TFG Livre - Centro Socioeducativo Humanizado

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CENTRO SOCIOEDUCATIVO HUMANIZADO

LÍVIA SARAIVA FREIRE Trabalho Final de Graduação



LÍVIA SARAIVA FREIRE

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CENTRO SOCIOEDUCATIVO HUMANIZADO

sob orientação da Profa Dra Zilsa Santiago

FORTALEZA 2016


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca Universitária Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

F933l

Freire, Lívia Saraiva. Livre : centro socioeducativo humanizado / Lívia Saraiva Freire. – 2017. 79 f. : il. color. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Centro de Tecnologia, Curso de Arquitetura e Urbanismo, Fortaleza, 2017. Orientação: Profa. Dra. Zilsa Maria Pinto Santiago . 1. Centro socioeducativo. 2. Medidas socioeducativas. 3. Método APAC. 4. Forma arquitetônica. I. Título. CDD 720


LÍVIA SARAIVA FREIRE

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CENTRO SOCIOEDUCATIVO HUMANIZADO

Este documento registra o processo de pesquisa e projeto do Trabalho Final de Graduação apresentado à Coordenação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo como requisito parcial à obtenção do título de Arquiteta e Urbanista pela Universidade Federal do Ceará. Aprovado em: ___/___/___

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________ Profa Dra Zilsa Maria Pinto Santiago Orientadora - DAU - UFC

__________________________________________ Profa Dr. Romeu Duarte Junior Convidado - DAU - UFC

__________________________________________ Arquiteta Bianca Aderaldo Lobo Convidada



agradecimentos Meus sinceros agradecimentos às seguintes pessoas das quais, sem a colaboração para com este trabalho, ele não se realizaria. À Deus, que é trindade, início e fim de tudo e à Maria Santíssima, meio de tudo, À minha família, minha mãe Lúcia, meu pai Francisco e meu irmão Felipe pela paciência e apoio, Ao meu namorado Francisco Neto pelo carinho, À Zilsa Santiago, minha orientadora e firme apoiadora nesse desafiante processo, Aos jovens que cumpriam medidas socioeducativas com os quais eu conheci ao longo dos últimos dois anos, pelo compartilhamento de vida e amizade, Aos professores Marcondes Lima, pelo incentivo que permanece até hoje, Paulo Cunha, pelo auxílio no sistema estrutural e Renan Cid, pela ajuda na tomada de decisões ligadas ao conforto térmico do meu projeto; Aos amigos de curso Pedro Thomé, Davi Pereira, Melina Pinheiro, Maria Eduarda Sousa, Marisa Cerejo, Gabrielle Guerreiro, Victor Lima e Larissa Coriolano, que se fizeram ainda mais próximos na elaboração deste trabalho, Às pessoas da Comunidade Católica Shalom com as quais pude compartilhar experiências, em especial, às que participam do Ministério de Promoção Humana de Fortaleza, pela acolhida e oportunidade de me levar a conhecer tantas realidades, especialmente as vividas por jovens em centros socioeducativos, Aos missionários da residência geral 1 da Diaconia da Comunidade Católica Shalom, pelo suporte e acolhida quando mais precisei, Aos missionários Vitor Aragão e Daiane Santos, pelas orações e amizade, Ao missionário e arquiteto Marcos Frate, pelo compartilhamento de ideias, Ao Padre Marcos, responsável pela pastoral carcerária na diocese de Fortaleza, pela disposição e conhecimento compartilhado, Aos profissionais que trabalham em centros socioeducativos com os quais eu tive a oportunidade de dialogar ao longo desses dois anos, visitando centros socioeducativos. Não conseguiria lembrar o nome de todos, mas, em especial, à Cecília Regina, psicóloga do Centro Socioeducativo Passaré e à Dr. Célia Santiago, diretora do centro socioeducativo Mártir Francisca. À arquiteta Bianca AderladoLobo, pelo fornecimento das plantas de centros socioeducativos de Fortaleza, que foram usados no estudo de caso deste trabalho; Às estudantes da FAU-SP Amanda Prado e Amanda Brito, pela generosidade em me enviar partes da tese do arquiteto e professor da FAU-SP Hugo Segawa. 7



A todos os jovens



sumário INTRODUÇÃO

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Apresentação

13

Experiência pessoal

Objetivo geral

Objetivos específicos

Metodologia

16 17 17 18

REFERENCIAL TEÓRICO

21

Embasamento filosófico

22

Embasamento histórico

26

Embasamento normativo 30

ANÁLISE CRÍTICA

39

Análise

45

REFERÊNCIAS DE PROJETO 47

Vestiário da praia Leighton

Obras de Luis Barragán

PROJETO

47 50

53

Critérios para escolha do local

Bairro Messejana

Terreno e entorno 54

Legislação urbanística

Fluxograma 62

Sistema construtivo e estrutural 63

Conforto Térmico 64

Diretrizes da praça 68

53

CONSIDERAÇÕE FINAIS BIBLIOGRAFIA 73 ANEXOS 76

53

58

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introdução

Apresentação O tema a ser abordado neste trabalho final de graduação consiste na criação de um centro socioeducativo para adolescentes em conflito com a lei, associado à um espaço público em seu entorno imediato como contrapartida que contribua para a melhor integração da vizinhança com o equipamento. Os centros socioeducativos de internação presentes atualmente em Fortaleza apresentam muitas características que os assemelham a prisões. No entanto, essa semelhança é incoerente à proposta pedagógica apresentada pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), documento que apresenta parâmetros para esse tipo de edificação. Assim, a proposta do novo centro surge pela análise crítica do que está sendo reproduzido em Fortaleza, do que há nas normas que regem essas estruturas e, sobretudo, no espaço possível de inovação propositiva que não foi visto até hoje na Cidade e que não conflita com uma proposta que favoreça o desenvolvimento e a reinserção desses adolescentes na sociedade.

ilustração 1 conforme apêndice

A contribuição para a boa formação dessas pessoas que ainda possuem a personalidade em desenvolvimento é de responsabilidade de todos e, quando isso não acontece, maior ainda é a responsabilidade do resgate desses indivíduos. 13


Mais do que um compromisso social, trata-se de uma responsabilidade para com a pessoa humana e com resgate de suas qualidades e reconstituição de sua dignidade, sanidade física, mental e espiritual.

Justificativa

Atualmente, Fortaleza é considerada a 35ª cidade mais violenta do mundo e a 12ª do Brasil, segundo uma pesquisa realizada anualmente pela ONG mexicana Consejo Ciudadano para la Seguridad Pública y la Justicia Penal (CCSPJP). Essas informações são baseadas no número de homicídios em relação a cada 100 mil habitantes,realizadas em cidades com mais de 300 mil habitantes que não estejam envolvidas em conflitos bélicos. Esses dados se tornam ainda mais preocupantes quando relacionados ao Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) na capital cearense. O IHA é um mapeamento da mortalidade por homicídios na faixa etária de 12 a 18 anos, por iniciativa da Unicef e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PH) em parceria com o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Rio de Janeiro (LAV-UERJ). Segundo uma pesquisa divulgada pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará no mês de junho de 2017, para cada mil adolescentes entre 12 e 18 anos, 10,94 deve ser assassinado até 2021, caso não haja mudanças de condições, com base em dados de 2014 do IHA. Isso revela Fortaleza como a capital com maior IHA do Brasil. Outra pesquisa, também relacionada ao tema, foi realizada pelo Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, resultando no relatório Trajetórias Interrompidas, lançado em junho de 2017 na Assembleia Legislativa. Com investigação de 312 casos, o total de ocorrências em Fortaleza no ano de 2005, a pesquisa revela a relação geográfica desses índices. Metade dos casos investigados ocorreram a 500 metros da casa das vítimas e 73% no mesmo bairro que residiam. De todos os casos, 44% aconteceram em 18 dos 119 bairros de Fortaleza, o que é apenas 3% do território da cidade. De acordo com o coordenador do serviço de epidemiologia da Secretaria de Saúde de Fortaleza, Antônio Lima, em reportagem a BBC Brasil, no dia 06 de junho de 2017, os mesmos bairros que apresentam alto índice de violência contra adolescentes em Fortaleza são os mesmos onde há maior número de casos de sífilis, tuberculose e gravidez na adolescência. Além disso, constatou, pela superposição do mapa da violência com outras informações geográficas, o desfavorecimento nos quesitos saúde, educação, emprego e lazer. A mesma pesquisa ainda constatou que 55% dos casos eram de filhos 14


de mulheres que foram mães na adolescência, 64% tiveram também amigos assassinados, 73% haviam abandonado a escola há pelo menos seis meses antes da morte, 55% haviam experimentado algum tipo de droga lícita ou ilícita entre a idade de 10 a 15 anos e 73% já havia sofrido algum tipo de violência por parte de policiais, conforme anuncia a mesma reportagem da BBC Brasil. Esse quadro constata a vulnerabilidade que se encontram muitos jovens no município de Fortaleza. No que diz respeito ao envolvimento de adolescentes em roubos, furtos, homicídios, estupros, dentre outras ações regulamentadas como infrações pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo Sistema de Atendimento Socioeducativo, por mais que não se tenha encontrado levantamentos que relacionem esses dados geográficos à prática também de infrações, sabe-se que: “Hoje, no Brasil, a ampla maioria dos adolescentes privados de liberdade é composta por excluídos sociais. Será impreciso afirmar que a miséria, a penúria de bens materiais, a falta de perspectivas causa o cometimento de atos infracionais. Porém, podemos concluir existir aí uma condição de vulnerabilidade.” CONTINI, KOLLER, 2002, p. 123, apud Retirado da página 1338 do artigo

O enfrentamento da violência, ainda que consista em complexas atuações de política pública, perpassa também pela efetividade da aplicação das medidas socioeducativas, aplicadas aos adolescentes em situação de conflito com a lei, uma vez que representa uma oportunidade de recuperação desse indivíduo para a sociedade. Além disso, pode vir a prevenir o cometimento de infrações ainda mais graves e a auxiliar na maior inclusão desse adolescente, seja no âmbito educacional abandonado ou debilitado e consequente inclusão profissional, seja na formação psíquica, emocional e espiritual desses adolescentes. Fortaleza conta com dez unidades de atendimento socioeducativo. Desse número total, uma é de atendimento de ambos os sexos e acolhe adolescentes por um período máximo de vinte e quatro horas, outra é exclusivamente para internação feminina e as demais são de internação exclusivamente masculina, sendo uma em regime de semiliberdade, uma em regime de internação provisória e as outras seis em regime de internação prolongada. Apesar desse número de unidades de atendimento, foi considerável o número de reportagens nos últimos dois anos denunciando superlotação no sistema. Essa situação acarretou no submissão dos adolescentes a situações de maior insalubridade e pior condição humana, dificultando a aplicação de qualquer plano pedagógico e contribuindo para tentativas de rebeliões e fugas.

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A deficiência na qualidade espacial desses ambientes compõe outro aspecto para a justificação desse tema. As semelhanças com ambientes de reclusão para adultos e a constante debilidade no atendimento de condições de conforto que sejam mais coerentes com propostas de valorização humana demonstram os desafios ainda enfrentados para o rebatimento no espaço do que é proposto pelo SINASE. Além disso, a experimentação projetual para um equipamento em que se propõe a socioeducação se faz importante, de forma a contribuir para a criação de um tipo arquitetônico cada vez mais condizente com as medidas socioeducativas, ainda uma aplicação recente no Brasil. A Arquitetura, portanto, teria o papel de facilitar ou dificultar, por meio de sua forma, o uso de atividades que condigam com as propostas de valorização humana. Isso inclui também o favorecimento à aplicação de novas metodologias no sistema socioeducativo, como é o caso de uma adaptação do método APAC, utilizado até então somente no sistema penal, mas que é uma experiência exitosa no Brasil na diminuição da reincidência ao crime. A implantação de um novo centro socioeducativo em Fortaleza como exercício projetual de arquitetura, assim como o rebatimento no espaço de características que favoreçam alternativas que melhorem a aplicação de medidas socioeducativas nesses equipamentos contribuem para a fomentação de discussões na área e propõem o incentivo à atuação mais intensa de arquitetos e urbanistas para melhor atender às necessidades de jovens em conflito com a lei. Público este que precisa, pelo maior número de favorecimentos, ser re-inserido na sociedade e ser cada vez menos alvo de condições de vulnerabilidade.

Experiência pessoal A trajetória acadêmica de cursar arquitetura e urbanismo na Universidade Federal do Ceará durante o período de 2011.2 a 2017.1 coincidiu com o aprofundamento da minha fé católica e a vivência de forte experiência com o sentido de Igreja. Esse período gerou amadurecimento profissional e pessoal, em especial, no entendimento de do papel da arquitetura de reconhecer os valores inerentes à cada pessoa humana e auxiliar no cumprimento da sua vida. Em uma disciplina de projeto arquitetônico, ministrada pelo professor Marcondes Lima, pude desenvolver um projeto com base na demanda de atender à crianças que estivessem em situação de vulnerabilidade social com base em uma experiência que eu havia tido na Casa dos Pequeninos Ronaldo Pereira. Essa instituição pertence à Comunidade Católica Shalom e atende à até cem crianças de cinco comunidades de Fortaleza.

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A experiência de ter projetado um “Centro de Promoção da Infância pela Arte” nessa disciplina contribuiu para a adoção do tema deste trabalho final de graduação de forma significativa. No entanto, a experiência de visitar constantemente jovens em centros socioeducativos ao longo desses últimos dois anos, participando da Comunidade Católica Shalom, foi o que, de fato, me instigou a contribuir, também por meio de conhecimentos arquitetônicos, no melhoramento dessa realidade em Fortaleza. O papel da arquitetura como fator contribuinte de transformações sociais perpassa pelo envolvimento do profissional com essas demandas. O enfrentamento da violência, principalmente, em realidades que atingem jovens e, em especial, a discussões a respeito da aplicação de medidas socioeducativas para jovens em conflito com a lei são assuntos que, cada vez mais, devem ser discutidos por todos os segmentos da sociedade. No entanto, por mais que esses sejam assuntos que demandam a participação de uma equipe multidisciplinar, cabe somente ao profissional de arquitetura e urbanismo propor as soluções espaciais que melhorem essas realidades. Reflexões à respeito das relações entre violência em espaços públicos e instituições que contribuem para a erradicação da mesma permearam esse processo até a elaboração de um centro socioeducativo que atendesse às normas vigentes e, ao mesmo tempo, pudesse receber uma proposta pedagógica inspirada no método APAC. Para tanto, podendo servir como uma alternativa ao Estado e aqueles que acreditam que os jovens são a prioridade de uma sociedade.

Objetivos geral • Contribuir para o debate da temática sobre os centros socioeducativos com a elaboração de um projeto arquitetônico na fase de anteprojeto de um centro socioeducativo, baseado nas normas do SINASE e inspirado nos conceitos da metodologia APAC, inserido num terreno juntamente com diretrizes de uma praça em seu entorno próximo.

Objetivos específicos • Projetar um espaço construído que possa propiciar o acolhimento, o lazer, o aprendizado, o encontro com familiares, o contato com a arte, a capacitação profissional, a vivência da espiritualidade e de outros direitos básicos, de modo a não infringir o respeito à dignidade de cada indivíduo, contribuindo para a reinserção social dos mesmos; • Apresentar uma arquitetura que favoreça a aplicação de planos pedagógicos condizentes com a valorização humana e permitam a diminuição da reincidência de jovens no sistema socioeducativo; 17


• Fomentar discussões a respeito das dificuldades do cumprimento dos direitos fundamentais de adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em centros socioeducativos em Fortaleza, visando a busca por soluções; • Alertar o poder público e a sociedade em geral sobre a importância do investimento arquitetônico, social político e econômico nesses equipamentos; • Denunciar a repercussão de conceitos arquitetônicos que mais condizem com ambientes de sentido puramente punitivo, em detrimento da busca por espaços que favoreçam a recuperação dos indivíduos para a sociedade; • Demonstrar a importância da associação de equipamentos socioeducativos à espaços públicos para o favorecimento do maior contato da comunidade com esses equipamentos; • Apresentar uma solução arquitetônica que propicie conforto térmico;

Metodologia O processo de elaboração deste trabalho pode ser dividido em três etapas. A primeira delas consiste no contato com experiências em centros socioeducativos, notícias nas mídias que dizem respeito ao tema, e leitura de textos sobre assunto, que encaminham a estruturação de uma fundamentação teórica, buscando conceitos para entendimento do tema e suas transformações ao longo do tempo. A pesquisa bibliográfica busca , portanto, o entendimento aos questionamentos levantados ao se ter uma experiência prática ligada ao tema. O segundo momento consiste na reflexão dessas informações, entendendo as suas conexões e relações de dominância, assim como suas consequências na sociedade, agrupando-as e buscando visualizar o rebatimento delas no espaço. A terceira ação consiste apresentar uma resposta que converse com os pontos relevantes encontrados a respeito da temática, de forma a ser um ponto de equilíbro entre as relações de conflito conhecidas na primeira etapa do processo.

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referencial teórico Para a melhor compreensão do tema a ser abordado, fez-se necessário o estudo de espaços de confinamento de forma geral. O intuito dessa abordagem é identificar os pensamentos que repercutem na constituição de um espaço próprio para o acolhimento de jovens em conflito com a lei, uma vez que, ao longo da história, nem sempre existiu nem a ideia de ressocialização, nem a de tipo arquitetônico próprio para atender a esse objetivo. Perpassando por influências ideológicas que tiveram forte respaldo na forma de pensar de um geração, inclusive pensadores ligados à teoria da arquitetura, em “Embasamento filosófico”, serão dissertadas brevemente algumas ideias provenientes do Iluminismo na Europa que tocam a temática da arquitetura em espaços de confinamento. Um de seus intuitos é introduzir o tópico seguinte, “Embasamento histórico”, e apresentar um contraponto com relação aos pensamentos Iluministas que levaram a um abafamento de discussões sobre a beleza na arquitetura, uma vez que Durand já afirmava que a satisfação aos olhos jamais foi o fim útil na arquitetura (DURAND 1802:15,23, apud SEGAWA, 1988) Em seguida, em “Embasamento histórico”, buscou-se identificar marcos na História que geraram mudanças tanto no conceito de presídios, quanto no de espaços de acolhimento para adolescentes. Será apresentado um paralelo entre fatos que podem ter contribuído para que haja as devidas semelhanças e diferenças entre esses dois “tipos” arquitetônicos.

ilustração 2 conforme apêndice

Esse comparativo se faz relevante, uma vez que o projeto que será apresentado posteriormente, tem como um de seus objetivos o atendimento da norma vigente que rege centros socioeducativos no Brasil e que tenha a flexibilidade de atender a um método alternativo, até então, exclusivo do sistema penal. Esta pode vir a ser uma alternativa efetiva na maior humanização das medidas socioeducativas. 21


Em ‘Embasamento Normativo”, fez-se necessário a apresentação da norma vigente no Brasil que diz respeito à aplicação de medidas socioeducativas, o seu caminho jurídico e o contexto normativo que se encontra o método alternativo que deverá ser implantado no novo equipamento.

Embasamento filosófico O século XVIII é um período marcado pela evolução de pensamentos que valorizam o homem por meio da razão. Houve consideráveis transformações tanto na forma de penalizar indivíduos, uma vez que até 1770, na Europa, as formas de punições eram entendidas como um castigo e a penalidade consistia, no maior número dos casos em humilhações e execuções públicas (SANTAYANA, 2013). Até então a permanência em espaços de cáscere não era considerado o cumprimento de uma penalidade por uma questão de justiça na sociedade, mas “um componente de manutenção do equilíbrio vigente, configurando uma solução para afastar do ambiente elementos perturbadores da ‘ordem’ e da ‘moral’: bêbados, mendigos, desocupados, desvalidos, menores abandonados, prostitutas..” (SEGAWA, Hugo, Construções de Ordem, 1988) e a retaliação pública seria uma forma de restabelecer o poder da monarquia (Michel Foucault, apud SANTAYANA, 2013) A função dos espaços de confinamento permaneciam com o sentido de separar um indivíduo do convívio social. No entanto, essas medidas eram ligadas a uma questão de ordem pública e poderiam ser aplicadas a qualquer indivíduo desestabilizador da ordem, inclusive crianças e adolescentes. Com a influência do pensamento de alguns filósofos, essa estrutura começou a mudar. Cesare Beccaria (1738 - 1794), filósofo italiano, discípulo de Montesquieu (1689 - 1755) e Rousseau (1712 - 1778) “foi um dos mais influentes pensadores por uma reformulação da questão penal” (SEGAWA, 1988), uma vez que apresentava ideias de total repúdio à pena de morte, aos julgamentos secretos, a desigualdade de tratamento pela responsabilidade por crimes de mesma natureza, dentre outras medidas que iam de encontro a um ideário de igualdade e recuperação do indivíduo para a sociedade. Em seu livro, “Del delliti e delle pene” (1764), ele apresenta a pena não como um ritual de vingança, mas como um recurso para a reeducação e a reintegração do indivíduo na sociedade (SEGAWA, 1988) e afirma que era melhor prevenir crimes do que puni-los. John Howard (1726 - 1790) também foi um importante pensador por acreditar nessa recuperação do homem por meio do trabalho, da educação e do isolamento, sendo o responsável pela organização do 22


sistema penitenciário na Inglaterra. Em seu livro, “The state of prisons” (1777), ele afirma que as prisões devem ajudar os indivíduos a se arrependerem de seus atos ao invés de unicamente puní-los. Em 1787, Dr. Benjamin Rush expressava o pensamento de que castigos públicos tendiam a deixar o homem pior e elaborou algumas medidas que poderiam ser implantadas para a diminuição do sofrimento corporal de quem se encontrasse em cárcere.Uma delas seria a melhoria das condições sanitárias (SANTAYANA, 2013). Os discursos iluministas também influenciaram a forma de se pensar a arquitetura, visto que os filósofos da ilustração questionavam o modelo de soberania representado pelas monarquias administrativas, autoritárias ou absolutas. Os séculos XVII e XVIII tiveram a repercussão de uma nova mecânica do poder emanada da formulação ilustrada. Esse novo mecanismo, de acordo com Michel Foucault, seria o poder disciplinar. “Este novo mecanismo de poder apóia-se mais nos corpos e seus atos que na terra e seus produtos. É um mecanismo que permite extrair dos corpos tempo e trabalho mais do que bens e riqueza. É um tipo de poder que se exerce continuamente através da vigilância e não descontinuamente por meio de sistemas de taxas e obrigações distribuídas no tempo.”

(Michel Foucault, 1986:187-8, apud SEGAWA, 1988)

O poder disciplinar fundamentado por Foucault estaria intimamente relacionado à revolução industrial e ao rápido aumento demográfico vivido na Europa no século XVIII e essas mudanças requeririam a racionalização produtiva que só seria atingida pela disciplina. A disciplina, antes de desempenhar um papel dominador e de poder, seria um instrumento de adestramento e aperfeiçoamento do corpo enquanto força produtora. No entanto, diante dessa nova ordem de poder, fazia-se necessário a distribuição do homem no espaço e a organização do espaço. Nesse quadro, a arquitetura teve um papel especial na prática do poder disciplinar e esse período coincide com o amadurecimento das ideias sobre tipologia arquitetônica. Não que anteriormente não se pensasse sobre alguma forma de classificação na arquitetura. Para tanto, havia os tratados arquitetônicos setecentistas que já haviam introduzido a noção de ordem arquitetônica. No entanto, pelas ideias de Durand (1760 - 1834), ideólogo da Beaux Arts e do racionalismo estrutural (Benevolo 1974 (Banham 1975 e Hitchcock 1978, apud SANTIAGO, Zilsa, 2011), a noção de tipologia 23


arquitetônica amadureceu consideravelmente, pois pregava a divisão de edifícios segundo a sua finalidade, e teve uma repercussão em toda a Europa durante o século XIX. Outro pensador responsável pelo aprofundamento da noção de tipo foi Antoine Quatremére de Quincy (1755-1849). Ele foi secretário perpétuo da Academia de Belas Artes a partir de 1816 e figurou a ideia de um dicionário da arquitetura. “Este esforço classificador foi uma das características do pensamento do século XVIII, no bojo do racionalismo, essência da ilustração” (SEGAWA, 1988). Jean Reynaud (1806 - 1863) também abraçou de tal forma os conceitos racionalistas, que elaborou um tratado que não só assinalava a importância das ordens arquitetônicas, como uma genealogia de tipos arquitetônicos, classificando-os conforme a sua função. De maneira mais complexa do que Durand, Reynaud consolidava estudos que chegavam a considerar a cidade como uma tipologia. “Da mesma maneira que os seres são criados pela mão de Deus, existe uma relação íntima entre a forma e a função; que o exterior é o resultado da composição do interior; que todas as coisas são dispostas com ordem e simplicidade; que nada de inútil venha chamar a atenção de nossas vistas; que das condições existentes nos pareçam resultar a expressão, a harmonia, a beleza; que a matéria carregue a marca do espírito que a anima…” (Reynaud 1894, apud SEGAWA 1988, pág. 28)

O conceito de beleza se modifica conforme o tempo e o pensador que o conjuga. No entanto, pode-se inferir que, a partir do Iluminismo, existiu uma tendência a desconsiderar tudo o que seria supérfluo na arquitetura ligada a um sentido de beleza desprovido de uma função e não condizente com as ideias racionalistas, como se pode inferir pela afirmação de Durand: “Seja consultando a razão, seja examinando os monumentos; é evidente que satisfazer (os olhos) jamais foi o fim da arquitetura nem a decoração arquitetônica seu objetivo. A utilidade pública e particular, a felicidade e a conservação dos indivíduos e da sociedade: estas são as finalidades da arquitetura. (..). Sua finalidade, em compondo e executando edifícios, é a de satisfazer um grande número de nossas necessidades e de nos colocar facilmente ao alcance de satisfazer todas outras necessidades.” (Durand, 1802: 15, 13, apud SEGAWA 1988, p 25)

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Com a virada para o século XIX, chega a modernidade no mundo ocidental, caracterizada por um modelo econômico baseado no capitalismo e em uma nova forma de poder, o Estado. De acordo com Max Weber “a empresa capitalista supõe a existência de força de trabalho formalmente livre e um tipo de organização racional de produção baseado no cálculo contábil e na utilização técnica de conhecimentos científicos.” (apud SEGAWA, 1988, pág. 8). Essa nova forma de organização social, de acordo com Michel Foucault, é comandada por um poder disciplinar, o qual se encontra na raiz da organização do espaço e na especialização de programas arquitetônicos com objetivos econômico-políticos no século XIX. (SEGAWA, 1988, pág. 10) Como consequência de um processo de modernização também na cultura, que, para Rouanet, é caracterizado pela racionalização das visões do mundo e, em especial, da religião: “vão se diferenciando esferas axiológicas (wertsphären) autônomas, até então embutidas na religião: a ciência, a moral e a arte. A ciência moderna permite o aumento cumulativo do saber empírico e da capacidade de prognose, que podem ser postos a serviço do desenvolvimento das forças produtivas. A moral, inicialmente derivada da religião, se torna cada vez mais secular. (...) Enfim, surge a arte autônoma, destacando-se do seu contexto tradicionalista (arte religiosa) em direção a formas cada vez mais independentes, como o mecenato secular e finalmente a produção para o mercado”.

(Rouanet 1987:231-2, apud SEGAWA, 1988, pág. 9)

Além dos conhecimentos já apresentados, fez-se necessária a busca por mais pensadores contemporâneos, como Francis D. K. Ching (1943) e Cláudio Pastro (1948 - 2016), que contrapusessem uma visão de arquitetura meramente funcional, retomando o aspecto da beleza. Conceito esse que, como foi apresentado anteriormente, era associado a um sentido de decoração, considerado supérfluo por pensadores como Durand. Sendo assim, Ching nos lembra que: “Enquanto arte, a arquitetura é mais do que a satisfação de exigências puramente funcionais de um programa construtivo. Fundamentalmente, as manifestações da arquitetura acomodam a atividade humana. Todavia, o arranjo e a organização das formas e espaços também determinam a maneira como a arquitetura pode promover iniciativas, trazer respostas e comunicar significado.” (CHING, Arquitetura, forma, espaço e ordem, 1998, 2ª edição, pág. 9) 25


Cláudio Pastro, em seu livro “O Deus da Beleza, a educação através da beleza”, afirma que o sentido da vida passa pelo sentido de Beleza e apresenta várias qualidades que se relacionam à Beleza, a começar pela menção da palavra Kalón, do antigo grego, a qual, em seu sentido, reunia os três conceitos: a Verdade, o Amor, que seria a bondade e a justiça, e a Beleza. “A dimensão teológica revela-se necessária para interpretar e resolver os problemas atuais da convivência humana” Centesimus annus, 55

Outra qualidade ligada a beleza seria a de aproximar tudo o que é visível à presença de algo para além do imediato e levar o homem a ter um encontro com aquilo que não é percebido pela razão. Pastro também afirma que o maior dos direitos humanos seria “o direito à criatividade, ao gratuito, ao repouso, ao ócio, ao lúdico, à contemplação e ao prazer da beleza”, pois o ato de criar o colocaria em seu estado de maior liberdade e plenitude do seu ser. “a beleza não existe apenas para um deleite pessoal, para o prazer dos sentidos, mas para uma abertura, para entrada numa vida plena que nos reorganiza e cria pessoas de fibra.” PASTRO, 2000, pág. 22

Embasamento histórico A utilização de abrigos para crianças e adolescentes na sociedade sofre modificações conforme ideologias que são disseminadas com o tempo. Espaços de reclusão para crianças em conflito com a lei em alguns momentos sofrem as mesmas influências que espaços de reclusão para adultos. Para tanto, uma sequências de fatos serão apresentados no que dizem respeito à mudanças construtivas ou relacionadas à função desses edifícios no Brasil. Com as ideias iluministas, e a racionalização de muitos processos da sociedade, a humanização do tratamento de pessoas em situação de cárcere também foi alvo de discussões. No Brasil No final do séc. XVIII, nos tratados arquitetônicos desse período, começou-se a estabelecer gêneros de edifícios e passou a haver uma preocupação classificatória que também perpassou por outros campos do conhecimento, como a segurança pública.

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As ideias revolucionárias provenientes do iluminismo e da nova ordem mundial que se implantava começavam a chegar nas colônias de países europeus, incluindo o Brasil. Isso passou a ser sentido na atuação de movimentos anti-colonialistas, que buscavam a independência e pela inconfidência mineira, antes de 1808. No entanto, com a chegada da família portuguesa no País nesse ano, esse processo se acelerou. Com a criação de uma Constituição Imperial em 1824, já se transcrevia trechos da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, documento escrito devido às várias discussões a respeito da garantia dos direitos humanos, fomentada pela Revolução Francesa. No entanto, o Brasil abraçou somente parte desses ideais, uma vez permaneceu escravocrata até a assinatura de lei Áurea em 1888. “Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente e todas as mais penas cruéis. As cadeias serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos réus, conforme suas circunstâncias e natureza dos crimes”

Constituição do Império, 1824, SEGAWA

Por esse fragmento, é possível perceber duas referências no que diz respeito à arquitetura de espaços de reclusão. Uma delas é a menção à humanização do castigo. “Abolidas as penas de suplício físico (exceto para a escravaria) atestado pela Constituição de 1824, a nova norma imperial - o Código Criminal de 1830 introduzia o cativeiro entre as penalizações: prisão com trabalho, prisão simples. Penas que se aplicavam a cerca de dois terços dos delitos previstos”

(Moraes 1923:3-5, apud SEGAWA 1988)

O que se pode inferir pela tese, “Construções de Ordem” de Hugo Segawa, com relação às construções decorrentes da aplicação do código penal, a exemplo da Casa de Correção do Rio de Janeiro (1834), as penitenciárias de Pernambuco (1855), Paraíba (construída entre 1852 - 1857), Bahia (1850) e São Paulo (1852), é que havia no Brasil a intenção de seguimento de regimes inspirados em modelos europeus e norte americanos (SANTAYANA, 2013). Porém, essas tentativas foram frustradas, visto que jamais se percebeu com clareza a obediência a qualquer regime e isso é reforçado pela citação de Padua Fleury, em 1882: “Fala-se todos os dias em reforma do regime penitenciário; mas não há reforma do que não existe.”

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(Moraes 1923-42, apud SEGAWA, 1988, pág. 290)

Com relação aos espaços de reclusão para jovens considerados delinquentes, o Código Criminal do Império (1830) foi o primeiro documento a mencionar a responsabilidade do menor de 21 anos mas não se dispunha de espaço para abrigá-los no Brasil. Esses jovens acabavam ficando em escolas militares, em instituições filantrópicas ou mesmo em prisões destinadas a adultos (Liberati, 2003, apud Sousa, p 59). Um exemplo é a casa de correção do Rio de Janeiro, que “tinha como cargo sete serviços: prisão civil, calabouço, instituto de menores artesão, depósito de africanos livres, estações e oficinas externas, seção de bombeiros” (Moraes 1923:15, apud SEGAWA, 1988, p. 281) Somente no fim do Império surgem as primeiras instituições, cuja finalidade era abrigar somente jovens, a exemplo da Colônia Agrícola Orfanológica e Industrial de Isabel, na província de Recife, que acolhia órfãos, abandonados e delinquentes em 1873 (Rizzini, 2005, apud Sousa, 2011, p 59). Posteriormente, outras instituições semelhantes foram criadas nas demais províncias. (Souza, 2011 p 59, apud Marcílio, 2001) Com o advento da República (1889 - 1930), houve o desenvolvimento e a efetivação de mudanças na estrutura jurídica-administrativa do País. Uma nova ordem política e social é implantada em um quadro econômico em que, com a abolição da escravidão e a vinda de imigrantes para o País, houve uma nova demanda de mão-de-obra, o que contribuiu para a organização operária (SEGAWA, 1988, p. 296). As mudanças sociais, jurídicas, administrativas e econômicas do século XIX também tiveram um rebatimento na arquitetura, uma vez que, dado um certo momento, houve a implantação da modernidade. É crescente, no Brasil, a codificação de construções realizadas por profissionais civis, em simetria a construções militares e religiosas realizadas por engenheiros militares. (SEGAWA 1988, pág. 11) O crescimento demográfico acarretado pelo crescimento da indústria nas primeiras décadas do período republicado contribuiu para a aplicação de uma política de cunho higienista nos centros urbanos, levando ao afastamento da implantação de instituições próprias para adolescentes de centros urbanos. Além disso, acarretou na construção de edifícios públicos mais modestos e menos dispendiosos (SALLES, Campos, apud SEGAWA, 1988, p. 296), a exemplo do Instituto Disciplinar (1902) em São Paulo. No que diz respeito a institutos disciplinares, nomenclatura dada em 1903 no Brasil aos espaços que tinham como objetivo:

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“...incutir hábitos de trabalho e educar fornecendo instrução literária profissional e industrial, de preferência agrícola, a menores vadios, vagabundos, abandonados, viciosos.” (SEGAWA, Construções de Ordem, pág 300).

A construção de novos equipamentos não conseguia acompanhar o aumento populacional de muitas cidades, que também sofriam com o aumento de adultos e adolescentes apreendidos. Ainda a exemplo do Instituto Disciplinar de São Paulo, em 1916, não havia mais espaço para receber novos detentos, pois ele já contava com a lotação de 202 menores, ainda que tivessem acontecido reformas e ampliações nesse ano. (Mensagens, 1916:719, apud SEGAWA, 1988, p. 300). Na era Vargas (1930 - 1945), o Estado intervencionista adota uma política assistencialista com relação a adolescentes em conflito com a lei, e instaura o Sistema de atendimento ao Menor (SAM) com o intuito de “sistematizar e orientar os serviços de assistência a menores desvalidos e delinquentes, internados em estabelecimentos oficiais e particulares”, conforme o artigo segundo do decreto-lei n. 3799. No ano de 1964, sob a vigência do regime militar, esse sistema é substituído pela Fundação Nacional de Bem Estar do Menor (FUNABEM) e pela Fundação Estadual de Bem Estar do Menor (FEBEM). Ambas adotam um regime militar em suas instituições para acolhimento de jovens infratores e são acarretadas de adaptações da estrutura física do SAM. Em 1979, um novo código de menores é elaborado e em 1988 é sancionada a constituição do Brasil. Em 1990, é promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e em 2012 o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) é aprovado. Este é documento que regulamenta a aplicação de medidas para adolescentes que cometem infrações vigente até hoje. A criação e aplicação desses documentos representaram um grande marco legal no que diz respeito à proteção dos direitos do homem e à colocação do tratamento de crianças e adolescentes como prioridade na sociedade. No Brasil, hoje, ainda são vividos grandes desafios para o enfrentamento de situações que ponham em risco a integridade de adolescentes em conflito com a lei. No entanto, pela breve visão histórica que foi dissertada, foi possível inferir que a proximidade temporal da aplicação de novas normas, como a Constituição Federal, o ECA e o Sinase dos dias de hoje, pode ser um dos motivos para ainda haver espaços para o acolhimento de adolescentes em conflito com a lei semelhantes a espaços de reclusão para adultos. Além disso, percebe-se a carga política que esse tema carrega, uma vez que mesmo em momentos em que havia jurisprudência que per29


mitissem avanços no tratamento de crianças e adolescentes em conflito com a lei, as ações políticas não acompanhavam essas mudanças e esse atraso na aplicação de medidas sempre prejudicava o enfrentamento de desafios em sistemas políticos posteriores. “Vivemos, hoje, uma crise da pós-modernidade, que se caracteriza por uma nova desordem no mundo, com desregulamentação constante, um processo de insegurança crescente e uma perda da identidade do ser humano (…) Com as políticas neoliberais que pontificaram três décadas, vivemos um quadro de criminalização da pobreza, com o abandono do Estado de Bem-Estar Social, substituído por um Estado Penal/Criminal. A palavra de ordem é a contenção e a repressão aos mais pobres.” (ANDRADE, 2014, pag. 43)

Ainda assim, as normas vigentes comprovam, como será visto no próximo tópico, que é de extrema importância o resgate do adolescente em conflito com a lei para a sociedade, ainda que esses conflitos sejam acarretados de situações de vulnerabilidade provenientes da própria sociedade que o adolescente provém.

Embasamento normativo A Constituição Federal da República do Brasil, promulgada em 1988, no seu âmbito geral, fundamenta todo o ordenamento jurídico brasileiro. Ela é a lei fundamental e suprema vigente no País e tem como objetivo salvaguardar os direitos inerentes ao homem, incluindo, em seu inciso quinto, o direito à dignidade, que é o direito mais fundamental. Após a promulgação da Convenção sobre Direitos da Criança, proveniente do decreto nº 99.710 (1990), é criado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), proveniente da lei nº 8.069 (1990), que estabelece um sistema de controle judicial de atos infracionais para adolescentes em conflito com a lei (12 a 18 anos), responsabilizando o adolescente, autor de ato infracional mediante um devido processo legal, estabelecendo sanções, sob a forma de medidas socioeducativas. As medidas socioeducativas são regulamentadas pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) da Lei nº12.594 (2012), as quais são: advertência, reparação de dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, internação em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional (Artigo 112 do ECA). O local para a internação de menores infratores é chamado hoje de centro educacional. 30


“ embora apresente caráter sancionatório, seus objetivos e natureza são primordialmente educativos para a superação de um sistema tutelar e repressivo correcional, para a efetivação de um sistema que possibilite o apoio necessário aos jovens, numa perspectiva emancipatória para o pleno exercício da vida cidadã.” (SANTIAGO 2014)

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), instituído pela Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, estabeleceram, na esfera legal, um avançado sistema de proteção geral dos direitos de crianças e adolescentes, denominado Sistema de Garantia de Direitos (SGD). Para o melhor entendimento de como acontece a aplicação das medidas socioeducativas, faz-se necessário compreender que o ato infracional é condenável, pois desrespeita as leis, a ordem pública, os direitos dos cidadãos ou o patrimônio. Uma vez que é cometido por crianças de até 12 anos, são aplicadas medidas de proteção pelo Conselho Tutelar. Essas medidas também podem ser aplicadas para adolescentes de 12 a 18 anos, quando se relacionarem a casos de violação dos seus direitos em ambiente tutelar. No que diz respeito ao ato infracional cometido por adolescentes, este deve ser apurado pela Delegacia da Criança e do Adolescente, seguido de encaminhamento ao Promotor de Justiça, que poderá aplicar as medidas socioeducativas já apresentadas e como pode ser acompanhada a forma de aplicação no esquema ilustrado. O SINASE, além de reafirmar a diretriz presente no ECA sobre a natureza pedagógica das medidas socioeducativas, constitui parâmetros mais objetivos para a aplicação das medidas de forma a evitar ou limitar a discricionariedade. Um desses parâmetros servem para a arquitetura de centros socioeducativos e estes serão aplicadas no projeto que será apresentado posteriormente. “Outrossim, priorizaram-se as medidas em meio aberto (prestação de serviço à comunidade e liberdade assistida) em detrimento das medidas privativas ou restritivas de liberdade em estabelecimento educacional (semiliberdade e internação), haja vista que estas somente devem ser aplicadas em caráter de excepcionalidade e brevidade). Trata-se de estratégia que busca reverter a tendência crescente de internação dos adolescentes bem como confrontar a sua eficácia invertida, uma vez que se tem constatado que a elevação do rigor das medidas não têm melhorado substancialmente a inclusão social dos egressos do sistema socioeducativo.” (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, 2016, pág. 14). 31


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Essa realidade, por mais que seja apresentada no SINASE, não é o que se efetiva na cidade de Fortaleza, como será visto pela apresentação do número de centros socioeducativos de internação no capítulo “Contextualização”. Considerando essa situação como uma oportunidade para buscar metodologias alternativas que pudessem ser aplicadas em um quadro em que o adolescente permanece internado por um período não tão breve em um centro socioeducativo, surgiu a abordagem pelo método APAC. Método APAC "Ao descobrir-se amado por Deus, o homem compreende a própria dignidade transcendente, aprende a não se contentar de si e a encontrar o outro, em uma rede de relações cada vez mais autenticamente humanas. Feitos novos pelo amor de Deus, os homens são capacitados a transformar as regras e as qualidades das relações, inclusive as estruturas sociais: são pessoas capazes de levar a paz onde há conflitos, de construir e cultivar relações fraternas onde há ódio, de buscar a justiça onde prevalece a exploração do homem pelo homem. Somente o amor é capaz de transformar de modo radical as relações que os seres humanos têm entre si. Inserido nesta perspectiva, todo homem de boa vontade pode entrever os vastos horizontes da justiça e do progresso humano na verdade e no bem."

Compêndio da doutrina social da igreja, pág 3.

Há 45 anos, em 1972, surgiu na cidade de São José dos Campos (SP), por meio de um grupo de católicos, a primeira instituição que acolhia condenados, liderada por Mário Ottoboni, constituída por Associação de Proteção e Assistência ao Condenado - APAC. Ela é fruto de um trabalho iniciado no Presídio Humaitá e que culminou na necessidade de desenvolver um projeto voltado para a recuperação do preso, suprindo uma deficiência do Estado. Ganhando personalidade jurídica, em 1974 passou a atuar em parceria da Justiça na execução da pena. (ANDRADE, 2014) A APAC se constitui como uma entidade civil de direito privado, de natureza jurídica que opera auxiliando os poderes Judiciário e Executivo desde 1974, na execução e administração da pena. Atua como uma organização não governamental, sem fins lucrativos nos regimes fechado, semiaberto e aberto.

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Figura 1 - Centro de Reintegração Social da APAC de São João Del Rei (MG), inaugurado no final de 2013. Fonte: Livro APAC, a face humana da prisão.

O método APAC tem como princípios : A participação da comunidade Em conformidade com a Lei de Execução Penal, que afirma que o Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de Execução da Pena e da medida de segurança, a APAC é mantida por doações de pessoas físicas, jurídicas e entidades religiosas, conta com a parcerias e convênios com o Poder Público, instituições educacionais, dentre outras entidades e com a participação de voluntários em seu corpo de servidores. A ajuda entre recuperandos para o bom cumprimento da pena Por meio do Conselho de Sinceridade e Solidariedade, que é um grupo representativo composto por alguns recuperandos. Ele relata dificuldades enfrentadas por outros recuperandos para o setor administrativo. Além disso, reivindicam ações que possam aproximar ainda mais a instituição APAC de seus princípios. Assim, é fomentada a co-responsabilidade de cada recuperando pelo bom cumprimento da sentença dos outros. O valor do trabalho dentro e fora da unidade, dependendo do regime interno A ocupação do tempo por meio de atividades produtivas é muito importante nos três tipos de regime encontrados em instituições APAC. No entanto, existem focos diferentes dependendo do tipo de cumprimento. O regime fechado está ligado a atividades que propiciem o autoconhecimento e a apreensão de convicções ligadas à valorização humana. O regime semiaberto compreende a capacitação para a re-

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alização de possíveis atividades profissionais e, no regime aberto, o recuperando deve apresentar um plano de trabalho plausível de cumprimento e deve se colocar em busca de sua reinserção na sociedade também por meio de um compromisso trabalhista. A religião como ferramenta de recuperação de valores morais Ainda de forma a não descumprir o princípio de laicidade, no método APAC, a religiosidade é apresentada no sentido de demonstrar a importância de se ter valores e de buscar cumpri-los com determinação, potencializando o enfrentamento de dificuldades enfrentadas na vida por meio na crença em algo para além do próprio indivíduo. A Assistência jurídica A assistência jurídica é garantida, sendo incluída na execução do método, aos recuperandos que comprovem renda insuficiente para a contratação desse serviço, especialmente na fase da execução penal. A Assistência à saúde Estão contemplados no método APAC a assistência médica, odontológica, psicológica, sendo um atendimento humanizado e prioritário. Valorização humana O grande objetivo do método APAC é a valorização humana, auxiliando na reconstrução da identidade do recuperando. Medidas de caráter pessoal e individual, como chamar cada um pelo próprio nome e o conhecimento da história e aspirações, são incentivadas. A família Indo de encontro ao princípio da intranscendência, que prega que a pena deve atingir somente a pessoa que recebeu uma condenação, evitando que ela atinja a sua família, a integração e fortalecimento de laços afetivos extramuros são incentivados no método APAC e a família é incluída no processo de recuperação do sentenciado para a sociedade. Vítimas e seus familiares também são incluídos para serem assistidos, a depender da vontade e disponibilidade de acolhida do método. O serviço voluntário Por ser mantido por doações, as remunerações de funcionários restringe-se àqueles responsáveis pelo setor administrativo. Sendo assim e em coerência com o método que incentiva a gratuidade para estar a serviço do próximo, o método APAC conta com a participação da sociedade por meio do voluntariado. Fornece cursos de formação, que duram em média 42 aulas para a apresentação do método e seus 35


conceitos, assim como o desenvolvimento de aptidões para o bom desenvolvimento dos trabalhos voluntários que, conforme o tempo de trabalho, podem realizar cursos de aperfeiçoamento.

O Centro de Reintegração Social Este consiste em um estabelecimento composto por três pavilhões que visa o cumprimento de pena de um recuperando, seja o regime que ele estiver cumprindo, de forma a possibilitar a maior aproximação com o seu núcleo afetivo. O Mérito A meritocracia consiste no recebimento de benefícios conforme o desempenho de um indivíduo em uma atividade. No que diz respeito a questões práticas ao método, conforme a apuração da conduta do recuperando em aspectos objetivos e subjetivos, seja na faxina, na forma de se relacionar com outro recuperandos, voluntários e visitantes, na prestação de serviços a proposta socializadora, dentre outros, o recuperando recebe benefícios assegurados por lei. Uma atividade que exemplifica a forma como a relação de vivência da metodologia e o mérito é aplicada é a existência de um painel nos espaços que acolhem o regime fechado. Nesse painel, são registradas informações atualizadas semanalmente sobre o dormitório mais organizado e o menos organizado. Se não houver zelo de um recuperando pelo espaço, ele perde pontos, que também são registrados em painéis. A Jornada de Libertação com Cristo Deve se ter claro que a APAC não é uma entidade religiosa e não presta a proselitismo com o financiamento do Estado. Ela respeita o princípio de laicidade, presente na Constituição Brasileira, e acolhe apenados que professam qualquer credo. No entanto, o método APAC acolhe, em sua gênesis fundante, ensinamentos religiosos cristãos. A Jornada de Libertação com Cristo consiste em um método que requereu quinze anos de estudo e baseia-se na apresentação de novos valores inspirados na vida de Jesus, tanto ao recuperando, quanto a sua família, que é convidada a participar. Por ser mais um dos passos inerentes ao método, a sua participação é obrigatória, como forma de adesão do recuperando à metodologia como um todo. “A APAC não é remunerada para receber ou ajudar os condenados. Ela se mantém através de doações de pessoas físicas, jurídicas e entidades religiosas, de parcerias e convênios com o Poder Público, instituições educacionais e outras entidades, da captação de recursos junto a fundações, institutos e organ36


izações não governamentais, bem como das contribuições de seus associados, sendo, ainda, o único estabelecimento que pode ofertar as três formas de regime nas penas privativas de liberdade, no caso, podendo receber recuperandos em regime fechado, semiaberto e aberto.” SERRA, MAIA, MARCIANO, TEMOTEO. O método APAC e sua aplicabilidade no sistema penitenciário nacional, 2016.

Existem estudos que contribuem para o avanço da aplicação de uma metodologia pelo menos inspirada na APAC em centros socioeducativos, como o presente no artigo “O método APAC como possibilidade de ser aplicado na internação do menor infrator”, apresentado em 2005 no III Congresso de Pesquisa e Extensão da FSG, Faculdade da Serra Gaúcha. Neste artigo, é reconhecida a fragilidade da situação vivida por adolescentes na sociedade e da relação de causa que provém de um sistema social que contribui fortemente para o envolvimento de adolescentes em infrações. Como diz Siqueira (1996, p 162 apud Azevedo, Silva e Rocha, 2015) “traumas familiares, falhas educacionais, más companhias, desemprego e pobreza não são considerados fatores determinantes de transgressões, mas mediadores entre o contexto social mais amplo e o comportamento delinquente”. No que diz respeito à aplicabilidade dessa metodologia para jovens em conflito com a lei, “muito embora seja preconizado que as medidas socioeducativas precisam possuir caráter pedagógico e que, deveriam ter, como premissa, o preparo para que o adolescente volte a conviver em sociedade, o que é possível constatar é que tais espaços podem ser entendidos como, ou tão igual, aos cárceres para adultos, porém de modo mais camuflado.” Assim sendo, em julho de 2014, foi assinado entre a Fundação Granja Escola São José e Associação de Proteção e Assistência aos Adolescentes em Conflito com a Lei da Comarca de Itaúna, um contrato de comodato que visa a concessão de um terreno para a construção da APAC Juvenil (JUS BRASIL, 2011) De acordo com o Juiz da 1ª Vara Criminal e de Execuções Penais de Itaúna, Paulo Antônio de Carvalho, a criação do método é algo inédito em Minas e no Brasil e que a metodologia aplicada para adultos poderá ser adaptada para adolescentes em conflito com a lei em consideração às adequações da psicologia juvenil (JUS, BRASIL, 2011) Uma vez que a aplicação desse método se faz possível em um estado, a sua implantação em centros socioeducativos pode se tornar possível também no estado do Ceará, onde, de forma mais recente, se tem buscado novas soluções para os centros socioeducativos. 37


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análise crítica De implantação Fortaleza possui dez unidades de atendimento socioeducativo implantados em sete bairros do município. Ao fazer um rebatimento dos dados do Índice de Desenvolvimento Humano dos Bairros (IDH-B), conforme dados levantados pelo Censo Demográfico 2010, e consultados em cartilha disponibilizada pela Prefeitura do Município e conforme localização desses centros socioeducativos e de terminais rodoviários, é possível inferir alguns aspectos, como a dominância do número de unidades socioeducativas implantadas em bairros de IDH-B abaixo de 0.35, em relação a unidades implantadas em bairros com IDH-B maior do que esse valor, e a distância de algumas unidades de terminais rodoviários, dificultando o seu acesso.

ilustração 3 conforme apêndice

O IDG é um indicador sintético composto por três dimensões, a renda, a educação e a longevidade e é uma metodologia utilizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde a década de 1990 para avaliar o grau de desenvolvimento de países. Em conformidade com a aplicação de uma metodologia que pudesse avaliar o desenvolvimento de municípios, o Programa Nações Unidas (PNUD), em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e a Fundação João Pinheiro (FJP) calculou um índice por meio de adaptações da metodologia de análise utilizada para o cálculo do IDH, utilizando outras bases de dados e outros indicadores. Por meio também da utilização de uma nova base de dados, é calculado o IDH-B em Fortaleza e, este avalia o desenvolvimento de seus bairros. 39


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Os bairros Presidente Kennedy (IDH-B: 0,428987851), Ancuri (IDH-B: 0,204302295), Conjunto Prefeito José Walter (IDH-B: 0,348284739), Antônio Bezerra (IDH-B: 0,348284739), Sapiranga (IDH-B: 0,337820039) e Canindezinho (0,136277040) acolhem, respectivamente, as unidades: Luís Barros Montenegro, Patativa do Assaré, Cardeal Aloísio Locheider, Aldaci Barbosa Mota, Mártir Francisca e Canidezinho. As unidades São Miguel, São Francisco, Passaré e Dom Bosco estão localizados no bairro Passaré (IDH-B: 0,224672553). Isso compõe o quadro situacional das unidades socioeducativas de Fortaleza e o seu entendimento foi fundamental para o estabelecimento de critério à implantação do centro socioeducativo que será proposto neste trabalho, fundamentando a busca por um terreno que fosse implantado em um bairro de IDH-B maior do que 0,35 e com acesso à terminais rodoviários mais facilitado. Estudo de caso Três edificações de Fortaleza foram escolhidas para uma análise morfológica. O intuito dessa análise é identificar rebatimentos na forma arquitetônica desses projetos conforme o Sinase passou a ser aplicado e, posteriormente, revisado, além de demonstrando que o avanço da aplicabilidade das medidas socioeducativas influência na concepção de espaços de centros socioeducativos.

Figura 2 - Mapa elaborado pela autora com base nas informações encontradas nas seguintes Fontes: para os bairros de menor IDH de Fortaleza: http://www.anuariodoceara. com.br/indice-bairros-fortaleza/ Para a localização dos centros

socioeducativos

Fortaleza:

de

http://portais.tjce.

jus.br/cijce/wp-content/uploads/2014/08/Centros-educacionais-Fotaleza-Interior.pdf. Auxílio do software Google Earth para a localização dos terminais de Fortaleza.

Os edifícios escolhidos foram o conjunto de dois centros socioeducativos, o São Francisco e o São Miguel, que compõem um único projeto arquitetônico e que foram construídos antes da aplicação do SINASE; o centro socioeducativo Patativa do Assaré, que teve a sua construção no ano de 2002, período próximo da implantação do SINASE; e o centro socioeducativo do Canindezinho, construído em 2016, após duas revisões do SINASE. Francis D. K. CHING, em seu livro “Arquitetura, forma, espaço e ordem”, classifica e analisa obras arquitetônicas de acordo com um método de análise. Para a análise da forma desses três projetos, fazse necessária, assim, a introdução desse método. Com ideias contemporâneas sobre classificação e análise de obras arquitetônicas, Ching apresenta um manual que demonstra a relação não tão rígida entre função, espaço, forma e técnica construtiva, focando mais em abstrações relacionadas a percepção da forma pelo observador e demonstrando essas características em exemplos arquitetônicos pelo mundo. No que diz respeito à essas abstrações, a simplificação visual da forma auxilia na sua compreensão, conforme citação:

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“A psicologia gestaltista afirma que a mente simplifica o meio visual a fim de compreendê-lo. Dada qualquer composição de formas, temos tendência a reduzir o tema, em nosso campo visual, aos formatos mais simples e regulares. Quanto mais simples e regular for um formato, mais fácil será percebê-lo e compreendê-lo. Da geometria sabemos que as figuras regulares são o círculo e a série infinita de polígonos regulares que podem ser inscritos nele. desses polígonos, os mais significativos são as figuras primárias: o círculo, o triângulo e o quadrado.” CHING, Arquitetura, forma, espaço e ordem, 1998, pág. 38

Assim, a forma e a relação entre formas é classificada por Ching das seguintes maneira: central ou centralizada, linear, radial, aglomerada e em malha, assim como circulações são classificadas em linear, radial, espiral, malha, rede e composta, como é possível observar nos esquemas: Análise

Figura 3 - Esquema de classificação das formas proposto por F. Ching. Extraído de CHING, Arquitetura, forma, espaço e ordem, 1998.

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Figura 4 - Esquema de classificação das formas proposto por F. Ching. Extraído de CHING, Arquitetura, forma, espaço e ordem, 1998.

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Centro Socioeducativo São Francisco e Centro Socioeducativo São Miguel Apresenta uma forma em malha ortogonal, com a predominância de área de vazio em dois pátios e circulação radial na área que une as circulações dos dois centros socioeducativos, seguindo por circulações lineares.

Centro Socioeducativo Patativa do Assaré Apresenta forma em rede, com vazios dentro da forma e circulações em rede.

Centro Socioeducativo Canindezinho Apresenta uma sequência de formas organizadas linearmente, configurando vazios coincidentes com a circulação entre esses edifícios e circulação linear.

Figura 5 -Linha Superior: planta-baixa, cheios e vazios e circulação do Centro Socioeducativo São Francisco; Linha ao meio: planta-baixa, cheios e vazios e circulação do Centro Socioeducativo Patativa do Assaré; Linha Inferior: planta-baixa, cheios e vazios e circulação do Centro Socioeducativo Canindezinho. Fonte: Setor de Arquitetura da Superintendência de Atendimento Socioeducativo do Governo do Estado do Ceará.

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referências de projeto Muitos projetos arquitetônicos foram observados em seus aspectos formais e estruturais até que se chegasse à dois que foram tomados como referências, e - que contemplam, de forma mais condensada, os conceitos construtivos e subjetivos de apreensão do espaço que foi buscado adaptar para o projeto deste trabalho.

Vestiário da praia Leighton Ficha técnica Arquitetos | Bernard Seeber Localização | Leighton Beach Blvd, North Fremantle WA 6159, Austrália Área | 215.0 m² Ano do projeto | 2016 Fotografias | Douglas Mark Black Área do Terreno | 2440 m² Área do Quiosque | 92 m² Um deles é o vestiário da obra de revitalização da praia de Leighton, em Fremantle, na Austrália. Esse projeto, que foi construído em 2016, foi elaborado devido a demanda da cidade de Fremantle de recuperar o uso de vestiários e espaços de apoio aos usuários da praia. Os vestiários anteriores encontravam-se abandonados e a proposta do novo projeto era atender ao conceito de acessibilidade universal, principalmente para atender aos usuários da Associação de Surfistas Deficientes da Austrália Ocidental.

ilustração 4 conforme apêndice

Uma gama de materiais foi considerada, mas estes se apresentam de forma contido para garantir que a estrutura do vestiário permaneça silenciosa diante da paisagem das dunas da praia e permita que as atividades de seus usuários seja favorecida para agregar qualidade dinâmica ao lugar. 47


Além disso, o uso dos materiais implantados facilita a manutenção desse equipamento a longo prazo, além de serviço de limpeza e controle de vandalismo. O quiosque que se liga ao vestiário, atende o público em geral e, em particular, apoia as instalações para piqueniques. Sua cor alaranjada e marcante atua como um ponto de referência para encontros do público e para o parque aberto.

Figura 6 - Área Austrália. Fonte: http://www.archdaily.com.br/ br/800222/revitalizacao-leighton-beach-bernard-seeber. Acesso em 26 de junho de 2017.

Figura 7 - Fachada do Vestiário de Leighton Beach, Austrália.

Esta obra não só serviu como inspiração pelo seu sistema estrutural e escolha de combinação de materiais, a parede de concreto e as placa metálicas, mas serviu de amparo para vislumbrar a aplicação de vários conceitos arquitetônicos que se aspirava aplicar no projeto a ser proposto.

Fonte:

Apesar da função a ser desempenhada pelo vestiário ser complexa, foi demonstrado que a qualidade arquitetônica e construtiva é algo que pode e deve existir independentemente do programa. Os detalhes dos balanços de sua coberta demonstram ao mesmo tempo consistência e firmeza, quando formam o aparente apoio nas paredes e leveza, compondo uma planta limpa, fazendo entrar luz e ventilação natural no ambiente.

Figura 8 - Área interna do

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http://www.archdaily.

com.br/br/800222/revitalizacao-leighton-beach-bernard-seeber.

Acesso em 26

de junho de 2017.

Vestiário de Leighton Beach, Austrália.

Fonte: http://www.

archdaily.com.br/br/800222/revitalizacao-leighton-beach-bernard-seeber.

Acesso em 26

de junho de 2017.


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Obras de Luis Barragán Ficha técnica Arquiteto | Luis Barragán Ano | 1948 Localização | Rua General Francisco Ramírez 12-14, Colonia Ampliación Daniel Garza, Cidade do México, México Tipo de projeto | Residencial Estrutura | Concreto Os obras de Luis Barragán (1902 - 1988) são reconhecidamente sensíveis e favorecem uma apreensão silenciosa do espaço. Tendo recebido influências da Art Déco, e pessoas como Le Corbusier e Pablo Picasso e Ferdinand Bac sobre, que ele conheceu pessoalmente, Barragán agrega particularidades de experiências mexicanas, como as pequenas vias, os muros altos, as janelas pequenas e as casas que se voltam para o seu interior a sua arquitetura que tocam a universalidade de espaços aconchegantes. Suas viagens a Europa e a África o fizeram ter contato com ideias e arquiteturas que o deslumbrava, incorporando jogos de luz e sombra, integrada com um paisagismo composto de espécies nativas e com a constante presença da água como elemento sonoro e visual. Suas influências o fizeram, ao mesmo tempo que usava uma linguagem moderna, aplicava cores vibrantes, como o rosa, o amarelo e o laranja, texturas, contrastes. Um aspecto interessante de seus pensamentos era que ele criticava a Bauhaus por colocar o homem em uma caixa de vidro, onde ele perderia a privacidade e se desumanizaria. Para ele, as paredes trazem intimidade e serenidade e permitem que o homem experiencie mistérios e perceba a escala da natureza.

Figura 9 - Espaço interno da Casa-estúdio, de Luís Barragan.

Fonte:

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Tendo sido o segundo arquiteto e, até então, o único mexicano, a receber o Prêmio Pritzker, em 1980, Barragan chamava a si mesmo de arquiteto paisagista. Acreditava que o planejamento do jardim era tão importante quanto o projeto da casa e ambos deveriam ser pensados como um só. As suas obras em geral, mas, de forma especial, a Casa-estúdio de Luis Barragán, cuja sensibilidade e conceitos aplicados, principalmente no jardim, inspiraram a relação com o pátio interno do projeto a ser proposto.

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phpac tion=view&galler y_ id=19285. Acesso em 26 de junho de 2017. Figura 10 - Exterior da Casa-estúdio, de Luis Barragán. Fonte:httpwww.plataformaarquitectura.clcl02-101641clasicos-de-arquitectura-casa-estudio-luis-barragan-luis-barragan. Acesso em 26 de junho de 2017.




projeto Critérios para escolha do local Dois aspectos foram fundamentais para a escolha do local de implantação do centro socioeducativo proposto. O primeiro deles diz respeito a acessibilidade facilitada para o equipamento. A constância na visitação e, consequentemente, maior participação por parte de familiares de adolescentes na unidade favorece o melhor cumprimento da medida socioeducativa aplicada, além de ser um dos passos que compõe também a metodologia APAC. O segundo aspecto se relaciona a presença de infraestrutura urbana e de serviços. Uma vez que tanto o método APAC contempla a participação mais efetiva da sociedade para a reinserção de pessoas em conflito com a lei, por meio do voluntariado quanto a aplicação de medidas socioeducativas requer a integração entre adolescentes e outros equipamentos de saúde, educação e lazer a depender da necessidade do adolescente e do plano pedagógico implantado. A proximidade com equipamentos de comércio e serviço facilita a parcerias com a instituição socioeducativa, seja para oferecer cursos profissionalizantes e de capacitação, seja para dar oportunidade de aprendizagem ou estágio em ambiente profissional. Além disso, a realização de atividades externas por parte de adolescentes que estejam cumprindo medidas socioeducativos serve também de respaldo para a sociedade, a qual se beneficia com a possibilidade de participar de exposições de materiais e obras confeccionadas pelos adolescentes, peças de teatro, comemorações festivas como Natal e São João. Essas atividades podem ter o seu acesso flexibilizado de acordo com os seus objetivos e acontecer na própria instituição ou em seu entorno próximo. Bairro Messejana ilustração 5 conforme apêndice

Sendo assim, o bairro da Messejana demonstrou ser uma alternativa que atende à esses critérios, além de constituir uma estrutura urbana 53


consolidada e potencialidade de crescimento. A presença de um terminal rodoviário em seu território o conecta mais facilmente à outros bairros de Fortaleza, contribuindo para o maior número de linhas de ônibus em seus ruas e contemplando linhas provenientes de outros municípios. “Formada pelas comunidades do Sítio São José, Conjunto São Bernardo, Conjunto Nova Conquista, Parque Pampulha, Parque Canaã, Parque Manueira, Vila Nova e Conjunto Bandeirantes, o bairro de Messejana possui uma área de 600 hectares e tem como limites os bairros Guajeru, Curió, Cambeba, Cajazeiras, Barroso, Parque Santa Maria, Paupina e Coaçu. Na condição de bairro, sob uma análise bem apurada, poder-se-ia afirmar que o seu tecido social, embora heterogêneo, já se encontra bem definido.” FREITAS, Edmar. Messejana, 2013, p. 63-65 No que diz respeito à proporcionar melhores condições de reinserção social e um sistema mais humanizado de medidas sócio educativas, entende-se que as visitas de familiares é indispensável. Para tanto, a proximidade de equipamentos ligados ao transporte, como terminais rodoviários permite a diminuição da dificuldade de acesso ao equipamento proposto. Terreno e entorno

Figura 11 - Mapa da Regional II de Fortaleza, com destaque para o bairro da Messejana. Elaborado pela autora. Figura 12 - Mapa de situação do terreno dentro do bairro e da SER II. Elaborado pela autora.

54


SITUANDO O TERRENO DA PROPOSTA NA MESSEJANA N Cajazeiras

Parque Iracema

Cambeba

Alagadiço Novo

Barroso Curió

Guajerú

Jangurussu Coaçu Ancuri

Palpina

1.250 m

Terreno da proposta

Limite da Messejana

Recursos hídricos

Limite das quadras da Messejana

Terminal rodoviário da Messejana

Limite dos bairros vizinhos à Messejana 55


N

PARQUE IRCEMA

23

CAMBEBA

54 24 44

22

ESC CR GE OLA ESC NT E EN

DO

21 ES BR CO DE INC LIN AP AN HA RE DO ND ER

A LINH ESCO O MEU SONH

ALAGADIÇO NOVO

20 55 32 6

33

5

MESSEJANA

27

34

3

1 4

7

45

35

25

CURIÓ

9

36 10

28

43

19

11 31

8 12

53

47

51 48 30

46

39

52 ABCR

41

17

49 50 29

13

37

40 16 PATRONATO PE LUIS BARBOSA MOREIRA (ESCOLA)

26

38

42

18

15

GUAJERÚ

2 14 600m

56


Legenda Equipamentos de saúde 1 - Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto 2 - Hospital Municipal Doutor Waldemar de Alcântara 3 - Secretaria de saúde do departamento de Assistênci Farmacêutica 4 - Hospital Distrital Gonzaga Mota

Instituições religiosas 27 - Igreja São Bernardo 28 - Capela São José 29 - Associação Jesus e Maria 30 - Igreja N. S. da Conceição 31 - Igreja São João Batista 32 - Capela de São Francisco Outros

Equipamentos de educação 5 - E. M. E. I. F. Professor Clodomir Teófilo Girão 6 - Projeto ABC São Bernardo 7 - Centro Educacional Sra. de Fátima 8 - Colégio Ernesto Gurgel 9 - Centro Educional Infantil Menino Jesus 10 - E. M. Prfa. Raimunda F. de Alcântara 11 - Colégio Dr. Miguel Couto 12 - E. M. E. I. F. Josefa Barros de Alencar 13 - Colégio Angellu’s 14 - Colégio Cônego Francisco Pereira 15 - Centro Estudantil Sousa Correia 16 - E.E.F.M Profa Telina Barbosa Costa 17 - E.M.E.I.F. Angélica Gurgel 18 - E. E. Comendador Miguel Gurgel Profissionalizante 19 - E. M. E. I. F. João Saraiva Leão 20 - E. M. E. I. F. Antônio Ferreira Magalhães 21 - Escolinha Brincando de Aprender 22 - Escola Gente Crescendo 23 - Colégio Rosa de Saron 24 - E.E.F.M. Virgílio Távora 25 - E.E.E.M. Liceu de Messejana 26- Patronato de Luis Barbosa Moreira

33 - Integral Engenharia LTDA 34 - Associação Centro Comunitário Nova Conquista 35 - DETRAN 36 - Clube da C.E.F. 37 - Associação Beneficiente Cearense de Reabilitação 38 - Agência Coelce 39 - Mercado Municipal de Messejana 40 - Shopping Diogo Alcântara 41 - Agência EBCT (correios) 42 - IBAMA 43 - Ypioca 44 - Santé Cozinha Industrial 45 - Vila Olímpica de Messejana 46 - Farmácia Dose Certa 47 - Supermercado Pinheiros 48 - Lojas Insinuante 49- Banco do Brasil 50 - Telemar 51 - Loja Rabelo 52 - Supermercados Panorama 53 - Banco da Caixa Econômica Federal 54 - Centro Administrativo Cambeba 55 - Esquadrão da polícia montada da PM

Terreno da proposta Quadras do recorte urbano Recursos Hídricos Delimitações dos bairros Edificações de uso relevante Figura 13 - Mapa de situação do terreno da proposta no bairro da Messejana e equipamentos adjacentes. Elaborado pela autora.

E.E.I.E.F. - Escola Estadual e Instituto de Estudo Fundamental

E.E. - Escola Estadual

E.M.E.I.F. - Escola Municipal de Ensino e Instituto Fundamental

E.M. - Escola Municipal

E.E.F.M - Escola Estadual de Fundamental e Médio

57


Legislação urbanística Zoneamento O terreno da proposta se encontra em uma Zona de Ocupação Moderada 2 (ZOM 2), conforme zoneamento do Plano Diretor Participativo de Fortaleza (PDPFor). Os parâmetros urbanísticos que competem à essa classificação de zoneamento e instrumentos que podem ser aplicados nele seguem conforme o artigo 105 e 106 do PDPFor e são:

Art. 105 - São parâmetros da ZOM 2: I - índice de aproveitamento básico: 1,0; II - índice de aproveitamento máximo: 1,5; III - índice de aproveitamento mínimo: 0,1; IV - taxa de permeabilidade: 40%; V - taxa de ocupação: 50%; VI - taxa de ocupação de subsolo: 50%; VII - altura máxima da edificação: 48m; VIII - área mínima de lote: 150m2; IX - testada mínima de lote: 6m; X - profundidade mínima do lote: 25m. Art.106 - Serão aplicados na Zona de Ocupação Moderada 2 (ZOM 2), especialmente, os seguintes instrumentos: I - parcelamento, edificação e utilização compulsórios; II - IPTU progressivo no tempo; III - desapropriação mediante pagamento por títulos da dívida pública; IV - direito de preempção; V - direito de superfície; VI - outorga onerosa do direito de construir; VII - transferência do direito de construir; VIII - operação urbana consorciada; IX - consórcio imobiliário; X - estudo de impacto de vizinhança (EIV); XI - estudo ambiental (EA); XII - Zona Especial de Interesse Social (ZEIS).

58


Parâmetros de uso De acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo do Município de Fortaleza, no que diz respeito ao número mínimo de vagas de estacionamento para uma instituição de defesa e segurança Correcional de Menores, é de uma vaga para cada 50 m² de área útil do terreno utilizado.

atividade

código

classe

Porte II

eds

(m )

Nº minimo de vagas de estacionamento veicular

2

75.22.11

Militar para fins de defesa (Quartel)

4-PE

Qualquer

Será objeto de estudo

7522.12

Academia (Militar, policial ou civil)

4-PE

Qualquer

Será objeto de estudo

75.23.01

Penitenciária

4-PE

Qualquer

Será objeto de estudo

75.23.02

Correcional de Menores (Casa de Detenção)

4-PE

Qualquer

1 vaga/ 50m2 de A.U.

75.24.81

Posto Policial

1

até 80

75.24.82

Delegacia de Policia

2

81 a 250

3

251 a 1000

75.24.83

Corpo de Bombeiros

4-PE

Qualquer

1

até 80

2

81 a 250

1 vaga/ 100m2 de A.U.

1 vaga/ 100m2 de A.U.

1 vaga/ 100m2 de A.U.

Tabela da LUOS

Recuos Os recuos de equipamento para atividades de defesa e segurança são, respectivamente, cinco metros de frente, três metros laterais e três metros de fundo, conforme determinado pela LUOS. Subgrupos de

Classes

Resultados

uso Setor 1.1

Residencial (R)

Misto (M)

Setor 1.2

Setor 2

Setor 3

FREN

LAT

FUN

FREN

LAT

FUN

FREN

LAT

FUN

FREN

LAT

FUN

3,00

1,50

3,00

3,00

1,50

3,00

-

1,50

3,00

3,00

1,50

3,00

Demais

5,00

3,00

3,00

5,00

3,00

3,00

-

-

-

5,00

3,00

3,00

1

-

-

-

3,00

1,50

3,00

-

1,50

3,00

7,00

3,00

3,00

Demais

7,00

3,00

3,00

7,00

3,00

3,00

-

-

-

7,00

3,00

3,00

1, 3, 4,7, 8

1

7,00

3,00

3,00

7,00

3,00

3,00

-

1,50

3,00

7,00

3,00

3,00

Demais

7,00

3,00

3,00

7,00

3,00

3,00

-

-

-

7,00

3,00

3,00

3, PGT1

10,00

10,00

10,00

10,00

10,00

10,00

-

-

-

-

-

-

Demais

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

EDS

1,2

-

-

-

-

-

-

5,00

3,00

3,00

-

-

-

ECL

1

7,00

3,00

3,00

5,00

3,00

3,00

5,00

3,00

3,00

-

-

-

CSM

SOL

Tabela da LUOS

59


60


Premissas Racionalidade construtiva Contemplando a implantação do programa de tal forma que haja o mínimo de áreas subutilizadas ou monofuncionais. Simplificação da circulação Por meio da concentração de caminhos de circulação no pátio central, contribuindo para que haja o contato com essa área livre e de visual atrativa e interessante, que estimula a criatividade e enaltece o sentido de liberdade pela beleza. Flexibilidade de usos A permissividade de adequação de usos para a apropriação do espaço tanto por meio da política convencional vigente quanto da aplicação de uma nova política que permita a aplicação de uma metodologia inspirada no método APAC. Conforto e segurança mínima Por meio de duas decisões construtivas fundamentais que dizem respeito respectivamente a esses princípios, a primeira, por meio do favorecimento da entrada de ventilação no edifício por meio de sistema de circulação cruzada, favorecida pela abertura conforme a orientação do vento e, a segunda, com formação dos limites da instituição pelos ambientes que o compõe, em detrimento de muitas aberturas que deem para somente muros.

Figura 14 - Planta explodida perspectivada. Elaborado pela autora.

61


Fluxograma

62


Sistema construtivo e estrutural A escolha da utilização predominantemente de concreto, seja moldado in loco, seja fabricado previamente foi uma decisão pautada na busca por equilíbrio de alguns fatores. Uma deles foi a praticidade, uma vez que não requer utilização de mão-de-obra tão especializada e facilita situações de reformas quando há necessidade. Além disso, o concreto é um material de longa durabilidade e baixa frequência de manutenção. Outro fator foi a segurança no sentido de permitir que fiações e suportes para lâmpadas seja embutidos de forma mais fácil em relação a outros sistemas construtivos, como os que utilizam alvenaria. Além de disso, é um material que não propaga chamas em casos de incêndio. A estrutura de pilares e vigas um grid de espaçamentos de 6,30 m, 3,15 m e 4 m no eixo norte-sul (vertical) e de 2,75 e 4,85 nos eixos leste-oeste (horizontal). A coberta é sempre bi apoiada e de dimensão de acordo com o vão vencido.

Figura 15 - Esquema Construtivo. Malha da estrtura e Coberta. Elaborado pela autora

63


Conforto Térmico A passagem de ventilação é favorecida, para além da conformidade das condições ambientais de Fortaleza, onde o maior incidência de ventos vem do leste e do sudeste e corrobora com medidas mínimas de segurança e para espaços de acolhimento de adolescentes em conflito com a lei por meio de alguns elementos. O primeiro desses elementos é o muro. De acordo com o SINASE, muros e alambrados devem obedecer a uma altura mínima de 5 metros. Um elemento dessa altura poderia comprometer a entrada de ventilação no equipamento, caso fosse completamente preenchido. Assim, o muro do projeto proposto é concebido para ter a em sua parte mais superior material vazado e, em sua parte inferior, até 3 metros de altura, concreto e a continuação do mesmo elemento vazado em seu lado externo. Outro elemento que favorece o conforto térmico é a coberta, pois, com pequenas aberturas, ela permite a saída do ar mais quente do ambiente sem comprometer a segurança. A sua forma permite também a entrada de iluminação natural e retém o escoamento de água da chuva até que esta tenha vazão para tubulações hidráulicas. A coberta da quadra poliesportiva, por ser reta, não compromete a aceleração do vento, até que ele chegue para o outro lado da edificação, passando por bandeirolas e janelas. Figura 16 - Esquema de Ventilação. Elaborado pela autora.

64


Figura 17 - Esquema de Chuva. Elaborado pela autora.

Figura 18 - Esquema de Iluminação Natural Difusa. Elaborado pela autora.

65


DESENVOLVIMENTO PLACA METÁLICA

processo de desenvolvimento

FACHADA OESTE COM PLACA METÁLICA

66


GRID CONSTRUTIVO DETALHE 1

1

67


Diretrizes da praça A presença de uma praça próxima a implantação do centro socioeducativo proposto visa contribuir com a aplicação das medidas socioeducativas e servir de espaço de visitação para os jovens a depender do plano pedagógico implantado, oferecer para a população um equipamento público de uso coletivo e contribuir para a melhor inclusão desses equipamentos no tecido urbano. Visando a melhor integração desses equipamentos e refletindo sobre os usos dos espaços do centro socioeducativo proposto, é realizada a implantação do campo de futebol gramado e do anfiteatro na praça. Sendo o anfiteatro reinterpretado para funcionar como uma arquibancada voltada para o muro do equipamento, para que este possa servir de plano de fundo de apresentações culturais ou para projeções de vídeos. A guarda-externa fica situada de forma insinuar a operação de guarda e segurança abrangendo tanto os espaços da praça quanto o centro socioeducativo.

Legenda 1 2 3

68

guarda externa campo de futbol gramado anfiteatro

Figura 19 - Mapa de situação do terreno da proposta no bairro da Messejana e equipamentos adjacentes. Elaborado pela autora.




considerações finais O presente trabalho permitiu o conhecimento mais aprofundado de dados que se relacionam à violência em Fortaleza, demonstrando como adolescentes que moram em bairros de conflitos territoriais são um grupo vulnerável e de que o envolvimento em infrações é mais um fator que demonstra esse aspecto. Cumpriu com o seu objetivo principal de projetar um centro socioeducativo com interpretações do Sinase e propício de adequação a uma metodologia inspirada no método APAC, favorecendo o acolhimento, o lazer, o aprendizado, o encontro com familiares o contato com a arte, a capacitação profissional, a vivência da espiritualidade e outros direitos básicos. Além disso, a apresentação de diretrizes para uma praça em seu entorno, de forma a, tanto contribuir para gradativa reinserção dos adolescentes em espaços públicos, quanto servir de contrapartida para a população do bairro que recebeu o equipamento. O processo de elaboração deste trabalho final foi contemplado com o contato com profissionais que trabalham em centros socioeducativos, pessoas religiosas que desempenham assistência espiritual a pessoas em situação de cárcere e estudantes e professores de arquitetura e urbanismo a respeito de diversos aspectos que conectam-se ao tema. Isso fomentou, cada vez mais, a melhor compreensão de suas complexidades.

ilustração 6 conforme apêndice 71



bibliografia Referências Bibliográficas ANDRADE, Durval Ângelo. APAC: a face humana da prisão. Belo Horizonte: Expressa, 2014. AZEVEDO, Gabriela, SILVA, Joana e ROCHA, Mario. O Método APAC como Possibilidade de ser Aplicado na Internação do Menor Infrator. Caxias do Sul, 2015 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. ______. Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de julho de 1990. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 2002. ______. Lei do SINASE. Lei n. 12.594, de 18 de janeiro de 2012. Disponível em://www. planalto.gov.br ______. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispões sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e da outras providências. 7. Ed., DF: Senado Federal. CHING, Francis. Arquitetura, forma, espaço e ordem. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2009. FREITAS, Edmar. Coleção Pajeú - Messejana. Fortaleza: Secultfor, 2013 PASTRO, Cláudio. O Deus da Beleza: A educaçao através da beleza. São Paulo: Paulinas, 2000. SANTAYANA, Glen. PriSchool: A Prison + School Hybrid. Tese (Mestrado em Arquitetura) – Escola de Design, Universidade de Harvard. Cambridge, 2013. SANTIAGO, Maria Coeli Girão. Uma Luz no Fim do Túnel: Avaliação da Percepção dos Socioeducando e Familiares sobre a Aplicação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo em uma Unidade de Semiliberdade em Fortaleza. Tese (Mestrado em Avaliação de Políticas Públicas) - Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação, ilustração 7 conforme apêndice

Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2014.

73


SANTIAGO, Zilsa Maria Pinto. Arquitetura e instrução pública: A Reforma de 1922, concepção de espaços e formação de grupos escolares no Ceará. Tese (Doutorado em Educação Brasileira) - Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2011. SEGAWA, Hugo. Construção de ordens: um aspecto da arquitetura no brasil, 18081930. São Paulo, 2000. SERRA, Bianca, MAIA, Isabel, MARCIANO, Danielle, TEMOTEO, Wagneriana. O método APAC e sua aplicabilidade no sistema penitenciário nacional. Fortaleza, 2016. SOUZA, Danielle Gomes de Barros. A repercussão das diretrizes pedagógicas do SINASE nos projetos arquitetônicos de unidades socioeducativas de internação. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Maceió, 2011.

Bibliografia Consultada ABNT NBR 9050:2004. Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. ALBUQUERQUE, Isis de. Juventude e punição: sob a ótica de jovens internos no Centro Educacional Patativa do Assaré – CEPA / Isis de Albuquerque. – 2011. ANTÔNIO, Wynie Araújo, Centro Socioeducativo: ambientes interativos - fábrica de sonhos, trabalho final de graduação, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2016. BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo: Diretrizes e eixos operativos para o SINASE. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, 2013. Lei nº 12.852, de 05 de agosto de 2013. Referente ao Estatuto da Juventude. COLET, Charlise Paula & COITINHO, Viviane Teixeira Dotto. A abordagem da justiça restaurativa no exercício da cidadania pelo adolescente em conflito com a lei: da estigmatização à inclusão social. Artigo. Disponível em: < http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/ anais/salvador/charlise_paula_colet-1.pd f>. Acessado em 17-6-2010. CONANDA & SEDH. Sistema Nacional De Atendimento Socioeducativo – SINASE. Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Brasília: CONANDA, 2006. FROTA, Anésia Barros; SCHIFFER, Suelli Ramos. Manual de Conforto Térmico. São Paulo: Studio Nobel, 1995. LAMBERTS, Roberto; DUTRA Luciano; PEREIRA, Fernando O. R. Eficiência Energética na Arquitetura. São Paulo: Pro Editores, 1997. PROGRAMA NOVOS RUMOS. Atos Normativos. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 2007.

74


RODRIGUES, Flávia Silvia e LIMA, Ana Laura Godinho. Instituições de assistência à infância no Brasil nas décadas de 1880 a 1960: um estudo da legislação federal. Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Disponível em link:http://sbhe.org.br/ novo/congressos/cbhe2/pdfs/Tema7/7113.pdf. ZEVI, Bruno. Saber Ver Arquitetura. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1994.

Sites Consultados ALBUQUERQUE, Isis de. Juventude e punição: sob a ótica de jovens internos no Centro Educacional Patativa do Assaré – CEPA / Isis de Albuquerque. – 2011. Disponível em: Acesso em: UOL NOTÍCIAS. Por que morrem tantos jovens na capital mais perigosa do Brasil para adolescentes. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2017/06/06/ por-que-morrem-tantos-jovens-na-capital-mais-perigosa-do-brasil-para-adolescentes.htm. Acesso em: 07/06/2017. ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AOS CONDENADOS – APAC ITAÚNA. Disponível em : http://apacitauna.com.br. Acesso em: 12/06/2017. O POVO. Fortaleza é a capital com o maior índice de homicídios na adolescência. Disponível em: http://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2017/06/fortaleza-e-a-capital -brasileira-com-o-maior-indice-de-homicidios-da-a.html. Acesso em: 07/ 06/2017.

75



lista de figura Figura 1 Centro de Reintegração Social da APAC de São João Del Rei (MG), inaugurado no final de 2013. 34

Figura 3 Esquema de classificação das formas proposto por F. Ching. 42 Figura 4 Esquema de classificação das formas proposto por F. Ching. 43 Figura 5 Linha Superior: planta-baixa, cheios e vazios e circulação do Centro Socioeducativo São Francisco; Linha ao meio: planta-baixa, cheios e vazios e circulação do Centro Socioeducativo Patatva do Assaré; Linha Inferior: planta-baixa, cheios e vazios e circulação do Centro Socioeducativo Canindezinho. Fonte: Setor de Arquitetura da Superintendência de Atendimento Socioeducativo do Governo do Estado do Ceará. 45 Figura 6 Área Austrália. 48 Figura 7 Fachada do Vestiário de Leighton Beach, Austrália. 48 Figura 8 Área interna do Vestiário de Leighton Beach, Austrália. 48 Figura 9

Espaço interno da Casa-estúdio, de Luís Barragan. 50

Figura 10 Exterior da Casa-estúdio, de Luis Barragán. 50 Figura 12 Mapa de situação do terreno dentro do bairro e da SER II. 54 Figura 13

Mapa de situação do terreno da proposta no bairro da Messeja na e equipamentos adjacentes. 57

Figura 14

Planta explodida perspectivada. 61

Figura 15

Esquema Construtivo. Malha da estrtura e Coberta. 63

Figura 16

Esquema de Ventilação. 64

Figura 17

Esquema de Chuva. 65

Figura 18

Esquema de Iluminação Natural Difusa. 65

Figura 19 Mapa de situação do terreno da proposta no bairro da Messeja-


apêndice Experiências vividas em visitações à centros socioeducativos em Fortaleza no período de junho de 2015 a julho de 2017 contribuiram para um processo de sensibilização para com as dificuldades enfrentadas por jovens em situação de vulnerabilidade, seja por uma carência moral, material ou espiritual. A comunicação dessas experiências tem o intuito de envolver o leitor em uma atmosfera de maior aproximação com o tema e contribuir para a reflexão a respeito do tema deste trabalho. Dormitório onde jovens escreveram a frase “bem-vindo ao inferno”, demarcando o ambiente que, de acordo com relatos deles, seriam levados os jovens considerados mais problemáticos.

A espera para que alguém passasse com pasta de dente fez com que a escova de dimensões reduzidas fosse apoiada na grade, porta de acesso de dormitórios.

Notícias que diziam respeito à essas realidades passaram a ter um significado e um impacto diferente após o início de visitações à centros socioeducativos.

78


A experiência de um jovem que buscou socorro à Deus por meio de uma oração para o enfrentamento de uma situação de risco e foi atendido.

Materiais apreendidos após uma vistoria e apresentados como forma de mobilizar a persistência na assistência espiritual dessa instituição.

Imagem da tentativa de brincar de pescaria e viver algo lúdico, mesmo estando em um ambiente com grades.

O olhar de um jovem ao pedir oração por libertação física, moral e espiritual.

79


Ilustração Melina Pinheiro | melinapinheirom@gmail.com Diagramação Levi Holanda | levi.hcbranco@gmail.com




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