E-Book III Congresso SPESM - Volume I

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A Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental ASPESM

DA INVESTIGAÇÃO À PRÁTICA Atas do III Congresso Internacional da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

Porto, Dezembro 2012


EDIÇÃO E PROPRIEDADE: SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL

Título: DA INVESTIGAÇÃO À PRÁTICA Sub-Título: Atas do III Congresso Internacional da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

COORDENAÇÃO DA EDIÇÃO: Carlos Alberto da Cruz Sequeira Luís Octávio de Sá

COMISSÃO EDITORIAL: Bruno Miguel Costa Santos Francisco Miguel Correia Sampaio

Divulgação: SPESM Suporte: E-book (formato .pdf) ISBN: 978-989-96144-4-4 Nota: todos os artigos publicados são propriedade da SPESM, pelo que não podem ser reproduzidos para fins comerciais, sem a devida autorização da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental A responsabilidade pela idoneidade e conteúdo dos artigos é única e exclusive dos seus autores.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


ÍNDICE 1. JOGO EDUCATIVO PARA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

10

Camila de Castro Teixeira; Zelia Nunes Hupsel; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira

2. PERFORMANCE HUMANA E INFLUÊNCIA DOS ANTIDEPRESSIVOS NAS FUNÇÕES PSICOMOTORAS – UM ESTUDO EXPERIMENTAL 18 Helena Jardim; Bruna R. Gouveia

3. VULNERABILIDADE AO STRESS EM FAMILIARES DE PESSOAS EM SITUAÇÃO CRÍTICA

27

Madalena Cunha; Helena Rosário; Fernando Pina

4. ENFERMEIROS DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS PERANTE A DOENÇA MENTAL

40

Nelson Alexandre Simões de Oliveira; Carolina Miguel Graça Henriques

5. AS HABILIDADES SOCIAIS DO DOENTE MENTAL EM CONTEXTO DE INTERNAMENTO

52

Carolina Miguel Graça Henriques; Helena da Conceição Borges Pereira Catarino; José Carlos Gomes; Nelson Alexandre Simões Oliveira

6. OS ESTILOS PARENTAIS EDUCATIVOS E ANSIEDADE MANIFESTA NA CRIANÇA

63

Carolina Miguel Graça Henriques*; Jacinta de Jesus Ferreira Alho

7. VIVÊNCIAS DO HOMEM INFÉRTIL QUE DESEJA TER FILHOS

75

Carolina Miguel Graça Henriques; João José de Sousa Franco; Paula Maia Ferreira Vicente Amado

8. A QUALIDADE DA SUPERVISÃO NO ENSINO CLÍNICO DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL

85

Carla Sílvia Fernandes; Bruno Miguel Costa Santos; Raquel Maria Torres; Victor Ferreira Lobo

9. CONTRIBUTO DAS INTERVENÇÕES PSICOEDUCATIVAS NA ADESÃO TERAPÊUTICA DA PESSOA COM INSUFICIÊNCIA CARDÍACA: CONCEÇÃO DE UM PROGRAMA PSICOEDUCATIVO 96 Pedro Miguel Custódio

10. ALTERAÇÕES PSICOLÓGICAS E COMPORTAMENTAIS NA DEMÊNCIA

125

Lia Fernandes

11. VINCULAÇÃO, TEMPERAMENTO AFETIVO E SAÚDE MENTAL

133

Raul Alberto Cordeiro

12. ESTRATÉGIAS COMUNICATIVAS UTILIZADAS PELOS ENFERMEIROS DE CUIDADOS INTENSIVOS 150 Liliana Oliveira; Neide Feijó

13. ESTIGMA FACE AO DOENTE MENTAL - LOUCO?! MAS POUCO…

162

Ana Margarida Moreira Barbosa; Cátia Sofia da Silva Monteiro; Joana Raquel Fernandes Regufe; Marta Moreira e Sá

14. GESTÃO DO REGIME TERAPÊUTICO DA PESSOA PORTADORA DE ESQUIZOFRENIA: UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA 173 Fernanda Maria dos Santos Antunes Neto; Maria de Fátima dos Santos Rosado Marques

15. O USO DO ÁLCOOL PELAS GESTANTES E AS CONSEQUÊNCIAS SOBRE O FETO

179

Priscyla Fernanda Santana França; Maria do Carmo Querido Avelar

16. A DEPRESSÃO NOS IDOSOS – UM ESTUDO DE CARACTERIZAÇÃO DE IDOSOS RESIDENTES NA COMUNIDADE Bruna R. Gouveia; Helena Jardim

190


17. ADAPTAÇÃO E VALIDAÇÃO PARA PORTUGUÊS DO QUESTIONÁRIO DE COPENHAGEN BURNOUT INVENTORY (CBI) 202 Cesaltino Manuel Silveira da Fonte; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe; José Carlos Rodrigues Gomes

18. “PONTES DE SAÚDE MENTAL”: O IMPACTO DE UMA INTERVENÇÃO EM GRUPO NA SAÚDE MENTAL, SENTIDO INTERNO DE COERÊNCIA E ADESÃO AOS TRATAMENTOS DO DOENTE DEPRESSIVO 219 Ana Margarida Varandas Santo; José Carlos Gomes

19. CO-DINÂMICA DO TRATAMENTO PSICOTERAPEUTICO DE PAIS E DE FILHOS

239

Luís Barroso

20. OS PAIS COMO PARCEIROS NA EDUCAÇÃO PARA A SEXUALIDADE

250

Maria Isabel Santos; Júlia Magalhães; Neide Feijó

21. ALTERAÇÕES EMOCIONAIS DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: CONHECER PARA PREVENIR

262

Júlia Magalhães; Maria Isabel Santos; Neide Feijó

22. PERCEÇÃO DOS PAIS SOBRE A ADAPTAÇÃO DOS IRMÃOS DE CRIANÇAS COM DOENÇA ONCOLÓGICA

274

Goreti Filipa Santos Marques; Beatriz Rodrigues Araújo

23. QUALIDADE DE VIDA DO DOENTE COM ESQUIZOFRENIA INSTITUCIONALIZADO

286

Filipa João Antunes Costa Lima

24. ANSIEDADE: BOAS PRÁTICAS EM ENFERMAGEM

298

Natália da Conceição Martins Rodrigues Fernandes; Rosângela Sebastiana Augusto de Sousa; Maria da Fé Tavares Carapichoso; Filipe Daniel Viegas Fontes; António José Bastos Martins

25. TÉCNICAS DE RELAXAMENTO: BOAS PRÁTICAS NO SERVIÇO DE MEDICINA INTENSIVA

307

Natália da Conceição Martins Rodrigues Fernandes

26. RASTREIO E DETEÇÃO DE CASOS EM SAÚDE MENTAL

325

Elza Maria Silva Lemos; Ana Maria Romano; José Manuel Monteiro Dias; Maria Conceição Alves Rainho

27. O ACOLHIMENTO DOS USUÁRIOS DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS NA ATENÇÃO BÁSICA: PERCEPÇÃO DOS ENFERMEIROS

332

Letícia Bosso Moreira; Sonia Regina Zerbetto

28. ATITUDES DOS ENFERMEIROS NA PSIQUIATRIA FACE À IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA NOS CUIDADOS DE ENFERMAGEM 343 Júlia Martinho; Manuela Martins; José Carlos Carvalho; Ilda Fernandes

29. CONVIVER COM UMA PESSOA COM ESQUIZOFRENIA: REPERCUSSÕES NOS FILHOS E CÔNJUGE 354 José Carlos Carvalho; Paula Pinto Freitas; António Leuschner

30. VERDADES ÚNICAS DE PERCURSOS PARTILHADOS: CONJUGALIDADE E PROBLEMAS LIGADOS AO ÁLCOOL 369 Joana Amaral; Zélia Teixeira

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31. REIKI E QUALIDADE DE VIDA

381

Marcela Jussara Miwa; Maria Cristina Silva Costa; Nelson Filice de Barros

32. CYBERBULLYING - UMA AMEAÇA SEM ROSTO

392

Bárbara Sofia da Silva Cardoso Fernandes; Lígia Raquel Mendes Pereira Sala; Marina Fernandes Pereira; José Carlos Carvalho

33. PERCEÇÃO DO CONCEITO DE BULLYING NO TRABALHO PELOS ENFERMEIROS

402

Antónia Teixeira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

34. O EFEITO DE UM PROGRAMA DE EXERCÍCIOS NA MELHORIA DA MOBILIDADE EM DOENTES DE ALZHEIMER 414 Fernandes, A.; Carvalho, R

35. ENFRENTANDO UMA EXPERIÊNCIA DIFÍCIL MESMO COM APOIO: A ADOLESCENTE MENOR VIVENCIANDO A MATERNAGEM ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Paula Rosenberg de Andrade; Regina Issuzu Hirooka de Borba; Conceição Vieira da Silva Ohara; Circéa Amalia Ribeiro

36. O FAMILIAR COMO CUIDADOR DA PESSOA COM DEPRESSÃO

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Maria de Fátima dos Santos Rosado Marques; Manuel José Lopes

37. A ADESÃO AO PACIENTE ALCOOLISTA AO TRATAMENTO: NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E DROGAS LOCALIZADO NO INTERIOR DE SÃO PAULO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Cely de Oliveira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Tatiane Fernandes Alves

38. O PAPEL DO ENFERMEIRO NOS CUIDADOS A PACIENTES PORTADORES DE ESQUIZOFRENIA MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Cely de Oliveira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Tatiane Fernandes Alves

39. PERCEPÇÃO DOS GRADUANDOS DE ENFERMAGEM SOBRE ASSISTÊNCIA AO ADOLESCENTE PORTADOR DO TRANSTORNO BIPOLAR DO HUMOR ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Cely de Oliveira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Anselmo Amaro dos Santos

40. ABUSO E NEGLIGÊNCIA A PESSOAS IDOSAS: FATORES ASSOCIADOS À INTERVENÇÃO DOS ENFERMEIROS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Helena Maria Júdice; Carlos Alberto Sequeira; José Ferreira-Alves

41. ESTUDO DE CASO – DEPRESSÃO MAJOR

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Nelson Alexandre Simões de Oliveira; Catarina Cardoso Tomás

42. MOVIMENTO E RELAXAMENTO: UMA ESTRATÉGIA NO CONTEXTO DA INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Olga Maria Martins de Sousa Valentim; Maria do Céu Monteiro

43. QUALIDADE DE VIDA EM PESSOAS COM ALCOOLISMO

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Olga Maria Martins de Sousa Valentim; Célia Samarina Vilaça de Brito Santos; José Pais-Ribeiro

44. CULTURA, STRESS E DOENÇA MENTAL Carlos Manuel Ferreira Monteiro; Liliana Castanheira Rebelo

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.


45. FAMÍLIAS QUE INTEGRAM PESSOAS DEPENDENTES NO AUTOCUIDADO: PERCEÇÃO DA AUTOEFICÁCIA DOS MEMBROS DA FAMÍLIA PRESTADORES DE CUIDADOS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Susana Carla Ribeiro de Sousa Regadas; Cândida Assunção Santos Pinto; Abel Avelino de Paiva e Silva

46. IMPACTO DA PSICOEDUCAÇÃO NA ANSIEDADE E PERSPETIVAS FACE Á MORTE EM MÉDICOS E ENFERMEIROS DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Cláudia Cristina de Sousa Mourão

47. A LINGUAGEM CLÍNICA CONVOCADA PELOS ENFERMEIROS: DO PROCESSO DE DIAGNÓSTICO ÀS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM NUMA UIPIA ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Ana Margarida Esteves Pereira; Vanessa Sofia Daniel Lages

48. AVALIAÇÃO DO AUTOCONCEITO NUM GRUPO DE ADOLESCENTES PORTUGUESES MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Catarina Cardoso Tomás; João Paulo Branco Gaspar Dias Balau; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe; José Carlos Rodrigues Gomes

49. LITERACIA EM SAÚDE MENTAL DOS ADOLESCENTES E JOVENS – UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Tânia Morgado; Lúcia Sousa; Susana Conceição; Luís Loureiro

50. QUALIDADE DE VIDA E BEM-ESTAR DOS IDOSOS

ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO.

Sandra Moreira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

51. QUALIDADE DE VIDA E ESPIRITUALIDADE DE PESSOAS IDOSAS QUE VIVEM SÓS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Sandra Moreira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

52. QUALIDADE DE VIDA E SATISFAÇÃO COM A VIDA DOS IDOSOS NA COMUNIDADE MARCADOR NÃO DEFINIDO.

ERRO!

Sandra Moreira; Teresa Rodrigues Ferreira; Elizabete Borges

53. ANÁLISE DO PROJETO TERAPÊUTICO INSTITUCIONAL: NÚCLEO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS DE SANTO ANDRÉ ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Maria Odete Pereira; Isabela Alves Silveira Souza; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira

54. PROMOÇÃO DA SAÚDE MENTAL NOS ADOLESCENTES: RESULTADOS DE UMA ESTRATÉGIA DE INTERVENÇÃO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Luísa Campos

55. FATORES QUE DIFICULTAM A APLICABILIDADE DA POLÍTICA NACIONAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL PARA A ATENÇÃO INTEGRAL AOS USUÁRIOS DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Maria Odete Pereira; Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira; Paula Hayasi Pinho; Heloísa Garcia Claro; Divane de Vargas; Sônia Barros

56. INTENÇÃO DE PROCURA DE AJUDA E AS BARREIRAS PERCEBIDAS NO CONSUMO DE ÁLCOOL ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Luís Manuel de Jesus Loureiro; Aida Maria de Oliveira Cruz Mendes; José Carlos Pereira dos Santos; Nuno Rafael Neves de Oliveira

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57. O ABUSO DE ÁLCOOL E A PROCURA DE AJUDA EM ADOLESCENTES E JOVENS PORTUGUESES ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Luís Manuel de Jesus Loureiro; Teresa Maria Barroso; Catarina Sofia Sousa; Ana Teresa Martins Pedreiro

58. IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE DO INSTITUTO SÃO JOÃO DE DEUS NA CASA DE SAÚDE DO TELHAL – CLÍNICA DE ALCOOLOGIA NOVO RUMO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Jorge Cravidão

59. CONFUSÃO AGUDA E DELIRIUM: IMPORTÂNCIA DA UTILIZAÇÃO DE INSTRUMENTOS PSICOMÉTRICOS DE DIAGNÓSTICO E/OU RASTREIO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. Francisco Miguel Correia Sampaio; Carlos Alberto da Cruz Sequeira

60. FAMÍLIA: GESTÃO DE CONFLITOS EM CONTEXTO PSIQUIÁTRICO ERRO! MARCADOR NÃO DEFINIDO. ,

Manuela Martins, Júlia Martinho, José Carlos Carvalho Ilda Fernandes

61. PREVALÊNCIA DO BULLYING NUMA EB2,3 DA REGIÃO NORTE DE PORTUGAL NÃO DEFINIDO.

ERRO! MARCADOR

Elizabete Borges; Pedro Melo

62. CARPE – CENTRO DE ACOMPANHAMENTO E REABILITAÇÃO PSICOEDUCATIVA NÃO DEFINIDO.

ERRO! MARCADOR

Ana Maria Seco Alves de Sousa; Luís Filipe Esteves Barbosa de Oliveira; Célia Maria Fernandes Cerqueira

63.PREVENÇÃO DE COMPORTAMENTOS SUICIDÁRIOS: UM CONTRIBUTO DOS ENFERMEIROS MARCADOR NÃO DEFINIDO. José Carlos Santos

ERRO!


INTRODUÇÃO

Caros (as) colegas, Em primeiro lugar envio uma palavra de apreço e agradecimento pelo elevado número de trabalhos enviados para esta publicação. A todos os autores, um bem-haja, pelo esforço e contributo na disseminação do conhecimento. A edição deste E-book surge no âmbito da realização do III CONGRESSO INTERNACIONAL, que se realizou nos dias 10, 11 e 12 de Outubro de 2012, no Auditório da Universidade Católica, Porto, Campus da FOZ, Portugal. Este evento foi dedicado à Investigação em Saúde Mental e à sua Relação com a Prática Clínica, porque consideramos que se trata de uma área da maior importância na promoção de saúde, prevenção da doença e no tratamento/reinserção da pessoa com problemática mental. Desde já agradecemos à Universidade Católica pela amabilidade demonstrada no acolhimento desta iniciativa da SPESM, A Janssen, à BIAL e à LIDEL Edições Técnicas Ldª, pelo apoio a este evento. Este evento, iniciou-se no dia 10 de Outubro de 2012, com as comemorações do dia Mundial da Saúde Mental, com destaque para o debate sobre “como promover uma melhor saúde mental das pessoas” e terminou no dia 12 com uma conferência sobre “a promoção da saúde mental na comunidade”. Por isso, a enfase foi colocada na investigação e, na investigação que ofereça respostas seguras para a prática clínica. As pessoas com doença mental fruto de alterações cognitivas, afetivas, relacionais e comportamentais,…, devem ter o direito, de ser alvo de intervenções sustentadas pela investigação, ou seja, que tenham possibilidades efetivas de contribuir para a melhoria do seu estado de saúde.

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O programa científico incluiu conferências sobre a Investigação e a prática clinica em saúde mental; ética e a saúde mental/doença mental; pratica baseada na evidência e o seu contributo para a qualidade das práticas, dados epidemiológicos sobre a morbilidade psiquiátrica em portugal e no brasil, a saúde mental dos adolescentes, a depressão e o suicídio em Portugal, as questões relacionadas com o álcool – instrumentos de avaliação, estratégias de redução da ansiedade e depressão nos familiares cuidadores, a reabilitação psicossocial e a assistência à pessoa com doença mental, estratégias de empoderamento das equipas, a construção social do enfermo mental, estratégias para promover comunidades mentalmente saudáveis e como construir uma boa saúde mental. Em paralelo funcionaram várias mesas temáticas com sessões mais práticas sobre: violência e saúde mental, impacte da doença mental, envelhecimento, demência e familiares cuidadores, vulnerabilidade e resiliência em adolescentes e jovens adultos. A nossa mensagem neste ano de 2012 é de esperança; esperança para todos os profissionais de saúde, esperança para todas as pessoas vulneráveis, esperança para todos por um futuro melhor, porque sem esperança, a vida torna-se muito mais difícil. Os artigos selecionados foram muito diversificados. A responsabilidade do seu conteúdo é única e exclusiva dos seus autores. Optamos por aceitar o maior número de artigos enviados, por considerarmos a sua importância para a divulgação do conhecimento, em detrimento de um rigor exaustivo em termos de formatação de acordo com as regras de publicação. Na expetativa de ver o nosso esforço recompensado, esperamos que disfrutem deste EBook, como prova para memória futura de alguns dos trabalhos discutidos neste congresso. Porto, 18 de Dezembro de 2012 O Presidente da Direcção da SPESM Carlos Sequeira


1. JOGO EDUCATIVO PARA DEPENDÊNCIA QUÍMICA Camila de Castro Teixeira*; Zelia Nunes Hupsel**;Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira*** *Graduada em Enfermagem pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - 55 11 991906878, camila.castrot@gmail.com **Professora Ms. Assistente do Departamento De Enfermagem na Saúde do Adulto e Idoso do Curso Graduação Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - 55 11 991694231, zeliahupsel@uol.com.br ***Professora Dra. Associada - Livre Docente do Departamento de Enfermagem Materno- Infantil e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - 55 11 997615301, marciaap@usp.br

RESUMO Durante as aulas práticas da Disciplina Enfermagem Psiquiátrica em determinada unidade de tratamento a pacientes dependentes químicos, os alunos do Curso de Enfermagem decidiram realizar uma atividade terapêutica que contemplasse a educação em saúde, projeto que encoraja as pessoas a adotar e manter padrões de vida sadios visando a melhoria das próprias condições de saúde, do coletivo e do meio ambiente. Foram identificados os assuntos de interesse dos pacientes e elaborada uma atividade lúdica e educativa na forma de um jogo de tabuleiro, com circuito, denominado “A Chave”, com os objetivos de identificar déficits de conhecimento; Realizar Educação; Estimular a reflexão, sensibilização e discussão sobre a dependência química; Aumentar o senso crítico dos envolvidos. O jogo foi apresentado aos pacientes e a Equipe de Enfermagem da unidade que participaram e jogaram até o final. A atividade foi avaliada como intervenção terapêutica, educativa que permitiu atualização no assunto drogas, facilitou a exposição e a reflexão de sentimentos. O enfermeiro pode desenvolver atividades

lúdicas

e

educativas

nos

serviços

de

saúde,

promovendo

sensibilização, acolhimento, vínculo, adesão ao tratamento e reflexão. Palavras-chave: Enfermagem; educação em saúde; dependência química. 10

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1.1. INTRODUÇÃO Com a finalidade de realizar uma atividade terapêutica com os pacientes de uma unidade para atendimento a dependentes químicos de um determinado Centro de Atendimento a Saúde Mental, localizado na cidade de S. Paulo, os alunos do Curso de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa decidiram realizar um jogo. Optou-se então em realizar uma atividade lúdica e educação em saúde cujo foco está voltado para a população e para a ação com os objetivos de encorajar as pessoas a adotar e manter padrões de vida sadios; usar de forma judiciosa e cuidadosa os serviços de saúde colocados à sua disposição, e

tomar sua próprias decisões, tanto

individual como coletivamente, visando melhorar suas condições de saúde e as condições do meio ambiente“, além de desenvolver nas pessoas o senso de responsabilidade pela sua própria saúde e pela saúde da comunidade a qual pertençam e a capacidade de participar da vida comunitária de uma maneira construtiva(Stefanelli, Moreno, 2008; Levy, 2012). Para a identificação do assunto de interesse dos pacientes, foi disponibilizada uma caixa para eles depositarem suas dúvidas, esta caixa permaneceu na unidade um período de vinte e quatro horas. Após a retirada e a leitura do conteúdo, constatou-se perguntas e dúvidas sobre a internação, dependência química, conceito, intervenção, tratamento, medicamentos, reabilitação. Segundo Santo Agostinho, “o lúdico é eminentemente educativo no sentido que constitui a força impulsora de nossa curiosidade a respeito do mundo e da vida, o princípio de toda descoberta e toda criação” (Fujishima, 2009). Assim foi elaborado um jogo de tabuleiro, com circuito, denominado “A Chave”, que ajuda a reconhecer o motivo da internação e a identificar a situação vivenciada atualmente e que condiz com a realidade do paciente. A linguagem utilizada é objetiva, com gírias e expressões conhecidas, relacionadas ao cotidiano dos dependentes químicos. Teve-se o cuidado de não elaborar o jogo com numero excessivo de cartas para não cansar e provocar desinteresse nos jogadores.

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1.1.1. OBJETIVOS DO JOGO •

Realizar Educação em Saúde;

Estimular a reflexão, sensibilização e discussão em grupo sobre a dependência química;

Identificar o déficit de conhecimento sobre a ação das

substâncias

psicoativas e esclarecer duvidas ; •

Aumentar o senso crítico dos envolvidos (conhecimento) e favorecer a expressão de sentimentos.

1.2. MÉTODO Aplicação, desenvolvimento e etapas do jogo: •

Duração: aproximadamente 1h e10 m.

Participantes: no mínimo dois e no máximo seis jogadores, com direito a uma jogada por rodada.

Início do jogo: Começa o jogo o participante que jogar o dado e obter o maior número.

Espaço ou Local: É importante que seja desenvolvido em um ambiente calmo para que não perca o foco da atividade terapêutica. O tabuleiro é colocado sobre uma mesa e os participantes ficam em volta.

Material do jogo 12

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Um/1 tabuleiro com vinte e seis/26 casas numéricas, dez/10 casas vermelhas, doze casas/12 com um ponto de interrogação;

Um/1 dado

Seis/6 piões em formato de chave

Dez/10 Cartões vermelhos: O que são drogas ? Os Tipos de drogas- O que é Dependência química- A Dependência química é uma doença?Dependência física- Dependência psíquica- Tratamento- MedicaçõesInternação- Dia-Dia (Stefanelli, Moreno 2008; NEAD, 2011).

Sete/7Cartões verdes: dizeres populares e do cotidiano dos usuários de substâncias lícitas e ilícitas, Momentos difíceis, mudanças, recaída, balada com os amigos, entre outras...

Seis/6 Chaveiros prêmios

Um Folheto “Regras ”

O JOGO “A CHAVE”

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O tabuleiro foi confeccionado com Etil Vinil Acetato (EVA), cola quente e caneta marcadora permanente. Os objetos “piões” foram feitos em forma de chave com massa de “bisqui” e tem a identificação do assunto de interesse dos pacientes para a discussão e reflexão. Os

cartões

também

são

de

EVA

e

cortados

em

quadrados

de

aproximadamente 10x10 cm nas cores vermelhas e 5x5 cm nas cores verdes. Os conceitos e as frases foram impressos em folha de papel A4, fixados nos quadrados de EVA e plastificados com adesivo contact. Outras peças são os chaveiros de plástico com uma chave em EVA cada um com a seguinte frase “Você é a chave para o seu caminho”.

Observações sobre a aplicação do jogo Inicialmente todos os pacientes e a Equipe de Enfermagem da unidade foram convidados para participarem. O jogo foi apresentado como um recurso para facilitar o aprendizado, estimular reflexão e discussão. Foi esclarecido que não possuía a ideia de competição, todos seriam ganhadores e o importante era o aprendizado. Foi assegurada liberdade de participação e de tomada de decisão.

O jogo seguiu os seguintes passos •

Foi estipulada uma hora de duração. Os pacientes que não participaram da atividade proposta, observaram o curso da dinâmica, pois as outras tarefas da unidade estavam suspensas, para não perder o foco da atividade proposta.

Foram explicadas as regras: O jogo comporta no mínimo dois e no máximo seis pessoas, com direito a uma jogada por rodada. O tabuleiro com vinte e seis casas numéricas são avançadas pelos participantes. Existem no

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tabuleiro dez casas vermelhas, e é obrigatória a retirada de um cartão vermelho pelo participante ao passar pela casa e a leitura em voz alta do texto. Nestes cartões existem orientações sobre o tema explorado. Também há doze casas com um ponto de interrogação e ao passar por estas, é obrigatório a retirada de um cartão verde. Nesses cartões verdes constam frases que estão na rotina de um dependente químico: “Você teve uma recaída: Volte 1 casa”; “Balada com os amigos: volte 2 casas. Parabéns, você ficou só no refri: Ande 3 casas”; “Mudanças. Você está com a chave em suas mãos,faça a sua escolha”: Ande 2 casas” entre outras. Estas expressões têm como finalidade trazer o jogador a sua realidade e estimular a tomada de decisões e reflexões

no contexto

histórico (Stefanelli, Moreno 2008; NEAD, 2011). Essa fase do jogo permite que o jogador avance ou volte algumas casas, “permaneça uma rodada sem jogar” ou “retorne para o começo do jogo”. Vence aquele que chegar primeiro ao final do jogo, mas todos ganham a chave, o que deve funcionar como um incentivo.

1.3. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A primeira aplicação desse jogo teve início às 8h40 e terminou às 9h30. Na unidade havia dezoito pacientes, após o convite/propaganda, seis aceitaram participar da atividade, quatro observaram, dois pacientes não participaram devido a atendimento médico e visita da família e três ficaram no local, aparentemente não deram atenção ao jogo. Não houve participação direta da equipe de enfermagem, no entanto, todos ficaram atentos ao desenrolar do jogo. Os seis participantes jogaram até o final do circuito do tabuleiro. Foram lidos todos os conceitos descritos nos cartões vermelhos e com compreensão da leitura. Também se identificaram com as frases que constavam nos cartões verdes de acordo com o que foi coletado anteriormente. Nesse momento, apresentaram de forma espontânea as suas experiências pessoais tais como: E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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quando começaram o uso de drogas, como eram as recaídas, a síndrome de abstinência, a overdose, a relação com os amigos e familiares e a vontade de se reintegrarem na sociedade. Durante o jogo, demonstraram insatisfação com as regras quando as cartas vermelhas acabaram e foi necessário estabelecer limites para a conclusão da atividade. Ao ser explicado, entenderam a dinâmica e acataram as normas da atividade proposta. Todos ganharam o prêmio simbólico a medida que chegavam ao final do jogo e então comentavam que poderiam ser vencedores. O uso de álcool e drogas ainda é um assunto discutido com preconceito pela sociedade, existe dificuldade em compreender que a dependência química é um transtorno mental que pode atingir o sujeito em diferentes fases da vida e em diversos contextos, que há tratamento e que não deve ser banalizado. As repercussões não afetam apenas o usuário, mas também os familiares e a sociedade em que este indivíduo está inserido (OBID; NEAD, 2011). O jogo foi doado para a unidade e colocado à disposição para outros setores.

1.4. CONCLUSÕES Consideramos que a dinâmica é interessante, trata-se de uma intervenção terapêutica, foram esclarecidas as dúvidas e atingidos os objetivos. Os alunos e professores envolvidos avaliaram que essa dinâmica educativa permitiu que todos atualizassem o conhecimento sobre o assunto drogas, facilitou a exposição e a reflexão dos pensamentos e sentimentos dos participantes frente à dependência química, as dificuldades relacionadas ao tratamento e o preconceito vivido. Além disso, identificou a semelhança e características comuns entre os pacientes que procuram efetividade no processo de tratamento. Deve-se salientar a importância da atuação da equipe multiprofissional durante a internação e a reabilitação desse paciente com relação às atividades, que devem ser voltadas para o processo de ensino e aprendizado, desenvolvidas 16

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por meio da educação em saúde. Isso permitirá que haja acolhimento, formação de vínculo entre a equipe e o paciente, adesão ao tratamento e reflexão. Em vista disso, pode-se dizer que o enfermeiro pode ser preparado para desenvolver atividades lúdicas e educativas com a população atendida no serviço de saúde em que esse profissional está inserido, promovendo a Sensibilização da sociedade quanto à dependência química como um transtorno psiquiátrico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Fujishima, M. (2009). Aprender Brincando: A História do Lúdico como instrumento facilitador no ensino aprendizagem.

[online].

Consultado

em:

02/06/2012.

Disponível

em:

http://www.soartigos.com/artigo/1994/Aprender-Brincando:-A-Historia-do-Ludico-como-instrumentofacilitador-no-ensino-aprendizagem/ Levy, S. Conferência Nacional de Saúde On-Line. Educação em Saúde: Histórico, Conceitos e Propostas. Ministério da Saúde, Diretoria de Programas de Educação em Saúde. Brasilia. Consultado em: 02/06/2012. Disponível em: http://www.datasus.gov.br/cns/temas/educacaosaude/educacaosaude.htm. Ministério da Justiça. Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas, OBID. (2011). Brasília. Consultado em: 02/06/2012. Disponível em http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/index.php Ministério da Justiça. Secretária Nacional de Políticas sobre Drogas- SENAD. (2011). Brasília. Consultado em: 02/06/2012. Disponível em http://www.senad.gov.br A Núcleo Einstein de Álcool e Drogas do Hospital Albert Einstein, NEAD. (2011).

São

Paulo.

Consultado

em:

02/06/2012.

Álcool e Drogas sem distorção. Disponível

em:

http://apps.einstein.br/alcooledrogas/novosite/atualizacoes/as_115.htm Stefanelli, M. & Moreno, R. (2008). Intervenções Psicoeducacional Orientação e Educação em Saúde Mental. In Enfermagem Psiquiátrica em suas dimensões assistenciais, pp. 281- 293. São Paulo: Editora Manole.

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2. PERFORMANCE HUMANA E INFLUÊNCIA DOS ANTIDEPRESSIVOS NAS FUNÇÕES PSICOMOTORAS – UM ESTUDO EXPERIMENTAL Helena Jardim*; Bruna R. Gouveia** *Prof. Coordenadora, Centro de Competência Tecnologias da Saúde - Universidade da Madeira, hjardim@uma.pt **Prof. Assistente Convidada, Centro de Competência Tecnologias da Saúde - Universidade da Madeira, brunadegouveia@uma.pt

RESUMO O uso de substâncias psicoativas, particularmente dos antidepressivos, tornouse banal no quotidiano. Este estudo experimental pretende avaliar o desempenho psicomotor dos indivíduos face à ingestão de antidepressivos. A amostra, composta por 9 mulheres voluntárias/saudáveis (33-43 anos), foi distribuída aleatoriamente por 3 grupos: G1 (Mianserina 30mg); G2 (Fluoxetina 20 mg) e o G3 (Placebo). A avaliação da performance foi realizada com recurso ao Leeds Psychomotor Tester: Frequência Crítica de Fusão (CFF) e Tempos de Reacção de Escolha (CRT). Utilizou-se ainda o Teste de Substituição Algarismos/Símbolo (DSST) e o Teste Cópia de Símbolos (SCT). As avaliações foram realizadas em 3 momentos, com intervalos de 1 hora. A análise estatística foi descritiva e inferencial. Quanto à CFF, verificou-se que os antidepressivos, desde a 2ª hora após ingestão, provocam diminuição significativa da função de arousal (integração). Relativamente ao CRT, constatou-se que apenas a Mianserina apresenta variações significativas à 2ª e 3ª horas após ingestão. No DSST, atestou-se que a Mianserina exerce um efeito depressor durante todo o tempo de ação e a Fluoxetina apresenta diferença significativa somente à 1ª hora após ingestão. Verificou-se que os antidepressivos não afectam o SCT. 18

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Os dados obtidos confirmam a diminuição do desempenho psicomotor sob a influência destes fármacos.

Palavras-chave: Performance humana; Antidepressivos.

2.1. INTRODUÇÃO Para que o ser humano execute um perfeito desempenho numa atividade, desde a mais simples à mais complexa, é necessária, além da integridade do sistema sensorial e motor, a respetiva coordenação do sistema nervoso central (SNC). A performance humana consiste num composto de diversas funções isoladas, logo, segundo Broabent (1984), uma alteração numa destas funções pode não afectar as outras. A vida é marcada por acontecimentos estressantes, por exigências do quotidiano, os quais podem produzir ansiedade e depressão. É de facto conhecido o grave problema da automedicação, ao qual acresce uma prescrição excessiva, em especial dos ansiolíticos e dos antidepressivos, por parte dos clínicos (Pelegrini, 2003). Na atualidade, os psicofármacos instituíram-se como o recurso terapêutico mais utilizado para tratar qualquer malestar das pessoas, como a tristeza, o desamparo, a solidão, a inquietude, o receio, a insegurança, e mesmo a ausência de felicidade (Ferrazza, Luzio, Rocha & Sanches, 2010). Os medicamentos antidepressivos surgem então como uma alternativa vulgar, no entanto, apesar de um efeito redutor do stress/ansiedade e das alterações de humor, têm consequências na performance psicomotora, riscos e efeitos secundários associados.

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O uso generalizado de antidepressivos, desde 1957, tem levantado questões relativamente ao efeito destas drogas na função cognitiva. Apesar dos benefícios clínicos dos antidepressivos serem bem conhecidos, pouco se conhece sobre os seus efeitos na função intelectual e psicomotora (Amado-Boccara, Gougoulis, Littré, Galinowski & Lôo, 1995). A revisão de literatura efectuada por Serretti, Calati, Goracci, Simplicio, Castrogiovanni e Ronchi (2010) descreve a existência de uma lacuna no conhecimento, no que respeita aos efeitos psicológicos e cognitivos dos antidepressivos, referindo que os estudos publicados neste domínio são poucos e com limitações de poder, pela restrição e heterogeneidade das amostras, mormente no género e idade. Este estudo, de natureza experimental tem como objetivo avaliar o desempenho psicomotor dos indivíduos face à ingestão de substâncias

2.2. METODOLOGIA Este

estudo foi

Sociopsicologia

da

efetuado,

Saúde

na

em

1994, no âmbito do

Universidade

de

Mestrado em

Extremadura-Badajoz.

O

incremento e banalização da ingestão de fármacos antidepressivos pela população portuguesa originaram o interesse na divulgação do presente estudo. A pertinência do artigo advém da constatação de escassos estudos experimentais em indivíduos saudáveis, associada à mudança de legislação no que concerne à utilização de humanos em testes laboratoriais.

2.2.1. PARTICIPANTES A amostra foi constituída por 9 indivíduos voluntários e saudáveis, do sexo feminino, com idades entre 33 e 43 anos. 20

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Foram excluídos os indivíduos com alterações gastrointestinais, visuais, psicopatológicas, história de alcoolismo, sensibilidade aos antidepressivos e consumidores de substâncias aditivas. A realização deste estudo teve em conta legislação em vigor e os princípios descritos na Declaração de Helsínquia (1975), tendo sido solicitado o consentimento informado escrito a todos os participantes.

2.2.2. INSTRUMENTOS A avaliação da performance dos participantes foi realizada com recurso ao Leeds Psychomotor Tester, onde foram estimadas a CFF e CRT. A CFF é uma das variáveis mais utilizadas no estudo do desempenho do SNC e de alerta. Esta é definida por Smith e Misiak (1976) como o ponto em que uma fonte luminosa intermitente origina a sensação subjetiva de luz estável. Segundo Hindmarch (1990), a variável CRT consiste na medição do tempo de reconhecimento dos estímulos, bem como os tempos de reação motora e sensoriomotora. Com recurso a papel e lápis, foram realizados os testes: DSST e o SCT, que constituem testes de memória recente e função cognitiva, designadas por Hindmarch (1990) como memória executiva ou operativa. Estes são testes muito utilizados para a avaliação do processamento da informação sensorial e componente motora em cada tarefa. 2.2.3. PROCEDIMENTOS Após recrutamento, os participantes foram alocados aleatoriamente a 3 grupos diferentes: G1 (medicados com Mianserina 30mg); G2 (medicados com Fluoxetina 20 mg) e o G3 (medicado com Placebo).

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As avaliações foram realizadas em 3 momentos com intervalos de d 1 hora, em sala escurecida com luz artificial, ausência de ruído e/ou quaisquer interrupções. A colheita de dados decorreu durante um período de 8 meses, com alternância da distribuição dos participantes pelos grupos G1, G2, e G3. O tratamento estatístico incluiu estatística descritiva, correlacional (método de ajustamento de curvas dos mínimos quadrados ponderados) e estatística inferencial (análise multivariada).

2.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS No que respeita à CFF, verificou verificou-se que os antidepressivos, ssivos, desde a 2ª hora após ingestão, provocam diminuição significativa da função de arousal (integração), como é possível constatar na Figura 1.

Figura 1. Valores médios da CFF relativos aos grupos medicados com Mianserina, Fluoxetina e Placebo, ao longo das quatro avaliações realizadas.

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Relativamente ao CRT, constatou constatou-se se que apenas a Mianserina apresenta variações significativas à 2ª e 3ª horas após ingestão, não existindo diferenças significativas quanto à Fluo Fluoxetina e ao Placebo (Figura 2).

Figura ura 2. Valores médios da CRT relativos aos grupos medicados com Mianserina, Fluoxetina e Placebo, ao longo da das s quatro avaliações realizadas. No DSST, atestou-se se que a Mianserina exerce um efeito depressor durante todo o tempo da sua ação e a Fluoxetina apr apresenta esenta diferença significativa somente à 1ª hora após ingestão, conforme ilustrado na Figura 3.

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Figura 3. Valores médios da DSST relativos aos grupos medicados com Mianserina, Fluoxetina e Placebo, ao longo das quatro avaliações realizadas. Relativamente ao SCT, verificou-se que os antidepressivos não exercem diminuição neste componente, contudo apurou-se que um maior número de respostas certas ocorreu sob ação da Fluoxetina e um menor número sob ação da Mianserina.

2.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS No

que

respeita

à

CFF,

no

nosso

estudo,

verificou-se

que

os

antidepressivos provocavam diminuição significativa da função de arousal, o que é congruente com os resultados do estudo de Fink & Irwin (1982) e de Ridout & Hindmarch (2001). Relativamente ao CRT, constatou-se que apenas a Mianserina estava associada a um decréscimo significativo, às 2ª e 3ª horas após ingestão, o que foi verificado, igualmente, por Ridout & Hindmarch (2001). Nesta componente, não existiram diferenças significativas quanto à Fluoxetina e ao Placebo, o que era esperado, uma vez descrito em diversos estudos incluídos na revisão de literatura publicada por Amado-Boccara, Gougoulis, Littré, Galinowski e Lôo (1995). No DSST, atestou-se que a Mianserina exerce um efeito depressor durante todo o tempo da sua ação e a Fluoxetina apresenta diferença significativa somente à 1ª hora após a toma, o que identicamente confirma o exposto por Amado-Boccara, Gougoulis, Littré, Galinowski e Lôo (1995). Na mesma linha, verificou-se que os antidepressivos não exercem diminuição na performance no SCT.

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2.5. CONCLUSÕES No nosso estudo verificou-se que os antidepressivos, desde a 2ª hora após a toma, provocam diminuição da função de arousal (CFF). Apenas a Mianserina estava associada a variações significativas no CRT, à 2ª e 3ª horas após ingestão. Relativamente ao DSST, demonstrou-se que a Mianserina exerce um efeito depressor, durante todo o tempo de ação, enquanto a Fluoxetina estava associada a uma diferença significativa, somente à 1ª hora após ingestão. Verificou-se que os antidepressivos estudados não afetavam o SCT. Na sequência dos resultados obtidos nesta pesquisa, que suportam a inferência de que ocorre uma diminuição do desempenho psicomotor sob a influência destes fármacos, importa enfatizar o relevante papel dos profissionais de saúde na educação para a saúde das populações, visando prevenir o risco de acidentes, quedas e lesões decorrentes, potenciais percursoras de morte precoce, e evitando o consumo exagerado destes fármacos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Amado-Boccara, I., Gougoulis, N., Littré, M., Galinowski, A., Lôo, H. (1995). Effects of antidepressants on congnitive fuction: a review. Neurosci Biobehav Ver, 19(3), pp.479-493. Broabent, DE. (1984). Performance and its measurements. BR J Clin Pharmac. 18, pp. 55-95. Ferrazza, D., Luzio, C., Rocha, L. & Sanches, R. (2010). A banalização da prescrição de psicofármacos em um ambulatório de saúde mental. Paidéia. 20(47), pp. 381-390. Fink, M. & Irwin, P (1982). Effects of some psychoctive drugs on CRR volunteers. Pharmacopsychiat. 15, Suppl 1, pp.36-38. Hindmarch, I. (1990). Human psychopharmacological diferences between benzodiazepines. In: Hindmarch et al. (Eds.) Benzodiazepines: current concepts (pp.181-198). Chichester: Wiley.

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Pelegrini, M. (2003). O abuso de medicamentos psicotrópicos na contemporaneidade. Psicol. cienc. prof. [online]. 23(1), pp. 38-41. Ridout, F. & Hindmarch, I. (2001). Effects of tianeptine and mianserin on car driving skils. Psychopharm. 154(4), pp. 356-361. Serretti, A., Calati, R., Goracci, A., Simplicio, M., Castrogiovanni, P., Ronchi (2010). Antidepressants in healthy subjects:what are the psychotropic/psychological effects?. Europ Neuropsychophar. 20, pp. 433-453. Smith, JM. & Misiak, H. (1976). Critical flicker frequency (CFF) and psychotropic drugs in normal human subjects: a review. Psychopharm. 47, pp.175-182.

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3. VULNERABILIDADE AO STRESS EM FAMILIARES DE PESSOAS EM SITUAÇÃO CRÍTICA Madalena Cunha*; Helena Rosário**; Fernando Pina*** *Prof. Adjunta, CI & DETS, Escola Superior de Saúde de Viseu – IPV, madac@iol.pt **Enfermeira Especialista, Centro Hospitalar Tondela - Viseu, EPE, lenarosário@hotmail.com ***Enfermeiro Especialista, Centro Hospitalar Tondela - Viseu, EPE, fernando.fer.pina@sapo.pt

RESUMO A evidência científica documenta que a satisfação dos Familiares é um determinante do bem-estar e que o suporte familiar se assume como protector da ocorrência da vulnerabilidade ao stress. Assim, os objectivos do estudo foram:

- Analisar a influência das variáveis sócio-demográficas e importância/satisfação das necessidades no stress dos Familiares; - Estimar o efeito preditivo da idade e importância/satisfação das necessidades na vulnerabilidade ao stress dos Familiares. O estudo descritivo, foi realizado numa amostra não probabilística de 60 Familiares com média de idades de 45.48 anos, com recurso à Escala de Vulnerabilidade ao Stress (Vaz Serra, 2000), ao Critical Care Family Needs Inventory e ao Needs Met Inventorry, de Molter (1979) e Leske (1991), versão de Melo (2005).

Vulneráveis ao stress 53,3% familiares e não estão vulneráveis 46,7 %. A vulnerabilidade ao stress é mais elevada nas mulheres, nos mais velhos, nos menos instruídos, com grau de parentesco de cônjuge. A satisfação, revelou-se preditiva da vulnerabilidade ao stress dos Familiares, explicando 12,6% da sua variabilidade. Os resultados sugerem que a idade, a literacia, o grau de parentesco e a satisfação das necessidades influenciam a vulnerabilidade ao stress, devendo ser incluídas no planeamento das boas práticas assistenciais a oferecer aos familiares. Palavras-chave: Stress; Necessidades; Satisfação; Familiares

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3.1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento científico e tecnológico que acompanhou os cuidados de saúde nas últimas décadas teve um impacto significativo no acto de cuidar o doente crítico. As Unidades de Cuidados Intensivos (UCI’s) são um exemplo da evolução tecnológica e terapêutica, aplicada ao tratamento de doentes em situação crítica. A estas unidades é atribuído um duplo sentido, esperança de vida e gravidade do estado clínico do doente, associados à sofisticada tecnologia de monitorização e de intervenção terapêutica. As UCI’s tornaram-se alvo de maiores expectativas por parte dos doentes e da família. (Stayt, 2009). A investigação documenta o quão importante é a humanização de cuidados nestas unidades, mostrando que, quanto mais cedo a interacção entre profissional e a família acontecer melhor será para a família, e que cuidar de forma holística e sistematizada ajuda a promover a qualidade dos cuidados ao doente critico e seus familiares, (Mezzareba, 2009). Estudos sobre a identificação de sintomas de ansiedade e/ou stress em familiares de doentes internados nas UCI’s, recomendam a avaliação precoce desses sinais e implementação de estratégias de prevenção de forma a amenizar os eventos stressores pois a ansiedade do familiar poderá ser transmitida ao doente e interferir na sua condição de saúde e induzir alterações no seu estado clínico, (Maruiti, Galdeano & Farah, 2008).

O facto de um familiar se sentir ou não em stress é ditado pelo grau de vulnerabilidade ou de autoconfiança que desenvolve em relação a determinada circunstância, considerada por si como diferente e que lhe cria exigências específicas. Pois como refere Vaz Serra (2000), muitas circunstancias podem ser susceptíveis de induzir stress, mas são raras as que podem ser consideradas em termos absolutos, isto é, em que haja certeza de que afectam todos os indivíduos sem excepção. O stress surge assim quando o indivíduo acredita que “não tem aptidões e recursos, pessoais ou sociais, para superar o grau de exigência” de uma determinada situação que é “considerada importante para si” desenvolvendo, 28

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assim, a “percepção de não ter controlo sobre essa circunstância”. O indivíduo passa a sentir-se “vulnerável em relação a essa ocorrência”, (Vaz Serra, 2000, p.262). O internamento de um familiar em estado crítico nas UCI’s, arroga-se como uma situação/desafio psico-emocional que potencialmente desencadeará stress nos seus familiares, porquanto a UCI consiste numa unidade fechada, ou seja, facilita a coordenação das actividades dos profissionais que ali trabalham e restringe o acesso a outras pessoas. A entrada de familiares apenas é permitida por um curto período de tempo e em horários pré estabelecidos, nem sempre se observando uma preparação prévia do familiar para o contacto com o “seu” doente e com este novo ambiente, (Maruiti & Galdeano, 2007). Santos (2004), citado por Maruiti and Galdeano, (2007), inferiu que o relacionamento da equipa com os familiares decorre formalmente, é burocrático e, acima de tudo, despersonalizado. O diálogo com a família é superficial, o enfermeiro está ausente a maior parte do tempo e os outros funcionários da unidade evitam o contacto com os familiares. Por norma, o foco da assistência clínica centra-se no atendimento às necessidades do doente. Contudo, este não é o único a sofrer com a doença e com a hospitalização, pois os familiares e outras pessoas consigo directamente envolvidas partilham a angústia, o medo e o sofrimento do momento, tornandose potencialmente vulneráveis ao stress. Como tal, é importante que os familiares sejam alvo de atenção, visando facilitar o modo de enfrentar esta nova experiência. Os profissionais devem dar resposta às necessidades dos doentes e dos seus familiares, ajudando-os a compreender, a aceitar e a enfrentar a doença, o tratamento e as possíveis consequências que essa nova situação impõe na vida familiar (Maruiti & Galdeano, 2007).

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A hospitalização de um familiar numa UCI’s acontece de forma aguda e inadvertida, não havendo tempo para o ajustamento familiar. Em face dessa situação, os familiares podem sentir desamparo e dificuldade em se mobilizarem, fazendo emergir diferentes tipos de necessidades. Quando devidamente supridas, aliviam ou diminuem a aflição e a angústia imediatas” (Freitas et al., 2007, p. 2). A hospitalização ocasiona medo da morte, incertezas relacionadas com o prognóstico e o tratamento, conflitos emocionais, preocupação com a condição financeira, alterações de papel que podem gerar ansiedade, stress e depressão em alguns membros da família, pelo que se torna essencial que a equipa de saúde esteja preparada para estabelecer um relacionamento de empatia e de confiança com a familiares de forma a suprir necessidades. Maruiti et al.. (2008), Maruiti

and

Galdeano

(2007),

relatam

que

as

necessidades

mais

frequentemente relatadas são: ter a certeza que o doente recebe o melhor tratamento, saber factos concretos sobre o progresso do doente e saber exactamente o que está a ser feito ao seu familiar. Em 2009 Davidson citando um estudo multicêntrico longitudinal realizado em França, referia que 90 dias após a alta ou morte do doente, 33% dos familiares de doentes internados na UCI apresentava um risco moderado a alto de transtorno de stress pós-traumático. O risco aumentava para 80% para os membros da família envolvidos na tomada de decisão de fim de vida. Era maior em mulheres e quando não foi dado tempo suficiente para a comunicação, a informação estava incompleta, ou a informação não foi fácil de entender. No estudo de Chien et al., (2006), citado por Davidson (2009), os membros da família a quem foi dado um programa individualizado de informações, manifestaram menor nível de ansiedade e maior satisfação, comparativamente com o grupo de controlo.

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Outra investigação randomizada, que envolveu familiares de doentes adultos de uma UCI francesa, revelou que melhorar a comunicação, recorrendo à conferência sobre o caso e a um folheto informativo, diminuiu o risco de depressão, de stress pós-traumático, assim como a combinação de ansiedade e depressão (Davidson, 2009).

3.2. METODOLOGIA O estudo de natureza observacional e análise descritiva e correlacional, teve como objectivos: Analisar a influência das variáveis sócio-demográficas (idade, sexo, habilitações literárias, estado civil e grau de parentesco) na vulnerabilidade ao stress dos Familiares; Estimar o efeito preditivo da idade, importância e satisfação das necessidades na vulnerabilidade ao stress dos Familiares;

3.2.1. PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA) A amostra de 60 participantes, Familiares de Doentes Críticos, é maioritariamente constituída por mulheres (60%), sendo 40% homens, com média de idades de 45.48 anos. A média de idade das mulheres (M=44.50) é semelhante à dos homens (M=46.96) (t Student =. 654; p=.516). O perfil sócio-demográfico médio dos familiares revela ser mulher (60%), com cerca de 44 anos de idade, casada (80,5%), com o grau de parentesco de filho(a) (31,7%), com formação literária 1.º ciclo/4.ª classe (28,3%), residente no concelho de Viseu (71,7%) e vivendo acompanhada (90,0%). Em que 86,7%, dos familiares não existe experiência anterior no acompanhamento dos doentes críticos em UCI’s, e que apenas 13,3% relataram possuir experiência anterior.

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3.2.2. INSTRUMENTOS A colheita de dados, teve como suporte um Questionário sócio – demográfico, a a Escala de Vulnerabilidade ao Stress - 23 QVS, elaborada por Vaz Serra em 1985 (Vaz Serra, 2000), o Critical Care Family Needs Inventory (CCFNI) e o Needs Met Inventory (NMI) ambos de Molter (1979) e Leske (1991), versão adaptada de Melo (2005).

3.2.3. PROCEDIMENTOS A recolha de informação foi efectuada no período de Janeiro a Maio de 2011 no Centro Hospitalar Tondela Viseu, após autorização do Conselho de Administração e consentimento dos familiares. O tratamento estatístico foi processado através do programa SPSS 15.0 (Statistical Package for the Social Sciences) versão 15.0 (2006) para Windows.

3.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS As pontuações obtidas nas escalas de hierarquização da importância e satisfação das necessidades, indicou que os familiares atribuem maior importância às necessidades de confiança /tranquilidade e de informação (39,5%) e atribuem menor importância às necessidades de proximidade e conforto (23,7%), tendência observada em ambos os sexos e na amostra global. Depreende-se ainda que os familiares valorizam sobretudo a satisfação das necessidades de confiança /tranquilidade e de informação (34,2%) e atribuem menor importância à satisfação das necessidades de proximidade e de apoio/ajuda (23,7%), propensão presenciada no sexo masculino e feminino e na amostra global.

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Constatou-se que a maioria (38,3%) dos familiares atribui elevada importância às necessidades e que também a maioria (38,3%) se encontram muito satisfeitos. A importância das necessidades (CCFNI) apresentada pelos familiares foi de 124.68. É mais elevada nas mulheres (M=129.03) do que nos homens (M=118.17), com significância estatística quer nos factores, quer score global (t=-3.404; p=.001). A hierarquização da importância das necessidades patenteia que os valores médios mais elevados se situam no item “Sentir que há esperança”, tendência observada em ambos os sexos (Homens M=3.58 vs Mulheres M=3.67) e no global da amostra M=3.63). As mulheres consideraram ainda prioritário e com igual valor médio (M=3.67) “Visitar o doente com frequência”. Os itens menos pontuados foram “Ter um telefone perto da sala de espera” no sexo masculino (M=2.33) e no global da amostra (M=2.68) e os itens “Ter mobiliário confortável na sala de espera” (M=2.89) e “Poder estar sozinho sempre que quiser” (M=2.89) no sexo feminino. O score médio apresentado pelos familiares na satisfação das necessidades (NMI) foi de 113.66. É também mais elevado nas mulheres (M=114.33) do que nos homens (M=112.58), porém semelhante nos dois grupos, nos factores, quer no score global (U=427.000; z=-.076; p=.940). O estudo da hierarquização da satisfação das necessidades denota que os valores médios mais elevados se situam no item “Ser informado acerca do ambiente de cuidados intensivos antes de entrar nesse ambiente pela primeira vez”, tendência observada em ambos os sexos (Homens M=3.25 vs Mulheres M=3.33) e no global da amostra (M=3.30). Os homens consideraram ainda prioritário e com igual valor médio (M=3.25) “Sentir que a equipa do hospital se preocupa com o familiar”. Os itens menos pontuados foram “Poder visitar o familiar a qualquer hora” nas mulheres (M=2.56) e no global da amostra (M=2.58) E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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e o item “Ter alguém que possa ajudar nos seus problemas financeiros” (M=2.54) nos homens. As estatísticas relativas à vulnerabilidade ao stress (23QVS) revelam que os scores oscilaram entre 21 e 63, sendo a média de 42.96. As mulheres (M=3.44), apresentam, maior tendência para a vulnerabilidade ao stress do que os homens (M=42.29), mas sem significância (t=-.379; p=.706). Classificamos os Familiares em dois grupos: com scores inferiores a 43, isto é, “sem vulnerabilidade ao stress”, constituído por 46,7% dos familiares, e o segundo, cujo score foi superior ou igual a 43 e, portanto, “com vulnerabilidade ao stress”, representando 53,3%, ou seja, a maioria dos familiares. Embora as mulheres se apresentam, mais vulneráveis ao stress (58,3%) do que os homens (41,7%), mais uma vez se não verificam diferenças significativas entre os grupos (teste Qui-Quadrado: χ2=.267;gl=1 p=.606 n.s.). Constatou-se ser possível o sexo influenciar a vulnerabilidade ao stress (as mulheres estão mais vulneráveis M=43,44; Dp =11.297); a idade influenciar a vulnerabilidade ao stress (os familiares mais velhos mais vulneráveis (r =. 262; p=. 021); o nível de escolaridade influenciar a vulnerabilidade ao stress (os familiares menos instruídos, portadores de menos habilitações literárias estão mais vulneráveis (H=6.444; p=. 040); o grau de parentesco influenciar a vulnerabilidade ao stress (os cônjuges estão mais vulneráveis (F=3.218; p=.047); A satisfação das necessidades associou-se com a vulnerabilidade ao stress, sendo mais elevada nos familiares mais satisfeitos (Ró = -. 296; p=. 022). Revelou-se ainda preditiva da vulnerabilidade ao stress, explicando 12,6% da sua variabilidade. Em síntese os familiares de doentes críticos mais vulneráveis ao stress são as mulheres, os mais velhos, com parentesco de cônjuge, com baixa escolaridade e cujas necessidades estão mais satisfeitas.

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3.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Em termos médios (42,98) na nossa amostra, a tendência para a vulnerabilidade ao stress é moderada, pois Vaz Serra (2000) considera como valor de corte o score de 43 e só acima desse valor se pode considerar que o indivíduo poderá estar mais exposto ao stress. Neste estudo, observou-se que 53,3% dos Familiares se apresentam vulneráveis ao stress e 46,7 % não estão vulneráveis. O predomínio de sujeitos vulneráveis encontra paralelismo no estudo de Cunha, André & Rodrigues (2009), que apresenta percentagens semelhantes (55,0% vulneráveis e 45,0% não vulneráveis). Maruiti, Galeano and Farah, (2008), descrevem que as variáveis sóciodemográficas e importância e satisfação das necessidades se relacionam com a vulnerabilidade ao stress dos Familiares. Os nossos resultados corroboram os de Davidson (2009), em que o risco das mulheres sofrerem um impacto mais negativo do que os homens face ao internamento dos seus familiares numa UCI era significativo. Demonstraram ainda uma variação no sentido dos que tinham maior idade apresentarem maior vulnerabilidade ao stress. Também Cunha, André and Rodrigues (2009), inferiram que a vulnerabilidade ao stress aumentava com a idade. Quanto à influência da escolaridade na vulnerabilidade ao stress, Vaz Serra (2000) inferiu que o nível de stress não é influenciado pelo grau de instrução. Porém, no nosso estudo os resultados denotam que indivíduos com menos instrução estão mais vulneráveis ao stress. A um maior nível de escolaridade corresponde maior literacia em saúde, contribuindo para a aquisição de comportamentos conducentes a respostas adaptativas mais adequadas em face do internamento, o que logicamente tem na vulnerabilidade ao stress. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Os familiares cujo grau de parentesco é cônjuge pontuaram com maior vulnerabilidade. Similarmente, Maruiti, Galeano and Farah (2008), encontraram valores mais elevados de ansiedade e depressão no companheiro(a) dos doentes críticos. Avaliada a hierarquização atribuída pelos familiares à importância das necessidades mediante o CCFNI a maioria (38,3%) dos familiares atribui elevada importância às necessidades. Indicou ainda que os familiares atribuem maior valor às necessidades de confiança /tranquilidade e de informação (39,5%) e atribuem menor importância às necessidades de proximidade e conforto (23,7%), tendência observada em ambos os sexos e na amostra global. Esta hierarquização é concordante com a obtida nos estudos, de Kosco & Warren (2000), Bjttebier et al., (2001) citados por Melo (2005). Centrando-nos depreende-se

que

na os

hierarquização familiares

da

valorizam

satisfação

das

sobretudo

a

necessidades, satisfação

das

necessidades de confiança /tranquilidade e de informação (34,2%) e atribuem menor importância à satisfação das necessidades de proximidade e de apoio/ajuda (23,7%), propensão presenciada no sexo masculino e feminino e na amostra global. Estas necessidades, encontram paralelismo no estudo de Melo (2005). Os Familiares menos satisfeitos nas suas necessidades são os mais vulneráveis. Este resultado, torna-se ainda mais significativo porquanto 36,7% estão pouco satisfeitos e 25% apenas razoavelmente satisfeitos. Este resultado encontra paralelismo no estudo de Chien et al,. (2006) citado por Davidson (2009) quando refere que os familiares a quem foi dispensado um programa individualizado de informações (…) manifestaram menor nível de ansiedade e maior satisfação, comparativamente com o grupo de controlo.

36

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3.5. CONCLUSÕES A vulnerabilidade ao stress dos familiares de doentes críticos internados em unidades de cuidados intensivos, foi estudada numa amostra não probabilística por conveniência, constituída por 60 Familiares, apurando-se que 53,3% dos Familiares se apresentam vulneráveis ao stress e 46,7 % não estão vulneráveis. A idade, grau de instrução e de parentesco, a satisfação das necessidades, influem na vulnerabilidade ao stress dos familiares, em que, mais idade corresponde a maior vulnerabilidade, maior nível de instrução repercute-se positivamente em menor vulnerabilidade, as mulheres e os cônjuges estão mais vulneráveis. Assim, apesar das limitações inerentes ao n da amostra, considerase

que

as

variáveis

supra-citadas,

contribuíram

para

a

existência

de

vulnerabilidade ao stress. Como implicações preventivas pensamos que valorizar a satisfação das necessidades se assume como um determinante da promoção das boas práticas no acolhimento/assistência aos familiares nas UCI’s. Deverá privilegiar-se a interacção afectiva com a família e pessoas significativas. Esta intervenção poderá ocorrer por ocasião das visitas, para informar e ajudar os familiares a lidarem com as situações, oferecendo oportunidades para participar nos cuidados, bem como proporcionar a mobilização de recursos da sua rede social de apoio para lidarem melhor com as situações de saúde problemáticas. Assim, partir dos resultados vislumbra-se como proposta de melhoria das práticas clínicas, intervir a dois níveis:

A) - Programação de momentos de discussão em grupo entre os profissionais da UCI, para que expostas as cargas emocionais provocadas pelo próprio trabalho, se possa intervir/orientar/ajudar os profissionais a gerir as suas emoções, a formar-se de forma contínua na adopção de estratégias positivas promotoras de bem-estar. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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B) - Criação de um Plano de Assistência à Família que sistematize, operacionalize e facilite o agrupamento da informação chave a dar aos Familiares. Para que isso aconteça impõe-se realizar reuniões com a equipa de saúde da UCI para: 1- Discutir o Plano de Assistência à Família, designadamente: Informações gerais sobre a UCI, seu funcionamento, equipa de cuidados; aparelhos e equipamentos, procedimentos e regras a seguir pelos familiares quanto ao horário de visitas, fardamento, higiene das mãos; Diagnóstico das necessidades dos familiares; Intervenções face à Família; 2- Criar um instrumento de informação escrito e ilustrativo, (Folheto), que reúna as informações gerais para um primeiro contacto com a família, (definição, localização e funcionamento da UCI, características dos doentes, aparelhos e equipamentos e a importância dos visitantes os não manipularem e informação sobre a alta segura); Procedimentos a seguir pelos familiares quanto ao horário de visitas, fardamento, higiene das mãos; Salienta-se ainda a necessidade de futuras investigações analisarem as competências comunicacionais dos profissionais de saúde que, enriquecendo estes resultados, contribuam para cuidar de forma mais satisfatória os familiares de doentes críticos internados em unidades de cuidados intensivos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Cunha, M, N. ; André, S. & Rodrigues, V. (2009) – Vulnerabilidade ao Stress nos Cuidadores

Informais.

Revista Referência, II Série, 5, Suplemento, 26. Davidson, J. E. (2009). Family-Centered Care: Meeting the Needs of Patients' Families and Helping Families Adapt to Critical Illness. Critical Care Nurse, Vol 29, 3: 29-34. Freitas, K.; Kimura, M. & Ferreira, K. (2007). Necessidades de familiares de doentes em Unidades de Terapia Intensiva: análise comparativa entre hospital público e privado. Rev Latino-am Enfermagem, 15 (1): 1-9. Maruiti, M. R. & Galdeano, L. E. (2007). Necessidades de familiares de doentes internados em unidade de cuidados intensivos. Acta Paul Enferm, 30 (1): 37-43. 38

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Maruiti, M.; Galdeano, L. & Farah, O. (2008). Ansiedade e depressão em familiares de doentes internados em unidade de cuidados intensivos. Acta Paul Enferm, 21 (4): 636-42. Melo, J. M. C. (2005) - As necessidades dos familiares de doentes internados em UCI: percepção dos familiares, médico e enfermeira. Lisboa: Dissertação de mestrado em Gestão dos serviços de saúde apresentada ao Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa. Mezzareba, R. M.; Freitas, V. M. & Kochla, K. R. A. (2009). [2011, Sept. 28]. O cuidado de enfermagem ao paciente crítico na percepção da família. Cogitare Enferm [Em linha]. 14: 3 (Jul/Set, 2009) 499-505. Disponível em WWW: <URL: http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/ index.php/cogitare/article/download/16180/10699>. ISSN 21769133. Stayt, L. C. (2009). Death, empathy and self preservation: the emotional labour of caring for families of the critically ill in adult intensive care. Journal of Clinical Nursing [Em linha]. 18: 9 (Maio, 2009) 1267-1275. [Consult. 11 Out. 2011]. Disponível em WWW: <URL: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.13652702.2008.02712.x/abstract>. ISSN: 1365-2702. Stayt, L. C. (2007). Nurses’ experiences of caring for families with relatives in intensive care units. Journal of Advanced Nursing, 57(6): 623–630. Vaz Serra, A. (2000). A vulnerabilidade ao stress. Psiquiatria Clínica, 21 (4) (Outubro/Dezembro,): 261-278.

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4. ENFERMEIROS DE CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS PERANTE A DOENÇA MENTAL Nelson Alexandre Simões de Oliveira*; Carolina Miguel Graça Henriques** *MsC, Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria. Centro Hospitalar do Médio Tejo – Serviço de Psiquiatria, Unidade de Tomar, enfenelson@gmail.com **Ph.D, Professora Adjunta, Escola Superior de Saúde (Leiria), carolina.henriques@ipleiria.pt

RESUMO O presente estudo visa conhecer e descrever as vivências dos enfermeiros de cuidados de saúde primários perante o adulto com doença mental, tendo como questão de investigação “Quais as vivências do enfermeiro nos cuidados de saúde primários perante o adulto com doença mental?”. Constituindo-se um estudo de natureza qualitativa de enfoque fenomenológico, no domínio da investigação-acção,

procurou-se

‘entrar’

no

mundo

das

vivências

dos

enfermeiros, através do recurso a entrevistas semi-estruturadas, desenvolvendose a investigação em dois momentos distintos. Fizeram parte deste estudo três enfermeiros da Unidade de Saúde Familiar de Marmelais, que para além de terem participado nesta investigação, foram alvo de um processo de intervenção onde se desenvolveram múltiplas acções, que passaram por processos formativos na área da saúde mental, e realização da parametrização sob a forma de norma de orientação clínica (NOC) da consulta de enfermagem. Num primeiro momento os enfermeiros revelam uma construção estigmatizante da patologia mental, observando-se juízos de valor e ideias pré concebidas na prestação de cuidados. Assiste-se ainda a um sentimento de insegurança, défice de intervenção sentida pelos próprios enfermeiros que revelam “sentir” o seu exercício como ineficaz e pouco profundo no domínio da saúde mental e psiquiatria. Num segundo momento, após intervenção, observa-se sentimentos de maior segurança e procura de práticas mais profundas e estruturadas nos cuidados de enfermagem prestados por estes enfermeiros perante o adulto com doença mental, revela-se ainda o uso de instrumentos facultados nas consultas de enfermagem e normas 40

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de orientação clínica. Constatamos assim a mudança do estado do fenómeno do primeiro para o segundo momento, ressaltando a necessidade de apoio, formação e supervisão por parte dos enfermeiros especialistas em saúde mental dirigida aos enfermeiros generalistas de cuidados de saúde primários.

Palavras-Chave: Doença Mental, Enfermeiros, Vivências

4.1. INTRODUÇÃO Por entendermos que os cuidados ao utente com patologia mental está presente em todas as fases de vida, bem como em diferentes patologias de carácter físico e curativo, na prestação de cuidados do enfermeiro, independente da sua área de exercício, considera-mos, e de acordo com Michele (2001), que os cuidados de saúde primários são locais apropriados, se munidos de recursos capazes para actuar adequadamente, numa detecção precoce e acção preventiva aos transtornos mentais. Para tal, é fundamental que os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros de cuidados de saúde primários sejam capazes de ir ao encontro da doença e do doente mental.

4.2. METODOLOGIA Pretendendo o entendimento do fenómeno em questão, não se absorvendo com explicações e generalizações, pensamos que a metodologia qualitativa de enfoque fenomenológico seja aquela que mais se adequa à nossa problemática. O método fenomenológico procura fenómenos subjectivos com base na experiência vivida. Também Flick (2005) conta-nos que a fenomenologia pode-se representar-se como um modo de tornar a filosofia numa ciência de rigor, sendo

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uma ciência descritiva, procura descrever não se preocupando em encontrar relações causais, e sim mostrar a essência do fenómeno. Uma vez que a prática profissional de enfermagem está associada às experiências de vida das pessoas, a fenomenologia como método de pesquisa, parece-nos o mais bem adequado à investigação de fenómenos importantes, trazendo à linguagem as perceções da experiência humana (Streubert e Carpenter, 2002). A conduta nesta investigação, realizou-se numa acção do tipo longitudinal, realizando-se dois momentos de avaliação de experiência do fenómeno. Pretendendo investigar o fenómeno, identificamos como necessidade procurar compreender o estado do fenómeno num primeiro momento, e as possíveis modificações

geradas

após

intervenção,

compreendendo

o

impacto

da

intervenção, nas alterações sugeridas nas vivências dos enfermeiros na prestação de cuidados de saúde. Assim consideramos realizar uma intervenção de impacto, observando e comparando o estado do fenómeno antes e depois do exercício do impacto, exercício de impacto baseada fundamentalmente no que a teoria nos revela de prioritário a intervir, fundamentalmente na formação contínua dos profissionais de saúde de enfermagem na área de saúde mental e psiquiatria. Para Moreno & Caixeta (2008) os enfermeiros reconhecem apenas como acções de saúde mental o controle da medicação psiquiátrica e as orientações que realizam esporadicamente, porém apontam para a necessidade de capacitação de toda a equipa para atender esse tipo de utentes, afirma ainda este autor que os enfermeiros referem que não existe um atendimento específico em saúde mental, as actividades restringem-se ao encaminhamento a um serviço especializado em saúde mental, ou a um aconselhamento realizado perante uma crise e ou uma descompensação do paciente. Definimos então como questão de investigação “Qual a vivência do enfermeiro nos cuidados de saúde primários perante o adulto com doença mental?”, tendo este trabalho, como objetivo geral: Conhecer as vivências dos 42

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enfermeiros de cuidados de saúde primários perante o adulto com doença mental; Foram ainda definidos dois objetivos específicos: Analisar as vivências dos enfermeiros de cuidados de saúde primários face ao adulto com doença mental; Conhecer o significado da doença mental para os enfermeiros de cuidados de saúde primários; Constituem-se como potenciais participantes deste estudo, os licenciados em enfermagem que prestam cuidados no âmbito da saúde do adulto, há mais de cinco anos, na Unidade de Saúde Familiar de Marmelais. Os critérios estabelecidos para a inclusão dos enfermeiros neste estudo, alicerça-se no entendimento de que a formação, ao nível da licenciatura, por parte dos enfermeiros determina o seu entendimento profissional e a sua prática de cuidados, por outro o estudo da percepção destes enfermeiros face ao adulto com doença mental, determina claramente que estes enfermeiros mantenham contacto com adultos com doença mental. Foi ainda definido que estes enfermeiros deveriam ter mais de cinco anos de experiência profissional ao nível dos cuidados de saúde primários, no sentido de assegurar uma experiência profissional relevante por parte destes enfermeiros. A forma de seleccionar esses participantes baseia-se no conhecimento específico que eles têm de um determinado fenómeno, com a finalidade de partilhar esse conhecimento, constituindo assim uma amostra intencional. Ao longo do estudo iremo-nos referir aos enfermeiros usando nomes fictícios, tal como: Ana (E1), a que corresponderá a entrevista número um, João (E2) a que corresponderá a entrevista numero dois, e a Maria (E3), a que corresponderá a entrevista numero três. O instrumento mais frequentemente utilizado para a colheita de informação de acordo com Moreira (2004), é a entrevista, e assim optámos por recorrer à

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entrevista

semi-estruturada.

A

escolha

do

processo

interpretativo

que

consideramos adequar-se a esta investigação, é o de Colaizzi. Após realização das primeiras entrevistas no 1º momento, realizou-se um apuramento de dificuldades formativas, bem como o complemento de instrumentos de trabalho para a prática de enfermagem na área de saúde mental e psiquiatria. Assim estabeleceu-se como actividades a desenvolver junto dos enfermeiros que fizeram parte desta investigação, as seguintes actividades: •

Plano de cuidados para intervenção em registo SAPE com linguagem CIPE- Consulta de Enfermagem

Intervenção na Memória

Intervenção na auto estima; solidão; tristeza;

Intervenção na dependência alcoólica; uso de drogas; interacção social relação;

44

Realização de exame Mental;

Formação Equipa de enfermagem

Intervenção em Saúde Mental e psiquiatria

Relembrar CIPE

Estudo de caso com aplicação clínica

Memória e Demências

Avaliação cognitiva

Escala de Capacidade Funcional

Consulta de Enfermagem na Memória

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Relações Precoces e Vinculação – Preparação para o Parto.

Na segunda intervenção foram realizadas formações de acordo com as necessidades emergentes detectadas na prática de enfermagem, bem como pelas solicitadas pelos profissionais, estas formações visaram contribuir para o enriquecimento da prática, bem como complemento a uma continuidade formativa agora da intenção individual de cada profissional de forma a dar continuidade

à

sua

própria

formação

e

responsabilidade

de

adquirir

competências.

4.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Relativamente às vivências dos enfermeiros de cuidados de saúde primários face ao adulto com doença mental, podemos constatar, os sentimentos dos enfermeiros face ao adulto com doença mental, atestavam sentimentos de dificuldade, nervosismo, impotência. Após intervenção, expressam sentimentos nessas mesmas vivencias de, confortável, atenção e satisfação. Esta mudança, com certeza muito derivada a intervenção acção realizadas, nesta mudança de sentimentos vivenciados na prestação laboral. Ainda na mesma área temática, e no que concerne às vivências dos enfermeiros face à consulta de enfermagem ao adulto com doença mental, uma alteração notável na representação da sua prestação de cuidados nessa consulta, em que numa primeira linha referenciam o encaminhamento médico, a ausência de consulta especifica, a escuta e a ausência de mensuração de actividades como vivencias no exercício das consultas do adulto, e num segundo momento após intervenção, constatamos a mudança nessa representação do exercício e prestação constatando que neste segundo momento os enfermeiros expressam relativamente às vivencias nas consultas de enfermagem ao adulto com doença mental, uma actuação especifica e uma diferenciação. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Relativamente às vivências dos enfermeiros face às limitações no desenvolvimento da consulta de enfermagem ao adulto com doença mental, observamos um estado do fenómeno que nos expressa ausência de formação e conhecimentos, ausência de cuidados, ausência de protocolos, ausência de tempo, afinidade electiva associada à prestação.

Ausência de Mensuração das Actividades: “ Sem ser de tratamento, administrar terapêutica, neste momento não existe mais nada.” (Ana) “ (…) o sistema não está preparado para isso, e possivelmente nós também teríamos dificuldades em faze-lo sem formação específica, mas o SAPE não contempla um programa de saúde mental, só ai se vê a importância que é dada a este tipo de intervenções.” (João)

Ausência de Consulta Especifica: “ (…) a mesma é desenvolvida da mesma forma que para os outros utentes, não há diferenças. (…) Tal como as consultas estão programadas, digamos que não há muita diferença em relação às outras consultas para os doentes ditos ‘normais’. Eles são atendidos como os outros, não há intervenções de enfermagem específicas para estes utentes, (…).” (Ana)

Estas vivências dos enfermeiros face às limitações no desenvolvimento da consulta sofreram consideráveis alterações após a intervenção, alterações que se dirigem agora à manutenção de formação contínua e existência de profissional especializado. Podemos observar a representação intencional expressada pelos profissionais, em que até poderemos acrescentar uma 46

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necessidade mais profunda de continuidade como a que é expressada pela necessidade de um profissional especializado na área. Na segunda área temática que se refere a Conhecer o significado da doença mental para os enfermeiros de cuidados de saúde primários, poderemos observar no significado do Doente Mental para os enfermeiros de cuidados de saúde primários, e numa primeira intervenção a compreensão expressada pelos enfermeiros referindo-se a esse significado de doente sem necessidades específicas e doente com necessidades específicas.

Doente sem necessidades específicas: Um doente mental para mim, é um doente como outro doente qualquer, com outra patologia. Para mim a patologia mental é como outra qualquer, (…). (Ana) Observamos num segundo momento a manutenção das mesmas unidades de significação com a expressão de significado diferente, reportando-se a uma profundidade e entendimento de necessidades do doente com um conhecimento e abordagem diferente.

Doente com Necessidades Especificas: “ É um utente com uma patologia específica, que necessita de uma intervenção específica e profissional.” (Ana) “ (…) com diagnósticos de enfermagem próprios, especificidades, em que temos de desenvolver um plano de cuidados específico tendo em conta a sua patologia de base, (…).” (João)

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No que diz respeito às limitações atribuídas pelos enfermeiros de cuidados de saúde primários ao doente mental, no primeiro enfoque o estado do fenómeno revela necessidade gerais na satisfação de necessidades humanas básicas, contudo nessa compreensão leva-nos a crer um certo estigma associado à patologia mental, de dependência e invalidez nas actividades de vida diárias e no modo de as resolver, após um segundo momento interventivo, observa-se um mudança de compreensão descrevendo essas limitações na unidade de significação ausência de limitações, compreendemos que nesta expressão não se resume à identificação de limitações de um doente com patologia e sim á caracterização não discriminativa de uma patologia especifica que por si só poderá oferecer limitações e que mesmo assim não pode ser considerada como característica personalizante da própria patologia. Constatamos mais numa vez a mudança paradigmática da concepção da compreensão das vivências dos enfermeiros face ao adulto com patologia mental. Quanto às qualidades atribuídas pelos enfermeiros de cuidados de saúde primários ao doente mental constatamos as descrições de afectividade/ sensibilidade, confiança nos outros, e nenhumas em específico, num segundo momento notamos as referências mantidas nas unidades de afectividade/ sensibilidade e de nenhumas em específico, também aqui se observa a manutenção das unidades de significação, contudo pelos descritos observa-se neste segundo momento uma compreensão de significado atribuído diferente do adulto com patologia mental, e que neste segundo momento as verbalizações apresentam maior profundidade de descrição das qualidades bem como a ausência de estigmatização dirigida. Na descrição do doente Mental numa só palavra, a mesma é descrita por humano e infeliz, e num segundo momento a manutenção de humano e doente. Mais uma vez constata-se a mudança, agora ligeira, da descrição de doente mental em uma só palavra, contudo e como antes referido denota-se mais uma vez uma compreensão da expressão utilizada mais dirigida e caracterizante de

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um doente mental, sem juízos de valor ou atribuições de significações pré concebidas.

4.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Deste estudo podemos apurar as vivências dos enfermeiros de cuidados de saúde primários perante o adulto com doença metal nas consultas de enfermagem, que revelam uma construção estigmatizante da patologia mental, observando-se algum juízo e ideias pré concebidas na prestação de cuidados afastada dos referenciais teóricos em voga. Assiste-se ainda a um sentimento de insegurança, défice de intervenção sentida pelos próprios enfermeiros que revelam “sentir” o seu exercício como ineficaz e pouco profundo. Num segundo momento após intervenção é-nos revelado a alteração fenomenológico do estado inicial, observando-se uma identificação e expressão mais adequada, com revelações de sentimentos de maior segurança e mesmo incentivo a praticas mais profunda e estruturadas nos cuidados de enfermagem, revela-se ainda o uso de instrumentos facultados nas consultas de enfermagem, e essas alterações geradas nas próprias vivencias dos enfermeiros de cuidados de saúde primários na prestação de cuidados no adulto com patologia mental, que revela um maior sentido de satisfação profissional bem como o sentimento do “exercer” de encontro às necessidades emergentes. Constatamos assim a mudança do estado do fenómeno de uma primeira intervenção para a segunda intervenção revelando necessidades de atuação e implementação de novas estratégias formativas, e de monitorização contínua do estado de cuidados oferecidos pela população de estudo a que este trabalho se reporta. Não nos foi possível comparar os resultados por nós obtidos com outras investigações, já que à data da realização do mesmo não encontramos nenhum estudo que se centra nas vivências dos enfermeiros que prestam cuidados E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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especificamente em cuidados de saúde primários. No estudo desenvolvido por Campos & Teixeira (2001), foi também possível encontrar vivencias e sentimentos estigmatizantes face ao doente mental, sendo que o estudo realizado se centrou num serviço de urgência e não houve qualquer tipo de intervenção por parte do investigador.

4.5. CONCLUSÕES Com esta investigação procuramos dar essa visão e procurar contribuir para essa mesma evolução, adequando práticas regulares do exercício actual de enfermagem, para uma

adaptação contínua

ao principal

objectivo que

fundamenta a criação desta ciência. Procurando dar resposta a necessidades teorizadas, procuramos desenvolver estudos que demonstrem necessidades para um processo de crescimento contínuo no domínio da enfermagem de saúde mental e psiquiatria. Algumas dificuldades sentidas na elaboração desta investigação estiveram presentes, pois poucos estudos científicos se reportam às ópticas dos cuidadores, e das necessidades que estes identificam como lacunas ao exercício do cuidar em enfermagem no domínio da saúde mental e psiquiatria. Esta investigação, pode assim, ser considerado como um passo para uma necessidade emergente das vivências dos enfermeiros nos cuidados de saúde mental, e a justificação para um exercício especializado nesta área de cuidados

de

saúde,

reconhecida

pelos

enfermeiros

neste

espaço

de

investigação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Campos, C. & Teixeira, M. (2001). O atendimento do doente mental em pronto-socorro geral: sentimentos e acções dos membros da equipe de enfermagem. Revista da Escola Enfermagem da Universidade de São Paulo, v. 35, n. 2, 141-9. Flick, U. (2005). Métodos Qualitativos na Investigação Cientifica. Lisboa: Monitor. 50

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Michele T. et. al (2001). Perturbações Mentais Comuns nos Cuidados Primários.1º edição, Lisboa, Climepsi. Moreira, V. (2004). O Método Fenomenológico de Merleu-Ponty como Ferramenta Crítica na pesquisa em Psicologia. Disponível em www.scielo.br/pdf/prc/v17n3/a16v17n3.pdf Moreno, V. & Caixeta, C. (2008). O enfermeiro e as ações de saúde mental nas unidades básicas de saúde. Revista

Eletronica

de

Enfermagem,

vol.

10,

nº1.

Disponível

em

http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen/article/view/8010 Streubert, J.; Carpenter, R. (2002). Investigação Qualitativa em Enfermagem. 2ª Ed. Loures: Lusociência.

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5. AS HABILIDADES SOCIAIS DO DOENTE MENTAL EM CONTEXTO DE INTERNAMENTO Carolina Miguel Graça Henriques*; Helena da Conceição Borges Pereira Catarino**; José Carlos Gomes***; Nelson Alexandre Simões Oliveira****

*PhD, Professora Adjunta, Escola Superior de Saúde (Leiria), carolina.henriques@ipleiria.pt **PhD, Professora Coordenadora, Escola Superior de Saúde de Leiria, helena.catarino@ipleiria.pt ***Msc, Professor Coordenador, Escola Superior de Saúde de Leiria, Instituto Politécnico de Leiria ****Msc,

Enfermeiro

Especialista

em

Enfermagem

de

Saúde

Mental,

Centro

Hospitalar

do

Médio

Tejo

Tomar,

enfenelson@gmail.com

RESUMO A investigação pode dar um elevado contributo à prática clínica de enfermagem, na identificação e nomeação de saberes inerentes à prática, através de um processo de natureza dedutiva. Esta é a forma de evoluirmos para uma efetiva construção da disciplina, através da identificação de saberes específicos e de uma evolução para a prática baseada na evidência (Ordem dos Enfermeiros, 2006). Neste âmbito procurou-se desenvolver um estudo quantitativo do tipo descritivo, intitulado “As Habilidades Sociais do Doente Mental em Contexto de Internamento”, com os objetivos: Conhecer as características sociodemográficas e clinicas; Avaliar o nível de habilidades sociais dos doentes mentais internados no serviço de Psiquiatria (Departamento de agudos) do Centro Hospitalar do Médio Tejo -Tomar. Para a recolha de dados foi construído um questionário, tendo-se respeitado os procedimentos formais e éticos, que garantiram a autorização para a recolha dos dados, o anonimato e a confidencialidade dos mesmos. Recorreu-se a uma amostra não probabilística de conveniência, que cumprissem alguns critérios de inclusão, constituída por vinte e nove do respetivo serviço. Conclui-se que o evitamento social dos participantes é moderadamente elevado, observa-se alguma dificuldade em dizer não e cortar com interações, revelam timidez no inicio de interações positivas com quem se sintam atraídos/as, referem medo em se expor socialmente e por fim sentem alguma habilidade na defesa dos seus próprios direitos como consumidores. Palavras-chave: Doente Mental, Habilidades Sociais

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5.1. INTRODUÇÃO A aprendizagem de habilidades sociais pode ser definida, segundo Liberman et al. (1994) como técnicas comportamentais ou atividades de aprendizagem que permitem às pessoas estabelecer ou restaurar habilidades práticas em domínios necessários para desenvolver atividades interpessoais, autocuidado e de aumentar capacidades para uma relação social na comunidade. Existem evidências que sugerem que a aprendizagem de habilidades sociais, quando cuidadosamente projetados e entregues, pode aumentar o conhecimento dos utentes no desenvolvimento de atividades sociais, bem como reduzir para metade percentagens de recidiva (Wallace & Liberman, 1985). Pelo estado da arte é indicado que a aprendizagem de habilidades sociais pode ser interpretado e realizado em de várias maneiras. A aprendizagem de habilidades sociais tem como objetivo dissolver os problemas da vida diária, desde as mais simples e pessoais bem como questões mais

amplas

e

complexas

envolvendo

concordância

medicação,

relacionamentos, amizades e ocupação (Liberman et al, 1994). Défices nas habilidades da vida social são comuns entre aqueles com graves e permanentes problemas de saúde mental e incluem défices em habilidades de comunicação verbais e não-verbais, como expressões faciais (Liberman, 1992). O plano de intervenção deste estudo é fazer uma proposta de um plano de interveniência de enfermagem de base psicoterapêutica e psicoeducativa, envolvendo atividades estruturadas e validadas pela equipa de enfermagem, com carater piloto. Numa fase inicial de proposta de intervenção será específico para três quadros patológicos: Perturbação do Humor (DSM IV, 1996); Esquizofrenia e outras Perturbações Psicóticas (DSM IV, 1996) e Perturbações pela Utilização de Substancias (DSM IV, 1996). O estudo de investigação pretende assim criar uma fundamentação de análise de diagnóstico de situação do nível de Habilidades sociais que o doente mental em contexto de internamento no serviço de Psiquiatria Agudos do CHMTE-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

53


Tomar

apresenta.

Consequentemente

justificar

a

proposta

“piloto”

de

implementação intervenções de enfermagem do especialista de enfermagem de saúde mental e psiquiátrica.

5.2. METODOLOGIA Trata-se de um estudo quantitativo do tipo descritivo, com os seguintes objetivos: Conhecer as características sociodemográficas e clinicas dos doentes mentais internados no serviço de psiquiatria (internamento de agudos) da unidade de Tomar, do Centro Hospitalar do Médio Tejo; Avaliar o nível de habilidades sociais dos doentes mentais internados no serviço de psiquiatria (internamento de agudos) da unidade de Tomar, do Centro Hospitalar do Médio Tejo; Definir uma proposta de plano de intervenção em enfermagem de saúde mental de base psicoeducativa que permita o desenvolvimento habilidades sociais dos doentes mentais internados no serviço de psiquiatria internamento de agudos do CHMT Tomar. O estudo decorreu no Centro Hospitalar do Médio Tejo – Unidade de Tomar, serviço de psiquiatria e teve por base uma amostra não probabilística intencional, sendo constituída por 29 participantes que respondiam aos seguintes critérios de inclusão: idade igual ou superior a 18 anos; ambos os sexos; Participar voluntariamente na investigação; Ter a capacidade de responder de forma escrita o instrumento de investigação; Ser portador de perturbação do humor, esquizofrenia e/ou outras perturbações psicóticas ou perturbações pela utilização de substancias; Possuir um estado mental sem defeito cognitivo, por avaliação através do Mini Mental Status (MMS). A colheita de dados foi realizada entre os meses de Fevereiro e Março de 2012. Para a sua realização foi utilizado um questionário constituído por questões relativas aos dados sociodemográficos, familiares, laborais e clínicos e a Escala Habilidades Sociais (EHS). 54

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A utilização da escala MMSE irá assegurar a monitorização da existência de défice cognitivo, o que exclui da participação no estudo. Assim e segundo a escala MMSE considera-se existência de défice cognitivo em indivíduos analfabetos um score igual ou inferior a 15, indivíduos com 1 a 11 anos de escolaridade considera-se défice cognitivo se score inferior ou igual a 22, e para indivíduos com escolaridade superior a 11 anos um score igual ou inferior a 27. O tratamento estatístico dos dados foram efetuados informaticamente, através do programa Statistic Packadge for the Social Sciences - SPSS na versão 18.0 para o Windows Vista. Para a sistematização da informação colhida foi utilizada a estatística descritiva, nomeadamente, as frequências absolutas (n.º) e relativas (%), medidas de tendência central: média aritmética (Md), moda (Mo), e mediana (Md) e medidas de dispersão tais como o desvio padrão (σ), valor mínimo (Xmin.) e valor máximo (Xmáx.).

5.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS •

Caracterização sociodemográfica, familiar, laboral e clinica: Pela análise dos dados obtidos, observamos que a média das idades dos

utentes internados que participaram no nosso estudo é de 44,76 anos (σ=14,17), com um valor mínimo (Xmin.) de 19 anos e um valor máximo (Xmax.) de 70 anos de idade. No estudo quantitativo desenvolvido por Sgambati (1983) a 322 doentes mentais, conclui-se que a grande parte dos doentes mentais internados são em 70% do sexo masculino, com uma média de idades que se situa nos 39 anos. Face à escolaridade 31,0% (9) dos utentes são detentores do 1º ciclo de escolaridade, 24,1% (7) o 2º ciclo de escolaridade e 31,0% (9) possuem o 3º ciclo de escolaridade. Somente 2,9% (2) detêm o ensino secundário.

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No estudo de Sgambati (1983) grande parte dos mesmos (62%) são casados, vivendo com o seu conjugue, ou conjugue e filhos, e 57% só sabe ler e escrever. Dos utentes que fizeram parte deste estudo 37,9% (11) trabalham a tempo inteiro, 34,5% (10) afirmam estar fora do mercado de trabalho e 17,2% (5) afirmam que esta questão não se aplica à sua situação atual. Quando questionados se estando fora do mercado de trabalho ou em trabalho irregular (não a tempo inteiro) 24,1% (7) dos utentes afirmam que não procuram trabalho. Em relação ao rendimento mensal dos participantes que fizeram parte do estudo 65,5% (19) auferem menos de 500 euros, sendo que 20,7% (6) situam os seus rendimentos entre os 500 e os 750 euros. Em relação aos encargos mensais do agregado familiar 44,8% (13) assinalam que os mesmos são inferiores a 500 euros e entre 500 a 750 euros. Face à perceção por parte dos utentes que fizeram parte do nosso estudo sobre o apoio que lhe é dado pela sua família 44,8% (13) afirmam estar muito insatisfeitos, sendo que 37,9% (11) mostram-se insatisfeitos. A maioria dos inquiridos considera a relação com a sua família em 41,4% (12) como má e 37,9% (11) como muito má. Em relação à perceção sobre a capacidade de regressar à atividade laboral 37,9% (11) consideram-se nada capazes, já 37,9% (11) consideram-se capazes. Em relação à perceção sobre o seu estado de saúde atual, os participantes em 31,0% (9) consideram-no mau e 27,6% (8) consideram-no como médio. Face aos dados relativos ao internamento e doenças associadas, verificamos que 48,3% (14) dos inquiridos, foram encaminhados para o tratamento/internamento por si próprios, companheiro, familiar ou amigo, sendo que 31,0% (9) foram encaminhados pelo tribunal/sistema penal. Na maioria dos participantes, 55,2% (16), o motivo de internamento relaciona-se com esquizofrenias e outras perturbações psicóticas. Como 56

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patologias associadas a maioria dos inquiridos, 27,6% (8), assinala a hipertensão arterial, sendo que 51,7% (15) não respondeu a esta questão. Verifica-se Verifica que 69% (20) dos participantes do o nosso estudo já tiveram internamentos anteriores num serviço de psiquiatria. Pela análise dos dados obtidos, que a média do tempo em meses decorrido desde

que

os

utentes

internados

que

participaram

no

nosso

estudo

suspenderam a atividade profissional é de 6,50 meses (σ=7,77), =7,77), com um valor mínimo (Xmin.) de 1,00 mês e um valor máximo (Xmax.) de 12,00 meses (tabela 1). Quanto à avaliação do estado mental dos inquiridos, o valor médio obtido foi de 25,10 com um desvio padrão de 2,33, sendo o valor mínimo (Xmin.) ( obtido de 22,00 e o valor máximo (Xmáx.) de 30,00, o que indica que os participantes do estudo no momento de participação revelaram um score sem défice cognitivo (tabela 1)

Tabela 1: Dados sociodemográficos e clínicos

Habilidades Sociais: No que ue concerne ao nível de habilidades sociais (tabela 2) através da

utilização da Escala de Habilidades Sociais (versão portuguesa) – EHS, observamos que o nível global é de 63,65 com um desvio padrão de 11,1. Considerando que quanto maior o valor obtido, ma maior ior grau de habilidade social, e atendendo que o valor máximo da escala é de 96 e tendo como referencia o valor E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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médio (Xmed.=60,00), podemos considerar que o nível global de habilidade social dos participantes do estudo é satisfatório. Relativamente ao fator 1 - Fator Global de Evitamento Social, verifica-se que o valor médio obtido é de 16,13 com um desvio padrão de 3,97. Assim poderá afirma-se que o evitamento social dos participantes do estudo é moderadamente elevado, atendendo ao valor médio para este fator (Xmed.=15). Face ao fator 2 - Dizer não e cortar com interações, observa-se que o valor médio obtido é de 16,10 com um desvio padrão de 3,34. Assim poderá afirma-se que em relação a dizer não e cortar com interações o valor médio obtido é moderadamente elevado, atendendo ao valor médio para este fator (Xmed.=15), indicando alguma dificuldade dos participantes do estudo em dizer não e cortar com interações (tabela 2). Em relação ao fator 3 - Timidez - Inicia interações positivas com quem se sinta atraído/a, verifica-se que o valor médio obtido é de 8,15 com um desvio padrão de 2,13. Assim poderá afirma-se que em relação a este fator o valor médio obtido é moderadamente elevado, atendendo ao valor médio (Xmed.=7,5), indicando que os participantes do estudo revelam timidez no inicio de interações positivas com quem se sintam atraídos/as (tabela 2). A análise do fator 4 - Medo em se expor socialmente - permite-nos verificar que o valor médio obtido é de 11,37 com um desvio padrão de 2,90. Poderá então dizer-se que o valor médio obtido é elevado, atendendo ao valor médio (Xmed.=10), indicando que os participantes do estudo revelam medo em se expor socialmente (tabela 2). O fator 5 foi um fator não interpretado pelos autores que validaram a escala para a população portuguesa, no entanto o valor médio obtido é de 6,68 com um desvio padrão de 2,15. Poderá então dizer-se que o valor médio obtido é moderadamente baixo, atendendo ao valor médio (Xmed.=7,5). Finalmente pela análise dos valores obtidos referentes ao fator 6 - Defesa dos próprios direitos 58

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enquanto consumidor, verifica verifica-se se que o valor médio obtido é de 6,75 com um desvio padrão de 2,27. Poderá então dizer dizer-se que o valor or médio obtido é moderadamente baixo, atendendo ao valor médio (Xmed.=7,5), indicando que os participantes do estudo sentem alguma habilidade na defesa dos seus próprios direitos como consumidores.

Tabela 3: Habilidades Sociais

Em relação aos dados ap apresentados resentados não foram encontrados resultados de estudos que nos possam levar a comparar os resultados por nós obtidos nesta investigação, já que não encontramos nenhum estudo que em que houvesse a aplicação da escala EHS em doentes mentais quer em contexto de internamento, quer em contexto comunitário (hospital de dia).

Com a observação do estado da arte no que se refere ao transtorno de habilidades sociais em doentes mentais nos três quadros de intervenção relatados anteriormente podemos observar uma linha de investigação ainda redutora no nosso país, contudo pela anális análise e de estudos de investigação internacionais verificamos nas Perturbações de Humor, e num estudo realizado por Fernandes, Falcone e Sardinha (2012), que pretendia verificar a relação entre deficits em habilidades sociais e níveis de depressão, com uma amostra amost constituída por 46 participantes de ambos os sexos, os resultados confirmam deficits em habilidades sociais, que podem constituir um fator de vulnerabilidade para a depressão. Também num estudo realizado por Matta, Yates, Silveira, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Bizarro e Trentini (2010), através de revisão sistemática de artigos publicados de janeiro de 1999 até outubro de 2009, nos bancos de dados indexados PubMed, BVSPsi e Science Direct (MedLine, PsycInfo), sendo selecionados artigos originais e revisões que abordavam a interferência da aplicação de técnicas de Terapia Cognitivo-Comportamental e sua interferência no controle sobre os sintomas do Transtorno do Humor, evidenciando que o treino de habilidades sociais atua sobre o funcionamento social e diminui os riscos de recaída, habilitando os pacientes a tornarem-se mais independentes e ativos quanto ao transtorno e ao tratamento.

5.4. CONCLUSÕES Após análise e discussão dos resultados pode concluir-se ao nível de habilidades sociais e recorrendo à utilização da EHS, observamos que o nível global de habilidade social dos participantes do estudo é satisfatório. Relativamente ao fator 1 - Fator Global de Evitamento Social, verifica-se que o evitamento social dos participantes do estudo é moderadamente elevado. Face ao fator 2 - Dizer não e cortar com interações, observa-se alguma dificuldade dos participantes do estudo em dizer não e cortar com interações. Em relação ao fator 3 - Timidez - Inicia interações positivas com quem se sinta atraído/a, verifica-se que revelam timidez no inicio de interações positivas com quem se sintam atraídos/as. A análise do fator 4 - Medo em se expor socialmente - permite-nos verificar que os participantes do estudo revelam medo em se expor socialmente. Quanto à análise do fator 5, não interpretado pelos autores que validaram a escala para a população portuguesa, observa-se um valor médio moderadamente baixo. 60

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No fator 6 - Defesa dos próprios direitos enquanto consumidor, verifica-se que os participantes do estudo sentem alguma habilidade na defesa dos seus próprios direitos como consumidores. Como principais contributos deste estudo salienta-se a perceção das carências e necessidades de intervenção da população assistida pelo serviço de Psiquiatria Tomar, alertando-se para o facto da preparação e reestruturação de melhoria de habilidades sociais no que concerne a relação familiar, retorno a atividade profissional, e relações sociais de interação, sugerir ainda em proposta piloto uma abordagem mais profunda e que satisfaça as necessidades dos utentes dentro dos quadros patológicos observados. Reflete-se assim uma necessidade de intervenção para alem do quadro clinico exacerbado em internamento, e sim também alarga-lo aos envolventes de relação com o doente mental. A caracterização exposta das habilidades sociais da amostra, permite fundamentar a implementação de um programa tipo adaptado as necessidades nas três temáticas sugeridas. Esta intervenção fundamentada no referencial teórico exposto anteriormente, conduzira a uma intervenção padronizada de caracter inovador em Portugal, no que se refere a uma intervenção em habilidades sociais em contexto de internamento de psiquiatria agudos, sendo intenção uma intervenção fundamentada da prática especializada de saúde mental e psiquiátrica, revê-se neste estudo todo um referencial apropriado a uma intervenção adequada baseada em evidência científica. Este estudo levanta a questão do tipo de intervenção de saúde realizado em Portugal na área de saúde mental, propriamente no exercício de enfermagem especializada em saúde mental e psiquiátrica.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DSM IV (1996). Manual de Diagnóstico e Estatística dos Distúrbios Mentais Lisboa: Climepsi Editores. Fernandes, C., Falcone E., & Sardinha, A. (2012). Deficiências em habilidades sociais na depressão: estudo comparativo. Psicologia: teoria e prática, v. 14, n. 1, p. 183-196

Liberman, R. et al (1994). Biocomportamental tratamentos e reabilitação da esquizofrenia. Terapia de comportamento; 25: 1, 89-107. Liberman, R. (1992). Manual de Reabilitação Psiquiátrica. New York: Macmillan. Matta, A., Yates, B., Silveira, G., Bizarro, L., Trentini, C. (2010). Intervenções Cognitivo-Comportamentais no Transtorno de Humor Bipolar. Interamerican Journal of Psychology, vol. 44, núm. 3, 432-441. Sgambati, E. (1983). Reinternação e rejeição familiar: um estudo com o paciente psiquiátrico, Ribeirão Preto, 1983. Dissertação de Mestrado. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Wallace, C., Liberman, R. (1985). Treinamento de habilidades sociais para esquizofrênicos: um ensaio clínico controlado. Psychiatry Research, 15: 239-247.

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6. OS ESTILOS PARENTAIS EDUCATIVOS E ANSIEDADE MANIFESTA NA CRIANÇA Carolina Miguel Graça Henriques*; Jacinta de Jesus Ferreira Alho** *PhD, Professora Adjunta, Escola Superior de Saúde (Leiria), carolina.henriques@ipleiria.pt **Centro Hospitalar do Médio Tejo - Unidade de Tomar.

RESUMO O conceito de parentalidade abrange três componentes que estão intrinsecamente ligadas: os comportamentos, as cognições e os afetos parentais. No presente estudo temos como objetivos: Conhecer os estilos parentais educativos apresentados pelos progenitores e da criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do adolescente do CHMT; Determinar a manifestação de ansiedade na criança dos 8 aos 11 anos, que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT; Determinar a influência dos estilos parentais educativos percecionados pelos progenitores na manifestação de ansiedade na criança dos 8 aos 11 anos, que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT; Analisar a influência dos estilos parentais educativos percecionados pela criança dos 8 aos 11 anos, que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da criança e do adolescente do CHMT, na manifestação de ansiedade da mesma. Recorremos a um estudo quantitativo, de desenho correlacional e transversal. Os resultados mostram que os pais, tal como as crianças, percebem níveis elevados de suporte emocional, níveis moderados a elevados de tentativa de controlo e níveis mais baixos de rejeição.

Observa-se a existência de uma correlação estatisticamente significativa entre a ansiedade manifesta da criança e o estilo parental educativo de suporte emocional percecionado pelos pais e ainda uma correlação significativa entre a ansiedade manifesta na criança e os estilos parentais educativos de Rejeição e Tentativa de Controlo. Estes resultados traduzem um padrão parental envolvido,

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protótipo autorizado, com níveis elevados de responsividade e moderados a elevados de tentativa de controlo.

Palavras-chave: Estilos parentais; Educação; Ansiedade; Criança

6.1. INTRODUÇÃO Segundo Pereira & Canavarro (2004) o comportamento parental é constituído por diversas facetas: fatores que influenciam o comportamento parental, estilos parentais educativos, competência parental e bem-estar parental. Os fatores que influenciam o comportamento parental são conceitos descritivos que caracterizam o comportamento parental e a sua etiologia, e referem-se

às

seguintes

variáveis:

a

história

de

desenvolvimento,

a

personalidade, as relações conjugais, a rede social e o trabalho dos pais, as características e o desenvolvimento da criança (Belsky & Vondra, 1989). A competência parental e o bem-estar parental são conceitos que contêm juízos de valor, situando-se numa dimensão conceptual avaliativa e normativa (Pereira & Canavarro, 2004). Na presente investigação iremos focalizar-nos nos estilos parentais educativos para estudar o comportamento parental. Os estilos parentais são considerados como variáveis do contexto familiar que afetam a eficácia de práticas educativas mais específicas. Durante a infância a ansiedade surge como característica normal, permitindo às crianças adaptarem-se a situações novas, inesperadas ou perigosas (Rosen & Schulkin, citado em Borges, Manso, Tomé e Matos, 2008). Para a maioria das crianças a ansiedade é uma experiência comum, funcional e transitória, cuja natureza e intensidade variam, em grande parte, de acordo com o estádio de desenvolvimento. 64

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Malagris & Castro (2003) referem que mães com dificuldades em manter um ambiente seguro na família devido à sua própria ansiedade, podem transmitir insegurança aos filhos através de um apego inseguro, favorecendo o desenvolvimento de transtornos tais como ansiedade, depressão e outros transtornos internalizantes na infância.

6.2. METODOLOGIA O presente estudo pode ser classificado como um tipo de estudo quantitativo, de desenho correlacional e transversal. Como questões de investigação temos: Quais são os estilos parentais educativos apresentados pelos progenitores da criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do adolescente do CHMT?; Quais são os estilos parentais educativos percecionados pela criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT?; Qual é a manifestação de ansiedade na criança dos 8 aos 11 anos, que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT?; Qual é a relação entre a manifestação de ansiedade e as variáveis idade e género, na criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT?; Qual é a relação entre os estilos parentais educativos percecionados pelos progenitores da criança que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT, e o nível de escolaridade dos mesmos?; Qual é a influencia dos estilos parentais educativos percecionados pelos progenitores na manifestação de ansiedade na criança dos 8 aos 11 anos, que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente do CHMT?; Qual é a influência dos estilos parentais educativos percecionados pela criança dos 8 aos 11 anos, que frequenta a consulta de

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psicologia do Centro de Desenvolvimento da criança e do adolescente do CHMT, na manifestação de ansiedade da mesma? Tendo em conta as questões de investigação e os objetivos delineados, foram traçadas quatro hipóteses. O processo de amostragem utilizado neste estudo foi de tipo não probabilístico acidental ou de conveniência. A presente investigação contou com uma amostra de 95 crianças e respetivos pais (maioritariamente mães). Os instrumentos de colheita de dados utilizados foram: questionário sociodemográfico preenchido pelos pais, questionários de estilos parentais educativos EMBU- C e EMBU-P, e a escala de ansiedade manifesta para crianças - RCMAS. A análise dos dados foi realizada informaticamente através do Programa “Statistical Package for the Social Sciences”, versão 17. Face à distribuição da amostra foram utilizados testes não paramétricos. Foram tidos em consideração todos os procedimentos formais e éticos.

6.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS a) Características sociais e demográficas das crianças Relativamente às características sociodemográficas, desta amostra fazem parte 95 crianças, 38 do sexo feminino e 57 do sexo masculino. Observa-se que 28,4% das crianças têm 8 anos de idade, 32,6% têm 9 anos, 15,8% têm 10 anos e os restantes 23,2% possuem 11 anos, sendo que a média de idades é de 9,34 (Sd =1,13). As crianças que fazem parte desta amostra encontram-se, na sua maioria (64,2%), a residir com ambos os pais, com família nuclear intacta.

b) Ansiedade Manifesta nas Crianças 66

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Ao nível da ansiedade manifesta, de acordo com os resultados da tabela 1, a pontuação máxima apresentada pelos sujeitos é de 25 pontos e a mínima é de 3 pontos, sendo a pontuação média de 13,63 (Sd=4.96). Como a ansiedade manifesta é composta por 28 questões, com uma pontuação máxima de 28 e mínima de 0, a média de 13,63 situa-se aproximadamente a meio destes valores.

Tabela 1: Distribuição das respostas dos inquiridos face à escala de ansiedade manifesta RCMAS

Ansiedade

X

X

Média

Mínimo

Máximo

Desvio Padrão

3

25

3,63

4,96

0

9

4,48

2,68

Manifesta

Escala de Mentira

c) Estilos Parentais Educativos Relativamente aos Estilos Parentais Educativos percecionados pela criança (EMBU-C) acerca da figura paterna observa-se uma média de 39,65 (Sd=8,87) no fator Suporte emocional, uma média de 12,23 (Sd=3,76) no fator Rejeição, e uma média de 21,02 (Sd=5,55) no fator Tentativa de Controlo. No caso dos Estilos Parentais Educativos percecionados pela criança em relação à mãe, observa-se que o fator Suporte emocional apresenta uma E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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pontuação média de 44,56 (Sd=5,98), a Tentativa de Controlo tem uma média de 24,87 (Sd=4,65) e a Rejeição de 11,98 (Sd=3,22). Ao compararmos a perceção da criança em relação aos estilos parentais educativos do pai e da mãe, podemos verificar que as crianças consideram o Suporte Emocional e a Tentativa de Controlo mais frequentes nas mães, ao passo que a Rejeição apresenta uma maior frequência por parte do progenitor do sexo masculino. Em relação ao Suporte emocional observa-se uma grande discrepância entre os valores mínimos para o pai e para a mãe, o que faz pressupor que, em alguns casos, o progenitor masculino oferece muito baixo suporte emocional para as crianças, o que não acontece no caso do progenitor feminino. Relativamente à avaliação que os progenitores fazem dos seus estilos parentais educativos (EMBU-P), pode observar-se que o Suporte Emocional tem uma pontuação média de 45,61 (Sd=5,60), a Rejeição apresenta um valor médio de 29,25 (Sd=4,96) e a Tentativa de Controlo tem uma média de 29,91 (Sd=4,61). Os resultados mostram que os pais, tal como as crianças, percebem níveis elevados de suporte emocional (a pontuação média dos itens é de 3,26), níveis moderados a elevados de tentativa de controlo (a pontuação média dos itens desta escala é de 2,72) e níveis mais baixos de Rejeição (valor médio dos itens de 1,72).

d) Teste de Hipóteses H1: “Existe correlação estatisticamente significativa entre a manifestação de ansiedade e a idade, na criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento do CHMT”.

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Nesta amostra pode-se concluir-se, que não existe uma correlação estatisticamente significativa entre estas duas variáveis (p> 0,05). H2: “Existe relação estatisticamente significativa entre a manifestação de ansiedade e o género, na criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de psicologia do Centro de Desenvolvimento do CHMT. Podemos concluir que, embora a ansiedade manifesta seja superior nas meninas (M = 14,00, Sd = 5,29) comparativamente aos meninos (M = 13,39, Sd = 4,76), esta diferença não é estatisticamente significativa (U = 989,00; p>0,05). H3: “Existe correlação estatisticamente significativa entre a manifestação de ansiedade na criança dos 8 aos 11 anos que frequenta a consulta de Psicologia do Centro de Desenvolvimento do CHMT, e os estilos parentais educativos percecionados pelos pais”. Observa-se, a existência de uma correlação estatisticamente significativa entre a ansiedade manifesta da criança e o estilo parental educativo de suporte emocional percecionado pelos pais. Esta relação é significativa a 1% e trata-se de uma correlação negativa, o que significa que quanto menor é o suporte emocional facultado pelos progenitores maior é a ansiedade manifesta das crianças. H4: “Existe correlação estatisticamente significativa entre a manifestação de ansiedade nas crianças dos 8 aos 11 anos que frequentam a consulta de Psicologia do Centro de Desenvolvimento do CHMT, e os estilos parentais educativos percecionados pelas mesmas.” Observa-se uma correlação significativa a 1% entre a ansiedade manifesta na criança e os estilos parentais educativos de Rejeição e Tentativa de Controlo (percecionados pela criança quer em relação ao pai quer em relação à mãe). Trata-se de uma correlação positiva, significando que quanto maior for a Rejeição (Pai: r = 0,46 e Mãe: r = 0,45), e a Tentativa de Controlo (Pai: r = 0,36 e E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Mãe: r = 0,33) percecionadas pela criança em relação aos pais, maior será a ansiedade manifesta pela criança.

6.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Estes resultados traduzem um padrão parental envolvido (Baumrind, 1989, citado

por

Cruz, 2005),

protótipo

autorizado,

com

níveis

elevados

de

responsividade e moderados a elevados de tentativa de controlo. De acordo com a classificação de Pereira (2007) podemos considerar que estes pais apresentam um estilo parental entre o Apoiante e o Apoiante - Controlador, que são segundo o estudo da autora os que ocorrem com maior frequência. O facto de o suporte emocional ser a dimensão com níveis médios mais elevados tanto para as crianças como para seus pais poderá ser um indicador bastante positivo para o futuro, pois de acordo com Canavarro (1999) o suporte emocional proporcionado por ambos os pais durante a infância e adolescência parece ser um fator protetor para as perturbações emocionais na idade adulta. Inversamente, um baixo nível de suporte emocional proporcionado na infância, pode contribuir para o desenvolvimento de perturbações de ansiedade no adulto. Com efeito, Chambers, Power & Durham (2004) verificaram valores inferiores de suporte emocional e valores superiores de controlo parental em pacientes adultos que tinham diagnóstico de ansiedade generalizada, pânico ou pós stress traumático. Neste estudo, podemos também observar que as crianças consideram os fatores de suporte emocional e tentativa de controlo mais frequentes nas mães, enquanto a rejeição apresentou uma maior frequência por parte do progenitor masculino. Estes dados sugerem um maior envolvimento da mãe na educação dos filhos e, em alguns casos, possível demissão dos pais em relação ao seu papel parental. Note-se que neste estudo existem várias famílias monoparentais constituídas pela figura materna, o que faz pressupor que o pai quando existente 70

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poderá não estar a manter uma relação positiva com o filho, seja por desinteresse ou devido a conflitos entre os pais. Nos estudos de Canavarro & Pereira (2007, 2008) com o EMBU-P e com o EMBU-C, as mães revelaram níveis mais elevados do que os pais em todas as dimensões do comportamento parental, o que também sugere um maior envolvimento das mães na parentalidade. Neste

estudo

não

foi

encontrada

uma

correlação

estatisticamente

significativa entre a manifestação de ansiedade e a variável sociodemográfica idade, nem uma relação estatisticamente significativa entre a ansiedade manifesta e o género social, ainda que as meninas tenham mostrado um resultado ligeiramente superior aos meninos. Apesar de se dirigir a uma população clínica, os valores médios da escala de ansiedade manifesta encontrados nesta investigação, tanto para as meninas como para os meninos, mostraram-se ligeiramente inferiores aos encontrados no estudo de Dias & Gonçalves (1999) realizado em contexto escolar com a mesma escala. Pode-se assim inferir que esta população clínica não apresenta valores médios de ansiedade manifesta acima do normal para as crianças desta faixa etária. Tal como no presente estudo, estes autores não encontraram diferenças significativas em relação ao sexo da criança, ainda que os valores de ansiedade no sexo feminino também se mostrem superiores aos do sexo masculino. No estudo de Fonseca (1992), foram encontrados efeitos significativos da variável sexo, apresentando as raparigas índices de ansiedade mais elevados que os rapazes. O mesmo se verificou em relação à idade, apresentando as crianças mais novas índices mais elevados de ansiedade do que as mais velhas ou adolescentes. Ao correlacionarmos os estilos parentais educativos com a ansiedade

manifesta

estatisticamente

na

criança,

significativa

entre

confirmamos

a

a

de

dimensão

correlação suporte

negativa emocional

percecionada pelos pais e a ansiedade da criança, o que significa que quanto E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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menor a perceção de suporte emocional por parte dos progenitores maior a ansiedade manifesta na criança. Encontramos também uma correlação positiva estatisticamente significativa entre as dimensões tentativa de controlo e rejeição percebidas pelas crianças e a expressão de ansiedade nas mesmas, ou seja, quanto maior a rejeição e a tentativa de controlo percecionadas pela criança em relação aos pais, maior será a ansiedade manifesta na criança. Contrariamente ao nosso estudo, na investigação realizada nos Países Baixos, por Murin, Bogels, Meesters, Van der Kamp e Van Oosten (1996), que estudava a relação entre os comportamentos educativos parentais e a psicopatologia na criança, não foi encontrada associação entre as práticas educativas parentais e os problemas internalizantes na criança. No entanto, os resultados do estudo realizado por Markus, Lindhout, Boer, Hoogendijk e Arrindell (2003), encontraram associação entre a perceção da parentalidade, medida pelo EMBU-C, e a ansiedade traço na criança, concluindo-se que os indivíduos ansiosos foram educados de uma forma mais rejeitante e protetora comparativamente aos não ansiosos.

6.5. CONCLUSÕES Os resultados do presente estudo reforçam a importância da dimensão suporte emocional na relação pais-filhos, e logo a existência de uma interação calorosa e de boa qualidade emocional como base de um desenvolvimento psíquico saudável. Por outro lado, fortalecem a ideia de que os excessos de rejeição e de tentativa de controlo são negativos para o desenvolvimento psicoemocional da criança, podendo levar ao desenvolvimento de problemas internalizantes como a ansiedade. Os resultados evidenciados no presente estudo devem, no entanto, ser interpretados de forma cautelosa, tendo em conta as limitações desta investigação. Ao tratar-se de um estudo não experimental, não existe controlo 72

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rigoroso das variáveis estranhas ou parasitas, o que aumenta a probabilidade de ameaças à validade interna e externa da investigação. No que diz respeito à validade interna, o método transversal não capta a dinâmica e evolução dos fenómenos no tempo, apesar de ser um método de fácil e de rápida aplicação na abordagem das diferenças inter-individuais. Em relação ao tamanho da amostra, esta é significativa e representativa da população alvo, no entanto esta pesquisa não tem validade ecológica, isto é, os seus resultados não são generalizáveis a outros ambientes. Seria interessante realizar mais estudos com outras populações em diferentes contextos clínicos e não clínicos e de diferentes faixas etárias, de forma a se poder realizar estudos comparativos.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


7. VIVÊNCIAS DO HOMEM INFÉRTIL QUE DESEJA TER FILHOS Carolina Miguel Graça Henriques*; João José de Sousa Franco**; Paula Maia Ferreira Vicente Amado*** *PhD, Professora Adjunta, Escola Superior de Saúde (Leiria), carolina.henriques@ipleiria.pt **PhD, Professor Coordenador, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, franco@esenfc.pt ***Msc, Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Materna e Obstetrícia Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, paula-amado@hotmail.com

RESUMO A maioria dos estudos sobre infertilidade incidem sobre a mulher, mas esta situação, não é menos penosa para o género masculino. A vivência emocional da infertilidade por um homem é extremamente frustrante, uma vez que ainda vivemos numa cultura, onde sinal de “ser homem” é ser um “bom reprodutor”, contudo a dor vivenciada pelo homem com dificuldades para ter um filho, é muito pouco estudada e até mesmo, pouco reconhecida pela sociedade. Tudo é vivenciado num certo silêncio masculino

Este estudo tem como objectivo, conhecer as vivências do homem infértil que deseja ter filhos. Utilizámos para a colheita da informação a entrevista a 10 homens que reuniam os critérios de inclusão e recorremos à metodologia qualitativa de enfoque fenomenológico com análise interpretativa de Colaizzi (1978) de acordo com Carpenter (2009). Encontramos como categorias: o significado de ter um filho, significado e sentimentos antes do diagnóstico e face ao diagnóstico de infertilidade, implicações da infertilidade, significado de ser infértil, estratégias para lidar com a infertilidade, mudanças sentidas, preocupações e dificuldades vivenciadas ao longo do processo. Com este estudo foi possível conhecer as vivências do homem infértil que deseja ter filhos e identificar os factores responsáveis pela variabilidade na sua E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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adaptação psicossocial. Este permitiu ainda, adquirir o conhecimento de que a vivência da infertilidade masculina é um fenómeno pluridimensional com implicações aos mais diferentes níveis: pessoal, conjugal, sexual, familiar e social, e compreender o âmbito em que é necessário atuar de forma a colmatar as suas necessidades e a ultrapassar as dificuldades sentidas.

Palavras-chave: Vivências, Homens, Infertilidade

7.1. INTRODUÇÃO Desde o despontar da Humanidade que a reprodução e a sua falência são uma importante preocupação. Em toda a história da humanidade e em todas as civilizações encontram-se relatos relativos à fecundidade / infecundidade e aos rituais mágico-religiosos de procriação, que visavam favorecer a fecundidade, testemunhando a centralidade ocupada pela maternidade na vida humana. Ao longo dos tempos e em todos os povos, a capacidade de perpetuar a espécie, transcende o mero desejo e torna-se, além de uma essência para a realização do ser humano, um símbolo da bênção divina e da continuidade da sua história. Sendo em muitos contextos socio-culturais

uma

temática

tabu, a

infertilidade não deixa de ser um fenómeno emergente e gritante. De acordo com os dados estatísticos, estima-se que em Portugal a prevalência da infertilidade ao longo da vida situa-se entre os 9% e10 % estimando-se que entre 266088 e 292996 mulheres (casais) tenham infertilidade (Carvalho et al., 2009) e que “ a nível mundial, 10 a 15% dos casais em idade fértil são afetados pelo problema da infertilidade, ou seja, cerca de 1 em 10 casais tem dificuldade em conseguir ter um filho.” (Delgado, 2007, p.11). Assim, e de acordo com Pinto (1998, p. 96) citado por Delgado (2007) “A infertilidade constitui um problema com implicações não só a nível individual, 76

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mas também familiar, social e, mais recentemente, médico e científico”. Trata-se claramente de uma experiência multideterminada, influenciada por vários factores e que se pode manifestar ao longo do tempo de diversas formas (Ramos, 2010). Após séculos onde se considerou a infertilidade como exclusivamente feminina, a perceção do envolvimento masculino na infertilidade surge apenas durante os últimos cinquenta anos (Speroff, Glass e Kase, 1999, citado por Delgado, 2007). Tido como problema exclusivamente feminino, é no isolamento social e remetidos ao silêncio que a maioria dos homens vivencia a sua infertilidade. Daí pouco se saber sobre a forma como estes homens sentem e vivenciam o serem inférteis. Por ser um problema que afeta a saúde e bem-estar, a nível físico, psicológico, familiar, conjugal, laboral e social; porque atinge um número crescente de homens que se deparam com a impossibilidade de concretizarem o sonho de uma vida – ter um filho; mas sobretudo porque as vivências da infertilidade masculina se encontram pouco estudadas, entre a maioria dos autores que se dedica ao estudo da infertilidade; compreendemos a necessidade de estudar esta problemática, dada a sua importância e pertinência para o cuidar em enfermagem. Pensamos que um melhor e maior conhecimento das vivências masculinas desta experiencia humana, representará uma mais-valia para os profissionais de saúde e para a prestação de cuidados em enfermagem, fornecendo subsídios para melhorar a qualidade da intervenção junto do homem infértil. Poder responder às suas necessidades de uma forma holística, não vendo unicamente o seu problema físico, permitirá compreender melhor a forma como estes vivenciam todo o processo da infertilidade e encontrar algumas estratégias capazes de os ajudar a ultrapassar esta fase. Este estudo tem como questão de investigação “ Quais as vivências do homem infértil que deseja ter filhos” e objectivos conhecer as vivências do E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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homem que deseja ter um filho antes e após o diagnóstico de infertilidade, procurando identificar os factores e contextos que influenciam essas vivências. A partir da questão inicial e do objectivo deste trabalho emergiram outras questões que se revelam importantes, na medida em que contribuem para clarificar o fenómeno: •

Qual é o significado de ter um filho?

Quais são as implicações psicológicas, sociais, conjugais, familiares e profissionais da infertilidade masculina?

Qual é o significado de ser infértil?

Quais são as principais dificuldades, preocupações e mudanças sentidas durante o processo da infertilidade?

Quais são as estratégias de coping utilizadas pelos participantes para lidar com a infertilidade?

7.2. METODOLOGIA No sentido de dar resposta á questão de investigação e concretizar os objectivos, foi desenvolvido um estudo onde recorremos à metodologia qualitativa de enfoque fenomenológico, tendo por base a análise interpretativa das vivências, o processo metodológico de Colaizzi (1978). Entendemos ser a metodologia qualitativa, a que mais se adequa; pois como refere Polit e Hungler (2004) esta permite “compreender a maneira como os homens e mulheres tiram algum sentido de uma experiência complexa, interpessoal e dinâmica”.

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De acordo com Strauss e Corbin (2008, p.24) os métodos de pesquisa qualitativa referem-se à pesquisa sobre a vida das pessoas, experiencias vividas, comportamentos, processos de pensamento, emoções e sentimentos, podendo ser “ …usados para obter detalhes intrincados sobre os fenómenos…” que através de métodos de pesquisa mais convencionais são difíceis de extrair. À semelhança desta ideia Polit, Beck e Hungler (2004) referem que os resultados da pesquisa qualitativa baseiam-se nas experiências reais das pessoas que possuem o conhecimento do fenómeno em primeira mão. Aceitando o pressuposto de que a fenomenologia tem como intuito descrever e compreender a vivência de um determinado fenómeno, acreditamos que só através de uma descrição rigorosa, ou seja, só através do relato acerca do modo como um participante o experimenta e vivencia; é possível compreender o vivido e apreender a sua essência De acordo com Fortin (2003) citada por Loureiro (2006), o objetivo das investigações qualitativas é descobrir e explorar os aspetos da ação do ponto de vista dos participantes, interpretando o fenómeno no seu meio natural, daí a entrevista revelar-se um ótimo meio, porque permite entrar no mundo da outra pessoa, permitindo aceder às perspetivas dos participantes através de uma conversa informal, facilitando verbalização e a exteriorização das suas vivências. Assim, optámos por recorrer à entrevista semiestruturada, centrada essencialmente nas vivências dos entrevistados, com o suporte de um guião de entrevista pré-definido, embora flexível e adaptável face às contingências dos discursos produzidos em situação de inquérito. Foram formuladas, pelo investigador, questões abertas, gerais ou combinadas com subquestões, de modo a deixar o participante “livre para responder como entender, sem que tenha de escolher respostas predeterminadas” (Fortin, 2003, p. 247).

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Foi realizada colheita de dados junto de dez homens a quem foi diagnosticada infertilidade. De acordo com o problema em estudo. Os participantes foram selecionados de forma deliberada, recorrendo a amostragem intencional. Estes encontravam-se a frequentar a consulta de Andrologia no Serviço de Reprodução Humana, dos Hospitais da Universidade de Coimbra. Foram tidos como parâmetros de inclusão: homens a quem já foi diagnosticado um tipo de infertilidade; com idades compreendidas entre 25 e 40 anos, sem qualquer filho biológico ou adotado e que desejem ter filho Dada a escassez de pesquisas que incidem sobre o fenómeno das implicações multidimensionais da infertilidade masculina este estudo será exploratório do tipo descritivo. Para promover a adequação e o rigor no processo de investigação de cariz fenomenológico, Loureiro (2006) aponta várias estratégias e possibilidades, com base nos critérios paralelos de índole quantitativa descritos na literatura (credibilidade, transferibilidade, dependência e confirmabilidade) o que se procurou respeitar.

7.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Relativamente às vivências do homem infértil que deseja ter filhos encontramos como categorias: o significado de ter um filho, significado e sentimentos antes do diagnóstico e face ao diagnóstico de infertilidade, implicações da infertilidade, significado de ser infértil, estratégias para lidar com a infertilidade, mudanças sentidas preocupações e dificuldades vivenciadas ao longo do processo. Das entrevistas efetuadas podemos verificar que a infertilidade poderá trazer implicações a nível físico, psíquico, emocional, familiar, profissional e social. 80

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Após a análise das entrevistas efetuadas conhecemos o significado de ter um filho para estes homens, que atribuíram significados de motivação: biológica, social,

afetiva,

herança

cultural/transmissão

de

valores,

preencher

o

vazio/lacuna, reforço do vínculo conjugal/complemento, realização, projeto de vida/ totalidade Após a análise das entrevistas efetuadas conhecemos o significado de ser pai para estes homens. Verificamos que muitos dos seus significados estão associados a diferentes tipos de motivações: biológicas, sociais e afetivas. Ter um filho para estes homens significa a possibilidade de realização, de transmissão de valores e saberes; de dar carinho e amor. Significa a possibilidade de se perpetuarem de verem realizado o seu projeto de vida e de concretizarem o seu maior objectivo. Um filho é entendido como o fruto das suas vidas e assume para sua existência a dimensão de totalidade. O desejo de ter um filho consiste na realização do “sonho‟. Neste contexto a infertilidade, primeiramente rejeitada, é sinónimo de inferioridade, inutilidade e anormalidade, levando a que estes homens se sintam culpados e estigmatizados. Vivenciada num clima de grande tristeza e de revolta, altera profundamente o modo como este homens percecionam a sua própria identidade e estabelecem as suas relações com os próximos: cônjuge, familiares e outros. As principais consequências da infertilidade salientam-se ao nível da conjugalidade, sexualidade e das relações familiares e sociais. Podendo assumir um papel no fortalecimento das relações conjugais e de aproximação entre os cônjuges; pode igualmente ser motivo de afastamento entre estes homens, os seus familiares e outros. Encontrando nas suas companheiras o pilar para o apoio necessário e para a partilha desejada; as famílias, ainda que bem-intencionadas, representam o peso da incompreensão,

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dos comentários indesejados e dos conselhos não pedidos. Escusando-se a partilhar a sua dor, afastam-se do convívio familiares e social. E se a possibilidade de ser infértil faz surgir sentimentos por si bastante negativos e torna a vivência destes homens difícil, é como se o mundo tivesse desabado, a confirmação do diagnóstico agudiza o modo como é vivenciada e os sentimentos que a envolvem ainda mais negativos. A infertilidade adquire um significado mais marcante. Sentem-se frustrados, inferiores, inúteis, impotentes perante o desejo de realizar o sonho, culpam-se pelo sofrimento que causam às companheiras, também elas impedidas de se realizarem e de realizarem o sonho de serem mães. Perante dificuldade em comunicar a angústia, desalento e dor causada pela infertilidade, isolam-se. Este acontecimento nas suas vidas, marcado por constrangimentos, rejeições e sentimentos reativos de caracter negativo, ainda que acabe por ser aceite e integrado no seu modo de viver e sentir, não ocorre sem que provoque mudanças nas suas vidas. Salientam-se as mudanças na conjugalidade, na vivência da sexualidade que parece resumir-se a uma obrigação, tarefa e algo mecânico com hora e data para ser realizada, Oscilando num ciclo de desalento e de esperança vão fazendo frente as dificuldades e preocupações em se traduz e que representa a infertilidade. Como preocupações e dificuldades sentidas são sublinhadas as referentes à atividade profissional, que aparece perturbada pela constante necessidade de deslocação

a

consultas

ou

realização

de

tratamentos.

Mas

as

mais

constrangedoras e mais difíceis de integrar e aceitar são a i deia de que os tratamentos podem não resultar, de que este esforço para ter um filho pode ser inglório, A maior preocupação é aceitar a verdade da infertilidade e conseguir lidar com a recriminação social que sentem.

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Ainda que muitos refiram e descrevam diferentes estratégias de coping ou seja, estratégias comportamentais e cognitivas utilizadas para lidar e gerir esta difícil situação, nomeadamente o Coping centrado no problema, Coping centrado na emoção, Coping evitante e o Coping vigilante; não deixam de a referir como a mais difícil batalha das suas vidas e a que mobiliza todos os seus esforços para alcançar o seu o sonho das suas vidas: o ter um filho.

7.4. CONCLUSÕES Os resultados sugerem que, de um modo geral, os homens inférteis apresentam uma adaptação com grande relevância ao nível pessoal, familiar e social. Demonstram ainda, alguma reatividade emocional negativa e pouca relevância na adaptação profissional. Aparece sublinhado também que, as dimensões específicas da infertilidade, nomeadamente a importância atribuída, ao ter um filho biológico, á parentalidade, se revelam um aspeto fundamental na compreensão das vivências destes homens; pelo que se compreende que seja apontada como a grande dificuldade / preocupação o aceitar e o conviver com a situação ou a não realização do desejo de ter um filho, ou ainda, que estes homens se sintam inferiores, inúteis e com um enorme sentimento de culpa. Da análise efetuada, apesar de, não terem sido identificadas dificuldades relacionais

significativas,

com

o

cônjuge,

salientam-se

as

dificuldades

relacionais ao nível familiar e social. Salientam-se entre os sentimentos verbalizados por estes homens a recriminação e estigmatização social por parte de familiares e amigos e do consequente isolamento social por eles adotado. Entendendo a infertilidade como assunto tabu pertencente ao domínio do foro privado, remetem-se ao silêncio e ao isolamento social encontrando na vivencia da infertilidade a possibilidade do reforço do seu vínculo conjugal e o cônjuge como único confidente. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Os resultados deste estudo apelam a uma abordagem que, mais que comparativa, permita não só a identificação dos factores e contextos que mais agudizam a vivência das situações de infertilidade, que aumentam as dificuldades e dificultam os processos de transição destes homens; mas também a possibilidade de delinear estratégias de enriquecimento das redes de apoio, permitindo que estas abranjam não só o nível pessoal, mas igualmente o conjugal, familiar, laboral e social. Considerando estes aspetos, o cuidado de enfermagem surge voltado para uma maior sensibilização, consciencialização e humanização, permitindo-lhe realizar de forma saudável o seu processo de adaptação transicional. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Carvalho, M., Valle, E. (2002).- A Pesquisa Fenomenológica e a Enfermagem. Acta Scientiarum, 24, n.3, p.843-847 Delgado, M. (2007 )– O desejo de ter um filho. As vivências do casal infértil. Lisboa: Universidade Aberta, Tese de Mestrado

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Comunicação

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Saúde.

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8.

A

QUALIDADE

DA

SUPERVISÃO

NO

ENSINO

CLÍNICO

DE

ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL Carla Sílvia Fernandes*; Bruno Miguel Costa Santos**; Raquel Maria Torres***; Victor Ferreira Lobo**** *Enfermeira Especialista em Enfermagem de Reabilitação, carlasilviaf@iol.pt **Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiátrica, Irmãs Hospitaleiras – Braga, santosbmc@gmail.com ***Enfermeira

Especialista

em

Enfermagem

Médico-cirúrgica,

Centro

Hospitalar

Póvoa

de

Varzim/Vila

do

Conde,

raquelmgstorres@gmail.com ****Enfermeiro Especialista em Enfermagem Medico Cirúrgica, Centro hospitalar Médio-Ave victorlobo@sapo.pt

RESUMO

A formação em enfermagem comporta uma componente prática, denominada de ensinos clínicos. Para garantir a qualidade da aprendizagem, é determinante o papel do supervisor. Este artigo pretende evidenciar os atributos considerados essenciais para a qualidade deste processo no contexto específico da saúde mental. Este estudo foi de natureza qualitativa, com recurso à entrevista semiestruturada como instrumento de colheita de dados, junto de sete participantes que voluntariamente integraram o estudo. Os resultados foram agrupados em três grandes áreas temáticas a estrutura, processo e resultado, tendo por base o modelo de avaliação da qualidade de Donabedian. Este estudo pretende fornecer conteúdos para a melhoria contínua da qualidade da supervisão em enino clinico de Saúde Mental.

Palavras-chave: Supervisão de Enfermagem; Saúde Mental.

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8.1. INTRODUÇÃO

O conhecimento compreende componentes resultantes quer da observação como de dados científicos, teorias ou modelos, mas também saberes adquiridos através das experiências pessoais, quer na vida profissional, quer na vida pessoal. (Hesbeen, 2000) No âmbito da formação em enfermagem os ensinos clínicos permitem a consciencialização gradual dos diferentes papéis esperados pelo futuro profissional. As preocupações com o acompanhamento deste processo de aprendizagem, nomeadamente da supervisão dos estudantes em ensino clínico, não são recentes, embora bem mais difundidas nos últimos anos. Este papel assume como principal função o apoio à formação contribuindo para o crescimento e desenvolvimento global dos estudantes envolvidos. (Borges, 2010). È notória a vasta produção científica realizada nos últimos anos, a este nível. Conforme nos referem Garrido, Simões, & Pires (2008) , os processos de acompanhamento e de supervisão das práticas clínicas dos enfermeiros, não são processos recentes, nem tão pouco inovadores, as discussões mais recentes a nível do desenvolvimento profissional e da certificação de competências dos enfermeiros, trouxeram um novo incremento a esta discussão. “O conceito de supervisão clínica em Enfermagem, refere-se a uma relação profissional

centrada

na

exigência,

na

formação,

no

trabalho

e

no

desenvolvimento emocional, que envolve uma reflexão sobre o desenvolvimento das práticas orientadas por um profissional qualificado. Compreende um conjunto de estratégias (centradas no profissional e no grupo), incluindo perceptorship, mentorship, supervisão da qualidade das práticas, promoção e acompanhamento dos critérios de qualidade.” (Simões, 2004, p. 64) “Consiste uma relação constitutiva de um Nós, ou seja, um comprometimento recíproco.” (Garrido, Simões, & Pires, 2008) O Nós a que estes autores se referem incide sobre os diferentes atores presentes neste processo, inumerados na ilustração 1.

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Ilustração nº 1 – Atores no processo de supervisão Alguns dos flagelos deste processo poderão resultar da particularidade deste “Nós”, ou seja, na ausência de qualidade e parcerias entre estes elementos,

determinantes

para

o

sucesso

deste

processo.

Conforme

problematiza esta autora, terão os diferentes intervenientes visões, sobre o seu lugar na formação inicial do enfermeiro, congruentes entre si? Como devem ser recrutados os Enfermeiros para o exercício desta função, nomeadamente tutores, supervisores, etc.? Que saberes, competências, experiências devem possuir? Como devem ser inseridos no modelo de formação inicial? Qual a formação específica que devem possuir para orientar os ensinos clínicos? Como se devem articular os profissionais de instituições com objetivos tão distintos, numa tarefa que lhes é comum? Ou, não se articulam, e a formação surge por acumulação de saberes obtidos em dois mundos paralelos? Como se revêm e são reconhecidos pelos pares todos estes intervenientes? (Rodrigues, 2007) O presente artigo tem como eixo orientador a perspetiva da qualidade da Supervisão Clínica em estudantes de Enfermagem, observada pelos supervisores e associado ao contexto específico da Saúde Mental. Conforme no refere Schafer, Wood, & Williams, ( 2011), a particularidade deste contexto ainda é observada com estigma e discriminação pelos enfermeiros e alunos.

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A emergência da qualidade nos processos de formação têm sido visíveis nos últimos anos, nomeadamente o surgir da agência de acreditação do ensino superior. (A3ES) “A Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior assumirá a responsabilidade pelos procedimentos de garantia da qualidade desse grau de ensino — nomeadamente os de avaliação e de acreditação, (…).” (Portugal, Decreto-lei nº369, 2007, p. 8042).

8.2. METODOLOGIA Na construção do nosso caminho, tentamos compreender os atributos considerados imprescindíveis para a qualidade do processo de supervisão dos estudantes em contexto de ensino clínico de Saúde mental. O qual entendemos poder vir a contribuir para a melhoria contínua, deste processo. De um modo particular, pretendemos atingir os seguintes objetivos: analisar que fatores convergem para a qualidade da supervisão clínica de estudantes em enfermagem no âmbito da saúde mental e identificar atributos de estrutura, processo e resultado para a qualidade da supervisão clínica em enfermagem no âmbito da saúde mental. A problemática orientou-nos na compreensão do fenómeno em estudo a partir da realidade percebida pelos supervisores, inserindo-se por isso num estudo de natureza fenomenológico. A fenomenologia é uma corrente filosófica com o propósito de “descrever um determinado fenómeno ou a aparência das coisas enquanto experiências vividas” (Streubert & Carpenter, 2002, p. 49). Os participantes do estudo foram elementos escolhidos de modo intencional dado o conhecimento privilegiado que detinham sobre o fenómeno em estudo, num total de sete supervisores clínicos no âmbito da Saúde Mental. O instrumento de recolha de dados foi a entrevista semiestruturada para o qual foi realizado um guião. Na construção do guião da entrevista os autores recorreram ao modelo de avaliação da qualidade de Donabedian (2003) assente em três 88

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componentes essenciais a estrutura, processo e resultados, porque tal como o autor salienta, o seu modelo, devido à sua simplicidade e capacidade de utilização intuitiva, facilita a conceção de qualidade. Para todas as entrevistas foi realizado um consentimento informado tendo sido solicitado a autorização por escrito. Ao longo do estudo foram salvaguardados os princípios éticos inerentes a uma investigação. As entrevistas decorreram no mês de Março de 2011, num total de sete. Segundo Bardin (2004), as diferentes fases da análise de conteúdo, organizam-se em torno de três polos cronológicos: a pré-análise, a exploração do material e por último o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. (Bardin, 2004). Nesta caso para cada àrea temática estrutura, processo e resultado foi elaborado um conjunto de categorias.

8.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS A análise dos dados recolhidos através das narrativas dos episódios significativos irá ser apresentada em dois momentos: a caracterização geral dos participantes e a análise por área temática. Os participantes num total de sete, eram três do sexo feminino e quatro do sexo masculino, dois deles detentores do grau de doutores, quatro com o título de mestre e um licenciado. A idade dos participantes oscilou entre os 28 e 46 anos, sendo a média de idades de 38,1 anos. No que se refere à experiência no âmbito da supervisão, o tempo oscilou entre os 3 e 15 anos, e a média foi de 8,6 anos.

A importância da Estrutura para a qualidade da supervisão A avaliação da estrutura implica os recursos humanos, recursos materiais e aspetos organizacionais (Donabedian). Relativamente à área temática Estrutura surgiram as seguintes categorias recursos organizacionais, recursos materiais, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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recursos humanos e formação dos intervenientes. (Ilustração 3). No que se refere aos recursos organizacionais são realçados como elementos integrantes integran a escola, as instituições de saúde e o serviço. No que se refere aos recursos materiais são referidos os documentos de suporte e as grelhas de avaliação ajustadas às competências a adquirir no âmbito do enino clinico em saúde Mental. Ao nível dos recursos sos humanos são salientados a necessidade de rácios adequados e a importância da correta formação dos intervenientes.

Ilustração 2: Atributos da Estrutura

O processo da supervisão Clínica em Enfermagem Mezomo (2001) salienta que uma boa estrutura e a existência de processos adequados contribui para o alcance de bons resultados. No entanto, ressalva que, esta relação nem sempre existe entre os elementos. A nível do processo são salientados a importância das parcerias entre todos os intervenientes. São inumeradas numeradas as características de um bom supervisor, o seu papel, como decorre o processo de supervisão e que contributos daí advêm.

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Ilustração 3: Atributos do processo

Os resultados da supervisão Clínica em Enfermagem O resultado reflete as mudanças, no sentido desejável ou indesejável de todo um percurso, podendo refletir a estrutura e os efeitos do processo. Neste âmbito foram enumerados diferentes instrumentos de avaliação e os momentos em que ocorrem. Por outro lado evidenciado a importância dos próprios próp supervisores serem avaliados quer pelos alunos ou através de procedimentos de auto-avaliação.

Ilustração 4: Atributos do Resultado

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8.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Muitas críticas têm sido apontadas ao processo da supervisão por diversos autores, nomeadamente a dicotomia entre a teoria e a prática (Abreu, 2002; Simões, 2004; Garrido, Simões, & Pires, 2008), a ausência de parecerias entre os diferentes intervenientes (Carvalhal, 2003; Garrido Simões, & Pires, 2008; Borges, 2010), o desconhecimento por parte de todos os intervenientes do processo formativo dos estudantes (Borges, 2010;Silva, Pires, & Vilela, 2011). Não os apontaria como críticas mas sim como Itens a melhorar num processo de melhoria contínua, pois entendo tal como Simões (2004) que a Supervisão Clinica deve

ser

entendida

um

processo

mediador

na

aprendizagem

e

no

desenvolvimento, um processo cumulativo, mas que deve assentar em “alicerces” anteriormente construídos que possam sustentar a futura “casa”. Aos itens críticos citados no parágrafo anterior poderiam acrescer outros, nomeadamente: a falta de formação dos intervenientes; o pouco tempo adstrito à supervisão; a sobrevalorização do estudante em aprender o saber fazer em detrimento de um processo mais reflexivo e aberto; uma melhora adequação das estruturas físicas dos contextos clínicos para o ensino e a utilização de uma metodologia científica e linguagem comum por todos os intervenientes, para não existirem choques de conceitos. Todos estes aspetos foram emergindo nas entrevistas com os supervisores, distribuídas pelas três grandes áreas temáticas, estrutura, processo e resultado. Dos achados deste estudo, conjugado com a vasta revisão da literatura divulgada no âmbito da Supervisão Clinica em enfermagem, os autores fizeram emergir no diagrama que se segue os itens considerados relevantes para a melhoria destes processos.

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Diagrama 1: Sobre a qualidade da supervisão clinica em saúde mental

Conforme nos salienta este entrevistado “Se as instituições de ensino estiverem certificadas significa que tem o número de professores suficientes, as instalações adequadas, em termos dos procedimentos se estão corretos. Validaria isto tudo. Se instituições da prática clínica estivessem certificadas, validaria que tem o rácio de enfermeiros por doente adequado, que tem o processo de enfermagem solidificado, que as práticas são de qualidade. Se os supervisores também estivessem certificados, já tínhamos garantido aqui a experiência profissional, a certificação pedagógica, a certificação científica e teríamos aqui um processo harmonioso. Só depois teríamos que certificar o processo de supervisão. Isso seria muito mais fácil.”E7 E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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8.5. CONCLUSÕES O ensino clínico não é uma experiência isolada de formação, mas sim integradora para a construção de um futuro profissional. No âmbito do ensino clinico de saúde mental este carece ainda de maior especificidade. Acreditamos que a acreditação das diversas instituições, a certificação dos serviços e dos profissionais envolvidos permitirá uma grande evolução neste percurso. O trabalho até agora realizado é pertinente, pelas reflexões que tem produzido, mas tal como nos refere estes próximos autores é determinante nesta fase passar à ação. “Urge criar condições adequadas, para implementar políticas, bem definidas, de supervisão clinica, nas nossas organizações de saúde, em todas as áreas profissionais e, em particular, em enfermagem.” (Garrido, Simões, & Pires, 2008, p. 98). Ou seja, é determinante começar a construir um caminho de qualidade quer no contexto global da supervisão clínica, como no contexto específico do enino clinico em saúde mental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abreu, W. (2002). Supervisão Clínica em Enfermagem: Pensar as práticas, gerir a formação e promover a qualidade. Sinais Vitais, 45, 53-57. Bardin, L. (2004). Análise de Conteúdo (3ª edição ed.). Lisboa: Edições 70. Borges, C. (2010). Supervisão de Estudantes de Enfermagem em Ensino Clínico: Que Parcerias? Aveiro: Universidade de Aveiro:Departamento de Didáctica e Tecnologia Educativa. Carvalhal, R. (2003). Parcerias na formação- Papel dos orientadores clinicos - perspectiva dos actores. Loures: Lusociência. Donabedian, A. (2003). An introduction to quality assurance in health care. New York: Oxford University Press.. Garrido, A., Simões, J., & Pires, R. (2008). Supervisão Clínica em enfermagem- perspectivas práticas . Aveiro: Universidade de Aveiro.

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Hesbeen, W. (2000). Cuidar no Hospital-enquadrar os cuidados de enfermagem numa perspectiva de cuidar. Loures: Lusociência. Mezomo, J. C. (2001). Gestão da qualidade na saúde: principios básicos (1ª edição ed.). São Paulo: Editora Manole. Portugal. (2007). Decreto-lei nº369. Diário da Républica 1º série. Rodrigues, A. (2007). Da teoria à Prática: Necessidades de Formação dos Formadores. In Rodrigues, Nascimento, Antunes, Mestrinho, Serra, Madeira, . . . Lopes, Processos de Formação na e para a Prática de Cuidados (pp. 77-90). Loures: Lusociência. Schafer, T., Wood, S., & Williams, R. (2011). Survey into student nurses atttitudes toworas mental ilness : implications. Nurse Education Today, 31, p.328-332. Silva, R., Pires, R., & Vilela, C. (Março de 2011). Supervisão de estudantes de Enfermagem em ensino clínico. Revista de Enfermagem Referência, 3, 113-122. Simões, J. (2004). Supervisão em Ensino Clínico de Enfermagem- a perspectiva dos cooperantes. Departamento de didática e tecnologia Educativa. Aveiro: Universidade de Aveiro. Streubert, H., & Carpenter, D. (2002). Investigação qualitativa em enfermagem: avançando o imperativo humanista. Loures: Lusociência.

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9. CONTRIBUTO DAS INTERVENÇÕES PSICOEDUCATIVAS NA ADESÃO TERAPÊUTICA DA PESSOA COM INSUFICIÊNCIA CARDÍACA: CONCEÇÃO DE UM PROGRAMA PSICOEDUCATIVO Pedro Miguel Custódio* *Centro Hospitalar de Setúbal – Serviço de Cardiologia, Unidade de Cuidados Intensivos Coronários/Sala de Hemodinâmica (Portugal)

9.1. INTRODUÇÃO Uma das definições de saúde mental diz que “é um estado de bem-estar em que o indivíduo tem perceção do seu potencial, consegue lidar com o stress do dia-a-dia, trabalhar de forma produtiva e contribuir para a sua comunidade. A saúde mental e a saúde física são duas vertentes fundamentais e indissociáveis da saúde” (OMS, 2011). O carácter abrangente da saúde mental é assim evidente. Esta está presente em tudo, seja na vida pessoal de cada um, seja nos seus contextos profissionais. A transversalidade do cuidar em enfermagem toma mais expressão na especialidade de saúde mental, pois esta abarca a pessoa durante todo o seu percurso de vida, adequando e ajustando as suas ações em função dos focos identificados como passíveis de atuação específica. Esta transversalidade justifica a presença de enfermeiros especialistas nesta área nas equipas multidisciplinares dos diversos serviços de saúde. A especificidade das competências dos enfermeiros especialistas em enfermagem de saúde mental e psiquiatria (EEESMP) confere-lhes um papel de relevo nas referidas equipas, capacitando-os para acompanhar as pessoas ao longo do seu ciclo de vida, desde o nascimento até à morte. O EEESMP pode desempenhar as suas funções nas mais diversas áreas, podendo desenvolver o seu trabalho em parceria com a criança, jovem, adulto e 96

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idoso; na área da família ou até nos processos de dor e sofrimento, do luto e do morrer. Os

processos

de

auto-conhecimento,

desenvolvimento

pessoal

e

profissional, inerentes à saúde mental conferem aos enfermeiros não somente competências na relação com os clientes, mas também na relação com os pares, capacitando-os de modo bastante eficaz para o desempenho de funções de chefia e gestão dos serviços. Apesar da problemática da adesão/não adesão terapêutica ser motivo de preocupação por parte da comunidade científica, vários estudos apontam que, nos países desenvolvidos, apenas 50% dos doentes portadores de doenças crónicas aderem às recomendações terapêuticas. A falta de adesão à terapêutica compromete a eficácia dos tratamentos e contribui para o aumento considerável dos custos em saúde, constituindo um problema de saúde pública major (OMS, 2002). A insuficiência cardíaca, tal como a doença mental, trata-se de uma doença de evolução prolongada, condicionando negativamente a vida de um indivíduo, ficando este, por vezes, incapacitado de se relacionar com outros, de responder aos estímulos da sociedade e às solicitações que esta lhe impõe. A psicoeducação tem como fundamento terapêutico capacitar as pessoas com doença de um enfoque teórico e prático para compreender e lidar com as consequências da doença, para transformar "a" doença na doença "deles", o que basicamente significa tentar entender a relação complexa entre sintomas, personalidade, ambiente interpessoal, efeitos colaterais da medicação e ao mesmo tempo responsabilizá-los em relação à sua doença e ao seu tratamento, otimizando a adesão terapêutica. O tratamento apropriado da insuficiência cardíaca implica não somente uma abordagem

farmacológica,

mas

também

intervenções

psicológicas

e

psicossociais, de modo a assegurar não apenas a remissão da sintomatologia, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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mas também a recuperação funcional (social e ocupacional) da pessoa, procurando uma adaptação progressiva às limitações próprias da doença. Assim, face à evidência da eficácia da psicoeducação na adesão terapêutica da

pessoa

com

insuficiência

cardíaca,

foi

concebido

um

programa

psicoeducativo intitulado “Insuficiência cardíaca: um novo começo”, para ser aplicado no serviço de cardiologia onde encontra-se a exercer funções. Na Unidade de Cuidados Intensivos Coronários, onde encontra-se a exercer a sua atividade, prestam-se cuidados, diariamente, a pessoas que são reinternadas devido ao abandono da terapêutica. Atendendo à sua experiência profissional, verifica-se que existe um número considerável de doentes que abandonam a terapêutica devido a condições financeiras, no entanto a maioria deve-se a outros fatores. Green (1988, citado por Mcintosh, 2008) refere que a descontinuação efetiva da terapêutica é a maior causa de descompensação nas perturbações psicóticas. Tal facto também se aplica não somente a pessoas com doença mental mas também a pessoas com insuficiência cardíaca. Na revisão bibliográfica efetuada, existe evidência de que as intervenções psicoeducativas podem fazer toda a diferença e evitar estas recaídas, quer na deteção precoce de situações de risco, quer em doentes que registam reinternamentos devido a abandono da terapêutica. A escolha desta área da adesão terapêutica deve-se não somente a um interesse

pessoal,

mas

também

pela

crescente

evidência

de

que

a

psicoeducação, embora não substitua o tratamento medicamentoso, é um importante recurso na otimização significativa dos efeitos dos tratamentos farmacológicos e dos seus resultados, além de apresentar características preventivas para recaídas e para a saúde mental dos familiares.

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Knapp e Isolan (2005) acreditam que um dos principais objetivos da psicoeducação é a adesão à medicação. Ela visa dar aos clientes informações sobre a natureza e o tratamento da sua doença, contemplando um conjunto de ensinamentos teóricos e práticos para que os clientes possam compreender e lidar melhor com a sua patologia. Considerando os fatores supracitados, a problemática estudada diz respeito ao contributo da psicoeducação na adesão terapêutica da pessoa com insuficiência cardíaca.

9.2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO Os cuidados de enfermagem têm por objetivo ajudar o cliente a ser proativo na consecução do seu “projecto de saúde”. Assim, centram-se na prevenção da doença e na promoção dos processos de readaptação, procurando a satisfação das necessidades humanas fundamentais, com a máxima independência na realização das atividades de vida, visando a adaptação funcional do cliente aos défices e adaptação a múltiplos factores – frequentemente através de processos de

aprendizagem

da

pessoa

(Ordem

dos

Enfermeiros,

2001).

O enfermeiro para dotar a pessoa doente de conhecimento e capacidade para ser proativo na consecução do seu “projecto de saúde”, recorre à implementação de processos de ensino e aprendizagem, fornecendo informação que tem por objetivo que a pessoa doente desenvolva competências para a implementação de comportamentos adequados à sua condição de saúde (Ordem dos Enfermeiros, 2001). A adoção de comportamentos adequados à condição de saúde da pessoa doente, não sendo dependente em exclusivo do conhecimento, é influenciada decisivamente por ele, onde os contextos sociofamiliar, económico e profissional são fatores também concorrentes (Padilha, 2006).

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Com base na revisão bibliográfica, existem áreas prioritárias de intervenção, e que as pessoas doentes apresentam dificuldades após alta hospitalar, nomeadamente: falta de conhecimento sobre a medicação; falta de conhecimento para o auto-cuidado; falta de conhecimento sobre os recursos da comunidade; e falta de estruturas de suporte (Naylor et al., 2000; Jaarsma et al., 2000). A partir de estudos realizados, pode-se verificar a importância do exercício profissional dos enfermeiros neste processo, pois as áreas identificadas pelos autores são focos de atenção da prática de enfermagem e sensíveis aos cuidados de enfermagem (Pereira, 2007).

Insuficiência cardíaca Ao longo dos últimos anos temos assistido a uma diminuição da mortalidade devida a doenças infecciosas e a acidentes e a um aumento da prevalência de doenças de evolução prolongada (doenças crónicas). As doenças cardiovasculares ocupam um lugar de destaque como causa de morbilidade e mortalidade por todo o mundo. Incluída neste tipo de patologia encontra-se a insuficiência cardíaca (IC) crónica (Silver et al., 2004). Em Portugal estima-se que a prevalência da IC crónica seja de 4,36% na população adulta. A prevalência aumenta com a idade, sendo 16,14% dos idosos com mais de 80 anos acometidos por esta patologia (Ceia et al., 2002). Com o aumento da esperança média de vida e com o aumento da prevalência da IC, podemos perceber que a longo prazo estes valores irão aumentar. Este fato é sustentado também com o aumento dos fatores de risco desta patologia, tais como diabetes e obesidade, e com o progresso no tratamento de enfartes e outras doenças, que ao aumentar a sobrevivência a estes eventos, aumenta o número de pessoas que podem vir a desenvolver IC como sua sequela (Silver et al., 2004).

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Segundo as guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia de 2005 (Swedberg et al., 2005), a IC trata-se de uma patologia em que o coração deixa de conseguir bombear sangue suficiente para o resto do corpo, podendo dividir-se em IC aguda e IC crónica. A IC aguda diz respeito a um acontecimento de insuficiência inaugural e súbito ou a uma descompensação de IC crónica. A IC crónica caracteriza-se por sintomas de IC (dispneia, fadiga e edema dos tornozelos) tanto durante o exercício como em repouso, evidência de disfunção cardíaca sistólica ou diastólica em repouso (sendo o ecocardiograma o método preferível) e resposta ao tratamento da IC. A IC pode ainda ser dividida em IC direita e IC esquerda, se o congestionamento afetar predominantemente a circulação pulmonar ou sistémica ou IC sistólica e diastólica consoante a função do coração atingida. Há muitas maneiras de categorizar a IC, sendo uma das mais utilizadas a classificação funcional, que depende geralmente da New York Heart Association. Assim, a IC pode dividir-se em 4 classes:

Classe I – a pessoa não tem limitações nas atividades de vida diárias (AVD´s); Classe II: a pessoa tem limitação leve em algumas atividades, sentindo-se confortável em repouso ou com pequenos esforços; Classe III: a pessoa apresenta limitações acentuadas em qualquer atividade, sentindo-se confortável só em repouso; Classe IV: qualquer atividade implica desconforto para a pessoa e os sintomas de IC ocorrem mesmo em repouso. Esta pontuação procura traduzir a gravidade dos sintomas, no entanto, embora a sua aplicação seja generalizada, não prevê com confiança a tolerância a determinados tipos de atividades. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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A IC crónica é uma patologia cada vez mais comum (Hobbs et al., 2002), com uma prevalência de cerca de 2% nos países desenvolvidos (Davies et al., 2001). O aumento da incidência e prevalência desta patologia nos últimos anos deve-se ao envelhecimento da população, que, para além de viver cada vez mais anos, sobrevive

mais

à

patologia

coronária,

que,

por

vezes,

cursa

com

o

desenvolvimento de IC (Davenport et al., 2006). Em 2002 foi publicado o estudo EPICA (Epidemiologia da Insuficiência Cardíaca e Aprendizagem) (Ceia et al., 2002). Os dados para este estudo foram recolhidos por médicos de medicina geral e familiar. Foi um dos primeiros estudos realizados na europa tendo como critérios para o diagnóstico de IC crónica as guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia já aqui expostas. A estimativa da prevalência da IC crónica em Portugal foi de 4,36% em adultos com mais de 25 anos, sendo 4,33% nos homens e 4,38% nas mulheres. Estes valores aumentam com a idade, com uma prevalência de 1,36% nos indivíduos com idades compreendidas entre 25-49 anos e 2,93% entre os 50-59 anos a contrastar com uma prevalência de 7,63% entre os 60-69 anos, 12,67% entre os 70-79 anos e 16,14% nos com mais de 80 anos. Os valores encontrados são ligeiramente superiores aos dos outros estudos europeus. A IC crónica é uma síndrome causada por uma patologia do músculo cardíaco ou por uma condição extracardíaca que aumenta a necessidade de trabalho da bomba cardíaca. O avanço terapêutico e tecnológico em saúde fez com que a sobrevida de portadores de doenças crónicas aumentasse consideravelmente (Colucci & Braunwald, 2003), pelo que a avaliação da qualidade de vida (QV), relacionada à saúde (Health Related Quality of Life – HRQOL), ganhou grande importância nos últimos anos.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Por

se

tratar

de

algo

tão

complexo,

que

envolve

conceitos

multidimensionais, que relacionam aspetos físicos, psicológicos e espirituais da pessoa, não existe uma definição consensual de QV, no entanto esta pode ser definida de uma forma genérica ou relacionada com a saúde. Este conceito engloba dimensões amplas, como o bem estar físico, mental e social, e a relação desses aspetos com o ambiente em que vive. De acordo com esse , ter qualidade de vida significa não apenasque a pessoa tenha saúde física e mental, mas que estja bem consigo, com a vida e com as pessoas com quem convive, capaz de reagir

de

forma

satisfatória

aos

problemas

e

ter

controlo

sobre

os

acontecimentos do quotidiano (OMS, 1995). O conceito de QV relacionado com a saúde (HRQOL) agrega e relaciona todos os aspetos envolvidos na definição genérica, com a questão da doença e das intervenções de saúde (OMS, 1995).

Adesão terapêutica Considerando a importância dos fármacos na prevenção de recaídas, seja a doença de que natureza for, importa desenvolver estratégias que promovam uma maior adesão ao regime medicamentoso recomendado. Quando se aborda o conceito de adesão, implica sempre uma participação ativa da pessoa no seu processo de tomada de decisão, relacionada com o seu processo de doença e plano de tratamento. O processo de tomada de decisão refere-se à cognição com as características específicas: disposição para reter ou abandonar ações tendo em conta o julgamento; capacidade de escolher entre duas ou mais alternativas pela identificação da informação relevante, das consequências potenciais de cada alternativa, dos recursos de suporte e das contradições entre desejos, pensando e selecionando as alternativas; fazer escolhas que afetam o próprio ou terceiros (ICN, 2005). Na

literatura

inglesa,

encontram-se

diferenciadas

as

palavras

“compliance”,”adherence” e “concordance” no sentido crescente da autonomia E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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da pessoa. Assume-se um papel passivo no tratamento associado à palavra “compliance”, um envolvimento mais ativo no tratamento a “adherence” (Donohoe, 2006) e “concordance”, que surge na bibliografia associada a uma maior autonomia da pessoa no processo de decisão. Aborda a adesão terapêutica como um processo de livre escolha em que o profissional de saúde adota apenas um papel facilitador, de suporte e de aconselhamento (Chien, 2008). Gray et al (2002) afirma que os profissionais de saúde mental necessitam de se mover do papel de assegurar a compliance para desenvolver a concordance. Em Portugal não existe discussão em torno da definição da palavra. A importância reside no facto de se realçar a aliança terapêutica entre a pessoa e o profissional de saúde, onde o cumprimento do esquema terapêutico é o comportamento resultante de um trabalho de equipa (Donohoe, 2006). Ele optou por utilizar o termo “adesão terapêutica”, descrita na literatura como o grau em que as pessoas cumprem a medicação respeitando a prescrição (Haynes et al, 2002, citado por Donohoe, 2006). Ou “adesão” definida como o grau de concordância entre o comportamento da pessoa e o aconselhamento dos profissionais de saúde relativamente à aceitação do esquema terapêutico, dieta ou mudanças no estilo de vida (Nursat et al, 2002, citado por Sim, 2006). Uma revisão da literatura efetuada, considera que esta definição não é assim tão simples, dado que as definições variam de autor para autor, podendo a mesma pessoa, na mesma circunstância, ser considerada aderente num estudo e incluída no grupo da não adesão noutro, dependendo dos critérios e dos instrumentos de medida. A adesão pode ser considerada total, parcial, nula ou errática (Cramer,1991, citado por Lindström et al, 2000). A adesão aparece muitas vezes associada ao apoio da família e de pessoas que são importantes para o cliente, conhecimento sobre os medicamentos e processo da doença, motivação, relação entre o profissional de saúde e o cliente (ICN, 2006). 104

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A adesão terapêutica traz ganhos, quer para a pessoa, que experiencia sintomas menos exacerbados, quer para os cuidadores, que apresentam menores níveis de stress (Smith et al, 1999). Apesar da problemática da adesão/não adesão ser motivo de preocupação por parte da comunidade científica, vários estudos apontam que, nos países desenvolvidos, apenas 50% das pessoas portadoras de doenças crónicas aderem às recomendações terapêuticas (WHO, 2003). A não adesão aos tratamentos constitui provavelmente a mais importante causa de insucesso das terapêuticas, introduzindo disfunções no sistema de saúde através do aumento da morbilidade e da mortalidade (Gallagher, Viscoli, & Horwitz, 1993, citado por Delgado & Lima, 2001, p. 81). As repetidas situações de recaída e o alargamento do período de tratamento, conduz a um sofrimento evitável e a custos substanciais acrescidos (Enlund et al, 1987, citado por Delgado & Lima, 2001, p. 81). Os profissionais de saúde devem compreender e identificar quais os fatores que

influenciam

a

tomada

de

decisão

das

pessoas

relativamente

a

comportamentos de não adesão terapêutica. Konkle-Parker (2001), refere quatro categorias principais de fatores que influenciam a adesão terapêutica: 1 - fatores relacionados com a medicação: efeitos secundários da medicação número de medicamentos, tamanho do medicamento, apresentação do medicamento, restrições na dieta implicadas pelo medicamento, duração e complexidade da administração do medicamento; 2 fatores relacionados com a pessoa: conhecimento sobre o processo de doença, crenças de saúde, estadio da doença, aceitação do diagnóstico, compreensão sobre adesão, preparação para tomar a medicação prescrita, estratégias de coping, confiança nas capacidades; 3 - fatores relacionados com o ambiente: fator financeiro, disponibilidade telefónica, suporte familiar e suporte social; 4 fatores

relacionados

com

o

enfermeiro:

competências

comunicacionais,

disponibilidade para questões abertas, relação terapêutica. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Cerca de metade dos portugueses (46,7%) acredita que o esquecimento é o principal motivo que pode levar as pessoas a não seguir totalmente as indicações dadas pelos médicos. Esta é uma das conclusões do estudo realizado pela Associação portuguesa da indústria farmacêutica (APIFARMA), em conjunto com o Instituo de Ciências Sociais (ICS), sobre a “Adesão à Terapêutica em Portugal”, apresentado em 19 de Março de 2010. O objetivo deste estudo era traçar um perfil rigoroso ao nível das atitudes e dos comportamentos relativamente à adesão à terapêutica em Portugal, considerando a adesão à terapêutica como o grau de correspondência do comportamento que a pessoa assume em relação às indicações dadas por um profissional de saúde e ao tratamento prescrito. Se ao esquecimento se juntarem fatores como a preguiça em tomar medicamentos (7,5%), não querer ou não gostar de medicamentos (6,6%), adormecer antes da toma (4,3%), não planear as tomas (2,5%) e não ter tempo ou estar ocupado (2,4%), temos a maioria das razões apontadas pelos inquiridos. No seu conjunto, estes fatores representam 70% dos motivos apontados para a não adesão à terapêutica. O fator económico (18,3%) é também um dos motivos apresentados, representando, no entanto, pouco mais de 1/4 do conjunto das razões de natureza comportamental. No que respeita ao papel da relação de confiança entre o profissional de saúde e a pessoa em situação de doença para o êxito da terapêutica, observa-se que, segundo a generalidade dos inquiridos, o receio destes em fazer perguntas e pedir esclarecimentos aos profissionais (31,7%), bem como o fato de não prestar atenção quando estes estão a explicar o tratamento (28,5%), são as principais razões que podem contribuir para as pessoas não aderirem à terapêutica. A falta de compreensão das vantagens do tratamento (20,5%), por parte da pessoa, é a razão mais referida a seguir, surgindo em último a falta de confiança no médico (12,5%).

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Para a generalidade da população, a relação com os profissionais de saúde é um fator determinante para o cumprimento das indicações terapêuticas, considerando que estes deveriam, segundo os inquiridos, dispor de mais tempo para dedicar a cada pessoa a fim de explicarem os tratamentos e fornecerem um plano detalhado do mesmo. Os níveis de adesão terapêutica nas pessoas em fase aguda da doença são geralmente mais elevados do que nas pessoas com doenças crónicas, uma vez que a presença de sintomas tem uma grande influência na perceção da doença e no comportamento de adesão. As pessoas com doença apercebem-se mais facilmente dos seus problemas de saúde, e tentam resolvê-los, se os associarem a sintomas desagradáveis, pelo que a presença destes ajuda a pessoa a assumir a doença e a procurar cuidados de saúde (Horne, 2000). No que respeita a duração e complexidade da terapêutica, a mais complexa dificulta a gestão do tratamento e doença e são mais propícios à ocorrência de erros, tais como: esquecimento e omissão das tomas, não cumprimento das doses e horário de medicação (Mansur et al., 2001; Ockene et al., 2002). A complexidade da terapêutica é um fator condicionante de adesão, considerando que quanto maior for o número de medicamentos prescritos e maior for o número de tomas diárias, menor será a adesão (Brannon & Feist, 1996). Quando a terapêutica envolve a mudança de hábitos já enraizados e provoca alterações no estilo de vida da pessoa, como por exemplo: dieta, gestão de complicações, deslocações periódicas para exames, os índices de adesão tendem a ser inferiores há aqueles que envolvem somente a adesão à medicação (Lip & Li Saw-Hee, 2000; Mansur & Rainer Düsing, 2001). Outros aspetos que têm sido associados ao baixo índice de adesão são o custo dos medicamentos e os seus efeitos secundários, que podem ser desagradáveis. As circunstâncias sociais das pessoas são determinantes no que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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respeita aos comportamentos de saúde, relacionados com a adesão (Cameron, 1996; Bishop, 1994), bem como o apoio da família e dos amigos (Murray et al., 2004). Se considerarmos o problema da não adesão como um problema de mudança de comportamentos, as teorias da mudança de comportamentos podem também ser consideradas teorias da adesão. As teorias explicativas de Mudança Comportamental centram-se no indivíduo, nomeadamente, em fatores como o seu conhecimento, crenças, aptidões, experiências passadas, motivação, auto-conceito, desenvolvimento psicológico e comportamentos (Glanz, 1999). Vários modelos de mudança de comportamento, pretendem explicar as relações entre o pensamento e o comportamento das pessoas, relativamente às questões afetas à saúde e às doenças. Baseiam-se no pressuposto de que compreendendo as suas crenças, valores e atitudes, será possível planear uma intervenção mais eficaz, que permita modificar e controlar os comportamentos adotados, relativos à saúde. De acordo com Leventhal e Cameron (1987), os estudos sobre adesão têm seguido

uma

de

cinco

perspetivas

teóricas

principais:

biomédica,

comportamental, comunicacional, cognitiva e de auto-regulação. Cada uma destas perspetivas inclui uma ou mais teorias ou modelos que se propõem, cada um por si, explicar a totalidade da intervenção vocacionada para a mudança de comportamentos relativos à saúde. Numa perspetiva evolutiva, o modelo biomédico ajudou a perceber as relações entre a adesão e a doença / regime terapêutico, tendo impulsionado o desenvolvimento de novas formas de administração de terapêutica de modo a facilitar a adesão ao regime medicamentoso e permitiu conhecer os níveis de adesão, no âmbito de algumas doenças, utilizando medidas diretas como os valores bioquímicos. Este modelo, em que o doente é mero executor e deve 108

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obedecer ao que lhe é solicitado, sem participar nas decisões, está mais associado ao conceito inicialmente usado, de “compliance”, que não é adequado, se pretendemos oferecer cuidados de saúde congruentes, que respondam “às necessidades, preferências e vontades dos doentes” (Ribeiro, 2005, p. 227). As teorias ou modelos comportamentais são mais adequados quando se pretende o treino e a aprendizagem de capacidades para realizar atividades instrumentais referentes ao regime terapêutico aconselhado, dando ênfase aos estímulos que desencadeiam o comportamento e às recompensas que o reforçam (Leventhal e Cameron, 1987). A perspetiva comunicacional emergiu nos anos setenta encorajando os profissionais de saúde a melhorarem as suas competências de comunicação e impulsionando a realização de registos escritos e a transmissão de informações entre profissionais por esta via. Permitiu ainda que fosse dada maior ênfase à educação das pessoas e ao desenvolvimento de relações mais iguais, entre estes e os profissionais de saúde. Esta abordagem aumentou a satisfação dos doentes com os cuidados de saúde e mostrou que é necessário interagir com os doentes desenvolvendo relações amáveis e calorosas, mas por si só é insuficiente para mudar o seu comportamento de adesão (WHO, 2003). Inclui-se nesta perspetiva o modelo da hipótese cognitiva de adesão de Ley, desenvolvido em 1981, no qual o autor defende que a adesão se pode prever através de uma combinação da satisfação do doente em relação à consulta com a compreensão da causa, extensão e tratamento da sua doença e com a capacidade de recordar a informação fornecida pelos profissionais de saúde. Ainda de acordo com o modelo de Ley (1981) é possível melhorar a adesão, melhorando a comunicação, o que inclui clareza, simplicidade e repetição das informações transmitidas oralmente; dar seguimento à consulta com entrevistas adicionais; e fornecer informação escrita, que permita recordar mais tarde as informações fornecidas A perspectiva cognitiva inclui várias teorias e modelos como: o modelo de E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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crenças de saúde, a teoria da aprendizagem social de Bandura, a teoria da ação racional de Fishbein, que depois deu origem à teoria do comportamento planeado e a teoria da motivação protetora de Rogers. A perspetiva de auto-regulação pretende explicar as variáveis do contexto e as respostas cognitivas individuais às ameaças à saúde, à luz do modelo de auto-regulação. Por auto-regulação entende-se o processo sistemático de tentativas individuais conscientes de modular pensamentos, emoções e comportamentos de modo a alcançar determinados objetivos, num ambiente em mudança (Zeidner, Boekaerts & Pintrinch, 2000). No âmbito da saúde, espera-se que pessoas com uma boa auto-regulação tenham maior probabilidade de adotar comportamentos saudáveis e menor probabilidade de se envolverem em comportamentos de risco (Woo & Frisbie, 2005). Todos os modelos e teorias apresentam vantagens e desvantagens no que se refere ao fenómeno da adesão não o explicando totalmente. Dada a multiplicidade

de

doenças

e

de

regimes

terapêuticos

com

diferentes

especificidades, nenhum modelo se adapta a todas as situações, pelo que uma abordagem com recurso a diferentes modelos parece ser a estratégia mais eficaz (Leventhal e Cameron, 1987).

Intervenções psicoeducativas Duhamel (1995) define intervenção como alguma ação ou resposta da enfermeira, incluindo ações terapêuticas, respostas cognitivas e afetivas que ocorrem no contexto do relacionamento enfermeira/doente e oferecido para o indivíduo, família ou comunidade onde a enfermeira trabalha. É comum afirmarse que o objetivo da intervenção de enfermagem é efetuar mudanças que ajudem o cliente e a família a darem respostas mais efetivas aos problemas de saúde.

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O conceito de intervenção, segundo Suhonen et al. (2008, p. 844), “destaca a experiência de saúde como individual pelo que a intervenção de enfermagem também deve ser individualizada, adaptada às características individuais com resultados evidenciados na saúde do indivíduo. Destaca ainda o controlo e participação na tomada de decisão pelo próprio indivíduo tendo em conta as suas expetativas a fim de obter consequências desejáveis”. Segundo Rummel-Kluge et al (2006) a intervenção psicoeducativa refere-se a informação sistemática, estruturada e didática relativa à doença e ao seu tratamento e tem em conta os aspetos emocionais individuais, permitindo estimular os indivíduos a lidar com a doença adequadamente. Esta intervenção permite que a pessoa seja capaz de compreender as diferenças entre as suas características pessoais e as características da doença, ajudando-o a lidar melhor com a sua problemática, pois passa a conhecer detalhadamente as consequências, os sintomas e os fatores desencadeantes referentes à patologia que apresenta (Caminha et al., 2003). Os componentes fundamentais destas intervenções compartilham as seguintes características: educação ampla sobre a patologia, treino de habilidades de comunicação, treino de resolução de problemas e como lidar com as crises agudas (Bahls, 2003; Bellack & Mueser, 1993). Segundo Goldstein (1995), a técnica clínica de esclarecer a pessoa doente e sua família a respeito da doença que os afeta, com seus aspetos etiológicos, diagnósticos, evolutivos, terapêuticos e prognósticos, visando aprimorar a participação no processo de tratamento, chama-se psicoeducação. Knapp e Isolan (2005) acreditam que um dos principais objetivos da psicoeducação é a adesão à medicação. Ela visa dar aos pacientes informações sobre a natureza e o tratamento da perturbação psicótica, promovendo ensinos teóricos e práticos para que o paciente possa compreender e lidar melhor com a sua doença, ou seja, desenvolver uma estratégia de coping adequada ao seu caso. Os autores mencionam ainda que outros tópicos devem ser abordados em E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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intervenções psicoeducativas como a identificação precoce dos sintomas prodrómicos, o não consumo de drogas ilícitas e a capacidade de enfrentar com auto-confiança situações provocadoras do stress e da ansiedade (Knapp e Isolan, 2005). Assim, a psicoeducação tem sido definida como uma intervenção didatapsicoterapêutica sistemática, designada para informar os indivíduos e seus familiares sobre a patologia e tratamento e sobre estratégias de coping (Simoneau et al., 1999; Bäuml et al., 2006) que, quando combinada com o tratamento

farmacológico,

tem

a

capacidade

de

orientar

pacientes

na

estabilização do humor, diminuir os internamentos hospitalares e aumentar o funcionamento do indivíduo em diversas áreas (Huxley & Parikh & Baldessarini, 2000). A compreensão da

doença com

orientações

sobre sua

dimensão

psicobiológica e o conhecimento das opções e dos recursos terapêuticos disponíveis, devem fazer da pessoa com a doença mental grave e dos familiares, colaboradores ativos no processo terapêutico e promover um aperfeiçoamento na adesão terapêutica. O entendimento da patologia costuma melhorar a participação no tratamento, substituindo atitudes inadequadas por suporte correcto. Desta forma, as intervenções psicoeducativas propõem-se a modificar as atitudes tanto da pessoa como dos familiares, no sentido de corrigir distorções em relação a prováveis conceitos equivocados sobre a doença e sobre como controlá-la (Goldstein, 1995). A United Kingdom Central Council for Nursing, em 1992, definiu como responsabilidade profissional dos enfermeiros o envolvimento da pessoa e da família na educação em relação à terapêutica prescrita (Tarrier et al, 2000).

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O cuidar em Imogene King Quando se fala em adesão terapêutica, ganha relevância a teoria de alcance de metas e objetivos de Imogene King. A cronicidade da insuficiência cardíaca, tal como na doença mental, pode conduzir a uma alteração drástica no estilo de vida das pessoas, pelas restrições impostas no tratamento, exigindo forte cooperação do utente. Para King (1981), a saúde é um ajuste continuo a fatores de stress no meio ambiente, por otimização dos recursos pessoais para alcançar um potencial máximo para viver. No modelo de King têm-se três sistemas em interação: pessoal, interpessoal e social, onde o sistema interpessoal compreende relações entre duas ou mais pessoas. Essas interações são comportamentos observáveis quando estão em presença mútua e é muito positiva no sentido de permitir uma relação de maior confiança entre as pessoas, fazendo com que passem de um momento de interação inicial a um de transação, no qual já há uma manifestação de um relacionamento mais estável. A interação enfermeiro/doente deve ser aproveitada, objetivando obter do utente o seguimento do tratamento e o controle dos sintomas da sua doença, pois como afirma a teoria, no processo interactivo, dois indivíduos identificam metas e os meios para alcançá-las mutuamente. Quando uma pessoa inicia uma interação, acontece uma ação, depois uma reação e seu desenrolar vai mostrar se a interação evolui para transação. Para King (1981), transação é o comportamento humano dirigido a metas, e acontecem nas situações em que os seres humanos participam ativamente em eventos, movimentos/ações para alcançar uma meta, o que provoca mudanças no indíviduo. Outro factor importante para King é a comunicação entre enfermeiro e doente, pois o cuidado de enfermagem envolve conhecimento e habilidades de comunicação com uma variedade de indivíduos, procurando alcançar metas. A E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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dificuldade de comunicação entre doentes e profissionais de saúde é percetível, pois muitas vezes não há um acordo entre eles em relação ao tratamento, ou seja, as preferências do doente não são consideradas, dificultando a adesão. Nesta perspectiva, o sistema pessoal de King apresenta-se como um recurso importante para a compreensão da adesão terapêutica. Para isto, é necessário o conhecimento dos conceitos referentes a tal sistema, pois estes poderão influenciar, de forma positiva ou negativa, na adesão do doente ao tratamento. Essa teoria tem aplicação junto de todos os doentes crónicos, não sómente nos casos de insuficiência cardíaca e doença mental. Muitas vezes, a evolução lenta da doença, que acontece na maioria das doenças crónicas, constitui uma dificuldade à adesão ao tratamento. Trabalhar com metas pode encorajar os doentes a prosseguir, viabilizando uma forma de interacção enfermeiro/doente necessária à eficácia terapêutica e, com o apoio da família, esse encorajamento pode atingir o controle da doença, prevenindo complicações e dando-lhes melhores condições de vida. Face ao mencionado, as intervenções psicoeducativas surgem como um dos meios à disposição dos enfermeiros e de outros profissionais de saúde para o “empowerment” da pessoa com insuficiência cardíaca, ela passa a ter mais controle sobre a sua doença e sobre a sua vida.

9.3.

CONCEÇÃO

DO

PROGRAMA

PSICOEDUCATIVO

“INSUFICIÊNCIA

CARDÍACA: UM NOVO COMEÇO” Após ter elaborado e aplicado um programa psicoeducativo para pessoas com doença mental em contexto do curso de mestrado em enfermagem de saúde mental e psiquiatria, concebeu um programa para pessoas com insuficiência cardíaca para ser aplicado no serviço onde desempenha funções. 114

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Em contexto académico, elaborou um programa para pessoas com doença mental em situação aguda de doença, após estabilização do quadro clínico. Neste caso, concebeu um programa psicoeducativo, intitulado “Insuficiência cardíaca: um novo começo”, para ser aplicado a pessoas com insuficiência cardíaca em contexto de internamento na unidade de cuidados intensivos coronários e/ou no serviço de cardiologia – enfermaria. Os

objetivos

do

programa

concebido são:

troca

de experiências;

desenvolvimento de insight e de competências de gestão de doença; prevenção de recaída; e promoção de hábitos de vida saudáveis. Assim, os seus objetivos relacionam-se, de um modo geral, com a promoção de uma participação ativa da pessoa no processo de recuperação e a integração de conhecimentos e a aquisição de competências de auto-gestão da doença, promovendo a adesão ao tratamento e à medicação. O programa estrutura-se em torno de uma natureza modular, orientada essencialmente em função de sessões de grupo presenciais. É constituída por seis módulos, sendo a que cada um destes corresponde uma sessão. Embora o programa esteja orientado para sessões de grupo, devido ao fato de desenrolar-se num contexto de internamento, onde as pessoas estão permanentemente, poderá ser feito um trabalho a nível individual com cada um dos participantes, respeitando o seu ritmo e individualidade. Cada sessão tem uma duração prevista de quarenta minutos, que poderá sofrer alterações mediante o estado dos participantes e a sua motivação e participação nas sessões. O programa para pessoas com insuficiência cardíaca foi concebido de acordo com os princípios que orientaram a elaboração do programa para pessoas com doença mental, procurando atuar nas quatro categorias principais de fatores que influenciam a adesão terapêutica (Konkle-Parker, 2001): E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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1 - fatores relacionados com a medicação: efeitos secundários da medicação número

de

medicamentos,

tamanho do

medicamento,

apresentação

do

medicamento, restrições na dieta implicadas pelo medicamento, duração e complexidade da administração do medicamento; 2 - fatores relacionados com a pessoa: conhecimento sobre o processo de doença, crenças de saúde, estadio da doença, aceitação do diagnóstico, compreensão sobre adesão, preparação para tomar a medicação prescrita, estratégias de coping, confiança nas capacidades; 3 - fatores relacionados com o ambiente: fator financeiro, disponibilidade telefónica, suporte familiar e suporte social; 4 - fatores relacionados com o enfermeiro: competências comunicacionais, disponibilidade para questões abertas, relação terapêutica.

Se a pessoa tiver alta clínica sem ter terminado o programa psicoeducativo, tem a possibilidade de concluir o programa e continuar a ser alvo de uma intervenção

psicoeducativa

individualizada

e

que

corresponda

às

suas

necessidades, objetivos e motivações quando a pessoa for às consultas ou efetuar algum tratamento no hospital de dia de insuficiência cardíaca. O 1º módulo do programa psicoeducativo “Insuficiência cardíaca: um novo começo” aborda o binómio “saúde vs doença”. Inicialmente, importa desenvolver as relações interpessoais entre todos os intervenientes, promovendo atividades que possibilitem uma identificação de todos enquanto grupo. Seguidamente, proceder à apresentação do programa e saber as motivações e objetivos de cada um dos participantes. Só depois desta fase inicial de conhecimento mútuo e das expetativas de cada um face ao programa se dará início aos conteúdos

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relacionados com a saúde e doença. Importa definir a insuficiência cardíaca e as limitações que esta doença implica. É importante realçar a cronicidade da mesma e o papel que cada um pode ter no seu controle. O 2º módulo diz respeito aos sinais e sintomas de insuficiência cardíaca. Os doentes são convidados a expressarem como a doença se manifesta neles próprios. Procura-se acima de tudo motivar à participação nas sessões. As vivências pessoais de cada um são um bom ponto de partida para identificarem num estudo de caso, realizado em grupo, outras manifestações de insuficiência cardíaca. É vincada a importância de uma deteção precoce, o que se é possível através de um conhecimento de si próprios. O 3º módulo fala da medicação/esquema terapêutico. Os principais objetivos desta sessão prendem-se com o reconhecimento dos benefícios do cumprimento da medicação, bem como o conhecimento de atitudes que facilitem uma correta gestão da medicação. Aborda efeitos secundários e uma vez mais refere como essencial a adoção de hábitos de vida saudáveis. Segue-se o 4º módulo, que trata de como lidar com a insuficiência cardíaca. Reforça a importância do planeamento de atividades de vida diárias. A existência de rotinas, de hábitos de higiene, sono e alimentação são imperativos numa vida que se quer produtiva. É imperativo planificar as atividades em função das limitações da doença e dos graus de insuficiência cardíaca. Posteriormente, foi apresentado o 5º módulo, intitulado “Prevenção de Recaídas”. É mencionada a importância de um plano de emergência, reduzindo o stress.

A identificação

precoce

dos

sintomas

de

descompensação

de

insuficiência cardíaca pode evitar recaídas e reinternamentos.

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O 6º módulo denominado “Melhorar a Qualidade de Vida”, onde são recuperados e revistos inúmeros conceitos abordados ao longo das sessões anteriores. Todas as sessões estão estruturadas com uma introdução, onde se apresentam os objetivos; o desenvolvimento, onde são apresentados os conteúdos; e uma conclusão, onde se procede à síntese e se esclarecem dúvidas dos participantes da sessão. Pretende-se que o grupo que cumprirá o programa psicoeducativo funcione em regime fechado, de forma a facilitar o desenvolvimento e coesão do grupo e a aquisição progressiva de competências. Deverá ser no máximo constituído por quatro

ou

cinco

elementos,

de

modo

a

possibilitar

uma

intervenção

individualizada O programa psicoeducativo está acessível a qualquer pessoa que esteja internada na UCICOR ou na enfermaria. Não são incluídos no programa psicoeducativo pessoas que não queiram, ou seja, que recusem. As pessoas em situação aguda de doença, só após a estabilização da sua situação clínica poderão ser integradas no grupo psicoeducativo. Independentemente dos graus de insuficiência cardíaca, e das limitações que daí advêm, qualquer pessoa pode ser integrada no programa psicoeducativo. A versatilidade do programa possibilita que as pessoas possam assistir apenas a algumas sessões e ser realizado um trabalho individualmente, de modo a ir ao encontro das necessidades de cada pessoa. O programa tem que ser aplicado atendendo à especificidade de cada pessoa, adequando-se às limitações que cada um possa ter. É essencial que a pessoa consiga definir objetivos em função das limitações próprias da evolução da insuficiência cardíaca, encontrando um significado para a sua vida. 118

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9.4. CONCLUSÕES Atendendo à experiência profissional que tem na área da insuficiência cardíaca, verifica-se um número considerável de reinternamentos por abandono terapêutico. A pessoa com insuficiência cardíaca tem inúmeras limitações, sendo que muitas destas advêm dos efeitos secundários dos esquemas terapêuticos instituídos, nos quais a pessoa não foi devidamente envolvida nem está motivada para o seu cumprimento. A não adesão terapêutica resulta tipicamente de crenças sobre efeitos secundários e rotura nos estilos de vida e outras preocupações sobre os efeitos a longo o prazo e dependência (Leventhal et al., 1987; Murray et al., 2004). De

acordo

psicoeducação

com

a

como

revisão

modelo

bibliográfica

terapêutico

e

efetuada, prática

sabe-se

frequente

que

no

a

meio

institucional, potencializa os resultados terapêuticos na medida em que as pessoas com insuficiência cardíaca passam a ter um maior conhecimento da patologia, aprendem a lidar com as situações do dia-a-dia de forma mais adequada e aprendem a gerir crises. A aprendizagem de deteção de sinais iniciais e informações acerca da doença, que passa a ser vista pela pessoa como a “sua doença”, constituem outros dos objetivos primordiais da psicoeducação. O

tratamento

farmacológica,

mas

da

insuficiência

também

cardíaca

intervenções

implica

uma

psicossociais.

abordagem

Através

desta

modalidade de intervenção é possível reduzir o número de recaídas e consequentemente de internamentos hospitalares, potencializando o papel social do doente e promovendo um aumento da sua qualidade de vida. A análise da problemática da adesão terapêutica à luz do modelo de Imogene King possibilita um olhar crítico e reflexivo sobre os cuidados de enfermagem prestados na sua prática diária. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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É essencial olhar a pessoa como um parceiro nos cuidados, importa envolvê-la em todo este processo, uma vez que esta é o foco de toda a intervenção. Os objetivos têm que ser definidos em função da pessoa e não do cuidador. É imperativo respeitar as suas expetativas, motivações e ritmos próprios. A comunicação entre enfermeiro e pessoa é extremamente importante, pois o cuidado de enfermagem envolve conhecimento e habilidades de comunicação com uma variedade de indivíduos, procurando alcançar metas. A dificuldade de comunicação entre doentes e profissionais de saúde é percetível, pois muitas vezes não há um acordo entre eles em relação ao tratamento, ou seja, as preferências do doente não são consideradas, dificultando a adesão. O conhecimento que a pessoa possui sobre a terapêutica é uma determinante importante de adesão, pelo que os profissionais de saúde nas interações que estabelecem com os doentes devem assegurar que se trata de uma relação baseada na confiança e que estes tenham compreendido as recomendações (Bishop, 1994; Ockene et al., 2002). Na sua prática diária, na unidade de doentes coronários, passou a prestar cuidados em função do outro e não atendendo a objetivos pessoais que muitas vezes não coincidem com os da pessoa cuidada e só a tornam mais dependente. A grande finalidade da relação de ajuda e o grande objetivo do enfermeiro é a autonomia do outro. O enfermeiro é um importante recurso à disposição da pessoa, no entanto a procura do sentido para a vida é um processo pessoal, onde o enfermeiro adota um papel de orientador, nunca substituindo a pessoa. O enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental e psiquiatria (EEESMP) desperta e capacita as pessoas para elas próprias encontrarem e trilharem o seu caminho…

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10. ALTERAÇÕES PSICOLÓGICAS E COMPORTAMENTAIS NA DEMÊNCIA Lia Fernandes* *Prof. Associada da FMUP, Psiquiatra no CHSJ - Porto

RESUMO A Doença de Alzheimer (DA) e outras formas de demência afectam 7.2 milhões de pessoas na Europa, com 153 000 demenciados em Portugal, 90 000 dos quais com DA (número que se estima que duplique até 2020). Estes dados são, sem dúvida, preocupantes tendo em conta que a DA representa actualmente, a principal causa de dependência nos idosos, resultando num considerável crescimento de necessidades, bem como sobrecarga dos cuidadores e dos Sistemas de Saúde e de Segurança Social. A Psicogeriatria emerge como sendo uma área de intervenção prioritária em Portugal, nomeadamente na abordagem das alterações comportamentais e psicológicas do idoso, com principal relevo para a depressão.

Palavras-chave: Demência; Alterações Psicológicas e Comportamentais

10.1 . Introdução A demência caracteriza-se por um défice de memória e de outras áreas da cognição (afasia, agnosia, apraxia e funcionamento executivo), bem como manifestações neuropsiquiátricas, com perda funcional suficiente para causar deterioração a nível social ou ocupacional. Tem normalmente um início gradual e declínio cognitivo continuado (DSM-IV-TR, 2000).

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Particularmente os sintomas comportamentais e psicológicos da Demência (SCPD) definem-se, de acordo com Associação Internacional de Psicogeriatria (1996), como “sintomas ou sinais de perturbação da percepção, conteúdo do pensamento,

humor,

comportamento,

que

ocorrem

frequentemente

na

demência”. Estes sintomas podem ser muito variados, podendo surgir sob a forma de inquietação motora, agitação, deambulação, fugas, gritos/praguejar, agressão física, depressão, apatia, desconfiança, alucinações, delírio, desinibição sexual, acumulação de objectos, perturbação do sono e alimentar (Burns et al., 2001). Sendo a demência de Alzheimer (DA) uma doença neurodegenerativa progressiva, o aumento da sua gravidade surge acompanhado pelo agravamento das incapacidades. Neste contexto, Reisberg (1982) define sete estadios progressivos na evolução do processo demencial, que vão desde o estadio préclínico, às queixas subjectivas, defeito mnésico, demência ligeira, moderada, moderada/grave e grave. Nesta sequência os sintomas comportamentais, como a depressão e a apatia iniciar-se-iam na passagem do defeito mnésico para demência ligeira, enquanto que os sintomas de agitação, alucinação e agressividade surgiriam sobretudo a partir da demência moderada-grave. Os SCPD são definidos como resultado de disfunção cerebral na DA (tendo na

sua

génese

mecanismos

de

natureza

genética,

neuroquímica

e

neuropatológica), com lesões ao nível do sistema límbico e dos circuitos corticosubcorticais. Os SCPD podem ainda ser resultado de alterações psicológicas, com base na personalidade pré-mórbida e na resposta ao stresse, bem como em alterações a nível social (nomeadamente quando há mudança no ambiente ou na relação estabelecida com o prestador de cuidados/familiar) (Lawlor, 1996; Robert et al., 2009). Tradicionalmente, os SCPD podem ser agrupados em cinco grandes blocos (McShane, 2000): 126

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1. Agressão de tipo físico/verbal, bem como resistência agressiva 2. Apatia, que pode englobar isolamento, desmotivação e perda de interesse 3. Depressão expressa pela tristeza, choro fácil, desespero, baixa autoestima, ansiedade e culpabilidade 4. Psicose com manifestações que vão desde falsas interpretações a alucinações e delírios 5. Agitação psico-motora que compreende o deambular sem objectivo ou andar atrás de alguém, inquietação, repetição de actos diversos, vestir e despir e ainda perturbações do sono. Na DA as manifestações psicopatológicas desenvolvem-se por ordem de frequência, sob a forma de apatia (80%), depressão (60%), ansiedade e agitação (53%), euforia e desinibição (27%) e perturbação do sono (13%) (Santana et al., 2000). Na avaliação dos SCPD, o Inventário Neuropsiquiátrico – NPI (Cummings, 1994) é o instrumento que mais tem sido utilizado. Este deve ser aplicado por entrevista ao cuidador, podendo ser feito em 20 minutos, com a avaliação da frequência e sobrecarga atribuída a 13 comportamentos psicopatológicos (validação da versão portuguesa em curso pelo GEECD, 2008). Para avaliação dos SCPD, existem ainda algumas regras de conduta, que devem ser alvo de atenção, nomeadamente a recolha de uma história clínica completa, a pesquisa de causa orgânica/iatrogénica, o conhecimento de medicação concomitante e eventuais efeitos adversos, bem como a avaliação do impacto na autonomia e nas actividades de vida diária, destes doentes. Para além da observação directa do idoso na presença do cuidador/familiar, é igualmente importante ter em conta que para cada comportamento, deve ser considerado o contexto, a duração e a reacção dos doentes aos cuidadores. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Muito em particular, deve-se considerar nesta avaliação alguns factores ambientais e sociais. Nomeadamente ter em conta que o demenciado é muito sensível às alterações da sua rotina. Por outro lado, acontecimentos de vida marcantes (como por exemplo, a perda do cônjuge) podem causar sintomas depressivos, até seis meses após a sua ocorrência. Outras alterações no contexto de vida destes doentes, como a mudança de residência, podem desencadear confusão, agitação e actividade delirante, ou até mesmo, maior mortalidade (Orrell et al., 1995; 1996). É importante destacar ainda, que alguns destes sintomas, como a agitação, podem exprimir situações de desconforto/dor, astenia, doença física, excesso de álcool/café, hiperestimulação e acção secundária a medicamentos. Podem resultar também de resposta à irritação do cuidador, presença de estranhos ou ambiente não familiar, bem como excesso de exigências ou má compreensão da situação (ameaças), contrariedades, depressão e psicose (Copeland et al., 2002). Por outro lado, no âmbito destes sintomas, situações como desconfiança com eventual evolução para delírio, podem denunciar dificuldades repetidas de memória, como o esquecimento do local onde se arrumam determinados objectos, a má interpretação de acções e palavras, erros na identificação de pessoas, distorções perceptivas e mesmo alucinações. Podem resultar ainda de isolamento social ou alteração do ambiente. No entanto, a possibilidade de o idoso estar a ser realmente mal tratado ou roubado, deverá sempre ser tida em conta. No que se refere ao tratamento dos sintomas comportamentais e psicológicos da demência, a abordagem deverá ser preferencialmente nãofarmacológica, através estratégias de intervenção integradas no contexto individual/familiar ou em lares e instituições (Burns et al., 2006). Naturalmente que só se pode avançar para qualquer tipo de intervenção terapêutica, previamente excluídas (com diagnóstico e tratamento atempado) as 128

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causas mais frequentes destas alterações comportamentais, que são as de etiologia orgânica. Actualmente antidemenciais

considera-se e

que

psicofármacos

o

tratamento

(antipsicóticos,

farmacológico,

com

benzodiazepinas

e

antidepressivos) deverá ser utilizado apenas como último recurso (Waldemar et al., 2009). Particularizando os antidemenciais, quer inibidores das colinesterases (donepezil, rivastigmina, galantamina) quer antiglutamaérgicos (memantina), têm globalmente eficácia ao nível da deterioração cognitiva, funcionalidade e alteração comportamental. Os primeiros melhoram sobretudo as manifestações de apatia e alterações do comportamento motor e delírio (Cummings, 2008). Os segundos melhoram essencialmente a agitação e a agressão (Gauthier, 2007). Estes fármacos têm ainda como implicação clínica o atraso na emergência dos sintomas comportamentais e psicológicos, reduzindo a necessidade de outros psicofármacos (nomeadamente neutrolépticos), embora sem uma acção imediata (Holmes et al., 2004). Quanto aos antipsicóticos, é hoje assumido que devem ser utilizados com particular precaução nas situações demenciais, pelos riscos conhecidos de sedação e de sintomas extra-piramidais (especialmente Demência de Corpos Lewy) (Skin et al., 2005). Por outro lado, há necessidade de ponderação entre risco/benefício na utilização destes fármacos no tratamento dos SCPD, quer no caso dos neurolépticos clássicos quer dos atípicos. O seu benefício parece ser muito modesto, e, apenas útil no tratamento da agitação e da psicose (Ballard et al., 2006). Segundo alerta da FDA, estes medicamentos podem induzir efeitos cardiovasculares graves, risco de AVC e morte súbita, particularmente em E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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doentes previamente demenciados e hipertensos (Wirshing et al., 1998; Casey, 1996; McKeith, 2002; FDA, 2005). A abordagem dos aspectos psicológicos e do funcionamento social constituem hoje o principal foco de intervenção, nomeadamente com terapias aplicadas em centros/hospitais de dia, departamentos de fisioterapia/terapia da fala, clínicas de memória e lares, com envolvimento de uma equipa multidisciplinar e sem implicar grandes custos económicos. Este tipo de abordagem pode abranger um leque diversificado de intervenções que vão desde o tipo cognitivo, psicossocial, adaptação do meio ambiente, estimulação sensorial e estimulação motora. Poderá ser desenvolvida em doentes individualmente (sobretudo em estadios iniciais DA), bem como nos cuidadores e familiares que lidam com estas perturbações ao nível do treino de competências, numa intervenção do tipo psicoeducativo (Livingston, 2005).

10.3. Conclusão Em conclusão, pode afirmar-se que as alterações comportamentais e psicológicas são uma das partes mais importante da clínica das demências. Embora o seu tratamento seja essencialmente não farmacológico, hoje utilizam-se com maior frequência os agentes antidemenciais, que diminuem a necessidade de recurso a psicofármacos. Estes últimos (sobretudo os neurolépticos) devem ser apenas usados após ponderação risco/benefício e prescrição por curto período de tempo com reavaliação frequente dados os riscos cardiovasculares e de morte súbita. A abordagem prioritária não farmacológica, no tratamento das alterações comportamentais e psicológicas, deve englobar uma acção integradora que 130

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consiga coadjuvar o suporte ao doente, cuidador e família (nomeadamente a nível psicoeducacional), com uma intervenção de tipo institucional, em contexto multidisciplinar (numa fase mais avançada de demência).

10.3 BIBLIOGRAFIA

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11. VINCULAÇÃO, TEMPERAMENTO AFETIVO E SAÚDE MENTAL Raul Alberto Cordeiro* *Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, Professor Adjunto, Doutorado em Ciências e Tecnologias da Saúde – Desenvolvimento Humano e Social, Presidente do Conselho Técnico-científico, Instituto Politécnico de Portalegre - Escola Superior de Saúde, raulcordeiro@essp.pt

RESUMO Este estudo teve como objetivo estudar a relação entre os padrões de vinculação (parental e amorosa) e o temperamento afetivo (depressivo, ciclotímico, hipertímico, irritável e ansioso) conceptualizado em temperamentos estáveis (depressivo e hipertímico) e instáveis (ciclotímico, irritável e ansioso) reunindo dados que nos permitiram perceber se padrões de vinculação seguros se correlacionam positivamente com temperamentos estáveis. A amostra foi constituída por 760 estudantes do curso de licenciatura em enfermagem provenientes de quatro escolas do sistema de ensino superior politécnico português. Os dados foram recolhidos por questionário de autopreenchimento, formado por várias medidas: variáveis sóciodemográficas, a Escala de Temperamento de Memphis, Pisa, Paris e San Diego (TEMPS-A), validação para a população portuguesa (Akiskal & Akiskal, 2005a; Figueira et al., 2008), o Questionário de Vinculação ao Pai e à Mãe – QVPM, Versão IV (Matos & Costa, 2001a), o Questionário de Vinculação Amorosa – QVA, Versão III (Matos & Costa, 2001b). Os participantes são maioritariamente do género feminino (83,3%) com uma média de idades de 21,3 anos, vivem maioritariamente num agregado familiar com pai e mãe, 81,7% têm irmãos e 60,3% mantêm uma relação de namoro.

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A partir dos dados dos fatores de vinculação parental (pai e mãe) e de vinculação amorosa foram construídos padrões de vinculação (seguro, preocupado, desinvestido e amedrontado). Os resultados evidenciam associações significativas entre os temperamentos instáveis (ciclotímico, irritável e ansioso) e o padrão de vinculação desinvestido da vinculação parental (pai e mãe).

Palavras-Chave:

Temperamento

afetivo,

vinculação

parental,

vinculação

amorosa, saúde mental

11.1. INTRODUÇÃO A problemática que se constitui como o ponto central da nossa investigação é a análise das relações entre os padrões e fatores de vinculação parental e amorosa e o temperamento afetivo, na perspetiva de melhor entender os fenómenos de moderação mútua entre estes conceitos numa população jovem adulta. Este é um trabalho que se centra nas formulações teóricas sobre os temperamentos afetivos apontadas por Hagop Akiskal e seus colaboradores e seguidores (Akiskal, 1985 e 1994; Akiskal & Akiskal, 2005abc; Akiskal, Savino & Akiskal, 2005; Akiskal, Akiskal, Haykal, Manning & Connor, 2005a; Akiskal et al., 1998 e 2005b) e ainda nas formulações teóricas da vinculação (Bowlby, 1978ab, 1979, 1980, 1984ab). Akiskal & Akiskal (2005c) baseiam o modelo que propõem no conceito de predisposição de humor, na continuidade dos estudos protagonizados por Kraepelin (1913/19, 1921) e da sua observação dos padrões de humor na prática clínica, emergindo, das suas formulações, primariamente, três tipologias de 134

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temperamentos: o hipertímico, o ciclotímico e o depressivo; e, mais tarde, o temperamento ansioso e irritável. No âmbito da vinculação optámos por escolher duas vertentes de estudo: a vinculação parental (pai e mãe) e a vinculação amorosa. Tal escolha justifica-se, em

nosso

entendimento

por

corresponderem

a

fases

relevantes

de

desenvolvimento identificadas no contínuo do desenvolvimento humano e das relações sociais. No que diz respeito à vinculação, a teoria de Bowlby e Ainsworth (Ainsworth & Bowlby, 1991) tem-se constituído como uma base segura para a exploração das dinâmicas desenvolvimentais específicas do ser humano numa perspetiva de ciclo de vida e com recurso a uma diversidade metodológica. Os contributos da teoria e da investigação têm sido de tal forma relevantes que, na atualidade, a teoria da vinculação assume-se como um quadro concetual extremamente robusto e por isso inquestionável para o estudo da vinculação em jovens adultos. Para Bowlby (1978ab) as experiências de vinculação da infância são internalizadas em modelos internos dinâmicos que reúnem expetativas de si próprio e dos outros. Bartholomew & Horowitz (1991) dicotomizou estas duas dimensões do self e do outro em positivo e negativo, formulando um modelo de quatro protótipos de vinculação. Deste modo, os modelos internos do self podem ser positivos (o self como merecedor de amor e de apoio) ou negativos (o self como não merecedor de amor e de apoio), bem como os modelos internos dos outros podem ser positivos (os outros são responsivos e confiáveis) ou negativos (os outros são rejeitantes e indisponíveis). Dada a utilização neste trabalho deste quadro conceptual como grelha de leitura e como guia de alguns dos procedimentos estatísticos que realizamos, efetuamos uma breve descrição de cada um dos Protótipos de Vinculação E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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sugeridos pelo modelo de Bartholomew. Estas descrições têm por base quer o que se apresenta na Peer Attachment Interview (Bartholomew, 1996), quer em artigos (Bartholomew, 1990; Bartholomew & Horowitz, 1991) quer ainda nos documentos que são disponibilizados na página do laboratório dirigido pela própria Kim Bartholomew na Simon Fraser University (Bartholomew'sResearchLab;www.sfu.ca/psyc/faculty/bartholomew/research/). Ao modelo do self está associado o grau de ansiedade e dependência nas relações próximas e ao modelo do outro associa-se o grau de responsividade e disponibilidade ou evitamento dos outros (Bartholomew & Shaver, 1998). Do cruzamento deste dois tipos de modelos obtêm quatro protótipos de vinculação: o seguro, o preocupado, o amedrontado e o desinvestido (Bartholomew & Horowitz, 1991). Em Portugal, o estudo da vinculação segundo este modelo conceptual tem sido conduzido por Paula Mena Matos e colaboradores (Matos et al., 1999; Matos, Almeida & Costa, 1997 e 1998; Matos, Barbosa & Costa, 2001; Matos & Costa, 2006), tendo sido construído um instrumento de autorrelato, dirigido a adolescentes e jovens adultos, para a avaliação da vinculação aos pais - Questionário de Vinculação ao Pai e à Mãe (QVPM; Matos & Costa, 2001a) - e um instrumento de avaliação da vinculação amorosa Questionário de Vinculação Amorosa (QVA; Matos & Costa, 2001b).

O temperamento refere-se à forma de ser emocional de cada indivíduo sendo considerado como a base do humor, do comportamento e da personalidade (Lara, 2006). Está relacionado com a natureza emocional individual, possui herança predominantemente genética e é relativamente estável no tempo (Allport, 1961; Cloninger, Svrakic & Przybeck, 1993). Akiskal e seus colaboradores e seguidores desenvolveram uma estrutura classificativa dos temperamentos (Akiskal, 1985, 1994; Akiskal & Akiskal, 2005ab) baseada, nos primeiros estadios dos seus estudos, na seguinte tipologia:

- Temperamento depressivo: indivíduos preocupados, pessimistas, quietos, tímidos, indecisos e passivos. Têm uma conduta reservada, são resignados, 136

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reflexivos e com elevada tolerância para situações monótonas ou que exigem cautela. - Temperamento ciclotímico: indivíduos que alternam entre períodos de auto-confiança alta e baixa, estados apáticos e energéticos, pensamentos confusos e aguçados, humor tristonho e brincalhão, momentos introvertidos e expansivos, sonolência e pouca necessidade de sono. - Temperamento irritável: manifestação de irritabilidade como característica marcante

e

constante.

Os

indivíduos

são

ameaçadores,

desconfiados,

combativos e destrutivos. - Temperamento hipertímico: os indivíduos são dinâmicos, desejam estímulos e sensações de prazer, tem tendência para a impulsividade, curiosidade, extravagância e desorganização. Pretendem reacções afectivas rápidas e intensas, e possuem inquietação, tédio e irritabilidade. Em estudos posteriores viria a ser integrado o temperamento ansioso: caracterizado por disposição de personalidade exagerada em direção à preocupação.

Caracteriza-se

por

um

humor

ansioso,

com

sensações

desagradáveis de ansiedade manifestando-se por tremores, sudorese ou taquicardia, sempre com reações ansiosas em situações específicas (provas, trabalho, entrevistas, situações sociais, entre outros).

11.2. METODOLOGIA Foi desenvolvido um estudo de natureza correlacional, não experimental com tratamento quantitativo dos dados e para o qual foram definidos os seguintes objetivos: -Caracterizar os temperamentos afetivos, conceptualizados em estáveis e instáveis; E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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-Caracterizar os fatores e os padrões de vinculação parental e amorosa; -Correlacionar os temperamentos afetivos com os fatores de vinculação parental e amorosa.

E as seguintes hipóteses de investigação: H1 – Padrões seguros de vinculação parental correlacionam-se positivamente com temperamentos estáveis; H2 – Padrões seguros de vinculação amorosa correlacionam-se positivamente com temperamentos estáveis.

11.2.1. PARTICIPANTES A amostra deste estudo (N=836) foi retirada da população do Ensino Superior, de entre os estudantes do Curso Superior de Licenciatura em Enfermagem do Centro e Sul de Portugal e que frequentava, no ano letivo de 2007/2008 as seguintes Escolas: -Escola Superior de Saúde de Portalegre (N=255) -Escola Superior de Enfermagem de S. João de Deus – Universidade de Évora (N=123) -Escola Superior de Saúde de Beja (N=245) -Escola Superior de Saúde Dr. Lopes Dias de Castelo Branco (N=213) Foram definidos como critérios de inclusão na amostra: -

138

Ter respondido à totalidade do questionário;

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-

Ter idade superior a 18 anos. Da aplicação exaustiva das regras de inclusão resultou um grupo de estudo

de N=760 inquiridos.

11.2.2. INSTRUMENTOS Foram utilizadas as seguintes medidas, incluídas no questionário atrás referido: a) Avaliação da vinculação parental Foi utilizado o Questionário de Vinculação ao Pai e à Mãe – QVPM, Versão IV (Matos & Costa, 2001a) aplicado de duas formas: uma relativa à mãe e outra relativa ao pai (Anexo I – Parte 1). b) Avaliação da vinculação amorosa Efetuada com recurso ao Questionário de Vinculação Amorosa – QVA, Versão III (Matos & Costa, 2001b) (Anexo I – Parte 2). c) Avaliação do temperamento afetivo A TEMPS-A é uma escala composta por 110 itens e construída de forma a fornecer cinco disposições ou dimensões temperamentais: temperamento depressivo – itens 1 a 21 (21 itens), temperamento ciclotímico – itens 22 a 42 (21 itens), temperamento hipertímico – itens 43 a 63 (21 itens), temperamento irritável – itens 64 a 84 (21 itens, menos um no caso do género feminino) e temperamento ansioso – itens 85 a 110 (26 itens).

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11.2.3. PROCEDIMENTOS A recolha de dados decorreu entre os meses de Janeiro e Junho de 2008. Tal como referido anteriormente participaram neste estudo um total de N=836 estudantes do Curso Superior de Licenciatura em Enfermagem das Escolas Superiores de Saúde de Portalegre, Beja e Castelo Branco e da Escola Superior de Enfermagem de S. João de Deus da Universidade de Évora. A recolha de dados, através do preenchimento do questionário, foi efetuada em sala de aula, com a presença do investigador. Os dados recolhidos para este estudo foram lançados e editados para suporte informático em base de dados do programa SPSS® (Statiscal Package for Social Sciences) na versão 17.0. Durante a construção da base de dados foram codificadas as variáveis necessárias ao estudo respeitando os seus níveis de medida.

11.3. RESULTADOS Variáveis sociodemográficas A média de idades encontrada para a totalidade dos inquiridos foi de M=21,3 anos (DP=2), variando entre 18 e 36 anos, com uma mediana de 21 anos. No género masculino a idade variava entre 19 e 35 anos com M=21,8 (DP=2,6) e mediana de 21 anos e no género feminino a idade variava entre 18 e 36 anos com M=21,2 (DP=1,9) com mediana de 21 anos. Verificou-se ainda que 75% dos indivíduos inquiridos têm menos de 22 anos, 50% menos de 21 anos e 25% menos de 20 anos com um intervalo interquartis de 2 anos para o género feminino e 3 anos para o género masculino. 140

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VINCULAÇÃO IEI 60 40 20 0

ASD

QLE

Gráfico 1 – Variabilidade dimensional da vinculação na relação com a mãe Legenda – Fatores de vinculação ra relação com a Mãe: IEI: Inibição da exploração e individualidade; QLE: Qualidade do laço emocional; ASD: Ansiedade de separação e dependência

70 60 50 Seguro 40

Preocupado

30

Desinvestido

20

Amedrontado

10 0 IEI

QLE

ASD

Gráfico 2 – Padrões de vinculação na relação com a mãe

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IEI 60 40 20 0

ASD

QLE

Gráfico 3 – Variabilidade dimensional da vinculação na relação com o pai Legenda – Fatores de vinculação ra relação com o Pai: IEI: Inibição da exploração e individualidade; QLE: Qualidade do laço emocional; ASD: Ansiedade de separação e dependência

70 60 50 Seguro

40

Preocupado 30

Desinvestido

20

Amedrontado

10 0 IEI

QLE

ASD

Gráfico 4 – Padrões de vincul vinculação ação na relação com o pai

142

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Ambivalência

Confiança 70 60 50 40 30 20 10 0

Dependência

Evitamento

Gráfico 5 – Variabilidade dimensional da vinculação ao par amoroso 80 70 60 50

Seguro

40

Preocupado Desinvestido

30

Amedrontado 20 10 0 Confiança

Dependência Evitamento Ambivalência

Gráfico 6 – Padrões de vinculação ao par amoroso

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TEMPERAMENTO AFETIVO

4,5% 4,0%

4,2%

3,7%

3,5% 3,3%

3,0% 2,5%

2,5%

2,0%

1,8%

1,5% 1,0% 0,5% 0,0% Depressivo

Ciclotímico

Hipertímico

Irritável

Ansioso

Gráfico 7 – Percentagem de indivíduos com pontuações médias dos temperamentos acima de 2 desvios-padrão (>2Z) por género

11.4. DISCUSSÃO DE RESULTADOS •

Sugere-se que as raparigas investem mais a relação com as mães que com os pais, embora mais dependentes das mães; também em comparação com os rapazes. Parece existir evidência de que a qualidade do laço emocional nas raparigas é mais robusta relativamente a ambos os elementos parentais, e por consequência os níveis de ansiedade de separação e dependência encontrados foram também mais elevados;

As raparigas revelaram maiores níveis de confiança e ambivalência nas relações amorosas que os rapazes e estes, um maior grau de evitamento e dependência. Estes resultados exigem um robusto corpo teórico que

144

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indica que as perceções das relações românticas na adolescência são diferenciadas por género e, que esta diferenciação é mais positiva e investida por parte das raparigas; •

Dos vários resultados ressaltam os que indicam que o temperamento depressivo tem características ansiosas e o temperamento ansioso características depressivas e características ciclotímicas mas que cada um mantém

a

sua

individualidade,

não

fosse

o

temperamento

uma

característica individual, mas não mutuamente exclusiva. Podemos justificar diferenças significativas entre temperamentos com claros pontos de contacto do ponto de vista psicopatológico; •

Existirão características temperamentais mais atribuíveis a um género que a outro. Os temperamentos ciclotímico, depressivo e ansioso serão mais característicos do género feminino e os temperamentos irritável e hipertímico do género masculino, o que tem sido corroborado por outros estudos.

Evidenciamos a relação com significado estatístico entre o temperamento ciclotímico e o temperamento irritável (temperamentos instáveis) e todos os fatores da vinculação ao par amoroso com realce para a relação negativa entre o temperamento ciclotímico e o fator confiança mostrando uma relação de sentido inverso. Tais resultados, entre outros, sugerem uma

desvalorização

do

fator

confiança

para

os

indivíduos

com

temperamento ciclotímico, o mesmo acontecendo com o mesmo fator e os restantes temperamentos. •

Relativamente aos padrões de vinculação amorosa foram encontradas associações

estatisticamente

significativas

entre

o

temperamento

depressivo e hipertímico (estáveis) e ansioso (instável) e o padrão amedrontado e entre este padrão e o temperamento irritável (instável).

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145


11.5. CONCLUSÕES •

Associações significativas entre os temperamentos instáveis e o padrão desinvestido quando estudamos a vinculação parental (pai e mãe) sugerindo que indivíduos com autorrepresentação positiva e modelos negativos dos outros têm como dominantes temperamentos instáveis.

Na vinculação na relação com a mãe, o temperamento depressivo (estável) e os temperamentos instáveis (ciclotímico, irritável e ansioso) revelaram-se dominantes entre o padrão desinvestido e o hipertímico (estável) entre os preocupados.

Na vinculação na relação com o pai, o temperamento depressivo (estável) e os temperamentos instáveis (ciclotímico, irritável e ansioso) revelaram-se dominantes entre o padrão desinvestido e o hipertímico (estável) entre os seguros.

No que se refere à vinculação amorosa os resultados evidenciaram associações significativas quer entre temperamentos estáveis ou instáveis e o padrão preocupado sugerindo uma associação pouco clara entre temperamentos (do ponto de vista da sua estabilidade) e os indivíduos com padrão preocupado

O temperamento influencia os tipos de experiências em que nos envolvemos e como reagimos instintivamente a elas. Assim, é claro que o temperamento e o caráter se influenciam e interagem e nem sempre é fácil diferenciar o que provém do caráter e o que provém do temperamento;

A relação entre tipos de temperamento excessivo e padrões de vinculação revelou-se uma questão de investigação que pode clarificar determinados comportamentos observáveis, percursos e escolhas afetivas;

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12. ESTRATÉGIAS COMUNICATIVAS UTILIZADAS PELOS ENFERMEIROS DE CUIDADOS INTENSIVOS Liliana Oliveira*; Neide Feijó** *Enfermeira CASTIIS, lilianapoliveira@hotmail.com **Enfermeira, Professora Doutora, ESS J Piaget/VNG, nfeijo@gaia.ipiaget.org

RESUMO Os estudos sobre “Comunicação Terapêutica” têm sido valorizados na Enfermagem e deram importante contribuição à profissão. Cientes das necessidades especiais em comunicação que apresentam os pacientes das unidades de cuidados intensivos (UCIs), propomos estudar estas temáticas conjugadas: comunicação do enfermeiro em UCIs. O principal objetivo foi conhecer as diferentes estratégias comunicativas utilizadas pelos enfermeiros destas unidades e, secundariamente, identificar os principais fatores que interferem neste fenómeno. É um estudo descritivo, de cunho qualitativo; para a recolha dos dados recorreuse à entrevista semiestruturada junto a enfermeiros de UCIs. Para a análise dos dados e a construção das categorias temáticas foi utilizado o método de análise de conteúdo. Os enfermeiros consideram que o doente crítico possui necessidades especiais de comunicação pelas alterações emocionais que apresentam, ressaltando estados de stress e altos níveis de ansiedade. As formas especiais de comunicação mais utilizadas foram o toque, atenção ativa, demonstração de interesse, saber ouvir, o uso do humor, técnicas de validação, especialmente quando o paciente está impedido de utilizar a comunicação verbal. Os enfermeiros entrevistados mencionaram questões da organização institucional e 150

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da assistência como fatores que interferem nesta prática. Reconhecem necessidades comunicacionais junto dos familiares, mas relatam estabelecer uma comunicação do tipo informativa.

Palavras-chave: comunicação terapêutica; enfermagem de cuidados intensivos Keywords: therapeutic communication; intensive care unit

12.1. INTRODUÇÃO O estudo da comunicação abrange o conhecimento sobre os comportamentos, incluindo todas as atitudes perceptíveis, sejam elas verbais ou não.

Na perspectiva de PHANEUF (2005, p. 23): “A Comunicação é um processo de criação e de recriação de informação, de troca, de partilha e de colocar em comum sentimentos e emoções entre pessoas. A Comunicação transmite-se de maneira consciente ou inconsciente pelo comportamento verbal e não-verbal, e de modo mais global, pela maneira de agir dos intervenientes. Por seu intermédio, chegamos mutuamente a aprender e a compreender as intenções, as opiniões, os sentimentos e as emoções sentidas pela outra pessoa e, segundo o caso, a criar laços significativos com ela.” A comunicação com o utente é um instrumento terapêutico importante, pois facilita o princípio da autonomia, do consentimento informado e a confiança mútua entre enfermeiro e utente. Relativamente às habilidades do enfermeiro em relação à comunicação consideram-se essenciais: saber escutar, falar quando necessário, dar abertura para a realização de perguntas, ser honesto, mostrar respeito, dispensar tempo suficiente para a conversa e mostrar interesse pelo utente. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Numa UCI, comunicar com o utente em estado crítico não é nada fácil, uma vez que a capacidade de comunicação dos utentes está bastante limitada, seja pelo uso de próteses ventilatórias, pela ação de drogas ou por serem portadores de patologias que impedem a comunicação oral. Também os equipamentos, o grande número de profissionais a trabalhar na unidade, os ruídos, as emergências, a agitação e o não entendimento sobre o estado de saúde dos demais, fazem com que o utente venha a ter sentimentos de medo, insegurança e isolamento, prejudicando o seu bem-estar. Sendo assim, é indispensável que os enfermeiros alcancem estratégias comunicativas, para que esses utentes possam expressar as suas necessidades e estabelecer uma comunicação efetiva. Muitas vezes, durante o contato verbal ou mesmo quando este se torna difícil ou até impossível, o toque pode ser a atitude comunicativa mais terapêutica. Além disso, o tato constitui, juntamente com a audição, um dos últimos sentidos a perder antes da morte, pelo que é indicado até aos últimos momentos se quisermos que o doente não morra sozinho. Assim, seja por meio de palavras faladas e escritas, seja por meio de gestos, expressões faciais e corporais, o trabalho na área da saúde exige do profissional o conhecimento desse processo chamado comunicação interpessoal e de seus fundamentos básicos. A comunicação não-verbal adquire maior importância para os utentes graves, na interação com os profissionais que lhes assistam e a percepção das suas necessidades deve ser uma aptidão mantida em contínuo aperfeiçoamento. Entenda-se a percepção como o ato de conhecer por meio dos sentidos, estando estruturada pelo nosso próprio condicionamento social e expectativas pessoais. Assim, “é preciso que o Enfermeiro esteja consciente dos elementos sociais e pessoais que orientam a forma de se comunicar com o mundo.” (FERREIRA, KNAPP, HAAL citado por SILVA, SOUSA, TAVARES, 2007, p.58).

152

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Parafraseando RECOR E TRINTA citado por SILVA, SOUSA, TAVARES (2007, p. 58): “o corpo tem capacidade de afirmar, enfatizar, complementar e, muitas vezes, contradizer o que comunicamos verbalmente. Mesmo não sendo intencional, o nosso corpo demonstra o que somos

e

o

que

pensamos.

Dessa

forma,

os

utentes

impossibilitados de falar apresentam infinitas possibilidades de comunicação, ao utilizarem, nesse processo, o seu próprio corpo.”

12.2. METODOLOGIA Recorreu-se ao estudo de natureza qualitativa, uma vez que esta salienta os aspectos dinâmicos, holísticos e individuais da experiência humana. Isto só é possível utilizando um paradigma que considere os indivíduos no próprio contexto em que realizam as suas vidas, o ponto de vista do sujeito investigado, a sua interpretação das condições que influenciam as suas condutas, e os resultados tal como eles mesmos os percebem. Os dados recolhidos são ricos em pormenores descritivos, em forma de palavras ou imagens e não de números (BOGDAN e BIKLEN, 1991). Sendo importante conhecer componentes subjectivos das vivências relativas à comunicação, o estudo qualitativo torna-se o método mais apropriado para ajudar a obter conhecimentos profundos e detalhados das experiências, na perspectiva

dos

participantes

na

situação,

neste

caso,

as

estratégias

comunicativas dos enfermeiros em UCIs. Num estudo de cunho qualitativo, em que não se pretende generalizar os resultados, não se trata de definir exactamente uma amostra, e sim os elementos E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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que serão sujeitos do estudo. Os sujeitos entrevistados foram quatro enfermeiros que trabalham em duas UCIs de instituições distintas do distrito do Porto. Este número mostrou-se suficiente para as informações necessárias ao objectivo pretendido, isto é, obteve-se a saturação dos dados. Dos enfermeiros entrevistados, dois eram do sexo feminino e dois do sexo masculino. As idades encontravam-se na faixa dos 26 aos 36 anos. Metade dos inquiridos eram casados e os restantes solteiros. Todos se afirmaram de religião católica. Dois deles tinham mestrado (em doente crítico), os outros dois eram licenciados, sendo um aluno de mestrado. O tempo de serviço variou entre cinco e dezasseis anos, e o tempo de serviço na área de UCIs, entre três e dezasseis anos. Para garantir a recolha desejada, foi necessário utilizar um gravador áudio, o que possibilitou a transcrição precisa e a leitura minuciosa.

Os dados foram gravados, transcritos, lidos com atenção e trabalhados com base no método de análise de conteúdo adaptado de Bardin (2004), com a identificação de categorias que serão apresentadas no próximo tópico.

12.3. ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS DADOS As necessidades especiais de comunicação dos utentes em UCI Dos relatos dos enfermeiros que participaram na pesquisa, pôde-se constatar que eles definem o doente crítico como um doente com necessidades especiais de comunicação e apresentam as razões pelas quais o doente crítico tem tais necessidades. Numa das entrevistas fica evidente esta afirmação: “ (…) perfeitamente bem definido, com ansiedade, com níveis de ansiedade elevados, 154

portanto,

têm

uma

personalidade muito

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


específica,

a

comunicação

é

importante,

é

essencial.

(…)

comunicação verbal tá comprometida, e mesmo outro tipo de comunicação é difícil porque os doentes estão sedados.” (E1) Outro exemplo refere que a comunicação é especial devido ao ambiente adverso em que se encontram: “No meio adverso onde se encontram, muitas vezes é uma palavra ou expressão facial do prestador de cuidados, neste caso o Enfermeiro, que torna o ambiente mais familiar e assim possibilita uma melhor adaptação da pessoa ao seu estado.” (E2) As necessidades especiais de comunicação em UCI são verificadas por outros autores, como STOVSKY e DRAGONETTE, citado por RILEY (2007), que além de reconhecerem este fato, referem que a comunicação pode ser planeada através de veículos especiais como cartões com letras e desenhos para transmitir a mensagem desejada e, ainda reforçam, a importância de se juntar a esta, outras formas espontâneas de comunicação, como os gestos e a postura.

As alterações emocionais dos utentes em UCI Com relação às alterações emocionais, os entrevistados ressaltam estados de stress e altos níveis de ansiedade nos utentes destas unidades, como é possível exemplificar com as seguintes comunicações: “Muitas vezes eles estão cá, estão conscientes, sentados no cadeirão, portanto, a comunicação é essencial e é fundamental para a gente tentar diminuir ao nível mínimo possível, essa carga de stress, esses níveis de ansiedade.” (E1) Alguns fatores predispõem às alterações emocionais: os equipamentos, o grande número de profissionais a trabalhar numa UCI, os ruídos, as emergências, a E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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agitação e o não entendimento sobre o estado de saúde dos demais utentes da unidade que os rodeiam. Estes factores fazem com que o utente venha a ter sentimentos de medo, insegurança e isolamento, prejudicando o seu bem-estar. Os enfermeiros reconhecem nestes utentes medo e confusão, como demonstra a transcrição a seguir: “(…) os doentes acabam por desorientar porque estão num ambiente muito diferente do habitual. E é assim, falo de desorientação, quero logo dizer confusão, medo, tudo junto.” (E4) A transição da saúde para a doença, e de casa para um local estranho, como uma UCI, leva as pessoas a apresentarem mudanças consideráveis nas suas emoções, que se manifestam no seu comportamento. Entende-se que as reacções ao sofrimento variam de indivíduo para indivíduo, e estão exacerbadas naqueles que não conseguem comunicar claramente a natureza e o significado do seu problema ou da sua necessidade.

As Técnicas de Comunicação como estratégias Nos depoimentos pôde-se notar que, para os enfermeiros, existe a necessidade de utilizarem formas especiais de comunicação. As técnicas de comunicação

terapêutica

identificadas

foram,

o

toque,

atenção

ativa,

demonstração de interesse, saber ouvir, o uso do humor, entre outras, como nos exemplos a seguir: “(…) e a gente já consegue ler nos lábios e perceber. Através do toque, através muitas vezes pelos gestos (…). Direciono o olhar aos olhos do utente sempre, que é para ele perceber que nós estamos coma atenção.” (E1)

156

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“ (…) tenho tendência a olhar nos olhos a comunicar, mas na maioria das vezes, oiço mais do que o que falo, pois também é necessário dar espaço ao doente para este expor as suas dúvidas.” (E2) Relativamente à utilização das técnicas de comunicação terapêutica mereceu dos enfermeiros uma especial reflexão, nomeadamente, no que diz respeito a identificar os momentos em que deve estimular a comunicação ou respeitar o desejo de silêncio do utente; como se verifica na seguinte transcrição: “A relação de ajuda é exactamente a mesma coisa: não podes estar a impingir nada a ninguém. Não quer, não quer. Quer estar sossegado, sossegadinho ali para não ter dores, a gente deixa-o estar sossegado. Alguns doente gostam de falar mais, a gente aí já tem outra interatividade. É como qualquer opção terapêutica, se o doente não quer a gente respeita.” (E1) Este relato levanta uma questão importante e possível de ser um conflito para os enfermeiros que exercem as funções junto de utentes com algum limite na comunicação verbal, qual seja, a dificuldade de estabelecer o limite entre o respeito pelo desejo de silêncio do utente e a responsabilidade em estimular a comunicação e a expressão de sentimentos. Neste caso, os próprios enfermeiros entrevistados valorizaram a experiência profissional, como forma de se tornarem mais conhecedores do processo comunicacional enfermeiro-utente. Vários autores assinalam que o “instrumento” mais terapêutico numa interacção com o utente é o próprio profissional. Esse processo requer o uso consciente de técnicas comunicativas durante as interacções. Neste sentido, Lazure (1994) valoriza algumas capacidades que os enfermeiros devem desenvolver no âmbito da comunicação terapêutica, destacando: a clarificação, o respeito por si próprio e pelo doente; a congruência, a empatia e o confronto. Necessidade de validação da comunicação E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

157


A transcrição a seguir ilustra a necessidade sentida pelos enfermeiros em validar a comunicação interpessoal, especialmente quando o paciente está impedido de utilizar a comunicação verbal. “Da minha parte continua a ser a comunicação verbal, agora tento é arranjar estratégias com o doente para ele conseguir expressar-se (…) a estratégia para perceber se o doente compreendeu é o feedback que ele dá (…) avaliar a forma como ele se comporta, para ver se de facto percebeu a mensagem ou não.” (E3) No contexto estudado, a atenção dos enfermeiros está centrada na comunicação não-verbal do paciente, como forma preferencial de comunicação e validação da comunicação enfermeiro-utente. Inúmeras transcrições apontam a comunicação não-verbal como meio de comunicar e validar a comunicação. Mais ainda, quando analisamos com maior profundidade as expressões dos enfermeiros, apreende-se uma preocupação em desenvolver a capacidade de compreender o paciente através das suas expressões faciais e pequenos gestos. “(…) pelo comportamento do doente e pelas atitudes (…) é quase como um sexto sentido, conseguimos perceber até que ponto estamos a ser entendidos e estamos a entender o doente, e ele tem percepção que isto está a funcionar.” (E3) “(…) pelo feedback

que

o doente

nos

(…)

certas

características, que são as técnicas de comunicação, que tu acabas por saber se o doente percebeu ou não: expressões, olhares, acabas por entender.” (E4) As questões apontadas com relação à comunicação não-verbal demonstraram ser as mais complexas. Neste ponto, é possível destacar das preocupações emitidas pelos entrevistados: a dificuldade na compreensão da comunicação 158

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não-verbal emitida pelo paciente e a importância da experiência profissional para o desenvolvimento desta competência comunicacional. As transcrições a seguir são exemplos desta afirmação: “ (…) não conseguimos perceber aquilo que o doente quer dizer, essencialmente, quando a comunicação não é verbal (…). Nem sempre é fácil. Regra geral, conseguimos ou consigo, porque quase sempre são coisas standard: o que incomoda, ou saber, ou que tem uma algália e quer urinar, ou tem um tubo a incomodar, ou muitas vezes, que horas são, ou onde está a família, esse tipo de coisas; é fácil e com o passar do tempo, quanto mais é a experiência, mais fácil se torna.” (E3) LAZURE (1994) apresenta algumas sugestões para que a comunicação possa ser eficaz, o que vai ao encontro das informações transmitidas pelos enfermeiros inquiridos. Em síntese, são elas: demonstrar interesse, preocupar-se com a congruência da comunicação não-verbal, promover a escuta activa e validar a comunicação através da reformulação junto do utente. A organização institucional como factor de interferência na comunicação

Os enfermeiros entrevistados mencionaram questões da organização institucional e da assistência como fatores possíveis de interferir na prática da comunicação

interpessoal

enfermeiro-paciente

e,

especialmente

com

os

familiares. Embora, tenham sido identificadas diferenças entre as organizações das diferentes instituições, algumas características organizacionais foram citadas pelos enfermeiros entrevistados, como por exemplo o horário para visitas: “(…) é muito complicado só ter uma hora de visita por dia. O Enfermeiro tem sempre tempo para tudo. Tem que ter. Se não tiver que o arranje, que faça fora das horas.” (E4)

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SILVA, SOUSA e TAVARES (2007) apontaram fatores que interferem com a comunicação, alguns deles relacionam-se com as questões organizacionais das instituições e do trabalho, são eles: o ritmo acelerado das tarefas, ausência de um local reservado para o diálogo, entre outros. Através das informações das entrevistas não ficam evidentes quais os factores que são favorecedores da comunicação, mas são indicados alguns como aqueles que interfere, especialmente: número de enfermeiros e horário das visitas. Esta questão do horário das visitas remete para uma outra temática, a comunicação com os familiares.

A comunicação com os familiares As informações obtidas nas entrevistas apontam para uma intenção de disponibilidade e flexibilidade diante da necessidade de informação dos familiares. No entanto, é possível observar uma condicionante relativamente ao tipo de informação. “Se a informação que o doente ou familiar pretende é da minha competência mostro-me disponível para ouvir e esclarecer as dúvidas.” (E2) A transcrição acima é ilustrativa sobre a necessidade sentida pelos enfermeiros em definir o tipo de informação que compete a cada profissional da equipa. Os entrevistados expressem disponibilidade e flexibilidade para com os familiares, porém a comunicação que relatam estabelecer é maioritariamente do tipo informativa. A família pode contribuir muito para a recuperação do utente, mas para que isso aconteça, ela precisa de ser orientada sobre as rotinas da UCI, e sobre o que 160

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está acontecer com o seu familiar, necessitando sentir-se respeitada e, também, cuidada. Por isso, é importante permitir a sua presença, assegurar- lhe de que ali há ajuda para enfrentar esse momento difícil.

12.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados obtidos sobre as estratégias de comunicação utilizados pelos enfermeiros que prestam cuidados em UCI vêm reforçar a importância do tema escolhido para o estudo e vão ao encontro da literatura, que valoriza a comunicação terapêutica como técnica e estratégia para o exercício da enfermagem e ressaltou a necessidade especial de comunicação nos serviços de cuidados intensivos O desenvolvimento do trabalho permitiu descrever as técnicas de comunicação utilizadas pelos enfermeiros nas unidades de cuidados intensivos, merecendo destaque a comunicação não-verbal e o toque. Apontando para que esta temática seja mantida e aprofundada na formação e prática dos enfermeiros, atentando para as especificidades de certas áreas que requerem igualmente um desempenho diferenciado do enfermeiro e a aquisição de competências através da experiência profissional.

BIBLIOGRAFIA Bogdan, B. Biklen, S. (1991). Investigação qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora. Bardin, L. (1991). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70. Lazure, H. (1994). Viver a relação de ajuda. Lisboa: Lusodidacta. Phaneuf, M. (1995). Relação de Ajuda - Elemento de Competência da Enfermeira. Coimbra: Edição Cuidar. Riley, J. (2004). Comunicação em Enfermagem. 4ª ed. Loures: Lusociênica. Silva, R., Souza, J., Tavares, J. (2007) Comunicação Enfermeira e Paciente na Unidade de Tratamento Intensivo. Revista Baiana de Enfermagem, Salvador, n.1, p.55-63, vol.21, n.1 Jan/Abr. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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13. ESTIGMA FACE AO DOENTE MENTAL - LOUCO?! MAS POUCO… Ana Margarida Moreira Barbosa*; Cátia Sofia da Silva Monteiro**; Joana Raquel Fernandes Regufe***; Marta Moreira e Sá**** *Enfermeira.

E-mail:

anabarbosa10@hotmail.com;

**Enfermeira.

E-mail:

catiamonteiro27@hotmail.com;

***Enfermeira.

E-mail:

joanaregufe@gmail.com; ****Enfermeira. E-mail: marta.moreira.sa@gmail.com

RESUMO

O estigma face à pessoa com perturbação mental é uma realidade na população em geral, e nos profissionais de saúde em particular, conduzindo a consequências para o doente como o sofrimento, o isolamento social e a dificuldade no acesso aos cuidados de saúde. Sendo este estigma uma clara necessidade de intervenção no âmbito da Saúde Mental, surge o planeamento do projeto Estigma face ao doente mental - Louco?! Mas Pouco…. Planeou-se a intervenção

através

de

quatro

sessões

com

recurso

a

métodos

fundamentalmente ativos, bem como a estratégias que promovam a reflexão e a consciencialização. A avaliação do projeto será realizada ao longo de todas as sessões, constituindo a avaliação de processo, sendo a avaliação de resultado concretizada na quarta sessão. A futura implementação deste projeto torna-se fulcral, pois pode contribuir, em última análise, para a melhoria da qualidade dos cuidados prestados pelos futuros profissionais de saúde.

Palavras-chave: Estigma; Perturbação Mental; Futuros Profissionais de Saúde; Projeto de Intervenção.

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13.1. INTRODUÇÃO Moreira e Melo (2008, p.307) definem estigma como sendo uma diferença indesejada, um atributo pejorativo que implica a intolerância do grupo. De acordo com a CIPE versão 2.0, trata-se de uma Crença Comprometida: Prática de associação de desonra ou vergonha com outros pela presença de um fator distintivo; frequentemente associada com doença mental, incapacidade física, religião ou história de comportamento criminoso (ICN, 2011, p.53). No mesmo sentido Ferreira (2005), refere que a estigmatização é a associação inapropriada e errónea da perturbação mental a algo vergonhoso. As atitudes discriminatórias resultantes da estigmatização levam ao sofrimento do utente (Ferreira et al., 2008). O estigma face à doença mental traz ainda outras consequências para a pessoa, nomeadamente ao nível da qualidade de vida e do processo de inserção social, provocando o isolamento do indivíduo e prejuízo das suas relações sociais (Ferreira, 2005). A relutância na procura de serviços de saúde por parte dos utentes, assim como os obstáculos criados para o acesso a recursos de saúde são também fruto da estigmatização. Foram definidas, na Conferência Ministerial Europeia da Organização Mundial de Saúde sobre a Saúde Mental, cinco prioridades que foram subscritas por Portugal. De entre essas prioridades constava lutar contra a estigmatização e a discriminação, bem como apoiar as pessoas com problemas de saúde mental e a sua família (Fazenda, s/d). Tendo em conta que os estigmas são socialmente construídos, não se pode atribuir aos profissionais o estatuto de culpados por essa lógica se reproduzir. No entanto, têm o compromisso ético-político dessa desconstrução, devendo lutar pela efetivação dos direitos da pessoa com doença mental e a desconstrução do estatuto de louco junto à sociedade (Dummer, 2010). Para que promovam a destigmatização da doença mental, os enfermeiros devem confrontar-se com os próprios preconceitos, atitudes discriminatórias e conhecimentos científicos (Ferreira et al., 2008). Torna-se fulcral que os E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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profissionais de saúde promovam a destigmatização da doença mental, bem como se encontrem devidamente preparados para prestar cuidados à pessoa com perturbação mental. Assim, o presente artigo tem como finalidade apresentar o planeamento do projeto Estigma face ao doente mental - Louco?! Mas pouco…, que surgiu no âmbito de uma unidade curricular inserida no Curso de Licenciatura em Enfermagem da Escola Superior de Enfermagem do Porto, no ano letivo 2011/2012. A construção do título do projeto baseou-se no olhar face à pessoa com perturbação mental. Incluiu-se o termo “louco” de forma a assumir a perturbação mental como uma realidade inalterável. Contudo, o “mas pouco…” reforça a ideia de que o doente não poderá deixar de ser encarado como uma pessoa, em todas as suas dimensões. Este projeto pretende abordar o estigma face à pessoa com perturbação mental por parte dos futuros profissionais de saúde, visando intervir junto destes ao longo da sua formação.

13.2. METODOLOGIA O planeamento de um projeto implica a análise do contexto e problemas, recursos existentes e prioridades, constituindo, assim, uma etapa crucial para o desenrolar do mesmo (Menezes, 2007). Como tal, são apresentadas de seguida todas as etapas que constituem o mesmo.

13.2.1. POPULAÇÃO Barbosa (2010) no seu estudo denominado “Estigma Face à Doença Mental por Parte da Futuros Profissionais de Saúde Mental” analisou o estigma pelos estudantes das instituições de ensino superior da área da saúde da Universidade e Instituto Politécnico do Porto. Nesta investigação concluiu a existência de estigmatização e, consequentemente, reconheceu a necessidade de intervir junto 164

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destes, durante a sua formação, de forma a torná-los capazes de lidar com a pessoa com perturbação mental. A população-alvo do presente projeto surge com base no estudo supracitado, que contemplou um total de 643 alunos que frequentam cursos da área da saúde - Enfermagem, Medicina, Psicologia, Serviço Social e Terapia Ocupacional - de idades compreendidas entre os 17 e os 51 anos. Tomamos, assim, esta população como alvo partindo-se para a identificação das suas necessidades neste âmbito.

13.2.2. IDENTIFICAÇÃO DAS NECESSIDADES As necessidades da população do projeto são identificadas a partir dos dados recolhidos no estudo de Barbosa (2010). Estes foram obtidos a partir da aplicação de um questionário sociodemográfico e da versão portuguesa do Attribution Questionnaire – AQ 27 (Corrigan et al., 2003), traduzida e elaborada por Sousa e colaboradores (2008, citado por Barbosa, 2010). Este último trata-se de um questionário de autopreenchimento, que avalia o estigma através dos seguintes fatores: responsabilidade, pena, irritação, perigosidade, medo, ajuda, coação,

segregação

e

evitamento.

Os

dados

recolhidos

através

deste

instrumento permitiram concluir que as atitudes dos futuros profissionais de saúde relativamente à doença mental sofrem variações entre os diversos cursos, entre os anos do curso - estudantes do primeiro e do último ano – e em função da familiaridade com a doença mental. Quanto à variação entre os anos do curso, a estigmatização apresenta níveis inferiores no último ano, pressupondo que a experiência e a informação recebidas durante a formação académica influenciam positivamente as perceções acerca da doença mental, diminuindo a atitude estigmatizante perante o doente mental. De acordo com as conclusões de diversos autores, a participação em programas ou sessões informativas sobre a doença mental é um fator promotor da diminuição do estigma. É, então, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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concluído que há necessidade de se reforçar ao longo dos cursos a capacidade da não estigmatização e favorecer o contacto com pessoas com doença mental. Perante as conclusões supramencionadas, e em continuidade com o subcapítulo anterior, considera-se que os estudantes da área de saúde do primeiro ano são os que necessitam de uma maior intervenção nesta área. De acordo com Avanci e colaboradores (2002, citado por Barbosa, 2010, p. 53), os estudantes da área da saúde, ao ingressarem num curso superior, manifestam estereótipos e preconceitos que prevalecem na sociedade num dado momento e que podem influenciar a forma como futuramente interagem com os doentes. Face à análise dos dados e das necessidades da população-alvo é identificado o seguinte diagnóstico de enfermagem: Estigma [face à pessoa com perturbação mental].

13.2.3. OBJETIVOS Perante as necessidades identificadas, o objetivo geral traçado para o projeto é diminuir o estigma dos futuros profissionais de saúde em relação à pessoa com perturbação mental. Este projeto aporta, ainda, os seguintes objetivos específicos: •

Sensibilizar os futuros profissionais de saúde para a problemática do estigma face à pessoa com perturbação mental;

Facilitar a expressão de sentimentos e emoções face à pessoa com perturbação mental;

Conhecer os conceitos de saúde e de perturbação mental;

Identificar crenças erróneas e mitos relacionados com a perturbação mental;

• 166

Confrontar algumas crenças erróneas e mitos com a realidade;

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Refletir sobre as implicações da presença do estigma para a pessoa com perturbação mental;

Facilitar o contacto e interação dos futuros profissionais de saúde com pessoas com perturbação mental;

Refletir acerca das mudanças que este projeto incitou no estigma dos futuros profissionais de saúde.

De forma a atingir estes objetivos é essencial elaborar um planeamento cuidado das intervenções que serão implementadas, bem como das estratégias a utilizar no decurso das mesmas.

13.2.4. PROCEDIMENTOS E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO O planeamento das atividades de intervenção caracteriza-se pela preparação da execução do projeto. Aqui torna-se imperativo selecionar as estratégias, conteúdos e métodos a utilizar, de forma a atingir os objetivos propostos (Menezes, 2007). Por se considerar ser o mais adequado, selecionou-se o modelo do Empowerment, de forma a orientar a equipa de intervenção ao longo deste processo. Este modelo visa a tomada de decisões de forma voluntária e consciente. O Empowerment evidencia uma clarificação de valores e crenças, que requer o uso da discussão em grupo e reflexão pessoal, complementada, quando necessária, com o fornecimento de informações cruciais para uma tomada de decisão autónoma (Carvalho & Carvalho, 2006). Desta forma, pretende-se que os estudantes de saúde se consciencializem acerca da problemática e implicações do estigma em relação à perturbação mental, promovendo reflexão, tomada de decisão e, consequente, mudança de atitudes e comportamentos.

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Segundo Corrigan e Wassel (2008), as estratégias que têm sido utilizadas para a diminuição do estigma em relação à doença mental são o protesto, a educação e a interação com o doente mental, sendo que estas duas últimas são as que têm apresentado resultados mais significativos. Na estratégia educacional são fornecidas informações acerca do tema, clarificando crenças erróneas e confrontando mitos existentes em relação à doença mental com factos. Através das informações transmitidas, a população reflete acerca desta problemática, o que permite desconstruir o estigma e promover a mudança de atitudes e comportamentos. O contacto e interação com pessoas que apresentam doença mental têm-se revelado como uma estratégia fulcral para a redução do estigma (Corrigan et al., 2008). De facto, segundo Holmes (1999), bem como Corrigan e colaboradores (2001), quanto maior é o grau de contacto com as pessoas com doença mental, menor é o padrão de estereótipos e atitudes negativas (citado por Barbosa, 2010). Posto isto, a intervenção será implementada ao longo de quatro sessões, para as quais foi selecionado um conjunto de atividades e dinâmicas, tendo em consideração, tanto a população alvo, como as diferentes estratégias que, segundo a bibliografia analisada, são eficazes na redução do estigma. As sessões decorrerão durante um mês, cada uma delas com uma semana de intervalo, nas instituições de ensino da Universidade e Instituto Politécnico do Porto. No início de cada sessão, será utlizada uma atividade de quebra-gelo, de forma a criar um ambiente descontraído, propício para a interação e a dinâmica em grupo. Durante o desenvolvimento das sessões recorrer-se-á a métodos expositivos, mas fundamentalmente ativos, dadas as características inerentes ao modelo do Empowerment. Para tornar a intervenção mais apelativa e interativa serão utilizados vídeos, músicas e dinâmicas de grupo, recorrendo a debates e partilha de opiniões/ideias.

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• “Para que é que isto me interessa?!”: a primeira sessão visa sensibilizar os futuros profissionais de saúde para a problemática do estigma face à pessoa com perturbação mental, bem como facilitar a expressão de sentimentos em relação a estas pessoas. Para isto, exibir-se-á um videoclip, com intuito dos estudantes refletirem sobre os preconceitos e estereótipos face à diferença. Além disto, programaram-se duas dinâmicas de grupo que consistem numa partilha de ideias sobre o conceito de “doente mental”, bem como na reflexão do estigma face à pessoa com perturbação mental, com recurso ao humor.

• “Desvenda os teus olhos, abre os teus horizontes!”: a segunda sessão pretende que a população-alvo conheça os conceitos de saúde e de perturbação mental, identifique crenças erróneas e mitos relacionados com a perturbação mental e que os confronte com a realidade. Para tal, realizar-se-á uma dinâmica de grupo que se centra na reflexão sobre as diferenças visualizadas e apontadas intuitivamente, entre diferentes fotografias, que incluem pessoas com e sem perturbação mental. A esta sessão será, ainda, acrescentada a exibição de um vídeo com cariz sensibilizador que sistematiza alguns dos conceitos relacionados com a saúde mental e o estigma face a estes doentes.

• “Todos diferentes, mas todos iguais!”: a terceira sessão permite o contacto e a interação dos estudantes com pessoas com perturbação mental. Assim, será exibido um vídeo que alerta e sensibiliza para as implicações que o estigma acarreta. Para esta sessão convidar-se-ão três pessoas com doença mental que irão transmitir ao público-alvo algumas das suas vivências e perspetivas. Assim definiram-se alguns critérios para a seleção dos convidados: a pessoa deve encontrar-se numa fase estabilizada da doença; ter uma boa capacidade comunicativa; interagir, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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facilmente, com jovens, bem como sentir-se capaz de falar da sua doença, nomeadamente, no que respeita ao processo do adoecer, vivência da doença, adaptação à mesma, emoções e sentimentos ao longo desse processo. De forma a proporcionar diversidade de testemunhos, decidiuse que os três convidados devem ter patologias diferentes, mas emblemáticas, preferencialmente, um deve apresentar depressão, outro doença bipolar e o último esquizofrenia.

• “Para que é que isto serviu?!”: na última sessão é esperado que os estudantes reflitam acerca das mudanças que este projeto incitou nos mesmos, através de uma dinâmica de grupo “Eu achava que… Eu acho que…”. Aqui pretende-se que os participantes refiram o que mudou nas suas opiniões, comentando as diferenças apresentadas entre o início e o final da participação no projeto.

13.3. PLANEAMENTO DA AVALIAÇÃO O planeamento da avaliação mostra-se fulcral num projeto de intervenção, na medida em que, só assim, é possível avaliar os resultados das intervenções (Menezes, 2007). A avaliação do projeto divide-se em avaliação de processo e de resultado. A primeira surge através da comunicação verbal e não-verbal dos participantes, aquando das sessões de intervenção. Assim, os parâmetros que serão avaliados ao nível da comunicação não-verbal passam pela presença nas sessões, a expressão facial e a postura dos estudantes. Ao nível da comunicação verbal, pretende-se avaliar a participação do grupo ao longo das sessões, a próatividade e a iniciativa na participação nas atividades e dinâmicas. No final de todas as sessões é expectável que a população-alvo apresente as suas ideias/opiniões face aos conteúdos abordados na sessão, avalie a sessão quanto à pertinência, métodos utilizados e conteúdos abordados - e reconheça a 170

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importância do projeto. Os dados colhidos continuamente são bastante importantes, na medida em que, permitem uma melhor adequação das estratégias usadas na intervenção, possibilitando que vá de encontro às expetativas da população-alvo e que os objetivos do projeto sejam atingidos. A avaliação de resultado é realizada na quarta sessão, e consiste na dinâmica de grupo “Eu achava que… Eu acho que…”. É esperado que os participantes exponham, partilhem e comparem as opiniões/crenças anteriores e posteriores à participação no projeto. Paralelamente poderão ser colocadas questões de forma a promover a reflexão sobre as dinâmicas que contribuíram para a mudança das conotações atribuídas ao doente mental e em especial, para a diminuição do estigma. Simultaneamente pretende-se auxiliar os estudantes a percecionarem a sua

capacidade

para

trabalhar

com

pessoas

com

perturbação mental,

percebendo-se assim qual o impacte do projeto nas suas vidas pessoais e profissionais.

13.4. CONCLUSÕES Com a realização deste planeamento de projeto e, em particular, com a análise desta temática foi possível perceber que existem muitas outras áreas com necessidade de intervenção de enfermagem no âmbito da Saúde Mental e Psiquiatria. Cabe aos profissionais de enfermagem estar alerta para as necessidades nesta área, quer das pessoas com perturbação mental, quer das pessoas que as rodeiam e com as quais se relacionam. Neste sentido, os projetos que tenham como objetivo a intervenção nesta área, revestem-se de um papel fundamental no impacto que poderão ter na qualidade de vida e bem-estar dos doentes. A eventual implementação deste projeto seria essencial, já que constituiria um contributo significativo para a melhoria da qualidade dos cuidados prestados pelos futuros profissionais de saúde, através da promoção da diminuição do estigma face ao doente mental. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Barbosa, T. (2010). Estigma Face à Doença Mental por Parte dos Futuros Profissionais de Saúde Mental. Porto: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Dissertação de Mestrado em Temas de Psicologia. Carvalho, A. & Carvalho, G. (2006). Educação para a Saúde: Conceitos, Práticas e Necessidades de Formação. Loures: Lusociência. Corrigan, P. & Wassel, A. (2008). Understanding and influencing the stigma of Mental IlIness. Journal of Psychosocial Nursing and Mental Services, 42-48. Dummer, C. (2010). Práticas Profissionais na Saúde Mental, Lógica Manicomial e Processos de Resistência: uma cartografia do CAPS Escola de Pelotas. Pelotas: Universidade Católica de Pelotas. Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em Política Social do Centro de Ciências Jurídicas, Económicas e Sociais. Fazenda, I. (s/d). Novos Desenvolvimentos em Saúde Mental e Comunitária. Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, 111 – 119. Ferreira, M. [et al.] (2008). Estigma: o inimigo invisível In SEQUEIRA, Carlos [et al.] – Saúde Mental e Equilíbrio Social. Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental. Ferreira, M. (2005). Um olhar sobre a (d)estigmatização do doente mental. Leiria: Instituto Politécnico de Leiria. Internacional Council of Nurses (ICN) (2011). Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem: Versão 2.0. Genebra. Menezes, I. (2007). Intervenção Comunitária: uma perspectiva psicológica. Porto: Livpsic. Moreira, V. & Melo, A. (2008). ‘Minha Doença é Invisível!’: Revisitando o Estigma de ser Doente Mental. Interação em Psicologia, 12 (2), 307 – 314. Sadock, B. & Sadock, V. (2007). Compêndio de Psiquiatria – Ciência do comportamento e Psiquiatria clínica. 9ª ed. Porto Alegre: Artmed. Tonwsend, M. [et al.] (2002). Enfermagem Psiquiátrica – Conceitos de Cuidados. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.

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14. GESTÃO DO REGIME TERAPÊUTICO DA PESSOA PORTADORA DE ESQUIZOFRENIA: UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA Fernanda Maria dos Santos Antunes Neto*; Maria de Fátima dos Santos Rosado Marques** **Escola Superior de Enfermagem São João de Deus – Universidade de Évora (Portugal)

Introdução No âmbito da realização do Mestrado em enfermagem Saúde Mental e Psiquiatria na Universidade de Évora, Escola Superior de Enfermagem S. João de Deus, foi desenvolvido e implementado um programa de intervenção terapêutica aos utentes portadores de esquizofrenia internados no Serviço de Psiquiatria do Hospital Garcia de Orta, EPE. O interesse por esta área surge no decorrer da nossa experiência profissional e através de uma análise empírica na qual verificámos que a esquizofrenia

representa

uma

das

principais

causas

de

internamento,

apresentando estes utentes dificuldade em gerir o seu regime terapêutico, o que favorece uma elevada percentagem de recaídas e reinternamentos, motivados essencialmente pelo abandono da terapêutica prescrita. Assim

sendo,

considerámos

premente

desenvolver

intervenções

terapêuticas de enfermagem que permitissem ao utente uma cooperação ativa no seu

processo

terapêutico,

de

forma

a

que

desenvolvesse

o

seu

autoconhecimento e compreendesse a sua situação de saúde, através da aquisição de conhecimentos e habilidades que lhe possibilitasse fazer opções e tomar decisões adequadas ao seu processo de cuidados. Assim, esta intervenção profissional tem como objetivo, desenvolver técnicas de intervenção terapêutica que contribuam para a optimização da gestão E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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do regime terapêutico do utente portador de esquizofrenia após a sua alta hospitalar. O programa foi realizado entre outubro de 2011 e janeiro de 2012, durante este intervalo de tempo foram internados no serviço nove utentes com o diagnóstico de esquizofrenia. Contudo, só foi possível trabalhar com três, uma vez que, dois recusaram participar alegando que não eram portadores de esquizofrenia e quatro mantiveram até ao final do internamento alterações da percepção e do pensamento, sendo estes critérios de exclusão. Para o desenvolvimento do programa, preconizámos um acompanhamento personalizado de acordo com as necessidades e/ou dificuldades de cada utente, através

da

realização

de

entrevistas

de

avaliação

diagnóstica,

de

ajuda/acompanhamento e entrevistas de informação e ensino. Estas últimas visam a realização de ações de formação no âmbito da educação e promoção para a saúde em grupo ou individualizadas, subdivididas em dois módulos, o módulo I – “Estilos de vida saudáveis” e o módulo II – “Aprender para melhor viver”. Os focos de atenção trabalhados com estes utentes e os respetivos diagnósticos incidiram sobre a “aceitação do estado de saúde” e a “gestão do regime terapêutico”. A avaliação foi realizada com indicadores de avaliação prédefinidos através da aplicação de um follow-up um mês após a alta hospitalar. Os utentes com quem trabalhámos apresentavam idades compreendidas entre os 23 e 42 anos, solteiros, sem atividade profissional, com dificuldade em gerir

o

regime

terapêutico,

recorrendo

à

urgência

com

o

motivo

de

incumprimento do regime medicamentoso, apresentavam um nível de insigt pobre,

contudo

manifestaram

a

necessidade

de

tomar

a

medicação,

considerando-a importante para a sua doença e para o controlo da sua sintomatologia.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Conclusões Após a implementação e desenvolvimento do programa, concluímos que este permitiu que os utentes adquirissem um melhor autoconhecimento face à doença, capacidade de detecção de sintomas e de pedir ajuda aquando dos sinais de recaída, bem como, uma melhor adesão ao regime terapêutico, evidenciando assim a importância das intervenções autónomas de enfermagem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Afonso, P. (2010). Esquizofrenia: Para além dos mitos, descobrir a doença. Parede: Principia. ISBN 978-9898131-63-8. Amador, X. (2007). No estoy enfermo, no necessito ayuda. (2ªed.). Madrid: Mayo ISBN: 978-84-96792-53-1 American Psychiatric Association, DSM_IV_TR. (2002). Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais. (4ª ed.). Lisboa: Climepsi Editores. ISBN 972-796-020-0. Atreja, A., Bellam, N., & Levy, S. (2005). Strategies to Enhance Patient Adherence: Making it Simple. Medscape General Medicine. Retrieved May 12, 2006 from: http://www.medscape.com/viewarticle/498339 Bandura, A. (2008). Albert Bandura e as Teorias da Aprendizagem Social. Hall, C. LIndzey, G., & Campbell, J. (4ªed.). Teorias da Personalidade. Porto Alegre. Artmed. p. 460-485. Bernardino, A.; Machado, C.; Alves, E.; Rebouço, H.; Pedro, R. & Gaspar, P. (2009). Os Enfermeiros enquanto agentes de Educação para a Saúde: Validação da Escala de Práticas e Comportamentos de Educação para a Saúde. Instituto Politécnico de Leiria. IC online. Consultado em 14 de Dezembro de 2011, através fonte http://hdl.handle.net/10400.8/113 Caminha, R., Wainer, R., Oliveira, M., & Piccoloto, N. (2003). Psicoterapias Cognitivo- Comportamentais – Teoria e Prática. São Paulo: Casa do Psicólogo. Cardoso, Luciene; Galera, Sueli. (2006). Adesão ao tratamento psicofarmacológico. Ata Paulista de Enfermagem. vol.19 (3):343-8 July/Sep. ISSN 0103-2100. Consultado em 14 de Novembro de 2011, através da fonte http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002006000300015 Chalifour, Jaques (2008) – A intervenção terapêutica – Os fundamentos existêncial-humanista da relação de ajuda, Loures, Lusodidata.

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15. O USO DO ÁLCOOL PELAS GESTANTES E AS CONSEQUÊNCIAS SOBRE O FETO Priscyla Fernanda Santana França*; Maria do Carmo Querido Avelar** *Graduanda do Curso de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, priscyla.franca@hotmail.com **Professora Adjunta do Curso de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, carmoav@uol.com.br

RESUMO Desde o século passado, observou-se o aumento do uso de drogas lícitas como o álcool e o tabaco pelas mulheres o que representava uma prática caracteristicamente masculina. Este hábito passou a ser uma constante na vida de mulheres em idade reprodutiva, englobando também as gestantes. Este estudo teve como objetivo realizar um levantamento de publicações sobre o uso do álcool pela gestante e as consequências deletérias sobre o feto. O método utilizado foi a revisão bibliográfica em fontes diversas, incluindo 35 publicações sendo 9 selecionadas. Concluiu-se, segundo publicações analisadas, que o uso do álcool pela gestante e as consequências deletérias sobre o feto é um grande problema de saúde pública, e que nem sempre isto é um tema estudado pelos profissionais da saúde na assistência pré-natal. Palavras – chave: gestante; álcool; gestação; Síndrome Alcoólica Fetal (SAF). 15.1. INTRODUÇÃO Com a evolução da sociedade moderna, a inclusão da mulher no mercado de trabalho, intensificou-se a partir da segunda metade do século passado, sendo observado o aumento do uso de drogas lícitas, como o álcool, pelas mulheres. Este hábito passou a ser uma constante na vida de mulheres em idade reprodutiva, englobando também as gestantes. (Oliveira & Simões, 2007)

O consumo do álcool durante a gravidez tem sido um tema de estudo razoavelmente documentado, embora muitas das consequências sobre o desenvolvimento infantil dos filhos de mães alcoolistas, ainda sejam pouco E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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conhecidas. Desta forma, o uso e o abuso do álcool durante a gravidez vêm sendo motivo de grande preocupação e acurada investigação por parte dos profissionais de saúde que assistem as mulheres no pré-natal, já que o consumo de álcool durante a gestação envolve um grande risco ao feto pela sua embriotoxicidade e teratogenicidade. Considera-se que o álcool é o agente teratogênico e embriotóxico fetal mais comum, transformando-se em um sério problema de saúde pública. (Fabbri, 2002; Freire, Machado, Melo & Melo, 2005) Segundo a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) e a Organização Mundial de Saúde (OMS), nas últimas décadas houve um aumento do consumo de álcool na maioria dos países, sendo a droga mais consumida no mundo. Em 2002, a OMS informou que, na América Latina o alcoolismo constituía o principal problema de saúde, sendo o fator que mais reduz a expectativa de vida saudável do brasileiro. As mulheres têm uma biodisponibilidade ao álcool maior que os homens, pela maior absorção dessa droga, maior proporção de gordura corpórea, atingindo alcoolemia maior. São menos tolerantes ao álcool do que os homens, com maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de complicações clínicas e risco de mortalidade. (Mesquita, 2010) Uma das principais consequências sobre o feto é denominada Síndrome Alcoólica Fetal (SAF). Caracteriza-se por retardo mental e do crescimento pôndero-estatural intrauterino e pós-natal; redução da circunferência craniana; disfunção do Sistema Nervoso Central com alterações na coordenação motora; fissura palpebral pequena; deficiências cognitivas; anomalias craniofaciais típicas; deficiência de crescimento e várias malformações associadas. A prevalência média mundial da SAF é de 0,5-2 casos por 1000 nascidos vivos, e o diagnóstico é mais real os dois aos onze anos de vida, uma vez que, as dismorfias faciais tornam-se mais evidentes e a disfunção típica do Sistema Nervoso Central emerge clinicamente. (Junior, 2005; Mesquita & Segre, 2009; Yamaguchi, Cardoso, Torres & Andrade, 2008) A exposição ao álcool traz agravos também à saúde da mãe, como doenças cardiovasculares, câncer, depressão e distúrbios neurológicos. Além disso, está associada ao ganho de peso gestacional insuficiente, menor número de consultas no

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pré-natal e aumento do risco de utilização de outras drogas. (Caputo & Bordin, 2008; Mesquita, 2010)

Ante o exposto tem-se a seguinte indagação: as gestantes possuem conhecimento suficiente sobre os efeitos deletérios que possam decorrer do uso do álcool durante o período de gestação? Como profissional da saúde, entende-se que conhecer as consequências do uso do álcool pelas gestantes é fundamental, tanto para o desenvolvimento de um processo de orientação, acompanhamento, encaminhamento e tratamentos apropriados, como na investigação de problemas relacionados à efetividade das intervenções. (Freire, Padilha & Saunders, 2009). O objetivo deste estudo foi levantar na literatura disponível publicações sobre o uso do álcool pela gestante e suas consequências deletérias sobre o feto.

15.2. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem quantitativa dos dados obtidos, utilizando para a sua elaboração o levantamento bibliográfico.

15.2.1. PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA) Material bibliográfico obtido nas Bases de Dados: LILAC’S (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde) e na plataforma SciELO (Scientific Electronic Library Online), dos últimos 15 anos (1995 – 2010). Palavraschave: gestante, álcool, gestação, Síndrome Alcoólica Fetal (SAF). Publicações em língua portuguesa, do período referido, disponíveis na íntegra “on-line”.

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15.2.2. INSTRUMENTOS Coleta de dados foi realizada utilizando uma ficha contendo: local, tipo de publicação, base de dados, descritores, categoria profissional dos autores, levantamento dos efeitos deletérios do álcool sobre o feto no 1º, 2º e 3º trimestre da gestação e os efeitos deletérios do álcool sobre a gestante.

15.2.3. PROCEDIMENTOS O estudo foi realizado na seguinte sequência: busca do material conforme critérios de inclusão, realizando a leitura de 35 resumos, selecionando 9 (100%) publicações que obtidas na íntegra constituiu a amostra deste estudo. Os dados foram tratados conforme sua natureza, em números e percentuais simples e explicitados textualmente no estudo.

15.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS O presente estudo permitiu a obtenção de dados que estão descritos como segue.

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Tabela 1. Distribuição das publicações segundo local e tipo, em números e porcentagens. São Paulo, 2011. N= 9 Tipo

Local

%

Dissertação

Ribeirão Preto

1

11,0

Periódicos

São Paulo

4

44,5

Rio de Janeiro

4

44,5

9

100,0

Total

Na tabela 1 – O material bibliográfico utilizado no estudo concentra-se em periódicos (8-89,0%), que estão distribuídos entre as cidades de São Paulo (444,50%) e Rio de Janeiro (4-44,50%).

Tabela 2. Distribuição das publicações segundo Base de Dados, sobre o uso do álcool pelas gestantes e seus efeitos deletérios no feto, em números e porcentagens. São Paulo, 2011. N= 9 Bases de Dados

%

LILAC’S

4

44,5

SciELO

5

55,5

Total

9

100,0

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Na tabela 2 – As bases de dados consultadas ofereceram semelhante quantidade de publicações, sendo SciELO (5-55,50%) e LILAC’S (4-44,50%).

Tabela 3. Distribuição dos descritores do estudo sobre o uso do álcool pelas gestantes e seus efeitos deletérios no feto, em números e porcentagens. São Paulo, 2011. *N= 19 Descritores

%

Álcool

7

37,0

Alcoólica 6

32,0

Gestação

5

26,0

Gestante

1

5,0

Total

19

100,0

Síndrome Fetal

*N= 19, alguns artigos repetem os descritores.

Na tabela 3 – Entre os descritores utilizados no estudo, os mais frequentes foram: álcool (7-37,0%); Síndrome Alcoólica Fetal (6-32,0%) e gestação (5-26,0%).

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Tabela 4. Distribuições das publicações sobre o uso do álcool pelas gestantes e seus efeitos deletérios no feto, segundo o tipo de pesquisa, em números e porcentagens. São Paulo, 2011. N= 9 Tipo de pesquisa

%

Artigos originais

4

44,5

Artigos de pesquisa

2

22,2

Artigo de revisão

1

11,1

de 1

11,1

Relato de caso

1

11,1

Total

9

100,0

Dissertação mestrado

Na tabela 4 – As publicações deste estudo estão contidas em periódicos nacionais (8-88,9%), em artigos: originais (4-44,5%), de pesquisa (2-22,2%), de revisão (1-11,1%) e relato de caso (1-11,1%). Foi utilizada uma dissertação de mestrado (1-11,1%).

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Tabela 5. Distribuição dos autores das publicações segundo sua categoria profissional, em números e porcentagens. São Paulo, 2011. *N= 14 Categoria profissional

%

Docente em Medicina

5

35,8

Médico

4

28,6

Discente em Medicina

2

14,2

Enfermeiro

2

14,2

Sem informação

1

7,2

Total

14

100,0

*N= 14, alguns artigos apresentam mais de um autor.

Na tabela 5 – Entre os autores das publicações utilizadas destacam-se como categoria profissional os docentes em Medicina (5-35,80%) seguidos dos médicos (4-28,60%), totalizando 9-64,40%, à qual pode-se acrescentar os discentes em Medicina (2-14,20%), alcançando um total de 11-78,60% dos autores nesta área. Os principais efeitos deletérios do álcool sobre o embrião no 1º trimestre de

gestação

são

as

anomalias

físicas,

dismorfismo,

alterações

no

desenvolvimento do Sistema Nervoso Central, aborto espontâneo, asfixia e mortalidade perinatal (Fabbri, 2002; Freire et al., 2005; Kaup, Merighi & Tsunechiro, 2001; Mesquita, 2010; Moraes & Reichenheim, 2006; Oliveira & Simões, 2007; Person, Cerchiari, Moretti, Zanini, Monteiro & Rapoport, 2005).

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Já no 2º trimestre da gestação o principal efeito deletério do álcool sobre o feto é o aborto espontâneo (Fabbri, 2002; Kaup et al., 2001; Moraes & Reichenheim, 2006; Oliveira & Simões, 2007). No 3º trimestre da gestação, os efeitos deletérios do álcool sobre o feto destacam-se os fatores comprometedores durante o parto; risco de infecções; descolamento prematuro de placenta; hipertonia uterina; trabalho de parto prematuro e líquido amniótico meconial. O retardo de crescimento geralmente alcança a proporção de 700g a menos nos recém-nascidos com SAF em comparação com recém-nascidos normais. Filhos de mães que usaram álcool durante a gravidez nascem com peso, comprimento e perímetro cefálico menores. Além disso, persiste velocidade de crescimento diminuída até os três anos de vida (Fabbri, 2002; Freire et al., 2005; Kaup et al., 2001; Oliveira & Simões, 2007). E, por fim, os efeitos deletérios do álcool sobre a gestante, destacam-se as manifestações da abstinência - sintomas da exacerbação do Sistema Nervoso Autônomo Simpático, como taquicardia, hipertensão, arritmias, falência cardíaca, além de delirium, alucinações e tremores, que podem aparecer de 6 a 48 horas até 10 dias da interrupção do consumo. Também encontramos como efeitos deletérios na gestante a doença coronariana, hipertensão arterial, neoplasia de mama, distúrbios neurológicos, depressão e outras desordens afetivas; o ganho de peso gestacional insuficiente, menor frequência aos serviços de pré-natal e maior utilização de outras drogas (Moraes & Reichenheim, 2006; Oliveira & Simões, 2007; Yamaguchi et al., 2008).

15.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Considerando um tema atual e a crescente preocupação dos profissionais da saúde sobre a progressão do uso do álcool pelas gestantes e os efeitos

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deletérios sobre o feto, apresentou-se este estudo como subsídio para trabalhos mais amplos na área. Na análise das publicações, vimos que os profissionais que mais se destacaram como autores foram da área médica, ficando os enfermeiros com apenas 14,20% do total das publicações, o que mostra uma lacuna relacionada ao envolvimento em estudos da temática em foco pelos profissionais da Enfermagem (Caputo & Bordin, 2008; Fabbri, 2002; Freire et al., 2009; Freire et al., 2005; Júnior, 2005; Kaup et al., 2001; Mesquita, 2010; Mesquita & Segre, 2009; Moraes & Reichenheim, 2007; Oliveira & Simões, 2007; Person et al., 2005; Yamaguchi et al., 2008). As publicações mostraram consequências da ordem do desenvolvimento embrionário e da dinâmica gestacional como: anomalias físicas, dismorfismo, alterações no desenvolvimento do Sistema Nervoso Central, aborto espontâneo, asfixia, mortalidade perinatal. O uso de álcool na gravidez está associado à redução do crescimento fetal. Sabe-se que os efeitos teratógenos do álcool podem ocorrer na ausência de anomalias congênitas ou de SAF. Entende-se também importante ressaltar as consequências do uso do álcool na gestante, causando principalmente a Síndrome de Abstinência (Fabbri, 2002; Junior, 2005; Moraes & Reichenheim, 2007; Oliveira & Simões, 2007; Yamaguchi et al., 2008).

15.5. CONCLUSÕES Os resultados apresentados permitiram concluir que, o consumo de álcool pelas mulheres gestantes envolve um grande risco para o desenvolvimento embrionário ou fetal bem como para a saúde da própria gestante. Neste estudo, evidenciou-se a necessidade dos enfermeiros em realizar estudos e pesquisas sobre o tema, para um maior conhecimento da temática que

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poderá ser direcionada para o desenvolvimento na assistência pré-natal na prevenção do uso do álcool.

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16. A DEPRESSÃO NOS IDOSOS – UM ESTUDO DE CARACTERIZAÇÃO DE IDOSOS RESIDENTES NA COMUNIDADE Bruna R. Gouveia*; Helena Jardim** *Prof. Assistente Convidada, Centro de Competência Tecnologias da Saúde - Universidade da Madeira; Doutoranda em Ciências de Enfermagem, Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar - Universidade do Porto, brunadegouveia@uma.pt **Prof. Coordenadora, Centro de Competência Tecnologias da Saúde - Universidade da Madeira, hjardim@uma.pt

RESUMO A depressão é a doença mental mais predominante nos idosos em Portugal, sendo considerada pela OMS como subdiagnosticada em todo o mundo (Costa, 2005). A investigação deste problema geriátrico pelos enfermeiros justifica-se pela necessidade da identificação precoce da depressão e da prevenção da doença ou das suas consequências. Os objectivos deste estudo foram documentar a prevalência de depressão nos idosos, identificar sintomas depressivos e verificar diferenças entre grupos. Este estudo integrou uma amostra não-probabilística consecutiva de 80 sujeitos (40 homens e 40 mulheres), com idade superior ou igual a 65 anos, residentes na comunidade, na Região Autónoma da Madeira, Portugal. Foram definidos dois grupos etários: idosos com idades entre 65 e 79 anos e muito idosos com mais de 79 anos. A depressão foi avaliada através da escala de depressão de Hamilton (1960), aplicada a todos os sujeitos pela mesma enfermeira. A análise estatística foi realizada com recurso ao programa SPSS, versão 12.0. Na determinação de significância estatística foram utilizados o teste t-Student e a ANOVA. Neste estudo, 86,3% dos idosos apresentaram depressão, verificando-se baixa intensidade nos sintomas depressivos (score médio 14,04). Os sintomas 190

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depressivos (itens da escala) apresentaram diferentes contribuições para o score de depressão. Os muito idosos apresentaram maior intensidade nos sintomas depressivos (18,57) em relação aos idosos (13,08), sendo esta diferença significativa. Não foram encontradas diferenças significativas entre grupos definidos pelo género e pelo género e idade. Com este estudo, conferimos a elevada prevalência de depressão nos idosos, identificando um aumento nos sintomas depressivos ao longo da idade, independentemente do género, que determinam uma abordagem diferenciada pelos profissionais da área da saúde.

Palavras-chave: Idosos; Depressão; Comunidade.

16.1. INTRODUÇÃO A depressão constitui uma doença psiquiátrica subdiagnosticada nos idosos em todo o mundo, o que poderá dever-se à percepção do estigma social da depressão e consequente repressão da sintomatologia, e a apresentação de sintomas sugestivos de patologia física (Bowker, Prince & Smith, 2006). O quadro clínico da depressão no idoso geralmente não se distancia muito do encontrado noutras idades (Fernandes, 2002). Este transtorno nos idosos é caracterizado por vários sintomas, como a tristeza, falta de motivação, desânimo, desinteresse, alterações do sono e apetite, somatização, dor física, irritabilidade, dificuldade de concentração e perda da vontade de viver (Zimerman, 2000). São identificados como factores de risco para a depressão, a incapacidade e a doença grave, a institucionalização, as perdas, o isolamento social, a dor crónica, e as perdas sensoriais da audição e visão (Bowker, Price & Smith, 2006).

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As consequências e implicações da depressão no idoso têm grande impacto na sociedade, nomeadamente, no campo económico (como o aumento da dependência e gasto de recurso de saúde e segurança social), no campo social (pela perturbação das relações familiares, e dependência da família e de recursos formais), no campo sanitário (pelo aumento do recurso aos cuidados de saúde primários e diferenciados) e no campo ético (nomeadamente como causa de suicídio no idoso) (Costa, 2005). Abstendo-se do diagnóstico da depressão, que está sob alçada e responsabilidade médica, a avaliação da depressão através de escalas constitui uma forma de identificar sintomas depressivos que excedem a norma e proporcionar um meio para a sua modificação (Spar & La Rue, 2005). Estes autores enumeram, entre outras, três escalas clinicamente úteis em idosos, nomeadamente, o Inventário de Depressão de Beck (Beck, 1978), a Escala Geriátrica de Depressão (Yesavage et al., 1982) e a Escala de Avaliação de Hamilton para a Depressão (Hamilton, 1960). Os dois primeiros instrumentos são de auto-avaliação e especialmente úteis para avaliar as características psicológicas da depressão, todavia, podem subestimar os sintomas somáticos da depressão, por não os incluírem. Estas escalas podem ser pouco apropriadas para alguns idosos, particularmente perante défices visuais, instrução limitada, proficiência pobre na linguagem, depressão mascarada ou psicose. Nestas situações, os autores aconselham a utilização de um instrumento que inclua a avaliação pelo observador, como é a Escala de Avaliação de Hamilton para a Depressão. Esta escala é ponderada no sentido dos sintomas depressivos (sono, alteração do peso, rapidez psicomotora e outros), incidindo também no humor triste, ansiedade e outras características psíquicas, verificando-se a existência de várias versões da mesma. Embora actualmente contestada, esta escala mantém a sua aplicabilidade devido a estes factores e validade aceitável (Weintraub et al., 2006; Bagby et al., 2004). Na perspectiva dos enfermeiros, a avaliação da depressão no idoso com recurso a estes instrumentos, justifica-se pela necessidade da identificação 192

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precoce da depressão e da prevenção da doença ou das suas consequências, na prática clínica. Por outro lado, na investigação, a criação de conhecimento sobre a extensão da população afectada pela doença nos contextos clínicos específicos poderá permitir uma melhor definição de estratégias de intervenção na prática. Nesta linha, tendo como contexto geográfico a Região Autónoma da Madeira, esta investigação procurará estudar a problemática da depressão nos idosos, através da documentação da prevalência de depressão nos idosos residentes na comunidade, da identificação dos sintomas depressivos e da verificação de diferenças entre grupos de idosos.

16.2. METODOLOGIA Esta investigação advém de uma necessidade de conhecimento sobre a extensão da população idosa afectada por sintomas depressivos no contexto clínico da enfermagem na Região Autónoma da Madeira, pretendendo contribuir para a definição de estratégias de intervenção na prática, quer na prevenção ou diagnóstico precoce da doença. Os objectivos deste estudo foram documentar a prevalência de depressão nos idosos, identificar sintomas depressivos mais frequentes ou que se evidenciam com maior intensidade e verificar diferenças entre grupos, definidos pela idade e género.

16.2.1.

PARTICIPANTES

Este estudo integrou uma amostra não-probabilística consecutiva de 80 sujeitos (40 homens e 40 mulheres), com idade superior a 65 anos, residentes na comunidade, na Região Autónoma da Madeira, Portugal. Foram definidos dois E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

193


grupos etários: idosos com idades entre 65 e 79 anos e muito idosos com mais de 79 anos. Foram considerados como critérios de exclusão no estudo, a desorientação no tempo e espaço, situação de afasia, surdez total, situações de doença aguda e grave e situações de fase terminal diagnosticada.

16.2.2.

INSTRUMENTOS

A depressão foi avaliada através da Escala de Avaliação de Hamilton para a Depressão (1960). Na presente pesquisa utilizámos uma versão da escala com 17 itens, existente numa tradução portuguesa (Botelho, 2000), não tendo incluído as manifestações psicóticas da escala original. No nosso estudo, a escala de depressão de Hamilton apresentou um valor de Alpha de Cronbach de 0,669, indicador de consistência aceitável.

16.2.3.

PROCEDIMENTOS

Em fase preliminar, a presente pesquisa foi apreciada e aprovada pelo Conselho de Administração do Serviço Regional de Saúde, E.P.E. e foi obtido um parecer favorável da Comissão de Ética para a Saúde do mesmo serviço. A avaliação da variável depressão for realizada durante uma entrevista, tendo o instrumento sido aplicado a todos os sujeitos pela mesma enfermeira, após treino teórico-prático específico. Previamente, os participantes foram elucidados dos objectivos e procedimentos inerentes ao estudo e foi assinado um documento de consentimento informado. Os participantes foram inquiridos na sua residência ou no Centro de Saúde respectivo, no período entre Fevereiro e Julho de 2008.

194

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A análise estatística foi realizada com recurso ao programa SPSS, versão 12.0. Foi realizada uma análise simples dos dados com recurso a estatística descritiva e na determinação de significância estatística foram utilizados o teste t-Student e a ANOVA.

16.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS O score de depressão na amostra variou entre 3 e 33, sendo o valor médio de 14,04. De acordo com a classificação desta escala de depressão, cujo ponto de corte é o 7, a amostra contou com 13,8% de idosos não deprimidos e 86,3% com depressão. Tendo em conta os grupos definidos pela idade, verificou-se que o score de depressão foi significativamente superior nos muito idosos, que apresentaram uma média de 18,57 contra 13,08 nos idosos (sig=0,025), significando que o grupo dos muito idosos revelou maior intensidade nos sintomas depressivos (Gráfico 1).

Idade

Muito Idosos

Idosos

10,00

20,00

30,00

Score de de pressão

Gráfico 1. Score da escala de depressão segundo a idade.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

195


Relativamente aos grupos definidos pelo género, o score médio de depressão na amostra dos homens foi de 13,55 contra 14,53 nas mulheres, apontando para o facto de as mulheres apresentarem maior intensidade nos sintomas depressivos. No entanto, o resultado do teste t não permite extrapolar esta conclusão. No que respeita aos scores médios dos grupos definidos pelo género e a idade, estes indicam valor médios próximos, o que vem confirmado pelo valor de prova associado à ANOVA (F=0,068, sig=0,795). Atendendo aos itens incluídos nesta versão da escala de Hamilton, os sintomas depressivos mais evidenciados nos idosos da amostra foram os “sintomas gerais”, presentes em 92,5% da amostra; os “sintomas somáticos”, presentes em 82,5%; e os “sintomas genitais”, com 80% dos idosos a apresentar os mesmos. Importa também ressalvar que mais de metade da amostra (57,5%) apresenta sintomas de “humor triste”, conforme apreciável na Tabela 1. Tendo em conta a intensidade dos sintomas, verificamos que foi no item “trabalho e actividade” que se registaram maior número de idosos no nível muito intenso do sintoma depressivo (26,3%). A este, seguem-se os “sintomas somáticos”, com 16,3% dos idosos no nível superior desta classificação, e o “humor triste”, com 12,5%. Saliente-se também que, em 16,2% dos idosos a “ideação suicida” está presente, e a sua frequência é decrescente em função da categoria de intensidade.

196

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Tabela 1. Distribuição da amostra segundo a classificação dos sintomas depressivos incluídos na escala de depressão (Frequências Relativas). Ause (%)

nte

Humor triste

Ligeir o

Moder ado

Intens o

Muito intenso

42,5

28,8

6,3

10,0

12,5

65,0

3,8

28,8

2,5

0,0

Ideação suicida

83,8

11,3

3,8

0,0

1,3

Insónia inicial

42,5

15,0

42,5

0,0

0,0

Insónia intermédia

61,3

12,5

26,3

0,0

0,0

Insónia tardia

35,0

31,3

33,8

0,0

0,0

46,3

15,0

8,8

3,8

26,3

Inibição

92,5

6,3

1,3

0,0

0,0

Excitação

95,0

5,0

0,0

0,0

0,0

30,0

21,3

38,8

6,3

3,8

17,5

16,3

27,5

22,5

16,3

76,3

20,0

0,0

2,5

1,3

Sentimentos

de

culpa

Trabalho actividade

Sintomas psíquicos Sintomas somáticos Sintomas gastrointestinais

e

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197


Sintomas gerais

7,5

43,8

41,3

7,5

0,0

Sintomas genitais

20,0

11,3

68,8

0,0

0,0

Hipocondria

46,3

6,3

37,5

10,0

0,0

Perda de peso

70,0

10,0

18,8

1,3

0,0

66,3

0,0

33,8

0,0

0,0

Consciência doença

da

O teste de independência do Qui-Quadrado mostrou que existem diferenças significativas entre homens e mulheres na intensidade de alguns sintomas depressivos. O “humor triste” é apresentado por maior número de mulheres (72,5%) do que por homens (42,5%) (X2=16,357, sig=0,003). Relativamente à “ideação suicida”, verificamos diferenças significativas entre homens e mulheres, estando mais ausente nos homens (97,5%) do que nas mulheres (70%) (X2= 12,139, sig=0,007). Na “insónia inicial” foram encontradas diferenças significativas entre géneros, mais ausente nos homens (57,5%) do que nas mulheres (27,5%) (X2=7,451, sig=0,024). Os “sintomas gastrointestinais”, que dizem respeito à anorexia, apresentam maior frequência na amostra das mulheres (40%) quando comparado com os homens (7,5%) (X2= 14,770, sig=0,002).

16.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O score de depressão na amostra varia entre 3 e 33, sendo o valor médio de 14,04, com 13,8% de idosos considerados não deprimidos e 86,3% com depressão. Fazendo uma comparação com estudos realizados em Portugal, a prevalência de depressão no nosso estudo é superior à encontrada na maioria dos estudos revistos. Botelho (2000), utilizando a mesma escala, faz referência a 198

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32% de depressão numa amostra de um centro de saúde de Lisboa. Na dependência de outro instrumento também aplicado na comunidade, Costa (2005) constatou uma prevalência de depressão de 67,9% numa amostra do Porto, enquanto Paúl (1993) determinou 74% de idosos com suspeita ou depressão provável, numa amostra de idosos em Lisboa. Vislumbrando os resultados para cada item da estala, no nosso estudo, os scores mais elevados foram encontrados nos muito idosos, o que implica uma maior intensidade de sintomas depressivos neste grupo. Da mesma forma, as mulheres apresentaram maior intensidade nestes sintomas. Estes resultados são consistentes com os encontrados por Fernandes (2002). Importa também ter em conta que um grande número de idosos apresentava “sintomas gerais”, identificados como cansaço ou dores no corpo, “somáticos”, descritos como e “genitais”, o que pode significar influências da componente fisiológica ou da incapacidade de ordem física na depressão, conforme referido por Ramos (2001), Spirduso (2005) e Sousa, Figueiredo e Cerqueira (2006). O item “trabalho e actividade” é referenciado pelos idosos como associada à reforma, reportando-nos para a alteração ou exclusão de papéis sociais, de acordo com Sousa, Figueiredo e Cerqueira (2006). Em 83,8% dos idosos, o item “ideação suicida” estava ausente, o que é contrário ao encontrado na maioria dos estudos neste campo. Podemos considerar este um bom indicador, uma vez que o suicídio nos idosos é reconhecidamente uma consequência possível da depressão (Costa, 2005; Fernandes, 2002). Quanto ao humor, factor central na depressão, mais de metade da amostra apresentou sintomas de “humor triste”. Neste campo, seria pertinente uma abordagem qualitativa no sentido de explorar a percepção da tristeza destes idosos.

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199


Importa frisar as limitações inerentes a esta investigação, nomeadamente, o tamanho da amostra, que condicionou a impossibilidade de generalização a toda a população idosa residente na comunidade da Região Autónoma da Madeira. Todavia, ressalvamos a constituição intencional da amostra, equitativa quanto ao género, com o objectivo de possibilitar a comparação entre os dois géneros, rara possibilidade em estudos desta natureza que apresentam proporcionalidade em relação à população real.

16.5. CONCLUSÕES Este estudo procurou responder à necessidade de maior conhecimento sobre a prevalência da depressão e as suas manifestações nos idosos, especificamente, no contexto clínico da enfermagem na Região Autónoma da Madeira. Na presente pesquisa verificámos uma elevada prevalência de depressão na amostra (86,3%) e um score médio de 14,04, localizado acima do ponto de corte da escala para identificação de depressão. Os scores de depressão, indicadores da intensidade dos sintomas foram significativamente mais elevados nos muito idosos (18,57), em relação aos idosos (13.08). Os sintomas depressivos mais evidenciados nos idosos da amostra foram os “sintomas gerais” (92,5%), os “sintomas somáticos” (82,5%) e os “sintomas genitais” (80%). A ideação suicida estava ausente em 83,3% dos idosos da amostra. Este estudo reafirma a existência de uma realidade que alerta para a necessidade de atender à problemática da depressão no idoso, no contexto clínico

da

enfermagem

na

comunidade.

Identificámos

ainda

sintomas

depressivos frequentes nestes idosos, cuja identificação preliminar na prática clínica poderá facilitar o diagnóstico precoce. Assim, consideramos que, como 200

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recurso dos enfermeiros, a avaliação sistemática da depressão no idoso, na presença dos indicadores mais frequentes, poderá permitir a identificação precoce da depressão e contribuir para a implementação de estratégias de prevenção da doença ou das suas consequências, no plano prático.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bagby, R. et al. (2004). The Hamilton Depression Rating Scale: Has the Gold Standard Become a Lead Weight?. Am J Psychiatry, 161, 2163-2177. Botelho, M. A. S. (2000). Autonomia funcional em idosos: caracterização multidimensional em idosos utentes de um centro de saúde urbano. Porto: Bial. Bowker, L. K., Prince, J. D. & Smith, S. C. (2006). Oxford handbook of geriatric medicine. Oxford: Oxford University Press. Costa, A. (2005). A depressão nos idosos portugueses. In Paúl, C. & Fonseca A. M. (Coords.), Envelhecer em Portugal: psicologia, saúde e prestação de cuidados (157-176). Lisboa: Climepsi Editores. Fernandes, P. (2002). A depressão no idoso (2ª Ed.). Coimbra: Quarteto. Hamilton, M. (1960). A rating scale for depression. J. Neurol. Neurosurg. Psichiat., 23, 56-62. Paúl, M. C. (1993). A depressão em idosos: estudo exploratório. Análise psicológica, 4 (XI), 609-617. Ramos, H. V. (2001). Qualidade de vida e envelhecimento. In Archer, L. et al (Coords.), Novos desafios à bioética (225-235). Porto: Porto Editora. Sousa, L.; Figueiredo, D. & Cerqueira, M. (2006). Envelhecer em família: os cuidados familiares na velhice (2ªEd.). Lisboa: Ambar. Spar, J.E. & La Rue, A. (2002). Psiquiatria geriátrica. Lisboa: Climepsi. Spirduso, W. W. (2005). Dimensões físicas do envelhecimento. São Paulo: Manole. Weintraub, D. M. D. et al. (2006). Test characteristics of the 15-item geriatric depresión scale and Hamilton depresión rating scale in parkinson disease. Am. J. Geriatr. Psychiatry, 14 (2), 169-175. Zimerman, G. I. (2000). Velhice: aspectos biopsicossociais. Porto Alegre: Artmed.

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201


17. ADAPTAÇÃO E VALIDAÇÃO PARA PORTUGUÊS DO QUESTIONÁRIO DE COPENHAGEN BURNOUT INVENTORY (CBI) Cesaltino Manuel Silveira da Fonte*; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe**; José Carlos Rodrigues Gomes*** *Enfermeiro Especialista Saúde Mental e Psiquiátrica, Centro Hospitalar do Médio Tejo, EPE, cesaltinofonte@gmail.com **Professor Coordenador, Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Campus 2, maria.dixe@ipleiria.pt ***Professor Coordenador, Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Campus 2, jcrgomes@ipleiria.pt

RESUMO Este estudo de investigação metodológica incidiu sobre 228 enfermeiros maioritariamente do sexo feminino (75%) com uma média de idades de 35,5 anos (DP = 8,5). Para validação foi solicitada a autorização aos autores do instrumento original, assim como à direção da instituição onde recolhemos os dados. O Copenhagen Burnout Inventory (CBI) é constituído por 19 itens, distribuídos por três escalas: o burnout pessoal 6 itens; o burnout relacionado com o trabalho 7 itens e o burnout relacionado com o cliente 6 itens. O coeficiente de alfa de Cronbach observado nas três escalas (0,845; 0,866 e 0,843 respetivamente) permite afirmar que o instrumento apresenta uma boa consistência interna. Verificamos ainda que as três escalas do CBI apresentam uma boa validade convergente com o Maslach Burnout Inventory (MBI) e discriminante, em que nenhum item se correlaciona mais com as outras escalas do que com a sua própria o que indicia uma estrutura bem definida. Os enfermeiros apresentam índices baixos de burnout nas três escalas do CBI. A escala validada apresenta boas características psicométricas, sendo fiável e válida para a identificação e mensuração do burnout, permitindo a aplicação prática e em futuras investigações.

202

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Palavras-chave: burnout; trabalho; utente; enfermeiro.

17.1. INTRODUÇÃO A síndrome de burnout tem sido definida como uma resposta ao stresse crónico no trabalho, integrando atitudes e sentimentos negativos em relação às pessoas com as quais trabalhamos (atitudes de despersonalização) e ao próprio papel profissional (falta de realização profissional no trabalho), assim como pela experiência de estar emocionalmente esgotado (exaustão emocional). Esta resposta ocorre com frequência nos profissionais de saúde e, em geral, nos profissionais de organizações de serviços que trabalham em contacto direto com os utentes (Gil-Monte, 2001). Schaufeli & Greenglass (2001) definiram burnout como um estado de esgotamento físico, emocional e mental que resulta do envolvimento de longo prazo nas situações de trabalho que são emocionalmente exigentes. Esta síndrome psicológica, segundo Schaufeli & Buunk (2003) pode desenvolver-se de uma forma gradual, mas pode também permanecer oculta por um longo período sem ser identificada pelo indivíduo, derivando de um desvio entre as suas expectativas profissionais e a realidade. Por outro lado, estão associadas a esta síndrome estratégias de coping inadequadas o que faz com que o burnout se autoperpetue. O termo também é reconhecido como uma metáfora popular entre os trabalhadores de serviços humanos (Kristensen et al., 2005). O burnout não é apenas cansaço ou exaustão. Se este fosse o caso, o conceito não seria necessário. Para uma melhor compreensão do conceito, a característica adicional mais importante é a atribuição da fadiga e da exaustão para domínios específicos ou para as esferas da vida pessoal. O trabalho é um domínio sendo o trabalho com o cliente um domínio mais específico. O questionário CBI é uma nova ferramenta de mensuração do burnout composta por três escalas: o burnout pessoal “personal burnout”; o burnout relacionado E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

203


com o trabalho “work-related burnout”; o burnout relacionado com o cliente “client-related burnout (Kristensen, et al. 2005) ”.

17.2. METODOLOGIA O estudo atual teve como objetivos validar o questionário de Copenhagen Burnout Inventory (CBI) para a população Portuguesa, determinar as suas características psicométricas e determinar os níveis de burnout nos enfermeiros portugueses.

De

acordo

com

os

objetivos

enunciados

é

considerado

metodológico e quantitativo quanto ao tipo de análise de dados (Almeida & Freire, 2008; Fortin, 2009).

17.2.1.

PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA)

A população deste estudo foi constituída pelos enfermeiros portugueses e amostra constituída pelos enfermeiros que exercem funções numa instituição de saúde da zona centro de Portugal. Apos as devidas autorizações enviamos o questionário via online para o email profissional a 693 enfermeiros, tendo respondido 228 enfermeiros, durante o período de Março a Maio de 2011 (taxa de resposta de 32,9%). O método de amostragem utilizado foi o não probabilístico por conveniência (Almeida & Freire, 2008; Fortin, 2009).

17.2.2. A

INSTRUMENTOS primeira

parte

do

questionário

foi

constituída

pela

avaliação

sociodemográfica e profissional. A segunda parte integrou o questionário CBI que foi elaborado pelo Instituto Nacional de Saúde Ocupacional de Copenhaga, sendo a primeira edição de 2004 (Kristensen, et al. 2005) e uma terceira pela escala MBI (Maslach, Jackson & Leiter, 1996). 204

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O CBI é um questionário constituído por 19 questões que avaliam o burnout, segundo três escalas: O burnout pessoal (6 itens): avalia o grau de exaustão física, psicológica e da exaustão experienciada pela pessoa. Refere-se aos sintomas gerais de exaustão física ou mental, que nem sempre estão relacionados com uma determinada situação em particular no ambiente de trabalho e aplica-se a todos os trabalhadores. O burnout relacionado com o trabalho (7 itens): analisa o grau de fadiga física e psicológica e a exaustão que é percebida pela pessoa em relação ao seu trabalho. Diz respeito aos sintomas de exaustão que estão relacionados com o trabalho da pessoa e aplica-se a todos os trabalhadores. O burnout relacionado com o utente (6 itens): avalia o grau de fadiga física e psicológica e de exaustão que é percebido pela pessoa como relacionado com o trabalho com os utentes. Refere-se aos sintomas de exaustão relacionada com o trabalho com os utentes e aplica-se aos trabalhadores dos serviços humanos, como enfermeiros e professores. O MBI foi traduzido, validado e adaptado para a população portuguesa por Melo, Gomes e Cruz (1999).

17.2.3.

PROCEDIMENTOS

Para se proceder à validação e adaptação transcultural do questionário CBI, foi solicitado autorização aos autores. Após a obtenção da sua autorização, procedeu-se à tradução e retroversão. A estratégia metodológica seguida ao longo deste processo encontra-se resumida de forma esquemática na figura 1. Depois de concluído o processo de tradução do questionário CBI, foi efetuado um pedido de autorização à direção da instituição para a sua aplicação junto dos enfermeiros, utilizando um questionário on-line através do e-mail profissional. O questionário foi criado no “Google docs”. A natureza confidencial do Instrumento de colheita de dados foi assegurada.

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205


Figura 1 – Processo de adaptação transcultural do Questionário de Copenhagen Burnout Inventory Tradução para Português Tradutor 1: Português bilingue. Tradutor Oficial, experiente na área da saúde

Tradutor : Português bilingue, experientes área da saúde e conhecedor dos objectivos do estudo

Versão I da Tradução do Questionário de Copenhagen Burnout Inventory (CBI) Tradução I

Comparação e análise das diferenças entre as duas versões

Tradução II

1ª Versão em Português do CBI

Retroversão para Inglês da 1ª Versão em Português Tradutor 1: Nativo Inglês bilingue. Tradutor Oficial, experiente na área da saúde

Tradutor 2: Inglês bilingue, experiente na área da saúde e conhecedor dos objectivos do estudo

Retorno aos autores para validação semântica de cada item Análise dos desvios e ajuste do instrumento pelo investigador

2º Versão em Português do CBI Submissão a comité de juízes na área da saúde e linguística

3ª Versão em Português do CBI

Pré-teste e Reflexão falada Aplicação a um grupo com características semelhantes à população em estudo (equivalência operacional). Formato e aparência visual, compreensão das instruções, dos itens e adesão aos conteúdos

Versão final do Questionário de Copenhagen Burnout Inventory (CBI) - PT

206

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17.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS 17.3.1.

CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS E PROFISSIONAIS

Dos 228 enfermeiros participantes do estudo, predomina o sexo feminino com 75,0% (171), na sua maioria 68,0% (155) são casados ou vivem em união de facto. A média de idades dos elementos da amostra é de 35,5 anos (DP = 8,5). Em relação às habilitações literárias, 95,6% (218) são licenciados, 51,8% (118) são detentores da categoria de enfermeiro. Em geral a amostra está distribuída por diversos serviços onde exercem funções, obtendo maior relevância o Serviço de Urgência com 19,7% (45), o Serviço de Cirurgia com 11,8% (27) e o Serviço de Medicina com 11,0% (25). A maioria dos enfermeiros, ou seja, 79,4% (181) não exerce funções noutra Instituição. Verifica-se que 50,4% (115) têm uma carga horária de 40 horas semanais. Quanto ao tipo de horário praticado a maioria dos enfermeiros 71,5% (163) trabalha em regime rotativo por turnos. A amostra em relação ao tipo de contracto jurídico de trabalho estabelecido com a instituição empregadora verifica-se que 41,23% (94) dos enfermeiros têm um Contrato por Tempo Indeterminado em Funções Públicas. A média do tempo de serviço é de 13,11 anos (DP = 8.73). A média do tempo de exercício na Instituição é de 11,62 anos (DP = 8,09). A média do tempo de exercício no serviço atual é de 7,28 anos (DP= 5,23). Um pouco mais de metade dos enfermeiros 54,8 % (125) não mudariam de profissão, contudo uma percentagem ainda significativa 45,2% (103) referiu que mudaria de profissão. Cerca de 63,2% (144) dos enfermeiros referiu que não mudaria de instituição. Por último, quanto à afirmação “Mudaria de

Serviço”

verificou-se

que

58,3%

(133)

dos

enfermeiros

respondeu

negativamente.

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207


17.3.2.

CARATERÍSTICAS PSICOMÉTRICAS DA ESCALA CBI

a) Estudo da Fidelidade do instrumento A fidelidade da versão portuguesa questionário do CBI foi estimada através do alfa de Cronbach como medida de consistência interna. O quadro 1 mostra a media e desvio padrão dos itens, as correlações obtidas (r item-total sem o próprio item) e os valores de alfa de Cronbach. Mostra-nos ainda e para as três escalas do CBI, que as correlações obtidas entre cada item com a sua nota global quando o próprio item é excluído são positivas oscilando os seus valores entre 0,464 e 0,750. Os valores do alfa de Cronbach são abonatórios de uma boa consistência interna para as três escalas do CBI. O burnout pessoal apresenta um alfa de Cronbach 0,845; o burnout relacionado com o trabalho apresenta um alfa de Cronbach de 0,866 e por último o burnout relacionado com o utente alfa de Cronbach de 0,843.

Quadro 1 – Estatísticas de homogeneidade dos itens e coeficientes de consistência interna (alfa de Cronbach das escalas do CBI) Itens

Alfa r do de Limite s

Burnout pessoal

Médi a

DP

total sem

Cronbac o h

item

(excluind o o item)

Com

que

frequência

se

sente

cansado/a? Com

que

frequência

fisicamente exausto/a?

208

se

sente

0-100

54,17

16,565

0-100

50,11

19,421

0,68 3 0,63 8

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0,814

0,818


Com

que

frequência

se

sente

emocionalmente exausto/a? Com que frequência pensa: “Eu não aguento mais isto”? Com

que

frequência

se

sente

fatigado/a? Com que frequência se sente frágil e suscetível a ficar doente?

0-100

37,72

21,570

0-100

28,07

23,264

0-100

47,15

20,295

0-100

32,57

19,920

0,56 1 0,67 6 0,70 9 0,52 2

Total de alfa de Cronbach

0,833

0,811

0,803

0,839 0,845

Burnout relacionado com o trabalho O seu trabalho é emocionalmente desgastante? Sente-se esgotado por causa do seu trabalho? O seu trabalho deixa-o/a frustrado/a? Sente-se esgotado/a no final de um dia de trabalho? Sente-se exausto/a de manhã ao pensar em mais um dia de trabalho? Sente que cada hora de trabalho é cansativa para si? Tem energia suficiente para a família

0-100

70,94

19,563

0-100

41,67

24,424

0-100

45,39

24,626

0-100

55,15

19,302

0-100

36,62

25,313

0-100

33,11

22,629

100-0

29,82

20,424

0,46 4 0,76 3 0,63 2 0,64 0 0,73 0 0,71 7

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

0,53 209

0,869

0,829

0,849

0,848

0,834

0,836 0,861


e os amigos durante o tempo de lazer?

2

Total de alfa de Cronbach

0,866

Burnout relacionado com o utente Acha difícil trabalhar com utentes? Acha

frustrante

trabalhar

com

utentes? Trabalhar com utentes deixa-o/a sem energia? Sente que dá mais do que recebe quando trabalha com utentes? Está

cansado

de

trabalhar

com

utentes?

0-100

46,59

27,957

0-100

25,99

24,536

0-100

33,77

22,381

0-100

55,59

27,943

0-100

30,15

21,844

0-100

31,91

25,469

0,63 7 0,73 3 0,75 0 0,58 2 0,56 8

Alguma vez se questiona quanto tempo conseguirá continuar a trabalhar com utentes?

0,50 6

Total de alfa de Cronbach

b) Estudo da Validade A validade discriminante dos itens é obtida através da comparação da correlação do item com a dimensão a que pertence e com as que não pertence. Verificamos (quadro 2) que os itens em cada uma das escalas se correlacionam entre eles de uma forma bastante alta com a sua própria escala (o que indica uma estrutura bem definida) e moderadamente com aquelas que têm alguma relação 210

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

0,816

0,796

0,796

0,828

0,828

0,840

0,843


teórica entre si. Nenhum item se correlaciona mais com as outras escalas do que com a sua própria.

Quadro 2 – Correlação dos itens com as escalas do CBI a que pertence (excluindo esse item) e com as escalas a que não pertencem

Itens

Burnout

Burnout

Burnou relacionado

relacionado

t pessoal

com trabalho

Com que frequência se sente cansado/a?

o com utente

0,773**

0,647**

0,478**

0,755**

0,662**

0,420**

0,712**

0,554**

0,351**

0,802**

0,708**

0,420**

0,813**

0,687**

0,486**

0,671**

0,523**

0,270**

O seu trabalho é emocionalmente desgastante?

0,395**

0,590**

0,384**

Sente-se esgotado por causa do seu trabalho?

0,750**

0,843**

0,554**

O seu trabalho deixa-o/a frustrado/a?

0,562**

0,750**

0,491**

Com

que

frequência

se

sente

fisicamente

exausto/a? Com que frequência se sente emocionalmente exausto/a? Com que frequência pensa: “Eu não aguento mais isto”? Com que frequência se sente fatigado/a? Com que frequência se sente frágil e suscetível a ficar doente?

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

211

o


Sente-se esgotado/a no final de um dia de

0,627**

0,732**

0,400**

0,731**

0,823**

0,536**

0,724**

0,805**

0,563**

0,539**

0,651**

0,343**

Acha difícil trabalhar com utentes?

0,321**

0,443**

0,772**

Acha frustrante trabalhar com utentes?

0,398**

0,480**

0,826**

Trabalhar com utentes deixa-o/a sem energia?

0,577**

0,642**

0,830**

0,332**

0,410**

0,734**

0,304**

0,404**

0,692**

0,497**

0,500**

0,664**

trabalho? Sente-se exausto/a de manhã ao pensar em mais um dia de trabalho? Sente que cada hora de trabalho é cansativa para si? Tem energia suficiente para a família e os amigos durante o tempo de lazer?

Sente que dá mais do que recebe quando trabalha com utentes? Está cansado de trabalhar com utentes? Alguma

vez

se

questiona

quanto

tempo

conseguirá continuar a trabalhar com utentes? (**) Correlação significativa ao nível 0,01 (2 tailed).

c) Validade concorrente O estudo da validade concorrente foi realizado a partir da matriz de correlações entre as três escalas do CBI com as três dimensões da escala do MBI (quadro 3). A escala do burnout pessoal apresenta uma correlação positiva forte com a exaustão emocional (0,790) e uma correlação moderada negativa com a 212

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


realização pessoal (-0,490). O burnout relacionado com o trabalho apresenta uma correlação positiva forte com a exaustão emocional (0,797) e correlaciona-se de forma negativa moderada com a realização pessoal (-0,490). A escala referente ao burnout relacionado com o utente apresenta uma correlação positiva moderada com a exaustão emocional (0,632) e uma correlação negativa moderada (-0,461) com a realização pessoal

Quadro 3 – Correlações de Pearson entre as escalas do CBI e do MBI MBI

CBI Burnou Escalas

Burnou t pessoal

t

Exaust

t

relacionad relacionad ão o

com

o o

trabalho Burnout pessoal

Burnou

com

Desper

sonalizaçã zação

o emocional o

pessoal

utente

1,000

Burnout relacionado com o

0,836**

1,000

0,533**

0,634**

1,000

0,790**

0,797**

0,632**

1,000

0,497**

0,486**

0,529**

0,674**

trabalho Burnout relacionado com o utente Exaustão emocional Despersonalizaçã o

Reali

1,000

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

213


Realização

-0,490**

-0,462**

pessoal

-0,461**

-0,466**

-0,425**

(**) Correlação significativa ao nível 0,01 (2 tailed).

17.3.3.

NÍVEIS DE BURNOUT DOS ENFERMEIROS

Sendo que os valores de burnout poderiam oscilar entre 0 e 100 verificou-se que ao nível do burrnout pessoal a média foi de 41,6 (15,3), revelando um nível baixo de burnout pessoal. Em relação ao burnout relacionado com o trabalho a média foi de 44,6 (16,7), revelando também um nível baixo de burnout entre os enfermeiros. No burnout relacionado com os utentes a média foi de 37,5 (18,8), revelando que os enfermeiros da amostra apresentam um nível baixo de burnout relacionado com os utentes. Utilizando o valor da mediana para dividir em dois grupos verificamos que 42,5% (97) dos enfermeiros apresentam altos níveis de burnout relacionado com o trabalho; 31.6% (72) manifestam altos níveis de burnout relacionado com o utente e 31,1% (71) apresentam altos níveis de burnout pessoal (quadro 4).

Quadro 4 – Distribuição da amostra relativamente aos níveis de burnout de acordo com as escalas do CBI Baixo nível de burnout

nível

burnout

CBI

%

%

Burnout pessoal

157

68,9

71

31,1

131

57,5

97

42,5

Burnout 214

Alto

relacionado

com

o

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

de

1,000


trabalho Burnout relacionado com o utente

156

68,4

72

31,6

17.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A escala validada mostra boas características psicométricas com valores de alfa de Cronbach, consentâneos com os encontrados por vários autores (Borritz & Kristensen, 2004; Shimizutani, et al 2004; Winwood & Winefield, 2004; Bourbonnais, 2006; Wahl, 2008; Benson, 2009). No burnout pessoal os dados revelaram um nível baixo de burnout pessoal sendo o valor médio superior ao encontrado no estudo original PUMA (Borritz & Kristensen, 2004) e em relação ao estudo realizado por Benson, et al (2009) mas inferiores aos encontrados nos restantes estudos (Shimizutani et al, 2004; Yeh W-Y et al, 2004; Winwood & Winefield, 2004; Quinn, 2007; Milfont et al, 2007; Williams, 2007; Wahl, 2008; Liljegren & Ekberg, 2008; Tsai & Chan, 2009 e Tsai et al, 2009). Em relação ao burnout relacionado com o trabalho verificaram-se também um nível baixo de burnout entre os enfermeiros, valores superiores aos encontrados no estudo de Borritz e Kristensen (2004), Yeh W-Y et al (2004); Winwood & Winefield (2004); Liljegren & Ekberg (2008) e Benson, et al (2009) mas inferiores aos encontrados noutros estudos (Shimizutani et al, 2004; Quinn, 2007; Milfont et al, 2007; Williams, 2007; Wahl, 2008; Tsai & Chan, 2009). No burnout relacionado com os utentes a média foi de 37,50 (DP=18,8), revelando que os enfermeiros da amostra apresentam um nível baixo de burnout relacionado com os utentes.

17.5. CONCLUSÕES E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

215


Este estudo permitiu a validação e adaptação do questionário CBI à realidade da população portuguesa e avaliar os níveis de burnout dos enfermeiros portugueses. O resultado obtido refletem apenas a realidade desta amostra sendo importante a realização de um estudo na população dos enfermeiros portugueses, a fim de apurar que valores de burnout expressam estes profissionais, tendo em consideração as mudanças organizacionais entretanto observadas, tais como a junção de Instituições, redistribuição de pessoal e com a consequente redução do pessoal de enfermagem. A validação e implementação em Portugal do questionário sobre o burnout: Copenhagen Burnout Inventory (Borritz e Kristensen, 2004) poderá constituir uma ferramenta essencial para a mensuração dos níveis de burnout, sendo assim possível uma abordagem planificada na sua intervenção ao nível dos órgãos de gestão.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


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para

su

explicación

y

recomendaciones

para

la

intervención.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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218

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


18. “PONTES DE SAÚDE MENTAL”: O IMPACTO DE UMA INTERVENÇÃO EM GRUPO NA SAÚDE MENTAL, SENTIDO INTERNO DE COERÊNCIA E ADESÃO AOS TRATAMENTOS DO DOENTE DEPRESSIVO Ana Margarida Varandas Santo*; José Carlos Gomes** *Enfermeira Especialista em Saúde Mental, Equipa de Tratamento de Caldas da Rainha do Instituto da Droga e da Toxicodependência, margarida.varandas@gmail.com **Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria

RESUMO De acordo com a Organização Mundial de Saúde (2002) a depressão afeta cerca de 20% da população portuguesa. Tendo em conta esta realidade, actualmente tem sido dedicada atenção especial aos benefícios da terapia de grupo como meio de encorajar as pessoas com depressão a partilhar os seus problemas com os outros. Este estudo pretende através de uma metodologia de investigação-acção perceber o impacto de uma intervenção em grupo na adesão aos tratamentos, sentido interno de coerência e saúde mental do doente depressivo e simultaneamente

identificar

quais

as

intervenções

consideradas

pelos

participantes como mais benéficas e quais as alterações necessárias ao modelo de intervenção existente (abordagem qualitativa). O modelo de intervenção em grupo denominou-se “Pontes de Saúde Mental” e decorreu durante 2 meses. A amostra foi constituída pelos 6 elementos participantes no grupo. Concluiu-se que a intervenção em grupo aumentou o nível de saúde mental, sentido interno de coerência e adesão aos tratamentos dos participantes da intervenção em grupo. No que se refere às intervenções consideradas como mais benéficas por parte dos participantes do grupo destacaram-se as relacionadas com trabalhar o relacionamento interpessoal e a socialização, promover a E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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redução do estigma e gestão do stress. Como alterações ao modelo existente surgiu a importância de aumentar o número de sessões e foi reforçada a necessidade de explorar o que os participentes sentem pela ausência de outros membros do grupo.

Palavras-chave: saúde mental; terapia de grupo; depressão

18.1. INTRODUÇÃO O presente estudo de investigação foi realizado tendo por base uma necessidade identificada pela equipa multidisciplinar de um Departamento de Psiquiatria, relacionada com a importância de se intervir junto dos doentes depressivos no sentido de promover a sua de saúde mental e capacitar face à situação de doença. Para além disso, também foi identificada a necessidade de se desenhar um modelo de intervenção em grupo para estes doentes baseado nas necessidades identificadas pelos próprios e não apenas pelos profissionais de saúde. As questões relacionadas com as intervenções de promoção de saúde mental e capacitação dos doentes face à sua situação de doença revelam-se cada vez mais pertinentes, uma vez que a incidência de doenças mentais encontra-se a aumentar de forma significativa (Coordenação Nacional para a Saúde Mental, 2008). Tendo em conta a prevalência da depressão e a consequente necessidade de avaliar o impacto de intervenções com estes doentes, os objectivos deste estudo são: Avaliar o nível de saúde mental, o sentido interno de coerência e a adesão ao tratamento medicamentoso da pessoa com depressão antes e após a participação num programa de intervenção em grupo.

220

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Avaliar o impacto de um programa de intervenção em grupo na saúde mental, sentido interno de coerência e adesão aos tratamentos da pessoa com depressão. Identificar as intervenções realizadas no âmbito da intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” que os participantes consideraram mais benéficas e quais as alterações a realizar a este modelo de intervenção.

• Promoção da Saúde Mental e Sentido Interno de Coerência

Segundo a Carta de Ottawa (1986, p.1) a “promoção da saúde é o nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo”. Para atingir um estado de completo bem-estar os indivíduos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. Desta forma, considera-se que as pessoas não podem realizar o seu potencial de saúde se não forem capazes de controlar os fatores determinantes da mesma, sendo que a intervenção ativa do doente é imprescindível (Bugalho & Carneiro, 2004). A saúde mental é um recurso individual que contribui para diferentes capacidades e competências, sendo inerente o sentimento de controlo sobre os acontecimentos de vida, lidando assim, melhor com as situações desafiadoras com que se depara (Lehtinen, 2008). O conceito de sentido interno de coerência desenvolvido por Antonovsky (1986) tem sido associado ao conceito de saúde mental, sendo considerado uma “proposta inovadora no campo da identificação e especificação das características do indivíduo que facilitam uma estratégia que se

adapta

na

resolução

de

problemas

e

gestão

do

stress

da

vida,

desempenhando uma ação promotora da saúde mental (…).” (Saboga Nunes, 2000, p. 2). O sentido de coerência é, assim, uma orientação global que define a capacidade com a qual um indivíduo com um persistente e dinâmico sentimento E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

221


de confiança encara os (1) estímulos emanados dos meios interno ou externo de uma existência como estruturados, preditíveis e explicáveis (capacidade de compreensão); (2) que estão ao alcance do indivíduo recursos para satisfazer as exigências colocadas por esses estímulos - (capacidade de gestão); e (3) que essas exigências são desafios, capazes de catalisar o investimento e empenho do indivíduo - (capacidade de investimento) (Antonovsky, 1987 citado por Saboga Nunes, 2000). Assim, o sentido interno de coerência é um conceito que exprime uma característica intrínseca própria a todos os indivíduos, mas, porque diferente de indivíduo para indivíduo, constitui uma variável importante na capacidade de lidar com os stressores, o que inclui o enfrentar as doenças crónicas como a depressão (Saboga Nunes, 2000).

• A Depressão

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (2002) a depressão afecta 20% da população portuguesa. Segundo a Diagnostic and Stastistic Manual of Mental Disorders- IV (DSM IV, 2002), o transtorno depressivo major caracteriza-se por um ou mais episódios depressivos majores, isto é, pelo menos duas semanas de humor deprimido ou perda de interesse, acompanhados por pelo menos cinco sintomas adicionais de depressão que são: perda ou ganho significativo de peso; insónia ou hipersónia; agitação ou inibição psicomotora; fadiga ou perda de energia; sentimento de desvalorização, ou culpa excessiva, ou

inadequada;

capacidade

diminuída

de

pensar

ou

concentrar-se

e

pensamentos de morte recorrente. A depressão é uma doença complexa e que exige uma atenção redobrada por parte dos profissionais de saúde. Desta forma, torna-se pertinente disponibilizar ao nível dos cuidados de saúde ferramentas úteis na intervenção face a esta patologia, entre as quais a intervenção em grupo e trabalhar a adesão aos tratamentos (DGS, s.d.). 222

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


• A adesão aos tratamentos

e intervenção em grupo com o doente

depressivo Segundo a OMS (2003, p.3), adesão ao tratamento “é a medida com que o comportamento de uma pessoa – tomar a sua medicação, seguir a dieta e/ ou mudar seu estilo de vida – corresponde às recomendações de um profissional de saúde”. Apesar da importância de aderir ao tratamento, em muitos casos os pacientes não o fazem. Segundo a OMS (2003, p. 7), “não há como negar que pacientes têm dificuldade em seguir o tratamento recomendado. A adesão ao tratamento de longo prazo em países desenvolvidos ronda os 50%”. No caso concreto das doenças psiquiátricas, como é o caso da depressão, a não adesão ao tratamento é apontada como fator determinante do agravamento da mesma (Cardoso & Galera, 2005). Segundo Demyttenaere (2001) os doentes que sofrem de perturbação depressiva major podem cessar de cumprir a medicação por razões variadas, sendo que a própria depressão pode predispor os doentes a não cumprirem o tratamento, uma vez que pode levar as pessoas a acreditar que não são merecedoras de qualquer tratamento. Outros sintomas de depressão podem conduzir ao esquecimento, o que constitui uma causa bem identificada de não cumprimento passivo do tratamento (Demyttenaere, 2001). Neste âmbito cabe aos profissionais de saúde, nomeadamente ao enfermeiro especialista em saúde mental, desenvolver intervenções que visem a adesão da pessoa com depressão ao tratamento. Segundo o International Council of Nurses (ICN, 2009), os enfermeiros encontram-se numa posição única para avaliar, diagnosticar, intervir e avaliar resultados nas questões relacionadas com a adesão. Tal como referem Bugalho e Carneiro (2004) existe um conjunto de intervenções provadamente eficazes na melhoria da adesão ao tratamento, ainda que não seja claro determinar quais são as melhores. As intervenções com os doentes depressivos podem ser realizadas individualmente ou em grupo, sendo E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

223


que atualmente cada vez se dá mais relevância à terapia de grupo como meio privilegiado do doente depressivo ter contacto com pessoas com problemas idênticos (Stuart & Laraia, 2001). Nos últimos tempos, tem sido dedicada atenção especial aos benefícios da terapia de grupo pois ao partilhar experiências com pessoal treinado e especializado, as pessoas podem obter, não só um conhecimento mais profundo de si próprio e dos seus problemas, como também aprender a identificar sinais de aviso de potenciais situações ameaçadoras da sua saúde mental (Stuart e Laraia, 2001).

18.2. METODOLOGIA • O desenho do estudo

Tendo em conta os objectivos anteriormente mencionados, este estudo classifica-se como quase experimental do tipo pré-teste e pós-teste sem grupo de controlo. A primiera etapa para dar resposta aos objectivos do estudo foi a constituição do grupo terapêutico, que consistiu na identificação, por parte da equipa multidisciplinar, dos utentes que preenchiam critérios de inclusão na amostra. A intervenção em grupo foi denominda de “Pontes de Saúde Mental” sendo contituida por 8 sessões semanais. Durante as sessões foram abordadas diferentes

temáticas

(Quadro 1) e mobilizadas

técnicas

especificas

enfermagem especializada em saúde mental.

224

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

de


Quadro 1 - Temas abordados em cada sessão do grupo “Pontes de Saúde Mental Tema Sessão nº 1

Apresentação interpessoal

Sessão nº 2

Promoção da Saúde Mental

Sessão nº 3

Gestão do stress

Sessão nº 4

Adesão aos tratamentos

Sessão nº 5

O relacionamento interpessoal

Sessão nº 6

Empowerment

e

adesão

aos

tratamentos Sessão nº 7

Preparar o término do grupo

Sessão nº8

O fim do grupo

Na primeira preenchecem

intervenção com o grupo foi pedido aos participantes que

um questionário cuja primeira parte é constituida por um

questionário sociodemográfico e clínico e a segunda parte por três escalas: Medida de Adesão aos Tratatamentos (MAT), Mental Health Inventory 5 (MHI-5) e Escala do sentido interno de coerência – versão reduzida (SOC 13). Após as 8 semanas de intervenção foi novamente solicitado ao participantes que respondessem à segunda parte do questionário. Para dar resposta ao terceiro objectivo deste estudo de investigação, foram realizadas notas de observação no final de cada sessão do grupo. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

225


Questões de investigação e hipóteses Tendo em conta os objectivos traçados para este estudo foram definidas as seguintes questões de investigação: Questão 1: Qual o nível de saúde mental, sentido interno de coerência e adesão aos tratamentos da pessoa com depressão antes e após uma intervenção em grupo? Questão 2: Qual é o impacto de um programa de intervenção em grupo na saúde mental, o sentido interno de coerência, e a adesão terapêutica da pessoa com depressão? Questão 3: Quais as intervenções do modelo “Pontes de Saúde Mental ” identificadas pelos participantes do grupo como mais benéficas e quais as alterações a introduzir ao modelo existente? Como hipótese de investigação, foi delineada: Hipótese 1: O nível de adesão aos tratamentos, a saúde mental e o sentido interno de coerência melhoram após uma intervenção em grupo.

• Instrumentos de colheita de dados

Face à problemática em estudo optou-se pela aplicação de um questionário em que na primeira parte foram recolhidos dados de carácter sociodemográfico e clínicos e na segunda parte foram apresentadas três escalas: MAT (Delgado & Lima, 2001), MHI-5 (Pais Ribeiro, 2001) e SOC-13 (Saboga Nunes, 2000).Foram também utilizados como método de recolha de dados a observação participante e notas de observação em cada sessão do grupo terapêutico.

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Para avaliar a saúde mental foi utilizado o MHI -5. Esta escala foi desenvolvida para o questionário de saúde mental do Medical Outcomes Study e é constituído por 5 itens (alfa de Cronbach de 0,95). A resposta a cada item desta escala é dada numa escala ordinal de seis posições. A nota total resulta da soma dos valores brutos dos itens que compõem a escala, sendo que parte dos itens são cotados de forma invertida. Valores mais elevados correspondem a melhor saúde mental (Pais Ribeiro, 2001). Considerou-se que valores inferiores ou iguais a 52 revelavam uma má saúde mental, enquanto valores superiores a 52 remetem para um bom nível de saúde mental. Para avaliar o sentido interno de coerência foi utilizada a escala do Sentido Interno de Coerência na sua versão reduzida de 13 itens (SOC-13).Esta escala foi adaptada para a população portuguesa por Geada (1990) baseada na versão do Sense of Coherence Quest desenvolvido por Antonovsky (1986) revelando excelentes propriedades psicométricas (alpha de Cronbach de 0.79) (Geada, 1990, 1994, 1996). Para avaliar a adesão aos tratamentos foi utilizada a Medida de Adesão aos Tratamentos (MAT) que foi validada para a população portuguesa por Delgado e Lima (2001). Consiste numa escala com sete itens de resposta do tipo Likert (de 1 a 6). Para a identificação dos sujeitos como aderentes ou não os indicadores da escala são recodificados em sim e não, segundo o seguinte critério: nunca (6) e raramente (5), da escala de Likert passou a não (1) da escala dicotómica, e por vezes (4), com frequência (3), quase sempre (2) e sempre (1) passou a sim (0) da escala dicotómica. A classificação dos sujeitos como aderentes ou não aderentes é feita segundo valores próximos da mediana e o sujeito será tanto mais aderente quanto mais elevada for a sua pontuação. Segundo Delgado e Lima (2001), a MAT na versão de 7 itens em escala de Likert apresenta alfa de Cronbach de 0,74. Por último, foram também utilizados como método de recolha de dados a observação participante as notas de observação. Os principais objetivos da E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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observação participante consistiram em identificar comportamentos verbais ou não verbais que estejam relacionados com as intervenções realizadas no grupo “Pontes de Saúde Mental” de forma a identificar quais as intervenções que foram consideradas pelos participantes do grupo como mais benéficas para a melhoria do seu estado de saúde e quais as sugestões de alterações que deveriam ser introduzidas ao modelo existente.

• População, amostra e procedimentos formais e éticos

A população do estudo foi constituída pelos utentes de um Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental, com base nos seguintes critérios de inclusão na amostra: ter diagnóstico de depressão; estar em seguimento no Departamento; falar, ler e escrever português e ter idade superior a 18 anos. A amostra foi não probabilística intencional e integrou um grupo de 6 utentes. Foi solicitada autorização formal ao Conselho de Administração do Centro Hospitalar.

Tratamento dos dados No que de refere às medidas de tratamento dos dados quantitativos, estes foram lançados numa base de dados informatizada e processados no programa de estatística SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 14, para o Windows.Iniciou-se o tratamento de dados pela análise de estatística descritiva, para a caracterização dos indivíduos intervenientes no estudo. Foi também utilizada a estatistica inferencial, nomeadamente o teste de Wilcoxon que foi considerado o mais adequado devido à distribuição não normal da amostra e porque é utilizado para comparação entre duas amostras emparelhadas (Aguiar, 2007). Para o tratamento dos dados qualitativos recorreu-se à técnica da análise de conteúdo das notas de observação. 228

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


18.3. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS • Caracterização da amostra A análise dos resultados quanto à caracterização da amostra permite-nos verificar que existe uma predominância de elementos do género feminino (66,7%). No que se refere à idade podemos verificar que a maioria (66,7%) dos indivíduos

apresenta

entre

45

e

54

anos

e

têm

como

escolaridade

predominantemente o 1º ciclo do ensino básico (50%). No que se refere ao tempo de acompanhamento clínico para a sua situação de doença psiquiátrica, verificou-se que metade dos participantes se encontra em acompanhamento clínico há mais de dois anos, sendo que 33,3% se encontra em seguimento entre um ano e dois anos e os restantes (16,7%) há menos de um ano. • Nível de Saúde Mental

Antes da intervenção do grupo “Pontes de Saúde Mental” e no seu final, foi avaliada a saúde mental dos participantes através da escala MHI-5 (Quadro 2). Os resultados do primeiro questionário demonstram que, antes da intervenção em grupo, os participantes do estudo apresentavam um baixo nível de saúde mental (M=43,3). Embora este resultado fosse expectável pelo facto de a amostra ser apenas constituída por pessoas com o diagnóstico de depressão, todos os participantes apresentam valores iguais ou inferiores a 52, que como já foi referido anteriormente é considerado o ponto de corte abaixo do qual consideramos que o indivíduo apresenta um mau nível de saúde mental. No segundo momento de aplicação do questionário verificamos que a média dos resultados da aplicação desta escala aumentou (M=51,3) o que leva a concluir que após a intervenção o nível de saúde mental dos participantes do grupo terá, em média, melhorado (embora continua abaixo do ponte de corte).

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229


Quadro 2 - Resultados obtidos no MHI-5 antes e após a intervenção em grupo. MHI-5

X

Md

σ

Xmin

Xmax

N

Antes

43,3

52,0

15,6

12,0

52,0

6

Após

51,3

48,0

21,9

16,0

84,0

6

• Sentido Interno de Coerência

De forma a avaliar o sentido interno de coerência utilizou-se a SOC-13. Pela análise dos resultados podemos verificar que os utentes do grupo revelaram um sentido interno de coerência baixo antes da intervenção em grupo (M=39,3), tendo aumentado após a intervenção (M=47,8), embora continuem a ser valores baixos. Os resultados evidenciados no que se refere ao sentido interno de coerência são expectáveis uma vez que todos os participantes apresentam diagnóstico de depressão, o que se encontra normalmente relacionado com um sentido interno de coerência baixo. Contudo, apesar da média do sentido interno de coerência apresentar valores baixos verificamos que no segundo momento a média aumentou o que revela uma maior capacidade por parte dos participantes em lidar com stressores, pois como refere Saboga Nunes (2000, p. 1) “os indivíduos com um elevado sentido interno de coerência revelam-se menos atingidos comportamental/emotivamente, psicológica e psicossomaticamente pelos efeitos dos stressores a que estão sujeitos”. • Adesão aos tratamentos

A análise dos resultados obtidos através da MAT revela que, no que se refere à adesão aos tratamentos, os participantes demonstram ter uma elevada adesão aos tratamentos (Quadro 3) antes do início do grupo terapêutico. Todos os participantes do estudo são classificados como aderentes, apresentando

230

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inclusivamente valores bastante elevados. No final do estudo, a média mantevese elevada, tendo inclusivamente aumentado face ao início do grupo terapêutico. Quadro 3 - Resultados obtidos na MAT antes e após a intervenção em grupo. MAT 1º

X

m

σ

XMin

XMax

N

5,2

5,2

0,4

4,5

5,8

6

5,6

5,3(a)

0,2

5,2

6,0

6

Momento 2º Momento (a) Multiple modes exist. The smallest value is shown Os valores apresentados não vão ao encontro dos principais dados apresentados por Cardoso e Galera (2005) ao referirem que a adesão ao tratamento de longo prazo em países desenvolvidos ronda os 50%, sendo que os níveis de adesão aos tratamentos são reconhecidamente menores nos doentes com patologia psiquiátrica. Por outro lado, todos os participantes no grupo “Pontes de Saúde Mental” são seguidos há vários anos no Departamento de Psiquiatria onde foi realizado o estudo de investigação, pelo que as questões relacionadas com a adesão aos tratamentos têm sido trabalhadas com base numa relação terapêutica duradoura e sólida. Esta ideia é corroborada por Cabral e Silva (2010) ao referir que os fatores ligados à relação do utente com os profissionais de saúde são cada vez mais reconhecidos como determinantes para a adesão. • Teste de hipóteses

No que se refere ao impacto da intervenção em grupo no nível de saúde mental dos participantes a análise dos dados encontrados (Quadro 4) permitenos concluir que existem diferença estatisticamente não significativa entre a saúde mental dos participantes do grupo no inicio e no final do mesmo.Contudo, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

231


a análise dos dados relativos à saúde mental dos participantes permite-nos perceber que a esta intervenção trouxe, em média, uma melhoria do nível de saúde mental dos doentes. Um dos fatores que poderá estar relacionado com estes resultados diz respeito à duração da intervenção, que se limitou a 8 sessões pois segundo Yalom (2006) para obter resultados mais significativos as intervenções breves em grupo deverão ter o mínimo de 12 sessões de duração. No que se refere ao impacto da intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” no sentido de coerência dos participantes, os valores encontrados (Quadro

4)

demonstram

que

existem

diferenças

estatisticamente

não

significativas entre o sentido de coerência no inicio e no fim da intervenção em grupo. O facto de existirem diferenças estatisticamente não significativas poderá estar relacionado coma

curta duração da intervenção, pois os valores

encontrados no final da mesma demonstram uma tendência positiva o que nos poderá levar a crer que a continuidade da intervenção seria benéfica. No que se refere ao impacto da intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” na adesão aos tratamentos os resultados (Quadro 4) demonstram que existem diferenças estatisticamente significativas

entre a adesão aos

tratamentos no início e no fim da intervenção. Assim, a intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” foi eficaz na promoção da adesão aos tratamentos. Este resultado encontra-se relacionado com o facto desta ter sido uma das temáticas mais abordadas ao longo da intervenção em grupo. Foram sobretudo abordadas as razões pelas quais os membros do grupo não aderiram no passado aos tratamentos e exploradas estratégias para melhorar a adesão. Segundo a OMS (2003) o nível de instrução dos pacientes, bem como as suas atitudes e crenças pessoais a respeito da eficácia dos tratamentos têm sido amplamente reconhecidos como preditores do nível de adesão. Assim, podemos concluir que a intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” demonstrou aumentar, em média, o nível de saúde mental, o sentido interno de coerência e a adesão aos tratamentos dos participantes do grupo 232

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


(embora

apenas

tenham

sido

encontradas

diferenças

estatisticamente

significativas na adesão aos tratamentos).Neste contexto, torna-se necessário acrescentar a perspectiva dos participantes da intervenção em grupo face às intervenções consideradas benéficas pelos próprios e as sugestões de alteração ao modelo, tornando-o mais adequado à população para a qual foi desenhado. Quadro 4 – Resultado da aplicação do Teste de Wilcoxon à comparação do nível da saúde mental, de adesão aos tratamentos e do sentido interno de coerência antes e após a intervenção “Pontes de Saúde Mental” Média

N

Ordens positivas MHI

Ordens negativas Empates Ordens positivas

MAT

Ordens negativas Empates Ordens positivas

SOC

Ordens negativas Empates

ordens

4(a)

3,25

1(b)

2,00

das

Z

p

-1,153(a)

0,249

-2,214(a)

0,027*

-1,153(a)

0,249

1(c)

6 (d)

0

0(e)

3,50

0(f)

1(g)

5,00

5(h)

3,20

0(i)

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

233


• Intervenções do modelo “Pontes de Saúde Mental ” identificadas pelos

participantes do grupo como mais benéficas e as alterações que deveriam existir neste modelo de intervenção Para dar resposta à última questão de investigação, foi realizada análise de conteúdo às notas de observação tendo emergido dois conjuntos de categorias: intervenções que os participantes do grupo consideraram mais benéficas e sugestões de alteração ao modelo “Pontes de Saúde Mental”. No que se refere às intervenções que os participantes consideraram mais benéficas surgiram as seguintes categorias: trabalhar o relacionamento interpessoal e a socialização, promover a redução do estigma e gestão do stress. No que se refere à categoria trabalhar o relacionamento interpessoal e a socialização esta foi uma intervenção muito valorizada pelos participantes do grupo. Segundo Yalom (2006, p. 35) “a aprendizagem social – o desenvolvimento de habilidades sociais básicas – é um fator terapêutico, embora a natureza das habilidades ensinadas e o grau em que o processo é explícito variem muito, dependendo do tipo de terapia de grupo”. Com o decorrer da intervenção em grupo, alguns membros demonstraram ter adquirido habilidades sociais, respondendo de forma útil aos outros. Yalom (2006) acrescenta que

estas

habilidades ajudam os membros dos grupos em interações futuras e constituem as bases da inteligência emocional. Ao longo da análise surgiu também a categoria promover a redução do estigma. Neste âmbito, as questões relacionadas com a forma de lidar com o estigma emergiram da intervenção em grupo e tornaram-se algo incontornáveis, pelo que foram exploradas estratégias entre os vários membros do grupo para fazer face ao estigma que sentem, mas também para fazer face ao seu próprio estigma sobre a doença mental. Segundo Corrigan e Watson (2002) o autoestigma ocorre quando membros de um subgrupo imerso em atitudes preconceituosas de uma cultura dominante concordam com esses preconceitos, aplicando as atitudes em si. Neste âmbito, as intervenções que visam combater o 234

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estigma tornam-se muito pertinentes sendo que a Declaração sobre Saúde Mental para a Europa define, entre outros objectivos, a luta contra o estigma e a descriminação (Coordenação Nacional para a Saúde Mental, 2008). Ainda no âmbito das intervenções que os participantes do grupo consideraram como mais benéficas emergiu a categoria promover a redução do stress. Ao longo da intervenção em grupo foi detetada a necessidade de intervir face às situações de stress, sendo para tal utilizada a comunicação entre os vários membros do grupo no sentido de, em conjunto, encontrarem os recursos necessários para fazer face aos stressores do dia-a-dia e também realizando psicoeducação sobre o stress e as técnicas existentes para o reduzir. A importância de intervenções para promover a gestão do stress em pessoas com uma doença mental é corroborada pela Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2010) ao referir que o stress contribui para o aparecimento de sintomas e de recaídas nestes doentes. Foram também encontradas algumas categorias relativas a sugestões de alteração ao modelo “Pontes de Saúde Mental”. A primeira categoria encontra-se relacionada com a necessidade de explorar o que se sente pela ausência de membros do grupo. Segundo Yalom (2006, p. 266) “a pesquisa sobre a terapia de grupo demonstra que um número substancial de pacientes deixa os grupos prematuramente, independentemente do que o terapeuta fizer” pelo que é necessário estar atento a esta realidade no seio do grupo. Por último, emergiu da análise das notas de observação, a categoria maior número de sessões do grupo terapêutico. O grupo terapêutico “Pontes de Saúde Mental” teve a duração de 8 sessões, tendo sido verbalizado pelos participantes do grupo a necessidade que sentiam que este continuasse. Segundo Yalom (2006) as terapias breves de grupo deverão ter no minimo 12 sessões.

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235


18.4. CONCLUSÃO Após a análise e discussão dos resultados pode-se concluir que a intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” teve um impacto positivo na saúde mental, sentido interno de coerência e adesão aos tratamentos dos seus participantes. O facto de estes resultados não serem mais significativos poderá estar relacionado com a duração da intervenção face àquilo que são as indicações para uma terapia de grupo breve. Mais do que a perceção dos profissionais de saúde sobre quais as intervenções mais adequadas à população específica do local onde foi realizado o estudo, procurou-se também perceber quais as intervenções que os participantes do grupo consideraram benéficas e quais as sugestões de alteração ao modelo de intervenção realizado. No que se refere às intervenções consideradas benéficas pelos membros do grupo foram destacadas a promoção do relacionamento interpessoal e da socialização, a gestão do stress e a promoção da redução do estigma. No que se refere às alterações ao modelo de intervenção estas encontramse relacionadas com a importância de se explorar as ausências dos membros do grupo e com a importância da intervenção em grupo ter um maior número de sessões. Em suma, a intervenção em grupo “Pontes de Saúde Mental” revela potencialidades na melhoria da saúde mental, sentido interno de coerência e adesão aos tratamentos dos participantes, devendo, contudo, ser reestruturada face às reais necessidades da população a que se destina. Como sugestões para uma intervenção futura baseada neste modelo realça-se a importância de: dar ênfase às intervenções que os participantes consideraram como mais benéficas; trabalhar com os participantes as ausências e abandonos de outros membros do grupo e aumentar o número de sessões para o mínimo de 12. O presente estudo de investigação abre o caminho para a realização de um estudo maior, com uma 236

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amostra mais significativa, de forma a comparar resultados e adequar este modelo de intervenção a outras populações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Aguiar, P. (2007). Guia prático de estatistica em investigação epidemiológica: SPSS. (1º edição). Lisboa: Climepsi Editores. Bugalho, A. & Carneiro, A. V. (2004). Intervenções para aumentar a Adesão Terapêutica em Patologias Crónicas. Lisboa: Centro de Estudos da Medicina Baseada na Evidência. Cabral, M., Silva, P. (2010, Março). A adesão à terapêutica em Portugal: atitudes e comportamentos da população portuguesa perante as prescrições médicas. In. Conferência Conclusões: A adesão à terapêutica em Portugal. Lisboa. Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2008). Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016. Lisboa: Alto Comissariado de Saúde. Corrigan, P. W. & Watson, A. C.(2002). The paradox of self-stigma and mental illness. Clinical PsychologyScience and Practice. Delgado, A. & Lima, M. L. (2001). Contributo para a validação concorrente de uma medida de adesão aos tratamentos. Psicologia, Saúde e doenças.2, (2), 81-100. Demytenaere, K. (2001). Adesão ao Tratamento antidepressivo. Revisões. III (5), 15-24. Depressão. In: Portal da Saúde. Lisboa: Direção Geral da Saúde. Acedido em 24 de janeiro de 2012 em http://www.minsaude.pt/portal//enciclopedia+da+saude/saude+mental/depressao.htm Geada, M. (1994). Sentido interno de coerência, clima familiar e comportamentos de risco de consumo de drogas na adolescência. Análise psicológica, 12 (2/3). 315-321. Lethinen, V. (2008). Buildind up good menthal health: Guideline based on existing kmowledeg. Finland: STAKES. Organização Mundial de Saúde (1986). Carta de Otawa. Otawa. Organização Mundial de Saúde (2003). Adherence to long term therapies. Evidence for action. Genebra: WHO Pais Ribeiro, J.L. (2001). Mental Health Inventory: Um estudo de adaptação à população portuguesa. Psicologis, Saúde & Doenças. 2 (1), 77-79. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Saboga Nunes, Luís (2000). O sentido de Coerência: operacionalização de um conceito que influencia a saúde mental e a qualidade de vida. Relatório de investigação para a obtenção do Grau de Mestre em Saúde Pública a ser apresentado na Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa. Stuart, G. e Laraia, M. (2001). Enfermagem Psiquiátrica. (6º edição). Porto Alegre: Artmed Editora. Yalom, I (2006). Psicoterapia de grupo: teoria e prática. (5º edição). São Paulo: Artmed.

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19. CO-DINÂMICA DO TRATAMENTO PSICOTERAPEUTICO DE PAIS E DE FILHOS Luís Barroso* *Psicólogo clínico / licenciado em Psicologia pela Universidade do Porto, 1981. Especializações em Terapia Familiar, Psicodrama, Terapia Cognitiva - Narrativa e Psicoterapias Psicodinâmicas.

RESUMO Foram avaliados três grupos de pais em apoio psicoterapêutico de três grupos psicoterapêuticos mistos de crianças e de jovens de idades dos 6 aos 14 anos em contexto hospitalar de saúde mental infantil e juvenil, com variada psicopatologia. Foram assinaladas as diferenças entre os vários grupos de idades e recomendado que o co-tratamento se processe em dois períodos de nove meses devido à evidência manifestada neste estudo.

Palavras-chave: grupo de pais; grupos psicoterapêuticos mistos de crianças e de jovens; co-eficácia da função parental; expectativa co-gerada nos pais.

19.1. INTRODUÇÃO Torna-se pertinente – baseado em investigação anterior realizada – Coelho, A, etc. (1994) e Rodrigues, S (2005) – e agora continuada no presente estudo – valorizar a intervenção com os pais de crianças e de jovens em psicoterapia para a co-eficácia da função parental na mudança a efetivar. Os objetivos do estudo são: •

Comprovar a eficácia do apoio psicoterapêutico de pais como coadjuvante ao tratamento psicoterapêutico dos filhos.

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239


Comprovar que o tempo limitado do tratamento dos filhos perspetiva a necessidade da continuação do mesmo baseada na expetativa cogerada nos pais.

19.2. METODOLOGIA 19.2.1.

PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA)

Três grupos de pais (16 elementos) em apoio psicoterapêutico segundo a Teoria Sistémica-Familiar e Teoria da Dinâmica de Grupo – Sampaio, D., etc. (1985) e Rattner, J. (1977) – de três grupos psicoterapêuticos mistos de crianças e de jovens – de idades dos 6 aos 8 anos (Grupo I), dos 9 e 10 anos (Grupo II) segundo a Teoria da Interimaginação – Coelho, J. & Coelho, A. (2010) – e dos 12 aos 14 anos (Grupo III) segundo a Teoria do Psicodrama – Pio Abreu, J. L. (2002) – em contexto hospitalar de saúde mental infantil e juvenil, com variada psicopatologia (segundo a DSM-IV-TR): perturbações da vinculação – inibida e desinibida, perturbações do comportamento, da oposição e da hiperatividade, perturbações da eliminação e obsessivas, mutismo e gaguez.

19.2.2.

INSTRUMENTOS •

A. Avaliação quantitativa

No final do processo de apoio psicoterapêutico aos pais por:

A.1. Escala de perceção dos pais quanto à evolução dos filhos A.1.1. Estado geral.

240

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A.1.2.

Estado

no

contexto

escolar

(rendimento,

socialização,

comportamento). A.1.3. Estado no contexto familiar (inibição, autonomia, humor – sentimentos depressivos, agressividade, capacidade de aceitar regras). A.1.4. Aparecimento (ou não) de novos sintomas.

A.2. Escala da perceção dos pais da sua evolução (quanto ao grau de satisfação e de importância) no «Grupo de pais».

A.3. Registo sistemático da assiduidade ao «Grupo de pais».

B. Avaliação qualitativa

Por parecer fundamentado de altas propostas em reunião final dos técnicos do «Grupo de pais» e do grupo de crianças e de jovens.

19.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS A. Avaliação quantitativa: A.1. Escala de perceção dos pais quanto à evolução dos filhos A.1.1. Estado geral: Grupo I (G I): todos os pais acharam que foi «melhor». E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Grupo II (G II): 80% «melhor» e 20% «igual». Grupo III (GIII): 50% «igual», 33% «melhor» e 17% «pior».

A.1.2. Estado no contexto escolar: A.1.2.1. Rendimento: G I: 60% «pior» e 40% «melhor». G II: 60% «igual» e 40% «melhor». G III: 67% «pior» e 33% «melhor». A.1.2.2. Socialização: G I: 60% «melhor» e 40% «igual». G II: 80% «melhor» e 20% «igual». G III: 67% «melhor» e 33% «igual». A.1.2.3. Comportamento: G I: 60% «melhor» e 40% «igual». G II: 80% «igual» e 20% «melhor». G III: 33% «melhor», 33% «igual» e 33% «pior».

A.1.3. Estado no contexto familiar: A.1.3.1. Inibição: G I: 60% «melhor» e 40% «igual». 242

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G II: 80% «melhor» e 20% «igual». G III: 67% «igual» e 33% «melhor». A.1.3.2. Autonomia: G I: 60% «melhor», 20% «igual» e 20% «pior». G II: 80% «melhor», 20% «igual». G III: 50% «melhor», 50% «igual». A.1.3.3. Sentimentos depressivos: G I: 60% «melhor» e 40% «igual». G II: 80% «melhor» e 20% «igual». G III: 67% «igual» e 33% «melhor». A.1.3.4. Agressividade: G I: 80% «melhor» e 20% «igual». G II: 40% «melhor», 40% «igual» e 20% «pior». G III: 50% «pior», 33% «igual» e 17% «melhor».

A.1.3.5. Capacidade de aceitar regras: G I: 60% «igual» e 40% «melhor». G II: 40% «melhor», 40% «igual» e 20% «pior». G III: 50% «pior», 33% «melhor» e 17% «igual».

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243


A.1.4. Aparecimento (ou não) de novos sintomas: G I: 60% «não» apareceram e em 40% apareceram. G II: 60% apareceram novos sintomas. G III: 83% «não» apareceram.

A.2. Escala da perceção dos pais da sua evolução. A.2.1. Grau de Satisfação (de 1 a 5) G I: 80% «grau 5» e 20% «grau 2». G II: 80% «grau 5» e 20% «grau 4». G III: 83% «grau 4» e 17% «grau 3».

A.2.2. Grau de Importância (de 1 a 5) G I: todos os pais acharam que foi evolução máxima. G II: 80% «grau 5» e 20% «grau 4». G III: pais acharam que a evolução foi de «grau 4».

A.3. Registos Sistemáticos da assiduidade ao «Grupo de pais» G I: no total a assiduidade dos pais foi de 89%. G II: no total a assiduidade dos pais foi de 88%. G III: no total a assiduidade dos pais foi de 94%. 244

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B. Avaliação Qualitativa: Altas (Não Altas) propostas em reunião dos técnicos. G I: os técnicos propuseram 20% de «Altas». G II: os técnicos propuseram 20% de «Altas». G III: os técnicos propuseram 33% de «Altas».

19.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A. Quanto à perceção dos pais à cerca da evolução dos filhos:

A.1. genericamente: a sua melhoria acentuada nos grupos de crianças e com mais resistência à melhoria no grupo pré-adolescente. A.2. no contexto escolar: o grande desenvolvimento da socialização e do comportamento (menor no grupo pré-adolescente) e a baixa de rendimento escolar (menor no grupo dos 9 e 10 anos). A.3. no contexto familiar: a melhoria da autonomia e da inibição e dos sentimentos depressivos e também, em menor intensidade, da agressividade e capacidade de aceitar regras (com maior resistência no grupo dos préadolescentes) indica estar-se no primeiro ano de tratamento. A.4. a alteração da sintomatologia no grupo das crianças (evidente nas mais velhas) e a manutenção no grupo dos pré-adolescentes é inerente a cada faixa etária.

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B. A perceção dos pais da evolução do seu desempenho é bastante

ou

muito

positiva

(grupo

de

pais

dos

pré-

adolescentes), quanto à satisfação – envolvimento emocional e afetivo – e à importância do seu próprio percurso de educadores face à mudança verificada nos seus filhos.

C. A assiduidade de todos os «grupos de pais» é bastante positiva o que denota um forte envolvimento e participação no acompanhar do tratamento dos filhos e a disponibilidade para a sua própria mudança parental.

D. O baixo número de propostas de altas (e já pré-anunciada em reunião intercalar, três meses antes do final do processo terapêutico) relaciona-se com o tempo do tratamento, o que indica a necessidade da continuação da psicoterapia aos filhos e do apoio psicoterapêutico aos pais por mais um ano (nove meses), de resto, na linha de anteriores investigações realizadas

Barroso,

L.(2007),

Coelho,

A.,

etc.

(1984),

Rodrigues, S. (2005) – com grupos terapêuticos similares.

E. Existem diferenças significativas entre os dois grupos de crianças e o grupo de pré-adolescentes – que seguem o padrão de maior resistência à mudança no primeiro ano de tratamento inerente à faixa etária dos 12 aos 14 anos.

246

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F. Verifica-se alguma diferença de género: há leve resistência à mudança no sexo masculino devido à grande diferença no apoio psicoterapêutico no «grupo de pais», pois mais de noventa por cento são as mães que acompanham os filhos. Não se manifesta perceção diferente quanto há evolução dos filhos em comparação com a evolução das filhas.

19.5. CONCLUSÕES Os grupos de pais proporcionam elevada satisfação e indiscutível importância para a relação parental. Os «grupos de pais» de apoio psicoterapêutico aos grupos de tratamento psicoterapêutico dos filhos proporcionam um grau elevado de satisfação pela alavancagem das emoções e afetos e a melhor compreensão parental da relação pais-filhos. A importância percecionada pelos pais é indiscutível e sentida como altamente positiva.

A. É recomendável que o co-tratamento se processe por dois períodos de nove meses. O tempo de cinco a nove meses manifesta-se insuficiente para o tratamento psicoterapêutico dos filhos e para apoio efetivo dos pais à mudança com maisvalia parental. É recomendável que o co-tratamento de uns e de outros se processe por dois períodos de nove meses para ser eficaz (e na linha de anteriores investigações).

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247


B. Será de considerar uma futura amostra mais alargada. Perspetiva-se a continuação do tratamento de filhos e do co-tratamento dos pais por mais nove meses o que nos garante a continuação desta investigação analisando as perceções dos pais ao fim do tempo que consideramos gerador de eficácia.

C. Será de considerar o alargamento da amostra para estabelecer um

padrão de análise mais consistente (número de grupos

observados e consequente número de crianças/pré-adolescentes e de pais observados).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS Barroso, L. (2007). Do momento à eficácia - o Psicodrama com Pré-Adolescentes. Trabalho técnico-científico não publicado apresentado ao Hospital Central Especializado de Crianças Maria Pia para obtenção do Grau de Assessor da Carreira de Técnico Superior de Saúde, Porto, Portugal. Bermudas, R. (1980). Introdução ao Psicodrama. São Paulo: Editora Mestre Lou. [traduzido por J.M. D’ Alessandro]. Coelho, A. & Dias, G. & Pimental, J. & Barroso, L. & Gesta, C. (1994). Avaliação da Evolução de Criança em Grupos Terapêuticos, Lisboa, In Revista Portuguesa de Pedopsiquiatria, nº7, APPIA. Coelho, J. & Coelho, A. (2010). Temas de Pedopsiquiatria, Porto: Edição de Autor. Mazzotta (1995). O jogo Dramático com crianças: a luta pela transformação. In J. Mota (eds.). O jogo no Psicodrama (2ª ed.). São Paulo: Editora Ágora Ltda. Monteiro, R. (1994). Jogos Dramáticos (7ªed.). São Paulo: Editora Ágora Ltda. Moreno, J. L. (1983). Psicodrama. São Paulo: Ed. Cultrix. [traduzido por A. Cabral]. Moreno, J. L. (1983). Fundamentos do Psicodrama. São Paulo: Summus Editorial. Piaget, J., & Inhelder, B. (1979). A Psicologia da Criança. Lisboa: Morais Editores. 248

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20. OS PAIS COMO PARCEIROS NA EDUCAÇÃO PARA A SEXUALIDADE Maria Isabel Santos*; Júlia Magalhães**; Neide Feijó*** *Enfermeira Especialista em Enfermagem Comunitária; UCCÂncora – ACES Grande Porto VIII – Gaia; misabelljsantos@gmail.com **Enfermeira Especialista em Enfermagem Comunitária; UCCÂncora – ACES Grande Porto VIII - Gaia; enfjuliamagalhaes@gmail.com ***ESS J Piaget/VNG; nfeijo@gaia.ipiaget.org

RESUMO A vivência da sexualidade por parte dos adolescentes é uma preocupação constante dos educadores, enquanto pais, professores ou mesmo profissionais da saúde. Os pais são aqueles que mais oportunidades têm de presenciar e de participar ativamente na sua evolução. Na verdade, estes têm grande influência nos comportamentos sexuais dos filhos, quer servindo-lhes de modelos de comportamento sexual, quer intervindo na formação das suas atitudes e valores em relação à sexualidade. Traçou-se como objectivo deste trabalho conhecer o entendimento dos pais sobre a sexualidade dos seus filhos adolescentes, com apoio da teoria das representações sociais Os participantes do estudo foram catorze pais de alunos adolescentes, matriculados no 3º ciclo do ensino básico dos três Agrupamentos de Escolas de Vila Nova de Gaia. Para o tratamento dos dados utilizou-se a análise de conteúdo com o apoio da teoria das representações sociais. Na análise dos foi possível depreender que a representação da sexualidade para os pais ultrapassa o ato sexual uma vez que envolve amor, carinho, troca de palavras, o toque, e o envolvimento entre as pessoas que se expressam.

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Igualmente foi associada à genitalidade, ao ato sexual e ao corpo, acompanhada dos

receios

da

gravidez

não

desejada

e

das

infecções

sexualmente

transmissíveis. O estudo da sexualidade na adolescência inscreve-se no processo de desenvolvimento do adolescente, exige uma avaliação global rigorosa de todos os comportamentos, atitudes e valores, cuja finalidade será a obtenção de dados necessários a uma intervenção eficaz dos pais, professores e técnicos de saúde,

Palavras – chave: Sexualidade. Adolescência. Pais. Educação em Saúde.

20.1. INTRODUÇÃO O tema da Sexualidade assume um relevo muito particular em contraste com outros temas, porque a sexualidade integra o percurso vivencial do indivíduo, transcende as barreiras familiares, os muros da escola e centra-se no EU individual, não como mero recetor de aprendizagens, mas na sua dimensão de Ser Pessoa: pessoa que faz parte de uma vasta urdidura de relações, pessoa que possui emoções e carece de afectos, pessoa que – estando ainda nos degraus iniciais da vida – necessita de quem saiba orientar, aconselhar, escutar, apoiar… Embora continuem a perdurar opiniões opostas, vários estudos e revisões nacionais e internacionais evidenciam que a ES não fomenta a atividade sexual precoce, nem a sua maior frequência e, que contrariamente, leva a um adiamento no inicio da atividade sexual ou à sua diminuição (COLLINS [et al], 2002; FERREIRA e VILAR, 2009). Para além disso, verificou-se que, em jovens sexualmente ativos, a ES incita a práticas sexuais seguras e responsáveis, tais como a utilização correta de contracetivos (IPPF EU, 2006).

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Temas como a educação para a sexualidade ainda geram algum desconforto e polémica. Na sociedade coexistem diferentes padrões morais, o que faz com que cada educador encare o tema individualmente e o possa abordar de diversas formas. A ES pode ocorrer de um modo formal e explícito, isto é, enquanto projecto de intervenção pedagógica estruturada e intencional, ou de um modo informal e implícito, mas, alicerça-se, sempre, num processo de contínua interação entre um indivíduo pertencente a um determinado sexo e os outros, nos diferentes contextos de vida em que se desenvolve: família, escola, amigos, etc. É nesta forma de perspetivar a ES que se inscreve o nosso interesse pelo objeto do presente

estudo

empírico:

o

conhecimento

e

a

caracterização

das

representações sociais expressas nos discursos dos pais sobre a sexualidade dos seus filhos adolescentes. A

sexualidade

tanto

pode

constituir

uma

forma

privilegiada

de

enriquecimento pessoal e relacional como, pelo contrário, tornar-se numa fonte de sofrimento que afeta dramaticamente toda a vida pessoal e relacional do ser humano (GOMES, 1992). A ES começa, então, com a vida relacional do ser humano. A qualidade das relações precoces que o bebé estabelece com os pais, primeiras e mais importantes figuras de vinculação, vai mediatizar a sua sexualidade ao longo de toda a vida. Com a vida relacional, inicia-se também o desenvolvimento psicossexual que vai conferir sentido, forma e energia à sexualidade. Uma das fases cruciais desse desenvolvimento psicossexual, sejam quais forem as características do indivíduo, é a adolescência. Com efeito, durante esta fase ocorrem inúmeras mudanças e colocam-se igualmente inúmeras questões relativas à sexualidade e a outras áreas com ela intimamente relacionadas, tais como a dependência-autonomia, a aceitação pelos pares, o sentido de competência, a definição de valores e a construção da identidade. É importante que os pais reajam a estas mudanças nos filhos com reconhecimento e 252

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adaptação, introduzindo algumas alterações nas relações familiares e no estilo de interação. É essencial que aceitem a separação, o processo de autonomia do filho, ajudando-o no dia-a-dia a integrar a informação e a experiência necessárias para aceder à vida adulta. Ora, sabe-se que nem todos os pais têm a mesma facilidade em realizar estas tarefas adaptativas, todas elas de alguma forma associadas às questões da sexualidade do filho adolescente. Em especial alguns pais terão mesmo uma dificuldade acrescida em lidar com as questões mais relacionadas com a sexualidade. Nascimento e Romera (1999, p. 238) referem que as pesquisas sobre educação sexual e adolescência são unânimes em apontar que: “Os adolescentes afirmam, que os pais dão informações insuficientes, possuem reações negativas quando têm cenas de sexo na tv e relatam que gostariam que os pais fossem mais abertos. Os dados revelam que os pais desconhecem a vida sexual ativa dos seus filhos adolescentes, especialmente das filhas”. Para além das atitudes positivas e/ou negativas que possam apresentar face ao desenvolvimento da sexualidade dos seus filhos, os pais apresentam receios em relação aos comportamentos sexuais dos mesmos. A maioria dos pais teme a possibilidade de uma gravidez indesejada mesmo sabendo que os seus filhos têm acesso aos métodos anticoncecionais, com medo de não os saibam usar corretamente, ou que não os tenham disponíveis no momento de uma relação sexual. É na fase da adolescência que muitas famílias poderão sentir-se desconfortáveis e não preparadas para responder às exigências dos seus filhos adolescentes, por se acharem inábeis intelectualmente e/ou emocionalmente para orientar, conduzir, informar e direcionar sobre a sexualidade nas suas diferentes dimensões. As representações que os pais elaboram sobre a vida afetivo-sexual dos seus filhos, determinam e legitimam as orientações e os comportamentos que estes assumem em relação às manifestações desta. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

253


Todas as interações humanas que brotem da relação entre duas pessoas ou entre dois grupos pressupõem representações. No entanto, para que exista representação social é necessário que se opere uma mudança interna e mental sobre as próprias pessoas e que influencie o comportamento do indivíduo participante dentro de uma coletividade. É elemento predominante no processo mental individual, sendo essa representação o produto das nossas ações e comunicações, quase objetos materiais (MOSCOVICI, 2003). 20.2. METODOLOGIA A utilização do discurso dos pais como fonte e processo para conhecer as representações que estes constroem sobre a sexualidade do adolescente, implicou a opção por uma metodologia qualitativa. Para a a análise dos discursos recorreu-se à fundamentação teórica da Representação Social. O instrumento escolhido para a recolha dos dados foi uma entrevista semiestruturada, constituída por duas questões. As entrevistas foram aplicadas aos pais dos adolescentes do 3º ciclo do ensino básico, de três agrupamentos de escolas do concelho de Vila Nova de Gaia. As entrevistas, e consequente a colheita de dados, ocorram num período de três meses (Setembro a Novembro de 2011).

20.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os participantes do estudo foram catorze pais de alunos adolescentes, matriculados no 3º ciclo do ensino básico dos três Agrupamentos de Escolas de Vila Nova de Gaia, na maioria do sexo feminino (10 em 14), com idades compreendidas entre os 33 e os 52 anos, sendo que a média é de 42 anos de idade. Dos adolescentes alvo de estudo, ou seja, dos que frequentam o 3º ciclo do ensino básico, nove são do género feminino e 5 do masculino, o que traduz uma média de 64% e 36%, respetivamente. Dos pais participantes neste estudo 254

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três possuem Licenciatura, um Bacharelato, dois o 12º ano, um o 11º ano, três o 9º ano, três o 6º ano e um o 5º ano de escolaridade. Na análise dos discursos dos pais podemos, assim, constatar que emergem duas dimensões, consideradas por nós como que os núcleos preponderantes do nosso estudo: compreensão da sexualidade dos filhos adolescentes e a comunicação. Assim, fazendo a transcrição de alguns discursos dos pais, destacamos os principais resultados obtidos: para os pais, a sexualidade é o amadurecimento e as transformações que ocorrem na adolescência pelas mudanças no corpo, na busca da identidade e personalidade: “Começa por um composto de transformações físicas…. A partir de uma certa idade o nosso corpo transforma-se, as hormonas andam ali um bocadinho …” (E7) “…engloba a parte física, a parte biológica, a parte social, a parte humana, portanto, a sexualidade é um todo que está dentro de nós e também temos que desenvolver, aprendendo alguns conceitos e regras…”(E13). Este entendimento vai ao encontro da literatura atual, que dá ênfase à compreensão dos pais sobre a relação do desenvolvimento da sexualidade e as transformações do adolescente, especialmente, as marcantes modificações anatomo-fisiológicas

que

ocorrem

no

corpo

dos

adolescentes

e

são

acompanhadas de mudanças de sentimentos e atitudes. Crescer e amadurecer são os termos que mais se enquadram quando retratamos o período da adolescência; a representação da sexualidade para os pais deste estudo, não se circunscreve ao corpo, é, fundamentalmente, um apelo à relação em

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termos de personalidade, o que engloba, evidentemente, as diferenças sexuais: “… é o afecto que há entre pessoas…” (E1) “…não é só sexo, (…) tem a ver com a parte íntima da pessoa a nível de amor, a nível de carinho…”(E2) Entendem a sexualidade, como mais do que o ato sexual, uma vez que envolve amor, carinho, o toque, e o envolvimento entre as pessoas que se expressam e se percebem como homens e mulheres, o que vai ao encontro do que a literatura apresenta; Para estes pais, o respeito quer aquando do diálogo sobre sexualidade quer nas relações interpessoais, é um valor necessário e obrigatório e que não deve ser menosprezado, deve estar em constante evolução: “…Eu acho que devem respeitar o outro acima de tudo e respeitarem-se a eles mesmos porque estão a passar pela fase de alteração de hormonas, de vontades, de desejos, mas também têm que respeitar os desejos do outro e acho que isso é muito importante.”(E7) “…está-se a valorizar menos a intimidade da relação, estamos numa sociedade cada vez mais imagética, e cada vez a aparência, o look e o prazer imediato estão a valorizar-se em detrimento de valores e de uma relação mais profunda e de longo termo, estamos todos a fazer corridas de 100 metros e menos a fazer maratonas…a sexualidade deve ser uma coisa para trabalhar a longo prazo, ser fruto de uma relação mais íntima, mais perene.” (E12) Assim, o exercício da sexualidade, à semelhança de qualquer outro comportamento, é condicionado pelas atitudes e, por consequência, por valores, não podendo, por isso, ser visto exclusivamente como componente biológica, mas sim, envolta em processos sociais que se encadeiam com a idade;

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A

representação

da

sexualidade

por

parte

dos

pais

está,

simultaneamente, associada à genitalidade, e ao ato sexual, revelada pelas expressões: parte sexual, sexo, relações sexuais e por inerência aos riscos que lhe estão associados: “…também a parte sexual mesmo propriamente dita.” (E2); “…tem a ver com o sexo, com as relações sexuais, entre um homem e uma mulher” (E3). A relevância da sexualidade “no sexo”, nas relações sexuais, e nos seus componentes, como o prazer, o desejo e a maneira de ver e fazer sexo, talvez suceda devido aos movimentos de liberdade sexual, veiculação da comunicação social; Para os pais do nosso estudo, a representação social das relações sexuais na adolescência está ancorada nos receios, porque representam a possibilidade de ocorrência de uma gravidez indesejada e de transmissão de infecções sexuais, como reflexo de práticas sexuais desprotegidas: “…meter-se em qualquer aventura desse género, sem os conhecimentos que deverá ter para entrar numa aventura dessas, por exemplo a primeira vez…, a relação sexual…; e tenho medo porque ela pode engravidar…” (E1) “São os habituais, as doenças sexualmente transmissíveis e uma gravidez não desejada na adolescência…”(E12) De acordo com a literatura da área, apesar de os jovens serem sexualmente ativos cada vez mais cedo, na maioria das vezes este ato não é acompanhado de medidas contracetivas, dando suporte à preocupação dos pais no que se refere às relações sexuais dos seus filhos.

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A representação da sexualidade em função do género foi evidenciada na maior facilidade dos pais abordarem esta temática com os rapazes e, principalmente, através da maior preocupação com a ocorrência de gravidez indesejada com as raparigas: “…é muito nova para andar com rapazes…, penso que se fosse um rapaz era mais fácil… se fosse rapaz não havia o problema de engravidar… os rapazes usam o preservativo e pronto, não precisam de se chatear com mais nada. As raparigas são diferentes.” (E3) “…resguardamos mais a nossa filha, por ser menina. Os conselhos para os rapazes já são diferentes…, aos rapazes dá-se mais liberdade…, até porque ela pode aparecer grávida, e o rapaz não…São coisas diferentes.” (E5) As orientações e os comportamentos que os pais assumem em relação a todo o desenvolvimento da vida afetivo-sexual dos seus filhos espelha-se, assim, na representação que os pais fazem relativamente à sexualidade, repercutindo-se na própria educação sexual. A representação da sexualidade diferenciada segundo o género ficou evidente - a sexualidade masculina foi considerada de mais fácil abordagem. Ao usar certas convenções impostas pela sociedade, os pais mantêm um modelo educacional preso às diferenças anatómicas entre homens e mulheres, constituindo motivo para desigualdades de direitos, da autonomia e do próprio exercício da sexualidade. A questão do género e da sexualidade sempre esteve presente no processo educacional, onde desde pequenos somos conduzidos a agir de maneira diferente quando relacionamos o sexo feminino e masculino, conservando a reprodução de papéis masculinos e femininos. A respeito da comunicação/relação entre pais e adolescentes, a representação social da comunicação parental está ancorada na dificuldade, no desconforto e na não preparação para falar de sexualidade: 258

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“…aliás eu fui a que estive sempre presente, não o pai… está mais ligado à parte da profissão dele e não quer saber do resto.” (E2) “ … alguma coisa que veja numa revista, alguma coisa que veja na televisão, ou até alguma situação que se passe na escola, até em plena aula… estou sempre que aparece uma situação aproveito e falo” (E8) Tal como sugerem os estudos da área, a família tem um papel basilar na construção

da

sexualidade

e

constitui-se

um

contexto

privilegiado

no

desenvolvimento de atitudes e crenças, contudo, enquanto fonte de informação, a família apresenta um papel mais reduzido. Salientamos, também, o papel privilegiado da mãe na comunicação sobre a sexualidade derivado da natureza da sua relação com o filho adolescente, pelo seu maior envolvimento com o quotidiano dos adolescentes, em que assume não só o papel de autoridade, agindo como disciplinadora, mas também de conselheira, confidente dos filhos que partilham com ela as suas experiências. Quando se trata de comunicar, a conversa entre pais e filhos é mediada com recurso a estratégias externas e informativas, através de livros ou programas televisivos para que a (in)formação seja transmitida, ou seja, o diálogo é introduzido e veiculado com um carácter mais informal; a representação da sexualidade por parte dos pais está associada à relação de pares: “Apesar de não ter dificuldade no diálogo, ele de certa forma é que tem dificuldade. Acho que ainda não encontramos aquele meio-termo onde ele sinta à vontade para falar de terminados tipo de coisas, e nós também, eu principalmente porque estou mais tempo com ele, não sei até onde se deve forçar…O único receio é, eventualmente de ele vir a falar com pessoas, com os amigos que não podem vir a ajudar muito ou que o ajudam da forma errada” (E10)

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“ … tenho sempre muito medo que os meus filhos aprendam pelos outros…todos juntos…”(E11) Por um lado, existe a dificuldade e o desinteresse dos jovens em procurar estabelecer o diálogo e escutar os pais, e por outro lado há o constrangimento dos pais para falar sobre o tema, reconhecendo, também, que os filhos preferem conversar com os amigos. Com o despertar da personalidade, o adolescente tem a necessidade de se auto-afirmar e se diferenciar, e, por isso, insurge-se contra a autoridade e os representantes do mundo adulto, como os pais e os educadores. Por isso, é importante recordar que o papel do educador não se limita a informar e auxiliar a construção de conhecimentos, mas, deve representar-se como um agente de socialização, de modo a facilitar o processo de transição da adolescência para uma cidadania adulta.

20.4. CONCLUSÕES O estudo da sexualidade na adolescência inscreve-se no processo de desenvolvimento do adolescente, exige uma avaliação global rigorosa de todos os comportamentos, atitudes e valores, cuja finalidade será a obtenção de dados necessários a uma intervenção eficaz dos pais, professores e técnicos de saúde, suscetível de desenvolver, no jovem, a capacidade para agirem autonomamente, assumindo opções conscientes e responsáveis nos diversos contextos da vida, manifestando respeito pelos outros que com eles interagem. Torna-se pertinente e até urgente desenvolver projetos de intervenção no âmbito da educação sexual, de forma estruturada e intencionada, em contexto escolar, para promover uma atitude positiva face à sexualidade e permitir a aquisição efetiva de conhecimentos e de competências que favoreçam atitudes e comportamentos responsáveis face à sexualidade. Em relação à sexualidade, podemos dizer que se trata de um tema que perpassa toda a vida dos indivíduos,

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em todas as fases do desenvolvimento e de diversos modos, exigindo uma abordagem interdisciplinar ao ser trabalhada na educação em saúde.

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Similares:

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21. ALTERAÇÕES EMOCIONAIS DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: CONHECER PARA PREVENIR Júlia Magalhães*; Maria Isabel Santos**; Neide Feijó*** *Enfermeira Especialista em Enfermagem Comunitária; UCCÂncora – ACES Grande Porto VIII - Gaia; enfjuliamagalhaes@gmail.com **Enfermeira Especialista em Enfermagem Comunitária; UCCÂncora – ACES Grande Porto VIII – Gaia; misabelljsantos@gmail.com ***ESS J Piaget/VNG; nfeijo@gaia.ipiaget.org

RESUMO A gravidez na adolescência pode definir-se como a gestação precoce ocorrida no início da vida reprodutiva e fértil, num período de dependência económica dos pais. Trata-se de um problema biológico, mas também social e comunitário. Traçou-se como objetivo deste trabalho conhecer quais os sentimentos dos adolescentes perante a gravidez na adolescência e como finalidade contribuir para o aumento do conhecimento na área e uma melhoria na prestação de cuidados a este grupo. Optou-se por uma análise qualitativa dos dados, obtidos através de uma entrevista semiestruturada. A análise dos discursos teve por base a teoria das representações sociais. A amostra é constituída por 16 indivíduos, com idades entre os 13 e 17 anos, com uma média etária de 15,1 anos, que frequentam um de três agrupamentos de Escola de Vila Nova de Gaia. Da análise dos discursos emerge o sentimento de pena, o julgamento social, da escola e dos pares, o afastamento dos colegas, o abandono escolar, as dificuldades em cuidar do bebe e em manter a relação com companheiro.

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Em relação aos motivos da gravidez, a maioria dos discursos refere que a gestação na adolescência não é planeada. O entendimento que os jovens possuem sobre a gravidez na adolescência representa a realidade coletiva do seu meio. Assim sendo, os profissionais de saúde e outros envolvidos, como os educadores, devem ser profundos conhecedores destas questões para estarem preparados para atuar de forma assertiva na promoção da saúde dos adolescentes incluindo a educação para a sexualidade.

Palavras-chave: gravidez na adolescência, alterações emocionais, educação para a sexualidade 21.1. INTRODUÇÃO A gravidez na adolescência pode definir-se como a gestação ocorrida no inicio da vida fértil e capacidade reprodutiva da jovem. Caracteriza-se ainda por ter lugar num período de vida onde existe uma total dependência económica da adolescente gestante dos pais e família parental. A sexualidade tem sido cada vez mais vista e analisada numa perspetiva que vai para além da mera necessidade reprodutiva. Trata-se de uma forma de realização do corpo e do espírito, que envolve muitos mais aspetos que a genitalidade. A aceitação da sexualidade como global leva facilmente à compreensão que o relacionamento sexual é uma partilha de intimidade, comunicação e proximidade com o outro. A procura de um relacionamento sexual e a sua concretização pode ser uma forma de afirmação de masculinidade e feminilidade, bem como de teste do

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poder de sedução de que é capaz. Uma interação sexual livre e consentida implica vontade de partilha e troca de sentimentos, sensações e de prazer. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define sexualidade como: “…uma energia que nos motiva para procurar o amor, contacto, ternura e intimidade; ela integra-se no modo como nos sentimos, nos movemos, tocamos e somos tocados; é ser-se sensual e, ao mesmo tempo, ser-se sexual; ela influência pensamentos, sentimentos, acções e interacções e por isso influência também a nossa saúde física e mental. (OMS citada por FRADE, MARQUES, ALVERCA e VILAR, 2001, p. 16) Apesar de inerente à vida, a convivência social, implica que existam regras que a controlem, assim, as atitudes e valores relacionados com a sexualidade são uma criação e imposição social, cultural, religiosa e familiar, sem esquecer a veiculação de conceitos e ideias nos contextos escolar e dos meios de comunicação. A sexualidade assume um papel de relevo na nossa vida, motivo que justifica que a sua compreensão e conhecimento sejam alvos de uma cuidadosa reflexão e intervenção social (YOUNG [et al.], 1995). Educar

para

a

sexualidade,

implica

aceitar

que

é

um

trabalho

multidisciplinar e partilhado. (FRADE [et al.], 1996; SERRÃO e NUNES, 1998). A educação sexual deve assim proporcionar a aquisição de conhecimentos adequados

e

fundamentados,

assim

como

facilitar

a

compreensão

da

sexualidade humana nas vertentes biológica, psicológica, social, assim como do papel sexual e de género, ajudando a criança ou adolescente a construir e vivenciar relações interpessoais satisfatórias (PRAZERES, 1998). Definir adolescência não é, contudo, uma tarefa fácil, opta-se pela definição da OMS (1984) que se reporta à adolescência como o período de vida que medeia

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entre os 10 e 19 anos e caracteriza-se pelas seguintes fases do desenvolvimento humano: • Aparecimento dos caracteres sexuais secundários de maturação sexual; • Evolução dos processos psicológicos e de identidade da fase infantil para a fase adulta; • Passagem de uma total dependência económica para uma mais relativa. As vivências neste período são muito importantes para a vida adulta e podemos falar da adolescência como um período de interregno, de experiência e preparação para a vida adulta. Na adolescência a sexualidade surge com um forte impulso sexual voltado para a experimentação e concretização sexual, sendo uma fase onde aumentam as gravidezes não desejadas e precoces, as infeções sexualmente transmissíveis (IST’s), a violência sexual, a coação sexual e o aborto (VILELAS, 2009). O desenvolvimento físico e sexual dos adolescentes tem vindo a manifestarse cada vez mais cedo (WIN [et al.], 1995). Estudos realizados (NODIM, 2001 e VASCONCELOS, 1998) mostram que 23% da população jovem inicia-se sexualmente antes dos 16 anos e 80% dos jovens entre os 18 e 25 anos já tiveram relações sexuais. Portugal, apresenta-se como o segundo país da União Europeia com taxas de gravidez na adolescência mais elevada, acompanhadas de uma forte incidência de abortos clandestinos e IST’s (VILELAS, 2009). Tendo como objetivo conhecer os sentimentos dos adolescentes face à gravidez na adolescência, optou-se pela análise dos discursos recorrendo à Teoria das Representações Sociais, na medida em que ajuda na compreensão de como a sociedade vê determinado aspeto.

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21.2. METODOLOGIA Trata-se de um estudo qualitativo, através da análise dos discursos dos entrevistados apoiada na Teoria das Representações Sociais, tendo usado como instrumento para a recolha dos dados foi a entrevista semi-estruturada. A metodologia escolhida é de cunho qualitativo, carácter compreensivo, onde se pretende conhecer e descrever de forma profunda os sentimentos, crenças e valores dos adolescentes face à gravidez precoce. A complexidade dos sentimentos, crenças e relações humanas é de tal forma intrincada que justifica uma análise qualitativa, onde o investigador pode permitir aos sujeitos uma liberdade de discurso, e uma riqueza de explanação de conceitos que seria dificultada com a análise quantitativa. No que respeita à amostra, é constituída por 16 entrevistados, com idades compreendidas entre os 13 e os 17 anos de idade, com uma média etária de 15,1 anos. No que respeita ao género, 68,75% da amostra é do género feminino, representando cerca de 2/3 do total dos entrevistados (n=11), o género masculino corresponde a 31,25%. Em relação ao ano de curso, abrangeram-se alunos a frequentar os anos letivos desde o 5º ao 12º ano.

21.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os aspetos emocionais estão intimamente relacionados à compreensão global que os adolescentes possuem da gravidez precoce, no entanto, para dar cumprimento ao objetivo proposto, procurou-se fazer a reconstrução do discurso coletivo e identificar essa dimensão específica. A adolescente grávida é visualizada de forma predominantemente negativa, como alvo de julgamentos sociais.

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Da análise dos discursos surgem as categorias:

O sentimento de pena é predominante O principal sentimento dos jovens relativamente à gravidez na adolescência foi o de pena, ou seja, o adolescente que engravida é digno de pena por parte dos seus pares, como se percebe pelas citações: “A primeira coisa que sinto é pena.”(E1) “Acho que uma mistura de pena e compaixão.” (E15) Este sentimento, que pode parecer positivo e uma manifestação de empatia para com o outro, também pode ser uma forma de manifestar superioridade perante alguém que se encontra em situação inferior ou pior. É um sentimento que aparece imbuído de algum julgamento.

A gravidez na adolescência não é inevitável A gravidez na adolescência ocorre por negligência A gravidez na adolescência é “fruto do acaso” A gravidez não é considerada como inevitável, mas como uma ocorrência escusável, que tem lugar por negligência dos intervenientes ou por “azar”, como se percebe pelas expressões: “Estúpida (…) Temos demasiada informação para que engravide, sem que se deseje…”(E3) Assim, por um lado percebe-se a presença do “pensamento mágico”, presente nesta etapa de desenvolvimento, que os leva a atribuir um acontecimento indesejado ao “azar” ou “falta de sorte”. Mas, também se percebe E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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o julgamento e a crítica perante aquele que engravida e que permitiu que tal acontecesse, não tomando as medidas preventivas necessárias. Os adolescentes consideram que existe negligência, uma vez que os jovens ao manterem relações sexuais sem uso de contraceção estão a ser inconsequentes e a colocar-se em risco de uma gravidez indesejada, como referem nos discursos: “Ninguém que tenha dois palmos de cabeça engravida com esta idade por querer.”(E16) Pelas características inerentes à adolescência, um jovem pode ter dificuldades em perceber que os conhecimentos que detêm possam ser diferentes dos conhecimentos que outros jovens têm sobre a mesma temática. Esta situação está tão mais presente, quanto mais novos são os adolescentes, com o avançar da adolescência e do desenvolvimento cognitivo, o adolescente, mais velho, começa a conseguir colocar-se no lugar do outro.

A sobrecarga da mãe adolescente é a principal consequência Também, a sobrecarga feminina surge como uma consequência da gravidez precoce, sendo referido de forma transversal em todos os discursos. A ideia que ainda está, socialmente, muito enraizada é que é do foro feminino o cuidado ao bebe, o que facilita, de certo modo, a desresponsabilização da figura masculina nestas tarefas, como se lê nas entrevistas “…porque acaba sempre por ser a rapariga que mais sofre, o pai acaba só por dar o nome e pouco mais.”(E3)

O abandono do companheiro é frequente Os adolescentes acreditam que é frequente que o companheiro abandone a adolescente grávida. Este abandono, muitas vezes, está relacionado com uma 268

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imposição familiar. A família da rapariga tenta afastar da filha aquele que considera como culpado de toda a situação, enquanto a família do rapaz, o persuade a afastar-se pela razão inversa. A ideia do abandono pelo companheiro está patente nas expressões: “Mas acho que na maior parte das vezes os pais dos bebés deixam as raparigas grávidas e partem para outra, não estão para assumir as responsabilidades.”(E5)

O julgamento social da família, pares e professores é inevitável A adolescente grávida é alvo de julgamento por parte dos pais, professores e pares, em consequência a grávida adolescente vê-se marginalizada por parte dos seus conviventes. Um dos motivos deste julgamento prende-se com o que a gravidez revela, e que é precisamente a sexualidade dos adolescentes, como se percebe pela citação: “Tenho pena porque vai passar por muito, pelas críticas dos pais, professores, colegas e até do namorado (…) porque parece que toda a gente faz sexo e toda a gente fala de sexo mas quando a rapariga engravida é uma Maria vai com todos, o que ate pode nem ser verdade, até pode ser uma rapariga toda atinadinha que teve azar.” (E4) Assim, a gravidez precoce acarreta dois importantes aspetos, por um lado impõe a confrontação com o facto dos adolescentes vivenciarem a sexualidade e manterem relações sexuais e por outro implica que a sociedade, família, escola e até os pares reflitam sobre a sua responsabilidade no acontecimento e no que estaria ao seu alcance para evitar a ocorrência desta situação.

Pode ocorrer o afastamento da escola e dos amigos

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Se a gravidez dificulta a frequência escolar e o relacionamento com os pares, o nascimento do bebe, acaba por trazer mais dificuldades, porque as exigências do recém-nascido dificultam a disponibilidade temporal para as tarefas escolares, particularmente se existirem poucos apoios familiares, como se percebe pela expressão: “Normalmente deixam a escola, os amigos, os colegas da escola, ninguém as quer para trabalhos de grupo…Os amigos também se afastam, porque às vezes são aconselhados pela família com medo das más companhias.” (E10).

A vida da adolescente é modificada As alterações decorrentes da gravidez impõem uma modificação na vida do adolescente, não de cariz temporário, mas permanente, uma vez que a parentalidade é uma transição irreversível. Esta ideia é corroborada pelas expressões: “A vida deve mudar e de certeza que para pior.”(E13) “Claro que é uma vida que se modifica para sempre…Acho que a vida muda em todas as dimensões.” (E10)

Nas dificuldades é necessário contar com o apoio da família O afastamento dos pares ocorre de forma bilateral, porque existe uma disparidade de interesses entre a adolescente grávida/mãe e os pares, o que facilita um afastamento cada vez maior. Assim, o somatório destas situações leva a que a família seja identificada, como a mais importante, ou mesmo única fonte de apoio do adolescente que engravida; apoio a nível financeiro, mas também nos cuidados ao bebe e até para 270

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a possibilidade de continuação do percurso escolar. Este apoio familiar é referido nos discursos: “Um bebé deve exigir muito da mãe. Também não me parece que alguém da minha idade ou mais nova que eu tenha condições para ter e cuidar de um filho sozinha” (E16).

A gravidez na adolescência é um sinónimo de dificuldades A gravidez nesta faixa etária é perspetivada como acarretando muitas dificuldades e obstáculos, que implicam que a adolescente cresça demasiado depressa para que seja capaz de assumir as responsabilidades da parentalidade: “…não vejo nenhuma vantagem, pelo contrário só traz dificuldades e desvantagens.” (E7) “Facilidades devem ser poucas…” (E15)

As principais intenções para que ocorra a gravidez na adolescência: A gravidez é vista como meio de conseguir independência da família; A gravidez como tentativa de solidificação da relação com o companheiro. Os adolescentes não consideram que a gravidez na adolescência seja desejada. No entanto, apontam duas razões para o caso dela ser planeada, por um lado a gravidez pode ser uma forma de conseguir independência da família e por outra, como modo de sedimentar a relação com o companheiro. A falta de metas e objetivos a médio e longo prazo podem tornar a gestação apelativa, na medida em que os adolescentes veem nesta uma forma de emancipação familiar e um caminho para construir uma relação mais duradoura com o companheiro, como se observa nos discursos pelas expressões: E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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“Às vezes quando engravidam podem sair de casa e ir viver com o namorado e serem mais independente.”(E14) “Se calhar a gravidez é uma forma de sair de casa, de enfrentar a família…”(E13) A gravidez pode também ser vista pelo adolescente grávido, como uma hipótese de fuga da realidade familiar, quando este vive num meio que lhe é adverso. No entanto, os próprios adolescentes não acreditam no sucesso desta tentativa, como se vê: “…não sei talvez possa ser intencional para agarrar o namorado… A gravidez é uma forma para… prender o namorado ou namorada.”(E13).

21.4. CONCLUSÕES A grávida adolescente é digna de pena, mas também é alvo de julgamento, por parte de todos os que com ela convivem e em alguns casos de abandono pelo companheiro. Na maioria dos casos, a gravidez, não é desejada, ou pode ser baseada em perspetivas irreais da parentalidade. É consensual que a gravidez nesta etapa de vida modifica de forma irreversível a vida, mas quando existe apoio familiar, social e comunitário é possível estabelecer metas e objetivos futuros. A

gravidez

na

adolescência,

planeada

ou

não,

acarreta

sempre

consequências a nivel pessoal, familiar, económico e social. Estas não se centram apenas no adolescente e companheiro, mas repercutem-se no bebe e nos cuidados ou não de que é alvo. Dotar os adolescentes de ferramentas para viverem uma sexualidade plena e feliz é um caminho inevitável e essencial para que se possam diminuir as gravidezes precoces indesejadas e desmistificar e desconstruir as ideias erradas da parentalidade 272

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Um investimento na educação sexual precoce é uma das formas de dotar os adolescentes de capacidade para viveram uma sexualidade plena sem antecipação de planos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Frade, A. [et al.] (1996) Educação Sexual na Escola – Guia para Professores, Formadores e Educadores. Lisboa: Texto Editora. Frade, A. [et al.] (2001) Educação Sexual na Escola – Guia para Professores, Formadores e Educadores. Lisboa: Texto Editora.2ª Edição. König, A.B.; Fonseca, A.D.; Gomes, V.L. (2008) Representações sociais de adolescentes primipáras sobre “ser mãe”. Revista Electrónica de Enfermagem,10 (2), p. 405-413 Nodin, N. (2001) Os jovens portugueses e a sexualidade em finais do século XX. Lisboa: APF. OMS - Health promotion: a dicussion document on the concept and principles. SupplementofEuropeNews. 3.Copenhagen.1984 Prazeres, V. (1998) Os adolescentes, Os oceanos e a Saúde. Revista Portuguesa de Saúde Pública. Abril/Junho. Serrão, D.; Nunes, R. (1998) Ética em Cuidados de Saúde. Porto: Porto Editora. Vasconcelos, P. (1998) Práticas e discursos da conjugalidade e da sexualidade dos jovens portugueses. Jovens Portugueses de Hoje – resultados do inquérito 1997. Oeiras: Celta editora. Vilar, D. (2003) Falar Disso. A Educação Sexual nas Famílias dos Adolescentes. Porto: Edições Afrontamento. Vilelas, J.M.S. (2009) A influência da família e da escola na sexualidade do adolescente. Coimbra: Formasau. Winn, S. [et al.] (1995) Knowledge about puberty and sexual development in 11-16 year-old:implications for health and sexual education in schools. Educational Studies,. P. 187-201. Young, I. [et al.](1995) Promover a Saúde da Juventude Europeia. Rede Europeia de Escolas Promotoras de Saúde.

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22. PERCEÇÃO DOS PAIS SOBRE A ADAPTAÇÃO DOS IRMÃOS DE CRIANÇAS COM DOENÇA ONCOLÓGICA Goreti Filipa Santos Marques*; Beatriz Rodrigues Araújo** *Doutoranda do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica do Porto – Enfermeira no IPO do Porto; 964855267, goreti_marques@hotmail.com **Professora Coordenadora, Centro Interdisciplinar de Investigação em Saúde, Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Católica Portuguesa (CIIS, ICS, UCP), 225580000, baraujo@porto.ucp.pt

RESUMO A doença oncológica é um fator stressante para os irmãos saudáveis, e pode levá-los a reações e sentimentos diversos, como depressão, raiva, ciúme, ansiedade e isolamento social. Este estudo tem como objetivo identificar a perceção dos pais sobre adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica. Trata-se de um estudo exploratório, descritivo com uma abordagem quantitativa. Partimos de uma amostra de conveniência, constituída por 67 pais de crianças com doença oncológica, a realizarem tratamento no serviço de pediatria

do

Instituto

Português

de

Oncologia

do

Porto,

no

período

compreendido entre Agosto de 2011 e Janeiro de 2012. Os dados foram recolhidos por um questionário de caracterização sociodemográfica no qual se identificou a perceção dos pais sobre adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica. Da nossa amostra em estudo 24 crianças com doença oncológica são filhos únicos, os restantes 43 têm um ou mais irmãos. A análise da perceção dos pais sobre adaptação dos irmãos à doença oncológica demonstrou duas dimensões: afetiva e mental. Estes resultados são fundamentais para que os enfermeiros possam intervir de forma a fornecer apoio social aos irmãos saudáveis e às suas famílias.

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Palavras-Chaves: Doença oncológica; Perceção dos Pais; Adaptação dos Irmãos; Pais

22.1. INTRODUÇÃO A experiência da doença oncológica é um fator stressante para os irmãos saudáveis, e pode levá-los a reações e sentimentos diversos, como depressão, raiva, ciúme, ansiedade e isolamento social. (Murray, 1999 citado por Caviocchioli, 2005) Os irmãos da criança doente sofrem não só pela doença do irmão como também pela constante ausência dos pais. Deixa de existir espaço para os irmãos. É difícil conciliar o tempo que os pais passam no hospital, devido aos longos internamentos, com a atenção que é necessária dar aos outros irmãos. Muitas vezes, os outros irmãos assumem uma responsabilidade acrescida na rotina diária onde frequentemente estão separados dos pais e sentem que tem de crescer mais cedo (Azeredo, et al., 2004). Um estudo de Cavicchioli (2005) revela que os irmãos da criança com doença oncológica passam a ter mais responsabilidades no domicílio, uma vez que a família passa a exigir mais deles, tendo inclusive de se esforçar para manter o ambiente domiciliar em ordem. Por vezes, os irmãos vêem-se obrigados a tomar uma iniciativa própria para poderem sobreviver, já que estão longe da mãe. O afastamento materno decorrente das idas e vindas ao hospital, quando a criança doente está a realizar tratamentos em ambulatório, os internamentos e reinternamentos frequentes, trazem modificações significativas na vida dos irmãos saudáveis. Ao nível escolar o rendimento dos irmãos saudáveis fica muitas vezes alterado, tirando notas mais baixas, devido à falta de concentração nas aulas e por outro lado, o seu pensamento está votado para o sofrimento do irmão doente e de toda a família.

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Os tratamentos diferenciados pelos pais, perante a criança doente, podem levar os irmãos saudáveis a perceberem que a doença traz benefícios secundários, causando queixas psicossomáticas na tentativa de chamarem à atenção. Nas situações em que existe uma grande proximidade entre os irmãos surgem por vezes quadros depressivos devido ao medo da perda, o que ainda aumenta mais as dificuldades sentidas pelos pais (Azeredo et al., 2004). Os numerosos estudos que têm vindo a ser realizados acerca da adaptação dos irmãos referem que dentro do sistema familiar são eles que apresentam níveis de adaptação mais fracos e maiores necessidades ao nível emocional (Araújo, 2011). Avaliar o impacto de uma doença crónica na família significa assumir o ponto de vista de cada um dos seus membros (pai, mãe, irmãos e outros) ou até mesmo do sistema familiar. A desestruturação familiar pode manifestar-se nos irmãos saudáveis, através do ciúme, tristeza e tendência para o isolamento, uma vez que o irmão doente é o foco de atenção dos pais (Cavicchioli, 2005). O impacto da doença no irmão pode ser sentido de várias maneiras: diminuição da atenção prestada pelos pais e pela separação do irmão durante a hospitalização. (Silva et al., 2002) Em alguns casos a criança com doença oncológica realiza tratamento em centros hospitalares distantes do domicílio, necessitando dos cuidados de um dos pais, que é quase sempre a mãe, o que implica que os irmãos saudáveis fiquem entregues aos cuidados de outros familiares ou amigos. Os pais não são muitas vezes capazes de comparecer em atividades escolares ou a outras solicitações dessas crianças, vendo-se obrigados a direcionar os seus recursos emocionais e financeiros para a criança doente. Desta forma os irmãos vivenciam a saída de casa de duas pessoas da sua família, a mãe e o irmão vêm, também, todas as atenções voltadas para a criança doente e muitas vezes são lhes feitas, 276

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mesmo, novas exigências. Os irmãos poderão assim demonstrar através de inúmeras manifestações o seu mal-estar perante esta nova situação. As atitudes manifestadas por esta criança são um sinal de protesto e um sinal de revolta contra as mudanças de atitude parental e pelas novas exigências que lhe foram atribuídas (Araújo, 2011). A capacidade da família enfrentar esta situação de doença depende dos sistemas de suporte de que dispõe e da sua capacidade de resiliência. Entendese por resiliência a capacidade da família responder de forma mais consistente aos desafios e dificuldades de reagir com flexibilidade e capacidade de recuperação diante os desafios e circunstâncias desfavoráveis (a doença oncológica), tendo uma atitude positiva, otimista, preservando e mantendo o equilíbrio dinâmico (Sória, et al., 2009). Neste contexto, e tendo por base a revisão da literatura, decidimos realizar um estudo com o objetivo de identificar a perceção dos pais sobre adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica.

22.2. METODOLOGIA Trata-se de um estudo exploratório, descritivo com uma abordagem quantitativa. O cenário de pesquisa foi o serviço de Pediatria do Instituto Português de Oncologia do Porto (IPOP).

22.2.1. AMOSTRA Para o desenvolvimento do estudo estabeleceram-se como critérios de inclusão na amostra, pais de crianças e adolescentes até aos 18 anos: (i) com uma doença oncológica diagnosticada há pelo menos três meses; (ii) que tiveram uma experiência prévia de internamento no Serviço de Pediatria do IPOP; e (iii) E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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que se encontrem na fase de tratamento. Como critérios de exclusão consideraram-se pais de crianças e adolescentes até aos 18 anos: (i) em cuidados paliativos; (ii) em situação de pós-transplante, e (iii) em fase de vigilância, ou seja, que já não se encontrem a realizar tratamentos. Partimos assim de uma amostra de conveniência, constituída por 67 pais de crianças com doença oncológica, a realizarem tratamento no serviço de pediatria do Instituto Português de Oncologia do Porto, no período compreendido entre Agosto de 2011 e Janeiro de 2012. O agregado familiar da amostra em média é composto por 4 elementos, e 24 dos pais das crianças com doença oncológica só tinham um filho, os restantes 43 tinham um ou mais filhos.

22.2.2. INSTRUMENTOS Os dados foram recolhidos por um questionário de caracterização sociodemográfica no qual os pais identificaram a perceção adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica. Este questionário identifica ainda embora outra dimensões como a perceção do pais sobre o impacto da doença oncológica ao nível económico, social, conjugal e familiar. Identifica ainda a perceção dos pais sobre as intervenções dos enfermeiros junto da família. Trata-se de um questionário de autopreenchimento, composta por 21 questões, 20 questões fechadas e 1 questão aberta, que permitem ao sujeito assinalar o seu grau de concordância com cada uma delas (se se aplica ou não à sua opinião individual), apresentadas numa escala tipo Likert com cinco posições de resposta.

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22.2.3. PROCEDIMENTOS Após o parecer favorável do Conselho de Administração e Comissão de Ética do Instituto Português de Oncologia do Porto, iniciou-se à recolha de dados. Os participantes da amostra foram informados do objetivo do estudo, foi pedido o consentimento informado individual a cada um dos envolvidos, garantida a confidencialidade dos e acesso aos resultados, Os dados foram recolhidos por questionário de autopreenchimento, junto de 67 pais de crianças com doença oncológica internados no serviço de pediatria do Instituto Português de Oncologia do Porto. Após a recolha os dados foram tratados utilizando o programa Statistical Package for Social Sciences (versão 20,0), foi utilizada a análises dos dados com recurso à estatística paramétrica, cujos procedimentos serão descritos ao longo da apresentação dos resultados.

22.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS No sentido de conhecermos melhor a nossa amostra em estudo, fizemos uma distribuição da mesma no sentido de caracterizamos o lugar que a criança ocupa na família.

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Tabela 1- Caracterização da amostra segundo o lugar que a criança ocupa na família Lugar criança

que

a

ocupa

na

família Frequência

Percentagem

Filho único

24

35,8

Mais velho

17

25,4

Filho entre outros

7

10,4

Filho mais novo

19

28,4

Total

67

100

Da nossa amostra em estudo 24 crianças com doença oncológica são filhos únicos, os restantes 43 têm um ou mais irmãos. A análise dos nossos resultados irá incidir sobre a amostra dos 43 pais.

Validade de Constructo Com vista a conhecer a organização de conteúdos da escala, procedemos à Análise de Componentes Principais (ACP), com recurso à análise fatorial exploratória,

complementada

com

rotação

varimax

dos

seus

principais

componentes, procurando obter fatores com eighanvalue superiores a um e com 280

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coeficientes

de

saturação

superiores

a

0,3.

Nesta

análise

exploratória

encontrámos dois fatores que explicam 61,1% da variância total da escala. A análise do conteúdo dos itens: raiva, ciúme, baixa de rendimento escolar, queixas psicossomáticas para chamar atenção e dificuldade de adaptação à doença, que compõem o fator 1 revelam pertencer à dimensão da afetividade, com uma variância de 41%. O sendo o segundo fator que explica o fator que mais contribui para a explicação da variância (61,1%), revela pertencer à dimensão mental (depressão, isolamento social, sentirem que têm que “ crescer mais rápido”, assumirem as responsabilidades de casa). A consistência interna (alfa de Cronbach) total é de 0,81, o que mostra uma boa fidelidade em todos os domínios. Exploramos também, se existia alguma relação entre as habilitações literárias dos pais e a perceção da adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica. Quando relacionadas as habilitações literárias das mães com a dimensão afetiva, que inclui os itens: (i) raiva, (ii) ciúme, (iii) baixa de rendimento escolar, (iv) queixas psicossomáticas para chamar atenção e dificuldade de adaptação à doença, e com a dimensão mental, que inclui os itens: (i) depressão, (ii) isolamento social, (iii) sentirem que têm que “ crescer mais rápido”, (iv) assumirem as responsabilidades de casa, conclui-se que quanto maior forem as habilitações literárias maior é a capacidade das mães para percecionar as reações de adaptação dos filhos saudáveis em ambas as dimensões. Pelo contrário entre as habilitações literárias do pai e a perceção da adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica, não existe qualquer relação.

22.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Estudamos uma amostra de 67 pais de crianças com doença oncológica, na sua maioria composta por um agregado familiar de 4 pessoas. No entanto, apenas 43 crianças tinham um ou mais irmãos, sendo esta a nossa amostra final E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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para este estudo. Os referenciais teóricos indicam, que a experiência da doença oncológica é um fator stressante para os irmãos saudáveis, e pode levá-los a reações e sentimentos diversos, como depressão, raiva, ciúme, ansiedade, isolamento

social,

queixas

psicossomáticas.

(Murray,

1999

citado

por

Caviocchioli, 2005) Com este estudo prendemos, identificar a perceção dos pais sobre adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica. A análise da fatorial dividiu a escala em duas dimensões, que as agrupamos na dimensão afetiva e na dimensão mental. Esta fusão interpretativa relacionasse com a perceção que os pais, sendo que a dimensão afetiva os inclui: (i) raiva, (ii) ciúme, (iii) baixa de rendimento escolar, (iv) queixas psicossomáticas para chamar atenção e dificuldade de adaptação à doença e a dimensão mental, que inclui os itens: (i) depressão, (ii) isolamento social, (iii) sentirem que têm que “ crescer mais rápido”, (iv) assumirem as responsabilidades de casa. Estas dimensões vão de encontro ao exposto por Azeredo, et al., (2004), em que os irmãos da criança doente sofrem não só pela doença do irmão como também pela constante ausência dos pais. Deixa de existir espaço para os irmãos. Os irmãos da criança com doença oncológica passam a ter mais responsabilidades no domicílio, uma vez que a família passa a exigir mais deles, tendo inclusive de se esforçar para manter o ambiente domiciliar em ordem. Por vezes, os irmãos vêem-se obrigados a tomar uma iniciativa própria para poderem sobreviver, já que estão longe da mãe (Cavicchioli, 2005). A divisão nestas duas dimensões sustentam ainda a ideia do autor, Araújo, (2011), que as atitudes manifestadas por esta criança são um sinal de protesto e um sinal de revolta contra as mudanças de atitude parental e pelas novas exigências que lhe foram atribuídas. No que diz respeito ao nível de escolaridade, as mães com menos habilitações literárias sãos as que percecionam menos reações na adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica, em ambas as dimensões. Pelo contrário, não se verificou qualquer influência entre as habilitações literárias do 282

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pai e a sua perceção sobre a adaptação dos irmãos à doença oncológica. Os dados corroboram a ideia de que a criança com doença oncológica necessita de cuidados de um dos pais, que é quase sempre a mãe que acompanha a criança que realiza tratamento em centros hospitalares distantes do domicílio (Araújo, 2011). Neste sentido, o facto de serem as mães os principais cuidadores, pode explicar a não existência estatística de qualquer influência entre as habilitações literárias e a perceção da adaptação dos irmãos à doença oncológica. As mães com mais habilitações literárias provavelmente conseguem desenvolver uma maior resiliência, o que o que faz com que têm mais perceção sobre as reações de adaptação dos irmãos da criança com cancro.

22.5. CONCLUSÃO Os enfermeiros devem compreender o impacto da doença oncológica na família, nomeadamente no âmbito das suas alterações ao nível dos irmãos saudáveis, como uma maneira de oferecer subsídios para o cuidado de enfermagem. Podendo assim, intervir de forma a fornecer apoio social aos irmãos saudáveis. Os resultados deste estudo permitem-nos identificar a perceção dos pais sobre adaptação dos irmãos da criança com doença oncológica, que a categorização em duas dimensões (afetiva e mental). Estes resultados são fundamentais para o planeamento de intervenções, que visem melhorar a resiliência dos pais das crianças com doença oncológica de forma a ajuda-los a estabelecer mecanismos úteis junto dos irmãos saudáveis que os ensinam a lidar com a situação.

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23.

QUALIDADE

DE

VIDA

DO

DOENTE

COM

ESQUIZOFRENIA

INSTITUCIONALIZADO Filipa João Antunes Costa Lima* *Enfermeira; Casa de Saúde S.João de Deus – Barcelos; filipa.jacl@gmail.com

RESUMO Nas últimas décadas, assistiu-se a grandes mudanças na visão da saúde mental. O estigma social de indiferença que conduziu ao isolamento do doente mental transformou-se no reconhecimento da sociedade sobre a necessidade da sua inclusão no contexto social como forma do seu processo de tratamento. Assim, socialmente a saúde mental foi reconhecida como um domínio da qualidade de vida. Proporcionar a oportunidade de discussão sobre a qualidade de vida no doente esquizofrénico e facultar conhecimentos para investigar e modificar atitudes, com o intuito de melhorar a qualidade das ações desenvolvidas, deverá ser um dos objetivos prioritários a perseguir. O objetivo deste estudo foi conhecer quais as dimensões da Qualidade de Vida mais afetadas no doente com esquizofrenia institucionalizado. Foram avaliadas as dimensões da Qualidade de Vida através do questionário Estado de Saúde SF-36, numa amostra de 70 doentes com esquizofrenia institucionalizados. Os resultados evidenciam diferenças significativas nas dimensões: Função Física, Desempenho Físico e Vitalidade nos doentes com esquizofrenia institucionalizados comparativamente à população normativa.

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As conclusões deste estudo apontam para a necessidade de repensar estratégias para melhorar as dimensões mais afetadas com o intuito de melhorar a Qualidade de Vida do doente com esquizofrenia institucionalizado.

Palavras-Chave: Qualidade de Vida, Esquizofrenia, Saúde Mental

23.1. INTRODUÇÃO A esquizofrenia é uma doença mental crónica que afeta aproximadamente 1% da população mundial, e uma das doenças mais incapacitantes da psiquiatria com um impacto profundo nos indivíduos e nas suas famílias (Skevington et al, 2004). A esquizofrenia é marcada por manifestações psicopatológicas como alterações na perceção sensorial, no juízo de realidade, nas emoções, comportamentos e movimentos. Os principais sintomas deficitários encontrados são: distanciamento afetivo, retração social, empobrecimento da linguagem e do pensamento, diminuição da fluência verbal e vontade, apragmatismo, autonegligência

e

lentificação

psicomotora.

Quanto

aos

sintomas

positivos

destacam–se as alucinações, ideias delirantes, comportamento bizarro, atos impulsivos, agitação psicomotora, neologismo e parafasias (Kaplan et al, 1997 & Dalgarrondo, 2000). Lehman (1996) evidencia a necessidade de encontrar medidas e indicadores adequados que guiem e monitorizem as intervenções em saúde mental. Assim, a qualidade de vida pode tornar-se um indicador importante para monitorizar as intervenções e os progressos dos doentes com doença mental. Proporcionar a oportunidade de discussão sobre a temática da qualidade de vida na esquizofrenia, e facultar conhecimentos para investigar e modificar E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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atitudes e práticas nas instituições de saúde mental, com vista a melhorar a qualidade das ações desenvolvidas, deverá ser um dos objetivos prioritários a perseguir. Diversos estudos foram realizados com o propósito de se poder identificar quais os fatores que influenciam a qualidade de vida dos doentes com esquizofrenia, mas os resultados não são consensuais quer pela diversidade de populações estudadas quer pelas variáveis envolvidas (Souza L.A e Coutinho E.S, 2006 e Narvaez J.M et al, 2008). Têm sido várias as definições e abordagens da qualidade de vida. A Organização Mundial de Saúde definiu qualidade de vida como uma perceção individual da sua posição na vida, no contexto dos valores culturais em que está inserido, em relação com os seus objetivos, expectativas e condicionalismos existentes (WHO, 2002). É um conceito alargado afetado de um modo complexo pela saúde física, pelo estado psicológico, nível de independência, relações sociais e fatores ambientais (WHOQOL Group, 1994). Quando a qualidade de Vida é relacionada com intervenções específicas é utilizada como um indicador nas avaliações clínicas de doenças específicas (Seidl e Zannan 2004). De acordo com Lehman et al (1982), um amplo conhecimento da qualidade de vida dos pacientes pode ajudar na compreensão do impacto das doenças e da assistência à saúde sobre o seu bem-estar geral. Em condições crónicas, a qualidade de vida torna-se ainda mais importante, uma vez que o tratamento não é curativo, como nos casos de transtornos mentais graves e persistentes. Neste sentido, e tendo em consideração que o Instituto S. João de Deus presta cuidados de saúde, com enfoque na vertente da reabilitação, a

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potenciação da qualidade de vida reporta-se aos ganhos alcançados pelos cuidados assistenciais prestados que visam a melhoria da saúde dos indivíduos. De facto, a investigação da qualidade de vida na esquizofrenia tem estudado preferencialmente, a doença em contexto agudo em doentes seguidos em consulta externa, e centrada em variáveis médicas e clínicas, não sendo hoje ainda conhecidos os fatores que afetam a qualidade de vida na esquizofrenia. A

abordagem

terapêutica

a

estes

doentes

envolve

uma

equipa

multidisciplinar de cuidadores, onde os cuidados de enfermagem podem aparecer como elemento potenciador da qualidade de vida, com repercussões a nível biológico, psicológico e social, contribuindo para promoção e manutenção da saúde e aquisição de hábitos de vida saudáveis. Os Cuidados de Enfermagem aplicados à psiquiatria não têm acompanhado a necessidade de investigar e perceber de que forma estes cuidados podem interferir com algumas dimensões da qualidade de vida. De facto, é escassa a investigação acerca da importância dos cuidados de enfermagem no doente com patologia psiquiátrica. Contudo, o problema que nos move nesta investigação é uma preocupação pela qualidade de vida na esquizofrenia do doente crónico institucionalizado, e desta forma, torna-se fulcral entender quais as dimensões da qualidade de vida mais afetadas nestes indivíduos. Outro dos fatores que nos motiva para a realização este estudo prende-se, com a escassez de estudos na temática qualidade de vida e esquizofrenia bem como da inexistência de estudos com a preocupação orientada para a qualidade de vida no doente com esquizofrenia institucionalizado. Conhecer quais as dimensões da qualidade de vida mais afetadas no doente com esquizofrenia institucionalizado, pode traduzir uma necessidade de modificar e adequar os cuidados de enfermagem ministrados no sentido de intervir sobre as dimensões mais afetadas. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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O objetivo deste estudo foi identificar quais as dimensões da qualidade de vida mais afetadas no doente com esquizofrenia institucionalizado.

23.2. METODOLOGIA População: Constituída por 85 utentes institucionalizados na Casa de Saúde S. João de Deus/Instituto S. João de Deus, com diagnóstico clínico de esquizofrenia de acordo com os critérios do DSM-IV. Amostra: recolhida por conveniência com 69 utentes, institucionalizados na Casa de Saúde S. João de Deus/Instituto S. João de Deus, nas unidades de evolução prolongada, com diagnóstico clínico de esquizofrenia de acordo com os critérios do DSM-IV. Tipo de Estudo: observacional, transversal e quantitativo (Fortin, 1999).

23.2.1. PROCEDIMENTO Duração da Colheita de Dados: período de 15 dias. Colheita de Dados: Do material necessário à realização do estudo fez parte o Questionário SF (Short Form) – 36 (Questionário de Estado de Saúde), que foi construído como medida do estado de saúde para representar oito dos conceitos mais importantes de saúde: Função Física, Desempenho Físico, Dor Corporal, Saúde Geral, Vitalidade, Função Social, Desempenho Emocional e Saúde Mental. Critérios de exclusão: Foram excluídos todos os indivíduos que não estavam compensados do ponto de vista clínico e psicopatológico no momento da recolha de dados. Consentimento Informado: Os indivíduos selecionados para o estudo foram informados acerca dos objetivos, propósitos do estudo e conteúdos do ensaio 290

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clínico ficando o registo escrito do seu consentimento livre e esclarecido. Os objetivos deste estudo não violam os princípios da Declaração de Helsínquia. Foi pedido o parecer à Comissão de Ética e este estudo cumpriu o procedimento P02-06 do Sistema de Gestão da Qualidade do Instituto S. João de Deus. Tratamento Estatístico dos Dados: Tratamento através do software de estatística SPSS versão 18.0. Foram verificados os pressupostos da normalidade da distribuição das variáveis e homogeneidade das variâncias com os testes estatísticos Kolmogorov-Smirnov e Leven. Foram comparadas as notas transformadas das dimensões do Questionário SF-36 com os valores normativos para a população portuguesa (Ribeiro, 2005), com o teste T de Student. Foi utilizado um nível de significância de 0.05.

23.3. RESULTADOS Tabela 1- Resultados do teste t-Student para as dimensões de Q.V Dimensões

FF

DF

DC

SG

FS

DE

SM

VT

45,4

58,7

63,7

62,7

71,6

65,7

63,4

50,3

Valores médios

da

amostra

9

Valores normativos Valor de p

8 80,8

7

2 76,6

1 0,00*

8 71,2

5

6 63,7

2 0,01*

0,00*

6 74,2

5 0,57

69,8 4

0,09 8

2

2 66,2

1 0,32

58,7 6

0,08 5

0,00 2*

FF(Funcionamento Físico); DF(Desempenho Físico); DC(Dor Corporal); SG(Saúde em Geral); FS(Funcionamento Social); DE(Desempenho Emocional); SM(Saúde Mental); VT(Vitalidade)

*p<0,05

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A análise da tabela 1, permite verificar que a diferença entre os valores médios

nas

dimensões

da

qualidade

de

vida:

Funcionamento

Físico,

Desempenho Físico, Dor Corporal e Vitalidade, na amostra em relação à população portuguesa são estatisticamente significativos (p<0,05). Por outro lado, não são estatisticamente significativas (p>0,05) as diferenças encontradas dos valores médios nas dimensões da qualidade de vida: Saúde em Geral, Funcionamento Social, Desempenho Emocional e Saúde Mental, na amostra em relação à população portuguesa Para uma melhor visualização dos resultados, foi efetuada a representação gráfica dos mesmos.

Gráfico 1- Representação dos valores médios da escala SF-36 na amostra estudada e os valores normativos para a população portuguesa. 120 Valores normativos População

100 80 60 40 20 0 FF

DF

DC

SG

FS

DE

SM

V

Da análise do Gráfico 1, podemos observar em simultâneo os valores médios das diferentes dimensões do Questionário de Estado de Saúde SF – 36 na amostra estudada e na população portuguesa.

292

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23.4. DISCUSSÃO DE RESULTADOS Ao analisarmos os resultados deste estudo, em termos gerais podemos observar que os indivíduos com esquizofrenia institucionalizados apresentam valores médios inferiores em todas as dimensões da qualidade de vida comparativamente à população portuguesa. Contudo, observando de forma mais particular, podemos constatar que na dimensão Funcionamento Físico, a diferença entre as médias da amostra e da população portuguesa é significativa. Este facto evidencia que, os indivíduos estudados percecionam mais dificuldades e limitações na execução de atividades físicas desde as menos exigentes como: tomar banho ou vestir-se; às mais exigentes como: levantar ou carregar compras, subir vários lances de escadas ou mesmo caminhar. Em relação à dimensão Desempenho Físico podemos constatar que a diferença entre as médias da amostra e da população portuguesa também é significativa. Os indivíduos estudados percecionam limitações na execução das tarefas habituais e necessidade de reduzir a quantidade de tarefas tendo noção da dificuldade em realiza-las. Este fato pode estar relacionado com a fisiopatologia da doença, tendo sido apontadas fortes alterações psicomotoras decorrentes da esquizofrenia (Kaplan et al, 1997 e Dalgarrondo, 2000). Quanto à intensidade e desconforto causados pela dor e a extensão da forma como interfere nas atividades usuais, o que corresponde à dimensão Dor Corporal na escala SF – 36, a diferença entre as médias da amostra em relação à população portuguesa são significativas. Podemos referir que os doentes com esquizofrenia

institucionalizados

apresentam

menores

intensidades

e

interferências da dor nas suas atividades diárias. Este achado pode estar relacionado com o tipo de medicação administrada que pode condicionar a perceção de dor nestes doentes. Não foi possível enquadrar esta afirmação na E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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literatura, uma vez que não foram encontrados estudos que relacionem a medicação com a dor corporal. No que concerne à dimensão Saúde Geral o grupo estudado não apresenta diferenças significativas em relação à população portuguesa. Ambos os grupos percecionam a mesma perspectiva holística da saúde, incluindo não só a saúde atual mas também a resistência à doença e aparência saudável. O facto de estes doentes estarem centrados na sua doença mental em particular e não na sua saúde em geral pode condicionar a sua perceção global de saúde e reconhecendo-a como positiva. Não foi possível sustentar esta afirmação dada a inexistência de estudos que relacionem estas variáveis. Relativamente à dimensão Funcionamento Social a amostra em estudo apresenta semelhanças com a população portuguesa no que concerne à quantidade e à qualidade das atividades sociais. No que diz respeito à dimensão Desempenho Emocional o grupo estudado e a população portuguesa evidenciam dificuldades semelhantes no trabalho ou outras atividades diárias como resultado de problemas emocionais. A dimensão da Saúde Mental inclui questões referentes a quatro das mais importantes dimensões da saúde mental: ansiedade, depressão, perda de controlo em termos comportamentais ou emocionais e o bem-estar psicológico. Entre a amostra em estudo e a população portuguesa não existem diferenças no que concerne a esta Esta constatação pode estar relacionada com o facto de estes doentes participarem em várias atividades ocupacionais e recreativas inerentes ao programa de intervenção promovido pelo Instituto S. João de Deus. Este facto, aliado

ao

relacionamento

interpessoal

com

os

profissionais

de

saúde

(enfermeiros, médicos, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais) e colaboradores (auxiliares, voluntários, administrativos) pode constituir uma 294

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base de relacionamento e interação social capaz de se aproximar dos papéis desenvolvidos na comunidade e por outro lado reduzir estados de ansiedade e depressão

nestes

doentes.

Esta

afirmação

não

pôde

ser

sustentada

bibliograficamente devido à escassez de estudos neste âmbito. Uma outra explicação para este facto, prende-se com os estudos realizados por Alptekin et al (2009), que refere os deficits cognitivos inerentes à esquizofrenia podem influenciar a perceção de alguns domínios da qualidade de vida, especialmente o domínio social. Relativamente aos níveis de energia e fadiga, que corresponde à dimensão Vitalidade os indivíduos da amostra percecionam-se como tendo menos energia e mais cansados em relação à população portuguesa. Esta constatação pode estar relacionada com a fisiopatologia da doença em que alguns autores referem que estes doentes apresentam lentificação motora inerente à patologia (Kaplan et al, 1997 e Dalgarrondo, 2000) ou pela medicação incluída na terapêutica destes doentes que pode condicionar os níveis de energia dos mesmos. Estes resultados revelam-se consistentes entre si evidenciando as maiores diferenças entre os doentes com esquizofrenia institucionalizados e a população portuguesa no conceito de Saúde Física, e particularmente nas dimensões: Funcionamento Físico, Desempenho Físico e Dor Corporal. Nas dimensões que envolvem o conceito de Saúde Emocional observam-se semelhanças entre os doentes com esquizofrenia institucionalizados e a população portuguesa, à exceção da dimensão Vitalidade.

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23.5. CONCLUSÕES As conclusões deste estudo devem ser interpretadas tendo em conta as dificuldades metodológicas e limitações de uma investigação desta natureza. Contudo, a interpretação dos dados obtidos permite desenhar algumas conclusões. As dimensões da qualidade de vida mais afetadas no doente com esquizofrenia institucionalizado estão relacionadas com a Função Física, Desempenho Físico e Vitalidade. No que concerne às dimensões Função e Desempenho Físico, estes indivíduos

percecionam

limitações

e

dificuldades

no

desempenho

de

determinadas tarefas no seu dia-a-dia por razões de saúde. Relativamente à dimensão Vitalidade, estes indivíduos percecionam cansaço, fadiga e falta de energia na maior parte do tempo. A importância das medidas de qualidade de vida é indiscutível em diversos campos da assistência em saúde. Na saúde mental, essa importância é revestida de características próprias, principalmente na assistência a portadores de transtornos mentais graves, como a esquizofrenia. Assim parece evidente a necessidade de investimento dos serviços de saúde mental tendo em vista a adequação das estratégias de intervenção às necessidades destes indivíduos. Estratégias para assistência, promoção e pesquisa sobre Qualidade de Vida, de uma maneira geral devem ser incentivadas e colocadas em prática nas instituições de saúde mental.

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24. ANSIEDADE: BOAS PRÁTICAS EM ENFERMAGEM Natália da Conceição Martins Rodrigues Fernandes*; Rosângela Sebastiana Augusto de Sousa**; Maria da Fé Tavares Carapichoso***; Filipe Daniel Viegas Fontes****; António José Bastos Martins***** *Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar Baixo Vouga - Unidade de Aveiro; Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria; fernandes.natalie@gmail.com **Local de trabalho: Serviço de Medicina II, do Centro Hospitalar Baixo Vouga- Unidade de Aveiro; Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria; rsousa747@hotmail.com ***Centro de Saúde de Aveiro; Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria; mariafecarapichoso@gmail.com ****Departamento de Psiquiatria e de Saúde Mental do Centro Hospitalar Baixo Vouga - Unidade de Aveiro; Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria; filipedfontes@gmail.com *****Departamento de Psiquiatria e de Saúde Mental do Centro Hospitalar Baixo Vouga- Unidade de Aveiro; Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria; mbastosjose@gmail.com

RESUMO A ansiedade acompanha a maior parte das pessoas no processo existencial como um fenómeno adaptativo e necessário para se enfrentar situações do quotidiano. O presente artigo analisa vários estudos sobre a ansiedade em diversos contextos e descreve intervenções em enfermagem orientadas para a melhoria das práticas no âmbito de enfermagem em saúde mental. O objectivo principal é contribuir para elaboração de um manual de boas práticas na ansiedade.

Palavras-Chave: Ansiedade; boas práticas; pessoa; família; enfermeiro.

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24.1. INTRODUÇÃO A ansiedade é um fenómeno humano normal. É considerado patológico quando interfere com o bem-estar geral e a actividade. São diversos os autores que abordam a ansiedade em diferentes perspectivas. Para Augusto (1987), ansiedade é uma experiência psicofisiológica cuja tonalidade emocional e conteúdos cognitivos possuem características semelhantes às da vivência do medo. Este autor reconhece no comportamento humano considerado normal, o papel que a ansiedade desempenha, assumindo um valor de sobrevivência e criatividade. Couto (1990) defende que, ansiedade é como um complexo de emoções que têm como núcleo o medo, ao qual se podem associar outras emoções, como a amargura, a cólera, a vergonha e a culpabilidade e que podem conduzir a múltiplos comportamentos diferentes. Concordamos com Alarcão (1989), na medida em que considera a ansiedade como um fenómeno universal por todos experimentado ao longo das diferentes etapas da vida, que pode ser encarada como a tradução, a nível individual, de uma situação de crise. Assim, podemos considerar a ansiedade como uma resposta do indivíduo a uma situação em que as exigências do meio ambiente ultrapassam os recursos pessoais e em que esta relação é avaliada como ameaçadora para o seu bemestar. Se para alguns autores a ansiedade é considerada uma emoção pelas semelhanças com outros fenómenos de natureza emocional, para outros é vista como uma resposta, considerando que as emoções constituem padrões individuais de resposta psicofisiológica, podendo assim ser entendidos como comportamentos.

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E enquanto profissionais de saúde que lidam diariamente com situações de ansiedade nos diversos contextos, surge a preocupação conjunta em melhorar as boas práticas com base na evidência científica. Assim o objectivo principal compreende: •

Contribuir para a elaboração de um manual de boas práticas na ansiedade.

Para a sua concretização, procedeu-se a uma exaustiva e rigorosa pesquisa bibliográfica em base de dados on-line (B - On, Scielo.br, Google académico), com o intuito de reunir e sintetizar o conhecimento inerente ao tema.

24.2. ANSIEDADE NOS PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM O termo ansiedade provem do grego “Anshein” (Barros 2003), que significa oprimir, sufocar. Angústia ou ansiedades exprimem uma experiência subjectiva e, regra geral, são sempre associados a manifestações de sintomas físicos. Segundo Barros et al (2003), existem dois modos de diminuir a ansiedade: por um lado, lidar directamente com a situação, resolvendo o problema e tentando superar os obstáculos, por outro, fugir das ameaças e criar estratégias. Com o intuito de reconhecer o desconforto emocional das enfermeiras, e ajudá-las a desenvolver mecanismos de enfrentamento mais apropriados, Barros et al (2003), desenvolveram um estudo para delimitar o problema dos níveis de ansiedade nessa classe profissional. O seu objectivo foi identificar situações no dia-a-dia das enfermeiras em contexto de trabalho, que fossem consideradas como fonte geradora de ansiedade e, que estratégias utilizariam para diminuir essa ansiedade. Dos seus resultados, constam o cuidado à pessoa doente, a gestão do serviço, as relações interpessoais com a família da pessoa internada e com a equipa de enfermagem, e o acompanhamento de alunos em estágio clínico. 300

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Daqui concluem que o trabalho da enfermagem parece trazer alguma carga de desconforto emocional. Aparentemente, e segundo os dados recolhidos, as enfermeiras mantêm-se constantemente em estado de tensão classificado como moderado a alto, independentemente de utilizarem algumas estratégias para minimizar tais efeitos, que segundo as autoras, são: ouvir musica, passear, conversar, fazer compras, praticar desporto, brincar com animais, namorar, ir ao cabeleireiro, ir ao cinema e brincar com os filhos. Outros estudos realizados pretendem identificar quais as alterações fisiológicas provocadas pela ansiedade, que fatores a influenciam bem como os sentimentos dos enfermeiros perante tais situações. Os resultados sugerem a necessidade de criar modelos de intervenção, como por exemplo, grupos de apoio e/ou grupos de reflexão para o profissional que lida com esta realidade, pois o sofrimento emocional poderá interferir, não só na sua saúde como também na qualidade dos serviços prestados. Será pertinente a realização de posteriores investigações na área, que viabilizem estratégias de apoio para os profissionais que lidam com pessoas em fase terminal, de forma a contribuir para a prevenção de doenças ocupacionais e para a melhoria da qualidade de vida dos profissionais e da pessoa/família, alvo dos seus cuidados. Faria e Maia (2007) Kang et al (2008) defendem que, alunos de enfermagem no seu processo de aprendizagem devem experienciar níveis de ansiedade elevados como treino de forma a desenvolverem mecanismos lidar com a sua ansiedade, com a ansiedade da pessoa /família e, vida profissional.

24.3. ANSIEDADE NA FAMÍLIA DA PESSOA INTERNADA O internamento em qualquer serviço leva à quebra do vínculo familiar, e consequentemente, ocorrem alterações de papéis devido às perturbações causadas pela doença, sentimentos de medo e insegurança que podem precipitar crises. A comunicação entre os seus elementos pode se tornar distorcida porque E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

301


o medo, a ira e a culpa que a família sente, pode tornar-se demasiado intensa para que consigam lidar com estes sentimentos. Segundo Martins (2003), as famílias numerosas têm maior facilidade em ultrapassar situações de stress, porque têm uma rede de apoio mais extensa. Cada família poderá responder a fontes de stress iguais de forma diferente, pois não têm as mesmas estruturas, nem os mesmos suportes. A falta de informação e a incerteza em que se encontram provocam apreensão e ansiedade. Num estudo realizado por Maruiti et al (2008), foram identificados sintomas de ansiedade e/ou depressão em famílias sujeitas a situações causadoras de stress. A sua conclusão reforça a importância das intervenções de enfermagem direcionadas à família através de programas de treino de aptidões, para melhor compreensão e atendimento neste contexto. Partilhamos a mesma opinião na medida em que a assistência à família, é uma intervenção que requer particular atenção por parte dos profissionais de enfermagem pois, esta pode facilitar ou retardar a recuperação da pessoa. Seguindo esta linha de pensamento, achamos enriquecedor referir o estudo realizado por Luchese et al (2008), cujo propósito é o de identificar as necessidades da família de pessoas com doenças crónicas, internadas num hospital geral e verificar a associação dessas necessidades mediante o perfil clínico e psiquiátrico da pessoa internada. Concluem que as necessidades importantes para a família passam por obter informações que lhes deem segurança independentemente do serviço onde possa estar internado o seu familiar.

24.4. ANSIEDADE NA PESSOA INTERNADA Vários estudos reportam-nos para a existência da ansiedade na pessoa internada. 302

Para

estas

pessoas

a

ansiedade

sentida

é

uma

realidade

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


incontornável. Este fenómeno tem como ponto de partida todas as alterações que surgem na vida, após o internamento. Podemos constatar, que a ansiedade é um dos diagnósticos de enfermagem mais frequentes. No processo de hospitalização a pessoa torna-se vulnerável, mesmo para situações simples. Sente-se só, e o seu pensamento dirige-se para os seus familiares e amigos mais próximos, pois são estes que o vão ajudar na sua recuperação, Flório et al (2003). Filho et al (2008) descreve a vivência do sinistrado e do seu familiaracompanhante

no

contexto

de

internamento.

São

mencionadas

pelos

participantes os sentimentos de ansiedade, tristeza, medo, preocupação, desinformação e desvalorização pelos profissionais de saúde. Perante estas manifestações, os autores consideram relevante que a equipa profissional de saúde tenha uma maior proximidade, desenvolva uma relação baseada na comunicação, informação, escuta activa e que haja um envolvimento no planeamento e efectivação dos cuidados necessários para o sucesso do tratamento. Filho et al (2006) procuram avaliar a influência da avaliação pré-anestésica ambulatória sobre a ansiedade e/ou a depressão nas pessoas com doença oncológica. Desta forma, aplicaram escalas de avaliação da ansiedade e da depressão em dois grupos de pessoas, antes e após a consulta pré-anestésica. Daqui concluíram que os níveis de ansiedade e a sua prevalência foram reduzidos. Seguindo esta linha de pensamento, cabe-nos a nós enfermeiros, intervir perante tais situações, procurando em cada dia cumprir um ritual de boas práticas para que a pessoa se sinta apoiada, valorizada de forma a ultrapassar momentos mais difíceis da vida, tendo como alicerces o Cuidar em Enfermagem.

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303


24.5. BOAS PRÁTICAS As boas práticas dão orientações fundamentais na actividade profissional dos enfermeiros. É através da partilha de conhecimentos, com o objectivo de melhores cuidados, que se caminha para o enriquecimento da saúde e bem-estar da população. Baseados no Manual de Boas Práticas Canadianas em Saúde Mental e Psiquiatria, e, fundamentados na análise de vários estudos científicos, pretendemos reunir um conjunto de intervenções assentes na evidência que contribuam na redução dos níveis de ansiedade. De entre os domínios de competências do enfermeiro especialista de saúde mental e psiquiatria referenciados em tal manual, destacamos: fornecer cuidados profissionais competentes; administrar e monitorizar intervenções terapêuticas; gerir eficazmente situações críticas; intervir através da função ensino/treino; monitorizar e garantir a qualidade das práticas dos cuidados de saúde que levam à prevenção, diminuição ou controle da ansiedade. Cooper (2007), que num dos seus estudos pretendeu sintetizar evidências de intervenções para reduzir a ansiedade em prestadores de cuidados. E concluiu que boas terapias, tais como, a cognitivo-comportamental são necessárias para tratar especificamente a depressão, assim como as técnicas de relaxamento para diminuição da ansiedade. A eficácia do treino do relaxamento muscular progressivo na redução da ansiedade nas pessoas com esquizofrenia aguda, foi provada no estudo de, Chen et al (2009). A bibliografia consultada comprova-nos que a utilização das terapias cognitivo-comportamentais e das técnicas de relaxamento se transformam em boas práticas no dia-a-dia dos enfermeiros.

304

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


24.6. CONCLUSÃO A ansiedade pode não ser considerada uma expressão patológica, mas apenas uma manifestação psicológica. Enquanto enfermeiros especialistas na área da saúde mental, parece-nos de particular interesse abordar a ansiedade como uma síndrome, considerando as componentes que a caracterizam e determinar a origem e a natureza dos estímulos que a desencadeiam. Assim, torna-se fundamental não esquecer a importância de valorizar este tipo de distúrbio, para poder adaptar os nossos cuidados e assim diminuir o impacto dos factores de risco associados, apostando em estratégias eficazes de prevenção. Será pertinente a concretização de outros trabalhos na área que abordem as possíveis boas práticas. Desta forma caminhamos, para que estas medidas simples possam fazer toda a diferença: contribuir para melhores cuidados

de

enfermagem,

diminuir

a

incidência

da

ansiedade

e

consequentemente, diminuir os custos em saúde.

BIBLIOGRAFIA Alarcão, Zilda (1989). O comportamento psicológico do doente oncológico: a componente ansiedade. Divulgação Nº 9, Porto; pg. 4-15. Augusto, Mário de Jesus (1987). Ansiedade: perspectivas clínicas. Parte I. "Psiquiatria Clínica". Coimbra. Vol. 8 (4); pg. 185-194. Barros, Albl, Humerez D.C., Fakin, F.T., Michel, J.L.M. (2003). Situações geradoras de ansiedade e estratégias para o seu controle entre enfermeiras: estudo preliminar. Revista Latino-americana de Enfermagem; Vol. 11(5); pg. 585-92. WWW.eerp.br/riaenf Chen, Wen-Chun; Chu, Hsin; Lu, Ru-Band; Chou, Yuan-Hwa; Chen, Chung-Hua; Chang, Yue-Cune; O’brien, Anthony Paul; Chou, Kuei-Ru (2009). Efficacy of progressive muscle relaxation in reducing anxiety in patients with acute schizophrenia. Journal of Clinical Nursing; Vol. 18, pg. 2187-2196. www.B-on.pt

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305


Cooper, Cláudia; Balamurali, T. B. S.; Selwood, Amber; Livingstone, Gill (2007). A systematic review of intervention studies about anxiety in caregivers of people with dementia. International Journal of Geriatric Psychiatry , Vol. 22; pg. 181 – 188. www.interscience.wiley.com Couto, António de Jesus (1990). Aspectos psicológicos do doente com Sida. Revista Servir, Vol. 38 (5); pg. 211-215. Faria, Daniella; Maia, Eulália (2007). Ansiedade e sentimentos da enfermagem nas situações de terminalidade em oncologia; Revista Latino-americana de enfermagem, Vol. 15 (6). www.Scielo.br Filho, Lidiomar Lemos Magalhães et al. (2006). Impacto da avaliação pré-anestésica sobre a ansiedade e a depressão dos pacientes cirúrgicos com câncer. Revista brasileira de anestesiologia; Vol. 56; pg. 126 – 136. www.Scielo.br Filho, Osvaldo Albuquerque Sousa et al. (2008). Hospitalização no óptica do acidentado de trânsito e de sue familiar-acompanhante. Revista da escola de enfermagem USP; Vol. 42; pg. 539 – 546. www.Scielo.br Flório, Maria Cristina Simões; Galvão, Cristina Maria (2003). Cirurgia ambulatorial: identificação dos diagnósticos de enfermagem no período perioperatório. Revista latino-americana de enfermagem, 2003, Vol. 11 (5); pg. 630 – 637. www.Scielo.br Kang, Yune Sik; Choi, So Young; Ryu, Eunjung (2008). The effectiveness of a stress coping program based on mindfulness meditation on the stress, anxiety, and depression experienced by nursing students in Korea. Nurse Education Today, Vol. 29; pg. 538-543. www.elsevier.com Luchese, Ana Cecília; Citero, Vanessa De Albuquerque; Marco, Maria Alfredo De; Andreoli, Sérgio Baxter; Nogueira-Martins, Luiz António (2008). The needs of members of the families of general hospital inpatients. São Paulo Medical jornal, Vol. 126 (2); pg. 128-131. www.googleacademico.pt Martins, Maria M. Silva (2003). A família, suporte ao cuidar. Sinais Vitais; nº 50; pg. 52 – 55. Maruiti, Marina Rumiko; Galdeano, Luzia Elaine; Farah, Olga Guilhermina Dias (2008). Ansiedade e depressão em familiares de pacientes internados em unidade de cuidados intensivos. Acta Paul Enfermagem, 2008; Vol. 2 (4), pg. 636 – 642. www.Scielo.br Sadock, Benjamin James; Sadock, Virgínia Alcott (2007). Compêndio de Psiquiatria – Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica; 9ª edição; Artmed Editora, Lda – Porto Alegre Serra, Adriano Vaz et al. (1991). Reacções emocionais à doença grave: como lidar. Coimbra: "Psiquiatria Clínica". Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (2009). Manual de boas práticas canadianas em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica. Porto.

306

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25. TÉCNICAS DE RELAXAMENTO: BOAS PRÁTICAS NO SERVIÇO DE MEDICINA INTENSIVA Natália da Conceição Martins Rodrigues Fernandes* *Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria, a exercer funções no Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar Baixo Vouga, E.P.E. Unidade de Aveiro; fernandes.natalie@gmail.com

RESUMO Atualmente, o ritmo e a natureza do trabalho causam pressões na saúde mental e no bem-estar das pessoas, levando a um maior absentismo, desmotivação e desvalorização pessoal, oferecendo mal-estar, incapacidade e baixo rendimento. Será

importante,

que

os

intervenientes

ajam

com

medidas

de

implementação de programas de saúde mental e bem-estar com avaliação do risco, assim como programas de prevenção para situações potencialmente adversas para a saúde mental das pessoas. Neste contexto, e porque sou enfermeira num serviço, onde o cuidado ao doente é deveras preocupante dada a sua situação de risco iminente de vida, cujas características tão diferenciadas, exige de todos os profissionais implicados, uma maior concentração e actuação imediata, acarretando uma grande carga de stress, ansiedade, nervosismo e tensão, optei por implementar um projecto de Promoção da Saúde Mental no local de trabalho: “Técnicas de Relaxamento: Boas práticas no Serviço de Medicina Intensiva”. O principal objectivo compreende, melhorar o bem-estar físico e psicológico dos profissionais que fazem parte da equipa multidisciplinar do Serviço de Medicina Intensiva. Desta forma, e tendo como pano de fundo as boas práticas em enfermagem, as quais dão orientações fundamentais na actividade profissional através da partilha de conhecimentos, realizei 16 sessões de relaxamento, 3 vezes por semana, com a duração de 30 minutos cada, cuja população alvo foram os profissionais do serviço de Medicina Intensiva dum Hospital da zona Centro, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

307


com uma amostra de 25 elementos, Enfermeiros, Médicos e Assistentes Operacionais. Foi aplicado o Questionário de Saúde Geral de 28 itens, antes e após as 16 sessões, ficando excluídos todos os elementos que não tiveram oportunidade de participar. O questionário é a tradução de uma das versões conhecida por “General Health Questionnaire” – GHQ28, validado para a população portuguesa. Aborda Sintomas Somáticos, Ansiedade e Insónia, Disfunção Social e Depressão. Os resultados foram analisados através do programa estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 17. Os resultados evidenciam uma maior percentagem na disfunção social, sintomas somáticos, ansiedade e insónia reflectindo uma grande carga emocional, tensão, fadiga nos profissionais que estão permanentemente sujeitos a um ambiente desgastante, tenso e stressante. Uma boa prática que favoreça o seu bem-estar físico e psicológico refletir-se-á em melhores cuidados prestados, melhores relacionamentos interpessoais, e consequentemente, maiores ganhos em saúde.

Palavras–Chave:

Equipa

multidisciplinar;

Boas

Práticas;

Saúde

Mental;

Relaxamento.

25.1. INTRODUÇÃO Os profissionais de saúde no desempenho das suas atividades confrontamse diariamente com problemas de ordem física, psíquica e social, motivados pelo profissionalismo que lhes é exigido. Mesmo que o local de trabalho seja gratificante pelo facto de providenciar serviços com significado e boas condições físicas, os profissionais não deixam de referir como fonte de stress, a dificuldade em lidar com questões de ordem 308

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


psicológica. É a carga horária, são as situações inesperadas e urgentes, é o lidar com situações emocionais da pessoa doente/família. São os conflitos de papel e o carácter hierárquico, burocrático e especializado. Atitudes pessoais que nem sempre convergem com as dos colegas, superiores, doentes e familiares. A comunicação de um diagnóstico desfavorável ou morte, aos familiares. A falta de profissionais médicos e enfermeiros, que certamente acarretará uma maior sobrecarga, o que leva ao desgaste, reflectindo irritabilidade, impaciência, vulnerabilidade. A alteração dos ritmos biológicos, o trabalho por turnos, alterações das horas de comer e de dormir provoca uma dessincronização dos ritmos circadianos, com implicações fisiológicas, psicológicas e sociais, constituindo uma fonte de desequilíbrio na saúde destes profissionais. Na Unidade de Cuidados Intensivos, dadas as características que apresenta, ruídos

e

vibrações

permanentes

produzidas

por

equipamentos,

fraca

luminosidade, estado do doente grave e instável que requer intervenções rápidas,

torna-se naturalmente,

um

espaço mobilizador

de

emoções

e

sentimentos que frequentemente se expressam de forma muito intensa. Leal (2010) defende como medida preventiva as técnicas de relaxamento, a fim de minimizar os efeitos nocivos do stress que se refletem em insatisfação com a profissão e na sintomatologia que lhe está inerente. Nesta linha de pensamento, o investimento da saúde física e mental dos profissionais é vital para a qualidade e atendimento prestado. Bons relacionamentos interpessoais implicam ambiente favorável ao bem-estar de toda a equipa. Logo melhores cuidados prestados, (Gatti e Silva, 2007). Existem estudos realizados com outros profissionais, que fundamentam a pertinência do tema. Cuidar do educador, é um estudo realizado com professores, no qual foram incluídas as técnicas de relaxamento, no sentido de gerar maior tranquilidade, sentimento de paz e melhoria da auto estima, (Abreu, 2007).

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

309


Um outro estudo realizado com alunos da Universidade sujeitos a exames orais, veio realçar a importância de se aplicarem as técnicas de relaxamento a pessoas sujeitas a grande ansiedade/pressão. Cada participante aprendeu a reconhecer os primeiros sintomas da ansiedade e a utilizar o relaxamento para ativar o sistema nervoso parassimpático traduzindo-se em respostas biológicas de tranquilidade, relatando sensações de calma e bem-estar, (Duarte e Oliveira, 2004). Leoni (1996) citado por Abreu (2007), refere que o profissional de saúde, dadas as características da profissão, tem como principal ferramenta o auto conhecimento.

Este

auto

conhecimento,

para

além

do

auxílio

de

um

psicoterapeuta, pode ser alcançado através das técnicas de relaxamento, como recurso de ampliação da saúde física e psicológica. Assim, oferecer suporte emocional a estes profissionais, incluindo as técnicas de relaxamento, não só preserva a saúde física e mental, como também, oferece uma melhor qualidade na assistência prestada. Neste contexto é possível afirmar que as técnicas de relaxamento oferecem indicações muito simples para ajudar os profissionais de saúde a relaxar e a diminuírem os sintomas de tensão (…). (Monte, 2004). O autor recomenda que sejam incluídos alguns minutos por dia no local de trabalho à prática do relaxamento, para haver maior motivação e melhores resultados finais. Assim, boas práticas na implementação de medidas que visem minimizar estas perturbações nos profissionais de saúde, serão uma mais-valia para promover a saúde e o bem-estar, aumentar a realização profissional, proporcionando bons relacionamentos interpessoais de forma a criar um bom ambiente de trabalho e aumentar o nível de produtividade, sem custos adicionais.

310

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25.2. METODOLOGIA Participaram no estudo 25 elementos: 4 médicos, 14 enfermeiros 7 Assistentes

Operacionais.

Os

critérios

de

inclusão

compreendem:

os

profissionais com vontade em participar; os profissionais que conseguem manter o foco de atenção durante as sessões e os profissionais que sejam capazes de seguir as instruções dos ciclos de tensão/descontracção. Como critérios de exclusão: recusa em participar e ausência por férias, num total de 6 elementos. Após ter sido aprovado pelo Conselho de Administração e Direção do Serviço, distribui o instrumento para a recolha de dados, sendo previamente explicada a finalidade e o objetivo do estudo a cada participante e obtido o seu consentimento livre e esclarecido. O questionário (GHQ28) validado para a população portuguesa conhecido por “General Health Questionnaire – GHQ28”, tem como principal objetivo, avaliar a saúde dos profissionais. Engloba quatro domínios: Sintomas Somáticos; Ansiedade e Insónia; Disfunção Social e Depressão. A distribuição foi realizada antes de iniciar as sessões de relaxamento a cada elemento da equipa multidisciplinar, e após terem sido submetidos ao relaxamento. As sessões de Relaxamento foram realizadas ao longo de 6 semanas, 3 sessões por semana com a duração de 30 minutos cada, num total de 18 sessões. Previamente foi estruturado o plano mensal dos dias em que iriam decorrer as sessões de relaxamento. As sessões decorreram em horário pós laboral, após a saída do turna da manhã. Os profissionais aceitaram permanecer mais 30 minutos no serviço após o seu horário de trabalho. Em cada sessão, um limite de 3 a 4 elementos devido ao espaço físico disponibilizado. Reuni o material: musica e guiões (Relaxamento Muscular Progressivo de Jacobson,

Treino

Autogénico

de

Schultz,

Relaxamento

por

Imaginação

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

311


conduzida, Relaxamento Cognitivo de M.Mahoney, Letting - go) e adaptei o ambiente: silencio, luminosidade e conforto. No final das sessões distribui novamente o questionário aos participantes e obtive a comparação dos resultados.

25.3. ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS Apresentam-se de seguida os dados relativos à intervenção desenvolvida nos meses de Setembro/Outubro de 2010 (durante 6 semanas) para um total de 25 participantes (Enfermeiros, Médicos e Assistentes Operacionais) do Serviço de Medicina Intensiva dum Hospital da Zona Centro.

25.3.1. CARACTERIZAÇÃO GERAL DA AMOSTRA Existe uma maior predominância do sexo feminino (84%), em relação ao sexo masculino (16%), traduzindo uma equipa maioritariamente constituída por elementos femininos.

Tabela 1 – Género Frequency

Percent

Valid

Cumulative

Percent Percent Masculino 4 16,0 16,0 16,0 Feminino 21 84,0 84,0 100,0 Total 25 100,0 100,0 A média de idades dos sujeitos é de 40,36 anos e a média de anos de

Valid

serviço é de 15,52 anos, o que evidencia uma equipa experiente.

312

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Tabela 2 – Percentagem dos anos de serviço e idade dos sujeitos. N

Minimum

Maximum

Mean

Std.

Idade

dos

25

25

55

40,36

Deviation 8,97

Sexo

dos

25

1

2

1,84

,37

25

1

3

2,12

,60

3

33

15,52

7,69

Profissão Anos

de

25

Valid

N

25

Existe um predomínio mais abrangente de Enfermeiros (64%), seguindo-se de Assistentes Operacionais (24%) e por fim a classe Médica com 12%.

Tabela 3 – Classe Profissional Frequency Valid

Percent

Valid

Cumulative

Médico

3

12,0

Percent 12,0

Percent 12,0

Enfermeiro

16

64,0

64,0

76,0

Assistente

6

24,0

24,0

100,0

Total

25

100,0

100,0

A maioria da equipa trabalha entre 10 e 20 anos (48%).

Tabela 4 – Tempo de serviço em classes

Valid

Menos De 10 a Mais de Total

Frequency

Percent

7 12 6 25

28,0 48,0 24,0 100,0

Valid Percent 28,0 48,0 24,0 100,0

Cumulative Percent 28,0 76,0 100,0

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313


25.3.2. CARACTERIZAÇÃO DAS DIMENSÕES Do GHQ – 28 (General Health Questionnaire de 28 itens) fazem parte quatro dimensões: Sintomas Somáticos, Ansiedade e Insónia, Disfunção Social e Depressão Grave, que servem de base à avaliação do estado psicológico dos indivíduos em estudo. A primeira parte do estudo consistiu em verificar como se encontrava a saúde em geral dos participantes, tendo em consideração tais domínios.

25.3.3. CARACTERIZAÇÃO ANTES DA INTERVENÇÃO Os sintomas somáticos estão presentes mais no sexo masculino (6,75%), assim como a disfunção social (6,67%). A ansiedade e insónia aparecem como maior percentagem no sexo feminino (5,29%), e a depressão com uma percentagem mínima (1%). Tabela 5 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e do género dos participantes Sintoma

Género

Masculi no Feminin o Total

314

s Mean N Std. Mean N Std. Mean N Std.

Somáticos 6,75 4 2,99 5,48 21 3,54 5,68 25 3,44

Ansieda

Disfunç

de e Insónia ão Social 5,00 4 3,46 5,29 21 4,31 5,24 25 4,13

7,25 4 ,50 7,33 21 2,01 7,32 25 1,84

Esta

Depressã do

o ,00 4 ,00 1,00 21 1,30 ,84 25 1,25

de

saúde 19,0 4 6,38 19,1 21 8,70 19,0 25 8,26

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Os médicos sofrem mais de sintomatologia somática (6,67%), seguindo-se os enfermeiros (5,56%) e os Assistentes Operacionais (AO) (5,50%). Em relação à ansiedade e insónia, são os AO (6,17%) quem mais sofrem seguindo-se dos médicos (5,33%) e os enfermeiros (4,87%). A disfunção social é mais atingida pelos enfermeiros (7,75%), seguindo-se dos médicos (6,67%) e finalmente os AO (6,5%), finalmente a depressão mais sentida pela classe dos AO (1,67%), enfermeiros (0,63%) e médicos (0,33%).

Tabela 6 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e da Classe Profissional Sintoma

Profissão

Médico Enfermeir o Assistent e Operacional Total

O

s Mean N Std. Mean N Std. Mean N Std. Mean N Std.

grupo que

Ansieda de

e ão social

Somáticos insónia 6,67 5,33 3 3 4,73 2,31 5,56 4,87 16 16 3,85 4,00 5,50 6,17 6 6 1,64 5,49 5,68 5,24 25 25 3,44 4,13

sofre

mais

Disfunç

de sintomas

Esta

Depress do

ão

6,67 3 ,58 7,75 16 2,14 6,50 6 ,84 7,32 25 1,84

somáticos

,33 3 ,58 ,63 16 1,15 1,67 6 1,51 ,84 25 1,25

de

saúde 19,0 3 7,00 18,8 16 9,50 19,8 6 5,98 19,0 25 8,26

são as

idades

compreendidas entre 31 e 40 anos (7,14%) e a que menos sofre são as idades superiores a 40 anos (4,93); no domínio da ansiedade e insónia, os que sofrem mais são as idades entre os 31 e 40 anos (5,57%), e os que sofrem menos são os inferiores a 30 anos (5,00%); o grupo que prevalece com mais percentagem de disfunção social são as idades entre 30 e 40 anos (7,57%) e o que menos sente E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

315


este domínio é menos de 30 anos (6,75%); já no domínio da depressão, embora com percentagens mínimas de uma forma geral, os mais afectados são os superiores a 30 anos até mais de 40 anos com 0,86% contra os de idades inferiores a 30 anos que sofrem menos de depressão (0,75%). Tabela 7 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e a Idade em classes Idade em

Sintomas Somáticos

Ansiedad e e insónia

Disfunçã o social

Esta

Depressã o

do

de

classes Meno

saúde Mean 5,75 5,00 6,75 ,75 18,25 N 4 4 4 4 4 s de 30 Std. 4,11 2,71 2,22 ,96 8,06 anos de 31 Mean 7,14 5,57 7,57 ,86 21,14 N 7 7 7 7 7 a 40 Std. 4,38 3,15 1,40 1,46 9,30 anos Mais Mean 4,93 5,14 7,36 ,86 18,29 N 14 14 14 14 14 de 40 Std. 2,70 5,01 2,02 1,29 8,23 anos Mean 5,68 5,24 7,32 ,84 19,08 Total N 25 25 25 25 25 Std. 3,44 4,13 1,84 1,25 8,26 Os elementos com menor número de anos de serviço sofrem mais de sintomatologia somática (7%) e os que trabalham entre 10 e 20 anos são os que sofrem menos (4,67%); em relação à ansiedade e insónia, os que sentem mais esta sintomatologia são os que trabalham há mais de 20 anos (8,33%), e os que sofrem menos são os que trabalham entre 10 e 20 anos (3,5%); a disfunção social é mais sentida pela classe superior a 20 anos de serviço (7,83%), e a classe mais nova em serviço é a que sente menos disfunção social (6,86%); a depressão é mais sentida pelos elementos que trabalham há mais de 20 anos (1%) e os menos deprimidos são os profissionais que trabalham entre 10 e 20 anos (0,75%).

316

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Tabela 8 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e o tempo de serviço em classes Temp o

de

serviço Meno s de 10 De 10 a

20 Mais

de

Sintomas

20 Total

Mean N Std. Mean N Std. Mean N Std. Mean N

Ansiedad

Somáticos

e e insónia

7,00 7 3,74 4,67 12 3,75 6,17 6 1,94 5,68 25

5,57 7 2,23 3,50 12 3,29 8,33 6 5,75 5,24 25

Disfunçã o social 6,86 7 1,57 7,33 12 1,07 7,83 6 3,19 7,32 25

Depressã o

Esta do

,86 7 1,21 ,75 12 1,36 1,00 6 1,26 ,84 25

de

saúde 20,29 7 6,65 16,25 12 8,52 23,33 6 8,45 19,08 25

25.3.4. CARACTERIZAÇÃO APÓS A INTERVENÇÃO Após a intervenção procedi à distribuição dos questionários aos elementos que participaram nas sessões de relaxamento. Recorri ao Independente Sample Test, para verificar se haveria diferenças significativas nas médias das variáveis em estudo, relacionadas com género, idade, tempo de serviço em classes e classe profissional. Relativamente às dimensões da GHQ-28 e o género, não se verificaram resultados obtendo-se as mesmas percentagens do que antes da intervenção, em ambos os sexos.

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317


Tabela 9 – Descrição das dimensões do GHQ-28 e o sexo dos sujeitos

Sintomas Somáticos Ansiedad e e insónia Disfunção social Depressã o

Género

N

Mean

Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino Masculino Feminino

4 21 4 21 4 21 4 21

6,75 5,48 5,00 5,29 7,25 7,33 ,00 1,00

Std. Deviation

Std. Error Mean

2,986 3,544 3,464 4,314 ,500 2,008 ,000 1,304

1,493 ,773 1,732 ,941 ,250 ,438 ,000 ,285

Em relação às dimensões da GHQ-28 e a idade em classes não houve alterações significativas nas relações entre as variáveis em estudo. Tabela 10 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e a idade em classes Idade em classes Sintomas

N

Menos de 4 de 31 a 40 7 Somáticos Ansiedad Menos de 4 de 31 a 40 7 e e insónia Disfunção Menos de 4 de 31 a 40 7 social Depressã Menos de 4 de 31 a 40 7 o Estado de Menos de 4 de 31 a 40 7 saúde geral Em relação às dimensões da GHQ-28

Mean

Std. Deviation

Std. Error Mean

5,75 4,113 7,14 4,375 5,00 2,708 5,57 3,155 6,75 2,217 7,57 1,397 ,75 ,957 ,86 1,464 18,25 8,057 21,14 9,299 e o tempo de serviço em

2,056 1,654 1,354 1,192 1,109 ,528 ,479 ,553 4,029 3,515 classes, não

houve resultados significativos nos diferentes domínios. 318

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Tabela 11 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e o tempo de serviço em classes Tempo de serviço classes Menos De 10 Somáticos Ansiedad Menos De 10 e e insónia Disfunção Menos De 10 social Depressã Menos De 10 o Estado de Menos De 10 saúde geral Sintomas

em de a de a de a de a de a

N

Mean

7 12 7 12 7 12 7 12 7 12

7,00 4,67 5,57 3,50 6,86 7,33 ,86 ,75 20,29 16,25

Std. Deviation 3,742 3,750 2,225 3,289 1,574 1,073 1,215 1,357 6,651 8,519

Std. Error Mean 1,414 1,082 ,841 ,949 ,595 ,310 ,459 ,392 2,514 2,459

Em relação às dimensões da GHQ-28 e as classes profissionais, verifica-se uma ligeira alteração na percentagem (4,88%) no domínio de ansiedade e insónia para os enfermeiros.

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319


Tabela 12 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e as classes de Medico e Enfermeiro

Sintomas Somáticos Ansiedad e e insónia Disfunção social Depressã o Estado de saúde geral

Std.

Std. Error

Profissão

N

Mean

Médico Enfermeiro

3 16

6,67 5,56

4,726 3,847

2,728 ,962

Médico Enfermeiro Médico

3 16 3

5,33 4,88 6,67

2,309 3,998 ,577

1,333 ,999 ,333

Enfermeiro Médico Enfermeiro Médico

16 3 16 3

7,75 ,33 ,63 19,00

2,145 ,577 1,147 7,000

,536 ,333 ,287 4,041

Enfermeiro

16

18,81

9,502

2,376

Deviation

Mean

Em relação às profissões de Assistente Operacional, não se verificam resultados significativos, relacionados com os diferentes domínios e a profissão.

320

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Tabela 13 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e as classes de Medico e Assistente Operacional

Profissão

N

Mean

Std. Deviation

Std. Error Mean

Sintomas

Médico 3 6,67 4,726 2,728 Assistente 6 5,50 1,643 ,671 Somáticos Ansiedad Médico 3 5,33 2,309 1,333 Assistente 6 6,17 5,492 2,242 e e insónia Disfunção Médico 3 6,67 ,577 ,333 Assistente 6 6,50 ,837 ,342 social Depressã Médico 3 ,33 ,577 ,333 Assistente 6 1,67 1,506 ,615 o Estado de Médico 3 19,00 7,000 4,041 Assistente 6 19,83 5,981 2,442 saúde geral Não houve alterações nos diferentes domínios relacionados com as profissões de Enfermeiro e Assistente Operacional após a intervenção. Tabela 14 – Descrição das dimensões da GHQ-28 e as classes de Enfermeiro e Assistente Operacional

Sintomas Somáticos Ansiedad e e insónia Disfunção social Depressã o

Estado de

saúde geral

Profissão

N

Mean

Enfermeiro Assistente Enfermeiro Assistente Enfermeiro Assistente Enfermeiro Assistente Enfermeiro Assistente

16 6 16 6 16 6 16 6 16 6

5,56 5,50 4,88 6,17 7,75 6,50 ,63 1,67 18,81 19,83

Std. Deviation 3,847 1,643 3,998 5,492 2,145 ,837 1,147 1,506 9,502 5,981

Std. Error Mean ,962 ,671 ,999 2,242 ,536 ,342 ,287 ,615 2,376 2,442

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321


25.4. DISCUSSÃO Os resultados apresentados evidenciam o tipo de trabalho inerente aos profissionais de saúde, mais concretamente à equipa de cuidados intensivos, os quais estão permanentemente sujeitos a um ambiente desgastante, tenso e stressante. Uma maior percentagem na disfunção social, sintomas somáticos, ansiedade e insónia foi apresentada nestes profissionais da área da saúde. São os horários rígidos, com extensas horas de trabalho por turnos. É o trabalhar num ambiente muito fechado inseridos num contexto social pouco favorável, com atividades de grande responsabilidade, confronto permanente com o sofrimento e morte, algumas vezes a falta de reconhecimento e autonomia profissional, e os conflitos que surgem no ambiente de trabalho. A implementação das sessões de relaxamento no seio da equipa multidisciplinar proporcionou momentos de paz e tranquilidade, nos quais as preocupações eram colocadas de lado para dar espaço a um lugar seguro e tranquilo para cada um. Diminuiu a tensão provocada pelo ambiente fechado e pelo sofrimento e incapacidade inerente a este tipo de serviço. Melhorou o bem-estar físico e psicológico dos elementos participantes, manifestado por palavras muito sentidas, envoltas de carinho, de respeito, cheias de humanismo em prol de quem precisa estar bem cuidado para poder CUIDAR e TRATAR. Melhorou a capacidade relacional da equipa, entre os diversos elementos, e, entre eles, o doente e a família. Proporcionou momentos de descontração, de tranquilidade, de bem-estar, para que o futuro, no que concerne às práticas diárias destes elementos, possa ser mais promissor. Portanto, a necessidade de implementar medidas preventivas a fim de evitar sérios riscos para a saúde, e que poderá ser reflectido em cuidados deficitários aos doentes, será uma medida prioritária nos contextos de trabalho.

322

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25.5. CONCLUSÃO O relaxamento cria um espaço para fazermos uma auto-avaliação, para nos consciencializarmos da maneira como respiramos, do bem-estar, ou do mal-estar a que nos sujeitamos com a nossa forma habitual de estar e pensar. Esta tomada de consciência muitas vezes conduz à resolução de problemas há muito enraizados na mente bem como a mudança da estrutura do pensamento, (Dias, 2007). Para além de permitir que a pessoa se torne mais consciente de si mesma e mais atenta ao seu interior, permite observar as reacções emocionais a partir de outra perspectiva, percebendo muitas vezes que algumas das sensações corporais são criadas pelos próprios pensamentos. Numa visão mais ampla, o relaxamento ajuda a pessoa a descobrir uma fonte de calma e serenidade no meio das actividades da vida. Este projecto, veio trazer a possibilidade de transmitir aos profissionais do Serviço de Medicina Intensiva, o quão importante é poder encontrar momentos de paz e tranquilidade após uma jornada de trabalho no qual se lida com tanto sofrimento e incapacidade. Por outro lado, uma forma de melhorar os relacionamentos interpessoais e de contribuir para momentos de descontracção, de tranquilidade, de bem-estar. E isto, certamente se refletirá em melhores cuidados prestados e maiores ganhos em saúde, num percurso de melhoria contínua para a qualidade. BIBLIOGRAFIA Abreu, A. P. (2007). Cuidando do Educador, (versão electrónica). Foz do Iguaçu, Plêiade. Vol. 1, Nº2, p.133142. Dias, M., I. (2007). O treino de relaxamento como potenciador de sucesso educativo em jovens do 3.º ciclo. Coimbra. Dissertação de mestrado, p. 110-119.

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323


Duarte, M.M.A. e Oliveira, A.M. (2004). Controle de respostas de ansiedade em universitários em situações de exposições orais. (versão electrónica). S. Paulo. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva. Vol. 6, Nº 2. Gatti, Z.F.M. e Silva, P.J.M. (2007). Musica ambiente em serviços de emergência: Percepção dos profissionais. (Versão electrónica). Revista Latino-americano de Enfermagem. Leal, M.L.; Silva, M.M.R.F.; Espíndula, M.B.(2010). Stress em trabalhadores de Unidades de Terapia Intensiva: como reduzir ou minimizar os riscos? (Versão electrónica). Revista Electrónica de Enfermagem do Centro de estudos de Enfermagem e Nutrição. Universidade Católica de Góias. Leoni, G.M. (1996). Autoconhecimento do enfermeiro na relação terapêutica. (Versão electrónica). Rio de janeiro. Cultura Medica. Monte, G.R.P. (2004). Cuidando de quem cuida. Psicologia em estudo. Maringá. Vol. 9, Nº 1. Ribeiro, J.L.P.; Antunes, S.; (2003). Contribuição para o estudo de adaptação do questionário de saúde geral de 28 itens”; Revista Portuguesa de Psicossomática. Vol. 5, Nº 1.

324

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26. RASTREIO E DETEÇÃO DE CASOS EM SAÚDE MENTAL Elza Maria Silva Lemos*; Ana Maria Romano**; José Manuel Monteiro Dias***; Maria Conceição Alves Rainho****

*Professora Adjunta, Escola Superior de Enfermagem de Vila Real – UTAD, elemos@utad.pt **Professora Coordenadora, Escola Superior de Enfermagem de Vila Real – UTAD, aromano@utad.pt ***Professor Adjunto, Escola Superior de Enfermagem de Vila Real – UTAD, jmdias@utad.pt ****Professora Coordenadora, Escola Superior de Enfermagem de Vila Real – UTAD, crainho@utad.pt

RESUMO Este

trabalho

teve

por

objetivo

avaliar

o

risco

de

mulheres

idosas,

desenvolverem patologia psiquiátrica. Foi realizado um estudo quantitativo, descritivo, transversal. A amostra foi constituída por 72 mulheres residentes em lares de terceira idade, com uma média de idades de 80,82; DP=9,78. Para a colheita dos dados aplicou-se a Escala de Rastreio em Saúde Mental – ER80 (Abreu; Pato, 1981). Neste estudo observou-se que a probabilidade deste grupo de mulheres vir a desenvolver uma perturbação mental foi de 21 (29,2%). Consideramos que os dados obtidos poderão contribuir para a reflexão e ponto de partida para futuras pesquisas que fundamentem projetos de intervenção neste âmbito.

Palavras-chave: Idosos; Saúde Mental; Rastreio

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325


26.1. INTRODUÇÃO São cada vez mais o número de pessoas a alcançar a idade geriátrica. Segundo o INE (2009) é previsível que a população idosa seja superior à população jovem entre 2010 e 2015. Acentuar-se-ão as diferenças entre sexos, ou seja, a tendência de envelhecimento e feminização será reforçada (Veras, 1991). O envelhecimento associa-se a maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de perturbações mentais. Algumas destas perturbações são mais comuns nos idosos, tendo subjacentes vários fatores psicossociais de risco que contribuem para esta realidade. Entre estes fatores geralmente incluem-se entre outros a perda de papéis sociais, declínio da saúde isolamento social, perda de autonomia, redução do funcionamento cognitivo. Podemos constatar que este tipo de perturbações constitui um grave problema de saúde pública, salientandose que aproximadamente um em cada seis idosos apresenta uma história de poder vir a apresentar uma perturbação mental (Veras, 1991). Além disto, a repercussão

que

as

perturbações

psiquiátricas

dos

idosos

têm

no

comprometimento da qualidade de vida quer dos utentes quer dos cuidadores, representa hoje em dia uma das principais áreas de gastos com a saúde nos países desenvolvidos (Almeida, 1999). A avaliação da saúde mental reveste-se de particular importância na terceira idade porque permite a adequação dos cuidados prestados às pessoas idosas, através da avaliação real dos “settings” de intervenção considerados prioritários. Pretende-se com este tipo de estudos, prevenir as perturbações mentais, ou reduzir o seu impacto neste grupo etário, através de um conjunto diversificado de estratégias, sustentadas na evidência científica capazes de responder à especificidade das múltiplas necessidades destes utentes (Resende, 2011). Com este estudo pretendemos avaliar o risco das mulheres idosas sem diagnóstico de doença mental, terem a probabilidade de virem a desenvolver uma perturbação mental e contribuir para a fundamentação de estratégias de intervenção que visem a promoção da saúde mental destes grupos. 326

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26.2. METODOLOGIA Foi realizado um estudo do tipo quantitativo, descritivo, transversal.

26.2.1. PARTICIPANTES Este estudo foi realizado numa amostra não probabilística que pressupõe um procedimento de seleção informal constituída pelos utentes do sexo feminino, residentes em quatro Lares de Terceira Idade do Distrito de Vila Real. Os critérios de inclusão para a participação no estudo foram não apresentar comprometimento cognitivo, nem diagnóstico de perturbação mental. O tratamento estatístico dos dados foi efetuado através do programa SPSS versão 19.0 do (Statiscal Pakage for the Social Science) para Windows.

26.2.2. INSTRUMENTOS Foi utilizado um questionário para a caracterização sociodemográfica da amostra e a Escala de Rastreio em Saúde Mental – ER80 (Abreu; Pato, 1981), por se tratar de uma escala adaptada às condições socioculturais da população portuguesa, ter sido utilizada em diversos trabalhos e ainda ser de fácil e rápida aplicação. A Escala ER80 é constituída por 16 itens, considerada bimodal [0-1] incluindo cinco questões de falsidade, (F-Resposta considerada improvável; Falsidade: 1 ponto por cada (F), Limiar ≥ 4). Na sua operacionalização considerase 1 ponto por cada (+), sendo o limiar de positividade para o Sexo Masculino ≥ 6 e para o Sexo Feminino ≥ 7. Os resultados assim obtidos correspondem ao limiar superior da escala, sendo estes os casos classificados como ER80+.

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327


26.2.3. PROCEDIMENTOS Após pedido de autorização, e apresentação dos objetivos do estudo e garantida a confidencialidade dos dados, foi aplicada a Escala de Rastreio em Saúde Mental (ER/80). Tendo em atenção as características da amostra, foi realizada uma entrevista individualizada previamente marcada com cada um dos utentes que se disponibilizaram colaborar. Neste estudo dos 81 questionários aplicados foram excluídos 09 por se observar um índice de Falsidade superior a 4 na Escala ER80. Para análise posterior obtivemos uma amostra de 72 participantes.

26.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Na caracterização sociodemográfica podemos observar que a nossa amostra é constituída por 72 participantes do sexo feminino cuja média de idades é de 80,82; DP=9,78. Em relação ao estado civil, a maioria 46 (63,9%) era viúva, 15 (20,8%) casadas e 11 (15,3%) solteiras. Quanto a grau de instrução 48 (66,7%) sabe ler e escrever, 17 (23,6%) era analfabeto, 4 (5,6%) sabe ler e 3 (4,2%) tem outro nível de instrução. Os resultados obtidos através da Escala de Rastreio em Saúde Mental – ER80 apresentam-se na tabela 1.

328

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Tabela 1 – Avaliação da probabilidade de desenvolvimento de perturbação mental na amostra em estudo n

%

ER80 Positivo

21

29,2

ER80 Negativo

51

70,8

Total

72

100

Pela leitura da tabela 1 podemos verificar que a percentagem de mulheres com probabilidade de não vir a desenvolver uma perturbação mental foi de 51 (70,8%) e a percentagem de mulheres de vir a desenvolver este tipo de perturbação foi de 21 (29,2%).

26.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os resultados vão de encontro a outros estudos, desenvolvidos noutros contextos, onde se observa que as mulheres e em particular as mulheres idosas e sem vínculo marital mostram maior probabilidade de desenvolver algum tipo de patologia psiquiátrica (Gonçalves & Meireles, 1998; Simões & Gama, 2000). Neste estudo as participantes apresentam um risco acrescido de vir a desenvolver algum tipo de perturbação mental, constatando que estes resultados se podem considerar próximos do estudo realizado por Simões & Gama (2000). No entanto devemos salvaguardar o tamanho e tipo da amostra deste estudo que não permite a extrapolação dos resultados para a população geral.

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329


26.5. CONCLUSÕES Reportando-nos aos resultados observados neste estudo, as mulheres podem

ser

consideradas

como

provável

grupo

de

risco

21

(29,2%),

perspetivando-se a necessidade de uma intervenção consentânea com os resultados obtidos. Apesar dos limites do estudo consideramos que os dados obtidos poderão contribuir para a reflexão e ponto de partida para futuras pesquisas de âmbito mais alargado e em outros contextos de intervenção.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abreu, J. L. P., & Pato, M. L. V. (1981). A utilização de uma escala de rastreio em epidemiologia psiquiátrica. Psiquiatria Clínica, 2 (2), 129-133. Almeida, O. (1999). Idosos atendidos em serviço de emergência de saúde mental: características demográficas e clínicas. Revista Brasileira de Psiquiatria, 21 (1), 12-18. Gonçalves, J. A., & Meireles, A. (1998). Morbilidade psiquiátrica numa unidade de dor. Rev. Port. Aneste., 9 (3), 53-59. Instituto Nacional de Estatística. (2009). Projeções da população residente em Portugal 2008-2060: Relatório anual

de

2009.

Recuperado

em

22

de

março,2012,dehttp://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_boui=655 73359&DESTAQUESmodo=2. Resende, M. C., Almeida, C. P., Favoreto, D., Miranda, E. G., Silva, G. P., Vicente, J. F. P., Queiroz, L. A., Duarte, P. F., & Galicioli, S. C. P. (2011). Saúde mental e envelhecimento. Psico, 42 (1), 31-40. Simões, J. A. R., & Gama, M. E. A. (2000). Rastreio em saúde mental a uma amostra de utilizadores da consulta sem diagnóstico de perturbação mental. Psiquiatria Clínica, 21 (1), 49-55. Veras RP, Murphy E. (1991). The ageing of the third world: tackling the problems of community surveys. Part I. Brazil a young country grows old. Int J Geriatric Psychiatry. 6:619-27.

330

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World

Health

Organization.

(2009).

Definition

of

an

older

or

elderly

person.

Disponível

em

<http://www.who.int/healthinfo/survey/ageingdefnolder/en/>. Acesso em: 10 de abr.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

331


27. O ACOLHIMENTO DOS USUÁRIOS DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS NA ATENÇÃO BÁSICA: PERCEPÇÃO DOS ENFERMEIROS Letícia Bosso Moreira*; Sonia Regina Zerbetto** *Enfermeira, Santa Casa de Pederneiras, São Paulo, Brasil. E-mail: letícia_bosso@hotmail.com **Enfermeira, Doutora em Enfermagem Psiquiátrica pela EERP-USP; Professora Adjunto II do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de São Carlos-São Paulo, Brasil. E-mail: szerbetto@ufscar.br

RESUMO O acolhimento pode ser compreendido como abordagem de relações humanas e como estratégia para organização dos serviços. Este estudo objetivou apreender o processo de acolhimento aos usuários de álcool e outras drogas, na percepção das enfermeiras das Unidades Básicas de Saúde (UBS) de uma cidade do interior paulista, Brasil. Estudo descritivo, de abordagem qualitativa, tendo como sujeitos as enfermeiras das Unidades Básicas de Saúde de uma cidade do interior do estado de São Paulo, Brasil. Os dados foram coletados em 2010, por meio de entrevista semi-estruturada e submetidos à análise de conteúdo, categoria temática. Surgiram quatro categorias temáticas: concepção de acolhimento na percepção das enfermeiras; as intervenções realizadas pelas enfermeiras durante o processo de acolhimento; facilidades e as dificuldades enfrentadas pelas enfermeiras no desenvolvimento do processo de acolhimento. Conclui-se que para um cuidado mais eficaz e resolutivo ao usuário que faz uso de álcool e outras drogas, é necessário que o enfermeiro sistematize o processo de acolhimento, bem como o considere uma importante ferramenta tecnológica para a criação de vínculos.

Palavras-chave: acolhimento; usuários de drogas; enfermagem; atenção primária à saúde. 332

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27.1. INTRODUÇÃO O conceito de acolhimento pode ser entendido como abordagem de relações humanas e como estratégia para a reorganização do serviço (Franco et al., 2003;Takemoto & Silva,2007). No primeiro enfoque, considera-se o modo de relacionamento entre profissional de saúde e usuário do serviço e no segundo, como etapa do processo de trabalho responsável pelo atendimento da demanda espontânea, ou seja, um instrumento para reorganizar o serviço em saúde, proporcionando melhor resolubilidade no trabalho dos profissionais de saúde durante a assistência (Franco et al., 2003). Considerando a política do Ministério da Saúde brasileiro para Atenção Integral ao Usuário de Álcool e outras Drogas, o modo de atuação dos enfermeiros junto a esta população, não tem sido sistemático e uniforme, sendo suas ações desenvolvidas de forma fragmentadas e heterogêneas, de acordo com os conhecimentos e disponibilidades de cada um (Gonçalves & Tavares, 2007). Sendo o acolhimento uma estratégia facilitadora de abordagem às pessoas que consomem substâncias psicoativas, perguntou-se: como ele vem sendo realizado pelos enfermeiros no atendimento aos usuários de álcool e outras drogas? Quais ações e intervenções que esses profissionais realizam a essa população durante o acolhimento nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs)? Quais as facilidades e dificuldades desses profissionais para realizá-las? Percebeu-se uma fenda ampla e profunda entre as necessidades requeridas pela crescente demanda das pessoas que buscam assistência em relação ao problema

de

uso

abusivo

e

dependência

de

substâncias

psicoativas,

principalmente na atenção primária e, os recursos existentes, incluindo o preparo dos profissionais da saúde, aqui identificado na pessoa do enfermeiro. Este estudo tem como objetivos apreender o processo de acolhimento aos usuários de álcool e outras drogas, na percepção das enfermeiras das UBSs e, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

333


identificar as facilidades e dificuldades que elas encontram durante esse processo, assim como as suas ações e intervenções.

27.2. METODOLOGIA Estudo descritivo, de abordagem qualitativa, tendo como campo empírico sete Unidades Básicas de Saúde de uma cidade do interior do estado de São Paulo, Brasil.

27.2.1. PARTICIPANTES Nove enfermeiras, sendo o critério de inclusão: ser enfermeira (o) da unidade, estar trabalhando durante o período de realização das entrevistas e ter no mínimo um ano de tempo de serviço na respectiva UBS.

27.2.2. INSTRUMENTO Entrevista semi-estruturada constituída de caracterização pessoal e das questões norteadoras: O que você entende por acolhimento? Como tem sido para você o processo de acolhimento ao usuário de álcool e outras drogas? Quais são as ações/intervenções que você desenvolve com o usuário de álcool e outras drogas durante o processo do acolhimento? Como tem sido para você a sua relação com o usuário de álcool e outras drogas durante o acolhimento? Há dificuldades nesse processo? Quais? Como superá-las?

27.2.3. PROCEDIMENTOS

334

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Os depoimentos foram coletados durante os meses de novembro e dezembro de 2010, sendo as entrevistas gravadas, após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos sujeitos e, posteriormente transcritas. Utilizou-se da análise de conteúdo categoria temática de Bardin, consistindo em três fases, ou seja, pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e sua interpretação (Bardin, 2008). Na primeira fase constituiu-se na organização dos materiais, ou seja, na transcrição das gravações das entrevistas. Em uma segunda fase, para a classificação dos dados, realizou-se uma leitura flutuante seguida de uma leitura exaustiva do material, para apreensão das ideias centrais, que tentaram transmitir o tema enfocado, permitindo o estabelecimento das categorias e subcategorias. A análise temática consistiu em descobrir núcleos de sentido cuja presença ou frequência de aparição pode significar algo para o objetivo analítico escolhido. Na fase de tratamento dos resultados obtidos e sua interpretação foi desvendado o conteúdo subjacente ao que esteve manifesto, baseando-se na fundamentação teórica e pessoais sobre o tema emergido. As entrevistas foram identificadas com a letra E (Enfermeira), seguidas por um número, que correspondeu à sequência da sua realização. De acordo com a Resolução 196/96, regulamentada pelo Conselho Nacional de Saúde Brasileiro, a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos, sob o protocolo nº 206/2010.

27.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Em relação ao perfil das participantes, todas eram do sexo feminino, sendo uma na faixa etária de 20-29 anos, três de 30-39 anos, duas de 40-49 anos e três de 50-59 anos. A média de idade das entrevistadas foi de 41 anos, sendo a mais nova com 24 anos. Surgiram quatro grandes categorias temáticas, descritas abaixo em negrito: E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

335


Concepção de acolhimento na percepção das enfermeiras: No enfoque de estratégia de reorganização do processo de trabalho, as enfermeiras apontaram que o ato de acolher constitui-se em uma etapa do atendimento para todo usuário, inclusive aquele que faz uso abusivo ou é dependente de álcool e outras drogas, possibilitando ao enfermeiro sistematizar o seu cuidado. O acolhimento é a porta de entrada do serviço, você vai acolher todo mundo, receber todo mundo, ouvir todo mundo. (E9) No entendimento de abordagem de relações humanas, as enfermeiras salientaram a importância de receber a pessoa que busca ajuda, de maneira empática, através da escuta terapêutica, para estabelecer a confiança entre enfermeiro e usuário e favorecer a criação de vínculo. Primeiro lugar empatia, se colocar no lugar do outro. É, segundo lugar é detectar maior necessidade no momento e tentar, é, dentro dos recursos disponibilizados, agilizar a melhor resposta possível para essas necessidades, no menor período de tempo. (E5) As intervenções realizadas pelas enfermeiras durante o processo de acolhimento: Apesar das enfermeiras não se sentirem preparadas para acolher o usuário com consumo problemático de álcool e outras drogas, elas buscam apoio de outro profissional para solução do problema, realizam a escuta, encaminham o usuário ao profissional especializado e/ou outro serviço, buscam apoio da família e dão responsabilidade e poder de decisão ao dependente químico. (...) têm alguns profissionais que têm dado um suporte pra gente, que têm ajudado bastante, que são a terapeuta ocupacional e a psicóloga. (E3) (...) A princípio a gente tem a parte da escuta, né, ele vem, procura um atendimento, a gente ouve, vê qual é a necessidade dele.(..) (E1)

336

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


(...) se tiver necessidade, a gente encaminha pro Caps. (...) até vinte e um anos a gente encaminha pro Caps álcool e droga, que eles fazem o atendimento. (E4) (...) acho que não é só trabalhar o usuário de álcool e droga, tem que trabalhar a família. (E8) (...) porque você não pode abordar de maneira que venha a julgar, você não pode abordar de maneira a tomar decisões por ele, você não pode chegar pra ele “ó vamos parar”, porque quem vai tomar essa decisão é o usuário, você vai dar meios pra que ele venha a tomar essa decisão, pra fortalecer aquela decisão.(E7) As facilidades enfrentadas pelas enfermeiras no desenvolvimento do processo de acolhimento: As oportunidades das enfermeiras em participarem de capacitação, treinamentos e eventos sobre a temática do álcool ajudaram-nas a direcionar as suas intervenções no cotidiano do trabalho. Eu acho assim, o primeiro passo já até começaram, a gente foi em um treinamento para aprender a utilização do AUDIT [Questionário de Identificação de Transtornos pelo Consumo de Álcool]. (E3) As dificuldades enfrentadas pelas enfermeiras no desenvolvimento do processo

de

acolhimento:

Os

maiores

problemas

identificados

foram

relacionados à falta de articulação entre a UBS e os recursos de saúde mental disponíveis na rede, à deficiência em recursos humanos, desorganização e desestruturação da rede de saúde mental e dificuldade na relação com o dependente químico no momento de intoxicação pela droga. A minha maior dificuldade é pra onde enviar aquele usuário, como acompanhar aquele usuário se eu não tenho meios, entendeu...(...) o psicólogo faz uma avaliação, a avaliação vai pro CAPS [Centro de Atenção Psicossocial], mas nosso retorno de lá pra cá não tenho, às vezes até volta, mas é muito difícil, entendeu, a contra-referência de lá eu não tenho. (E7) E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

337


(...) a maioria das unidades não tem um psiquiatra né, por falta realmente do profissional, não só aqui como em outras regiões, então você não tem uma equipe que possa apoiar a família, não tem assistente social nas unidades (...). (E4) (...) mas a gente tem muita dificuldade, hoje a rede tá bastante desestruturada, desorganizada. (E8) (...) muitas vezes eles chegam alcoolizados né, aquele momento que “acontece tudo errado”, já chegam xingando, já chegam gritando, já chegam bem exaltados... então esse momento é um momento que a gente não tem muito o que a gente tá fazendo né. A gente tem que procurar chamar a família, conversar com a família. (E2)

27.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A Política Nacional de Humanização (PNH) do Brasil reforça a concepção de acolhimento como uma sequência de atos que faz parte da reorganização do processo de trabalho em saúde (Brasil, 2006), ampliando o acesso dos usuários aos serviços de saúde, tornando a relação profissional-usuário mais humanizada (Brasil, 2006; Takemoto & Silva, 2007). O acolhimento proporciona a mobilização de procedimentos e ações sistemáticas realizadas pelo profissional de saúde, tornando-se uma ferramenta tecnológica de intervenção na qualificação da escuta (Brasil, 2006). Porém, o acolhimento não pode se restringir a ações técnicas, focando somente no problema e a atenção centrada na queixa-conduta (Coelho & Jorge, 2009; Brehmer & Verdi, 2010), nem ter o objetivo de realizar triagem para o atendimento médico. O ato de acolher tem a finalidade da escuta qualificada e de responsabilização do serviço no sentido de dar resolutividade à sua demanda (Oliveira et al., 2008).

338

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


O acolhimento não se constitui em ação pontual e isolada dos processos de produção em saúde, mas que envolve inúmeras ações e intervenções, como o ato da escuta e a produção de vínculo, identificadas como ações terapêuticas (Brasil, 2006), facilitando a construção da autonomia, mediante responsabilização compartilhada entre enfermeiro e usuário (Jorge et al., 2011). Esse momento relacional é uma oportunidade para o estabelecimento de uma aliança terapêutica, possibilitando ao usuário rever seu padrão de consumo, mudar as suas atitudes, aumentar seu comprometimento e esclarecer objetivos terapêuticos (Edwards et al., 1999). Nem sempre o usuário está motivado internamente para reduzir ou parar de usar o álcool ou outra droga, portanto também dependerá de possibilidades dos recursos que o serviço pode oferecer-lhe, estratégias motivacionais externas dos profissionais de saúde para incentivá-lo em sua decisão (Figlie & Bordin, 2010), encaminhá-los para outros serviços especializados (Falk et al., 2010), busca de rede de apoio social e familiar. Porém, salienta-se que essa família precisa ser instrumentalizada pelas enfermeiras, para realizar e participar no cuidado do dependente químico, possibilitando sentir-se segura e confiante (Barreto et al., 2010). Para facilitar o processo de acolhimento das pessoas com padrão de consumo problemático de álcool e outras drogas, estudos apontam que cursos direcionados para a capacitação dos profissionais de saúde da rede, são importantes para a compreensão da complexidade da prática em saúde mental (Oliveira et al., 2008; Barreto et al., 2010) e direcionamento de suas intervenções. Para que haja uma continuidade no cuidado ao dependente químico e seus familiares, é importante estabelecer articulações com todos os serviços oferecidos, para garantir a eficácia dos encaminhamentos previstos (Brasil, 2006). Apesar de a literatura ressaltar que há necessidade das equipes de saúde evitarem que o processo de acolhimento se centralize na figura do médico (Merhy, 1998; Franco et al., 2003; Baraldi & Souto, 2011), uma das dificuldades E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

339


enfrentadas pelos enfermeiros, foi a falta de recursos humanos, principalmente do profissional médico, considerando a necessidade de terapia medicamentosa em um período tão crítico do dependente químico, como por exemplo, a abstinência à droga. O medo e estigma diante do dependente químico, identificados neste estudo, são percebidos pela comunidade e trabalhadores de saúde, dificultando o seu tratamento (Gonçalves & Tavares, 2007) e refletindo no processo de acolhimento, com abordagens e intervenções inadequadas e não terapêuticas. A não realização da escuta terapêutica por fatores de medo ou preconceito interfere negativamente na qualidade da e na produção do cuidado ao usuário que busca ajuda na UBS, ocasionando uma contínua peregrinação desse pelos diversos serviços de saúde (Nery, 2006). Dessa maneira, apesar da resistência e negação

serem

características

presentes

em

usuários

que

fazem

uso

problemático de álcool, eles podem ser colaborativos e cooperativos quando o profissional da saúde preocupa-se com a saúde deles (Babor & Higgins-Biddle, 2001). Considerando que o dependente químico é um cidadão, os trabalhadores de saúde precisam ultrapassar as fronteiras da sua prática cotidiana baseada somente no tratá-lo bem e respeitá-lo, mas refletir sobre o seu “objeto” de trabalho, isto é, o usuário, compreendido enquanto possuidor de direitos e não como aquele que necessita da caridade alheia (Oliveira et al., 2008). É importante salientar que o acolhimento, promove a autonomia do usuário e para que tal objetivo seja alcançado em sua totalidade, há necessidade de o enfermeiro trabalhar tal estratégia na perspectiva de que o usuário, nesse caso o dependente químico, compreenda o seu processo de adoecer e alcance autonomia no auto-cuidado (Nery, 2006).

340

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


27.5. CONCLUSÃO Considerando o objetivo deste estudo de apreender o processo de acolhimento aos usuários de álcool e outras drogas, na percepção das enfermeiras da Unidade Básica de Saúde, observou-se que a concepção do acolhimento foi entendida como ferramenta tecnológica de encontro e diretriz operacional do processo de trabalho. Para uma assistência mais efetiva e resolutiva ao usuário que faz uso de álcool e outras drogas, é necessário que o enfermeiro reveja o seu processo de acolhimento e o considere uma importante ferramenta tecnológica para a criação de vínculos. Considera-se que os resultados deste estudo possam contribuir e subsidiar os enfermeiros atuantes na rede de atenção básica para uma reflexão sobre a importância do acolhimento como estratégia de política pública na atenção ao usuário de álcool e outras drogas, mas principalmente, como ferramenta tecnológica do processo relacional entre profissionais, usuários e famílias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Babor, T. & Higgins-Biddle, J.C. (2001). Brief Intervention for hazardous and harmful drinking. Geneva: World Health Organization. Baraldi, D.C. & Souto, B.G.A. (2011). A demanda do acolhimento em Unidade de Saúde da Família em São Carlos, São Paulo. Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde, 36 (1), 17-25. Bardin, L. (2008). Análise de conteúdo. Portugal:Edições 70. Barreto, M. et al. (2010). Acolhimento em saúde mental: percepções de profissionais vinculados à Estratégia de Saúde da Família. Revista Tempus Actas Saúde Coletiva, 4 (1), 39-49. Brasil. (2006). Acolhimento nas práticas de produção de saúde/Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Brasília:Ministério da Saúde.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

341


Brehmer, L.C.F. & Verdi, M. (2010). Acolhimento na Atenção Básica: reflexões éticas sobre a Atenção à Saúde dos usuários. Ciência & Saúde Coletiva , 15 (supl.3), 3569-3578. Coelho, M.O. & Jorge, M.S.B. (2009). Tecnologia das relações como dispositivo do atendimento humanizado na atenção básica à saúde na perspectiva do acesso, do acolhimento e do vínculo. Ciência & Saúde Coletiva ,14 (Supl.1),1523-1531. Edwards, G. et al. (1999). A avaliação como o início da terapia. In: G.Edwards, J. Marshall & C.C.H. Cook. O tratamento do alcoolismo: um guia para profissionais da saúde (pp.179–203). Porto Alegre:Artmed. Falk, M.L.R. et al. (2010). Acolhimento como dispositivo de humanização: percepção do usuário e do trabalhador em saúde. Revista Atenção Primária à Saúde, 13 (1), 4-9. Figlie, N.B. & Bordin, S. (2010). Motivação. In: N.B. Figlie, S. Bordin & R. Laranjeira R. Aconselhamento em dependência química (pp.249-260). São Paulo:Roca. Franco, T.B. et al. (2003). O acolhimento e os processos de trabalho em saúde: o caso de Betim, Minas Gerais, Brasil. In: E.E. Merhy et al., O trabalho em saúde: olhando e experienciando o SUS no cotidiano (pp.37-54). São Paulo:Hucitec. Gonçalves, S.S.P.M. & Tavares, C.M.M. (2007). Atuação do enfermeiro na atenção ao usuário de álcool e outras drogas nos serviços extra-hospitalares. Escola. Anna Nery Revista Enfermagem, 11 (4), 586-592. Jorge, M.S.B. et al. (2011). Promoção da Saúde Mental - Tecnologias do Cuidado: vínculo, acolhimento, coresponsabilização e autonomia. Ciência & Saúde Coletiva, 16 (7), 3051-3060. Merhy, E.E. (1998). A perda da dimensão cuidadora na produção da saúde: uma discussão do modelo assistencial e de intervenção no seu modo de trabalhar a assistência. In: A.T.Reis et al. Sistema Único de Saúde em Belo Horizonte: reescrevendo o público (pp.103-201). São Paulo:Xamã. Nery, S.R. (2006). O acolhimento no cotidiano dos profissionais das Unidades de Saúde da Família em Londrina-PR. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Londrina, Londrina, Brasil. Oliveira, L.M.L. et al. (2008). Acolhimento: concepções, implicações no processo de trabalho e na atenção em saúde. Revista Atenção Primária à Saúde, 11(4), 362-373 Takemoto, M.L.S. & Silva, E.M. (2007). Acolhimento e transformações no processo de trabalho de enfermagem em unidades básicas de saúde de Campinas, São Paulo, Brasil. Caderno Saúde Pública, 23 (2), 331-340.

342

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


28.

ATITUDES

DOS

ENFERMEIROS

NA

PSIQUIATRIA

FACE

À

IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA NOS CUIDADOS DE ENFERMAGEM Júlia Martinho*; Manuela Martins**; José Carlos Carvalho***; Ilda Fernandes**** *Professora-Adjunta na ESEP; Doutoranda em Ciências de Enfermagem; e-mail: julia@esenf.pt **Professora Coordenadora na ESEP; Professor Doutor em Ciências de Enfermagem; email: mmartins@esenf.pt ***Professor-Adjunto na ESEP; Professor Doutor em Ciências de Enfermagem; email: zecarlos@esenf.pt ****Professora- Adjunta na ESEP, Professora Doutora em Ciências de Educação; email: ildafernandes@esenf.pt

RESUMO Os estudos sobre as atitudes dos enfermeiros mostram que há uma discrepância entre os relatos e o desenvolvimento de práticas centradas na família, o que comprova que as representações e as ações não são congruentes, razão pela qual desenvolvemos este estudo, que tem como objetivo analisar as atitudes dos enfermeiros do contexto de psiquiatria face à família. Utilizamos uma abordagem quantitativa, estudo descritivo-correlacional. Os dados

foram

colhidos

utilizando

um

questionário

que

integra

dados

sociodemográficos e a escala "A importância das famílias no cuidado de enfermagem - as atitudes das enfermeiras (IFCE-AE)", aplicado a 56 enfermeiros (43,23% da população) de uma instituição psiquiátrica da região do Norte de Portugal. Os resultados sugerem que os enfermeiros que participaram neste estudo têm maioritariamente uma atitude integrativa face à importância da família nos cuidados, existindo relação estatisticamente significativa entre as atitudes família como fardo e a formação em enfermagem de família o que indica o quanto é importante promover e desenvolver esta área de formação.

Palavras-Chave: Atitudes; Enfermagem; Família; Psiquiatria. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

343


28.1. INTRODUÇÃO Com a inserção do doente mental na comunidade a família cada vez mais foi-se

evidenciando como

basilar

neste

processo,

tornando-se

clara a

necessidade de a apoiar, na atenção e suporte de saúde bem como nas necessidades sociais (Johnson,2000). Deste modo, destaca-se o papel do profissional de saúde mental na capacitação destas famílias (Huxley,1990) perspetivando um cuidado em parceria, no qual o papel de ambos os cuidadores é complementar (Gartner, Lipsky, e Turnbull, 1991). A investigação tem vindo a revelar que existem alguns problemas na interação entre os profissionais de saúde mental e a famílias dos doentes (Kuipers & Bebbington,1990). Algumas barreiras têm sido identificadas, como atitudes menos positivas dos profissionais face à família assentes numa culpabilização desta, pelo agravamento ou aparecimento da doença, bem como na

falta de conhecimento e habilidades profissionais específicas sobre as

famílias e suas necessidades reais. Efetivamente, têm sido poucos os estudos que centralizam o foco na interação dos profissionais com as famílias e na perceção que estes detêm sobre a qualidade dessa interação (Bernheim & Switalski, 1988; Riebschleger, 2001; Rubin,

Cardenas,

Warren, Pike, & Wambach, 1998). Alguns estudos, desde a década de 80, relatam insatisfação por parte das famílias com os profissionais de saúde (Holden &Lewine,1982; Spaniol & Zipple, 1988). Centrando-se essa insatisfação na informação considerada insuficiente, especialmente em relação ao medicamento (efeitos colaterais e dosagens) e na ausência de apoio para lidar no cotidiano com o doente mental. Essa insatisfação manteve-se na década de 90, revelando os estudos, que as famílias se queixavam de falta de apoio e conselhos práticos na utilização da medicação e na gestão da 344

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


doença (Solomon & Marcenko, 1992), no envolvimento e acompanhamento na comunidade (Hanson & Rapp, 1992) e o atraso na obtenção de ajuda e descrédito nos relatos das situações patológicas do seu familiar doente (Greenberg, Steven & Greenley, 1997; Jeon & Madjar, 1998). Outros estudos relatam a diminuição do stress familiar quando os profissionais envolveram a família no processo de cuidados, os trataram como parceiros (Greenberg, Steven, & Greenley, 1997) e lhe proporcionaram conselhos práticos e apoio na gestão de comportamentos, aumentando assim a sensação do cuidador familiar de controlo (Reinhard, 1994). Várias iniciativas politicas e institucionais têm reconhecido o papel importante do cuidador tendo cada vez mais vindo a assistir-se à implementação de programas de apoio às necessidades por eles expressas. No entanto, a investigação continua a revelar dificuldades e insatisfação no relacionamento entre os profissionais de saúde mental e cuidadores familiares (Doornbos, 2002; Ferriter & Huband, 2003; Heather, de 2004; Muhlbauer, 2002; Rapaport, et al., 2006) centrando-se as queixas na falta de comunicação, nos breves e inconstantes contatos com os profissionais (Ferriter & Huband,2003), na total falta de conhecimento sobre o papel do cuidador familiar e de empatia com eles ou com a sua situação e necessidades (Rapaport et al.,2006). Estas dificuldades mantêm-se, segundo os profissionais, pela falta de tempo, de conhecimento das famílias e pela ausência de apoio dos serviçosinstituições para se trabalhar com as famílias (Kaas, Lee & Peitzman (2003).Os profissionais de saúde mental descrevem ter plena consciência da necessidade e dos benefícios de ter uma relação positiva com os familiares, no entanto, manifestam alguma incerteza como isso pode ser feito. Identificam também, como principais barreiras a falta de conhecimento e de habilidades para trabalhar com as famílias, excesso de trabalho e exigências dos serviços-instituições dirigidas para outros objetivos (Nicholls & Pernice, 2009). Estes profissionais E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

345


foram considerados por outros colegas como conservadores e lentos em aceitar as mudanças. Consideramos que aumentar o entendimento das atitudes dos enfermeiros de saúde mental face à família pode ajudar na consciencialização e mudança de comportamentos e na conceção de intervenções dirigidas às suas necessidades, razão que fundamenta a importância e a motivação para o desenvolvimento deste estudo. Objetivo: Analisar as atitudes dos enfermeiros face à família em contexto psiquiátrico.

28.2. METODOLOGIA Abordagem quantitativa • Opção metodológica : Estudo descritivo - correlacional. População em estudo: Enfermeiros de um hospital psiquiátrico do Norte de Portugal. (N=129) Amostra: não probabilística intencional, composta por 56 enfermeiros (43,23% da população). Técnica e instrumentos de recolha de dados: • Questionário de autorrealização constituído por: Dados sociodemográficos e escala "A importância das famílias no cuidado de enfermagem - as atitudes das enfermeiras (IFCE-AE)". Desenvolvido por Benzein et al. (2008ab) e validado para população portuguesa por Oliveira et al. (2009). A escala é constituída por 26 itens utilizando uma escala de concordância de estrutura do tipo Likert (4 opções), que varia desde discordo completamente (1) a concordo completamente (4) que mede as seguintes dimensões: Família: parceiro dialogante e recurso de 346

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coping (12 itens); Família: recurso nos cuidados de enfermagem (10 itens); Família: fardo (4 itens). A pontuação obtida na escala pode variar entre 26 e 104, considerando-se quanto maior o score obtido, mais as atitudes dos enfermeiros sobre a família são de suporte (Benzein et al., 2008b). Variáveis: sociodemográficas e atitudes. Procedimentos: Foi pedida autorização ao Conselho de Administração da Instituição para realização do estudo. Foi explicado aos enfermeiros o objetivo do estudo, os procedimentos e pedida a sua colaboração no preenchimento do questionário e do consentimento livre e informado. O questionário foi aplicado a todos os enfermeiros da instituição, no mês de Abril de 2011. O procedimento para a análise dos dados obtidos nos questionários envolveu a estatística descritiva simples com a respetiva análise de frequências absolutas e medidas de tendência central e análise multivariada, considerando uma probabilidade de erro máximo de 5%. Utilizou-se estatística não paramétrica em amostras com menos de 30 sujeitos recorrendo ao SPSS versão 19.0.

28.3. RESULTADOS Participaram no estudo 56 enfermeiros (43,23%), de uma população de 129 enfermeiros. Maioritariamente do sexo feminino (69,6%,n=39), com idades compreendidas entre os 22 e os 59 anos (M=32,4 DP= 7,9) e com experiência profissional compreendia entre 1 e 35 anos (M=9,63 DP=7,7). Dos participantes 82,1% referem ter tido experiências pessoais anteriores com familiares gravemente doentes. Dos inquiridos: 44,6% têm uma especialidade de enfermagem sendo que destes a maioria 41% possuem a especialidade de psiquiatria e saúde mental,14, 3% têm pós-graduações (emergência, supervisão clinica entre outras) e 41% refere ter formação no âmbito de enfermagem de família (33,9% em contexto académico e 7,1% em autoformação). E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

347


De seguida apresentamos no quadro1 o resumo das atitudes dos enfermeiros face à família, desenvolvidas no hospital de psiquiatria. Quadro 1 - Estatísticas descritivas das atitudes dos enfermeiro face à família Atitudes face à família

Mínimo

Máxim

Média

o Família:

Parceiro

dialogante

Desvio Padrão

e

20

48

36,45

4,246

Família: Recurso nos cuidados de

20

38

31,58

3,563

Família: Fardo

4

12

7,98

1,986

Score total

50

91

76,018

7,015

recurso de coping

enfermagem

Neste hospital, conforme o quadro 1, as atitudes face à família que os enfermeiros desenvolvem mais são as atitudes de integração da família como parceiro dialogante e recurso de coping com um valor médio de 36,45, seguindose as atitudes de integração da família enquanto recurso nos cuidados de enfermagem com um valor médio de 31,58 e finalmente as atitudes que perspetivam a família como um fardo, com um valor médio de 7,98. O score total da escala apresenta um valor médio de 76,0, podendo variar entre 26 e 104, considerando-se que quanto maior o score obtido, mais as atitudes dos enfermeiros sobre a família são de suporte (Benzein et al., 2008b).

348

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Quadro 2 – Índice médio das atitudes face à família pelo título profissional Titulo profissional Família: Parceiro dialogante e recurso

Enfermeiro

N

Média

32

30,50

24

24,77

p

de coping Enfº Especialista

Família: Recurso nos cuidados de enfermagem

Família: Fardo

Score total AT

Total

56

Enfermeiro

31

29,53

Enf Especialista

24

26,02

Total

56

Enfermeiro

32

26,53

Enf Especialista

24

29,90

Total

56

Enfermeiro

32

29,61

Enf Especialista

24

25,92

Total

56

p=0,05

Para saber se os enfermeiros (generalistas e especialistas) desenvolvem igualmente as mesmas atitudes face à família, recorremos ao teste não paramétrico de Mann-Whitney. Usou-se uma probabilidade de erro 0,05. Segundo as autoras da escala (Benzein,2008b) um maior score obtido, nas dimensões Família: Parceiro dialogante e recurso de coping e Família: Recurso nos cuidados de enfermagem associados a um menor score na dimensão família: fardo, traduzem atitudes mais positivas face à família. Observamos assim, no quadro 2, que os enfermeiros generalistas desenvolvem atitudes mais positivas face à família do que os enfermeiros especialistas. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

349

,184

,417

, 433

, 395


Quadro 3 – Índice médio das atitudes face à família pela formação em enfermagem de família

Família: dialogante

Parceiro e

recurso

Recurso

N

Média

Não

32

25,97

Sim, contexto académico

20

29,95

Sim, autoformação

4

35,00

Total

56

Não

32

25,94

Sim, contexto académico

20

30,32

Sim, autoformação

4

33,50

Total

56

Não

32

33,02

Sim, contexto académico

20

22,58

Sim, autoformação

4

13,63

Total

56

Não

32

27,02

Sim, contexto académico

20

29,00

Sim, autoformação

4

31,13

Total

56

p

de

coping

Família:

Formação Enfermagem Família

nos

,452

cuidados de enfermagem

Família:Fardo

Score total AT

,493

,012

,840

De referir que não se verificam diferenças estatisticamente significativas. p=0,05 350

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No quadro 3 observamos que os enfermeiros que referem ter formação em enfermagem de família obtida através da autoformação têm atitudes mais positivas que os enfermeiros que têm formação obtida em contexto académico e os que não têm formação, sendo estes os que têm atitudes menos positivas. Existindo relação estatisticamente significativa entre as atitudes - família como fardo e a formação em enfermagem de família (p=0,002) e a autoformação (p=0,012).

28.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS:Os enfermeiros que participaram neste estudo têm maioritariamente uma atitude integrativa face à importância da família nos cuidados, destacando-se os enfermeiros generalistas que têm scores médios superiores. O que nos leva a questionar o que poderá estar na origem desta diferença. Existe relação estatisticamente significativa entre as atitudes - família como fardo e a formação em enfermagem de família o que indica o quanto é importante promover e desenvolver esta área de formação.

28.5. CONCLUSÕES A qualidade da interação com a família é influenciada pelas atitudes dos enfermeiros sendo fundamental promover a participação dos enfermeiros na formação dirigida para a área da família, por forma a diminuir e minimizar o impacto de atitudes menos positivas face à família e a desenvolver nos enfermeiros habilidades e partilha de competências que lhes permitam integrar as famílias nos cuidados, aumentando a satisfação de todos os envolvidos neste processo. Limitações do estudo: Uma limitação inerente ao estudo é a impossibilidade de generalização dos resultados a outras situações, devendo-se essencialmente ao número limitado de E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

351


participantes. Consideramos também, que a entrevista deveria ter sido associada ao questionário, potencializando a recolha de dados e uma melhor compreensão das atitudes dos enfermeiros face à família em contexto de psiquiatria. Deixamos como sugestão a replicação do estudo com as limitações retificadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS Benzein, E.; Årestedt, F.; Jonhansson, P. e Saveman, BI. (2008a) – Families’ Importance in Nursing Care Nurses’ Attitudes – An Instrument Development. Journal of Family Nursing, 14 (1), 97-117. Benzein, E.; Jonhansson, P.; Årestedt, F.; Berg, A. e Saveman, BI. (2008b) – Nurses’ Attitudes About the Importance of Families in Nursing Care A Survey of Swedish Nurses. Journal of Family Nursing, 14 (2), 162180. Bernheim, K. F., & Switalski, T. (1988, January). Mental health staff and patient’s relatives: How they view each other. Hospital and Community Psychiatry,39(1), 63–68. Doornbos, M. M. (2002, February). Family caregivers and the mental health care system: Reality or dreams. Archives of Psychiatric Nursing, 16(1), 39–46. Ferriter, M., & Huband. N. (2003). Experiences of parents with a son or daughter suffering from schizophrenia. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 10, 552–560 Gartner, A., Lipsky, D. K., & Turnbull, A. P. (1991). Supporting families with achild with a disability. Baltimore, MD: Paul. H Brookes. Greenberg, J. S., Steven, J., & Greenley, J. R. (1997). Do mental health services reduce distress in families of people with serious mental illness? Psychiatric Rehabilitation Journal, 2(1), 40–55. Hanson, J. G.,&Rapp, C. A. (1992). Families’ perceptions of community mental health programs for their relatives with a severe mental illness. Community Mental Health Journal, 28(3), 181–197. Heather, J. (2004). Research report. “I don’t understand why there is such a problem with listening to families. . . ” A study exploring the experiences of families as partners in care when an adolescent/young adult family member has a mental illness. Nelson: Nelson Marlborough Institute of Technology. Holden, D. F., & Lewine, R. R. J. (1982). How families evaluate mental health professionals, resources, and effects of illness. Schizophrenia Bulletin, 8(4), 626–633. Huxley, P., Hagan, T., Hennelly, R., & Hunt, J. (1990). Effective community mental health services. England: Ashgate.

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353


29.

CONVIVER

COM

UMA

PESSOA

COM

ESQUIZOFRENIA:

REPERCUSSÕES NOS FILHOS E CÔNJUGE José Carlos Carvalho*; Paula Pinto Freitas**; António Leuschner*** *Professor Adjunto, Escola Superior de Enfermagem do Porto, zecarlos@esenf.pt **Professora Auxiliar, Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar UP ***Professor Catedrático Convidado, Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar UP

Resumo A convivência com as pessoas com esquizofrenia, tem sido um alvo crescente de interesse, uma vez que é uma síndrome heterogénea que afeta as capacidades do doente a diferentes níveis. Os filhos dos doentes têm sido vistos como um grupo de risco no que respeita à sua saúde mental em resultado da exposição à doença do progenitor e/ou do risco genético assim como os cônjuges estão expostos às manifestações da doença. Tivemos como objetivo caracterizar a família dos doentes que têm filhos, entre os 6-18 anos, e que mantêm contacto regular com eles. Estudo de natureza quantitativa, descritivo e analítico, constituído por 38 famílias (38 doentes, 25 cônjuges e 50 filhos), com recurso a instrumentos de avaliação individual e familiar (FACES IV; PFQP; WHOQOL, FRT) e respeito pelas normas éticas. Os filhos dos doentes com esquizofrenia apresentam maior vulnerabilidade e mais indicadores de risco que o grupo de controlo, porém, sem resultados estatisticamente significativos. Tanto os doentes como os cônjuges têm uma perceção da sua família como funcional (maioria das famílias são flexíveis e unidas). Apesar das dificuldades, os progenitores referem uma preocupação acrescida na exposição dos seus descendentes ao rótulo da doença mental e em colocar em risco a sua guarda legal. 354

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Palavras-chave: Esquizofrenia; Família; Filhos; Enfermagem.

Abstract Schizophrenia as a heterogeneous syndrome affects the patient’s ability in different levels (language, perception, thought) and is characterized by a combination of signs and symptoms, with mental deterioration and impaired social functioning. The family is considered as the basic unit for personal development and where youngsters live essential experiences for personality growth. Our aim is to characterize the family of the patient with schizophrenia who have children and are maintaining regular contact with them, more focused on descendants aged between 6-18 years, since children of patients with schizophrenia have been considered as a risk group regarding their mental health disease, as a result of the exposure to parent disease and / or genetic risk. This is a quantitative study, descriptive and analytical, consisting of 38 families (38 patients, 25 spouses and 50 children) and with the use of instruments for individual and family assessment (FACES IV; PFQP; WHOQOL, FRT). The present study respects all ethical standards. The elements of the family: patients, spouses and children, present some socioeconomic, educational and access to health difficulties as well as lack of information about the disease. Both patients and spouses have a perception of their family as functional and most families are characterized as flexible and united.

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355


Although not to be recognized a greater concern, is an sensitive area to nursing mental health care and the nurse has a key role in monitoring these families and changing mental disease stigma.

Key words: Schizophrenia; Family; Children; Nursing.

29.1. INTRODUÇÃO As crianças que são criadas em famílias em que um dos progenitores tem esquizofrenia, assim como os seus pontos de vista, raramente têm sido estudados. O desconhecimento de trabalhos portugueses sobre esta temática, aliado à falta de consensos nos trabalhos que têm sido publicados, nomeadamente quanto à prevalência de psicopatologia nestas crianças e a importância atribuída à família, foram a motivação para o estudo. O conceito de esquizofrenia sofreu várias alterações ao longo dos tempos. Muitas vezes é definida como uma síndrome heterogéneo de perturbações ao nível do pensamento, da perceção, da linguagem, do afeto e da volição, caracterizando-se por uma combinação de sinais e sintomas, com prejuízo no funcionamento social e/ou ocupacional e deterioração mental, afetando pessoas de todas as classes sociais. Os sintomas positivos da esquizofrenia (ideias delirantes, alucinações, transtorno formal do pensamento, comportamento extravagante e desorganizado) são muitas vezes, exuberantes e atraem a atenção. Os sintomas negativos tendem a prejudicar a capacidade da pessoa de levar uma vida quotidiana normal. Esta sintomatologia tem uma relação muito importante e direta com as possíveis repercussões da doença na família. Os efeitos

dos

sintomas

negativos

no

funcionamento

do

indivíduo

são,

habitualmente, o primeiro sinal de que algo está errado, para a família, assim como a imprevisibilidade que ocorre na relação com o doente com esquizofrenia, tem um efeito profundo nos membros da família. Os comportamentos erráticos 356

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ou inapropriados de muitos doentes psiquiátricos, associados à falta de informação sobre a doença, são causas frequentes de stress e tornam a família mais suscetível aos casos de ansiedade, depressão e raiva (Yacubian & Neto, 2001). O conceito de família tem-se alterado, acompanhando as mudanças da sociedade, e tem ultrapassado as questões da consanguinidade e da coabitação, com maior destaque para as dimensões psicológicas e sociológica (Wright & Leahey, 2009; Figueiredo, 2009). Esta crescente valorização da família e do seu papel como cuidadora, nomeadamente

pela

importância

do

envolvimento

familiar

no

processo

terapêutico, fundamental na recuperação do doente, fomentou também o crescimento da investigação relativa à família da pessoa com doença mental grave e, ao mesmo tempo, foi-se alterando a perspetiva de olhar para a família (Xavier et al. 2002).

Objetivos Estudo e caracterização do funcionamento da família do doente com esquizofrenia, que tem filhos com idades entre os 6 e os 18 anos e que vive ou mantém contato frequente com ele(s).

29.2. METODOLOGIA Estudo transversal, descritivo e exploratório. O protocolo de colheita de dados incluiu instrumentos de avaliação individual e familiar. A amostra foi constituída por 38 famílias (38 doentes, 25 cônjuges e 50 filhos), selecionados num hospital especializado do norte de Portugal.

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29.2.1. INSTRUMENTOS DE COLHEITA DE DADOS • Escala de Graffar, para a caracterização social da família (profissão, instrução, fontes de rendimento familiar, conforto do alojamento e os aspetos da habitação/bairro). • Questionário de Problemas Familiares de Morosini et al. (1991), na versão portuguesa, Portuguese Family Problems Questionnaire (PFPQ), de Xavier & Caldas Almeida (2002). Composto por cinco fatores principais (sobrecarga objetiva; sobrecarga subjetiva; apoio recebido; atitudes positivas e criticismo) e por secções adicionais onde se destacam a sobrecarga para os filhos e as implicações económicas diretas e indiretas, tendo sido desenvolvido para avaliação da familia que convive com doente com esquizofrenia. • World Health Organization Quality of Life (WHOQOL-Bref), da OMS, na versão portuguesa de Canavarro et al. 2006). Instrumento de medida genérico, multidimensional e multicultural, que permite a avaliação subjetiva da qualidade de vida (QV). Constituido por 26 questões (2 relativas à perceção geral da QV e 24 questões que representam os 4 domínios: fisico, psicológico, relações sociais e ambiente. • Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scales (FACES IV), de Gorall, Tiesel & Olson, (2004, 2006) e na versão portuguesa de Rolim, Rodrigues & Lopes (2005, 2006). Questionário de autoavaliação do funcionamento familiar, composto por 62 questões. Com duas dimensões centrais que são: a coesão e a adaptabilidade/flexibilidade da família, permite caraterizar as perspetivas individuais, face à família quanto aos níveis de coesão e de flexibilidade/adaptabilidade, assim como os níveis de satisfação e de comunicação familiar. Importante para o diagnóstico das relações familiares (Olson, Gorall & Tiesel, 2006).

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• O Family Relations Test (FRT) de Bene & Anthony (1957) - Teste das Relações Familiares, teste projetivo, lúdico e de fácil aplicação, que consiste em convidar a criança a reproduzir a sua família real, incluindose a si mesma, através de figuras de cartão com uma silhueta ambígua (representando pessoas de ambos sexos, com diversas idades, tamanhos e aparências). Uma das figuras é designada pelo Sr. Ninguém e nela são depositados as mensagens que a criança entende não serem dirigidas a nenhum dos elementos da família. Adaptam-se a qualquer família específica e a introduzir pequenas mensagens, que exploram as relações afetivas intrafamiliares (Malpique, 1998).

29.2.2. PROCEDIMENTOS Amostra constituída por indivíduos adultos de ambos os sexos, com o diagnóstico de esquizofrenia e que têm filhos com idades compreendidas entre os 6 e os 18 anos, com contacto frequente e que aceitaram participar no estudo a partir da população de doentes com o diagnóstico de esquizofrenia, seguidos em um hospital especializado de Psiquiatria do norte de Portugal. Aos doentes/familiares eram explicados os objetivos e a finalidade do estudo e solicitada a participação e o consentimento informado. Solicitada a autorização e o consentimento expresso da Comissão de Ética do hospital. A colheita de dados decorreu de março de 2008 a dezembro de 2009 no domicílio dos doentes selecionados. Foram utilizadas estratégias com a finalidade de obter o máximo de doentes referenciados: 1. Solicitando apoio ao pessoal de Enfermagem da consulta externa, que ajudou a referenciar o maior número de doentes (melhor conhecimento) com filhos. 2. Solicitada colaboração de outros profissionais de saúde mental, pelo conhecimento que podiam ter dos doentes e famílias.

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3. Consultando os processos clínicos no arquivo clínico da instituição, para deteção de referências à existência de filhos. Dos 3056 doentes com esquizofrenia foram referenciados 213 (6,9%) doentes com filhos e foi possível contactar 155 famílias (72,8%) e sinalizar a existência de 274 filhos. A amostra foi constituída por 38 famílias (38 doentes, 25 cônjuges e 50 filhos). As variáveis quantitativas contínuas foram analisadas através de medidas de tendência central e de dispersão e do tipo nominal, tendo sido analisadas de acordo com as frequências relativas e absolutas com recurso ao Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS Statistics 19).

29.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS As famílias são maioritariamente constituídas por agregados familiares reduzidos (23,7% vivem apenas com o(a) filho(a) e 42,1% com o(s) filho(s) e cônjuge), pertencem à classe média baixa

(47,4% segundo Graffar) e os progenitores apresentam baixa

escolaridade. Os doentes são maioritariamente (52,6%) do sexo feminino, com uma média de idade de ‫ݔ‬ҧ ݅݀ܽ݀݁ =40,87 (±4,82) anos, cerca de metade (47,4%) são profissionalmente ativos, ainda que com profissões não qualificadas, e 76,3% mantêm contacto permanente com os filhos embora apenas ao fim de semana em 23,7%. O aparecimento da sintomatologia foi posterior ao relacionamento conjugal em 66,7% dos casos e o nascimento do primeiro filho ocorreu antes do aparecimento da doença em 61,8% dos casos. Os cônjuges (casados: 88%, união de facto: 12%) têm uma média de idade mais elevada, sendo que 76% são profissionalmente ativos, ainda que com profissões de baixa qualificação, e 62,5% tiveram de alterar o seu funcionamento familiar. No entanto, 29,2% referem ter tido necessidade de alterações no seu quotidiano e 16% estarão a ser seguidos em consulta de Psiquiatria. Globalmente apresentam bons valores médios de qualidade de vida (WHOQOL), com valores da média acima dos 75% para o domínio psicológico e de 72% para o domínio físico. 360

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Relativamente à perceção da família com o Faces IV, pela análise de frequências, verificou-se que os doentes percecionam a sua família como uma família unida (58,6%), muito flexível (69,0%), com um nível de comunicação familiar moderado (51,7%). No entanto referem um nível de insatisfação familiar elevado (75,8%). Apontam para um baixo nível de emaranhamento (58,6%), para um nível de desmembramento baixo (44,2%) e muito baixo (34,5%), com níveis de rigidez moderados (48,3%) e com um nível caótico baixo e muito baixo (75,8%). Os cônjuges percecionam a sua família como uma família unida (65,2%), muito flexível (82,6%) com um nível de comunicação familiar moderado (43,5%) ou alto (39,1%), e referem também um baixo nível de satisfação familiar (56,6%). Os resultados, apontam para um baixo (56,5%) nível de emaranhamento, com um nível de desmembramento muito baixo (56,5%), com níveis de rigidez moderados (43,5%) ou baixo (34,8%) e com um nível caótico baixo (47,8%) ou muito baixo (47,8%). Os doentes apresentam resultados compatíveis com 10 tipos de família diferentes

(Modelo Circumplexo/FACES

IV),

com

16

(55,2%)

doentes

a

considerarem a sua família como flexível e unida. Os cônjuges apresentam resultados compatíveis com 5 tipos de família diferentes e 16 (60,9%) consideram, as suas famílias como flexíveis e unidas. Relativamente aos filhos dos doentes com esquizofrenia, constata-se que 68% viviam com ambos os progenitores. Evidenciaram a presença de alguns fatores problema e/ou indicadores de vulnerabilidade (reprovações: 28%, seguimento em consulta de pedopsiquiatria: 8%, medicação psicofarmacológica: 8%, institucionalizadas: 6%). A perceção das relações familiares pelos filhos através do FRT mostra que as figuras dos progenitores e as mães em particular, recebem globalmente mais afetos positivos que negativos não existindo diferenças quanto aos sentimentos positivos e negativos enviados e recebidos quer ao pai quer à mãe em função do estado de saúde/doença do progenitor em causa. Ou seja, na nossa amostra a situação de doença não parece influenciar a qualidade dos afetos que os filhos nutrem em relação aos progenitores. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

361


29.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os agregados familiares são constituídos na sua maioria por famílias nucleares, com a presença do(s) filho(s) e do cônjuge. Alguns contam com a presença dos ascendentes dos doentes, no entanto em muito menor escala, do que acontece com os doentes que não constituíram família e que vivem dependentes dos pais ou de familiares. O contacto com os filhos foi um critério de seleção da amostra, mas surpreende o facto de os filhos conviverem diariamente com o progenitor doente: 76,3% vivem permanentemente com o progenitor doente. Pela nossa experiência profissional e pelo acompanhamento dos doentes nos serviços de internamento de Psiquiatria, muitas vezes temos a perceção que os doentes com esquizofrenia, não têm contacto com os descendentes, sendo a custódia dos filhos entregue a terceiros (institucional ou familiares). Este facto realça ainda mais a importância deste estudo. Sendo um estudo sobre os descendentes dos doentes e sobre os cônjuges, era expectável que os doentes, que vivem maritalmente, fossem em maior número que os solteiros, o que se verifica, com a condição de casado/união facto a representar mais de 65% da amostra. Nas famílias estudadas, 52,6% dos doentes são do sexo feminino, o que está de acordo com a população em estudo, justificado pelo início tardio da doença na mulher, assim como à sintomatologia ser menos exacerbada. Dalery & D’Amato (2001), referem que 61% dos homens com esquizofrenia, não viviam em casal (depois dos 25 anos) contra 40% das mulheres, em que 42% das mulheres têm capacidade para manterem uma relação conjugal estável, contra apenas 12% dos homens. A constituição da família e a opção de ter filhos foi maioritariamente anterior à doença. O nascimento do primeiro filho ocorreu, em 61,8% dos casos, anteriormente ao processo de doença, pelo que as crianças passaram também elas por um processo de adaptação, além de todas as alterações ocorridas no ambiente familiar. O mesmo se verificou com as relações conjugais, tendo 362

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iniciado

o

relacionamento,

em

66,7%

das

situações,

anteriormente

às

manifestações e à sintomatologia própria da esquizofrenia. Os baixos índices de escolaridade, associados às dificuldades impostas pela doença, assim com a presença de algum estigma social, levam a maior dificuldade no acesso a profissões mais qualificadas e melhor remuneradas. Apesar das dificuldades referidas, cerca de metade dos doentes, encontra-se no ativo em termos laborais, continuando no mercado de trabalho o que é concordante com os bons níveis de funcionalidade evidenciados pela amostra estudada. O tempo de doença apresenta uma amplitude grande [2-32 anos], existindo doentes em acompanhamento psiquiátrico há muitos anos e onde é claramente acentuado o caráter crónico da doença. O acompanhamento psiquiátrico no sexo masculino é praticamente o dobro do sexo feminino, possivelmente porque as mulheres apresentam evolução menos grave, menos recidivas, menos hospitalizações e consequentemente internamentos mais curtos (Sadock & Sadock, 2008),

permitindo uma

manutenção das capacidades de viver em casal e com menor repercussões sociais da doença, melhor autonomia e capacidade de trabalho (Dalery & D’Amato, 2001). As mulheres jovens pré-esquizofrénicas encontram-se melhor adaptadas que os homens. Antes da descompensação clínica da doença, 40% das mulheres são casadas no momento do primeiro internamento, contra 30% dos homens e o mesmo se verifica com o desenvolvimento psicossexual em que 16% das mulheres nunca tiveram relações sexuais antes do início da doença, contra 40% dos homens (Dalery & D’Amato, 2001). Dos cônjuges que participaram no estudo, 4 referiram ter também problemas da área da saúde mental, sendo acompanhados em consulta de Psiquiatria. A sintomatologia referida pelos cônjuges relaciona-se diretamente com sintomatologia depressiva ou quadros depressivos. Os cônjuges e os familiares estão sujeitos à “sobrecarga subjetiva”, algo difícil de ser mensurado, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

363


apesar dos esforços e de instrumentos como o PFQP. Com a utilização do inventário

neuropsiquiátrico

pretendia-se

saber

quais

os

episódios

de

manifestação de sintomatologia psiquiátrica que foram percebidos, tendo-se verificado que alguns comportamentos estão presentes em praticamente todas as famílias. Alguns destes sinais e sintomas típicos da doença mental, podem induzir per si algumas alterações no relacionamento com os filhos e podemos verificar

que

estiveram

expostos

a

manifestações

de

ansiedade

e

a

comportamentos depressivos, assim como experienciaram episódios de agitação e de irritabilidade. Um dos aspetos que foi mais valorizado refere-se às alterações dos padrões do sono que estariam claramente prejudicados. As alterações do sono não interferem só com o doente, interferindo de igual modo com o companheiro. As mudanças nos padrões de sono e de repouso alteram o funcionamento global do organismo, potenciam uma menor concentração, induzem maior sonolência diurna, condicionam um maior risco de acidentes, assim como uma maior irritabilidade e maior cansaço psicológico (Sadock & Sadock, 2008) e por consequência, menor disponibilidade para os filhos/família. A presença de atividade delirante e/ou alucinatória, sintomatologia algo emblemática desta doença, não foi mencionada pela maioria dos cônjuges. Considera-se este aspeto relevante, uma vez que a exposição a este tipo de sintomas da doença poderá condicionar a forma como lidam com o doente e com a doença em família. A análise da qualidade de vida (QV) pelo WHOQOL revela valores percentualmente altos, permitindo afirmar que a QV dos cônjuges está preservada, com valores mais elevados nos domínios da saúde física/mental e valores mais baixos nas relações sociais e do meio ambiente. Os tipos de família, de acordo como o modelo Circumplexo e o Faces IV, mostram uma grande variedade da perceção que os doentes têm da sua família, mas maioritariamente apresentam família unidas e flexíveis dentro dos padrões considerados normais de funcionalidade. Pela análise do tipo de família podemos verificar algumas diferenças e algumas semelhanças na forma como o doente e o seu cônjuge percecionam a 364

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sua família, mesmo quando esta apresenta evidência de ser considerada não equilibrada. A existência de 3 famílias classificadas como caóticas e emaranhadas, apesar de ser considerado baixo, poderá significar a existência de crianças em risco. Os progenitores demonstram uma preocupação acrescida na proteção dos seus descendentes, o que poderia ser considerado protetor, revelando, no entanto, inibição no pedido de ajuda externa, podendo não ser favorecedor da saúde familiar e do despiste de situações potencialmente graves para os próprios e para a restante família. A ausência de informação relativa à família dos doentes com esquizofrenia poderá indiciar a pouca importância atribuída a este subgrupo de doentes, o que vai contra o que se preconiza para o tratamento e para a reabilitação (Portugal, 2008). As famílias em que existe um progenitor com esquizofrenia não estão sinalizadas e toda a informação está dispersa pelos vários técnicos, sendo um aspeto a melhorar e em que a enfermagem deve ter um papel crucial.

29.5. CONCLUSÕES A existência da doença, por si, não foi motivo para que as famílias não pudessem funcionar. Tanto os doentes como os cônjuges apresentam uma perceção da sua família como funcional e a maioria das famílias são caracterizadas como flexíveis e unidas. O grupo de doentes estudados, apresenta bons índices de funcionalidade, também confirmada pelo número significativo de doentes profissionalmente ativos. Admite-se que este nível de funcionalidade pode estar relacionado com a própria integração do doente na família, podendo admitir-se serem os doentes à priori mais funcionais que constituem família e/ou que a constituição e manutenção da família funcione como fator protetor. Existe preocupação dos cônjuges no bem-estar dos doentes e na manutenção da relação, uma vez que E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

365


valorizam

muito

a

relação

e

manifestam

uma

preocupação

com

o

companheiro(a), negligenciando as atividades de lazer/distração, na medida em que outros aspetos do relacionamento são mais urgentes ou requerem maior exigência. Revelam uma boa perceção da qualidade de vida, avaliada pelo WHOQOL, que se traduz pela boa adaptação ao processo de saúde/doença do seu cônjuge. Apesar da existência da doença na família, revelam uma preocupação acrescida na proteção dos seus descendentes, no que diz respeito a expô-los ao rótulo da doença mental, uma vez que o estigma ainda é um fator de exclusão. A relação de proximidade das crianças com o progenitor doente é frequente, apesar da esquizofrenia. Os filhos estão expostos a vários fatores de vulnerabilidade e risco, além da doença mental crónica de um dos progenitores. Se tivermos em conta o conjunto de indicadores utilizados para avaliar o potencial

sofrimento

e/ou

desadaptação

na

criança

(manifestações

psicopatológicas, recurso a consulta especializada, uso de psicofármacos, reprovações/retenções escolares, enquadramento familiar) constata-se que um ou mais destes indicadores estava presente nos filhos de doentes com esquizofrenia. Apesar disso a doença mental do progenitor não parecia influenciar a qualidade dos sentimentos expressos relativamente ao pai ou à mãe. Este estudo aborda áreas de estudo e investigação multidisciplinares, sendo defendida a complementaridade de todos os profissionais de saúde e onde a enfermagem deve ter um papel importante, contribuindo com mais um olhar na abordagem da esquizofrenia e da família.

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368

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30.

VERDADES

ÚNICAS

DE

PERCURSOS

PARTILHADOS:

CONJUGALIDADE E PROBLEMAS LIGADOS AO ÁLCOOL Joana Amaral*; Zélia Teixeira**

*Psicóloga; Formadora na TalentStage – Formação, Investigação e Consultoria em Saúde; joanamaral.psi@gmail.com **Psicóloga; Docente da Universidade Fernando Pessoa; Formadora na TalentStage – Formação, Investigação e Consultoria em Saúde; zeliamacedoteixeira@gmail.com

RESUMO Assente nos pressupostos basilares do Pós-Modernismo, movimento que pretende encerrar todas as transformações sociais, pessoais e intelectuais que estão na origem da sociedade “Pós-Moderna” em que atualmente vivemos (Teixeira, 2004), e que no domínio do psicológico, chama a atenção para o significado que cada Ser Humano, enquanto ser individual, atribui à sua experiência, o seguinte artigo apresenta os resultados qualitativos de um estudo desenvolvido com casais em que um dos seus membros apresentava diagnóstico de dependência de álcool. Este estudo pretendeu aceder ao significados que os participantes atribuem à sua experiência, em contexto conjugal, tendo em linha de conta a influência que os problemas ligados ao álcool de um dos cônjuges pode apresentar na interação conjugal.

Palavras-chave:

Pós-Modernismo,

Investigação

qualitativa,

Conjugalidade,

Dependência de álcool

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369


30.1. INTRODUÇÃO Constituindo-se como um acontecimento inesperado no desenvolvimento do ciclo vital familiar, assumindo um carácter dramático, que influencia de forma negativa e põe em causa a estabilidade do sistema, os problemas ligados ao álcool acarretam consequências negativas para a convivência familiar e afetam os seus elementos (Filizola, Pavarini, Perón, Filho & Nascimento, 2006; Ramos & Moreira, 2006), constituindo muitas vezes uma fonte de stress intensa e constante, que envolve prejuízos a nível psicológico, social, cultural e económico, diminuindo a qualidade de vida e a estabilidade biopsicossocial (Miranda, Simpson, Azevedo & Costa, 2006), tanto do elemento consumidor, como dos restantes elementos da família, em particular do cônjuge e dos filhos, bem como na sua interação enquanto sistema (Copello, Velleman & Templeton, 2005; Krishnan, Orford, Bradbury, Copello & Velleman, 2001). 30.2. METODOLOGIA Considerando os princípios orientadores da procura de significados com fio condutor desta investigação, adotou-se a metodologia qualitativa. Esta focalizase na contextualização do conhecimento, incluindo o próprio processo de construção do conhecimento como dimensão a ter em conta (Fernandes & Maia, 2001), e parte do pressuposto de que a investigação dos fenómenos humanos, enredados em significado, podem ser descritos e analisados, contrapondo-se às quantificações estatísticas (Chizzotti, 2003). Sustenta-se num conjunto de metodologias e técnicas de carácter interpretativo, direcionadas para a descrição dos componentes de um sistema complexo de significações. Deste modo, pressupõe que o conhecimento aprofundado de um fenómeno/experiência, só pode ser desvendado através do “insight” dos indivíduos sobre a sua experiência pessoal (Coutinho, 2008). Nesta linha de investigação, elegeu-se a Grounded Analysis, método enraizado na Grounded Theory proposta por Glasser e Strauss (1967). Este modelo decorre dos pressupostos ontológicos e 370

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epistemológicos da investigação qualitativa, salientando-se a particularidade de ter como objetivo final a construção de teoria baseada nos dados recolhidos (Fernandes & Maia, 2001; Fonte, 2003).

30.2.1.

PARTICIPANTES

Sendo uma investigação de índole qualitativa, como nos sugere Fonte (2003), procedeu-se a uma seleção não probabilística intencional da amostra. Desta

fazem

parte

12

casais

(24

indivíduos

no

total),

selecionados

aleatoriamente, dependendo da disponibilidade para participar no estudo. Como requisito de inclusão, consideraram-se apenas os casais em que só um dos elementos apresentava problemas ligados ao álcool e frequentava as consultas de ambulatório da Unidade de Alcoologia Dr. José Barrias da Delegação Regional do Norte do IDT, I.P.

30.2.2.

INSTRUMENTOS

Para além do consentimento informado que contemplava também a permissão para gravação das entrevistas, foi administrado um questionário, dividido em 3 partes: a primeira, de caracterização socio-demográfica; a segunda, para recolha de informação adstrita à relação conjugal; a terceira, para administrar apenas aos utentes, de caracterização dos consumos de álcool e problemas adjacentes. A Entrevista semiestruturada foi eleita como instrumento central, contemplando domínios de relevo na revisão bibliográfica realizada, tendo em conta as temáticas em estudo. 30.2.3.

PROCEDIMENTOS

Tendo em conta o interesse em recolher o mesmo tipo de informação junto dos dois elementos que constituem cada casal (utente e cônjuge), a recolha foi E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

371


realizada separadamente, cada um na sua vez, e sem a presença do outro. Para cada elemento do casal, despendeu-se, em média, 45 minutos, somando um total de 90 minutos para a administração do protocolo de recolha de dados a cada casal. A Entrevista semiestruturada, registada em gravação áudio, compreendia 17 questões, elaborada com base na pesquisa prévia de temas frequentemente associados, na literatura especializada, à relação álcool/conjugalidade. À medida que a recolha foi realizada, foi-se procedendo à transcrição das respostas pelo próprio investigador (Belei et al., 2008), visando o registo integral dos conteúdos obtidos junto de cada participante (Fonte, 2003). Obedecendo à metodologia adotada, nomeadamente o método Grounded Analysis, seguiram-se os seus pressupostos teóricos e práticos com vista à elaboração de uma teoria fundamentada nos dados obtidos (Fernandes & Maia, 2001; Strauss & Corbin, 2008). O processo de investigação cumpriu os seguintes passos, detalhados por Fonte (2003): a) seleção do material relevante; b) categorização descritiva; c) Elaboração de memorandos; d) categorização conceptual; e) conceptualização central; f) Hierarquização de categorias; g) clarificação estrutural; h) Construção do discurso de grupo. Para cada uma das 17 questões, administradas aos dois elementos de cada casal, foi aplicado o procedimento acima descrito, resultando na esquematização da informação, de acordo com o exemplo que se segue:

372

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Quadro 2 a) – Categorias de 1ª e 2ª ordem e categorias centrais obtidas na questão 2 aos utentes entrevistados Questão 2: Quais os aspectos que avalia como mais positivos na relação conjugal? Categorias de 1ª ordem Categorias de 2ª ordem

Categorias centrais

“Actualmente é a gente dar-se bem.”(N=1)

Interacção/comunicação

“Damo-nos bem.”(N=1)

conjugal (N=4)

“Sinceridade (…) não Referências em 4 utentes entrevistados

há segredos.”(N=1) “Concordância.”(N=1)

Convivência/Envolvimento Conjugal

“Gosto dela.”(N=1)

(N=8)

“Escolhi-a

Referências em 7 utentes

porque

gostava dela.”(N=1) “Amor

forte,

Dimensão

entrevistados

amor afectiva/emocional (N=4)

verdadeiro.”(N=1)

Referências em 3 utentes

“(…) ralha comigo (…) entrevistados eu reconheço nisso um grande

acto

de

amor.”(N=1)

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373


“Se

fosse

outra

deixava-me ficar.”(N=1)

Acomodação

à

relação

Acomodação à relação conjugal conjugal (N=3) qualquer dia deixo-te (N=3) (…) e até hoje não o Referências em 3 utentes fez.”(N=1) Referências em 3 utentes entrevistados “Ela começa a dizer:

“A

gente

está

entrevistados

habituado.”(N=1)

“Trabalhar para manter a família.”(N=1) “Ela ajuda-me muito.”(N=1) “Agora já não dou aquela instabilidade (…) sinto-me feliz.”(N=1)

30.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS A análise categorial dos resultados obtidos foi realizada separadamente para o grupo de utentes e esposas seguindo os procedimentos acima descritos, e para facilitar a leitura, considerando a quantidade e qualidade dos mesmos, foi esquematizada e apresentada em quadros, para cada uma das perguntas realizadas. Vista a impossibilidade de apresentar toda a análise descrita nos quadros, optámos por facultar apenas o discurso de grupo, apresentado de seguida na discussão dos resultados.

374

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30.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Verificamos que a maioria dos indivíduos, tanto os utentes como as esposas, apresentavam um nível de satisfação conjugal positivo, apoiado, essencialmente, no processo terapêutico dos utentes. Deste modo, a satisfação conjugal, nos dois grupos, surge associada à fase de abstinência, desvendando, deste modo, a centralidade dos problemas ligados ao álcool não só a nível individual, mas também ao nível conjugal. Por outro lado, algumas esposas mostram-se insatisfeitas, o que poderá pressupor uma organização familiar em que o álcool assumia uma função primordial de equilíbrio, que é posta em causa com a abstinência do utente. Como aspetos mais positivos da relação conjugal, a maioria dos utentes salientou a convivência e o envolvimento conjugal, nomeadamente a interação conjugal positiva, a comunicação, e os afetos e emoções, à semelhança das esposas, que, embora em menor proporção, também consideraram os afetos e emoções e o envolvimento conjugal como aspetos mais positivos da relação, bem como o exercício da parentalidade. Por outro lado, os utentes realçaram ainda o apoio emocional e empatia demonstrada pelas companheiras, enquanto que as esposas destacaram a abstinência como benéfica para a relação. A nível individual, os utentes referiram que os problemas ligados ao álcool prejudicaram essencialmente as dimensões psicológica e comportamental,

manifestando-se

num

aumento

dos

comportamentos

agressivos e no desenvolvimento de perturbações a nível psicológico. As esposas destacaram prejuízos no relacionamento social, caracterizados pelo isolamento

e

diminuição

da

convivência

com

outros,

e

desequilíbrios

psicológicos, dos quais fazem parte o sofrimento e tristeza. A nível familiar/conjugal, os utentes destacaram os prejuízos na interação conjugal, decorrentes do carácter conflitual assente nos problemas ligados ao álcool. As esposas focaram prejuízos a nível financeiro, ao nível do relacionamento sexual e prejuízos provocados pelos comportamentos agressivos dos maridos. No que respeita às modificações provocadas pelos consumos na relação conjugal, os E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

375


dois grupos, relevaram, na sua maioria, o impacto negativos dos problemas ligados ao álcool na interação e convivência conjugal, salientando modificações de carácter negativo a nível emocional e sexual. Observam-se ainda respostas, nos dois grupos, que negam a existência de modificações a nível conjugal. Contudo, tem de se considerar o processo terapêutico em que os utentes se inserem, que pode ter provocado a remissão das mesmas, visto que a problemática do álcool já não apresenta o mesmo peso na família nuclear. Embora em menor proporção, destacam-se ainda, no grupo de esposas, referências ao carácter positivo dos problemas ligados ao álcool, que poderá revelar a função estabilizadora e organizadora do álcool a nível familiar, que é posta em causa com a abstinência. Observa-se também que, tanto os utentes como as esposas, na sua maioria, lidam de forma negativa perante situações de conflito. Enquanto que os utentes, referiram que estas situações eram pautadas por comportamentos agressivos (a nível verbal e físico) da sua parte, as esposas optavam pelo afastamento a nível íntimo e sexual, visto que os problemas e conflitos eram vividos de forma tensa. Por outro lado, em ambos os grupos, alguns participantes assumiram lidar de forma positiva com os conflitos ou problemas, e algumas mulheres destacaram a importância da comunicação verbal como elemento fundamental. Verifica-se ainda a ausência de conflitos, no discurso dos utentes, que desvenda mais uma vez a centralidade dos problemas ligados ao álcool, na medida em que os conflitos se restringiam a essa temática, e desapareceram com a abstinência. No que respeita à resolução de conflitos, nos dois grupos, a maioria revelou apresentar dificuldades, traduzidas na desistência das situações conflituais sem resolução. As mulheres salientaram a indiferença dos utentes nestas situações, e o clima de tensão decorrente, enquanto que os homens apontaram o seu afastamento. Sobressaíram ainda, em ambos os grupos, respostas que salientaram uma resolução positiva das situações conflituais, e as esposas evidenciam a comunicação verbal como fator fundamental desta resolução positiva. Do discurso das esposas emergiu também a noção de responsabilidade na resolução de conflitos, de que, algumas, são as únicas envolvidas, denotando-se a desresponsabilização dos utentes neste 376

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processo. Em ambos os grupos salientaram-se défices a nível comunicacional, na medida em que, apesar da comunicação ser frequente, direciona-se para questões práticas de organização familiar, não se verificando referências a temas centrais da relação conjugal e problemáticas adjacentes. No que concerne à compatibilidade, a maioria dos utentes considera a sua relação compatível, mas, em contrapartida, a maioria das esposas considera-a incompatível. Como denominador

comum,

salientam-se,

nos

dois

grupos,

as

questões

da

personalidade e temperamento. Assim, as semelhanças a este nível indicam compatibilidade no discurso dos utentes, enquanto que as diferenças indicam incompatibilidade

no

discurso

das

esposas.

Quando

se

pediu

para

caracterizarem o seu companheiro, as esposas assumiram novamente a incompatibilidade, apoiada em características do utente, como a teimosia e o nervosismo. Os utentes, referiram novamente a compatibilidade, apoiada numa interação conjugal positiva e as semelhanças ao nível da personalidade. Em relação à cumplicidade, em ambos os grupos, na maioria das respostas impera a cumplicidade,

sendo

que,

no

grupo

das

esposas,

esta

assenta

no

companheirismo e cumplicidade, enquanto que no grupo de utentes, assenta nas semelhanças de personalidade e temperamento, espelhando as respostas dadas em relação à compatibilidade. Caracterizando os parceiros relativamente a estas questões, os utentes, na sua maioria, consideram-nas cúmplices, e esta cumplicidade caracteriza-se essencialmente pelo companheirismo e presença da esposa, indo ao encontro do apoio emocional e empatia, que, como anteriormente já vimos, os utentes dão especial relevo. Por outro lado, as esposas salientam o companheirismo e a complementaridade e, algumas, referem ainda, que a cumplicidade é inexistente, e esta ausência associa-se, particularmente, ao facto do utente ser reativo ao controlo por parte da esposa. Atendendo à relação sexual dos casais, impera uma perceção negativa desta dimensão, transversal aos dois grupos. Os utentes associam a inatividade sexual aos problemas ligados ao álcool, e as esposas para além de corroborarem esta inatividade e esta associação com os consumos, salientam que, quando existente, é insatisfatória. Por outro lado, embora em menor proporção, E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

377


verificam-se algumas referências a uma atividade sexual satisfatória. A intimidade também foi influenciada de forma negativa pelos problemas ligados ao álcool, e cerca de metade dos participantes, dos dois grupos, evidenciam esta influência. Por um lado, as esposas referiram a desvalorização da atividade sexual e o bloqueio da intimidade perante episódios de embriaguez dos maridos, enquanto que os utentes, apesar de, à semelhança das esposas, também focarem o bloqueio da intimidade pelas mulheres, salientam os défices no desempenho sexual. Metade das referências, nos dois grupos, negam qualquer tipo de interferência dos problemas ligados ao álcool na intimidade conjugal. Tanto os utentes como as esposas assumem que as tarefas domésticas são da responsabilidade da esposa, salientando-se alguns homens que ajudam esporadicamente. Este facto poderá espelhar uma estrutura familiar tradicional, na medida em que a maioria dos casamentos é de longa duração. Sensivelmente metade do grupo de esposas refere que a gestão financeira não foi influenciada pelos problemas ligados ao álcool, contrapondo com as restantes que assumem essa influência. Espelhando as respostas das esposas, no grupo de utentes, metade também assume que a gestão financeira foi influenciada, devido aos seus gastos abusivos em fases de consumo problemático, e a outra metade nega esta influência. Emergem também referências no grupo de utentes, relativas à responsabilidade nesta gestão, destinada exclusivamente à esposa, o que poderá revelar alguma desresponsabilização, típica de indivíduos com este tipo de problemática. Tanto os utentes como as suas esposas apresentam uma perceção positiva do seu papel de pais. Contudo, os dois grupos, evidenciaram uma influência negativa dos problemas ligados ao álcool no desenvolvimento global dos filhos, nomeadamente a nível psicológico e emocional. Enquanto que as esposas referiram os traumas decorrentes dos conflitos familiares provocados pela presença do álcool e a inversão de papéis, na medida em que os filhos cresceram prematuramente e assumiram responsabilidades que não eram da sua competência, visto que os papéis parentais se mostravam deficitários, os utentes chamaram a atenção para o sofrimento e para a vergonha que os filhos demonstravam da sua situação familiar. Salienta-se ainda que, metade dos 378

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utentes

nega

qualquer

tipo

de

influência

da

sua

problemática

nos

desenvolvimento dos filhos. No início da relação conjugal, a maioria dos indivíduos, tanto as esposas como os utentes, apresentavam expectativas positivas para a relação conjugal, orientadas para a convivência, bem estar e felicidade familiar, e para questões mais materiais, como a construção do lar. Para além destas, os utentes referem a parentalidade, como objetivo inicial da relação. Por outro lado, nos dois grupos, embora em menor número, algumas referências apontam para a ausência de expectativas. Em relação ao cumprimento das mesmas, nos dois grupos, a divisão é semelhante, na qual metade dos inquiridos revelou que as expectativas não se cumpriram e a outra metade assume que se cumpriram. Como objetivos futuros para a relação conjugal, a maioria das esposas salientaram o bem estar e a estabilidade conjugal, e algumas focaram também o exercício de funções parentais. Por sua vez, os utentes destacaram a manutenção da relação conjugal e objetivos individuais orientados para a recuperação dos problemas ligados ao álcool, demonstrando mais uma vez a centralidade dos mesmos a nível relacional. Por fim, nos dois grupos, a maioria referiu que não existem aspetos para melhorar, relativos à relação conjugal. Algumas referências, também nos dois grupos, salientaram os problemas ligados ao álcool como único aspeto a suscitar maior investimento.

30.5. CONCLUSÕES Em traços gerais, podemos concluir que os problemas ligados ao álcool exercem um impacto negativo em áreas relacionais essenciais à satisfação conjugal,

como

a

comunicação,

resolução

de

conflitos,

cumplicidade,

compatibilidade, intimidade, etc., apesar dos participantes terem assumido um nível de satisfação conjugal positivo. Este aspeto poderá justificar-se pelo processo terapêutico em que os utentes se encontram, na medida em que a abstinência é uma condição dominante, e permite aumentar os níveis de E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

379


satisfação, uma vez que problema está a ser resolvido. Consideramos que a informação qualitativa recolhida, se mostra especialmente importante em contexto clínico, na medida em que o discurso individual das experiências permite um maior entendimento em profundidade da problemática em questão, o que poderá facilitar a compreensão da especificidade individual, bem como a intervenção psicológica, nomeadamente quando direcionada para casais, na medida em que aumenta o conhecimento das particularidades deste contexto, revelando potencialidades e limitações, concordâncias e discrepâncias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Belei, R. A. ; Gimeniz-Paschoal, S. R. ; Nascimento, E. N. & Matsumoto, P. H. V. R. (2008). O uso da entrevista, observação e videogravação em pesquisa qualitativa. Cadernos de Educação, 30, 187-199. Chizotti, A. (2003). A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais: Evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação, 16(2), 221-236. Copello, A. G. ; Velleman, R. D. B. & Templeton, L. J. (2005). Family interventions in the treatment of alcohol and drug problems. Drug and Alcohol Review, 24, 369-385. Fernandes, E. M. & Maia, A. (2001). Grounded theory. In: Fernandes, E. M. & Almeida, L. S. (Eds.). Métodos e técnicas de avaliação: Contributos para a prática e investigação psicológica. Braga: Universidade do Minho, Centro de estudos e Educação. Filizola, C. L. ; Pavarini, S. C. L. ; Perón, C. J. ; Filho, J. F. P. & Nascimento, M. M. A. (2006). Compreendendo o alcoolismo na família. Esc Anna Nery Rev Enferm, 10(4), 660-670. Krishnan, M. ; Orford, J. ; Bradbury, C. ; Copello, A. & Velleman, R. (2001). Drug and alcohol problems: The users’ perspective on family members’ coping. Drug and Alcohol Review, 20, 385-393. Miranda, F. A. N. ; Simpson, C. A. ; Azevedo, D. M. & Costa, S. S. (2006). O impacto negativo dos transtornos do uso e abuso de álcool na convivência familiar. Revista Electrónica de Enfermagem, 8(2), 222-232. Ramos, J. M. & Moreira, R. A. (2006). Interacção familiar e sofrimento psicológico em dependentes de álcool. Alcoologia, 1(3), 16-27. Strauss, A. & Corbin, J. (2008). Pesquisa qualitativa. Técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada (2ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Teixeira, Z. A. M. T. (2004). Construção e validação de uma narrativa protótipo para o alcoolismo. Tese de Doutoramento apresentada à Universidade do Minho. 380

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31. REIKI E QUALIDADE DE VIDA Marcela Jussara Miwa*; Maria Cristina Silva Costa**; Nelson Filice de Barros*** *Socióloga, doutoranda da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/Universidade de São Paulo (USP) – marcelajmiwa@yahoo.com.br **Antropóloga, docente da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/Universidade de São Paulo (USP) – mccosta@eerp.usp.br ***Sociólogo, docente da Faculdade de Ciências Médicas/ Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) – filice@fcm.unicamp.br

RESUMO Estudos indicam que reiki pode contribuir na redução da ansiedade, da dor e do estresse, assim como, possibilitar melhoras na qualidade de vida, relaxamento e sensação de bem-estar em pessoas que recebem essa energia. Buscamos compreender como a aplicação do reiki e/ou iniciação na técnica reikiana poderiam contribuir na melhora da qualidade de vida de seus praticantes. Tratase de estudo qualitativo realizado em um Núcleo de Reiki voluntário, em Ribeirão Preto-SP, Brasil, entre os anos de 2010 e 2011, com 20 sujeitos (15 são reikianos e 5 apenas recebem reiki), que utilizou a observação participante e entrevistas semi-estruturadas. Os principais resultados indicam que, por meio dos ensinamentos e teorias associados ao reiki juntamente com as mudanças de comportamento e pensamento desencadeadas pela adesão à técnica, seus adeptos encontraram novos sentidos para suas questões ou problemas (como doenças ou conflitos familiares), promovendo diminuição da ansiedade, aumento da tolerância e do autocontrole. A crença no poder curativo da energia reiki associada

à

busca

pelo

autoconhecimento

contribuem

na

melhora

da

sociabilidade e conseqüente melhora na qualidade de vida de seus praticantes.

Descritores: Terapias Complementares; Qualidade de Vida.

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381


31.1. INTRODUÇÃO A técnica reiki (RAMOS, 1995; MULLER, 1997; PALOTTA, 1999; De’CARLI, 2006) surgiu em 1922, no Japão, com Mikao Usui, considerado monge cristão e professor. Em 1922, isolou-se no monte Kuruma, Japão, e após 21 de meditação e jejum teve uma visão que ensinava os símbolos sagrados do reiki, seus significados e usos. Usui ensinou a técnica até 1926, quando faleceu. Foi sucedido por seu discípulo Chujiro Hayashi, que, em 1940, transmitiu a sucessão a Hawayo Takata, responsável pela difusão da técnica reiki no Ocidente. No Brasil, a técnica foi introduzida em 1983, pelo mestre norte-americano Stephen Cord Saiki. Reiki significa “energia vital universal”. Os males e sofrimentos são oriundos de desequilíbrios ou “bloqueios” energéticos gerados pelo próprio sujeito ou pelo ambiente em que se encontra. A atuação do reiki seria uma forma de restaurar esse equilíbrio energético, viabilizando a harmonia e melhoras nas condições de vida e saúde. Para tornar-se reikiano é necessário passar por iniciação conduzida por mestre habilitado. A iniciação pode ser dividida em quatro níveis: nível I, também chamado de “o despertar”, em que são introduzidas, ao neófito, noções sobre energia, chakras, história do reiki, suas utilizações e as posições das mãos durante a aplicação. Nível II, “a transformação”, nessa segunda iniciação o neófito aprende símbolos para dinamizar e potencializar a energia reiki, nessa fase são trabalhados aspectos mentais e emocionais do iniciante. Nível III, “a realização” ou 3-A, onde se ensina um quarto símbolo e sua iniciação é vista como passo para a consciência e atuação planetárias, sendo possível canalizar energia para multidões. Por fim, nível IV, “mestre” ou 3-B, o aluno aprende como iniciar novos reikianos. Alguns estudos, a maioria quantitativos, procuraram testar a eficiência do reiki na melhora da qualidade de vida, relaxamento, redução da ansiedade, de estresse e de dor (MACKAY, 2004; BURDEN, 2005; La TORRE, 2005; 382

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BRATHOVDE,

2006;

CRAWFORD,

2006;

PIERCE,

2007;

POTTER,

2007;

RAINGRUBER, 2007; TSANG, 2007; ASSEFI, 2008; BALDWIN, 2008; BOSSI, 2008; LEVIN, 2008; MORSE, 2011). Eles indicam os possíveis benefícios do reiki sobre os comportamentos acima mencionados nos grupos experimentais comparados a grupos controle em cada pesquisa, ou apresentam estudos de casos em que a utilização de reiki foi benéfica, constatando a necessidade de se realizarem mais estudos nessa área. Neste trabalho procuramos compreender como o recebimento, a iniciação na técnica e a prática de reiki podem contribuir na melhora da qualidade de vida e influenciar em fatores como ansiedade, tolerância e nas relações sociais.

31.2. SOBRE O MÉTODO A pesquisa faz parte de estudo sobre terapias complementares que visa interpretar os significados da cura pela imposição de mãos em reiki e em johrei (da Igreja Messiânica Mundial). Parte da pesquisa de campo foi desenvolvida em Núcleo de Reiki de Ribeirão Preto, cidade do interior do Estado de São Paulo, entre 2010 e primeiro semestre de 2011, utilizando técnicas de observação direta, entrevista em profundidade, história de vida e caderno de campo (TRIVIÑOS, 1987; GOLDENBERG, 2000). Vinte sujeitos foram entrevistados, entre eles: 15 reikianos (que são iniciados na técnica e realizam trabalho voluntário no Núcleo de Reiki) e 5 frequentadores (apenas recebem reiki). A pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/USP, com o número 1047/2009. Para sua realização, foi respeitado o que rege a Resolução 196/96 sobre as exigências éticas de pesquisa com seres humanos.

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31.3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O Núcleo de Reiki estudado foi fundado em 1990, na cidade de Ribeirão Preto,SP. A princípio, era uma organização beneficente em prol de pessoas soropositivas. O reiki foi introduzido em 1992. Atualmente oferece sessões de reiki em horários diferentes ao longo da semana; o atendimento é gratuito, solicitando-se apenas que cada frequentador doe um quilo alimento para ser distribuído em cestas básicas para famílias carentes. Entre 2009 e 2010 mais de 930 pessoas buscaram atendimento, havendo predominância do público feminino. Apresenta uma média de 30 reikianos voluntários, a maioria é de mulheres brancas e aposentadas. Dos 15 reikianos entrevistados (11 mulheres e 4 homens), 11 possuíam ensino superior. Essas características os aproximam do público neo-esotérico estudado por Magnani (1999), em pesquisa realizada na cidade de São Paulo sobre o movimento neo-esotérico dos anos de 1980 e 1990. Segundo esse autor, o público “neo-esô” caracteriza-se por ser “de classe média, adulto e majoritariamente feminino” (p. 110). Além disso, os reikianos do Núcleo assemelham-se aos “neo-esô” quando buscam novos paradigmas de conhecimento, independência de sistemas religiosos institucionalizados e propondo uma visão “holística” do homem e da natureza. Em relação à contribuição do reiki para melhora na qualidade de vida dos reikianos do Núcleo, podemos destacar os seguintes aspectos:

Equilíbrio Energético Entre os sujeitos entrevistados – 15 reikianos e 5 frequentadores – todos relataram buscar a técnica reiki para solucionar problemas (dor/sofrimento) particulares ou para reestabelecerem seu equilíbrio energético. As histórias trazem episódios de doenças físicas: anemia, alergias, câncer, enxaqueca, 384

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desnutrição, Alzheimer (no sujeito ou parentes próximos – irmãos ou pais); ou sofrimentos como depressão, ansiedade, problemas, perdas de entes queridos. Contudo,

no

que

diz

respeito

aos

freqüentadores,

ou

enquanto

são

freqüentadores, a maioria dos sujeitos mantém uma postura passiva em relação a responsabilidade de sustentar o equilíbrio, atribuindo ao reiki essa responsabilidade. Eles são apenas pacientes do Núcleo, forma como são tratados pelos reikianos voluntários. Entre os voluntários, todos revelaram que desejaram iniciação em reiki depois dos benefícios que receberam com a técnica e decidiram trabalhar no Núcleo como uma forma de retribuição, reforçada pela ideia de satisfação em fazer o bem. Sobre o voluntariado e a ideia de fazer o bem é interessante notar que talvez o “trabalho no Núcleo”, termo usado pelos próprios reikianos, tenha se tornado uma forma de revalorização de si através da “produtividade”, já que a grande maioria é aposentada e, portanto, não mais “produtiva” para a esfera do trabalho. Ao serem iniciados na técnica, os neófitos vivenciam a fase de expurgo, período de 21 dias após a iniciação em que ocorre uma “limpeza” no corpo físico, mental, emocional e energético (dependendo do nível da iniciação) para permitir um melhor fluxo de energia no novo reikiano. Contudo, depois de “limpos”, como eles se mantêm em equilíbrio? Quando indagados a respeito das modificações que ocorreram em suas vidas, sobretudo nos padrões de comportamento, os reikianos afirmaram que não mudaram muitos seus hábitos. Questionados sobre vícios, apenas 4 pessoas revelaram ingerir bebidas alcoólicas socialmente, as demais não tocaram no assunto, nem nas entrevistas nem durante pesquisa de campo. Apenas uma reikiana era fumante; questionada se o cigarro poderia prejudicar o fluxo de reiki, ela respondeu que acreditava que não. Na literatura não foi encontrado nada específico em relação a vícios, somente o incentivo para largá-los no intuito de assegurar maior equilíbrio interior. Sobre a alimentação, a maioria respondeu não E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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ter feito alterações no cardápio, exceto duas pessoas afirmaram diminuir o consumo de carne espontaneamente. As mestras reikianas do Núcleo sugeriram a abstenção de carne vermelha somente na fase do expurgo (21 dias após a iniciação). Pela bibliografia consultada, somente Johnny De’Carli (2006) reprovou o consumo de carne vermelha, associando a prática como falta de “compaixão pelos animais” (p.88). Algumas mulheres reconheceram-se como mais decididas, outras mais bonitas ou sentiram-se rejuvenescidas depois que se iniciaram na técnica. Todavia, as principais mudanças relatadas pelos entrevistados (reikianos e freqüentadores) foram

de

aspectos psicoemocionais,

como redução da

ansiedade, conseqüente relaxamento, assim como o aumento da percepção e, principalmente, o aumento da tolerância.

Passos para a alteridade A tolerância foi destacada porque foi resposta unânime nas entrevistas com os reikianos. Todos afirmaram que depois do reiki deixaram de ser tão exigentes consigo e com os outros, como também, deixaram de exercer tanto controle sobre suas vidas e de outras pessoas próximas, melhorando, dessa forma, seus relacionamentos, principalmente os familiares. Eu fiquei mais calmo, menos agitado [...] minha esposa é mais devagar e eu não aceitava, agora eu já aceito, eu sei que ela tem o ritmo dela. (homem, 50 anos, rekiano há 4 anos) O meu sentimento, ele melhorou [...] eu era muito apegado em coisas materiais, eu fui entendendo [...] considero que eu melhorei muito, até no entendimento com meus familiares [...] eu não posso modificar o mundo deles [...] antes do reiki eu não tinha esse conhecimento, então eu queria que eles

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fossem do jeito que eu queria e não o que eles queriam. (homem – 68 anos, reikiano há 14 anos) Me sinto uma pessoa melhor... eu me tornei assim mais tolerante com as coisas, paciência que eu tenho. (mulher, 53 anos, reikiana há 5 anos) Conseguiram efetuar o exercício de sair de uma concepção “narcisista”, onde o que vale ou prevalece são os ditames e vontades do “ego”, em que o “outro” se confunde com o próprio “eu”, para uma posição de maior alteridade onde se reconhece o outro como distinto e autônomo, diferente de si (SYMINGTON,

2003;

MIWA,

2010),

melhorando,

dessa

forma,

seus

relacionamentos e expectativas sociais. Desenvolvendo a autoconsciência e o autocontrole. A própria raiva é compreendida como falta de energia. Isso não significa que não tenham problemas, muito menos que não adoeçam e nem se irritem, a questão é que eles passaram a interpretar as situações desagradáveis como energias “bloqueadas” ou “desequilibradas” e quando se dão conta do ocorrido, valem-se da ferramenta reiki para desbloquear e harmonizar as energias, desenhando ou mentalizando os símbolos que aprenderam nos cursos de iniciação na técnica.

Espiritualidade Independente Recordando o estudo de Magnani (1999) em que afirma que o público neoesô apresenta “uma espiritualidade independente de sistemas religiosos institucionalizados” (p. 7-8), os reikianos do Núcleo aproximam-se desse aspecto. As

entrevistas

evidenciaram

forte

sincretismo

entre

catolicismo

e

espiritismo kardecista. As histórias são semelhantes, a formação inicial desenrola dentro da religião católica – por influência familiar – e depois, já em E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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uma fase de maior independência (juventude ou já adultos) vão buscar conhecimento no espiritismo kardecista, freqüentando centros espíritas e, por vezes, atuando como médiuns. Apenas duas pessoas não mencionaram o catolicismo em sua formação religiosa. Uma outra, afirmou ter frequentado centro de umbanda, de candomblé e a Igreja Messiânica Mundial, no entanto, atualmente só vai ao centro espírita. No geral, a religiosidade dos voluntários pode ser sintetizada pela seguinte fala: Hoje eu me considero a religião de Deus, do mundo (mulher, 55 anos, reikiana há 20 anos) Porque mesmo havendo menção predominante das duas religiões (católica e espírita) os reikianos do Núcleo não se limitaram a buscar conhecimento apenas nessas doutrinas. Apresentam grande interesse por temas diversos. Das filosofias orientais, esoterismo e terapias complementares foram citadas: yoga (dois praticantes), johrei (seis afirmaram conhecer a técnica), tao, apometria, rosa-cruz, aromaterapia, uso de pirâmides, técnica de polaridade, constelação familiar, shiatsu, do-in, feng-shui, t’chi kun, seicho-no-ie, cura quântica, florais, acupuntura, cromoterapia, cura prânica, mãos sem fronteiras, Academia Filosófica Cristã, ritual de Saint Germain e leituras de auto ajuda. Fato que os aproxima novamente do público neo-esotérico que é interessado “por temas tão diversos, como filosofias orientais, ecologia, valorização do feminino, terapias soft” (MAGNANI, 1999: 18). Podemos compreender esse comportamento, desses reikianos, de misturar informações variadas, retomando a ideia de “pensamento mítico” elaborada por Lévi-Strauss (1989), onde elementos díspares, fragmentados, extraídos de diferentes conjuntos culturais são combinados em um tipo de “bricolagem intelectual”, de composição heteróclita, sem contradições aparentes. Nas palavras do referido autor:

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Ora, é peculiar ao pensamento mítico, assim como ao bricolage no plano prático, e elaboração de conjuntos estruturados não diretamente com outros conjuntos estruturados mas utilizando resíduos e fragmentos de fatos – odds and ends, diria o inglês ou, em francês, des bribes et des morceaux – testemunhos fósseis da história de um indivíduo ao de uma sociedade. (LÉVISTRAUSS, 1989: 37) Entretanto, se conhecem tantos assuntos e técnicas, por que escolheram o reiki? As três principais explicações entre os reikianos foram: foi a primeira técnica que conheci; mais afinidade com o reiki do que com outras técnicas e praticidade, já que não precisavam fazer grandes mudanças em suas vidas para aderir ao reiki. Quando questionados se estavam satisfeitos com suas vidas, onze responderam

que

ainda

precisavam

melhorar

muito

comportamento,

disponibilidade de tempo, aceitar o outro como ele é, etc.

31.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A técnica reiki, ao interpretar males e doenças como “bloqueios energéticos”, forneceu aos seus adeptos (praticantes e freqüentadores do Núcleo) a possibilidade de elaborarem novas interpretações às suas dores e sofrimentos. Além disso, a abertura que a técnica oferece aos sujeitos de recombinar teorias e informações de origens diversas, numa “bricolagem intelectual” incentiva o esforço pela busca de si, de novos sentidos para suas vidas

através

de técnicas

e

terapias

que

visam

o autoconhecimento.

Consequentemente, essa autoconsciência os levou a respeitar e compreender melhor as demais pessoas.

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No caso dos sujeitos estudados, a adesão ao voluntariado pode ser compreendida como um mecanismo de revalorização de si, de retorno à “produtividade” e atividade social. Assim como, a convivência durante os trabalhos no Núcleo viabilizou uma nova sociabilidade, mesmo que momentânea entre os praticantes de reiki e freqüentadores da instituição, já que uma das principais palavras associadas ao atendimento do Núcleo é acolhimento. Desse modo, pelos motivos apresentados, não é demasiado afirmar que a prática de reiki pode, sim, contribuir na melhora da qualidade de vida dos sujeitos na medida em que melhora sua sociabilidade, ameniza sintomas e lhes fornece subsídios simbólicos, na forma de estruturas de significação, para enfrentar as dificuldades que experimentam em seu cotidiano.

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32. CYBERBULLYING - UMA AMEAÇA SEM ROSTO Bárbara Sofia da Silva Cardoso Fernandes*; Lígia Raquel Mendes Pereira Sala*; Marina Fernandes Pereira***; José Carlos Carvalho**** *enfermeira.patanisca@gmail.com **ligiasala@hotmail.com ***marina.pereira1990@gmail.com Licenciadas em Enfermagem pela Escola Superior de Enfermagem do Porto ****Prof. Doutor, Escola Superior de Enfermagem do Porto

RESUMO Aliado ao crescente uso dos meios tecnológicos pelas camadas mais jovens da nossa sociedade, emergem novas realidades relacionadas com a falta de conhecimento e segurança no uso das mesmas. Também o cyberbullying - ato de violência intencional, que visa denegrir, difamar ou prejudicar uma ou mais pessoas, sem que seja conhecida a identidade do bullie - é cada vez mais frequente. Assim, com base numa revisão bibliográfica, elaboramos uma proposta de intervenção, que visa prevenir e promover a Saúde Mental de adolescentes que se encontrem a frequentar o Ensino Básico. O projeto supracitado será implementado através da realização de sessões, sendo que o objetivo nas duas primeiras centra-se na sensibilização dos jovens sobre os riscos a que estão expostos, bem como dar a conhecer os recursos existentes na comunidade no qual estes podem pedir ajuda. Esta intervenção culmina com uma terceira e última sessão, focando uma abordagem que visa avaliar e reforçar os conhecimentos transmitidos, não só à nossa populaçãoalvo, mas também aos educadores/professores. 392

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Por todas as consequências do cyberbullying na formação da identidade, caráter psicossocial, autoestima e no padrão de socialização, torna-se incontornável a necessidade de intervenção dos enfermeiros especializados em Saúde Mental e Psiquiatria.

Palavras-chave: Adolescentes; Cyberbullying; Enfermagem; Saúde Mental.

ABSTRACT Coupled with the growing use of new technologies by the younger layers of our society, new realities emerge related to the lack of knowledge and safe use thereof. Also cyberbullying – intentional act of violence, which intents to denigrate, defame or harm one or more people, without to be known the identity of the bullie – is increasingly common. Thus, based on a literature review, we developed a porposal for intervention to prevent and promote teenagers’ Mental Health who are attending Basic School. The project mentioned above, will be implemented by conducting sessions, with the goal in the first two focuses on raising awareness among

young people

about the risks to which they are exposed, as well as publicizing the resources available in the comunity in which they can ask for help. This action culminates in a third and final session, focusing on an approach to evaluate and reinforce the knowledge

imparted,

not

only

to

our

target-population,

but

also

to

educators/teachers. For all the consequences of cyberbullying in the identity definition, psychosocial character, self-esteem and socialization patterns, it becomes unavoidable the need of nurses’ intervention specialized in Mental Health and Psychiatry.

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393


Key words: Adolescents; Cyberbullying; Nursing; Mental Health.

32.1. INTRODUÇÃO Atualmente, a internet é já uma parte integrante na vida de toda e qualquer pessoa que esteja ligada aos meios de informação, isto porque é neste espaço virtual que os utilizadores adquirem a possibilidade de aceder a um vastíssimo e variado leque de conteúdos que vai desde o entretenimento, informação e interação até à educação, colocando tudo à nossa disposição através de um simples clique, inclusive os perigos e ameaças (Amado et al., 2009:301-306). Nesta categoria, insere-se o cyberbullying, que se define como sendo uma forma de bullying, ou seja, um tipo de violência intencional, feita com recurso às tecnologias de informação e comunicação com o intuito de denegrir, humilhar e/ou difamar uma ou mais pessoas (Neves & Pinheiro, 2009:4962). Caracterizado como um ato criminoso e sendo até mesmo visto como uma tortura psicológica, o cyberbullying pode ir desde um simples e-mail contendo ameaças, boatos prejudiciais publicados em redes e comunidades sociais, podendo chegar até a perseguições e agressões físicas (Barbosa, 2009:12). Como qualquer outra experiência traumática, o cyberbullying também acarreta consequências físicas, psicológicas, emocionais, sociais e cognitivas, principalmente para as vítimas. Neste plano, os danos psicológicos causados na vítima adquirem especial relevo e passam sobretudo por situações de introversão, baixa autoestima, sentimentos de pânico e insegurança, angústia, depressão, insucesso escolar ou, em casos muito graves, pode levar ao suicídio (Cruz, 2011:4). As ações do cyberbullying variam de acordo com o seu efeito e conteúdo, contudo um ato de cyberbullying apresenta, habitualmente, as seguintes características: 394

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a) Ação repetida e sistemática (possibilidade de multiplicação da visualização do ato); b) Ação intencional e premeditada; c) Incapacidade defensiva da vítima; d) Ações hostis para com as vítimas; e) Ação contra a vontade da vítima; f) Agressor anónimo e ausente (“tu não podes ver-me, mas eu posso ver-te”); g) Ação passivamente aceite (Cruz, 2011:9). Perante isto, a melhor forma de prevenção é: 1) educar crianças/jovens, bem como educadores e usuários da internet em geral, sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação de forma ética, responsável e segura; 2) alertar sobre riscos da partilha de fotografias, vídeos e outros dados pessoais online que podem ser usados por qualquer pessoa (amigos, agentes mal intencionados, namorados (as), entre outros); 3) não reagir intempestivamente para proteger a vítima. No caso de a criança/jovem ser vítima de cyberbullying, não lhe retirar o direito do acesso ao computador, como forma de castigo e 4) monitorizar a utilização das tecnologias de informação e comunicação pelos usuários. Além de tudo isto, devemos evitar colocar os computadores em áreas isoladas, preferindo os espaços de maior circulação de pessoas para que a supervisão esteja mais facilitada (Barbosa, 2009:39). Posto isto, os profissionais de Enfermagem da área da Saúde Mental estão numa posição privilegiada para educar as comunidades escolares sobre os recursos para prevenir e lidar com o cyberbullying de um modo que ajudará os adolescentes, pais, professores e comunidade (Williams e Godfrey, 2010:37). Estes devem intervir junto das escolas com o intuito de auxiliar os adolescentes E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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vítimas de cyberbullying, ensinar as melhores formas de evitar o cyberbullying, bloquear mensagens perturbadores, não responder a assédios e outro tipo de provocações. Além disto, devem igualmente intervir junto dos professores e auxiliares de educação de forma a mostrar quais os sinais a ter em atenção, qual o tipo de comportamentos a adotar e auxiliar os adolescentes a terem uma autoestima melhorada (Patchin e Hinduja, 2010: 615-616).

32.2. METODOLOGIA

32.2.1. PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA) Devido à possibilidade de interagir com pessoas desconhecidas, a internet adquire atualmente uma enorme importância para os jovens. Patchin e Hinduja (2010:615-616) refere que a adolescência é a fase de desenvolvimento de particular importância, onde os adolescentes acabam por se descobrir e formar a sua própria identidade. Esta forma de procura da sua própria identidade é influenciada pelo ambiente que envolve os adolescentes. Por consequente, estes tendem a procurar situações e comportamentos que os façam sentir-se bem e que os valorizem positivamente. Num estudo realizado pelo autor supracitado, conclui-se que tanto as vítimas de cyberbullying, como os agressores apresentam uma baixa autoestima. Estudos demonstram que 78% das crianças portuguesas com idades compreendidas entre os 9 e os 16 anos utiliza a internet, estando entre as crianças europeias que mais utilizam a internet nos seus quartos (67%) (Cruz, 2011:25). No mesmo estudo, verificou-se ainda que as crianças que usam a internet são cada vez mais novas e que esta é já parte integrante da vida das crianças e jovens entrevistados: cerca de 93% está online pelo menos uma vez por semana, e 60% acede todos os dias ou quase todos os dias (Cruz, 2011:24). 396

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Perante o exposto anteriormente, podemos afirmar que os adolescentes entre os doze e dezasseis anos são os mais afetados por esta problemática. E corroborando o que nos menciona os estudos já referenciados previamente, decidimos então incidir nos adolescentes com idades compreendidas entre os treze e quinze anos, a frequentar o ensino básico, visto ser uma população alvo de cyberbullying, tendo um uso regular e cada vez mais desenvolvido nas novas tecnologias, tornando pertinente e útil a nossa intervenção para a promoção da saúde e bem-estar dos nossos jovens.

32.2.2. INSTRUMENTOS De forma a obtermos dados atuais acerca da situação do cyberbullying entre a comunidade portuguesa, optamos por efetuar uma pesquisa bibliográfica, onde incluímos teses de mestrado e doutoramento, investigações e artigos de pesquisa sobre o mote acima referido. Nestes procuramos obter resposta para quais os grupos etários mais vulneráveis a esta problemática, de forma a podemos travar este problema, além de perceber quais são os recursos existentes em Portugal que visam colmatar as situações de cyberbullying emergentes.

32.2.3. PROCEDIMENTOS Após a definição da problemática a intervir, da população-alvo a considerar e de conhecidas as necessidades em Saúde Mental e Psiquiatria emergentes, elaboramos o projeto “TU NÃO PODES VER-ME, MAS EU POSSO!”. Este último consiste numa forma de aproximação dos jovens de uma forma a partir da qual pudéssemos não só alertá-los sobre os perigos do cyberbullying, através da transmissão de informação neste âmbito, mas também promover a Saúde Mental e Psiquiátrica nas escolas portuguesas. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

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Neste medida, o projeto elaborado visa atingir os seguintes objetivos: •

Consciencializar/Sensibilizar/Informar a população-alvo sobre a temática do cyberbullying e as características inerentes à mesma;

Consciencializar/Sensibilizar/Informar a população-alvo sobre o impacto do cyberbullying no desenvolvimento de um adolescente;

Dar a conhecer os recursos disponíveis na comunidade aos quais podem recorrer face a uma vivência de cyberbullying;

Promover a capacidade de resolução de um caso de cyberbullying por parte da população-alvo;

Promover a reflexão crítica da população-alvo sobre o cyberbullying.

Estes objetivos, poderão ser concretizados, por meio de três sessões com turmas de alunos do 7º ao 9º ano, as quais seriam realizadas ao longo de três semanas, dividindo cada sessão por semana e um dia para cada ano escolar. Não obstante, o objetivo das duas primeiras sessões passaria assim por sensibilizar os jovens sobre estes problemas e riscos a que estão expostos, culminando a nossa intervenção numa terceira e última sessão de avaliação de conhecimentos adquiridos, mas também de consolidação dos mesmos.

32.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS O projeto aqui apresentado não foi aplicado em nenhuma população, pelo que não existem resultados passíveis de serem analisados.

398

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32.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O cyberbullying tem vindo a ser uma temática cada vez mais atual abrangendo várias classes sociais e zonas territoriais, não estando confinada nem às áreas urbanas nem às áreas rurais. Dado o seu impacto na sociedade, tem-se verificado um aumento do número de estudos desenvolvidos face a esta problemática, que exige uma rápida, assertiva e precoce atuação por parte dos profissionais de saúde, com intuito de prevenir e promover a saúde mental nos jovens. Não obstante, a falta de informação sobre a temática nos adolescentes implica

primeiramente

que

a

nossa

intervenção

passe

por

uma

contextualização/familiarização mais exaustiva, para que assim os jovens sejam capazes de identificar situações problemáticas e, posteriormente, as nossas intervenções sejam dirigidas para a resolução e prevenção de problemas. Além disto, houve a necessidade de restringir a população-alvo. Uma vez que o cyberbullying não atinge apenas a vítima, mas também a sua esfera pessoal, surge a necessidade da nossa intervenção se alargar aos educadores (pais, encarregados de educação, professores, auxiliares de educação), para que também estes adquiram conhecimentos nesta área e possam estar alertas para sinais de risco. Ao longo do planeamento do nosso projeto tivemos sempre a preocupação que este fosse exequível num futuro próximo, pelas razões mencionadas anteriormente. No entanto, devemos ressalvar que dada a falta de conhecimento por parte dos responsáveis educativos das escolas sobre esta temática, poderíamos encontrar um obstáculo à implementação do mesmo, pois corríamos o risco de esta não ser identificada como uma necessidade emergente. Por outro lado, não podemos deixar de referir que a não implementação deste projeto e a sua elaboração com base meramente em pesquisas E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

399


bibliográficas, poderá apresentar algumas limitações que não nos foram percetíveis.

Contudo,

julgamos

ser

de

extrema

importância

não só a

implementação futura destes e de outros projetos similares nas escolas portuguesas, como também a pesquisa e divulgação desta problemática, pois só assim poderemos promover e prevenir a Saúde Mental e Psiquiatria nas escolas.

32.5. CONCLUSÕES Denota-se um consenso entre os autores quando referem que o uso da internet contribuiu para que o cyberbullying se tornasse um problema a nível mundial. Por todas as consequências deste na formação da identidade, caráter psicossocial, autoestima e no padrão de socialização, torna-se incontornável a necessidade de intervenção dos enfermeiros especializados em Saúde Mental e Psiquiatria. Também por esse motivo, julgamos que os jovens portugueses poderiam beneficiar de uma abordagem como a que propusemos anteriormente, pois de uma forma simples e acessível, abordamos os principais pontos identificados por diversos investigadores como sendo constituintes de uma melhor capacidade de resposta a estas situações. Relativamente ao trabalho de pesquisa nesta área, julgamos ser de extrema pertinência, visto que o cyberbullying é também uma realidade portuguesa que ainda carece de alguma investigação.

400

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E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

401


33. PERCEÇÃO DO CONCEITO DE BULLYING NO TRABALHO PELOS ENFERMEIROS Antónia Teixeira*; Teresa Rodrigues Ferreira**; Elizabete Borges***

*Enfermeira, Centro Hospitalar de São João, E.P.E., anadrite@sapo.pt **Professora Coordenadora, Escola Superior de Enfermagem do Porto, teresarodrigues@esenf.pt ***Professora Adjunta, Escola Superior de Enfermagem do Porto, elizabete@esenf.pt

RESUMO O bullying é um tipo de violência que tem sido investigado em vários contextos, entre eles o local de trabalho. A sua incidência no setor da saúde constitui uma ameaça à saúde dos profissionais e à segurança dos cuidados prestados aos cidadãos. Com este estudo pretende-se descrever as perceções dos enfermeiros relativamente ao conceito de bullying no trabalho. O estudo foi dirigido a enfermeiros com 10 ou mais anos de atividade profissional. Recorremos à entrevista semiestruturada para recolha de informação. Dos resultados verificou-se uma maior conceptualização do bullying no âmbito psicológico. Os colegas de trabalho são identificados como principais agressores. Os participantes referem que este tipo de violência influencia as pessoas e a própria atividade. A maioria dos participantes não refere duas das principais

dimensões

deste

fenómeno,

a

frequência

e a

duração dos

comportamentos agressivos, que caracterizam o bullying e o distinguem de outros tipos de violência.

402

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Os resultados permitiram constatar a necessidade de formação dos enfermeiros sobre bullying no trabalho, de forma a contribuir para a consciencialização deste fenómeno e suas implicações.

Palavras-chave: Bullying; enfermeiros.

33. 1. INTRODUÇÃO Bullying no trabalho refere-se a um tipo de comportamento ofensivo, através de tentativas vingativas, maliciosas e cruéis, de humilhar um indivíduo ou grupo de indivíduos no local de trabalho (International Labour Office, 1998). Outros termos têm sido usados para abordar o mesmo fenómeno, tal como mobbing ou assédio moral. O conceito de violência no trabalho é complexo, daí as inúmeras definições, sendo que diferentes termos são usados de acordo com o país, cultura e área geográfica (European Agency for Safety and Health at Work, 2007). A duração do bullying é um importante critério para diferenciar entre bullying e os conflitos quotidianos nas organizações (Zapf, Escartín, Einarsen, Hoel & Vartia, 2011). O comportamento de bullying ocorre repetida e regularmente durante um longo período de tempo (Einarsen, Hoel, Zapf & Cooper, 2011). Este

fenómeno

pode

ser

causado

por

mais

do

que

um

fator

simultaneamente, sendo múltiplas as suas causas (Zapf, 1999; Zapf & Einarsen, 2011). Das quais se destacam fatores organizacionais, pessoais do agressor e da vítima, má comunicação entre as pessoas, sentimentos de inveja e medo, rivalidade, conflito de papéis, ambição de poder e insegurança no emprego (Leymann, 1996a; Zapf, 1999; European Agency for Safety and Health at Work, 2002; Hirigoyen, 2002; Strandmark & Hallberg, 2007).

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

403


As consequências fazem-se sentir não só nas vítimas, mas também nas testemunhas, nas organizações e na sociedade em geral (Vartia, 2001; Leymann, 1996a, 1996b). Estudos perturbações

demonstram do

sono,

que

as

vítimas

irritabilidade,

podem

cefaleias,

apresentar

perturbações

cansaço, digestivas,

sentimentos de humilhação e vergonha, stresse pós-traumático, destruição da identidade, sentimentos de baixa autoconfiança, ansiedade e depressão (Vartia, 2001; Hirigoyen, 2002; Hauge, Skogstad & Einarsen, 2010). As testemunhas de bullying apresentam mais reações de stresse e sofrem com o clima psicossocial negativo no ambiente de trabalho (Vartia, 2001; European Agency for Safety and Health at Work, 2002). Alguns efeitos a nível das organizações incluem um maior absentismo e mobilidade de pessoal e uma redução da eficácia de trabalho e produtividade (European Agency for Safety and Health at Work, 2002). As consequências económicas para a sociedade resultam dos custos do atendimento e tratamento das vítimas, assegurados por seguros sociais em que toda a comunidade se vê envolvida (Leymann, 1996a). Este é um fenómeno que também se tem verificado no setor da saúde, nomeadamente entre os enfermeiros. Em Portugal, numa população de enfermeiros, Carvalho (2007) constatou que insónias, ansiedade, irritabilidade, dificuldade na concentração, cefaleias e sentimento de insegurança foram os sintomas

mais

referenciados

pelos

enfermeiros

que

experienciaram

comportamentos de assédio no seu local de trabalho. Também numa população de enfermeiros portugueses, Sá (2008) observou uma diminuição do bem-estar, da saúde mental, da satisfação profissional e um aumento da intenção de abandono do emprego. Numa amostra constituída por enfermeiros, Borges (2012) constatou relação entre stresse e violência psicológica.

404

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


A violência no setor da saúde acarreta graves consequências para a saúde física e mental dos profissionais, prejudicando o seu desempenho, pondo em causa a qualidade dos cuidados prestados aos cidadãos (Direção-Geral da Saúde, 2006). Uma maior consciencialização do bullying no local de trabalho e das suas implicações poderá contribuir para a diminuição da sua incidência, pelo que consideramos relevante conhecer a perceção dos enfermeiros sobre este fenómeno.

33.2. METODOLOGIA Este estudo teve como objetivo descrever as perceções dos enfermeiros relativamente ao conceito de bullying no trabalho. O estudo é do tipo exploratório, descritivo e transversal, inserido num paradigma de investigação qualitativa.

33.2.1. PARTICIPANTES Participaram no estudo enfermeiros, no mínimo, com 10 anos de exercício profissional. O método de seleção dos participantes foi a amostragem por redes. O número de participantes foi condicionado pela saturação da informação, sendo no total 12 participantes. O grupo de participantes é predominantemente do sexo feminino (83,3%). A média de idades é de 35,9 anos (desvio padrão de 4,8), correspondendo a idade mínima a 31 anos e a idade máxima a 49 anos. O tempo médio de experiência profissional é de 13,7 anos (desvio padrão de 4,3). A maioria dos participantes (83,3%) trabalha em contexto hospitalar. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

405


33.2.2. INSTRUMENTOS A entrevista semiestruturada foi a técnica utilizada para a recolha de informação.

33.2.3. PROCEDIMENTOS A informação fornecida durante a entrevista foi gravada, e posteriormente transcrita para texto em computador (Microsoft Office Word 2007). As entrevistas foram codificadas com a atribuição da letra E, seguida de um número, de 1 a 12, de acordo com a ordem em que foi realizada cada entrevista. A informação fornecida durante a entrevista foi submetida a uma análise de conteúdo temática. Foram cumpridos os requesitos éticos do processo investigativo. 33.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Dos resultados obtidos salientamos que a partir da análise de conteúdo emergiu a categoria temática: conceito de bullying no trabalho. Nesta categoria identificamos nove subcategorias, ilustradas na tabela n.º 1, assim como determinadas unidades de registo.

406

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Tabela n. º 1 – Conceito de bullying no trabalho percecionado pelos participantes SUBCATEGORIA

UNIDADES DE REGISTO

Tipo Psicológico

“… chantagem psicológica…” (E1) “… violência psicológica…” (E2) “… pressão psicológica…” (E3) “… mais verbal, psicológico…” (E5) “… perseguição… pressionar psicologicamente, emocionalmente…” (E6) “… sofrer algum tipo de represálias… sentir-se ameaçada…” (E8) “… algum tipo de agressão, pressão, no trabalho…” (E10) “… agressão verbal… irritação…” (E11) “… passa mais por descriminação…” (E12)

Tipo Físico

“… física é muito raro acontecer…” (E1) “… violência… física, no local de trabalho…” (E2) “… pode ser físico…” (E4) “… não passa tanto por violência física…” (E12)

Tipo Físico e Psicológico

“… uma certa forma de agressão, que pode ser direta ou indireta…” (E9)

Tipo Sexual

“… pode haver algum assédio sexual…” (E12) E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

407


Interveniente – Agressor

“… por parte de colegas…” (E2) “…

pelos

pares…

pelas

outras

categorias

profissionais… pelo doente… pelos familiares…” (E3) “… pelos familiares…” (E5) “…

tanto da

parte

de colegas… visitas… e

doentes…” (E6) “… por parte dos colegas…” (E11) Interveniente – Vítima

“… personalidade mais frágil…” (E1)

Intencionalidade

“… de propósito…” (E8) “… no sentido de… os tentarem prejudicar…” (E12)

Temporalidade

“… eu penso que é uma coisa continuada no tempo…” (E2) “… a que nós somos sujeitos no dia-a-dia…” (E3)

Consequências

“… a pessoa sente-se um bocadinho à margem…” (E7) “… fazer outra pessoa passar bastante mal…” (E8) “… vai influenciar a atividade… a forma de estar da pessoa…” (E9) “…

fazerem-te

sentir

mal,

quer

enquanto

profissional, quer enquanto pessoa…” (E11)

408

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Quase todos os participantes conceptualizam o bullying no âmbito psicológico. O bullying no trabalho é considerado como chantagem, pressão, perseguição, agressão verbal, ameaça e descriminação. No entanto, a maioria dos participantes apenas faz referência a uma destas características do bullying. A natureza

física do bullying também

é

referenciada

por

alguns

participantes, mas alguns evidenciam que é menos frequente que a natureza psicológica do fenómeno. Apesar da distinção entre âmbito físico e psicológico, houve necessidade de definir uma subcategoria incluindo estes dois tipos de violência, dada a ambiguidade da seguinte unidade de registo “… uma certa forma de agressão, que pode ser direta ou indireta…” (E9). Foi entendido que por direta o participante se estaria a referir a confronto físico e por indireta a confronto psicológico. Desta forma podemos afirmar que todos os participantes enquadram o bullying na violência psicológica, sendo que alguns referem que também pode ser física. Um dos participantes refere ainda que pode existir bullying do tipo sexual. Os participantes referiram-se ao âmbito, aos intervenientes, à temporalidade e consequências do fenómeno.

33.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O âmbito psicológico percecionado pelos participantes vai ao encontro do referido por Einarsen et al. (2011), que referem que os comportamentos de bullying são de natureza essencialmente psicológica. No entanto, segundo Hirigoyen (2002), o bullying tem um vasto sentido, englobando comportamentos ofensivos de âmbito psicológico, bem como comportamentos abusivos com conotações sexuais e agressões físicas. O fenómeno de bullying inclui ser E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

409


exposto a insultos ou comentários ofensivos persistentes, crítica persistente e abuso pessoal ou mesmo abuso físico (Zapf et al., 2011). Os agressores são referenciados por quase todos os participantes, quando questionados sobre a perceção de bullying no trabalho. Os participantes apontam os colegas como os agressores, sendo também referenciados os profissionais de outras categorias, os familiares dos doentes e os doentes. Na sua investigação, Carvalho (2007) constatou que o assédio do tipo horizontal foi o mais referido, em que os enfermeiros foram assediados, na sua maioria, por um ou vários colegas. Quanto às vítimas, a sua “personalidade” é percecionada como sendo frágil (E1). Como refere Zapf e Einarsen (2011), são várias as questões envolvidas nos antecedentes individuais das vítimas e a personalidade e os comportamentos da vítima podem desencadear comportamentos agressivos por parte de outros. Hogh, Mikkelsen e Hansen (2011) consideram que ainda é pouco claro em que medida aspetos relacionados com a personalidade das vítimas predizem a exposição ao bullying. Vários estudos demonstraram que existe relação entre bullying e baixa estabilidade emocional, enquanto outros referem que existem vítimas com diferentes tipos de personalidade (Zapf e Einarsen, 2011). Alguns participantes (E8, E12) referem que existe intenção por parte dos agressores. Segundo Hirigoyen (2002), no assédio moral há uma intenção, consciente ou não, de prejudicar o outro e as consequências tornam-se mais graves quando a pessoa se apercebe de que existe intenção de a magoar. No entanto, como provar a intenção é um aspeto que Hirigoyen (2002) questiona. Einarsen et al. (2011) referem que, normalmente, é impossível verificar a presença de intenção, mas que a intenção não altera a situação das vítimas e que os comportamentos ofensivos devem ser considerados, independentemente da intenção.

410

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


A temporalidade também emergiu no conceito de bullying no trabalho dos participantes. O bullying é percecionado como algo que se prolonga no tempo. No entanto, apenas dois participantes se referem à temporalidade (E2, E3). A temporalidade é uma das dimensões do conceito de bullying. Zapf et al. (2011) mencionam que a duração do bullying é um importante critério para diferenciar entre bullying e os conflitos quotidianos nas organizações. A frequência e duração

dos

comportamentos

negativos

indesejados

parecem

ser

tão

importantes quanto a natureza dos mesmos (Einarsen et al., 2011). As consequências do bullying foi outra subcategoria que emergiu. Os participantes referem que este tipo de violência influencia as pessoas e a própria atividade, sendo responsável por sentimentos negativos. Hirigoyen (2002) defende uma definição que tenha em consideração as consequências sobre as pessoas. As consequências também estão inerentes na definição proposta por Einarsen et al. (2011), onde bullying significa assediar, perseguir, ofender ou excluir socialmente ou afetar negativamente o seu trabalho.

33.5. CONCLUSÕES Relativamente ao conceito de bullying no trabalho, os participantes enquadram este fenómeno no âmbito da violência psicológica, referindo os colegas de trabalho como principais agressores. A frequência e a duração dos comportamentos agressivos não são referidas pela maioria dos participantes. As definições de bullying no local de trabalho, encontradas na pesquisa bibliográfica, remetem para várias dimensões, em que a frequência e a duração dos comportamentos agressivos são tidas como fundamentais para distinguir este tipo de violência de todos os outros. Outra dimensão presente na definição de bullying referida por Einarsen et al. (2001) é a desigualdade de poder entre as partes envolvidas, em que o bullying é descrito como um processo crescente (em escalada) e que a pessoa confrontada E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

411


acaba numa posição inferior, passando a ser alvo de comportamentos de bullying. Também Hirigoyen (2002) refere que o assédio moral é precedido por uma influência psicológica do agressor e de uma submissão forçada da vítima, consideram-se, assim, uma parte dominadora e outra dominada. Da informação obtida não se encontraram dados que se referissem a esta dimensão. Evidencia-se assim a necessidade de informação e formação dos enfermeiros sobre esta temática.

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413


34. O EFEITO DE UM PROGRAMA DE EXERCÍCIOS NA MELHORIA DA MOBILIDADE EM DOENTES DE ALZHEIMER Fernandes, A.*; Carvalho, R** *Fisioterapeuta, C.M.F.R. Maria Luzia e Manuela Silva, anabarros86@hotmail.com **Prof.Adjunta, ESSVS-CITS/IPSN/CESPU, raquel.carvalho@ipsn.cespu.pt

RESUMO Introdução: A doença de Alzheimer traz várias repercussões, nomeadamente a nível físico, mais especificamente défices na mobilidade. Objetivo: O objetivo do estudo foi avaliar o efeito de um programa de exercícios na mobilidade de doentes com a doença de Alzheimer. Participantes e métodos: A amostra foi constituída por 10 indivíduos com diagnóstico de Alzheimer. Foi aplicada a Mini-Mental State Examination para determinar o grau de demência dos doentes. O grupo foi sujeito a uma intervenção, de 30 a 40min, 3 sessões/semana com uma duração de quatro semanas. Os instrumentos utilizados na avaliação da mobilidade foram o Time “Up & Go” e o “Six-Minute Walk Test”. Efetuaram-se três avaliações, 4 semanas antes da intervenção, imediatamente pré-intervenção e pós intervenção. Resultados:

O

presente

estudo

apresentou

resultados

estatisticamente

significativos, após o período de intervenção, verificando-se uma diminuição do tempo em segundos do Time “Up & Go” e um aumento dos metros percorridos no “Six-Minute Walk Test”. Conclusão: Conclui-se que um programa de exercícios com a duração de 4 semanas melhorou a mobilidade de doentes com doença de Alzheimer. 414

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Palavras-Chave: Doença de Alzheimer; Mobilidade; Atividade Física; Time “Up & Go”

34.1. INTRODUÇÃO O envelhecimento da população constitui uma nova realidade e em Portugal, tal como noutras sociedades industrializadas, tornou-se num desafio com o surgimento de demências. As demências são a quarta principal causa de incapacidade funcional, com uma prevalência de 5% a 13% em pessoas com mais de 65 anos, estando os números de incidência em ascensão (Ries, Echternach, Nof & Blodget, 2009). A mais conhecida é a doença de Alzheimer (DA), de causa desconhecida, caracterizando-se por uma perda progressiva da capacidade funcional do cérebro. Atualmente a Organização Mundial da Saúde (OMS) revela que 18 milhões de pessoas sofrem de DA, estimando-se 2 milhões de doentes na Europa, em 2040. Existem diferentes classificações da DA descritas em função dos défices de cognição e das perdas motoras. Staten e Dupper (2005) descrevem três fases: fase inicial, onde os sintomas são subtis, manifestando-se pelo défice de coordenação; fase intermédia, em que os sintomas são mais acentuados a nível cognitivo e motor; fase avançada com perda da capacidade de marcha associada ao severo declínio. Sem problemas específicos numa fase inicial, com a progressão da DA surgem dificuldades de mobilidade tais como: lentidão, perda de equilíbrio e diminuição da capacidade para realizar as atividades da vida diária (AVDs), em particular a marcha (Staten & Dupper, 2005). Alguns dos efeitos nocivos associados ao défice de mobilidade são a diminuição do movimento articular e da massa muscular. E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

415


Segundo a OMS, a DA e o aumento da esperança média de vida representam um elevado custo na sociedade (direto e/ou indireto), sobretudo nos gastos assistenciais. Rolland e colaboradores (2008) sugerem que um estilo de vida ativo pode ajudar a retardar a progressão da DA. O fisioterapeuta parece desempenhar um papel primordial relativamente aos défices de mobilidade. Tratando-se de uma doença degenerativa, o fisioterapeuta, no seio de uma equipa multidisciplinar, pode melhorar a condição do doente, contribuindo para a manutenção da autonomia e da marcha. Assim sendo, o objetivo deste estudo é avaliar o efeito de um programa de exercícios na mobilidade de doentes de Alzheimer.

34.2. METODOLOGIA 34.2.1. PARTICIPANTES (POPULAÇÃO E AMOSTRA) A amostra foi constituída por 10 doentes com DA,

selecionada por

conveniência em indivíduos institucionalizados, do distrito do Porto. Foram incluídos indivíduos, de ambos os géneros, com DA, que obtivessem no MiniMental State Examination (MMSE) o valor mínimo de 12 pontos e o máximo de 24, com idade entre os 60 e os 90 anos, com capacidade de deambulação e que apresentassem défice de mobilidade (Hayes & Johnson, 2003). Foram excluídos os indivíduos que exibissem: lesão do sistema nervoso central; condições cardíacas agudas e pulmonares; alterações visuais severas; artroplastia da anca ou do joelho. Após explicação dos objetivos e do protocolo do estudo, todos os participantes assinaram uma declaração de consentimento informado. Na tabela 1 pode-se observar as principais características da amostra. 416

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012


Tabela 1: Caracterização da amostra em função da idade, valor obtido no MMSE, escolaridade e género. Média ± desvio padrão

(Min. – Máx.)

Idade (Anos)

73,9 ± 7,31

(65 – 89)

MMSE

18,0 ± 3,85

(12 – 24)

Anos de Escolaridade

5,90 ± 2,28

(4 – 9)

N Género (Feminino/Masculino)

1/9

As abreviaturas referem-se ao valor mínimo e máximo (Min. – Máx.) e o n ao número amostral.

34.2.2. INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS Após autorização das instituições foram aplicados para seleção da amostra 16 questionários e a MMSE para avaliar o estado da demência. A pontuação total da MMSE é de 30 pontos. Os valores de “corte” utilizados foram os adaptados para a população portuguesa (para revisão ver Morgado, Rocha, Maruta, Guerreiro & Martins, 2009). A MMSE possui uma boa consistência interna e confiabilidade teste-reteste (0,80 a 0,95) e uma boa sensibilidade (84%) e especificidade (60%) (Ries et al., 2009). Após a aplicação da MMSE, foram excluídos 5 doentes por não cumprirem o score mínimo de 12, posteriormente foi excluído outro por não comparecer no programa de exercícios.

E-book – III Congresso Internacional SPESM “Da Investigação à Prática Clínica em Saúde Mental” Porto, 2012

417


Para avaliação da mobilidade optou-se pelo Time “Up & Go” (TUG) e pelo Six-Minute Walk Test (6MWT), usados ambos em doentes com demências (Prince, Corriveau, Hébert & Winter, 1997; Ries et al., 2009). O TUG mede o tempo que um indivíduo demora para se levantar de uma cadeira, andar uma distância de 3 metros, contornar um objeto, regressar à cadeira e sentar-se. A pontuação é realizada em segundos (Steffen, Hacker & Mollinger,

2001).

Geiger

e

colaboradores

(2001)

referem

que

doentes

neurológicos são considerados independentes se concluírem o teste em menos de 20 segundos e dependentes na maioria das AVDs se completarem em mais de 30. O coeficiente de correlação intraclasse (ICC) é igual a 0,985 – 0,988 (Ries et al., 2009). Inicialmente o examinador demonstrou o teste e durante a aplicação assistiu o doente dando estímulos verbais e visuais para uma melhor prestação (Ries et al., 2009). O tempo de execução foi cronometrado e registado. O 6MWT consiste em caminhar durante 6 minutos num percurso prédefinido e tem como objetivo percorrer a maior distância possível nesse tempo. Marcou-se no chão o percurso, metro a metro, de acordo com Steffen et al., (2001) para uma melhor precisão na medição da distância percorrida. Ao sinal do examinador, o indivíduo foi instruído a caminhar e o tempo foi acionado. Foi dito ao doente para andar a um ritmo confortável até ser dada instrução para parar. Ao longo do percurso foram fornecidos, estímulos, sendo alertados a cada minuto. O número de voltas e de metros cumpridos foram registados. Na DA, o 6MWT possui um ICC = 0,982 – 0,987 (Ries et al., 2009). A avaliação da mobilidade foi realizada em 3 momentos, com um intervalo de quatro semanas entre eles. Entre as duas primeiras avaliações os doentes não estiveram sujeitos a intervenção de fisioterapia. Após estas duas avaliações os doentes foram sujeitos a um plano de intervenção durante 4 semanas, após o qual foram reavaliados. Quanto à intervenção, embora estudos sugiram que o efeito do exercício físico em DA surja em média após sete semanas (Coelho, Santos-Galduroz, 418

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Gobbi & Stella, 2009), devido à difícil comparência por longos períodos de tempo e pela característica degenerativa da DA, optou-se por uma duração de quatro semanas, três vezes por semana, durante 30 a 40 minutos/sessão. O treino realizado neste estudo foi adaptado do estudo de Melo & Driusso (2006). Os exercícios foram de fácil perceção e de intensidade leve a moderada, caracterizando-se por movimentos amplos, feitos de modo lento, em média a 10rpm, com aumento gradual do número de repetições, variando entre 6 e 15, de forma a promover o fortalecimento generalizado. Realizou-se ainda caminhada com o intuito de melhorar o equilíbrio e a força. Vários autores sugerem que caminhadas são mais aconselháveis que exercícios mais complexos (e.g. Shimoda, Dubas & Lira, 2003). Os dados recolhidos foram codificados e analisados através do programa estatístico IBM SPSS Statistics® 19. Para a descrição da amostra as variáveis quantitativas foram descritas pela média como medida de tendência central e desvio padrão (dp) como medida de dispersão. Para os resultados das avaliações foram utilizadas a mediana e a amplitude inter-quartil (AIQ). Utilizou-se o teste de Shapiro-Wilk para verificar o pressuposto da normalidade, não sendo este cumprido utilizou-se o teste não paramétrico para duas amostras emparelhadas Teste do Sinal para comparar as diferenças entre a avaliação inicial e final do TUG e do 6MWT. O nível de significância utilizado foi de α=0,05.

34.3. ANÁLISE DOS RESULTADOS Na tabela 2 pode-se observar os resultados obtidos nos três momentos de avaliação de forma a comparar as diferenças entre as primeiras quatro semanas em que não ocorreu nenhuma intervenção em termos de programa de exercícios e as últimas quatro semanas onde foi aplicado um programa de exercícios.

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Tabela 2: Resultados obtidos no TUG e 6MWT em mediana e amplitude interquartil (AIQ) e comparação pelo Teste do Sinal. Avaliação Inicial Mediana (AIQ) Sem Intervenção

TUG (segundos)

Com Intervenção Sem

6MWT

Intervenção

(metros)

Com Intervenção

Avaliação Final Mediana (AIQ)

Teste

do

Sinal

16,0 (5,0)

16,5 (9,0)

p = 1,000

16,5 (9,0)

12,0 (7,0)

p = 0,008*

248,20 (135,7)

241,40 (150,9)

p = 0,727

241,40 (150,9)

319,40 (184,2)

p = 0,002*

* Diferença estatisticamente significativa (p<0,05)

Na

análise

da

tabela

2

verifica-se

que

não

existiram

diferenças

estatisticamente significativas, durante o período sem intervenção. Após a intervenção, observou-se uma diminuição no tempo de execução no TUG - 3,00 segundos e um aumento dos metros (78,20) no 6MWT, comparativamente ao período sem intervenção, sendo estes ganhos estatisticamente significativos (p=0,039 e p=0,002, respetivamente).

34.4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

420

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O presente estudo pretendeu avaliar o efeito de um programa de exercícios na mobilidade de doentes com a DA. De acordo com os resultados obtidos verificaram-se ganhos em termos de mobilidade após 4 semanas de intervenção, quer em termos de velocidade de execução do TUG, assim como da quantidade de metros percorridos no 6MWT. Estes dados sugerem que a execução do programa de exercícios parece produzir efeitos benéficos sobre a função neuromuscular, justificando assim os resultados obtidos (Piermartiri, Bezerra & Hoeller, 2009). Vreugdenhil, Cannell, Davies & Razay, 2012 sugerem que exercícios que envolvam os quatro membros, assim como equilíbrio e caminhada, podem melhorar a capacidade funcional na DA. Estes resultados são reforçados por Thomas e colaboradores. (citado por Piermartiri et al 2009) que utilizaram exercícios de resistência com o intuito de aumentar a força e a funcionalidade dos membros inferiores de pessoas com demência. A intervenção consistiu num treino progressivo de resistência com uma frequência de 3 vezes por semana durante 6 semanas, onde se observou melhorias em alguns dos grupos musculares dos membros inferiores. No presente estudo realizou-se um treino aeróbio, onde a intensidade foi aumentada progressivamente quer através do número de repetições quer do tempo da caminhada, resultando num aumento da mobilidade que parece indicar de forma indireta um aumento da força e da resistência (Pitkala, Raivio, Laakkonen, Tilvis, Kautiainens, & Strandbberg, 2010). Outro aspeto importante a discutir é se os valores obtidos, além de estatisticamente são clinicamente significativos. Os resultados obtidos no TUG demonstram ganhos de –3,00segundos Ries et al. (2009) sugerem que só a partir de 4,09segundos seja considerado clinicamente significativos. Esta diferença pode justificar-se pelos resultados iniciais do TUG (16,5segundos) já serem à partida inferiores aos apresentados no estudo de Ries et al., (2009) (19,95segundos), resultando numa maior dificuldade em obter maiores ganhos. Relativamente ao 6MWT os mesmos autores revelam que um aumento de 33,47 metros percorridos comporta ganhos mínimos clínicos significativos, o que torna

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os nossos resultados para além de estatisticamente, clinicamente significativos, uma vez que se obteve um aumento de 78,0 metros. A intensidade dos exercícios variou entre leve e moderada. Estudos revelam que pessoas que sofrem de demência têm menos probabilidade de participarem com sucesso em movimentos complexos, sugerindo que caminhadas são mais aconselháveis e que independentemente de serem de baixa ou alta intensidade protegem a função cerebral (Hill, LoGiudice, Lautenschlager, Said, Dodd, & Suttanon, 2009; Rolland et al.,2008; Shimoda et al., 2003). A duração e frequência da intervenção tiveram em conta valores referidos na literatura que demonstraram que um programa de exercício de 1 hora, 2 vezes por semana, durante 12 meses demonstrou melhorias significativas na velocidade da marcha (Rolland et al., 2007). Mais tarde Rolland et al. (2008) relata que 30 minutos de fortalecimento, 3 vezes por semana, a longo prazo, resultavam na melhoria da mobilidade na DA. Contudo existe alguma controvérsia, não estando determinado um protocolo de recomendações referentes ao tipo e intensidade da atividade física necessária para produzir benefícios na DA (Hamer & Chida, 2009). Na sua revisão sistemática Coelho et al. (2008) refere que a intervenção pode variar entre 7 e 16 semanas. Contudo, outros autores defendem que é necessário uma duração de 12 ou mais semanas, com frequência de 3 vezes por semana, com 45-60 minutos por sessão, para se verificar uma melhoria da mobilidade (Blankevoort, Heuvelen, Luning, Jong, Scherder, & Boersma, 2010). Estes tempos de intervenção são superiores aos utilizados no presente estudo, contudo com base nos resultados obtidos, 4 semanas de intervenção, parecem ser suficientes para provocarem alterações significativas em termos de mobilidade em doentes com DA, sendo estas clinicamente significativas na quantidade de metros percorridos. Não podemos deixar de referir que mesmo em estadios iniciais na DA ocorrem alterações da marcha, nomeadamente na velocidade, cadência e comprimento do passo em comparação a idosos saudáveis, reforçando a necessidade de uma intervenção precoce nestes doentes (Nadkarni, Mawji, McIlroy, & Black, 2009). 422

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Algumas das limitações que podem ter interferido com o estudo para além do número de indivíduos, são o facto de os indivíduos terem sido selecionados por conveniência, o que não permite afirmar que são representativos da população com DA, assim como, estes se encontrarem institucionalizados, podendo ter influenciado os resultados do estudo. O presente estudo foi direcionado para a prevenção do declínio de mobilidade, contudo não se pode afirmar que ocorreu uma lentificação da progressão da DA tal como referida por Rolland et al., (2008). Seria pertinente verificar se a intervenção efetuada pode, a longo prazo, servir para combater outros declínios nomeadamente os cognitivos.

34.5. CONCLUSÕES Em função dos resultados obtidos, conclui-se que os objetivos propostos para o estudo foram alcançados, mostrando que os indivíduos com DA após 4 semanas de intervenção, melhoraram a sua mobilidade.

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