Monografia agrobiodiversidade e soberania alimentar no norte de minas gerais

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA GERAL

Agrobiodiversidade e soberania alimentar no Norte de Minas Gerais

Monografia apresentada à Universidade Federal de Viçosa como parte das exigências da disciplina BIO 497 – Estágio Supervisionado em Ecologia II do curso de Ciências Biológicas

Discente: Lis Soares Pereira Orientadora: France Maria Gontijo Coelho (UFV) Membros da Comissão Avaliadora: Douglas Mansur da Silva (UFV) Gustavo Taboada Soldati (UFJF) Reinaldo Duque-Brasil (UFJF)

VIÇOSA MINAS GERAIS - BRASIL 2015


Lis Soares Pereira

Agrobiodiversidade e soberania alimentar no Norte de Minas Gerais

Monografia apresentada à Universidade Federal de Viçosa como parte das exigências da disciplina BIO 497 – Estágio Supervisionado em Ecologia II do curso de Ciências Biológicas

APROVADA em 26 de junho de 2015.

__________________________ Prof. Douglas Mansur da Silva

__________________________ Prof. Gustavo Taboada Soldati

__________________________ Prof. Reinaldo Duque-Brasil

_________________________________ Profª. France Maria Gontijo Coelho (Orientadora)


Por tanto amor Por tanta emoção A vida me fez assim Doce ou atroz Manso ou feroz Eu, caçador de mim Preso a canções Entregue a paixões Que nunca tiveram fim Vou me encontrar Longe do meu lugar Eu, caçador de mim Nada a temer senão o correr da luta Nada a fazer senão esquecer o medo Abrir o peito a força, numa procura Fugir às armadilhas da mata escura Longe se vai Sonhando demais Mas onde se chega assim Vou descobrir O que me faz sentir Eu, caçador de mim (Sérgio Magrão e Luis Carlos Sá com interpretação de Milton Nascimento, 1981).

Aos meus pais, Maria Candida e Dimas, que com muito amor criaram essa flor.

A France, por ter me ajudado muito durante todo esse tempo, pelos múltiplos aprendizados, pela paciência, pela sensibilidade, por me despertar a cada vez que falava comigo, pela amizade e por sempre confiar em mim. Minha gratidão!

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MUITA BELEZA

A minha casa, é um rancho de palha. A minha cama, é toda de vara. O meu colchão, é um couro de gado. As minhas vasilhas são todas de barro. Eu busco água, em uma cabaça; Lá na fonte, de água mineral. Eu moro no meio do mato; Junto da mãe natureza; Desfrutando o perfume das flores; O ar puro e muita beleza. O meu fogão, é uma trempe de pedras. A minha comida, é toda natural. A minha roupa, é tanga de algodão; Fiado na roda, tecida no teá. Minhas precatas, são de couro cru. O meu transporte, é um burro com cangaia. Eu moro no meio do mato; Junto da mãe natureza; Desfrutando o perfume das flores; O ar puro e muita beleza. Na minha roça, eu não uso trator.

Eu passo um bico, com uma junta de bois. Eu não faço queimadas, e nem uso de venenos. Eu respeito à mãe natureza. Crio galinhas, porcos e perus. E uma vaquinhas da raça peduro. Eu moro no meio do mato; Junto da mãe natureza; Desfrutando o perfume das flores; O ar puro e muita beleza. A minha roça, é uma diversidade. Eu planto um pouquinho, de muitas variedades. As minhas mãos, são todas calejadas; O meu orgulho, é fruto do meu trabalho. O amor mora dentro de mim. Eu sou feliz assim, com a vida que Deus me deu. Eu moro no meio do mato; Junto da mãe natureza; Desfrutando o perfume das flores; O ar puro e muita beleza. Música de autoria do Sr. Geraldo Gomes Comunidade do Touro Serranópolis de Minas - MG

A todas e todos agricultoras (es) familiares camponeses, e comunidades que se organizam e trabalham em luta da garantia e melhoria de nossa natureza, do que há de melhor em nós, da vida em cada ser. Como nos inspira Seu Geraldo Gomes: “Vem nascendo um novo dia, com alegria eu quero ver o amor em cada coração renascer eu quero ver, eu quero ver”. iv


Agradecimentos Estou imensamente agradecida por ter terminado, por ter começado. Agradeço aos seres de luz que invadem a minha alma! A estrela guia e minhas amadas estrelas da manhã, minhas queridas avós: Dona Dalva (in memoriam) e Cilese (in memoriam). Aos meus familiares, meus inúmeros tios e tias, primos e primas, parentes próximos e distantes, pela alegria, estímulo e nossa união. Ao meu irmão Igor pela convivência e amor. Aos trabalhadores sem-terra, aos atingidos pelas barragens, mineração, minerodutos e a tantos outros desvalidos deste mundo. Por não me acostumar e pela necessidade contante de ser Outros. Agradeço a todas as pessoas que me estimularam e animaram. As amigas e amigos de infância, e as cidades de Ouro Branco e Mar de Espanha, importantíssimas na minha vida! As primeiras amigas da Bio: Maira, Anna, Paty, Camila e Isadora. Gratidão por todos os momentos, em sala de aula, trabalhos e as deliciosas comidas! Aos movimentos e coletivos (grupos) que (me) construí em Viçosa: Movimento Estudantil da Biologia (ENEBio) e os amigos que de lá fiz, Centro Acadêmico de Biologia da UFV (CABio, gestões CAekós, João de Barro, Jequitibás), ME-UFV e o pessoal da ABEEF, FEAB e Geo (em especial a Isabela pelo apoio neste momento), Etnoikos, Folhas da vida (em especial ao Saulo que me despertou no universo das terapias naturais), Campanha pelas Águas e Contra o Mineroduto da Ferrous, Cursinho Popular DCE-UFV, Grupo EntreFolhas (em especial a Marina), GABA e Mutirão Ciranda (em especial a Cida e Efigênia que me alimentaram com muito amor nos últimos anos), Tanatose (novos e velhos companheiros, em especial a Gínia, Thaís, Marco e Inácio), Escola Estadual Santa Rita de Cássia (onde pude vivenciar a licenciatura), coordenações do curso e as demais instâncias representativas (onde aprendi como a universidade tenta funcionar) e ao grupo CPC pelas recentes discussões e reflexões. Em especial, aos companheiros do CA e amigos da vida: Ju, Luiz, DDI, Pablito, Lety, Gui, Bruno, Talitinha, Siça, Fernandinho, Juninha Paula, Nat, Pará, Iza, Mirelle, Adriana e Paulo. Eu aprendi demais com vocês! A Ju de Aracaju, que mesmo de longe sempre esteve presente em nós! Aos professores, minhas referências, Maria Catarina, Irene, Douglas, Willer, Edgar, Heloísa, Carlos Speber, Jorge Dergam, Luzimar e Marildinha. E em especial ao professor Casali que a pouco conheci e me fortalece a cada dia. Aos servidores da UFV, em especial a Ritinha, Alci, Maria do Carmo, Chiquinho da Floresta, Ademir e companheiros da Dendrologia, ao João da Biologia e o Charrão pelos dizeres eternos, A luta continua! As inúmeras companheiras de morada em Viçosa e aos meninos também! Gratidão por todos os momentos vividos e pelo carinho de cada um de vocês! São especiais demais na minha vida! Gratidão Lety, por sempre me perguntar: tá complexa ou tá frenética? rsrs e assim me fazer parar um pouco e compartilhar nossos dias. Gratidão Júnia, por sempre cuidar e acreditar em mim e fazer aquelas sopinhas deliciosas e salvadoras. Gratidão Edson, por termos compartilhado tantos e maravilhosos momentos juntos. Gratidão Ju, por estar sempre próxima, pelas viagens e pela grande amizade construída. Gratidão Luizão e Lucas DDI, vocês são grandes irmãos para mim! Gratidão Pri, por me estimular na homeopatia e nessas mil energias que não v


damos conta, mas tentamos entender. Gratidão Moniquinha, pelos sonhos e por ser uma irmã para mim. Gratidão Pablito, por ser meu amigo de fé, irmão e camarada! Aos que convivi pela reta, RU e nos movimentos paralelos. Aos vizinhos da Violeira e amigos do Palmital. A cidade de Viçosa e a todos trabalhadores e trabalhadoras que nos permitiram (com) viver esses anos, em especial a Luciene, a Terê e aos agricultores familiares. Aos parceiros desta pesquisa. Em especial ao grupo do Projeto Etnobotânica e Soberania Alimentar: Pablito, Siça, Luana, Fernanda, Sara, aos mestres Reinaldo, Tigu, France e Carlos Schaefer, que assumiu o projeto como nosso coordenador frente ao CNPq, e a tantos que contribuíram em momentos específicos no campo. Gratidão pela oportunidade da aprendizagem vialibilizada nesta empreitada. Conhecê-los e vivenciar o processo permitiu fecundos aprendizados acadêmicos e para a vida. E principalmente, por terem me apresentado o sertão norte mineiro, seus encantamentos e suas realidades! Neste trabalho de síntese tem um pouquinho de cada um da equipe.

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“(...) a monocultura é uma prisão. A diversidade, ao contrário, liberta. A independência se restringe ao hino e à bandeira se não se fundamenta na soberania alimentar. Tão só a diversidade produtiva pode nos defender dos mortíferos golpes da cotação internacional, que oferece pão para hoje e fome para amanhã. A autodeterminação começa pela boca”. Eduardo Galeano Montevidéu, 2010 vii


RESUMO

Esta monografia configura-se como uma proposta de síntese e análise dos dados produzidos em experiência pretérita quando da realização do projeto institucional, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), intitulado “ETNOBOTÂNICA E SOBERANIA ALIMENTAR NO NORTE DE MINAS GERAIS: RESGATE DE PLANTAS ALIMENTÍCIAS TRADICIONAIS ENTRE GERAIZEIROS, CAATINGUEIROS, VAZANTEIROS E QUILOMBOLAS”. O objetivo geral da monografia foi analisar a agrobiodiversidade presente em comunidades tradicionais do norte de Minas Gerais e tecer uma rede de elementos necessários a análise da segurança e soberania alimentar. Os quintais e hortas se destacaram na riqueza de flora alimentícia e na multiplicidade de usos e importâncias. Os períodos com maior disponibilidade de plantas foram classificados pelas comunidades como sendo os meses centrais do “tempo das águas” e “tempo das “secas”. A origem das plantas variou pouco quanto ao fato de ser interna ou externa às comunidades. Dentre as inúmeras formas de obtenção das plantas, sobressaíram o “comércio”, a “troca com vizinhos e amigos” e as “ações do/a próprio/a morador/a”. As comunidades apresentaram também riquíssimos saberes sobre as plantas alimentares conhecidas na academia como alimentos emergenciais, cujos significados e formas de uso estão concectados aos momentos históricos de “fome” e “escassez”, tais saberes estão difusos e pouco utilizados atualmente. Por meio das análises e sistematizações de cada contexto das comunidades estudadas foi possível construir o que se chamou de mapa cognitivo para a compreensão da (in)segurança e da soberania alimentar no contexto rural. Com esse mapa espera-se apontar uma rede de categorias e aportes teórico-conceituais que, transdiciplinarmente, se fazem necessários como referência para uma compreensão mais adequada das configurações locais e das condições de possibilidade para análise da (in)segurança e soberania alimentar.

Palavras-chave: Soberania alimentar; Agrobiodiversidade; Segurança Alimentar e Nutricional; Quintais; Plantas Alimentares Emergenciais; norte de Minas Gerais.

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SUMÁRIO 1. PREFÁCIO ...................................................................................................................... 1 2. INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 3 3. REFERÊNCIA CONCEITUAL..................................................................................... 5 3.1. Biodiversidade, agrobiodiversidade e agrodiversidade .......................................................... 5 3.2. Insegurança alimentar, segurança alimentar e segurança alimentar e nutricional .................. 7 3.3. Soberania alimentar .............................................................................................................. 10 3.4. Quintais ................................................................................................................................. 13 3.5. Plantas alimentares emergenciais ......................................................................................... 15 4. OBJETIVOS .................................................................................................................. 18 5. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................... 19 5.1. Caracterização da área de estudo .......................................................................................... 19 5.2. Métodos de produção dos dados etnobotânicos .................................................................... 21 5.3. Análise dos dados ................................................................................................................. 23 6. RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................................................. 24 6.1. Os conceitos locais de “quintal” e “horta” e sua distribuição espacial na paisagem ........... 24 6.2. Importâncias dos quintais para a vida cotidiana de comunidades tradicionais no norte de Minas Gerais ................................................................................................................................ 26 6.3. Caracterização da flora alimentícia presente nos quintais e hortas....................................... 32 Riqueza de etnoespécies alimentares presentes nos quintais e hortas, seus usos e formas de preparo ...................................................................................................................................... 32 Disponibilidade temporal e etnofenologia das plantas alimentares nos quintais e hortas ....... 43 6.4. Origem social dos propágulos que edificam a agrobiodiversidade dos quintais e hortas ..... 56 6.5. Caracterização das plantas reconhecidas como alimentos emergenciais .............................. 63 6.6. Histórico, conflitos e soberania alimentar ............................................................................ 87 7.

CONSIDERAÇÕES ................................................................................................. 106

8. AGRADECIMENTOS ................................................................................................ 107 ix


9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 108 10. ANEXOS .................................................................................................................... 114 ANEXO 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ........................................ 114 ANEXO 2 – Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares nos quintais e hortas por cada comunidade pesquisada ................................................................................. 115 ANEXO 3 – Registro Fotográfico ............................................................................................. 127

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LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Plantas alimentares mais citadas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais e análise geral comparativa. Tabela 2 - Locais de obtenção, riqueza e porcentagem de espécies de plantas alimentares citadas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 3 - Lista das etnoespécies conhecidas, e utilizadas como bens alimentares e obtidas nos quintais e hortas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 4 - Categorias de preparo, consumo e uso das plantas alimentícias citadas pelos entrevistados das comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 5 - Disponibilidade temporal de plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade quilombola de Malhada Grande, Catuti (MG). Tabela 6 - Disponibilidade temporal de plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto, Matias Cardoso (MG). Tabela 7 - Disponibilidade temporal das plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade geraizeira do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). Tabela 8 - Disponibilidade temporal de plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). Tabela 9 - Disponibilidade temporal mais ampla e restrita ao longo do ano de plantas alimentares nas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 10 - Relação de plantas alimentares anuais, perenes e semi-perenes citadas nas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 11 - Origem das plantas alimentares citadas nos quintais das comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 12 - Atores responsáveis pela obtenção das plantas alimentares nos quintais e hortas das comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Tabela 13 - Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares emergenciais pelas comunidades pesquisadas do norte de Minas Gerais. Tabela 14 - Riqueza e porcentagem de plantas alimentares emergenciais registradas por locais de obtenção pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais.

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LISTA DE FIGURAS Gráfico 1 - Categorias de preparo e consumo e riqueza de etnoespécies (número de etnoespécies identificadas) nas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Gráfico 2 - Mapa cognitivo para análise da Segurança e Soberania Alimentar

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LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Porcentagem de etnoespécies disponíveis por mês nos quintais e hortas de cada comunidade pesquisada no norte de Minas Gerais. Quadro 2 - Disponibilidade Temporal/ Meses de escassez, riqueza e porcentagem de plantas alimentares em cada comunidade pesquisada no norte de Minas Gerais. Quadro 3 - Principais características das plantas alimentares emergenciais citadas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais.

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1. PREFÁCIO “A maior riqueza do homem é a sua incompletude. Nesse ponto sou abastado. Palavras que me aceitam como sou – eu não aceito. Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 horas da tarde, que vai lá fora, que aponta lápis, que vê a uva etc. etc. Perdoai Mas eu preciso ser Outros. Eu penso renovar o homem usando borboletas”. Manoel de Barros Retrato do artista quando coisa, 1998 O presente trabalho “está sendo” parte de múltiplos processos de aprendizado. A constante busca de mim, do ser, marca este movimento, numa permanente inconclusão, incompletude e inacabamento como nos faz refletir Paulo Freire e Manoel de Barros. Assim, digo, desde já, que este trabalho faz parte do meu ser na condição e na tentativa de “ser mais”, e ele não acabará com sua apresentação e aceitação pela banca, nem muito menos dentro de mim, de nós. Posso dizer que desde muito pequena fui despertada para o mundo vegetal, seus segredos, belezas e para os inúmeros causos que os doutos que pude conviver contavam. Um deles, se não o mais importante desta estória, por mim inventada, sonhada e vivida, é o meu pai. Isto porque nele há o homem da terra, o homem curioso e pesquisador, o homem operário e o homem meu pai. Talvez por isso tenha me afeiçoado fazer um curso sobre a vida, biologia? Lá estariam tais mistérios e toda a luta necessária que poderia se buscar para uma pessoa que cresceu na época da Rio 92, com tantos desafios acerca do mundo, dos possíveis mundos. Ehh..., o curso não era bem assim e meu pai ainda me pergunta se já aprendi sobre o canto das minhocas... Entrei na UFV em 2009 e de certa forma continuei nessa busca. Caloura, eu participei da Semana Acadêmica e lá, num universo de discussões, fui conhecendo pessoas, temáticas e grupos que percorri durante toda minha graduação. Dois deles foram o grupo Etnoikos e o movimento estudantil. Daí, foram inúmeros espaços de formação, de (des)construção. Com a participação no Etnoikos, pude começar a acompanhar o projeto Etnobotânica e Soberania Alimentar no Norte de Minas Gerais e depois me dedicar um pouco mais a ele como bolsista e ao que apresento agora como monografia, frutos de trabalhos coletivos. Quando li pela primeira vez o prefácio de Eduardo Galeano no livro “As Veias abertas da América Latina”, sabia que era isso que estava buscando neste momento monográfico. Sim, a autodeterminação começa pela boca. A boca que come, mastiga, deglute. A boca que fala, berra, grita e sabe se calar quando é preciso. A boca que canta, sorri, não para de cantar. Vem da compreensão (pessoal e coletiva) que o alimento não pode ser uma mera mercadoria, que vai e 1


vem, que não tem em si o suor do povo que o semeou, cultivou, colheu, guardou, transportou e que por um encontro chegou até nós. Não, assim como, não virá da monocultura do agronegócio a liberdade que procuramos, não virão dos transgênicos, nem tampouco dos organismos geneticamente modificados (OGMs). Tenho aprendido tanto, tanto. Desculpem-me a demora, por não ter cumprido nenhum dos prazos estipulados, mas definitivamente meu tempo não anda dando conta mais de calendários, nem de semestres, às vezes, nem de mim mesma. Porém, agradeço imensamente por ter os feito.

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2. INTRODUÇÃO Como disse, este trabalho foi motivado pela minha participação no projeto de pesquisa institucional financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), intitulado “ETNOBOTÂNICA E SOBERANIA ALIMENTAR NO NORTE DE MINAS GERAIS: RESGATE DE PLANTAS ALIMENTÍCIAS TRADICIONAIS ENTRE GERAIZEIROS, CAATINGUEIROS, VAZANTEIROS E QUILOMBOLAS”. O referido projeto teve como coordenador o Profº Carlos Schaefer e ainda outros mestres, que, como dizem, estão em constante formação (Tigu, Reinaldo e France), além de nós todos, estudantes de graduação ou pós, bolsistas ou voluntários. Hoje, podemos dizer que o (com)partilhamento de valores e o comprometimento com as comunidades nos uniu em propósitos de pesquisa e nos motivou a superar todos os desafios de um trabalho de campo que exigiu fôlego, coragem e muita paixão. Para dar início aos trabalhos de campo, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Viçosa e registrado na Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PPG). Seu objetivo geral foi registrar os conhecimentos tradicionais associados ao uso de plantas alimentícias obtidas tanto por atividades de cultivo quanto por práticas extrativistas em áreas manejadas, tendo como principal força motriz o empoderamento das comunidades parceiras e o fortalecimento de sua soberania alimentar. Foram pesquisadas quatro comunidades tradicionais do norte de Minas Gerais pertencentes a diferentes identidades culturais da região: geraizeiros, caatingueiros, quilombolas e vazanteiros. Ao serem consultadas, todas as comunidades convidadas demonstraram interesse e consentiram em participar do projeto, de modo que, por meio do diálogo, cuidamos por adequar nossa proposta, os tipos de devolução e material com resultados aos seus anseios e às necessidades locais. Dessa forma, além do formal relatório entregue ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) ao final do financiamento, foram redigidos relatórios para duas das comunidades que demandaram um documento para fortalecer suas lutas. No mesmo sentido, outros documentos e materiais foram produzidos com a intensão de devolução dos resultados de forma a uma divulgação maior do rico conhecimento destas comunidades. Deste projeto original foram elaborados vários projetos de extensão universitária, que deram origem a novas sistematizações dos dados. Assim, foram gerados esboços de cinco cartilhas de retorno e um Catálogo da Casa de Sementes de Seu Geraldo Gomes, do município de Serranópolis de Minas. Neste ano de 2015, com recursos de outro projeto aprovado pelo PROEXT, este material será editorado e impresso, para ser, finalmente, entregue às comunidades e à instituição parceira do norte de Minas Gerais (o Centro de Agricultura Alternativa). Em continuidade desta monografia, desde 2014, esta proposta surge em virtude do laborioso trabalho de sistematização e análise de dados produzidos, além da busca por maior compreensão e retribuição da pesquisa, bem como para melhor fundamentar o compromisso do retorno na forma de cartilhas e catálogos para revitalização desses conhecimentos e divulgação popular. Carece dizer também sobre as limitações desta investida. No projeto, éramos um grupo novo, mutante e fomos aprendendo muito ao caminhar. Neste trabalho, desafiei-me no eterno mundo das finalizações, daquele projeto e da graduação, lidando com afinco sobre minhas próprias limitações. 3


Esta proposta se enquadra no seio da Etnobiologia e Etnoecologia e tem como tema principal a agrobiodiversidade e a soberania alimentar. Neste campo do saber, muito tem sido produzido sobre a utilização de plantas pelas comunidades rurais e povos tradicionais, porém pouco tem sido discutido sobre este saber no cerne da soberania alimentar desses povos e comunidades. Somado a isto, fazem-se necessários mais pesquisas e estudos cada vez mais complexos sobre os quintais devido à exarcebada contribuição que trazem enquanto espaços de variada agrobiodiversidade intensamente manejados, repercurtindo no autoconsumo familiar e economia local, e mais políticas públicas dialógicas voltadas para estes agroecossistemas específicos (CANO CONTRERAS, 2014; DUQUE-BRASIL et al., 2007; FLORENTINO et al., 2007). Duque-Brasil et al. (2011) e Florentino et al. (2007) ainda acrescentam a carência de estudos sobre quintais em ambientes semiáridos e de florestas secas como as encontradas no norte de Minas Gerais (DUQUE-BRASIL et al., 2011). Nesse sentido, as plantas alimentares utilizadas em momentos extremos pelas comunidades também merecem atenção, visto a antiga e escassa literatura sobre elas e seus saberes encontrada (NASCIMENTO, 2010). Este trabalho pretende contribuir para análise da segurança e soberania alimentar em comunidades tradicionais por meio da análise da agrobiodiversidade presente nos quintais, da análise das plantas consideradas alimentos emergenciais e do histórico e conflitos das comunidades pesquisadas no semiárido norte mineiro, tecendo, por fim, uma rede de elementos necessários a sua consolidação. Essas plantas serão aqui entendidas e denominadas como “bens vegetais” por serem valores constitutivos dos modos de vida dos grupos sociais pesquisados. Nesse sentido, cabe destacar que aqui elas não são os chamados “recursos”, denominação que pode as reduzir ao significado apenas de recurso econômico, apesar do estudo ecológico entender “recursos”como algo necessário à vida de um organismo. Dessa forma, neste trabalho, as plantas alimentares constituiram-se em objeto de estudo por sua natureza sociobiológica e cultural, e não apenas econômica. Objetiva-se, pois, a) registrar os saberes locais sobre os bens vegetais úteis na alimentação; b) registrar os conceitos locais de “quintal” e “horta” e analisar sua distribuição espacial na paisagem; c) registrar as importâncias dos quintais para a vida cotidiana de comunidades tradicionais destacando seu papel na segurança e soberania alimentar; d) caracterizar a disponibilidade temporal das plantas alimentícias presentes nos quintais e nas hortas; e) analisar a origem social dos propágulos que edificam a agrobiodiversidade dos quintais; e f) Caracterizar as plantas reconhecidas como alimentos emergenciais e o seu papel para as comunidades parceiras. Assim, espero que o relato deste documento possa contribuir para uma melhor compreensão sobre a relação entre culturas e plantas alimentares no semiárido brasileiro, tendo a soberania alimentar dos grupos tradicionais e agricultores familiares como sua principal justificativa social.

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3. REFERÊNCIA CONCEITUAL 3.1. Biodiversidade, agrobiodiversidade e agrodiversidade Segundo a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), de 1992, em seu art. 2º, in verbis, a biodiversidade significa: [...] a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas (BRASIL, 2000).

Subentende-se que a biodiversidade encobre além da diversidade em ecossistemas “naturais” também naqueles com interferência humana (STELLA et al., 2006). Cabe ressaltar que o termo “diversidade” refere-se à pluralidade de formas de vida, assim como os arranjos sociais, religiosos, tecnológicos e institucionais presentes e adaptados às realidades dos grupos humanos e à sustentabilidade ambiental da região onde vivem (STELLA et al., 2006). Já o termo agrobiodiversidade é relativamente recente e na Decisão V/5 da 5a Conferência das Partes da CDB, realizada no ano 2000, em Nairobi, a define como: Um termo amplo que inclui todos os componentes da biodiversidade que têm relevância para a agricultura e alimentação, e todos os componentes da biodiversidade que constituem os agroecossistemas: as variedades e a variabilidade de animais, plantas e microorganismos, nos níveis genético, de espécies e ecossistemas, os quais são necessários para sustentar funções chaves dos agroecossistemas, suas estruturas e processos (STELLA et al., 2006, p. 44).

Segundo Petersen (2013), os agroecossistemas podem ser apreendidos sob a perspectiva ecológica, a partir da qual são encarados como “[...] ecossistemas modificados e mantidos artificialmente em estádios intermediários na sucessão biológica a fim de explorar a alta produtividade líquida (biomassa acumulada) característica da situação de imaturidade ecológica” (p. 83) e como sistemas socioeconômicos nos quais “[...] interagem subsistemas de produção de bens e serviços voltados tanto para o mercado quanto para o consumo da família produtora” (p. 84). Assim, os agroecossistemas podem ser compreendidos como “sistemas ecossociológicos”, “[...] resultado do equilíbrio dinâmico entre várias dimensões da vida material e simbólica das famílias agricultoras e suas comunidades” (p. 85). Entretanto, é necessário fazer a diferenciação dos termos “agrobiodiversidade” e “agrodiversidade”. No primeiro caso, mais antigo e comum, refere-se à diversidade biológica presente nos ecossistemas agrícolas (BROOKFIELD & STOCKING, 1999; SANTILLI, 2009). Já o termo “agrodiversidade” é mais abrangente na medida em que considera “às muitas formas pelas quais os agricultores usam a diversidade natural do ambiente para a produção agrícola, incluindo não apenas as escolhas de espécies e variedades de plantas para o cultivo como também o manejo das terras, águas, e da biota como um todo” (BROOKFIELD & PADOCH, 1994 apud BROOKFIELD & STOCKING, 1999, p. 77). Este último conceito também é entendido como “a variedade resultante da interação entre os fatores que determinam os agroecossistemas: os recursos genéticos de plantas, os ambientes bióticos e abióticos e as práticas de manejo” (ALMEKINDERS 5


et al., 1995 apud BROOKFIELD & STOCKING, 1999, p. 77). “Agrodiversidade” envolve gestão espacial, temporal, e as dimensões organizacionais e de subsistência. Seus elementos; diversidade biofísica, diversidade direcionada, agrobiodiversidade e diversidade organizacional; são interrelacionados e não podem ser considerados um sem o outro. É característica de campos inteiros, fazendas, comunidades e paisagens, em contraste com a diversidade biológica, atribuída a organismos e locais (BROOKFIELD & STOCKING, 1999). Com esta ressalva, Santilli (2009) utiliza o termo “agrobiodiversidade” por ser mais conhecido, o qual será empregado também no decorrer desta leitura. Um elemento fundamental para compreensão da agrobiodiversidade é, portanto, a ação do ser humano sobre os ecossistemas. Desde as práticas de manejo, cultivo e seleção de espécies, desenvolvidas nos últimos 12 mil anos, até tradições e costumes como preferências, festividades, ritos e religiosidade (STELLA et al., 2006; SANTILLI, 2009). Assim, a diversidade agrícola deve ser associada aos contextos, processos e práticas culturais e socioeconômicas existentes e é resultado da diversidade biológica, genética, ecológica e da variabilidade dos sistemas socioeconômicos e culturais (SANTILLI, 2009; SILVA, 2011). Nesse sentido, Machado et al. (2008) compreendem a agrobiodiversidade como “o resultado da interação de quatro níveis de complexidade: (a) sistemas de cultivo; (b) espécies, variedades e raças; (c) diversidade humana; e (d) diversidade cultural” (p. 28). Além disso, deve-se considerar a forma de organização das propriedades rurais, bem como as forças sociais, econômicas e políticas que influenciam e constroem a agrobiodiversidade e o dinamismo que advém nas relações seres humanos e meio (SANTILLI, 2009; BROOKFIELD & STOCKING, 1999). Cabe ressaltar que o manejo da diversidade agrícola é realizado historicamente como resultado das transformações destas relações. Além disso, homens e mulheres atuaram neste processo, individual e coletivamente, o que possibilitou, a construção e a troca de conhecimentos entre os agricultores (SANTILLI, 2009; SILVA, 2011). As sabedorias tradicionais se baseiam “nas experiências que se têm sobre o mundo, seus feitos, e significados, e sua valorização de acordo com o contexto natural e cultural onde se desdobram” (TOLEDO & BARRERA-BASSOLS, 2009, p. 40). Dentre os saberes construídos e transmitidos pelas comunidades de agricultores familiares, tem-se as variedades de espécies que são adaptadas a uma gama de ambientes e manejos locais, seus múltiplos usos, suas denominações e os sistemas de preferências desenvolvidos (SILVA, 2011; SANTILLI, 2009). São também muitos os termos empregados para variedades e linhagens de plantas originadas pela conservação e manejo da diversidade genética pelos agricultores por gerações. Frequentemente, estas variedades são denominadas “tradicionais”, “locais” ou “crioulas”. Esta diversidade é ressaltada e ressalta os valores culturais fundamentados na história das comunidades (OAKLEY, 2004). As variedades cultivadas pelos agricultores são melhores adaptadas ao clima, ao solo e às pragas locais, não necessitam do uso de fertilizantes e agrotóxicos (OAKLEY, 2004), e no âmbito político-ideológico, são “uma afirmação da cultura e da resistência de diversas comunidades” (SILVA, 2011, p. 31).

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Os impactos negativos dos sistemas agrícolas convencionais sobre o ambiente geraram um processo de erosão genética e cultural em diversos países, o qual é difícil de mensurar. É neste contexto de resistência e crítica a estes sistemas que emergiu o conceito de agrobiodiversidade (MACHADO et al., 2008; SILVA, 2011; SANTILLI, 2009). A erosão genética e cultural tornou-se uma preocupação mundial principalmente a partir da década de 1980, ainda no auge da chamada Revolução Verde e foi amplamente discutida na ECO 92 (MACHADO et al., 2008). Em 1996, durante a 4ª Conferência Técnica Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos, realizada em Leipzig, na Alemanha, o Relatório sobre o Estado dos Recursos Genéticos de Plantas do Mundo alertou que a principal causa da erosão genética é a substituição das variedades manejadas pelas variedades “modernas”, com alto rendimento e pequena base genética (SANTILLI, 2009). Esta troca vegetal acarretaria perdas em espécies de animais, de insetos, de combinações genéticas e moleculares, contaminação das águas e dos solos causada por adubos químicos e agrotóxicos utilizados (SANTILLI, 2009; SILVA, 2011). A expansão dos monocultivos é um dos fatores principais para a perda da agrobiodiversidade, acarretando o processo da erosão genética e atingindo toda a gama de conhecimentos associados a agrobiodiversidade previamente construídos (SILVA, 2011). A uniformidade genética torna os cultivos vulneráveis, é incerta e com amplos riscos de perdas totais nas lavouras, o que já ocasionou períodos de grandes fomes, de miséria e de grande mortalidade de populações humanas (SANTILLI, 2009). 3.2. Insegurança alimentar, segurança alimentar e segurança alimentar e nutricional O problema da fome e da desnutrição há décadas é tratado como um problema social devido a fenômenos naturais (CASTRO, 2008). Na obra “Geografia da Fome”, Josué de Castro a analisa como um problema social resultante da forma de organização social da produção e distribuição dos alimentos (CASTRO, 2008). No início do século XX, Josué de Castro destacava a importância dos termos segurança e insegurança alimentar para compreensão deste fenômeno. O termo insegurança alimentar está ligado à questão da fome, aguda e oculta marcada pela desnutrição e/ou subnutrição, e da pobreza (CASTRO, 2008). Segundo Pasini (2014, p. 131) a “FAO [Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação] costumava e costuma apontar a questão da insegurança alimentar como relacionada à capacidade e condições econômico-sociais, e recentemente, [a condições] ambientais, da produção de alimentos”. O tema segurança alimentar é recente e surge durante a 1ª Guerra Mundial (1914 – 1918) na Europa e, somente após a 2ª Guerra Mundial e criação da FAO (1945), que o conceito ganhou mais ênfase. Segundo Andrade et al. (2009), a partir de então, necessitou-se da criação de políticas públicas que proporcionassem independência nos países em produtividade e disponibilização de alimentos, além de formular indicadores da disponibilidade e consumo alimentar e bases de dados nacionais e internacionais. O olhar para a segurança alimentar era ligado ao conceito de segurança nacional visando à produção suficiente de alimentos (ANDRADE et al., 2009; BURITY et al., 2010).

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Como um termo originalmente militar, um país dominaria o outro se obtivesse o controle sobre seu fornecimento de alimentos. Ocorreria, então, a necessidade de formação de estoques de alimentos e de busca de autossuficiência por cada país (MENEZES, 2011). Dessa forma, implementou-se em diversas regiões do planeta um sistema alimentar baseado na importação e na Revolução Verde que tentaria aumentar a produtividade de alguns alimentos, com novas variedades genéticas altamente dependentes de insumos químicos. Em pouco tempo, as consequências deste modelo tornaram-se visíveis, como a já citada erosão genética e cultural, o êxodo rural e a contaminação dos solos, das águas e dos alimentos. Ou seja, o comprometimento de diversos bens naturais e da própria sustentabilidade da produção de alimentos (BURITY et al., 2010; SILVA, 2011; DELFORGE, 2008). A Conferência Mundial de Alimentação, ocorrida em Roma, em 1974, definiu segurança alimentar como “o adequado suprimento alimentar mundial para sustentar a expansão do consumo e compensar eventuais flutuações na produção e nos preços” (FAO, 1974). O termo fortaleceu a Revolução Verde uma vez que propunha o aumento da produção agrícola com intensa utilização de fertilizantes e agrotóxicos (MENEZES, 2011). Portanto, o termo define um objetivo de políticas públicas, assim, este termo está sujeito a distintas conotações, dependendo de condições econômicas, perfil dos organismos internacionais e apropriação dos atores sociais ou agentes econômicos (MALUF, 1995). A ênfase era principalmente no produto e não no ser humano, não garantindo o acesso aos alimentos (BURITY et al., 2010). A produção mundial, nesta mesma década, se recuperou longe do que prometia a Revolução Verde e as mazelas da fome e desnutrição ainda se acentuavam gravemente (BURITY et al., 2010). Assim, para além da disponibilidade de alimentos ou um produto da superpopulação no pós-guerra, é a estrutura econômico-social desfavorável com uma agricultura uniformizada que condiciona o problema da fome (CASTRO, 2008; CHONCHOL, 2005). Portanto, o fenômeno da fome pode ser caracterizado como [...] resultado da exclusão de milhões de pessoas do acesso a terra, água, sementes, conhecimento e bens da natureza para reproduzirem sua própria existência. Ela é resultado das políticas impostas por governos de países desenvolvidos, por suas empresas transnacionais e seus aliados nos países pobres do sul na perspectiva de manter a continuidade da hegemonia política, econômica, cultural e militar sobre o atual processo de reestruturação econômica global. [...] É resultado do aumento da concentração do mercado agrícola mundial nas mãos de poucas empresas transnacionais, o que aumentou consequentemente a dependência e a subordinação alimentar da maioria dos povos a seus interesses de lucro (ZIEGLER, 2008).

O conceito de segurança alimentar foi revisto durante as décadas de 80 e 90 e de acordo com o Fórum Mundial sobre a Alimentação, realizado pela FAO, em 1996 “a segurança alimentar existe quando todas as pessoas, em todo o tempo, têm acesso físico e econômico a alimentos suficientes, seguros e nutritivos para atender às suas necessidades dietéticas e preferências alimentares para uma vida ativa e saudável” (FAO, 1996).

A declaração deste Fórum ainda afirma que a alimentação não deve ser utilizada em pressões políticas ou econômicas (FAO, 1996). Segundo Burity et al. (2010), consolida-se na 8


década de 90 a reafirmação do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), de acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais - PIDESC (1966). O direito relaciona-se tanto a alimentação adequada e suficiente quanto a estar livre da fome (BURITY et al., 2010). Ao estabelecer o aspecto nutricional e sanitário ao conceito de segurança alimentar, este é nomeado de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) no Brasil, o que ressalta a importância tanto da disponibilidade do alimento quanto da qualidade e da valorização dos hábitos alimentares. A SAN passa a ser compreendida como uma possível estratégia para se obter o DHAA (BURITY et al., 2010). Hoje, adota-se o seguinte conceito de SAN no país: Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis (CONSEA, 2009).

A partir dos anos 1990, os governos brasileiros passam a elaborar políticas públicas que garantem o acesso à alimentação no que tange a renda e poder aquisitivo da população. Porém, as soluções são levadas por meio de ações fragmentadas e imediatas, de programas assistenciais pontuais e específicos e sem levar o ser humano na centralidade na tomada dessas estratégias. Este quadro toma novas dimensões sociais e políticas no final dos anos 1990 e início do século XXI (GAZOLLA & SCHNEIDER, 2007; MACHADO et al., 2008). Nos últimos 12 anos, a questão da segurança alimentar torna-se a política principal no campo social do governo federal. Uma ação concreta neste sentido foi a criação, em 2002, do Ministério Extraordinário de Combate a Fome e a da Segurança Alimentar (MESA), hoje chamado de Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) (GAZOLLA & SCHNEIDER, 2007). Ocorreu, assim, a implantação de diversas políticas públicas através do MDS e do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Como exemplo, temos o Programa Comunidade Solidária, o Programa Bolsa Família, o Programa Fome Zero, o Programa Água para Todos no âmbito do Brasil sem Miséria, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Atualmente, temos a instituição da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Decreto No 7.794/2012) com objetivo de promover a transição agroecológica e a produção orgânica e de base agroecológica (BRASIL, 2012). As ações dos órgãos públicos gestores passaram a ser melhor interligadas, mas, segundo a Articulação Nacional de Agroecologia (2010), há muito o que se avançar. Um exemplo é que as políticas de SAN devem também serem capazes de considerar as especificidades de cada região (ANA, 2010). Neste sentido, os governos passaram a apoiar à agricultura familiar, apesar de investimentos modestos, porém inéditos. Isto porque, a agricultura familiar produz alimentos, distribui renda e gera empregos garantindo, então, o acesso a alimentos locais (MACHADO et al., 9


2008). Portanto, ela “[...] é responsável por garantir boa parte da segurança alimentar do país (...)” (PACKER, 2012, p. 17). Vale a pena destacar que entendemos a agricultura familiar a partir da consolidação da Lei da Agricultura Familiar (Decreto No 11.326/2006), por meio da luta dos agricultores familiares e movimentos sociais, que considera agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele com até quatro módulos fiscais, que utilize principalmente mão de obra familiar, com mínimo da renda familiar advinda da atividade rural e que dirija o estabelecimento com a família (BRASIL, 2006). A lei amplia os benefícios para os silvicultores, aquicultores, pescadores, povos indígenas, integrantes de quilombos e demais povos e comunidades tradicionais (PACKER, 2012). 3.3. Soberania alimentar Foi em contraposição ao rumo das discussões durante a Cúpula Mundial sobre a Alimentação, da FAO, realizada em 1996 em Roma, que a Via Campesina, organização internacional de movimentos campesinos, construiu a proposta que seria adaptada, rediscutida e hoje se configura com o que compreendemos como “soberania alimentar” (SOUZA, 2009). Esta propõe outra lógica de produção e comercialização dos alimentos, enfocando na autodeterminação políticas dos povos (VIA CAMPESINA BRASIL, 2007). Para a Via Campesina, a produção e distribuição dos alimentos é uma questão de sobrevivência dos seres humanos, portanto, uma questão de soberania popular e nacional (STÉDILE & CARVALHO, 2010). Ou seja, não dependência, autonomia de fazer, questionamento do modelo de desenvolvimento capitalista opondo-se à mercantilização da vida e da natureza (AMTR-RS, 2007; PIMBERT, 2009). Em resposta à atual crise alimentar mundial, a soberania alimentar e a agroecologia são as alternativas propostas pela Via Campesina. A crise alimentar é um forte elo que liga as crises financeira, climática, energética, social global e da biodiversidade oriundas do modelo neoliberal (DELFORGE, 2008). Pimbert (2009) destaca que o mercado livre aliado à visão neoliberal não resolverá a problemática da fome, pois a visão predominante é que os alimentos são meras mercadorias, assim, quanto menor os preços do trabalho e dos outros insumos melhor o conjunto da cadeia industrial alimentar. Dessa forma, a crise alimentar mundial não é um fenômeno natural, nem advém de aumento populacional; e o fenômeno da fome é “uma realidade dolorosa, persistente e desnecessária” (AMTR-RS, 2007, p. 44), um problema político, econômico e social (DELFORGE, 2008). Do Fórum Mundial de Soberania Alimentar, realizado em Havana (Cuba), em 2001, destacou-se: A soberania alimentar é o direito dos povos de definir suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos, que garantam o direito à alimentação a toda população, respeitando as próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses, pesqueiros e indígenas de produção agropecuária, de comercialização e de gestão dos espaços rurais, nos quais as mulheres desempenham um papel fundamental. [...] Ela pressupõe uma Reforma Agrária radical, e o apoio às agriculturas familiares, em que as mulheres tenham igualdade de oportunidades e de acesso aos meios de produção. O comércio alimentar deve estar subordinado ao supremo direito humano à alimentação. Os produtos agrícolas e alimentares devem estar fora da OMC. [...] Os recursos genéticos

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são um bem de toda a humanidade. Não se pode aceitar o patenteamento dos seres vivos. [...] Para se obter soberania alimentar, são necessários sistemas produtivos sustentáveis, em que se valorize a soberania e as culturas locais e, em especial, os hábitos alimentares. [...] A alimentação jamais será utilizada como arma de pressão econômica e política entre os Países [...] (Declaração Final do Fórum Mundial sobre Soberania Alimentar. Havana, Cuba, 2001).

Os principais elementos são: (a) necessidade de políticas públicas apropriadas para o incentivo e viabilização da produção alimentar, agrícola e pesqueira, que aconteçam por meio de relações trabalhistas dotadas de direitos, com manejos adequados de solos e água, de forma que sejam ecológica, econômica e socioculturalmente apropriados aos grupos sociais e seus contextos políticos específicos; (b) reconhecer o direito à autonomia dos grupos para definir sua dieta alimentar e seu sistema alimentar próprio, ao decidir o que produzir de alimento, como, quantidade, qualidade, onde, sob quais condições visando a autossuficiência; (c) prática de sistemas produtivos e de distribuição sustentáveis, por meio das quais se garante uma produção agroecológica, que utiliza técnicas agrícolas livres de agrotóxicos, distantes de organismos geneticamente modificados e que respeitam o meio ambiente; (d) comercialização com preços acessíveis aos trabalhadores e trabalhadoras e que os protejam contra a especulação e pressão dos preços dos grande mercados, além de promover comércios alternativos, que possibilitem trocas, tanto de alimentos, outros produtos como artesanatos ou até dias de trabalho ou serviços; (e) acesso à alimentação saudável e diversificada, que promove, além da valorização da cultura local, alimentos seguros, nutritivos e culturalmente apropriados à preservação de práticas alimentares; (f) qualidade de vida e distribuição equitativa, entre homens e mulheres, do direito ao acesso e uso dos bens naturais, como a terra, a água, e a agrobiodiversidade prioritariamente, redefinindo os direitos de propriedade; (g) empoderamento das mulheres e jovens, por meio da tomada de decisões conjuntas sobre o uso do território e o reconhecimento social da importância das mulheres na gestão da oferta dos alimentos; (h) prioridade à reforma agrária que modifique a estrutura que impede o acesso a terra como um direito de uso e permanência nos territórios utilizados pelos camponeses, povos e comunidades tradicionais, como forma efetiva de apoio a agricultura familiar (SOUZA, 2009; ANA, 2010; EHNE, sem data; PIMBERT, 2009; DELFORGE, 2008; AMTR-RS, 2007). No Fórum de Mali (2007), avançou-se mais neste conceito de soberania alimentar, que, além de ser um direito, é também um dever dos povos, porque toda a população que deseja ser livre e autônoma tem a obrigação de produzir seus próprios alimentos. Ao compreender que a soberania alimentar, é oposta ao modo de produção capitalista, no qual o alimento torna-se mercadoria controlada por algumas empresas, mais que um direito, é uma condição política exercê-la (STÉDILE & CARVALHO, 2010).

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Neste Fórum, constatou-se que os principais obstáculos que a soberania alimentar enfrenta são os governos neoliberais e as empresas transnacionais. Os governos neoliberais em negociações da OMC e da FAO, com relações capitalistas mais “flexíveis”, ao adotarem a fluidez do mercado e, portanto, prevalecer o interesse econômico violando normas protecionistas para a agricultura familiar de alguns governos nacionalistas e populares (STÉDILE & CARVALHO, 2010). As empresas transnacionais ao comporem um sistema transnacionalizado que “detém o domínio da cadeia alimentar, desde a produção até a comercialização” (PASINI, 2014, p.140). Poucas empresas controlam desde a produção mundial de sementes, comercialização, até a distribuição de alimentos na América Latina (PASINI, 2014). Como discutido na Conferencia Especial para la Soberanía Alimentaria, por los Derechos y por la Vida, Afirmamos que a fome e a pobreza não são produtos da casualidade, senão de um modelo que viola o direito à vida digna das pessoas e dos povos, acrescentando a subordinação da mulher, explorando seu trabalho e inviabilizando sua contribuição social, econômica e cultural. Apesar das evidências em todo o mundo dos nefastos efeitos do modelo neoliberal, o sistema internacional, os governos e as transnacionais insistem em submeter o planeta a um desenvolvimento que esgota as possibilidades mesmas da vida, convertendo as pessoas em meros agentes produtivos, sem rosto e sem história. A liberalização econômica, como único caminho para o desenvolvimento, é diretamente proporcional ao crescimento da pobreza e da fome na região; o não exercício da soberania alimentar compromete gravemente a soberania dos próprios Estados (Declaração da Conferência em Brasília, 2008).

No tocante à questão energética, evidenciaram a importância que a produção de alimentos não seja substituída pela produção de energia a partir de produtos agrícolas e que não utilize produtos alimentícios como, por exemplo, o milho (VIA CAMPESINA BRASIL, 2007). Cabe ressaltar que a soberania alimentar para as organizações sociais e camponesas é mais que um conceito, trata-se de um princípio e de uma ética de vida, não corresponde a uma definição acadêmica uma vez que é um processo coletivo de construção, participativo, popular e progressivo (STÉDILE & CARVALHO, 2010). Foi durante a II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional ocorrida em Olinda (PE), em março de 2004, que a noção de Soberania Alimentar é associada a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). Segundo Burity et al. (2010, p. 13), “[...] os países devam ser soberanos para garantir a Segurança Alimentar e Nutricional de seus povos (soberania alimentar), respeitando suas múltiplas características culturais, manifestadas no ato de se alimentar”. Ao estabelecer a Segurança Alimentar e Nutricional e a Soberania Alimentar como um direito humano pressupõe que “o alimento não pode ser considerado uma mercadoria, pois tem um papel vital para a sobrevivência humana” e, portanto, aspectos éticos e humanos não devem ser submetidos à busca pelo lucro (ANA, 2010, p. 76). Em suma, o conceito de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) está em construção e disputa e refere-se às estratégias de ações e políticas públicas para garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) a todos os cidadãos. Já o DHAA com seus aspectos jurídicos e seus princípios dos direitos humanos serve de apoio na elaboração do conceito e de programas de SAN. A soberania alimentar seria um principio que está dentro de valores que regem a SAN e que 12


são compatíveis com os direitos humanos (BURITY et al., 2010). Assim, segundo Burity et al. (2010) a soberania alimentar, implica em cada nação ter o direito de definir políticas que garantam a Segurança Alimentar e Nutricional de seus povos, incluindo aí o direito à preservação de práticas alimentares e de produção tradicionais de cada cultura. Esse princípio relaciona-se com o direito de todos de participar das decisões políticas de seu país, cujos governantes devem agir de forma livre e soberana e de acordo com os direitos fundamentais de seus habitantes (p.23).

Segundo Pasini (2014), “para que a SAN consiga efetivamente cumprir este princípio [soberania alimentar], as políticas públicas e estratégias de ações voltadas à sua promoção devem transcender à lógica mercantil” (p.130). A principal crítica dos movimentos sociais em relação às políticas públicas do governo é que as mesmas são insuficientes para atacar de fato a raiz do problema. Dos diversos fatores que impedem a soberania alimentar no Brasil, destaca-se o modelo de produção e tecnológico neoliberal adotado pelo Estado (STÉDILE & CARVALHO, 2010; THOMAZ JUNIOR, 2006). A soberania alimentar faz parte do universo de relações sociais de trabalho e de produção, portanto, não pode ser resumida ao contexto rural e da luta pela soberania do país em geral, pois implica em outro projeto de sociedade, de autonomia política dos povos (AMTR-RS, 2007; PIMBERT, 2009; EHNE, sem data; THOMAZ JUNIOR, 2006). Dentre as diversas táticas para se alcançar a soberania e segurança alimentar e nutricional (SSAN), destaca-se a agrobiodiversidade. Cabe mencionar que a Secretaria de Biodiversidade e Florestas (SBF/MMA), no planejamento das atividades para o período de 2004 a 2007, questionou-se: “afinal, agrobiodiversidade para quem?”. Ao analisar os estabelecimentos de categoria familiar, de patronais e do governo e outros, por meio de suas respectivas áreas agrícolas e número de estabelecimentos rurais, ficou evidente a concentração fundiária no Brasil. A distribuição de recursos para financiamento (crédito) e investimento do governo no setor agrícola também foi desigual, sobrepujando a categoria patronal, em detrimento da familiar. A partir desse estudo, direcionou-se a atenção nas atividades relacionadas à agrobiodiversidade para a agricultura familiar, destacando o segmento da reforma agrária como o mais prioritário e com foco no diálogo com as comunidades, suas realidades, saberes e práticas (STELLA et al., 2006). 3.4. Quintais Ao direcionar o olhar para a agrobiodiversidade na agricultura familiar, entendemos que a mesma é construída e mantida nos agroecossistemas (MACHADO et al., 2008; PETERSEN, 2013; SANTILLI, 2009), em especial nos ambientes frequentemente denominados quintais, ou também, terreiros, “home garden” e “huerto familiar” (CANO CONTRERAS, 2014; DUQUEBRASIL et al., 2007, 2011; HUAI & HAMILTON, 2008; SEMEDO & BARBOSA, 2007). Os quintais são sistemas agrícolas tradicionais socialmente construídos a partir do cultivo de plantas, criação de pequenos animais e outras atividades diversas ao redor das moradias, voltados fundamentalmente o autoconsumo das famílias, que, por sua vez, podem manter distinta dependência a mercados externos, apesar de estarem cada vez mais ligados e influenciados por eles (AMARAL & GUARIM NETO, 2008; FLORENTINO, 2007; HUAI & HAMILTON, 2008). 13


Normalmente, os quintais localizam-se próximos às residências, sendo espaços manejados ao longo de anos com agrobiodiversidade adaptada aos microambientes, por meio de experimentações a fim de conservar e diversificar espécies, variedades (exóticas ou não), e manter bancos de sementes locais; e possuem múltiplos usos e formas (DUQUE-BRASIL et al., 2007; HUAI & HAMILTON, 2008). Mudanças bruscas nestes sistemas podem ocasionar erosão genética e cultural, das inúmeras espécies e variedades, saberes e práticas associadas. Pois, são centros de (re) produção social e cultural (AMARAL & GUARIM NETO, 2008; CANO CONTRERAS, 2014). Os quintais se destacam por conterem altos níveis de produção otimizados em comparação com a baixo aporte de tecnologias externas, mantendo-se principalmente pelo trabalho familiar, geralmente diferenciado entre homens e mulheres (CANO CONTRERAS, 2014; FLORENTINO, 2007; HUAI & HAMILTON, 2008; OAKLEY, 2004). Além disso, os quintais podem ser caracterizados pela variedade de tipos existentes no globo, classificando-os pelos seus tamanhos, estruturas e funções. Variam florísticamente de acordo com sua localização. Alguns fatores que devem ser considerados em sua composição são o microclima, disponibilidade de água, qualidade e estrutura do solo, bem como das relações simbióticas presentes (HUAI & HAMILTON, 2008). Nos quintais potencializa-se o uso do espaço, além de ocorrer uma maior resistência a variações ambientais, como desequilíbrios ecológicos (CANO CONTRERAS, 2014). As principais funções dos quintais foram sintetizadas por Huai e Hamilton (2008) em: (a) fornecimento de alimentos, medicamentos, forragem, sombra, plantas ornamentais e renda aos proprietários, potencializando a economia local e o envolvimento social; (b) ecológica, especialmente na dinâmica de ciclagem de nutrientes do solo e de conservação da agrobiodiversidade, destacando as plantas nativas e endêmicas; (c) cultural, devido às festas, brincadeiras e atividades religiosas, as espécies cultivadas especificamente para estes momentos, além de poder retratar valores e significados; e (d) experimental, pela histórica domesticação de populações de espécies silvestres, aclimatação, seleção e melhoramento de variedades domesticadas. Além disso, vários autores reafirmam a centralidade dos quintais para o autoconsumo familiar, (AMARAL & GUARIM NETO, 2008; CANO CONTRERAS, 2014; DUQUE-BRASIL et al., 2007; FLORENTINO, 2007; LACERDA, 2008; OAKLEY, 2004; SEMEDO & BARBOSA, 2007). Os quintais também configuram ambiente de lazer e sociabilidade comunitária (AMARAL & GUARIM NETO, 2008; DUQUE-BRASIL et al., 2007). Assim, os quintais tem papel destacado na concretização da autonomia familiar e contribuem, portanto, para a soberania alimentar. As práticas locais que atuam como distúrbios e modificações graduais na paisagem contribuem para o acréscimo de novas espécies ocasionando um aumento da diversidade local (CAVECHIA, 2011). Desta forma, entender como ocorre a obtenção de espécies, como ocorrem as trocas sociais é importante para a garantia da SSAN. É importante também entender a origem e o desenvolvimento dessas relações de trocas (BOISSEVAIN, 1987). O valor de troca está relacionado positivamente em relação ao valor de uso, portanto, para além das práticas mercantis o 14


valor de troca transcende o valor em si e é impregnado de simbolismos (MENASCHE et al., 2008) e de relações de poder. Dito isso, evidenciamos a importância das redes de trocas sociais na busca da SSAN. As escolhas alimentares das comunidades e suas alterações de tempos em tempos implicam em expressões de identidade e isto é melhor demonstrado a partir da comida. Essa última abarca todo um contexto cultural, social e histórico (MENASCHE et al., 2008). A comida expressa a identidade de um povo na medida em que pode se reconhecer uma constante de hábitos alimentares, ao mesmo tempo em que esta constante pode não ser exclusiva deste povo (FRIEIRO, 1996). O papel feminino é de fundamental importância para a revitalização de culturas e hábitos alimentares, pois, além de deter o saber-fazer, as mulheres são consideradas guardiãs da agrobiodiversidade, elas mantém práticas de produção e de manejo da paisagem, especificamente, nos quintais, guardam as sementes crioulas e mantém um fluxo de trocas delas na comunidade (OAKLEY, 2004). Assim, as tradições culinárias são reafirmadas e essa produção para o autoconsumo é garantia da segurança alimentar e nutricional (MENASCHE et al., 2008). No caso de sistemas agrícolas tradicionais, identidade e tradições culinárias, é importante entender em qual território e quais territorialidades são tecidas neles. E, principalmente, compreender e exercitar o direito ao território das comunidades e dos povos, onde possam reproduzir e reelaborar suas culturas com potencial autonomia e soberania alimentar. Cabe dizer que território é entendido aqui como o local, material ou não, que a vida é (re) produzida socialmente, imersa em distintas relações de poder. Enquanto que a territorialidade é construída a partir do território, em suas múltiplas formas de apropriação e dominação. Para uma leitura mais detalhada, ler Little (2002), Pasini (2014) e Porto-Gonçalves (2002). 3.5. Plantas alimentares emergenciais Um elemento constituinte da agrobiodiversidade entre os mais distintos ambientes das regiões semiáridas, áridas ou desérticas do globo são plantas comestíveis reconhecidas como alimentos emergenciais, ou “famine food” (MULLER e ALMEDOM, 2008). Geralmente adaptadas aos climas, solos e biomas regionais, estas plantas foram historicamente utilizadas como estratégia de sobrevivência de populações em momentos de escassez hídrica e/ou conflitos territoriais os quais geraram situações de insegurança alimentar. Por este motivo, as plantas alimentícias emergenciais foram importantíssimas para a manutenção e (re)produção social desses grupos (MELLO et al., 2011). Castro et al. (1947) fazem um estudo do estado nutricional destes “alimentos silvestres, às ‘comidas brabas’ ou ‘iguarias bárbaras’ ” (p. 6) com distintas formas de preparo e partes de uso. São analisados a farinha de macambira (Bromelia laciniosa Mart. e Bromelia caratas L.), a semente de mucunã (Mucuna glabra RT.), a farinha da raiz de mucunã (Mucuna glabra RT.), o côco catolé (Cocus comosa Mart.), a farinha de parreira brava (Abutua platyphylla Mart.), o xiquexique (Pilocerius setosus Guerke) e a raiz de umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda). Ao final, concluem que tais alimentos são ricos, diversos e devem ser fomentados. Algumas citações 15


de toxidez não procederam, pois eles acreditaram que elas advêm da já frágil situação alimentar das populações neste contexto. Nesse sentido, eles não só corroboram cientificamente a eficácia destes alimentos como apontam a resistência do povo sertanejo ao recorrem a eles. Em estudo realizado comparando as plantas alimentícias da caatinga pernambucana e paraibana, Nascimento (2010) discute a problemática da fome e em contraposição a riqueza da biodiversidade vegetal e do fato de mundialmente pouquíssimas variedades e espécies serem consumidas em detrimento das plantas regionais e nativas. Existe, pois, uma gama de plantas alimentícias não oriundas da agricultura, as denominadas, plantas alimentícias silvestres. Estas com baixíssima utilização, apresentam alto potencial para a segurança alimentar, manutenção da saúde através da complementação da dieta alimentar e renda nas mais diversas comunidades (NASCIMENTO, 2010). Já os alimentos emergenciais são associados a situações de extrema penúria, geralmente “não são colhidos devido a baixa qualidade nutricional do órgão alimentício, ao sabor desagradável ou a fatores culturais” (ELLEN, 2007 apud NASCIMENTO, 2010, p. 25). Alguns fatores apontados que interferem no consumo dos alimentos silvestres e emergenciais são os tabus, costumes e crenças locais, a ligação entre o seu uso e situações de pobreza e o desconhecimento tanto em identificá-las quanto aos bens nutricionais e efeitos colaterais apresentados (NASCIMENTO, 2010). Minnis (2000) apud Nascimento (2010) considera dois fatores principais para caracterizálas: serem comestíveis e resistentes a fatores que reduzem a colheita dos alimentos comuns, como algumas características biológicas que irão torná-las emergenciais em uma região, por exemplo, espécies xerófitas resistentes a seca em regiões com limitação hídrica e defesas bioquímicas e estruturais que limitam a predação como espinhos e toxidez. Esta última pode gerar uma série de efeitos colaterais que compõem a caracterização de alimentos emergenciais. Outros fatores apontados são a densidade populacional e a irregularidade na produção destas plantas. Nascimento (2010) ainda se utiliza da classificação elaborada por Guinand e Lemessa (2001) para categorizar a parte da planta e a situação em que é consumida, a saber: (a) alimentos emergenciais típicos: tolerantes a seca e podem permanecer no solo por muito tempo, coletados quando a necessidade aumenta; (b) plantas silvestres que atraem categorias adicionais de consumidores em períodos de escassez alimentar: são consideradas comestíveis e consumidas em qualquer época do ano, porém são requeridas devido a situação adversa; (c) plantas alimentícias silvestres com componentes de uso emergencial: plantas com múltiplos usos e partes utilizadas; e (d) alimentos cultivados com componentes de alimentos emergenciais: partes de plantas cultivadas geralmente não consumidas, pois sua utilização pode levar a destruição total da planta ou comprometer a colheita, um exemplo é o consumo do pseudocaule da bananeira (Musa x paradisiaca L.) em períodos de falta de alimentos (NASCIMENTO, 2010). 16


Dessa forma, as plantas alimentícias emergenciais podem ser entendidas como importantíssimas, , atuando na amenização das situações de extrema insegurança alimentar. Além disso, tem rico potencial na diversificação alimentar, pois, ao se preparar, manejar e consumí-las são (re)produzidos saberes e práticas tradicionais conectados ao contexto regional das comunidades e povos que as utilizam (MELLO et al., 2011). Estratégias indicadas para conhecer e popularizar estes alimentos são políticas locais participativas e a produção de técnicas de processamento a fim de diminuir os efeitos que limitam seu uso (NASCIMENTO, 2010).

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4. OBJETIVOS Geral Analisar a agrobiodiversidade presente em comunidades tradicionais do norte de Minas Gerais e tecer um mapa conceitual de elementos necessários à compreensão da (in)segurança e soberania alimentar.

Específicos - Registrar os saberes locais sobre os bens vegetais úteis na alimentação; - Registrar os conceitos locais de “quintal” e “horta” e analisar sua distribuição espacial na paisagem; - Registrar as importâncias dos quintais para a vida cotidiana de comunidades tradicionais destacando seu papel na segurança e soberania alimentar; - Caracterizar a disponibilidade temporal das plantas alimentícias presentes nos quintais e nas hortas; - Analisar a origem social dos propágulos que edificam a agrobiodiversidade dos quintais; e - Caracterizar as plantas reconhecidas como alimentos emergenciais e o seu papel para as comunidades parceiras.

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5. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 5.1. Caracterização da área de estudo A região Norte de Minas Gerais é habitada por diversos povos e comunidades tradicionais, como indígenas, quilombolas, geraizeiros, caatingueiros, vazanteiros, dentre outros (COSTA, 2006). As comunidades lá residentes possuem estratégias de produção e manejo da paisagem, diferenciados e adaptados às variações climáticas e edáficas em escala local e regional. Cabe ressaltar que os povos e comunidades tradicionais são conceituados a partir da diversidade fundiária brasileira e do campo de lutas territoriais, dimensão empírica e política, caracterizados também pela propriedade comum de terras, sentimento de pertencimento a um lugar, autonomia cultural e práticas adaptativas sustentáveis, além das tradições culturais continuarem em constante transformação e por suas dinâmicas de mobilizações (LITTLE, 2002). Em uma área de 120.701 km², o Norte de Minas localiza-se numa região de transição entre os biomas Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica, onde predominam florestas estacionais decíduas e diferentes fitofisionomias savânicas. Junto à diversidade ecológica, a diversidade social proporcionou a formação de grupos com identidades culturais distintas, por meio de suas próprias e constrativas definições (COSTA, 2006). Nesse sentido podemos exemplificar com os povos quilombolas, caatingueiros, geraizeiros, vazanteiros, veredeiros, chapadeiros e barranqueiros. Neste contexto, a agricultura norte-mineira desenvolveu-se à medida em que os povos e comunidades se relacionaram com o ambiente e o clima, criando múltiplas estratégias em seus manejos (COSTA, 2006; SILVA, 2011). A partir da década de 1970, com o intuito de “integrar” o norte mineiro, uma série de programas e projetos de desenvolvimento baseado nos princípios da Revolução Verde, com uso intensivo de mecanização e pacotes agroquímicos, foi promovida. Por meio da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), investiu-se ainda mais na pecuária já consolidada historicamente na região, bem como na produção florestal e agrícola intensiva, além da implementação dos grandes projetos de irrigação. A repercussão se deu no “empobrecimento dos agricultores familiares, na degradação dos recursos naturais e na manutenção da concentração fundiária” (FEITOSA & BARBOSA, 2005, p. 8). Para reverter o quadro de miséria o governo inseriu diversos programas assistencialistas que buscaram substituir as sementes crioulas por variedades comerciais híbridas ou melhoradas geneticamente. Como consequências, a deterioração da vida no campo foi intensa, houve um grande êxodo rural e, como ressalta Dayrell (1998) apud Silva (2011), a importação de gêneros alimentícios desestruturou o sistema alimentar local. Entretanto, essas inúmeras mudanças advindas da lógica capitalista não deram fim as lógicas de vida, bem como, manejo, conservação local e uso da agrobiodiversidade pelos povos tradicionais. Estes sobrevivem em complementaridade e também em contrariedade ao construir suas próprias lógicas produtoras de territorialidades e de espaços sociais diferenciados (COSTA, 2006). A escolha de quatro comunidades para participar da presente pesquisa foi visando representar as principais identidades culturais do norte de Minas Gerais. O contato inicial foi 19


facilitado pelo Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA-NM), uma ONG que trabalha em parceria com comunidades em toda região, em ocasiões de eventos como o Encontro dos Vazanteiros realizado em Itacarambi (Setembro de 2010), Encontro dos Povos e Comunidades Tradicionais do Norte de Minas realizado em Montes Claros (Outubro de 2010) e o V Encontro de Agrobiodiversidade realizado em Rio Pardo de Minas (Dezembro de 2010). Outras instituições locais como as Associações comunitárias das comunidades de Pau Preto, Touro e Sobrado, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio Pardo de Minas (STR), Comissão Pastoral da Terra (CPT) auxiliaram nossa aproximação. Nesses encontros, o diálogo com diversas lideranças foi realizado com o objetivo de apresentar os objetivos e propósitos do projeto institucional, assim como oferecer um convite de parceria. O estudo foi realizado conforme disponibilidade e interesse das comunidades. Neste contexto, as comunidades parceiras desta pesquisa foram: os quilombolas de Malhada Grande (município de Catuti, MG), os vazanteiros da Ilha do Pau Preto (Matias Cardoso, MG), os geraizeiros do Sobrado (Rio Pardo de Minas, MG) e os caatingueiros do Touro (Serranópolis de Minas, MG). Malhada Grande A comunidade quilombola de Malhada Grande pertence ao quilombo Gututuba, estabelecido nos vales do Rio Verde Grande e Gorutuba. O quilombo engloba mais de 27 comunidades que abrangem sete municípios do centro norte mineiro (COSTA FILHO, 2008). Esta comunidade situa-se no município de Catuti e é cortada pelo Rio Serra Branca, afluente do Rio Gorutuba, região localizada na faixa de transição entre os biomas Mata Atlântica e Caatinga, onde predominam florestas estacionais decíduas em estágios iniciais de sucessão, frequentemente denominados “carrascos”. A comunidade é habitada por cerca de 50 famílias. A principal atividade econômica é a agricultura familiar, organizada em unidades familiares, tendo o milho, feijão e mandioca como suas principais culturas. Vale a pena destacar a prática ancestral de manutenção de roças comunitárias de mandioca. Pau Preto A comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto localiza-se no interflúvio dos Rios São Francisco e Verde Grande, em território anteriormente conhecido como Arraial do Meio, no município de Matias Cardoso, MG. A região está na transição entre os biomas Mata Atlântica e Caatinga, onde predominam matas ciliares e florestas estacionais decíduas em diferentes estágios de sucessão. Os vazanteiros reconhecem distintos ambientes em seu território e os manejam em conformidade com o ciclo natural do rio e assim, suas próprias vidas são marcadas pelas mudanças e adaptações aos períodos de cheia, vazante e seca. A comunidade é constituída por cerca de 60 famílias que se (re) produz economicamente através da agricultura familiar e da pesca. Além disso, muitas vezes precisam complementar a renda familiar em empregos temporários na cidade, estabelecendo vínculos nas cidades de Manga (MG) e de Matias Cardoso (MG).

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Sobrado A comunidade geraizeira do Sobrado abriga várias nascentes de córregos pertencentes à bacia do Rio Pardo, município de Rio Pardo de Minas. A vegetação da região é caracterizada por diversas fitofisionomias do bioma Cerrado, em área de transição para a Caatinga. A paisagem é composta por planaltos e montanhas e possui, no mínimo, sete nascentes em seu território. A principal atividade econômica dos seus habitantes é a agricultura familiar, principalmente com a produção de café em sistemas agroflorestais e o feitio tradicional da farinha de mandioca. Ocorre também o extrativismo de plantas e frutos do cerrado para complementar a renda e utilização na produção de remédios caseiros. Os quintais dos geraizeiros são denominados “chácaras”, as quais constituem-se sistemas agroflorestais que combinam várias espécies arbóreas nativas e exóticas com o cultivo de café sombreado. Touro A comunidade caatingueira do Touro localiza-se em Serranópolis de Minas, embora seus habitantes tenham relações sociais e comerciais mais frequentes com o município de Porteirinha, onde ocorre a feira mais importante da região. Os caatingueiros do Touro habitam o sopé da Serra Geral na bacia do Rio Mosquito. Esta região é caracterizada pelo encontro dos biomas Mata Atlântica, Caatinga e Cerrado, onde predominam diferentes estágios sucessionais de florestas estacionais decíduas, popularmente denominadas “caatingas” e “carrascos”. Com cerca de 170 habitantes, em torno de 60 famílias, a comunidade produz principalmente feijão, milho e amendoim que, juntamente com outros produtos, são comercializados nas feiras locais. 5.2. Métodos de produção dos dados etnobotânicos A presente monografia utilizou dados construídos a partir de metodologias etnoecológicas abordados no projeto institucional “Etnobotânica e soberania alimentar no Norte de Minas Gerais: resgate de plantas alimentícias tradicionais entre caatingueiros, geraizeiros, quilombolas e vazanteiros” (CNPq/Nº559569/2010-6) que foi devidamente aceito nas exigências para realização de pesquisa envolvendo seres humanos (Conselho Nacional de Saúde, através da Resolução n° 196 de 10/10/1996) pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Viçosa (UFV), havendo acerto das condições legais para sua realização com os entrevistados (assinatura do Termo consentimento de livre e esclarecido – ANEXO 1). Além disso, este foi apresentado e devidamente adequado de acordo com as demandas de cada comunidade e dentro das nossas limitações de formação. O projeto fundamentou-se especialmente na observação participante, que nos permitiu uma vivência mais próxima às comunidades, ampliando nossa percepção de seus hábitos, tradições e dinâmicas e nossa interação com a mesma (ALBUQUERQUE et al., 2010), e por meio dela foram realizadas oficinas para mapeamento da comunidade, turnês guiadas nos ambientes levantados, entrevistas semi-estruturadas, listagem livre, levantamento estrutural e florístico dos quintais, coleta de material botânico, registro em caderno de campo, fotografia e gravação, entre dezembro de 2010 e julho de 2011. Posteriormente, realizaram-se expedições de retorno às comunidades

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para retribuição dos resultados parciais e para confirmação das informações por meio de oficinas participativas em cada comunidade, realizadas entre junho e agosto de 2012. Antes da aprovação do projeto institucional, o retorno às comunidades já havia sido previsto e indicado, mas foi no contato inicial das comunidades a serem pesquisadas que as ações foram acertadas, sempre orientado pelas demandas das comunidades. Assim, tais escolhas, ética e teórico-metodológica, foram premissas em todo o processo deste trabalho. A própria elaboração desta monografia se dá nesta perspectiva, em vista a somar na produção de material didático constituinte do retorno acordado. Para esta monografia, utilizou-se das sistematizações feitas das entrevistas semiestruturadas, entrevista orientada por um roteiro previamente elaborado, porém fluída ao permitir que outros elementos e questionamentos, muitas vezes inesperados, surjam, e façam parte dela, o que pode ajudar e facilitar a compreensão da temática pesquisada (ALBUQUERQUE et al., 2010). Tais entrevistas facilitaram o entendimento do histórico de vida de cada família entrevistada e sua relação com as plantas e cultivo, assim, perguntamos sobre o sustento da casa e a posse da terra, a relação com as plantas alimentares, com a comunidade e do que consideravam que faltava para serem felizes. Em especial, utilizei os questionamentos sobre a importância dos quintais para os entrevistados e o consumo atual das plantas consideradas alimentos emergenciais. Nos diálogos foi indagado se estas eram conhecidas e se sim, se eram consumidas atualmente e o porquê, quais seriam estas plantas e suas principais características. Ao todo, foram visitados 31 domicílios e entrevistaram-se os responsáveis de cada residência. Foram 5 mulheres (idade entre 37 e 65 anos) e 3 homens (entre 60 e 72 anos, todos acompanhados de suas esposas) na comunidade quilombola de Malhada Grande; 3 mulheres (idade entre 37 a 58 anos) e 5 homens (entre 53 e 73 anos, sendo dois acompanhados de suas esposas) na comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto, nesta comunidade com um entrevistado não foi possível seguir o roteiro da entrevista semi-estruturada realizando apenas a amostragem de seu quintal; 5 mulheres (idade entre 42 e 77 anos, duas acompanhadas de suas filhas) e 3 homens (entre 67 a 79 anos, dois com suas respectivas esposas) na comunidade geraizeira do Sobrado; e 2 mulheres (34 e 49 anos, uma acompanhada do marido) e 5 homens (idade entre 42 e 70 anos, dois acompanhados das esposas) na comunidade caatingueira do Touro. Utilizei também das sistematizações das listas livres (ALBUQUERQUE et al. 2010; MEJÍA, 2002) quando os parceiros eram perguntados a citar as plantas alimentares e emergenciais conhecidas. Pelas listas-livres, foi possível caracterizar as plantas utilizadas na alimentação, partes usadas, usos, época de disponibilidade e seus locais de obtenção. Além disso, para as etnoespécies ocorrentes nos quintais e hortas, perguntou-se também sobre a origem das mudas, de onde e de quem haviam obtido, a fim de entender as relações sociais configuradas em cada comunidade. As relatorias feitas nas expedições de retorno para retribuição dos resultados parciais e confirmação de dados foram requeridas também por terem o registro de falas das reuniões iniciais com o grupo em que conversávamos sobre o que se passou na comunidade desde o início da pesquisa e o registro das dinâmicas das oficinas participativas realizadas sobre as temáticas das importâncias dos quintais e das trocas sociais. 22


A fim de adentrar na discussão sobre as condições de possibilidade a consolidação da segurança e soberania alimentar, busquei contextualizar cada comunidade, principalmente nos seus elementos históricos e identitários, por meio das entrevistas realizadas em campo e dos relatórios produzidos pelo grupo de pesquisa do projeto que orientou a construção desta monografia. Em especial, o trabalho realizado por Mello et al. (2011) que trata do histórico e identidade das comunidades pesquisadas, por Dayrell et al. (2011) sobre etnoecologia e paisagem e os relatórios técnicos ambientais elaborados pela equipe os quais foram requeridos pelas comunidades da Ilha do Pau Preto e do Sobrado durante o processo de conflitos em que passavam. 5.3. Análise dos dados A análise da importância dos quintais se deu por meio das entrevistas semi-estruturadas e das discussões em grupo nos campos de retorno, com isto foi possível organizar os pontos discutidos em todas as comunidades pesquisadas e agruparam-se as informações semelhantes fazendo, assim, um texto síntese. A partir das listas livres e das respectivas planilhas de bancos de dados feitas e posteriormente confirmadas, foram construídas tabelas com as informações sobre as plantas alimentares, ora comparando as comunidades pesquisadas, ora agrupando-as e analisando-as como um todo. Assim, com as tabelas, foi possível elaborar categorias de preparo e consumo das plantas alimentares e emergenciais, e identificar os seguintes elementos: as plantas com maior e menor frequência de citações, a parte mais utilizada das plantas, importância relativa ao longo do ano e meses de maior e menor disponibilidade. Sobre os dados das origens das plantas dos quintais fezse uma análise simples das informações das entrevistas e das expedições de retorno buscando saber se eram internos ou externos à comunidade e que atores estavam envolvidos na troca. Fez-se uma análise também de todos os registros sobre as plantas alimentícias emergenciais a fim de caracterizá-las. Utilizou-se das discussões em grupo sobre a disponibilidade temporal das plantas, trocas sociais e plantas alimentícias emergenciais para qualificar os valores apresentados nas tabelas. Diante deses dados, lançou-se mão de depoimentos das entrevistas para relacioná-los com o contexto das comunidades a fim de entender os múltiplos aspectos que influenciam as situções de (in) segurança alimentar e de ameaça ou não à soberania alimentar. Por fim, sintetizou-se esse esforço de análise com a proposição do que aqui se denominou como Mapa Cognitivo para análise das condições de possibilidade e das necessidades decorrentes quando se aborda a questão alimentar em comunidades rurais.

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6. RESULTADOS E DISCUSSÃO 6.1. Os conceitos locais de “quintal” e “horta” e sua distribuição espacial na paisagem

A casa que não tem planta é igual casal que não tem filho, né? Fica os dois ali, um olhando pro outro. Parece que ao redor fica tudo vazio, sem quintal (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). Durante as entrevistas, os parceiros citavam as plantas utilizadas na alimentação e seus locais de obtenção. Dentre os inúmeros locais, o termo quintal foi o mais citado durante a listagem das etnoespécies, outros termos informados que remetem ao mesmo espaço, porém com baixa citação foram: “casa”, “casa da mãe”, “casa do pai”, “fundo da casa”, “na casa do vizinho”, “propriedade”, “redor de casa” e “terreiro”. Em geral, para os parceiros da pesquisa, o termo quintal abrange o local ao redor da casa em que há plantio e criação de animais. É uma área onde destina-se um cuidado diário, devido às inúmeras plantas cultivadas, de pequeno à grande porte, e aos bichos criados como cachorros, aves, galinhas, porcos, entre outros. Ressalta-se muito a presença e a variedade de árvores frutíferas lá encontradas: “Pé de árvore se enche vira quintal” (vazanteira da comunidade da Ilha do Pau Preto, idade não informada). Os quintais apresentam diferentes espaços, como a “horta”. Geralmente, a “horta” é local onde se cultiva plantas de ciclo curto, por exemplo, açafrão, alface, alho, beterraba, cebola, cebolinha, cenoura, coentro, jiló, pimentão, quiabo, salsa e tomate. Ela também foi denominada de “canteiro” por alguns vazanteiros da Ilha do Pau Preto. A horta costuma ficar dentro do quintal e próxima às moradias, pois exige regas mais constantes, em geral duas vezes ao dia durante todos os dias da semana. Contudo, nem sempre a “horta” está próxima a casa e/ou dentro do quintal, como na comunidade geraizeira do Sobrado, que algumas “hortas” ficavam na parte baixa do terreno, na “baixa” ou no “brejo”, área mais úmida o que evita regas tão constantes, enquanto suas casas estavam em região mais alta, por eles conhecida como “tabuleiro”, área mais alta que a “baixa” e o “brejo” com terreno aplainado que não alaga: “Horta é perto do córrego no fundo da propriedade, as casas são no alto” (geraizeira da comunidade do Sobrado, 77 anos). A “baixa” e o “brejo” são os locais mais baixos no relevo e que podem sofrer alagamento, sendo a “baixa” mais úmida que o “tabuleiro” e menos que os “brejos”, que estão mais próximos aos córregos. Outro geraizeiro nos explicou que se a casa for feita na região alta, a “horta” fica no quintal dentro da propriedade, agora se a casa for construída na região baixa, faz-se a “horta” no “brejo”. Muitos ainda disseram mudar a localização das hortas em função da época de chuva e umidade do terreno, assim, as hortas são feitas no “tabuleiro” na época de chuva com plantas que suportam a chuva e são feitas no “brejo” na época de seca. Outra justificativa apontada sobre a diferenciação da localização da horta foi por causa do contato com animais e suas fezes: “Horta fica na roça, é longe, gestão de higiene. Não vai gato, cachorro, galinha” (geraizeira da comunidade do 24


Sobrado, 66 anos). Por fim, uma entrevistada não fez essa distinção: “Faz a horta dentro do quintal, num lugar mais aberto, é tudo junto” (geraizeira da comunidade do Sobrado, 42 anos). A maioria das casas, quintais e criações de pequeno porte e “chácaras” de café na comunidade do Sobrado ocorrem nos “tabuleiros”. Mas segundo os moradores se os quintais e “chácaras” forem feitos na “baixa” eles irão produzir mais e ao longo do ano em contraste com o plantio no “tabuleiro”. Ainda foi observado por eles que as plantações variam de forma, tamanho e gosto dependendo da época de plantio e dos lugares dentro do ambiente da “baixa” (DAYRELL et al., 2011). Cabe dizer que as “chácaras” são locais característicos de tradição da comunidade, onde há pés de café entremeados e sombreados com outras árvores e plantações ao redor das casas formando uma verdadeira agrofloresta. Os bosques são formados, sobretudo, por Ingazeiros (Inga sp.) que otimizam o controle biológico de pragas, aumentando a produção do café (REZENDE et al., 2014). Alguns moradores identificam as “chácaras” como ambientes característicos da região. Porém, muitos entrevistados não citaram esse termo. Para alguns ainda tais plantios caracterizam os quintais: “Quintal é aqui mesmo na chácara, lá pra baixo é roça. Chácara é o quintal” (geraizeira da comunidade do Sobrado, 66 anos). Outra diferença ambiental peculiar foi encontrada na Ilha do Pau Preto. A ocupação tradicional do território ocorria conjuntamente e em razão das variações dos ciclos dos rios, São Francisco e Verde Grande. Com as cheias, os vazanteiros passavam das áreas de “vazante”, local onde a água vaza após as cheias, para de “caatinga”, parte mais alta do território onde se encontram as Matas Secas e latossolos sedimentares. Nos ciclos de seca, seus plantios voltavam para as “vazantes”. Porém, com a perda de acesso a diversos ambientes do território vazanteiro, esta prática cessou e seu manejo ficou limitado às regiões da “ilha”, braço de terra dentro do rio, da “vazante” e do “capão”, áreas elevadas geralmente não inundáveis. As áreas de “ilha” e “vazante” costuma-se praticar a agricultura de vazante, com plantio de roças e “canteiros”. Já no “capão” é preferencialmente utilizado para construção de moradias e seus quintais (DAYRELL et al., 2011). Alguns vazanteiros, por falta de acesso ou preferência, utilizam as “vazantes” como local de moradia e cultivo de quintais. Apesar de ressaltarem ser um local inseguro, não indicado para isto, argumentam “Plantar é uma tentativa” (vazanteira da Ilha do Pau Preto, 37 anos). Outro morador, porém, maneja esta situação e nos explicou sobre a existência de dois “canteiros”, um mais perto do rio e outro mais perto de sua casa, no “capão”. Dessa forma, o rio é um elemento que marca a construção e significação dos quintais e “canteiros” para os vazanteiros do Pau Preto. Todo o ano mudava, casa lá e casa cá. Agora faz barraco aqui no alto. Este é maior. Agora vamo prantá mais fruta. Ano passado ele [o rio] comeu todos mamão. Lá [na ilha] era bom que ficava pertinho do rio, mas aqui é mio que dá pra prantá mais. É bom que nóis usa as vazante pra plantá. Agente reza pra dá enchente que dá vazante (vazanteira da Ilha do Pau Preto, 37 anos). Tempo do canteiro era no mês de maio. Quando o rio enche, tem muitas coisas do canteiro que a gente muda. Março, abril tava enchendo. [...] Canteiro próximo a casa era para criar muda. E o outro canteiro na beira do rio, plantava as mudas do canteiro de cima (vazanteiro da Ilha do Pau Preto, 73 anos).

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6.2. Importâncias dos quintais para a vida cotidiana de comunidades tradicionais no norte de Minas Gerais Durante as 31 entrevistas realizadas para estudo dos quintais e posteriormente nos quatro campos de retorno, pode-se observar que eles se destacaram na vida das populações por seus múltiplos usos, mas, principalmente, por ser o local onde se planta, cuida, cultiva, maneja e colhese a vida, ou seja, onde ela é mantida e (re) produzida. Assim, os quintais abordam a dimensão ao redor da casa, sua diversidade em espécies e manejos e também dimensionam a vida social familiar e comunitária. Em consonância com o que se discute nesta pesquisa, ao se pensar em comunidades e povos tradicionais com maior ou menor grau de soberania alimentar há que se indagar sobre a existência ou não de ambientes manejados como os quintais em seus territórios e sobre a apropriação que se faz. A maioria dos entrevistados afirmou possuir quintal. Entretanto, alguns casos chamam atenção, como veremos a seguir pelo depoimento de dois moradores da Ilha do Pau Preto. O primeiro foi por manter uma forte ligação com o seu quintal e este se destacar entre os demais. Com sua casa escorada e em vias de cair, ele preferia descansar em baixo das árvores de seu quintal a dormir dentro da casa. Durante o levantamento florístico, ele nos mostrou com veemência cada planta cultivada em seu quintal, fazendo questão de nos acompanhar em todo o trajeto. Já o segundo morador não considerava que possuía um quintal, pois como não tinha a documentação de propriedade da terra, ele se sentia inseguro em dizer que existia quintal porque não podia manejá-lo. Isso tudo porque receava que o proprietário viesse requerer a terra de volta depois de todo esforço. Em suas palavras: Tem desejo de plantar, mas não tem espaço, plantar no terreno dos outros não dá; não paga o trabalho, fica o prejuízo. Por gosto de Dedé [proprietário] não tava aqui não. Tem um espaço prás meninas brincar (vazanteiro da comunidade da Ilha do Pau Preto, 53 anos).

Durante as entrevistas, a questão da posse, ou não, da terra, foi aspecto recorrente quando se falava de quintais. Apesar de a maioria afirmar possuir a terra, muitos disseram não possuir a documentação de registro da propriedade, principalmente, por ser herança familiar. Alguns disseram ser posseiros ou estar em terra emprestada pelo fazendeiro. A terra é nossa mesmo, mas eu não tenho documento. Cês sabe que esses documentos de herança é difícil de organizar, né? (caatingueira da comunidade do Touro, 49 anos). O patrão não manda embora, nós num vai sair. Aqui tá bom demais (caatingueiro da comunidade do Touro, 70 anos).

Na Ilha do Pau Preto, a perda do território tradicionalmente ocupado e a posterior criação de uma Unidade de Proteção Integral (Parque Estadual do Verde Grande) colocam as famílias em uma situação delicada e aponta para a necessidade de regularizar a terra. Tô esperando a liberação da RDS [Reserva de Desenvolvimento Sustentável], viemo para cá em janeiro. De moradia na baixa, moramos faz 20 e tantos anos (vazanteira da comunidade da Ilha do Pau Preto, 56 anos).

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Analisando os quintais em sua relação com a produção de alimentos e o significado que eles adquirem em cada uma das comunidades estudadas ficou evidente a necessidade de programas e políticas públicas que facilitem e garantam o acesso e a permanência na terra e no território respeitando formas tradicionais de manejo dos ambientes. Num contexto de dominância de latifúndios e emergência constante de conflitos territoriais, somente um modelo de reforma agrária popular poderia modificar as estruturas de poder que impedem a realização do direito a terra e aos territórios pelas comunidades e povos tradicionais. Considerando as entrevistas realizadas pode-se dizer que, quando se pensa em soberania alimentar, outros aspectos revelam o significado do quintal como espaço de produção para o autoconsumo e convivência social das famílias pesquisadas. Primeiramente, os quintais foram apontados como locais bons de estar e onde se obtém o alimento de maneira rápida, garantida, diversa e saudável, permitindo complementar sua alimentação. A autossuficiência do grupo e sua manutenção econômica está relacionada com a autonomia em suas decisões de manejo, de produção e de comercialização dos alimentos nos mercados locais. Além disso, foi muito destacada a possibilidade de produção de alimentos seguros e confiáveis e a geração de renda por meio dos quintais: É muito importante pra nóis... é nesse quintal que nóis produz... planta pro sustento da casa... muito importante... o quintal é a firmeza da gente (caatingueira da comunidade do Touro, 49 anos). Ajuda a gente, produz, ajuda na alimentação, é muito difícil trazer coisa do mercado, depende da gente trabalhar, se você tiver um é capaz de ter tudo. É muito difícil comprar na feira, dependendo da época, na seca a gente molha, dá para produzir tudo. A gente coloca o esterco da vaca, do gado (geraizeira da comunidade do Sobrado, 42 anos). A sombra e ter a fartura, né? Por que você compra tudo envenenado e plantado, não tem veneno, né? Ajuda na economia. Quase não compro. Eu não moro na cidade por causa disso. Lá não dá pra ter quintal. Gosto muito de planta, pra mim dá pra quem não tem... e pra mim também. Meus filhos chegam aqui e leva um monte de fruta, verdura... (caatingueiro da comunidade do Touro, 70 anos). É tudo. Tudo aqui pra nós é importante. Nós tira o sustento daqui. É despensa nossa, é porque nós planta tudo aqui. A pesca complementa a renda pra comprar as coisas... (vazanteira da comunidade da Ilha do Pau Preto, 37 anos). Venda, entrega frutas para Cooperativa [Grande Sertão], renda a mais (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 79 anos).

Há também nos quintais, a criação de animais de pequeno porte. Isto aumenta a garantia nutricional ao fornecer proteínas na alimentação das famílias. Com instalação de galinheiros e chiqueiros, os bichos do quintal são manejados de forma integrada com a vida das famílias. Além disso, aproveita-se o que tem nos quintais para dar como alimento à criação e evita-se que eles mexam em outras áreas do terreno. Foi possível identificar nas comunidades pesquisadas, marcas de produção agroecológicas. Essas marcas foram evidenciadas nos relatos de utilização de técnicas agrícolas livres de agrotóxicos e distantes de organismos geneticamente modificados. Por produzirem não apenas para venda do excedente, mas para o autoconsumo, esse padrão de segurança tende a ser mantido. 27


Por suas falas pode-se dizer que respeitam o meio ambiente por entenderem que é isso que garante a saúde da família. Essa conexão entre ambiente e saúde é posta pela experiência que tem mostrado quais práticas produtivas são mais adequadas para garantir a saúde da família: Cuidado que tem a mais para nós que consome. Veneno só traz complicação. Temo preocupação de ta plantando. Na época do algodão teve intoxicação. Desce tudo para dentro das águas. Para a gente ter certeza de um alimento mais saudável tem que plantar e cuidar, né? Sem veneno, o produto tem preço melhor, garantia. Certificação de orgânica, incentivo que passa pra outras pessoas. Muitos vão na ilusão das grandes empresas e quem acredita fica na dependência deles. Quintal com veneno tem mais inseto. As sem, um controla o outro. Tem parte de inseto que é bom, ajuda. Tem umas abelha boa (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). Abóbora japonesa, a semente dela já vem intoxicada para a gente não conseguir plantar a semente. Aqui faia muito, não produz (caatingueiro da comunidade do Touro, 65 anos).

Como já ressaltado na Ilha do Pau Preto, o rio é fundamental na dinâmica da comunidade, das atividades de pesca e cultivo. Ele leva e traz plantas, o que pode até atrapalhar o esforço de produção nos quintais vazanteiros: Eu acho que... sabe... Não precisa comprar, tem. É bom, é importante ter essa coisa [quintal]. Só não tenho mais porque tem o rio que gosta de bagunçar, né? (vazanteiro da comunidade da Ilha do Pau Preto, 73 anos). Sim, não tá mais importante. Porque não tamo plantando o que a gente quer. Uma laranja, um mamão, siriguela. O rio carrega tudo (vazanteira da comunidade da Ilha do Pau Preto, 56 anos).

No quintal também encontram-se “plantas de remédio”, assim denominadas pelas comunidades parceiras. Elas são tradicionalmente utilizadas e relatos de práticas populares de cura pelo uso dessas plantas ou pela alimentação saudável foram uma constante. Antigamente a gente bebia esses remédios, a gente não procurava médico nenhum (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). [relato de cura local] Não precisou operar mais, comeu essas folhas [Ora pro nóbis] (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Toda casa, pode falar, é difícil que tem uma casa que não tem planta pra remédio, né? (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). Tem bastante planta que é para remédio. Cidreira, sete-dor... (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Remédio, tem poejo, hortelã, malvão, erva doce, sete-dor (vazanteiro da Ilha do Pau Preto, idade não informada). Até mesmo pé de fruta serve para remédio, né? Mamão, goiaba... (caatingueira da comunidade do Touro, idade não informada).

Ademais, os relatos descrevem como o quintal ajuda na garantia do sustento da casa. Além disso, ele é um espaço que fornece condições para intensificação das relações sociais de vizinhança e/ou familiares estendida, pois é comum a prática da doação de alimentos e plantas 28


medicinais especialmente quando há a fartura, fortalecendo os laços de solidariedade dentro das comunidades. Várias fruta que tem, que planta. Na época tem fartura passo pros vizinho, para quem não tem. Para os passarinho. Consumir e dar pros outros. Se for pouco fala que não tem fartura (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada) O quintal? É... Acho que ele é bem importante. Porque a gente olhava e não sabia o tanto que ele podia dar. Dá comida pra nóis e pra outras pessoas também que a sempre tem. Aqui procura distribuir pros outros que não tem (caatingueira da comunidade do Touro, 34 anos). Sê podia me dá uma galha dessa planta? É bom demais [satisfação em poder dar a planta] (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada).

Muitos relatos demonstraram que os quintais não são só lugar de plantas, mas também de bichos. Por isso são locais de se atrair determinados animais. A relação dos grupos sociais com espécies da fauna local não domesticada foi apreciada, por ser bom estar perto deles, ou não, por avaliarem que certos bichos dão prejuízo às plantas. Além disso, no norte mineiro, os quintais são uma alternativa ao clima semiárido que “arrebata a gente”. O quintal dá uma sombra fresca e as pessoas podem se refrescar embaixo das árvores. A função dessa sombra é identificada como um valor fundamental do quintal no norte mineiro: Cria para a gente comer e criação também. Fruta que dá criação, dá pros porco, galinha. Acerola, goiaba, galinha gosta muito. Para os pássaros também... eles vem comer muito (caatingueira da comunidade do Touro, idade não informada). É bom demais. Tem uma planta... cria uma galinha... tem uns porco... pé de banana... (vazanteiro da Ilha do Pau Preto, 61 anos). Preá, na casa de Tuta é o único lugar que ainda tem. Siriema gosta de vir muito. Macaquinho já apareceu muito (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). Tenho aquele prazer de bestage, qualquer bichinho eu pego para criar (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Para conviver é bom, a alegria dos passarinho. Periquito dá é prejuízo (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Conserva tudo. Até para a gente já é bem bom, para as pequenas [plantas] também, para as galinhas... (quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Para os passarinho é uma alegria. Para a gente também é muito bonito, né? A sombra é bom pra gente e pros bicho também. Principalmente no verão. Só vê barulho. É tão bonito ver um tanto de pássaro (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). A importância?! A importância é que eu to muito devagar... Pra gente ficar olhando, chega um amigo, tem uma fruta. A gente pra viver num lugar pra ficar sem nada é ruim, né? Eu gosto dos bichinhos. Aí dá que só vendo [mamão] e eles comem tudo. Eu gosto. Desde que aprendi a trabalhar eu tinha vontade de fazer um quintalzinho... tendo uma árvore pra gente olhar, né? Serve pra gente, serve pros amigos, serve pros bicinhos, serve pra tudo, né? (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 79 anos).

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Uai moço! Primeiro pra deitar debaixo da moita... eu sempre gostei de pranta...se você sabe entra dentro da casa e não tem uma sombra.... é bom diversificar.... Foi meio que na tora... um mangueirão pra porco... já tinha roçado um cado de toco... A Leucena eu tiro pra dar pros porco, pros bicho... [...], o quintal ajuda... ano passado essa acerola deu na entresafra aí ajudou os menino que tava com resfriado... paga uma cuida e joga pras galinha e elas faz a festa! (caatingueiro da comunidade do Touro, 42 anos). Bom para ficar lá. É fresco. Tem água de coco para beber, limão para tomar, fazer chá (homem quilombola da comunidade de Malhada Grande, 60 anos). Os bicho também precisa viver (geraizeira da comunidade do Sobrado, 62 anos).

Alguns relatos demonstram ainda outros saberes de manejo, em relação à extração de lenha, solo e plantio, o que evidencia o papel dos quintais na produção agrícola. Deixa uma reversa, perto de casa para tirar lenha. No quintal também tem uma hora que dá [lenha]. Mas é mais fora do quintal. Glericídea usa muito como lenha. Para quem gosta de vender lenha para carvoeira é bom glericídea. E é uma lenha que não precisa de fiscalização pra cortar, né? Planta vinda de fora (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). O quintal é bom para reter a terra que desce dos morros, reter as proteínas e a umidade da terra [...] (caatingueiro da comunidade do Touro, 65 anos). Plantar nas cabeceira da horta, as plantas de cheiro evita as praga que dá na horta (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, sem idade).

Finalmente, pode-se dizer que os quintais dão cores, formas e belezas nas casas do povo. Essa é sua função estética ambiental. Nele, as crianças e adultos se divertem, os mais velhos aliviam o estresse do dia-a-dia e podem até conversar com as plantas. Nele acontecem as “formozuras” que alimentam a alma. Os quintais são espaços de lazer que ampliam as dimensões das residências. Para enfeitar a casa, o quintal (vazanteira da Ilha do Pau Preto, idade não informada). Espirradeira para boniteza (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Pro quintal ficar mais bonito, pros passarinho mesmo (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, 44 anos). É importante demais. Além de estar plantando umas coisinhas para nós aqui, para o sustento, é um divertimento. É um sossego de espírito, né? Veja o pesinho de laranja, né? (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada). Ah! Ele é minha diversão. Meu passatempo, fia. Pra mim é tudo, fia. Distrair, olhando a natureza. Ah! A gente, sei lá, esse povo que mora na capital não tem o prazer que a gente pode ter, né? Com aquela poluição, né? E é muito, minha diversão. E... a gente não entende de quase nada e o pouco que a gente entende é só isso aí mesmo, não tem outra coisa, né? (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 67 anos). O quintal é o maior divertimento, pra sair, ficar olhando a natureza. Casa é só pra quando tá trabalhando (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, 37 anos).

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No dia que eu tô muito nervosa em casa, eu saio no quintal e vou tirando uma folha veia, limpando e as coisas ruins da cabeça, vão saindo. É bom para distrair (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Pra mim é bom, porque tem hora que vou ali no quintal e fico olhando os pesinho de trem (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, 55 anos). Vamo lá fora e conversa com ela: ô cê tá com sede flor? Flor. Pode ser meia noite, moía as plantas (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). É muito importante. Eu me divirto muito. Trabalho. Eu quero ficar é no meu quintal, isso é saúde para mim, é uma vida, para mim, esse quintal (geraizeira da comunidade do Sobrado, idade não informada).

Nos encontros em grupo, apresentamos todas essas características que foram atribuídas aos quintais pelos entrevistados e a discutimos coletivamente. Além disso, por último, introduzimos a discussão da importância ecológica dos quintais. Eco vem de casa e lógica é em relação à dinâmica, movimento do dia-a-dia da casa. Das pessoas cuidando do quintal, dos animais, do solo. Essa interação, animais, planta e solo, chamamos de importância ecológica na universidade. É sobre a seleção de plantas pelo ser humano de acordo com o local, os bichos que vem do mato. Tudo é importante. É um conjunto do quintal que cê tem que ter. Vários tipos de planta, os remédios caseiro. É um complemento. Luta por manter equilíbrio ecológico (pesquisador do projeto, 23 anos).

Um dos depoimentos neste momento foi: É de tá plantando de forma correta, não tá agredindo o meio ambiente, não tá agredindo o local. Plantando de modo alternativo, sem abusar das coisas que destroem, né? (caatingueiro da comunidade do Touro, idade não informada).

Outros usos atribuídos aos quintais, citados no retorno em grupo pelos vazanteiros da Ilha do Pau Preto foram: “Fazer um churrasco de baixo de árvore”, “À noite observar o céu”, “Plantar rosa”, “Cantiga de roda. Brincar de esconder, namorar as meninas”, “Apreciá as coisas” e “Quintal tem garage para por carro”. Como encerramento dos diálogos com os grupos nas comunidades, ao serem perguntados se teria como viver sem um quintal, eles disseram ser muito difícil e triste, pois “sem quintal a vida fica vazia” e perderiam até a alegria de viver. Ave Maria! Tá numa prisão, não pode nem respirar. Não dá para viver sem quintal, nem na cidade. Não cresce criança (vazanteira da Ilha do Pau Preto, idade não informada). Eu não queria nem saber (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, 44 anos). É triste, não queria nem saber. É por isso que as casa de Mato Verde é tudo triste. Calor. Vou levar um alqueire de terra em cima d’eu, não leva nada dessa vida (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada). Se não tivesse ia ser feio e triste. Horroroso. Não ia ter alegria nenhuma (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, idade não informada).

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O quintal é tão importante que na cidade se você tiver uma casa e quiser vendee, é muito difícil [casa sem quintal]. Tem que plantar alguma planta (geraizeiro da comunidade do Sobrado, idade não informada). Uma casa sem quintal é como uma morada sem cuidado, sem ninguém, abandonado (caatingueiro da comunidade do Touro, 65 anos). O quintal é tudo, se não tivesse, não tinha nada. É tudo na vida da gente. Faz lembrança da luta, foi sofrido formar um (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 68 anos).

Tudo indica que os múltiplos usos e significados atribuídos ao microambiente dos quintais são elementos identitários e condição indispensável para (re) produção cultural, social, econômica e ambiental dos grupos pesquisados. A vida acontece nos quintais e a agrobiodiversidade deste espaço faz parte de todo um sistema socioambiental e modo de vida dos grupos tradicionais do norte mineiro.

6.3. Caracterização da flora alimentícia presente nos quintais e hortas Riqueza de etnoespécies alimentares presentes nos quintais e hortas, seus usos e formas de preparo Passarinho passou longe O melhor é nem mexer S’ele pinica esteja certo Muito bom é de comer Saiba home é fruta boa É até medicinal Coisa rica, mel, macia Gosto doce, divinal Como os frutos esquecidos Lá num canto d’um quintal Como os frutos esquecidos Lá num fundo d’um quintal Tem mangaba – abricó Manga – maracujá – tem cajá Jambo – também tem Trapiá – oiti-coró Jaca Ingá Mai pitanga – araçá Jamelão – sapota Siriguela – cajui tem Tem úmbu – canapu

Tamarindo – coração de negro Melancia – catolé Macaúba – e graviola Carambola Anda Luiza Traga pro moço provar Um gomo de tangerina Pr’ele se maravilhar Saboreie de mancheia Os mil frutos desses quintais Onde reina a passarada Ensinando seus sinais Os sinais que a natureza Dá pro homem se guiar Se é de vida ou se é de morte Se é de chuva ou vai secar Só com os olhos de menino Se é capaz de decifrar Os mistérios ficam claros é ter olhos de enxergar. Quintais/O meu aboio Gonzaguinha (Moleque - 1977) 32


Nas quatro comunidades tradicionais estudadas foi registrada grande diversidade de plantas alimentares, 183 etnoespécies existentes nos mais diversos ambientes, inclusive os quintais e as hortas (Tabela 1). Cabe ressaltar que a comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto apresentou a menor riqueza de etnoespécies alimentares presentes nos quintais e hortas. Porém, a riqueza aumentou e se aproximou das demais comunidades se analisarmos todos os ambientes citados (Tabela 1). Isto pode ser devido à utilização atual de uma área extremamente restrita confinada a uma ilha abraçada pelo rio em comparação ao seu território tradicionalmente ocupado, onde ocorre a já referida prática da agricultura de vazante, e por passar por constantes processos de modificação no ambiente em razão dos movimentos das vazantes. Tabela 1. Plantas alimentares mais citadas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais e análise geral comparativa. TE = total de etnoespécies citadas nos diversos ambientes; TQ = total de quintais amostrados; TEQ = total de etnoespécies citadas em quintais e hortas; Frequência de citação entre parênteses, variando de 0 a 1. Comunidades Malhada Grande Quilombolas (Catuti, MG).

TE 92

TEQ 65

Etnoespécies mais citadas (Frequência de citação) Manga (Mangifera indica L.) (1); Goiaba (Psidium guajava L.) e Pinha (Annona squamosa L.) (0,875); Acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC.) e Mamoeiro (Carica papaya L.) (0,75).

Ilha do Pau Preto Vazanteiros (Matias Cardoso, MG)

101

37

Acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC.), Banana (Musa x paradisiaca L.), Cana (Saccharum officinarum L.) e Mamoeiro (Carica papaya L.) (0,375).

Sobrado Geraizeiros (Rio Pardo de Minas, MG).

101

86

Banana (Musa x paradisiaca L.), Café (Coffea arabica L.) e Manga (Mangifera indica L.) (1); Abóbora (Cucurbita sp.1), Alface (Lactuca sativa L.), Coentro (Coriandrum sativum L.), Corante/Urucum (Bixa orellana L.), Couve (Brassica oleracea L.), Jabuticaba (Myrciaria cauliflora (Mart.) O. Berg), Lanranja (Citrus sinensis (L.) Osbeck), Mamoeiro (Carica papaya L.) e Mandioca (Manihot esculenta Crantz) (0,875).

Touro Caatingueiros (Serranópolis de Minas, MG).

85

71

Total geral comparativo

183

133

Acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC.), Ciriguela (Spondias purpurea L.), Goiaba (Psidium guajava L.), Mamoeiro (Carica papaya L.), Pinha (Annona squamosa L.) e Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (1). Manga (Mangifera indica L.) e Mamoeiro (Carica papaya L.) (0,774); Acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC.) (0,710); Banana (Musa x paradisiaca L.) e Goiaba (Psidium guajava L.) (0,677).

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Os quintais e as hortas foram os locais que se destacaram no fornecimento de plantas alimentares compondo 72,68% da riqueza conhecida e utilizada (Tabela 2). Tabela 2. Locais de obtenção de plantas alimentares, sua riqueza e porcentagem de etnoespécies citadas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Porcentagem de etnoespécies Locais de obtenção Riqueza de etnoespécies Hortas e quintais 133 72,68% Matas 52 28,42% Ilhas e vazante 44 24,04% Beira do rio 37 20,22% Roça 26 14,21% Alto 24 13,11% Baixa, baixio ou várzea 13 7,10% “Gerais” ou cerrados 9 4,92% Tabuleiro 9 4,92% Chapada 7 3,83% Carrasco 6 3,83% Caatinga 3 1,64% Chácara 3 1,64% Capão 2 1,09% Capoeira 2 1,09% Beira de lagoa 1 0,55% Outros* 23 12,57% Sem informação 26 14,21% 183 Total de etnoespécies * A categoria Outros tem registros de compra em diversos locais, obtenção em estradas, junto aos mantimentos, na área de pivôs de irrigação, currais e em outros lugares. Dessa tabela é também apresentada, na sequência uma análise das plantas alimentares presentes nos quintais de cada comunidade (ANEXO 2) e uma síntese do grupo como um todo (Tabela 3). Tabela 3. Lista das etnoespécies conhecidas, e utilizadas como bens alimentares e obtidas nos quintais e hortas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. TC = total de citações; TI = total de informantes; FR = frequência de citação; CUP = categorias de uso e preparo (: a = Alimentação Animal; b = Assados; c = Bebidas; d = Consumo in natura; e = Cozidos; f = Doces; g = Ensopados; h = Farinhas, beijús e gomas; i = Farofa; j = Frituras; l = Óleos; m = Outros; n = Saladas; o = Sem Informação; p = Temperos; q = Torrados). Etnoespécie Abacate Abacaxi Abóbora

Espécie botânica Persea americana Mill. Ananas comosus (L.) Merr. Cucurbita sp.1

Família botânica Lauraceae Bromeliaceae Cucurbitaceae

TC 41 2 27

TI 15 1 15

FR 0,484 0,032 0,484

CUP cdfn cd abcdfg 34


Etnoespécie Abóbora d'água/verde Abóbora japonesa Abobrinha Açafrão Acerola Agrião Alface Alho Amendoim Amora Araçá Arroz Articum Atemóia Bacupari Banana Batata Batata doce Berinjela Beterraba Boldo Café Cagaiteira Cajá Caju Cana Carambola Cariru Caxixa/caxixe Cebola Cebolinha Cenoura Cereja Chichá Chuchu Cidra/Limaozão Ciriguela Coco

Espécie botânica Cucurbita sp.2 Cucurbita sp.3 Cucurbita pepo L. Curcuma longa L. Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC. Nasturtium officinale W.T. Aiton Lactuca sativa L. Allium sativum L. Arachis hypogaea L. Morus nigra L. Psidium sp. Oryza sativa L. Annona crassiflora Mart. Annona cherimola Mill. x A. squamosa L. Garcinia gardneriana (Planch. & Triana) Zappi Musa x paradisiaca L. Solanum tuberosum L. Ipomoea batatas (L.) Lam. Solanum melongena L. Beta vulgaris L. Vernonia condensata Baker Coffea arabica L. Eugenia dysenterica DC. Spondias mombin L. Anacardium occidentale L. Saccharum officinarum L. Averrhoa carambola L. Amaranthus sp. Sechium sp. Allium cepa L. Allium fistulosum L. Daucus carota L. Prunus avium L. Sterculia striata A. St.-Hil. & Naudin Sechium edule (Jacq.) Sw. Citrus medica L. Spondias purpurea L. Cocos nucifera L.

Família botânica Cucurbitaceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Zingiberaceae Malpighiaceae

TC 2 1 3 1 45

TI 2 1 3 1 22

FR 0,065 0,032 0,097 0,032 0,710

CUP g g g p acdf

Brassicaceae Asteraceae Amaryllidaceae Fabaceae Moraceae Myrtaceae Poaceae Annonaceae Annonaceae

1 14 7 6 16 3 2 2 1

1 12 6 2 10 2 1 2 1

0,032 0,387 0,194 0,065 0,323 0,065 0,032 0,065 0,032

n dn p dfq cdf cd e d d

Clusiaceae

1

1

0,032

d

Musaceae Solanaceae Convolvulaceae Solanaceae Chenopodiaceae Asteraceae Rubiaceae Myrtaceae Anacardiaceae Anacardiaceae Poaceae Oxalidaceae Amaranthaceae Cucurbitaceae Alliaceae Alliaceae Apiaceae Rosaceae Malvaceae

71 4 13 1 10 1 12 5 9 31 29 6 4 1 15 20 22 1 2

21 2 10 1 4 1 9 3 6 15 13 4 2 1 7 12 8 1 1

0,677 cdefgijn 0,065 fgj 0,323 bdef 0,032 j 0,129 begn 0,032 d 0,290 cm 0,097 cd 0,194 cd 0,484 bcdfl 0,419 acdf 0,129 cd 0,065 gin 0,032 g 0,226 np 0,387 p 0,258 bcegin 0,032 d 0,032 fq

Cucurbitaceae Rutaceae Anacardiaceae Arecaceae

5 4 24 42

2 2 13 13

0,065 0,065 0,419 0,419

eg cfm acd bcdf 35


Etnoespécie Coco macaúba Coentro Conde Coquinho azedo Corante/Urucum Couve Espinafre Fedegoso Feijão Feijão andu Figo Garoba Gerglim Girassol Goiaba Graviola Hortelã pimenta Ingazeiro Inhame Jabuticaba Jaca Jambo Jambre Jamelão Jatobá Jenipapo Jericanhota Jiló Juá mirim Juazeiro Laranja Laranja da terra Leucena Lima Limão rosa/galego Limão/Limão Tahiti

Espécie botânica Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. Coriandrum sativum L. Annona reticulata L. Butia capitata (Mart.) Becc. Bixa orellana L. Brassica oleracea L. Emilia sp. Senna sp. Phaseolus vulgaris L. Cajanus cajan (L.) Huth Ficus carica L. Indet 4 Sesamum indicum L. Helianthus annuus L. Psidium guajava L. Annona muricata L. Plectranthus amboinicus (Lour.) Spreng. Inga spp. Dioscorea sp. Myrciaria cauliflora (Mart.) O. Berg Artocarpus heterophyllus Lam. Syzygium malaccense (L.) Merr. & L.M. Perry Syzygium cumini (L.) Skeels Syzygium cumini (L.) Skeels Hymenaea courbaril L. Genipa americana L. Indet 5 Solanum gilo Raddi Celtis brasiliensis (Gardner) Planch. Ziziphus joazeiro Mart. Citrus sinensis (L.) Osbeck Citrus aurantium L. Leucaena leucocephala (Lam.) de Wit Citrus limettioides Tanaka Citrus limonia (L.) Osbeck Citrus latifolia Tanaka

Família botânica Arecaceae

TC 4

TI 1

FR 0,032

CUP bdfl

Apiaceae Annonaceae Arecaceae Bixaceae Brassicaceae Asteraceae Fabaceae Fabaceae Fabaceae Moraceae Indet 4 Pedaliaceae Asteraceae Myrtaceae Annonaceae Lamiaceae

24 3 1 25 12 1 3 20 19 2 1 6 4 58 13 1

9 2 1 16 8 1 2 8 8 2 1 4 1 21 8 1

0,290 0,065 0,032 0,516 0,258 0,032 0,065 0,258 0,258 0,065 0,032 0,129 0,032 0,677 0,258 0,032

np cd c hp dginp n cgi dei dei f a bf al acdf cd p

Fabaceae Dioscoreaceae Myrtaceae

6 1 14

6 1 9

0,194 0,032 0,290

d g cdm

Moraceae Myrtaceae

12 2

8 1

0,258 0,032

cd d

Myrtaceae Myrtaceae Fabaceae Rubiaceae Indet 5 Solanaceae Cannabaceae

2 1 10 1 1 2 2

1 1 5 1 1 1 1

0,032 0,032 0,161 0,032 0,032 0,032 0,032

ad d abdf c d gn a

Rhamnaceae Rutaceae Rutaceae Fabaceae

4 49 1 3

3 20 1 3

0,097 d 0,645 bcdfmn 0,032 d 0,097 a

Rutaceae Rutaceae Rutaceae

3 7 30

2 4 18

0,065 0,129 0,581

cd c cdp 36


Etnoespécie Limãozinho

Espécie botânica Citrus aurantifolia (Christm.) Swingle Maçã Malus domestica L. Mamoeiro Carica papaya L. Mandacaru Cereus jamacaru DC. Mandioca Manihot esculenta Crantz Manga Mangifera indica L. Mangaba Hancornia speciosa Gomes Manjericão Ocimum sp. Maracujá Passiflora edulis Sims Maracujá do pequeno Passiflora sp.3 Maracujá do mato Passiflora vitifolia Kunth Maracujina Passiflora sp.2 Maxixe Cucumis anguria L. Melancia Citrullus lanatus L. Melão Cucumis melo L. Milho Zea mays L. Moringa Moringa oleifera Lam. Mostarda Brassica oleracea L. Mutamba Guazuma ulmifolia Lam. Nim Azadirachta indica A. Juss. Palma Opuntia ficus-indica (L.) Mill. Palmatória Brasiliopuntia sp. Pepino Cucumis sativus L. Pequi Caryocar brasiliense Cambess. Pimenta Capsicum frutescens L. Pimenta de cheiro Capsicum sp.1 Pimenta passarinho Capsicum sp.2 Pimentão Capsicum annuum L. Pimentinha Capsicum sp.3 Pinha Annona squamosa L. Pinhão Jatropha sp.1 Pitanga Eugenia uniflora L. Pocam Citrus reticulata Blanco Quiabo Abelmoschus esculentus (L.) Moench Quixabeira Sideroxylon obtusifolium (Humb. ex Hoem. & Schult.) T.D.Penn. Repolho Brassica oleracea L. Romã Punica granatum L. Rúcula Eruca sativa Mill. Salsa Petroselinum sp. 1

Família botânica Rutaceae

TC 5

TI 2

FR 0,065

CUP cm

Rosaceae Caricaceae Cactaceae Euphorbiaceae Anacardiaceae Apocynaceae Lamiaceae Passifloraceae Passifloraceae Passifloraceae Passifloraceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Poaceae Moringaceae Brassicaceae Malvaceae Meliaceae Cactaceae Cactaceae Cucurbitaceae Caryocaraceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Annonaceae Euphorbiaceae Myrtaceae Rutaceae Malvaceae

3 65 7 87 76 2 1 11 1 2 2 10 18 6 47 5 2 1 1 6 2 5 12 16 4 1 7 1 22 2 14 4 12

2 23 2 18 24 1 1 10 1 1 2 8 7 2 9 3 1 1 1 3 2 4 4 9 3 1 4 1 18 1 9 3 9

0,065 d 0,742 acdfghn 0,065 dfg 0,581 abdeghj 0,774 acdfn 0,032 c 0,032 d 0,323 cdf 0,032 c 0,032 cf 0,065 c 0,258 g 0,226 cdfg 0,065 cde 0,290 abehm 0,097 lmn 0,032 gi 0,032 d 0,032 a 0,097 aeg 0,065 d 0,129 dn 0,129 bdegjlm 0,290 p 0,097 p 0,032 p 0,129 gnp 0,032 p 0,581 cd 0,032 a 0,290 cd 0,097 d 0,290 gn

Sapotaceae

4

2

0,065

ad

Brassicaceae Lythraceae Brassicaceae Apiaceae

3 13 1 1

2 11 1 1

0,065 0,355 0,032 0,032

gn cd n p 37


Etnoespécie Salsinha Soja Sombrinha Taioba

Espécie botânica Petroselinum sp. 2 Glycine max (L.) Merr. Ficus sp. Xanthosoma sagittifolium (L.) Schott Tamarindo Tamarindus indica L. Tançagem Plantago major L Tangerina Citrus deliciosa Tem. Tanja Citrus sp. Tomate Lycopersicon esculentum Mill. Tomate grão de galo Lycopersicon sp.3 Tomate redondinho Lycopersicon sp.4 Tomatinho de rolinha Lycopersicon sp.2 Tomatinho/tomate Lycopersicon sp.1 cereja Umbuzeiro/Imbuzeiro Spondias tuberosa Arruda Uva Vitis vinifera L. Veludo Amaranthus cruentus L. Xarope Indet 8 133 Total de etnoespécies

Família botânica Apiaceae Fabaceae Moraceae Araceae

NC 4 1 2 9

TI 1 1 1 2

FR 0,032 0,032 0,032 0,065

CUP np e d gh

Fabaceae Plantaginaceae Rutaceae Rutaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae

13 1 6 4 18 2 1 1 3

7 1 4 3 12 1 1 1 2

0,226 0,032 0,129 0,097 0,387 0,032 0,032 0,032 0,065

cd n cd cd cdgn gn n g dg

Anacardiaceae Vitaceae Amaranthaceae Indet 8

36 2 1 1

13 2 1 1

0,419 0,065 0,032 0,032

cdfhj d n c

As 31 entrevistas com os moradores dos respectivos quintais amostrados apontaram 133 etnoespécies presentes nos quintais e hortas, distribuídas em 130 espécies e 46 famílias botânicas. Solanaceae foi a família mais representativa, totalizando 13 (treze) espécies, seguida de Cucurbitaceae e Rutaceae, com 10 (dez) espécies, Fabaceae, com 9 (nove) espécies e Myrtaceae, com 8 (oito) espécies. As 15 etnoespécies com maiores números de citação, ou seja, quantas vezes ela foi citada pelos entrevistados, foram: Mandioca (Manihot esculenta Crantz), com 87 citações, Manga (Mangifera indica L.), com 76, Banana (Musa x paradisiaca L.), com 71, Mamoeiro (Carica papaya L.), com 65, Goiaba (Psidium guajava L.), com 58, Laranja (Citrus sinensis (L.) Osbeck), com 49, Milho (Zea mays L.), com 47, Acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC.), com 45, Coco (Cocos nucifera L.), com 42, Abacate (Persea americana Mill.), com 41, Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda), com 36, Caju (Anacardium occidentale L.), com 31, Limão/Limão Tahiti (Citrus latifolia Tanaka), com 30, Cana (Saccharum officinarum L.), com 29, Abóbora (Cucurbita sp.1), com 27. Abaixo desse número, as citações foram pulverizadas entre as demais 118 etnoespécies citadas. Em termos de frequência de citações, ou seja, o total de informantes que citaram determinada planta pelo total de entrevistados, sobrepujaram-se: Manga (Mangifera indica L.) (0,774), Mamoeiro (Carica papaya L.) (0,742), Acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex 38


DC.) (0,710), Banana (Musa x paradisiaca L.) e Goiaba (Psidium guajava L.) (0,677), Laranja (Citrus sinensis (L.) Osbeck) (0,645), Limão/Limão Tahiti (Citrus latifolia Tanaka), Mandioca (Manihot esculenta Crantz) e Pinha (Annona squamosa L.) (0,581), Corante/Urucum (Bixa orellana L.) (0,516), Abacate (Persea americana Mill.), Abóbora (Cucurbita sp.1) e Caju (Anacardium occidentale L.) (0,484), Cana (Saccharum officinarum L.), Coco (Cocos nucifera L.), Ciriguela (Spondias purpurea L.) e Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda ) (0,419), Alface (Lactuca sativa L.), Cebolinha (Allium fistulosum L.) e Tomate (Lycopersicon esculentum Mill. ) (0,387). Neste levantamento nos quintais, curiosamente, 48 plantas alimentícias foram citadas por apenas um informante, apesar de muitas serem, na sociedade brasileira como um todo, muito conhecidas na alimentação cotidiana. A origem e obtenção destas plantas foram diversificadas, em geral, estas plantas chegaram das seguintes maneiras: 1) Pela compra das sementes pelos geraizeiro do Sobrado, no caso as etnoespécies: Abóbora japonesa (Cucurbita sp.3), Agrião (Nasturtium officinale W.T. Aiton), Jiló (Solanum gilo Raddi), Mostarda (Brassica oleracea L.) e Rúcula (Eruca sativa Mill.). 2) Por serem mudas novas que vieram pelo Projeto Terreirão em parceria com o CAA (a exemplo, Atemóia (Annona cherimola Mill. x A. squamosa L.), Coquinho azedo (Butia capitata (Mart.)Becc) e Mangaba (Hancornia speciosa Gomes)) e do IEF de Serranópolis de Minas (Jamelão (Syzygium cumini (L.) Skeels) o que demonstra o incentivo a plantas nativas do sertão norte mineiro. 3) Por ocorrem em outros locais e/ou serem nativas, como Bacupari (Garcinia gardneriana (Planch. & Triana) Zappi), Coco macaúba (Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart.), Chichá (Sterculia striata A. St.-Hil. & Naudin), Jambo (Syzygium malaccense (L.) Merr. & L.M. Perry), Jambre (Syzygium cumini (L.) Skeels), Jenipapo (Genipa americana L.), Juá-mirim (Celtis brasiliensis (Gardner) Planch.), Maracujá do mato (Passiflora vitifolia Kunth), Maracujá do pequeno (Passiflora sp.3), Mutamba (Guazuma ulmifolia Lam.) e Tomate redondinho (Lycopersicon sp.4). Os outros locais de obtenção citados foram: beira do rio, capoeiras, matas, ilhas e vazantes, alto, roça, baixa, baixio e várzea, e todos os lugares. 4) Por também serem cultivadas preferencialmente em outros locais como: na beira do rio, citadas a Salsa (Petroselinum sp. 1) e Salsinha (Petroselinum sp. 2) pelos geraizeiros do Sobrado; na vazante, citado o Girassol (Helianthus annuus L.) pelos vazanteiros do Pau Preto; nas matas, baixa, baixio e várzeas, citado o Inhame (Dioscorea sp.) pelos quilombolas de Malhada Grande; e, na roça, beira do rio, ilhas e vazantes, citada a Caxixa/caxixe (Sechium sp.) por todas as comunidades. 5) Por serem consumidas por animais, não compensando cultivá-las, como é o caso do Girassol (Helianthus annuus L.) na comunidade caatingueira do Touro.

39


6) Por terem sido citados para outras categorias de uso além da alimentação direta, como por exemplo: Medicinal, citado o Boldo (Vernonia condensata Baker) e a Tançagem (Plantago major L.); Medicinal, Óleo e Madeira citado o Nim (Azadirachta indica A. Juss.); e, Lenha, Sombra e Cerca citada a Garoba (Indet 4), todos citados por caatingueiros do Touro. 7) Por ter sido introduzida acidentalmente, não sendo um costume cultivá-la, “Vem no meio do feijão quando o compra” como foi o caso da Soja (Glycine max (L.) Merr.) citada apenas uma única vez por um homem quilombola de Malhada Grande. 8) Por gosto do morador que é cultivada, apesar dos outros moradores a reconhecerem, a exemplo a Berinjela (Solanum melongena L.), citada na beira do rio e o Tomatinho de rolinha (Lycopersicon sp.2), este também citado como Medicinal e encontrado nas matas. Ambas citadas por vazanteiros da Ilha do Pau Preto. 9) Por ser mais característico de determinada comunidade. Por exemplo, na comunidade caatingueira do Touro foi citado a etnoespécie Jericanhota (Indet 5), também conhecida como “Melancia engana tolo”. Pode ser plantada também ao redor das roças de Melancia, pois, como as duas etnovariedades são visualmente parecidas, eles enganam as pessoas: “Formato melancia, é crespa por dentro, dura, não tem doce. Plantava no meio de melancia, o pessoal roubava e enganava. As maiô eles panha. Chegava, í não era melancia. Meu avô plantava nas borda. Tem listrada, cumprida, redonda, branca. Folha igual de melancia”. Além de alimentar, tem uso medicinal: “remédio para recém-nascido [da semente]”. Destaco duas etnoespécies com apenas uma citação nos quintais que são parte importante da cotidiano alimentar das comunidades estudadas. A primeira é o Açafrão (Curcuma longa L.), citado na comunidade vazanteira na Ilha do Pau Preto. Lá existe o costume de usá-lo para temperar a comida: “corta, passa no moinho, põe na comida”, especialmente no preparo dos peixes: “Os mesmo tempero usa, para não ficar branco [sobre os peixes Curimatá, Dourado, Surubim, Pirá e Mandu], corante ou açafrão”. A segunda etnoespécie é o Arroz (Oryza sativa L.), citado na comunidade quilombola de Malhada Grande. A planta está ligada a uma prática sociocultural que reúne mulheres entorno do pilão, uma prática de encontro fundamental da tradição quilombola, que precisa do arroz com casca para ser realizada. Enquanto batem o pilão em ritmo marcante, as mulheres costumam cantar catingas tradicionais. Os gurutubanos relataram que não dá para fazer o prato típico de arroz com carne seca socado no pilão com arroz comprado. Tem que ser plantado e pilado da maneira tradicional. A presença do arroz em um quintal quilombola, e somente no quintal quilombola, pode evidenciar a importância tanto da planta quanto deste quintal para a continuidade de certas práticas sociais para esta comunidade. Neste caso, no fundo do quintal há um córrego, onde forma-se uma pequena lagoa na várzea na época das chuvas. O arroz, como é uma cultura de ambientes úmidos e alagáveis, foi citado predominantemente em outros ambientes como na baixa, baixio e várzea e nas ilhas e vazantes e obtido por compra pela mesma comunidade e pelas outras comunidades. 40


Além disso, essas informações podem ter ocorrido talvez pelo procedimento metodológico adotado, pelos entrevistados não lembrarem naquele momento da gama de etnoespécies existentes em seus quintais, somado à inexperiência de alguns pesquisadores com a lista-livre e a identificação nos quintais e hortas. A partir dos usos citados, foram estabelecidas 15 categorias de preparo e consumo: Alimentação animal; Assados; Bebidas; Consumo in natura; Cozidos; Doces; Ensopados; Farinhas, beijus e gomas; Farofa; Frituras; Óleos; Outros; Saladas; Temperos; e Torrados (Tabela 4). Destas categorias, Temperos apresentou a maior riqueza de usos, 16, seguida de Bebidas (12), Cozidos (11) e Doces (10). No total, foram apresentados 82 usos alimentares distintos, categorizados a partir dos termos e expressões locais utilizados pelos entrevistados. Destacaram-se com maior número de citações, as seguintes categorias êmicas: “Comer” (60 citações), “Suco” (44), “Chupar” (38), “Saladas” (28) e “Doce” (20) e “Ensopado” (18). As espécies que apresentaram maior plasticidade quanto ao número de usos foram: a Mandioca (Manihot esculenta Crantz) (15 formas de uso), a saber: Beiju, Biscoito, Bolo, Comer, Cozido, Ensopado, Farinha, Fritura, Goma, Outros, Pão de queijo, Polvilho, Ração, Sopa e Tapioca; e o Milho (Zea mays L.) (13): Angu, Assado direto na brasa, Bolo, Cozido, Cuscuz, Farelo, Farinha, Fubá, Mingau, Outros, Pamonha, Polenta e Ração. Também se destacaram quanto ao total de usos: Banana (Musa x paradisiaca L.), Cenoura (Daucus carota L.), Goiaba (Psidium guajava L.) e Mamoeiro (Carica papaya L.) (10), Pequi (Caryocar brasiliense Cambess.) e Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (9). Tabela 4. Categorias de preparo, consumo e uso das plantas alimentícias citadas pelos entrevistados das comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Categorias de preparo e consumo Alimentação Animal Assados Bebidas Consumo in natura Cozidos

Doces Ensopados Farinhas, Beijús e gomas Farofa

Formas de uso Consumo direto, Descarte da alimentação humana, Ração Assado, Assado direto na brasa, Biscoito, Bolo, Pão, Rosca Batida, Cachaça e acompanhamentos, Café, Chá, Consumos direto, Imbuzada, Garapa, Licor, Polpa, Suco, Vinho, Vitamina Amassado com acompanhamentos, Chupar, Comer, Comer com açúcar Angu, Canjica, Cozido, Cozido com arroz, Cozido com carne, Cozido com peixe, Cural, Feijoada, Mingau, Mugunzá, Pamonha, Panqueca, Purê, Tutu Cocada, Doce, Doce de Tijolo, Mel de engenho, Mousse, Paçoca, Quenquinha, Rapadura Afogado, Ensopado, Ensopado com carne, Molho, Sopa, Vaca Atolada Beiju, Cuscuz, Farelo, Farinha, Fubá, Goma, Gralão, Polvilho, Puba, Tapioca Farofa 41


Categorias de preparo e consumo Frituras Óleos Outros Saladas Temperos

Torrados Total: 15

Formas de uso Fritura Óleo, Fritura com peixe, Omelete Açúcar, Limpar água, Pipoca Saladas Comer, Corante, Corante para batatinha, Corante para carne, Corante para galinha, Corante para macarrão, Molho, Pimenta, Tempero, Tempero para carne, Tempero para feijão, Tempero para galinha, Tempero para peixe Torrado 82

Consumo in natura apresentou maior riqueza de espécies (68) (Gráfico 1). Esta categoria é composta principalmente por árvores frutíferas presentes nos quintais e nas partes altas da paisagem, cujos frutos são “comidos” e “chupados”. A categoria Bebidas também se destacou em relação à riqueza de espécies (49), reforçando a importância de árvores frutíferas. A possibilidade de acesso a frutas no quintal cumpre função não apenas de nutrição e alimentação. Ao serem consumidas in natura, elas mediam a criação de espaço de sociabilidade, de diálogo e de prazer do encontro entre membros da família, vizinhos ou visitantes. As frutas criam as condições da extensão do acolhimento das residências. Além disso, também proporcionam lanches rápidos durante tarefas cotidianas realizadas nas pastagens, nas serras e nas matas.

Gráfico 1. Categorias de preparo e consumo e riqueza de etnoespécies (número de etnoespécies identificadas) nas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. 42


Sobressaíram-se também os Ensopados, Saladas e Doces. Os cultivos diversificados aparecem refletidos nessas tradições culinárias que costumam combinar diversas plantas e recursos obtidos nos quintais. Algumas espécies destacaram-se pela diversidade de categorias de usos apresentadas, em especial: Banana (Musa x paradisiaca L.) (com 8 categorias distintas), Mamoeiro (Carica papaya L.), Mandioca (Manihot esculenta Crantz) e Pequi (Caryocar brasiliense Cambess.) (7), Abóbora (Cucurbita sp.1), Cenoura (Daucus carota L.) e Laranja (Citrus sinensis (L.) Osbeck ) (6), Caju (Anacardium occidentale L.), Couve (Brassica oleracea L.), Manga (Mangifera indica L.), Milho (Zea mays L.) e Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (5). O Fruto foi a parte utilizada das plantas alimentícias com maior número de citações (100), seguido da Folha (23) e da Semente (16). O Mandacaru (Cereus jamacaru DC.) apresentou quatro regiões distintas passíveis de utilização, a saber, Casca, Caule, Fruto e Semente. Além de toda diversidade de espécies, a diversidade varietal de Mandioca e Manga foi riquíssima. Os informantes citaram 11 (onze) e 8 (oito) variedades, respectivamente. Diante da diversidade de etnoespécies e de usos pode-se afirmar que há realmente manejo e usos das plantas na alimentação e que por conta disso é que as etnoespécies e a diversidade se mantêm, ou seja, nessas comunidades tradicionais, tem a diversidade porque usa. Disponibilidade temporal e etnofenologia das plantas alimentares nos quintais e hortas Por meio das entrevistas individuais em cada comunidade, foi elaborada uma tabela consenso das informações sobre a disponibilidade temporal das plantas alimentícias citadas nos quintais e hortas para cada comunidade pesquisada (Tabela 5, 6, 7 e 8). Na comunidade quilombola de Malhada Grande, Catuti (MG), as plantas alimentícias de maior importância relativa e mais disponíveis ao longo do tempo foram 17(dezessete): Abóbora, Abobrinha, Acerola, Banana, Cebolinha, Coco, Goiaba, Laranja, Limão/Limão Tahiti, Limãozinho, Mamoeiro, Mandioca, Manga, Pimenta, Pinha, Quiabo e Tomate. A partir dos depoimentos individuais, os meses com maior quantidade de plantas foram dezembro, janeiro e fevereiro. Já os meses com menor quantidade de plantas foram 3(três), quais sejam, março, abril e maio. Nestes meses, as plantas disponíveis foram 35(trinta e cinco): Abóbora, Abobrinha, Acerola, Alface, Amendoim, Amora, Banana, Batata doce, Cana, Cebola, Cebolinha, Chichá, Coco, Corante/Urucum, Fedegoso, Feijão andu, Gergelim, Goiaba, Graviola, Laranja, Limão/Limão Tahiti, Limãozinho, Mamoeiro, Mandioca, Maracujina, Moringa, Palmatória, Pimenta, Pimenta passarinho, Pimentão, Pimentinha, Pinha, Quiabo, Tomate e Umbuzeiro (Tabela 5). As etnoespécies em negrito citadas acima são as plantas distintas entre os meses de maior e menor quantidade de etnoespécies. Já as tabelas seguintes (Tabela 5, 6, 7, 8, 10 e o Quadro 1) apresentam uma variação de cor com a intensidade aumentando em consonância com o aumento da importância relativa.

43


Tabela 5: Disponibilidade temporal de plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade quilombola de Malhada Grande, Catuti (MG). NI = Número de informantes. Etnoespécies

NI

Jan

Fev

Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

IR

Abacate

4

0,3

0,3

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,3

0,7500

Abóbora

3

0,4

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,4

2,1250

Abobrinha

2

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,3

0,3

2,0000

Acerola

6

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5 0,5

0,5 0,5

0,5

0,6

0,6

6,2500

Alface

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Amendoim

1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,3750

Amora

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,3

0,1

0,1

1,6250

Arroz

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,1

0,1

0,0

0,2500

Articum

1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,1250

Banana

4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,5

0,4 0,4

0,4 0,4

0,4

0,4

0,4

4,6250

Batata doce

5

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,4 0,3

0,3 0,1

0,1

0,0

0,0

1,2500

Beterraba

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1 0,1

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,2500

Cajá

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,1

0,1250

Caju

3

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,1 0,1

0,0

0,0

0,1

0,6250

Cana

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Cebola

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Cebolinha

5

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3 0,3

0,3 0,3

0,3

0,3

0,3

3,0000

Cenoura

3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1 0,1

0,1 0,0

0,0

0,0

0,0

0,3750

Chichá

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,6250

Ciriguela

4

0,4

0,4

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,1

0,0

0,0

0,1

1,0000

Coco

5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5 0,5

0,5 0,5

0,5

0,5

0,5

6,0000

Coentro

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Coquinho azedo

1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,1

0,1

0,3750

Corante/Urucum

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Couve

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Fedegoso

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Feijão andu

2

0,0

0,0

0,1

0,1

0,3

0,3 0,3

0,3 0,3

0,1

0,1

0,0

1,7500

Gergilim

2

0,0

0,3

0,1

0,1

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,5000

Goiaba

7

0,8

0,8

0,3

0,3

0,3

0,4 0,4

0,4 0,3

0,3

0,4

0,8

5,0000

Graviola

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,3 0,3

0,3

0,1

0,1

1,8750

Jabuticaba

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Jaca

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Laranja

5

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3 0,4

0,4 0,1

0,3

0,3

0,3

2,5000

Laranja da terra Limão/Limão Tahiti

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

5

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4 0,4

0,4 0,5

0,5

0,5

0,5

5,0000

Limãozinho

2

0,3

0,3

0,3

0,3

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,3

2,1250

Mamoeiro

6

0,8

0,8

0,6

0,6

0,6

0,6 0,6

0,6 0,6

0,6

0,6

0,8

7,8750

Mandacaru

3

0,3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,3 0,3

0,0

0,0

0,1

0,8750

Mandioca

5

0,1

0,0

0,1

0,1

0,3

0,3 0,3

0,4 0,4

0,4

0,3

0,1

2,6250

44


Etnoespécies

NI

Jan

Fev

Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

IR

Manga

8

0,3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,1 0,3

0,1 0,5

0,6

0,6

0,6

3,2500

Maracujá

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1 0,1

0,1 0,0

0,0

0,0

0,0

0,3750

Maracujina

2

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,3

1,7500

Maxixe

4

0,3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,4

0,7500

Melancia

4

0,5

0,5

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,5

1,5000

Melão

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,1

0,1250

Milho

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,2500

Moringa

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Palmatória

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Pimenta Pimenta passarinho

2

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3 0,3

0,3 0,3

0,3

0,3

0,3

3,0000

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Pimentão

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,3

0,3

0,3

1,8750

Pimentinha

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,1 0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Pinha

7

0,6

0,6

0,3

0,0

0,0

0,0 0,1

0,1 0,1

0,0

0,0

0,5

2,3750

Pitanga

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Quiabo

3

0,4

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1 0,1

0,3 0,3

0,1

0,1

0,3

2,2500

Romã

3

0,4

0,3

0,0

0,0

0,0

0,0 0,1

0,1 0,1

0,0

0,0

0,3

1,2500

Soja

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Sombrinha

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Tamarindo

2

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,1 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,1

0,5000

Tangerina

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Tanja

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0 0,1

0,1 0,1

0,0

0,0

0,1

0,7500

Tomate Tomatinho/tomate cereja

5

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3 0,3

0,3 0,3

0,3

0,3

0,4

3,3750

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Umbuzeiro

4

0,4

0,4

0,3

0,0

0,0

0,0 0,0

0,1 0,1

0,0

0,0

0,3

1,5000

Uva Importância relativa do mês

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0 0,0

0,0 0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

11,6 10,5

6,9

6,3

6,5

7,4 7,8

8,4 8,3

7,6

7,6 11,5

Na comunidade vazanteira do Pau Preto, Matias Cardoso (MG), as plantas alimentícias de maior importância relativa e mais disponíveis ao longo do tempo foram 7(sete): Cana, Carambola, Laranja, Manga, Manjericão, Maracujá e Umbuzeiro. Os meses com maior quantidade de plantas foram 8(oito): dezembro, janeiro, fevereiro, junho, julho, agosto, setembro e outubro. Já os meses com menor quantidade de plantas foram 2(dois): março e abril. Nestes meses, as plantas disponíveis foram 8(oito): Cana, Carambola, Goiaba, Juá mirim, Manjericão, Maracujá, Pinha e Umbuzeiro (Tabela 6). Tabela 6: Disponibilidade temporal de plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto, Matias Cardoso (MG). NI = Número de informantes. Etnoespécies

NI

Jan

Fev

Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Importância relativa

Abacate

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Abóbora

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1250

Açafrão

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

45


Etnoespécies

NI

Jan

Fev

Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Acerola

3

0,0

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

Importância relativa 0,3750

Alface

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Banana

3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Berinjela

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Caju

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1250

Cana

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Carambola

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Cebola

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Cebolinha

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Ciriguela

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,2500

Corante/Urucum

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Feijão andu

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,3750

Gergilim

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Goiaba

2

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,5000

Jatobá

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,5000

Juá mirim

1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,6250

Juazeiro

2

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2500

Laranja

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,3

0,3

0,3

0,0

0,0

1,0000

Limão/Limão Tahiti

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Mamoeiro

3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,6250

Mandioca

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Manga

4

0,3

0,3

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,0

0,1

1,0000

Manjericão

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Maracujá

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Milho

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1250

Pimenta

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Pimenta de cheiro

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Pinha

2

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,3750

Quixabeira

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Repolho

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Tamarindo

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,3750

Tangerina

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,6250

Tomatinho de rolinha

1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,2500

Umbuzeiro

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

1,4

1,3

0,9

0,9

1,1

1,5

1,5

1,5

1,4

1,4

1,0

1,3

Importância relativa do mês

Na comunidade geraizeira do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG), as plantas alimentícias de maior importância relativa e mais disponíveis ao longo do tempo foram 17(dezessete): Abóbora, Alface, Banana, Batata Doce, Cana, Cebolinha, Cenoura, Chuchu, Coco, Coentro, Couve, Jaca, Laranja, Mamoeiro, Mandioca, Maracujá e Maxixe. Os meses com maior quantidade de plantas foram 6(seis): outubro, novembro, dezembro, janeiro, junho e julho. Já os meses com menor quantidade de plantas foram 2(dois); abril e setembro. Nestes meses, as plantas disponíveis foram 55(cinquenta e cinco): Abacate, Abóbora, Acerola, Agrião, Alface, Alho, Banana, Batata Doce, Café, Cagaiteira, Cana, Cariru, Cebola, Cebolinha, Cenoura, Chuchu, 46


Coco, Coco macaúba, Coentro, Conde, Corante/Urucum, Couve, Espinafre, Fedegoso, Feijão, Feijão andu, Goiaba, Hortelã pimenta, Ingazeiro, Inhame, Jabuticaba, Jaca, Jatobá, Jiló, Laranja, Lima, Limão rosa/galego, Limão/Limão Tahiti, Mamoeiro, Mandioca, Maracujá, Maracujá do pequeno, Maxixe, Pepino, Pimenta, Pimentão, Pinha, Pocam, Quiabo, Romã, Rúcula, Salsa, Taioba e Tomate (Tabela 7). Tabela 7: Disponibilidade temporal das plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade geraizeira do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). NI = Número de informantes Importância Etnoespécies NI Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez relativa Abacate

6

0,4

0,5

0,3

0,3

0,3

0,3

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,4

2,5000

Abacaxi

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,5000

Abóbora

7

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,6

6,1250

Abóbora d'água/verde

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2500

Abóbora japonesa

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2500

Abobrinha

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Acerola

6

0,3

0,3

0,3

0,3

0,1

0,3

0,3

0,1

0,1

0,3

0,3

0,4

2,7500

Agrião

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Alface

7

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

6,0000

Alho

6

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,4

0,5

0,1

0,1

2,3750

Amora

3

0,3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,3

0,3

1,0000

Araçá

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,3750

Articum

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1250

Bacupari

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Banana

8

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

1,0

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

10,6250

Batata

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2500

Batata doce

4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

3,2500

Beterraba

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,6250

Café

8

0,0

0,0

0,0

0,1

0,4

0,3

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,1

1,2500

Cagaiteira

3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,4

0,3

0,1

0,8750

Cajá

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1250

Caju

6

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,5000

Cana

4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

4,5000

Cariru

2

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,3

0,3

2,1250

Caxixa/caxixe

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Cebola

3

0,1

0,1

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,1

0,1

1,7500

Cebolinha

5

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

3,0000

Cenoura

5

0,1

0,1

0,3

0,3

0,3

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

3,0000

Cereja

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,0

0,1250

Chuchu

2

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

3,0000

Ciriguela

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1250

Coco

3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

3,0000

Coco macaúba

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Coentro

8

0,4

0,4

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,5

0,5

0,5

6,6250

Conde

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,1

0,1

1,6250

47


Etnoespécies

NI

Jan

Fev

Mar

Abr

Mai

Jun

Jul

Ago

Set

Out

Nov

Dez

Importância relativa

Corante/Urucum

7

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,6

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

1,3750

Couve

7

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

6,0000

Espinafre

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Fedegoso

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Feijão

8

0,4

0,4

0,3

0,0

0,1

0,1

0,1

0,5

0,3

0,1

0,0

0,1

2,3750

Feijão andu

3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,4

0,4

0,4

0,1

0,1

0,1

1,5000

Goiaba

6

0,3

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,4

1,5000

Hortelã pimenta

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Ingazeiro

6

0,1

0,0

0,3

0,3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

1,0000

Inhame

1

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,6250

Jabuticaba

7

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,4

0,3

0,1

0,8750

Jaca

6

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

3,1250

Jambo

1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1250

Jambre

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Jatobá

4

0,3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,1250

Jenipapo

1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,3750

Jiló

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Laranja

8

0,1

0,1

0,3

0,3

0,6

0,6

0,6

0,6

0,4

0,0

0,1

0,1

3,8750

Lima

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,1

1,2500

Limão rosa/galego

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Limão/Limão Tahiti

6

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,1

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

2,5000

Maçã

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Mamoeiro

7

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

0,6

0,6

0,5

0,5

0,5

0,5

0,5

6,2500

Mandioca

8

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

10,5000

Manga

10

0,6

0,4

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,4

0,8

2,3750

Maracujá

4

0,4

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,4

3,5000

Maracujá do pequeno

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Maxixe

3

0,3

0,3

0,4

0,4

0,4

0,3

0,3

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

4,0000

Milho

4

0,3

0,1

0,3

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,8750

Mostarda

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Mutamba

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Pepino

3

0,1

0,1

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

2,7500

Pequi

4

0,4

0,3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,3

0,8750

Pimenta

3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,3

0,1

0,1

0,7500

Pimenta de cheiro

2

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Pimentão

1

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,2500

Pinha

2

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

1,0000

Pinhão

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Pitanga

3

0,3

0,3

0,3

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

1,0000

Pocam

3

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,8750

Quiabo

4

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,3

2,0000

Repolho

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Romã

2

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,6250

48


Etnoespécies

NI

Jan

Fev

Mar

Abr

Mai

Jun

Jul

Ago

Set

Out

Nov

Importância relativa

Dez

Rúcula

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Salsa

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5000

Salsinha

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Taioba

2

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,1

0,1

0,1

1,2500

Tomate

5

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,5

0,3

0,3

0,3

0,1

0,1

2,0000

Tomatinho/tomate cereja

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Umbuzeiro

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1250

Uva

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1250

Importância relativa do mês 13,50 12,38 12,63 11,50 12,25 13,13 14,00 12,75 12,13 13,38 13,00 14,8

Por fim, na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG), as plantas alimentícias de maior importância relativa e mais disponíveis ao longo do tempo foram 21(vinte e uma): Abóbora, Acerola, Amora, Banana, Cajá, Caju, Cana, Ciriguela, Coco, Figo, Graviola, Laranja, Limão rosa/galego, Limão/Limão Tahiti, Mamoeiro, Maracujá, Palma, Pinha, Pitanga, Romã e Umbuzeiro. Os meses com maior quantidade de plantas foram 5(cinco): dezembro, janeiro, fevereiro, março e maio. Já os meses com menor quantidade de plantas foram 2(dois): setembro e outubro. Nestes meses, as plantas disponíveis foram 30(trinta): Abóbora, Acerola, Amora, Banana, Boldo, Cajá, Caju, Cana, Cebolinha, Cidra/Limãozão, Coco, Corante/Urucum, Figo, Graviola, Laranja, Leucena, Limão rosa/galego, Limão/Limão Tahiti, Mamoeiro, Maracujá, Moringa, Nim, Palma, Pimenta, Pitanga, Romã, Tamarindo, Tangerina, Tomate e Tomate Grão de galo (Tabela 8). Tabela 8: Disponibilidade temporal de plantas alimentares pertencentes a quintais e hortas da comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). NI = Número de informantes. Etnoespécies

NI

Jan

Fev Mar

Abr Mai Jun Jul

Ago Set

Out Nov Dez

IR

Abacate

4

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,8571

Abóbora

4

0,6

0,6

0,6

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

4,2857

Acerola

7

1,0

0,9

0,7

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

1,0

8,1429

Alface

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Amendoim

1

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Amora

4

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,4

0,6

2,7143

Araçá

1

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Atemóia

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Banana

6

0,6

0,6

0,7

0,7

0,7

0,7

0,7

0,7

0,7

0,7

0,7

0,7

8,2857

Batata Doce

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Boldo

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Café

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,5714

Cajá

4

0,1

0,1

0,3

0,4

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,1

2,5714

Caju

6

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

2,4286

Cana

5

0,3

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,4

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

4,1429

Carambola

3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,1

0,3

1,0000

49


Etnoespécies

NI

Jan

Fev Mar

Abr Mai Jun Jul

Ago Set

Out Nov Dez

IR

Cebolinha

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Cidra/Limãozão

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Ciriguela

7

0,9

0,6

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,7

2,2857

Coco

5

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

0,6

6,8571

Coentro

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Corante/Urucum

5

0,1

0,3

0,1

0,0

0,1

0,1

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,5714

Feijão

3

0,4

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,7143

Feijão andu

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Figo

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

2,1429

Garoba

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Gergilim

1

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,5714

Girassol

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Goiaba

7

0,7

0,4

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,4

1,7143

Graviola

6

0,3

0,1

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

2,1429

Jabuticaba

1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1429

Jaca

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Jamelão

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,4286

Jericanhota

1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,4286

Juazeiro

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Laranja

6

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

3,5714

Laranja

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Leucena

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Lima

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Limão rosa/galego

3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

2,0000

Limão/Limão Tahiti

7

0,6

0,7

0,7

0,6

0,6

0,6

0,4

0,4

0,4

0,6

0,6

0,6

6,7143

Maçã

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Mamoeiro

7

1,0

1,0

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

0,9

1,0

10,7143

Mandioca

4

0,0

0,1

0,3

0,3

0,4

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

1,5714

Manga

8

0,7

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,3

0,6

1,7143

Mangaba

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Maracujá

3

0,3

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

3,0000

Maracujá do mato

1

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Maxixe

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,4286

Melancia

3

0,4

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,8571

Melão

1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Milho

3

0,4

0,3

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

1,0000

Moringa

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Nim

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Palma

3

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

0,4

5,1429

Pepino

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,2857

Pimenta

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

50


Etnoespécies

NI

Pinha

7

0,6

1,0

0,9

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

2,7143

Pitanga

4

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,3

0,1

0,1

0,3

2,2857

Quiabo

2

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,4286

Quixabeira

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Romã

6

0,4

0,6

0,6

0,3

0,4

0,4

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

0,3

4,4286

Tamarindo

4

0,1

0,0

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,8571

Tançagem

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Tangerina

2

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Tanja

2

0,3

0,3

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,1

0,1

1,4286

Tomate

3

0,1

0,1

0,0

0,0

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,0

0,0

0,0

1,0000

Tomate grão de galo

1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

1,7143

Tomate redondinho

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Umbuzeiro

7

0,9

1,0

0,4

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,4

2,7143

Veludo

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

Xarope

1

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0000

16,0 15,0

12,3

8,9

9,7

9,4

8,6

8,1

7,7

7,4

8,7

12,1

IR total

Jan

Fev Mar

Abr Mai Jun Jul

Ago Set

Out Nov Dez

IR

Com o retorno a campo, foi feito um exercício de sistematização das informações disponíveis até a época e que surgiram dos levantamentos individuais. Nessa devolução e validação dos registros, outras pessoas foram entrevistadas e os debates em grupo permitiram acordos para maior segurança na sistematização das informações anteriormente produzidas. Além disso, nesse momento de devolução foram indagadas novamente as questões da disponibilidade temporal mais ampla e mais restrita das plantas de cada comunidade. Na tabela 9, têm-se a síntese desses debates. Tabela 9: Disponibilidade temporal mais ampla e restrita ao longo do ano de plantas alimentares nas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Disponibilidade Temporal/ Comunidades Malhada Grande (Quilombolas)

Pau Preto (Vazanteiros)

Sobrado (Geraizeiros)

Mais Ampla

Mais restrita

Abobrinha2, Acerola1, Alface2, Amora1, Banana1, Cana1, Cebola1, Cebolinha1,2, Coco1, Graviola, Limão, Limãozinho, Mamoeiro, Maracujina, Moringa, Palmatória, Pimenta 1, Pimenta Passarinho1, Pimentão1, Pimentinha1 e Tomate1 (com 12 meses); Mandioca (11 meses). Abacate1, Banana, Berinjela, Cana, Carambola, Corante, Limão, Manjericão, Pimenta1 e Pimenta de Cheiro (com 12 meses); Pinha2 (9 meses).

Coentro2, Couve1,2, Pitanga1 e 1, 2 Tomatinho/tomate cereja (em 0 meses); Amendoim2, Gergilim, Jabuticaba, Jaca e Mandacaru (1 mês).

Abóbora1, Alface1,2, Amora1, Banana, Beterraba2, Cana, Cariru1, Cebolinha1, Chuchu1,2, Coco1,2, Coco macaúba, Conde2, Couve1, Espinafre1, Fedegoso, Hortelã Pimenta1, Inhame1, Jaca, Jiló1, Mamoeiro1, Mandioca1,2, Maracujá1,2, Maracujá do pequeno1,2, Maxixe1, Mostarda1, Pepino1,2, Pimenta de cheiro1, Pinha1,2, Romã1, Rúcula1 e Salsa1 (com 12 meses); Coentro, Lima1, Pimentão1 e Taioba1 (10 meses).

Abóbora1,2, Açafrão1, Acerola1, Alface1, Mamão1, Maracujá2 e Repolho1 (em 0 meses); Cebola2, Cebolinha1, Gergilim, Goiaba1 e Milho2 (1 mês). Salsinha1 e Tomatinho/tomate cereja1 (em 0 meses); Acerola1, Batata doce, Café, Cereja1, Ciriguela, Jabuticaba1, Maçã, Mutamba, Pimenta, Pinhão e Uva (1 mês).

51


Disponibilidade Temporal/ Comunidades Touro (Caatingueiros)

Mais Ampla

Mais restrita

Acerola1, Alfazema1, Banana1, Boldo1, Cebolinha, Cidra, Coco1, Limão1, Limão rosa/galego, Limão Taiti, Mamoeiro1, Maracujá1, Palma e Pimenta1 (com 12 meses); Tanja (8 meses).

Coentro, Figo, Garoba, Juazeiro, Leucena, Maçã, Mangaba, Nim, Tanchagem1, Tomate redondinho e Veludo (em 0 meses); Batata Doce, Cenoura, Corante, Girassol, Jabuticaba, Jaca, Moringa, e Quixabeira (1 mês).

Legenda: Foram citadas que: 1dão o ano inteiro, se tiver água; 2depende de quando se planta para saber quando produzem.

No geral, pode-se dizer que, cada comunidade marcou seu calendário sazonal com cerca de seis meses de chuva, “o tempo das águas”, de outubro até março, às vezes, reduzindo indo apenas até janeiro ou fevereiro, como foi o caso dos vazanteiros e quilombolas e cerca de seis meses de seca, “o tempo das secas”, de abril a setembro, na Ilha do Pau Preto o período seco começava entre maio e julho com menos meses e no Sobrado em setembro já chegavam as chuvas. É interessante observar a dinâmica de produção das plantas na fase de transição e nos meses centrais dos dois tempos. Quando se vai do tempo das águas para o das secas, e vice-versa, há maior escassez de plantas (QUADROS 1 e 2). Já os períodos de maior porcentagem de etnoespécies por comunidade foram os meses centrais do tempo das águas seguido pelos meses centrais do tempo das secas, o que demonstra etnoespécies e etnovariedades adaptadas ao clima regional e específicas a cada período. Alguns depoimentos revelaram observações que estabelecem uma relação entre as condições do tempo e a produção de plantas. Essa relação foi descrita de forma semelhante nas comunidades: “A gente planta, mas não dá. As chuva tá muito faiando. Tem o tempo certo dos mantimento (caatingueira do Touro)” e “Esse ano agora foi muito seco, né? Nossa mãe! (geraizeira do Sobrado)”. Outra observação feita na comunidade da Ilha do Pau Preto foi a interferência da lua no manejo e produção das plantas: “Quando a lua está crescente tudo rende, limpa no crescente. Se planta na minguante não vai para frente” e “Tem dois plantio no ano [sobre o feijão de arranca na prática da agricultura de vazante]. Planta mais junto as carreirinhas. Prepara a terra e deixa dia passar. Planta com 4 dias de lua nova. 3 ou 4 meses rança, põe no terreiro, terminou de secar bate, tira bagaço e põe limpo no seco” (vazanteira da Ilha do Pau Preto, 56 anos). QUADRO 1: Porcentagem de etnoespécies disponíveis por mês nos quintais e hortas de cada comunidade pesquisada no norte de Minas Gerais. Comunidades/Meses

J

F

M

A

M

J

J

A

S

O

N

D

Malhada Grande

71

66

41.5

35

36.9

48

46

48

41.5

40

42

66

Pau Preto

54

43

40.5

30

37.8

43

43

43

46

49

38

43

Sobrado

51

45

47.7

47

57

59

55

55

49

52

52

60

Touro

58

51

38

27

35.2

32

34

39

30

23

31

41

52


QUADRO 2: Disponibilidade Temporal/ Meses de escassez, riqueza e porcentagem de plantas alimentares em cada comunidade pesquisada no norte de Minas Gerais. Comunidades/Disponibilidade temporal

Malhada Grande

Pau Preto

Sobrado

Touro

Meses de escassez

Abril e maio.

Março, abril, maio e novembro.

Fevereiro, março, abril e setembro.

Abril, setembro, outubro e novembro.

1

Ano todo, se tiver água (Riqueza e porcentagem de etnoespécies)

24 (36,92%)

11 (29,73%)

42 (48,84%)

14 (19,72%)

2

10 (15,38%)

6 (16,22%)

20 (23,26%)

3 (4,23%)

Depende de quando planta (Riqueza e porcentagem de etnoespécies)

A variação de porcentagens na disponibilidade de plantas, ao longo do tempo, nas comunidades foi grande: nos quilombolas de Malhada Grande variou de 35% a 71%, nos vazanteiros de Pau Preto de 30% a 54%, nos geraizeiros de Sobrado de 45% a 60% e nos caatingueiros do Touro de 23% a 58%. Assim, a comunidade do Touro foi a única que apresentou meses com porcentagens de etnoespécies abaixo de 30% e juntamente com a comunidade de Malhada Grande apresentaram a maior variação nas porcentagens em torno de 35,5%, o que poderia indicar maior vulnerabilidade ao longo do ano (Quadro 1). Na comunidade de Malhada Grande, as plantas registradas nos períodos de escassez foram, além das de distribuição mais ampla (Tabela 9), as etnoespécies Chichá e Mandioca. No Pau Preto, acrescenta-se Juá mirim, Quixabeira e Umbuzeiro; no Sobrado, a Pocam; e no Touro, o Abacate, com exceção da etnoespécie Tanja (com disponibilidade temporal mais ampla). A disponibilidade de algumas etnoespécies foi relacionada pela oferta de água pois, como esclarecem os depoimentos: “tem que molhar todo dia”, “varia da água” e “molhando, dá o ano todo”. Nessa condição de etnoespécies que exigem cuidados com a rega, foi registrado na comunidade geraizeira do Sobrado maior riqueza e porcentagem de etnoespécies ao longo do ano. Assim, no Sobrado foram 42 etnoespécies (48,84%), além das plantas marcadas na Tabela 9, temos: Abobrinha, Alho, Caxixa/Caxixe, Cenoura, Coentro, Feijão andu, Laranja, Limão e Tomate. Em seguida, aparece a comunidade quilombola de Malhada Grande, com 24 etnoespécies (36,92%) a exemplo de: Abóbora, Caju, Ciriguela, Fedegoso, Feijão andu, Goiaba (“Se tiver moiando no quintal, ela dá várias vezes no ano”), Maracujina, Maxixe, Melancia e as marcadas na Tabela 9. Depois vem a comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto com 11 citações (29,73%), todas elas estão marcadas na Tabela 9. Por fim, têm-se a comunidade caatingueira do Touro, com 14 citações (19,72%), além do já marcado na Tabela 9, foram citadas: Cana, Goiaba, Pitanga e Quiabo (“Direto, tendo água para moiá”) (Tabela 9 e Quadro 2). A disponibilidade das plantas em virtude do ritmo do plantio também foi avaliada (Quadro 2). Na comunidade do geraizeira do Sobrado novamente houve maior riqueza e porcentagem de etnoespécies dependendo da época que se planta, ao todo foram 20 etnoespécies correspondendo a 53


23,26%. Além das já marcadas na Tabela 9, foram indicados: Abóbora d’água/verde/cabaça, Abóbora japonesa, Abobrinha (“planta em fevereiro e março, de 90 a 120 dias produz”), Agrião (“Planta na horta de março a abril e maio. Setembro planta de novo. Tem até novembro dura uns 90 dias”), Batata (“em seis meses”), Cebola (“planta em março, 70 dias e 120 dias”), Cenoura (“planta em março”), Feijão (“Depende da terra. Planta em março, junho e setembro, dá em 90 dias”), Quiabo (“planta de outubro a dezembro”) e Repolho (“planta em fevereiro, de 70 a 90 dias”). Etnoespécies típicas de horta como a Alface cultiva “mais no frio”, em geral no mês de março. Entre os vazanteiros da Ilha do Pau Preto foram 6 etnoespécies (16,22%) dependendo de quando planta, entre elas a Mandioca e a Abóbora (“planta na vazante, em 60 dias tá figando. Planta em fevereiro e março. Mais 30 dias amadurece”) e a Cebola (“pé amolece, é que tá madura. Uns 4 meses”). Na comunidade quilombola de Malhada Grande foram 10 (15,38%), além das marcadas anteriormente (Tabela 9), temos: Beterraba, Cenoura e Milho. Etnoespécies como Amendoim, Arroz e Batata doce cultivam de outubro a novembro junto à época de plantio das roças, vindo a colher de três a seis meses depois. Já etnoespécies de horta como Abobrinha, Alface, Cenoura, Coentro e Couve começa-se o plantio no mês de maio e cerca de dois meses já estão produzindo. A Beterraba planta-se antes, em março. Finalmente, na comunidade caatingueira do Touro houve menor riqueza e porcentagem de etnoespécies, 3 (4,23%), a saber: Abóbora, Feijão (“de dois a três meses para colher”), planta em janeiro para colher em março e Milho (“Varia da chuva, é três meses, tem de dois meses, precoce”). Esse manejo produtivo pode ser correlacionado com a riqueza de plantas anuais ou perenes citadas por estas comunidades (Tabela 10). A comunidade caatingueira do Touro citou menor quantidade de plantas anuais em relação às plantas perenes. Já a comunidade geraizeira do Sobrado foi a que mais citou plantas anuais. Tabela 10. Relação de plantas alimentares anuais, perenes e semi-perenes citadas nas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Etnoespécies Malhada Grande Pau Preto Sobrado Touro Todas

Anual e Perene 1 1 0 1 1

Anual

Perene

Semi-perene

28 14 42 25 61

34 21 42 44 67

2 1 2 2 4

Cabe ressaltar que as plantas cultivadas em roças e as etnoespécies como feijão, mandioca e milho, são as que podem ser encontradas em mais períodos e que podem ser guardadas e conservadas por longos períodos de tempo. Além disso, do milho e da mandioca tem-se a produção de farinhas entre outros, o que pode atenuar o significado das informações, o que ameniza a ideia de carência alimentar em meses de escassez. De forma geral, as informações sobre os períodos do ano de maior e menor disponibilidade de plantas, foram semelhantes quando se compara o levantamento em grupo e as entrevistas 54


individuais. Entretanto, cabe destacar que, nas comunidades quilombola de Malhada Grande, vazanteira da Ilha do Pau Preto e geraizeira do Sobrado, no levantamento em grupo, os diálogos enriqueceram a identificação de variedade de plantas alimentícias disponíveis, tanto ao longo do tempo quanto em meses de escassez. Já na comunidade caatingueira do Touro, não houve um aumento expressivo nessas informações por meio de diálogos em grupo. Isso pode ser entendido em razão da dinâmica do grupo ter sido realizada na época com poucas pessoas e com jovens, cuja idade não permitia um vínculo muito grande com o manejo e a produção de plantas. A partir das observações e dos dados produzidos, pode-se dizer que são várias as condições de possibilidade sobre as restrições na produção e na obtenção das plantas alimentícias. A água apareceu como um dos fatores fundamentais, associada à época de plantio e às práticas culturais de manejo, que exacerbam ou permitem conviver com as determinações das condições climáticas, muitas vezes adversas e pouco favoráveis à produção. Assim, o maior ou menor conhecimento dos ambientes e das dinâmicas das interações ecológicas locais torna as comunidades mais ou menos vulneráveis a essas determinações. Um exemplo nesse sentido vem de uma fala sobre a produção da Mandioca na comunidade caatingueira do Touro: “Com um ano tá produzindo com água. Seis meses pode renascer, tem que ter chuva”. No contexto do norte de Minas, a temperatura também foi citada e relacionada como limitante e condicionante da produção: “depende da temperatura, produz duas vezes próximo às águas” (sobre o Abacate na comunidade quilombola de Malhada Grande). Algumas etnoespécies alteram o fluxo regular de produção como o Cajá e a Manga na comunidade caatingueira do Touro: “Temporão, dá fora do tempo”. Ainda sobre a produção, ocorre o consumo das plantas por outros animais da região: “De vez em quando planta, periquito não deixa” (sobre o Girassol na comunidade do Touro). Analisando as etnoespécies plantadas, existem as que são plantadas por apenas um morador, como a Berinjela: “Só Seu Tonho planta. Tem os pé, dá todo tempo” (na comunidade da Ilha do Pau Preto) e outras que se pode considerar muito recorrente, “Cada casa tem um pé” (sobre a Acerola na comunidade do Pau Preto). Vale a pena ponderar o fato de que nem todos os entrevistados se lembraram ou sabiam responder sobre a época disponível. “Não sei te falar a época do ano que dá” (sobre a Jabuticaba na comunidade do Touro) e “Não lembro” (sobre o Jamelão na comunidade do Touro). Isso porque ou este era um conhecimento em desuso: “Já esqueci, tem muito tempo que produziu” (sobre o Figo na comunidade do Touro), ou um conhecimento muito novo que estava sendo introduzido: “Nunca produziu. Projeto Terreirão deu” (sobre a Graviola na comunidade do Touro). Em alguns casos tratava- se de plantas que se comprava e não plantava: “Dá mais no frio. Não sei não. Tem que comprar” (sobre a Maçã na comunidade do Touro), ou por não ter na região: “Aqui não tem. Mas na feira tem para vender” (sobre a Jaca na comunidade do Touro) e “Só tem nos Gerais, na região não tem. Não conheço” (sobre a Mangaba na comunidade do Touro). 55


Enfim, algumas plantas alimentares relembram que há hábitos antigos, que se mantém ou que tendem a desaparecer: “Mãe já comeu muito cariru, hoje não” (sobre o Cariru na comunidade do Sobrado) e “Antigamente” (sobre a Batata doce na comunidade do Sobrado). O estudo do uso das plantas alimentares pode auxiliar no entendimento sobre a dinâmica da vida, os valores e as condições de sua (re) produção.

6.4. Origem social dos propágulos que edificam a agrobiodiversidade dos quintais e hortas A origem social de cada planta alimentar citada nos quintais, ou seja, sua procedência, variou muito dependendo da comunidade. Assim, para fim de análises foram estabelecidas categorias quanto à origem dos propágulos em relação as comunidades. As plantas caracterizadas de origem externa às comunidades são normalmente advindas por compra em mercados e feiras ou obtidas a partir de projetos sociais e políticas governamentais, dentre outras origens. Já as de procedência interna às comunidades são as plantas que se propagaram por ação do próprio morador durante o manejo das plantas em seus quintais e por doações de familiares e vizinhos da comunidade. Em “nativo” agrupamos os depoimentos sobre as plantas consideradas “nativas” pelos moradores, como: “Nativo da terra”, “Nasceu aí, é trem do mato que nasce. É fruta, mas não é gente que planta não”. “Nas águas, aparece. Ele nasce. Quando o sol esquenta, não tem como. Ele é nativo da terra”, e “É da região, nativo”. De forma geral, não houve grande diferença quanto às citações agrupadas em relação à origem, se eram plantas externas ou internas às comunidades (Tabela 11). Tabela 11: Origem das plantas alimentares citadas nos quintais das comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais Origem Todas Malhada Grande Pau Preto Sobrado Touro 313 91 20 103 99 Externo à comunidade 266 45 20 109 92 Interno à comunidade 11 6 0 2 3 Não lembra 113 26 10 48 29 Sem informação 51 13 6 24 8 “Nativo” 2 0 1 1 0 Rio 756 181 57 287 231 Total de citações Em cada comunidade, também não houve grande diferença quanto à origem. Na comunidade quilombola de Malhada Grande, foram 91 citações de procedência externa, das quais 50 pelo comércio, 22 de outras localidades e 19 por projetos externos. Com origem interna foram 45 citações, 39 obtidas de outros membros da comunidade e 6 do próprio quintal. Isto demonstra uma intensa relação com o comércio e fortes laços sociais entre os moradores da comunidade. Na comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto, foram 20 citações de procedência externa, sendo 11 de outras localidades, 8 do comércio e 1 de projetos. De origem interna, foram registradas 20 citações, sendo 13 de outros membros da comunidade e 7 do próprio quintal. 56


Assim, observa-se intensa troca de plantas, seja entre moradores da mesma comunidade ou não, e pelo local ser de grande fluxo de pessoas, principalmente, pela dinâmica e transporte do Rio São Francisco. Na comunidade geraizeira do Sobrado, contabilizou-se 109 citações para plantas de origem interna, sendo 60 provenientes do próprio quintal, 43 de outros moradores da comunidade, 4 de causas externas, uma pela via comercial e uma sem informação sobre sua procedência. Quanto à origem externa foram 103 citações, dentre as quais 80 oriundas do comércio, 19 de outras localidades e 3 de projetos e 1 própria propriedade (outra propriedade localizada fora da comunidade). Assim, notou-se intensa troca e (re)produção de plantas pelos geraizeiros do Sobrado entre si e com outras comunidades, porém evidenciou-se a importância das relações comerciais externas à comunidade, especialmente devido à importância regional da feira livre que ocorre aos sábados em Rio Pardo de Minas. Na comunidade caatingueira do Touro, foram 99 citações para etnoespécies de origem externa, sendo 40 de projetos, 37 do comércio, 21 de outras localidades e 1 da própria propriedade (outra propriedade localizada fora da comunidade). Por outro lado, registrou-se 92 citações de plantas de origem interna, dentre as quais 52 advindas de outros moradores da comunidade, 36 da própria terra, 3 de outras fontes externas e uma obtida pelo comércio. Cabe destacar a intensa (re)produção e troca de mudas observada na comunidade do Touro, bem como a atuação de projetos institucionais e a forte relação com o comércio da cidade de Porteirinha, onde ocorre semanalmente uma das feiras livres mais importantes do Norte de Minas. Apesar da riqueza de informações registradas, não foi possível distinguir 113 citações quanto à origem, se interna ou externa à comunidade. Isso pode ter interferido na baixa diferenciação da análise acima. Nas expedições de retorno, buscou-se revisar, aprofundar e complementar tais informações, porém não foi possível encontrar alguns dos moradores que foram entrevistados na primeira ida a campo. Em relação aos locais de origem das plantas, a grande maioria adveio do próprio município da comunidade pesquisada (451 citações de um total de 756, representando 59,66%). Em seguida, predominou a procedência de municípios do norte de Minas, com 150 citações. Municípios de outros estados ou do sul de Minas receberam 11 citações enquanto outros 12 entrevistados não se lembraram do local. Grande parte dos entrevistados não especificou os municípios de origem (132). Na comunidade quilombola de Malhada Grande (Catuti – MG) o próprio município teve 82 citações (45,3%), em seguida Mato Verde (MG), cidade vizinha, com 29 citações (16%). Um entrevistado de Malhada Grande disse: “O certo é Mato Verde, quando você não tem uma planta e quer a muda, vai e compra em Mato Verde”. Os demais lugares tiveram 8 citações a menos. Entre os vazanteiros da Ilha do Pau Preto (Matias Cardoso – MG), o próprio município teve 23 citações (40,35%), seguindo de Manga (MG), situada na margem oposta do Rio São Francisco, com 17 citações. Outras localidades receberam de duas a uma citação. 57


Na comunidade geraizeira do Sobrado (Rio Pardo de Minas – MG) o próprio município obteve 211 citações (73,52%). A cidade de Mato Verde (MG), localizada no contato entre os “gerais” e as caatingas, recebeu sete citações e outros municípios foram mencionados em 3 citações ou menos. Entre os caatingueiros do Touro (Serranópolis de Minas - MG), o próprio município teve 135 citações (58,44%), seguido de Porteirinha (MG), cidade geograficamente mais próxima da comunidade, citada 39 vezes (16,88%), e Montes Claros (MG), cidade-polo regional com 14 menções (6,06%), e outros lugares receberam 3 citações ou menos. Diante destas informações foi possível também categorizar os principais atores sociais responsáveis pela obtenção de novas plantas para incremento e manutenção da agrobiodiversidade (Tabela 12). Dentro da categoria “comércio” temos registros de compra de sementes, mudas e até mesmo frutos, que serviram de alimento e, posteriormente, forneceram sementes para produção de novas mudas. Na categoria “pares sem relação de parentesco” foram agrupados os registros de obtenção de mudas ou diásporos por doação de vizinhos, amigos ou fazendeiros locais. Por sua vez, a categoria “ações do/a próprio/a morador/a” abrangeu depoimentos de moradores que realizaram propagação vegetativa de determinadas espécies nos quintais, que mantiveram as plantas que estavam na casa, que guardavam a semente dos frutos e replantavam, que coletavam mudas ou sementes por onde passavam, que trouxeram de moradia anterior ou do local onde trabalhavam. Nas “causas externas” foram alocados os depoimentos sobre plantas vindas através de dispersão feita por animais ou trazidas involuntariamente junto com outras sementes e esterco. Por fim, a categoria “Projetos de sindicato, CAA, governo” engloba os registros de plantas introduzidas por meio da participação de algumas famílias em projetos elaborados e executados pelas prefeituras, pelos sindicatos de trabalhadores rurais e cooperativas, pelo Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA), pelos governos federal e estadual, além de espécies obtidas em feiras de trocas e de agrobiodiversidade e outros eventos que tem função não somente técnica ou cultural, mas de resistência política ao padrão agroindustrial de uma agricultura convencional. Tabela 12: Atores responsáveis pela obtenção das plantas alimentares nos quintais e hortas das comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Quem? Todas Malhada Grande Pau Preto Sobrado Touro 114 9 7 61 37 Próprio do/a morador/a 9 0 1 5 3 Causas externas 177 50 8 81 38 Comércio 9 4 0 2 3 Não lembra 51 13 6 24 8 “Nativo” 90 23 4 34 29 Pares com relação de parentesco 166 50 21 41 54 Pares sem relação de parentesco 19 1 3 40 Projetos de sindicato, CAA, governo 63 77 13 9 36 19 Sem informação 756 181 57 287 231 Total de citações

58


Em geral, a maioria plantas alimentares citadas nos quintais veio por meio do “comércio”, com 177 citações, dos “pares sem relação de parentesco”, com 166 citações, e pela “ação do/a próprio/a morador/a”, com 114 citações (Tabela 12). Na comunidade quilombola de Malhada Grande, a maioria das plantas alimentares citadas veio do “comércio” e de “pares sem relação de parentesco” (ambos 50 citações). Durante a segunda ida a campo, nos debates com o grupo, foi comum, entre eles, falas como: “compra [de] muda do caminhão em Mato Verde”. Além disso, também foi dito que é comum, alguns “homens” passarem vendendo mudas na comunidade: “O homem de Monte Azul já passou aqui vendendo há muito tempo. Homem de Riachinho. Zé Barão, também passou vendendo”. Porém, “o certo mesmo é Mato Verde. Barreiro Branco [comunidade vizinha à comunidade de Malhada Grande] nunca comprei não. Mercado de Catuti, não”, “Lá [Mato Verde] ganha nada não, lá tem que ter dinheiro”. Vale a pena ressaltar que dentre as 50 citaçõespara a categoria “pares sem relação de parentesco”, 33 são de moradores da mesma comunidade, 13 de outras comunidades e quatro sem informação. Estas citações registram as doações feitas pelos vizinhos: “Tem gente que dá... Tudo eu já dei... mas tem hora que tem que dar, porque o quintal é muito pequeno e tem hora que tem que tirar”. Além desses presentes, também mencionou-se doação por fazendeiros da região: “Natalício trouxe várias mangas da fazenda [Maravilha] de Hélio Pinheiro, eles plantaram a semente das frutas”. Expressões como estas evidenciam a intensa relação de trocas entre membros das comunidades e suas vizinhanças. A categoria “pares com relação de parentesco” obteve 23 citações, dentre as quais 9 citações foram de pares de outras comunidades, 6 de pares da mesma comunidade e 8 sem informação. A seguinte expressão revela que há maior frequência de trocas com aqueles que estão mais perto: “Os parentes que dão plantas são os que moram próximos, os de longe não dão plantas”. Depois foram registrados os “projetos de sindicato, CAA e governo”, lembrados com 19 citações por fornecerem mudas. Algumas pessoas da comunidade foram beneficiadas pelo projeto Terreirão (Programa Uma Terra e Duas Águas da Articulação do Semiárido Brasileiro), o CAA ajudou na implementação e execução do mesmo. “Veio umas plantas aqui mesmo. Mas eles deu essas mudas só para quem fez a caixa [projeto Terreirão]. Foi 25 mudas. Imbú, cajá, Mamão, maracujina...”. A prefeitura de Catuti (MG) também executou projetos de doação de mudas: “Eu tenho uns pé de acerola que eles me deu”, “Foi dessa campanha de saúde [da prefeitura] que teve essas mudas. Tem mais de 4 anos”, “Poucas pessoas ganharam, a seleção foi feita por sorteio”. As etnoespécies consideradas como “nativas” na percepção dos entrevistados receberam 13 citações nas quais foram mencionadas plantas que estavam no local há muito tempo: “Nativo das terra é umbu, jatobá, canjirana, genipapo”. A categoria “ação do próprio morador” obteve 9 citações, exemplificando atitudes dos moradores para manter as plantas que já estavam no quintal, que nasceram de forma espontânea e/ou pelo costume de trazer mudas de outras regiões: “Manga, pinha, eles [os meninos] chupam e 59


jogam as sementes no terreiro, quando vê as mudas já nasceram”, “Sempre traz plantas dos lugares onde vão visitar”. Os quilombolas de Malhada Grande finalizaram a discussão sobre as trocas sociais reforçando a importância das plantas nativas e das que pelo projeto Terreirão, mas também ressaltaram a relevância das trocas entre vizinhos e da compra em Mato Verde. “Mais forte é as nativa e as que veio pelo CAA, esses que ganharam deram um pulinho na frente. Depois as pessoas dividem e dão as sementes ou mudas para o vizinhos. Mas há mais tempo é a nativa, pega de um vizinho e de outro. Ou compra em Mato Verde e depois reparte para os vizinhos(...)”. Na comunidade vazanteira do Pau Preto, a categoria “pares sem relação de parentesco” destacou-se nas entrevistas com 21 citações, dentre as quais 11 foram associadas a pares da mesma comunidade e 10 a pares de outras comunidades. Como exemplo, pode-se mencionar dois depoimentos registrados: “Moço, aqui não é muito aparentado não, só vizinho e amigo mesmo a maioria” e [O pessoal é muito aparentado?] _ “é pouco, os parente é os vizinhos. Aqui não, de família é pouco, o resto tem suas famílias fora. Mas todos são unidos, tudo é amigo. O vizinho da gente é parente. Não tem problema com ninguém”. Outras categorias registradas foram: “comércio” (8 citações), “próprio morador” (7), “nativo” (6), “pares com relação de parentesco” (4, as quais 2 de pares da mesma comunidade, 1 de outra comunidade e 1 sem informação) e, por fim, “causas externas” (1) e “projetos de sindicato, CAA e governo” (1). Durante as expedições de retorno pudemos discutir em grupo o que foi registrado com os entrevistados do primeiro campo. Assim, novos elementos surgiram e outros foram melhor compreendidos. Um elemento mencionado exclusivamente nesta comunidade foi a distribuição de mudas pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER – MG) de Manga (MG), onde há um horto florestal que trabalha com produção de mudas. Porém, os vazanteiros do Pau Preto não recebem mudas de lá: “[A EMATER] não deu ainda, precisa de cadastro. Nóis já ganhamo semente de feijão”. Na reunião de devolução dos resultados parciais foi sugerido que se discutisse o que eles achavam ser mais importante na obtenção das plantas. Dessa maneira, foi possível ordenar essas origens mencionadas pela ordem de importância atribuída. No início do debate foi montada uma sequência: I) compra, II) o ato de guardar a semente e III) plantá-la. Porém, comparando cada categoria, a ordem de importância foi rediscutida e alterada. No final, as tarjetas foram organizadas na seguinte sequência pelos participantes: 1. Guarda a semente e planta; 2. Ganhou/Trocou: (a) com a vizinhança, (b) com um conhecido ou parente distante, (c) da EMATER; 3. Comprou: (a) mudas no caminhão de fora, (b) sementes na Casa dos Fazendeiros, ou (c) no sacolão; 4. Planta “nativa”; e 5. “O rio trouxe”. 60


Assim, o debate levou o grupo a dar mais importância às “ações do próprio morador” de guardar a semente e plantá-la (“A gente mesmo faz a maioria”), seguida da vinda pelos “pares sem relação de parentesco” (“Aqui agente tem o custume de falar com o vizinho, e pedir uma muda ou fruta pra prantá”). Na sequência, foram citadas a compra de mudas (“A muda agente compra no caminhão na feira, ele vem de fora”), e as plantas vindas de parentes (“Às vezes quando nóis vamo na casa de um parente, agente pega umas fruta”). Além disso, o rio também foi mencionado como via de introdução de novas espécies, influenciando a composição do quintal (“As árvores que o rio mais traz é mangue, as veiz o rio traz do vizinho. Assim é mais nas vazante, agora aqui no alto, onde o rio não vem aparece menos”). Outro ator importante que merece destaque foi um morador considerado referência no cultivo e manejo de plantas alimentícias na comunidade. Seu quintal se destacou de todos os outros, devido a alta riqueza e abundância. Muitos recorriam a ele para obtenção de plantas, pois sabiam que lá haveria as espécies que usam e conhecem: “Não tem no quintal. Tem na casa de Zé Cardoso”. Na comunidade geraizeira do Sobrado, o maior número de citações foi para a compra de mudas e sementes no comércio (81 citações), conforme expresso na seguinte fala: “Vem de fora. No mercado em Rio Pardo. Em viveiro de plantas”. Na sequência, também registrou-se a importância da ação do/a morador/a (61 citações), pares sem relação de parentesco (41 citações dentre as quais 36 foram de pares da mesma comunidade, 4 de pares de outras comunidades e 1 sem informação), com relação de parentesco (34 citações, dentre as quais 15 foram de pares de outras comunidades, 7 de pares da mesma comunidade e 12 sem informação), plantas consideradas nativas (24), causas externas (5), projetos de sindicato, CAA, governo (3) e apenas duas citações para “não lembra”. Além disso, registou-se 36 citações sem informação sobre a procedência das plantas. Na viagem de retorno, promovemos uma discussão a partir da proposta metodológica de avaliação das estratégias de obtenção de plantas em: “bola cheia” e “bola murcha”. Assim, cada categoria foi escrita numa tarjeta e o grupo classificava de maneira positiva ou negativa. Foram avaliados como bola cheia: doação e a troca de mudas (“Eu, praticamente foi ganhado [as plantas] do meu pai”), nasceu sem plantar (“Se você vê uma planta que nasceu e você deixa, ela é mais nativa, mais forte que você plantasse. As que nasce é sempre melhor”) e também foram destacadas as plantas que já tinham no quintal (“Cê planta uma planta ali, cê tem que ter mais cuidado com ela. Uma planta que nasceu ela tava mais resistente que aquela que cê plantou”. No mesmo sentido, a seleção de sementes de frutos que foram apreciados e consumidos também foi avaliada positivamente: “Porque cê planta ela sabendo o que é”, “No meu quintal só tem dois pés de coco que eu comprei, o resto foi tudo eu que plantei, fazia as muda e plantava” e “Tem coisa que colhe a semente e guarda. Mas da horta não é todo mundo que tira a semente. A semente que colhe é mais resistente”.Ainda foi registrada como bola cheia a compra de sementes: “É diferente. Hortaliça é mais importante comprar. Pé de fruta é melhor plantar a semente da fruta” e “A maioria aqui compra a semente porque na própria colheita é difícil guardar a semente”.

61


Por outro lado, a compra de mudas foi indicada como bola murcha: “Porque as que plantaram [que foram compradas] deram uns 3 anos e depois parou. As nativa permanece mais tempo” e “Quando compra a semente é melhor [bola cheia], porque você tá vendo que tá gerando uma coisa nova. A muda comprada é bola murcha. No caso dos legumes, o que mais dá é semente comprada”. Uma justificativa dada para a compra de mudas foi: “Compra a muda porque ela dá mais rápido. Mas dura menos. A muda dos quintais demora mais para produzir”. Essa diferença preferirem-na preferência por produzir e doar/receber mudas ao invés de comprá-las na cidade relembra tempos e costumes passados que encontram-se em mudança, como foi registrado na seguinte fala: “Tem muito quintal novo que é comprado. Mas outros foi da planta que chupou a fruta. Os quintal mais velho, não tem muda comprada. Hoje em dia agente compra mais que troca”. Na comunidade caatingueira do Touro, os “pares sem relação de parentesco”, amigos e vizinhos, que obtiveram maior número de citações pelos entrevistados (54 , dentre as quais 40 são pares da mesma comunidade, 10 pares de outras comunidades e 4 sem informação): “Os da comunidade mesmo ajuda mais que os de fora, né?” e “O Geraldo Gomes doou muitas mudas. Osvaldo também. Passa para as pessoas, né? Partilha...”. Vale a pena destacar o papel do Sr. Geraldo Gomes, que é considerado guardião da agrobiodiversidade de reconhecimento nacional e internacional. Em levantamento realizado na sua casa de sementes registrou-se 167 etnoespécies e etnovariedades de plantas (re)produzidas por ele todo ano. Este hábito foi herdado e aprendido com familiares e amigos da comunidade que já reuniam essas variedades e foi potencializado pela participação frequente em eventos e feiras da agrobiodiversidade. Também foram relevantes as menções sobre a atuação de projetos de sindicato, CAA e governo, com 40 citações. As entidades mais lembradas foram o CAA, o sindicato de Porteirinha, um assentamento em Rio Pardo de Minas, a feira de agrobiodiversidade, o projeto Terreirão da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) e um programa do IEF. Neste contexto, algumas falas foram registradas como exemplo: “A maioria foi mais ganhada, pelo terreirão” e “O projeto ASA, Terreirão, outras caixas d´água contribuiu muito com muitas mudas, vários tipos de plantas”. Nesse momento pedimos que nos explicassem um pouco melhor sobre esse projeto: “Constrói nas pessoas que já tem a cisterna. A primeira água é para consumo. Projeto da ASA, primeira caixa [P1MC com 16.000 litros]. Governo federal no semi-árido. Cadastro das famílias que tem mais precisão. As pessoas de mais pouca renda. Que nem fazendeiro, não tem. 500 e pouco mil já vem beneficiados por esse projeto”. A segunda caixa faz parte do projeto uma terra duas águas (P1+2) com 52.000 litros, água para horta e para os animais, é neste programa que pode-se construir um terreiro para captação da água da chuva, o que ficou conhecido popularmente como projeto Terreirão. Também atuou na comunidade um projeto da sub-bacia do rio Mosquito, sítio Novo. Por esse projeto, conduzido pela Fundação Interamericana os caatingueiros do Touro ganharam muitas mudas doadas pelo IEF de Janaúba.

62


A categoria “comércio” obteve 38 citações, sendo que a maioria dos entrevistados citou a compra de mudas e sementes na feira, na Casa do Fazendeiro ou no caminhão do município de Porteirinha: “A gente compra mais no caminhão, né? Lá em Porteirinha”. Na devolução dos resultados parciais, quando perguntados, em grupo, sobre a compra em Serranópolis de Minas, vários presentes disseram: “Nunca comprei em Serranópolis não...”, o que pode evidenciar uma maior aproximação da comunidade do Touro com o município de Porteirinha. Nesse sentido, um comentário foi esclarecedor: “em Serranópolis a gente compra, mas não é do caminhão não, a gente compra é das comunidades”, principalmente a comunidade do Genipapim (Porteirinha – MG) muito citada nas entrevistas: “De Genipapim pode ser que as mudas... o Sindicato comprou de lá e ele deu. Às vezes foi Levi, [é] que Levi trabalhava no sindicato de Porteirinha e às vezes ele trouxe de lá”. E, finalmente, a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) de Janaúba também foi lembrada por fornecer mudas ao Sindicato de Trabalhadores Rurais,que distribui na comunidade. Nas “ações do/a próprio/a morador/a”, houve 37 citações que abrangeram expressões como: “comer o fruto e jogar a semente no quintal”, “fazer a muda e plantar a semente” e “manter as plantas que já estavam no quintal”. Já na doação de “pares com relação de parentesco” foram 29 citações, dentre as quais 12 são de pares da mesma comunidade, 11 de pares de outras comunidades e 6 sem informação. Ainda aquelas plantas “sem informação” obtiveram 19 citações, para “plantas nativas” foram 8, finalizando com “causas externas” e “não lembra”, com 3 citações cada. Em síntese, as formas de obtenção de plantas evidenciadas como mais importantes diante dos relatos obtidos foram: “doação dos pares” explicada ao final como “Muito é ganhado mesmo, né?”, “Acho que o que mais contribui mesmo é os vizinhos, amigo, parente”, e os “projetos do sindicato e da ASA com o Terreirão”, que, ao que tudo indica, na época, foram ações percebidas como de muito impacto para o aumento da disponibilidade de plantas na comunidade.

6.5. Caracterização das plantas reconhecidas como alimentos emergenciais (...) Não pode entender Quem nunca matou a fome Com raiz de macaxeira E a fruta ananás (...). Ponte Cigana – Grupo Agreste Por meio da aproximação com as comunidades e pelas leituras feitas previamente ao dar início ao projeto Etnobotânica e Soberania Alimentar no Norte de Minas Gerais, notou-se que algumas plantas tinham um histórico e práticas de uso diferenciadas, geralmente conectadas a momentos de escassez e insegurança alimentar. Daí a justificativa para se discutir o tema “plantas alimentares emergenciais” com os parceiros e nesta monografia. 63


De forma geral, são plantas conhecidas que foram ou ainda são utilizadas, mas por algum motivo não são mais usuais. Nesta pesquisa, a maioria dos entrevistados (19 de 31) disse não recorrer à utilização delas, pois seu uso muitas vezes remete a um passado marcado por períodos de seca e fome, ao mesmo tempo, que traz para eles importantes reflexões para o presente e para projeções de um futuro com melhores condições de vida, de acesso e clima favoráveis. Somente 5 dos entrevistados disse recorrer caso haja necessidade e em outros 7 não foi foi possível registrar esta informação. Por esses e outros motivos, o conhecimento sobre o uso de plantas alimentares emergenciais tem um significado histórico incomensurável na memória desses grupos humanos (MELLO et al., 2011). Nesse enfoque, foram relatadas situações de extrema fragilidade nas comunidades, especialmente entre os caatingueiros do Touro, marcados por duas severas secas nas décadas de 1930 e 1940, e também entre os geraizeiros do Sobrado, que preservam relatos de uma estiagem extrema que durou três anos na década de 1890 e ficou conhecida como “noventão”, além de outra seca em 1939. Também foram mencionadas lembranças de enchentes que isolavam as comunidades geraizeiras. Já, eu já ouvi falar. Os povo mais velho que contava assim pra gente. A gente que não põe tudo na memória, né?[...] Uma cacimba que eles abriu no rio pra panhar água. Só se vendo como que era fundo! Aqui tinha uma minação que era forte, eles vinham panhar água lá do Touro aqui. A água lá não dava não. Foi brabo...! (...) É... tem um tal de Mamãozinho-do-mato que tem uma fruta assim ó, mamãozinho. E eles fala que comia raiz de imbu... palma. Palma, Jatobá, esses trem assim eles comia.. Eles falam que de primeira eles sofreu foi muito, viu? Comendo esses trem... pra panhar, caçava no mato pra comer, né? E... ai tinha que sair no mato procurando aqueles trem pra comer, aqueles fruto do mato pra comer, até aquela frutinha de quixabeira eles falam que comia de primeira.... É, de quixabeira, tudo eles comiam... raiz de mamão (caatingueira da comunidade do Touro, 69 anos; MELLO et al., 2011). 1939 teve uma fome muito braba. O rio secou e tal, e o povo escapou com esse tipo de coisa [plantas alimentares emergenciais]. A carne sobrava, fazia o molho com o palito de coco. Mucunã tem uma batatona. Era meu pai que contava pra gente dessa fome. Não como mais, né? Hoje ficou melhor, né? Hoje tá muito bom, né? Naquele tempo o povo não podia comer, não calçava, nem vestia, andava com o pé no chão. Hoje não. Hoje o povo anda mais ou menos. O conforto hoje é maior, tem mais remédio (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 67 anos). Aqui mesmo o povo passou muita dificulidade. Na seca de 39 [1939], eu estava com oito anos. Em 1890, noventão, meu avô que falava que os rio secou tudo. Só esse daqui que não. Esse Rio Pardo da cidade o povo plantou dentro do rio, onde tinha um molhadinho: maniba, batata... Em 39, um ano de seca, eu alembro que cê passava na cidade e não tinha nada, nada...nada. O povo ficava olhando um pro outro assim... Matava o gado e cozinhava a carne e botava no angu. Esse Sobrado aqui, sobrou mesmo. Noventão que teve [3 anos de seca], morreu muita gente. Gente andava, andava, andava, aguentava não e morria na estrada. Usava o jatobá direto... A mandioca foi acabando. Antes o povo trabalhava mais pouco. Fazia coisa pouquinha, né? Eu falo assim com os meninos que não pode só fiar nos estudos e no emprego, tem que ter uma rocinha, que na precisão já serve. Eu acho que não. Não. O povo não tem mais necessidade e elas acabou, né? E é muito raro de ver, né? (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 79 anos)

64


O tempo presente foi avaliado positivamente devido à maior facilidade de acesso aos alimentos por meio da compra, muitas vezes viabilizada pelo auxílio proporciado por programas socias do governo federal. Não. Não tinha outras coisas. Agora tudo é mais fácil. Hoje tudo compra, prefere outra coisa (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, 65 anos). Não. Antigamente as pessoas passavam fome. De um tempo pra cá mudou. Mudou muito... Hoje em dia ninguém tá sentindo isso mais. Governo Lula dá cartão. Antigamente não tinha aposentadoria. Gente que antigamente passava fome hoje tá todo mundo de barriga cheia. Ele falou que ia ajudar e ajudou mesmo [Governo Lula]. Esse governo ficou para a história (homem quilombola da comunidade de Malhada Grande, 60 anos). Não come mais porque não tem mais, assim, aquela necessidade, né? Porque na precisão, né? Hoje em dia, graças a Deus, não tem precisão. Nóis nem conhece. Antes não tinha Bolsa Família e nem tinha aposentado (caatingueira da comunidade do Touro, 49 anos).

Outros elementos que justificam o desuso das plantas emergenciais são as melhorias da qualidade de vida e trabalho do povo. Os moradores também associam as chuvas a este desuso, isto pode ser devido a lembrança na memória das crises passadas de seca e hoje o armazenamento das águas nas cisternas. Esses tempo aí, eu não alembro. Não cheguei a comer. Hoje não vejo ninguém comer. Comia porque tinha precisão. Aí o povo comia. Hoje às vezes não tem precisão porque aparece dinheiro pra ganhar e chove. O povo antes não tinha condições pra fazer as coisas. Hoje o povo tem máquina, tem tombador, de primeiro era tudo no braço, não achava dinheiro pra ganhar (geraizeira da comunidade do Sobrado, 77 anos).

Além destes, ocorreram modificações no ambiente como o desmatamento das áreas de florestas nativas e a perda dos conhecimentos tradicionais sobre o uso das plantas. Não, porque é difícil de achar hoje em dia, com o grande desmatamento. O Juá dá muito, mas eles não ligam para ele (homem quilombola da comunidade de Malhada Grande, 72 anos). Não. Acabou as matas, ninguém conhece o que é (homem quilombola da comunidade de Malhada Grande, 61 anos).

Tudo indica que o desuso das plantas alimentares emergenciais está relacionado às memórias de dificuldades passadas e relatos da perda do conhecimento sobre suas formas de uso e preparo para consumo. Além disso, também mencionou-se o desinteresse e o preconceito dos jovens em relação ao consumo desses alimentos. Hoje em dia a precisão acabou. Povo mais novo não quer saber delas, mesmo nunca tendo comido, só querem modernidades. Não tem mais precisão porque os governos ajudam dando comida, não precisando de caçar mais coisa pra comer no mato. Os meninos falam: ‘Esse trem vai matar a gente!’ (mulher quilombola da comunidade de Malhada Grande, 37 anos). O tempo não dá. É muito corrido, a gente deixa passa. Se comer uma coisa dessas sempre é vaiado. Os novato avacalha dos velhos (geraizeiro da comunidade do Sobrado, 68 anos). Eles [os meninos] acham que é ruim, para eles é erva braba, acha até graça, que não existe (geraizeira da comunidade do Sobrado, 62 anos).

65


Apesar da maioria dos entrevistados relatarem o desuso das plantas alimentares emergenciais, alguns disseram que podem acessá-las para consumo em caso de necessidade ou também por apreciação. O uso restrito desses alimentos também foi explicado pela dificuldade de acesso a várias dessas plantas, que ocorrem principalmente nas “chapadas” e nos “Gerais” (ambientes dos cerrados e formações em transição), além do preparo difícil e laborioso de algumas, associado ao esquecimento das receitas originais. Depende da necessidade, tem quixaba madura. Às vezes para pra comer (vazanteiro da Ilha do Pau Preto, 67 anos). Come. Depende de achar. Ah, eu achar ela, eu como na hora. Só basta fazer que o pessoal come tudo. O povo gosta. Nós passamos uma dificuldade no Rio Verde, cês nem imagina. O povo tá tudo rico (vazanteira da Ilha do Pau Preto, 58 anos). São, mas não por nós, porque não tem aqui. Quem é dos Gerais que come (vazanteiro da Ilha do Pau Preto, 53 anos). Era a precisão que mandava. Não tinha o que comer. Hoje comeria, se desse as coisas errada, faltasse... Hoje não tem mais disso... hoje tá tudo luxento, acho que não é coisa de comer... dá trabalho, além, num sabe, manda fazer e num sei. O povo não quer mais trabalho (caatingueiro da comunidade do Touro, 70 anos). Eu não comi porque não teve precisão, tinha muitas plantas do mato que eles conheciam e comiam... aqui na região não tem muito fruto do mato, só nos gerais... (caatingueiro da comunidade do Touro, 65 anos).

Alguns relataram que outra razão para o desuso dessas plantas foi o processo de substituição dos alimentos e a consequente mudança de hábitos alimentares tradicionais. Um informante disse que a possível dificuldade no preparo desses alimentos não deveria ser considerado um empecílio para sua utilização. Muitas não é, não procuramos, mas que ainda existe, existe. Foi largando de comé, apareceu outras folhas diferentes (vazanteira da Ilha do Pau Preto, 56 anos). Só tem uma planta do mato que eu vi e que come, é o mamãozinho... que meu pai que dizia. Cóie, abre ela, joga no mel de cana e ai faz o tijolo. Eu, graças a Deus, desde que nasci, nunca passei muita dificuldade. Num é difícil de fazer não, mas hoje nós num usa não. Parece que antes tinha muita planta do mato que comia... (caatingueiro da comunidade do Touro, 65 anos).

Ao todo, foram registradas 52 etnoespécies de plantas alimentares categorizadas como emergenciais, distribuídas em 48 espécies e 24 famílias botânicas (Tabela 13). As famílias mais representativas foram Fabaceae e Annonaceae, com 6 espécies citadas em cada uma, seguida de Arecaceae, com cinco espécies, Cactaceae e Myrtaceae, com quatro espécies. Do total de espécies citadas, apenas duas etnoespécies não tiveram sua identidade botânica determinada até a conclusão deste trabalho. As espécies agrupadas nesta tabela foram analisadas de acordo com a parte da planta utilizada citada pelos moradores, pois, dependendo da parte utilizada a planta alimentar pode ou não ser considerada um alimento emergencial. Um exemplo típico é o Umbu, cujo fruto é comumente consumido no semiáriado brasileiro, um alimento convencional, porém suas raízes são 66


acessadas mais raramente, geralmente em períodos de escassez, e, portanto, são consideradas alimentos emergenciais. Tabela 13. Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares emergenciais pelas comunidades pesquisadas do norte de Minas Gerais. TC = total de citações; TI = total de informantes; FR = frequência de citação; CUP = categorias de uso e preparo (: a = Alimentação Animal; b = Assados; c = Bebidas; d = Consumo in natura; e = Cozidos; f = Doces; g = Ensopados; h = Farinhas, beijús e gomas; i = Farofa; j = Frituras; l = Óleos; m = Outros; n = Saladas; o = Sem Informação; p = Temperos; q = Torrados); LC = Locais de coleta (a = Alto; b = Baixa, baixio ou várzea; c = Beira do rio; d = Caatinga; e = Capão; f = Capoeira; g = Carrasco; h = “Gerais” ou Cerrados; i = Hortas e quintais; j = Ilhas e vazante; l = Matas; m = Outros; n = Roça; o = Sem informação; p = Tabuleiro). Etnoespécie

Espécie botânica

Araçá Articum

Psidium sp. Annona crassiflora Mart. Annona sp.1 Annona sp.2 Indet 1 Garcinia gardneriana (Planch. & Triana) Zappi Musa x paradisiaca L.

Articum branco Articum cagão Assissí/Assussinha Bacupari

Banana Banana de macaco Banana do mato Berdoega Cagaiteira Cariru Chichá Cieba Coco de macaco Coco macaúba Coquinho/Coquinho do mato Fedegoso Fedegoso Feijão Crespo Feijoa Gabiroba

Annona leptopetala (R.E.Fr.) H.Rainer Annona leptopetala (R.E.Fr.) H.Rainer Portulaca oleracea L. Eugenia dysenterica DC. Amaranthus sp. Sterculia striata A. St.-Hil. & Naudin Indet 2 Syagrus coronata (Mart.) Becc. Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. Syagrus oleracea (Mart.) Becc. Senna sp. Senna sp. Phaseolus vulgaris L. Phaseolus lunatus L. Campomanesia sp.

Família botânica Myrtaceae Annonaceae

Parte Usada Fruto Fruto

TC TI

FR

CUP CL

5 1

2 1

0,065 d 0,032 d

bjl d

Annonaceae Annonaceae Indet 1 Clusiaceae

Fruto Fruto Fruto Fruto

1 1 2 2

1 1 2 1

0,032 0,032 0,065 0,032

j j c cl

Musaceae

2

1

0,032 di

i

Annonaceae

Gema apical Fruto

1

1

0,032 d

h

Annonaceae

Fruto

1

1

0,032 d

l

Portulacaceae Myrtaceae

Folha Fruto

4 3

3 3

0,097 gin 0,097 d

cn hlp

Amaranthaceae Folha Malvaceae Fruto

10 6

4 3

0,129 gin iln 0,097 dfmq fil

Indet 2 Arecaceae

Raiz Fruto

1 1

1 1

0,032 h 0,032 d

n o

Arecaceae

1

1

0,032 n

l

Arecaceae

Gema apical Fruto

4

3

0,097 df

hlm

Fabaceae Fabaceae Fabaceae Fabaceae Myrtaceae

Folha Semente Semente Semente Fruto

2 2 1 1 1

2 2 1 1 1

0,065 0,065 0,032 0,032 0,032

ilm

d d d d

g c d i d

n n g 67


Etnoespécie

Espécie botânica

Gravatá/Croatá

Bromelia balansae Mez Imbiriçu Pseudobombax sp. Inhame Dioscorea sp. Jambre Syzygium cumini (L.) Skeels Jatobá Hymenaea courbaril L. Jatobá Hymenaea courbaril L. Jenipapo Genipa americana L. Juá mirim Celtis brasiliensis (Gardner) Planch. Juazeiro Ziziphus joazeiro Mart. Língua de vaca Chaptalia nutans (L.) Pol. Macaúva Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. Mamãozinho/Mamãozinho Cochlospermum do mato vitifolium (Willd.) Spreng. Mamãozinho/Mamãozinho Jacaratia spinosa do mato (Aubl.) A. DC. Mamoeiro Carica papaya L. Mamona Ricinus communis L. Mandacaru Cereus jamacaru DC. Mandacaru Cereus jamacaru DC. Mandacaru Cereus jamacaru DC. Mandioca Manihot esculenta Crantz Mandioca Manihot esculenta Crantz Maracujá de boi Passiflora sp.1

Família botânica Bromeliaceae

Parte Usada Fruto

TC TI

FR

CUP CL

3

2

0,065 de

hl

Malvaceae Raiz Dioscoreaceae Raiz Myrtaceae Fruto

1 9 1

1 3 1

0,032 d 0,097 eh 0,032 d

g bl c

Fabaceae

Fruto

14

6

0,194 bcdfh acil

Fabaceae

Madeira

1

1

0,032 c

Rubiaceae Cannabaceae

Fruto Fruto

14 1

5 1

0,161 cdfo 0,032 d

cjl m

Rhamnaceae

Fruto

4

1

0,032 d

il

Asteraceae

Folha

2

2

0,065 gi

cl

Arecaceae

Caule

1

1

0,032 h

o

Caricaceae

Raiz

13

10

0,323 adfh

adfl

Caricaceae

Fruto

5

3

0,097 de

adl

Caricaceae Euphorbiaceae Cactaceae Cactaceae Cactaceae Euphorbiaceae

Caule Semente Fruto Casca Caule Caule

2 1 4 2 2 2

1 1 3 1 1 1

0,032 0,032 0,097 0,032 0,032 0,032

i o adi

Euphorbiaceae Folha

1

1

0,032 e

Passifloraceae

Fruto

4

1

0,032 cd

ae

4

1

0,032 cd

ae

fh d dm f g gn

n

Maracujá de veado

Passiflora vitifolia Kunth

Passifloraceae

Fruto

Mari/Marizeiro

Geoffroea spinosa Jacq. Brassica oleracea L. Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth. Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.

Fabaceae

Semente 1

1 0,032

q

b

Brassicaceae Fabaceae

Folha Caule

2 3

1 0.032 2 0,065

gi c

i glmop

Fabaceae

Semente 9

7 0,226

eh

Mostarda Mucunã/Mucunã do mato Mucunã/Mucunã do mato

68


Etnoespécie

Espécie botânica

Mucunã/Mucunã do mato

Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth. Guazuma ulmifolia Lam. Pereskia aculeata Mill. Opuntia ficus-indica (L.) Mill. Opuntia ficus-indica (L.) Mill. Brasiliopuntia sp. Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. Caryocar brasiliense Cambess. Annona sp.4 Sideroxylon obtusifolium (Humb. ex Hoem. & Schult.) T.D.Penn. Manilkara sp. Lycopersicon sp.2 Spondias tuberosa Arruda

Mutamba Ora-pro-nóbis Palma Palma Palmatória Palmeira Pequi Pinha do mato Quixabeira

Saputá Tomatinho de rolinha Umbuzeiro

Família botânica Fabaceae

Parte Usada Raiz

TC TI

FR

CUP

Malvaceae

11

6 0,194

eh

Fruto

3

3 0,097

ad

jl

Cactaceae

Folha

1

1 0,032

n

l

Cactaceae

Folha

3

2 0,065

g

ilp

Cactaceae

Fruto

1

1 0,032

g

Fruto 3 Gema 3 apical Caryocaraceae Semente 1

2 0,065 1 0,032

d d

bil l

1 0,032

d

i

Annonaceae Sapotaceae

1 3

1 0,032 2 0,065

d d

L L

3 2 16

2 0,065 1 0,032 9 0,290

d cjl cf l defh ilm

Cactaceae Arecaceae

Fruto Fruto

Sapotaceae Fruto Solanaceae Raiz Anacardiaceae Raiz

CL

Os vazanteiros e quilombolas destacaram-se pelo número de plantas alimentares emergenciais citadas, com 29 e 25 etnoespécies registradas, respectivamente. Em seguida, os geraizeiros e caatingueiros listaram 15 e 9 etnoespécies, nessa ordem. Dentre todos os informantes, apenas duas mulheres não mencionaram nenhuma planta alimentícia emergencial, sendo uma quilombola de 65 anos e uma geraizeira de 77 anos. Entre os quilombolas e vazanteiros, o destaque na riqueza de alimentos emergenciais citados pode advir de sua origem étnica de negros aquilombados nas matas do sertão norte mineiro, o que pode ter proporcionado condições para construção desses conhecimentos de utilização das plantas em distintos ambientes do semiárido norte mineiro. Já nas comunidades geraizeiras e caatingueiras pode-se apontar o processo de formação das comunidades, e identidade, bem como a garantia fundiária, portanto, uma possível segurança em manejar as próprias terras, o que evitaria a necessidade de recorrer aos alimentos emergenciais. Porém, é importante ressaltar que estas duas comunidades vivenciaram momentos históricos de seca e uso concreto das plantas alimentícias emergenciais que ainda permanecem vivos na memoria coletiva desses grupos. Dessa forma, acredito que um estudo mais detalhado nesse sentido se faz necessário para tais apontamentos. As etnoespécies de plantas alimentares emergenciais mais citadas foram: Mucunã (Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.) (23 citações, sendo 11 para a semente, 9 para a raiz e 3 para o caule), Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (16 citações para a raiz), Jatobá (Hymenaea courbaril L.) 69


(15 citações, sendo 14 para o fruto e 1 para a madeira), Jenipapo (Genipa americana L.) (14 citações para o fruto), Mamãozinho/Mamãozinho do mato (Cochlospermum vitifolium (Willd.) Spreng.) (13 citações para a raiz) e Cariru (Amaranthus sp.) (10 citações para as folhas). Em geral, a frequência de citação das etnoespécies foi extremamente baixa (Tabela 13). Analisando separadamente por comunidade: em Malhada Grande, as plantas citadas com maior frequência foram: Mucunã/Mucunã do mato (Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.) (para a semente) com 0,5 (4 informantes), Inhame (Dioscorea sp.) (para a raiz), Jenipapo (Genipa americana L.) (para o fruto) e Mamãozinho/Mamãozinho do mato (Cochlospermum vitifolium (Willd.) Spreng.) (para a raiz) com 0,38 (3 informantes), Jatobá (Hymenaea courbaril L.) (para o fruto), Mandacaru (Cereus jamacaru DC.) (para o fruto) e Palmatória (Brasiliopuntia sp.) (para o fruto) com 0,25 (2 informantes) e as 23 demais citações de alimentos emergenciais (76,67% do total) com 0.13 (apenas um informante citou); na Ilha do Pau Preto, as mais frequentes foram: Berdoega (Portulaca oleracea L.) (para as folhas), Cagaiteira (Eugenia dysenterica DC.) (para o fruto), Chichá (Sterculia striata A. St.-Hil. & Naudin) (para o fruto), Coquinho/Coquinho do mato (Syagrus oleracea (Mart.) Becc.) (para o fruto), Jatobá (Hymenaea courbaril L.) (para o fruto), Língua de vaca (Chaptalia nutans (L.) Pol.) (para as folhas), Mutamba (Guazuma ulmifolia Lam.) (para o fruto), Quixabeira (Sideroxylon obtusifolium (Humb. ex Hoem. & Schult.) T.D.Penn.) (para o fruto), Saputá (Manilkara sp.) (para o fruto) e Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (para a raiz) com 0,25 (2 informantes) e as outras 22 etnoespécies mencionadas (68,75% do total) com 0.13 (apenas um informante citou); no Sobrado, foram: Mucunã/Mucunã do mato (Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.) (para a raiz) com 0.63 (5 informantes), Cariru (Amaranthus sp.) (para as folhas) e Jatobá (Hymenaea courbaril L.) (para o fruto), as 13 demais (81,25% do total) com 0.13 (apenas um informante citou); e no Touro: Mamãozinho/Mamãozinho do mato (Cochlospermum vitifolium (Willd.) Spreng.) (para a raiz) e Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (para a raiz) com 0,86 (6 informantes), Mucunã (Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.) (para a semente) com 0,29 (2 informantes) e as 8 demais (72,73% do total) com 0,14 (apenas um informante citou). Apesar das comunidades de Malhada Grande e Ilha do Pau Preto terem citado maior número de etnoespécies vegetais consideradas alimentos emergenciais, as frequências de citação foram baixas. Tudo indica que o uso e os respectivos conhecimentos associados a estas plantas parecem estar mais difusos entre os moradores, pois cada um citou plantas diferentes dos outros. Isto também pode sinalizar a mobilidade destes grupos e pessoas, bem como seus saberes e ocorrência diferencial das plantas. Na Ilha do Pau Preto, a influência do rio São Francisco e o histórico de “encurralamento territorial” podem ser fatores importantes para distribuição difusa destes saberes. O rio por ser veículo natural para o fluxo de pessoas e vegetais, podendo trazer ou levar espécies e conhecimentos sobre as mesmas. O processo denominado “encurralamento” corresponde à expropriação do território historicamente ocupado pelos vazanteiros, excluindo-os de suas terras ou comprimindo-os em pequenas áreas (ANAYA, 2012). Na comunidade de Malhada Grande, podemos destacar a influência da migração e dispersão dos quilombolas gurutubanos ao longo de todo o vale do rio Gorutuba. Já no Sobrado e no Touro a baixa riqueza de etnoespécies foi contrastada com valores altos (>0,6) de frequência de citação de algumas plantas 70


alimentares emergenciais. Isto indica que nestas comunidades geraizeira e caatingueira há maior consenso sobre as plantas indicadas como alimentos emergenciais e provavelmente foram utilizadas em momentos históricos específicos que ainda fazem parte da memória coletiva. Analisando especificamente a percentagem de plantas emergenciais citadas em cada comunidade por apenas um informante, em todas as comunidades os valores percentuais foram maiores que 65%, demonstrando alta difusão destes saberes e fazeres, o que evidencia mais semelhanças entre as comunidades do que diferenças quanto às consequências dos processos sociais vividos em diferentes contextos históricos na mesma região. As plantas alimentícias emergenciais mencionadas com maior frequência foram: Mamãozinho/Mamãozinho do mato (Cochlospermum vitifolium (Willd.) Spreng.) (0,323 para a raiz). Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) (0,290 para a raiz) e Mucunã (Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.) (0,226 para a semente) (Tabela 13). Dependendo da etnoespécie citada havia mais de uma parte utilizada com preparo distintos, assim das 52 plantas alimentícias emergenciais, registrou-se 61 alimentos emergenciais. De 34 alimentos emergenciais foi possível analisar as informações sobre sua utilização atual, uso passado ou não-uso. Assim, dentre esse grupo, registrou-se que a maioria não é utilizada no presente e/ou foi utilizada no passado (85,29%) e que poucos ainda são utilizados na atualidade pelos entrevistados (23,53%). Além disso, foram registradas as formas de uso e preparo com as respectivas partes utilizadas e as experiências nesse preparo e consumo como possíveis efeitos colaterais, dificuldades no preparo e problemas no sabor (Quadro 3).

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Quadro 3. Principais características das plantas alimentares emergenciais citadas pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais. Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo Não.

Problemas no sabor Não. Beira de rio de vazante, assim, era fresquinho.

Araçá

Fruta e semente.

Come, chupa e pode bater no liquidificador.

Não, fazia não.

Articum/Araticum do mato/Cabeça de nego

Fruto

Come a frutinha.

Articum branco

Fruta

Descasca e come.

Não. Se come demais não se sente bem.

Não

É bom.

Articum cagão

Fruta

Descasca e come.

Não

Não

O gosto é muito forte./ É bom, tem demais.

Assisí/Assussinha

Fruta

Roe, tira a pele, tem massa. Chupa.

Não pode comer com leite, mata velho. Eu não sei não, não comi ela com leite./ Não, faz não.

Bacupari

Fruta, é que nem cajá.

Parte ele e tira os gominhos. Chupar.

Banana

Imbiga [gema Lava, ferve e comia com feijão. Farofa. apical]

Não

Não

Não

Banana de macaco

Fruta

Descasca e come.

Não faz nada.

Não

Azeda./ É gostoso demais.

Banana do mato/Bananinha

Fruta

Come

Dá pigarro na garganta.

Meio azedinho.

Ela é docinha, todo mundo gosta dela. Ela é boazinha. Meio enjoadinha. É doce.

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Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo Não

Problemas no sabor Tem um sumo verde forte demais e amargoso, por isso ferventa. / Não, é gostoso./ Tem um cheirinho ruim, ferventava e tirava o cheiro.

Berdoega

Folha

Faz farofa.Tem que ferventar [ferver]. Tipo mostarda, pega as folha e corta ela todinha e frita na gordura. Salada. Refogada.

Não

Cagaiteira

Fruto e semente.

Descasca e come./ Chupa.

Não./ Se comer muito chumba [deixa tonto].

Não

Doce

Cariru

Folha

Bem verde passa na gordura, fermenta ela primeiro e depois faz a farofa./ Salada.

Não

Não. É muito fácil.

Não. É gostoso./Tem um cheirinho ruim, ferventava e tirava o cheiro./Normal.

Chichá

Caroço [fruto]

Assa os caroço no forno e ranca a casca dele e come. Come cru, faz paçoca, pisa no pilão. Faz torrado e faz paçoca, que nem amendoim, gergelim.

Cru e muito faz o menino ficar rudo [não aprende muito]. É bestagem deles. Diz que não prende na leitura, fica sonso, professora manda fazer tarefa, não sabe fazer. Filho meu nenhum ficou não.

Não é duro não. Não. É bom. Difícil de achar, coisa rara, dá pouquinho. Mas não tem dificuldade de preparar.

Cieba

Raiz

Povo punha bastante água, depois torcer aquela massinha, fazia o beijuzinho. Tinha que lavar também, era muito margosa./Minha mãe usava cieba. A raiz é braba. De primeiro os povo rancava raiz e fazia até beiju.

Se comer muito e não souber fazer direito, que ela é muito margosa, erva [causa irritação no estômago] e morre. Dá pra sentir mal, gomita muito. Tem que beber água de sal pra melhorar, se não morre./Se não cuidar direito mata agente, chumba [deixa tonto]. Tem que saber fazer direito.

Povo relava e fazia o Ficava sem graça beijuzinho. Só pra de tanto lavar. não dizer que ficou sem comer. Era muito trabaioso pra fazer isso.

73


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no Problemas no preparo sabor A casca dele é muito Não dura.

Coco de macaco/ Licurí

Coquinho [fruto]

Quebra o coquinho, tira os grãozinhos e come.Tem que cozinhar ou deixar seco para por no pilão. Faz até farofa./ Tirar os coquinho, bota no pilão e fareia ele [jogar a farinha].

Não. Mas se comer ele muito dá disenteria porque ele é gorduroso.

Coco macaúva

Castanha, bala [semente]. Palmito [gema apical].

Palmito mole [gema apical] pra fazer farinha . Dá até um óleo da carne dele. É óleo da bala [semente]./Fazia a salada./ Gema do coco, pisava no pilão, colova farinha e rapadura./ Biscoito.

Dava não, ele é bom.

Coquinho/Coquinho do mato

Balinha e Vai quebrando com uma pedra o coquinho e Nenhum. Muito sadio, vixe! Ah baguinho, come./ Gado come./ Come massinha vermelha. se toda planta do mato fosse massa [fruto]. Eles [os meninos] diz que é gostoso é o baguinho igual o coquinho! dentro. /Paçoca, doce. Ôh moça, mas tem [que ter] tempo para fazer isso./Chupa a casquinha.

Fedegoso

Folha e semente

Corta a foia, passa na gordura e faz farofa. E no tempo da fome, nem gordura tinha, colocava sal mesmo só e tem vez que nem farinha tinha pra fazer a farofinha, comia só a foinha só, com sal só./ Salada, se passa na gordura./Faz café, pega a bage, debulha [as sementes] e põe no pilão. Torra a semente e mói no moinho./ Café misturado com milho.

Não./ Teve uma família que Não. morreu... quem lava não morre./ Perigoso adoecer, não pode tomar água gelada./ Tem, diz que pega doença. Fica estoporado. Não pode tomar banho.

Feijão Crespo

Semente

Cozido

Pesa muito o intestino.

Buscava longe. É Tem não. É difícil porque tem gostoso. muito espinho, né? Na casca tinha muito espinho, na árvore. A bala é muito dura. Mas quem tem dente bom, mastiga ele./ Não era tão difícil, né? Fácil, muito./ Sim, é duro de quebrar.

Não. É gostoso, moça!/ Doce.

Amargo, põe pouco pó e mais açúcar./ Ótimo, gostoso./É fraco, diferente do outro.

Muito duro.

74


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo Lavar bastante.

Feijoa

Semente

Farofa

Até mata. Porco mesmo mata. De noite pode comer muito não, chumba [deixa tonto].

Gabiroba

Fruto

Chupa

Gravatá/Croatá

Fruta e folha

Só descasca e come. Da folha tirava água pra remédio. Pegava cru./ Limpa, cozinha e descasca.

Comer muito corta a boca. Casca assa [causa irritação na boca], tem que tirar os pelos. Tirando a serria, não tem nada não./ Difícil de pegar, tem espinho na casaca. Só tirar a casca e pegar o fruto.

Imbiriçu

Raiz

Puxa o pezinho e a gente ranca raiz e come crua mesmo. Só quando tá novo que tira a raiz.

Não, não fazia mal não. Só não Não era difícil de Não enchia a barriga, só mesmo achar. Mas era duro pra não morrer. de rancar quando fica velho, fica mais grosso.

Problema é só achar. A madeira tem espinho. É que nem banana mesmo quando tá maduro. Era difícil de achar porque os pé dela é pouco e dá muita gente caçando./ A fruta é como banana, se comer muito corta a boca./Cru é adstringente, corta a língua.

Problemas no sabor Dependendo da terra, terra vermelha e amarela, tinha que lavar pra tirar o amargo. Diz o povo que ela é até muito boa. Não. Ela é docinha, quase igual banana mesmo, mas era mais dura um pouquinho que banana. Cru é adstringente, corta a língua.

75


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo Só descascar./ É fiapuda./ Arranca e rela.

Inhame

Raiz

Comia crua, só descascava ela, rancava a casca e Não, não sentia nada não. comia./ Descasca e come como mandioca./ Chupa./ Farinha./ Arranca, rela, espreme no pano, porque tem muita água, vira na panela para fazer beiju./ Sopa.

Jambre

Fruta

Come com a casca e tudo, em cima do pé e enchia a barriga.

Se comer muito dá uma cheiura Não ruim, né? Parece que vai inchando.

Não

Jatobá

Massa da bage, do caroço, gema [fruto], madeira e casca.

No tempo de fome, pessoal ficava pelejando pra pisar o caroço pra fazer paçoca, mas era duro demais, ficava mesmo com o caroço na boca, só pra envolver. No tempo da fome o povo achava ainda que tava mole esse trem./ Bate o pó, a massa que está dentro da fruta, põe no leite, formando a jacuba. Da madeira, tira o vinho. Se botar de molho a casca, faz vinho e remédio. Quebra as frutas e tira a semente. Faz até bolo. /Caroço pra tirar farinha, botava dentro de água pra amolecer e botava no pilão./ Quebra ele e come./ Doce./ Pra chupar a fruta, a massa. Os de chapada é melhor./ Come seco./ Biscoito./ Dá para o porco./ Suco.

Muito faz mal ao estômago, azia./ Não pode comer jatobá inteiro com semente, entope [causa intestino preso]. Não pode comer muito a massa dá ressecamento e entope também. Dá dor de barriga./ Não.

Não. É uma delícia./ Não era muito boa [a farinha do caroço], mas comia./ Ele tem de duas qualidades. O do Gerais não é ruim não. Mas o outro, o branco, da beira do rio não é bom não./ Se tomar com água não dá dor no estômago. Tem não, tem gosto ruim não.

Era só pegar e comer a massa. Era duro pisar o caroço./ Não, ótimo./ Tem que ralar, bater.

Problemas no sabor Gosto ruim, come quando tá com fome.

76


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Jenipapo

Fruta e semente.

Come a fruta./ Comer com leite. Tira a serrinha, feito uns espinhos e come. O povo faz o vinho também da semente./ Tira a serria, bate ele todinho, com semente com açúcar, põe leite e açúcar come. Vitamina bem grosso./ Bate e coloca na rapadura, genipapada. Faz suco, licor, batida e chupa./Faz vinho, bom para gastrite. Lava bem põe no tacho com água na altura e ferve. Depois moe ou põe no pano e torce, pega o líquido e espera fermentar, fica com cor escura. Para ficar pronto na hora põe puga e açúcar.

Tem que tirar a serria, senão entope. A serria tá dentro. Entupimento, a pessoa não obra [evacua]./ Tipo de exageiro se comer muito./ Se comer muito chumba [fica bêbado], fica meio besta da cabeça, né?

Juá mirim

Fruto

Chupa

Dor de barriga.

Juazeiro

Fruta

Come

Língua de vaca

Folha

Tem que ferventar pra fazer salada./ Tipo mostarda, pega as folha e corta ela todinha e frita na gordura./ Ferve, derrete com toucinho e faz a farofa.

Tem que comer pouco. Eu acredito que dá diarreia. Chumba [deixa tonto]./ Come pessoa um ou dois. Se comer muito morre, entope [causa intestino preso], empazina./ Tosse. Não

Dificuldade no preparo Não. Só tirar a serria./ Tirava ela na prensa da mandioca, não era difícil, né?

Problemas no sabor Não. É bom demais./ Ele só tem um ardor na goela da gente.

Não

Não tem gosto ruim. Só é babosa.

Não

Não./ Tem um sumo verde forte demais. Amargoso, sumo forte, por isso ferventa.

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Etnoespécie

Parte Usada

Macaúva

Miolo do pau Ralava ele e fazia a farinha. Ralava numa roda de [caule] mandioca. Farinha vermelha.

Dava não.

Mamãozinho/Mamãozin ho do mato

Raiz, batata [raiz]

O povo ralava a raiz fazia doce, farinha. Ranca a raiz, parece um pote e rela. Só rapar e relar e botar o leite, se não tiver o leite coloca água e açúcar e faz o doce./ Ralar, tirava farinha, torrava, tirava goma, dava pra fazer tanta coisa, um beiju, um biscoito frito com a goma./ Liquidificador e engrossa rapadura. /Tirava e partia. Dava pras galinhas./ Rala, lava a massa, joga no mel da cana e faz o tijolo.

Mamãozinho/Mamãozin ho do mato (Jacaratia spinosa)

Bananinha, fruta.

Tem que ferventar a fruta./ Comer./Chupar.

Mamoeiro

Miolo do tronco [caule] Caroço [semente]

Doce de tijolo e farinha.

Mamona

Forma de preparo

Pessoal ia fazer sabão, pisava a mamona no pilão e os meninos aproveitava e comia, tava tudo com fome. Tirava o óleo também, o azeite, pra curar umbigo de menino. Mastigava o carocinho.

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo É difícil porque tem muito espinho, né? Na casca tinha muito espinho.

Problemas no sabor Tem não.

Ruim para intestino./ Não sentia nada, nada. Deus que olhava né? Ce já come cismada, mas com precisão./Tinha uns que não sentia muito bem não com esses trem.

Juntava três moça numa pé de mamãozinho, cavucando. Mas a raiz era funda! Pra arrancar a raiz, dava trabalho!

Era boa, assim meio amarela, mas cê sabe a pessoa tando na precisão, vai tudo./ Acho que esses trem não tinha gosto de nada; não./ Não era bom não. Só comia por causa da fome./ Rançosa.

Não. Se deixar o leite da fruta, ele assa, queima, tem que ferventar./ Tirava a água senão dava desenteria.

Tem muita água./ A Não. fruta quando comida com a casca corta a boca./ Não.

Ela é doida pra ervar a gente também, uma desenteria, gomitadeira, é muito perigosa essa mamona, eles comeu mesmo porque tava passando fome, pra não morrer comia esse trem. Saia com desenteria porque tem muito óleo na mamona.

78


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo Passarinho não deixa, quando a gente vai olhar, passarinho já comeu./ Não.

Problemas no sabor É docinha./ Não.

Mandacaru

Fruta; casca e broto [caule].

Come a fruta./ Chupa./ Faz cocada da casca./ Usa Febre./ Com pinga e leite o broto para cozinhar. enguengrena./ Não.

Mandioca

Folha; rama, Raspa da casca de mandioca. Ia buscar longe, casca [caule]. povo roubava, comprava. Matava uma vaca, meu avô, pra trocar [pela farinha da raiz] em conta de carne./ Passa no óleo [rama]./ Feito salada [rama]./Cozinha dentro do feijão [a folha].

Não. Era difícil de achar, não chovia pra criar nada. Naquela época plantava, mas não dava.

Não./ Gostosa.

Maracujá de boi

Fruta e folha. Descasca e come a massa de dentro. Usa pra suco Não. Ele dá sono. e faz chá pra dormir da folha.

Não

Não

Maracujá de veado

Fruta

Come e suco.

Não

Não

Doce

Mari/Marizeiro Mostarda

Semente Folha

Semente do marizeiro torre [...]. Farofa e refogada.

Não

Não

Ardida, sai assim pelo nariz.

Mucunã/Mucunã do mato

Cipó, galha, pau [caule].

Os vaqueiros tomam a água dela. Corta a galha e toma a água./ Cipó era bom pra tirar água pra dor de barriga.

Batia o dia inteiro nos mato olhando onde é que tinha os cipozinho dela.

Aperto na boca, tipo banana verde.

Mucunã/Mucunã do mato

Raiz, batata.

Lavava, coava, tirava a goma, fazia mingau. Fazia mingau da goma da raiz. A goma era roxa, mingau ficava roxo. Parecia gelatina, aquele coisa [o mingau] que fica mexendo assim... Preparava ralado e apertado, tirava a farinha./ Cortava a raiz, botava no pilão, pisava e tirava a goma...goma vermelha. Lava em água para tirar a cor vermelha.

Não./ Dependendo da mandioca, podia matar.

Chumbava [deixa tonto], ficava igual cachaceiro ... dava molesa no corpo e provocava vomito./ Chumbava ou morria, a goma é veneno.

A raiz é dura. Lavar, Amargo./ Diz que lavar... era difícil, tinha gosto ruim. tirar uns cinco quilos disso era um trabalho doido. Tirar goma de pau não é fácil.

79


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Efeitos colaterais

Dificuldade no preparo Difícil de preparar, as frutas são muito pequenas para ralar./ Já tava com fome e ainda tinha que lavar me nove águas!/ Vixe menina! Era um sacrifício doido! Ficar no pilão, pobre das mulher, né?/ Torrar, pisar a semente.

Mucunã/Mucunã do mato

Caroço, semente, massa da fruta, balinha, fruto [semente].

Quebrar e lavar. Pisava e lavava em nove águas, dura. A gente contava nove águas. Fazia beiju. Torrar, pisar a semente./ Para usar ele, tem que lavar em nove águas para poder fazer beiju, farofa. Trocava a água nove vezes, durante nove dias./ Tirava o fubá pra fazer mingau. Lavar em nove águas, o fubá. Temperava feijão com esse fubá, porque era difícil de achar farinha.

Venenosa a fruta./ Intoxicação./ Forte, pode até matar gente. Margava muito, era venenosa, matava./ Não sentia nada não./ Se não lavasse fazia mal. Até matava.

Mutamba

Fruta

Descasca e come./ Chupa./ Dá fruta mais não come. Pássaro come, o Jacú.

Se comer muito dá entupimento Dura./ Não. [causa intestino preso]./ Não.

Docinha./ Meio enjoadinha.

Ora-pro-nóbis

Folha

Cortava a saladinha.

Não

Sabor bom.

Palma

Foia grande, folha nova [caule] e fruto.

Descasca as foia dela. Faz que nem abóbora./ Joga para porco e vaca. A madeira é dura./ Descasca, corta, ferve e come./ Chupa [fruta].

Não./ Não, não sei dizer, nunca Difícil de tirar o experimentei. espinho, tem que ter muito cuidado./ Diz que não é boa pra cuidar, que ela tem uns espinhozinhos, né?/ É não, o problema é que tem uma cola.

Não

Problemas no sabor Sem graça. Sem gosto de nada./ Mas era ruim viu? Eu não comia não. Comia porque não tinha jeito, né?/ Eu achava bom, eu comia, mas assim, se não tivesse a natureza e a fome apertasse, eu não comia não./ Era bom, gostoso, porque tava com fome./ Ficava com gosto de palha, porque lavava demais.

Gosto de folha. Não, ela é que nem abobrinha./ Sei que quem come, diz que é muito bom, né?/ É boa. Pra quem gosta é gostosa demais. Gosto ruim não dá não.

80


Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Palmatória

Fruta

Tem muito espinho na fruta, tira ela, pisa no chão e rela com a sandália pra tirar espinho. E descasca ela./ Limpar os espinhos, comer as sementinhas e o bagaço.

Palmeira/ Palmito de coco

Palmito Não cheguei a comer. Tira o olho de cima, tem que [gema apical] tirar a árvore.

Pequi

Castanha, coco e bala [semente].

Pinha do mato/ Amor de Fruta longe

Efeitos colaterais

Dificuldade no Problemas no preparo sabor Tirar os espinhos. Se É boazinha. não souber tirar, fica com o dedo cheinho de espinho. Diz que era muito bom.

Comer como alimento a pelezinha e pra tirar óleo da castanha. Também dá pra fazer paçoca com a castanha. Tudo dele é aproveitado, né?/ Tira a água branca e come [castanha].

Não./ Se comer demais, né? Porque ele é muito gordo.

Sim, tem que socar.

Chupava e comer.

Muito, faz mal ao estômago.

Tinha na beira de rio.

Gostoso. Sabor bom.

Quixabeira

Fruta

Comer

Não

Tem um leite que gruda, tem que tirar com o dedo. Põe em uma vasilha com água, isso ajuda.

É forte, sustenta./ Não

Saputá

Fruta

Come a fruta que tem uma massa dentro e a semente tem um líquido grudado que chupa./ Corta igual ao umbu e chupa. Corta a casca e chupa o caroço./ Descasca e rói o caroço que tem por dentro.

Não

Não

É bom, é azedo.

Tomatinho de rolinha

Raiz

Água para beber e faz doce [raiz].

Não

Não

Não tem gosto ruim.

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Etnoespécie

Parte Usada

Forma de preparo

Umbuzeiro/Imbuzeiro

Batata, casca Rancava a raiz do imbuzeiro novo e comia a raiz. da raiz e raiz Com a casca da raiz, relava e fazia um mingau [raiz]. com leite de cabra./ Umbuzada com leite e farinha./ Ralava e fazia doce./ Ralava, torcia no pano, secava e fazia farinha./ Cocada, descasca e rala./ Rala, espreme e faz beijú.

Efeitos colaterais Não, era até fresquinho, era até bom pra barriga./ Dor de barriga.

Dificuldade no preparo Escavar os pés de umbu./ Tirar a batata [raiz]./ Ah! Era... difícil rancá a raiz./ Tem não.

Problemas no sabor Aperta a língua./ Não, é gostosa.

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As partes/órgãos das plantas mais citadas como alimento emergencial foram: Fruto (destaque com 29 citações), Folha (8), Raiz e Semente (7), Caule (5), Gema apical (3), Casca e Madeira (1) (Quadro 3). As plantas mais versáteis foram: Mandacaru (Cereus jamacaru DC.) (Fruto, Casca e Caule) e Mucunã/Mucunã do mato (Dioclea grandiflora Mart. ex. Benth.) (Caule, Raiz e Semente), ambas com três partes usadas. A partir das principais formas de uso relatadas para as plantas alimentares emergenciais registradas, elaborou-se 15 categorias de preparo e consumo, a saber: Alimentação Animal; Assados; Bebidas; Consumo in natura; Cozidos; Doces; Ensopados; Farinhas, beijus e gomas; Farofa; Frituras; Óleos; Saladas; Temperos; Torrados e Outros (Tabela 13). O fruto do Jatobá (Hymenaea courbaril L.) destacou-se por sua versatilidade de preparo para o consumo alimentar, tendo sido citado em cinco categorias: Assados, Bebidas, Consumo in natura, Doces e Farinhas, beijus e gomas. Em seguida, o fruto do Chichá (Sterculia striata A. St.-Hil. & Naudin), o fruto do Jenipapo (Genipa americana L.), a raiz do Mamãozinho/Mamãozinho do mato (Cochlospermum vitifolium (Willd.) Spreng.) e a raiz do Umbuzeiro (Spondias tuberosa Arruda) foram citadas em quatro categorias distintas. O Consumo in natura foi a categoria de uso mais citada, representada por 35 etnoespécies vegetais, que fornecem principalmente frutos coletados e consumidos ocasionalmente em áreas de vegetação nativa ou áreas manejadas. Quanto aos locais de ocorrência e obtenção de plantas alimentares emergenciais, as matas foram indicadas como a principal fonte destas, representando 51,92% das citações, o que reforça a importância da preservação de remanescentes florestais como estratégia para mitigar a insegurança alimentar em contextos de escassez. As hortas e os quintais também merecem destaque como fonte de alimentos emergenciais mantidos perto das moradias, representando 25,00% das citações. Também foram citados vários ambientes de ocorrência dessas plantas, incluindo áreas manejadas e áreas de vegetação nativa em diferentes setores da paisagem (Tabela 14). Tabela 14. Riqueza e porcentagem de plantas alimentares emergenciais registradas por locais de obtenção pelas comunidades pesquisadas no norte de Minas Gerais.

Locais de obtenção Matas Hortas e quintais Beira do rio Alto Roça Ilhas e vazante Outros Gerais ou cerrados Sem informação

Riqueza de etnoespécies 27 13 8 6 6 6 5 4 4

Porcentagem de etnoespécies 51,92% 25,00% 15,38% 11,54% 11,54% 11,54% 9,62% 7,69% 7,69% 83


Locais de obtenção Baixa, baixio ou várzea Caatinga Carrasco Tabuleiro Capão Capoeira Total

Riqueza de etnoespécies 3 3 3 3 2 2 52

Porcentagem de etnoespécies 5,77% 5,77% 5,77% 5,77% 3,85% 3,85% -

Por meio da literatura e depoimentos em campo, associou-se as plantas alimentícias emergenciais às seguintes características (Quadro 3): (a) Forma de preparo específico. Essas plantas demandavam protocolos especiais para torná-las aptas para o consumo humano, algumas por serem muito duras e outras pelo longo tempo de preparo ou pela necessidade de repetição de determinados procedimentos culinários, além da presença de espinhos em espécies como a palma e o mandacaru. Tais propriedades podem ser identificadas em vários depoimentos: “Paçoca, doce. Ôh moça, mas tem [que ter] tempo para fazer isso”; “Para usar ele, tem que lavar em nove águas para poder fazer beiju, farofa. Trocava a água nove vezes, durante nove dias”; “Difícil de tirar o espinho, tem que ter muito cuidado”; “Já tava com fome e ainda tinha que lavar me nove águas!”; “Vixe menina! Era um sacrifício doido! Ficar no pilão, pobre das mulher, né?”; “A raiz é dura. Lavar, lavar... era difícil, tirar uns cinco quilos disso era um trabalho doido. Tirar goma de pau não é fácil”; Se comer muito e não souber fazer direito, que ela é muito margosa, erva [causa irritação no estômago] e morre. Dá pra sentir mal, gomita muito. Tem que beber água de sal pra melhorar, se não morre”; “Se não cuidar direito mata agente, chumba [deixa tonto]. Tem que saber fazer direito”.

(b) Difícil consumo e baixa palatabilidade. Algumas plantas foram citadas como alimentos emergenciais por possuírem gosto considerado desagradável e/ou serem pouco palatáveis, conforme expresso no seguinte relato: “Povo punha bastante água, depois torcer aquela massinha, fazia o beijuzinho. Tinha que lavar também, era muito margosa”: “Tem um sumo verde forte demais e amargoso, por isso ferventa”; “Ficava sem graça de tanto lavar”.

(c) Dificuldade de acesso e coleta. Dentre as plantas citadas, várias ocorrem em ambientes distantes dos povoamentos e muitas vezes de difícil acesso, como áreas de vegetação nativa e locais de relevo acidentado. Outros fatores que dificultam a coleta de algumas espécies estão relacionados à baixa disponibilidade desses recursos no ambiente devido a sazonalidade climática ou a ocorrência em pequenas populações . Os seguintes relatos exemplificam algumas dessas dificuldades: “Tirar os espinhos. Se não souber tirar, fica com o dedo cheinho de espinho”; “Não é duro não. Difícil de achar, coisa rara, dá pouquinho. Mas não tem dificuldade de preparar”; “Buscava longe. É difícil porque tem muito espinho, né? Na casca tinha muito espinho, na

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árvore. A bala é muito dura. Mas quem tem dente bom, mastiga ele”; “Juntava três moça numa pé de mamãozinho, cavucando. Mas a raiz era funda! Pra arrancar a raiz, dava trabalho!”; “Problema é só achar. A madeira tem espinho. É que nem banana mesmo quando tá maduro. Era difícil de achar porque os pé dela é pouco e dá muita gente caçando”.

(d) Associadas a momentos de fome e escassez. Muitos depoimentos registraram o uso de alimentos emergenciais somente em contextos críticos de escassez de água e alimentos na comunidade, como podemos perceber nos seguintes relatos: “Era boa, assim meio amarela, mas cê sabe a pessoa tando na precisão, vai tudo”; “Não era bom não. Só comia por causa da fome”; “Eu achava bom, eu comia, mas assim, se não tivesse a natureza e a fome apertasse, eu não comia não”. (e) Baixo valor nutricional. Alguns citaram não conhecer o valor nutricional desses alimentos ou acreditam que é baixo, mas o seu consumo foi justificado pelo efeito psicológico do ato de comer. “No tempo de fome, pessoal ficava pelejando pra pisar o caroço pra fazer paçoca, mas era duro demais, ficava mesmo com o caroço na boca, só pra envolver. No tempo da fome, o povo achava ainda que tava mole esse trem”. (f) Efeitos adversos. Vários depoimentos mencionaram efeitos adversos associados ao consumo e ao preparo inadequado de algumas dessas plantas. Foram recorrentes relatos de intoxicação, febre, dor de barriga e até morte dependendo da forma de uso. “Teve uma família que morreu... quem lava não morre”; “Não. Mas se comer ele muito dá disenteria porque ele é gorduroso”; “Comer muito corta a boca. Casca assa [causa irritação na boca], tem que tirar os pelos. Tirando a serria, não tem nada não”; “Não pode comer jatobá inteiro com semente, entope [causa intestino preso]. Dá dor de barriga”; “Tem que tirar a serria, senão entope. A serria tá dentro. Entupimento, a pessoa não obra [evacua]”; “Se comer muito chumba [fica bêbado], fica meio besta da cabeça, né?”; “Ela é doida pra ervar a gente também, uma desenteria, gomitadeira, é muito perigosa essa mamona, eles comeu mesmo porque tava passando fome, pra não morrer comia esse trem. Saia com desenteria porque tem muito óleo na mamona”; “Chumbava [deixa tonto], ficava igual cachaceiro ... dava molesa no corpo e provocava vomito”.

(g) Razões explicitamente culturais. Muitas vezes os entrevistados citaram nunca terem consumido tais plantas, porém sabem identificá-las e podem descrever seu processo de preparo adequado. Portanto, muitas das citações de uso são culturalmente produzidas, reproduzidas e, principalmente, reconstruídas na região. “Não pode comer com leite, mata velho. Eu não sei não, não comi ela com leite”; “Cru e muito faz o menino ficar rudo [não aprende muito]. É bestagem deles. Diz que não prende na leitura, fica sonso, professora manda fazer tarefa, não sabe fazer. Filho meu nenhum ficou não”.

Entretanto, muitos relatos contradizem essa caracterização negativa e apresentaramse favoráveis à utilização das plantas alimentícias emergenciais, ora por apreciarem, ora 85


por serem consideradas de fácil preparo, consumo e acesso: [sic] “Ela é docinha, todo mundo gosta dela. Ela é boazinha. Meio enjoadinha”; “É gostoso demais”; “Nenhum [efeito colateral]. Muito sadio, vixe! Ah se toda planta do mato fosse igual o coquinho!”. Portanto, as plantas alimentícias emergenciais representam mais que recurso nutritivo e de socorro em períodos de crise. Tudo indica que elas tem significado variado na memória ativa das comunidades. A elas estão ligadas memórias de sofrimento ou de alívio e de satisfação. A análise desses relatos e análise pode evidenciar como o paladar está vinculado a valores, memórias e lembranças em processos essencialmente culturais. A memória coletiva não significa homogeneidade, mas acordos sobre temas relevantes para os grupos humanos, pois ela comporta múltiplas interpretações e sentidos. Tais análises expressam também razões históricas, mudanças climáticas e conflitos territoriais vivenciados pelas comunidades tradicionais norte mineiras.

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6.6. Histórico, conflitos e soberania alimentar Toda a análise das plantas só foi possível em razão do contexto observado em campo e que nos ajudou a entender a cultura alimentar nas diferentes comunidades pesquisadas e a própria complexidade do termo soberania alimentar, apropriado por distintos atores e conotações. Aqui se faz necessária uma descrição mais detalhada do sertão norte mineiro e das comunidades estudadas. Costa (2006) considera o sertão norte mineiro como síntese da constituição histórico-cultural da nação brasileira, devido à ocupação por diversos povos e comunidades tradicionais de matrizes indígenas, afro-brasileiras e europeias, expressando reflexos dos diferentes processos históricos que marcam a colonização do país. Por isso, esta ideia é retomada no intuito de entender a diversidade cultural e ambiental do sertão norte mineiro. Segundo Costa (2006), esta sociobiodiversidade regional marca a constituição da sociedade norte mineira, assim, “[...] como a sociedade norte mineira vê o ambiente onde se encontra localizada é a forma como vê a si mesma, ou seja, como uma totalidade ambiental por um lado e, por outro, ela é uma sociedade integrada e uma cultura específica” e diversa (COSTA, 2006, pg. 3). Sobre a diversidade de povos, nos enriquece Brandão (2013): De acordo com o lugar onde plantavam as suas moradas e semeavam entre setembro e janeiro os grãos da vida os povos da terra e das águas criaram os nomes dos viventes dos sertões: beradeiros, barranqueiros, vazanteiros, ilheiros, veredeiros, chapadeiros, geralistas, geraizeiros, sertanejos, camponeses, lavradores, pescadores. E os unia a mesma sina de serem por toda a parte os semeadores da vida: a dos filhos, a das roças de milho, a das pequenas comunidades tradicionais que em pouca coisa tornava diferentes os xacriabás, os quilombolas e os camponeses, irmãos de sina que com diferentes gramáticas de saberes tiravam de raízes e frutos da natureza e dos grãos da roça o sustento da Vida e entre diferentes linguagens a tudo davam nomes (BRANDÃO, 2013; grifo meu).

Eram diversas etnias indígenas e agrupamentos afrodescendentes fugidos da escravidão que passaram a habitar áreas distantes e de pouco acesso, num processo de invisibilidade simbólica e social, a fim de se manterem ou constituírem como grupo. Assim, forjaram-se diversas identidades culturais associadas às territorialidades expressas pelas estratégias de ocupação e sobrevivência nos diversos contextos ambientais da região, entre cerrados, caatingas e florestas, entre vales e serras (CUNHA, 2010). Somente no início do século XVII que os primeiros bandeirantes chegaram à região. Cada bandeira era um grupo social, como um corpo de guerra a lutar contra populações indígenas e quilombolas que habitavam a região, com o objetivo de aprisionálos ou expulsá-los de suas terras. As bandeiras vinham de São Paulo, Bahia e Pernambuco. Por último, chegaram os mineiros tomando o mando político dos arraiais, depois vieram os padres belgas com intuito de “civilizar” a região e, posteriormente, os imigrantes italianos trazidos em projetos coloniais que visavam “embranquecer” a população (COSTA, 2006). 87


Mas foi no início do XX que chegaram os desenvolvimentistas. Ocorreu uma multiplicidade de projetos civilizatórios em articulação nesta região a fim de integrá-la e expandir o projeto de “desenvolvimento” em curso no Brasil. Costa (2006) destaca a inserção do semiárido mineiro na área de atuação da SUDENE por volta de 1960 como um marco histórico a partir do qual tem-se, então, incentivo governamental para a já propagada pecuária extensiva, para o plantio de monoculturas, principalmente de eucalipto e algodão, e para grandes projetos de irrigação no Gorutuba e na Jaíba. Regionalmente ocorreu o mesmo processo que já estava em curso no país, no qual tais projetos do Estado e de capital privado passaram a atuar ativamente na região. Neste contexto, intensificou-se o movimento de êxodo rural e ampliaram-se os processos de homogeneização cultural e “modernização” dos povos e comunidades tradicionais lá existentes. Assim como ocorreu no norte do Espírito Santo, o poder público tratou o sertão norte-mineiro como um espaço “vazio”, institucionalizando o processo de invisibilização e desterritorialização das comunidades indígenas e negras perante o Estado (PASINI, 2014). Cabe ressaltar que o termo “sertão” tem diversos sentidos no imaginário social brasileiro e foi historicamente representado a partir da visão das oligarquias dominates, além de trabalhos acadêmicos e ficcionais (CUNHA, 2010). No olhar do colonizador europeu, o sertão foi sempre encarado como um “deserto humano”, no sentido de ausência de civilização europeia, e também tratado como um “vazio econômico” com populações “pré-civilizadas” e vegetação entrelaçada. Nesse sentido o sertão foi idealizado como um espaço encoberto, a ser conhecido e conquistado, que direcionou o colonizador após a “ocupação” da costa litorânea brasileira, ao seu oposto; apresentando-se, pois, como uma fronteira civilizatória a ser “modernizada” (FRANÇA & SOARES, 2006). Em contraste, na obra de João Guimarães Rosa, especificamente no romance Grande Sertão: Veredas (1956), o sertão é descrito olhares partir de outra perspectiva, que procura dar visibilidade aos invisibilizados. Rosa discutiu sua existência e sua representação simbólica, histórica e política: Mas, hoje, que na beira dele, tudo dá – fazendões de fazendas, almargem de vargens de bom render, as vazantes; culturas que vão de mata em mata, madeiras de grossura, até ainda virgens dessas lá há. O gerais corre em volta. Esses gerais são sem tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães... O sertão está em toda a parte. [...]. O senhor sabe: sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado! E bala é um pedacinhozinho de metal... [...]. Em termos, gostava que morasse aqui, ou perto, era uma ajuda. Aqui não se tem convívio que instruir. Sertão. Sabe o senhor: sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar. Viver é muito perigoso... [...]. O sertão aceita todos os nomes: aqui é o Gerais, lá é o Chapadão, lá acolá é a caatinga. [...] (ROSA, 1994).

O sertão mineiro, que abrange principalmente a região norte de Minas Gerais, é marcado pela implantação de projetos atendendo sempre interesses hegemônicos e pelas consequências do processo de dominação na região que promoveu a desterritorialização dos povos e comunidades tradicionais. Por este motivos, o sertão norte mineiro também é marcado pelo histórico de resistência desses povos e comunidades. Outrora, foi 88


caracterizado como oposto ao litoral e à região mineradora do estado. O sertão, porém, abasteceu as minas através da pecuária e da agricultura praticada nos “gerais”. Contudo, foi sempre renegado pelo seu suposto atraso econômico, tecnológico e cultural. Com este discurso e o processo de “ocupação” ocorrido, o norte mineiro foi incorporado à lógica dominante de “progresso nacional”, caracterizado pelo avanço da fronteira agrícola e do capitalismo nas regiões de caatinga, cerrado e mata seca (FRANÇA & SOARES, 2006). Dessa forma, as interações dos diferentes povos e comunidades tradicionais com seus territórios e a biodiversidade local sofreram profundas mudanças devido a variadas situações (im)postas em distintos momentos históricos. Por ora, os diferentes contextos observados nas comunidades pesquisadas foram marcados pela (re)produção de suas identidades culturais e pelos movimentos de resistência e luta por seus direitos étnicos e territoriais. A seguir, será realizada uma breve contextualização da história e dos conflitos territorias, bem como suas implicações para a soberania alimentar, em cada comunidade. A comunidade quilombola de Malhada Grande (Catuti – MG) pertence ao quilombo Gututuba, cujo território abrange 27 comunidades em 7 municípios do norte de Minas. A identificação enquanto quilombo Gurutuba adveio, principalmente, de trabalhos do antropólogo Aderval Costa Filho, além da articulação com entidades na região (como ONGs, Instituições parceiras, Sindicatos de Trabalhadores Rurais, Entidades religiosas e movimento quilombola). A partir daí, a comunidade passou a se identificar como quilombola, organizaram-se e passaram a lutar em buscar de seus direitos étnicos e dos benefícios que podem ser obtidos a partir de tal reconhecimento legal. Os moradores não tem muita certeza sobre o nome da comunidade: “[...]. Eu desconfio, meu avô até falava, que aqui tem esse nome porque era um lugar que os boi maiava [descansava] tudo junto[descansava]. E era muito boi. Por isso o nome Malhada Grande”. Antigamente, o costume era criar o gado solto, cada um com a marca da família, o uso das terras era comum e as casas eram cercadas para evitar que os animais comessem as hortas (MELLO et al., 2011; UNHA PRETA, 2009). A origem do quilombo Gurutuba remonta o século XVIII, quando escravos fugidos se fixaram nos vales dos rios Verde Grande e Gorutuba. A consolidação do grupo se deu principalmente em virtude da alta incidência de malária na região, os quais eram resistentes e causava temor nas outras populações. A “maleita”, como era chamada a malária, acometia e matava os brancos no dizer deles. Porém, com a intervenção do Estado na região a partir da década de 1950, houve a desinsetização e apaziguamento da malária. Como consequência, a região começou a ser “ocupada” por outros sujeitos, os “brancos” vindos “de fora”, o que gerou diversos conflitos territoriais. Destaca-se a atuação principalmente da SUDENE através do projeto de irrigação Jaíba que excluiu os quilombolas gurutubanos como pertencentes àquelas terras, exluindo também seus saberes e práticas adaptadas à região. É importante afirmar que esta ocupação da região com objetivo de expansão da fronteira agrícola foi conduzida por meio do cercamento dos povos quilombolas e expropriação de seus territórios com respaldo e incentivo 89


governamental na época, restringindo-os a pequenas áreas sitiadas entre grandes fazendas de gado e as várzeas periodicamente alagadas (MELLO et al., 2011). [...] Quando que o governo criou aquele órgão da malária, pra combater a malária, aí combateram a malária, eles começaram encostando. Ai eles foram empurrando, empurrando, empurrando tendo aqueles brocotozinho. É, sitiada, e continua sitiada ainda, cercada. [...] O território era nosso, nós tinha território, só que há pouco tempo ele tinha sido tomado, entendeu? Pelos latifundiários, inclusive tinha um fazendeiro, que vendeu os território quase tudo, por baixo dos pano. [...]. (homem quilombola de Malhada Grande, ex-presidente da Associação de Moradores de Malhada Grande; MELLO et al., 2011).

O território que antes era caracterizado pelos gurutubanos como livre, permitindo a criação de animais soltos em áreas comuns, foi restringido a poucas áreas passíveis de uso. A região passou a ser dominada por grandes latifundiários que compraram grandes extensões de terra num processo de grilagem e implementação de fazendas, conduzido pelo governo estadual à época como política de “regularização fundiária”: Veio um povo de fora, pedindo assinatura pra gente falando que ia construir estrada. Nem conversavam direito com a gente, já vieram pedindo pra assinar, colocar o dedo, pra quem não sabia escrever. Muita gente acreditou neles. Claro, não imaginavam que eles iam fazer coisa ruim! Eles venderam nossas terras com nossas assinaturas no papel. Aí eles vinham “laçando” as terras e o povo ia ficando sem nada. Eles escolhiam a terra que era melhor. Venderam pra fazendeiros, gente com muito dinheiro e poder. Mas a gente não aceitou fácil não! Gurutubano é povo forte, bravo! A gente brigou do jeito que deu. Mas eles tinham mais arma. A gente ouvia as balas zunindo no nosso ouvido, só pra intimidar a gente. Roubaram nossas terras. Dai a gente veio pra este lado do rio. A gente sempre teve parente pra cá. Mas nossa vontade de voltar pra nossa terra sempre existiu. E vamos conseguir nossas terras de volta! (homem quilombola da comunidade de Malhada Grande, MELLO et al., 2011).

Um exemplo da luta pela retomada do território gurutubano foi a ocupação de uma fazenda em Janaúba (MG) em 2005. As oligarquias municipais foram contra o acampamento e, com aval judicial, muitos gurutubanos foram presos, incluindo uma liderança da comunidade de Malhada Grande. Tal fato está registrado no documentário “Unha Preta” realizado em 2009 pela Comissão Comunidades dos Povos Tradicionais e pelo CAA- Norte de Minas. Segundo a liderança: Até algemado eu fui, eu fui, só que tenho orgulho de ter sido algemado pra defender o que é meu, o que é dos outros, que tem deles que nem coragem de ser algemado pra defender o que é deles não tem, eles não tem. Eu tenho! (UNHA PRETA, 2009).

A comunidade continua nessa luta, acompanhando um processo junto ao INCRA para o reconhecimento do território gurutubano. Porém, as terras demarcadas estão “do outro lado do rio”, como nos disseram (MELLO et al., 2011). Isto é, Malhada Grande não encontra-se oficialmente incluída no quilombo Gurutuba por estar situada na margem direita do rio que delimita o território demarcado. Então é isso que nós queremos. A solução de Minas Gerais é território, não é migalha de cesta básica não. Nós temos muita semente crioula no Norte de Minas, no Brasil. Onde nós

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mora, nós temos Mas como que nós vamos guarda elas por século da vida, se nós não temos onde aplicar ela, nós não temo onde planta ela, se guarda o bicho vai comer ela (homem quilombola de Malhada Grande, ex-presidente da Associação de Moradores de Malhada Grande, DAYRELL et al., 2011).

Além das sementes crioulas, destacadas no depoimento acima como símbolo de resistência, em campo foi possível observar mais elementos identitários da cultura quilombola. Muitos marcam e registram a suas práticas e escolhas alimentares. Por exemplo, numa casa foi observada a presença de grandes tachos de cobre onde se produzia rapadura e noutra um pilão de arroz ainda em uso. O plantio do tradicional feijão gurutuba utilizado no preparo da farofa gurutubana. A religiosidade da comunidade marcada por festas tradicionais, como a passagem das bandeiras de santos de ano em ano pelas famílias. A prática do “batuque” e do “sapateado”, momento de encontro em que tocam os tambores, as ditas caixas, e que dançam e cantam suas histórias. Nestes momentos, as tradições culinárias também são repassadas e reconstruídas junto com vários outros traços culturais, bem como os laços comunitários. Outro momento marcante da história recente desta comunidade foi o trágico acidente ocorrido com a van da prefeitura de Catuti que transportava um grupo de quilombolas para uma apresentação cultural no Solar dos Sertões, espaço do CAA, durante as tradicionais Festas de Agosto de Montes Claros em 2011. No acidente, morreram 8 quilombolas e o motorista do veículo , e outros 11 ficaram feridos. Uma das principais lideranças do povo gorutubano faleceu, o Sr. Mariano Matos da Silva. O superintendente estadual do INCRA foi ao velório e prometeu acelerar o processo de reconhecimento e demarcação do quilombola do Gurutuba. Em 2012, quando retornamos na comunidade, muita coisa havia acontecido passado um ano após o acidente. A filha da liderança assumiu o movimento, principalmente na Associação de Mulheres Gurutubanas, onde era já pela segunda vez presidente, além de participar do conselho fiscal do CAA e do conselho de saúde de Catuti (MG). Criada em 2010, a associação busca a melhoria da comunidade através dos benefícios do governo federal e parcerias do CAA e ActionAid (ONG internacional). Segundo ela, depois do registro legal da associação, os principais desafios eram manter os papeis em dia e o engajamento das mulheres, devido também ao preconceito de muitos da comunidade ao ver as mulheres saindo de casa. A associação, além de promover cursos, tinha na época alguns projetos em construção. Ela já arrendava uma área para plantio de mandioca em mutirão, porém não era o desejável, pois não podiam plantar diversidade, nem fazer benfeitorias na área, além do risco de perder a produção. [...] a terra não é nossa em si. Porque se a terra fosse nossa mermo, nóis sabia o que fazia, porque nóis planta variedade de coisa, porque tem como plantá variedade dentro da, das mesmas terra, só que como a terra não é nossa não tem nem como nóis ficá, né, fazendo benefício dentro da terra sendo que a terra não é nossa. [-e só planta mandioca mesmo?]

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É, só mandioca. Eu pretendo um dia, ou ver se tiver um recurso da associação eu comprar pelo menos dois hectares de terra pra associação. Porque não tem como você ficar plantando em terra dos outros, né, todo ano cê plantando em terra dos outros, às vezes ocê planta, chega uma época que o dono que usar aí planta, põe gado ou põe cavalo dentro, né, e você perde o serviço que você fez. [- Já aconteceu isso com a Senhora?] Oh minha nossa senhora, nóis plantou uma vez lá num terreno aculá em baixo quando foi na época que ela pá colhé, o gado entro dentru e comeu tudo. E nóis [a associação] só ficou no prejuízo. É, então, eu fico sem saber. Eu planto no terreno dos outro, mas eu já planto de orelha em pé, né, já com medo do prejuízo. Porque num é fácil não, cê enfrentar as coisas assim e cê mexer também com gente num é fácil não. Cê tem que tê paciência, porque senão cê estora (presidente da Associação de Mulheres Gurutubanas, 44 anos, entrevista gravada 14/08/2012).

A associação havia comprado um terreno e estava construindo uma casa de beneficiamento e feitura de farinha e de conservação de sementes crioulas. O maquinário foi obtido por doação da Cáritas Brasileira, entidade de promoção e atuação social na região, em pessoa da Irmã Porcina Amônica (Irmã Mônica). Além disso, estavam tentando funcionar a padaria comunitária Mariano Matos da Silva (MMS) no distrito de Barreiro Branco (Catuti, MG) e seria implementada também uma rádio comunitária. Em relação ao conflito da terra, perguntamos se tinham alguma discussão na associação das mulheres: Das mulheres não, na associação quilombola tem. As mulheres por enquanto nóis não tamo mexendo, né, com isso não, porque nóis tamo correndo atrás dos benefício primeiro pra depois ingajar na associação quilombola [Associação do Quilombo Gurutuba] lá (presidente da Associação de Mulheres Gurutubanas, 44 anos, entrevista gravada 14/08/2012).

Passado esses anos, temos notícias que os projetos estão prosperando na comunidade, principalmente a padaria que agora passou a funcionar em Malhada Grande. No final da entrevista pedimos que ela comentasse sobre a importância de se ter uma associação na comunidade e em sua vida: [...] foi uma coisa muito boa, né, na comunidade a permanência da associação e foi uma avaliação muito, né, agradável pra comunidade, porque sem uma associação na comunidade não avança nada, porque hoje as coisas só saem pela associação e também melhorou muita coisa na vida, na minha vida, que eu era uma pessoa que eu não sabia nada, hoje eu posso dizer que apesar deu num ser formada eu sei muita coisa, né, que eu aprendi andando pelo mundo, eu já aprendi muita coisa que, já deu pelo menos assim, um aberta na minha mente, como eu sei me vivê, como eu posso vivê, né, não é igual de antigamente que eu vivia dentro de casa, não sabia nada, não sabia ir em lugar nenhum, aprendi muita coisa, importante, aprendi coisas boas e coisas ruim, porque agente sai a gente vê tudo né e também pela luta que a gente enfrenta, dá muito bem pra gente vê que as cosias não é tão fácil, igual tem muitos que pensa que agente luta pra podê vencer todas as batalhas que têm, todas as barreira, quebrar as barreiras que têm contra a gente também. Eu acho uma coisa muito importante, e, e, com a fé em Deus, durante eu tiver vida, eu quero correr atrás das coisa, dos benefício, né, pra pra comunidade, no dia que eu tiver

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podendo andá com as minhas próprias pernas eu tô aí a disposição (presidente da Associação de Mulheres Gurutubanas, 44 anos, entrevista gravada 14/08/2012).

A comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto (Matias Cardoso – MG) é localizada no encontro dos rios São Francisco e Verde Grande, seus povos se autodenominam e são denominados de vazanteiros. Eles possuem profundo conhecimento sobre o manejo da área, praticando uma agricultura itinerante de vazante sincronizada com os ciclos de inundação do São Francisco, cultivam nas terras altas e nas vazantes, caça e criação de animais, além da característica pesca realizada nas lagoas e nos rios (MELLO et al., 2011; DUQUE-BRASIL et al., 2011). A origem dos vazanteiros na região advém principalmente de escravos fugidos na época da colonização portuguesa, que se estabeleceram e se isolaram nas margens do São Francisco (MELLO et al., 2011). A comunidade historicamente usa e ocupa a região, porém a partir da década de 1940 com políticas do Estado de “modernização” e a “regularização fundiária” conduzidas pela Ruralminas, os vazanteiros foram expulsos de seus territórios e fazendeiros de gado passaram a ocupar a área. Porém, devido a grandes enchentes do rio no final da década de 1970, os fazendeiros abandonam a região e os vazanteiros retornaram às terras originalmente ocupadas (MELLO et al., 2011; DUQUE-BRASIL et al., 2011). A área que atualmente habitam é dita como prioritária para a conservação da biodiversidade em Minas Gerais (DRUMMOND et al. 2005). Nesse sentido, foi proposto um sistema de Unidades de Conservação de caráter de Proteção Integral como medida compensatória dos impactos gerados pelo Projeto de irrigação Jaíba. Em 1998, foi criado o Parque Estadual Verde Grande. Com a operacionalização dele enquanto unidade restritiva, novamente, os vazanteiros foram negligenciados nas ações do Estado, tendo sido “encurralados” em uma pequena área legalmente considerada de proteção permanente, o que compromete seu modo de vida, práticas tradicionais e sua segurança e soberania alimentar pela perca do seu território tradicional (ANAYA, 2012). Os vazanteiros historicamente desenvolveram estratégias de manejo desses ambientes que são compatíveis com suas raízes culturais e mantém a biodiversidade local, ao contrário do que ocorreu nas áreas onde foram implantados projetos de irrigação como o Jaíba ou fazendas de criação extensiva de gado. Dessa maneira, a restrição à diversidade de ambientes pode comprometer seu modo de vida e até a preservação de conhecimento ecológico tradicional (DUQUE-BRASIL et al., 2011). Em entrevista, um dos moradores destaca a primazia da agricultura familiar no caráter regional alimentar e afirma que seu modo de vida necessita conservar a biodiversidade e os recursos naturais e, por isso, conserva a região. Se não tiver nós pequeno, os grandes não veve. Que nós é que planta o milho, o feijão, é quem cria o porco, é quem cria a galinha, quem cria o bode, quem cria uma vaca de leite... que o grande que tem a boa fazenda... a produção dele é vendida pra fora, pro exterior, lá pro Rio Grande do Sul, pra São Paulo... e nós não, o nosso é tudo aqui dentro. E o grande não olha pra isso, porque nós hoje, eles acho que nós preservou aqui, é porque nós

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precisava, nós preservamos. Que é uma coisa tão clara. Que cês foram naquela área lá em cima que era do fazendeiro... ela só tá terra, né? Que o fazendeiro ele interessa fazer o pasto, a pastagem criar o bicho, o gado. Nós não, nós precisamos de tudo, precisamos da mata, precisamos de tudo. Precisa da madeira, temos as fruta (Representante da comunidade do Pau Preto; DUQUE-BRASIL et al., 2011).

Neste contexto, atualmente os vazanteiros lutam pela retomada de seu território tradicional. Em 2007, propuseram ao IEF-MG (Instituto Estadual de Florestas), que é o responsável pelo Parque Estadual Verde Grande, a mudança do categoria da unidade de conservação para uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS Pau Preto). Com a RDS, os interesses do IEF e dos vazanteiros seriam conciliados, proporcionando a conservação da área associada à sua permanência do território, bem como a (re)produção de seu modo de vida tradicional. Porém, em 2011, com o lento avanço nas negociações com o IEF-MG, os vazanteiros, em parceria com a Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Manga e o Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA-NM), pesquisadores da Unimontes e UFMG e com apoio da Comissão Nacional de Povos e comunidades Tradicionais e da Promotoria da Bacia do São Francisco, decidiram retomar as áreas de seu território pressionando as autoridades, fazendo a autodemarcação e ocupando uma antiga fazenda abandonada. As comunidades vazanteiras e quilombolas vem se articulando nesse processo de reconhecimento de seus direitos territoriais, saberes e práticas, vinculados ao Rio São Francisco e se fortalecem caracterizando o grupo “Vazanteiros em movimento”1. Na fazenda ocupada, agora denominada Acampamento Arraial do Meio, um dos nomes históricos e retomado na ocupação da antiga sede da Fazenda Catelda, uma das primeiras ações dos vazanteiros foi organizar uma horta e uma roça coletiva. Na horta planta-se açafrão, alface, alho, beterraba, cebola, cebolinha, cenoura, coentro, jiló, pimentão, quiabo, salsa e tomate. Na roça, mandioca, milho e feijão. A horta é molhada de manhã cedo e de tarde durante todos os dias da semana. Existem plantas para remédio como erva cidreira, coejinho, hortelã e vique. O jiló, além de utilizado na alimentação, serve também para quem tem problema de fígado. Porém, novamente os pecuaristas de Malhada (BA) e Matias Cardoso (MG) tentaram criar gado no território dos vazanteiros. Tal situação causou danos ambientais e destruiu a roça dos vazanteiros. Em 2012, os criadores de gado entram na justiça alegando a posse por uso da área há mais de vinte anos. Eles chegaram a conseguir uma liminar em seu favorecimento, mas a mesma foi suspensa. Os vazanteiros então se organizaram para retirar cerca de 750 cabeças de gado da área e arrumaram as cercas de suas lavouras2.

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Disponível em: http://vazanteirosemmovimento.wordpress.com. Acesso em: agosto/2014.

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Disponível em: https://vazanteirosemmovimento.wordpress.com/2012/05/24/territorio-livre-vazanteiroslibertos-3/. Acesso em agosto/2014.

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No campo de retorno, 15 dias depois deste episódio, pudemos acompanhar um pouco deste processo participando de uma nova audiência pública. Logo no início da audiência o juiz abriu a sessão para que as partes entrassem em acordo. O juiz disse não ter lido os papeis em sua mesa, na qual haviam inúmeros trabalhos elaborados por pesquisadores da Unimontes, UFMG e UFV (Relatório Técnico elaborado por nossa equipe). A proprietária da fazenda Catelda fez uma proposta inicial de acordo , desde que os “invadores” pagassem pela compra do imóvel. A proposta foi considerada irreal pelos vazanteiros devido ao valor da fazenda estimado em cerca de um milhão e 500 mil reais, que poderia ser pago em 10 vezes. Foi uma tarde cheia de discussões e no final, houve a suspenção do processo por um ano. Em reunião posterior, a comunidade avaliou negativamente o acordo de manutenção do gado na área e a utilização do curral, e positivamente a resistência dos vazanteiros e o fato do juiz e da promotoria terem ido ver de perto a situação deles, além do impasse na negociação com os fazendeiros, apesar da insistência deles. Com o término da discussão, ressaltou-se a importância da união dos vazanteiros, do trabalho e do planejamento coletivo. Dois depoimentos marcantes foram: “não negociamos direitos” (representante da CPT) e “Vocês não estão só. Não desanimei, não fiquei de cabeça baixa. Fazendeiro não quer terra, quer dinheiro. Nós pobres, não movemos o mundo, quem move é o dinheiro, o que move nós é a fé. O quilombo da Lapinha tá na mesma situação” (mulher quilombola vazanteira do Quilombo da Lapinha). Por estes depoimentos, evidenciamos a luta por direitos, a organização comunitária e social dos vazanteiros e a espiritualidade como elementos importantes para os povos tradicionais das vazantes do Rio São Francisco. Cerca de três meses depois houve um curso de Direito Territorial dos Povos e Comunidades Tradicionais no Acampamento Vazanteiro do Arraial do Meio (Matias Cardoso–MG). O curso possibilitou a articulação dos Povos e Comunidades Tradicionais pertencentes às articulações Rosalino e Vazanteiros em Movimento e uma atualização sobre o marco legal, além da partilha de saberes, fazeres e sementes. Em ocasiões como esta, os povos tradicionais podem recriar sua história, compartilhar lutas e possibilidades de novos futuros aos que virão. Do curso, destaco uma frase que o antropólogo Aderval Costa Filho disse ao discutir sobre territorialidade e políticas: “O direito vai até onde o entendimento alcança”. Assim, para muitas comunidades, o marco nesse processo de luta se inicia com a busca de entendimento, tomada de consciência crítica e protagonismo de sujeitos históricos inseridos numa realidade social. Neste processo de mobilização e luta popular, a comunidade chegou a propor o plano de ocupação e uso dos ambientes de seu terrirório. Nesse sentido, permitimo-nos, então, a pensar na urgência de uma educação popular e libertária, no e do campo, que construa e seja construída pela cultura e identidade cultural e que promova o diálogo entre os saberes, entendendo as formas de poder que os hierarquizam (CASTRO HUERTAS & BUITRAGO, 2005; FREIRE, 1987; PEREIRA et al., 2014).

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A comunidade geraizeira do Sobrado (Rio Pardo de Minas – MG) se autodenomina geraizeira por habitarem os “Gerais”, como chamam as chapadas com cerrado no alto da Serra Geral. Os geraizeiros são considerados um povo acolhedor e tímido, sendo frequentemente lembrados por outros grupos tradicionais de forma jocosa pela alcunha de “cacunda de librina” (que pode ser traduzido como “corcunda de neblina”). Esta denominação deve-se ao fato de se curvarem ao enfrentar a neblina nas estradas dos “gerais” enquanto transportavam seus produtos em carroças para vender nas feiras da região. Segundo relatos de caatingueiros, os geraizeiros chegavam na feira de Porteirinha até encolhidos com aquela “cacunda de librina”. Os caatingueiros, com quem mantinham relações mais intensas, sempre tratavam os geraizeiros como pobres e inferiores, mas não tanto quanto os negros aquilombados (DAYRELL et al., 2011). Inicialmente, a exploração econômica da região da Serra Geral norte mineira foi planejada para mineração e extração de diamantes pelos colonizadores portugueses, após a disseminação e consolidação dos currais de gado no vale do São Francisco. Com o tempo, povoados foram se estabelecendo nas proximidades dos cursos d’água entre as chapadas do Alto Rio Pardo, principalmente no entorno de fazendas que exploravam mão de obra negra na agricultura e pecuária. Os geraizeiros se constituíram a partir da mistura étnica entre “índios” nativos e negros “cativos”, que foram escravizados e depois continuaram a trabalhar nas terras dos fazendeiros como meeiros, além dos imigrantes europeus que posteriormente chegaram à região como trabalhadores rurais (MELLO et al., 2011; DUQUE-BRASIL et al., 2011). O nome Sobrado foi associado a uma área que sobrou frente às fazendas que foram se constituindo na região. Outra relaciona o nome da comunidade à existência de um casarão grande, um sobrado, onde era provavelmente o abrigo dos escravos. Segundo um dos entrevistados, o nome de cada fazenda tinha um significado (DAYRELL et al., 2011; MELLO et al., 2011). Pela localização geográfica da comunidade, diversas nascentes são encontradas, formando o córrego do Sobrado, que é afluente do rio Pardo. Duas nascentes, a do Nogueira e da Caiçara, abastecem cerca de 95 famílias nas comunidades do Sobrado e São Lucas (DUQUE-BRASIL et al., 2011). Antigamente, os moradores tinham o costume de deixar a mata nativa, porém agora elas vem sendo devastadas para plantio de eucalipto por grandes empresas no território da comunidade. Tal fato segundo alguns, afetou o abastecimento hídrico da região. Outro costume mantido pelos geraizeiros é a ida às feiras da região, que constituem a principal fonte de renda a partir da comercialização café e de mandioca e suas feituras como farinha, goma, biscoitos, entre outros produtos tradicionais. Assim como os caatingueiros, eles estão fortemente ligados ao mercado (MELLO et al., 2011). Uma percepção em relação às mudanças no cultivo das roças e produção foi:

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Aquela época a pessoa fazia uma roça e quando aquela roça tava enfraquecendo porque tinha o mato né? Mas quando aquela roça tava enfraquecendo, a pessoa partia pra outra, pra outra roça, pra terra mais nova, né? Que não usava assim, adubo, essas coisas assim de...que às vezes alimenta mais a raiz da lavoura, né? Então não tinha assim o combate de veneno, essas coisa pra combater a praga ...depois que trouxe as firma, de uns 30 anos pra cá, entrou as firma, né? A Embaúba, a Gerdau, outras firma ai né? Então foi combatendo a praga, as formiga pra fora né? Com outros veneno, ai a praga pra cá também mirrou mais né?(geraizeiro da comunidade do Sobrado, MELLO et al., 2011).

A partir da década de 1970, grande parte do município de Rio Pardo de Minas passou a ter as monoculturas de eucalipto como atividade econômica hegemônica, principalmente por meio dos incentivos fiscais do governo estadual. Em campo, dois conflitos ambientais foram relatados pela comunidade. O primeiro diz respeito sobre a compra de um terreno por um trabalhador rural. Na área, havia uma das nascentes da comunidade. O novo morador passou a criar porcos de maneira inadequada, poluindo e assoreando a nascente. Ele também desmatou a mata nativa e soltou gado na área. Os moradores da comunidade denunciaram este fato à Polícia Militar Ambiental e ao IEF-MG. Até a prefeitura do município foi acionada e tentou negociar com o proprietário a troca por outro terreno na região. Dessa maneira, o conflito foi cessado e a comunidade se organizou em torno da conservação ambiental da área: “[...] E o que nós quer fazer aí é uma área de preservação que seja pros nossos filhos, né? Não quer dizer que eu vou trabalhar lá, não. Mas eu dependo de lá pra trabalhar aqui” (geraizeiro da comunidade do Sobrado, MELLO et al., 2011). O segundo conflito ocorreu em virtude do desmatamento do cerrado nas chapadas da região, onde estão localizadas as nascentes que abastecem a comunidade. A área de propriedade do Estado foi concedida em princípio a multinacional Gerdau Açominas S/A para o plantio de monoculturas de eucalipto. Após término do contrato, ao invés da área ser recuperada e protegida de acordo com a legislação vigente na época, nova concessão foi feita a uma cooperativa do município que continuou com os monocultivos. A comunidade novamente se mobilizou, solicitando a criação de uma Unidade de Conservação na área. No início a Gerdau, ela fez um contrato com o Estado, ai o contrato venceu, ela entregou pro Estado. E aí o Estado, a cooperativa, diz que fez um contrato. Mas, pelo Sindicato, aquela área é de reserva. Nós tem mais ou menos conhecimento, a Gerdau deixou como área de reserva, né? Aí eles tão desmatando, eles tão rancando os toco e fazendo aquela grande erosão e vai causar, e nem uma bacia de contenção não tem. (...) pra segurar aquelas terra de lá que tá no rancado os toco. Pode descer tudo pras nascente. Onde as nascentes tão ali não tem nem 100 metros, das nascente. Além de tudo, tá na área de recarga, na área de APP. Não pode ser desmatada! Não pode acontecer uma coisa daquilo!(...) O que importa é que a gente tá lutando com amor, com carinho pra salvar nossa comunidade. Pra salvar nosso patrimônio, nossa água e nosso bem, nosso ouro, eu trato ali como ouro, né? E nós vamos lutando, e vamos lutar (geraizeiro da comunidade do Sobrado, MELLO et al., 2011).

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Neste contexto, a água tomou centralidade na luta territorial dos geraizeiros e na conservação ambiental. A água tem papel fundamental para o plantio e a geração de renda, como nos conta uma geraizeira de 62 anos de idade: “Quando é tempo de chuva faz horta. A água daqui é da comunidade, num dá para fazer horta. Quando faz horta vende as coisas na feira: pimentão, abóbora, maxixe, maracujá”. A água também foi ressaltada como um bem comum, que não deveria ser monopolizada e privatizada: “Ninguém é dono da água não. É só Deus. Nós somo administrador. Água é vida, não pode negar água a ninguém. Não pode estocar água” (geraizeiro, 67 anos). Durante a entrevista na casa desta mesma moradora (62 anos), ela nos disse com pesar a falta que o falecido marido fazia e lembrou-se que durante as refeições costumava separar os melhores pedaços de carne, os maiores para seu marido e o resto ficavam com ela e com as crianças. Apesar de a situação ser encarada por ela como um ato de amor ao esposo, ela nos faz pensar o quanto as mulheres e os jovens podem estar mais vulneráveis em situações de insegurança alimentar e nutricional. Woortmann e Woortmann (1997), em pesquisa etnográfica sobre o processo de trabalho em municípios de Sergipe, discutem os padrões alimentares como expressão das relações entre comida, trabalho e gênero. Segundo eles, os alimentos considerados “fortes” pelos sitiantes, como feijão com farinha e eventualmente carne, são consumidos pelos homens, inclusive quando homens e mulheres realizam o mesmo trabalho. Tais alimentos fortes cabem às mulheres somente quando há disponibilidade para a família, independente do trabalho que elas realizam. Ainda segundo a referida geraizeira, seus filhos trabalham na propriedade e, quando conseguem, em outros locais. Em seu depoimento: “Falta mais terra, tem vontade de comprar mais uma terrinha, mas é difícil. A terra é pequena. [...] Coragem de trabalhar tem de mais [os filhos]. Aí, não trabalhava de meia. Emprego, também não tem não. Os jovens vão indo embora”. O dinheiro que ela recebe vem por meio da aposentadoria e é destinado à manutenção da casa: “O meu é para sustentar a casa, despesa; o deles [dos filhos] é para eles”. Na comunidade foi registrado que muitos pais de família e jovens homens vão trabalhar em São Paulo ou na colheita do café no sul de Minas ficando meses fora de casa. Este fator muda a dinâmica das famílias e da comunidade ao longo do ano. Nesse sentido, também evidenciamos que a questão alimentar envolve as relações de gênero e de trabalho como analisado por Woortmann e Woortmann (1997). Em entrevista, outra geraizeira (66 anos) disse reservar sua renda para tornar a investir na produção de mudas: “Quando eu arrumava os dinheirinho, gastava era em sementinha, comprando no mercado em Rio Pardo”. Esta preferência ressalta o vínculo dos geraizeiros com a terra, assim como no depoimento sobre as formas de obtenção das plantas dos quintais: “Tira semente, torna a plantar. Deixa amadurecer na terra mesmo. Tem também para vender as latinhas, mas não gosto de plantar [das que vendem]. Essas coisas plantada não é bom, essas coisas aí para fora é só com veneno. Aqui não passa veneno não, aduba bem adubado” (geraizeira, 62 anos). Aqui, ressaltamos a preocupação com a produção livre de agrotóxicos e o consumo de alimentos saudáveis. 98


Outro ponto relevante da comunidade foi o interesse da mesma em registrar sua história, num processo de reconhecimento de saberes e de (re)produção. Por incentivo do sindicato de trabalhadores rurais de Rio Pardo de Minas, uma jovem mulher da comunidade (com 27 anos) pesquisou com os moradores a tradição do plantio de café nas chácaras e o histórico do lugar. Assim que chegamos no Sobrado e a conhecemos, ela se dispôs a nos acompanhar, nos indicando as casas, apresentando aos moradores e participando conosco das entrevistas. Mais recentemente, outro trabalho foi feito, agora pelo grupo de jovens da comunidade. Eles produziram em parceria com o sindicado, o CAA, a Unimontes (Universidade Estadual de Montes Claros) entre outros atores uma cartilha registrando a culinária e os saberes tradicionais da comunidade geraizeira do Sobrado. A comunidade caatingueira do Touro (Serranópolis de Minas – MG) tem identidade contrastada com a dos geraizeiros, estão vinculados à caatinga e são descendentes de negros alforriados que habitavam o vale do rio Verde Grande, além disso os migrantes italianos que a partir do século XIX se estabelecem no sopé da Serra Geral são reconhecidos pelos geraizeiros como caatingueiros (COSTA, 2006). Por meio dos relatos, a comunidade possui este nome devido a existência de um boi que chamava Touro, era muito bravo e vivia solto na “malhada”. Contaram-nos que havia uma grande fazenda na região com trabalho escravo. Com o tempo, outros fazendeiros se estabeleceram na região e mais pessoas chegaram, influenciando a formação da comunidade. Muitos moradores trabalharam nestas fazendas e com o tempo adquiriram terras e começaram a construir casebres pau-a-pique (MELLO et al., 2011). Os caatingueiros podem ser considerados agricultores familiares fortemente ligados ao mercado. Antigamente, o transporte dos alimentos produzidos para serem vendidos nas feiras era feito por carros de boi. Numa conversa sobre este assunto, um caatingueiro nos disse como eram feitos os carros de boi, sobre seu cantar e alguns costumes antigos de comércio: [...] o cabeçaio é de Pau d’arco. Lateral do cabeçalho, Achedas, é de Carne de Vaca ou Canafista. Eixo de Pau Preto, canta mais bonito. Depende da madeira faz um som diferente. Mesa é de Carne de vaca ou canafista. Cantadeirinha fazia os cocão, peça para firmar acheda com o eixo, para mesa rodar e não sair. Eu quando era pequeno, até 15 anos, depois acabou o carro de boi. Foi chegando outro transporte. Acabou. A geração daqui foi tudo carro de boi ou cavalo carqueiro. Um primo meu fazia. Canga punha nos pescoço do boi para encaixar no cabeçalho, lá em casa tinha. Um primo meu tem um velho, mas não roda mais não. Amansa eles [os bois], eles acostuma, trabalha de guia solto. No início não acostuma, toma chifrada. Meu pai amansava e ficava velho os boi e vendia. Tropeiro para Montes Claros saia tocando os porco, [durava] dois meses, ia matando[os porcos para se alimentarem]. Janaúba levava feijão, mamona, os produto, igual galinha, a feira era lá. Uns dois dias demorava. Cortava por dentro. Agora, só ficou na lembrança (caatingueiro da comunidade do Touro, 52 anos).

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Os caatingueiros incorporaram aos seus sistemas diversificados de produção de carne e alimentos básicos, o cultivo do algodão e posteriormente de mamona. O algodão se destacou como cultura mais exportada na região por volta de 1925. Já na década de 70, com a Revolução Verde, visando o aumento na produtividade e à maximização do lucro houve a introdução de variedades modernas e insumos agroindustriais na região. Os caatingueiros se aliaram aos programas estatais coordenados pela Emater e a monocultura algodoeira começou a substituir seus sistemas de produção de alimentos e fibras relacionadas à criação de gado bovino (COSTA, 2006). Esta introdução levou à substituição ou perda de diversas variedades tradicionalmente utilizadas na região. Com a queda da produção algodoeira, principalmente pela chegada do bicudo, que se alastrou nas monoculturas, muitos caatingueiros se viram forçados a migrar, o que gerou um fluxo de pessoas e vínculos comerciais dos produtos norte mineiros com o interior de São Paulo. Somente os que mantiveram seu sistema tradicional diverso, encontraram alternativas produtivas e resistiram na região (COSTA, 2006). A partir dos anos 80, como forma de resistência, iniciou-se um movimento social que, dentre outras reivindicações, buscava recuperar as antigas variedades e, assim, conservar a agrobiodiversidade e promover a soberania alimentar de grupos tradicionais do norte mineiro. Uma referência na comunidade foi o agricultor Geraldo Gomes, reconhecido como guardião da agrobiodiversidade e da cultura popular da região. Ele nos recebeu em sua casa e contou que grande parte do que aprendeu foi com o tio, Sr. Adão, também residente no Touro. Ambos foram muitas vezes citados como fonte para obtenção de mudas e sementes pelos moradores da comunidade. Segundo Sr. Geraldo, “[...] cuido de nosso alimento, para pessoas conhecer, o que tem e o que já se perdeu. Tem pessoas que tem muita saudade e vontade de adquirir novas sementes”. Em sua casa de sementes, na época foi possível identificar 167 etno-variedades de plantas cultivadas. Sr. Geraldo planta variedades também para adubar o solo, além disso, para ele não basta ter as sementes é preciso plantar sempre consorciado, diversas espécies na mesma roça: “[...] antigamente [no tempo da SUDENE] não podia plantar nada consorciado, junto. O algodão, que houve grande incentivo para plantar, o banco não financiava a roça consorciada de meu pai. Mas quando o bicudo arrasou o algodão na região, eu possuía as variedades que eram menos atacadas”. Segundo ele: “Cada uma [variedade] tem o seu valor”. Hoje se alastra na região o monocultivo do sorgo, alerta Sr. Geraldo Gomes. Neste caso, a expansão do monocultivo foi, e ainda é um dos motivos da perda da agrobiodiversidade tão importante para garantir a soberania alimentar aos grupos tradicionais. Ao discutir as mudanças que ocorreram na comunidade durante o tempo da pesquisa, os moradores ressaltaram o deslocamento recorrente, e por vezes sazonal, de pessoas para o trabalho em plantações de café no sul de Minas Gerais: -O povo daqui muito migrou. Para colheira de café, né. -Hoje até as mulheres vão, leva os filhos. É um fracasso doido da aula de alunos -Esse ano a safra foi pouca, fraca. -Quem plantou nas primeiras chuva deu, quem não, não.

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Neste momento os caatingueiros destacaram também os projetos e as políticas públicas que chegaram à comunidade: -Projeto da caixa d’água do terreirão, ASA, veio cinco. Quatro barraginha também. Tem outro projeto da CODEVASP. -É muito importante, região seca, né. A caixa do terreirão... Bebe água da biqueira, se não caminhão pipa. A seca é muito cumprida fica esperando a chuva... É outra coisa molhar com água de chuva e sal. A [água] de sal [a planta] fica cinzenta. Não produz. -Cupim estraga a raiz, morre um bucado de coisa. -Forges [Comunidade próxima], Juarez é o presidente, é do município de Riacho. É pior, mais isolado, prefeitura não dá apoio. Terra de cerrado é diferente. Agora num sei com esse trem de mineradora. É ouro, tem ferro na divisão com Rio Pardo, um magnésio. Teve uma época que foi explorado pela Vale, fez um devasti. O povo protestou par ver se barrava, mas não conseguiu não. Mineroduto sai com Ilhéus, o povo protestou lá. Riacho as reflorestadoras fez um arraso. Chegava as mineradoras acaba de acabar com tudo. -Diretoria do Sindicato de Porteirinha, [é] só para reinvindicação de direito, benefício, previdência. O povo não participa. - Só filia na hora que precisa.

A partir destes depoimentos, mais elementos podem ser configurados no contexto desta comunidade e dos riscos à sua segurança e soberania alimentar. Destacou-se, além da falta de água e do desequilíbrio ecológico, a intensiva mineração na proximidade da comunidade, a construção de um mineroduto para escoamento do minério, a monocultura de eucalipto e a baixa participação política. Também foi destacado o baixo interesse da comunidade em relação ao trabalho que o Sr. Geraldo faz, segundo ele: “[...] O povo daqui não conhece, o pessoal parece que não tem curiosidade de conhecê. Já fomo no Brasil levar e mostrar. Mais recente tamo levando para França pro pessoal tá lá conhecendo”. Segundo uma caatingueira que trabalha na escola da comunidade: “Os professores tá sempre trabalhando sobre agricultura. O que é semente, banco de semente. Somos muito acomodado. Não damos valor, tomar providência de conhecê. Eu mesmo não conheço, é falta de interesse, da gente mesmo. Espero que nós um dia demos valor a nossa comunidade, município. Este trabalho é importante [Projeto Etnobotânica e soberania alimentar], conhecer vocês, o trabalho de vocês. Agora mesmo tô com um bucado de muda. Vocês vão ver a diferença”. Em conversa recente com Sr. Geraldo Gomes, houve uma visita dos estudantes da escola municipal em sua casa e banco de sementes o que demosntra avanços nesse sentido. Ainda no grupo, conversamos sobre as comidas e festas da comunidade, os caatingueiros do Touro presentes disseram:

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-Feijão é a base da comida. Feijão e arroz começa o prato. Feijão de arranca mais gosta de comer. -Biscoito de abóbora, mandioca. Rosca, batatinha. Bolo de cenoura, mandioca e beterraba. -Festa de Sant’ana e Rosa Mística. Antes tinha muito São João, Santa Luzia, festa. Faz bandeira. Caldo de mandioca, chá de amendoim, canjica, assado. Toda casa faz fogueira, biscoito, churrasco. Canta reza, tem tradição. Folia de Reis, liturgia de missa e forró. Grupo de Três.

A comunidade era muito devota a alguns santos católicos, porém este costume no olhar dos mais velhos está diminuindo: Tinha...acabou... Foi morrendo, as pessoas mais velha foi morrendo, né? Ai os que é novo muda não pega aquela devoção, não pega não... Ai vai deixando e fica né? (...) E parece... sei não, a juventude de hoje assim parace que não quer festejar. Vai numa missa e não quer assistir aquela missa direito. Vai numa reza e não quer assistir aquela reza direito, né? (caatingueira da comunidade do Touro, MELLO et al., 2011).

As práticas e saberes alimentares muitas vezes estão associados às festas tradicionais e se modificam à medida que a comunidade muda seus vínculos e a juventude se apropria ou não das tradições, podendo até mesmo (re)criá-las. A partir da vivência em campo e do exposto acima, retomo a discussão sobre soberania alimentar e pretendo por fim fazer uma teia de interrelações dos elementos discutidos. Primeiramente é importante salientar que a comida vai muito além do que se entende como o necessário para as funções vitais do organismo, isto é, o alimento. A comida é um termo que incorpora identidade cultural ao alimento e pode ser reivindicada para sua afirmação étnica (FRIEIRO, 1996; MELLO et al., 2011; MENASCHE et al., 2008). Além disso, é diferenciada de acordo com os sujeitos sociais, suas representações e processos incorporados no grupo. A seguir, dois depoimentos nos ajudam a refletir sobre o assunto: “A gente planta, mas não dá. As chuva tá muito faiando. Tem o tempo certo dos mantimento” (caatingueira do Touro); e Eles devem gastar mais. Por exemplo, nós não vamos depender de água pra tá molhando, né? E eles lá precisa de água, tem que ter coisa pra tocar a lavoura, né? Lá eles planta uma coisa só, né? E nóis aqui planta de tudo. (...)Aqueles povo lá come mais é carne, essas coisa mais civilizada e aqui não. Nós não, nós é vazanteiro mesmo, quando não é o peixe é o frango (vazanteira da Ilha do Pau Preto falando sobre as diferenças da sua comunidade com as demais, no caso sobre os lugares de grandes plantações, MELLO et al., 2011).

Por meio deles, podemos observar tanto a significação temporal quanto identitária da comida. No livro “Sementes: Patrimônio do povo a serviço da humanidade”, organizado por Carvalho (2003), discute-se como os padrões de consumo em massa tem modificado hábitos alimentares da maioria da população, que passou a adotar uma dieta dependente da indústria de alimentos. Além disso, a utilização de sementes híbridas e transgênicas, a incorporação ideológica moderna e o consumo de alimentos industrializados no meio rural 102


desestabilizou a base social e familiar em comunidades camponesas, quilombolas e indígenas. Este processo engendra a perda da identidade social e étnica, contribuindo para exclusão social dessas populações. Nesse contexto, não cabe um padrão alimentar homogeneizante que oferece os mesmos produtos com baixíssimas variedades, que controla também o volume, a periodicidade e a qualidade alimentar a todos os povos do Planeta Terra através do oligopólio privado das sementes e da determinação e controle da oferta de matéria-prima para a agroindústria e de produtos para o abastecimento alimentar (CARVALHO, 2003). Da mesma forma, ao estruturar uma gama de programas e políticas públicas, para além de se focar prioritariamente no “poder de compra” para acesso aos alimentos, não pode ser deixado de se levar em consideração a origem e a identidade étnica dos sujeitos sociais e, sobretudo, de se colocar em questão os interesses que regem os mercados globais de alimentos. As análises que levam em consideração apenas dados da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), que pretende mensurar, por domicílios, a percepção das famílias quanto ao acesso a alimentos por meio exclusivamente da compra, podem ser extremamente frágeis se não levarem em consideração outros elementos necessários à caracterização das condições de (In)SAN e da Soberania Alimentar. Cabe dizer que o EBIA visa também identificar os grupos populacionais mais vulneráveis a violação do DHAA e apontar as desigualdades sociais, étnico-raciais e de gênero associadas. No contexto rural, o histórico do grupo específico, questões territoriais, ambientais, agrárias e culturais vividas, quando desconsiderados, podem gerar conclusões não muito acertadas diante das medidas a serem tomadas. Por isso, como indicado na Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar (PNAD) de 2013, o EBIA deve ser parte de um conjunto de instrumentos de coleta de dados que visam entender os fatores que afetam a segurança alimentar das famílias. Segundo Pasini (2014), os dados do IBGE (2009) advindos do PNAD 2009 revelam a necessidade de maior atenção para com as especificidades do contexto rural, pois as maiores percentagens de casos de insegurança alimentar advém da zona rural em comparação da zona urbana, e, principalmente, mulheres negras. Por isso, destacamos a importância de se entender e discutir as desigualdades sociais e as opressões neste contexto, de forma que possam reverberar em ações públicas concretas, como, por exemplo, a necessidade no campo brasileiro de uma reforma agrária e da agilização do reconhecimento da distinção étnica de certos grupos sociais. No Brasil, mesmo diante do avanço nas diretrizes do CONSEA, essas diretrizes vêm carregadas de desafios: “(...) inerentes ao próprio sistema capitalista, onde a diferença de riqueza, inevitável nesse sistema, gera as desigualdades no acesso ao alimento. Sendo assim, o Estado, através das políticas públicas, garante esse acesso aos grupos ditos mais ‘vulneráveis’, sem garantir, por outro lado, a autonomia desse acesso a esta parcela da população” (PASINI, 2014, pg 139). No mesmo sentido, Cano Contreras (2014) destaca os desafios das comunidades autônomas no México. 103


Diante deste debate, como esforço de síntese deste trabalho apresenta-se uma proposta de Mapa Conceitual com vistas em orientar trabalhos sobre (In)Seguranaça Alimentar e Nutricional e Soberania Alimentar com comunidades e povos tradicionais, agricultores familiares, assentados e/ou reassentados. Isso porque as análises aqui realizadas a partir da agrobiodiversidade e do histórico das lutas sociais permitiram e motivaram a constitução desta proposição que pretende identificar aspectos indispensáveis para o entendimento das condições de possibilidade da segurança e da soberania alimentar. No estudo das plantas alimentares, com esse foco teleológico da segurança e da soberania alimentar permitiu abordá-las como elementos constitutivos fundamentais de práticas sócio-culturais, sustentáveis e autônomas. Como se pode ver, ao longo do tempo, essas práticas foram mantidas mas também recriadas e aprimoradas, em contextos de conflitos agrários mas em razão da manutenção de uma boa saúde e qualidade de vida, num movimento constante de busca de equilíbrio nas interações ecológicas entre homens/mulheres e animais, terra/solo/ambientes e plantas.

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MAPA COGNITIVO

Grรกfico 2: Mapa Cognitivo para anรกlise da Seguranรงa e Soberania Alimentar (elaborado pela autora). 105


7. CONSIDERAÇÕES Diante do exposto e até o presente momento, podemos considerar que o alimento é condição sine qua non para a sobrevivência dos grupos humanos. Assim, enquanto mercadoria, o alimento é patronizado (variedades, produção) e segue as regras do mercado, não se importando o que se produz, como, quem produz e, muito menos, quem consome ou quem necessita comer. Nesse sentido, partindo da premissa que os alimentos e a alimentação são carregados de valores, entendemos que a soberania alimentar deve ser entendida como um princípio fundamental para qualquer grupo humano, e principalmente, para os grupos historicamente marginalizados. Os quintais e hortas foram comumente encontrados nas moradias do povo que vive no sertão norte mineiro, constituindo-se espaços importantes na produção de alimentos para consumo familiar. Neles, a agrobiobiversidade é (re)construída e apresentaram múltiplos usos. Para as comunidades, esses espaços representam a materialização das identidades e das lutas, sendo, assim, indispensáveis em suas vidas. No mesmo sentido, pode-se dizer que os conhecimentos sobre a diversidade e o uso de plantas alimentares consideradas emergenciais possuem enorme potencial para a autonomia alimentar dos povos, especialmente por sua importância histórica e seu valor adaptativo. Entretanto, podemos afirmar que há necessidade de maior discussão sobre a especificidade das dimensões da segurança e soberania alimentar em comunidades e povos tradicionais do campo. Para tanto, faz-se evidente, também, a necessidade um diálogo constante da própria academia com os trabalhos e políticas públicas que vem sendo feitos nesta temática. Para isso, de forma singela propomos que tais ações poderiam orientar as problemáticas de pesquisa considerando itens postos no mapa cognitivo que apresenta as condições de possibilidades e as necessiadades que envolvem a análise da Segurança e Soberania Alimentar no contexto rural, e principalmente entre comunidades e povos tradicionais, agricultores familiares, assentados e reassentados. Espera-se que esse mapa sirva como referência para compreensão da dinâmica socioambiental e cultural local, entendendo-o como um sistema a alterações e novas configurações adequadas aos contextos locais. Carece dizer que este trabalho foi construído por um grupo de pesquisadores e estudantes em contato com as comunidades parceiras e, por isso, configurou-se como uma busca de múltiplas estratégias de diálogo e interação social. Dessa forma, nas comunidades do Sobrado e Pau Preto, em razão dos conflitos territoriais já estabelecidos antes mesmo da realização desta pesquisa, duas demandas ficaram evidentes e puderam ser concretizadas com a produção de relatórios técnicos sobre seus saberes e suas práticas nos territórios. Esses relatórios serviram de instrumento para fortalecer suas lutas. No mesmo sentido, também foi possível elaborar um catálogo com os saberes e fotos das 177 sementes da Casa de Semente do “guardião das sementes criuolas”, Sr. Geraldo Gomes, da comunidade do Touro. Além do mais, cartilhas estão em produção final para devolução às comunidades com expectativa na popularização dos conhecimentos sistematizados. 106


8. AGRADECIMENTOS Agradeço aos e às parceiras de cada comunidade, que nos receberam em suas casas e compartilharam suas vidas carregadas de ensinamentos. Agradeço a parceria do Centro de Agricultura Alternativa - Norte de Minas (CAANM), das associações comunitárias das comunidades de Malhada Grande (em especial a Associação de Mulheres Gurutubanas), Pau Preto, Touro e Sobrado, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio Pardo de Minas (STR), e da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em nome de Zilah Mattos. Em especial dedico aos gurutubanos falecidos, em nome do Sr. Mariano Matos da Silva (in memoriam) e do Sr. Porfírio Antunes Barbosa (in memoriam). Não existe partida para aqueles que permanecerão eternamente em nossos corações.

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10. ANEXOS ANEXO 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PROJETO: Etnobotânica e soberania alimentar no norte de Minas Gerais: resgate de plantas alimentícias tradicionais entre geraizeiros, caatingueiros, vazanteiros e quilombolas EQUIPE: Prof. Carlos Ernesto G. R. Schaefer - Departamento de Solos/UFV (Coordenador) Profª. France Maria Gontijo Coelho - Departamento de Extensão Rural/UFV MSc. Reinaldo Duque-Brasil - Departamento de Biologia Vegetal/UFV MSc. Gustavo Taboada Soldati - Laboratório de Etnobotânica Aplicada/UFRPE Neste documento, eu autorizo à equipe do Projeto ETNOBOTÂNICA E SOBERANIA ALIMENTAR NO NORTE DE MINAS GERAIS, coordenado pelo Prof. Carlos Ernesto G. R. Schaefer, a realizar uma pesquisa, com minha participação como parceiro (a). De acordo com os pesquisadores, o trabalho será feito de maneira que eu possa fornecer, de forma livre, espontânea e sem qualquer tipo de pressão, informações sobre as plantas, desde o cultivo até suas formas de uso na alimentação. Para tanto realizarão entrevistas comigo e poderei acompanhar coleta de plantas e sugerir outras pessoas para serem entrevistadas. Esse trabalho é importante para mim e para minha comunidade porque pretende registrar o rico conhecimento que temos sobre as plantas utilizadas em nossa alimentação. Os pesquisadores se comprometem a trazer de volta, para mim e para minha comunidade, os resultados da pesquisa organizados em documentos, filmagens ou cartilhas para que eles não se percam ao longo do tempo. O objetivo primeiro deste trabalho é a valorização e registro de nossas tradições com plantas alimentares, o que não traz nenhum tipo de risco ou perigo para mim ou minha comunidade. Assim, os resultados da pesquisa não podem ser utilizados como objeto de lucro econômico de outra pessoa, sem a nossa autorização e sem a nossa participação nos benefícios econômicos que, por ventura, possam vir desta pesquisa. ________________________________________________ Assinatura do (a) informante ________________________________________________ Assinaturas do (a) entrevistador (a) ________________________________________________ Assinatura do Coordenador do Projeto Local: ______________________________________

Data:

/

/

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ANEXO 2 – Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares nos quintais e hortas por cada comunidade pesquisada

Tabela 15. Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares nos quintais e hortas pelos quilombolas de Malhada Grande, Mato Verde, Minas Gerais. TC = total de citações; TI = total de informantes; FR = frequência de citação; CUP = categorias de uso e preparo (: a = Alimentação Animal; b = Assados; c = Bebidas; d = Consumo in natura; e = Cozidos; f = Doces; g = Ensopados; h = Farinhas, beijús e gomas; i = Farofa; j = Frituras; l = Óleos; m = Outros; n = Saladas; o = Sem Informação; p = Temperos; q = Torrados). Etnoespécie Abacate Abóbora Abobrinha Acerola Alface Amendoim Amora Arroz Articum Banana Batata doce Beterraba Cajá Caju Cana Cebola Cebolinha Cenoura Chichá Ciriguela

Espécie botânica Persea americana Mill. Cucurbita sp.1 Cucurbita pepo L. Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC. Lactuca sativa L. Arachis hypogaea L. Morus nigra L. Oryza sativa L. Annona crassiflora Mart. Musa x paradisiaca L. Ipomoea batatas (L.) Lam. Beta vulgaris L. Spondias mombin L. Anacardium occidentale L. Saccharum officinarum L. Allium cepa L. Allium fistulosum L. Daucus carota L. Sterculia striata A. St.-Hil. & Naudin Spondias purpurea L.

Família botânica Lauraceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Malpighiaceae Asteraceae Fabaceae Moraceae Poaceae Annonaceae Musaceae Convolvulaceae Chenopodiaceae Anacardiaceae Anacardiaceae Poaceae Alliaceae Alliaceae Apiaceae Malvaceae Anacardiaceae

TC 11 4 2 10 3 3 4 2 1 9 6 1 1 7 2 5 5 3 2 7

TI 4 3 2 6 3 1 3 1 1 4 5 1 1 3 1 3 5 3 1 4

FR 0,5 0,375 0,25 0,75 0,375 0,125 0,375 0,125 0,125 0,5 0,625 0,125 0,125 0,375 0,125 0,375 0,625 0,375 0,125 0,5

CUP cdf g g cdf n fq cd e d cdf be e d cdl df p p g fq cd 115


Etnoespécie Coco Coentro Coquinho azedo Corante/Urucum Couve Fedegoso Feijão andu Gergilim Goiaba Graviola Jabuticaba Jaca Laranja Laranja da terra Limão/Limão Tahiti Limãozinho Mamoeiro Mandacaru Mandioca Manga Maracujá Maracujina Maxixe Melancia Melão Milho Moringa Palmatória

Espécie botânica Cocos nucifera L. Coriandrum sativum L. Butia capitata (Mart.) Becc. Bixa orellana L. Brassica oleracea L. Senna sp. Cajanus cajan (L.) Huth Sesamum indicum L. Psidium guajava L. Annona muricata L. Myrciaria cauliflora (Mart.) O. Berg Artocarpus heterophyllus Lam. Citrus sinensis (L.) Osbeck Citrus aurantium L. Citrus latifolia Tanaka Citrus aurantifolia (Christm.) Swingle Carica papaya L. Cereus jamacaru DC. Manihot esculenta Crantz Mangifera indica L. Passiflora edulis Sims Passiflora sp.2 Cucumis anguria L. Citrullus lanatus L. Cucumis melo L. Zea mays L. Moringa oleifera Lam. Brasiliopuntia sp.

Família botânica Arecaceae Apiaceae Arecaceae Bixaceae Brassicaceae Fabaceae Fabaceae Pedaliaceae Myrtaceae Annonaceae Myrtaceae Moraceae Rutaceae Rutaceae Rutaceae Rutaceae Caricaceae Cactaceae Euphorbiaceae Anacardiaceae Passifloraceae Passifloraceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Poaceae Moringaceae Cactaceae

TC 16 1 1 3 1 2 6 3 18 3 1 1 9 1 7 5 12 7 24 20 1 2 5 12 3 4 3 2

TI 5 1 1 3 1 1 2 2 7 2 1 1 5 1 5 2 6 2 5 8 1 2 4 4 1 1 1 2

FR 0,625 0,125 0,125 0,375 0,125 0,125 0,25 0,25 0,875 0,25 0,125 0,125 0,625 0,125 0,625 0,25 0,75 0,25 0,625 1 0,125 0,25 0,5 0,5 0,125 0,125 0,125 0,25

CUP bcdf p c p n ci dei fq cdf cd d d cd d cdp cm cdfg dfg bdeghj cd c c g cdfg c beh lmn d 116


Etnoespécie Pimenta Pimenta Passarinho Pimentão Pimentinha Pinha Pitanga Quiabo Romã Soja Sombrinha Tamarindo Tangerina Tanja Tomate Tomatinho/tomate cereja Umbuzeiro Uva Total de etnoespécies

Espécie botânica Capsicum frutescens L. Capsicum sp.2 Capsicum annuum L. Capsicum sp.3 Annona squamosa L. Eugenia uniflora L. Abelmoschus esculentus (L.) Moench Punica granatum L. Glycine max (L.) Merr. Ficus sp. Tamarindus indica L. Citrus deliciosa Tem. Citrus sp. Lycopersicon esculentum Mill. Lycopersicon sp.1 Spondias tuberosa Arruda Vitis vinifera L. 65

Família botânica Solanaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Annonaceae Myrtaceae Malvaceae Lythraceae Fabaceae Moraceae Fabaceae Rutaceae Rutaceae Solanaceae Solanaceae Anacardiaceae Vitaceae

TC 3 1 3 1 7 4 4 4 1 2 3 1 1 7 1 10 1

TI 2 1 3 1 7 2 3 3 1 1 2 1 1 5 1 4 1

FR 0,25 0,125 0,375 0,125 0,875 0,25 0,375 0,375 0,125 0,125 0,25 0,125 0,125 0,625 0,125 0,5 0,125

CUP p p gp p d cd g cd e d cd d d cdgn d cdf d

117


Tabela 16. Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares nos quintais e hortas pelos vazanteiros do Pau Preto, Matias Cardoso, Minas Gerais. TC = total de citações; TI = total de informantes; FR = frequência de citação; CUP = categorias de uso e preparo (: a = Alimentação Animal; b = Assados; c = Bebidas; d = Consumo in natura; e = Cozidos; f = Doces; g = Ensopados; h = Farinhas, beijús e gomas; i = Farofa; j = Frituras; l = Óleos; m = Outros; n = Saladas; o = Sem Informação; p = Temperos; q = Torrados). Etnoespécie Abacate Abóbora Açafrão Acerola Alface Banana Berinjela Caju Cana Carambola Cebola Cebolinha Ciriguela Corante/Urucum Feijão andu Gergilim Goiaba Jatobá Juá mirim Juazeiro Laranja Limão/Limão Tahiti

Espécie botânica Persea americana Mill. Cucurbita sp.1 Curcuma longa L. Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC. Lactuca sativa L. Musa x paradisiaca L. Solanum melongena L. Anacardium occidentale L. Saccharum officinarum L. Averrhoa carambola L. Allium cepa L. Allium fistulosum L. Spondias purpurea L. Bixa orellana L. Cajanus cajan (L.) Huth Sesamum indicum L. Psidium guajava L. Hymenaea courbaril L. Celtis brasiliensis (Gardner) Planch. Ziziphus joazeiro Mart. Citrus sinensis (L.) Osbeck Citrus latifolia Tanaka

Família botânica Lauraceae Cucurbitaceae Zingiberaceae Malpighiaceae Asteraceae Musaceae Solanaceae Anacardiaceae Poaceae Oxalidaceae Alliaceae Alliaceae Anacardiaceae Bixaceae Fabaceae Pedaliaceae Myrtaceae Fabaceae Cannabaceae Rhamnaceae Rutaceae Rutaceae

TC 6 4 1 7 1 6 1 4 6 1 4 3 4 4 7 2 5 2 2 3 7 2

TI 1 1 1 3 1 3 1 1 3 1 1 1 1 1 2 1 1 1 1 2 2 1

FR 0,125 0,125 0,125 0,375 0,125 0,375 0,125 0,125 0,375 0,125 0,125 0,125 0,125 0,125 0,25 0,125 0,125 0,125 0,125 0,25 0,25 0,125

CUP cdn afg p acd n cdn j bc acd d p p ad p ei f acdf df a d cdf cd 118


Etnoespécie Mamoeiro Mandioca Manga Manjericão Maracujá Milho Pimenta Pimenta de cheiro Pinha Quixabeira Repolho Tamarindo Tangerina Tomatinho de rolinha Umbuzeiro Total de etnoespécies

Espécie botânica Carica papaya L. Manihot esculenta Crantz Mangifera indica L. Ocimum sp. Passiflora edulis Sims Zea mays L. Capsicum frutescens L. Capsicum sp.1 Annona squamosa L. Sideroxylon obtusifolium (Humb. ex Hoem. & Schult.) T.D.Penn. Brassica oleracea L. Tamarindus indica L. Citrus deliciosa Tem. Lycopersicon sp.2 Spondias tuberosa Arruda 37

Família botânica Caricaceae Euphorbiaceae Anacardiaceae Lamiaceae Passifloraceae Poaceae Solanaceae Solanaceae Annonaceae Sapotaceae Brassicaceae Fabaceae Rutaceae Solanaceae Anacardiaceae

NC 9 10 18 1 2 5 5 1 3

TI 3 2 2 1 2 1 2 1 2

FR 0,375 0,25 0,25 0,125 0,25 0,125 0,25 0,125 0,25

CUP dfg bdeh cdf d c abeh p p d

3 1 2 2 1 1

1 1 1 1 1 1

0,125 0,125 0,125 0,125 0,125 0,125

ad g c cd g f

119


Tabela 17. Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares nos quintais e hortas pelos geraizeiros do Sobrado, Rio Pardo de Minas, Minas Gerais. TC = total de citações; TI = total de informantes; FR = frequência de citação; CUP = categorias de uso e preparo (: a = Alimentação Animal; b = Assados; c = Bebidas; d = Consumo in natura; e = Cozidos; f = Doces; g = Ensopados; h = Farinhas, beijús e gomas; i = Farofa; j = Frituras; l = Óleos; m = Outros; n = Saladas; o = Sem Informação; p = Temperos; q = Torrados). Etnoespécie Abacate Abacaxi Abóbora Abóbora d'água/verde Abóbora japonesa Abobrinha Acerola Agrião Alface Alho Amora Araçá Articum Bacupari Banana Batata Batata doce Beterraba Café Cagaiteira Cajá Caju Cana

Espécie botânica Persea americana Mill. Ananas comosus (L.) Merr. Cucurbita sp.1 Cucurbita sp.2 Cucurbita sp.3 Cucurbita pepo L. Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC. Nasturtium officinale W.T. Aiton Lactuca sativa L. Allium sativum L. Morus nigra L. Psidium sp. Annona crassiflora Mart. Garcinia gardneriana (Planch. & Triana) Zappi Musa x paradisiaca L. Solanum tuberosum L. Ipomoea batatas (L.) Lam. Beta vulgaris L. Coffea arabica L. Eugenia dysenterica DC. Spondias mombin L. Anacardium occidentale L. Saccharum officinarum L.

Família botânica Lauraceae Bromeliaceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae Malpighiaceae Brassicaceae Asteraceae Amaryllidaceae Moraceae Myrtaceae Annonaceae Clusiaceae Musaceae Solanaceae Convolvulaceae Chenopodiaceae Rubiaceae Myrtaceae Anacardiaceae Anacardiaceae Poaceae

TC 15 2 10 2 1 1 11 1 9 7 6 1 1 1 29 4 6 9 11 5 1 12 9

TI 6 1 7 2 1 1 6 1 7 6 3 1 1 1 8 2 4 3 8 3 1 5 4

FR 0,75 0,125 0,875 0,25 0,125 0,125 0,75 0,125 0,875 0,75 0,375 0,125 0,125 0,125 1 0,25 0,5 0,375 1 0,375 0,125 0,625 0,5

CUP cd cd bdfg g g g cd n dn p cdf d d d cdefgjn fgj def begn cm cd d cd acdf 120


Etnoespécie Cariru Caxixa/caxixe Cebola Cebolinha Cenoura Cereja Chuchu Ciriguela Coco Coco macaúba Coentro Conde Corante/Urucum Couve Espinafre Fedegoso Feijão Feijão andu Goiaba Hortelã pimenta Ingazeiro Inhame Jabuticaba Jaca Jambo Jambre Jatobá Jenipapo

Espécie botânica Amaranthus sp. Sechium sp. Allium cepa L. Allium fistulosum L. Daucus carota L. Prunus avium L. Sechium edule (Jacq.) Sw. Spondias purpurea L. Cocos nucifera L. Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd. ex Mart. Coriandrum sativum L. Annona reticulata L. Bixa orellana L. Brassica oleracea L. Emilia sp. Senna sp. Phaseolus vulgaris L. Cajanus cajan (L.) Huth Psidium guajava L. Plectranthus amboinicus (Lour.) Spreng. Inga sp. Dioscorea sp. Myrciaria cauliflora (Mart.) O. Berg Artocarpus heterophyllus Lam. Syzygium malaccense (L.) Merr. & L.M. Perry Syzygium cumini (L.) Skeels Hymenaea courbaril L. Genipa americana L.

Família botânica Amaranthaceae Cucurbitaceae Alliaceae Alliaceae Apiaceae Rosaceae Cucurbitaceae Anacardiaceae Arecaceae Arecaceae Apiaceae Annonaceae Bixaceae Brassicaceae Asteraceae Fabaceae Fabaceae Fabaceae Myrtaceae Lamiaceae Fabaceae Dioscoreaceae Myrtaceae Moraceae Myrtaceae Myrtaceae Fabaceae Rubiaceae

NC 4 1 6 11 19 1 5 1 10 4 22 3 9 11 1 1 13 4 13 1 6 1 11 10 2 2 8 1

TI 2 1 3 5 5 1 2 1 3 1 7 2 7 7 1 1 5 3 6 1 6 1 7 6 1 1 4 1

FR CUP 0,25 gin 0,125 g 0,375 np 0,625 p 0,625 bcegin 0,125 d 0,25 eg 0,125 d 0,375 bcdf 0,125 bdfl 0,875 np 0,25 cd 0,875 p 0,875 dginp 0,125 n 0,125 g 0,625 dei 0,375 ei 0,75 acdf 0,125 p 0,75 d 0,125 g 0,875 cdm 0,75 cd 0,125 d 0,125 ad 0,5 abd 0,125 c 121


Etnoespécie Jiló Laranja Lima Limão rosa/galego Limão/Limão Tahiti Maçã Mamoeiro Mandioca Manga Maracujá Maracujá do pequeno Maxixe Milho Mostarda Mutamba Pepino Pequi Pimenta Pimenta de cheiro Pimentão Pinha Pinhão Pitanga Pocã Quiabo Repolho Romã Rúcula

Espécie botânica Solanum gilo Raddi Citrus sinensis (L.) Osbeck Citrus limettioides Tanaka Citrus limonia (L.) Osbeck Citrus latifolia Tanaka Malus domestica L. Carica papaya L. Manihot esculenta Crantz Mangifera indica L. Passiflora edulis Sims Passiflora sp.3 Cucumis anguria L. Zea mays L. Brassica oleracea L. Guazuma ulmifolia Lam. Cucumis sativus L. Caryocar brasiliense Cambess. Capsicum frutescens L. Capsicum sp.1 Capsicum annuum L. Annona squamosa L. Jatropha sp.1 Eugenia uniflora L. Citrus reticulata Blanco Abelmoschus esculentus (L.) Moench Brassica oleracea L. Punica granatum L. Eruca sativa Mill.

Família botânica Solanaceae Rutaceae Rutaceae Rutaceae Rutaceae Rosaceae Caricaceae Euphorbiaceae Anacardiaceae Passifloraceae Passifloraceae Cucurbitaceae Poaceae Brassicaceae Malvaceae Cucurbitaceae Caryocaraceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Annonaceae Euphorbiaceae Myrtaceae Rutaceae Malvaceae Brassicaceae Lythraceae Brassicaceae

NC 2 18 1 1 9 2 18 46 20 5 2 4 22 2 1 4 12 4 3 4 3 2 5 4 6 2 2 1

TI 1 7 1 1 6 1 7 7 8 4 1 3 4 1 1 3 4 3 2 1 2 1 3 3 4 1 2 1

FR CUP 0,125 gn 0,875 bcdfmn 0,125 d 0,125 c 0,75 cdp 0,125 d 0,875 acdfgn 0,875 abefhj 1 cdfn 0,5 cf 0,125 cf 0,375 g 0,5 abeh 0,125 gi 0,125 d 0,375 dn 0,5 bdegjlm 0,375 p 0,25 p 0,125 fnp 0,25 cd 0,125 a 0,375 cd 0,375 d 0,5 gn 0,125 n 0,25 d 0,125 n 122


Etnoespécie Salsa Salsinha Taioba Tomate Tomatinho/tomate cereja Umbuzeiro Uva Total de etnoespécies

Espécie botânica Petroselinum sp. 1 Petroselinum sp. 2 Xanthosoma sagittifolium (L.) Schott Lycopersicon esculentum Mill. Lycopersicon sp.1 Spondias tuberosa Arruda Vitis vinifera L. 86

Família botânica Apiaceae Apiaceae Araceae Solanaceae Solanaceae Anacardiaceae Vitaceae

NC 1 4 9 8 2 1 1

TI 1 1 2 4 1 1 1

FR 0,125 0,125 0,25 0,5 0,125 0,125 0,125

CUP p np gh gn g d d

123


Tabela 18. Lista das etnoespécies conhecidas e utilizadas como bens alimentares nos quintais e hortas pelos caatingueiros do Touro, Serranópolis de Minas, Minas Gerais. TC = total de citações; TI = total de informantes; FR = frequência de citação; CUP = categorias de uso e preparo (: a = Alimentação Animal; b = Assados; c = Bebidas; d = Consumo in natura; e = Cozidos; f = Doces; g = Ensopados; h = Farinhas, beijús e gomas; i = Farofa; j = Frituras; l = Óleos; m = Outros; n = Saladas; o = Sem Informação; p = Temperos; q = Torrados). Etnoespécie Abacate Abóbora Acerola Alface Amendoim Amora Araçá Atemóia Banana Batata Doce Boldo Café Cajá Caju Cana Carambola Cebolinha Cidra/Limãozão Ciriguela Coco Coentro Corante/Urucum

Espécie botânica Persea americana Mill. Cucurbita sp.1 Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC. Lactuca sativa L. Arachis hypogaea L. Morus nigra L. Psidium sp. Annona cherimola Mill. x A. squamosa L. Musa x paradisiaca L. Ipomoea batatas (L.) Lam. Vernonia condensata Baker Coffea arabica L. Spondias mombin L. Anacardium occidentale L. Saccharum officinarum L. Averrhoa carambola L. Allium fistulosum L. Citrus medica L. Spondias purpurea L. Cocos nucifera L. Coriandrum sativum L. Bixa orellana L.

Família botânica Lauraceae Cucurbitaceae Malpighiaceae Asteraceae Fabaceae Moraceae Myrtaceae Annonaceae Musaceae Convolvulaceae Asteraceae Rubiaceae Anacardiaceae Anacardiaceae Poaceae Oxalidaceae Alliaceae Rutaceae Anacardiaceae Arecaceae Apiaceae Bixaceae

TC 9 9 17 1 3 6 2 1 27 1 1 1 7 8 12 5 1 4 12 16 1 9

TI 4 4 7 1 1 4 1 1 6 1 1 1 4 6 5 3 1 2 7 5 1 5

FR 0,571 0,571 1,000 0,143 0,143 0,571 0,143 0,143 0,857 0,143 0,143 0,143 0,571 0,857 0,714 0,429 0,143 0,286 1,000 0,714 0,143 0,714

CUP cd cfg cd n df cd cd d cdfij e d c cd cdf acdf cd p cfm cd bcdf p hp 124


Etnoespécie Feijão Feijão andu Figo Garoba Gergilim Girassol Goiaba Graviola Jabuticaba Jaca Jamelão Jericanhota Juazeiro Laranja Leucena Lima Limão rosa/galego Limão/Limão Tahiti Maçã Mamoeiro Mandioca Manga Mangaba Maracujá Maracujá do mato Maxixe Melancia

Espécie botânica Phaseolus vulgaris L. Cajanus cajan (L.) Huth Ficus carica L. Indet 4 Sesamum indicum L. Helianthus annuus L. Psidium guajava L. Annona muricata L. Myrciaria cauliflora (Mart.) O. Berg Artocarpus heterophyllus Lam. Syzygium cumini (L.) Skeels Indet 5 Ziziphus joazeiro Mart. Citrus sinensis (L.) Osbeck Leucaena leucocephala (Lam.) de Wit Citrus limettioides Tanaka Citrus limonia (L.) Osbeck Citrus latifolia Tanaka Malus domestica L. Carica papaya L. Manihot esculenta Crantz Mangifera indica L. Hancornia speciosa Gomes Passiflora edulis Sims Passiflora vitifolia Kunth Cucumis anguria L. Citrullus lanatus L.

Família botânica Fabaceae Fabaceae Moraceae Indet 4 Pedaliaceae Asteraceae Myrtaceae Annonaceae Myrtaceae Moraceae Myrtaceae Indet 5 Rhamnaceae Rutaceae Fabaceae Rutaceae Rutaceae Rutaceae Rosaceae Caricaceae Euphorbiaceae Anacardiaceae Apocynaceae Passifloraceae Passifloraceae Cucurbitaceae Cucurbitaceae

7 2 2 1 1 4 22 10 2 1 1 1 1 14 3 3 6 12 1 26 7 18 2 3 1 1 6

NC 3 1 2 1 1 1 7 6 1 1 1 1 1 5 3 2 3 6 1 7 4 6 1 3 1 1 3

TI

FR CUP 0,429 dei 0,143 di 0,286 f 0,143 a 0,143 b 0,143 al 1,000 cdf 0,857 cd 0,143 cd 0,143 d 0,143 d 0,143 d 0,143 d 0,714 cd 0,429 a 0,286 cd 0,429 c 0,857 cd 0,143 d 1,000 cdfghn 0,571 ehj 0,857 acdf 0,143 c 0,429 cd 0,143 c 0,143 g 0,429 cdf 125


Etnoespécie Melão Milho Moringa Nim Palma Pepino Pimenta Pinha Pitanga Quiabo Quixabeira Romã Tamarindo Tançagem Tangerina Tanja Tomate Tomate grão de galo Tomate redondinho Umbuzeiro Veludo Xarope Total de etnoespécies

Espécie botânica Cucumis melo L. Zea mays L. Moringa oleifera Lam. Azadirachta indica A. Juss. Opuntia ficus-indica (L.) Mill. Cucumis sativus L. Capsicum frutescens L. Annona squamosa L. Eugenia uniflora L. Abelmoschus esculentus (L.) Moench Sideroxylon obtusifolium (Humb. ex Hoem. & Schult.) T.D.Penn. Punica granatum L. Tamarindus indica L. Plantago major L Citrus deliciosa Tem. Citrus sp. Lycopersicon esculentum Mill. Lycopersicon sp.3 Lycopersicon sp.4 Spondias tuberosa Arruda Amaranthus cruentus L. Indet 8 71

Família botânica Cucurbitaceae Poaceae Moringaceae Meliaceae Cactaceae Cucurbitaceae Solanaceae Annonaceae Myrtaceae Malvaceae Sapotaceae Lythraceae Fabaceae Plantaginaceae Rutaceae Rutaceae Solanaceae Solanaceae Solanaceae Anacardiaceae Amaranthaceae Indet 8

3 16 2 1 6 1 4 9 5 2

NC 1 3 2 1 3 1 2 7 4 2

1 7 8 1 3 3 3 2 1 24 1 1

1 6 4 1 2 2 3 1 1 7 1 1

TI

FR CUP 0,143 cde 0,429 abehm 0,286 m 0,143 a 0,429 aeg 0,143 d 0,286 p 1,000 cd 0,571 cd 0,286 g 0,143 0,857 0,571 0,143 0,286 0,286 0,429 0,143 0,143 1,000 0,143 0,143

a cd cd n cd cd dn gn n cdfhj n c

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ANEXO 3 – Registro Fotográfico REGISTRO FOTOGRÁFICO 1 – Audiência Pública em Manga no dia 31.05.2012, comunidade vazanteira da Ilha do Pau Preto. 2 - Horta comunitária no acampamento Arraial do Meio, na Ilha do Pau Preto (Matias Cardoso, MG). 3 – Preparação do peixe curimatá pela vazanteira Dona Helena. 4 – Proposta de RDS da comunidade vazanteira do Pau Preto. 5 – Proposta de Mapa de Uso e Ocupação do Território dos Vazanteiros da Comunidade do Pau Preto. 6 – Troca de sementes durante o curso de Direito Territorial dos Povos e Comunidades Tradicionais no Arraial do Meio, Matias Cardoso – MG em agosto de 2012. 7 – Rio São Francisco e agricultura de vazante. 8 – Feitura de rede de pesca pela vazanteira Etelvina. 9 – Padaria Gorutubana Mariano Matos da Silva, em Barreiro Branco, Catuti (MG). 10 – Casa de farinha e de sementes em construção, Associação de Mulheres Guturubanas, Malhada Grande, Catuti (MG). 11 – Cantoria e socagem de arroz no pilão para feitura do arroz de pilão com carne de sol, Malhada Grande, Catuti (MG). 12 – Horta em quintal quilombola, Malhada Grande, Catuti (MG). 13 e 14 – Artesanato em tecido pelas mulheres gututubanas de Malhada Grande, Catuti (MG). 15 – Batuque na comunidade quilombola de Malhada Grande, Catuti (MG). 16 – Igreja católica da comunidade e hasteada a bandeira de São Lourenço, Malhada Grnade, Catuti (MG). 17 – Feira aberta da cidade de Rio Pardo de Minas (MG). 18 – Ida a feira, costume antigo dos moradores do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 19 – Horta na área de “baixa” na comunidade geraizeira do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 20 – Quintal geraizeiro da comunidade do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 21 – Oficina de retorno na comunidade do Sobrado em junho de 2012, Rio Pardo de Minas (MG). 22 – Reunião inicial com a comunidade do Sobrado em julho de 2011, Rio Pardo de Minas (MG). 23 – Área de “chapada” com plantações de Eucalipto (Eucalyptus sp.), na comunidade do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 127


24 – “Chácaras” de café em desenvolvimento, na comunidade do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 25 – Cistena construída na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 26 – Horta familiar na comunidade do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 27 – Antigo costume de carregar água nos potes de barro, na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 28 – Receita com a Palma, planta considerada emergencial, na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 29 – Feitura do requeijão, na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 30 – Feitura do Corante, na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 31 – Criação de porco no quintal, na comunidade caatingueira do Touro, Serranópolis de Minas (MG). 32 – Reunião de mapeamento comunitário, na comunidade caatingueira do Touro em janeiro de 2011, Serranópolis de Minas (MG). 33 – Feitio da farinha e goma de mandioca na comunidade geraizeira do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 34 – “Briante e Brilhoso, nós marra eles junto para mode criar amizade” (geraizeiro, 67 anos). Tradição do carro de boi também registrada na comunidade geraizeira do Sobrado, Rio Pardo de Minas (MG). 35 – Casa de Sementes do guardião Sr. Geraldo Gomes, comunidade do Touro, Serranópolis de Minas. 36 – Sr. Geraldo Gomes cantando e tocando as cantigas de sua terra, comunidade do Touro, Serranópolis de Minas. 37 – Sobre o sertão, Guimarães Rosa. 38 – Entrega do Catálogo de Sementes para o Sr. Geraldo Gomes no Encontro de Saberes em Juiz de Fora (MG) em 2014. 39 e 40 – Plantas consideradas emergenciais mais citadas pelas comunidades: Umbuzeiro e suas “batatas” por Maia (2004) (39), e Mucunã em destaque duas etno-variedades (40).

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