nesse caso, seus procedimentos, marcados pela espontaneidade, não se colocam em favor de uma estabilidade sígnica. Ao identificarmos estes aspectos presentes nas obras de Tom Zé podemos captar sua essência que transita além de seus papeis como compositor e artista popular, sua derradeira forma rebelde expelida em sua música corpórea. Tom além do tom popular em que à época cabia.

MARTINS, Antonio José Santana. Tom Zé Vida e Obra


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REFERÊNCIAS SANTANA MARTINS, ANTÔNIO JOSÉ. Biografia disponível em seu próprio site. Disponível em: http://www.tomze.com.br/biografia/. Acesso em: 04 Mai. 2016. SANTANA MARTINS, ANTÔNIO JOSÉ. Documentário Fabricando Tom Zé. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=TE7jkrfV76s. Acesso em: 04 Mai. 2016. SANTANA MARTINS, ANTÔNIO JOSÉ. Entrevista com Camilla Shinoda. Disponível em: http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/questao-de-foco/tomze-confundindo-pra-esclarecer/. Acesso em: 02 Mai. 2016. SANTANA MARTINS, ANTÔNIO JOSÉ. Material disponível no site da Tv Cultura. Disponível em: http://tvcultura.com.br/busca/?q=classicos/home/tom-ze-edit Acesso em: 02 Mai. 2016.


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ARRIGO BARNABÉ COMPOSITOR, CANTOR, PIANISTA E ATOR

ESCRITO POR: JOSYLENE FÉLIX


A MÚSICA NA MULTIMÍDIA A multimídia pode ser definida como a junção de uma mídia estática com uma mídia dinâmica, englobando dessa forma, a música e a fala humana. Os sons como forma de comunicação e transmissão de dados e sentimento, são componentes importantes para o contexto multimídia. A junção de elementos sonoros com elementos visuais é utilizada como transmissão de conhecimento, e também para transmitir sensações. No cenário musical brasileiro, em 1980, o artista Arrigo Barnabé, rompeu paradigmas utilizando em suas composições de forma sistemática, os procedimentos seriais. Essa mistura de erudito e modernismo, com letras


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ferinas baseadas na vida das metrópoles e em personagens de HQs, transformou a música popular brasileira. ARRIGO BARNABÉ Nascido em Londrina (PR) em 14 de setembro de 1951, em uma família de classe média, sendo sua mãe dona de casa e seu pai escrivão. Frequentou o colégio católico Irmãos Maristas, e foi aluno do Conservatório Musical Carlos Gomes por cinco anos, cursando piano e disciplinas teóricas. Era um adolescente curioso, que tinha desejos de ser inventor, ou em química ou em arquitetura. Fez parte de um círculo de amigos que discutia assuntos distintos como astrologia, ocultismo e música. Dentre as discussões sobre música, uma muito frequente era sobre os próximos passos da musica brasileira após o tropicalismo, principalmente sob a influência do livro de Augusto de Campos, O balanço da Bossa. Arrigo teceu uma consideração: “A Tropicália é um negócio que mexe muito com a paródia, não é um movimento propriamente musical. A loucura é a letra, toda fragmentada. (…) A gente achava, então, que o passo seguinte era mudar a própria música. (…) depois do tropicalismo, só a música atonal tinha futuro” (ARANTES, 1981, p.17). Dentro desse círculo, estava Mário Lúcio Cortes, Robinson Borba, Paulo Barnabé (seu irmão caçula) Antônio Carlos Tonelli, que posteriormente viriam a colaborar para sua obra-prima Clara Crocodilo. Aos 16 anos, mudou-se para Curitiba, onde cursou pré-vestibular, aprendendo mais sobre filosofia e se afastando ainda mais do catolicismo. Suas influências nesse período eram Voltaire, Rousseau, Kafka, Freud e Marx, e musicalmente passou a conhecer Stravinsky, Bartók, Stockhausen e Luigi Nono, o que o influenciou em primeiras composições experimentais.


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Após uma breve estadia no Rio de Janeiro, Arrigo passou a viver em São Paulo nos anos 1970, onde cursou um ano de arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Nesse período, surgiu o interesse por quadrinhos, através de uma visita ao MASP (Museu de Arte de São Paulo) levado pelo cartunista Luiz Gê, que posteriormente seria ilustrador da capa do disco de Clara e Crocodilo. A estética das HQs passou a influenciar seu trabalho a partir daí, sendo grande referência para criação de várias personagens de suas canções. Participou do Festival de Inverno de Ouro Preto, em 1971 onde teve aulas de composição com Ernst Widmer, fazendo parte da montagem da missa Orbis Factor, obra de Aylton Escobar, o que lhe marcou consideravelmente. Em 1975, ingressou no curso de música Departamento de Música da Escola de Comunicação e Artes da USP, estudando composição com Willy Correa de Oliveira e piano com Caio Pagano. Nesse período, ele já havia composto as canções de Clara Crocodilo. Em 1976, montou o conjunto Navalha, com os músicos que seriam seus parceiros na gravação de Clara Crocodilo, eram eles Antônio Carlos Tonelli (baixo-elétrico), Itamar Assumpção (voz e guitarra) e Paulo Barnabé (bateria). Não concluiu o curso de musica na USP, onde sentiu que seu estilo era desestimulado, abandonando-o em 1978. Em 1979, venceu o Festival Universitário da Canção da TV Cultura de São Paulo com a banda Sabor de Veneno, interpretando a canção Diversões Eletrônicas, iniciando diversas apresentações pelo pais. A realização de sua obra mais proeminente, Clara Crocodilo, considerada na época como um ato de rebeldia e resistência cultural, justamente por ter sido lançada no cenário independente, não foi intencionalmente


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lançada nesse contexto. O lançamento original do LP, programado para ser realizado como uma série Música Popular Brasileira Contemporânea, dedicada a novos artistas pela Polygram, foi cancelado, pois músico e gravadora não se entendiam. Dessa forma, a produção no cenário independente foi realizada entre junho e setembro de 1980, no Nosso Estúdio de São Paulo, produzido por Robinson Borba. Em 15 de novembro de 1980 o LP foi lançado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, porém só foi liberado pela censura na última semana de dezembro para vendas. Considerado pela crítica especializada o porta-voz de um movimento conhecido como Vanguarda Paulista, composto por artistas que também despontaram na época, dentre eles Tetê Espindola, Língua de Trapo e Rumo, Arrigo assumiu esse papel e declarou que o atomismo na música popular era algo que tinha que acontecer e que deveria ser organizado. Tudo isso por que suas canções enfatizam essa sonoridade de notas aleatoriamente, em um sistema de 13 notas diferentes do sistema tradicional, utilizado com sete notas. Arrigo, desenvolveu uma mistura de popular e erudito, levando a música atonal e o dodecafonismo ao universo musical brasileiro, algo que nunca havia sido realizado antes. Alcançou não só o sucesso popular, como críticas favoráveis tanto no Brasil quanto no mundo a fora. Ele também possibilitou, um outro olhar das gravadoras para o cenário independente, possibilitando a ascensão do rock brasileiro que era mais rentável e mais acessível tanto para as massas quanto para os investidores em potencial. Com seu disco Tubarões Voadores, de 1984, fundiu a música com as histórias em quadrinhos, sendo eleito como um dos melhores discos do mundo pela revista francesa Jazz Hot. Em 1985 recebeu o prêmio no Rio


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cine Festival pela música do filme “Estrela Nua”, de José Antônio Garcia e Ícaro Martins. Em 1986 APETESP deu-lhe o prêmio de melhor composição para teatro, pela música de “Santa Joana”. Também em 1986, lançou o LP Cidade Oculta, recebendo o prêmio de melhor trilha sonora no Rio cine Festival, com o filme “Cidade Oculta”, de Chico Botelho. Em 1988 , no Festival de Cinema de Brasília, ganhou o prêmio de melhor trilha sonora pelo filme “Vera”, de Sergio Toledo.

Clara - 1980

No Festival de Cinema de Curitiba, em 1988, ganhou o prêmio de melhor trilha sonora pelo filme “Lua Cheia”, de Alain Fresnot. Em 1988 foi ator, compositor e co-autor, com Hamilton Vaz Pereira, da peça “O Máximo”. Com Itamar Assumpção participou de shows por todo o Brasil, em 1991. No ano seguinte, lançou o CD “Façanhas”. Em 1995, participou do Primeiro Festival de Jazz e Música Latino-Americana, em Córdoba, Argentina.


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No Teatro Municipal, de São Paulo, apresentou sua peça “Música para Dois Pianos, Percussão, Quarteto de Cordas e Banda de Rock”. Trabalhou então com um grupo heterodoxo: um quinteto de percussão (do qual fazia parte), um quarteto de cordas de São Paulo e a Patife Band, de rock pesado, liderada por Paulo Barnabé, seu irmão. Apresentou-se, em 1996, na série Encontros Notáveis, em duo de pianos com Paulo Braga. No mesmo ano, dividiu um show com Tetê Espíndola. Suas composições são caracterizadas pelo dodecafonismo e atonalidade, em uma linha tênue entre o erudito e o contemporâneo. Escreveu quartetos de cordas e peças para a Orquestra Jazz Sinfônica de São Paulo. Em 1997, depois de quatro anos sem gravar, lançou o CD “Ed Mort”, do selo Rob Digital, trilha sonora do filme “Ed Mort”, dirigido por Alain Fresnot. Em 2001, reuniu orquestra em São Paulo para mostrar a ópera “O Homem dos Crocodilos - Um Caso Clínico em Dois Atos”, na qual mistura psicanálise com o vanguardismo musical, em parceria com o dramaturgo argentino Alberto Muñoz. No ano seguinte, mais um trabalho para cinema: a trilha de “Desmundo”, de Fresnot. Em 2004, Arrigo Barnabé lança, ao lado da cantora Tuca Fernandes e o Quinteto Delas, o CD “Luar”, uma releitura das modinhas e canções sentimentais brasileiras, a partir da linguagem da música contemporânea. Arrigo Barnabé é professor de composição e idealizador e apresentador do programa Supertônica, na rádio Cultura FM, premiado pela Associação Paulista de Críticos de Arte. Lançou “Missa in memoriam Itamar Assumpção”, uma homenagem ao seu grande amigo e parceiro.


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OBRAS Discografia • • • • • • • • •

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1980 - Clara Crocodilo 1984 - Tubarões Voadores 1986 - Cidade Oculta (trilha sonora) 1987 - Suspeito 1992 - Façanhas 1997 - Ed Mort (trilha sonora) 1998 - Gigante Negão 1999 - A Saga de Clara Crocodilo 2004 - Coletânea 25 Anos de Clara Crocodilo (inclui: Clara Crocodilo, Tubarões Voadores, Gigante Negão, A Saga de Clara Crocodilo e Uma Suíte a Quatro Mãos) 2004 - Missa In Memoriam Arthur Bispo do Rosário 2007 - Missa In Memoriam Itamar Assumpção

Filmografia • • • • • •

1981 - O Olho Mágico Do Amor 1986 - Cidade Oculta 1986 - Nem Tudo É Verdade 1987 - Anjos Da Noite 2002 - Desmundo 2012 - Luz nas Trevas

Atuação • •

A Primeira Missa ou Tristes Tropeços, Enganos e Urucum (2013) Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista (2012), Arrigo Barnabé


RAÍZES - A ARQUEOLOGIA DA MULTIMÍDIA NO BRASIL

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Luz Nas Trevas (2010) Desmundo (2003) O Corpo (1991) Anjos da Noite (1987) Cidade Oculta (1986) Nem Tudo é Verdade (1986), Orson Welles O Olho Mágico do Amor (1981)

Prêmios •

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1979 - Festival Universitário da Canção da TV Cultura de São Paulo com a banda Sabor de Veneno, interpretando a canção Diversões Eletrônicas. 1983 - Festival de Gramado. Música Original. Vencedor, Janete (1983). 1985 - Prêmio no Rio cine Festival. Música do filme “Estrela Nua”, de José Antônio Garcia e Ícaro Martins. 1986 APETESP. Melhor composição para teatro, pela música de “Santa Joana”. 1986 -Riocine Festival. Música do filme “Cidade Oculta”, de Chico Botelho. 1988 - Festival de Cinema de Brasília. Melhor trilha sonora pelo filme “Vera”, de Sergio Toledo. 1988-Festival de Cinema de Curitiba. Melhor trilha sonora pelo filme “Lua Cheia”, de Alain Fresnot.


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ENTREVISTA COM ARRIGO BARNABÉ Quando surgiu seu interesse pela música e pela inovação? Eu era interessado por música quando criança, minha mãe queria que nós estudássemos, meu irmão mais velho estudou violino, eu no piano com nove anos, tinha um primo que tocava acordeom, canções italianas, nada de especial, mas aí aprendi a ler e escrever, meu interesse começou a aumentar e estudar Bah, dimensões de bases e depois das músicas. Os festivais também me influenciaram muito, o primeiro foi aos 15 anos, que eu assisti, me lembro muito de ter visto Chico Buarque. Música erudita me influenciou também e grupos de rock aparecendo, interessantes, tudo isso despertou uma curiosidade. Festivais impactaram muito as pessoas da minha geração. Ao mesmo tempo estava acontecendo o trabalho do Beatles, que se misturava com música erudita. Abandonei a arquitetura pra fazer música.

Arrigo barnabé - Jovem

Qual foi o momento decisivo em que resolveu compor e transformar suas ideias em música?

Comecei em 72, em 73 participei de um festival em Londrina, ganhei, continuei estudando em SP e tentando fazer algo diferente, me apresentei com Itamar Assunção no festival da TV cultura com diversões eletrônicas, em 79 participei do festival da TV tupi com sabor de veneno. Deu uma ótima divulgação por que era assistido em todo o Brasil. Em 1980 montei o grupo sabor de veneno e em seguida gravei o disco independente, ajudado por um amigo, Robinson Costa. Eu usava esse sistema de atomismo de uma maneira diferente, com uma coisa rítmica muito forte. Como foi a experiência de compor influenciado pelos quadrinhos, como você decidiu incluir essa referência em suas canções?


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Meu primeiro amigo em SP o Luiz Ge escrevia quadrinhos e esse ritmo me influenciou bastante, música com crônica com narrativa. Também tem a influência de programas de rádio, programas policiais, que contavam histórias de crime, tipo Gil Gomes sabe? Gosto desse tipo de narrativa. Como funciona o seu processo criativo? Eu quero fazer o que eu quero fazer, e por acaso o que eu quero. A minha escolha é primeiro pelo o que eu quero fazer, eu entro no ônibus lotado escutando o programa de crime, e isso me influencia, e o cara com a namorada e os dois brigam e isso começa a me influenciar. As historias do cotidiano me influenciavam para criar, eu queria imaginar o que podia acontecer com aquelas pessoas. Eu tinha que romper, a minha intenção era romper, o que estava sendo feito não estava correspondendo à realidade que a gente estava vivendo.A nossa realidade era muito mais agressiva muito mais caótica. Eu tinha que fazer essa ruptura.Mas o fato de eu trabalhar com essa ruptura não significa que a musica não tenha uma ordem. Você criou uma nova forma de musicalidade no cenário brasileiro, ampliando os horizontes desse segmento, você acredita que esse estilo ainda possa se expandir? Por quê? Tem, o Kiko Dinucci , que tem a ver com o que eu faço, a banda do meu irmão a Patife Band e o Sergio Molina. Qual dos seus trabalhos você considera o mais completo e imprescindível da sua carreira? Claro Crocodilo, eu escrevi uma missa em memória de Artur Bispo do Rosário e a ópera O Homem dos Crocodilos .


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Como foi a experiência de compor para o cinema? Gostoso pelo limite pelo tema, você não sai do zero tem ritmo, é um negócio bem legal trabalhar em equipe de forma predefinida. Quais as dificuldades em compor para uma personagem pré-definida? Dificuldade pra comédia, mas depois de Ed. Mort fiquei mais tranquilo Não vejo mais problemas. Além das suas influências que já conhecemos, existe algum artista hoje que te influencie? Por quê? Acho que não, escuto pouca coisa eu acho, não tem, eu escuto bastante música erudita, anos 40, música Orlando Silva , Paulinho da Viola, não tem algo que me influencie tanto. Você acredita que alguma das suas obras tenha gerado impacto social? Por quê? A maior parte do público era universitário, mas tinha muito office boy, tinha muito universitário público de outras áreas em que se identificava. Mexia muito com a ideia do gosto das pessoas, achavam horrível e gostavam.


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REFERÊNCIAS BARNABÉ, ARRIGO. Portfólio. Disponível em : http://www.arrigobarnabe.com.br/ Acesso em: 10 de Maio de 2016. CAVAZOTTI, ANDRÉ. O serialismo e o atonalismo livre aportam na MPB: as canções do LP Clara Crocodilo de Arrigo Barnabé Belo Horizonte, 2000 Disponível em : http://musica.ufmg.br/permusi/port/numeros/01/num01_cap_01.pdf Acesso em: 10 de Maio de 2016. MPB NET. Disponível em : http://www.mpbnet.com.br/canto.brasileiro/arrigo.barnabe/ Acesso em: 10 de Maio de 2016.


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FERNANDO VELÁZQUEZ ARTISTA PLÁSTICO

ESCRITO POR: ALINE SILVA DE SOUZA


ARTE E TECNOLOGIA Fernando Velázquez, é um artista plástico contemporâneo nascido em Montevidéu em 1997 que se formou em Design de Multimídia pelo Senac em 2005 e possui Doutorado em Comunicação e Semiótica, pela PUC-SP (2009). Velázquez costuma expor seus trabalhos tanto no Brasil quanto no exterior, dentre os quais destacam-se a recente Bienal de Arte e Tecnologia Emoção Art.ficial, no instituto Itaú Cultural; a Bienal de Arte e Tecnologia WRO; o Mapping Festival (Genebra, Suiça), a 7ª Bienal do Mercosul (Porto Alegre), e o FILE, Festival Internacional de Linguagem Eletrônica. Além disso participou de diversas exposições individuais e coletivas, dentre


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as que se destacam o Pocket Film Festival que aconteceu no Centre Pompidou . O Artista foi contemplado com diversos prêmios, como o Sergio Motta de Arte e Tecnologia, em 2009 (Brasil) e, em 2008, com o Culturas (Madri, Espanha). Além disso, ministra cursos e workshops sobre arte, tecnologia e audiovisual em Universidades, Instituições Públicas e Privadas. Ele integra em seu trabalho diferentes mídias como desenho, pintura, fotografia e vídeo em diversos dispositivos em formatos digitais, as chamadas novas mídias. Ele costuma investigar, em suas obras, questões relacionadas ao cotidiano contemporâneo: privacidade, monitoramento e controle.

Mindscape. 2011 - 2012.


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Em 2014, Fernando criou projeções em mapping(técnica que consiste na projeção de vídeo em objetos ou superfícies irregulares) em um trabalho para a HP (Hewlett-Packard) chamado Projeções e Skate, juntamente com a skatista Karen Jonz. Para tanto, o artista usou com base as tecnologias desenvolvidas na série Mindscapes, outro projeto em que estava trabalhando desde 2011. Nesse sentido, ele adaptou os códigos e programações que utilizou nas apresentações ao vivo e nas instalações para reagirem conforme a passagem da skatista na pista sobre as projeções, ele também modificou as imagens levando em conta o formato do bowl (um tipo de pista de skate). Na série Mindscapes ele investiga a ideia de paisagem mental, o bowl pode ser livremente interpretado como o interior de um crânio visto do avesso, e como as imagens são criadas e modificadas em parte pelo som feito no ambiente. O artista interessante remixar esse material, tendo como objetivo mostrar como seria se estivéssemos vendo um cérebro em ação. Como o coração do projeto já existia, ele levou poucas horas para entender o espaço e dinâmica propostas pela Karen e adaptar-se a situação. Por enquanto, este projeto ainda não foi comissionado por uma empresa para divulgar o produto, mas ele diz que se aparecer outros convites, com certeza ele aceitará, pois a experiência foi desafiadora. Se houver oportunidades, futuramente ele poderá vir a pensar em uma experiência similar com Longboard, durante um downhill, ele pretende inserir um projetor no long enquanto o skatista desce ladeira abaixo, intervindo a paisagem com projeções. De todos trabalhos e artes já criados, em sua opinião, o mais complexo e elaborado foi o projeto “Você não está aqui”, realizado em parceria com


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Gisele Beiguelman para a Bienal de Arte e Tecnologia “Emoção Art.ficial” que aconteceu no Itaú Cultural em 2012. O projeto apresenta uma interface robótica, emissiva e interativa que possibilita visualizar e modificar uma base de dados com mais 5000 imagens que os autores fizeram em aproximadamente 40 cidades. O mesmo envolveu robótica, desenvolvimento de aplicativo para dispositivo móvel, base de dados online e off-line, tracking (rastreamento) de movimento com Kinect (sensor de movimentos desenvolvido para consoles de videogames- Xbox - , que dispensa o uso de controle remosto ou joystick), multiprojeção, vídeo mapping, som em quadrifonia e estrutura paramétrica. Ele diz que foi um processo longo e de muito aprendizado no qual trabalhou intensamente com um grupo de aproximadamente 10 pessoas. Em entrevista Velázquez diz que a produção de arte funciona como um processo, primeiro de autoconhecimento e depois como um lugar de construção de conhecimento sobre o mundo. Por isso ele não consegue identificar um projeto preferido, pois projeto terminado é coisa do passado e logo ele já está pensando no próximo. Por outro lado percebe que uma das atividades que mais lhe traz satisfação são os processos realizados em tempo real e ao vivo, como as performances audiovisuais. Ele diz que o ato de encarar o público e dividir o ato criativo em toda a sua plenitude, com sua carga de beleza e sedução também lhe dá um ar de instabilidade e erro, juntamente com um saudável frio na barriga. Durante sua adolescência e até seus 20 anos, ele estudou profundamente a história da arte desde a perspectiva da pintura, escultura e até a arquitetura, disciplinas ao qual estudou formalmente quando morava no Uruguai. A partir do ano 2000, já com 30 anos de idade e morando no Brasil, ele começou a se interessar pelas artes tecnológicas e se dedicou a estudar a história da fotografia, vídeo e das novas tecnologias. Mais do que referências pontais, ele acredita que sua produção é permeada por um conjunto diverso de referências que o possibilitam pensar sim-


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bolicamente e formalmente a imagem, o espaço e o som. Por outro lado ele acredita que sua produção não seria a mesma sem a convivência e aprendizado com artistas como Sandra Cinto, Albano Afonso, Lucia Leão.

Você não está aqui. Giselle Beiguelman e Fernando Velázquez. 2012.

Estudar Design Multimídia foi fundamental para sua formação como artista. Na época, havia uma efervescência em torno das novas tecnologias, eram tempos onde reflexão e produção estavam em perfeita sincronia em escala global e aconteciam festivais, simpósios, exposições e todo tipo de eventos frequentados por artistas e pensadores locais e internacionais. Para ele dava até a impressão que estava escrevendo a história em tempo real. Durante o curso ele conheceu pessoas que modificaram sua visão de mundo como a Prof. Lucia Leão, a Prof. Rita Alves, a Prof. Denise Bertuzzi de Sant’Anna, o Prof. Ernesto Boccara, dentre outros. Em uma entrevista com a Embratel em 2011, ele destaca a importância da interatividade e como ela pode transformar salas de aula em ambientes mais práticos, e atualmente ele acredita que nós seres humanos, enxergamos a tecnologia como fetiche, não atravessamos a fase do deslumbre.


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Imersão, interação, agenciamento etc, são todos conceitos, por vezes sobre dimensionados na hora de resolver problemas e estabelecer leituras do mundo. Esta fase será superada no momento que os dispositivos tecnológicos e os comportamentos que emergem do seu uso estejam naturalmente integrados ao cotidiano da sociedade. Como ainda a “vida real” é a arena de teste de toda novidade e somos permanentemente surpreendidos por dispositivos tecnológicos que prometem revolucionar a nossa vida, nos esquecemos que muitas vezes de que comportamentos elementares e analógicos dão conta das nossas necessidades individuais e coletivas. Neste sentido, Fernando acredita que devemos cultivar uma atitude crítica, alerta e consciente sobre o impacto das nossas ideais e ações para assim contornar as armadilhas do positivismo. Para os estudantes, Fernando aconselha que criem repertório com base na história da arte, do design, da tecnologia, da comunicação, do comportamento etc. Pois quanto mais amplo o nosso conhecimento sobre o mundo, as pessoas e as coisas, mais aptos estamos para improvisar com propriedade, não que isto pareça um paradoxo. Caso queiram conhecer suas obras e seu currículo, podem acessar através do link: http://www.blogart.com/


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REFERÊNCIAS VELÁZQUEZ, FERNANDO. Portfólio. Disponível em: http://www.blogart.com/ Acesso em: 02 de Abril de 2016. VELÁZQUEZ, FERNANDO. Sobre. Disponível em: http://www.redbullstation.com.br/tag/fernando-velazquez/. Acesso em: 26 de Abril de 2016.


GILBERTTO PRADO ARTISTA MULTIMÍDIA E PROFESSOR DE PÓS GRADUAÇÃO DE ARTES PLÁSTICASDA ECA - USP

ESCRITO POR: LETICIA ROCHA RODRIGUES


GILBERTTO PRADO: VIDA E OBRA Gilbertto Prado (1954- ) é artista multimídia e professor do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais ECA/ USP. Além disto, coordena o Grupo Poéticas Digitais e trabalha com arte em rede e instalações interativas e trabalha com Arte em Rede e Instalações Interativas. Realizou e participou de inúmeras exposições no Brasil e no exterior, recebeu o 9º Prix Möbius International des Multimédias, Beijin, 2001; Prêmio Rumos, 2000, Transmídia, 2002 - Itaú Cultural e o 6º Prêmio Sergio Motta de Arte e Tecnologia, 2006, entre outros. Foi Professor do Instituto de Artes da Unicamp, Profes-


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sor Convidado da Universidade Paris 8 e realizou pós-doutoramento na Faculdade de Belas Artes da Universidade Politécnica de Valencia. O autor iniciou seus estudos na década de 1970 na Unicamp, onde estudou Engenharia e Artes plásticas. Por volta do mesmo período, começou sua carreira artística com trabalhos ligados ao movimento de arte postal (mail art), sendo um dos artistas presentes na seção dedicada a esse movimento na XVI Bienal Internacional de Arte de São Paulo (1981). TRAJETÓRIA ARTÍSTICA E ACADÊMICA Explorando os aspectos da arte em rede, passou a empregar tecnologias de comunicação a distância em suas peças, participando e organizando eventos de fax art, como o Faxarte I (março de 1989), Faxarte II (junho de 1989) e Connect (1991).

PRADO, GILBERTTO. Projeto Moone: La face cachée de la lune (1992)


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Ainda em 1989 passou a integrar o grupo Art-Réseaux, onde participou de diversos projetos, por exemplo, o City Portraits (1990) concebido e dirigido por Karen O’ Rourke, com imagens realizadas pelo grupo e seus correspondentes de nove cidades europeias e americanas e Mutations de l’image (1994) . Em 1992 participou da exposição Machines à Communiquer - l’Atelier des Réseaux, com o projeto Moone: La face cachée de la lune, no qual participantes em locais distintos (Electronic Café de Paris, França e o de Kassel, Alemanha) construíam imagens em uma tela partilhada conectada via rede. Em fevereiro de 1994 defendeu sua tese de doutorado, Expériences artistiques d’échange d’images dans les réseaux télématiques – La lingne lune imaginaire, na Universidade de Paris I, Panthéon Sorbonne, sob a orientação de Anne-Marie Duget. Nesse trabalho Prado buscou refletir acerca da exploração e dos modos de operação nas redes artísticas em meio às tecnologias de comunicação (principalmente o fax e computador) como espaços de possíveis trocas culturais. A partir de 1995, desenvolveu o projeto wAwRwT no Laboratório Paulo de Laurentiz no Instituto de Artes da Unicamp, onde foi professor entre 1995 e 2001. Com a intenção de refletir sobre as poéticas tecnológicas, privilegiou a dimensão artístico-telemática e a realização de trabalhos artísticos em novos meios. Em 1997 participa da exposição Mediações, no Espaço Cultural Itaú, em São Paulo, com a instalação 9/4 Fragmentos de Azul. Em 1998 participou da mostra de Web Arte da XXIV Bienal de São Paulo (1998), com a web-instalação Depois do Turismo vem o Colunismo, que também fez parte da exposição City Canibal no Paço das Artes em São Paulo. Em 2000, apresentou a obra Desertesejo, desenvolvida no Programa Ru-


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mos Novas Mídias do Itaú Cultural. O projeto, ambiente virtual interativo multiusuário construído em VRML, permitia a presença simultânea de até 50 participantes. Por essa mesma instituição publicou em 2003 o livro Arte telemática: dos intercâmbios pontuais aos ambientes virtuais PRADO, GILBERTTO. Desertejo (2000) multiusuários [3], em que traçou um panorama da arte em rede desde os anos 1970, introduziu as técnicas e refletiu sobre as possibilidades poéticas dos ambientes virtuais. Em 2004, em parceria com Arlindo Machado e Jeffrey Shaw, foi curador da exposição Emoção Art.ficial II: Divergências tecnológicas, também no Itaú Cultural. Desde 2002 coordena o Grupo Poéticas Digitais (ECA-USP), com o qual desenvolveu diversos projetos como: Acaso 30 (2005), Cozinheiro das Almas (2006), Amoreiras (2010), Encontros (2012), Mirante 50 (2014), Caixa dos Horizontes Possíveis (2014), entre outros. Em entrevista exclusiva à aluna do 4º Semestre do curso de Tecnologia em Produção Multimídia do Senac, Leticia Rocha Rodrigues, Gilbertto Prado falou um pouco sobre seus principais trabalhos e suas viagens pelo mundo. L. Rodrigues - Como você enxerga hoje o cenário da arte no Brasil? O que destaca como positivo, em nossa rica cultura, e o que ainda pode ser melhorado, valorizado? G. Prado - Com a chegada de todas essas novas tecnologias, inclusive a internet, houve uma mudança radical em todo mundo, e essa mudança se vê também no campo das artes. A internet ficou acessível a mais ou


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menos em meados de 90 e 94. Então sem que percebamos, o mundo sofre uma transformação muito grande, porque querendo ou não, nós sempre tivemos acesso aos dados por meio de outros meios de comunicação (rádio, televisão etc.), mas com a internet essa intervenção se dá de forma mais direta, as pessoas tem uma capacidade mais direta de divulgar seus dados, seus trabalhos, e isto de uma forma ou de outra fez com que houvesse uma explosão enorme de acessos e inclusões. Na minha época, as nossas referências eram os livros, basicamente minhas referências eram as mesmas dos meus pais, dos meus tios, primos e assim por diante. Não que esse meio de referência não fosse (e não continuem sendo importantes) importante, só que é uma dinâmica diferente comparada à rede atual.

PRADO, GILBERTTO. Obras.

Em relação as produções artísticas, se você não estivesse no mesmo “mainstream”, ou seja na corrente principal, em uma “Bienal”, em outros casos quando se ia para outro país em alguma exposição e na volta havia o compartilhamento da informação “Olha, fui em tal exposição etc.”, se


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não fossem por esses meios não havia acesso a informações. O podiamos ver de determinadas produções eram extremamente limitados, passavam por muitos filtros antes de chegar até alguém, e muitas vezes, se o artista era muito experimental, esta produção ficaria perdida por muitos anos até que alguém, ou algumas pessoas pudessem recuperar e compartilhar essa produção. Mas com a internet, acontece essa revolução, porque ela faz com que as produções sejam acessadas por muitas pessoas de diversos lugares do mundo, basicamente você faz o seu trabalho e o coloca em rede, sem que ele precise passar por vários filtros. E dando a possibilidade de expor o seu trabalho, é o mesmo que dar vida a ele, o que não se vê e o que não se tem acesso, passa a ser possível, visto, e foi a internet que trouxe essa potencialidade. Além disto, não somente acessar o trabalho dessas pessoas, a internet trouxe a possibilidade de você se conectar a essas pessoas, hoje é muito fácil entrar em contato com um artista, aqueles que estão vivos (risos), e com isto estar na conexão de pessoas, o trabalho faz com que o mundo passe a ser recolocado e passa ser um mundo partilhado. L. Rodrigues - Você fez doutorado em Paris, local onde se respira arte. Como e de que forma isso contribuiu para a sua bagagem como artista? Acha que foi fundamental para abrir horizontes? G. Prado – Com certeza foi fundamental para abrir meus horizontes. Paris é uma cidade que eu adoro, assim como eu adoro São Paulo (risos). Adoro viajar, mas falando do fato de você sair do ambiente que você está habituado, viaja para outro país e se sentir estrangeiro, a questão do olhar do outro, e ai o fato de você sair do seu país te dá a possibilidade de olhar o mundo com um outro ângulo. Mudar o nosso umbigo de lugar é


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extremamente importante para que possamos nos conhecer e vermos o outro de maneira diferenciada, sem perder a própria identidade, acumulando conhecimentos e trazendo novos elementos pra sua arte. Durante dois anos e meio pelo mundo a fora, não tinha roteiro, não tinha o amanhã, viajei a América Latina inteira e essa foi a primeira vez que sai do Brasil. Então essa relação de você dormir num país, acordar em outro, mudar a cultura, idioma diferente, pessoas diferentes, foi uma época de grandes descobertas. Está relação de sentir-se estrangeiro, de não ter raiz e não estar preocupado para onde está indo, ou onde irá acordar, te deixa mais poroso ao mundo e te deixa perceber coisas no mundo que em outro olhar, você não perceberia. Você tem que se abrir para o mundo, tem que se dar ao prazer da viagem. A arte é isso, é você abrir os seus poros, é você se dar ao prazer dessa grande viagem, é o prazer de você não saber o próximo passo, de você entregar o seu passo ao outro, embora você esteja caminhando. E quando fui para a França estudar Ciência e Doutorado, eu já tinha essa vivência estrangeira bastante intensa, e de alguma maneira isso marcou muito o meu trabalho, o meu trabalho é exclusivamente marcado por essas viagens e experiências. Quando você viaja, você está descristalizando, está conhecendo, absorvendo, explorando... E quando você volta, você cristaliza, reorganiza sem perder a sua própria identidade e sempre experienciando esses novos mundos. L. Rodrigues - Sua arte pode ser apontada como uma “arte tecnológica”. Acha que isso contribui na hora de dialogar com o mundo de hoje e a “audiência” atual? Acha que consegue conversar com todos os públicos através dela?


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G. Prado – Minha arte é tecnológica, mas eu diria que hoje ela é muito mais hibrida, ela vai sofrendo mutações, um exemplo, tem gente que pega um campo e senta nele e explora, explora, explora. Já eu, gosto de caminhar, sou andante, gosto de andar, de subir ou descer montanhas. Então as minhas paisagens, elas são multáveis, assim como a minha arte, e isto é uma escolha que eu fiz. Hoje em dia o meu trabalho tem tecnologia sim, até porque ela está presente no mundo, e como eu disse, ela é hibrida, pois o meu trabalho tem uma ligação muito forte com a natureza também. Então tanto quanto a tecnologia, a natureza que me circunda, também é fundamental para o meu trabalho. Eu vivo aqui, meu mundo é isso, é com ele que eu converso e esses elementos fazem parte da minha história. L.Rodrigues - Você realizou e participou de exposições no Brasil e no exterior e recebeu prêmios importantes tais como: • •

Prêmio 9º Prix Möbius International des Multimédias (2001); Prêmio Programa Transmídia - Categoria Publicação, Itaú Cultural (2002). Entre outros. Por quais deles você tem um carinho especial? G. Prado – Acho que todos eles são especiais, o prêmio 9º Prix Möbius International des Multimédias (Bejin - 2001), foi um prêmio extremamente relevante pra mim. E esta experiência é justamente você poder mostrar um trabalho lá fora e ser visto por outras pessoas. O Evento do prêmio 9º Prix Möbius International des Multimédias era organizado por Franceses e Chineses, reunia tecnologias e trabalhos extremamente complexos, com pessoas que tinham um conhecimento muito elevado, e de no meio de todos esses trabalhos, o meu que reunia Tecnologia e Natureza, e o que levava todo o encantamento, e não era


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a tecnologia a questão, mas como você consegue extrair poesia disso, trazer essa relação de maneira poética. Os prêmios do Itaú Cultural são extremamente importantes neste campo e da mesma forma, o prêmio Fomento à Produção - VI Prêmio Sergio Motta de Arte e Tecnologia (2005), porque eles souberam valorizar uma produção nacional e tiraram com o que estava acontecendo com o mundo inteiro. Isto foram marcos importantes para a arte brasileira, porém no meu ponto de vista, a arte brasileira ainda não foi valorizada o quando deveria e/ou poderia ser, porém, esses prêmios, essas exposições, eventos, congressos, encontros possibilitaram a realização de muitos trabalhos e de muito diálogo.

REFERÊNCIAS PRADO, GILBERTTO. Disponível em: http://www.gilberttoprado.net/gilberttoprado/index.html. Acesso em: 25 Mai. 2016.


GISELLE BEIGUELMAN ARTISTA DE MÍDIA E PROFESSORA DA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (FAU-USP)

ESCRITO POR: VAGNER FERREIRA SANTOS


MULTIMÍDIA É ARTE Giselle Beiguelman veio ao mundo em 1962, na cidade de São Paulo, onde cresceu e se formou uma das grandes referências à arte digital no Brasil. Graduou-se em História pela FFLCH da Universidade de São Paulo (USP) em 1984, e após alguns anos, concluiu o doutorado com a tese que virou livro, com tema de “A República de Hemingway: Por Quem os Sinos Dobram” em 1991, também pela Universidade de São Paulo. Atualmente dedica-se a pesquisas na área de preservação da arte digital, do patrimônio imaterial e do design de interface. Seu trabalho inclui intervenções em espaços públicos, projetos em rede e aplicações para dispositivos móveis, exibidos internacionalmente nos principais museus de arte e mídia, centros de pesquisa e espa-


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ços de arte contemporânea. Com essa sólida formação em humanidades, Giselle trabalha com criação e desenvolvimento de aplicações digitais desde 1994, por sinal, uma das pioneiras nessa área. Na década de 1990, integrou as equipes de implantação dos portais UOL e BOL e realizou pesquisa como bolsista da prestigiosa Fundação Vitae, com projeto na área de literatura e novas mídias. Esse projeto resultou em um de seus premiados trabalhos, “O livro depois de livro”. Trabalhou por dez anos, como pesquisadora, no extinto Departamento de Patrimônio Histórico da Eletropaulo, de 1985 a 1995. Remontam a essa época os primeiros estudos sobre os impactos da tecnologia no imaginário e nas formas de sociabilidade urbana. Em paralelo, Giselle dedicou-se às relaBEIGUELMAN, GISELLE. desvirtual.com ções entre comunicação de massas e a criação artística, que, posteriormente, no fim dos anos 1990, desembocaram em projetos que operam nas intersecções entre arte, comunicação e espaços urbanos e informacionais. Isso se refletiu em sua tese de doutorado – que abordava a relação entre literatura e comunicação de massas na obra antifascista de Ernest Hemingway, durante a Guerra Civil Espanhola – e em uma série de artigos, apresentações em congressos e em livros publicados entre 1985 e 2000, que discutiam as relações entre tecnologia e criação cultural. Nesse período teve como produções significativas e relacionadas a essas reflexões do início de sua vida profissional, por exemplo, os ensaios “Uma Cidade em Guerra” e “Acidentes de Bonde em São Paulo ” (1900-1905), publicados, respectivamente, nos Cadernos de História & Energia (nº 4, 1987, p. 76-89) e na Revista Memória (nº 19, 1993, p. 69-73). O primeiro, “Uma Cidade em


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Guerra”, explorava o cotidiano da cidade de São Paulo durante a Revolução de 1924. O outro, “Acidentes de Bonde em São Paulo”, discutia a historicidade da percepção do fenômeno da velocidade e o impacto da tecnologia no cotidiano paulistano no início do século 20.

Esse e outros projetos artísticos de sua autoria, acompanhados sempre de sólida pesquisa teórica, vieram a lhe proporcionar participações em numerosos eventos acadêmicos e exposições de arte e cultura digital, no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa. Com exposições como: • • • • •

Net_Condition, no Zentrum für Kunst und Medientechnologie (ZKM), Karlsruhe (1999); Núcleo Net Art Brasil da 25ª Bienal de São Paulo (2002); El final del eclipse (Fundación Telefonica, Madri e América Latina, 2001-03); Algorithmic Revolution (ZKM, Karlsruhe, 2004-08); Arte.mov (Galeria da Vivo, São Paulo, 2012); NETescópio, arquivo de web arte do Museu Extremeño e Ibero-americano de Arte Contemporáneo (MEIAC), em Badajoz, Espanha.

Como docente, entre 2001 e 2011, trabalhou no programa de pós-graduação em comunicação e semiótica da PUC-SP. Desde 2011, ensina história da arte e crítica do design de interface na Faculdade de Arquitetura da USP. Orientadora de uma nova geração de críticos e artistas dedicados à tecnologia e à cultura digital, é autora e organizadora de diversos livros sobre o tema, com destaque para Link-se (2005), O livro depois do livro (2005), Nomadismos tecnológicos (com Jorge La Ferla, 2011) e _HTTPpix _HTTPvideo: Criação e crítica nas redes de imagens (2011). O enfoque principal são estudos sobre o estatuto da memória no século 21 e às


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estéticas contemporâneas da memória, estratégias de conservação e preservação de arte digital e metodologias de organização da informação relacionadas ao design de interface. EXPOSIÇÕES ARTÍSTICAS Memória da Amnésia busca compreender como as políticas culturais e de patrimônio histórico definem o que são obras de arte pública e estabelecem suas relações com a memória urbana. O projeto aborda a memória pelo prisma do esquecimento, focalizando a mudança de monumentos de lugar e o “desterro” de monumentos em depósitos, duas questões recorrentes da história urbana de São Paulo. A exposição, fruto de um ano de pesquisa, é resultado de uma intervenção BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - urbana inédita que envolveu a higieMemória da Amnésia. nização e o transporte de estátuas do depósito da Secretaria Municipal de Cultura no Canindé para o Arquivo Histórico de São Paulo e um mapeamento dos mais de 60 monumentos nômades de São Paulo. FOTOGRAFIA E ARTE Cidades espelhadas põe em circulação também estratégias de programação que confundem os limites entre imagem estática e em movimento, cada vez mais recorrentes. São embates com a paisagem urbana, que seguem uma lógica quase “piranesiana”, buscando ocultar qualquer referência temporal e espacial precisa, suprimindo as oposições entre perto e longe de seus horizontes de enquadramento. Ao mesmo tempo, todas essas fotos, talvez pelo seu contexto de criação e produção, buscam resguardar, um princípio de ruí-


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do particular a cada uma das situações urbanas que retrataram, por meio de seu processo de manipulação e edição em aplicativos distintos. - Diz giselle em seu blog (http://www.desvirtual.com) ARTE DIGITAL O projeto intitulado “<Content=No Cache>” documenta a relação entre leitores da web e mensagens de erros. Essas mensagens são esteticamente reformuladas e exibidas em novas telas. Ao fazer isso, o site cria um contexto diferente para eles e inverte a relação entre o que se vê e o que é lido. Em poucas palavras, <Content = Sem Cache> funciona como se seria possível operar nos limites entre leitura e visão, a fim de explorar o que é suposto ser uma alfabetização cibernética.

BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - Content = No Cache.

INTERVENÇÕES URBANAS Notadamente voltada para intervenções no espaço urbano, suas obras


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contam com mídias locativas, dispositivos móveis, internet e redes sociais. Interrogando as zonas de contato dessas vertentes artísticas com a produção arquitetônica e do design contemporâneo, visando fornecer subsídios para uma reflexão sobre formatos de intervenção artística que operam nos fluxos e nas redes e não em locais específicos, permitindo novas perspectivas críticas de ação no espaço público, incluindo-se aí os territórios informacionais das redes de comunicação. Destaque especial será dado às intervenções artísticas mediadas por celulares na medida em que esses dispositivos complexos e cada vez mais populares, abrem possibilidades inéditas de fomento ao consumo, ao controle e ao uso crítico e criativo das mídias existentes, e apontam para diferentes concepções e tendências políticas da ecologia midiática atual. O LIVRO DEPOIS DO LIVRO O Livro depois do Livro é um ensaio sobre literatura, leitura e mídia no contexto da Internet. Tem como foco narrativas não-lineares, trabalhos que conferem à linguagem de programação conteúdos textuais e estéticos e criações que discutem e problematizam a condição do livro e do leitor. O site gira em torno de uma estante, cujas prateleiras acomodam sites de ciberliteratura e web arte, são interceptadas por intervalos da leitura. São “ páginas vazias “, que se desvanecem, indo do cinza ao branco, e impedem o retorno à estante pelos recursos do browser. É preciso apelar à barra de ferramentas do site, a fim de mover-se entre seus livros a áreas e zonas da fricção. Não somente cada volta à estante implica em um novo itinerário de leitura, mas toda a seleção significa correr o risco de mudar o trajeto, perder o ponto de partida e redirecionar da leitura. O avanço para um trabalho selecionado faz o leitor sair do site. Interessante paradoxo: Aqui, no espaço cuja a substância é a memória, o que prevalece é a arquitetura do esquecimento. São imagens que exibem textos e enfrentam a estranha passagem impos-


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ta pela web. No “verso” da tela, no código fonte, uma situação se define: a Internet não passa de um grande texto. Na frente, na superfície da tela, o texto se revela como imagem. Esse estranhamento introduz dimensões estéticas que vão além do horizonte técnico da multimídia.

BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - O livro depois do livro.


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REFERÊNCIAS BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual. Disponível em:http://www.desvirtual.com/. Acesso em: 20 Abr. 2016. BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - Memória da Amnésia. Disponível em:http://www.desvirtual.com/projects/memoria-da-amneesia/. Acesso em: 20 Abr. 2016. BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - Content = No Cache. Disponível em:http://www.desvirtual.com/projects/content-no-cache/. Acesso em: 20 Abr. 2016. BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - QR-Comms – Urban Scale. Disponível em:http://www.desvirtual.com/projects/qr-comms- urban-scale/. Acesso em: 05 de Maio de 2016. BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - Cidades espelhadas. Disponível em:http://www.desvirtual.com/projects/espelhados-mirrored/. Acesso em: 26 Abr. 2016. BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - O livro depois do livro. Disponível em: http://desvirtual.com/thebook/. Acesso em: 10 de Maio de 2016. BEIGUELMAN, GISELLE. Desvirtual - Sobre. Disponível em:http://www.desvirtual.com/bio/. Acesso em: 27 Abr. 2016.


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GUTO REQUENA ARTISTA MULTIMÍDIA

ESCRITO POR: LETÍCIA EPIFÂNIO


O DESAFIO DE AJUDAR NA TRANSFORMAÇÃO DA SOCIEDADE ATRAVÉS DA ARQUITETURA COM NOVAS MÍDIAS Paulistano, Guto Requena veio de Sorocaba. Nasceu em novembro de 1979 e tem grandes sonhos a serem realizados na sociedade. Mestre em arquitetura, ele conseguiu seu espaço esbanjando criatividade e bom humor através da tecnologia em novas mídias. Até 2007 concentrado na área acadêmica, realizando pesquisas e muito interessado em saber como as novas tecnologias estão transformando a maneira de


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se comunicar e a de fazer arquitetura. Hoje em dia ele tem um estúdio de nome próprio e associado a mais um arquiteto. Seus projetos são de maioria colaborativa. A cada caso, ele busca ingressar novos artistas, arquitetos e escritórios, conseguindo, assim, uma equipe multidisciplinar, chegando sempre a resultados diferentes e inovadores. O trabalho dele, através do Estúdio Guto Requena, é com a arquitetura, design de interiores e produtos imobiliário. Nos últimos projetos, o foco da casa tem ganhado espaço para a experimentação interativa. Um dos maiores interesses do Guto é entender como o universo digital adiciona novas narrativas poéticas nos projetos ou espaços. 10 anos de sua vida foram dedicados a estes estudos. Afinal, ele é um migrante da nova era. Nasceu em período analógico e hoje vive na era digital. Com convicção, ele afirma que falar de internet e rede social, é falar de arquitetura. SUA VISÃO DE TRABALHO Para Guto, arquitetura é falar do homem; para projetar espaço, primeiro é necessário olhar para o homem. Durante as pesquisas na época de sua formação, ele até passou a estudar antropologia, artes e comunicação. Para ele, era fundamental entender as transformações que estavam acontecendo no homem com o impacto das novas tecnologias. Com essas percepções, ele defende, é possível você enxergar a arquitetura.


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O ARQUITETO E A SOCIEDADE O diferencial do arquiteto para a sociedade é a humildade e a capacidade de entender e mostrar ao mundo que ele pode ser parte da mudança e transformação, e não o pilar fundamental. O Guto aponta que na formação de arquiteto é ensinado apenas o básico sobre como ser sustentável. O que, no mundo em que vivemos, devia ser o guia para projetos e espaços de profissionais na área. Retratando a importância de ser um arquiteto para a sociedade; não para si. DE DENTRO PARA FORA Para Guto, a inovação e experimentação é como um estilo de vida. Criar um espaço sustentável não te torna um. Para ele, é importante acreditar no que faz e fala. Seu Estúdio, localizado em São Paulo, permite – a todo tempo – novidades, experimentos e diversão. O processo importa muito mais do que a estética do ambiente. Quem trabalha lá, pode até levar seu cachorro. O ambiente em que criamos e passamos a maior parte do nosso tempo – acordados – deve ser agradável e sincero. A criatividade, para acontecer, precisa ser exercitada e estimulada. Não funciona na pressão. Para uma obra ser sustentável, primeiramente sua vida precisa ter essa característica. É ser, para depois fazer. MAIS CRIATIVIDADE, MENOS MONETARIZAÇÃO Através de sensores, arduínos e outras tecnologias, Guto e sua equipe buscam mais criatividade, com pouco dinheiro. O desafio é influenciar o país que em muitas áreas é fechado para novas tecnologias, a investir e aceitar transformações e investimentos.


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BRASILIDADE O que é ser brasileiro num contexto global? O país, inserido na América Latina, tende a buscar referência lá fora, no estrangeiro, estranho. O Guto busca trazer a identidade brasileira. Há materiais, formas, programas, costumes, culturas características. Como falar de brasilidade hoje? É importante inovar raízes e enraizar princípios dentro de si. #TUITERATURA São Paulo, 2013

Projetar o ambiente para uma exposição com o tema #Tuiteratura num espaço híbrido, aliando as realidades concreta e virtual. A necessidade de desmaterialização do espaço construído se fez inevitável. A concepção da cenografia parte de uma abordagem em que as pessoas, literatura e tempo se unem em um gesto único e forte, criando uma


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experiência multissensorial aos visitantes. O conteúdo é apresentado no e através do próprio corpo, trazendo o significado do indivíduo ativo e demonstrando que o fazer literário, independente de seu ambiente, só é possível através da interação e do próprio homem. Som, luz, letras, corpo e imagem transmitem e recebem conteúdo como um amálgama gerador da #Tuiteratura numa tela de 16 metros por 3 de altura, transformando o espaço numa caverna digital imersiva e interativa. EU ESTOU Misto de mobiliário urbano e projeto de visualização de dados, a instalação convida o participante a sentar-se em um banco, tirar uma foto de si mesmo e escolher dentre seis emoções aquela que sente no momento: amor, alegria, surpresa, raiva, medo ou tristeza, conforme definição do psicólogo Dr. Phillip Shaver sobre o grupo de seis emoções básicas do homem. Cada uma é representada por uma cor, que filtra a foto no momento em que ela aparece na Galeria de Arte Digital. A imagem se dilui em um gráfico que permite comparar quais emoções predominam individual e socialmente. As imagens são exibidas na fachada principal do prédio da FIESP, localizado na Avenida Paulista - São Paulo, um dos edifícios de maior expressão arquitetônica dos anos 80 e obra-prima do arquiteto Rino Levi. HOT-HOT CLUBE Localizado no centro de São Paulo, o charmoso edifício de dois andares estava em completo abandono há cerca de duas décadas e cumpria com perfeição às inúmeras exigências para abrigar o projeto da Hot Hot. A fachada do clube não recebeu nenhuma intervenção, valorizando a própria ação do tempo no edifício, seu aspecto deteriorado e grafites. Um túnel de luz de 20 metros de comprimento faz a ligação entre o mundo exterior


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e o universo Hot Hot.

A iluminação se faz através de imensas placas de LED, cujo desenho desdobra-se por todo o teto e invade a área da escada e do lounge no pavimento superior, como um organismo vivo. Funde-se neste ambiente, alta tecnologia e paredes, vigas e tetos descascados, enfatizando a proposta do projeto. O projeto apresenta o universo libidinoso e sensorial da Hot Hot, numa experiência singular aos amantes da música eletrônica. BAR - STELLA ARTOIS Concebida por Guto Requena e criada coletivamente com os artistas Rita Wu, Dimitre Lima, Luka Brajovic e com projeção mapeada de Eduzal, a obra transforma o ambiente num espaço híbrido, um imenso observatório de emoções. Essa projeção mapeada (de 30m X 10m) apresenta graficamente a coleta em tempo real feita na internet (Twitter e Instagram) de


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hashtags de emoções postadas em português. É possível visualizar quais emoções as pessoas postam, o que falam e suas imagens. Uma música generativa (feita pelo computador, que nunca terá fim) é criada também em tempo real como resposta à essas hashtags. Um grupo de 6 emoções básicas do homem, conforme definição do Psicólogo Dr. Phillip Shaver (2001), são visualizadas na projeção: #AMOR #ALEGRIA #SURPRESA #RAIVA #MEDO #TRISTEZA Os visitantes são convidados a beber uma cerveja e contemplar essa obra com comportamento visual e sonoro gerados em tempo real pelas emoções das pessoas na internet. Cada post orbita em volta da emoção correspondente. Aquela mais postada cresce visualmente na parede, permitindo entender qual emoção predomina no momento e relacioná-la com fatos políticos, históricos e culturais do nosso dia. Por exemplo, estaríamos postando agora mais #RAIVA? Teria esse dado alguma relação com uma grande manifestação contra o atual governo? Ou #AMOR aparece mais hoje por ser dia dos namorados? Estamos com mais #MEDO devido uma notícia de falta de água no país? Ou a #ALEGRIA predomina por algum motivo especial? Encontra-se no espaço ainda, um sensor que permite que um visitante o toque para coletar seu batimento cardíaco, impactando diretamente na visualização e no comportamento da obra. Assim o público contribui postando hashtags sobre seu estado emocional ou liberando dados vitais produzidos pelo seu corpo. Este projeto procura transcender questões de cunho meramente estético e convida as pessoas para uma experiência de imersão áudio visual, numa narrativa que reflete seus próprios comportamentos. Estamos todos conectados, somos todos feitos da mesma matéria. Todos somos um. O projeto para o Bar Interativo do Estudio Guto Requena apre-


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senta uma reflexão sobre o futuro do design, que deve cada vez mais se pautar em emoções, redes, narrativas e memória. O Design está em crise, assim como todas as disciplinas que estimulam o consumo. O mundo não precisa de mais uma cadeira. Estabelecer uma relação afetiva entre a pessoa e o objeto estimula um ciclo de vida mais longo, o que pode ser chamado de sustentabilidade afetiva. Chega de celebrar o novo. O bom design conta uma boa história. Sejamos brasileiros, improvisados, autênticos, bem-humorados. Sejamos nós mesmos, seja lá o que isso signifique. O futuro dos espaços é híbrido e interativo, uma mescla entre o concreto e o digital, o físico e o virtual ambos reais. Somos todos ciborgues agora, fruto da mistura entre o orgânico e o tecnológico. As tecnologias digitais têm como papel fundamental nos tornar mais unidos, participativos e mais humanos. Estamos todos conectados.


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REFERÊNCIAS GUTO REQUENA. About, Works Videos, News, Estúdio. Disponível em: http://www.gutorequena.com.br/site/. Acesso em 25 de maio de 2016.


JOSÉ ROBERTO AGUILAR ARTISTA MULTIMÍDIA

ESCRITO POR: IDEVAR CLARO FILHO


UM CAFEZINHO COM AGUILAR Aguilar, José Roberto, nasceu em São Paulo em 1941. É artista plástico, performer, videomaker, escritor, band-leader da Banda Performática, compositor, pioneiro na videoarte, enfim, um multimídia. Integrou o movimento performático-literário Kaos, em 1956, com Jorge Mautner e José Agripino de Paula, manifestação vanguardista que incluía sessões de poesia, literatura e performance. Em 1961 realizou sua primeira exposição e em 1963 foi selecionado para a Bienal Internacional de São Paulo. Em 1965, junto com outros artistas nacionais e internacionais, participou da famosa amostra OPINIÃO-65, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Em 1967


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recebeu o Prêmio Itamaraty na Bienal de São Paulo, e, volta a expor ali em 1969. Durante a agitada década de 60 centralizou sua atuação em seu ateliê na Rua Frei Caneca, frequentado por expoentes da renovação política e cultural brasileira. No início da década de 70 foi viver na Inglaterra e realizou exposições em Birmingham. Retornou ao Brasil em 1973 e fez exposições no Rio e em São Paulo. Entre 1974 e 1975 viveu em Nova York - EUA e começou a realizar trabalho pioneiro de vídeo arte. Convidado para a Bienal de São Paulo em 1977 realizou a peça performática “Circo Antropofágico”, com 12 monitores de vídeo no palco. Em 1978 participou de vídeo performances no Beaubourg, em Paris, e no Festival de Vídeo Arte de Tóquio. Em 1979 expos novamente na Bienal de São Paulo. Na década de 80, Aguilar desenvolveu grande atividade como pintor, com constantes exposições. É um dos artistas brasileiros com maior participação em mostras no exterior, sobretudo nos EUA e na Alemanha. Paralelamente a isso, reforçou sua imagem de multimídia com inúmeras performances, criação e apresentações da Banda Performática, realização de montagens e espetáculos em praças públicas, com uma mega produção em homenagem à Revolução Francesa, em 1989, e se utilizou de 300 artistas em cena, em frente ao Estádio Municipal do Pacaembu. Compõe músicas, grava discos, escreve e edita livros. Desenvolve suas ligações com religiosidade e a capacidade humana de transcendência. Em seu trabalho são constantes as demonstrações de “não ter medo de experimentar”. Nos anos 90 deu continuidade às suas múltiplas atividades, realizou megaexposições com quadros de grandes dimensões, no MASP, em 1991 e em 1996, além de exposições no exterior. Como diretor da Casa das Rosas, em São Paulo, dinamizou o espaço cultural com exposições sobre cultura brasileira. Com mais de 50 anos de presença no panorama cultu-


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AGUILAR, JOSÉ. Livros apresentados durante entrevista

ral, consolidou uma posição ímpar que se caracteriza pela diversidade de coerência. Publicou os seguintes livros: A Divina Comédia Brasileira (1981), A Canção de Blue Brother (1963), A Revolução Francesa de AGUILAR (1989), Hercules Pastiche (1994), Tantra Coisa (1999). Aguilar fechou a década com a exposição Tantra Coisa – Insights de um Voyeur, realizada na Pinacoteca do Estado. Esta exposição é a parte final de uma trilogia iniciada com A Criação do Mundo e o Tempo, seguida por Ossos e Asas. Nas duas primeiras exposições, o artista dedica se à criação do mundo e ao homem. Em Tantra Coisa – Insights de um Voyeur, Aguilar dedica-se ao corpo e à sensualidade. Segundo o artista: “Chegou a vez do multiplicai-vos, que é um hino ao corpo e à sensualidade... Tendo criado essas maravilhosas criaturas à sua semelhança, Deus se transforma num imenso voyeur.” As 29 telas exibidas sofreram um longo processo até o resultado final exibido na Pinacoteca, iniciado com a captação de imagens, por uma câmera voyeurística, de duas atrizes e de um ator nus que se movimentavam livremente e lambuzavam-se de tintas. Em 2000, Aguilar inaugurou seu novo ateliê instalado no bairro da Bela Vista em São Paulo. Projetado especialmente para se adequar às suas necessidades artísticas, o espaço generoso e bem iluminado dá novo ânimo ao artista, que passa a trabalhar freneticamente.


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CLARO, IDEVAR. Ateliê Aguilar

Em 2001, Aguilar inaugurou na Galeria São Paulo a exposição Rio de Poesias, colocando lado a lado espaços dedicados à pintura e à videoinstalação, demonstrando mais uma vez sua forte ligação com a literatura. Esta mostra fazia referência a grandes nomes da literatura ocidental em telas e na lírico-erótica videoinstalação Lençol de Poesia. Guimarães Rosa, Camões, Shakespeare, Walt Whitman são evocados “continuando uma tendência de embate com geniais escritores ocidentais, para ampliar as possibilidades da pintura”, como se refere Miguel Chaia na apresentação do catálogo da exposição. Em 2002, durante outra performance, que chamou atenção da paisagem urbana pela sua monumentalidade, Aguilar recobre com uma tela de 90 x 90 metros a Oca, o edifício projetado por Oscar Niemeyer no parque do Ibirapuera em São Paulo. “-Tanto faz pintar um quadro de 2 x 2 m ou de 90 x 90 m afirma o artista em entrevista”


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Em 2003, o artista juntamente com 600 crianças de escolas da rede pública do Distrito Federal, realizou uma enorme pintura da bandeira brasileira, na Esplanada dos Ministérios intervindo no cenário do Distrito Federal. Até 2003 Aguilar continuou à frente da Galeria da Casas das Rosas empreendendo importantes mostras e, neste mesmo ano foi convidado a atuar como Delegado Regional pelo Estado de São Paulo no Ministério da Cultura na gestão de Gilberto Gil. Em 2004, Aguilar inaugurou na Casa Andrade Muricy, em Curitiba, a exposição Os Visionários sob a curadoria de Bené Fonteles, que é uma espécie de introdução à mostra O Brasil de Aguilar. O ano de 2005 é marcado por duas importantes exposições individuais: Instalações e O Brasil de Aguilar, inauguradas no Instituto Tomie Ohtake em São Paulo e .na Galeria do SESI, respectivamente. A mostra O Brasil de Aguilar foi dedicada ao físico e crítico Mário Schenberg e teve como tema central o Brasil e os ícones nacionais representados em múltiplas telas. Jorge Mautner descreve seu amigo e sua obra: “Desde a primeira vez, como estudante colega no colégio Dante Alighieri, logo ficamos amigos”. Aguilar era um nacionalista poético e logo organizamos o Movimento Kaos, que era e será sempre um sistema de pensamento e de ética aberta para o infinito, e jamais um sistema fechado. Aguilar é pensador, escritor, poeta brâmane e pintor das esferas e vertigens do infinito. Meu pai nos apresentara em lições enlouquecedoras e geniais os pré-socráticos e a teoria da relatividade de Einstein. No ano de 2006, Aguilar participou da mostra 3º Paralela, e apresenta a videoinstalação Piscina. Nela são vistas imagens de uma bailarina em movimentos fetais deitada em uma piscina de luz. Esta mesma obra é montada posteriormente na Feira de Arte em Basel, na Suíça. Após 10 anos sem apresentações, em 2002 a Banda Performática ressur-


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ge com uma nova formação e novo CD: A ética da prata bêbada. Vários shows são realizados e o de maior destaque contou com a participação especial de Jorge Mautner. Agora a formação da Banda é a seguinte: band leader – Aguilar; contrabaixo – Mingau; guitarras - Kuaker guitarras; teclados - César Maluf bateria e voz - César Maluf; Loop B percussão na sucata e sampler -Claudinha e vocal - Gabi. Em 2007 é lançado o novo

AGUILAR, JOSÉ. Banda perfomática

CD – O anti-herói, com produção de Péricles Cavalcanti pelo selo Barravento. A revista Rolling Stones nos dedica “A sutil obsessão pelo conceito de heroísmo e seu antônimo vêm de longe”. Em 2007 Aguilar dedicou a exposição Ulisses, Transcriação Visual da


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Odisseia ao seu amigo, poeta e tradutor Haroldo de Campos. Realizada na Galeria ValuOria, o artista explorou a resina em poliuretano para criação de telas que mantêm diálogos com a obra de Homero. No ano de 2008, o grupo de artistas G onze, do qual Roberto Aguilar faz parte, excursionou pelo Brasil e exterior. O grupo, integrante da Associação para o Desenvolvimento da Arte e da Cultura, foi convidado especial da Primeira Bienal de Brasília com a exposição After School – a experiência pictórica brasileira, e depois para a Casa do Brasil em Bruxelas, Berlim e Roma. Em maio de 2010 Aguilar inaugurou ainda duas exposições. Na entrevista a seguir ele conta o que tem feito ultimamente. ENTREVISTA REALIZADA NO ATELIÊ DO ARTISTA EM 29/04/2016. O que é a Multimídia para você? Eu acho que basicamente todo mundo é multimídia! É gozado este termo porque quem estabeleceu muitos critérios de profissões foi a revolução industrial. Antigamente os caras já eram tudo. Eu me lembro quando comecei a imaginar que na Bienal tinha gravura, desenho, escultura e pintura e cada um fazia parte daquele esquema, mas não com nível da cultura assim. Por exemplo, eu lia muito da literatura, da poesia, de repente a poesia e a literatura tem muito a ver com a pintura e a pintura tem haver com questões externas da sociedade que a gente vive. A pintura me levou para o vídeo, para a performance. Então basicamente é difícil não ser multimídia, quer dizer você tem que realmente batalhar para só ser uma linguagem, mas tem pessoas iluminadas que ficam naquela linguagem, o Volpi pintando aqueles quadros, atualmente você vê pessoas como o Tunga.A tudo utiliza a todas as coisas. Não sei, ser multimídia agora é uma necessidade de expressão dos tempos. Você como referência multimídia se sente confortável com softwares e hardwares?


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Não, eu tenho uma virtude, eu delego. Então, por exemplo, fiz um filme, não fui eu quem fez o filme, nós fizemos o filme, embora eu tenha feito o roteiro e dirigido, porque tem muitas inclusões, por exemplo, o computador logo que chegou eu vi uma revolução, eu me lembro de que eu era diretor da Casa das Rosas, fiz uma exposição Arte Suporte Computador 1997, que foi fantástico. Tudo são meios que você pode utilizar e são ferramentas e tudo é inclusivo, eu acho muito pouco é exclusivo, a maldade é exclusivo. Na Década de 80, você fez trabalhos sobre futebol e comentou que naquela época era ruim o futebol e a arte do evento. E hoje? Mas olha a primeira menção que eu fiz foi em 66, com um quadro que tinha o Pelé entregando a bola para uma figura branca e preta, que podia se supor um general. Então o futebol sempre fez parte da nossa cultura básica, então é sempre o tema, tem uma exposição, é sempre vivo esse aspecto, o samba também. Qual foi o período mais rico e motivador ou isso “não pega nada pra” você, é “vamos que vamos”? Pega e não pega, o período mais rico foi aquele que eu fiz multimídia, nos anos 80, e além de pintar no fim dos anos 70 eu fazia muita performance. Depois nos anos 80 fiz uma planta performática com Arnaldo Antunes, que teve uma força muito grande e nos anos 70 também eu comecei a vídeo arte, mas nos anos 80 no sentido que o Brasil se abriu, foi uma efervescência muito grande onde nós fizemos muita pintura, exposições maravilhosas, muitos vídeos, muitas performances, publiquei livros, em 89 fizemos a Revolução Francesa com 300 atores no Pacaembu, então sem dúvidas os anos 80 eu acho foram anos muito explosivos.


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Esquerda: José Aguilar - Direita: Idevar Claro

Quem são, suas referencias? Tenho muitas, sem dúvida, vou falar as referências. A minha maior referência no começo da minha carreira, antes até foi o Jorge Mautner, éramos colegas de colégio, e a família dele, todos muito cultos, o pai dele era um grande físico, e agente estudou a filosofia, literatura, conversávamos muito, se discutia...então um dos maiores referencias da minha vida era o Jorge Mautner. Apesar de tantas obras eu percebi que não são muitas as instalações e vídeo instalações. Isto devido a dificuldades para espaço ou por muito trabalhoso? Não, não, difícil responder essa pergunta por que fizemos várias, mas não estão catalogadas, posso citar um que eu fiz, organizei o primeiro encontro de vídeo arte do Brasil, que fizemos uma instalação lá no MIS (Museu de Imagem e do Som São Paulo), muitas instalações, na Bienal de 79 inclusive eu fiz uma grande instalação de vídeo então, eu fiz várias, mas


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você tem outro tipo de razão porque a gente se dividia em performance, bandas. Fiz uma ultima instalação o Jardim de Alice, muito bonito usando cúpulas. Em que local você pintou a tela de 90x90 metros para cobrir a OCA no Parque Ibirapuera em São Paulo? Fiz no estacionamento do Centro de Exposição Imigrantes. (A tela foi pintada por Aguilar e onze ajudantes em uma lona de extrema resistência, utilizando 3.700 litros de tinta vinílica, fabricados especialmente para o evento. Sua produção tomou quase quatro meses e contou com a ajuda de uma equipe de engenheiros que estudou a melhor maneira de instalar a obra e preservar o edifício.) Suas telas são tempo livre ente outras artes, ou são nos tempos livres das telas que você desenvolve os outros trabalhos? Não, não, a pintura sempre foi a raiz, predomina quer queira ou não a pintura é a raiz. Sua banda performática com várias formações, que tempos em tempos você ressuscita, quando será a próxima apresentação? A próxima apresentação da banda vai ser na virada cultural neste ano e o Arnaldo Antunes vai participar, e você está convidadíssimo a ir, assim como toda a população, pois é uma apresentação aberta. Você participa em todas as fases nas apresentações da banda seja ao vivo, ou vídeo, a produção, ou pós-produção e edição? Não, não só ensaiamos fazer tudo você fica louco, damos algumas sugestões, mas na maioria só delegamos.


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Qual sua avaliação sobre as mídias? Mensagens rápidas, redes sociais, web, rádio e televisão. Essas mídias atonizam muito as pessoas, desencarna. Eu acho que tudo é válido, mas precisam encarnar um pouco, e as pessoas ficam muito distantes e muito fechadas no seu corpo, pouco generosas. Você disse que já trabalhou com vários cantores. Você fez alguma capa de disco ou cd com sua arte? Fiz só para Paulo Miklos, fiz três contando banda performática, tirando a banda fiz nos anos 70 para Caetano, Gil e Gal para os novos Baianos e a do Paulo Miklos. Sua biografia no site vai até 2010, isso é uma desatualização do site ou você se recolheu um pouco? Ah, eu não tenho saco, não aconteceu grande coisa, eu fiz 50 anos de pintura em 2011 no Centro Cultural Banco do Brasil, fiz uma exposição também na galeria André Milan, fiz poucas coisas. Fiz o show de 50 anos da banda performática. Joguei pouco futebol! Ah! Fiz o filme “Anna K”, cacete (sic), há dois anos, o primeiro filme longa metragem. É muita coisa pra fazer né? E tudo muito rico. A gente sempre fica se cobrando de fazer mais coisas. Ah, a gente é que nem surfista, se tiver uma onda boa a gente surfa, agora, por exemplo, tá difícil, o mar quase não tem ondas.


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REFERÊNCIAS AGUILAR, JOSÉ ROBERTO. Disponível em: http://www.aguilar.art.br/. Acesso em 29 de Abril de 2016. AGUILAR, JOSÉ ROBERTO. Disponível em: https://www.escritoriodearte.com/artista/jose-roberto- aguilar/. Acesso em 29 de Abril de 2016. AGUILAR, JOSÉ ROBERTO. Tantra Coisa: Insights de um voyeur: São Paulo. Studio Nobel, 1999.


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KIKO GOIFMAN DIRETOR, ROTEIRISTA, ARTISTA MULTIMÍDIA, PRODUTOR CULTURAL E ATOR.

ESCRITO POR: RENATO OLIVEIRA


ARROZ, FEIJÃO E PIMENTA Kiko Goifman nasceu em Belo Horizonte, Minas Gerais, em 1968. Diretor, roteirista, artista multimídia, produtor cultural e ator. É graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com Mestrado em Multimeios pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). No decorrer dos anos 90, Kiko assina a direção de diversos trabalhos em vídeo, entre ficções e documentários. Em parceria com o artista e documentarista Jurandir Müller, seu sócio na produtora Paleo TV, iniciou em 1997 o documentário experimental A Cidade e suas Histórias. Primeiro trabalho reconhecido internacionalmente é o


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CD-ROM com o livro chamado Valetes em Slow-Motion em 1998. Ganhador de vários prêmios, Goifman e Müller transformam o projeto num website que permitiu aos visitantes a interação em tempo real com os detentos do Carandiru no pavilhão do Ibirapuera. Em Morte Densa de 2001, traz um documentário junto a uma vídeo instalação e um website. E eles captam depoimentos de “assassinos de uma morte só”. O filme foi exibido no Festival de Locarno, em 2003. Seu primeiro longa-metragem é 33, de 2004, que mostra a busca do próprio Kiko Goifman por sua mãe biológica com o estilo detetive noir. O filme participou de festivais e foi premiado como melhor roteiro. Entre outros trabalhos, Atos dos Homens (2006) trata sobre a violência e o tráfico de drogas na Baixada Fluminense, mostrando a histórias dos sobreviventes de massacres ocorridos na história recente do país. Em Filmefobia, Kiko explora o mundo do medo levando fóbicos a encarar suas fobias e tendo um resultado inquietante proporcionando um cinema de experiência. Cenas do Filmefobia, fobia de cabelo

Ce


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Entre 2009 e 2010 dirige 52 episódios da série Hiperreal, na TV Sesc. A série tratava de grupo de jovens de variadas e curiosas tribos como: gays evangélicos, investidores financeiros, jovens detetives, adeptos da era vitoriana, skatistas, etc. Usando Imagens feitas pelos próprios entrevistados, com celulares ou câmeras digitais, Kiko inicia seu primeiro trabalho no formato para TV. Seu primeiro longa de ficção, Periscópio (2013), estrelado por João Miguel e Jean-Claude Bernardet, retrata o péssimo convívio entre os dois protagonistas em um apartamento, levando a conflitos em um cenário no qual não parece existir um mundo do lado de fora. Sem esperança e mergulhados na solidão surge um estranho objeto: um periscópio e junto um mistério, pois é visto pelos protagonistas como uma câmera, uma janela para o mundo.

Cenas do Filmefobia, fobia de penetração

No filme vemos um comentário sobre os reality shows e as redes sociais, não uma crítica como mesmo diz Goifman, mas sim um modo de interpretar nosso convívio com essa necessidade de sermos importantes só quando vistos. Atualmente finalizou a série Transando com Laerte do Canal Brasil. TRAJETÓRIA Kiko, formado em antropologia na época, já tinha forte interesse em fazer alguns experimentos audiovisuais em VHS no final dos anos 80. Sem possuir uma câmera, fazia scratch video no qual editava vídeos relacionados a um tema de determinada matéria e junto também fazia algumas coisas em fita cassete, como programas de rádios. Uma época difícil, de pouco orçamento e acesso as tecnologias vigentes, exigia muita vontade e parcerias para alcançar os objetivos. Com


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incentivo do professor Jarbas Medeiros, e com um grupo de pessoas, fez pequenos trabalhos, até que se formou e fez uma análise de discursos de presidentes militares na televisão, no qual juntava política e semiótica. Foi quando soube do Mestrado em Multimeios na UNICAMP e percebeu que poderia juntar um pouco a experiência da antropologia com a produção de imagens. Volta a trabalhar com o tema violência, no caso específico com prisão. Sua dissertação de mestrado na UNICAMP depois foi publicada com o livro CD Rom sob o título Valetes em Slow-Motion, que tratava da passagem do tempo na prisão. Foi premiado em Paris com este trabalho. Antes deste trabalho fez um vídeo documentário intitulado Teresa que tem uma relação muito forte com a vídeo arte da época, com muita manipulação de imagem, tornando-o diferente dos documentários tradicionais. Teresa foi filmado dentro de uma penitenciária e um distrito policial em 1982. Desde o início de sua carreira, a marginalidade, a violência, a miséria e o abandono são temas presentes em seus trabalhos, assim como a experimentação e o mergulho profundo na realidade de cada personagem. Em Morte Densa, temos depoimentos de homens que são assassinos de uma morte só, homens que mataram uma vez na vida. Nesse documentário ele pesquisa sobre pessoas que não tivessem crimes anteriores e que não tiveram uma “ficha suja” até o momento do seu primeiro e único crime. Kiko, então, recebe os entrevistados em sua própria casa, criando um envolvimento e uma imersão densa, às vezes de riscos, mas de grande contribuição para seus trabalhos. Seu primeiro longa metragem foi o filme intitulado 33 (2001), quando completou 33 anos. Muitos o classificam como um trabalho autobiográfico,


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mas, Goifman o considera como documentário com ficção. O FILME 33 SEGUE UMA TEMÁTICA DE FILMES “NOIR” Goifman parte da curiosidade de descobrir o paradeiro de sua mãe biológica, uma viagem documental repleta de ficção, cujo suspense e fotografia criam atmosfera de cinema noir. Filmefobia nasceu como um projeto de ficção, tratando do medo de pessoas, inicialmente estava seguindo uma linha de terror que não era o caminho de seu interesse. Novamente o teor da experimentação da pesquisa e da imersão são explorados: ele se dispõe a ficar diante de sua fobia de sangue e são inseridos atores, fóbicos reais que passam pela mesma experiência, inclusive Jean-Claude Bernardet, parceiro de Goifman e com cenas inspiradas no filme Laranja Mecânica de Stanley Kubrick. As obras de Kiko Goifman tratam da realidade que muitas vezes não queremos enxergar. Seu interesse por grupos sociais, criminalidade e pelas inquietações humanas são expostas com acidez e polêmica ao público. Em meio a temas fortes, impactantes e pelo experimentalismo fez com que seu trabalho explorasse outras mídias e ganhasse força de expressão e proporcionasse interação com o público. COMENTÁRIOS Passamos pela trajetória desse grande artista e suas obras impactantes.


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Começamos a entender seu trabalho que vem mostrar uma realidade que muitos olhos se negam a ver e ouvidos que relutam em escutar. Kiko Goifman expressa isso em seus trabalhos com uma obra recheada de temas polêmicos marcados pelo seu estilo “punk”, onde violência, criminalidade, diferenças de gênero se entrelaçam com pesquisas, experimentalismo e definem o seguimento de seus filmes em um envolvimento pleno de sua parte. Seu envolvimento chega a colocá-lo em risco em algumas vezes, mas desenvolve a essência e coloca mais perto daqueles que assistem seus filmes. Em conversa Goifman diz que apesar de nada contra, não se encaixa em desenvolver trabalhos “arroz com feijão”, ele tem mais um teor freak no qual o trivial seria: “arroz, feijão e pimenta.” Talvez o tempero seja a grande diferença de seu trabalho.


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REFERÊNCIAS GOIFMAN, KIKO. Sobre. Disponível em: enciclopedia.itaucultural.org.br. Acesso em 29 de Abril de 2016. GOIFMAN, KIKO. Sobre. Disponível em: www.sesctv.org.br. Acesso em 21 de Abril de 2016. GOIFMAN, KIKO. Trabalhos. Disponível em: www.portacurtas.org.br. Acesso em 21 de Abril de 2016.


KIKO MISTRORIGO E CÉLIA CATUNDA ANIMADORES

ESCRITO POR: JÉSSICA DIAS DE SOUZA


KIKO MISTRORIGO, CÉLIA CATUNDA E A TV PINGUIN: UM EXEMPLO DE SUCESSO DE ANIMAÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO A indústria da animação sempre foi dominada por estúdios estrangeiros, porém isso vem mudando graças aos esforços de brasileiros que acreditaram em seus trabalhos e tiveram perseverança para chegar ao seu objetivo apesar das dificuldades, além de possuírem conhecimento técnico e visão de negócio. A o surgimento do conceito de economia criativa, houve um significativo incremento na geração de empregos e visibilidade do país, despertando o interesse do


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governo. Em 2011, o Ministério da Cultura anunciou a criação da Secretária da Economia Criativa, para, dessa forma, criar programas pra o desenvolvimento do setor, assim, gerando receita ao país. A indústria da animação além do crescente papel financeiro, por meio da geração de empregos, consumo e crescimento, possui importante papel cultural, já que os chamados desenhos animados em algum momento estão ou estiveram presentes na vida das pessoas, seja na infância em que na maioria dos casos se vê desenhos animados, até mesmo na fase adulta, já que existem diversos tipos de animação para diversos públicos, sem mencionar a animação na publicidade e propaganda. Além disso, com o desenvolvimento contínuo da tecnologia, houve uma importante evolução do processo de criação, com a possibilidade da substituição das camadas de papel e acetato por sofisticados softwares pensados para as diferentes fases da produção dos filmes, tornando o processo mais rápido, prático e econômico. Vale destacar também que os personagens de desenhos são atemporais e podem ser usados para diversos propósitos. A animação brasileira vem buscando seu espaço na indústria mundial, segundo o diretor da Efe, um dos fundadores do Anima Mundi, a animação brasileira está ganhando personalidade, já que os brasileiros estão de olho no mercado e criando histórias e personagens originais sem seguir nenhum tipo de “escola”, criando novos padrões, o que é essencial para se ganhar espaço no cenário mundial, o que é o caso da TV pinguim de Kiko Mistrorigo e Célia Catunda. KIKO MISTRORIGO, CÉLIA CATUNDA E A TV PINGUIN Um grande exemplo de visibilidade no mercado da animação é o caso da TV Pinguin, fundado em 1989 por Francisco (Kiko) Mistrorigo e Célia Catunda, que se conheceram na faculdade de arquitetura e urbanismo (FAU), Kiko se formou, mas Celia abandonou o curso para depois se formar em rádio e TV na escola de comunicação e artes (ECA) da USP. Hoje Kiko é


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Arquiteto, designer, diretor de criação e efeitos especiais, e criou e dirigiu mais de 400 horas de animação para TV, é também vice presidente da Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão. Célia é artista visual, e explora diversas linguagens e técnicas de desenho e animação. Ela concebeu o projeto gráfico da Folhinha - suplemento da Folha de S. Paulo, em 1990. Entre seus trabalhos, destacam-se o vídeo Nome (1993), realizado a partir de poemas de Arnaldo Antunes; o quadro Poesias Animadas (1994), dentro do programa Castelo Rá-Tim-Bum, na TV Cultura; a série de animação Rita (1994), que pontua a programação infantil da mesma emissora, e que obteve altos índices de audiência ficando em segundo lugar entre os programas mais vistos da TV Cultura; os livros Brincadeiras 1 e 2 (1995); as animações da série Professor Planeta (1995/1997) para o canal a cabo ESPN/Brasil; as animações do quadro Retrato Falado do Programa Fantástico, da TV Globo (2000); e o site estadinho.com.br para o jornal O EstaKiko Mistrorigo do de S. Paulo. Recebeu o Prêmio para Realização de Curtas-Metragens do Ministério da Cultura, 1998, com o qual realizou o piloto da série de animação Escaleno. Célia participou de diversos festivais internacionais Kiko Mistrorigo e Célia Catunda possuem uma herança cultural que veio desde o início da democratização, pós ditadura militar, com a poesia concreta paulista proporcionada pela era digital. Partindo de soluções gráficas e formais para a palavra e o poema, chegaram a um intenso diálogo com o público infantil, sempre seguindo um mesmo princípio: oferecer ao espectador a chance de poder querer mais e melhor, ambos conseguiram através de suas experiências poéticas criar uma nova forma de se comunicar com o público infantil sem seguir as velhas “receitas” estrangeiras, dessa forma usando a cultura e a história brasileira em seus trabalhos.


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A dupla compõe a parte final da série Operação Para As Massas, integrada ainda por Arnaldo Antunes e Wilton Azevedo. O projeto propõe a investigação da presença do Projeto Construtivo Brasileiro na produção nacional atual, a partir de seu mais revolucionário potencial: estabelecer uma relação criativa com a sociedade. Os dois possuíam gostos parecidos por histórias em quadrinhos e animação, o que desencadeou essa parceria, mas a realidade da TV pinguin não era muito diferente de outras produtoras, uma vez que que viviam de publicidade e tinham dificuldades em seu início pela falta de tecnologia acessível e limitações tecnológicas. Foram pioneiros na utilização da computação gráfica com equipamentos Célia Catunda Apple no Brasil. Para os sócios, a publicidade da produtora era suficiente apenas para pagar as contas, porém eles tinham o desejo de produzir conteúdos próprios ligados a cultura por meio de séries e gerenciamento de marcas. Desde então, produziram várias animações com algum sucesso como o exemplo de “Rita” de 1994 e a série “De onde vem?” em 2002, ambos para a TV Cultura de São Paulo. A empresa percebeu, a partir do sucesso dos cartoons americanos, uma oportunidade de negócio. Inspirados no Cartoon Network perceberam a oportunidade por meio do código 39 da Condecine, que trata do incentivo às produções locais de animação. Kiko e Celia já tinham um projeto em mente, o Peixonauta (já formatado em 2003), e assim iniciaram seu projeto a fim de inserir definitivamente a produtora na indústria de animação. No ano seguinte, os dois começaram a visitar as feiras especializadas


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do setor (MIPCOM e MIPTV), para buscar parcerias, mas diferentemente de outras empresas, já tinham 38 reuniões pré-agendadas. A partir daí, começaram uma negociação com a produtora canadense Nelvana, produtora de sucessos como “Os Backyardigans”, “Franklin”, “Miss Spider”, “Babar” e “Badou. Em 2005 na MIPCON, formaliaram um projeto de coprodução com a Nelvana, e como garantia para captação de recursos no Canadá, tiveram que ter um contrato de exibição em uma TV local. Em 2006 a TV Pinguin assinou um contrato de pré-venda com a Discovery Kids para o mercado latino americano, com prazos apertados, e como a Nelvana não poderia participar no processo, o contrato entre eles foi encerrado. A Discovery assinou com a TV Pinguim uma temporada com 52 episódios de 11 minutos, mas, precisavam de 6 milhões de dólares para criar o projeto, e deveriam fazer isso em 18 meses. Mesmo com as dificuldades, a Discovery Kids sempre esteve aberta para negociação do cronograma, o que foi essencial, já que parte do investimento veio da própria Discovery, por meio do artigo 39 da Condecine, que permitiu que ela entrasse como coprodutora ao fazer a pré-compra da animação. Além disso, a empresa Bunge (do setor de alimentos e bioenergia) firmou um patrocínio de 400 mil enquanto a TV Pinguim foi responsável pela captação dos recursos faltantes por meio de outros patrocinadores. Eles buscaram, também, recursos com um grupo de investidores de risco em um evento da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia, mas sem retorno monetário obtido, porém, aprenderam com isso a fazer um plano de negócios. Um dos participantes do evento, ligado a Ancine apresentou a TV Pinguim ao BNDES e após muitas reuniões obtiveram financiamento através da Procult, porém, mesmo assim, tiveram que usar recursos próprios, e depois de 22 meses, com 15 funcionários e mais 150 pessoas contratadas para


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essa produção, conseguiram produzir a 1º temporada de Peixonauta que estreou em abril de 2009 na Discovery Kids, e foi sucesso assim como líder de audiência no canal. Com todo o sucesso da animação, a TV Pinguim conseguiu licenciar e distribuir os produtos ligados ao desenho, mas como licenciamento não era a área de conhecimento de Célia e Kiko, fecharam um acordo com a Redibra, a partir daí, a marca esta estampada em mais de 300 produtos de diversas empresas, hoje o Peixonauta é transmitido em 67 países, na américa latina e nos Estado Unidos, a distribuição ficou a cargo da Discovery Kids, e em outros países é coordenada pela Breakthrough Entertainment, que é canadense, com o nome de “Fishtronaut”. Em uma entrevista feita pelo blog Bom para criança ao entrevistar Célia Catunda, ela explica que ela e Kiko Mistrorigo trabalham desde o roteiro até a sinopse, e que o DNA da produtora é produzir conteúdos positivos para as crianças, já que essas mídias (TV, cinema, teatro....) afetam o lado afetivo delas, já que elas se divertem enquanto aprendem, tornando o processo de aprendizado mais fácil. A Tv Pinguin não faz só séries animadas, eles fazem também aplicativos e teatro, nos desenhos animados eles tentam incentivar as crianças a usarem livros, para que elas entendam que há outras formas de se buscar informação. Um exemplo de aplicativo lançado, se integra ao desenho, já que cada episódio há alguma atividade interessante para se fazer, um bom exemplo de estratégia usado para integrar também os pais nessa atividade. Célia Catunda aceitou fazer uma entrevista para falar de sua trajetória profissional, ela conta que entre os 13 e 14 anos, Célia já desenhava e que pensava na animação como algo que ela gostava e era o que queria fazer, ela já pensava em fazer animação para a TV desde cedo por ter a comunicação em massa como algo que a fascinava.


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Ao assistir desenhos animados na televisão, Célia percebeu que não tinha nenhuma animação brasileira, ou seja, era algo que faltava como conteúdo nacional, Célia conta que em sua época, não existiam muitos desenhos animados na TV e que tinham um horário muito reduzido, além de não ter TV a cabo na época, e que gostava de desenhos como Tom e Jerry, Charlie Brown, Hanna Barbera: Manda Chuva, Corrida maluca... Além de desenhos da Disney apesar de que não era corriqueiro, Célia gostava dos quadrinhos do Mauricio de Souza, e as propagandas animadas que era um dos poucos exemplos de animação nacional que tinha como referencia. Para Célia o mercado de animação mudou muito, e cita Peixonauta como algo que entusiasmou os animadores brasileiros, eles eram os únicos que tinham um projeto de animação para o mercado internacional, e que a mídia divulgou bastante o projeto, após o fechamento do acordo, o que atraiu as pessoas que tinham a animação como interesse, desde a produção de curtas, publicidade a pensarem na animação como produção de conteúdo mercadológico. Célia conta que hoje há um número grande de produtoras e há espaço na TV para as animações brasileiras, o que não tinha antes, pela ajuda também das cotas e das mídias digitais, surgiram muitas possibilidades de veiculação das animações brasileiras, portanto há mais demandas, porém, Célia aponta que a produção de uma animação ainda é bastante cara, o que torna difícil viabilizar um projeto, ela conta que já trabalha em roteiros em inglês porque a venda no mercado externo é fundamental para a produção ser viável, e que vender em um canal é inviável, para ela, falta as pessoas entenderem a animação de forma mais comercial e estruturar esse negocio de forma sustentável, organizada e que tenha retorno financeiro, para ela o meio criativo brasileiro é rico, e como o meio artístico era difícil, as pessoas possuem muita paixão e garra para conseguirem alcançar seus objetivos. Célia conta sobre as dificuldades que enfrentou antes da TV Pinguim, ela diz que na época em que começou não existia a carreira de animador


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aqui no Brasil, não existiam faculdades voltadas para área, não era uma profissão reconhecida, o que a fez ser também autodidata, e relata que também tornava difícil justificar tal escolha perante a família, Célia conta que largou várias faculdade pois sentia não se encaixar em nada, ela diz que se fosse nos EUA e Europa, e que se tivesse um mercado estabelecido, e postos de trabalho, teria sido mais fácil, apesar das dificuldades, por ter aprendido por conta, ela criou seu próprio estilo, e que não foi contaminada com outros estilos, algo que acontece muito no Brasil, ela diz que TV Pinguin tem seu próprio estilo de arte e animação, o que pode ser visto pelos trabalhos que apesar de ser pensado para o publico internacional também, ele não perde suas características brasileiras. Ela conta sobre seu processo criativo que sempre utilizou, como esboços, rabiscos descompromissados que viram grandes ideias, pois a partir deles, ela constrói seus personagens com estilos diferentes, hoje na TV pinguim o processo é diferente, se pensa em um tema para depois criar os personagens e a narração e que há um núcleo criativo trabalhando na produtora, algo mais metódico e menos espontâneo, ela diz que pensa no que não tem na área, o que falta falar, assuntos não abordados para assim criar novos conteúdos. Célia diz amar criar para o público infantil, pois adora criança, que não cansa, ela fala da originalidade do pensamento infantil, eles trabalham mais com o pré-escolar, o que ajuda na formação dessas novas gerações, o que torna a qualidade como sua principal responsabilidade como criadora de conteúdo, para ela a criança esta aberta a novos conteúdos, porém, ela aponta como desvantagem o fato de que conteúdos infantis não serem devidamente valorizado no mercado e é visto como algo menor, e até ridicularizado em alguns casos, ela relata que nos festivais há diversas categorias para diversos filmes, e no infantil, só um, e que o reconhecimento vem da criança e dos pais, apenas. Celia diz não se identificar com outros públicos e que pela demanda que possui na criação de conteúdo


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para o publico infantil, ainda não pensa em fazer conteúdos para um publico mais velho, Celia diz que o conteúdo para cinema tem um publico mais amplo, já que vai a família, por isso pensa em conteúdos que toda a família goste e não apenas tolere. Célia relata os conflitos culturais na hora de se vender um projeto para o exterior, como por exemplo a Índia que não comprou o show da Luna por a protagonista ser uma menina, para países árabes, pediam para colocar uma calca nas personagens, o se faz interessante a pré-venda, para que possa se mudar o roteiro, afinal, é um produto comercial. Kiko e Célia enfrentaram diversos problemas e acertos para chegar ao sucesso, porém, passaram por todo esse processo que os fez obter experiência e vontade de seguir adiante, o que foi fundamental para chegar onde estão, com isso, tiveram vários projetos incluindo um longa metragem para o cinema. Célia e Kiko foram finalista em: Melhor longa-infantil e Melhor longa de animação PEIXONAUTA Um do casos de maior sucesso da TV pinguim começou por acaso, com rabiscos de um peixe enquanto Célia Catunda assistia a uma palestra, e viu ali um grande potencial, assim surgiu o peixonauta, um peixe misto de viajante, explorador e agente secreto, na qual envolve questões ecológicas dentro de um parque, junto a menina Marina e o macaco Zico que nunca sai do parque, e recebem pistas da bola colorida a Pop, juntos solucionam diversos mistérios transmitindo valores como trabalho em equipe e preservação da natureza, ou seja, sustentabilidade é o foco do desenho. A série é totalmente brasileira o que a faz pioneira por terem adquirido


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tanto sucesso, algo raro na indústria de animação brasileira, Célia Catunda explica em uma entrevista que quando a série era apenas uma ideia, eles já vislumbravam um formato internacional, seja em relação ao número de episódios como o tempo de duração, além disso, Célia aponta que para a internacionalização, o personagem deve ser universal, sem regionalização e com humor e histórias que podem ser entendidas no mundo todo.

MELO, Caroline. Peixonauta em musical no Teatro Riachuelo.

SHOW DA LUNA! A série, o show da Luna (Earth to Luna em inglês), estreou inicialmente nos Estados Unidos em agosto de 2014, e depois de 2 meses, estreou no Brasil no Discovery Kids, assim como peixonauta é focada no público infantil entre 3 a 5 anos, com o foco no tema ciência. Na série, a personagem principal é uma menina de 6 anos chamada Luna, que ama ciência e sonha em ser cientista, o desenho possui uma linguagem que foge dos estereótipos sexistas contemporâneos. Ela vive aventuras junto ao


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seu irmão Júpiter, e uma fuinha, juntos buscam desvendar os mistérios da natureza, e para Luna a Terra é um laboratório gigante, a trama possui referência a vários cientistas, para que desperte a curiosidade do público infantil. O desenho passa na TV Brasil, no Discovery Kids, e também é exibido nos Estados Unidos pelo canal Sprout da NBC e em Portugal pelo canal SIC. A música também é um ponto alto da narrativa, e tem a direção de André Abujamra. PEIXONÁUTICOS Peixonáuticos é uma série liveaction gravada em escolas de São Paulo, aonde crianças interagem com os personagens animados da série Peixonauta e a bola Pop. Na série, as crianças plantam, cuidam dos animais, brincam, conversam, contam piadas, correm com a POP, dançam, cantam e fazem piquenique. Além disso, as crianças têm liberdade para dar suas opiniões e falar das coisas que mais gostam. A série estreou no Discovery Kids em 2013. GEMINI8 Gemini8 é uma série de comédia, ação e aventura que conta as aventuras de Marco, um garoto da Terra, no distante planeta Gemini 8. Marco é acidentalmente atraído por um portal e vai parar no planeta GEMINI8. Lá ele conhece Polo. Em meio a sucessivas tentativas de enviar Marco de volta à Terra, os dois vivem as mais incríveis aventuras e acabam por se tornar amigos inseparáveis. Com música de abertura de Arnaldo Antunes, a série estreou nos canais da Disney em 2014. O desenho tem ganhado espaço no mercado mundial, a série brasileira está sendo licenciada pela distribuidora espanhola Imira Entertainment que está oferecendo para canais de TV de várias partes do mundo 52 episódios de 11 minutos de duração cada.


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Gemini8 surgiu em 2012 em uma revista em quadrinhos publicada pela editora Abril, em seguida ganhou histórias inéditas para a internet, além de webisodes, além de tirinhas na revista recreio. DE ONDE VEM “De onde vem” estreou em 2001, e tem como foco assuntos educacionais para o público infantil. Kika é a personagem principal e tem perguntas de sobra sobre o que acontece ao seu redor. A série “De onde vem” aproveita esses momentos para contar, em uma linguagem simples e acessível, tudo que a garota quer conhecer: A animação passou em canais como TV Cultura, TV Rá-Tim-Bum, Canal Futura, Rede Gospel e TV Brasil e entre 2004 e 2005 foi líder de audiência na TV Cultura. PEIXONAULTA O FILME Quando o Doutor Jardim, avô da Marina, não retorna da cidade, Peixonauta, Marina e Zico partem para resgatá-lo. Mas quando chegam lá, algo muito estranho está acontecendo: todos na cidade sumiram! Para conseguir solucionar esse grande mistério, nossos heróis vão ter que contar com a ajuda da O.S.T.R.A. e de todos seus amigos e irão viver sua maior aventura…desta vez, na cidade! TARSILINHA Personagem inspirada em Tarsila do Amaral(1886-1973), Tarsilinha é uma menina que enfrentará seus medos em um mundo onírico, com formas e cores inspiradas nos quadros de Tarsila do Amaral, além nas referências do folclore brasileiro. O desenho tem o foco na superação de desafios e amadurecimento, envolvendo as relações sociais. Dirigido por Kiko Mistrorigo e Célia Catunda, e com roteiro de Fernando Salem (com experiência em várias séries infantis como Vila Sésamo e Cocoricó.


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Segundo a declaração do diretor, para a revista Tela Viva, “Tarsilinha” será em 3D por dois motivos: O primeiro é a questão mercadológica, pois “existe agora, um negócio, uma distribuição relacionada aos projetos audiovisuais 3D”. E o segundo motivo passa pela questão da narrativa, para Mistrorigo “as obras de Tarsila do Amaral são naturalmente tridimensionais e a tecnologia foi uma solução pensada desde o início”.


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REFERÊNCIAS ACADEMIA brasileira de cinema. Peixonauta – Agente secreto da O.S.T.R.A. 2012. Disponível em <http://academiabrasileiradecinema.com.br/gp2013/filme/ peixonauta-agente-secreto-da-ostra> Acesso em 6 de abril de 2016. ASSOCIAÇAO Cultural Videobrasil. 048 / Celia Catunda e Kiko Mistrorigo. Disponível em < http://site.videobrasil.org.br/dossier/dossier/1483022> Acesso em 15 de maio de 2016. BARBOSA, Ana Paula Franco Paes Leme Barbosa, MARILSON, A. Gonçalves, JUNIOR, William G. A INDÚSTRIA DE ANIMAÇÃO PARA A TV: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO SOBRE AS INICIATIVAS BRASILEIRAS NO SETOR. 2013. Disponível em <https://www.researchgate.net/profile/Wilian_Gatti_Jr/ publication/241687924_A_INDSTRIA_DE_ANIMAO_PARA_A_TV_UM_ ESTUDO_EXPLORATRIO_SOBRE_AS_INICIATIVAS_BRASILEIRAS_NO_SETOR/ links/0c96051c9f34cebf59000000.pdf> Acesso em 25 de abril de 2016. MENDONÇA, Fernanda. Como um peixe astronauta se transformou em um dos negócios brasileiros mais bem sucedidos no mundo. 2015. Disponível em <http://www.administradores.com.br/noticias/empreendedorismo/ peixonauta-e-a-reviravolta-do-mercado-de-producoes-brasileiro/101862/> Acesso em 22 de abril de 2016. TV PINGUIN. Produções. Disponível em <http://tvpinguim.com/> Acesso em 4 de abril de 2016.


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LENORA DE BARROS POETA E ARTISTA VISUAL

ESCRITO POR: RAFAEL SINDEAUX


“DO PAPEL” PARA IMAGEM Lenora de Barros nasceu em São Paulo em 1953. Em 1970 graduou-se no curso de Linguística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (Universidade de São Paulo), além de ser poeta e artista visual. Em sua carreira Lenora carrega grandes influências, como seu pai, o artista Geraldo de Barros (1923 – 1998) e o grupo Noigandres, formado por Augusto dos Campos (1931), Haroldo de Campos (1929-2003) e Décio Pignatari (1927-2012), por esse motivo seus trabalhos possuem caráter da poesia concretista. Lenora cedeu uma entrevista no dia 19 de maio de 2016, na qual a artista cria uma linha cronológica de sua carreira, comenta sobre a exposição na Oficina


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Cultural Oswald de Andrade (São Paulo), da recente participação na Exposição Space to Dream na Auckland ArtGalery (Nova Zelândia) e ainda conta sobre como descobriu o lado artístico e alguns altos e baixos durante esses anos de carreira. O atual trabalho IssoéOssoDisso, exposto na Oficina Cultural Oswald de Andrade, de acordo com a própria Lenora, traz um panorama de suas obras. E sobre a performance Pregação, apresentado em Auckland, comenta a artista: “Foi uma experiência bem rica, encontrei outros brasileiros, apresentei a performance dentro de um museu, com condições muito diferentes. Foi divertido martelar a parede de um museu...”. A primeira questão abordada foi em relação à quando ela se descobriu artista e volta no tempo nos contando quando seus pais começaram os primeiros incentivos “o estímulo da área visual vem do meu pai, por outro lado, minha mãe me estimulava muito para literatura... Lia Monteiro Lobato, ela punha a gente na cama, apagava a luz, tinha uma lanterna, acendia e ao

BARROS, LENORA. “Pregação” - 2015.


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ler, por exemplo, Viagem ao Céu, colocava a luz azul, pescaria Emília, tudo amarelo, Saci era em vermelho. Ali já começava a conectar o visual com verbal mudando as luzes da lanterna.” Quando chegou à adolescência, enquanto cursava o antigo colegial com matérias comuns como português, matemática, física etc. Também participava de aulas complementares voltadas para arte, como história da arte, desenho de observação e teve suas primeiras aulas de semiótica, que futuramente usou em suas fotografias. Mesmo com as ligações ao mundo artístico, ainda estava em dúvida sobre qual carreira seguir, vivia descobertas, admirava artistas como Yoko Ono, porém possuía um grande apreço pela arquitetura, era seu momento de formação. Um dia seu professor de concepção de projetos sugeriu um trabalho com o tema “Uma Crítica a Sociedade de Consumo”, inspirada em George Segal, monta sua primeira sequencia fotográfica com o intuito de criar, segundo a própria Lenora, uma “Figura à lá George Segal”. Entre 1970 e 1990, já na fase adulta, formou-se em Linguística na USP, tinha um grupo de amigos da sua idade, eram poetas visuais, frequentou a casa de Augusto dos Campos e fez uma parceria com o videomaker Walter Silveira, juntos transformaram aquela primeira experiência de homenagem a George Segal, em vídeo. Paralelamente criava conteúdo para a revista Poesia em Greve, seus poemas eram compostos basicamente por palavras, entretanto, rapidamente houve a integração da palavra com o visual. Ali estava a vertente que precisava, onde seria possível contemplar os dois lados da arte. Trabalhou no jornal e revista Folha de S. Paulo e na Editora Abril, ambos na função de editora de arte. Foi morar em Milão na Itália em 1990, seu marido era jornalista correspondente e ela foi para acompanha-lo, lá fez sua primeira exposição individual e entendeu o seu próprio processo de criação, onde fotos viravam vídeos, que viravam poema, vice e versa. Após voltar ao Brasil, começa a explorar os aspectos e efeitos sonoros, usava bolinhas de ping pong. É convidada a


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participar do Arte Cidade 2 como o tema Cidade e seus Fluxos, faz uma instalação onde usa os pontos recentemente explorados, todavia, queria utilizar suas possibilidades desde sonora, a visual e oralidade, ressalta que “Olhando para traz tinha um desafio pela tradição da poesia concreta, o que no momento não era muito claro, mas era impossível ser uma poeta concreta, porque dependia de um contexto histórico e questões que não eram mais as minhas, mas ao mesmo tempo queria trabalhar com palavras e como levar isso para frente de um modo que fizesse sentido?”. Reafirma que sem dúvidas, as circunstâncias vividas em Milão foram um marco no trabalho da linguagem verbal somada a visual “A palavra se integrava ao visual, não tinha um fim. Tentava lidar com várias linguagens e não era uma coisa só minha, mas sim uma questão de geração.” Colunista do jornal da Tarde onde tinha uma coluna, “Umas”, e plena liberdade para experimentar. Trabalhava com a memória, criando relações entre artistas e imagens, desenhava a própria coluna, muitos trabalhos saíram de lá e se transformaram em vídeo. “Não tinha a ferramenta de pesquisa Google, fazia tudo a mão, pesquisava e corria atrás.” Em 2000 conseguiu parar de trabalhar “Fico feliz ao ter certeza que foi a melhor decisão que tomei, a oportunidade que tive foi ótima, mas precisava me dedicar, minha produção se intensificou. Lá em Milão comecei a olhar meu próprio trabalho com mais sinceridade e tudo foi caminhando nessa direção.”. Ao ser questionada sobre a diferença entre criar obras nas décadas de 1970 e 1990, onde os métodos e equipamentos eram diferentes, além da ausência da internet, ela faz uma comparação com a sua época de colunista, diz que seria um pré blog e complementa “se tivesse os recursos de hoje com certeza seria mais rápido e fácil. Porque lembrava de uma imagem e tinha que pesquisar nos arquivos do jornal, comprar revistas, livros ou sair para fotografar. Formulei um método no qual criava várias colunas e uma completava a outra. Começava a produzir segunda e na


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quinta já tinha praticamente tudo pronto, desenhava a coluna, passava por fax, ou desenvolvia junto com o pessoal da arte e fechava na parte da tarde de sexta. Se tivesse um Google seria de fato bem mais fácil e de um modo geral nas outras áreas, acho que as condições de hoje para os jovens artistas são bem melhores, antigamente você tinha a possibilidade, mas eram poucas e difíceis as nossas opções.” Afirma que quando fez o trabalho do George Segal praticamente não existia vídeo, “Existia o cinema, mas era outra realidade. Quando surgiu a possibilidade de ter vídeo e quando conheci o Walter Silveira foi muito legal e é até hoje”.

BARROS, LENORA. “Procuro-me”, 2002. Imagem cedida por: Galeria Millan

Ao longo dos anos, realizou trabalhos expostos em diversas bienais, instalações de arte no Brasil e no mundo e confirma que atualmente vive o melhor momento de sua carreira “Milão foi legal, estava começando a ser mais sério, conheci artistas, fiz amigos, passei a poder trocar ideias e ter gente para conversar. Foi um período muito legal, hoje em dia tem o lado


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maduro, segurança no trabalho, o sofrimento continua, ele passa e vem, passa e vem em toda nova proposta ou continuação de trabalhos anteriores. Sempre é angustiante, sempre tenho a sensação de que a fonte secou, que não tenho ideia e não vou conseguir. Maturidade tem o lado bom” aproveitando o assunto, faz uma breve explicação do seu processo de criação, conta que ele varia, as vezes é rápido, outras demora e quando pensa que não vai usar uma ideia, dá um jeito de renová-la e consegue aplicar em um contexto diferente “Faço muitas anotações, tenho uns ataques e jogo fora. Uso muito o computador e vou concebendo a obra”, exemplifica com uma de suas obras famosas IssoéOssoDisso. Em 1994 participei de um congresso de psicanálise, na época tive a ideia de trabalhar com um esqueletinho de plástico, foi uma coisa meio rápida, anos depois em uma exposição no Rio de Janeiro, peguei uma frase e criei um poema horizontal que visualmente formava uma espinha vertebral e como já tinha uma obra com a minha língua e uma espinha vertebral resolvi conectar tudo e trazer a tona em forma de vídeo nessa nova exposição. Isso revela o meu processo de criação, claramente queria um trabalho novo para dar um tom de continuidade, não queria só caráter antigo, nem retrospectiva afinal, estou viva e trabalhando!” Outra grande obra seria Procuro-me, que nasce em 1994, quando Lenora visitava um cabelereiro atrás de imagens para a coluna intitulada “Formas Capilares”, havia um fotógrafo, capturando e fazendo montagem de pessoas com caras, bocas e perucas de cabelos diferentes, ele usava uma espécie de photoshop, imprimia em polaroid, “Fiz várias fotos, usei na coluna e guardei. Em 2001 estava assistindo TV, foi na época do ataque ao World Trade Center, aquela imagem das torres gêmeas era bem impactante, o presidente George W. Bush aparece com um cartaz do Osama Bin Laden e de outros terroristas com a palavra “Procurado” em baixo dos seus rostos. Na mesma hora lembrei das minhas caras e bocas com cabelos diferentes e me veio a palavra “Procuro-me”, afinal


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no momento todos estavam perdidos, se procurando no meio daquela loucura. Juntei as ideias e publiquei na Folha de São Paulo, tentei publicar o mais rápido possível para não perder o tema. Lá em 2002, participei de uma exposição no Rio de Janeiro e trabalhei com o procuro-me, fiz um mural, peça sonora, usei a minha expressão espantada da obra “Fogo no Olho”, sempre uso, é quase uma máscara. No dia seguinte abria no Centro Universitário Maria Antônia da USP uma exposição, a cada dois meses um artista era convidado e eu fui a primeira. Resolvi usar quatro cartazes do Procuro-me, ficou super bacana, lindo, estava feliz da vida, mas então um grupo pichou a obra, começaram a me mandar cartas assinadas como “Artatack”, meio delirantes, e mandaram também um projeto do que eles iriam fazer se não fossem pegos, em um primeiro momento foi uma ação violenta estava tudo legal e esses caras vieram destruir, levei um choque, porém o trabalho era meu, então peguei, criei novas imagens, fiz a série Retalhação, e no fim os caras me deram um presente. Sobre performances ao vivo, Lenora possui uma grande facilidade em ir e vir, seus trabalhos acabam ecoando no outro, quando passou um ano e meio em Nova York, onde retomou uma antiga ideia, fazer uma performance ao vivo, pensou em Pregação, “Queria criar um ruído a partir do silencio. Extrair som da palavra silêncio é um paradoxo, o desejo dessa obra estava guardado desde Nova York, era uma situação de correr risco em público, estava acostumada a fazer trabalhos quase todos com edição, depois de um tempo finalmente tive coragem e oportunidade para colocar em prática e na primeira vez ao vivo em Nova York, o público achou que poderia entrar e participar da performance, confesso que não estava esperando, mas administrei bem e a experiência tem me seduzido, deixar o trabalho aberto com uma situação para acontecer ao acaso, lidar com esse acaso e incorporá-lo no trabalho, isso traz uma verdadeira riqueza e quero desenvolver mais performances assim. Para finalizar, a artista que possui experiência e atua em vários ambientes,


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deixa uma mensagem para os jovens, não só para os seus seguidores, mas em geral aconselha que vivam a vida. “Parece clichê, mas viva intensamente, aproveite cada minuto, é muito importante acreditar nos sonhos, buscá-los e transformá-los em realidade, gosto de citar a frase do John Cage, que é meu lema de vida: “O mundo se transforma em função do lugar onde fixamos nossa atenção. “Esse processo é aditivo e energético”, entendo que podemos intervir na realidade, você é responsável por transformar e agir, principalmente tornar o mundo em que vivemos mais bacana, porque estamos passando por coisas complicadas e difíceis, temos que ter consciência e tentar agir pelo menos nas coisas próximas, temos que botar para frente boas energias”. Hoje com 62 anos, Lenora continua criando, expondo seus trabalhos pelo mundo e vivendo da arte e para felicidade dos seus admiradores.


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REFERÊNCIAS Artigo baseado em uma entrevista cedida por Lenora de Barros dia 19 de Maio de 2016 para o Aluno, Rafael Sindeaux, do 4º Semestre de Multimídia do Centro Universitário Senac.


LUCAS BAMBOZZI ARTISTA MULTIMÍDIA E PESQUISADOR EM NOVOS MEIOS

ESCRITO POR: RAPHAEL SILVA


A SOCIEDADE MIDIÁTICA Lucas Bambozzi é artista e pesquisador em Novas Mídias, interessado na exploração crítica de novos formatos de mídia independente. Trabalha em diversas mídias como vídeos, filmes, instalações ,performances audiovisuais e interatividade. Seu trabalho está sendo desenvolvido desde os anos 80, com foco principalmente em audiovisual e linguagem eletrônica. Nos anos 1990, seu trabalho passa a ser reconhecido e ele se torna um expoente de arte produzida para redes sociais , internet e telefonia móvel. Bambozzi procura colocar em destaque as relações


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entre o sujeito e a vida em coletividade. O contexto de comunicação está presente em sua arte proporcionando encontros, ativar trocas e retomar a arte como experiência, levando o sujeito a refletir sobre tensões entre esferas íntimas e dilemas entre o público e o privado. A relevância de sua obra, está em colocar em crise o sujeito tanto no espaço social , quanto associado ao espaço comunicacional. A postura critica a respeito da ideologia de mídias, misturada ao interesse da arte contemporânea e a sociedade no contexto histórico e cultural. Recebeu em 1996 a bolsa Bolsa Vitae de Artes para o desenvolvimento do projeto Tormentos. Em 1997 participou de importantes coletivas como a Arte Cidade, e a Arte e Tecnologia, no Itaú Cultural, ambos em São Paulo. Programou o setor de Internet e desenvolvimento de projetos de Novas Mídias para a Casa das Rosas, tendo sido curador de exposições como Artesuportecomputador, em 1998 e Imanência, em 1999. Em 2000 seu vídeo I have no words foi premiado pela primeira vez no Locarno VideoArt Festival, na Suíça. Em 2001 participou da Bienal 50 Anos, em São Paulo e foi um dos premiados no projeto Carlton Arts, com a instalação Postcards. Já no ano de 2004 integrou as exposições Emoção Art.Ficial, no Itaú Culutral, em São Paulo, HiPer, no Santander Cultural, em Porto Alegre, Perdida de Control, em Lima, no Peru e Heterodoxia, exposição itinerante. Tem escrito vários artigos e críticas sobre arte eletrônica e digital em publicações e catálogos no Brasil e no exterior. Entre 2004 e 2005 foi curador e coordenador nos eventos Sonarsound, Digitofagia e Nokiatrends. Em 2005 foi homenageado no XXe Videoformes, em Clermont-Ferrand,


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na França, com uma retrospectiva completa de seus trabalhos em vídeo, participou do festival ToShare, em Turim, na Itália, com uma instalação interativa, apresentou a obra O Pêndulo de Foucault, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, e realizou uma exposição individual em Londres, na Galeria HTTP - House of Technologically Termed Práxis – com a instalação SPIO, um sistema robotizado de auto-vigilância. Ainda neste ano participou ainda de outras importantes exposições como Cyphorg Citizens and Unwitting Avatars no New Lagon Arts, em Berkeley, EUA e Bel Horizon, na Bienale dArt Contemporain de Lyon, na França e na Bienale de LImage em Mouvement de Genebra, na Suíça. Em 2006 participou das coletivas Videometry, na Galerí dels Àngels, em Barcelona, Espanha e Interconect, no Zentrum für Kunst und Medientechnologie, em Karlsruhe, na Alemanha. PRINCIPAIS OBRAS: CURTO CIRCUITO ÚLTIMO SUSPIRO – 2014 Esta obra mostra uma instalação com 10 TVs de tubo e vídeos dessincronizados, que pulsam uma imagem “entranhada”, efeito colateral de sua


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condição eletrônica pré-digital. Retrato de precariedades e da obsolescência voraz nas tecnologias de imagens, onde emitem um “último suspiro” de raio catódico. Há algo de incômodo nesse refluxo, talvez por sermos testemunhas de uma arqueologia que opera em nosso presente. O lixo eletrônico causa fascínio e espanto. Há algo de aterrorizante em especular sobre o acúmulo de produtos industrializados que passam, em poucos anos, a não ter valor algum. Especula-se sobre o consumo, sobre o fluxo dos produtos, sobre o fim das coisas. Para onde vão as coisas que não queremos mais? O conjunto de TVs parece conflitante no espaço expositivo, mas ao mesmo tempo parece estar em estranha harmonia com o ambiente – algumas TVs parecem não funcionar a anos. Então, em algum momento, percebemos que algo ainda acontece nesse arsenal sucateado, enxerga-se um faiscar elétrico, as telas emitem lampejos, ouve-se uma pequena descarga, um possível curto-circuito. COISA LIDA [SP_URBAN] Coisa Lida responde em tempo real aos estímulos visuais e sonoros dos arredores. De acordo com os sons e imagens captados na Avenida Paulista, palavras de poesias pré-selecionadas aparecem no vídeo, em ritmo inconstante. Na intenção de transformar em imagens a aceleração e os fluxos locais, o projeto envolve um sistema de detecção de movimentos a partir de um Kinect instalado no Mirante da Al. das Flores, em frente ao edifício FIESP/ SESI, que “enxerga” o fluxo de carros na Av. Paulista e torna o fluxo de poemas uma espécie de comentário do próprio ambiente. O Gabinete de Alice faz referência aos Gabinetes de Curiosidades, ou Quartos das Maravilhas (Wunderkammer), populares nos séculos XVI e XVII, que de certa forma antecederam os museus e exposições atuais. Os gabinetes daquele tempo reuniam instrumentos tecnicamente avançados e curiosidades advindas de pesquisas e explorações associadas ao con-


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texto das grandes navegações e descobertas. O projeto é resultado de uma analogia entre essas referências, o espaço informacional que nos rodeia e a percepção alterada de Alice de Lewis Carrol – em alusão livre e colateral.

A instalação surgiu da vontade de uma experiência: a de conduzir estados sensoriais através de recursos tecnológicos diversos, em técnicas de manipulação da percepção. É um sistema em estado de pesquisa. Em algum ponto, pensamos, esse processo se encontra com a arte. Em algum momento, faz ver talvez, nossas capacidades fisiológicas. Ou esbarra em hábitos perceptivos arraigados. Em alguma das situações criadas evidencia com certeza, estados subjetivos em relação às situações criadas. Ou aponta um entendimento de arte que absorve experiências alheias a seu


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sistema. E é em torno desse ponto difuso de confluências e coexistências, que o projeto foi se estruturando.

O desafio envolveu cerca de dois anos de desenvolvimento, permeados por um pensamento crítico acerca do uso das tecnologias atuais no sentido de conscientização de nossas capacidades sensoriais e fisiológicas — uma das questões centrais no projeto é a relação do ambiente com a fisiologia do corpo, um acontecimento constante e presente (em continua negociação), que molda nossa subjetividade. O Gabinete situa-se assim nessa fronteira difusa, quase improvável, entre conhecimentos produzidos no campo da fisiologia do sistema nervoso autônomo, envolvendo o entendimento de ambientes imersivos, embutidos de certa inteligência programada, buscando entender como esses espaços híbridos podem reduzir ou aumentar a nossa potencia sensorial perceptiva.


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É um projeto que arrisca o instável, o indefinido, e convida o público a pensar em formatos que se expandem que permitem pensar a arte para além de padrões pré-configurados, em contato com campos a serem experimentados, na prática, na tessitura do que escapa.

REFERÊNCIAS BAMBOZZI, LUCAS. Site Oficial. Disponível em: http://www.lucasbambozzi.net/. Acesso em 29 de Abril de 2016. BAMBOZZI, LUCAS. Sobre. Disponível em: http://www.redbullstation.com.br/lucas-bambozzi- adrenalina/. Acesso em 29 de Abril de 2016.


LUCIO JOSÉ DE SÁ LEITÃO ARTISTA MULTIMÍDIA

ESCRITO POR: PAULO CESAR RAMOS DE ALBUQUERQUE


PERFORMANCE Segundo o iDicionário Aulete, performance significa “desempenho em uma exibição” ou “evento geralmente improvisado em que o(s) artista(s) se apresenta(m) por conta própria”. Originada do idioma francês antigo, a palavra performance vem de accomplir – parformer, que significa concluir, conseguir, cumprir ou fazer. Pode ser identificada como alguma tarefa que tem a sua realização feita com êxito. A expressão vem do latim, idioma em que se forma pelo prefixo per + formáre, significando estabelecer, dar forma ou formar. Porém, em explicações mais simplificadas, pode ter o sentido de execução de uma tarefa qualquer. A palavra performance veio do inglês à língua portu-


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guesa recentemente e é uma forma de estrangeirismo. É utilizada com maior frequência no campo artístico. Serve para análises de apresentações como malabarismo, mímica, mágica, teatro, canto e dança, em referência aos performers. Na América do norte, durante o século XX, surgiu de um gênero de arte chamado Performance Art, resultante da síntese do teatro, cinema, dança, poesia, música e artes plásticas. Performances são divididas da seguinte forma: musicais (concerto e recital) e teatrais (teatro musical, dança moderna, ballet, operetta, ópera e teatro). Ainda podem ser caracterizadas como mágica, leitura de poesia, arte viva, performance arte, apresentações circenses e leituras de histórias. No Brasil, o pioneiro foi Flávio de Carvalho, representante do Movimento Modernista interessado pelo experimental. Uma de suas performances mais polêmicas foi quando começou a andar no sentido contrário de uma procissão de Corpus Christi. Ele vestia uma boina verde e uma blusa de manga curta. Sua ação perturbou os integrantes da procissão, que quase o lincharam. O Flávio acabou na delegacia pelo episódio. Outra de suas apresentações ocorreu no centro histórico da cidade de São Paulo. Flávio saiu de seu ateliê e começou a caminhar pelas ruas da região central com uma blusa de mangas curtas e sandálias de couro, saia verde e uma meia arrastão. Com isso, queria mostrar que esta seria a forma mais adequada de se vestir no Brasil. Além disso, era uma forma do artista criticar a moda que vinha da Europa, onde o clima é frio. Existem casos em que a performance arte é extrema. Chris Burden, artista norte-americano, chegou a rastejar por um piso lotado de cacos de vidro, foi crucificado em cima de um automóvel e levou tiros em suas apresentações. Voltando para o Brasil, temos vários nomes, mas tem um que dispensa


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comentários e com certeza fez e ainda está fazendo parte dessa estética: Lucio José de Sá Leitão Agra. O presente trabalho apresenta um pouco de sua vida e obra,e, como complemento de pesquisa, uma entrevista, que explora alguns pontos que ele ainda não havia sido questionado. LUCIO JOSÉ DE SÁ LEITÃO AGRA Graduado em Letras Português Literaturas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1982), Licenciado em Letras Português Literaturas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1982), mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1993) e doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998). Atualmente professor e Doutor na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo na Graduação em Comunicação e Artes do Corpo (Em performance) e no PEPG de Comunicação e Semiótica, Linha de Pesquisa 1 (Regimes de Sentido). Experiente na área de Comunicação, com ênfase em Semiótica das Artes, atuando principalmente nos seguintes temas: poesia - poética - novas tecnologias, performance - artes do corpo, performance, poesia - poesia eletrônica e digital e performance- arte, tecnologia e vanguardas, teorias da comunicação. Além dessas atividades também é artista da performance e curador.

Videocasts Portal Cronópios do youtube, entrevista com Lucio Agra

Esse é um breve resumo da biografia de um dos ícones da comunicação brasileira, destacado nesse livro pelo aspecto de metamorfose, quem mais se adapta as mudanças. Desde o inicio de sua carreira, ele sempre foi irreverente, até nas apresentações de faculdade, ele sempre buscava uma coisa mais autentica, como na imagem a seguir, ainda como estudante, recitando “Verbal”.


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Ele relata que os poemas que ele escrevia não eram apenas para ser lido ou recitado, pois sempre faltava alguma coisa: a performance, que sempre fez parte de sua vida e obra até antes dele saber o que isso era de fato. Videocasts Portal Cronópios do youtube, entrevista com Lucio Agra Durante a adolescência até primeira graduação, começou a fazer teatro amador, mas isso foi ficando cansativo. Por volta dos anos 80, deixou o teatro, para onde voltou mais tarde, porém como artista essencialmente performaático, reconfigurando os trabalhos que já tinha feito, como ele mesmo diz: “Muitos dos meus poemas não é pra ser dito, é para ser performados”.

Conforme foi passando o tempo, ele foi juntando os materiais e as ideias, um dos pontos de junção desses materiais foi por volta dos anos 2000, quando foi feito pela primeira vez a “Ilusionates do cultivitas” no instituto Goethe, em pinheiros. Um segundo ponto dessa junção foi já em 2007 quando Lucio e o Paulo Hartmann fizeram um dueto, na apresentação “(DEMO)LIÇÃO” no “Divan du monde” em Paris. Esse trabalho, que está em processo até hoje, vem sendo apresentado e aperfeiçoado a cada apresentação. Por volta de 2011, foi feito um programa chamado (Passaporte Poético), onde o Lúcio foi chamado para fazer parte, dentre os brasileiros nesse programa temos Paulo Hartmann, Arnaldo Antunes, Marcelo Sahea e Ricardo Castillo. O passaporte consistia em promover artistas da América Latina e da Europa, uma curiosidade, Lucio e Arnaldo, nunca trabalharam juntos diretamente, mas fizeram algumas coisas, por exemplo um evento em homenagem ao Haroldo de campos (1923-2003) poeta, que foi lembrado por eles.


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Cena do espetáculo (DEMO)LIÇÃO

Lucio também é um baterista, desde a época de “Punk” em sua juventude, ele sempre gostou de musica, porem não se considera um exímio baterista, usa hoje suas baquetas, para completar sua performance. O trabalho dele consiste basicamente em musica, poesia e performance com o experimento delas juntas, sempre com originalidade e inovação. Lucio cedeu uma pequena entrevista por e-mail, nessa entrevista, foram questionados aspectos pouco explorados nas pesquisas e em outras entrevistas que o artista cedeu. O contato não foi demorado, e a entrevista por mais simples que seja, foi respondida com seriedade e acima de tudo com respeito, como já era de esperado, fui surpreendido em algumas vezes! ENTREVISTA Depois de tanto tempo trabalhando com performance, você acha que as novas mídias, de 1990 pra cá, ajudou ou foi uma barreira no seu no “modo de operação” e criação? Lucio Agra: Não creio que a demarcação temporal a partir de 1990 faça


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muito sentido. Na verdade, é preciso ressalvar que novas mídias existem desde que as mesmas existem, quero dizer, a televisão quando surgiu era uma nova mídia assim como o cinema. O vídeo portátil surgiu no começo dos anos 70,na época ainda uma tecnologia cara e somente disponível em países desenvolvidos. Ainda assim o seu uso se prestou muito bem à articulação com a performance, cujo desenvolvimento também se deu nessa época. O que se convenciona chamar de “novas mídias” está intrinsecamente ligado à performance e seus desenvolvimentos. No meu caso todo o processo de produção em performance, durante o período em que intensifiquei essa atividade, esteve ligado ao uso da tecnologia em conexão com o corpo. Foi, portanto, fonte primária de criação, ao menos para mim. Qual é o seu método para criação? Existe um limite? Lucio Agra: O limite de toda a criação, a princípio, é somente a morte do criador. Mesmo isso não é um limite pois sua obra pode ultrapassá-lo. Num sentido mais estrito, há certas modalidades de performance com as quais não trabalho por não ter com elas uma afinidade estética. Não há um método Lucio em apresentação junto com o Hartmann específico de criação. Cada situação me diz como devo proceder. Mas existem algumas premissas que busco observar, por exemplo: tento conhecer o contexto de um lugar onde vou fazer uma performance, tanto quanto possível. Existe uma boa ideia ou toda ideia é boa? Vale tudo na hora de criar? Lucio Agra: Decerto não existem ideias boas ou más. O critério de bom ou ruim é de natureza muito pessoal. Uma performance pode não me agradar mesmo sendo, eventualmente, algo até bastante conhecido e


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prestigiado. Mas é uma questão minha, que não tem validade universal. “Vale tudo” é um termo um pouco forte. Dá a entender que o criador sobrepaira a realidade, o que não é verdadeiro. Nem sempre se pode fazer o que quer. É bem aquela história que vem da psicanálise: o confronto entre o princípio de prazer, o desejo da criação e o princípio de realidade, que passa até pela própria sobrevivência. Como era fazer performance na ditadura? Havia contrapontos do governo? Lucio Agra: Eu não sou da geração que fez performances no período da ditadura. Minhas primeiras incursões, ainda sem saber ao certo o que fazia, já ocorreram dentro do clima de “abertura” política, a partir dos anos 80. Não conheci, felizmente, as dificuldades da censura mas certamente havia confrontos - não somente contrapontos - com o governo então vigente. Uma performance histórica como a de Antonio Manuel que, no início dos anos 70, despiu-se na abertura de um salão no Museu de Arte Moderna do Rio, poderia ter-lhe custado prisão e tudo o mais. Não é possível imaginar que, em uma ditadura, haverá contemplação para as artes experimentais. A história prova exatamente o oposto. No assunto “Brasil e performance”: qual a sua perspectiva sobre ela no Brasil? Lucio Agra: A performance, no Brasil, sempre acompanhou os movimentos internacionais. Mas, de tempos em tempos, era esquecida, já que sempre foi tratada como uma espécie de “moda” artística. Não é muito diferente do que se passa agora exceto por um detalhe importante: ao contrário de décadas anteriores a performance, hoje, é uma prática artística e uma área de conhecimento e pensamento, progressivamente reconhecida mesmo na Universidade. Isso faz toda a diferença no sentido de irmos percebendo, também, como no Brasil ela é relevante para o


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entendimento de nós mesmos e de nossa arte, na qual o corpo tem um papel singular e central. Estamos passando no Brasil, um movimento politico muito multimidiático. O digital é sem duvida uma arma muito poderosa de comunicação. Pensando por essa linha de raciocínio, como a performance pode ajudar na “reconstrução” do país? Lucio Agra: Outra correção: o momento é midiático, sem o multi. De fato, o universo digital tem sido importante para relativizar o que a mídia oficial publica (vide Mídia Ninja, Jornalistas Livres) atestando a decadência dessa forma de comunicação que já foi hegemônica nos anos 70, 80 e 90. É preciso lembrar que a criação de uma rede nacional de televisão não teria acontecido sem o decisivo auxílio e estímulo do regime militar que produziu inclusive as condições de infraestrutura para que isso acontecesse. Não vejo, pessoalmente, nenhuma perspectiva de reconstrução do país com o cenário que aí está. Vejo a destituição ilegal de um governo precisamente porque este (e os que o antecederam nos últimos 13 anos) inverteu as prioridades de investimento no país, desagradando a uma elite que ainda vê o país numa perspectiva que não mudou muito nos últimos 500 anos. De modo que a performance tem sido, politicamente, a afirmação de tudo aquilo que essa elite quer eliminar, ou seja, a diversidade de gênero, o respeito às diferenças, a emancipação da população pobre etc. A performance não “ajuda” mas afirma essa perspectiva progressista, o que significa que ela pode vir a sofrer muitos reveses se esta for derrotada nos próximos tempos, no Brasil.


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REFERÊNCIAS Dicionarios, porto editorial Infopédia. Pesquisa da palavra Performance. Disponível em: http://www.infopedia.pt/$performance-art CNPQ, Lattes. Lattes Lucio Agra. Disponível em: http://lattes.cnpq.br/1612568211757701 Agra, Lucio.Palestra de discursão “Performance”. Disponível em: http://www.spescoladeteatro.org.br/noticias/ver.php?id=616. Acesso em 24 mai. 2016.


PRISCILA ALMEIDA CUNHA ARANTES DIRETORA ARTÍSTICA, PESQUISADORA E CURADORA NO CAMPO DA ARTE CONTEMPORÂNEA E MIDIÁTICA.

ESCRITO POR: WILMA GOMES


VIDA E OBRA DE PRISCILA ARANTES Priscila é diretora artística, crítica, curadora, pesquisadora no campo da arte contemporânea e gestora cultural. Sua pesquisa é de natureza interdisciplinar e se concentra principalmente nos seguintes temas: estéticas tecnológicas, mídias digitais, cultura digital, arte contemporânea, arte midiática, processos criativos, crítica e curadoria. É formada em filosofia pela Universidade de São Paulo, possui mestrado e doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós doutorado em Arte Contemporânea pela Pennsylvania State University (USA) e UNICAMP.


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É professora do Mestrado e Doutorado em Design da Universidade Anhembi Morumbi, coordenadora do grupo cadastrado no CNPq Design, Arte e Memória: perspectivas contemporâneas e professora de pós-graduação e graduação da PUC/SP desde 2002 atuando no curso de Arte: História, Crítica e Curadoria e Tecnologia e Mídias Digitais. É diretora e curadora do Paço das Artes, instituição da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo desde 2007 e entre 2007 e 2011 foi diretora adjunta do MIS (Museu da Imagem e Som). É membro do CAA (College Art Association/USA) e da ANPAP (Associação Nacional de Artes Plásticas), sendo que entre 2008 e 2012 foi membro do Conselho Deliberativo da Associação. Atualmente integra o grupo de pesquisa cadastrado no CNPq: História, Arte, Crítica e Curadoria e o Conselho Editorial do Journal of Science and Technology of the Arts (Portugal). Entre os prêmios recebidos destacam-se o prêmio da Getty Foundation (USA), em 2012 e o 48 Prêmio Jabuti (finalista) pela publicação Arte @ Mídia: perspectivas da estética digital (FAPESP/SENAC). É autora de Arte @ Mídia: perspectivas da Estética Digital (SENAC/ FAPESP), Re/escrituras da Arte contemporânea: história, arquivo e mídia (Ed. Sulinas) de Estéticas tecnológicas: novas formas de sentir (EDUC/SP), co-autora de Arte: História, crítica e curadoria. É parecerista da CAPES/MEC na área de artes, participa de inúmeros congressos nacionais e internacionais tais como ANPAP, COMPOS, P@D e ISEA e integra inúmeros júris de prêmios em arte contemporânea. Entre suas curadorias destacam-se Arquivo Vivo (Paço das Artes) e I/legítimo: dentro e fora do circuito (Museu da Imagem e Som), Isso é Osso disso: Lenora de Barros (Paço das Artes), entre outros.


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Em 2010 integrou o Conselho Editorial da Revista do Polo de Arte Contemporânea da Bienal Internacional de São Paulo. ENTREVISTA Conte sobre o percurso de sua vida e carreira. Onde você nasceu em quais outros lugares morou e como descreveria sua infância? Desde criança você já imaginava que seria quem é hoje? Nasci em São Paulo nos anos 60, mais precisamente em 1966. Nesta época o Brasil vivia já dentro do contexto da ditadura militar. Tive uma infância bastante turbulenta por que, em função da ditadura militar e pelo fato de meus pais terem uma atuação política, vivemos clandestinamente durante vários anos no Brasil. Quando meu pai foi preso político, eu tinha 10 a 11 anos e morei durante uns 2 anos em Belo Horizonte com minha avó materna. Nesta época tive contacto com a pintura e com o mundo das artes.


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Você se formou em filosofia pela USP, como surgiu esse interesse e quando decidiu trabalhar com arte e mídias digitais? Sempre gostei muito de ler e o campo da filosofia se tornou um local propício para “dar conta” deste meu interesse. Na faculdade me aprofundei nos estudos relacionados não somente à filosofia contemporânea, mas ao campo de estudos de estética e filosofia da arte. Foi ainda na USP que me deparei com autores, como Walter Benjamin e a Escola de Frankfurt que abordavam não somente a discussão da área da cultura e das artes como um lócus privilegiado para entender o mundo contemporâneo, mas também procuravam entender o impacto dos meios tecnológicos na percepção atual. Quais artistas e teóricos você considera mais importantes? Walter Benjamin, dentre outros teóricos da escola de Frankfurt, como Adorno e Hokheimer, neste sentido, foram teóricos bastante importantes na minha formação na faculdade tanto que meu mestrado, já desenvolvido no programa de Comunicação e Semiótica da PUC/SP, era uma espécie de releitura de algumas teses benjaminianas nos movimentos de vanguarda. Autores como Vilém Flusser, Deleuze, são e continuam sendo fundamentais para as minhas pesquisas. Mais recentemente tenho trabalhado bastante também com Aby Warburg, Didi-Huberman, Foucault, Lev Manovich em função de minhas pesquisas mais recentes relacionadas a banco de dados e memória. Como autora, você escreveu a obra Arte@Mídia. Fale um pouco sobre essa obra e o que te levou a escrevê-la. A aproximação com Walter Benjamin no mestrado em um programa de Comunicação a Semiótica me conduziu ao meu estudo de doutorado Arte @ Mídia. O livro é não somente uma espécie de cartografia dos artistas


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que trabalham na interface com novos meios, mas especialmente uma discussão sobre os pressupostos da percepção e da estética em um mundo permeada pelos dispositivos tecnológicos. É um livro não somente de história da artemídia no Brasil, mas de discussões no campo mais conceitual. Neste livro desenvolvo o conceito de interestética ou estética da interface, ou seja, um conceito que aponta para a idéia de que a percepção contemporânea é uma percepção permeada e moldada pelos dispositivos tecnológicos. Em 2012, você escreveu a obra Arte@Mídia: perspectivas da estética digital, que inclusive foi premiado pela Getty Foundation (USA), em 2012 e finalista do 48º Prêmio Jabuti. Como foi receber a premiação? Ganhar um prêmio ou ser finalista é sempre uma honra. Por outro lado é um incentivo muito grande para que continuemos a pesquisar. Em 2015, você também escreveu a obra Re/Escritura(s) da Arte Contemporânea: história, arquivo e mídia. Qual sua maior inspiração para produzir essa obra? Em 2005 publiquei o livro Arte e Mídia: perspectivas da estética digital, resultado de minha pesquisa de doutorado que teve como proposta realizar uma leitura das produções artísticas que atuam na interface com os meios de comunicação e mídias digitais. Esta pesquisa pode ser vista não somente como um ‘mapeamento’ da artemídia no Brasil, mas também, como uma contribuição da mídia arte brasileira dentro do contexto mais geral da história da arte e cultura contemporânea. A pesquisa de doutorado, por lidar com projetos muitas vezes efêmeros e em processo, despertou em mim o interesse pelas questões que perpassam a documentação, o registro e o arquivo no contexto da arte contem-


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porânea abrindo caminho, assim, para a pesquisa de pós-doutorado, Re/ Escrituras da arte contemporânea: história, arquivo e mídia, desenvolvida junto à Pennsylvania State University, nos Estados Unidos, no ano de 2012. O interesse pelo arquivo e o banco de dados em diálogo com a arte contemporânea surgiu, ainda, a partir de minha trajetória, como diretora e curadora, durante os anos de 2007 a 2014, junto ao Paço das Artes, equipamento cultural da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. O Paço das Artes, por não ser um museu no sentido estrito da palavra e, portanto, por não possuir uma coleção de obras de arte e por atuar na promoção e difusão da jovem arte contemporânea brasileira, me sugeria que o registro e a documentação dos projetos que por ali passavam eram um dispositivo fundamental, senão primordial, para a construção da memória e história de parcela significativa da produção artística desenvolvida em nosso país. Foi dentro destas duas perspectivas, a acadêmica e a curatorial, que nasceu o livro Re/Escrituras da arte contemporânea: história, arquivo e mídia. Você foi diretora e curadora do Paço das Artes e também diretora do MIS. Existe algum projeto em especial que você mais gostou de desenvolver e como era organizar os eventos? O Paço das Artes, por não ser um museu no sentido estrito da palavra e, portanto, por não possuir uma coleção de obras de arte e por atuar na promoção e difusão da jovem arte contemporânea brasileira, me sugeria que o registro e a documentação dos projetos que por ali passavam eram um dispositivo fundamental, senão primordial, para a construção da memória e história de parcela significativa da produção artística desenvolvida em nosso país.


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Sem pretender fazer um mapeamento de curadorias e projetos desenvolvidos no Paço das Artes gostaria de chamar atenção para uma espécie de trilogia sobre o arquivo e banco de dados que desenvolvi durante os anos de 2010 a 2013 no Paço das Artes. São eles: projeto Livro Acervo, Para Além do Arquivo e Arquivo Vivo. LIVRO ACERVO O primeiro projeto, Livro Acervo, foi idealizado por mim no ano de 2010 em função da comemoração dos 40 anos do Paço das Artes. A idéia inicial do projeto foi a de desenvolver uma ‘grande’ curadoria que não somente pudesse resgatar a memória do Paço das Artes - os atores e agentes que fizeram parte de sua história, - mas a de oferecer ao público a possibilidade de ter acesso a uma curadoria para além do espaço expositivo tradicional. Foi dentro desta perspectiva que nasceu a idéia de desenvolver não somente uma curadoria no espaço do livro - como uma espécie de curadoria portátil e circulante – mas também de desenvolver uma curadoria a partir do ‘arquivo’ e ‘acervo’ da instituição: a partir de um de seus mais importantes projetos: a Temporada de Projetos. A partir desta idéia preliminar convidamos para desenvolver a primeira curadoria do projeto, os artistas Arthur Lescher e Lenora de Barros. O projeto foi composto por 3 partes principais. Na primeira delas, 30 artistas que passaram pela Temporada de Projetos foram convidados a desenvolver um trabalho inédito em folhas de papel (como é o caso do flip book Naufrágio, desenvolvido pela artista Laura Belem). Estes trabalhos foram impressos como cópias para distribuição e encartados em conjunto com os outros itens que compunham o projeto. No mesmo encarte dos cadernos trabalhados pelos artistas, temos a Enciclopédia, segunda parte do projeto, com informações sobre cada um dos artistas, curadores e júri que participaram da Temporada de Projetos desde sua primeira edição. A terceira parte do projeto era composta por uma obra sonora de


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até um minuto de duração, encartado em um cd ROM, desenvolvida pelos artistas e curadores que participaram da Temporada de Projetos. Cabe ressaltar que o projeto (constituído por estas três partes) recebeu a forma de uma caixa/arquivo – proposta desenvolvida pelos designers convidados Celso Longo e Daniel Trench- fazendo alusão exatamente à idéia de que este dispositivo contém uma parcela importante da história do Paço das Artes e de parcela da jovem arte brasileira. PARA ALÉM DO ARQUIVO O segundo projeto desta trilogia é a mostra Para além do arquivo, realizada em 2012. A curadoria, realizada em co-autoria com Cauê Alves, foi apresentada em dezembro de 2012 no CCBN (Centro Cultural Banco do Nordeste) como parte de uma parceria de intercâmbio de acervos entre o Paço das Artes e o Centro Cultural Banco do Nordeste. Para além do arquivo, foi uma mostra sobre o acervo imaginário do Paço das Artes e foi elaborada a partir da memória da instituição: vivências, catálogos, livros e documentos diversos. A exposição apresentou a produção de 15 artistas que se aproximavam de questões ligadas a arquivos e dispositivos de registros e que passaram pelo Paço das Artes em diferentes projetos e mostras. Carla Zaccagnini, Edith Derdyk, Fabiano Marques, Fabio Morais, Lenora de Barros, Mabe Betônico, MarcellVs L., Marcius Galan, Nino Cais, Odires Mlaszho, Raquel Kogan, Regina Parra, Rodrigo Matheus e Tatiana Blass foram os artistas convidados para o projeto. Apesar de possuir pontos em comum com o projeto Livro Acervo - uma vez que ambas curadorias partiam do ‘acervo imaginário’ do Paço das Artes, isto é, dos artistas que de alguma maneira já tinham passado pelo Paço das Artes seja através da Temporada de Projetos ou de outros projetos expositivos ocorridos na instituição - o foco principal de Para Além do Arquivo foi o de incorporar projetos em que o arquivo, a coleção


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e o registro fossem questões presentes nas obras dos artistas escolhidos. Este foi o caso de uma obra da série de Livros-mochila de Odires Mlaszho - mochilas feitas com livros e catálogos de empresas de peças de automóvel - de Display para arquivos fantásticos, em que os artistas Rodrigo Matheus e Amanda Dafoe apresentam um móvel/arquivo, problematizando os aparatos expositivos de arquivo, ou até mesmo as colagens da série Versailles de Nino Cais, em que o artista realiza colagens a partir de imagens de livros antigos adquiridos em sebos. Importante sinalizar, no caso específico deste projeto, o catálogo da exposição desenvolvido por Guilherme Falcão. O catálogo foi pensado como uma matriz que podia ser montada como o público quisesse, com folhas independentes com informações das obras que faziam parte da exposição. O público podia então xeroxar as páginas que tinha interesse e montar o seu catálogo/arquivo da maneira que lhe conviesse. ARQUIVO VIVO O último projeto da trilogia é a curadoria Arquivo Vivo, de minha autoria, exposta no Paço das Artes em outubro de 2013. Diferentemente dos dois projetos anteriores Arquivo Vivo não se fixou somente nos artistas que passaram pelo Paço das Artes, mas expandiu o debate para questões que perpassam o arquivo dentro de perspectivas diversas. Artistas que se apropriam de material de arquivo, que criam arquivos fictíticos, que desenvolvem projetos a partir de uma modalidade arquival, que reencenam obras conhecidas da história da arte, artistas que colocam em debate os processos de catalogação e arquivamento, artistas que incorporam o arquivo no próprio tecido corporal, são alguns dos procedimentos incorporadas em Arquivo Vivo. Investigar como e por quê parcela da arte contemporânea tem se debruçado em questões que perpassam o arquivo e o arquivamento é o


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desafio colocado pelo projeto Arquivo Vivo a partir da articulação de três vetores principais: • • •

Arquivo e apropriação de documentos e obras da história e da história da arte Arquivo no corpo e Corpo como arquivo Arquivos de artista, arquivo institucional e banco de dados

No primeiro vetor encontramos projetos que muitas vezes se apropriam de documentos da história ou reencenam obras/documentos emblemáticas da história da arte. Ao se apropriar destes arquivos/documetos, o artista desconstrói e modifica seu sentido ‘original’ apontando para a idéia de que o arquivo esta sempre aberto a outras leituras e interpretações. Dentro de um segundo vetor encontramos projetos que consideram o corpo como uma espécie de arquivo e/ou que incorporam o arquivo no próprio tecido corporal. O corpo, aqui, pode ser entendido como uma espécie de escritura que incorpora marcas, rasuras, indícios siginificantes de um um corpo/mensagem em constante processo de construção de sentido. Dentro de uma última perspectiva encontramos não somente projetos que colocam em cena arquivos pessoais e/ou institucionais mas, também, propostas que criam complexos sistemas de classificação e banco de dados em meios diversos. Muitos destes trabalhos evidenciam e problematizam questões específicas dos procedimentos de arquivamento como uma espécie de metaarquivo. As obras apresentadas no projeto não entendem o arquivo, portanto, como algo concluído, mas ao contrário: veêm o arquivo como um dispositivo sempre aberto a novas e diferentes proposições. Masaki Fujihata, Raquel Kogan, Rejane Cantoni e Leonardo Crescenti, Lucas Bambozzi,


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Christian Boltanski, Eduardo Kac, Hiraki Sawa, Pablo Lobato, Cristina Lucas, Regina Parra, Mabe Bethônico, Rosângela Rennó, Edith Derdyck, Voluspa Jarpa, Ivan Navarro e Mario Navarro, Nicola Costantino, Yinka Shonibare MBE, Marilá Dardot, Vesna Pavlovic, Paula Garcia, Berna Reale, Letícia Parente foram os artistas presentes na exposição que foi ainda acompanhada por mesas redondas e debates em torno do arquivo no contexto da arte contemporânea. Por ultimo, e dando continuidade à trilogia curatorial antes citada e com o objetivo de atuar no diálogo com a memória da arte contemporânea e contribuir para a construção de outras narrativas da história da arte brasileira, que concebi e implantei o projeto MaPA: Memória Paço das Artes (https://mapa.paçodasartes.org.br). MaPA é uma plataforma digital de arte contemporânea que reúne todos os artistas, críticos, curadores e membros do júri que passaram pela Temporada de Projetos desde sua criação em 1996. O lançamento da plataforma digital MaPA em novembro de 2014 no Paço das Artes foi acompanhada pela abertura de uma exposição homônima que disponibilizou ao público parcela do arquivo e documentação da instituição. Durante o mês de lançamento da plataforma e da exposição ocorreu uma zona de ação. Repleta de atividades, essa programação cultural – formada por artistas e projetos que dialogavam com o caráter experimental do Paço das Artes- potencializou as visitas à instituição, expandindo a visibilidade da exposição e a difusão da Temporada de Projetos a partir da plataforma digital MaPA. A plataforma é composta por um banco de dados com mais de 870 imagens das obras expostas na Temporada de Projetos, aproximadamente 270 textos críticos e 10 vídeos-entrevistas que foram especialmente desenvolvidos, desde 2014, para este projeto. Reunindo mais de 240 artistas, 14 projetos curatoriais, 70 críticos de arte e 43 jurados, a platafor-


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ma foi construída como um dispositivo relacional e um work-in-progress oferecendo ao pesquisador a oportunidade de ter acesso às informações a partir das relações existentes na Temporada de Projetos. Já na home do MaPA o público é apresentado por meio de um sistema randômico a uma série de nomes (de artistas, críticos, curadores e membros do júri que passaram pela Temporada). Ao passar o mouse sobre qualquer um desses nomes-links, o MaPA destaca, por meio de negrito, os demais nomes envolvidos naquela edição da Temporada. É assim que se inicia a pesquisa na plataforma MaPA: como um dispositivo relacional que permite conhecer a trajetória de cada artista juntamente com o crítico que o avaliou e o júri que o selecionou. O destaque atribuído a essa história “relacional” explica-se ao dialogar com a proposta da própria Temporada de Projetos que, ao selecionar artistas, curadores e críticos em início de carreira, atua como um lançador de talentos no cenário artístico. É por essa razão que a organização e referência às informações na plataforma são feitas através dos nomes dos artistas, curadores e críticos, valorizando as trajetórias e o desenvolvimento criativo de todos os envolvidos na produção e sistema da arte contemporânea. Por outro lado, a navegação é bastante amigável oferecendo ao pesquisador facilidade na busca de conteúdos: “as categorias de classificação do conteúdo - os anos das temporadas, o alfabeto e os modos de participação: artistas, curadores, críticos e membros do júri - foram tratados como elementos fixos e orientam a arquitetura da página. A situação proposta é permitir uma facilidade de visualização de todo o banco de dados a partir de diferentes modos de ordenação dos dados. O processo de elaboração gráfica foi atravessado por referências de um repertório visual de arquivos”, sinalizam os designers convidados para o projeto Claudio Bueno e Vitor Cesar. Desenvolvido com a tecnologia PHP e software livre, o trabalho de visu-


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alização dos dados na plataforma, como revela o programador envolvido no projeto, André Escudeiro, “rompeu os padrões do banco de dados, transformando-se numa camada completamente independente. Ou seja, a navegação e usabilidade não precisaram ficar presas na tecnologia. Pudemos extrapolar esta limitação para o universo do pesquisador. Esta concepção, antes vista somente nos olhares da ficção, passou a ser possível nos últimos anos, sempre que a tecnologia e o artista trabalham juntos”. Finalmente o MaPA pode ser visto não somente como um dispositivo de resgate de parcela da trajetória do Paço das Artes e do ‘acervo’ da instituição, mas também, como um dispositivo fértil de pesquisa para todos aqueles interessados nos rumos da jovem arte contemporânea brasileira. Por último, mas não menos importante o MaPA é um veículo disparador para a construção de outras narrativas da história da arte brasileira, da jovem arte brasileira, que muitas vezes não tem oportunidade ou não aparecem nos discursos da história da arte oficial. Talvez seja dentro desta perspectiva expandida que devemos pensar o museu no contexto contemporâneo. Trata-se não somente de criar estratégias de acesso ao acervo e às ações do museu, mas também de desenvolver dispositivos que possam contribuir para o entendimento do espaço institucional como local de produção de conhecimento e construção de novos e diferentes olhares em relação à produção e narrativas da arte. O que sua experiência profissional trouxe para a sua vida hoje? Você se sente realizada? Recentemente tenho me aproximado seja no campo curatorial quanto na atuação mais teórica em projetos e discussões que, de alguma forma, sejam eles tecnológicos ou não atuam dentro de uma perspectiva mais crítica e social.


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REFERÊNCIAS ARANTES, PRISCILA. Biografia. Disponível em: http://www.screen-projects.com/saopaulo/cartografia/priscilaarantes/. Acesso em: 14 Maio 2016. ARANTES, PRISCILA. Currículo Lattes. Disponível em: http://www.bv.fapesp.br/pt/pesquisador/103715/priscila-almeidacunha-arantes/. Acesso em: 14 Maio 2016.


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REGINA SILVEIRA ARTISTA MULTIMÍDIA, GRAVADORA, PINTORA E PROFESSORA

ESCRITO POR: LUCAS BARROS


BRASIL NA MULTIMÍDIA INTERNACIONAL Artista multimídia, gravadora, pintora, professora. Nasceu em Porto Alegre em 18 de janeiro 1939. Vive em São Paulo, Brasil. Concluiu seu bacharelado em pintura em 1959, no instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IA/UFGRS), convivendo com Aldo Locatelli (1915-1962) e Ado Malagoli (1906-1994), entre outros. Licenciou-se em desenho pela Faculdade de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). No início da década de 1960, teve aulas de pintura


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com Iberê Camargo (1914-1994), quem a influenciou fortemente. Também teve aulas de gravura com Francisco Stockinger (1919-2009) e Marcelo Grassmann (1925-2013), no Ateliê Livre da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Como bolsista do Instituto de Cultura Hispânica, em 1967, estudou na Faculdade de Filosofia e Letras de Madri. Em 1969, foi convidada a ministrar cursos na Faculdade de Artes e Ciências da Universidade de Porto Rico. Voltou para o Brasil em 1973, e coordenou até 1985 o setor de gravura da Faculdade de Artes Plásticas da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP). Em 1974, começou a lecionar na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Na mesma instituição, defendeu mestrado em 1980 e, em 1984, obteve o título de doutora. De 1991 a 1994, permaneceu em Nova York, com bolsas de estudo concedidas pela John Simon Guggnheim Foundation (1991), pela Pollock-Krasner Foundation (1993) e pela Fullbright Foundation (1994). Em 1995, recebeu bolsa de artista residente da Civitella Ranieri Foundation. Já em 2000, o Prêmio Cultural Sergio Motta. Sua produção inicial após sua formação em 1960, teve como foco principalmente figuras geométricas. Na década seguinte ela passou a utilizar mídias distintas em um mesmo trabalho de forma precursora, misturando fotografia, vídeo e colagem entre outros. Nos anos seguintes voltou-se para a ocupação do espaço, com o desenvolvimento de projetos que subvertiam a perspectiva, a representação e a percepção do espectador. Ganhou projeção internacional nos anos 1990, adquirindo diversos prêmios e bolsas de estudo. Nesse período, criou uma aproximação maior com a tecnologia , realizando uma forma de arte que ela define como “uma forma de computação


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feita à mão”. Aliou a especificidade de suas obras no contexto arquitetônico e espacial e suas impressões com jogos de luz e sombra e interferências diretas sobre os locais onde estão expostas. É uma forte influencia para artistas atuantes no cenário cultural do Brasil e do mundo. O trabalho de Regina Silveira, tem predominância gráfica, e brinca com a arquitetura e a vídeo arte, sendo pioneira desta última no Brasil. INFLUÊNCIAS Foi fortemente influenciada pela sua experiência de trabalho com o artista Iberê Camargo, tem trabalhos com tons soturnos, e gosto pela deformação dos signos . Também foi influenciada por Marcel Duchamp DEPOIMENTOS “Nunca me considerei gravadora, porque me incomoda a ideia de especialização em um único meio expressivo. Também não estou interessada na gravura em si. Artista é uma especialista em linguagens visuais. Gravura é apenas um dos meios no qual essas linguagens podem ser exercidas. A História da Arte está aí para nos lembrar de que os grandes gravadores também foram desenhistas e pintores. Minha postura multimídia se baseia nas possiblidades de construção de algo a partir de imagens gráficas de diferentes origens, nos mais diversos procedimentos gráficos. Sempre utilizei e misturei sem preconceitos serigrafia, off set, heliografia, xerox e até as técnicas tradicionais como a litogravura. Tudo aquilo que trata de reprodutibilidade me interessa, assim como me interessa a imagem impressa” - Regina Silveira. PRÊMIOS RECENTES Recebeu um prêmio em 2013, concedido pelo Masp, pelo conjunto da obra. Também recebeu o Prêmio Sérgio Motta de Arte e Tecnologia (2000), o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte pela exposição Claraluz (2003) o Prêmio Bravo Prime de Artes Plásticas por Mundus


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Admirabilis (2007) e o Prêmio de Artes para a Pintura/Vida e Obra, da Fundação Bunge (2009). ALGUMAS OBRAS

2010 - Tramazul, Museu de Arte de São Paulo

Em TRAMAZUL a imagem é a de um céu azul com nuvens claras, próxima às imagens de céus que se refletem nos vidros dos edifícios, com a diferença de estar construída como um gigantesco bordado em ponto de cruz. Nesses céus estendidos pelos quatro lados do museu, agulhas de grandes dimensões e virtualmente fincadas numa trama de azul intenso simulam bordar as nuvens espalhadas pelos vidros, com fios de três tonalidades – entre o branco e o cinza médio. TRAMAZUL se propõe como um falso reflexo e ao mesmo tempo como uma camuflagem que conecta o céu bordado do MASP com os outros céus vizinhos, reais ou refletidos, em um exemplo singular de arte pública ou urbana.


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MUNDUS ADMIRABILIS transportou para a caixa de vidro do CCBB inúmeros insetos escolhidos entre as espécies classificadas como daninhas. As imagens foram apropriadas de publicações de História Natural, e reproduzidas de tratados do século XVIII , onde busquei características específicas para os insetos que deveriam compor o MUNDUS ADMIRABILIS. Eles deveriam ser desenhados, com a sintaxe particular das ilustrações científicas pré-fotográficas, descritivas e muito detalhadas que, muitas vezes, incluíam espécies totalmente imaginárias.

2008 - Mundus Admirabilis e Outras Pragas


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REFERÊNCIAS SELIGMANN-SILVA, M., “Sombras e Luzes: Reprodução técnica e os rastros efêmeros do desaparecimento na obra de Regina Silveira”. Disponível em: http://www.pinacoteca.org.br/pinacoteca-pt/default. aspx?mn=545&c=acervo&letra=R&cd=2606. Disponível em: http://artescolegiobilac.blogspot.com.br/2011/02/biografia-deregina-silveira.html


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RICARDO ANDERÁOS FRAMEWORK CHANGE LEADER, EMPRESÁRIO E AMBIENTALISTA

ESCRITO POR: JOÃO PAULO BORGES


VISÃO EMPREENDEDORA, TATO PARA OPORTUNIDADES SOCIAL MEDIA E CORAÇÃO AMBIENTALISTA Ricardo Anderáos é Doutor em História Social da Arte pela Universidade de São Paulo (USP), jornalista e ambientalista, além de Framework Change Leader da ONG Ashoka (empresa que apoia o trabalho de empreendedores sociais) para a América Latina. Anteriormente foi diretor editorial do Huff Post Brasil (conhecido popularmente na web como Brasil Post), fruto de uma parceria entre a Editora Abril e o portal The Huffington Post, tendo ele próprio colaborado para tal lançamento no país, em janeiro de 2014.


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É sócio fundador da empresa de comunicação digital Latitude 0º, que desde 1995 ajuda empresas a se reinventarem nesta fronteira, o que alavancou outros projetos profissionais em plataformas digitais, trabalhando como webmaster no UOL, New Media Manager no Itaú Cultural, Editor-Executivo do Estadão.com, Diretor de Negócios Online no Grupo Bandeirantes e Diretor de Mídias Digitais na hoje extinta emissora aberta MTV Brasil. Antes de se tornar Diretor Editorial do Brasil Post, foi Diretor de Mídias Sociais do Grupo Abril. Iniciou sua carreira em 1988 como repórter e depois, correspondente internacional da Folha de São Paulo até 1993, mudando-se para Madrid nesse período.

Anderáos em ONG

Criou e editou o Link Estadão, produto crossmídia sobre comportamento e tecnologia, com cadernos semanais em O Estado de S. Paulo e no Jornal da Tarde. Foi o diretor editorial da versão paulistana do jornal Metro International, e responsável pela implantação desse periódico gratuito no Brasil. Assinou a coluna de tecnologia nas rádios Band News FM e Eldorado FM, e por 10 anos na revista Carta Capital.

Anderáos tem participação fundamental na história das mídias digitais no Brasil, pois criou em 1994 o primeiro veículo de mídia digital conhecido como NEO Interativa – a revista em CD-Rom. Ricardo passa metade de sua semana em Ilhabela, no litoral norte de São Paulo, onde vive com a esposa e três filhos. Na Ilha dirige a ONG ambiental Viva Floresta, iniciativa que combina um viveiro de árvores nativas da Mata Atlântica (floresta tropical mais ameaçada do planeta) e uma plataforma digital que tem como missão transformar todas as pessoas em


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plantadoras de árvores. É representante das ONGs paulistas no Conselho Estadual do Meio Ambiente de São Paulo. PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES PARA A MULTIMÍDIA BRASILEIRA Neo Interativa: Quando criou a NEO, primeira revista interativa em CD-Rom, Ricardo proporcionou à década de 90 (1994 com exatidão) uma inovação da informação através da mídia; para a época onde o conteúdo textual da matéria era complementado por hipertextos. A revista Super Intessante publicou em julho de 1994 uma matéria a respeito: “(...) Todas as matérias usam o conceito de hipertexto, uma técnica que consiste em criar ligações de certas palavras com. outros trechos de informação, sejam textos, sons ou imagens. Assim, ao se clicar o mouse sobre qualquer palavra sublinhada, surge uma caixa com texto adicional. Com as imagens acontece o mesmo: na fotografia do interior de uma casa, dentro do tema de arquitetura, o cursor indica onde há pontos sensíveis, bastando clicar sobre eles para que apareça outra foto com um detalhe daquele local. Vários tipos de botões dão a possibilidade de consultar vídeos, fotos ou mapas.” Essa mídia era muito atrativa principalmente aos adolescentes e jovens que queriam se inteirar com os avanços tecnológicos que estavam acontecendo na época, no âmbito da informática e com advento dos PC’s mais disponíveis para uso domiciliar. A novidade revelou-se uma experiência inovadora, constatando que não tínhamos os recursos multimidiáticos da informação em nossa internet daquela época, que diferente de hoje, pouquíssimos tinham acesso e sua velocidade (em Kbps) ainda “engatinhava”. O que é possível e comum para nós hoje é que com poucos cliques a internet nos dá informações em vídeos, áudios, tipografias animadas, música. No início da segunda metade da década de 90 era através dessa revista digital que era possível acessar uma informação com mais recursos que um jornal ou revista impressos podiam oferecer.


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eBand: O portal da emissora Band de televisão, o eBand tornou-se o primeiro portal brasileiro a trazer comentários com o Facebook. Em 30 de novembro de 2009, Ricardo Anderáos estava à frente da Direção de Negócios Online do Grupo Bandeirantes, acreditou que tal abordagem seria mais compatível com o atual estágio de desenvolvimento da internet. O portal incorporou a ferramenta Facebook Connect e inaugurou tal estratégia liberando comentários em todos os conteúdos para os usuários do Facebook. A novidade em 2009, hoje recurso presente em praticamente todos os portais e blogs, inovou permitindo que ao acompanhar uma notícia no eBand, bastava o internauta clicar na caixa do Facebook localizada abaixo de cada artigo, e na janela que surgisse autorizar a comunicação entre o portal e a rede social, então o compartilhamento da notícia estaria feito constando o link-fonte do portal no post do artigo no feed de notícias do usuário. “Há alguns anos as empresas ainda sonhavam em criar suas próprias redes sociais. Essa janela de oportunidade já fechou. Hoje, para crescer, um portal precisa ir onde as pessoas estão. A integração com o Facebook e o Twitter é inevitável”, afirmou Anderáos em reportagem da própria eBand sobre implementação de sua nova ferramenta. Ainda em relação ao portal de notícias eBand, Ricardo dá uma breve entrevista disponível no You Tube pelo canal SorayaDefavari, onde faz apontamentos de usar o Tweeter como ferramenta jornalística para propagação de notícias. Em vídeo divulgado no You Tube ele afirma que o portal eBand possui sim o Tweeter mas para postar principais notícias e grande repercussão. Afirma que é prejudicial colocar muitas atualizações no Tweeter, considerando que um portal de notícias tem as principais manchetes do dia


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fixas, mas que a medida que os fatos vão ocorrendo e o portal vai sendo atualizado pela central jornalística atendendo essa demanda: “(...) toda notícia publicada no eBand vai parar no Tweeter, o que que vai acontecer? Você vai parar de seguir esse Tweeter, pois ele vai entupir totalmente seu flow (fluxo) de posts de outras pessoas. As pessoas veem o Tweeter de maneira deslumbrada e acham que ele serve para tudo. E eu repito que querer usar o Tweeter pra distribuir notícia no volume que nós ou qualquer outro portal publica, é como querer bater um prego com uma chave de fenda, portanto cada ferramenta tem sua especificidade (...)”. – afirma Anderáos. Brasil Post: Para saber a importância da contribuição de Anderáos na criação da Brasil Post, é pertinente conhecer qual a sua origem. Presente em 10 países incluindo Japão, França, Canadá e Reino Unido, o The Huffington Post criado em 2005 nos EUA sob presidência e direção de redação de Arianna Huffington, tornou-se uma das publicações da internet mais prestigiadas no mundo; e tal importância fora obtida por ser visto como veículo de informação que melhor dialoga com as redes sociais. E O QUE RICARDO ANDERÁOS E A MULTIMÍDIA TERIAM A VER COM UM PORTAL DE NOTÍCIAS INTERNACIONAL? Ricardo na ocasião era Diretor de Mídias Sociais na Editora Abril, e muito antenado com o cenário brasileiro em relação a explosão das redes sociais, viu na estratégia do Huffington Post que seus principais pilares funcionariam bem para o Brasil. Com agregação de notícias, que consiste em publicar de outros sites e portais jornalísticos seus links quando estes veicularem notícias exclusivas ou relevantes, proporcionando ao leitor mais informação do que a redação da Post Brasil forneceria. Outro pilar


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importante com a Huff Post é a relação que tem com inúmeros blogueiros que contribuem com a propagação, criando uma rede de colaboradores desde o mais famoso internacionalmente até pessoas comuns, que dão opiniões relevantes e auxiliam na fomentação de debates de diversos temas. Uma visão perspicaz de Anderáos sabendo que chovem blogueiros nas redes, e que o Brasil está entre os países com maior número de pessoas conectadas e usuárias assíduas dessas mídias sociais. A parceria entre o Grupo Abril e The Huffington Post se iniciou em janeiro de 2014, liderada em seu início no país por Ricardo Anderáos, na direção editorial do Brasil Post e Otávio Dias como editor-chefe. A presidente Arianna em aprovação à parceria diz que brasileiros são sociais por natureza, online e off-line, tornando seu país um perfeito mercado de expansão ao jornalismo em plataforma eletrônica. “O Brasil em 2014 é um país que ao mesmo tempo enfrenta grandes desafios e transborda oportunidades” - afirma Arianna em texto de boas-vindas publicado no site Brasil Post. Para Ricardo, era importante a possibilidade de traduzir livremente notícias de outras edições internacionais do Huffington Post, produzidas em qualquer filial de outro país. E sendo parte do Grupo Abril trocar conteúdo com seus parceiros editoriais com sites e revistas da casa como a Exame, Quatro Rodas, Super Interessante, etc. PERCALÇOS DA CARREIRA A crise financeira que abalou o Brasil afetou o mercado profissional, ao atingir empresas dos mais variados seguimentos. Ricardo que pertencia ainda ao quadro de funcionários do Grupo Abril, já havia presenciado de perto o encerramento em outubro de 2013, das atividades da MTV Brasil (primeiro canal de tv segmentado do país, pertencente ao mesmo grupo)


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onde exerceu o cargo de Diretor de Mídias Digitais, estava se mantendo na Editora na Direção de Mídias Sociais – cargo que exerceu até setembro de 2013. Na Brasil Post como Diretor Editorial ficou até junho de 2015, quando a Abril fez mais um corte de funcionários a fim de mudar, reestruturando radicalmente a área comercial, a redução do portfolio de publicações visando enxugar a estrutura e revisar o negócio. Em depoimento à redação Jornalistas & Cia, Ricardo Anderáos revelou focar atenção a sua empresa de comunicação digital Latitude 0º com seu sócio e ex-colega de trabalho no caderno Link Estadão e MTV Brasil, Guilherme Werneck. Ricardo continua colaborando até os dias de hoje com o trabalho da Brasil Post mas como mais um blogueiro junto com a rede de aproximadamente 800 colaboradores que ele próprio ajudou a criar no Brasil; reconhecendo que a sua demissão na Editora Abril deveu-se exclusivamente pela necessidade desta reduzir custos. Mas a boa relação que teve de seu suporte na matriz Huffington Post International permitiu a permanência desse vínculo com o portal e a parceria dela com a Abril prossegue. Ricardo publicou em sua pagina pessoal do Facebook uma foto da tela com uma matéria da Brasil Post referente ao Desemprego e colocou seu crachá funcional da Abril (da época de MTV ainda) para comentar sua saída do Grupo: “A manchete do Brasil Post (que continua sem minha presença) é simbólica deste momento em que saio da Abril e entrego meu crachá, ainda dos tempos da extinta MTV Brasil. É hora de me voltar com todas as forças a minha velha e boa www.latitude.com.br com o sócio Guilherme Werneck Se você que está lendo este post conhece alguém precisan-


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do dois caras foda na comunicação em plataformas digitais, indique a gente! Muito obrigado Abril por tudo que aprendi, com destaque para meus padrinhos Helena Bagnoli, Manoel Lemos e Victor Civita. Tks to The Huffington Post, with a special hug to Arianna Huffington, Nicholas Sabloffand Koda Mike Wang.” OUTRAS OBRAS E REALIZAÇÕES DE ANDERÁOS Hiperconectado é um blog que se autodenomina com a missão de ajudar as pessoas utilizar a tecnologia e não ser usado por ela, levantando nas publicações questões que apesar de necessária a utilidade tecnológica e, o vício ao qual ela expõe nossas vidas. Nele Ricardo frequentemente publica matérias que envolvam interação tecnológica, mídias digitais, publicidade e ambientalismo: Latitude 0º já desenvolveu soluções na comunicação digital para diversos clientes importantes como Carta Capital, Senac São Paulo e portal MTV Brasil: Ilhabela: escreveu o livro em parceria com a fotógrafa Maristella Colucci, Dividindo sua moradia entre São Paulo e Ilhabela, Ricardo tem grande admiração pelo espaço e respeito a tudo que a natureza local oferece. No livro relata o lugar como polo turístico, histórias sobre tesouros e belezas naturais preservadas. Críticas jornalísticas: Ricardo no período que trabalhou na Folha de S. Paulo escreveu uma coluna sobre a exposição de Antonio José Saggese (SP, 1950), fotógrafo renomado que lecionou a disciplina de Análise da Imagem para a turma de 1º Semestre de Tecnologia em Produção Multimídia - noturno, no 2º período de 2014. Sendo esta turma sua última ao aposentar-se na instituição Centro Universitário Senac e responsável pela editoração deste livro. Tal exposição consistiu em um ensaio fotográfico realizado no MASP em 1991, e exibia fotografias de uma parede de oficina mecânica com paginas de revistas sensuais masculinas e outras bem con-


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troversas ao assunto de túmulos do cemitério do Araçá em São Paulo. Na crítica, Ricardo revelou-a bem positiva na redação de sua matéria sobre a essência que teria a exposição do fotógrafo. “(...) O trabalho de Saggese mostra que esse voyeurismo disfarçado é um dos elementos básicos da sedução fotográfica. Não por acaso a fotografia gratifica os sentimentos eróticos daqueles para quem o desejo se torna mais intenso com a distância. A morte é revelada como a essência do processo fotográfico. A ideia de que as fotos preservam o passado é a última fortaleza da teoria da foto como espelho da realidade. Mas as fotografias não sobrevivem às pessoas que registram. Pelo menos não por muito tempo”.

Anderáos, ricardo/folha de s. paulo, são paulo, 12 jun. 1991. morte e erotismo decodificam a linguagem fotográfica.


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REFERÊNCIAS DEFAVARI, SORAYA. ricardo anderáos analisa o tweeter para o uso no jornalismo. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=stc1q915yrw.acesso em: 20 mai. 2016. ANDERÁOS, RICARDO/folha de s. paulo, são paulo, 12 jun. 1991. morte e erotismo decodificam a linguagem fotográfica. Disponível em: http://acervo.folha.uol.com.br/fsp/1991/06/12/20/. Acesso em: 20 mai. 2016. ESCRITÓRIO DA ARTE. citação de crítica em biografia de antonio saggese por ricardo anderáos na folha de s. paulo/mec nica do desejo, exposição no masp em 1991. Disponível em: https://www.escritoriodearte.com/artista/antonio-saggese/ acesso em: 20 mai. 2016. REDAÇÃO JORNALISTAS & CIA/PORTAL DOS JORNALISTAS, notícias. fora da abril, ricardo anderáos foca em sua empresa, a latitude 0º. Disponível em: http://www.portaldosjornalistas.com.br/noticia/anderaos. acesso em: 07 mai. 2016. FRAGA, NAYARA/EXAME.COM. mtv migra para tv paga e deixa de pertencer à abril. Disponível em: http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/mtv-migra-para-tvpaga-e-deixa-de-pertencer-a-abril-2. acesso em: 12 mai. 2016. LATITUDE 0º. Desde 1995 quebrando a cabeça para ajudar empresas a se reinventarem no mundo digital. Disponível em: http://www.latitude.com.br/. acesso em: 24 abr. 2016. REDAÇÃO SUPER. neo interativa, um cd-rom cultural. Disponível em: http://super.abril.com.br/tecnologia/neo-interativa-um-cd-romcultural. acesso em 30 abr. 2016. GUIMARÃES, SAULO PEREIRA/EXAME.COM. versão brasileira do huffington post, brasil post está no ar.


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Disponível em: http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/versao-brasileira-dohuffington-post-brasil-post-esta-no-ar. acesso em 07 mai. 2016. ANDERÁOS, RICARDO/HYPERCONECTADO. blog com a missão de ajudar as pessoas a usar a tecnologia sem serem usadas por elas. Disponível em: http://hiperconectado.com.br/blog/. acesso em: 05 mai. 2016. HUFFPOST BRASIL. brasil post/ricardo anderáos. Disponível em: http://www.brasilpost.com.br/ricardo-anderaos/. acesso em: 01 mai. 2016. ANDERÁOS, RICARDO/BRASIL POST. o ano do brasil post. Disponível em: http://www.brasilpost.com.br/ricardo-anderaos/o-ano-do-brasilpost_b_4671433.html. acesso em: 14 mai. 2016 MORAES, ELIANE ROBERT. ensaio fotográfico de antonio saggese. Disponível em: file:///d:/tecnologia%20em%20produ%c3%a7%c3%a3o%20 multim%c3%addia%20-%20senac/pi%204/98609-171303-1-sm.pdf. acesso em: 07 mai 2016. Colucci, maristela/anderáos, ricardo. ilhabela – metalivros. Disponível em: http://indicalivros.com/pdf/ilhabela-maristela-colucci-ricardoanderaos. acesso em: 14 mai. 2016. ABOUT.ME. RICARDO ANDERÁOS – ilhabela, brazil. Disponível em: https://about.me/anderaos. acesso em 01 mai. 2016. REDAÇÃO EBAND. eband é primeiro portal brasileiro a trazer comentários com facebook. Disponível em: http://noticias.band.uol.com.br/tecnologia/noticia/?id=232185. acesso em: 15 mai. 2016.


TADEU DA FONSECA JUNGES DIRETOR, ROTEIRISTA, PRODUTOR, FOTÓGRAFO E DESIGN GRÁFICO

ESCRITO POR: EDUARDO GELMAN


TRANSGRESSÕES Tadeu da Fonseca Junges, conhecido como Tadeu Jungle, nasceu em São Paulo, em 25 de março de 1956. Formado em comunicação social pela Escola de Comunicação e Artes da USP em 1980. Já em 1981, inicia sua pós - graduação na San Francisco State University, na Califórnia. Um artista multimídia, atuando como poeta, fotográfo, roteirista, diretor de cinema e TV e Videasta* ! Casado com a roteirista e também diretora Estela Renner. No início da década de 80, torna- se um dos lideres no movimento de videoarte, que da os primeiros passos no Brasil, ao buscar formas de fazer TV inovadoras, como a “Fabrica do Som da TV Cultura, e TV MIX”, da


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TV Gazeta. Consolida-se como diretor de filmes, no meio publicitário, e também dirigindo cinema, por meio de sua produtora, a Academia de Filmes. Desde 2011 , atua como fotografo, realizando diversas mostras individuais, mantendo um dos projetos mais longos na Internet , com o nome Foto de Segunda. No mesmo ano , estreia seu primeiro longa metragem de ficção, Amanha Nunca Mais, e também o filme documentário Evoé, Retrato de um Antropófago , sobre o Celso Martinez Corrêa,conhecido dramaturgo . Em 2014, lança o livro Videofotopoesia , que reúne trabalhos dos seus 30 anos de carreira artística. HISTÓRIA Tadeu Jungle, sempre foi um transgressor. Estudou na USP, cursando Radio e TV, curso este pouco procurado em comunicações , já jornalismo e cinema, tinham as suas classes cheias, cerca de oitenta alunos, já a sua, mal contava com cinco alunos (incluindo o pórrio Tadeu ), já que fazer televisão naquela época (ditadura brasileira ), significava estar ligado ao sistema! Entretanto, optou por seguir o lema onde “tudo era programa de TV para todo mundo “, buscou a TV para o século 21! Essa forma, visava fugir dos tipos existentes no período, onde o espectador se sentia mais próximo do que lhe era oferecido. Esse estilo proposto em seus trabalhos e projetos, fez de Tadeu Jungle conhecido como um homem de vanguarda, que procurou sempre divergir do modelo convencional , ao desenvolver, e em apresentar o produto final ao público. De 78 á 80 , criou séries de poemas visuais como o Fure Fila, Sobreviverei 80 (impresso em camisetas ). passe a mão,o Mete, Remete distribuído via correios, e o Suruba, albúm de poesia visual. Sempre buscando uma linguagem moderna, simples, e direta para apre-


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sentar a todos, aos jovens principalmente, ele dirigiu com Nélson Motta o programa Mocidade Independente na Rede Bandeirantes. Apresentador de programas como A Fabrica do Som, onde grupos musicais em inicio de carreira , conhecidos até os dias de hoje em atividade, tais como Barão Vermelho, banda Titãs, Para-lamas do Sucesso , entre outros ! Tadeu considerava o programa “careta”, já que fichas previamente escritas funcionavam como roteiro para o programa ter seguimento, o que o deixou deprimido por sei episódios .

JUNGES, TADEU. Obras

E a cada banda que se apresentava, todo palco, instrumentos, e adereços sofriam mudanças durante 10 á 15minutos, então Tadeu jungle tinha que entreter a plateia com piadas, estorias, e como citou em entrevista, com uma verve Glaubeliana, também um estilo meio Chacrinha, uma forma irreverente segundo ele . A plateia aumentava á cada programa, e as pessoas queriam muito falar, o momento era propicio, já que a ditadura caminhava para o fim, o publico jovem queria expressar ideias pensamentos, ideais, de maneira livre, sem temor de represálias. Tadeu denominou de catártico , oque acontecia a cada apresentação.


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O programa deixava então de ser pra otário seguindo para um modelo inovador, saindo do conhecido , do comum, que burlava, mas acima de tudo, transgressor! Com uma linguagem ágil, e alternativa, deu um novo rumo a maneira de ver TV. Fundou a primeira videoescola nacional, a The Academia Brasileira de Vídeo. Dirigindo o programa TV Mix, transmitido diariamente e ao vivo pela TV Gazeta, tinha conteúdo, jornalistico, giro da redação para noticias de ultima horam, e principalmente muita informalidade , pois era tudo ao vivo. Chamava o público á participar, causando o certo caos, com vinhetas poéticas no rodapé das telas, ao transmitirem noticias.

JUNGES, TADEU. Obras

Uma ingerência que combinava com o pro grama. Um dos primeiros apresentadores do programa era a Condessa Giovana, era uma persona do ator e humorista Otávio Benincasa (hoje Mama Bruschetta do programa Mulheres da TV Gazeta ), comandava com Cleber Machado, Astride Fontenelle, Serginho Groisman, e com Tadeu Jungle, que produziu e apresentou o programa, além de outros nomes de hoje em dia! O TV Mix era um programa de variedades, misturando os mais variados assuntos, como sexo, cine ma, artes , teatro e culinária, tudo isso com


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muito humor, dentro de um formato inovador para a época. O TV Mix foi pioneiro na interatividade, era totalmente ao vivo, tendo participações dos telespectadores na Paulista, e via telefone! Em boa parte do tempo dos programas era destinado à interação com os espectadores. Tadeu Jungle,produziu, dirigiu, e apresentou outros programas televisivos como TV Tribo na Bandeirantes,com uma linha similar ao da TV Mix, e o Gente de expressão, um programa de entrevistas Internacionais, com a atriz e apresentadora Bruna Lombardi, mas numa forma mais convencional . Tadeu Jungle fez muito uso de vídeos para mostrar suas obras ao publico, videoinstalações em São Paulo e Rio de Janeiro, uma delas como Videoinstalaçao River de Janeiro , Os Vídeos, uma gigante instalação baseada em vídeo, pinturas e esculturas de Oswald de Andrade, na galeria São Paulo. Nos anos 1990, começou a dirigir vários filmes publicitários sendo que até hoje, já realizou mais de 600 para as principais agencias do pais. O evento na Casa das Rosas em São Paulo, o Tecnobomber , uma vez mais, mostra o estilo caótico do artista, convidando as pessoas para trazer aparelhos movidos a qualquer tipo de energia, que não se queira mais, que se tenha raiva, ou mesmo quebrado, para poder fazer parte de uma performance, um vídeo e uma escultura com o nome do participante. Inter atividade e irreverencia se mostram sempre presentes nas obras que cria, produz e dirige, dando ao espectador um outro contato com a obra, não se limitam do unicamente ao olhar. Usou da antropofagia para se alimentar na criação de suas obras, e o conteúdo delas, alimentar o publico. Trazendo conhecimento, aproximação e inter atividade á eles com suas obras. Dirigiu documentários,


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fez cinema, mostras de obras interativas , e um dos seu trabalhos mais longevos, que esta na Internet. Foto de Segunda, onde toda as segundas-feiras, tem uma foto nova, peculiares alias, acompanhadas de uma frase, que deixam a interpretação em aberto a que segue este trabalho, vale a pena conferir! Foi “acusado “ de renovador da televisão brasileira na década de 80, e declarou com veemência; Se eu fui renovador nos anos 80, estou ferrado. quero ser renovador hoje! Inovador na forma e conteúdo, este multi-artista via a sua primeira exposição fotográfica, “Estradas, camas, e reflexões, traduziu a mostra da seguinte forma : “Se você descortina o olhar, vê, nas camas desfeitas, uma poética do abandono, a ausência, o resto, a migalha. São marcas de um ato inconsciente que expõe o cotidiano”, conta Jungle. Artista em todas as frentes, Tadeu Jungle,transgrediu burlou, inovou na forma de fazer arte, permitindo seu acesso aos mais variados públicos, de formas inusitadas.


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REFERÊNCIAS PROGRAMA DE ENTREVISTAS “PROVOCAÇOES”. Disponível: http://tvbrasil.ebc.com.br/provocacoes/episodio/provocacoes-com-omultiartista-tadeu-jungle PROGRAMA SONHAR TV. Disponível: https://www.youtube.com/watch?v=eicaXml_obA ESTRADAS, CAMAS E REFLEXOES. Disponível: http://tadeujungleimprensa.blogspot.com.br/2014/10/estradas-camasreflexoes-galeria-valu.html FOTO DE SEGUNDA. Disponível: http://fotodesegunda.blogspot.com.br/


WILTON LUIZ DE AZEVEDO PROFESSOR DE PÓS-GRADUAÇÃO NA UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

ESCRITO POR: FELIPE DA SILVA HEIB


O AMANTE DAS ARTES Graduado em comunicação na Escola Superior de Propaganda e Marketing - ESPM em 1980. Estudou pigmentos e resinas naturais com Marlene Almeida (1942) e papel artesanal com Diva Elena Buss (1943). Em 1984 concluiu o mestrado em linguagem, comunicação e semiótica na PUC/SP, com a dissertação O Ruído como Linguagem, com orientação de Décio Pignatari (1927 - 2012). Em 1995, concluiu o doutorado na mesma instituição com a tese Criografia: a pintura tradicional e seu potencial programático com orientação de Arlindo Machado (1949). Começou a expor em 1977, participando do Salão de Humor de Piracicaba. Entre 1983 e 1989 lecionou na ESPM e no Senac. Em 1987 realizou a primeira exposição de pintura por


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computador em São Paulo no Clube de Criação, o que lhe valeu uma exposição no Museu de Imagem e Som em 1988. Escreveu para a revista Design & Interiores e foi crítico de design para o Caderno 2 de O Estado de S. Paulo. Publicou os livros “O que é design”, pela Editora Brasiliense, e “Os signos do design”, pela Global Editora. Em 1998 organizou, editou e figurou como responsável pelo design gráfico do CD-ROM Interpoesia: poesia hipermídia interativa, com poesias de sua autoria e Philadelfo Menezes (1960 - 2000). Atualmente é professor do programa de pós-graduação na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Azevedo, Wilton. Conversas de Valor.

Ao longo da vida Wilton fez inúmeros trabalhos envolvendo design gráfico. Após uma viagem aos Estados Unidos em 1989, ele conheceu a multimídia, a qual estava no começo de sua existência, onde ainda não se


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sabia exatamente o que era mas já sabia que seria o futuro das mídias, e direcionou-se para um doutorado falando sobre a multimídia, mostrando o quão inovadora ela era e enfatizando a mistura da escrita com o virtual. Após uma longa pesquisa sobre o autor percebe-se (é de clara visão que Wilton) tem uma carreira que carrega projetos inovadores e que demonstram a essência de tal. (então separei um compilado de citações sobre ele e suas obras, para que consigam ver a visão que o mundo tem sobre ele.) Abaixo seguem comentários a respeito de sua obra, para se perceber e sua contribuição para as artes e para a multimídia. “A pintura figurativa esteve e está em contínua transformação. E a investida de Wilton Azevedo nessa área é uma confirmação de que as coisas, sobretudo a arte, exigem dinamismo incessante’’ (desconhecido) ‘’Em suas telas atuais, o jovem e promissor artista (ele é também ‘designer’) transmite todas as emoções que lhe são inerentes. Na elaboração de objetos e figuras humanas, nas cenas cotidianas, sabe dosar com equilíbrio as formas gestuais controladas e as cores fortes. Resultado: bom trabalho.’’ (desconhecido) ‘’A obra de Wilton, percebe-se, atinge rapidamente um posto destacado entre os novos valores da pintura paulistana, ainda mais porque a ela se dedica há poucos anos. A sua evolução, apostamos, deverá ser ainda mais nítida até o fim da década”. (Ivo Zanini) “A invenção é um esforço de avanço em todas as direções e a melhor prova disso é o mais recente trabalho de Wilton Azevedo. De um lado, há uma pesquisa de pigmentos, no sentido de obter as cores e texturas mais adequadas às idéias estéticas que o artista quer materializar. Um longo processo de investigação conduz o pintor de volta aos momentos deflagradores da história da arte, quando a pintura começava com o gesto de


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buscar na terra e nas fibras vegetais os pigmentos necessários para dar vida às telas.’’ (desconhecido) ‘’Mas no caso de Azevedo não se trata de uma pintura naïve, de resistência contra as tintas sintéticas da pintura atual. Quando necessário, Azevedo também lança mão delas, sem qualquer pudor, pois o que ele busca é uma adequação da cor aos motivos plásticos invocados na tela, bem como uma certa heterogeneidade de materiais e procedimentos próprios da arte de nosso tempo.’’ (desconhecido) ‘’De outro lado, no que diz respeito aos motivos visualizados, a pintura de Azevedo é absolutamente contemporânea. Ela se inspira na eletrificação da iconografia atual, nas formas estilizadas e elípticas da cultura pop, nas figuras prototípicas e diáfanas da televisão e no rebuscamento neobarroco do design pós-moderno. Não por acaso, esta exposição, que começa com uma pesquisa de pigmentos naturais, termina com uma animação por computador, numa tela eletrônica, de modo a materializar a idéia da invenção artística como percurso não linear, em todas as direções”. (Arlindo Machado) Agora eu deixo aqui o meu olhar sobre a obra de Wilton de Azevedo. “Ao decorrer inúmeras paginas do google, vi diversas pesquisas, diversos vídeos, e pude tirar apenas uma conclusão: A arte está inserida em Wilton em tudo que ele faz nas belas melodias que ele posta no seu soundclound, nos seus vídeos interativos postado no youtube, nas páginas dos livros aonde ele demonstra sua particularidade, Wilton é o sinônimo da arte”.


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PRINCIPAIS OBRAS DE WILTON Livro: O que é Design SINOPSE - Este é um livro que acabou se contagiando por sua proposta, tornando-se ele mesmo um design. Seus capítulos acabam engajados na necessidade de explicar o que é design, através de sua diagramação. O autor mostra a necessidade que temos de democratizar o quanto mais as linguagens, utilizando várias fontes de informação. O livro traz os seguintes temas - design e desenho; produção como reprodução; a origem da arte aplicada; design gráfico; ruptura com o passado; objetos para usar e pensar; alguns usos do design; design cultural; indicações para leitura. CD - Interpoesia - Poesia Hipermídia Interativa SINOPSE - O Cd-RomInterpoesia é o resultado de um projeto integrado sobre suportes digitais, realizado pelo Estúdio de Poesia Experimental do programa de pós-graduação em comunicação e semiótica da PUC-SP e pelo Programa de Pós Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie Os Signos do Design SINOPSE - Os Signos do Design faz parte de uma tentativa de colocar o aluno de graduação e os interessados nos assunto em contato com o mundo do significado estético, em que o não tão visível também “fala” e forma opinião.


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REFERÊNCIAS AZEVEDO, WILTON. BIOGRAFIA. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa548/wilton-azevedo AZEVEDO, WILTON. CRITICAS. Disponível em:https://www.escritoriodearte.com/artista/wilton-luiz- de-azevedo/


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