uma narrativa indĂgena ilustrada
universidade de são Paulo faculdade de arquitetura e urbanismo
uma narrativa indígena ilustrada
Lís sanieli de ribeiro souza orientação de clice de t. s. mazzilli trabalho final de graduação ii 2017
Lista de ilustrações
Figura 1 Figura 2 Figura 3
Figura 4 Figura 5
Introdução
Frame do filme “Tron” (1982). Dirigido por Steve Lisberger. Fonte:<http://www.tested.com/art/movies/520562-putting-original-trons-special-effects-together/>. Acesso em: 27.06.2016. Imagem de tela do jogo “Tron”, de 1982, inspirado no filme homônimo. Fonte: <http://tron.wikia.com/wiki/TRON_(arcade_game)>. Acesso em: 27.06.2016. Imagem retirada da primeira edição (setembro de 1963) da história em quadrinhos “The Avengers”, da Marvel, de autoria de Stan Lee e arte de Jack Kirby. Fonte: <http://www.themarysue.com/avengers-statue-tragedy/>. Acesso em: 27.06.2016. Frame do filme “The Avengers: Os Vingadores” (2012), dirigido por Joss Whedon. Fonte: <http://www.imdb.com/imdbpicks/MCU-movies-ranked-by -imdb/ls038472133>. Acesso em: 27.06.2016. Página de “Maus: A história de um sobrevivente”, de Art Spiegelman. Fonte: SPIEGELMAN, Art. Maus: a história de um sobrevivente. Ilustrações do autor; trad. Antonio de. Macedo Soares. São Paulo: Companhia das Letras, 2014, p. 25.
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Figura 6 Quadro retirado de “Persópolis”, de Marjane Sapatri. Fonte: SATRA- 24 PI, Marjane. Persépolis. Trad. Pauko Werneck. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. Figura 7 Trecho de “Desvendando os Quadrinhos”, de Scott McCloud. Fonte: 25 McCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. Tradução Helcio de carvalho, Marisa do Nascimento Paro. São Paulo: Makron Books, 1995, p. 35-36.
Livro
Figura 8 Foto da Caverna de Lascaux, na França. Fonte: <http://rolfgross. 29 dreamhosters.com/CavePainting/Lascaux/Lascaux.html>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 9 Trecho de “Desvendando os Quadrinhos”, de Scott McCloud. Fonte: 33 McCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. Tradução Helcio de carvalho, Marisa do Nascimento Paro. São Paulo: Makron Books, 1995, p. 28. Figura 10 Evolução de ideogramas no idioma chinês (extraído de La visione 33 © 1979 Arnoldo Mondadori Editore). Fonte: GOMBRICH, E. H. Arte e Ilusão. Um estudo da psicologia da representação pictórica. Tradução: Raul de Sá Barbosa. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
Figura 11 Edição russa do livro “Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk”, de Nikolai Leskov. Fonte: <https://afflatus.dirty.ru/ledi-makbet-mtsenskogo-uezda-558470/>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 12 Detalhe de uma cópia do livro “Diamond Sutra”, de 686 d. C. Fonte:<http://www.getty.edu/conservation/publications_resources/newsletters/31_1/peerless_caves.html>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 13 Biblioteca acorrentada da Catedral de Hereford na Inglaterra. Fonte: <http://avax.news/educative/The_Newly_Cleaned_And_Extremely_Rare_Chained_Library_At_Hereford_Cathedral.html>. Acesso em 27/06/2016. Figura 14 Tipos móveis de chumbo fundido. Fonte: <http://movadesign.com. br/qual-o-seu-tipo-historia-da-tipografia-parte-1/>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 15 Iluminura de Cristo em Majestade do “Bestiário de Aberdeen” (folio 4v). Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Iluminura>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 16 Gravura de um monge copista trabalhando no scriptorium. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Scriptorium>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 17 Xilogravura de um pavão feita por Thomas Bewick, que se encontra no livro “A History of British Birds, Volume I (Land Birds)”, de 1797.
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Fonte: <http://www.bewicksociety.org/British%20Birds%20Land. html>. Acesso em: 28.06.2016. Figura 18 Matriz que, provavelmente, originou a gravura da figura 17. Fonte: 49 <https://global.britannica.com/biography/Thomas-Bewick>. Acesso em: 28.06.2016.
Índios Kaingang
Figura 19 Índios Kaingang de Ivaí (RS). Foto: Vilaine Capellari, 1994. Fonte: <https://pib.socioambiental.org/pt/povo/kaingang/286>. Acesso em: 28.06.2016. Figura 20 Mapa das reservas Kaingang. Fonte: <http://www.portalkaingang. org/index_aldeia_mapa_geral_g.htm>. Acesso em: 28.06.2016. Figura 21 Pintura com grafismos Kaingang nos braços. Foto: Divulgação UPF. Fonte: <http://www.upf.br/site/inc/noticias/mostraNoticia.php?codNoticia=19052>. Acesso em: 02.07.2016. Figura 22 Mulher pintando o corpo de uma criança durante oficina da Comunidade Kaingang de Ronda Alta. Foto: Camila Domingues/Palácio Piratini. Fonte: <http://www.sjdh.rs.gov.br/?model=conteudo&menu=1&id=2344&pg=>. Acesso em: 02.07.2016. Figura 23 Exposição “Eg Rá: Nossas Marcas”, em 2013, no Museu Histórico Regional (MHR), Passo Fundo/RS. Foto: Priscila Batistel Pulga. Fonte:
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Figura 24 Figura 25 Figura 26 Figura 27 Figura 28
<http://www.upf.br/mhr/index.php?option=com_content&view=article&id=200:q&catid=32:q&Itemid=5>. Acesso em: 02.07.2016. Acervo Pessoal de Kimiye Tommasino. Pinturas corporais cerimoniais dos Kaingang. Representação das duas metades ciânicas da origem do povo Kaingang. Fonte: <http://indigenasbrasileiros.blogspot.com.br/2016/04/kaingang.html>. Acesso em: 28.06.2016. Pinturas corporais realizadas no Ponto de Cultura Kanhgág Jãre (Raízes Kaingáng), na Terra Indígena da Serrinha, em Ronda Alta. Fonte: <http://pckanhgagjare.redelivre.org.br/2014/06/08/visita-dosecretario-de-estado-da-cultura-do-rs/>. Acesso em: 03.07.2016. Menina com pintura nhétkymby. Foto: Odan Jaeger. Fonte: <http:// galeria.obviousmag.org/recortes/indigenas-brasileiros/criancas -indigenas/indios-brasileiros-221.jpg>. Acesso em: 03.07.2016. Jovem índia tendo o rosto pintado na grafia ra róng ror. Frame do documentário “Vida Kaingang” (2014), dirigido por Nelson Akira Ishikawa. Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=HKX-nfTOKz0>. Acesso em: 03.07.2016. Dois jovens Kaingang que possuem a pintura ra taktéi no rosto. Frame do documentário “Vida Kaingang” (2014), dirigido por Nelson Akira Ishikawa. Fonte: <https://www.youtube.com/watch?v=HKX -nfTOKz0>. Acesso em: 03.07.2016.
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Figura 29 Homem Kaingang com a pintura ra taktéi no rosto e usando um cocar 64 durante ritual. Frame do documentário “Vida Kaingang” (2014) , dirigido por Nelson Akira Ishikawa. Fonte: <https://www.youtube.com/ watch?v=HKX-nfTOKz0>. Acesso em: 03.07.2016. Figura 30 Carimbo de taquara kaingang. Foto: Vladimir Kozak, 1955. Fonte: 65 <https://pib.socioambiental.org/pt/povo/kaingang/290>. Acesso em: 03.07.2016. Figura 31 Níveis morfológico e gráfico da cestaria Kaingang. 67 Fonte: CAVALCANTE, Ana Luisa Boavista Lustosa. Design para a Sustentabilidade Cultural: Recursos Estruturantes para Sistema Habilitante de Revitalização de Conhecimento Local e Indígena. 2014. 321 f. Tese (Doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento) - Universidade Federal de Santa Catarina, p.112. Disponível em: <http://btd. egc.ufsc.br/wp-content/uploads/2015/04/Ana-Luisa-Boavista-Lustosa-Cavalcante-1.pdf>. Acesso em: 02.07.2016.
Produção
Figura 32 “O Grito” (1895), litogravura de Edvard Munch. The Art Institute of Chicago, Clarence Buckingham Collection, © 2008 The Munch Museum/ Munch-Ellingsen Group/ARS, NY. Fonte: <http://arttattler. com/archiveedvardmunch.html>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 33 “Ansiedade” (1896), litogravura de Edvard Munch. The Epstein Family Collection, © 2009 The Munch Museum/ Munch-Ellingsen Group/ARS, NY. Fonte: <http://arttattler.com/archiveedvardmunch. html>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 34 Processo de criação de uma ilustração da artista japonesa Yuko Shimizu. Fonte: <http://www.yukoart.com/category/blog/page/4/?monthnum&year&category_name=blog&blog_subject=work-process>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 35 “Emergency Stabilization” (2014), de Stanley Donwood. Serigrafia. Fonte: <http://archive.slowlydownward.com/anonews.html>. Acesso em: 30.06.2016. Figura 36 “Spreading Contagion” (2014), de Stanley Donwood. Serigrafia. Fonte: <http://archive.slowlydownward.com/anonews.html>. Acesso em: 30.06.2016.
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Figura 37 Projeto gráfico de Stanley Donwood para o encarte do álbum “Amok” (2013) da banda Atoms For Peace. Fonte: <http://metro. co.uk/2012/12/05/thom-yorke-confirms-atoms-for-peace-album-amok-and-february-release-date-3301661/>. Acesso em: 27.06.2016. Figura 38 Encarte do álbum “Amok” (2013), de Atoms For Peace, na versão em vinil. Projeto gráfico de Stanley Donwood. Fonte: <http://archive.slowlydownward.com/anonews.html>. Acesso em: 30.06.2016. Figura 39 Spread do livro “Lampião e Lancelote” (Cosac Naify, 2006). Fonte: <http://www.revistaemilia.com.br/mostra.php?id=169>. Acesso em: 03.07.2016. Figura 40 Spread do livro “Lampião e Lancelote” (Cosac Naify, 2006). Fonte: <https://catalisecritica.wordpress.com/2012/11/30/lampiao-lancelote-fernando-vilela/>. Acesso em: 03.07.2016. Figura 41 Spread do livro “Lampião e Lancelote” (Cosac Naify, 2006). Fonte: <https://catalisecritica.wordpress.com/2012/11/30/lampiao-lancelote-fernando-vilela/>Acesso em: 03.07.2016. Figura 42 Capa do livro “Lampião e Lancelote” (Cosac Naify, 2006). Fonte: <http://www.revistaemilia.com.br/mostra.php?id=169>. Acesso em: 03.07.2016.
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Figura 43 Desenho esquemático: folhas espelhadas de mesma dimensão nos formatos retrato e paisagem. Fonte: autora (2017). Figura 44 Encadernação japonesa: variedade de costuras. Fonte: < http:// www.deconstructed.org.uk/projects/BOOK-Notebooks/Notebooks. php>. Acesso em: 23.06.2017. Figura 45 Costura copta tradicional. Fonte: <http://r-jones1417-sp.blogspot. com.br/2015/03/design-principles-what-is-book-book_21.html>. Acesso em: 23.06.2017. Figura 46 Costura copta adaptada. Fonte: <https://www.flickr.com/photos/ katej/5373189099/>. Acesso em: 18.06.2017. Figura 47 Desenho esquemático do modelo de caderno que compõe o livro. Fonte: autora (2017). Figura 48 Boneco em formato A7 apresentando costura frouxa. Fonte: autora (2017). Figura 49 Modelos de encadernação testados.Fonte: autora (2017). Figura 50 Encadernação lattice (de cima para baixo, primeiro caderno azul). Fonte: < http://www.aber.org.br/sites/default/files/_DSC7071%20 ed%20300%20230.jpg>. Acesso em: 23.06.2017.
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Figura 51 Aluna fazendo serigrafia no LPG. Fonte: Cândida Maria Vuolo. Dis- 93 ponível em: < http://www.fau.usp.br/apoio/lpg-publicacao-e-producao-grafica/>. Acesso em: 23.06.2017. 94 Figura 52 Uma das minhas telas gravada. Fonte: autora (2017). Figura 53 Folhas secando logo após impressão no LPG. Fonte: autora (2017). 95 97 Figura 54 Horário de atendimento para o uso do LPG. Fonte: autora (2017). 104 Figura 55 Primeiro boneco. Desenhos a lápis e a caneta nanquim. Fonte: autora (2016). Figura 56 Boneco em formato A7, contendo ideias mantidas no produto final. 105 Fonte: autora (2017).
Agradecimentos
À Júlia Contreiras pelas valiosas dicas de encadernação. Aos técnicos Ricardo e Márcio do LPG pela prestabilidade e disposição em me orientar na serigrafia. À Joziléia Daniza Jagso Ignácio Jacodsen por me tirar dúvidas referentes ao povo Kaingang e, assim, evitar que o meu trabalho se transformasse em um monólogo étnico. À professora Maria de Lourdes Zuquim por despertar minha curiosidade antropológica sobre os povos indígenas. À professora Clice pela orientação paciente e incentivadora, sempre me colocando dentro dos eixos. Aos meus pais, que sempre abraçam minhas causas, não importam quais. Sem eles, eu não teria tido forças para chegar até aqui. Muito obrigada a todos vocês!
Sumário
Introdução Proposta e motivações................... 18 A representação da realidade e fantasia....................... 20 Livro Origens da comunicação por signos....................................... 28 Comunicação visual....................... 30 Comunicação verbal...................... 32 Narrativa................................ 34 Mito........................................ 36 História do livro.............................. 38 Livro ilustrado: definição................ 44 História do livro ilustrado............... 46 Índios Kaingang A comunidade Kaingang ............... 54 Mito de origem............................... 56 Dualidade Kaiurucré/Kamé............ 58 Grafismo ....................................... 60 Pintura corporal..................... 62 Cestaria................................. 66
Produção Referências visuais........................ 70 Edvard Munch........................ 71 Yuko Shimizu......................... 72 Stanley Donwood................... 74 Fernando Vilale...................... 76 Interface e superfície..................... 78 Interface................................ 80 Superfície.............................. 82 Reprodução do livro....................... 84 Acabamento: encadernação........................ 86 Impressão: serigrafia............. 92 Produtos......................................... 98 Produto final........................106 Considerações Finais .......................................................120 Referências bibliográficas .......................................................122
Introdução
Proposta e motivações
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Eu escolhi a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo por gostar de desenhar. Eu queria aplicar essa minha habilidade em alguma área do mercado que satisfazesse as expectativas burguesas minhas e da minha família. Também tinha esperanças de que, com o conhecimento que eu adquirisse nesse curso, eu pudesse trazer benefícios às classes sociais menos favorecidas, de onde eu provenho. No entanto, no decorrer da graduação, assim como vários amigos e colegas da FAU, eu fui passando por dificuldades acadêmicas que me fizeram repensar sobre minha escolha de carreira. Enquanto isso, meu gosto por artes, design e ilustração somente crescia cada vez mais. Durante o quarto ano, eu ainda cogitava a ideia de fazer um projeto arquitetônico como Trabalho Final de Graduação, mas eu sentia que faltava um interesse mais profundo pelo projeto de arquitetura. Então eu procurei aprofundar um pouco mais meu conhecimento em relação às artes e suas técnicas e me afastei do ritmo frenético da faculdade, adiando, assim, minha formatura. Eu me decidi, então, que queria fazer algo que envolvesse a ilustração. Contudo, o que e como desenhar continuava uma incógnita. Finalmente, considerei a ideia de criar um livro ilustrado. Decidi que queria trabalhar com alguma história já escrita, principalmente por não confiar em minhas próprias habilidades literárias e narrativas.
Ao pensar em livro ilustrado, minha mente se voltou diretamente para obras literárias de ficção, em especial as histórias de fantasia. Pesquisei por contos fantásticos, em sua maioria europeus datados do século XIX. Embora tenha gostado muito de algumas histórias, como por exemplo “O Homem de Areia” (“Der Sandmann”) de E. T. A. Hoffman, pareceu-me que explorar uma história ambientada na Europa dezenovecentista fosse algo já muito explorado. Também achei que seria mais interessante trazer algo da cultura brasileira, visto que ela é bastante rica e ainda assim, pouco conhecida – e mesmo desvalorizada. Pesquisei histórias folclóricas, através da extensa bibliografia de Luís da Câmara Cascudo. No entanto, muito do folclore brasileiro tem sua base em mitos europeus. Segundo Câmara Cascudo, as proporções entre os elementos indígenas, africanos e brancos no Folclore brasileiro é 1.3.5, sendo que os contos indígenas e africanos se justapõem de modo que não podemos distinguir suas origens (CASCUDO, 2004). Por isso, optei por pesquisar um grupo étnico específico, e assim explorar sua forma de pensar, de interagir e se organizar socialmente, e conhecer seu universo mítico.
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A representação da realidade e fantasia
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Eu questionei a mim mesma quanto ao fato buscar por histórias de fantasia/mitologia (e não em histórias realistas) como fonte de inspiração para a criação dos meus desenhos. Por que relacionamos desenho à fantasia? Lembrei-me da minha infância, na década de 1990, onde a grande maioria das produções de entretenimento para as crianças apresentavam-se na forma bidimensional (livros ilustrados, histórias em quadrinhos e animações em 2D). Como sabemos, as histórias dirigidas a esse público possuem, em sua grande maioria, teor fantástico. A relação do bidimensional com esse tipo de ficção é tradicionalmente estreita. Nas últimas décadas, no entanto, esta situação vem mudando. Vivenciamos um grande desenvolvimento da computação gráfica, capaz de tornar o absurdo em factível. As produções cinematográficas investem cada vez mais em filmes de fantasia; tanto na forma de animações em três dimensões (no qual a Pixar foi o estúdio de animação percussor), como em filmes de live-action, que abordam os gêneros de ficção científica, contos de fada e de heróis de histórias em quadrinhos. Além do seu uso no cinema, o CGI (Computer-generated imagery, cuja tradução para o português seria “imagens geradas pelo computador”) também foi fundamental para a criação de jogos eletrônicos (video games).
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Figura 1 – Frame do filme “Tron”, de 1982, dirigido por Steve Lisberger. Um dos primeiros filmes a utilizar CGI de forma ampla. Figura 2 – Imagem de tela do jogo de video game, inspirado no filme e lançado no mesmo ano de 1982.
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Figura 3 – Imagem retirada da primeira edição (setembro de 1963) da história em quadrinhos “The Avengers”, da Marvel, de autoria de Stan Lee e arte de Jack Kirby. Figura 4 – Frame do filme “The Avengers: Os Vingadores”, de 2012, dirigido por Joss Whedon. A adaptação dos quadrinhos para o cinema não é algo recente - temos como um exemplo famoso, o filme “Superman”, de 1978 - porém, a produção de filmes de super-heróis nas últimas décadas viveu um grande boom, mostrando-se um gênero bastante lucrativo para a indústria cinematográfica.
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Em contrapartida a esse processo de concretização do irreal, vemos também o oposto ocorrendo: a representação de histórias reais em desenhos 2D bastante simplificados. Isso está se tornando muito comum no mundo das histórias em quadrinhos, com a publicação de várias graphic novels inspiradas em fatos biográficos. Podemos citar os best-sellers “Maus” (1980), de Art Spiegelman e “Persépolis” (2000), de Marjane Satrapi. No primeiro caso, temos o pai do quadrinista, um judeu polonês sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz, relatando para o filho como foi sua experiência durante o nazismo. Para tentar amenizar a história, cujo teor é pesadíssimo, o artista se utiliza da zoomorfização dos personagens. Cada etnia é representada por um animal diferente: os judeus são ratos, os nazistas são gatos, os poloneses não-judeus são porcos e os norte-americanos são cães. Dessa forma, a biografia se torna uma espécie de fábula. O fato de animais agirem como humanos não causa tanta estranheza como a história em si, que trata da desumanização da sociedade durante a Segunda Guerra Mundial.
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Figura 5 – Página de “Maus: A história de um sobrevivente”, de Art Spiegelman
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Figura 6 – Quadro retirado de “Persópolis”, de Marjane Sapatri.
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Em “Persépolis”, por sua vez, a autora Marjani Satrapi conta a história de sua infância, adolescência e início da idade adulta durante a Revolução Iraniana. Assim como “Maus”, essa graphic novel é em preto-e-branco e com traços cartunescos. O quadrinista Scott McCloud, em “Desvendando os Quadrinhos” explica que a representação simplificada dos personagens aproxima estes do leitor. Seria o que ele chama de universalidade de imagem do cartum: “quanto mais cartunizado é um rosto, mais pessoas ele pode descrever [...]” (McCLOUD, 1995, p. 31). Estas foram apenas algumas observações que venho fazendo enquanto criadora. Minha intenção não é fazer algo voltado a um grupo etário específico. O tema do fantástico, do mitológico, é algo que fascina todas as idades; e a representação bidimensional do mundo permanece sendo um dos recursos expressivos mais eficientes do ser humano. O desenho se mostra como uma excelente forma de transmitir experiências e sensações, e é isso que eu pretendo alcançar com minhas ilustrações.
Figura 7 – Trecho de “Desvendando os Quadrinhos”, de Scott McCloud.
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Livro
Origens da Comunicação por Signos
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Este capítulo se compromete a abordar a história do surgimento do livro. Pretendo, assim, compreender melhor a relação humana com esse artefato, que é o objeto final do meu TFG. * O ato de registrar experiências e ideias em uma superfície plana é uma característica peculiar do ser humano. As outras espécies de animais não possuem essa capacidade de abstrair do ambiente ou da sua mente os símbolos ou ícones que os representem. Por motivos que podemos apenas especular, o homem pré-histórico fazia, nas paredes da caverna, esquemas pictóricos das coisas com as quais interagia. Pelo fato de terem resistido ao tempo, esses desenhos rupestres possibilitam a comunicação entre o homem pré-histórico e o homem moderno. Esse modo de se comunicar pela representação imagética foi o que deu origem às artes, às formas de comunicação visual (como a infografia e o pictograma) etc. A escrita foi outro meio de comunicação proveniente da imagem, embora pertença, do ponto de vista semiótico, a outro grupo de signos.
Figura 8 â&#x20AC;&#x201C; Caverna de Lascaux, na França, e suas famosas pinturas rupestres.
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Comunicação Visual
A comunicação visual ocorre por meio de imagens. Estas, por sua vez, são definidas por Flusser (1985, p.7) como: superfícies que pretendem representar algo. Na maioria dos casos, algo que se encontra lá fora no espaço e no tempo. As imagens são, portanto, resultado do esforço de se abstrair duas das quatro dimensões espácio-temporais, para que se conservem apenas as dimensões do plano. Devem sua origem à capacidade de abstração específica que podemos chamar de imaginação.
A semiótica dá o nome de signos icônicos aos elementos que compõem a comunicação visual.
Signos icônicos, ou de representação, são aqueles em que o significado e o significante estão relacionados por atributos comuns, ou seja, quando o signo é uma representação direta de seu significado. […] Na maioria dos casos, não precisamos de conhecimento especial para compreender um ícone simples. (NIKOLAJEVA & SCOTT, 2011, p. 13)
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Na “Filosofia da Caixa Preta”, Flusser observa um fenômeno relacionado à forma como o homem se relaciona com a imagem, que ele chama de idolatria – e que tem seu apogeu durante o segundo milênio a.C. O homem, ao invés de se servir das imagens em função do mundo, passa a viver em função de imagens. Não mais decifra as cenas da imagem como significados do mundo, mas o próprio mundo vai sendo vivenciado como conjunto de cenas. Tal inversão da função das imagens é idolatria. (FLUSSER, 1985, p. 7-8)
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Comunicação Verbal
O desenho do signo, aos poucos, foi se desencarnando da imagemfigura para adquirir um valor fonético, abstrato, universal. (DERDYK, 2007, p. 23)
Na semiótica, os elementos que compõem a escrita são chamados de signos convencionais:
Os signos convencionais não tem nenhuma relação direta com o objeto significado. […] Os signos convencionais se baseiam em um acordo – entre os portadores de determinada língua – que compreende tanto a língua falada como as comunicações por gestos, códigos de vestuário ou emblemas. (NIKOLAJEVA & SCOTT, 2011, p. 13)
Para Flusser (1985), a criação da escrita foi uma resposta à idolatria (adoração da imagem).
Surgiram pessoas empenhadas no “relembramento” da função originária das imagens, que passaram a rasgá-las, a fim de abrir a visão para o mundo concreto escondido pelas imagens. O método do rasgamento consistia em desfiar as superfícies das imagens em linhas e alinhar os elementos imaginísticos. Eis como foi inventada a escrita linear. Tratava-se de transcodificar o tempo circular em linear, traduzir cenas em processos. (FLUSSER, 1985, p. 8)
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Figura 9 – Trecho extraído de “Desvendando os Quadrinhos”, de Scott McCloud, que ilustra o funcionamento das palavras.
Figura 10 – Evolução de ideogramas no idioma chinês.
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Narrativa
Em “O Narrador”, Walter Benjamin discute o desaparecimento, na cultura moderna, da figura que intitula o ensaio. O narrador é aquele que detém a “faculdade de intercambiar experiências” (BENJAMIN, 1994, p. 198). Diferentemente do romancista, que se segrega e que tem o livro como instrumento de veiculação da sua mensagem, este outro retira suas histórias daquilo que ele vê e ouve, e as transmite oralmente. Seu ouvinte, por sua vez, irá absorver e recontar a história, incluindo agora suas próprias percepções. Benjamin aponta vários fatores que resultaram na morte da narrativa. Um dos fatores mais importantes foi a invenção da imprensa por Gutenberg. A prensa de tipos móveis democratizou, paulatinamente, o acesso aos livros à população e permitiu a consolidação do romance como gênero; ademais, foi responsável pelo surgimento de uma nova forma de comunicação: a informação. Cada manhã recebemos notícias de todo o mundo. E, no entanto, somos pobres em histórias surpreendentes. A razão é que os fatos já nos chegam acompanhados de explicações. Em outras palavras: quase nada do que acontece está a serviço da narrativa, e quase tudo está a serviço da informação. Metade da arte narrativa está em evitar explicações. [...] O extraordinário e o miraculoso são narrados com a maior exatidão, mas o contexto psicológico da ação não é imposto ao leitor. Ele é livre para interpretar a história como quiser, e com isso o episódio narrado atinge uma amplitude que não existe na informação. (BENJAMIN, 1994, p. 203).
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Voltando a Flusser, podemos estabelecer uma relação entre a narrativa e a sociedade idólatra, assim como o romance e a informação estariam associados ao fenômeno da textolatria.
Figura 11 – Edição russa do livro “Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk”, de Nikolai Leskov. Para Walter Benjamin, Leskov é uma referência de narrador.
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Mito
Pela definição de Vernant (2002, p. 200), mito1 é a crença naquilo que é contado por meio das narrativas transmitidas oralmente (apud RODRIGUES, 2009). Portanto, as considerações feitas por Benjamin sobre a narrativa podem ser aplicadas ao mito. Antes do desenvolvimento do pensamento científico, o ser humano recorria ao mito para tentar entender o mundo. Lévi-Strauss (1978, p. 20) revela que esse mecanismo de compreensão “dá ao homem a ilusão, extremamente importante, de que ele pode entender o universo e de que ele entende, de fato, o universo.” Cortes examina as diferenças entre o conhecimento na cultura moderna e na cultura primitiva:
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Para o homem moderno, os eventos podem ser explicados através de relações causais perceptíveis. Já o homem primitivo, que tem uma visão mágica do mundo, explica tais eventos através de termos não-perceptíveis, sobrenaturais. (CORTES, 2008, p.3)
1. Segundo o antropólogo Godelier (1981, p. 190 apud Rodrigues, 2009), “um mito não é um ‘mito’ senão para aqueles que não acreditam nele”. Para fins de estudo, mantive o termo “mito” neste relatório, mas o exclui do livro ilustrado. O uso dessa palavra poderia reforçar a estereotipificação do indígena como ser exótico e distante. Minha ideia para esse trabalho é justamente o contrário: aproximar culturas.
Além disso, o mito é uma ferramenta política e social, como explica Boechat (2008, p. 19): Há uma importância essencial da mitologia na organização da vida diária dessas culturas [sociedade tribais]. Sem o mito, essas sociedades simplesmente não se organizariam. O nascimento, a infância, o casamento, a caça e a guerra, o comércio e a morte, todas as atividades, enfim, são ritualizadas e mitologizadas para ganharem sentido. (apud CORTES, 2008, p. 3)
Entretanto, não é apenas o caráter social e antropológico que o estudo do mito ajuda a explicar. Podemos também contemplar esse tipo de narrativa através de uma perspectiva psicológica, analisando seus símbolos e suas reincidências em grupos sociais distintos. Carl Jung, que foi o responsável por trazer esse assunto para a Psicologia Analítica, “pôde vislumbrar uma conexão universal entre os homens, uma herança psicológica construída ao longo da evolução humana.” (CORTES, 2008, p.2) Jung denomina a herança psicológica universal como inconsciente coletivo. Ele é composto pelos arquétipos (tipos arcaicos) que aparecem na consciência como imagens simbólicas (CORTES, 2008, p.2). No mito que me propus a analisar é possível identificar alguns arquétipos.
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História do livro
Figura 12 – Detalhe de uma cópia do livro Diamond Sutra, de 868 d. C., frequentemente citado como o livro mais antigo e completo de que se tem registro no mundo. A inscrição é lida verticalmente e as ilustrações foram impressas por meio de blocos de madeira. (HASLAM, 2007, p. 10)
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Os tipos de suporte para a escrita (e ocasionalmente, para as ilustrações que a acompanhavam) foram mudando ao longo do tempo: os sumérios usavam tijolo de barro; os indianos, folhas de palmeiras; os maias e os astecas usavam um material macio existente entre a casca das árvores e a madeira; os romanos usavam tábuas de madeira cobertas com cera (CALDEIRA, 2002). O papiro, fabricado a partir de uma planta de mesmo nome, seria inventado em torno de 2200 a.C. pelos egípcios. Seus manuscritos eram escritos em rolos (volumen) que podiam chegar a 20 metros de comprimento. Mais tarde, o pergaminho, cuja origem é animal (pele de carneiro), substituiria o papiro. (CALDEIRA, 2002). Segundo Caldeira, o papel seria inventado na China durante o século 2. Nesse mesmo período, também surge o codex (REIMÃO, 2004), o formato de livro que permanece até hoje. Em 1150, os árabes instalariam a primeira fábrica de papel da Espanha. A popularidade desse material cresceria durante o final da Idade Média (CALDEIRA, 2002).
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Com a invenção da prensa de tipos móveis no século XV por Johannes Gutenberg, uma nova era se iniciava para os livros, cuja produção, até então, dependia do trabalho manual e exaustivamente longo dos copistas. Segundo Sandra Reimão (2004), o desenvolvimento de uma maquinaria que encurtasse o tempo de cópia do livro foi resultado das mudanças que a sociedade medieval estava passando no momento. A revolução por que passou a Europa Ocidental entre os séculos X e XII, com o florescimento das cidades (em contraposição ao espaço fragmentado geográfica e politicamente da Baixa Idade Média), traz consigo a divisão do trabalho e o surgimento das escolas urbanas e das primeiras universidades — com esse novo sistema de ensino/ saber há profundas alterações nas funções e nas formas do livro. (REIMÃO, 2004)
Os livros eram tratados como bens econômicos durante a Alta Idade Média, como atesta Le Goff:
Os magníficos manuscritos da época são obras de luxo.(...) Mais ainda, eles não são feitos para serem lidos. Destinam-se a engrossar os tesouros das igrejas e dos reis. Era um bem econômico, mais do que espiritual(...) Os livros não são considerados de modo diferente do das baixelas preciosas. (Apud REIMÃO, 2004)
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Figura 13 â&#x20AC;&#x201C; Biblioteca da Catedral de Hereford na Inglaterra. Por serem muito valiosos, os livros costumavam ser acorrentados Ă estante das bibliotecas medievais.
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Com o aparecimento das universidades, nos últimos séculos da Era Medieval, aumentou-se a demanda por esses objetos. Eles agora seriam finalmente utilizados com a finalidade de leitura. Entretanto, os livros só ficaram mais acessíveis séculos depois:
A partir do século 19, aumenta a oferta de papel para impressão de livros e jornais, além das inovações tecnológicas no processo de fabricação. O papel passa a ser feito de uma pasta de madeira, em 1845. Aliado à produção industrial de pasta mecânica e química de madeira - celulose - o papel deixa de ser artigo de luxo e torna-se mais barato. (CALDEIRA, 2002)
No século XXI, com a evolução dos dispositivos eletrônicos, temos acesso à leitura pelos e-books (livros eletrônicos). Sua interface, embora digital, mimetiza o livro convencional – até o ato de virar a página é simulado. Debate-se se o livro impresso está sujeito a desaparecer devido a esse novo concorrente. No entanto, acredito que a experiência material com a obra é muito importante na nossa relação com o objeto. Embora traga versatilidade para nossa vida, o e-book falha por não permitir que o leitor explore seus outros sentidos, que não o da visão.
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Figura 14 â&#x20AC;&#x201C; Tipos mĂłveis de chumbo fundido.
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Livro Ilustrado: Definição
Segundo Sophie van der Linden, livros ilustrados são
obras em que a imagem é espacialmente preponderante em relação ao texto, que aliás pode estar ausente. A narrativa se faz de maneira articulada entre textos e imagens. (LINDEN, 2014, p. 24)
Para fins didáticos, serão adotadas, neste trabalho, as terminologias semióticas propostas por Nikolajeva e Scott:
O caráter ímpar dos livros ilustrados como forma de arte baseiase em combinar dois níveis de comunicação, o visual e o verbal. Empregando a terminologia semiótica, podemos dizer que os livros ilustrados comunicam por meio de dois conjuntos distintos de signos, o icônico e o convencional. (NIKOLAJEVA & SCOTT, 2011, p. 13)
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História do Livro Ilustrado
Até a Baixa Idade Média, o texto e a ilustração do codex eram então reproduzidos de maneira integrada, copiados pela mesma pessoa. As iluminuras que eram desenhadas pelos copistas tinham finalidade decorativa. Podemos entender também que, para os amanuenses, o ato de copiar o texto estava mais próximo da atividade de desenhar – mas um desenhar mecanizado, desprovido de reflexões – do que da de escrever. Era uma tarefa braçal, como Le Goff nos explica melhor: os monges que os escrevem laboriosamente nos scriptoria dos mosteiros não se interessam senão muito secundariamente por seu conteúdo. O essencial para eles é a aplicação devotada, o tempo consumido, a fadiga sentida em escrevê-los. É hora de penitência que lhes valerá o céu. (LE GOFF. Apud REIMÃO, 2004)
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Figura 15 – Iluminura de Cristo em Majestade do Bestiário de Aberdeen. As iluminuras eram pinturas decorativas executadas nos códices de pergaminhos medievais. Originalmente, apenas as pinturas feitas com ouro ou prata poderiam ser chamadas de iluminuras. Figura 16 – Gravura de um monge copista trabalhando no scriptorium.
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Figura 17 – Xilogravura de um pavão feita por Thomas Bewick, que se encontra no livro “A History of British Birds, Volume I (Land Birds)”, de 1797.
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A técnica de xilogravura, que surgiu provavelmente na China no século VI, também foi utilizada para a produção de livros na Europa medieval. O texto e a ilustração eram produzidos na mesma matriz, não havendo separação entre os elementos textuais e não-textuais. Porém, quando os livros começaram a ser impressos através dos tipos móveis, por uma questão técnica, estas etapas se tornaram distintas. A xilogravura e a gravura em metal se tornaram as principais técnicas de reprodução de imagens. A xilogravura era usada antes da invenção do tipo móvel e continuou a ser empregada pelos primeiro tipógrafos para fins de ornamentação e também de ilustração. No final do século XVI, porém as calcografias eram usadas para ilustrar livros de qualidade superior e as xilogravuras foram relegadas a obras mais populares até o final do século XVIII. Na Inglaterra, Thomas Bewick (1753-1828), famoso por ilustrações de história natural, revolucionou a técnica de xilogravura usando um cinzel (uma ferramenta afiada de metal) no sentido dos veios para gravar seus desenhos em madeira, combinando a conveniência e o baixo custo da xilogravura com a maior delicadeza do processo a entalhe. (MALLALIEU, 1999, p. 602)
Figura 18 – Matriz que, provavelmente, originou a gravura da figura 17.
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No final do século XIX, seria criada a técnica de impressão offset, que delimitou um novo paradigma na forma de se enxergar o design gráfico. Por meio do fotolito, agora o texto e as imagens poderiam ser pensados em conjunto. Além disso, as imagens poderiam apresentar uma maior fidelidade ao real, devido à redução do tamanho das retículas que, pelo recurso do meiotom, gerava as gradações de sombra e luz da imagem.
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Ă?ndios Kaingang
A comunidade Kaingang
Figura 19 – Índios Kaingang de Ivaí (RS). Foto: Vilaine Capellari, 1994.
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Figura 20 – Mapa das reservas Kaingang.
O povo indígena escolhido para ser estudado foi o Kaingang, que atualmente se localiza nos estados de São Paulo e do sul do Brasil (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul). Os Kaingang pertencem ao grupo linguístico Jê, cuja língua é homônima ao nome da tribo, e são um dos povos indígenas mais numerosos do Brasil – segundo o Censo brasileiro de 2010, os Kaingang são hoje o terceiro maior povo indígena em tamanho de população. Eles se dividem em hordas e sua organização social é explicada pelo mito de origem dos Kaingang, que conta como esses diferentes núcleos familiares, antes inimigos, se firmaram como um grupo. Por esse motivo, nas palavras de Ehrenreich, o mito Kaingang é uma “espécie de tradição política” (apud SCHADEN, 1959, p. 112).
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Mito de origem
Esse mito remonta a um período distante, em que
Divididos em certo número de hordas mais ou menos errantes, que viviam em hostilidade, esses índios estavam longe de desenvolver um sentimento de coesão tribal; pelo seu padrão de comportamento, as várias hordas antes pareciam condenadas a exterminar-se mutuamente.” (SCHADEN, 1959, p.104)
As hordas que protagonizam a história são os Kaingang, Kamé e Kaiurucré2 – além dos Curutons que, segundo Shaden (1959, p. 108), não estavam presentes na feição primitiva do texto. O mito transcrito a seguir foi narrado pelo Cacique Arakxô a Telêmaco Borba, em 1908.
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2. Esta palavra aparece com muitas variações de grafia: Kaĩru, Kainru, Kainrukré, Kanhru, Kanieru etc. Optou-se por grafar, neste trabalho, a patrimetade como “Kaiurucré”. A terminação kré, segundo Silva (2002), significa descendência.
“E
m tempos imemoráveis, deu-se um dilúvio que cobriu a terra inteira, habitada de nossos antepassados. Somente o cume da serra Krinjinjimbé (Serra do Mar) sobressaía das águas diluviais. Os Kaingang, Kaiurukré e Kamé nadavam na direção dela, cada um com um luminoso tição entre os dentes. Os Kaiurukré e os Kamé cansaram, afundaram-se e pereceram; suas almas foram habitar o interior da montanha. Os Kaingang e uns poucos Curutons atingiram com dificuldade o cume da serra, onde permaneceram uns no chão, outros nos ramos das árvores porque não acharam mais lugar. Lá passaram uns dias sem alimento e sem que as águas baixassem. Já esperavam a morte, quando ouviram o canto das saracuras que traziam cestinhos de terra, que deitavam nas águas. Assim, as águas foram recuando devagar. Os Kaingang clamavam às saracuras que se apressassem. Estas redobraram suas vozes e pediram aos patos que as ajudassem. Em pouco tempo conseguiram formar uma planície espaçosa no monte, que dava bastante campo aos Kaingang, com exceção daqueles que se refugiaram nas árvores. Estes foram transformados em macacos e os Curutons em macacos urradores. Desaparecida a inundação, os Kaingang estabeleceram-se nas proximidades da serra do mar. Os Kaiurukré e os Kamé , cujas almas moravam no interior da serra, começaram a abrir caminhos. Depois de muitos trabalhos e fadigas, uns puderam sair de um lado, os outros do outro. Na abertura de onde saíram os Kaiurukré,
teve sua nascente um belo arroio e lá não havia pedras; daí veio que eles têm os pés pequenos. Pelo contrário o caminho dos Kamé levava sobre terreno pedregoso, daí eles terem os pés compridos. Na noite em que tinham saído da abertura da serra, acenderam fogo e Kaiurukré formou de cinzas e carvão tigres e lhes disse: ide e devorai homens e animais! E os tigres se foram rugindo. Não tendo mais carvão para pintar, fez de cinzas as antas e disse-lhes: ide e comei folhas e ramos! Kaiurukré estava outra vez a formar um animal; faltavam a estes ainda os dentes, a língua e umas garras quando apontou o dia. Não tendo mais forças de dia, pôs-lhe uma vara na boca e disse-lhe: não tendo dentes, vive de formigas! Isto é a razão porque o tamanduá é um animal não acabado e imperfeito. Na noite seguinte continuou e formou outros animais, entre eles as abelhas boas. Kamé também fez animais, porém diversos, para combater aqueles. Assim ele fez os leões americanos, as cobras venenosas e as vespas. Acabado este trabalho, marcharam e foram se unir aos Kaingang. [...] Depois de terem chegado a uma grande planície, reuniram-se e aconselharam-se como deviam casar os filhos. Casaram primeiro os Kaiurukré com as filhas dos Kamé, e vice-versa. Quando porém, restavam ainda muitos jovens, casaram-nos com as filhas dos Kaingang. E daí veio que os Kaiurukré, os Kaingang e os Kamé são parentes e amigos.” (TESCHAUER. Apud JAHN, TETTAMANZY, FREITAS, 2007, p. 3).
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Dualidade Kaiurucré/Kamé
Este texto conta como foi estabelecida a forma de organização da tribo, baseada na exogamia (casamento entre membros de hordas diferentes) e na patrilinearidade (os descendentes seguem a linha paterna). São apresentados os irmãos gêmeos Kaiurucré e Kamé e suas respectivas hordas, nomeadas a partir deles. Cada um dos irmãos e, consequentemente, o grupo familiar a que pertencem, são antagônicos e complementares entre si. Essas características, porém, não se limitam ao âmbito social, como expõe Silva (2002):
as patrimetades Kaingang representam apenas um aspecto – o sociológico – de toda uma concepção dual do universo. Todos os seres, objetos e fenômenos naturais são divididos em duas categorias cosmológicas, uma ligada ao gêmeo ancestral Kamé, e a outra vinculada ao gêmeo ancestral Kainru. Principalmente, as metades são percebidas pelos Kaingang como cosmológicas, estando igualmente ligadas aos gêmeos civilizadores, os quais emprestam seus nomes a elas. (SILVA, 2002, p.190).
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A seguir, uma lista de características que definem os gêmeos ancentrais Kamé e Kaiurucré (SILVA, 2002, p. 191):
KaiUrucRÉ
conforme o mito, saiu primeiro do chão; lua, um ex-sol; noite; corpo fino, peludo, pés pequenos; frágil, menos forte; feminino; ligeiro em movimentos e resoluções; menos persistentes; leste; baixo (parte de baixo); pintura corporal redonda, “fechada”; orvalho, umidade; mudança; agilidade; lugares altos; seres e objetos redondos, fechados; seres e objetos malhados, manchados, leves, delgados; sete sangria (Simplocus parviflora).
Kamé
conforme o mito, saiu depois do chão; sol, símbolo de força e poder; dia; corpo grosso, pés grandes; mais fortes; masculino; vagaroso em movimentos e resoluções; persistentes; temperamento feroz; oeste; alto (parte de cima); pintura corporal em faixas, linhas, “aberta”; dureza; permanência; lugares baixos; seres e objetos compridos, riscados; seres e objetos mais pesados e grossos; pinheiro (Araucaria angustifolia).
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Grafismo
Os grafismos do povo Kaingang (kong-gãr) encontram-se disseminados em uma grande variedade de suportes: dos trançados, tecidos, utensílios confeccionados em cabaças, e troncos de pinheiros até a pele dos Kaingang (SILVA, 2001). A linguagem gráfica desse grupo indígena reafirma o conceito de dualidade presente na cosmologia Kaingang. Segundo Nimuendajú, os dois heróis, a que ele denomina Kañeru e Kamé, se distinguem quanto à pintura com que se enfeitam: o primeiro ostenta pontos, e o segundo traços. (SCHADEN, 1959, p.109)
Para designar os elementos compridos e que, portanto, relacionam-se à patrimetade Kamé, os Kaingang usam a palavra “téi”. Para os elementos fechados ou redondos, relativos a Kaiurucré, é usada a palavra “ror”. Quando ocorre a mistura entre os dois padrões (geralmente no grafismo), usa-se o termo “iãnhiá”.
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Figura 21 – Pintura com grafismos Kaingang nos braços. Foto: Divulgação UPF. Figura 22 – Mulher pintando o corpo de uma criança durante oficina da Comunidade Kaingang de Ronda Alta. Foto: Camila Domingues/Palácio Piratini. Figura 23 – Exposição “Eg Rá: Nossas Marcas”, em 2013, no Museu Histórico Regional (MHR), Passo Fundo/RS. Foto: Priscila Batistel Pulga.
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Pintura Corporal
Kamé: A pintura corporal dessa patrimetade é grafada com traços – motivos compridos – de cor preta, cuja tinta é extraída do carvão e do jenipapo (FAGUNDES & FARIAS, 2012) Kaiurucré: A pintura corporal dessa patrimetade é grafada com círculos ou manchas – motivos redondos – com tinta de cor avermelhada, extraída da casca da batata-doce, da argila ou do urucum. (FAGUNDES & FARIAS, 2012)
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Figura 24 – Acervo Pessoal de Kimiye Tommasino. Pinturas corporais cerimoniais dos Kaingang. Representação das metades ciânicas da origem do povo Kaingang.
Kamé
Nome da pintura: Ra taktéi Motivo: Dois riscos
Nome da pintura: Nhétkymby Motivo: Traços curvos nos cantos da boca
Nome da pintura: Ra ror Motivo: Um ponto
Nome da pintura: Ra róng ror Motivo: Três pontos
Nome da pintura: Ra ndor Motivo: Circunferências
Kaiurucré
Nome da pintura: Ra téi Motivo: Um risco
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Figura 25 – Pinturas corporais realizadas no Ponto de Cultura Kanhgág Jãre (Raízes Kaingáng), na Terra Indígena da Serrinha, em Ronda Alta.
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Figura 26 – Menina com pintura nhétkymby. Foto: Odan Jaeger.
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Figura 27 – Jovem índia tendo o rosto pintado na grafia ra róng ror. Frame do documentário “Vida Kaingang” (2014) , dirigido por Nelson Akira Ishikawa.
Figura 28 – Dois jovens Kaingang que possuem a pintura ra taktéi no rosto. Frame do documentário “Vida Kaingang” (2014) , dirigido por Nelson Akira Ishikawa.
Figura 30 – Carimbo de taquara kaingang. Foto: Vladimir Kozak, 1955.
Figura 29 – Homem Kaingang com a pintura ra taktéi no rosto e usando um cocar durante ritual. Frame do documentário “Vida Kaingang” (2014) , dirigido por Nelson Akira Ishikawa.
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cestaria
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As cestas são, tradicionalmente, usadas pelos Kaingang como utensílios domésticos, para a coleta de frutas e sementes e, no contexto atual, como produto de comercialização – porquanto o artesanato é uma das principais fontes de renda desse povo (FAGUNDES & FARIAS, 2012). As principais matérias-primas para os trançados Kaingang são cipós, taquaras, criciúma, embira, folhas de palmeira, urtiga e fio vegetal retirado do butiazeiro (SILVA, 2001).
Morfologia vasiforme e grafismo kre téi
Morfologia paneiriforme de boca redonda com tampa e grafismo kre ror
Morfologia paneiriforme de boca quadrada (kré kõpó) e grafismo kre téi
Morfologia bolsiforme (kre iyr) e grafismo misturado iãnhiá
Figura 31 – Níveis morfológico e gráfico da cestaria Kaingang (CAVALCANTE, 2014, p. 112)
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Produção
Referências Visuais
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Apresento aqui alguns artistas que tive como referência para o projeto. Esta seleção se baseou, principalmente no modo como os sinais gráficos foram usados para expressar sentimento, movimento e espacialidade.
Edvard Munch
FIgura 32 – “O grito” (1895). Figura 33 – “Ansiedade” (1896). Ambas litogravuras de Edvard Munch.
Edvard Munch, um dos maiores expoentes do movimento expressionista, foi um pintor e gravador norueguês nascido em 1863 e morto em 1944. Sua obra me inspira pela carga dramática transmitida através dos recursos gráficos das linhas sinuosas, que parecem emanar das figurais centrais de suas pinturas e gravuras. Para ilustrar essas ideias, escolhi duas litografias (cujas versões em pintura são mais famosas): “O Grito”, de 1895, e “Ansiedade”, de 1896. A paisagem, assim como as figuras humanas, apresentam-se distorcidas, de forma a recriar a visão do eu lírico. A estética desse mundo imaginário – que nas obras de Munch são frutos de sentimentos e sensações – foi uma inspiração para o meu projeto, que pretende ambientar o leitor a um plano mítico e subjetivo.
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Yuko Shimizu
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Yuko Shimizu é uma ilustradora japonesa residente em Nova York. Seus desenhos reúnem o tradicional e o moderno, através da combinação do método da pintura em nanquim com o da colorização digital. Devido à sua origem, as ilustrações de Shimizu apresentam uma clara influência da cultura japonesa. Ela recorre muitas vezes aos fenômenos naturais em suas composições e faz referências aos cânones da arte nipônica. Mas também é incorporado muito da estética ocidental, com imagens de forte apelo comercial. Sua obra assimila características da pop art, devido ao uso de cores vivas e à investigação da figura humana. Essa mistura resulta em um conjunto de obras bastante peculiar, que rompe as expectativas tanto do povo ocidental quanto do oriental. Assim como no trabalho de Shimizu, quero estabelecer, de forma construtiva, a interação entre culturas distintas.
Figura 34 – Processo de criação de uma ilustração de Yuko Shimizu.
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Stanley Donwood
Figura 35 – “Emergency Stabilization” (2014), de Stanley Donwood. Serigrafia. Figura 36 – “Spreading Contagion” (2014), de Stanley Donwood. Serigrafia.
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Stanley Donwood é um artista inglês, mais famoso pela autoria das capas de álbuns da banda Radiohead. O conjunto da obra de Donwood reúne várias técnicas e estilos diferentes, mas a série de gravuras feitas a partir da serigrafia (figuras 35 e 36) e da lineogravura (figuras 37 e 38), particularmente, chamaram-me a atenção devido ao grafismo vibrante e à temática das forças naturais.
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Figuras 37 e 38 – Projeto gráfico de Stanley Donwood para o encarte do álbum “Amok” (2013) da banda Atoms For Peace. A imagem usada para ilustrar o CD e o LP foi retirada de “Los Angeles”, um trabalho anterior do artista, realizado pela técnica da lineogravura.
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Fernando Vilela
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“Lampião & Lancelote” (2006), do artista plástico Fernando Vilela, é uma referência de livro-objeto para este trabalho. A história se trata do duelo inusitado entre uma figura histórica brasileira, o cangaceiro Lampião, e um personagem da lenda do Rei Artur, o cavaleiro medieval Lancelote. Para acentuar a origem de cada herói, o autor recorre a recursos estilísticos literários: a poesia do cordel e a prosa das novelas de cavalaria; e plásticos: as técnicas de carimbo e de xilogravura). O uso das páginas cobre e prateada é outro meio de reafirmar a identidade dos personagens Lampião e Lancelote, respectivamente — em referência aos tons dos trajes por eles usados — além de conferir uma estética especial ao livro. O formato do livro, com o lado maior da folha no sentido horizontal (formato paisagem), torna a narrativa mais cinematográfica, permitindo a imersão do leitor aos mundos apresentados.
Figuras 39, 40 e 41 – Spreads do livro “Lampião e Lancelote”, de Fernando Vilela (Cosac Naify, 2006). Figura 42 – Capa do mesmo livro.
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Interface e superfície
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Para uma melhor compreensão do ato de desenhar, Isoda (2013) separa os materiais usados para a produção do sinal gráfico em duas categorias: a do elemento que risca e a do elemento a ser riscado. Nessa concepção, o elemento que risca “é aquele que, a partir do gesto humano, vai servir de meio para a ação geradora do sinal gráfico”. (ISODA, 2013, p. 19). Como exemplos, Isoda cita o próprio corpo humano (quando, por exemplo, desenha com o dedo na areia) ou objetos, aos quais ele denomina interface, que seriam lápis, caneta, estilete, etc. O elemento a ser riscado é caracterizado por Isoda como uma superfície que é ou tende a ser plana. Para ele, a superfície também pode ser chamada de substrato, que é o “elemento que serve de base para o fenômeno” (ISODA, 2013, p. 19). Ele exemplifica essa categoria com o papel, muro, chão, pele, placa de metal e placa de madeira. Embora Isoda reconheça que tal terminologia não seja conclusiva — pois existem exceções, tal como a colagem — vou usá-la para explicar meu processo de criação.
Interface
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Na realização dos meus desenhos, ainda que eu tenha testado outras técnicas, como giz pastel e colagem, o uso da tinta como interface sempre pareceu mais apropriado para esta narrativa, porquanto a arte indígena apresenta uma forte relação com a pintura. Usando na maior parte das ilustrações o pincel para sumi-ê, eu consegui determinar traços de diversas espessuras e desenvolver uma linguagem que contemplava minhas expectativas. Para me aproximar mais da cultura indígena, também me aventurei a pintar com os dedos, porém o resultado não foi satisfatório: a tinta nanquim impregnava mais nas minhas mãos do que no próprio papel. Além da tinta nanquim de cor convencional (preta) que utilizei sobre folhas brancas, também fiz uso do guache branco ao pintar sobre folhas pretas. Mesmo com a posterior edição de imagem, é possível perceber a diferença entre uma tinta e outra. A escolha por um trabalho totalmente em preto e branco provém, em primeiro lugar, da observação do uso tradicional de cores na pintura corporal Kaingang. Como já foi mencionado aqui, eles se pintam com pigmentos vermelho e preto, os quais são extraídos da natureza.
Nos primeiros experimentos, em que convencionalmente me reservei a usar apenas o nanquim preto sobre a folha branca, percebi que o uso de duas cores opostas3 seria um recurso estilístico eficiente para reforçar o caráter de dualismo da cosmologia Kaingang. Achei, então, que o uso do vermelho era dispensável nas ilustrações. Ele encontra-se presente apenas no título do livro, de forma a garantir destaque para a palavra. Outro ponto para não adicionar mais cores ao trabalho seria a dificuldade que isso poderia acarretar ao processo de reprodução do livro, visto que eu planejava usar alguma técnica de gravura, que costuma ser um procedimento, por si só, bastante demorado. Também fiz uso da tinta branca sobre o papel preto. Apesar dos Kaingang não fazerem uso de pigmentos brancos, tal decisão foi determinada por outro fator, explicado mais adiante. Mesmo sendo adotada por uma necessidade alheia à ilustração, tal medida conferiu ao trabalho uma maior dinamicidade e tensão à narrativa, além de ajudar a enfatizar, mais uma vez, o antagonismo presente na concepção de mundo dos Kaingang. Todo esse processo de escolhas estilísticas descrito aqui ocorreu de maneira bastante intuitiva. Por meio de reflexões e conversas com a minha orientadora, porém, fizeram bastante sentido para mim.
3. Cientificamente, não é correto chamar o preto e o branco de cor. Ainda assim, eles encontram-se em condição de oposição, pois o preto resulta da ausência da luz, enquanto o branco é a junção de todas as cores do espectro de luz.
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Superfície
Minha pesquisa por superfícies não foi, na verdade, a mais abrangente em termos de cores e texturas. A maioria das minhas ilustrações foram feitas em folhas brancas no formato A3 com gramatura alta para receber a tinta. Porém, como o produto final deste trabalho consistia em um livro, minhas pinturas tiveram que ser pensadas levando em consideração seu formato. Sobre esse tema, Linden (2014, p. 52) discorre: O livro ilustrado contemporâneo oferece grande variedade de formatos. A organização das mensagens a serviço da página ou da dupla, bem como o tamanho e a localização das imagens e do texto, estão solidamente articulados com as dimensões do livro. Por essa perspectiva, o formato se torna determinante para a expressão.
Portanto, a questão da superfície no meu trabalho precisou ser duplamente pensada. A escolha pelo formato horizontal (dito à “italiana”) ocorreu de forma natural. Minha tendência, no momento de criação dos desenhos, foi posicionar as folhas no formato paisagem. Acredito que o fator que me influenciou a tal atitude foi a narrativa da história que, apesar de ter dois humanos como protagonistas, apresenta a natureza como mais um personagem.
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Dessa forma, faria mais sentido mostrar ao leitor a amplitude daquele ambiente, a linha do horizonte e outras características que alguém proveniente de uma metrópole como São Paulo (como eu) tem perdido contato. A princípio, eu pretendia fazer o livro em tamanho A4, devido à minha familiaridade com o formato. Por causa da encadernação, as folhas são impressas espelhadas. No caso de um codex em formato retrato e A4, por exemplo, imprime-se duas páginas A4 em uma folha A3. Em um codex de mesmo tamanho, mas com o lado maior da folha na horizontal, as páginas são impressas em uma A2, obtendo-se dois pares de páginas espelhadas. Quando fiz a primeira impressão do meu boneco, tive dificuldade em encontrar gráficas que imprimissem A2 frente e verso. Por isso, fiz o teste com o A5, com páginas impressas em folha A3. O resultado ficou bastante satisfatório. Ainda que tivesse curiosidade em testar o tamanho A4, preferi não fazê-lo pois, tendo em mente reproduzir o material na serigrafia, percebi que quanto maior fosse a folha, mais difícil e caro seria o processo.
Figura 43 – Desenho esquemático: folhas espelhadas de mesma dimensão nos formatos retrato e paisagem.
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Reprodução do livro
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“Assim como o pintor escolhe sua tela, o criador do livro ilustrado compõe em função das dimensões do livro.” (LINDEN, 2014, p. 52)
Em seu livro “Para ler o livro ilustrado”, Linden compara o livro e o seu criador a uma tela e o seu pintor. É necessário que ambos os autores tenham uma familiaridade com seus respectivos suportes. Para que minhas experimentações ocorressem da forma mais livre e fluida possível – e mesmo considerando que, por algum incidente, eu não pudesse participar de alguma das etapas de produção do material final – foi indispensável que eu conhecesse e dominasse o básico das técnicas de encadernação e de gravura a serem escolhidas. Esse caráter artesanal foi algo que busquei incessantemente para o meu trabalho, pois o envolvimento com todas as fases de produção do livro me dariam um embasamento técnico, que além de prolífico para uma estudante em conclusão de curso e complementar à pesquisa teórica desenvolvida aqui, também me permitiria fazer decisões de projeto mais apropriadas. Outrossim, enxergo isso como uma forma de aproximação da produção material dos povos pré-colombianos.
Acabamento: Encadernação
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Para a encadernação, uma das primeiras ideias foi usar uma costura que fosse aparente, de modo a explorar o desenho da cosedura como mais um elemento gráfico e, a partir disso, produzir algo que remetesse à arte Kaingang. Dos tipos de encadernação já conhecidos por mim, a japonesa parecia muito interessante para o projeto, pois permite uma criação infinita de geometrias na lateral da capa. Contudo, essa opção não atendia a um dos principais requisitos do meu projeto, que seria garantir a abertura das páginas em 180º e, assim, não interferir na leitura dos textos e imagens.
Figura 44 – Encadernação japonesa: ampla variedade de costuras.
Cogitei, então, trabalhar com a costura copta. Apesar de sua versão tradicional não ser geometricamente expressiva, encontrei em minhas pesquisas algumas adaptações dessa costura que poderiam ser trabalhadas para o meu caso.
Figura 45 – Costura copta tradicional.
Figura 46 – Costura copta adaptada.
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Para que o efeito visual na lombada se destacasse era importante atentar-se à escolha das cores. Era desejado que a linha para a encadernação fosse branca, pois se considerava o uso de folhas dessa mesma cor. Desse modo, seria garantido neutralidade – a cor da linha não produziria, entre as páginas, ruído na leitura da imagem ou do texto. Não obstante, o branco sobre o branco na lombada ficaria igualmente pouco visível. Decidi-me, então, por usar uma folha preta na extremidade externa de cada caderno. Assim, haveria contraste entre o papel e a costura na lombada do livro, mantendo, internamente, a monocromia na calha4 do livro (com exceção do terceiro caderno que, por questões de construção narrativa, apresenta os fólios internos pretos).
Figura 47 – Desenho esquemático do modelo de caderno que compõe o livro.
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4. Na definição de Haslam (2010, p. 21) calha é a “margem interna entre duas páginas faceadas ou margem de dobra do caderno”.
Todavia, meus primeiros estudos de encadernação não foram exitosos. Meu primeiro teste de encadernação com folhas pretas e brancas foi em formato A7. Como foi uma criação experimental, sem muito conhecimento, o resultado da costura não foi bom em relação à estrutura do livro. Não havia estabilidade entre os cadernos; era uma costura frouxa. No caso do primeiro boneco em escala 1:1, a costura pouco se destacava devido, principalmente, à pequena espessura do livro, que comporta apenas quatro cadernos. Comparando com o boneco A7, percebi como a proporção entre as dimensões de largura e comprimento em relação à espessura — que era praticamente a mesma nos dois bonecos —, mudava a nossa percepção em relação ao objeto.
Figura 48 – Boneco em formato A7 apresentando costura frouxa.
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Figura 49 – Modelos de encadernação testados.
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Então, por indicação de minha orientadora, conversei com a designer Júlia Contreiras. Formada na FAU e trabalhando na Associação Brasileira de Encadernação e Restauro (ABER), Júlia me apresentou a novas formas de costura que atenderiam às minhas exigências. Ela também me mostrou os materiais mais adequados. Entre as encadernações apresentadas, a belga e a lattice foram as que mais me interessaram. Mesmo tendo gostado muito da lattice, optei pela encadernação belga por vários motivos: a facilidade e rapidez de confecção; por permitir o uso de materiais mais rígidos; pelo fato de a capa, a contra-capa e a lombada serem independentes entre si, possibilitando a variação de cores. Diferente da copta, nesses dois tipos de costura, o miolo não fica aparente na lombada, sendo, portanto, indiferente a cor das folhas. Porém, o uso das folhas pretas foi bastante importante para o meu processo criativo.
Figura 50 – Encadernação lattice (de cima para baixo, primeiro caderno azul).
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Impressão: serigrafia
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Para Linden, “as imagens dos livros ilustrados devem ser consideradas reproduções de um trabalho original.” (LINDEN, 2014, p. 33). Portanto, a técnica de reprodução desempenha um papel importantíssimo no projeto editorial, já que atua como intermediário entre a obra original e o leitor. Para a reprodução do livro, pensei que seria mais interessante recorrer a alguma técnica de gravura do que apenas investir na impressão digital — que, apesar de ser mais rápida, perde na questão de materialidade. Alguns artistas citados como referência para o meu trabalho, como Edward Munch e Stanley Donwood, têm trabalhos reproduzidos através de gravuras (lito e lineogravura, respectivamente). Pelo resultado obtido a partir dessas técnicas, cuja linguagem era bem próxima da que eu queria para o meu trabalho, tive curiosidade em testá-las. Entretanto, tratavam-se de técnicas completamente novas para mim, que requereriam um tempo de aprendizado maior. Ademais, mesmo me baseando nos desenhos em nanquim, as imagens entalhadas perderiam o caráter espontâneo das pinturas.
Figura 51 – Aluna fazendo serigrafia no LPG. Fonte: Cândida Maria Vuolo.
A opção da serigrafia, portanto, parecia ser mais vantajosa. O processo já era conhecido por mim; a gravação pelo fotolito permite uma reprodução bastante próxima da imagem original; os materiais, em comparação às outras técnicas, são menos custosos; e o fato de haver um espaço para a execução de serigrafia e um corpo técnico perito no assunto no Laboratório de Produção Gráfica (LPG) da FAU foram os fatores que me convenceram a escolher esse método.
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EtapaS
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O processo fotográfico da serigrafia ocorre conforme os seguintes passos: • Gravação da tela: aplicação de emulsão; gravação na mesa de luz; retirada do excesso de emulsão com água. • Impressão: aplicação de fita crepe nos cantos entre o bastidor e o tecido para proteção contra tinta; colocação da tela na mesa de impressão; ajuste da folha na mesa para a imprimir no local desejado; impressão com o rodo. • Limpeza da tinta da tela com solvente e estopa. • Remoção da emulsão com removedor de emulsão e esponja.
Figura 52 – Uma das minhas telas gravada com dois pares de páginas duplas.
Figura 53 – Folhas secando logo após impressão no LPG.
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Dificuldades
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Comecei o processo de impressão na metade maio. Havia apenas um pouco mais de um mês até a defesa do TFG; os livros deveriam estar prontos até uma semana antes da banca para serem entregues à orientadora e aos convidados. Com um prazo bastante curto e um livro com uma quantidade razoável de páginas, era essencial um domínio técnico e a redução de imprevistos que pudessem atrasar o andamento do trabalho. Os fotolitos para a serigrafia seguiriam a mesma imposição de páginas das impressões digitais do boneco, em folha A3. A tela que permite trabalhar nesse formato possui dimensões de 50 x 60 cm. Dessa forma, seriam impressos dois pares de páginas duplas por tela, otimizando assim, meu tempo. Para meu livro, que contém 60 páginas, seriam necessárias 15 telas gravadas. Todavia, a grande extensão da tela traz dificuldades para o manuseio: ela exige mais força e habilidade. Na compra do material, adquiri uma tela de 90 fios, recomendada para a serigrafia em tecido. O tecido ideal para a silk screen em papel é de 110 a 120 fios, porque quanto maior o número de fios, menor a trama e, assim, melhor a definição das imagens. O motivo dessa compra foi o fato de eu achar que, sendo maior o espaço entre os fios, a tinta entupiria menos a tela. No entanto, a experiência me mostrou o contrário.
Mesmo tendo tido uma experiência prévia com a serigrafia, não lidei bem com esse processo. Já havia esquecido de algumas etapas e tive que melhorar minha habilidade manual. Também tive problemas com entupimento — situação que se agravava, segundo o técnico Ricardo do LPG, pelo uso da tinta de pigmentação branca (primeira tinta usada). Em duas semanas, ainda não tinha conseguido fazer a tiragem da primeira tela. Tendo que administrar o tempo entre a serigrafia e a redação do relatório, senti-me numa encruzilhada. A produção das tiragens estava muito lenta, ainda faltando praticamente 85% do material para ser impresso. Ademais, havia um grande número de alunos também usando o espaço e solicitando os técnicos. Nesse momento eu quase desisti de concluir o curso nesse semestre, vendo o trancamento como uma possibilidade bastante concreta. Mas felizmente, fui motivada pela minha orientadora a não adiar minha formatura. Decidi, então, por reservar apenas a capa à serigrafia e imprimir o restante do material na gráfica. A encadernação artesanal ainda foi mantida no meu projeto.
Figura 54 – Horário de atendimento para o uso do LPG quase sempre lotado.
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Produtos
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Aqui serå apresentado o desenvolvimento das ilustraçþes a nanquim e dos bonecos, os primeiros rascunhos e o resultado final.
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Figura 55 â&#x20AC;&#x201C; Primeiro boneco. Desenhos a lĂĄpis.
Figura 56 â&#x20AC;&#x201C; Boneco em formato A7, contendo ideias mantidas no produto final.
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Produto Final
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COnsiderações finais
A minha conclusão da graduação pode ser definida como um processo de auto-conhecimento. Como pessoa e como artista. Descobri que o ato de desenhar não precisa ser necessariamente penoso para ser poético. Sempre admirei trabalhos gestuais, mas nunca tinha me dado a possibilidade de eu mesma produzir algo do tipo. A escolha do tema, que trata de uma narrativa tradicional indígena, ocorreu principalmente pela minha curiosidade em conhecer outras concepções de vida e pelo caráter social – apresentar às outras pessoas uma parte da cultura brasileira, que infelizmente é silenciada. No entanto, tal imersão nessa pesquisa também foi uma forma de descobrir a mim mesma como criadora. Por se tratar de uma história mítica, que traz a sabedoria nãocientífica, tive um trabalho de resgate do meu lado mais espontâneo e livre de racionalidades. Entendi que a execução do desenho não precisa ser sofrida e atenuante, de perfeição milimétrica. É um aprendizado que também quero carregar para outras áreas da minha vida.
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A parte técnica e de planejamento, infelizmente, não ocorreu da forma que eu queria. Por não ter organizado tudo com antecedência, vi-me impossibilitada de fazer as impressões do livro na serigrafia. Foi difícil ter que, na reta final, desistir de algo desejado desde o começo. Contudo, como aluna da FAU, ter usado aquele espaço foi uma grande experiência para mim. Gostaria que o uso do LPG fosse mais incentivado na faculdade. Devido aos problemas de gestão da USP, materiais do laboratório não estão disponíveis para projetos acadêmicos não relacionados às disciplinas que tradicionalmente fazem uso do espaço, além de haver um número muito limitado de funcionários. Por isso deixo aqui esse trabalho como um motivador para que os próximos alunos venham a usar o LPG e fazê-lo mais presente na graduação.
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