Letícia Dal-Ri
Uma janela para nove irmãos
Projeto Literário
APRESENTAÇÃO Uma geladeira branca, um pingüim sobre ela, um caprichoso bolo com pedaços de chocolate mergulhados na cobertura descansando na primeira prateleira. Confortáveis chinelinhos de algodão e um vestido azul marinho de botões. A boca pintada de vermelho e um passo arrastado no assoalho. Cabelos ainda pretos levemente desgrenhados e uma voz suave dando vida àquela casa. Estas são as imagens que me vêm à cabeça quando penso em minha avó. Freqüentava a casa em que vivia não mais do que uma vez por ano. O bolo sempre estava lá. Era feito para o genro preferido, meu pai, que sempre a fazia rir e repetir o nome dele inúmeras vezes pedindo para parar. Anos depois de sua morte soube que fazia o bolo para qualquer visita. Na verdade sua intenção era comê-lo, visto que já havia sido detectada a diabetes em seu sangue e o pretexto de uma visita seria ideal para lamber a colher de pau, raspar a panela ou comer os pedaços de chocolate ralado que caiam sobre a mesa. Visitar minha avó, como deve ser com toda família, era sempre divertido. Viajávamos quilômetros para vê-la e o tempo parecia passar mais devagar dentro daquela casa, a grande testemunha de tudo. A água do pinhão borbulhando na panela, a lenha estalando no fogão, o chimarrão sendo passado de mão em mão. Eu era filha única e passar alguns dias em uma casa onde nasceram nove crianças era sempre uma alegria. A casa vivia cheia. A história de vida de Jona Jovita me fez acreditar que minha avó foi uma grande heroína. Há muitos anos tenho o desejo de contar a sua história. Apesar de ter apenas quatorze anos quando ela faleceu, ainda sou capaz de ouvir sua voz suave com doce precisão. Dela, recebi como herança a ansiedade por chocolates, permitindo que me lembre de seu rosto sempre que como o doce escondido, mesmo não sabendo por que o faço. Sua história é marcada pelo amor e dedicação que empenhou aos filhos, ilusões amorosas e sonhos frustrados esquecidos pelo tempo no sótão daquela casa. Quisera eu ter o poder de voltar no tempo e ouvi-la contar sua própria história. Quem me dera a casa pudesse verdadeiramente contar tudo o que aconteceu em seu interior. Letícia Dal-Ri
O PROJETO “Uma janela para nove irmãos” é um romance inspirado em fatos reais que conta a história de uma família de imigrantes através das memórias guardadas na casa em que viveram. A história se passa na cidade de Gramado, Rio Grande do Sul, e tem seu início quando a casa recebe os recém-casados Adela descendente de imigrantes alemães - e Massimo - descendente de imigrantes italianos - na década de 40. É nesta casa que Adela cria seus nove filhos enquanto Massimo luta pelo sustento da família. Conforme as crianças crescem, os cômodos da casa são preenchidos com suas histórias e vivências e suas paredes, portas e janelas tornam-se testemunhas únicas dos acontecimentos. Os anos passam e as crianças tornam-se adultos ultrapassando os limites do portão e indo embora para o mundo. Sozinha, Adela perde a vontade de viver, deixando-se morrer em 1992, aos 62 anos de idade. Um vazio toma conta da casa que permanece erguida até os dias atuais em meio ao turismo que toma conta da cidade. Hoje a casa vive na companhia de Massimo e de todas as lembranças do que lá se passou. Em uma época em que os recursos são escassos, a casa torna-se a única narradora capaz de contar com veracidade de detalhes a trajetória de Adela enquanto embala, cria e educa todos os nove filhos, mesmo diante das maiores dificuldades. Tendo que assumir sozinha o papel de mãe e pai enquanto o marido busca o sustento nos municípios vizinhos como caixeiro viajante, as mãos de Adela tornamse pesadas como ferro marcando para sempre a memória das crianças com o pau de mexer polenta. A casa é sua única cúmplice e companheira.
TRECHO DO LIVRO O começo e o fim Agora que habito minha própria solidão, não vejo mais motivos para guardar esta história em meu porão. O que minhas paredes vivenciaram ultrapassam as rachaduras do tempo e infiltrações provocadas pela chuva. Eu fui a morada de uma história que o tempo não pode apagar. Se um dia certamente irei abaixo - como todas as vizinhas desta rua -, motivada pelo turismo que hoje ganha mais mérito que os antigos tropeiros, não quero levar comigo a vida de uma família e transformá-la em escombros, entulho e poeira. Guardo em minhas paredes, portas, janelas e cômodos cada pedaço de uma história que durou pouco mais de meio século. Eu ainda era jovem e tinha estrutura um pouco gasta quando eles aqui me habitaram. Foi em meus aposentos que garantiram abrigo e em meu aconchego que começaram a construir uma grande família. Aos poucos vi todos crescerem e sofri com as estripulias de nove filhos. Enchi meus varais de fraldas e meus quartos de beliches e alegrias. Amedrontei-os com histórias de fantasmas quando criava canções com o vento que batia em minha janela. O tempo passou e um a um foi ganhando seus caminhos antes reservados ao jardim e ao meu velho portão de madeira. Eu não era mais o limite para quem poderia conquistar o mundo. Passei a compartilhar minha solidão com aquela que mais me deu carinho em toda minha existência e sofri com ela todas as doenças que lhe abatiam como tempestade. Chegou o dia em que nem eu mesma merecia sua atenção. Somente sua solidão importava. Teias invadiam meus cantos assim como imobilizavam seu coração esperando que ela ou eu – quem desistisse primeiro - não pudesse mais respirar. E assim permaneci. Sustentada por minhas paredes silenciosas enquanto ela partia para seu novo lar.
A AUTORA Gestora e Produtora Cultural, Escritora, Roteirista e Turismóloga. Formada em Comunicação Social pela PUC-Rio e Roteiro para Cinema e TV pela Estácio de Sá, com pós-graduação em Criação e Produção para Cinema e TV pela FGV, MBA em Marketing pela ESPM e MBA em Turismo e Novos Negócios pela UCAM. É sócia da “da Gaveta Produções” onde atua no desenvolvimento de projetos, inscrição e aprovação em leis de incentivo, editais, e produção cultural. Também atua como parecerista de projetos para o Ministério da Cultura (Artes Cênicas e Audiovisual) desde março de 2010. Como autora, é responsável pelo site de turismo “O destino a nós pertence” e colaboradora do site literário “Mondo Redondo”. Participou também do livro de crônicas “Um dia de cada vez” e foi roteirista da série “Os figuras”, exibido no Multishow. Pretende ainda em 2013 lançar os livros “Uma janela para nove irmãos e o infantil “Meu pequeno grande mundo”. Dentre suas experiências como Produtora Cultural, destacam-se a, produção da novela das 20h “Belíssima” e da minissérie “Amazônia: de Galvez a Chico Mendes”, na TV Globo e os espetáculos de teatro “Encontro com Fernando Pessoa”, “Transtorno Cênico Feminino”, “O Diabo veste Saara”, “Dona Flor e Seus Dois Maridos” apresentado em mais de 30 cidades do Brasil e “A Marca do Zorro”. Produziu também o curta-metragem “O Caso Libras”, vencedor do Festival de Cinema de Los Angeles e selecionado no Tribeca de NY, Festival da Amazônia Festival de Edinburgo e Festival de Petrópolis. Em setembro de 2012 estreou o espetáculo infantil “Paparutas”, escrito por Lázaro Ramos, em cartaz no Oi Futuro de Ipanema.
LEI DE INCENTIVO Lei Federal de Incentivo à Cultura Lei Rouanet Pronac: 126782 Situação: Prorrogado o prazo de captação Período de captação: 31/12/13 Valor autorizado: R$ 85.404,00
CONTATO Letícia Dal-Ri 21 32057227 21 88853116 leticia@dagaveta.com.br www.leticiatorgo.com.br www.dagaveta.com.br
“Quisera voltar ao passado e ver minha tapera. Os campos, as enormes figueiras com sua aconchegante beleza. Suas sombras que davam descanso e paz aos tropeiros em sua longa jornada. Seus galhos enormes pareciam braços estendidos, onde eu me sentia protegida e feliz. Feliz aquele que tem algo a lembrar.” Jona Jovita Haack ou Ione Dal-Ri