As Mortas da Perestroika

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Olá, Meu nome é Tiago. Durante mais de uma década, fui redator publicitário. Trabalhava no departamento de criação de agências de propaganda, fazendo campanhas para clientes nacionais. (Se você não troca de canal na hora do intervalo, é bem possível que tenha visto algum comercial que eu fiz). Hoje, dirijo uma escola chamada Perestroika. Se você já ouviu falar da gente, legal. Se você nunca ouviu falar, não tem problema. Para seguir a leitura, a única coisa que você tem que saber sobre a Perestroika é que nós somos uma escola de criatividade. Na verdade, uma escola de atividades criativas. Temos, obviamente, projetos ligados à publicidade. Mas também em arquitetura da informação, futebol como negócio, internet, design, comportamento do consumidor, comunicação em plataformas digitais, moda, arquitetura efêmera e poker profissional. Mas vamos ao que interessa: No meu tempo de redator, um dos hábitos que eu tinha era receber candidatos a estágio. As telefonistas das agências até já sabiam: se alguém ligava querendo mostrar a pasta, passavam direto para o meu ramal.


Fazia isso por vários motivos. O primeiro é que eu me sentia em dívida com o mercado. Muita gente me ajudou no início da carreira, sem nem me conhecer direito. Nada mais justo do que manter a Corrente do Bem. Em segundo, porque eu sempre gostei de ser um caça-talentos. Então, quanto mais pastas eu via, maior era a chance de eu encontrar um Pelé no início de carreira. Esse meu costume se tornou tão comum que meu caderninho virou um departamento de RH informal. Quando a nossa equipe precisava de alguém, sempre me consultavam. E até quando amigos de outras agências estavam em busca de estagiário, meu telefone tocava. Por fim, essa era uma maneira de aprender também. Quando você se força a dar opinião técnica sobre um assunto, você precisa buscar no seu banco de dados motivos para criticar ou elogiar determinada peça. Esse exercício aguçava o meu critério e melhorava o meu próprio trabalho. E aí aconteceu um negócio engraçado. De tanto avaliar pastas, os candidatos a estágio começaram a me ver como uma pessoa acessível dentro do mercado da propaganda. Um foi indicando outro, que foi indicando um terceiro, que falou para outro amigo. E quando eu vi, essa rotina de ver portfolios virou uma verdadeira rotina para mim. Mesmo saindo de agência (já faz mais de um ano que estou full time na Perestroika), continuei recebendo semanalmente candidatos a estágio. E o interessante é perceber que as dúvidas e os dilemas pro-


fissionais continuam existindo – e continuam seguindo um certo padrão. Esse foi o grande motivo de escrever esse material. A ideia é reunir aqui as principais dúvidas dos iniciantes na profissão que me procuraram nos últimos anos. Sejam dúvidas sobre o mercado, sejam escolhas profissionais, sejam conselhos do ponto de vista técnico. Tudo o que está aqui, neste livro, saiu da minha cabeça. Mas muita coisa que está na minha cabeça veio de outras fontes. Por isso, nada mais justo do que listar todo mundo que faz parte da ficha técnica. Certamente, a grande inspiração para começar a organizar esses conselhos foi o Manual do Estagiário, do Eugenio Mohallem. Um clássico da categoria. Mas além dele, também absorvi várias dicas do Criação Sem Pistolão, do Carlos Domingos. E muita coisa dos três livros do Paul Arden: It’s not how good you are, It’s how good you want to be / Whatever you think, think the opposite / God explained in a taxi cab. Os cinco são leituras praticamente obrigatórias para quem está começando. Também extraí bastante coisa das entrevistas que tenho feito por força da Perestroika. Para citar apenas alguns dos bate-papos que me inspiraram: o próprio Eugenio Mohallem (Diretor da Mohallem/ Artplan), Ícaro Dória (Diretor de Criação da Saatchi&Saatchi / Nova York), Marco Loco Bezerra (Diretor de Criação da TBWA Berlim), Beto Baibich


(Diretor de arte na Crispin, Porter + Bogusky), Fernando Perottoni (Diretor de arte da TBWA/Londres), Emiliano Trierveiller (Diretor de Criação da TBWA/ Berlim), entre outros. Mas veja bem: não quero comprometer nenhum desses profissionais. Depois de ouvi-los, tirei minhas próprias conclusões. Nunca vou usar aspas, e raramente vou cita-los. O que está escrito aqui é resultado do meu filtro. Falando em filtro: talvez este seja o grande valor deste material. A possibilidade de reunir todas essas dicas em apenas um documento, de forma (mais ou menos) organizada. Outra coisa boa é que ele foi adaptado às mudanças que a nossa propaganda sofreu nos últimos anos. (O Manual do Estagiário, por exemplo, foi escrito em 1997. De lá para cá, muita coisa mudou. Além disso, ele sempre esteve muito focado em São Paulo. Determinadas situações simplesmente não fazem sentido no dia-a-dia de outros mercados.) Nada aqui é definitivo. São apenas opiniões, baseadas na minha experiência pessoal e na forma como alguns profissionais com quem conversei encaram o negócio da propaganda. Isso aqui não é um livro de auto-ajuda. É um livro somente de ajuda. Muitas dessas dicas funcionaram comigo e talvez ainda funcionem para outras pessoas. Espero que seja o seu caso.


P.S.: Esse livro é uma obra que respeita o conceito Freemium, com distribuição gratuita através do site da Perestroika: www.perestroika.com.br (Caso o livro tenha repercussão positiva, e caso exista interesse por uma versão impressa, faremos uma leva de poucas unidades – todas elas cobradas. Entretanto, mesmo que isso aconteça, a versão gratuita continuará disponível para download no nosso site.) Se alguém quiser vendê-lo para você, não compre. É picareta na certa. O que fizemos, para satisfazer aqueles que insistiram muito, foi abrir uma conta especificamente para receber contribuições espontâneas. Então, se você achar o livro uma merda, não deposite nada. Nós já fizemos você perder o seu tempo. Se você achar bom, mas estiver com preguiça, não deposite nada também. Não queremos que você passe trabalho. Se você achar muito bom, mas estiver sem grana, a gente entende. Fica para a próxima. Agora, se você achar o livro bacana, e quiser contribuir, legal. Deposite o quanto achar justo. Não existe valor sugerido. Você é quem manda. Tiago Correa de Mattos Banco HSBC (399) Agência: 0252 Conta Poupança: 416976-0 Parte do valor será revertido em outras ações Freemium da Perestroika.


P.S. 2: Este livro, como bom filhote da internet, é Beta. Estará em constante atualização e, de tempos em temos, sofrerá as mudanças necessárias. Todas as novas versões estarão disponíveis para download gratuitamente nosso site: www.perestroika.com.br Lançar um Work in progress foi uma decisão difícil. Não queria que ele viesse ao mundo prematuro. Não queria que ele nascesse com cara de joelho. Mas também não dava para esperar mais. Especialmente depois que eu me dei conta que esse job estava há exatos nove meses na minha pauta. Se você tem sugestões, reclamações, dúvidas, pode escrever para tiago@perestroika.com.br. Vou adorar ouvir o que você achou. E vou considerar tudo o que você disser para a próxima versão. Por fim, é legal saber que, por ser de graça, decidimos não contratar um revisor oficial. Estamos contando com a sua boa vontade: se você encontrar qualquer errinho, nos perdoe. E nos avise.


P.S. 3: A ilustração da capa é de Marcos Zerene, designer argentino que cedeu gratuitamente seu material através da licença Creative Commons. http://www.formatbrain.com.ar http://www.flickr.com/formatbrain O layout do livro, feito em tempo recorde, foi obra do Dudu Friedrich. tg


Índice Capítulo 1

Manual Express Capítulo 2

Montando o portfólio Capítulo 3

Dentro da agência Capítulo 4

Trocando de emprego Capítulo 5

Primeiros dilemas profissionais Capítulo 6

Melhorando seu trabalho Capítulo 7

O novo criador Capítulo 8

O que aconteceu comigo Capítulo 9

Posts


CapĂ­tulo 1

Manual express


Se você está sem saco de ler todo esse livro, pelo menos preste atenção nesses toques. São pílulas. E pílulas do dia seguinte: você lê e, amanhã mesmo, pode colocar em prática. Bem vindo ao nosso drive thru de conselhos profissionais.


Vai lá e faz. Todas as pessoas do mundo têm boas ideias. Inclusive você. A grande diferença é que algumas conseguem executá-las. Portanto, não deixe seus planos mofando. Ideia na gaveta é a mesma coisa que ideia inexistente.


A vida é a melhor referência. Você só consegue criar coisas legais se você for um cara legal. Isso significa viver situações inusitadas. Sair da zona de conforto. Sair do lugar comum. Lembre-se: o seu trabalho está intimamente ligado às experiências que você passou. Se você for uma pessoa com vivências únicas, o seu trabalho será único. E aí, ninguém vai conseguir copiá-lo.


A quantidade faz a qualidade. Você conhece a teoria da toalha molhada? Ela é bem simples: você pega uma toalha molhada e torce até sair toda água. Daí, você torce de novo, e vai ver que sai mais um pouco de água. E se você torcer uma terceira vez, vai sair mais um pouquinho. E mais um pouquinho. E mais um pouquinho. Insistir faz parte. As primeiras soluções são as mais fáceis, mas as mais óbvias. Não surpreendem e, pior: provavelmente alguém já teve antes de você.


“Mais ou menos” é menos. Se quando você acha que o seu trabalho está bom, muitas vezes ele é reprovado, imagine quando você acha que ela está médio. Não se acostume com a mediocridade. Estresse a sua criação até chegar no seu limite.


Trabalhar com criação é divertido, mas é trabalho. E trabalho às vezes é um saco. Quando você vai no cinema, paga o ingresso. Quando você viaja, paga o avião. Quando você trabalha em propaganda, eles é que pagam você. E não pense que é porque você é um cara legal. Não: trabalho é trabalho. Por mais apaixonado que você seja por publicidade, há momentos em que até um monge budista perde a paciência.


O melhor jeito de ser puxa-saco é com um bom trabalho. Quem decide segurar o seu emprego apenas com bajulações normalmente se dá mal. Nem a Monica Lewinsky, que era uma estagiária extremamente dedicada ao patrão, conseguiu se manter no cargo.


Na maioria das vezes, a montanha não vem a Maomé. Por mais desestimulante que isso seja para alguém que está iniciando, é importante dizer: chegar lá vai dar trabalho.


Você aprende sozinho. Para sobreviver numa agência é preciso ter um pouquinho de Chuck Norris no DNA. Porque numa agência, ninguém tem tempo de pegar você pela mão e ensiná-lo a fazer as coisas. Seja observador, veja como os outros fazem, descubra o que eles gostam. E vá à luta.


Não encha o saco. Você tem todo direito de fazer quantas perguntas quiser. Mas por favor: existe uma linha tênue que separa o cara curioso do mala sem alça. Todo mundo adora um estagiário interessado. E todo mundo abomina um estagiário chato.


Quem se apega demais às ideias é porque tem poucas. Se você teve uma ideia bacana, e acredita nela, defenda até um certo limite. Se não aprovarem, parta para outra.


Aprenda a lidar com a frustração: ela é a maioria do nosso trabalho. Você já se deu conta que praticamente tudo o que criamos vai para o lixo? No final das contas, se tudo der certo, por mais que você tenha muitas ideias legais para um job, só uma vai sobreviver e veicular.


Ideias para publicitários só atingem um público: os publicitários. Esse assunto é mais do que batido, mas não custa lembrar de novo. As campanhas que caem no gosto do grande público, que viram parte da cultura popular, que entram para a história da propaganda, são muito diferentes daquelas ideias assépticas, comuns em festivais.


É melhor ser co-autor de algo brilhante a ser autor solitårio de algo comum. Esse Ê um pensamento popularizado pelo Washington Olivetto e que a gente compartilha.


A maioria dos gĂŞnios da propaganda acorda cedo e dorme tarde. Os melhores profissionais que eu conheci na propaganda eram pessoas bastante dedicadas. A fantasia do gĂŞnio que senta na cadeira e tem uma ideia brilhante, assim, num lampejo, ĂŠ pura ingenuidade.


Propaganda é a sua carreira, não a sua vida. É normal que um criador goste de criar. Mas é bem possível que ele se divirta mais fazendo outras coisas, como ver futebol na TV, comer churrasco com os amigos ou viajar ao redor do mundo. Acredite: isso é completamente sadio.


Uma ideia só é original até outra pessoal pensar a mesma coisa – e fazer antes de você. Hoje em dia, um criador em Porto Alegre e um na Sibéria têm acesso às mesmas referências. Então, não fique procrastinando. Ou você corre o sério risco de ver a sua linda ideia estampada na marca concorrente.


Todo cliente tem a propaganda que merece. A nossa obrigação é fazer o melhor trabalho possível para os clientes. Mas a palavra final sempre é de quem paga a conta. Se depois de muitas tentativas ele não aceitou as recomendações da agência, e prefere uma ideia sem-pénem-cabeça, paciência.


Câncer é um problema grave. Propaganda é só propaganda. Sempre que você se deparar com uma situação onde parece que o fim do mundo está próximo, lembre-se: isso é só propaganda. Ninguém vai morrer.


Cap铆tulo 2

Montando o portf贸lio.


O que é um portfólio? O mercado está cheio de bons profissionais, com trabalhos fantásticos e campanhas memoráveis. Mas também está cheio de enroladores, que só têm pose e nunca fizeram nada de relevante. Na hora de contratar alguém, como saber se o candidato faz parte do primeiro ou do segundo grupo? Para acabar com essa dúvida, inventaram um negócio chamado portfólio. O nome é chinfroso. Mas não passa de uma pasta, que reúne todo o seu histórico de trabalhos. Normalmente ele traz as suas peças gráficas (anúncios de jornal e revista) e eletrônicas (trabalhos de rádio e TV). O objetivo do portfólio é desmascararar os metidos e provar que o seu passado justifica uma contratação.


Vamos começar do início: o portfólio analógico. Ou, como estão falando por aí: o portfólio old school. Muita coisa mudou na concepção do portfólio. Hoje em dia, o processo é muito mais simples do que no meu tempo. Entretanto, como muita gente de agência ainda curte ver pastas impressas, resolvi começar falando do jeitinho tradicional.


Como se monta a embalagem do portfólio. Eu comentei há algumas páginas: o portfólio é, basicamente, uma pasta. Não invente. A embalagem não precisa ter aberturas mirabolantes ou formatos estroboscópicos. Uma pasta preta, dessas que você compra em qualquer livraria, já dá para o gasto. É melhor não colocar seus anúncios dentro de plásticos. Atrapalha. Mas se não tiver outra escolha, coloque pelo menos em sacos novinhos. A pasta precisa estar bem apresentada. Se você não cuida do seu portfólio, que é o seu cartão de visitas, imagine o que vai fazer quando cair um job chato na sua mesa. Nada de cantinhos amassados ou bordas descolando. Para quem quer investir, a grande dica é a Cartonaria. O pessoal faz pastas sensacionais. Dá para criar uma bem personalizada: você escolhe o modelo, as cores e o formato do berço. O meu antigo portfólio f o i f e i t o l á . ( S e v o c ê q u i s e r v e r, v i s i t e www.cartonaria.com.br, clique no link Portfólios e veja a imagem PT022. Aproveite e espie outros modelos antes de encomendar o seu.)


Como apresentar as peças. Se você simplesmente imprimir suas peças em folhas, legal. Já dá para o gasto. Agora, existe uma manha que o pessoal faz para ficar mais bonitinho (veja se você entende). As suas peças devem ser refiladas (cortadas na margem com estilete) e coladas, preferencialmente, num papel preto. Cuidado com a cola que você usa. Algumas podem danificar os anúncios. Sugiro que você compre uma cola spray. O acabamento sempre fica mais legal quando a base preta é mais grossa que as folhas de ofício tradicionais. Se eu não me engano, você encontra em boas livrarias os pacotes prontinhos, com as folhas da gramatura e da cor que quiser. Há muitos anos, eu encomendei numa gráfica expressa um lote de opalines cortados em A4. Pode ser uma saída. O ideal é que você tenha lâminas soltas, não afixadas no portfólio. Assim, você pode trocar a ordem, tirar e acrescentar peças sem estragar a sua pasta.


Como se imprimem os anúncios? A moral da história é: quanto melhor a impressora e o papel, melhor fica a reprodução. Imprima seus anúncios numa folha normal, dessas A4 ou ofício. Se você tem acesso a uma boa impressora (na sua agência ou universidade), está mais do que bom. Ou, para um acabamento ainda mais caprichado, use papel fotográfico. Neste caso, recomendo que você faça tudo direto numa dessas lojas que revelam fotos. É caro? É. Mas se você conseguir a vaga, o seu primeiro salário já paga o investimento.


Marco Loco Bezerra,

Diretor de Criação da TBWA/Berlim Quando recebi o convite do Tiago para escrever esse texto, fiquei bem confuso. São tantas as coisas que eu acho importante para a formação de um publicitário, que não sabia por onde começar. Pensei nas dicas que foram importantes para mim. Trabalhar duro, ter paciência, procurar sempre as melhores agências e professores. Tudo faz parte de um contexto de aperfeiçoamento profissional e pessoal. Vou sinalizar com três pensamentos que acho fundamentais. A minha primeira barbada seria pensar na carreira como uma maratona. O cara não pode desistir fácil. Tem que batalhar. Tudo pode acontecer em apenas um ano na nossas vidas. Vários amigos que começaram comigo nessa caminhada desistiram antes de chegar no pote de ouro. Caras extremamente valorosos e talentosos. Só não tiveram a paciência de esperar a melhor oportunidade. Na nossa profissão, tudo pode mudar em um curto espaço de tempo. O cara pode fazer uma sequência espantosa de prêmios e garantir um baita embalo na carreira. Para mim, por exemplo, tudo vem em ondas. Um ano maravilhoso seguido por outro muito difícil. Manter uma sequência é bem complicado. Exige concentração e sorte. Respeito muito quem consegue manter essa média alta. Para fugir do meu exemplo, vou falar de um cara bem fudido. O Erick Rosa, que nesse ano (2009) ga-


nhou 7 leões, precisou somar 17 short-lists nos anos anteriores. Quando veio o dele foi uma lavada. Deu uma acelerada maravilhosa em uma carreira já recheada de vitórias. Imagina se ele tivesse desistido? Caso ele resolva largar a barca pode jogar um dos 7 no lixo lá de casa. Outra coisa que eu acho importante é saber jogar com experiência. Saber a hora de dar o pique. Nenhum jogador de futebol consegue correr em todas as bolas. É o mesmo conosco. Se o cara vira todas as noites trabalhando, quando chegar a oportunidade de fazer o trampo da vida ele vai estar morto. Vai render abaixo da expectativa e vai se frustrar. Não quero dizer que você deva fazer o trabalho de forma preguiçosa e de má vontade. Isso jamais. Minha dica é para não punhetar sempre. Tem hora para dar o drible. De preferência quando estamos perto do gol. Como vocês podem ver, adoro metáforas de futebol. A terceira dica é procurar os melhores. Custe o que custar. Fique em ambientes fudidos e serás empurrado para o sucesso. Exemplos e professores de qualidade são a melhor forma de evoluir. Competir com respeito e jogando dentro das regras é a melhor forma de estimular uma mente curiosa e determinada. Para finalizar vai um pedido, mais do que um conselho. Não seja um FDP. Nosso mundo já está cheio de caras com as atitudes erradas. Ser um cara talentoso e especial não dá direito a ninguém ser um mau caráter. Mantenha a humildade e o respeito. Nossa profissão estimula muito a vaidade e isso não é desculpa para vender a alma ao diabo.


Faz um JPG. Você foi lá, mandou fazer a caixa, imprimiu tudo bonitinho, colou com o maior cuidado. Na sua primeira entrevista, o cara pede: Manda uns JPGs? Mesmo que a pasta impressa ainda tenha a sua importância, o dia-a-dia corrido dos criadores nem sempre permite entrevistas para todos os candidatos. Talvez, você seja o felizardo a mandar o trabalho por e-mail. E isso vai ser cada vez mais comum. Fica aí a dica. Independente da pasta, tenha sempre a mão: 1) Um portfólio on-line. Constantemente atualizado. 2) JPGs das suas peças. Nem muito pesados, para não atolar a caixa do cara. Nem muito leves, para a resolução não ficar baixa demais. Não existe um padrão para o portfólio on-line. Acredito que o jeito mais fácil seja fazer um blog. Ou se registrar no Carbonmande.com, a central de portfólios mais popular da internet. E só para não deixar passar: a pasta impressa é importante, sim. Pelo simples fato de que, pela internet, você não consegue deixar as imagens na resolução que se exige profissionalmente. Talvez, daqui uns anos, ela caia em desuso. Mas hoje ainda vale ter uma.


Caso você não tenha lido com atenção: portfólio sempre atualizado. Nunca me ligaram e disseram: Ouvi falar bem do seu trabalho. Que tal falarmos daqui um mês? Em agência de propaganda, nada tem prazo. Nem entrevista. Quando estão procurando gente, é sempre para ontem. Montar um portfólio na correria é uma dupla insanidade. Primeiro, porque é bastante estressante imprimir, refilar e colar com pouco prazo. Segundo, porque é um suicídio profissional. Já pensou, perder aquela vaga preciosa porque você deixou o portfólio defasado? Sempre tenha a pasta impecável. Tem gente que faz atualizações mensais. Tem gente que faz atualizações semanais. Nesse sentido, eu sempre fui bem CDF: fazia atualizações instantâneas. Se saía um anúncio legal, imprimia uma cópia na hora. E já separava o arquivo para mim. Para não ficar empurrando com a barriga, o jeito mais fácil é já deixar no seu desktop um folder Portfólio. Fez coisa bacana? Arrasta para lá. Se você for redator, encha o saco do seu dupla. É fundamental estar com as peças ao seu alcance.


Como selecionar as peças da sua pasta. A regra básica é: o que joga a sua pasta para baixo, sai. O que joga a sua pasta para cima, fica. O problema é que, se você mostrar a sua pasta para dez criadores diferentes, cada um vai dizer uma coisa. A única pista que você vai ter é sobre o que é muito ruim e o que é muito bom. Nisso, os caras experientes costumam concordar. Em geral, os critérios são muito subjetivos. Por isso, não existe certo e errado. Existe o certo e errado para cada situação. Não adianta chegar com um monte de ideias bundonas numa agência que faz só faz anúncios fora da casinha. E vice-versa. Você tem que se adequar ao seu público-alvo. Até na hora da entrevista. Quem me conhece, sabe que eu não simpatizo muito com as ditas Analogias Genéricas. E se você sabe disso, não vale a pena arriscar. Tire da pasta antes de falar comigo. É ferro na certa.


Na Matemática da Pasta, 1 + 1 = 1. Antes de sair da DCS, um candidato a estágio me ligou pedindo para mostrar a sua pasta, que tinha três anúncios. Sugeri que ele me procurasse novamente quando tivesse, no mínimo, dez peças. No dia seguinte ele me ligou. Fiquei um pouco intrigado. Mas marquei a entrevista mesmo assim. Como combinado, ele chegou com as dez peças. Mas elas faziam parte da mesma campanha. Dez anúncios, todos bem parecidos, com pequenas alterações de cor entre um e outro. Não sabia nem por onde começar. Esse episódio me ajudou a criar a Matemática da Pasta. Ela é simples e evita que você pague esse tipo de mico. Cada peça vale um. Um anúncio, um outdoor, uma embalagem, um logo, um jingle, uma ação de relacionamento na internet. Tudo isso vale um. Até aí, fácil. Se você tem uma campanha com três anúncios, e cada um deles tem uma ideia diferente, contam três peças. Agora, se você tem uma campanha com três anúncios, e os três anúncios são razoavelmente parecidos, conta apenas um.


Para complicar ainda mais: se essa campanha de três anúncios diferentes tiver um desdobramento (por exemplo, um outdoor), ele conta como uma nova peça. A não ser que ele seja apenas uma reprodução de um dos anúncios. Aí não vale nada. Só por favor: não leve ao pé da letra. A Matemática da Pasta é bem flexível e pode sofrer adaptações caso a caso. O objetivo principal é ser um guia para não deixar o seu portfólio nem muito curto, nem longo demais.


Ordem. O Manual do Estagiário consagrou uma maneira de montar as pastas que funciona muito bem. Você pega as suas dez peças e coloca em ordem. Começando pela pior até a melhor. 10 (a pior), 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1 (a melhor). Aí, você joga a melhor lá para o início: 1 (a melhor), 10 (a pior), 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2 (a segunda melhor). Assim, você começa dando um chute no saco. E termina a pasta sem fazer feio, deixando uma boa impressão. Eu sou um defensor desse sistema. Mas para falar a verdade, nunca segui esse método fielmente. Sempre usei como ponto de partida. Depois, mudava a partir de outras variáveis que considero igualmente importantes. Nunca contei esse meu método para ninguém. Me sentia meio herege de contrariar as dicas do Mohallem. Só fiquei mais tranquilo no dia em que tive a oportunidade de entrevistar o próprio Eugenio. Ele comentou que ficava chocado ao ver algumas pessoas seguindo a ordem cegamente. Aí eu relaxei.


Então, aí vai a minha sugestão: faça o 1, 10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2. Em seguida, avalie a relação de títulos vs. ideias visuais. Você não pode ter os cinco primeiros anúncios de um grupo e os cinco últimos de outro. Fica muito previsível. Seu objetivo é justamente surpreender quem está vendo a pasta, não é? O mesmo vale para design gráfico vs. design 3D ou propaganda off-line vs. on-line. Monte de um jeito que fique interessante. Outra coisa importante é a relação de clientes. Se você tem no seu portfólio um total de nove campanhas, sendo três para cada cliente, não deixe elas juntinhas. Cliente 1, Cliente 1, Cliente 1, Cliente 2, Cliente 2, Cliente 2, Cliente 3, Cliente 3, Cliente 3. Misture. Não pode parecer uma pasta com três blocos. Deve parecer uma pasta com nove campanhas. Cliente 1, Cliente 2, Cliente 3, Cliente 2, Cliente 1, Cliente 2, Cliente 3, Cliente 3, Cliente 1. E por último: cuide das cores das suas peças. Umas são mais avermelhadas. Outras têm fundo branco. Outras são escuras. Não deixe ela monótona. Crie estímulos visuais para quem estiver vendo. É sempre bom ter um cantinho (um bolso no final da pasta, por exemplo) para você deixar escondidas as peças polêmicas.


Só mostre se houver clima. Ou se você sentir que pode ser o tiro decisivo na sua contratação. Na dúvida, não ultrapasse.


Pedro Perurena,

Gestor Criativo da LiveAd PESSOAS SÃO PESSOAS De todos os brains que já fiz na vida, o que gerou esta contribuição aqui certamente foi um dos mais difíceis. Escolher um conselho profissional. UM conselho, dividir UM ensinamento, dar UMA morta! É como pedir a um DJ ou a um músico que escolha apenas UMA canção pra resumir o setlist. Nada fácil. Mas acho que o peso desse brain vem de pontos maiores, intrínsecos ao pedido do briefing - o desafio de pensar num assunto que pareça menos óbvio, já que vai ter muita gente boa dando conselhos sobre os temas que sempre são importantes serem lembrados. A idéia é tentar fugir dos temas principais, mas que ainda assim seja um assunto relevante - um conselho só é bom se servir pra alguma coisa. Minha dica é a mais óbvia de todas. Muita gente já ouviu e vai continuar ouvindo por aí, em agências, em livros de auto-ajuda e em igrejas. Talvez até mesmo neste livro mais alguém diga o mesmo. Só que é tão óbvia quanto é fundamental pra formação profissional (e pessoal) de qualquer um: quem quer trabalhar com Comunicação, não pode nunca esquecer que tudo gira em torno de PESSOAS. A primeira compreensão é a mais óbvia de fato: “pessoas” quer dizer o público a ser atingido, o lei-


tor, o consumidor, o usuário. Mas esta é a última esfera a que me refiro. Antes, vem o lado pessoal de cada profissional- um bom Comunicador é aquele que entende como uma PESSOA se comporta. Não um dado, uma estatística, uma faixa etária, uma classe social, um públicoalvo. Uma PESSOA (normal ou não). E entender como um indivíduo se comporta, o que consome, onde vive, é viver isso de verdade. Quem trabalha com Criação, sabe que é preciso se alimentar de referências da vida real, cotidianas, que conversem com o maior número de pessoas possível. As idéias sólidas, atemporais, que despertam sentimento, são aquelas inspiradas nas vidas das PESSOAS. Mas além das PESSOAS pra quem dirigimos nosso trabalho, além da nossa própria visão da vida e das PESSOAS - visão essa que deve estar sempre atenta aos movimentos sociais, estar em constante evolução - devemos entender que INTERNAMENTE, uma agência é feita de pessoas. O processo completo do trabalho depende de PESSOAS. Tá, e daí? Bom, ninguém faz nada sozinho. A gente sabe que mesmo o trabalho mais criativo do mundo depende de aprovação do cliente, de uma equipe de produção dedicada e bem brifada, de uma finalização impecável. E ainda deve servir ao negócio do cliente e da agência. O atedimento, a mídia, a criação, o planejamento, o estúdio, a diretoria, todos são PESSOAS.


E são PESSOAS como qualquer um que estiver lendo este texto, PESSOAS com alegrias e tristezas, ambições, defeitos, desejos, aptidões, certezas e incertezas. Cada um desses profissionais com sua própria linguagem e compreensão, seu próprio tom de humor, sua própria visão do trabalho. Dependemos de PESSOAS pra que nossa própria contribuição pro trabalho seja efetiva. E se vamos trabalhar junto com PESSOAS, é fundamental que a gente consiga ENTENDÊ-LAS. Qualquer trabalho que tem a contribuição de todas as áreas vai fluir melhor. E quanto mais harmônico for esse processo, melhor pro trabalho, melhor pras pessoas.


O que me impressiona na pasta de um Redator. Quando eu vejo uma pasta de Redação, eu espero encontrar, pela ordem: • Bons títulos • Bons textos publicitários • Bons conceitos e boas ideias visuais • Boas idéias de rádio, TV, no media e internet • Exercícios criativos fora da propaganda sempre são bem-vindos. No dia-a-dia de uma agência, praticamente todo o trabalho de um estagiário de Redação é criar títulos e textos. Portanto, não faz sentido contratar alguém que não saiba resolver esse tipo de problema. Ou o problema vai voltar para a mão de quem o contratou. Me impressiona ver na pasta de um estagiário de Redação argumentos inteligentes. Maneiras de abordar um produto que fogem do normal. Me impressiona ver variações nos recursos de forma: títulos duplo sentido, repetições, substitutivos, títulos visuais e de dois tempos. Me impressiona muito ver um título-raciocínio. Dependendo do caso, justifica a contratação na hora.


Me impressiona ver textos com ritmo. Com introdução, desenvolvimento e conclusão. Escrito com palavras coloquiais. Que conversem com o consumidor. Não me impressionam títulos que, ao usarem um duplo sentido, ficam vulgares. Não me impressionam anúncios de camisinha, motel ou canal pornô. Não me impressionam ver ideias para placas de banheiro. Falando em banheiro: não me impressiona o humor baseado em escatologia.


O que me impressiona na pasta de um Diretor de Arte. No caso do Diretor de Arte, a ordem é: • Bons layouts: hierarquia, escolha de fonte, combinação de cor, agrupamento e alinhamento (anúncios, outdoors, folders, catálogos, broadsides, flyers, etc.) • Boas ideias e boas montagens fotográficas (anúncios, outdoors, folders, catálogos, broadsides, flyers, etc.) • Boas ideias de rádio, TV, no media, internet • Boas ilustrações • Exercícios criativos fora da propaganda sempre são bem-vindos. Me impressiona ver um material com bastante informação (como um folder) bem diagramado, organizado, com os textos bem distribuídos e fotos no tamanho certo. Me impressiona ver montagens fotográficas caprichadas, com a correta incidência de luz, sombra e padronização das cores. Não me impressiona ver anúncio receita de bolo: fotão, barra e logo. Isso qualquer um faz. Não me impressiona ver Direção de Arte com cara de flyer de festa. Especialmente os que copiam os flyers de festa que já não são mais modernos. Ou que são moderninhos demais.


Não me impressiona ver um profissional que coloca o seu estilo de Direção de Arte acima da marca do cliente. E faz tudo igual: seja para um pré-vestibular, seja para uma whisky importado, seja para varejo de supermercado.


Dado Petersen,

Diretor de Arte da DDB/New York Um conselho. Procure inspiração nas suas experiências de vida. Se mantenha atualizado com as tendências sociais, tecnológicas e artísticas. Respeite a opinião dos outros. Discorde. Concorde. Observe o comportamento humano. Reconheça o momento certo de brigar pela sua idéia. Entenda o problema do cliente e encontre a solução. Sempre diga a verdade. Estude a história da propaganda. Encontre um mentor. Acompanhe todos os festivais de propaganda. Seja perfeccionista. Não seja perfeccionista. Seja o primeiro a chegar no trabalho e o último a sair. Se familiarize com a palavra não. Prazos são para ser cumpridos. Exercite sua criatividade. Revise suas idéias no dia seguinte. Seja persistente. Não tenho medo de errar. Inspire-se nos seus colegas de trabalho. Se torne um especialista nas suas ferramentas de trabalho. Se divirta.


Pequeno cuidado para se ter com os exercícios de fora da propaganda. Se o portfólio publicitário não estiver agradando, não ultrapasse o limite do bom senso. Os exercícios fora da propaganda devem ser o tiro de misericórdia, não um tiro no próprio pé. Vamos supor que a sua pasta seja fraca. Alguém teve paciência para criticar vários títulos, textos e conceitos. Ficou lá, explicando por A+B porque você deveria refazer seus anúncios. Aí, no final da entrevista, você insiste para que ele leia algumas crônicas que você imprimiu do seu blog. Parece um pouco Joselito, não? Além disso, saiba que se o portfólio em si não estiver lá essas coisas, dificilmente uma parede que você grafitou ou uma letra da sua banda vai salvar a sua pasta. Os exercícios fora da propaganda devem ser a cerejinha. Por isso, capriche no bolo.


Modernices. O perfil do portfólio muda na mesma velocidade que a propaganda muda. Então, ter ideias ousadas podem chamar a atenção. Algumas possibilidades: 1) Um vídeo “viral” 2) Um prédio como solução de ambient media 3) Uma estratégias de relacionamento on-line 4) Um aplicativo para Iphone 5) Um jogo de videogame Só não esqueça que esse tipo de solução criativa está em fase experimental nas maioria das agências. Não é o job do dia-a-dia. Portanto, serve mais para mostrar o seu potencial criativo do que para demonstrar uma expertise que será aplicada na agência.


Por melhor que seja o seu currículo, ele só vai atrapalhar você. Durante a entrevista, vão perguntar se você está estudando, onde você trabalhou, que programas domina, e tudo mais que julgarem necessário. Em outras palavras: não existe muita necessidade de um currículo impresso. Para falar a verdade, até pega mal. É até uma piada entre os criadores: Veio um estagiário só com currículo querendo emprego, pode? Gaste tempo na sua pasta que vale mais a pena. Só não esqueça de deixar o seu contato. Pode ser um cartão de visitas ou seu nome e e-mail/celular na capa. Perder a vaga com um portfólio ruim, vá lá. Agora, perder a vaga por sumiço, aí já é demais. Se você quer que dê namoro, tem que deixar pelo menos o telefone, né?


O melhor jeito de fazer uma pasta é trabalhando numa agência. Mas para entrar numa agência, você precisa de uma pasta. E aí? Aí você senta na frente do computador, pensa num briefing que renda uma boa campanha e começa a trabalhar. Mas eu nunca trabalhei, como vou saber o que é um bom briefing? Ora, um bom briefing é aquele que você gostaria de ter em mãos. Normalmente, são assuntos nos quais você já se interessa. Quem gosta de futebol provavelmente vai curtir criar para a Nike. Quem é viciado em videogame vai adorar pensar em ideias para Playstation. Só não perca muito tempo nessa parte do processo. Pensar num briefing é infinitamente mais fácil do que pensar num anúncio para esse briefing. Outra boa maneira de iniciar a pasta é acionar o seu Banco de ideias. Todo criador tem um arquivo de Word chamado Banco de ideias.doc. Alguns preferem um caderninho de anotações (especialmente os diretores de arte) porque dá para rabiscar.


Se você ainda não tem nenhum dos dois, comece hoje mesmo. Agora, se nada disso fez você se mexer, ainda existe uma última esperança. O Criação Sem Pistolão sugere o Método da Revista Veja. Você abre a revista em qualquer página que tenha pelo menos um anúncio. Aí, você identifica o briefing e tenta criar uma ideia melhor para o mesmo problema do anúncio. É difícil. Mas se você conseguir fazer anúncios melhores que os da Veja, eu tenho certeza que você consegue uma vaga.


Seja o seu próprio atendimento. É legal você se colocar um prazo. Ou vai ficar empurrando com a barriga eternamente. O anúncio de amanhã sempre pode ficar para depois de amanhã. Então, caso você esteja com tempo livre, sugiro que você coloque a seguinte meta: produzir uma pasta com dez peças em um mês. É bem razoável. Você terá 2,5 dias para criar e executar cada anúncio. O que, numa agência de verdade, é um luxo. E ainda terá todos os finais de semana livres para não pensar em propaganda. Se você já tem uma pasta, mas quer trocar algumas peças que foram criticadas, dá para manter a média de 2,5 dias por peça. Eu mesmo já utilizei esse sistema. E como garotopropaganda da minha própria ideia, afirmo com um sorriso no rosto: funciona!


A hora da verdade: quando a pasta está boa para fazer uma entrevista? Assim como o surfista, que morre em busca da onda perfeita, você vai morrer e não vai ter o portfólio ideal. A moral da pasta é justamente essa: estar sempre melhorando o seu conjunto de peças. Então, não adianta ficar pedalando a entrevista. Uma hora você tem que cair no mar. Para ser um pouco mais prático: pense num mínimo de dez peças. Menos que isso é perda de tempo. Para você, que terá pouca coisa para ser avaliada. E para quem entrevista, que vai criar um buraco na agenda para analisar o seu trabalho. Acima de vinte peças também não precisa. Sinal de que você filtrou mal. Corre o sério risco de aborrecer o cara. E aborrecer também esposa do cara, que odeia jantar sozinha. Entre quinze e dezoito peças está na medida. Outra coisa importante: assim que você tiver um portfólio, não enrole. Marque logo as entrevistas, mesmo que dê um medo. Imagine que o objetivo da conversa não é ser contratado. É ouvir críticas e melhorar a sua pasta. Para, numa próxima vez, aí sim disputar a vaga.


Não precisa existir vaga para marcar uma entrevista. Você está em casa e de repente toca o telefone. Fiquei sabendo que você gostaria de estagiar aqui na nossa agência. Estamos com uma vaga. Quer vir mostrar a pasta? Parece bizarro, mas é assim que alguns estudantes agem. Ficam esperando a oportunidade, em vez de criá-la. O jeito mais fácil de conseguir uma entrevista é usando os seus contatos. Se você tem algum conhecido que trabalha em agência, peça para ele ver o seu trabalho. Dificilmente vão recusar. Se esse seu amigo for muito novato, peça para ele agilizar com outra pessoa mais experiente. Quase sempre dá certo. Ou simplesmente pegue o telefone e ligue para as agências. Pergunte se tem vaga para estágio. Se não houver, pergunte se alguém da Criação pode ver a sua pasta. O pior que pode acontecer é dizerem não. E você ficar na mesma. Não caia no truque do Fale conosco. Você provavelmente será ignorado. Por sinal, e-mail é uma ótima ferramenta para ignorar candidatos a estágio. Ligar sempre é mais garantido.


Reginaldo Pujol, Redator da Escala

Se eu pudesse dar um conselho pra alguém sobre carreira, trabalho na propaganda, acho que seria: Não tenta ser um publicitário. E quando digo isso, não é aquela história de desiste que ainda é tempo, tu vai sofrer, o trabalho é pesado. Não, é o seguinte: não te molda pra ser publicitário. Não esquece de quem tu era antes da faculdade. Antes do emprego. E falo isso por causa da observação. Alguns dos caras com quem eu convivi que mais admiro profissionalmente – e quem eu acho que tem de fato bons conselhos pra dar –, esses sujeitos não têm cara, não têm jeito, não têm roupa de publicitário. Parecem ETs numa festa de premiação. Tiozões no final de semana. Não falam branding nem nenhum outro ding, quando um “Cara, o negócio é o seguinte” pode funcionar bem melhor. Preferem ver o Faustão ou o futebol, em vez do rolo de Cannes. Esse tipo de cara, que não se encaixa no estereótipo, que por natureza não quer parecer com os publicitários, acaba tendo um trabalho que não se encaixa nos estereótipos, que não se parece com a publicidade. E por isso mesmo acaba fazendo a diferença.


Lugares legais para trabalhar. Lugares ruins para trabalhar. Toda empresa tem a cara do dono. E como cada dono pensa de um jeito, as personalidades das empresas também são muito diferentes. Não é difícil descobrir o estilo de cada agência. Umas trabalham mais, outras trabalham menos. Umas pagam melhor, outras pagam pior. Umas têm mais benefícios, outras têm menos. Umas fazem mais festas, outras menos. É importante lembrar, também, que não é só o dono que faz o perfil da empresa. Existem fatores externos e internos que influenciam. Como um novo Diretor de Criação ou uma mudança no cenário econômico. Veja essa crise que recém passou, por exemplo. Algumas empresas mais soltinhas puxaram o freio de mão. E vice-versa. No meu tempo de estagiário, a F/Nazca era a agência com as ideias mais ousadas. A DM9 era a agência mais sintonizada com o novo padrão internacional. A Almap tinha a direção de arte e os títulos mais inteligentes. Evidente que, de lá para cá, houve mudanças. Analise o que as agências estão fazendo, se informe com profissionais experientes. Vai ficar mais fácil para você entender a personalidade atual dessas agências.


Entretanto. Não existe empresa perfeita. E como a grama do vizinho é sempre mais verde, você costuma perceber apenas os defeitos do lugar onde você trabalha. E não valorizar o que ele tem de legal. Olhe a metade cheia do copo.


Por fim. Vem o mais importante: você quer trabalhar nesse lugar? Sim, porque se convidarem você, mas você não estiver a fim, ou achar que o lugar não contribui para o seu crescimento, não vá. Não conheço nenhum departamento de RH que obrigue as pessoas a trabalhar com uma arma apontada para cabeça.


Pasta para quem quer ser um Criativo. Mas não no departamento de Criação. Muita gente me procura porque quer trabalhar com criação, mas não da forma tradicional. Uns se identificam mais com a área de Planejamento. Outros querem ter boas ideias para cliente, dentro do marketing da empresa. Fico bem feliz em ver estudantes pensando assim. Acredito até que a filosofia da Perestroika (Você sempre pode ser criativo, em qualquer área, em qualquer profissão) tenha uma importante participação nesse processo. Não conheço nenhum modelo de portfólio para Planejamento ou Marketing. Eu, se estivesse concorrendo a uma vaga nessas áreas, pensaria em projetos criativos. Apenas para mostrar meu potencial. Vamos pegar Olympikus como exemplo. Se eu quisesse trabalhar no Planejamento da agência que atende essa conta, ou no próprio cliente, eu faria o seguinte. Criaria várias ações envolvendo a marca. Novos produtos, eventos, hotsites, sugestões de crossmedia, ideias baseadas em tendências que ainda não se popularizaram. E por aí vai. O game SuperVôleiBrasil foi uma saída genial do próprio Márcio Callage para divulgar os novos uniformes da seleção. Sucesso absoluto de público, crítica e acessos. Uma ideia que poderia muito bem ter


saído da cabeça do seu assistente de marketing. Ou do Planejamento. Ou até de uma pasta de um candidato a estágio. É claro que só boas ideias não bastam. Esses três departamentos exigem de você outras qualidades bem específicas e diferentes da Criação. Mas mostrar que você tem ambições além do Excel também não atrapalha.


Daniel Poletto,

Diretor de Arte da DPZ Sempre achei que a melhor maneira de incentivar alguém a FAZER algo é dizendo a ela o que NÃO FAZER. Sabendo o que é não, fica mais fácil. Todo o resto é sim. Não ache que as únicas coisas legais feitas em propaganda são as postadas essa semana no youtube. Conhecer um pouco da história da propaganda e também dos profissionais que estão ao seu lado é fundamental na construção de um critério criativo sólido. Não desligue sua antena do mundo. Leia Zero Hora, mas também o New York Tines e a Al Jazeera. Siga o Bogusky no Twitter, acompanhe os festivais de propaganda, e tire suas próprias conclusões sobre as coisas. Não pare de criar. Nem mesmo no banho. E não estou falando de propaganda só. Crie uma maneira nova de preparar miojo, uma ilustra de camiseta, uma letra de música. Criar tem que virar rotina, vício. Não monte uma pasta somente com anúncios. Pense em maneiras diferentes de comunicar: pode ser um game, pode ser um vídeo no youtube, pode ser uma ação de rua… e também um anúncio. Não se deixe iludir pela primeira grana razoavelmente boa que você ganhar. No início o que vale é acumular experiências, conhecimento e não dinheiro. Não fique numa agência que você não admire. Se você não admira a agência nem o seu diretor de criação, pule fora logo. “A vida é muito curta pra se viver ao lado de um filho da puta.” Pense onde e com


quem você gostaria de trabalhar. É lá que você vai estar daqui um tempo. Não saia mostrando a pasta nas férias em São Paulo dizendo que o mercado de propaganda do Sul é uma merda e que está pequeno demais para as suas ambições. Primeiro faça algo de relevante. Cuspir no prato que comeu não pega bem. Não faça coisas só porque os outros estão fazendo. Se você não estiver a fim de pegar uma mochila e sair pela Europa, não vá. O fato de viajar por si só não determina acúmulo de conhecimento. O criativo que se diferencia é o que consegue olhar para as coisas ao seu redor e reinterpretá-las do seu jeito. Seja em que parte do mundo estiver. Não siga à risca o que eu estou dizendo. Saiba que o o que vai fazer de você um cara de exceção não está em livro algum, mas dentro de você.


Pasta para quem quer trabalhar no lado mais business ou no operacional. Existem outras três áreas fundamentais dentro de uma agência, que também exigem criatividade, mas de uma forma diferente: o Atendimento, a Produção e a Mídia. São áreas em que o dia-a-dia exige respostas mais rápidas. Então, a rotina é comprometida muito pelo lado operacional. O currículo nessas áreas ainda pesa. Mas o que realmente pesa é a sua capacidade de convencer o entrevistador. E até faz sentido. Se você não for bom em se vender, como vai negociar com clientes, fornecedores e veículos? Acho que aqui, mais do que qualquer outro lugar, vale demonstrar vontade pela vaga. Não tenha medo de dizer: Eu sei pouco, mas quero aprender e não arrepio.


Pasta para quem quer trabalhar no lado mais business ou no operacional, e já é um pouquinho mais rodado. Se você está buscando vaga na Produção, pode montar tranquilamente um portfólio com seus melhores trabalhos. É legal, de alguma forma, explicar que interferência a Produção teve no processo de execução. Esse é o motivo pelo qual estão contratando você. Já na Mídia e no Atendimento, talvez você consiga reunir alguns cases onde sua participação foi fundamental. E quando eu digo fundamental, não é Eu fui lá e aprovei a campanha, ou Eu que fiz o plano de mídia. É: Eu percebi uma oportunidade de negócio entre o meu cliente e uma outra marca. Fizemos uma promoção conjunta e vendemos que nem água. Ou: Eu sugeri um novo formato de anúncio. Mas ele fez tanto sucesso que entrou na grade de formatos-padrão do jornal X.


Engula o choro. Se você quer elogios, não vá mostrar a pasta. Ninguém está lá para bajular você. As pessoas vão dizer o que pensam, goste você ou não. A verdade é que as chances de você ser duramente criticado são altíssimas. Lembre-se: você não é nem estagiário. É aspirante a estagiário. Nada mais normal do que você ter uma pasta com erros de principiante.


Cada cabeça, uma sentença. Mas nunca uma sentença de morte. Sinto que muitos estagiários vão para a entrevista esperando uma opinião definitiva. Um oito ou oitenta. Se ele gostar, é porque eu nasci para a coisa. Se ele não gostar, é sinal de que sou um fracassado. O cara que vê a sua pasta não é um Imperador Romano, que levanta ou baixa o polegar e decide a sua vida. Ele está ali apenas para julgar o trabalho que você quiser mostrar, e que reflete aquele momento específico da sua carreira. Só. Agora, se o entrevistador tiver um ataque de megalomania e resolver encerrar a sua carreira ali mesmo (dizendo algo como Troque de profissão, você não dá para coisa), agradeça a oportunidade educadamente. E depois delete a entrevista do seu banco de dados. Primeiro, porque ninguém tem poder para adivinhar o futuro. Segundo, porque quem faz isso é muito idiota. E você não tem por que ouvir conselhos de um idiota. Não são poucas as histórias folclóricas de profissionais de sucesso que ouviram esse tipo de conselho (Largue a propaganda!). E hoje são chefes dos idiotas.


Cuidado: tem entrevistador que só quer se livrar de você. A primeira coisa que eu sempre digo, mesmo antes de abrir a pasta, é: Eu vou ser brutalmente honesto. Quer continuar? Tome cuidado com quem vê a sua pasta. É muito mais fácil para o entrevistador passar os olhos rapidinho, dizer Legal, qualquer coisa eu mando um email e chegar cedo em casa, do que dizer A sua pasta está muito ruim, eu sugiro que você mude isso, isso, isso, isso, isso, isso, isso, isso por causa disso, disso, disso, disso, disso, disso, disso, disso. Quando se é mais crítico, a entrevista costuma durar no mínimo meia hora. E o cara vai se incomodar com a patroa, que vai jantar mais uma vez sozinha. Eu sempre prefiro o caminho mais difícil: ver a pasta de verdade. Ou faço assim ou nem marco. Comento peça a peça, entro nos detalhes e faço várias críticas. Todas, é claro, pensando em contribuir. E a janta eu aqueço no microondas.


Luis Giúdice,

Diretor de Criação da Globalcomm Tenho muita coisa pra dizer a você que está começando a carreira de publicitário. Mas vou dizer o mesmo que me foi dito quando comecei, quando coloquei os pés pela primeira vez numa agência de propaganda. Duas palavras que valem para qualquer atividade que uma pessoa queira se dedicar e servem perfeitamente para quem quer vencer como criativo na área da comunicação: HUMILDADE E PERSEVERANÇA. HUMILDADE para aprender com as outras pessoas, mais velhas, mais jovens, sejam elas da criação ou de outro departamento, não importa, não esqueça que você está apenas começando. PERSERVERANÇA porque a vida de um criador publicitário não é fácil, e provavelmente você vai se perguntar: está valendo a pena tanto esforço, tantas noites mal dormidas, tantos finais de semana passados dentro da agência? Aí vai pensar em desistir muitas e muitas vezes e querer partir pra outra. Graças às palavras de Ignacio Gonzalez, hoje sócio e diretor de criação da Euro RSCG Uruguay, sou publicitário há 29 anos e posso dizer que tive sucesso como criador.


Portfólio visto. No início da carreira, são pequenas as chances de qualquer entrevista se transformar em vaga. Aí, é natural ficar aquela impressão de que o esforço não valeu a pena. Mas valeu. Na pior das hipóteses, você vai ter ouvido várias dicas para melhorar a pasta. Vai ter feito contato com pessoas importantes. Vai ter aguçado o seu critério, entendendo o que os mais experientes julgam ser bom e ser ruim. E se for a sua primeira entrevista, vai ter o que eu considero o mais importante: um choque de realidade. No mundo profissional, não há lugar para paternalismos.


Tic-tac-tic-tac. O tempo passa e ninguém responde. Particularmente, eu acho legal se você mandar um email depois da entrevista sinalizando que está a fim da vaga. Outros podem achar meio malice. E não duvido que alguns considerem forçação da sua parte e o eliminem da disputa. Então, use o feeling para saber até onde dá para ir. O tempo da resposta é muito variável. Geralmente a contratação é rápida. Mas em alguns casos, o processo pode demorar semanas. Fique sempre atento para saber se a vaga já foi preenchida ou se você ainda está no páreo.


Na traaaave. Se no final das contas você não conseguir nada, não faz mal. Ouça com atenção tudo o que disseram e refaça a sua pasta. Uma nova entrevista só se justifica se você tiver mais da metade do portfólio remodelado.


Feitooooooo. Mais cedo ou mais tarde, você vai conseguir um estágio. Talvez, não seja a vaga dos seus sonhos. Mas não dá nada: o importante é que você mudou de status. Antes, você era candidato a estagiário. Agora, você já é um estagiário. E está apto a ler o capítulo cinco.


CapĂ­tulo 3

Dentro da agĂŞncia.


Round One: fight O primeiro dia de um estagiário costuma ser parecido. O pessoal faz um tour rápido e apresenta você para o resto da agência. Depois, os caras da TI dão um jeito no seu computador, para que você tenha email e aprenda a salvar na rede. A partir daí, você ganha um tapinha nas costas e um monte de pepinos para descascar.


Dois pontos Para se dar bem dentro de uma agência, você precisa ser competente em duas frentes: 1) A questão técnica, do trabalho propriamente dito. 2) As regras de convivência, a etiqueta profissional, o seu comportamento no dia-a-dia. Em geral, os profissionais orientam você no que diz respeito ao ponto um. Mas não dão praticamente nenhuma ajuda no ponto dois. Portanto, se você quer uma mãozinha, leia com atenção as próximas páginas. São dicas que aprendi quando ainda era estagiário. Fruto de muita observação, muito jogo de cintura e algumas cabeçadas na parede.


Malandro não é malandro. É mané. Estagiários são jovens. Aproveitam a vida como jovens. Saem, enchem a cara, dormem duas horas e chegam na agência transpirando Whisky com Redbull. Eu entendo perfeitamente isso. E acho justo. O Early 20s é a melhor época para fazer todas as coisas irresponsáveis que se espera de um gurizão. A única coisa que você não pode esquecer é que a sua pauta social não pode comprometer a sua pauta no trabalho. Administrar isso é problema seu. Só seu. Se você bebeu mais do que devia, se dormiu mais do que devia, não faça o que não deve. Não minta. O seu chefe já teve a sua idade. Já passou pela mesma situação. E sabe exatamente o que passa pela cabeça numa hora dessas. Invento uma desculpa e tento sair limpo? Ou falo a verdade e corro o risco de me queimar? Assuma o seu vacilo. Ouça o xixi com o rabo entre as pernas. Sente a bunda na cadeira. E trabalhe, trabalhe muito. Pior do que o estagiário que chega de ressaca é o estagiário não rende por causa da ressaca.


Leo Prestes,

Diretor de Criação da W3Haus Kid Vinil Kid Vinil, pra quem não sabe, é um dos maiores colecionadores de discos do Brasil. Tem mais de 20 mil vinis e CDs. Sabe a discografia do Pink Floyd ao contrário. Tem EPs raros dos Stones que você não encontra nem na casa do Keith Richards. Pouca gente sabe mais de rock que ele. Mesmo com todo esse conhecimento, sabe quais foram as maiores contribuições de Kid Vinil para a música? Os hits “Sou Boy”(1983), “Tic Tic Nervoso”(1984) e “Glub Glub no Clube”(1985). Não quero dizer com isso que conhecimento faz mal, nem que você não tenha que buscar saber mais. Quero dizer que isso não garante que você vai ser um grande criativo. Durante anos eu ouvi na faculdade e em palestras o clichê de que “o publicitário tem que ver tudo, saber de tudo”. No início, eu fiquei angustiado com isso, tentando digerir toda a informação existente e, claro, esquecendo a maioria. E só deixei isso de lado quando comecei a trabalhar. Foi aí que eu descobri que poderia render tanto ou


mais que os caras que sabiam todos os anuários e Archives de cor, por exemplo. Porque o que realmente interessa não é o volume de informação que você armazena, e sim as conexões que consegue fazer com o que tem. E só o autoconhecimento faz você entender que coisas geram essas conexões na sua cabeça. Que leitura faz você rir sozinho, que filme faz você pensar no banho. Quer exemplos? Quando eu descobri que a TV ruim me inspirava mais do que as séries de TV que todo mundo me indicava, fiz uma premiada campanha de comerciais inspirada no horroroso programa “Most Amazing Videos”. Quando descobri que tiras de quadrinhos me atraíam muito mais do que HQs longas, comecei a desenhar as minhas. E aí montei um fanzine com amigos, entre eles o Felipe Anghinoni. E desse fanzine nasceu o embrião do que hoje é o nosso grupo de comédia, a Balalaika. Focar para não entrar em pânico. Focar para deixar algum espaço livre na cabeça para suas próprias idéias. Focar para consumir a informação que você gosta, não a que todo mundo quer que você goste. Esse é o único conselho que eu me atrevo a dar.


Cuidado com o efeito soneca do celular. Brasileiro nunca respeita horário. Você marca 9h30, o cara chega 9h45. Você marca 9h45, o cara chega às 10h. Você marca às 10h, o cara liga 10h15 para dizer que está chegando. Eu acredito que estagiário tem que chegar na hora. Se a agência começa a funcionar 9h, acho que todo estagiário deveria estar lá, às 9h, de prontidão. Por um simples motivo: estagiário é o soldado preparado para resolver qualquer problema. E problema não tem hora para aparecer. Como dizia o Ron Seichrist, Reitor da Miami Ad School: If you’re on time, you’re already late.


Dress code Dentro dos ambientes criativos, é comum ver muita gente com o estilo moderninho. O primeiro conselho que eu dou a você é: não se intimide. Se você é emo, mauricinho ou surfista, não precisa trocar todo o guarda-roupa só para fazer parte da turma. Agora, não dá para patifar também. Não dá para chegar de Havaianas, calção do Inter e camiseta de regata furada. Para não errar, é só fazer o óbvio. Os homens devem usar o clássico jeans com tênis e uma camiseta arrumadinha. Já as meninas só devem evitar as roupas minúsculas. Apesar de fazer sucesso nos corredores, os trajes micro viram assunto também na reunião de diretoria.


Missão dada é missão cumprida. Não tem nada mais chato que o estagiário que não resolve problemas. Aquele cara que conjuga todos os verbos no gerúndio. Já montou as peças que eu pedi há duas horas? Estou só resolvendo uma coisa aqui e já vou pegar. Você corrigiu aquele título que pediram para trocar? Estou só vendo uma coisa e já faço. Se derem uma tarefa para você fazer, ou você diz alguma coisa na hora, ou a batata quente acabou de passar para a sua mão. É melhor não ficar cozinhando em banho-maria. Resolva rápido o que passarem, ou a chapa esquenta para o seu lado. Então, se você está cheio de trabalho, e não vai dar conta do recado, avise. Mas não avise quando o prazo estiver estourando. Lembre-se: estourando também está no gerúndio. Um estagiário é medido por produtividade: pela criatividade nos jobs, não pela criatividade nas desculpas.


Não deu tempo. Não deu tempo é uma frase que não existe. Ou melhor, existe, mas em outro tempo verbal: Gente, não vai dar tempo. De novo: se você se deu conta que o prazo está apertado demais, não deixe para avisar em cima da hora. Ou nada poderá ser feito. Assim que você receber o job, grite. Ou quem vai ouvir no final é você.


Jacques Fernandes, Diretor de Arte da Escala

A coisa mais difícil de explicar para alguém que está começando em criação é por que aquela idéia ou layout não é legal. E sabe por quê? Porque a propaganda é subjetiva. O que é bom para uma pessoa pode não ser para outra. Criação não é matemática, e sempre vai ter uma justificativa para derrubar uma ideia. Por isso, se eu tivesse que dar apenas uma dica para alguém que está começando, eu diria para ela aprender a ter critério. Antes de querer criar uma boa campanha, temos que saber o que estamos fazendo. Ter critério é saber avaliar de forma madura aquilo que estamos criando. É um exercício difícil, justamente porque não é lógico. É puro "feeling" e experiência. Ainda mais se estivermos falando sobre direção de arte, que é pura estética. Acho que um bom caminho para formar bons critérios é aprender com quem sabe mais que a gente. Observar e "sugar" tudo daqueles que admiramos e são mais experientes, questionando sempre para tentar entender por que isso é melhor que aquilo. Mas só isso não é o suficiente. "Sugar" tudo dos mais experientes é importante. Mas para formar nossos próprios critérios, temos que ir mais longe. Temos que absorver informações de outros lugares também. Consumir tudo o que, de uma maneira ou


outra, possa acrescentar coisas novas àquilo já aprendemos: arquitetura, design, arte, fotografia, cinema... Tudo o que nos ajude a formar nossos próprios critérios. Direção de arte não se ensina, se aprende. É puro bom gosto. Então, se você quer ser um bom criativo, forme bons critérios na sua cabeça. Eles irão te acompanhar por toda sua carreira. E se não forem bons desde o início, é possível que você faça coisas ruins pensando que são boas.


Inteligência emocional. Os EUA não ganharam a Segunda Guerra sozinhos. Formaram um bloco com os chamados Países Aliados e, aí sim: destruíram com Hitler e companhia. Pense comigo: se até a maior superpotência do planeta precisa de ajuda, não vai ser você que vai resolver tudo sozinho, né? O dia-a-dia de uma agência é uma guerra. Vem bomba daqui, rajada dali, granada pelo alto. Se você não tiver amigos, morre antes mesmo de desembarcar na Normandia. Então, já de cara, exercite a fina arte da diplomacia. Depois, com o tempo, evolua e comece a formar o seu grupo de parceiros estratégicos. E aí vá expandindo seus territórios. Igualzinho ao War. Na hora que você precisar – e, acredite, um dia você vai precisar –, é para essas pessoas que você vai ter que pedir água.


Aprofundando o assunto: Conta Corrente Subjetiva Sabe quando dizem: Depois dessa, fico te devendo uma? Essa Uma é a Conta Corrente Subjetiva. No momento em que você quebra um galho para alguém, você ganha pontos. Quando você pede auxílio, é justamente o contrário: entra no vermelho. Quanto maior o favor, maior o valor. A grande maneira de ser respeitado dentro do ambiente de trabalho é estar sempre no positivo. Com todo mundo. Assim, ninguém pode falar nada de você. E quando você precisar de uma mão, não vão poder recusar. Então, siga o conselho dos religiosos: dê sem esperar nada em troca. Ou, se preferir, siga a filosofia de Dom Corleone, o personagem célebre de O Poderoso Chefão, que dizia para quem vinha lhe pedir favores. Eu não quero o seu dinheiro. Quero a sua amizade. Capisce?


Pergunte. Insista uma vez. E era isso. Você está autorizado a perguntar. Inclusive, o Por quê? costuma ser o melhor amigo das pessoas inteligentes. Mas se você é realmente inteligente, vai saber a hora em que a curiosidade vira pentelhação. Em que a contestação vira desrespeito à hierarquia. E aí, mesmo não concordando com a justificativa que deram a você, o jeito é sentar na frente do computador e fazer mais.


Orkut, Facebook, MSN, Twitter, Youtube e e-mail. Não fique com a fama de vagal. Em todas as agências, sempre tem um estagiário que fica com o estigma do cara que passa o dia na internet. Não seja esse cara. Ou sua vida dentro da empresa vai durar menos que 140 caracteres. Minha sugestão é que você aproveite os horários extra-pauta (antes das 9h, depois das 19h e o intervalo para o almoço) para fazer o seu tour virtual. Imagine a seguinte situação. O seu chefe está estressado, precisando que você termine um layout até as 16h. Faltando duas horas para a apresentação, ele passa pelo seu monitor e vê, abertas no seu e-mail, as últimas fotos da Paris Hilton. Chega no final do trabalho, a montagem não fica como ele esperava. Vai sobrar para você. E para a Paris Hilton também. Sempre que você estiver mandando fotinhos da Paris Hilton, ou deixando um scrap no Orkut do Alemão, ou visitando o Twitter do Mano Menezes, você está correndo o risco de que alguém chegue e pergunte: E aí, já limpou a pauta? Lembre-se: você não é o que você é. Você é o que os outros acham que você é. OBS: se o seu monitor estiver estrategicamente virado para a entrada da Criação, onde todo mundo


passa e vĂŞ o que estĂĄ na tela (esses monitores sempre caem para os estagiĂĄrios), o cuidado deve ser redobrado.


Ei, eu posso estar no Youtube vendo referências para um trabalho. Eu posso estar no Orkut pesquisando um grupo de consumidores. Claro, cada caso é um caso. Inclusive, racionalmente, todo mundo entende que essas coisas (o Mano Menezes, a Paris Hilton e o Alemão) são referências da vida e que fazem de você um criador melhor. Ao mesmo tempo, o seu chefe tem uma pauta represada, esperando que você diga Acabei! para passar o próximo job. E outra: não pense que o seu chefe não nota. Ele sabe exatamente a diferença entre um trabalho sério e alguém que está matando. Até porque, ele também tem um chefe, e também dá uma matadinha de vez em quando.


Estágio de seis horas. Há pouco tempo, entrou em vigor uma lei que determina que os estagiários não trabalhem mais que seis horas. Acho, sinceramente, a típica lei onde todo mundo sai perdendo. Principalmente o estagiário. Você está lá, cercado de um monte de gente melhor do que você. Profissionais que estão dando dicas, conselhos e oportunidades para você mostrar o seu trabalho. Cada hora, cada minuto, cada segundo num ambiente assim é valioso. Por que ficar apenas seis horas? Onde você aprende mais: dentro de uma agência ou em casa, coçando o saco? Se você for contratado para trabalhar seis horas, já se coloque à disposição para trabalhar mais, bem mais. No final das contas, é bom para você.


Bem mais é beeeeeeem mais. Quando você decide trabalhar com publicidade, tenha em mente o seguinte: a sua jornada de trabalho vai longe. Muitas vezes, entra final de semana e só termina quando o Tadeu Schimidt está mostrando os gols do Fantástico. Não fui eu que inventei isso. É a forma como o mercado da propaganda se organizou (ou se desorganizou). Essa é a regra do jogo. Se você não concorda, beleza. Não precisa entrar em campo. Mas se entrar em campo, não pode reclamar de carrinho no tornozelo. Moral da história: não seja um desses estagiários chatos que reclama dos horários malucos. Isso é um absurdo, é desumano. Não está satisfeito? Peça demissão. Ou você acha que uma empresa inteira vai se adequar ao seus horários? Conheço um monte de agência pequena que termina o expediente diariamente às 18h30. Mas só faz trabalhos de menor visibilidade. É o que você quer? Então vá lá. Aí, você pode dizer que tem gente que ganha bem, só faz trabalhos grandiosos e trabalha pouco. Claro, esses empregos existem, sim. Mas são pouquíssimos. E disputados pelo melhores dos melhores. Você, que recém começou, ainda está muito longe dessa cadeira.


Márcio Blank, Redator da Paim.

Leia sempre os asteriscos. Até onde não tem.* *Asterisco é um aviso. Um alerta. Um adendo. Um “ó, tem mais coisa além do que eu disse”. Foto meramente ilustrativa. Promoção válida enquanto durar o estoque. Crédito sujeito a aprovação. Existe asterisco em tudo. Até onde não vemos. Nas pessoas, nas situações, nos lugares. Amigo meramente interesseiro. Namoro válido até o carnaval. Qualidade de vida não incluída nesta cidade. A nossa profissão também é cheia de asteriscos além daqueles dos anúncios, comerciais e contratos. Abaixo, seguem os que mais tive que ler no início da carreira e que continuo lendo até hoje. *Não, não, não e não desista com os inúmeros NÃOs que você vai receber. *Talento se desenvolve. Não pare na primeira ideia. Quantidade traz qualidade. Não tenha preguiça mental. *Mude. Se você for sempre igual, vai criar tudo sempre igual. *Não crie coisas redundantes e sim, convergentes. Valorize ideias que gerem conteúdos que se desenvolvam em múltiplas mídias, aproveitando o que cada uma tem de melhor. *Seja criativo também fora do trabalho. *As pessoas são uma mina de “aspas”. Converse muito. Fale. Escute.


*Abasteça sua vida com cultura, com viagens, com experiências, com vida. *Não se acomode. Vá além do que você espera de você mesmo. Pra surpreender os outros, você primeiro tem que se surpreender. *Mais do que um profissional bom, seja um ser humano bom. Seja amigo, seja legal. Respeite as idades, as hierarquias, os horários, as pessoas. *Na maioria das vezes, o que você vai ter que ler não vai estar escrito; o que você vai ter que ouvir não vai ser falado; o que você vai ter que ver não vai estar visível. Veja além. Seja curioso. Procure sempre os asteriscos. **Asteriscos sujeitos a alterações.


Dica de sobrevivência na selva: não coloque tudo a perder nas baladas da empresa Existem agências e agências. Mas todas elas fazem algum tipo de comemoração. Ou quando conquistam uma conta nova, ou quando ganham um grande prêmio, ou – na pior das hipóteses – a festa de final de ano. De novo: existem agências e agências. Em algumas, ninguém se importa se você tomar um porre, vomitar no meio da pista e chegar junto na mulher do VP. Em outras, todo mundo vai ficar de olho quando você pedir o segundo whisky. Já pensou? Você demora anos para construir uma reputação e duas tequilas colocam tudo a perder? Em geral, chega uma hora na festa em que o álcool pega. Quem não quer incomodação, vai embora. Quem está para a maldade fica. A partir daí, está liberado.


Antes de chegar nos finalmente: três coisas que todo mundo acha que tem. Propaganda é um meio extremamente subjetivo. Isso dá margem para muita discussão e opiniões controversas. No início da carreira, é legal fugir do fogo cruzado. Então, já ligue o seu radar para os três pontos a seguir:

1) Bom senso

Você já ouviu alguém dizer: Eu não tenho bom senso? Eu nunca vi. Mas já vi muita reunião discutindo se fulano teve bom senso ou não. Quando isso acontecia, era um saco. Nunca se chegava a uma conclusão.

2) Critério

Certa vez, uma menina, que estava quase se formando, foi pedir estágio. Quando perguntaram se ela queria Redação ou Direção de Arte, a garota disse: Direção de Criação. Eu não sou muito boa fazendo propaganda, mas sou ótima avaliando peças. Essa história é real e ajuda a reforçar um ponto de vista que tenho: qualquer um se acha um bom avaliador de propaganda.


Pense comigo: cada pessoa tem um critério diferente. E como não existe uma Lei Universal, que determine o que é certo e o que é errado na publicidade, toda a pessoa tem a sensação de que o seu critério é melhor que o dos outros. Por isso que, se você não cuidar, sua peça vai receber pitaco de todo mundo. Até da tia do café.

3) Caráter

Você tem um amigo que é apaixonado por uma mulher gostosíssima. Mas ela não quer nada com o cara, e sim com você. Dar em cima da gatinha é sacanagem? Uns vão dizer que sim, outros vão dizer que não. Depende do grau de amizade, da gostosa, e principalmente: dos conceitos que vocês têm sobre o assunto. Eu já vi muito filho da puta fazer filhadaputice. E na maioria das vezes, eles não se achavam filhos da puta por isso. Sempre tinham uma justificativa – que para mim não fazia sentido, mas para os caras era mais do que suficiente. De novo: é tudo uma questão de bom senso e critério. Por isso, sempre que você fizer alguma coisa, e o pessoal olhar torto, avalie a situação. De repente, na sua cabeça, está tudo bem. Mas os outros podem estar tirando você para mau caráter.


Vinícius Malinoski,

Diretor de Criação da CuboCC. Descubra seu superpoder, aprenda a controlá-lo e use-o para o bem. Toda pessoa tem uma habilidade especial. E pode ser algo tão simples quanto simpatia, organização, memória ou bom humor. Ou não é incrível conseguir convencer alguém que não concorda com você de que ele está errado e ainda fazer ele lhe agradecer pelo toque? Pra isso, você precisa muito mais do que bons argumentos. Precisa de um caminhão de simpatia. Sorrir costuma ser bem mais difícil do que dar um soco. Pergunte para o Super-homem.


E finalmente: aproveite. O estágio teria tudo para ser uma etapa de merda na sua carreira. Você trabalha um monte. Pega só craqueira. E sempre que alguma coisa dá errado, sobra para você. Mas o estágio é uma das épocas mais legais da vida profissional. E a última dica desse capítulo é justamente essa: aproveite. Curta. Tem um lado muito legal de ser estagiário.


P.S.: Apesar de ser uma fase legal, eu não vou enrolar você. Uma hora, a coisa perde o encanto. E aí, quando o leite começa a azedar, é hora de pular para o capítulo quatro.


CapĂ­tulo 4

Trocando de emprego.


Antes de qualquer coisa: planeje a sua carreira. É fácil planejar o seu dia. Hoje eu vou acordar, trabalhar durante a manhã, ao meio-dia vou na academia, volto para agência, depois vou para a aula e quando voltar, durmo na minha namorada. Também não é difícil planejar o seu mês. Até o dia 15 eu vou economizar, no terceiro final de semana eu vou para a praia, perto do dia 30 eu faço uma puta balada com a grana que sobrar. Agora, você consegue planejar os próximos seis meses? Os próximos dois anos? Os próximos cinco anos? Infelizmente, é um mal necessário. Porque você só vai saber se uma decisão na sua carreira é certa ou errada se souber qual é o final da história. E saiba que todo plano foi feito para ser mudado. O plano é um guia, não um cão-guia. Você não precisa seguir cegamente.


Mudar é importante para a sua formação. Se você trabalhar durante anos em apenas uma agência, com um mesmo time de criadores, você vai aprender tudo o que eles têm de bom. Mas também vai aprender tudo o que eles têm de ruim. Ou você acha que os grandes profissionais não têm defeitos? Têm sim. E depois de consagrados, aí sim é que eles não mudam mais. O complicado de trabalhar num lugar só é que você fica com uma visão viciada e limitada. Dois defeitos que um criador não pode ter. E, não por acaso, a melhor época para trocar de agência é quando você é estagiário. Os compromissos são menores. As consequências são menores. Até o interesse em segurar você vai ser menor.


Para saber se é hora de mudar, preste atenção nessas duas coisas. 1) A pasta estagnada. Não é regra, mas um bom indicativo para saber se o seu atual emprego está legal é analisar a sua pasta. Se faz horas que você não coloca nenhuma peça nova no portfólio, das duas, uma: Ou você só está pegando trabalhos que não estão contribuindo para o seu crescimento. Craqueiras que não ensinam nada. E que também não dão oportunidade de você mostrar o seu potencial; Ou você está desmotivado e não está rendendo o melhor que pode. O que também é um sinal de que talvez seja a hora de sair.

2) O copo encheu. Existem também aqueles momentos em que você simplesmente enche o saco. Por mais que esteja crescendo, por mais que a sua pasta ganhe uma peça nova por semana. Via de regra, todo emprego tem um prazo de validade. Os criadores são pessoas que gostam de mudança, do novo. A rotina, para esse tipo de gente, é um vilão ainda mais malvado.


Mudar é importante para a sua formação. E sua formação é importante para toda a sua carreira. Um jogador de futebol, enquanto está nas categorias de base, recebe constante orientação. Tem sempre alguém por perto ensinando os fundamentos básicos, como o cabeceio, o passe e o chute. Tolerando os erros e indicando os atalhos do campo. O período de formação é muito importante e não pode ser atropelado. Quando o jogador sobe para os profissionais, ele precisa estar pronto. Porque nos profissionais, ninguém vai pegar o jogador pela mão e dizer Não, filho, é assim que se chuta. Se você não der resultado, vai para o banco. Ou pode até ser dispensado. Craques como o Ronaldinho Gaúcho ou o Alexandre Pato poderiam subir para os profissionais antes do tempo. Eles eram tão bons que, já com 15 anos, teriam condições de disputar de igual para igual com os profissionais. O problema é que esse período é precioso na formação. E se for tirado do jogador, nunca mais será recuperado. O mesmo acontece com o estagiário de publicidade. Porque depois que você é contratado, a exigência


muda. Antes você tinha alguém para orientá-lo, agora você vai ter alguém para cobrá-lo. Se você não aprender o que precisa aprender na hora certa, não aprende mais. Então, por favor: não atalhe a sua formação. Não se deixe seduzir por uma proposta de contratação antes que você esteja pronto. Essa é a maior burrice que você pode fazer com a sua carreira. Conheço vários caras que queriam o cargo de Redator ou de Diretor de Arte. Queriam deixar o posto de estagiário a qualquer custo. Queriam subir para os profissionais antes da hora. Mas ainda não sabiam chutar nem cabecear. Resultado? Hoje estão jogando no Bragantino.


Você não precisa crescer rápido. Precisa crescer sempre. Um redator demora no mínimo três anos para se formar. Dois como estagiário e mais um como Redator Júnior (que é um estagiário com grife). Isso quer dizer que, se você conseguir um estágio no primeiro semestre da faculdade, e fizer tudo certo, só vai conseguir um contrato pouco antes de se formar. No início, você vai fazer bons títulos, boas ideias visuais e bons textos. Esse é o mínimo que se exige de alguém que queira trabalhar com Redação. Depois, você tem que ser capaz de criar campanhas. Conceitos fortes que se desdobrem em várias mídias. Em seguida, você tem que criar boas peças de rádio e, talvez, comerciais baratos de TV. Tem que saber brifar um produtora. Mais: você tem que conseguir analisar a produção e dizer se ela está boa ou não. Você tem que detectar os problemas e pedir alterações, até que ela fique boa. Achou muito? Pois um diretor de arte demora o dobro. Se você for assistente de alguém bom, você precisa de no mínimo dois anos de estágio. Se for você um cara mais ou menos, o ideal é ficar três anos.


Isso para aprender só o básico, como diagramação, combinação de cor, escolha de fonte e montagens fotográficas. Depois do estágio, você precisa de mais dois anos como Diretor de Arte Júnior. Só então você vai aprender os processos mais complexos, como produção de foto e ilustração. O que já dá uma dica.


Se for preciso, pedale a faculdade. Fique esperto com a relação Estágio vs. Formatura. Se você não estiver com perspectivas de contratação, não adianta se formar. Muitas vezes, vale a pena prorrogar alguns semestres para não sair da faculdade com uma mão na frente e outra atrás. Alguns pais incomodam, porque querem que os filhos se formem nos quatro anos. Mas o mais importante é o seu bem. Então, se for necessário, e se for possível fazer esse esforço financeiro (todo novo semestre existem taxas de matrícula), converse com eles e tome a decisão que for melhor para a sua carreira. Se ajudar, mostre esse capítulo para os seus pais e diga que a culpa é minha.


Rodrigo Pinto, Redator da Africa.

Não tenha medo do job. À princípio, todo o pedido de trabalho parece ser impossível de resolver de forma criativa. Policies, limitação de formato, número de cores, produto que você não acredita, cliente de varejo, verba curta, prazo apertado. A coisa é tão séria, que até os erros de digitação do Atendimento servem de desculpa para você achar que, no máximo dos máximos, vai resolver a peça dignamente. Normal. Isso é só porque você ainda não teve uma idéia bacana. A melhor coisa a fazer nessa hora é descontrair. Tome um café, acesse o site do seu time, mande um tweet (pode ser até reclamando desse pedido de trabalho que está na sua mesa), toque a playlist das suas músicas preferidas e faça logo a idéia digna. Pronto. Agora que o job está resolvido, que tal se divertir fazendo a idéia boa? Só nesse capítulo tem mais vários caras muito bons que vão ensinar você como.


Voltando ao ponto principal deste capítulo: Você chegou à conclusão que é hora de trocar de agência. Então, prepare-se para o seu tour. Agende entrevistas nos principais lugares. Se você é estagiário, provavelmente ninguém conhece você e o seu trabalho. É hora de se apresentar para o mercado. Faça isso de forma discreta. É chato quando descobrem que você está mostrando pasta por aí. Até porque, quando a entrevista é durante o expediente, você vai ter que inventar uma desculpa (Vou ao médico). E toda vez que você sai, deixa a pauta pendurada para outro resolver. Lembre-se também que a chance de rolar alguma coisa imediatamente é baixa. Então, assim que você sentir que é hora de mudar, faça o tour o quanto antes.


Você pode contratar o seu novo chefe. Pintou uma oportunidade em outra agência. Será que vale a pena? A melhor maneira de saber quem é quem no mercado são os Anuários da ARP. Lá está a ficha corrida de todo mundo. Inclusive daquele cara que chamou você para uma entrevista. Não esqueça: antes de saber se ele quer contratar você, você deve saber se quer ser contratado por ele. Isso vai determinar o tom da entrevista, as suas respostas e a sua postura.


Abrindo parênteses: o que é um Anuário da ARP. A maioria dos festivais de propaganda geram, ao final do evento, um livro. Esse documento reúne imagens das peças vencedoras e suas respectivas fichas técnicas. Assim, você sabem quem fez o que. Em outras palavras: é um registro do que de melhor foi feito naquele ano. O principal festival do mercado gaúcho é a Semana da Comunicação/Salão da Propaganda, que premia trabalhos de Promoção, Merchandising, Design, Internet e de Publicidade. Se você ligar para a ARP (Associação Riograndense de Propaganda), é bem possível que consiga os anuários antigos com um precinho camarada. O telefone é (51) 3233.3354. Por sinal, já fica a dica de outros Anuários de fora do RS. São, no mínimo, excelentes fontes de estudo. O CCSP (Clube de Criação de São Paulo) é o mais famoso do Brasil, com trabalhos das principais agências do país. Visite www.ccsp.com.br e encomende o seu. Existem também os Anuários gringos, como o AD&D, o Art Directors, o The One Show e a Archive (que é uma publicação bimestral, mas tem o status de Anuário). Uma boa forma de conseguir é


através do Romeu, da Open Books. O telefone é (48) 3062-7763. Outra maneira é encomendar pela Amazon. Demora mais e é chatinho de achar. Mas sai mais em conta e compromete menos o seu salário. Especialmente se o seu salário ainda é uma bolsa-estágio.


A partir daí, vão surgir coisas. E você começa a viver os seus primeiros dilemas profissionais.


CapĂ­tulo 5

Primeiros dilemas profissionais.


Quando chamam você para uma entrevista. Durante a entrevista, você tem que saber o seu objetivo. Você quer trabalhar com essa pessoa? Você quer trabalhar nessa agência? Você quer trabalhar com essas contas? Essas são algumas perguntas básicas que você tem que considerar antes da conversa, e não durante a conversa. Porque aí, você será capaz de tirar as informações que você precisa para tomar a sua decisão. Acho esse um erro bem comum cometido pelos estagiários. Eles dizem: Vou lá só ouvir. E levam isso ao pé da letra. Vão lá só para ouvir mesmo. Em vez de aproveitarem a oportunidade para perguntar. Já dizia Guillaume D’Orange: Não há vento favorável para quem não sabe onde vai. Só depois de pensar bastante sobre os pontos positivos e negativos de trocar de emprego você vai estar preparado para a entrevista.


Primeira parte da entrevista: você vai ouvir exatamente o que quer. Por isso, ouça com atenção. Primeiro ouça. Se o entrevistador for um cara esperto, ele vai dizer exatamente o que você quer ouvir. Lave bem os ouvidos. Mas sempre deixe uma pulga atrás da orelha. Tenha em mente que o entrevistador não mente. Mas sempre conta uma versão conveniente da verdade. Conveniente para ele, não para você. A pessoa que estiver entrevistando você vai falar só maravilhas. Como a agência é interessante, das oportunidades que você vai ter, as pessoas legais que vai conhecer. Sempre com aquele leve exagero, natural das tentativas de persuasão. Da mesma forma, sempre vai usar eufemismos para as coisas ruins. Em vez de dizer que o seu dupla é vagabundo, por exemplo, ele vai dizer que o seu dupla é um cara mais low profile. Fique atento a esses detalhezinhos.


Use o feitiço contra o feiticeiro. A primeira coisa importante é não se expor. Não entre em terrenos perigosos. Evite polêmicas. Evite opiniões muito fortes. Dê respostas convenientes. Eles não estão procurando um Prêmio Nobel. Estão procurando um estagiário. Evite falar dos seus defeitos. Se por acaso você tiver que abrir o jogo, use eufemismos também. E sempre que houver oportunidade, valorize os seus pontos fortes. Mas de forma natural.


Mauro Dorfmann,

Presidente da Dez Propaganda Minha tarefa é dar UM conselho útil para um jovem criativo. Vamos lá. Talvez não seja muito excitante, mas vai ser útil. Vou me valer de uma metáfora. Comparemos a atividade criativa com uma outra bem menos arriscada: a caça. Se você está lendo este texto, deve achar que tem algum tipo de energia criativa e quer transformá-la numa forma de ganhar dinheiro e ser feliz. É importante determinar que tipo de criativo você será. E é aí que entra a minha metáfora. Imagine que você é um caçador que entra na floresta para procurar ideias. Se você não sabe o que está procurando e só está interessado em encontrar a maior, mais desafiadora, mais selvagem das ideias e não importa o que vai acontecer com ela depois que você dominá-la, talvez você seja um artista. Se você descobre que é bom em caçar um tipo de ideia, que seu instinto de explorador te faz buscar sempre o mesmo bicho e voltar para casa cada vez com uma presa maior e mais espetacular, talvez você tenha nascido para a indústria do entretenimento. Mas se você precisa entrar na selva para caçar comida para seus filhotes, você sabe o que está procurando. Só interessa um tipo de presa: aquela que suas crias vão querer comer. E que vai deixá-las satisfeitas. Sacou? Os filhotes aqui representam o público. O cara que está do outro lado da mensagem. O consumidor. Para ser o tipo de caçador que é o criativo


publicitário, você precisa amar o público. Se interessar por ele profundamente. E conhecê-lo como se conhece um filho. O principal objetivo de nossa atividade criativa não é nos deixar orgulhosos, nem impressionar nossos colegas. Ela serve para comunicar alguma coisa ou ideia para alguém. Ame esse alguém. Esse é o meu conselho.


Faça o tema de casa. Entre no site da agência. Veja os trabalhos que foram feitos. Entenda a filosofia da empresa. Tente identificar a visão de propaganda que essa pessoa tem. E fale exatamente o que ele quer ouvir. Se você fizer isso, e fizer bem feito, estará ali, ali para chegar lá.


Bom humor é mais do que bom. Pessoas contratam pessoas. Se você é um cara legal e interessante, aja naturalmente. Se você não é, tente ser. Pelo menos durante a entrevista. Bom humor é uma coisa que pega muito bem na entrevista. Rir na medida certa e fazer rir na medida certa é uma grande dica. Às vezes, para descontrair o clima, o entrevistador faz uma ou outra piadinha. Não veja isso como um sinal verde para você lançar o seu arsenal de tiradas geniais. Vá com calma. Conheço um estagiário que passou por todas as etapas da triagem de uma grande agência. Então, foi falar com o Diretor de Criação, que começou a entrevista com uma piada de gaúcho. O estagiário devolveu, fazendo uma piada de catarinense. Ele só esqueceu de um detalhe: o Diretor de Criação era de Santa Catarina.


Gustavo Spanholi, Redator da Escala

Esqueça o portfolio. Pelo menos aquela pasta preta que todo mundo conhece. Hoje existem views, pageviews e followers para dizer se o que você criou funciona ou não. Abuse disso. Invente qualquer vídeo doente para bombar no YouTube. Crie um blog que seja relevante para as pessoas. Faça um twitter fake para se arriar em alguém ou em alguma coisa. Combine tudo isso para, sei lá, divulgar sua festa de aniversário. Só aí você já vai estar treinando sua estética, seu texto, seu timing. O importante é fazer todo mundo comentar o que você criou. E colecionar esses pequenos feitos. Aí você junta todos e manda os links para os criativos que você admira. Mas...numa boa: se você já tiver conseguido UM só feito desses, fique tranqüilo. Alguém legal de um lugar muito bacana já vai ter te chamado.


Segunda parte da entrevista: as perguntas certas são mais importantes que as respostas certas. A partir daí, vão aparecer oportunidades para você questionar. Pergunte, dentro do limite do bom senso, tudo o que você deseja saber. Fique atento aos sinais corporais. Se você perguntar alguma coisa, e o entrevistador cruzar os braços, ou se encostar para trás, é sinal de uma postura defensiva. Você deve ter tocado num ponto delicado. Também atente para os atos falhos. Por mais experiente que seja o entrevistador, ele pode muito bem cometer um deslize. E nunca esqueça desses dois pontos.


Ponto um: você sempre está satisfeito com o seu atual emprego. Mesmo que você não esteja. Quando perguntarem se você está feliz, não titubeie. Diga que você está feliz, sim. É uma questão de sobrevivência. 1) Detonar o seu atual emprego soa, no mínimo, arrogante. Já pensou se ele é amigo do seu chefe? É queimação na hora. O mercado é muito pequeno e todo mundo se conhece. 2) Se você demonstrar desinteresse pelo atual emprego, talvez passe uma certa desmotivação. E tudo o que ele não quer é um estagiário sem energia. 3) E o mais importante: abrindo totalmente o jogo (Aceito qualquer proposta!), você parece meio desesperado e se desvaloriza. Então, lembre-se: você está feliz no seu emprego, no matter what. Mas não assuste o entrevistado ao ponto dele pensar Pô, esse cara está tão feliz que eu nunca vou conseguir contratá-lo. É fundamental verbalizar uma possível troca de ares. Se você fizer muitas juras de amor ao seu atual emprego, talvez ele nem faça uma proposta.


É como no jogo de sedução. Você não pode sair dizendo logo de cara Vamos para um motel? Mas alguma dica você tem que dar. Então, quer uma carona? O melhor a dizer é algo assim: Feliz eu estou, mas também sempre penso em crescer. Um novo desafio pode ser bom a minha carreira. Por que não?


Mais um detalhe: Também tome cuidado ao afirmar que adora trabalhar com Fulano, que Fulano sabe muito, que Fulano é muito bom. Não supervalorize o seu atual chefe – ainda mais, se você estiver vindo de uma agência menor. Talvez ele não seja tão bom assim e você já demonstre uma falta de critério.


Ponto dois: você sempre deve demonstrar interesse. Mesmo se não tiver interesse nenhum. Vai chegar um momento da entrevista que vão perguntar: E aí, você está a fim? Você sempre deve demonstrar interesse. Mesmo que você já saiba que vá recusar a proposta. Por quê? Bom, analise bem a situação sob o ponto de vista do cara que quer contratar você: Alguém, que é mais experiente que você, está fazendo um convite. Dizer não, assim, na lata, pode soar ofensivo. Por mais convincentes que sejam os seus motivos. Ninguém gosta de ser renegado. Especialmente por um estagiário. Ora, quem esse moleque pensa que é para recusar minha oferta? Sou partidário de sempre acenar positivamente, mas sem se comprometer. Algo como: Olha, achei a proposta bem legal, bem interessante, mas eu preciso falar com o pessoal lá da agência para ver direitinho como ficam as coisas. Posso dar uma resposta definitiva até 19h?


É hora de ganhar tempo. É hora de ganhar o máximo que a situação permitir. Uma proposta na mão é a única e principal arma de um estagiário.


Cenários Com a proposta na mão, você tem vários cenários. Escolha o que melhor combina com o seu momento e tente sair no lucro. Agora, nada de ser malandrinho e nem de ficar se achando. Todo cuidado é pouco.


Cláudio Franco,

Diretor de Arte da Matriz. Vou dar esse conselho de graça, sim. Faça bom uso, passe adiante e não repita aquele ditado que menospreza um bom conselho. Ele pode ser usado por você que está começando e até por um "quarentão" como eu, que ainda tem muito que aprender. Me deram uma lauda pra passar essa sabedoria adiante. Então, vamos lá. Você é "young". Porque um quarentão dizendo "Você é jovem" já ia começar mal um texto. Os "youngs" de hoje sabem muito mais. Tenho uma filha de sete anos em casa. Não me vejo com sete anos fazendo o que ela faz, lendo o que ela lê, vendo o que ela vê. O avanço é muito grande e o mundo é cada vez mais precoce. Mas, por que falar em precocidade se o assunto é apenas um conselho pra quem está começando a ser um criativo? Simplesmente porque esses "youngs" estão começando mais cedo em tudo. Para alguns, isso não interfere na personalidade. Para outros, a cada entrevista de estágio, vejo essa precocidade aflorando muito rápido, sem maturidade. Você é ansioso, audacioso e acha que é bom no que faz. Ótimo. Isso já é um bom começo. Mas antes de mais nada, tente tratar a ansiedade, moderar a sua audácia e, por enquanto, achar que você é bom só pra você. Por enquanto. A autoestima é essencial, mas não pode virar o jogo contra você. Principalmente quando outras pessoas, que não seus pais, costumam dizer que você é bom no que faz.


Mas, voltemos à precocidade e ao novo mundo das informações instantâneas. Essa nova era criou uma falta de critério. Taí. Critério criativo é uma coisa que você também precisa aprender a dominar além da audácia, da ansiedade e da autoestima. Ufa! Conjuntinho difícil esse hein! Mas não se assuste que o tempo é sábio e chega uma hora que você tira de letra todos eles juntos. A lauda tá acabando e preciso concluir. Seja criativo. Não seja mais diretor de arte ou redator. Seja curioso, mas não seja chato. Surpreenda colocando na balança a sua humildade e a sua audácia. E pra terminar um conselho final. "O" conselho. Tente ficar perto das pessoas certas, na hora certa. Não construa apenas um nome. Construa um trabalho. E depois dê conselhos de graça por aí


Primeiro cenário: você não quer trocar de agência. Quer deixar tudo exatamente como está. Essa é a mais fácil de todas. Basta ligar, ou mandar um e-mail (dependendo do que ficar combinado): Conversei com o pessoal aqui e eles me prometeram algumas mudanças que vão ser bem legais para mim. Fiquei muito balançado, porque as duas propostas são ótimas. Mas dicidi ficar. Muito obrigado pelo convite, fiquei muito feliz pelo interesse. Espero ainda trabalhar com vocês um dia. Se existem realmente mudanças, se houve realmente uma conversa, isso é irrelevante. O importante é você demonstrar que realmente considerou a proposta. E que só não aceitou porque a situação que propuseram na sua atual agência foi realmente muito boa. O cara não pode pensar: Que estagiário FDP, se queimou comigo! Tem que pensar: Puxa, que pena. Quase deu. Fica para a próxima. Ah: não deixe de falar para o seu atual chefe que você recebeu a proposta. Ele precisa saber que você está sendo sondado.


Segundo cenário: Você não quer trocar de agência. Mas quer aproveitar a oportunidade para tentar alguma valorização. A resposta continua a mesma. O que muda é a conversa entre você e o seu chefe. Nesse caso, você tem que convocar o bate-papo o quanto antes. E colocar a situação, sempre com muita humildade: Recebi uma proposta para trabalhar na agência Tal. Eu gosto muito daqui, não quero sair, mas eles sinalizaram algumas coisas bem interessantes, oportunidades que eu não tenho hoje. Eu estou bem dividido. Então, queria saber se existe alguma possibilidade das coisas mudarem aqui na agência. Se existe a chance de eu receber um aumento ou ser contratado. Isso certamente me faria ficar. Eu quero muito continuar aqui, mas estou bem na dúvida. Assim, você mete uma pressão de leve, sem botar o seu chefe na parede. E não cria um clima ruim para depois dizer: É, realmente, pensei bem e decidi ficar. Seja porque foi contratado. Seja porque recebeu um aumento. Ou não.


Terceiro cenário: Você nem quer ouvir uma contra-proposta. Quer sair de qualquer jeito. Teoricamente, essa aqui também é barbada. É só comunicar a sua saída. Se ninguém oferecer resistência, está resolvido. O problema é que, às vezes, o pessoal da sua atual agência se ofende com a decisão. Ou discorda da sua posição. E fica enchendo o saco. Para evitar qualquer contrangimento, para se esquivar de qualquer tipo de contra-proposta supostamente irrecusável, o jeito é arranjar um argumento que o seu futuro empregador possa oferecer, e o seu atual não. Só assim você sai ileso. Entendeu? Você tem que dizer que, na nova agência, vai receber uma coisa que o seu atual chefe não pode oferecer. Certa vez, eu recebi uma oferta muito boa. Por outro lado, eu sabia que meu Diretor de Criação faria todo e qualquer esforço financeiro para me manter. Como eu queria ir de qualquer jeito, já comecei a conversa sem dar muita chance: As nossas principais contas são de Indústria e Varejo. Adoro atender esses clientes. Mas eu não serei um Redator completo se eu não aprender a criar para


Moda. Eu ainda não tive oportunidade de trabalhar nesse ramo. E lá, eu vou cuidar de uma das maiores contas de Moda do Brasil. Não tem dinheiro que pague essa experiência. Ele ficou mudo por alguns instantes, deu um sorriso meio amarelo e fez aquela cara de Bom, o que eu vou fazer? Depois emendou: Quando é o seu ultimo dia? O papo não durou nem cinco minutos.


Quarto cenário: você está inclinado a sair. Mas dependendo da contra-proposta, até pode mudar de ideia e ficar. Esse é uma mistura do segundo com o terceiro cenário. A diferença é que, aqui, a pressão é maior. Você já tem que chegar mais decidido. Mas sempre na humildade: Recebi uma proposta para trabalhar na agência Tal. Eu gosto muito daqui, não quero sair, mas eles sinalizaram algumas coisas bem interessantes, oportunidades que eu não tenho hoje. Então, botando a minha situação atual na balança, decidi ir. Ainda não respondi para os caras. Preferi falar primeiro com vocês, até para saber se existe alguma possibilidade de mudança na minha posição. Se existe, por exemplo, alguma chance de eu receber um aumento ou ser contratado. Isso poderia tranquilamente me fazer trocar de ideia. Quando perguntarem os motivos que fizeram você ir, arranje sempre argumentos que não possam ser oferecidos pela sua agência atual. Como no cenário três. Aí, é ver como as coisas se desenrolam.


Ricardo Baptista,

Diretor de Criação da Competence.

Uma recomendação para quem quer trabalhar com criação: não fique velho. Velhos tem certezas, velhos acham que sabem, velhos não querem mais aprender. E este é o maior veneno que um criativo pode dar a si mesmo. Quer ficar jovem sempre? Comece agora - e não pare nunca - de perguntar: por quê? Não se contente com a primeira resposta. Você já se deu conta que a maioria das leis que regram as nossas vidas foram criadas por gente que já morreu há muito tempo? Então: trabalhando com comunicação você vai se deparar com inúmeras verdades supremas que não resistem a dois porquês seguidos. Pergunte, questione, seja curioso. Depois, pegue o resultado disso e comece a se divertir - com aquela seriedade das crianças quando brincam. Esse é o traço comum aos bons caras de criação, de todas as idades, com quem tive a sorte de trabalhar. E com quem também não paro de aprender.


Quinto cenário: você está completamente indeciso. Antes de qualquer outra dica duvidosa, eu tenho uma dica infalível. Quando você está passando por um dilema (no caso, um dilema profissional), preste muita atenção e avalie muito bem os seus conselheiros. A coisa mais importante que eu aprendi fazendo terapia foi que, em geral, as pessoas dão opiniões completamente irresponsáveis. Normalmente, elas não conseguem se colocar na sua pele. Julgam a situação a partir do próprio ponto de vista, sem considerar o que você está sentido, os seus valores e os seus interesses. Cansei de ver vários profissionais experientes dando conselhos muito ruins. Cansei de ouvir vários conselhos muito ruins. Inclusive de amigos bem próximos. Pessoas inteligentes, mas com dificuldade de se colocar na minha posição. Então, aí vai um conselho: cuidado com os conselhos. Especialmente quando você estiver totalmente dividido. (Como você pode notar, esse tópico coloca em xeque todos os meus conselhos anteriores. Por isso eu não coloquei lá no início do livro. Agora é tarde.)


Quinto cenário: Você consultou as pessoas certas. Mas continua indeciso. Eu ainda não li o Blink: A Decisão Num Piscar de Olhos. Mas, assim como o Silvio Santos, recomendo. Na verdade, achei tão interessante o assunto do livro que tratei de procurar resenhas e críticas na Internet, além de me informar com pessoas que já leram. O livro fala, entre outras coisas, da importância da intuição. Ele explica que uma parte do nosso cérebro, chamada de inconsciente adaptável, é capaz de realizar associações em frações de segundo. Assim, ele chega a conclusões antes que a gente racionalize, antes que se tome consciência do que está acontecendo. Eu sempre acreditei no meu feeling. E até hoje continuo ouvindo com atenção o anjinho e o diabinho que ficam do lado da minha cabeça. Bom, tudo isso para dizer que: quando você está vivendo um dilema, você provavelmente já tomou a decisão. E tomou no exato instante que comparou A com B. Depois, você fica ali, enrolando, tentando encontrar argumentos racionais para justificar a sua escolha. Mas ela, lá dentro da sua cabeça, já está feita.


Como colocar em prática o Método Blink. Responda de bate-pronto: você quer A ou B? Não pense, simplesmente responda. Talvez o seu lado racional não consiga explicar o porquê. Mas é, sem dúvida, um bom jeito de chegar a uma decisão. Especialmente se o jogo continua empatado depois do tempo normal, da prorrogação e dos pênaltis. Só não abuse. Eu confio no meu feeling. Mas não usaria, por exemplo, o Método Blink na pergunta final do Show do Milhão.


Quinto cenário: para quem não confia no Método Blink, o Método Tabelinha. Outro método consagrado é a Tabelinha. Você faz quatro colunas. Nas duas primeiras, coloca os prós e os contras do seu atual emprego. Nas outras, coloca as vantagens e desvantagens do novo. Depois compara tudo e tenta tirar alguma conclusão. Para muita gente, funciona. Mas para mim, ele parece muito racional e só complica.


Não se acaba namoro por torpedo. Você é um comunicador. Use o meio certo para mandar a sua mensagem. Se você vai recusar uma proposta de emprego, pense bem. Algumas coisas que você pode mandar por email. Outras, justificam uma ligação. E quando o papo é mais delicado, a conversa tem que ser olho no olho.


Nunca feche portas. A maioria das portas de agência são giratórias: ela leva você para dentro. Mas rapidinho, pode estar levando você para fora. Seja lá qual for a sua decisão, nunca se queime com ninguém. Mesmo que seja uma agência pequena ou um profissional que você não admire. Trate todo mundo com o mesmo respeito que você teria com o Diretor de Criação da sua agência favorita. Se não for por amor ao próximo (é legal tratar todo mundo bem, você não acha?), pelo menos por amor próprio.


Eduardo Axelrud,

Diretor de Criação da Escala Nada no seu trabalho vai ser mais importante do que descobrir e traduzir numa peça aquilo que é verdade para as pessoas. Se o seu target olhar para o que você criou, balançar a cabeça e dizer "putz, é mesmo", pode ir pra casa com um sorriso no rosto você acertou na mosca.


Eu preciso da grana. Se você depende do dinheiro que ganha, a sua situação é um pouco mais complicada. E exige um planejamento muito maior, já que você precisa encontrar uma oportunidade que seja mais interessante para você. Seja ganhando mais. Seja ganhando o mesmo, mas num lugar mais legal. Seja ganhando mais – e num lugar mais legal. O único conselho que eu dou para você é tomar cuidado com a estagnação. Quem depende do dinheiro geralmente corre menos riscos. Esse tipo de gente costuma tomar decisões seguras demais para um criador. E, muitas vezes, esse conservadorismo é justamente uma boa causa para darem um belo pé na sua bunda. A melhor maneira de não virar um refém dessa situação é o Fundo Foda-se.


Fundo Foda-se Eu acredito que todo profissional, de todo e qualquer nível, deveria ter um fundo, onde estejam acumulados seis salários. Isso é uma garantia dupla. Primeiro, porque se você for demitido, você não precisa se sujeitar a qualquer proposta. A segunda é que, assim, você pode ter a liberdade de trabalhar nas condições ideais. Pode dar opiniões sinceras, sem medos de retaliações. Pode criar sem um peso desnecessário nas costas. Em suma: assim, você não precisa vira nem um puxa-saco, nem um burocrata.


O dilema mais comum: viagem ou trampo? A pergunta que a maioria dos estagiário que me procura é: eu tenho muita vontade de viajar, fazer um intercâmbio. Será que devo? Claro que deve. Não conheço ninguém, absolutamente ninguém, que se arrependeu de passar um tempo fora. Eu garanto que uma viagem vai ensinar muito mais do que você pode aprender dentro de uma empresa. E, na maioria dos casos, você ainda volta falando uma outra língua, que é um puta diferencial competitivo. Um amigo meu sempre dizia que comer e viajar são as quarto melhores coisas da vida. Não sei se são. O que eu sei é que, numa viagem, você tem bastante oportunidade para fazer as outras três.


A pergunta de um milhão de dólares. Às vezes, a gente pede conselhos. Mas são perguntas que apenas nós mesmos podemos responder. Você já deve ter se deparado com a famosa pergunta de um milhão de dólares. O que eu quero para a minha vida? Se você tiver dificuldade para respondê-la, simplifique. O que eu quero para a minha vida AGORA? Quero ficar na minha cidade ou viajar? Quero investir no meu atual emprego ou dar uma espairecida? Quero trocar de profissão ou continuar na mesma? Se você pensar num período de dez anos, vai ver que essa pergunta ganha um peso desproporcional. Às vezes, tudo o que a gente precisa saber é o que vai fazer pelos próximos três meses.


Tudo termina bem. Você pode simplesmente ignorar para todas as sugestões que eu dei aqui. E ainda assim, eu tenho certeza que tudo vai dar certo para você. As coisas sempre terminam bem. Sempre. O único erro que eu tenho certeza que você não pode cometer é o da enrolação. Não fique esperando as coisas acontecerem. Não fique aí parado. O mundo está lá fora esperando por você. Vai lá e faz.


CapĂ­tulo 6

Melhorando o seu trabalho.


A nossa maior matéria-prima: informação. Um pedreiro precisa de tijolos para levantar a sua parede. Um marceneiro precisa de madeira para desenvolver suas peças. E um criador publicitário, o que precisa? Antes de tudo, de conhecimento, informação, referências, bagagem. O motivo é muito simples. Uma peça publicitária nada mais é do que a reorganização de informações que já existem. O papel do criador é tornar essa informação mais interessante – com humor, emoção ou racionalidade. Um exemplo. Se você me pedir para definir a Dercy Gonçalves, eu poderia tirar da Wikipedia: Dolores Gonçalves Costa, conhecida pelo nome artístico Dercy Gonçalves, foi uma atriz brasileira, oriunda do teatro de revista, notória por suas participações na produção cinematográfica brasileira das décadas de 1950 e 1960. Tudo é verdade. Mas se pegarmos o segundo parágrafo, ela parece muito mais interessante. Celebrada por suas entrevistas irreverentes, bom humor e emprego constante de palavras de baixo ca-


lão, foi uma das maiores expoentes do teatro de improviso no Brasil. Fica mais legal. Mas não daria para dizer isso de uma forma ainda mais bacana? A Dercy não morria nunca: toda vez que a morte chegava, a véia mandava ela tomar no cu. Viu? E por que foi possível evoluir da primeira para a segunda forma? Porque tivemos mais informação, e com mais informação, pudemos escolher aquilo que torna a Dercy mais simpática para quem está lendo. Em seguida, fizemos um trabalho de processamento da informação: pegamos parte do primeiro parágrafo e parte do segundo e demos uma forma.


Conclusão óbvia. Quanto mais informação você tem, maior a sua capacidade de encontrar o lado mais simpático do produto/marca que você quer vender.


Informação: faça uma suruba na sua cabeça. Quando um homem e uma mulher se conhecem na noite, ninguém quer se comprometer muito. Ninguém quer queimar o filme logo de cara. Então os dois ficam se estudando, com perguntas clichê e respostas evasivas. Por exemplo: quando um pergunta sobre o gosto musical do outro, vem a resposta. Eu sou bem eclético, curto de tudo. Ser eclético não é só bom em papo de balada. Ser eclético é fundamental para quem quer ser um bom publicitário. Inclusive dizem que Na propaganda, você tem que ler tudo, ver tudo, ouvir tudo. Apesar de ser meio batido, é mais ou menos por aí mesmo. Porque quando o cara tem uma formação muito popular, acaba não conseguindo sofisticar determinadas peças que precisam de um polimento especial. Ao mesmo tempo, quando o cara é muito erudito, não sabe quem é o personagem central da novela das oito. Também não funciona. O legal é quando você realmente gosta de tudo. Quando você consegue transitar com tranquilidade por esses mundos.


Se você é fã de BBB, mas também fica amarradão com os documentários do History Channel, tem tudo para se dar bem. E quem não curte? Bom, quem não curte se fudeu. Vai ter que ser na marra. Cultura geral é ferramenta de trabalho.


Marcelo Pires,

Diretor de Criação da Competence Eu gosto muito do escritor português Gonçalo M. Tavares. Deste autor, gosto especialmente da série de livros O Bairro. Nesta série, gosto em particular do livro O Senhor Breton e a entrevista. Pois é de O Senhor Breton que retiro dois parágrafos que me parecem bons conselhos para jovens criativos. O primeiro: “De resto, parece-me que o importante no mundo é existir a compreensão de que um chapéu bonito não promove ideias na cabeça.” E o segundo: “Uma rosa, apesar de bela, tem uma parte acastanhada e suja que está debaixo da terra. E um verso é como uma planta: é belo se investigar a terra que o destino lhe colocou por baixo. A beleza será pois uma profundidade e não uma estatura...”


Crítica também é matéria-prima. A maioria das pessoas, quando mostra o trabalho para os colegas de agência, pedindo uma opinião, mostra para ouvir elogio. Se você critica, sugere uma mudança, coloca um ponto de vista diferente, normalmente ouve uma resposta defensiva. É, mas isso aí veio no briefing. É, mas isso aí foi um pedido do cliente. É, mas isso aí foi ordem do meu Diretor de Criação. A crítica não pode ser levada como uma coisa ruim. Pelo contrário: crítica é uma coisa maravilhosa. Se crítica também é informação, crítica também é materia-prima. Enxergue ela como mais um dado que você pode usar a seu favor para deixar o trabalho melhor.


As ideias mais simples são as que dão mais trabalho. O Marcello Serpa diz, no livro As 22 Consagradas Leis da Propaganda e Marketing, uma coisa que eu levei para o resto da vida: O simples só é sofisticado, só é valorizado quando é descoberto antes de se tornar óbvio. (...) Foi preciso que alguém pensasse primeiro, que descobrisse a idéia, para que outro alguém pudesse então dizer ‘uau, por que não pensei nisso antes?’ E, apenas depois desta frase, repetida por muitos, é que uma idéia simples transforma-se no óbvio. Quando você vir uma ideia muito simples (não confunda ideias simples com ideia simplória), não pense que ela foi concebida rapidamente. Ao que tudo indica, foi fruto de muito trabalho. Observe as ideias simples e tente encontrar o que existe de genial por trás do seu raciocínio. Toda ideia simples é uma aula de propaganda.


Você não é um gênio incompreendido. Aqui na Perestroika, eu tive oportunidade de ter contato muitos caras bons. Em alguns casos, com os melhores dos melhores, nas mais diversas áreas. E engraçado: todos os caras realmente geniais que eu conheci não se achavam gênios. Se consideravam pessoas comuns, com algum talento e muita sorte. Imagine você, no início da carreira, já se achando o fodão. Você acha que isso vai ajudá-lo? Provavelmente não, né? Com o nariz empinado, você não vê direito o que tem pela frente. A chance de você tomar um tomar um tombo mais cedo ou mais tarde é grande. Então, seja humilde. Por mais que você olhe para os profissionais mais experientes e veja mediocridade, você nunca pode pensar que é melhor que os caras do topo da pirâmide. Nessa etapa da vida, você provavelmente não é.


Talento é algo discutível. Quando você olha uma pessoa fazendo um desenho à mão, pode pensar: Nossa, esse cara tem muito talento. Mas e se esse cara treina, desde os cinco anos, doze horas por dia? Isso é talento? O que é talento? É facilidade em desenvolver determinada tarefa? É uma habilidade natural? É treino? É ser eficiente numa função? Eu não gosto de entrar muito nesse terreno, porque acho ele quase irrelevante. Para mim, se um cara com talento e um sem talento chegam no mesmo lugar, eles são igualmente bons. Acredito que o importante não é o meio. O importante é atingir a meta. Se foi graças a um dom divino, horas de suor, macumba ou um pedido para o gênio da lâmpada, que diferença faz? No final, é melhor quem tem um resultado melhor. Simples assim.


Quando pedirem, faça. Quando não pedirem, surpreenda. A expectativa é a mãe da merda. Portanto, quando pedirem para que você faça algo bem feito, faça no mínimo bem feito. Ou vão achar uma porcaria. Agora, quando você propõe alguma coisa, você pega todo mundo pelo contrapé. Mesmo uma ideia não muito brilhante ganha outra dimensão. E você ainda faz o filme por demonstrar proatividade.


Diego Wortmann,

Diretor de Arte da Escala Seja curioso. Com todos os assuntos. Você nunca sabe quando vai cair para você alguma campanha sobre um assunto que não domina, que nunca viu na vida ou que não goste. Mas isso é o legal da profissão. Um dia você está vendendo sandálias infantis, outro dia você está vendendo trator e, no outro, plano de saúde. Ou seja, preste atenção em tudo à sua volta. Nas ruas, em casa, na faculdade, no trabalho. Preste atenção nas fachadas das lojas, na diagramação do folheto da esquina, no lettering do Big Brother, enfim, respire tudo que for necessário. Pode acreditar, um dia você vai precisar. Nesse caso, viajar é muito produtivo. Em uma viagem você vai ver e aprender sobre coisas que não estão ao seu redor. Tente aprender sobre todos os departamentos da agência. Ficar só recebendo briefings para criar vai limitar a sua carreira. Tente entender a sua profissão, ou o porquê você está fazendo aquele trabalho daquele jeito. Entenda o trabalho da produção, da mídia, do atendimento e, principalmente, o negócio do cliente. E e o mais importante e básico para todo criador: faça o novo. Faça o diferente. Não copie formas. Tente criar a sua própria.


Aos 45 do segundo tempo. Nas última semana, acompanhei uma aula da Keka Morelle cheia de dicas bacanas. O livro já estava selado, lacrado, dependendo apenas da revisão. Teoricamente, essas manhas deveriam entrar só na versão 2.0. Mas eu achei elas tão úteis que resolvi fazer um puxadinho no capítulo.

Fale tudo antes A hora de discutir tudo, absolutamente tudo, é antes do trabalho começar. Tirar dúvidas sobre como vai ser realizado o trabalho, entender bem o briefing, brifar bem o fornecedor. Depois que o processo começou, tudo fica muito mais difícil.

Saiba dizer não Não fique constrangido. Se o fornecedor não fez como você queria, diga não. Pior é dizer sim e ter que dizer não logo ali na frente. O não é um bom amigo do trabalho de excelência.

Resignifique as referências Referencia, como o próprio nome diz, é uma referência. Não é uma solução. O papel do criador é entender a referência, mas acrescentar em cima dela. Se é para simplesmente reproduzir algo que já foi feito por outra pessoa, a agência não precisa de você.


Tenha sua própria voz Você não é um artista, que cria tudo de um jeito e enfia goela abaixo dos outros. Mas você pode ter um estilo, uma personalidade, um jeito de trabalhar que ninguém mais tem. E é essa voz que você deve buscar.

Mantenha o entusiasmo O trabalho brilhante é aquele em que a gente consegue manter o entusiasmo do início ao fim. Quando os problemas nos fazem perder o tesão, isso naturalmente se reflete na peça. Não são raras as campanhas que começam lindas e vão murchando, murchando, até ficarem ficarem mornas e sem graça.


Dicas bem práticas. 1. A folha em branco é sua inimiga. Acabe com ela o mais rápido possível. Costuma funcionar comigo. Logo que eu começo um brain, trato de escrever a primeira ideia que me vem à cabeça. Normalmente, esse é um gatilho para que o meu cérebro entenda: OK, agora entramos no trabalho.

2. Ficar conversando numa salinha não é brain. Brainstorm é um processo de solução de problemas de insight. Por ser o mais popular dentro das agências de propaganda, parece ser o único. Mas não é: existem outros, como o Pensamento Lateral, o Seis Chapéus, o Mapa Mental, etc. Brainstorm não é passar o dia numa salinha, conversando sobre a vida. Brainstorm não é ficar só falando coisas sem sentido. Brainstorm dá trabalho. Por mais contraditório que pareça, Brainstorm exige uma certa disciplina.

3. Na hora de criar, ligue o foda-se. Na hora de executar, nunca ligue o foda-se. Uma coisa é certa: no brain, o seu filtro deve ser muito permissivo. Nada de criticar o seu dupla.


Nada de fazer avaliações instantâneas. Sua mente tem que estar relaxada. Portanto, durante o brain, ligue o foda-se. Agora, na hora de executar a ideia, e encontrar a melhor forma para concretizá-la, não relaxe. Leve o acabamento ao limite. Se você estiver cansado, louco para ir para casa, mas ainda não está totalmente satisfeito com o resultado, pegue um café e volte ao computador. Durante a execução, nunca ligue o foda-se.

4. Registre as ideias. Primeiro, porque se você não anotar, pode esquecer. Segundo, porque verbalizar/desenhar/rafear/documentar a sua ideia é a senha para que o seu cérebro pense: Beleza, posso partir para a próxima.

5. Leia muito sobre o assunto antes de começar a criar: incubação Eu tenho um monte de ideias tomando banho. Eu tenho um monte de ideias dirigindo. Ou, melhor: Eu sou aquela pessoa que está pensando na vida e, de repente, dá um estalo.


Vou contar um segredo para você: todo mundo tem ideias tomando banho, dirigindo. Todo mundo tem estalos. Esse é um processo natural na resolução dos problemas de insights (se eu não falei até agora, anotem: peças publicitárias normalmente são problemas de insight). Uma etapa natural, que vem antes do estalo, é a incubação. Quanto mais informação você tiver, maiores as chances de você encontrar um evento precipitador que cruze A com B – e resulte na sua ideia genial.

6. Não insista demais em determinado tema. Não quero parecer chato com esse papinho de problemas de insight, mas a maioria deles se resolve através desse estalo. É uma coisa meio assim: pápum. Então, quando você insiste demais em determinado tema (Acho que tem alguma coisa com dinossauro…Tô com um cutuco que dinossauro rende alguma coisa…Desculpa insistir, mas e se fosse um lance com dinossauro?), você está reduzindo drasticamente a sua chance de ter uma boa ideia.


Por fim, a dica mais importante de todas: trabalhe com gente boa. Isso sim faz diferenรงa na sua vida. Se aproxime dos bons, ouรงa o que eles dizem e, por um tempo, siga os conselhos dos caras. Normalmente dรก certo.


CapĂ­tulo 7

O novo criador


Pequena introdução Um bom criador, há dez anos atrás, não precisava nem ter e-mail. Hoje em dia, a maioria das entrevistas para trabalhar numa agência são marcadas por email. Talvez você, que é de outra geração, não entenda bem isso. Mas a propaganda está se reinventando nesses últimos anos. E você é quem vai fazer essa mudança.


Tenha uma vida digital ativa A geração que nasceu a partir dos anos 90 (os chamados nativos digitais) tem uma relação com a internet muito, muito diferente do resto das pessoas (os imigrantes digitais). Essa galera já vem com outro chip. E essa galera, que está definindo um novo padrão de consumo, está também redefinindo um novo padrão de comunicação. Nativo ou imigrante, você tem que ter que se relacionar bem com as mídias sociais. E aí, não importa se você não gosta muito de fuçar no Facebook, de conversar por MSN ou de twittar. Não tem jeito: é trabalho. E não adianta você usar uma, duas vezes e achar que Já entendi como funciona. É um pouco mais complicado que isso. Internet é relacionamento, e isso significa entender os códigos, a conduta e o comportamento do usuário nessas plataformas. Além disso, tudo muda muito rápido. O que é novo hoje, fica velho amanhã, e pode voltar a ser novo na semana seguinte.


Use o seu trabalho autoral como laboratório Um bom jeito de se familiarizar com as novas mídias é desenvolver um trabalho autoral, em paralelo ao seu trabalho do dia-a-dia. Dessa maneira, você tem menos responsabilidades. Se der errado, ninguém vai ser demitido. E se der certo, bom: aí você tem um grande case no portfólio. Em 2007, o Felipe anghinoni criou junto com outros amigos o Bronze Brasil, Blog que sacaneava o desempenho dos atletas brasileiros no Pan. Essa brincadeira já seria uma ótima maneira de aprender a administrar um Blog com vários colaboradores e diversas postagens diárias. Mas o Bronze Brasil estourou, saiu na grande mídia e virou um webhit.


Juliano Faermann, Redator da Escala.

Não pense que o trabalho termina quando você tem uma boa ideia. Por incrível que pareça, ele está só começando. O que vem pela frente costuma ser a parte mais dura do processo. Algo como uma subida para serra em dia de chuva: uma estrada sinuosa, lenta, cheia de desvios. E onde muita gente costuma derrapar. Um descuido no conceito aqui, uma referência equivocada ali e, pronto, você fica no meio do caminho. É assim de Lada. É assim de Jaguar. Se você quer que a sua ideia chegue lá, dedique-se e mantenha o foco até o final. Vale a pena. A vista lá de cima é linda.


Manje um mínimo de tecnologia Você não precisa ser um geek. Você não precisa ter o último modelo do último celular da última geração. Agora, você também não pode ser o último a saber das novidades tecnológicas. O motivo é bem lógico: sempre que surge uma nova tecnologia, o simples fato de colocar essa tecnologia numa ideia publicitária já tem impacto suficiente para chamar a atenção. Se a tecnologia vinga e começa a se popularizar, é natural que outras marcas também comecem a criar ideias para essa plataforma. E é aí que complica: se aumenta concorrência, não basta mais ter uma ideiazinha qualquer. Você vai ter que caprichar para chamar a atenção. Veja o exemplo do comercial da Toshiba. Eles apresentaram, pela primeira vez num filme de televisão, a t e c n o l o g i a Ti m e s c u l p t u r e ( v e j a n o l i n k http://www.youtube.com/watch?v=krYUkD0STag). Tem ideia? Tem. Mas ela é um pouco diferente das ideias publicitárias tradicionais. Ela impressiona mais pelo visual, pela apresentação da tecnologia em si, do que por um raciocínio conceitual, com início, meio e fim. Moral da história: quando a tecnologia ainda é insipiente, você nem precisa ter uma grande ideia. A tecnologia já é a ideia.


Fique esperto no que está bombando De alguma forma, você tem que sacar o que está sendo comentado na internet. E aí, não estamos falando necessariamente de tecnologias. Mas das novas celebridades, das piadas internas, dos últimos webhits. Lembra quando começaram a aparecer os primeiros Literal Videos (videoclipes que literalizavam as imagens nas suas letras)? A linguagem era um prato cheio para qualquer marca, de qualquer segmento, de qualquer parte do mundo. Quem estivesse ligado, poderia se apropriar dessa estética e sugar todo o recall que ela tinha na web.


Aprenda coisas que pouca gente sabe Muitos criadores da velha geração falam, de forma até um pouco desinformada, que é impossível planejar um viral. Evidente que existe técnica por trás de um viral, que aumenta consideravelmente a sua margem de sucesso. Agora, um profissional consagrado, com uma penca de prêmios de propaganda offline, talvez não tenha paciência para sentar, ouvir e aprender. Se reciclar não é fácil. É aí, é nessas brechas que você pode criar boas oportunidades. E se tornar uma figura importante dentro da agência. Assim como o viral, existem muitas outras estratégias de comunicação e relacionamento digital que ainda estão engatinhando no Brasil. Você pode sair na frente.


Multidisciplinaridade Na agência de propaganda antigas, os profissionais tinha que ser grandes especialistas nas suas áreas. O redator tinha que escrever muito bem, e só. O Layoutman tinha que fazer uma bela arte, e só. E tanto é verdade que os dois nem sentavam juntos: cada um ficava numa sala diferente. Não existia troca, não existiam vasos comunicantes. Era cada um por si. Esse perfil foi sendo transformado, mas a herança do especialista ainda existe em algumas agências mais old school. Acho que o perfil do profissional multidisciplinar vai, aos pouquinhos, substituir o especialista-megaespecializado. Se você também pensa assim, tem tudo para se dar bem.


Na dúvida, siga a bússola: Titanium Lions Se antigamente quem ditava a propaganda mundial era o Grand Prix de Film e de Press & Poster, hoje o prêmio mais badalado é o Grande Prix da categoria Titanium. O Titanium nasceu a partir do BMW Films, série com vários curtas metragens, dirigidos por nomes consagrados de Hollywood. Um projeto que chacoalhou e rediscutiu toda indústria da propaganda. O prêmio era só uma formalidade. O único problema é que ele não se encaixava em nenhuma das categorias vigentes no Festival de Cannes. Tiveram que criar uma só para isso. Aí nasceu o Titanium. Dos BMW Films, o mais conhecido é o episódio do Guy Ritchie, com participação da Madonna (Link: http://www.youtube.com/watch?v=q1dYv_gTA8). Vale dar uma espiada.


Big Idea. O Titanium Lion valoriza a chamada Big Ideia: um conceito que se desdobre para várias mídias. A Crispin+Porter, Bogusky é uma agência famosa por criar dentro desse formato. Você pode procurar na internet os cases do Whopper Freakout, por exemplo. Nessa ação, um restaurante da rede Burger King simplesmente tirou de circulação o seu sanduíche mais famoso, o Whopper. Quando os clientes chegavam, recebiam a notícia de que o clássico havia sido descontinuado. Bizarro, né? Pois foi justamente essa estranheza que gerou um grande bafafá, valorizou o produto e se transformou num grande case da propaganda moderna. Outro case interessantíssimo é Tap Project (http://www.youtube.com/watch?v=Uzs-Lm0AvRU), desenvolvido pela Droga5. É legal justamente pela simplicidade e pelos resultados contundentes. Os dois são ótimas referências. Não só do que é bom, mas do que é considerado o norte da propaganda mundial.


JJ + PK + ST Esses dias, o Carlos Merigo (que trabalha na Fischer, mas é mais conhecido pelo seu blog, o #Brainstorm9) veio falar com a gente e apresentou um raciocínio muito bacana. Ele acredita que o criador do futuro é uma mistura de J.J. Abrams, Philip Kotler e Star Trek. Ou seja: temos que fundir, cada vez mais, o lado entretenimento, com o marketing, com a tecnologia. Eu adorei essa visão. Acho que é bem por aí: a propaganda vai ter cada vez menos cara de propaganda, mas isso não significa que ela vai deixar de ser propaganda. No final das contas, tem que vender. O conhecimento tecnológico, como já falei há algumas páginas atrás, vai ser uma expertise Sine Qua Non para a boa criação. No momento em que o consumidor está (por exemplo) procurando restaurante via um aplicativo de Iphone, como que a gente faz? Se mete no meio, como fazia antigamente? Ou tenta ser tão útil, interativo e divertido? O cara esperto tem que estar muito esperto para essas as novas tecnologias.


Para fechar, um boa notícia: você está vivendo o momento mais legal da história da propaganda. Esse é um raciocínio que o Vinícius Malinoski apresentou numa aula da Perestroika – e eu concordo totalmente. As possibilidades hoje são praticamente infinitas, e só vão ficar ainda mais divertidas daqui para frente. Pense comigo: o celular, os games, a TV digital, o cinema 3D, o GPS, a realidade aumentada. Tudo isso ainda vai evoluir e impactar diretamente no trabalho dos publicitários.


Apêndice: o portfólio do novo criador. Como falamos antes: agora, o novo padrão do mercado são as chamadas Big Ideas. Na verdade, esse é um conceito antigo – muitas grandes campanhas do passado eram Big Ideas, só não tinham esse nome – que foi reciclado e agora é o objetivo de todo criador de agência de propaganda. Pois bem: um portfólio de Big Ideas é difícil de se conceber. A melhor maneira de apresentar isso é através de cases. Então, se você quer montar uma pasta mais moderninha, leve pelo menos um case de uma Big Idea. Você pode apresentar através de um vídeo, com uma lâmina que explique todas as ações ou simplesmente inventar um jeito novo. Não existe padrão. E se a ideia for boa, isso se torna menos relevante ainda.


CapĂ­tulo 8

O que aconteceu comigo


Existe um ditado que diz. Pessoas espertas aprendem com os próprios erros. Pessoas muito espertas aprendem com os erros dos outros. Por isso, resolvi contar com mais de detalhes o meu início de carreira. Não serve para seguir à risca. Serve muito mais para você evitar (e rir) das cagadas que eu fiz.


O plano. Sempre quis ser redator, desde o primeiro dia de propaganda. E tentando alcançar esse objetivo, tive uma estratégia diferente da maioria dos meus contemporâneos. Não tentei uma vaga como assistente de Redação logo de cara. Achei que o melhor seria aprender outras coisas ligadas à criação. Áreas afins, que me fariam um redator melhor no futuro.


O primeiro estágio. Meu primeiro emprego foi aos 17 anos, num jornalpiloto. Eu escrevia matérias, participava da diagramação e criava os anúncios que iam nos rodapés das páginas. Aí, você vai me perguntar: Como que um estagiário de publicidade escrevia matérias para um jornal? Isso não é proibido? Pois é: eu demorei um mês para me dar conta desse pequeno detalhe. Estava tão empolgado com o primeiro estágio que nem perguntei muita coisa. Já saí escrevendo. O jornal era picaretagem pura. O dono não dizia nada com nada e só mandava eu escrever. Quando eu comecei a desconfiar, ele veio com um papo de me transferir para a Europa com salário de US$ 3.000,00. Aproveitei que a história estava ficando nebulosa e desapareci no meio da fumaça. Nunca vi essa grana. Por sinal, nunca vi grana nenhuma. Mas eles também nunca mais ouviram falar de mim.


Maurício Oliveira,

Supervisor de Criação da DCS Você é sua escola (ou, seja um autodidata) Este texto é pessoal e inocente. É baseado apenas naquilo que acho importante você saber para ter uma vida profissional com mais possibilidades. E eu acredito nessas palavras. Porque seguindo elas estou me mantendo na profissão. E acredite: é muito difícil se manter na propaganda. Para conseguir isso eu sugiro: Aprenda muito mais do que te ensinam. Aprenda com os livros, com a web e aprenda com as pessoas. Principalmente com elas. As pessoas com quem você se relacionar não vão necessariamente ter coisas pra te ensinar. Todo dia você topa com gente interessante em igual medida que encontra gente desinteressante. Mas essa classificação é muito rasa. Prefiro separar entre pessoas entre as que eu posso aprender mais e outras que posso aprender menos.


Todo mundo está compartilhando conhecimentos e experiências involuntariamente a toda hora. Seja no jeito de se vestir, de falar, de coçar a cabeça ou de cumprimentar o porteiro da empresa. Aliás, o jeito como uma pessoa cumprimenta o porteiro da empresa diz muito sobre como ela age na firma. Mas o que interessa é o jeito como você tabula e organiza toda esse conhecimento não formal que paira por aí. Esse conhecimento, que tá na rua, nos corredores, na caspa sobre o cardigan moderno ou escondido no cafezinho gelado da mesa de reunião é fundamental para você que quer evoluir em qualquer ambiente corporativo. Aprenda com essas coisas. A faculdade, o MBA ou a Perestroika vão te ensinar a aprender. A partir daí é com você. Num futuro que pinta o conteúdo grátis, a economia do compartilhamento e o fim dos diplomas, esses aprendizados podem ser tudo o que você terá para se agarrar.


Rompendo o hímen. Sou da teoria que, se você ainda não trabalha, deve aceitar qualquer proposta de emprego. O primeiro trampo é apenas uma boa forma de perder a virgindade profissional. Você começa a entender como o mundo real é. E percebe que ele é bem diferente das relações que você tem com seus pais, com seus amigos, com seus colegas e professores. Arranje logo um primeiro emprego. Você não quer ser um virgem de 40 anos, quer? Por sinal, não crie muitas expectativas sobre o seu primeiro emprego. É mais ou menos como imaginar que a sua primeira vez vai ser a melhor transa da sua vida. Se o seu primeiro emprego for ruim, ainda assim será ótimo.


O segundo estágio. Antes mesmo do meu primeiro emprego, eu descobri que um amigo do meu pai era sócio de uma gráfica. Pedi um estágio na cara-dura. Deu a coincidência dos caras me chamarem em janeiro, alguns dias depois de eu desistir do jornal. Meu contrato era de apenas dois meses. As aulas começavam em março e, como o trabalho era em turno integral, e eu estudava de manhã, não tinha escolha. Naquela época, não me dava conta que estudar de manhã era um atraso profissional. (Se você estuda de manhã, peça transferência o quanto antes. Você está diminuindo em mais de 50% as suas chances de conseguir uma vaga num lugar legal.) Imaginei que, passando um tempo numa gráfica, eu poderia aprender mais sobre o processo de impressão. Só que a gráfica não fazia muitos trabalhos publicitários. Ela imprimia, basicamente, livros. Sempre com o mesmo papel, sempre PB, sempre nos mesmos formatos. Meu objetivo foi para o beleléu. Mas, sem querer querendo, aprendi naqueles dois meses uma coisa ainda mais interessante.


Um estudo antropológico. Ao contrário do que você pode imaginar, eu não ia para a parte administrativa da gráfica. Eu não ficava num escritório, com ar-condicionado, ajudando em tarefas burocráticas. Eu fui para o chão da fábrica. Só que as tarefas eram absolutamente mecânicas e fáceis de resolver, mesmo para uma pessoa recém chegada. Com isso, tive bastante tempo livre para conhecer melhor meus colegas de setor. Depois de algumas semanas, eu já estava bem entrosado com a galera. Cumprimentava todo mundo pelo nome, trocava uma ideia na hora do almoço. Até jogar bola com os caras eu joguei. Mas não foi sempre assim. No início, eu senti na pele o preconceito racial. Eu era um dos poucos funcionários brancos. E certamente o único de classe média (mesmo usando uniforme, dava para perceber que eu era filhinho de papai). Um alvo fácil para piadas, sacanagens e apelidos semitas. Nos primeiros dias, eu me senti tão mal que estacionava o carro bem longe, para ninguém ver que eu tinha um Gol zero. Foi bom ver o outro lado da moeda. Me ensinou a ser mais humilde e mais humano. Um choque de rea-


lidade que estourou a bolha onde eu vivi durante anos e anos. Mas o mais legal foi conhecer os gostos, os interesses, os valores de um grupo de pessoas com o qual eu nunca conviveria se não tivesse trabalhado lá. Só para citar um dos milhares de exemplos marcantes: logo que fui apresentado, um dos funcionários me perguntou. - Colorado ou gremista? - Colorado. - Imperadores ou Bambas? Carnaval para mim era apenas um feriado onde eu viajava, enchia a cara e tentava marcar muitos pontos. Imperadores, Bambas, Salgueiro ou Viradouro, isso não tinha a menor importância. Carnaval era gandaia. Para eles, Carnaval era coisa séria.


Regis Montagna,

Diretor de Criação da Escala. - Seu João, o teto da sala da minha casa está descascando, o senhor poderia pintá-la? - Claro doutor.

Sempre, mas sempre mesmo entregue mais do que lhe foi pedido.


Entretanto. A minha família tinha programado uma puta viagem para o Exterior para a mesma época. Daquelas grandes e inesquecíveis. Eu, obviamente, estava convidado. Mas na época, eu era um legítimo Abobadinho da Propaganda. Tão abobadinho que não podia perder a chance de conhecer mais sobre o processo gráfico. Por mais legal e recompensador que essa experiência profissional tenha sido para a minha vida e para a minha carreira, a viagem com a minha família era algo especial. Abrir mão disso foi uma burrice sem tamanho. E também me ensinou uma lição.


Lição. Nunca deixe de fazer algo que vai ficar marcado pelo resto da sua vida por causa de trabalho. Não deixe de acompanhar o nascimento do seu filho. Não falte ao casamento do seu melhor amigo. Não perca a formatura do seu irmão. Nenhum emprego, nenhuma agência, ninguém paga tão bem para que você abra mão das coisas que não têm preço.


O terceiro estágio. No jornal-picareta-piloto, fiz amizade com uma estudante de RP. Ela trabalhava numa agência minúscula, que era dividida em duas áreas. De um lado, o departamento de Relações Públicas, onde ela assistia à RP Sênior, sócia do negócio. Do outro lado, era o departamento de propaganda. Onde ficava o outro sócio e um estagiário. Eu. Me interessei pela vaga justamente porque era uma legítima Eugência. Eu fazia tudo. Ia no banco. Atendia o telefone. Preparava o cafezinho. Mandava fax com os comprovantes de veiculação. Criava os títulos, os textos, layoutava e finalizava os anúncios. Neste caso específico, o que mais me interessava era aprender a mexer nos programas de Direção de Arte. Sempre acreditei que um criador só seria completo se ele fosse capaz de criar e executar as suas ideias. E aí vai a primeira dica do terceiro estágio.


Primeira dica do terceiro estágio. Se você é redator, você não pode depender do seu diretor de arte. Esse é um vício muito comum. Tem redator que não sabe as funções básicas do Photoshop. Tem redator que nem sabe abrir o Photoshop. Dominar as ferramentas de manipulação e diagramação fazem com que você crie melhor. Só praticando direção de arte é que você entende conceitos importantes de alinhamento, agrupamento e hierarquia. Em suma, você só consegue criticar com mais autoridade o layout do seu dupla se tiver futricado, pelo menos um pouquinho, nos programas. Do ponto de vista prático, tem mais uma vantagem. Você não precisa ficar mendigando para que o seu diretor de arte faça JPGs das suas peças, ou grave um DVD com o seu portfólio. Se você dominar o básico do Photoshop e do Indesign (ou um similar), vai ser um criador independente. Para finalizar, eu acredito que um criador tem que ser capaz de colocar em prática as suas ideias. Durante o período que estive na Miami Ad School (chegaremos lá), não foram poucas vezes que eu sentei no computador e criei tudo sozinho. É evidente que você não precisa se sofisticar ao ponto de virar um Diretor de Arte de verdade. Eu, por


exemplo, investi apenas dois anos da minha carreira, e decidi parar quando atingi o meu objetivo. O inverso também é verdadeiro. Diretor de Arte que não sabe escrever, que não sabe fazer título, que não sabe roteirizar um spot, fica totalmente dependente do dupla. O Rafa Bohrer é um bom exemplo do criador completo. Além de ser um fenômeno como Diretor de Arte, ele escreve títulos e conceitos tão bons quanto qualquer redator experiente. Já vi ele criar textos invejáveis. Mais de uma vez. A moral é que você tem que ser um especialista, mas também tem que ser um generalista. Por mais contraditório que isso possa parecer.


Segunda dica do terceiro estágio. Construir uma network sólida é um talento. E usar esses contatos com sabedoria é um talento ainda maior. A maioria absoluta dos estagiários entra na agência a partir de uma indicação. Os profissionais mais experientes, com poder de contratação, não têm contato com os estudantes dos primeiros semestres. Alguém precisa fazer esse meio campo. Boa parte das vezes, as indicações são feitas diretamente para a pessoa que está contratando. Tenho um amigo que se interessa pela vaga. Vou pedir para ele mandar a pasta. Mas existe também uma rede de indicações muito mais poderosa, que circula por listas de e-mail, invade os MSNs, vira scraps no Orkut. Fulano me contou que Ciclano ouviu falar que estão procurando alguém na agência Tal. Nesse caso, nem sempre vence o mais forte. Às vezes, vence o mais rápido. Dependendo do caso, a agência precisa de um estagiário para ontem. Se você tiver uma ótima pasta, mas só ficar sabendo da oportunidade depois de amanhã, pode ser tarde.


Gustavo Diehl, Redator da DM9

Não trabalhe para o seu diretor de criação. Não trabalhe para o atendimento. Não trabalhe para o planejamento. Nem para o cliente. Trabalhe para a ideia.


O quarto estágio. A vantagem de uma Eugência é que você aprende a ser meio Homem-banda: faz de tudo um pouco. Participa de todas áreas e descobre qual é a sua preferida. Você suja as mãos, perde eventuais frescuras e endurece o couro. A desvantagem de uma Eugência é que você faz tudo. E chega uma hora que enche o saco. Outra coisa ruim da Eugência é que, normalmente, os criadores não são lá caras muito competentes. São uns faça-você-mesmo, que aprenderam aos trancos e barrancos. Cheios de vícios e com olhares pouco profissionais do negócio. No início, você até aprende a fazer propaganda. Mas depois de um tempo, você aprende a como não fazer propaganda. Passados alguns meses, pedi demissão. Eu não tinha nada em vista. Só achei que o meu prazo de validade tinha expirado. Pedi para conversar com o meu chefe. Recebi uma proposta de uma agência chamada ACS. É uma agência nova, pequena, que vai ser lançada por uns amigos do meu pai até o final do mês. Acho que vai ser uma boa para mim. Se você procurar na internet, não vai encontrar uma agência chamada ACS. Ela não existe. Ela nunca


existiu. Ela só existiu durante aquela rápida conversa. Eu precisava dê um motivo para não haver resistência por parte do meu chefe. Do outro lado, ele precisava de um motivo para não se sentir rejeitado. No final, todos saíram felizes. Não sinto muito orgulho dessa minha atitude. Não me sinto bem fazendo essa recomendação. Mas também não posso ignorar: funcionou. Então, se você quer uma dica da Propaganda das ruas, aí vai.


Propaganda das ruas: como pedir demissão, sem ter nenhuma proposta, e não se queimar. Há pouco tempo, eu tive uma estagiária que pediu as contas. Estou abrindo um negócio com umas amigas. A coisa está ficando séria e eu preciso dedicar mais tempo. Infelizmente, ainda não posso revelar o que é. Por mim, eu até falava, mas as minhas sócias pediram sigilo. Assim que a gente lançar, eu conto. A primeira coisa que eu pensei foi: Eu conheço esse golpe. Quando você quiser sair de um lugar, para ficar coçando em casa, a grande malandragem é criar uma historinha. Capriche no roteiro. Você tem que criar um cenário onde exista alguma informação que o seu chefe não possa ter acesso. No meu caso, eu tinha como trunfo o fato de ser uma empresa dos amigos do meu pai. Se ele pesquisasse sobre o assunto, nunca acharia nada. No caso da estagiária, ela tinha que manter o sigilo profissional do próprio negócio. Ambas histórias são duvidosas. Mas fazem sentido. E se você for um estagiário sério, com credibilidade, e não gaguejar na hora de pedir demissão, ninguém vai fazer uma sabatina para saber os detalhes.


Mesmo que alguém desconfie, sua saída vai ser aceita. E aceita com tranquilidade. É como a clássica cena do marido chegando em casa de madrugada. Ele diz que estava numa reunião extraordinária e põe a credibilidade à prova. Se o cara for um bom moço, não estiver com bafo de cerveja, perfume de mulher ou batom na gola, por que não acreditar? Use a sua imaginação. Você é um criador afinal de contas.


O quinto estágio. Fiquei alguns dias parado, descansando, mas me entediei rapidinho. Queria um novo estágio, e não sabia como. Então, peguei o guia telefônico (naquela época, a internet estava engatinhando, não existia nenhum tipo de cadastro de agências) e comecei a ligar uma a uma. Fui por ordem alfabética. Alô? Eu gostaria de saber: vocês estão procurando estagiário na área de redação? Já na primeira tentativa eu dei pé quente. Os caras queriam justamente um estagiário para criação. No mesmo dia, fui lá, mostrei alguns trabalhos, fiz uma espécie de teste vocacional (completamente sem sentido, diga-se de passagem) e fui selecionado. Era uma típica agência familiar, onde trabalhavam pai (atendimento), mãe (espécie de faz-tudo) e os dois filhos (um atendimento e outro diretor de criação). Apesar de também ser pequena – devia ter uma dez pessoas –, era uma evolução para mim. Lá, comecei a entender um pouco da dinâmica de departamentos. Eles tinham vários estagiários, todos fazendo um misto de direção de arte e produção. Por causa disso, o nível do trabalho era muito baixo. Também tinha uma redatora contratada. Mas ela não elevava muito


o padrão: era desinteressada, acomodada e não fazia quase nada legal. Como vocês devem ter notado, a minha vaga era muito mais de Direção de Arte do que de Redação. Passava o dia layoutando cartões, folhetos, tags, placas de esquina e anúncios rodapé. Mas como eu não me satisfazia muito com os títulos da redatora, comecei a sugerir opções em paralelo. Queria mostrar para eles que eu era capaz de fazer as duas coisas. E aí, eu naturalmente comecei a me destacar no meio dos outros estagiários. Enquanto todo mundo só fazia o que era pedido, eu ia além. Layoutava o que me mandavam – sempre muitas e muitas opções – e depois ficava lá, sugerindo títulos e outras ideias. Virei o queridinho do diretor de criação – o que não chegava a ser uma grande façanha, já que o resto do pessoal fazia um trabalho muito burocrático. Mas antes mesmo de colher os frutos desse reconhecimento, pedi as contas e fui embora. O lugar tinha um vibe estranha. A matrona tratava os estagiário como filhos, mas pelo lado ruim. Estava sempre xingando alguém, e sempre além do limite profissional. O atendimento tinha um jeito meio estranho. E o diretor de criação, segundo boatos, tinha um rolo que eu prefiro nem relatar aqui. Foram apenas três meses. Mas foram bem proveitosos. Como eu passava o dia layoutando, aprendi na marra a mexer nas ferramentas de layout. Posso até dizer que foi ali que eu aprendi a layoutar. A layoutar mal, mas aprendi.


Márcio Fritzen,

Redator da DM9DDB. No dia 6 de setembro 2007 faleceu um dos maiores em todos sentidos - cantores de ópera: o Luciano Pavarotti. Isso já faz um bom tempo, mas eu nunca mais esqueci. Explico porquê. O Pavarotti morreu e fizeram 1 minuto de silêncio em tudo que foi estádio na Europa. Todo jogo era a mesma coisa. Todos mudos. Estáticos e tristes por 60 segundos. Fiquei com isso na cabeça. E aí pensei: um minuto de silêncio para o Pavarotti? Um minuto de silêncio para um cara que cantava daquele jeito? Não tinha que ser diferente, não? O juiz, os jogadores em campo e a torcida na arquibancada não deveriam cantar por 1 minuto? O que estou tentando dizer com tudo isso? Não se prenda às regras. Não deixe o seu pensamento cair na inércia. Não olhe apenas para onde todos estão olhando. Ao longo da sua carreira você vai precisar ser obstinado, insistente, corajoso, mas acima de tudo, pensar diferente. Pensar e fazer.


Mãe Dinah. Quando avisei que estava indo embora, falei para a publicitária-mãe. Estou indo trabalhar na Zeppelin. O que era um puta mentira, mas ela não tinha como saber. O mais engraçado é que, dois meses depois, eu realmente consegui um estágio na Zeppelin. Não por coincidência: eu tinha muitos amigos da faculdade por lá. Amigo indica amigo, que indica amigo, que me indicou. Como a tarefa que eu iria realizar não tinha nenhum pré-requisito, além de um teleencéfalo minimamente desenvolvido e de um polegar opositor, minha pasta não serviu para nada. Repare: o que me colocou lá dentro foi apenas a network, já falada neste guia. Este foi – disparado – o melhor estágio que eu poderia desejar para a minha formação como criador. E tudo o que eu precisei foi só um pouco de sorte, alguns bons contatos e perceber uma grande oportunidade onde pouca gente percebeu.


O sexto estágio. A Zeppelin é uma das maiores produtoras de comerciais do Brasil. Na época, ela já era respeitada no mercado local, e estava começando a trabalhar de maneira mais constante com agências de São Paulo. Como toda produtora que se preze, ela tinha um arquivo, onde ficavam todas as fitas VHS e Betas. Esse departamento era gerenciado por uma menina chamada Gabriela, que sabia de cor onde estavam todos os filmes. Gabi, onde está o comercial Bolada Pepsi? Naquela beta grande, que fica na última prateleira, atrás de uma pilha de fitas virgens. Só que um dia a Gabriela pediu as contas, e todo o arquivo da produtora teve que ser catalogado. Alguém teria que ver fita a fita, filme a filme, cadastrar um a um, com a secundagem exata e breve descrição do comercial. E esse alguém era eu. Em outras palavras: eu tive oportunidade de ver todo o acervo da produtora. Desde os comerciais mais antigos aos mais modernos. Vi as fitas brutas, com as imagens não montadas. Vi as matrizes, com os comerciais editados. Vi uma coleção inteira de Shots e Latin Spots, com comerciais estrangeiros premiados no mundo inteiro. Vi animações. Vi curtas metragens. Vi longas. Vi a história da Zeppelin. Vi a história da propaganda gaúcha.


Tive acesso a referências que nenhum estagiário na minha idade poderia ter. Eu estava no lugar certo, na hora certa. Além de catalogar as fitas, também tinha que fazer todas as cópias da produtora. Era meio chato, especialmente porque eu tinha que pedir licença para o pessoal da finalização (a dupla da época nunca me tratou com, digamos, muita consideração). Mas eu não estava nem aí. Fazer as cópias e aturar o mau humor alheio era um preço pequeno para tudo o que eu estava absorvendo. Pude perceber a evolução da fotografia, do tratamento da imagem, da montagem. Lá nos primórdios da Zeppelin, era tudo muito simples. Mas à medida que a produtora ia crescendo, a sofisticação e o acabamento dos filmes iam ficando absolutamente nítidos. Eu era um bom estagiário. Apesar de alguns erros crassos – como enviar para a Globo um comercial errado, que felizmente foi trocado a tempo –, eu era um bom estagiário. Era voluntarioso e não afrouxava nunca. Por exemplo: uma vez, precisaram de alguém para dar uma força na produção de um comercial de cerveja. Não tinham quem convocar, e lá fui eu. Virei duas noites seguidas (isso não é figura de linguagem) mesmo não sendo minha função. E no outro dia, eu estava de pé, na produtora, fazendo as cópias e catalogando os comerciais.


Por essas e outras, foram soltando a corda. Comecei a digitalizar alguns materiais para montagem. Comecei a ser melhor recebido pelo pessoal da finalização. Começaram a pintar oportunidades para que eu crescesse por lá.


Mas você devem lembrar: Meu objetivo era ser redator. Então, nenhuma dessas possibilidades me comoveu muito. Pelo contrário: antes de assumir um compromisso lá dentro, saltei fora. Eu tinha um outro compromisso, comigo mesmo. Começava a última etapa do meu plano.


Período de reclusão Sabe quando o vilão perde para o mocinho, desaparece por um tempo e, depois, ele volta muito mais poderoso? Aqueles trailers que dizem: He’s back! Pois eu queria fazer meio isso. Sair de circuito por um tempo e fortalecer a minha pasta. Para, quando voltasse a apresentá-la nas agências, tivesse um material mais maduro. Sentei a bunda na cadeira e, ao longo de dois meses, montei a melhor pasta que eu poderia produzir dentro das minhas limitações. Eu praticamente dava expediente, só que em casa. Trabalhava todas as tardes religiosamente. (À noite, eu saía com meus amigos. De manhã, curava a ressaca. Ninguém é de ferro.) Foi um dos períodos mais produtivos, talvez o mais produtivo, do meu início de vida profissional. Eu era uma máquina. Ou melhor: uma maquininha, já que tinha um critério muito ingênuo na época. Produzia anúncios em série, praticamente um por dia. Fazia tudo. A direção de arte, a redação. Se tinha que tirar fotos, eu mesmo tirava. Se tinha que tratar imagem, lá ia eu. Viram por que é tão importante saber se virar sozinho? Em determinado momento, achei que estava bem servido. Eu tinha algo como 30 peças. Gravei tudo num Zip Drive – se você não sabe o que é isso, não se preocupe: você nunca vai precisar saber – e mandei imprimir na faculdade.


Mas eu olhei para a minha pasta e achei que estava meio careta. Então, juntei todo o meu material autoral e coloquei junto. Crônicas, poesias, letras de música, ilustrações, charges. Na época, não sabia se ia dar certo. Hoje eu sei que pesou bastante a meu favor. Para ajudar, tive sucesso em três premiações universitárias, que confirmaram que o trabalho produzido nesse período de reclusão tinha algum valor. Numa delas, ganhei uma viagem para Porto Seguro. O que só facilitou as coisas: eu ia para a Bahia, tirava umas pequenas férias dentro das minhas férias e, na volta, procurava um emprego.


Saul Duque,

VP de Criação da Dez Propaganda Nos meus mais de vinte anos de propaganda, já vivi a era do body type, a era da Futura extra bold condensed, a era dos varejos, a era das telefonias móveis, a era das butiques de criação, a era do full service, a era das fusões, a era do photoshop, a era do database marketing, a era da internet, a era dos virais e acho que estou vivendo agora a era da ativação. Eu nasci há dez mil eras atrás. Por consequência, conheci uma penca de criativos. De vários mercados do Brasil. Muitos deles caíram dentro de uma agência meio que por acaso. Um fenômeno que era mais comum alguns anos atrás e que, infelizmente, torna-se cada vez mais raro frente à profissionalização do mercado. O Ricardo Lima, diretor de arte que foi o meu saudoso e querido primeiro diretor de criação, era cartazista de loja, uma profissão artesanal extinta pelo computador. Havia músicos, jornalistas, locutores, atores, artistas, arquitetos, uruguaios fugidos da crise, gente bacana e corajosa que enxergava na propaganda uma oportunidade de crescer profissionalmente utilizando uma qualidade que todos eles tinham em comum: o raciocínio rápido para soluções inesperadas. Ou, em língua de gente, a tal da criatividade. Para não parecer saudosista, já vou afirmando que muitas outras coisas do nosso dia-a-dia eram piores. E que profissionalização é bom e eu gosto. Mas esta


fauna humana que circulava pelas criações era interessantíssima, competente e, o melhor de tudo, não limitava suas referências apenas aos anuários, revistas e compêndios técnicos do setor. (Neste momento, peço licença para abrir um parêntese: esse negócio de só procurar referência em anuário, olhar só anúncio para criar outro anúncio é muito parecido com aquela mania das dinastias egípcias, que só se acasalava entre si, praticando um suicídio genético de consequências catastróficas. A certa altura, começavam a nascer umas coisas esquisitas. Nobres, mas esquisitas. Fecha parênteses.) O pessoal botava mais o nariz para a rua e suas histórias de vida eram, digamos, mais complexas do que o caminho seguro que começa no segundo grau, passa pela faculdade e culmina na agência. Hoje o pessoal é publicitário e músico, publicitário e locutor, publicitário e qualquer outra coisa, mas primordialmente publicitário. E quando você pergunta o que ele quer ser na vida, se há alguma dúvida ela é dicotômica: não sei se redator, não sei se diretor de arte. Mas a pergunta ainda é válida, pois suas respostas são mais interessantes do que aquelas triviais básicas de uma entrevista. E, por vezes, mais honestas que um portfólio. A capacidade de improvisar, de se reinventar, é altamente desejada em nós, criadores. Fundamental, até. Mesmo que hoje existam tantas técnicas e disciplinas que precisam ser dominadas e exercitadas por nós frente aos outros departamentos e perante nossos clientes. É uma qualidade atávica que diferencia o bom criativo do excelente e o excelente do Alex Bo


gusky. E se às vezes é difícil de detectá-la na flor da idade de um candidato a estágio, uma pergunta tão filosófica como esta, o que ele quer da vida, pode ao menos trazer esta qualidade tenuamente à superfície. E a beleza de ser diretor de criação se manifesta quando na sua frente está um Felipe Anghinoni ou um Augusto Canani, crias da Dez que eu cito já pedindo desculpas à Valeska Morele, ao Marcelo Fedrizzi e a tantos outros que tive o orgulho de ajudar a crescer na propaganda. No dia em que coloquei o pé pela primeira vez em uma agência eu não tinha a menor idéia do que eu queria da minha vida. Ser feliz, ganhar dinheiro, fazer a diferença, talvez. Mas certeza de ser criador, redator, publicitário, essa não existia. Ninguém me fez a tal pergunta, mas, de certa forma, eu já estava tentando respondê-la ao não ver o meu nome na lista de aprovados da Geologia da UFRGS, quando tranquei a Escola de Arquitetura na Ritter dos Reis ou enquanto ouvia os discursos na formatura da Escola Superior de Educação Física. O que me trouxe até aqui foram as minhas incertezas. E resolvê-las é o que faz a nossa vida andar para a frente e valer a pena. O resto é só propaganda. Levei alguns anos até me convencer de que eu não era uma farsa encoberta pela habilidade literária de meus diretores de arte ou pela falta de tempo dos meus patrões para prestar atenção em mim.


Com o passar dos anos, o desconforto foi passando na mesma proporção em que aumentavam o prazer e a responsabilidade de ser criador publicitário. E, no fim das contas, os momentos mais interessantes e as pessoas mais importantes da minha vida, além de minha família, só vivi e conheci porque sou publicitário. E muitas delas só porque sou criador. Nosso setor tem o poder de extrair o melhor e o pior de cada um. Se você souber identificar o lado bom desta força e extrair o melhor dela, parabéns. Você é ou vai ser um grande profissional e vai conviver com pessoas maravilhosas e criativas. Com certezas ou incertezas, cabe a você escolher o seu caminho, aliarse aos que valem a pena, arriscar se for preciso. E, sempre, abrir a janela e respirar o ar puro e revigorante da vida que está lá fora. Sempre que eu fiz isso, foi para ser um publicitário, um criador e uma pessoa melhor. Vida de criativo é isso. Ou não, pois certeza mesmo você só vai ter se tentar.


O primeiro estágio como redator. Uma das agências mais tradicionais do nosso mercado é a Martins+Andrade. Ela tinha um programa de contratações muito legal, chamado Estagiário do Futuro. Funcionava assim: você mandava o seu portfólio e indicava se queria vaga para Direção de Arte ou Redação. Também havia vagas para os outros departamentos, mas a Criação era infinitamente mais concorrida. Muitas pastas entravam na disputa (não lembro exatamente, mas chutaria umas 100). Eles selecionavam três duplas. A melhor, trabalharia de janeiro a abril. A segunda melhor ficava de maio a agosto. E a terceira ia de outubro até o final do ano. Achei que essa era uma boa oportunidade para testar o meu trabalho. E pelo visto, foi mesmo: minha pasta acabou sendo selecionada como a melhor de Redação. Só isso bastaria para me deixar feliz por muitos e muitos dias. Mas tinha mais. Chegando na entrevista, a primeira coisa que perguntaram foi sobre o meu dupla. Estavam curiosos para saber quem tinha feito os layouts dos meus anúncios. Quando descobriram que era eu, veio a segunda grande notícia: eles haviam me selecionado também como melhor portfólio de Direção de Arte. Eu literalmente podia escolher com qual das vagas ficar.


Falando hoje, parece pouco. Mas para um estagiário cheio de dúvidas, foi um suspiro de alívio. Lembremse: eu tinha um plano de carreira nada comum. Enquanto eu estava lá, escrevendo no jornal piloto, layoutando cartões de visita, catalogando comerciais, meus colegas de faculdade redatores já estavam em agências legais. Eu sempre me perguntava se estava fazendo a coisa certa. Nesse dia, eu tive certeza que sim.


O último estágio como redator. Logo na minha chegada, percebi que aquele era um ótimo ambiente para eu me firmar. A Redatora do Ano estava lá e poderia me dar boas dicas. Por sinal, a Martins daquela época tinha uma cultura de redação, especialmente nos trabalhos de rádio. A agência tinha ido bem em vários festivais no ano anterior e estava num ótimo momento criativo. Ideias mais ousadas eram muito bem-vindas. A criação tinha apenas duas duplas, além dos estagiários. Numa estrutura assim, os brains coletivos são mais comuns. Para mim, era uma grande chance para conferir de perto o processo criativo dos caras mais experientes. A pauta era organizada e os prazos bem razoáveis. Para um iniciante, um sonho. Mas apesar de trabalhar quase na CNTP, o que realmente acelerou minha carreira foi (mais) um festival universitário. Para minha sorte, o júri era formado só por profissionais do mercado. Entre eles, estavam a Keka Morelle e o Gustavo Diehl, então na Dez Propaganda. (Hoje, os dois trabalham em São Paulo e dão aula na Perestroika.) A minha campanha era totalmente all type, diferente dos outros caras, que fizeram ideias visuais rebuscadíssimas. Por sinal, vale a pena contextualizar: na


época, as ideias visuais eram uma febre nas competições de propaganda. O Guga e a Keka gostaram do meu trabalho, pediram para a comissão organizadora o meu e-mail e marcamos uma entrevista. O papo foi bacana e me indicaram para o Diretor de Criação. O cara também gostou e, ao final da conversa, fez uma quaseproposta. Só pediu para eu esperar uma nova ligação, pois ele precisava resolver mínimos detalhes. A Dez era o sonho de consumo de todo estagiário da época. Tinha um perfil bastante criativo e recém havia criado a campanha do Universitário, a mais premiada da história da propaganda gaúcha. A Martins daquela época era muito legal. Mas a Dez daquela época era a Dez. Mesmo sem a confirmação, eu tinha motivos de sobra para acreditar que a vaga era minha. Então voltei para a agência, chamei os meus superiores e já fui avisando que estava de saída. Isso causou um corre-corre. E por um bom motivo (pelo menos, bom para mim): os caras não queriam me perder de jeito nenhum. Então, me fizeram um pedido. Espera até amanhã para dar a resposta. Vamos fazer uma proposta para te contratar. Justo.


Mas vejam só como é a vida. No dia seguinte, antes mesmo de receber a proposta da Martins, recebi uma ligação do Gustavo. Achei que era apenas para confirmar a vaga. Só que era justamente o contrário: ele me contou que os planos tinham mudado. Um atendimento da agência iria receber uma oportunidade na criação. A vaga tinha se fechado para mim. (Curiosidade: tempos depois, descobri que o cara em questão era o Felipe Anghinoni, hoje meu sócio.) No final das contas, a proposta da Martins veio igual. Mesmo sem confirmação da Dez. Mesmo com apenas quatro meses de agência. Fui efetivado, ganhei carteira assinada, ticket, vale-refeição e um belo aumento. E aí, deixei de ser estagiário.


Apêndice: Miami Ad School Muita gente pergunta sobre a minha experiência na Miami Ad School. Então, acho que valem algumas palavrinhas. Na época em que eu fui, os Portfolio Programs só existiam no exterior. Por isso, rolava uma curiosidade maior. Hoje em dia, com a proliferação desse modelo no país (só para citar algumas: Cuca, Lemon School, Escola de Criação da ESPM, além da própria Miami Ad School de SP), essa curiosidade diminuiu. Por isso, não vou gastar o seu tempo explicando tintim por tintim. Confesso para vocês que eu me frustei um pouco. Claro que aprendi muito. Claro que tive ótimos professores. Mas o modelo, na minha opinião, era previsível. E ser previsível é tudo o que eu não espero de uma escola de criação. A MAS ensinava pela tentativa e erro, e não pela instrumentalização. É um método válido, mas que não me satisfazia. Eu pensava: Se essa é considerada a melhor escola de criação do mundo, tem alguma coisa errada. Sonhava com uma escola com aulas realmente diferentes. Mais técnicas e inspiradoras. Foi aí que nasceu o embrião para a Perestroika.


Tiago Mattos,

Diretor da Perestroika Quando convidei outros criadores para que contribuíssem com seus conselhos, percebi que não era uma situação muito confortável. Na verdade, era um puta injustiça. Eu tinha escrito páginas e páginas com o que eu julgava ser interessante. Não tive a difícil missão de filtrar, entre todas as dicas que dei, a mais importante. Já com eles foi bem diferente. Pedi para que dessem um único conselho. Um conselho. O conselho. E ainda dei um briefing cheio de polices. Limite de linhas, prazo apertado e um foco não muito camarada. Por isso, resolvi me colocar na mesma panela de pressão, para ver se eu conseguia me virar tão bem quanto eles se saíram. Pois a minha dica é: tenha um projeto que lhe dê orgulho. O seu projeto pode ser autoral, como está sendo este livro. Pode ser empresarial, como foi a Perestroika para mim. Pode ser filantrópico, como foi o Clube


dos Jovens Criativos, do qual eu fiz parte desde a primeira reunião. O seu projeto pode ser o roteiro de um longa metragem. Pode ser a sua festa de casamento. Pode ser uma viagem de barco ao redor do mundo. Pode ser uma coisa despretensiosa. Pode ser uma busca espiritual. Pode ser o projeto da sua vida. Não importa. Tenha um projeto. Não viva no piloto automático. Tenha um projeto que lhe dê orgulho. Saiba o que você está fazendo e por que está fazendo. E quando você acabar, encontre um novo. E comece tudo de novo. E de novo. E de novo. Essa é a melhor forma de se sentir vivo.


CapĂ­tulo 9

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A Perestroika tem um blog (perestroika.com.br) com atualizações diárias. Ou quase diárias. Lá, a gente discute tudo o que acha interessante. E um dos temas mais requisitados por quem nos lê são os conselhos profissionais. Pensei em colocar aqui todos os posts legais. Mas quando fiz o meu primeiro short-list, percebi que teria um grande problema. Quase todos eram muito bons. Então, tive que tomar uma decisão drástica. E decidi ficar apenas com 50. Sim: o Top 50 do Blog da Perestroika. Reuni aqueles que, na minha opinião, valem a pena ser lidos por alguém que está procurando ajuda no início da carreira. Vale lembrar algumas coisas: Eles não estão organizados por ordem cronológica ou de preferência. Foi absolutamente randômico. Na maioria das vezes, nós não assinamos os posts. Por isso, eles podem ter sido escritos por mim, pelo Felipe Anghinoni ou pelo Márcio Callage. Quando o texto é de um colaborador (czar, coordenador de curso, professor, aluno, amigo, etc.) nós citamos logo abaixo do título. Alguns posts sofreram pequenos ajustes em virtude das imagens e vídeos que não puderam ser reproduzidos aqui.


Sempre tente imaginar o post dentro do seu contexto. Vários textos são antigos e, hoje, talvez sejam menos impactantes do que na época em que foram escritos. Muitos posts foram escritos antes da reforma ortográfica.


QUEREM SABER QUANTO EU GANHO? ENTÃO VOU DIZER. Uma das perguntas mais recorrentes dos alunos é sobre o nosso salário. E eu não vejo isso pelo lado bisbilhoteiro. Acho que, de certa forma, eles nos vêem como ponto de referência. Então, quando perguntam quanto ganhamos, acredito que seja mais pra saber quais são as perspectivas salariais no futuro. Só que tanta gente tem essa dúvida que eu resolvi abrir o jogo. Lendo esse post, vocês vão saber quanto eu ganho. Juro. *** A primeira coisa importante é perceber que grana é só uma parte da nossa remuneração. Além dos benefícios tradicionais, como ticket, vale e plano de saúde, tem muito mais coisa envolvida. Por exemplo: você tem duas propostas idênticas. Mas numa, você vai trabalhar com um chefe legal pra caralho. Na outra, com um pau no cu. Imagino que, em condições normais de temperatura e pressão, todos fechariam na primeira. Por quê? Ora, porque as CONDIÇÕES DE TRABALHO (no caso, o chefe) também contam como salário.


Assim como as condições de trabalho, existem outras coisas que devem ser vistas como remuneração, e às vezes a gente nem se dá conta. (Não listei todos os itens que compõem um “salário”. Só peguei alguns representativos para ilustrar o raciocínio.) O neguinho no início da carreira ganha pouca grana, sim. Mas por outro lado, ganha muito conhecimento. Porque o dia-a-dia o faz aprender com os profissionais mais experientes. E isso é uma forma de salário. Lembre-se: se você paga para aprender sobre propaganda numa universidade, é sinal de que esse conhecimento tem um valor. E numa agência, teoricamente você está recebendo de graça. Dependendo do ponto de vista, o salário de um iniciante na propaganda pode ser considerado uma puta grana. Vejam só.


Muita gente não se dá conta, mas a rede de contatos que você faz quando entra numa empresa é valiosíssima. Se contato não valesse dinheiro, não existiriam palavras como “lobbystas” ou “tráfico de influências”. Ninguém compraria mailings. E por aí vai. *** Com o passar do tempo, você cresce na profissão. Agora, em vez de trabalhar num computador podre, você já tem uma máquina bacana. Agora, você não faz só rodapés: já pega campanhas com rádio e TV. E além disso, você está com carteira assinada, ganhando o dobro do trampo anterior. Ou seja, você está ganhando mais. Certo? Depende. A agência que está pagando mais dinheiro para você só está fazendo isso porque, hoje, você tem uma certa experiência. Tem mais critério. Tem mais conhecimento técnico. E, logicamente, isso faz com que você resolva melhor e mais rapidamente os trabalhos. Mas vejam o outro lado. Como você sabe mais hoje do que sabia ontem, as novidades diminuem. O aprendizado continua, lógico. Mas fica mais lento. Antes, você mal sabia alinhar as coisas. Agora você já entende de combinação de cor, diagramação, escolha de fontes. Os conceitos básicos, que foram úteis


para você antes, agora não são mais. Se não são, sinal de que esse conteúdo você já domina. E se você já domina, não vai pagar por ele. Esse tipo de situação acontece na fase intermediária da carreira. A gente passa a ganhar mais de um lado, mas deixa de ganhar do outro. Veja só.


*** Até que um dia você fica grandão, vai para uma puta agência, ganhando uma puta grana, com contas animais. E agora, você está ganhando mais do que antes? Pode ser que sim, pode ser que não. Tudo depende de como você percebe o valor dessas coisas intangíveis.


*** Por esse raciocínio, a grande maioria das pessoas ganha mais ou menos a mesma coisa. De formas totalmente diferentes, mas com valores semelhantes. Evidente que existem injustiças por aí. Tem cara Tabajara ganhando mais do que deveria, tem neguinho competente ganhando menos do que merece. O mundo não é perfeito. *** Fiquei sabendo que um estagiário da turma 1, depois de ouvir essa minha teoria, fez uma sensacional. Percebeu que o salário dele era uma bosta. Que a agência em que trabalhava só tinha contas fodidas. Mas que ao seu lado, sentava uma estagiária muito gostosa. Ele virou para o lado e falou. “Olha, não me tire pra machista, não me leve a mal. Mas a gente vai ter que negociar umas coisinhas. Você faz parte do meu salário.”


PESSOAS APAIXONADAS SÃO PESSOAS APAIXONANTES. Eu sou um cara megasensível. E muito passional. Talvez, na Perestroika, o mais passional de todos. O que tem o lado bom e o ruim, como tudo na vida. O lado ruim é que fica mais difícil lidar com críticas. Muitas vezes já quero brigar com comentários no nosso blog, com twitadas e com outros percalços naturais do processo de se ter uma empresa, administrar uma marca e lidar com pessoas. Graças a Deus tem o Tiago aqui que sempre faz o contraponto e me faz pensar sobre essas coisas antes de sair tomando atitudes. O lado bom é que fico emocionado com as coisas, com as oportunidades, com os elogios, com as coisas que dão certo e tal. Fico feliz mesmo, arrepiado, com vontade de sair pulando às vezes, chorando outras e, algumas vezes, de sair pela Perestroika andando de cueca - o que de fato já aconteceu algumas vezes. Talvez por isso, tenha me emocionado tanto com o surfe do Romeu no Dilúvio. Sou um cara que se leva pelas paixões. E embora isso tenha tb o seu lado bom e o ruim, ser extremamente racional também tem. E sou feliz assim, mesmo que momentos de tristeza também acompanhem essa jeito apaixonado de viver.


Para mim, viver sem paixão não faz o menor sentido. Trabalhar sem paixão também não. E o resumo do que quero dizer para vocês é esse: persigam a paixão. Na vida, no trabalho e em tudo o que fizerem. ******* Posso dar essa sugestão com a tranquilidade de quem arriscou muita coisa em nome disso. Vejam bem: eu comecei minha carreira na publicidade como atendimento na Dez Propaganda, em 98. E não foi um estagiozinho de 3 meses, como acontece com muita gente. Fiz estágio, em pouco tempo, fui contratado como assistente. Passei 3 anos e meio no atendimento. Era uma jovem promessa, que cresceu rápido na agência. Eu tinha 22 anos e era o segundo atendimento da agência na época. Mas eu não tava feliz. Pedi demissão e decidi que ia para a criação. Fui absorvido na própria Dez, como estagiário de redação, ganhando 8 vezes menos do que ganhava como atendimento. Na criação, fui contratado 3 meses depois. 9 meses depois, fui o Redator do Ano do Prêmio Colunistas. Depois sai e fui trabalhar na Paim como redator. Em 2005, logo depois da conta da Renner ter ido para a Escala, assumi a área de Novos Negócios da Paim, deixando a trajetória de redator publicitário para trás e assumindo uma rotina ligada a prospecção, gestão de projetos e planejamento.


Um ano depois, nova guinada: virei Diretor de Criação da Paim. Tinha 28 anos. Era uma coisa bem fora do normal uma pessoa dessa idade estar numa posição dessas numa das 5 maiores agências do estado. Uma situação bem confortável, digamos assim. Bom, eu não tinha nem 4 meses como DC e fui convidado para trabalhar na LiveAD, uma empresa que eu nem sabia o que fazia. Mas segui totalmente meus instintos - porque a razão talvez mandasse eu ficar. Menos de 2 anos depois de assumir a Criação da LiveAD, larguei tudo para me dedicar exclusivamente à Perestroika, que ainda estava engatinhando, sem nenhuma garantia que daria certo, e ganhando significativamente menos do que lá. Em todas essas mudanças, eu sempre tive medo. Foi um trabalho árduo dos meus sentimentos tentando convencer minha razão de que era a coisa certa a fazer, o que é mais difícil que o contrário (a razão convencendo os sentimentos). Mas nunca consegui jogar para debaixo do tapete o que o meu coração (ui, que gay) dizia para fazer. E em todas, absolutamente TODAS as mudanças, eu nunca me arrependi. Sempre fiquei mais feliz. Que na real é o que importa. ******* Tá: para não parecer que tudo foi tão perfeito, teve uma vez que eu fiquei um tempão numa empresa sem amá-la mais. Tipo todas as células do meu corpo


diziam que eu não tinha mais que estar lá. Menos o meu cérebro. “O que tu vai fazer?” “Tu vai arregar?” “Se tu sair, tu vai assumir o teu fracasso.” Na real, eu queria racionalmente vencer aquela situação. Não queria pecar por omissão, por falta de tentativa. E fiquei um bom tempo (mesmo) nessa empresa. Claro, no final o fato de eu ter ficado lá me gerou muito aprendizado. Mas quando finalmente eu sai, tive uma puta sensação de alívio, de libertação, de felicidade. E fiquei me perguntando por que não tinha saído antes. Isso também foi aprendizado. ******* Hoje, eu sei que dá para ser feliz fazendo o que se quer fazer. Vivo isso na Perestroika todos os dias. Cada trabalho, cada novo projeto, cada novo curso é um puta tesão. Muita vontade de se envolver, de mergulhar, de se entregar. E quando a gente se entrega, não tem problema ter que trabalhar todos os sábados, não tem nada de errado acordar às 8 da manhã de domingo para fazer reunião. O amor é cego. E o mais legal é que a recompensa é o próprio processo de trabalho. Muita gente não se dá conta disso e fica se focando no trabalho final, na execução final, no filme pronto na formatura. Mas o processo criativo - uma das poucas coisas que absorvi do curso do Charles


Watson - deve ser um processo auto-télico, onde encontramos e focamos o prazer no processo, e não no ponto final. Em outras palavras, o caminho é a viagem, não o lugar de chegada. A gente vê que os alunos que mais se puxam, mais se empenham, mais nos impressionam, são os mais apaixonados. Pela Perestroika. Pelo projeto que estão fazendo. Pela vida, como é o caso do Romeu. O Tiago já escreveu um post muito legal nesse blog sobre as recompensas que se obtém no trabalho. Eu acho que a paixão é uma das recompensas da vida. ******* Tem outra coisa que eu acho que torna todo esse discurso mais relevante ainda que é o seguinte: a gente trabalha com criação. Ou pelo menos com o processamento de um monte de informação, conteúdo e estímulos que recebemos para a formatação de um produto criativo. Seja ele comercial, experimental ou autoral. Eu particularmente acredito que a sensibilidade necessária para identificar esses estímulos, essas vibrações vêm da paixão. Uma vez li em algum lugar uma história do Lupicínio Rodrigues sobre as várias mulheres que ele teve, e o sofrimento que a paixão não correspondida ou traumática que algumas desses romances geraram


nele. E ele disse algo, que não foi bem isso, mas que é mais ou menos por aqui: ele não se arrependia de ter se apaixonado e ter se entregado em todos esses casos, mesmo para as mulheres que mais fizeram ele sofrer. Porque as que mais fizeram ele sofrer foram as responsáveis pelas melhores obras dele. Felicidade, tristeza, emoções forte enfim são combustível criativo. Vejam o Vinícius de Moraes. O cara foi foda na produção cultural e artística brasileira. Foi um cara que se apaixonou muitas vezes. Casou 9, só para a gente ter noção. Porra, era um cara que acreditava no amor. E provavelmente, na paixão. ******* A razão é muito importante, é claro. Pensem, racionalizem. Mas lembrem-se que a razão nos deixa seguros, e nos deixa brabos. O que nos deixa feliz ou triste é emoção. Planejar, projetar, pensar é bem racional. Mas a paixão é que vai a gente ir lá e fazer. Vão lá e faça. Se apaixonem. E, de vez em quando, deixem se levar pelas paixões. Acho que vocês vão concordar comigo que vale a pena. Beijos, Felipe


OLHE PARA FRENTE. NÃO OLHE PARA O LADO. Há um tempo, eu ouvi falar de um estudo sobre felicidade que eu achei fantástico. Inclusive, sugiro que você faça o teste antes de ler o resto do post. O entrevistador conversava com os funcionários de uma determinada empresa, um a um, separadamente. E pedia que eles apontassem qual situação faria deles pessoas mais felizes. 1) Você prefere ganhar um salário de 100, sendo que todos os seus colegas ganham 150. 2) Você prefere ganhar um salário de 150, sendo que todos os seus colegas ganham 200. *** Segundo o estudo, a maioria optou pelo primeiro cenário. Mesmo que no segundo, a pessoa tivesse uma renda maior. A tese do cara é que a nossa noção de felicidade está diretamente relacionada à comparação. Você tem que olhar para o lado e ver uma situação pior que a sua. Só assim as pessoas (ou, pelo menos, a maioria delas) se sente realmente feliz. Isso talvez justifique várias manifestações da nossa sociedade. Como a gangorra do futebol, a popularização das fofocas, a grande audiência das tragédias e dos programas sensacionalistas, etc, etc, etc.


*** Eu fiquei bem surpreso ao saber do resultado. Quando me perguntaram, respondi de bate-pronto. “Óbvio que eu prefiro ganhar mais!”. Provavelmente, muito em função de uma crença que eu tenho. Olhe para frente. Não olhe para o lado. O que, em outras palavras, quer dizer: o importante é você buscar as suas próprias metas. Sejam elas relevantes ou não para os outros. *** O fundamental desse conceito é entender que você deve simplesmente ignorar aquilo que não influencia a sua vida. Mas ficar atento para o que influencia. Por exemplo: trabalham no mesmo departamento você e o João, um cara chato, vagabundo e incompetente. Se o João receber um aumento, e esse aumento não tiver relação nenhuma com o seu salário, isso não afeta em nada a sua vida. Bom para o cara. Agora, se o João receber um aumento, e esse aumento influenciar em todo o planejamento financeiro da empresa, de forma que você não seja promovido justamente por isso: bom, aí o furo é mais embaixo. ***


Na Perestroika, nós temos os Indicados. São os alunos que nos impressionaram pelos trabalhos e pela postura. Ao final do curso, nós montamos uma espécie de carta de recomendação, e enviamos para todos os diretor de criação do RS. Com os nomes dos indicados, os contatos e o nosso parecer. Para alguns alunos, isso é importantíssimo. Além de todo o conteúdo, eles querem fazer parte desse seleto grupo. Querem ser referendados pela Perestroika. Para outros, isso não tem moral nenhuma. Eles estão mais interessados no aprendizado em si. Alguns já dizem no primeiro dia de aula: “Eu não vou fazer nenhum tema e não vou me sentir culpado.” Acho isso o máximo. Mas acho o máximo quando é um sentimento verdadeiro. Não um sentimento comodista de “até queria ganhar, mas não vou entrar nessa barca porque tenho medo de perder”. *** É comum, ao final do curso, algumas pessoas nos procurarem, dizendo que acharam que o curso ganha um certo clima de competição nas últimas semanas. Muito em virtude desses alunos que buscam a indicação e se puxam para caralho. Ficam comparando os seus trabalhos com os colegas. Acho esse o clássico exemplo do cara que olha para o lado. Pense comigo:


- Não existe um número fixo de indicados. Se o cara se dedicar e nos impressionar, vai ganhar a sua vaga. Ele não concorre com ninguém, a não ser consigo mesmo. Então, essa competição é só uma paranóia. - Se o aluno está indiferente à indicação, não tem por que se contaminar com esse clima de competição. Basta ficar frio. Inclusive, se ele se deixa contaminar, se ele se afeta por isso, é um indicativo de que ele não estava tão indiferente assim. *** Certa vez, uma aluna me procurou no MSN, e tentou entender os critérios que a gente tinha usado para indicar determinado ex-colega. Eu expliquei para ela que, se ela queria ser Indicada, ela tinha que pensar sobre o que ELA tinha feito. O que ELA podia melhorar. E não se preocupar com o que eu achava dos outros. *** Eu sou um cara bastante competitivo. E não acho isso ruim. Porque sou competitivo olhando para frente, não olhando para o lado. Gosto de estar na fatia de cima da pirâmide. Mas na medida do possível, não me preocupo muito com o que os outros estão fazendo. Vou dar um exemplo bem ilustrativo que aconteceu na minha vida:


Eu queria ser Redator do Ano. E quando fui, não fiquei preocupado se os outros redatores do mercado estavam produzindo coisas boas ou não. Se os outros redatores da agência estavam recebendo jobs melhores que os meus. Se estavam fazendo fantasmas. Eu simplesmente baixei a cabeça e produzi o meu melhor. Via em cada pit uma oportunidade de emplacar um trabalho legal. Não produzi um único fantasma, uma única campanha filantrópica, uma única peça de caráter duvidoso. Tudo o que fiz foi pelas vias normais. E deu certo. Porque se eu fizesse o meu melhor, eu não poderia me sentir culpado numa eventual derrota. Pô, eu fiz o meu melhor! *** Agora que está começando um novo ano, aproveite e pense um pouco sobre isso. O que você realmente quer para 2009? O que vai fazer você feliz? Se na hora do amigo secreto o seu par de meias for mais feio que o do seu primo, não dê bola.


FOI LÁ E FEZ Eu tenho a impressão que quanto mais tempo a gente leva pensando, menos tempo a gente se envolve fazendo. Claro, pensar e planejar é importante, nem vou entrar muito nesse mérito. O que diferencia o ser humano de todos os outros animais é justamente a capacidade de raciocinar. Mas, talvez, o que diferencie uma pessoa de todos os outros seres humanos seja a capacidade de realizar. Já vi muito departamento de planejamento de agência, e às vezes a agência como um todo, gostar de ficar intelectualizando, questionando, ruminando, pensando e repensando. Uma punheta mental que às vezes até gera um trabalho bem esclarecido, bem defendido. Mas que nunca funciona muito quando colocado em prática. Se até as regras da física que a gente aprende no colégio são para abstrair e não funcionam na prática como nos livros, imagina no universo da imaginação e criatividade, onde as bases são bem mais subjetivas e abstratas. Acho que se o Ronaldinho pensasse muito, não tentaria fazer os dribles maravilhosos que ele faz. Quem pensa muito, não pula na piscina porque a água tá fria. Quem fica pensando muito, sempre pede mais uma cerveja antes de chegar na mulher que já tá encarando há mais de 10 minutos. Só pra ver um outro filho da puta chegar e levar a mina (é só um exemplo, não que tenha acontecido comigo). Se tu parar


pra pensar em todas as conseqüências possíveis, provavelmente tu não vai entrar vestido de vaca numa sala de aula. Se tu parar pra pensar, já tem tanta faculdade de comunicação e publicidade, ninguém vai querer fazer a Perestroika. Se tu parar pra pensar, vai ver que todos os teus projetos geniais ficam guardados na gaveta porque no fundo tu tem medo do que pode dar errado. De tentar fintar e perder a bola. De tomar um fora. De os alunos te tirarem pra trouxa. Mas a grande verdade, a grande verdade que eu acredito, pelo menos, é que a linha que separa a genialidade do fiasco é muito fina. Muito tênue. E que as poucas pessoas que se arriscam a andar em cima dessa linha, podem cair pros dois lados. Mas passar um pouco de vergonha ou de frio não é nada perto da recompensa de ser realmente genial. Lembrem-se que até mesmo os grandes pensadores também tinham que ser grandes escritores. Pense nisso. Mas só um pouquinho, tá?


O GRANDE INIMIGO DA INOVAÇÃO Se tem coisa que qualquer neguinho que queira trabalhar com atividade pensante, criativa e inovadora precisa é tempo. É fundamental ter tempo pra se envolver em todo o negócio da propaganda (no caso do mercado publicitário, óbvio), ler os jornais e revistas do setor, conferir o post do blog da Perestroika, acessar o BlueBus ou Brainstorm 9, passar o olho numa Archive, devorar um anuário, conferir a última campanha da Levis no YouTube, ver o DVDs da Shots com as apostas de Leão para Cannes. Precisamos, sim, ter tempo para isso. Ok. Deveria entrar na pauta de trabalho, inclusive. Só que a página inicial do Safari (tá bom, Felipe, Firefox) de qualquer cara que pretenda fazer alguma coisa original na vida deveria dizer: tempo livre, tempo livre, tempo livre, tempo livre, nunca esqueça, tempo livre. E este post é sobre isso. Precisamos ter tempo pra passear com o cachorro. Pra ir no cinema ou passar a noite beijando. Pra almoçar na casa da vó no final de semana e rir o tio bêbado caindo na piscina. Ouvir muita música, ir a um museu ou exposição de fotos. Praticar uma luta ou esporte.


Precisamos ter tempo pra tomar um chimarrão na praça, pra jogar bola e para o churrasco semanal com os amigos que só falam de mulher e cerveja. Tudo isso é produtivo pra caramba, não se engane. Nem se culpe por isso. É ótimo passar uma noite toda num bar e descobrir o sol nascendo, ir pra praia na quinta-feira, do nada, enquanto todo mundo está se quebrando na cidade. Como é bom quando nos pegamos conversando com o guarda da esquina ou com o gordo do ônibus como se não tivessemos mais nada pra fazer. Papo com taxista é rico e pensar que imagem uma nuvem está formando no céu também é um passatempo digno de quem não tem compromisso com mais ninguém que não consigo mesmo. Dedique tempo a isso. Pois são essas coisas que um dia virarão idéia. Está tudo na sua vida, na forma como você enxerga e processa isso. Quanto mais rico você for, mais valioso, exclusivo e único será o que sai de dentro de você. Sem falar que fazemos propaganda para todos os tipos de pessoa e não apenas publicitários. Isso quer dizer o taxista, a sua vô, o guarda e até o seu tio. Sim, aquele bebum, ao menos cerveja garanto que consome. Então além de estar abrindo a cabeça para novos insights, você também está estudando o brasileiro.


Sim, porque só quem cresceu e se deu bem mesmo com a correria dos executivos das empresas e publicitários e essa “vida para o trabalho” foram as empresas de pesquisas. Porque agora precisamos deles para nos trazer informações da rua, insights e referências. Então, gurizada do barulho, uma coisa é bombar trabalhando, se mostrar sempre a disposição pra ajudar, entender que existem fases e fases, se esforçar de verdade e tal, e outra, bem diferente, é achar esse é o caminho pra ser punk. Isso faz parte, mas cuidado: você está empobrecendo.


ESQUIZOFRENIA DA MARCA Numa das aulas para a galera de criação digo que todas as marcas têm sua personalidade: as suas verdades e caminhos legítimos. Nosso trabalho é contar isso para o consumidor de maneira que chame sua atenção, sempre que preciso, em todos os meios de contato que tivermos com ele. Assim como no ser humano, toda marca/empresa também tem uma personalidade. Ninguém CRIA OU ENCONTRA isso. O que fazemos é passar a conhecer. Ficamos íntimos da marca e passamos a saber mais sobre ela. Tudo simplifica. É como comprar um presente bacana: se você conhece a pessoa tem muito mais chances de dar algo legítimo, que combine com ela, do que se conhece pouco. Entender bem a empresa, a marca, o mix de produtos, as pessoas que trabalham e cada papel, a cadeia do negócio e o consumidor, é fundamental para qualquer um que queira fazer um bom trabalho. Só assim se consegue somar os talentos na hora do processo e chegar a excelência no trabalho que for desenvolvido. Porque uma marca se transforma, evolui, claro, mas não pode mudar de direção a cada campanha, ou ação. Ou estação. Ou pela crise. Em razão da tendência, do humor do diretor de marketing ou a ânsia da agência nova de mudar, simplesmente porque precisa colocar a sua cara no trabalho.


Isso é a Esquizofrenia das Marcas. Falei isso em aula, os alunos riram e eu gostei do termo. Explicou tão bem o que quero dizer que falei de novo na reunião estratégica de Olympikus que fizemos na semana passada pra definir alguns caminhos e rumos para a marca. Os discursos PRECISAM NECESSARIAMENTE SE SOMAR. Este é, talvez, o pecado mais cometido pelos anunciantes brasileiros hoje, parem para pensar. E como se fala pouco disso. Sem verdades, a comunicação fica vazia. Fútil, boba, ingênua. O investimento do passado ou atual não soma pro futuro. Acaba ali. Não rende. ZERO. É pior, até, que essa nova taxa da Poupança, que o Lula anda falando. Por mais que seja compratilhada, a responsabilidade, em última instância, é do anunciante. É quem brifa e quem aprova. É ele que precisa ter a noção do todo, e enxergar, a partir de tudo que é feito na empresa, a personalidade da marca na parte do trabalho que é feito pela(s) agência(s), que é a ponta do iceberg. A parte mais visível. A imagem da empresa na rua, seja na TV, numa convenção, no PDV, na promoção ou na megadoidaultrahypada ação de internet. Construção de marca é algo que se faz tijolo por tijolo. Ano após ano, a cada vez que se conversa, de alguma forma, com qualquer um que se relacione com ela.


É por isso que a Coca-Cola é o que é. Anos realizando ações de acordo com a sua personalidade. A Apple: Think Different “só” é um conceito genial porque traduz perfeitamente a proposta da marca/ empresa. Imagine só: “Microsoft. Think Different”. Não, né?! Não adianta buscar a verdade no consumidor apenas, para encontrar algo pra comunicar. Isso, de maneira profunda, já deveria ter sido feito para a concepção do negócio, da empresa ou do produto. Mas é macro. Se não houver legitimidade, é falso. É um blablabla. Toda marca e todo produto tem uma história. E é disso que o consumidor -pessoas- precisam. O mundo está carente de legitimidade. De um pouco mais de verdade nas relações. Basta criar o melhor jeito de contar essas histórias. As marcas que entregam isso tem mais chances de ter, em troca, a tão sonhada fidelidade do consumidor. E este é o grande tesão.


O FRITADOR DE HAMBÚRGUERES. Cada vez mais eu acredito numa coisa. E cada vez mais, eu acredito que é essa coisa que diferencia os bons criadores. É a disciplina. Por mais contraditório que isso possa parecer. Eu sinceramente acho que, se nós pegássemos qualquer departamento de uma agência de propaganda (atendimento, produção, mídia, etc.) e colocássemos na criação, e treinássemos durante alguns meses essas pessoas, o resultado seria surpreendente. Chegar em boas ideias não é difícil. Pensar em porralouquices não é difícil. Estou convencido disso. Quanto mais estudo o processo do brainstorm, e como as ideias surgem, mais eu me impressiono. O brain é só um processo. Que qualquer um pode seguir. O que talvez facilite a nossa vida (nossa = criadores do departamento de criação) é a personalidade das pessoas que vão para a Criação. Porque, em geral, nós temos traços que FACILITAM o processo de brainstorm. Como (só para citar dois exemplos) a desinibição e a sensibilidade. Mas se uma pessoa qualquer decidir treinar essas características, e investir tempo e energia exercitando (de novo, só para citar dois exemplos) a desinibição


e a sensibilidade, eu acredito, sinceramente, que o resutado não será muito diferente do que temos hoje no dia-a-dia de uma agência. Parece loucura. Mas eu juro que acredito nisso. Daí, você pode dizer. “Tiago, você realmente acha que um atendimento criaria um bom título? Que uma mídia pensaria numa ideia visual bacana?”. Sim, acredito. Com alguns meses de treino e muito disciplina por parte do cara, acredito pra caralho. Daí, você pode insistir: “Mas Tiago, você acha que eles vão conseguir criar aquelas ideias inusitadas, que a gente fica morrendo de inveja?”. Aí eu não sei. Ao mesmo tempo, eu não sei quantas ideias realmente inovadoras e inustitadas um departamento de criação produz por ano. Aquelas ideias que a gente diz: QUE COISA NOVA! Porque se formos realmente críticos com os nossos próprios portfólios, vamos ver que a maioria absoluta do que fazemos são fórmulas. São padrões. Até as peças que criamos exclusivamente para para festivais. Eu olho para os anúncios (estou falando só dos anúncios!) que criei e nada do que eu fiz fugiu de quatro padrões:


- Ideia visual - Anúncio de título - Anúncio de texto - Anúncio interativo Será que isso é ser INOVADOR? Na época em que eu fiz, achava que sim. Hoje, com um distanciamento (de tempo, e até do ambiente de agência), estou bem mais inclinado a achar que que não. Claro, eram boas peças. Boas soluções para os problemas do cliente. Mas não dá para dizer que eram coisas novas, inovadoras, revolucionárias. É muita pretensão achar isso. *** Vocês já ouviram falar do Faking It? É um reality show antigo, que passava na TV inglesa e era reproduzido por alguma canal a cabo aqui do Brasil (acho que era o Multishow). A moral era a seguinte: eles pegavam um profissional X e o treinavam durante um mês para executar uma atividade diferente da que ele fazia anteriormente (ex: um tosador de ovelhas viraria cabeleireiro). No final, outros três profissionais (no caso, outros três cabeleireiros) passavam pelo crivo de um júri, que avaliava o desempenho dos quatro. Então, o júri era comunicado que havia um impostor infiltrado. Na maioria dos casos, o júri não acertava quem era o picareta.


Tipo, um vigário virava vendedor de carros usados. Um bailarino virava lutador de luta-livre. Um fritador de hambúrgueres virava chef. Um pintor de casas virava pintor de quadros (e hoje ganha uma puta grana como artista plástico). Você acha que o programa encontrou talentos em meio à multidão? Que foi sorte? Que foi uma chance em um milhão? Eu prefiro acreditar que foi só disciplina, foco, treino. Veja esse trecho de um cantor punk que se tornou maestro. (http://www.youtube.com/watch?v=RIKnh716MnQ) Tudo bem, tudo bem. O cara não virou um maestro. Ele regeu apenas uma música, uma única vez, OK. Mas é suficiente para comprovar a teoria. Ou, no mínimo, para nos deixar uma pulga atrás da orelha.

*** Toda essa longa introdução é para dizer o seguinte: a gente, na Criação, tem uma tendência a achar que somos insubstituíveis. Quando chegamos num determinado patamar, simplesmente relaxamos. Achamos que o nosso talento, que o nosso histórico, é suficiente para nos garantir uma cadeira e um computador. Não, não é.


Qualquer um pode nos substitutir. A dupla mais jovem. O estagiário que recém entrou. Ou o estudante, que ainda nem foi contratado pela agência. É só um processo. É só treino. É só foco. E essa é, na minha opinião, a principal razão pela qual os profissionais de mais de 30 anos no RS somem, desaparecem. Depois de um certo tempo, falta aquele tesão. E aí, vem o fritador de hambúrgueres e rouba a vaga do chef. Certa vez, criei com o Rafa uma campanha para o Salão da Propaganda que dizia: Você é tão bom quanto o seu último trabalho. Nem achava a ideia tão legal, mas o conceito eu realmente curtia. Se nos dermos conta que um fritador de hambúrgueres pode virar chef, em apenas um mês, nós vamos nos dar conta que somos extremamente vulneráveis. A não ser, é claro, que a gente continue fazendo coisa boa. Todos os dias. Esse foi um dos principais motivos para eu vir para a Perestroika. Recomeçar do zero, numa função onde você não sabe nada (no caso, eu não sabia nada sobre “administrar uma escola”), é a melhor forma de não deixar a vaidade nos detonar.


FALANDO DO NEGÓCIO. Sei lá por que, mas tenho a sensação que a maioria das pessoas que trabalha com o assunto propaganda/ comunicação está mais interessada em direcionar seu ciclo de aprendizado e conhecimento para a função em si, do que em saber em que indústria, tipo de negócio, está envolvida. Me explicando, acho que a proporção entre o tempo que a grande maioria fica vendo “cases/campanhas de marcas de sucesso” X “cases de EMPRESAS de comunicação/mkt de sucesso”, POR EXEMPLO, é absolutamente desproporcional. Quase 100 pra 1, chutaria. Não deixe isso só para os acionistas. Ou você nunca vai ser um. Surge uma puta agência em Nova York. Os mais antenados logo descobrem todos os cases que serão premiados no próximo Festival. Ótimo. Mas poucos se interessam em pensar, imaginar, buscar saber, COMO FUNCIONA essa agência. Qual o processo para tanto trabalho criativo. Como foi passado o briefing ou quanto pagaram por aquela idéia? É um ser que cria tudo? Estão fazendo alguma coisa diferente? As funções são as mesmas? Fluxo de trabalho? Dupla de criação, planejamento, atendimento, tudo igual? A preocupação em ser o melhor atendimento, planejamento, criativo, mídia, produtor, músico, diretor, fotógrafo, editor, buscando conhecimento e conteúdo sobre este trabalho exato faz com que poucos se


preocupem com o que não é conhecimento específico da função. Nossa indústria está se especializando em formar mão-de-obra e não líderes. A má notícia é que a indústria somos nozes. E a maioria ganha mal. A maioria trabalha mais do que gostaria. A maioria não viaja todo o ano pra fora, não mora num apê grande ou faz muitas extravagâncias. E se a maioria não entende do negócio, a maioria também não tem foco. Entende bem da sua função, talvez tenha técnica, mas não entende completamente o que faz dentro do todo. Deve ter energia demais colocada para alguns assuntos e de menos pra resolver outros mais importantes para o negócio. Ou tem a mesma energia pra tudo, já que não sabe priorizar, e isso é FATAL até pras suas madrugadas na agência. Essa briga louca pelas premiações em geral, pode ser exemplo. A maioria distorce, através do que é premiado, o foco real que deve ser o trabalho de uma agência. O trabalho de uma dupla criativa. O negócio é outro, são mundos pararelos. Clientes precisam de mais e muitas agências não estão entregando. Continuam engessadas num modelo antigo. Tem outras maneiras de valorizar os profissionais e mostrar a direção do negócio. Festival pode existir, mas não precisa ser o único jeito de fazer a turma feliz. Digamos que fosse oferecerido um bônus pra equipe por cada idéia NÃO BRIFADA PELO CLIENTE e APROVADA. Isso: um percentual do faturamento


não-previsto indo direto pra equipe. Não ficariam todos mais focados? A galera não ia curtir ganhar R$15.000/R$20.000 a mais no fim do ano, por mérito, independente se é estagiário, júnior, mídia, produção, guardinha? Ou pra agência é melhor que o cara use todo o tempo livre pra criar um anúncio para uma ONG, sem objetivo real de ajudar? E que o resultado continua valorizando de verdade MEEEEESMO apenas a dupla, sem olhar, de novo, para todo o processo, para toda equipe. Vivemos o mesmo modelo de agência e mercado dos anos 50. Odeio repetir isso. Enquanto TUDO que surgiu desde 1950 evoluiu: TV, carro, internet, celular, etc. Entender as engrenagens, o ciclo todo desta indústria, as necessidades, onde está o dinheiro, é entender de mais oportunidades. É só abrir a cabeça. Tem gente que sabe disso e está aproveitando. Mas são poucos. Sábado começam as aulas. Senti saudades da função.


VOCÊ É O SEU PATRÃO.

Mesmo que não diga em nenhum lugar que “Tomás Lorente teve um ataque do coração por causa do stress”, o evento em si é chocante. E, naturalmente, desencadeia uma velha e inevitável discussão*. Tenho certeza que essa morte fulminante vai repercutir por todas as empresas do mercado publicitário. E vai servir para defender aquela tese de que “temos que trabalhar menos e não se estressar por qualquer coisinha”. Pode apostar: vai ter agência por aí dando discurso, dizendo que “a partir de agora, a nossa política é outra, queremos que os funcionários tenham mais qualidade de vida”. Aí passa um, dois, três meses. Entra uma campanhona. Entra uma concorrência. Entra uma prospecção.


E, quando o pessoal se dá conta, está tudo igual de novo. E é natural que isso aconteça. O ritmo do mercado publicitário é um, e ele não vai mudar. Nem com a morte do Tomás Lorente, nem com a morte de ninguém. Eu já vi muitos movimentos (todos eles louváveis, diga-se de passagem) para organizar o mundo da propaganda. Mas todos deram na trave. Já perdi as esperanças. *** Vou repetir uma coisa que defendo insistentemente: Vejo muita gente reclamando que “trabalha demais, esse nosso mercado é insano”. E, pensando racionamente, até é. Mas é uma escolha sua fazer parte desse jogo. Não conheço ninguém que foi contratado com uma arma na cabeça. Já pensou, o cara do RH apontando um treis-oitão para você? Trabalhe aqui ou eu te mato! Se você quer fazer parte de uma empresa X, e essa empresa X exige que você trabalhe que nem um cavalo: pense com carinho antes de dizer sim. Ou peça demissão quando encher o saco. Não faça parte do jogo se você não concorda com as regras. Por outro lado, se você não vê problema nenhum em trabalhar para caralho, e fuder com a sua saúde, ótimo. Se você se realiza morrendo aos 47 anos de


ataque do coração, mas com 15 Leões no portfólio: seja feliz, negão. Eu acho autoritário quem defende que abrir mão do sucesso profissional para ter mais qualidade de vida é a única solução correta. Para uns, é. Para outros, não é. E quem acha que não é, não deve ter vergonha de dizer: “Eu quero morrer com 47 e foda-se o que vão pensar”. Moral da história: você manda na sua vida. Você é quem decide se vai trabalhar num lugar onde tratam você como escravo ou não. Você é quem decide se vai chegar cedo em casa ou não. Ninguém é obrigado a trabalhar no lugar da modinha, na agência que todo mundo considera legal. Se você quer qualidade de vida, é só ir para uma agência pequena, onde o ritmo é mais tranquilo. Só não fique lamuriando que “eu não faço nada legal e meus clientes são uns idiotas”. Se você prefere ter mais visilidade do que saúde, não tenha vergonha de assumir isso. Só não fique reclamando que “esse lugar é foda, fim de semana é dia de semana”. Você é o seu patrão. *** Eu, quando assumi a Perestroika ao lado do Felipe, tinha em mente uma empresa que contemplasse o melhor desses dos dois mundos. A gente quer ter alto desempenho, mas quer viver bem. Talvez seja uma


filosofia meio utópica. Talvez não dê certo e a gente tenha que optar. Até agora, as coisas estão equilibradas e indo bem. Agora, não foi fácil. Tive que abrir mão de muita coisa e correr muitos riscos para conseguir jogar o jogo com as regras que eu acreditava. *** Só pra fechar: vale lembrar que Tomás Lorente era um cara muito, mas muito foda. Como Diretor de Arte, como criador, como Diretor de Criação e como empresário. É uma puta perda para o nosso mercado. Se vocês procurarem na internet, tenho certeza que vão encontrar muitos trabalhos memoráveis do cara. *** *P.S.: Valeu pelo comment, Rech.


O TEMPO. Certa vez li que o homem vai ter que voltar ao campo para resgatar a noção de TEMPO. Adorei a teoria e acho mesmo que faz bastante sentido. Cada vez mais, a angústia por chegar o mais rápido possível ao fim acaba atrapalhando, pra não dizer atropelando, o caminho. O meio. E a gente acaba não admirando a paisagem. E não percebemos que a vida é feita mais de durantes do que de finais. É o caminho que preenche a vida. Bom, e eu com isso? – Alguém aí se perguntou. É que eu tava contando essa história pra um amigo, que anda angustiado com a grana que não vem, com o reconhecimento profissional que não chega, e isso caiu muito bem pra ele. E agora virou post. Quando tinha meus 21/22/23 anos (tenho 30 hj), sacrificava um final de semana na praia por qualquer anúncio que pintasse na pauta. Eu e o Perottoni gostavamos pra cacete do que fazíamos, mas carregávamos com a gente também a sensação de que estavamos numa corrida maluca. Juntando A com B, o resultado era que, no verão, trocavamos quase todos finais de semana na praia pelo ar-condicionado da agência.


Ganhei muito pouco com isso, na real. Troquei um bronze na praia, por um no Salão que, sinceramente, não mudou NADA a minha vida. Mas o verão passou. O processo de aprendizado e amadurecimento na propaganda é muito maior do que se pensa. MUITO MAIOR. Tem gente nova DEMAIS nas agências, fazendo MUITA coisa ruim que tá veiculando, cliente aprovando, etc. Então, se você compara, pode até se iludir a achar que já sabe. Mas não se engane: são poucas agências e profissionais no estado que hoje realmente estão CONSTRUINDO MARCA, gerando negócios através de IDÉIAS E SOLUÇÕES RELEVANTES. Você precisa de vontade, tesão e dedicação. Siiiiiim. Mas você precisa também saber esperar. Fazer e repetir muito, sem achar que o resultado vem logo ali. Comemore as pequenas vitórias. São anos de trabalho pra construir a sua história, formar opinião, testar caminhos. É uma prova de longa distância e não de 100 metros. Moral: não são os finais de semana ou madrugadas desnecessárias que vão fazer a diferença. Claro que, quanto mais horas em cima de um problema, antes ele vai ser solucionado. Pra ser bom, tem que trabalhar, sim. Ralar, exercitar. Mas existe uma equação. Um fator externo. É o tempo dedicado X o tempo de amadurecimento mesmo. Tem um limite. Mágica não existe.


Se eu tivesse me dado conta disso, talvez não tivesse feito nada muito diferente, na prática. Eu realmente gosto de trabalhar. Mas dentro de mim, ao menos, talvez tivesse carregado menos angústias. Não fui pra forca. Nem teria ido se tivesse deixado a linha um pouco mais solta. Estaria aqui, no mesmo lugar. E talvez tivesse aproveitado um pouco mais o caminho. Alguns churras a mais com os amigos, ao menos. Precisamos saber andar em outra rotação que não seja a mais alta. E a história da volta ao campo conta um pouco disso. A teoria diz que o homem só vai voltar a entender que a natureza, a vida, a história, tem um tempo, um ritmo, quando ele voltar a plantar árvores. E perceber que ela não cresce da noite para o dia. Não existe velocidade de conexão mais rápida, adubo, terra, semente que possa fazer uma árvore brotar e se desenvolver em 3 meses. O tempo é rei.


WALL STREET E O ANO QUE NASCE. Não sou um cara religioso. Não tenho conhecimento de astrologia ou posição lunar. O tarô, as cartas, búzios, nada disso acabou influenciando alguma decisão minha na vida. De supertição mesmo, lembro de uma: o ano novo. Podemos começar tudo sempre, a qualquer momento. Evidente. A desculpa de que hoje é domingo, vou começar a correr na segunda, é esfarrapada. Mas, ao menos pra mim, a virada do ano é punk. Como faço aniversário 28 de dezembro, vira tudo um bolo só. E o momento se torna realmente especial. No dia-a-dia, brinco que vivo muito num close, em planos fechados, vivendo o momento, o detalhe, o desafio. E uso a virada do ano pra rodar um plano aberto. Ver de cima, e enxergar a cena toda. É o momento em que, de uma maneira não tão racional quanto parece quando escrevo, faço um geralzão: um balanço do que rolou, e o que quero daqui pra frente. O que vou deixar na lata de lixo e o que quero carregar junto comigo. Raramente acerto sobre o futuro (se acertasse, seria tarólogo). Não vivemos só do que existe dentro de nós. O mundo conspira. Coisas acontecem. Existem reflexos externos inesperados para as nossas atitudes. E não temos bola de cristal. Sem falar que tem sempre um filho da puta em wall street aprontando alguma coisa. Mas no fim das contas, o ano sempre


foi mais bacana do que planejei. 2008 foi assim. 2009 também vai ser. Desejo isso pra mim, e desejo isso para cada um de vocês. Feliz 2009. E obrigado a todos que ajudaram a fazer meu 2008 tão bacana: alunos, sócios, professores e amigos.


GURIZÃO-TIOZINHO. Fui convidado pela ESPM para participar da 3a. Noite de Prêmios, que rolou ontem lá no Juvenil. Para quem não conhece, esse evento é uma espécie de Salãozinho da Propaganda, apenas para consumo interno. Quem lê isso talvez imagine um encontro meio amador, sem muita pompa. Com canapés requentados, champagne quente e discusos intermináveis. Muito pelo contrário. Os caras capricharam. Além do visual impecável, estavam presentes vários empresários grandões, além de figuras representativas do mercado publicitário. Não há como negar que foi de encher os olhos. Ao mesmo tempo, não posso negar que tenho uma divergência filosófica por causa do objetivo do evento. Mas outro dia eu falo sobre isso. *** Antes do evento em si, rolou um coquetel só para os VIPs. Por algum motivo, eu fui convidado para essa boca. E fiquei lá, bebendo ao lado do Jorge Gerdau e do Ricardo Vontobel. Já tive a oportunidade de participar de encontros desse tipo em vários oportunidades. Mas foi minha estréia como empresário.


É foda. Porque nesse tipo de situação, a gente é forçado a ser um businessman. É isso que as pessoas esperam de você. Cumprimentos, tapinhas nas costas e conversas sobre o mundo dos negócios. Marcar almoços que nunca vão acontecer. Demonstrar interesse por coisas nem tão interessantes assim. Basicamente, exercitar o relacionamento e ampliar a network. Enfim: trabalho. Essa é a regra do jogo. E como eu sou novato, não vou ser louco de me aventurar. Sigo o passo da maioria. Por outro lado, eu sou um cara novo. Recém fiz 29 anos. Falo palavrão pra caralho. Falo gírias pra caralho. Uso jeans e tênis. E faço atrocidades com o meu cabelo. Para piorar a situação, sou diretor de uma escola de criatividade. Ou seja: um gurizão. As pessoas esperaram de mim uma postura inovadora, ousada e criativa. A Perestroika tem uma responsabilidade nesse sentido. Eu, como embaixador do negócio, não posso (e felizmente não posso) usar sapato caramelo, por exemplo. *** Esse é o tipo de coisa que acontece com todo mundo, na medida em que vai subindo na profissão. É o que eu chamo de Gurizão-tiozinho. Porque a gente não consegue negar a nossa personalidade contesta-


dora. Mas precisa se enquadrar, vez por outra, ao ambiente corporativo. Se você não quer ser visto simplesmente como um estagiário com potencial, se você quer ganhar respeito dos Diretores da empresa, leve em consideração isso. As pessoas esperam que você seja um Gurizão, mas um Gurizão-tiozinho. E aí, o que se faz numa hora dessas? A minha saída foi ir de terno e sapato. Mas, marrentinho, com a gravata pra dentro da camisa, inspirado num trendsetter com que eu conversei esses dias.


POR QUE É TÃO DIFÍCIL OUVIR UM “EU ERREI” ? Eu sou um cara bem crítico comigo mesmo (talvez até demais). Quando mando um bola na trave, ou pra fora, ou aquelas Bandeiraaaaaantes, eu espero a poeira baixar e sempre digo a quem precisa ouvir: “Meu, eu errei.” Não vejo problema nenhum nisso. No trabalho, nunca achei que fossem me demitir. Pelo contrário: sempre percebi que esse ato de maturidade me fazia ganhar mais pontos, e não perder. Nas empresas, principalmente nas grandes empresas, a lógica é o Jogo do Tira-e-põe. Todo mundo quer tirar do seu e colocar no dos outros. Talvez por isso seja tão difícil ouvir de alguém um “Eu errei” quando a campanha não atinge os resultados que a gente queria. Ou quando a manipulação fica abaixo do esperado, por apostar num fornecedor mais barato. Ou quando o prazo estoura, porque o cara ficou pentelhando no layout sem necessidade. Errou? Então diga, sem medo: “Eu errei”. Não fique se defendendo. Não fique arranjando desculpa. Não fique jogando a culpa para os outros. Eu mantenho um caderninho mental, com as vezes que acertei e com as vezes que eu errei na propagan-


da. E tenho orgulho de dizer que, pelo menos nesse caderninho, minha média foi bem boa. E se vocês querem saber, também tenho bastante orgulho de dizer que errei muitas vezes (sem hipocrisia nenhuma). Porque as vezes que errei, errei com convicção. Isso que é importante. Ter a sua opinião. Mesmo que todo mundo cague pra ela. Mesmo que seu chefe nem ouça você e faça só o que ele pensa. Tenha a sua sentença e não deixe de verbalizá-la. Se esconder atrás da opinião dos outros, ou torcer pelo fracasso geral para depois dizer “Viu? Eu falei!” é muito espírito de porco. Das duas, uma. Ou você mata no peito, e corre os riscos, ou você aceita a o consenso geral e trabalha para que isso dê certo. Agora, o inverso também é verdadeiro. Se você não errou, não precisa ficar assumindo a culpa pelos outros. Você não precisa ser um herói desnecessariamente. Ponha a cabeça no travesseiro e durma tranqüilo. A moral da história é a seguinte: se até os melhores do mundo erram, por que nós, pobres mortais, não erraríamos?


A LENDA DO MERCADO SATURADO. Todo mundo já ouviu lendas urbanas. “Não aceite bebida de estranhos, ou você pode acordar numa banheira cheia de gelo e sem os seus rins.” “Não vá no cinema do Iguatemi, porque os caras colocam agulhas infectadas com HIV.” “Não coma no McDonald’s: os hambúrgueres são feitos com carne de minhoca.” É ou não é? Ainda mais, depois que inventaram o email. Lenda urbana é o que não falta. Pois bem: dentro da propaganda gaúcha, existe uma lenda que me incomoda bastante. A de que “o mercado está saturado”. Eu já troquei de emprego quatorze vezes. Já fui peão de gráfica e host de restaurante metido. Já fui assistente de arte, arquivador de fitas e jornalista de um veículo totalmente picareta. Já distribuí flyer na praia. Já fui o último estagiário na hierarquia de uma grande produtora (aquele que vem depois do cu do cachorro). Hoje, sou Diretor da minha própria empresa. Mas sabe-se lá o que vai vir amanhã. E por todos esses lugares, eu sempre acompanhei o desespero dos meus chefes quando alguém pedia


demissão. Guardadas algumas exceções, era sempre um parto achar um substituto. Fosse quem fosse. Do novato ao presidente. Isso indica que, diferente do que se diz nos corredores, o mercado gaúcho não está saturado. Quer dizer: o mercado está saturado, sim. Mas saturado de profissionais que estão abaixo da expectativa de quem contrata. Quando se precisa de alguém bom, realmente bom, que entregue coisas acima da média, que tenha o respaldo de um bom portfólio, com maturidade e postura, que seja do bem e não tenha medo de trabalho, é foda de achar. Vi isso se repetir por todas as agências que passei. Mas também no restaurante, na gráfica e até no jornal picareta. Esse cara valioso, quase insubstituível, que é uma mistura de Romário (pelo talento) e Dunga (pela postura), é dificílimo de achar. E se você abrir mão dos nomes de maior visibilidade (que normalmente já recebem um bom salário, ou já atendem boas contas, ou já estão felizes na empresas em que trabalham), fica mais difícil ainda. Lembro bem quando o Perottoni foi para Londres e a DCS ficou meses e meses até achar a pessoa certa. O João Pedro Vargas, que é um puta diretor de arte. Um cara gente finíssima, super low-profile, e que justamente por isso foi um pouco mais difícil de encontrar.


Não sei como é em São Paulo, nos EUA ou na Europa. Mas aqui, eu garanto. Se você for bom, mas bom mesmo, você vai ser valorizado pela sua agência e respeitado pelos colegas. E vocês viverão felizes para sempre. THE END.


MIRE NO BRONZE. Essa Olimpíada, e toda a repercussão do Blog Bronze Brasil, me estimulou a falar de uma coisa muito séria. São essas frases prontas, bastante usadas em palestras motivacionais e discursos de formatura. “O céu é o limite”. “Você é do tamanho do seu sonho”. “Querer é poder”. Querer é poder? Porque eu quero ficar tão bonitão quando o Brad Pitt. Para isso, eu precisaria malhar para caralho, fazer uma cirurgia plástica na cara. E, provalmente, nascer de novo. O que eu quero dizer é que: não adianta você ter metas ilusórias. As metas na sua vida têm que ser reais e condizentes com a energia que você pretende gastar nelas. Não fique sonhando acordado. “Quando eu for milionário”. “Quando a minha banda estourar.” Não pense assim, a não ser que você realmente acredite que isso vá acontecer. E só acredite nisso se você realmente estiver trabalhando para isso. De outra forma, você está vivendo um Conto de Fadas. Planos são fantásticos. Planos são fundamentais para você atingir aquilo que quer. Mas planos só têm sentido se você estipula prazos e condições reais, dentro das limitações que o mundo impõe. É mais ou menos o caso do esporte brasileiro. Eu fico imaginando como deve ser frustrante para a


maioria dos nossos atletas, que sofrem toda essa pressão pelo Ouro. Quando, na verdade, o Ouro deles é o Bronze. Porque tirando algumas raríssimas exceções, o máximo que eles podem alcançar, dentro das condições que o nosso esporte proporciona, é o Bronze. Esse é o meu conselho. Não mire o Ouro. Mire o Bronze. Não tente dar um pulo para alcançar o último degrau da escada. Vá aos pouquinhos, baby steps, comendo o mingau pelas beiradas. Suba um por um. É muito mais fácil. E não tenha vergonha de admitir as suas limitações. Subir uma escada com mil degraus pode ser moleza para um cara bem condicionado. Mas inviável para alguém que está acima do peso. Se no meio do caminho você sentir que não dá mais, relaxe. O importante é saber qual é o seu teto. É fazer o seu melhor. Pense que, se você fizer o seu melhor, pouco importa a comparação com os outros. Pouco importa se você foi primeiro ou último. Você fez o seu melhor, não fez? E se as circunstâncias da vida fizerem com que o seu teto seja o Bronze, beleza. Seja pelas decisões que você tomou, seja pelas que você não tomou. A vida é assim mesmo. Não sofra. Não se sinta culpado. Não pense que você pode comer a Gisele Bündchen. Isso nunca vai acontecer, a não ser que você tenha um planejamento real. É mais fácil imaginar que


você vai comer a mina mais gostosa da sua faculdade. Ou até, a mais gostosa da sua turma. Se um dia você pegar a Luana Piovani, então é justo que você comece a pensar na Gisele Bündchen. Antes disso, você está só se enganando. Mire no Bronze. E se você conseguir o Bronze, aí sim, tente um lugar mais alto no pódio. *** Eu acho foda quando usam a exceção como regra. O nome da vez - e não poderia ser outro - é o Michael Phelps. “Se o Phelps conseguiu atingir o objetivo dele, por que eu não posso atingir os meus?”. Claro que pode. Desde que eles sejam plausíveis. O Michael Phelps estipulou, antes de Pequim, um plano para bater o recorde de medalhas olímpicas. O máximo que um atleta pode alcançar. Sabe o que ele fez para chegar nesse nível? Exatamente o máximo que um atleta pode fazer. Segundo uma reportagem que eu vi na ESPN, ele trabalhou todos os 365 dias do ano, em dois turnos (às vezes, três), não fugiu de uma rigorosa dieta (de altíssimo valor energético), não fez festa, não dormiu tarde, não fez porra nenhuma. Quantos estão dispostos a pagar esse preço? Poucos. Talvez ninguém, além dele.


Se você é um atleta, não adianta pensar que “um dia eu serei o maior medalhista da história”. Bullshit. Mire o Bronze. Depois de ganhar o Bronze, talvez você possa alçar vôos mais altos. Quando aqui na Perestroika a gente diz que vai dominar o mundo, tem um lado que é brincadeira. Mas também tem um lado sério. Mas que só é sério porque nós estamos nos dedicando pra caralho para atingir o que queremos. E não pensem que o nosso plano não tem etapas. E não pensem que o nosso plano não tem limites. Eu só não descobri exatamente quais são. É que, depois que o Felipe inventou um anão de cueca dentro da sala de aula, ficou foda.


A VIDA É OU NÃO É A MELHOR REFERÊNCIA? Uma vez, eu e o Rafa fizomos um anúncio da Olympikus para a Void. Justamente por veicular na Void, a gente tinha que acelerar. Não podia ser um lance nerd. O anúncio era só um tênis feminino, estouradão, e duas ilustrações, de um anjinho e um diabinho, feitas pelo Diego Medina. Os dois eram meio detonadões mesmo, bem subversivos, como o Medina curte. O modelo era branco com detalhes em rosa, todo fófi. Então, para adequar ao público da revista, saíam dois balõezinhos de diálogo, um do anjo e um do diabo, dizendo: (Anjo) - Se você é virgem, use Olympikus Tube. (Diabinho) - Se você é virgem, eu sou a mãe do Badanha. *** Essa peça me lembra aquelas situações em que a gente é tentado pela vagabundagem. Aqueles dias que, em vez de ter um anjinho e um diabinho, um em cada ombro, a gente está acompanhado por dois diabinhos. Tipo quando a gente tem uma puta campanha para layoutar para o dia seguinte, 9h da manhã, e recebe


um torpedo de uma gostosa que está sozinha em casa. Ou quando a gente tem que entrar na madrugada trabalhando, mas lembra que tá rolando um puta jogão na TV. Ou quando todo mundo fica metendo uma pilha para você ir na festa, mesmo sabendo que no outro dia tem que chegar às 6h na agência, para terminar de montar as peças que vão ser enviadas por Sedex. E aí? Foda-se a agência, não é? A vida é a melhor referência, não é? Médio. A grande sabedoria aí está no bom senso. Ficar preso na agência não é uma coisa das mais legais. Mas, às vezes (e, às vezes, muitas vezes), é preciso. Nessas horas, vale lembrar de um dos mandamentos que a gente apresenta no primeiro dia de aula. “TRABALHAR EM PROPAGANDA É LEGAL, MAS É TRABALHO. E TRABALHO, DE VEZ EM QUANDO, É UM SACO.” Assim como é muito fácil pensar “Ah, é só um anúncio, não vou morrer se me demitirem, eu vou é curtir a vida”, também dá pra pensar “Ah, é só uma mina, não vou morrer se perder essa FG, trabalho é trabalho”.


O botãozinho de foda-se vale para os dois lados. Sobrevive na propaganda quem resiste mais vezes a essas tentações. Eu lembro, com bastante nitidez, de deixar de ir em várias festas, enquanto alguns contemporâneos chutavam o balde de segunda a segunda. Na época, uns até me achavam meio CDF. E, talvez, olhando para trás, eu talvez estivesse sendo exigente demais com aquele Tiago, com que tinha só 18 anos na cara. Mas com as coisas acontecendo na minha carreira, e as propostas, e os aumentos, e a visibilidade, deu pra ver que o essa nerdzice tinha um sentido. Então, não usem esse bordão da Perestroika como álibi para a vagabundagem. Se querem sair, se querem ouvir os diabinhos, beleza. Não culpem a gente. Culpem a mãe do Badanha.


CORRERIA? CORRERIA! É comum a gente, numa rodinha de publicitários, ouvir o seguinte papo: - Esse findi eu trabalhei pra caralho. Ou: - Essa semana saí todos os dias às três da manhã. Ou ainda: - Putz, faz quatro meses que eu trabalho sábado e domingo. Cada vez mais, eu acho que esse discurso não é por causa da nossa rotina mega-atarefada. O que eu percebi, e essa é a tese que eu defendo, é que nós vemos a fodelança como status. Isso aí. No nosso meio, se fuder é ser foda. Você pode até nem concordar comigo. Mas sei lá. Parece que existe uma necessidade da gente mostrar para os outros que se está trabalhando muito. Não consigo identificar bem a razão. Talvez, isso signifique que a gente está numa agência grande (afinal, todas as agências grandes são assim). Ou um sinal de que temos muitas responsabilidades, que somos imprescindíveis no processo.


Ou que nós somos mega-exigentes e, dessa forma, nunca nos damos por satisfeitos saindo na hora (quem garante que o próximo Leão não vai pintar às 3h da madrugada?). Repare que, nos papos do Salão da Propaganda, o discurso clássico é: - E aí, como tá lá? - Correria, e lá? - Correria, correria. É ou não é? *** Parece meio aquela piada da Sharon Stone na ilha deserta. Se você come uma gostosa, e não conta pra ninguém, não tem a menor graça. Se você vira a noite trabalhando, e não conta para seus colegas, ninguém vai saber que você foi um herói. Não seria essa uma prova de que vemos a fodelança como status? Eu, num Salão há uns 2 anos, fiz questão de responder pra todo mundo “Pois é, minha vida tá bem tranqüila, tenho saído no horário”. (Tá, não era verdade. Mas eu só queria ver a reação das pessoas.)


E não é que todo mundo me olhava meio estranho? Como se fosse proibido estar bem posicionado no mercado e sair às 19h. *** Veja como é curioso. Normalmente, as pessoas mentem para mais. Elas exageram na fodelança. Elas realmente fazem questão de dizer que saíram às 4h da matina. Mesmo quando terminaram o job mais cedo. Outro indício de que minha tese não é tão absurda assim. *** Mais: se a questão é se exibir, não seria mais lógico o raciocínio inverso? “Eu trabalho pouco, chego às 11h, saio pra almoçar, só volto às 15h, nunca fico até mais tarde, tô cagando para todo mundo, e ainda assim precisam de mim”. Ninguém se vangloria de ter um carro caindo aos pedaços, ou de ganhar mal, ou de morar num JK alugado. Ninguém, tirando o Jorge Kajuru, chega para uma mina dizendo “Eu sou ruim de cama, tenho pau pequeno e já fiz troca-troca”. Ninguém se vende assim. Porque não existe status nisso.


Então, por que insistimos tanto nessa Síndrome de Sofrenildo? *** Agora, não confunda isso tudo com falta de ralação. Uma coisa é trabalhar para caralho. Ser um eterno insatisfeito. Ser exigente e não se contentar com o que já fizeram. Não aceitar bem a média. Outra coisa é ter a necessidade de falar para todo mundo que você trabalha para caralho. É se afirmar em cima disso. Uma coisa é a realidade do mercado. Que exige bastante e faz a gente virar a noite. Que joga para o acostamento que não agüenta o tranco. Outra coisa é se exibir. Como se o fato de ficar até tarde fosse um troféu. *** Eu tô na contramão. Pra mim, ficar até tarde é um saco. Perder o final de semana é um saco. E quanto mais eu lembrar desse sofrimento, pior. Por isso, nem toco no assunto. Quando eu estimulo os alunos a ralarem, é porque eu tenho certeza que a quantidade faz a qualidade. Agora, eu procuro na medida do possível (evidente que nem sempre isso é possível) não ficar me exibindo de algo que, pra mim, não tem valor nenhum.


E ainda assim, às vezes, eu me pego dizendo “Nunca almoço, passo o horário do meio dia resolvendo coisas da Perestroika, hoje eu tenho dois expedientes, a reunião de ontem terminou de madrugada, blá, blá, blá”. *** Sinceramente, espero que esse post sirva para recrutar pessoas que também pensam como eu. Não existe nenhum problema em trabalhar bastante, nem em ser exigente. O bizarro é ver alguma vantagem nisso. É ou não é, Kajuru?


LEFT LUGGAGE Seguindo a nossa linha de novas contribuições, aí vai o Post da Carol D’ávila. Ela vai coordenar um dos nossos novos projetos: o Curso de Design da Perestroika. Bem-vinda, Carol. ***** LEFT LUGGAGE Há exatos dez anos, no auge dos meus vinte e poucos, eu fazia minhas malas. Era a primeira vez que saía da casa dos meus pais e a primeira vez que sentia uma necessidade absurda de independência. Foi tudo sem muitos planos, e com muita, mas muita excitação e frio na barriga. Eu tinha uma academia de design me esperando. E eu, cheia de esperanças, queria entrar nessa academia. A única coisa que eu sabia é que ficaria no mínimo um ano e que só me permitiria voltar quando sentisse que tinha feito alguma coisa por mim - e isso significava, profissionalmente. O sentimento dos meus primeiros dias era de chapação total. E não porque eu estava na Holanda (sorry pelo trocadilho), mas por todo o bombardeio de informações que me rodeava.


A sensação que eu tinha é de que não ia dar tempo de absorver tudo e que um ano talvez fosse muito pouco. Foi na Holanda que virei designer. Na verdade, descobri que já era. Mostrando a pasta de agência em agência, num belo dia um diretor de criação me pergunta por que eu queria trabalhar em agências de propaganda se eu era designer. Pronto, a confirmação! Um ano e meio passou, muitas viagens, experiências profissionais absurdas, amigos, trabalhos, informação, informação, informação. E de tudo o que vivi, o mais importante que trouxe dentro de mim, foram as pessoas que passaram pela minha vida. A sensação que eu tinha - e estou tendo hoje - é de que todo mundo que passou por mim, deixou um pedacinho. E essas pessoas fazem de mim o que sou hoje. A Perestroika teve o poder de mexer comigo nessas últimas semanas. Frio na barriga, a sensação de que o tempo vai ser pouco pra tanta informação, empolgação. E o melhor de tudo, a certeza de que vou me tornar uma nova pessoa. Sei que além de ensinar, vou aprender horrores com vocês. Eu espero poder mudar ou mexer ou deixar um pedacinho, que seja, de mim em vocês.


ATÉ ONDE DÁ PRA BRINCAR? Na segunda-feira, um dos professores do Gestão de Contas veio conversar comigo no intervalo. - Tiago, me contaram uma coisa, não sei se é verdade. - Manda. - O Nizan comprou a Perestroika? - (Risos) Não! Mas eu sei de onde saiu esse boato. - Pois é. Uma pessoa lá onde eu trabalho me perguntou, e eu não soube responder. O que me deixou mais impressionado é que ela contou que a notícia veio pelo namorado. - Isso nasceu de uma piada interna nossa com a turma do Criação 2. Nós sugerimos que tínhamos uma janta com o Nizan. Depois, eu escrevi um post no Blog Padrão Iogurte (Blog dos alunos), reforçando a brincadeira. Mas no final, todo mundo sacou que era piada. ***


Passados alguns dias, eu e o Felipe anunciamos a nossa saída da Live e da DCS, para assumirmos a Perestroika. Exatamente por causa do nosso histórico de pegadinha, muita gente demorou a acreditar. Foi o preço de ter feito a piada do Nizan. *** Ontem, fizemos mais uma piada. Colocamos (e retiramos, você já vai entender por que) uma introdução no texto da Bibiana, nossa estagiária, que nos escreveu direto do Canadá. Não, ela não está indo para o Canadá às nossas custas. Inclusive, quem prestou atenção, viu que em nenhum momento a gente disse isso com todas as letras. O que acontece é que a Bibiana foi liberada, com menos de 2 meses de contrato, para ir para o Canadá. De certa forma, foi um presente, sim. Quantas empresas topariam esse acordo? Ainda mais porque ela saiu na parte mais crítica da história da Perestroika. Recém abrimos as inscrições de seis novas turmas. Enquanto ela está lá, no bem bom, nós estamos nos fudendo aqui para deixar tudo em dia. É ou não é um arrego, hein, Bibi? É claro que a maioria dos nossos alunos, o pessoal mais próximo, sacou a piada. Uma boa parte pode


até ter ficado na dúvida. Mas no final, a gente sabia que tudo ia ficar bem. Era mais uma tiração de sarro em cima do nosso problema. Sim, porque ficar sem estagiária, justo nesse perído, é uma fodelança sem tamanho. Nós estávamos rindo de nós mesmos. *** Só que essa notícia da Bibi gerou um bafafá. Só o Rafa recebeu três ligações de gente perguntando se era verdade. A história, evidente, foi esclarecida. Mas um comentário nos deixou pensativos. - Pô, vocês já estão picareteando. E aí, ao ouvir isso, nós descobrimos que estávamos pagando um segundo preço. O preço da visibilidade. *** Talvez nem nós mesmos tivéssemos nos dado conta do crescimento da Perestroika. Esse episódio me fez sentir como um adolescente. Que cresce e não se dá conta do próprio tamanho. Então vai batendo nas coisas, tropeçando nos móveis, e fica pensando que só ele é desastrado. Foi quando eu me dei conta que é isso que rola com as empresas quando crescem.


Enquanto elas são pequenas, livres, tipo franco-atirador, elas fazem o que bem entendem. E ninguém da bola. Por isso que sai tanta coisa boa, tanta coisa nova, tanta irresponsabilidade elogiável. No entanto, é só crescer um pouquinho que todos já ficam te julgando. Ficam te olhando de cima para baixo. Ficam procurando um defeito para dizer “bah, olha os caras, são uns picaretas!”. E aí, a Perestroika vai se engessando, vai se engessando, e vai virando um elefante branco, chato, insosso, morno e sem graça. Se a gente começar a pensar muito nos outros, vamos acabar com os testes cego de cerveja na aula (isso realmente acontece), com a galera fuzilando bolinhas uns nos outros (isso realmente acontece), com um grupo de ufólogos falando da cidade perdida de Atlântida (isso realmente acontece) e anões de cueca desfilando pela sala (isso realmente acontece). Será que, a partir de agora, a gente vai ter que medir todas as palavras e atitudes, porque tem muito mais gente olhando? Será que o preço de crescer é ser um chapa branca? Ainda não tenho essa resposta. *** Para mim, ser picareta é ser intelectualemente desonesto. É mentir para tirar vantagem. É querer que as


pessoas acreditem nessa mentira porque é justamente isso que vai trazer benefícios. É dizer que tem o que não tem. É dizer que faz o que não faz. É dizer que é bom onde não é. Eu conheço muita empresa grande que se valeu de picaretagem para crescer. E conheço algumas que continuam picareteando até hoje, mesmo depois de grandes. Sugerir, brincar, ironizar, fazer piada interna, rir de si mesmo, pra mim, não é ser picareta. É evidente que a Perestroika não quer enganar ninguém. A gente não promete o que não pode cumprir. Inclusive, quem já nos procurou para fazer matrícula, sabe que a gente joga aberto. Eu mesmo já disse para várias pessoas. “Olha, não faz a Perestroika. Acho que não é bem o que tu está procurando”. Principalmente quando vêm se matricular em busca de um bom portfólio. “Olha, se tu quer portfólio, faz a Escola de Criação da ESPM”. Já gastei a voz repetindo essa frase. Isso é ser picareta? *** Não estou dizendo que não aceleramos demais. Sei lá, ninguém é obrigado a acertar sempre. E sabendo que o nosso Blog tem MUITOS leitores novos, a gente deveria ter levado isso em conta. Então: a todos que entenderam mal, e se sentiram engrupidos por causa disso, as nossas sinceras desculpas.


Agora, um conselho aos novos leitores do Blog da Perestroika. Não levem tudo tão a sério. Esse aqui é um espaço que traz conteúdo, opiniões e muita coisa interessante. Mas sempre vai levar a vida com bom humor. Porque o nosso jeito de pensar é assim. *** Quem acompanha o Blog há mais tempo sabe que, todo final de mês, nós elegemos “O funcionário do Mês”. Mesmo que só tenhamos um. Uma piada bem com a nossa cara. Fico pensando: será que isso também não pode gerar confusão? Está cada vez mais difícil saber até onde dá pra brincar. Mas que a gente vai continuar sacaneando, ah, vai. E agora, me dêem licença por favor. Acabei de ver que tem uma chamada não atendida do Nizan.


UM TEXTO SOLTO SOBRE A PERESTROIKA E SEU MOMENTO ATUAL. Nesta última 4a feira participei de um debate do CJC, junto com o Leo Prestes e o Israel. Me identifiquei pra caralho com o Leo quando ele disse que tinha largado a redação porque ou ele acompanhava as mudanças do mundo da comunicação e ia trabalhar em uma agência digital, ou continuava fazendo o seu (belo) trabalho do dia-a-dia, mas que não estava conectado exatamente com o que teremos que fazer no futuro. Foi exatamente isso que me levou pra Azaléia/Olympikus há 3 anos. Uma mudança radical pra alguns, mas que eu afirmo: fui atrás de um sentimento, de que lá do outro lado do balcão poderia criar mais. Como cliente eu poderia ter a minha disposição TODAS as ferramentas da comunicação e do marketing. Poderia experimentar tudo. Testar. Bastava continuar tendo idéias e contratar qualquer empresa que fosse me ajudar a fazer o puta trabalho acontecer. De sobra eu acabaria SEMPRE atualizado. Vejo que acertei. Tanto que a maior experiência que tive de comunicação na Olympikus não foi um anúncio, um filme, nem uma estratégia viral: foi o patrocínio do Pan e o projeto de concepção dos uniformes que o Brasil usou no Rio de Janeiro e vai usar agora nas olimpíadas. Tanto que o Israel, que hoje faz games, já está concluindo o segundo puta projeto para a Olympikus, todos eles aprovados an-


tes da Aquiris ser finalista em Cannes ou alguém falar que games na internet era o futuro/tendência ou qualquer porcaria dessas (por sinal, Israel, quem te indicou pra Cubo, agência da Axe?). Nunca teria participado disso tão diretamente através de uma agência. Ao mesmo tempo, a vida do outro lado do balcão também me ajuda a não cair em deslumbre pelos modismos ou novidades: o game da Aquiris é fantástico. Mas é o Fantástico da Rede Globo que vai levar o consumidor pro site para jogar. Acredite: um filme na Globo é UM FILME NA GLOBO. Corta. No meio disso tudo, a Perestroika nasceu. E cresceu. Primeiro como escola de criação. Depois, quando vimos, éramos mais do que isso: uma escola que tinha forma criativa nas aulas. Não queríamos mais formar e ensinar com muito tesão apenas redatores e diretores de arte. A idéia por trás, que só descobrimos depois, era de usar as idéias e formatos criativos para ensinar. Tudo. Era isso que estava latente. Nossas aulas de criação 1 e 2 eram apenas a ponta do iceberg. Lançamos, então, há 6 meses, o curso de Gestão de Contas. Turma lotada em 3 dias. Nós dando aula? Não. E foi assim que desenvolvemos um modelo de negócio realmente inovador. Abrindo a empresa para todos que viessem a agregar. Essa idéia deu certo? Você responde. O fato é que com pouco mais de um ano, a Perestroika já é outra, e em agosto estão aí 4 novos cursos: Internet, Design, Consumidor e Som. Mais um projeto com a PUC. Mais um projeto com a ARP. Tudo com pessoas que só nos encantam: o


Marcelo Quinan, da Ag2; a Carol D’Avila, da Bendito; a Carla, Dudu, Rony, etc, da Box, o Edu Santos, da Ipanema e Loop. Será que o Felipe e o Tiago, saindo das agências, estão “saindo do mercado”? Ou será que a Perestroika não pode ser “o novo mercado”? Será que uma agência de propaganda vai ser do jeito que é hoje em 10/15 anos? Porque faz exatamente 58 anos que ela é assim e garanto: os meios de comunicação mudaram neste período. Alguém duvida? Outra coisa: mesmo que os dois viessem “só” a ensinar: é no Brasil que isso significa ficar desatualizado. Nos Estados Unidos, por exemplo, os cabeções TODOS estão desenvolvendo trabalhos inovadores nas universidades. É lá que surgem as inovações. É lá o local de experimentação. Ou a MIT tem a fama que tem por nada? Ou Harvard é mesmo careta e as pessoas só estudam lá por causa do diploma e os professores são uns bostas? Nós estamos vibrando com as novidades. Se fizemos tudo isso em reuniões das 19h às 3h da manhã, imagina agora? Enfim, estou orgulhoso e feliz que tenho dois amigos-sócios que agora vão se dedicar a pensar diferente e cuidar exclusivamente deste projeto que gostamos tanto. Que vão correr atrás das novidades. Do que está surgindo, do que é fresco. Novo. Que vão fazer acontecer muitas idéias que ainda estão no papel pela falta do desgraçado tempo. As oportunidades estão aí. E nós vamos correr para aproveitar. Aos alunos, tenham certeza: se mudar alguma coisa, é para melhor. Aos amigos, que apoiam e torcem:


sim, estรก dando certo, obrigado pela forรงa de sempre. Aos curiosos metidos, palpiteiros de plantรฃo, eu digo: aguardem. No fim, acho que era sรณ isso mesmo que eu queria dizer.


NÃO DESPERDICE O TEMPO DAS PESSOAS COM PROPAGANDA. Por Fabiano Goldoni* Todo mundo sabe que a propaganda está se transformando em algo bem diferente do que aquilo que os professores da faculdade nos ensinam. Estão surgindo novas formas de anunciar marcas e junto com isso uma nova nomenclatura para definir o que é a propaganda hoje em dia. Começamos a falar naturalmente sobre todos esses termos, como guerrilha, viral, ambush marketing, PR stunt, seeding, e até aproveitamos para rebatizar o bom e velho merchandising com o pomposo nome de product placement. E um dos assuntos mais falados hoje em dia é que a propaganda está se parecendo cada vez mais com conteúdo de entretenimento ou, em bom português, está se convertendo em advertainment. Antes de entrar no assunto, paro para fazer duas aclarações: primeiro, os professores da faculdade não estão ensinando coisas inúteis. É preciso entender a propaganda desde as origens para poder transformá-la de forma lógica e consciente. Segundo, o fato da propaganda estar tomando a forma de conteúdo como entretenimento não significa que ela não tenha conteúdo em si. É preciso entender a diferença entre esses dois conteúdos. O conteúdo da propaganda tem a função básica de informar sobre o produto, já o conteúdo como forma de entretenimento, mesmo quando associado a uma marca, não se preocupa (teoricamente) em informar o público sobre um produto ou uma marca.


Vou tentar explicar isso com exemplos mais práticos: você criou um comercial de TV superdivertido, que grudou na cabeça de todo mundo e virou uma referência de como a propaganda pode fazer parte da vida das pessoas e se transformar num fenômeno social e cultural. Isso é entretenimento? Não. Isso é boa propaganda. Entretenimento é tudo o que as pessoas fazem por livre e espontânea vontade para ocupar seu tempo livre. Ou seja, assistir uma série de TV, ler um livro, ver um filme, jogar vídeo game, acessar um site, praticar um hobby, etc. Os únicos que preenchem seu tempo livre com propaganda somos nós, publicitários. As pessoas normais preferem coisas normais. Ocasionalmente, elas dão de cara com o nosso trabalho enquanto estão preenchendo seu tempo livre. Por incrível que pareça, ou melhor, graças à criatividade dos profissionais de criação, a propaganda ainda dá resultado mesmo assim. O problema é que esse resultado vem diminuindo cada vez que surge uma nova revista ou um novo canal de TV. A culpa é do excesso de conteúdo disponível para preencher o tempo livre das pessoas. Tudo porque o tempo dedicado ao entretenimento não aumentou na mesma proporção em que se multiplicaram as mídias. E o pior é que a maioria dos anunciantes não tem como aumentar a sua verba publicitária o suficiente para cobrir todas essas novas mídias e opções de entretenimento. E, como as pessoas não consideram a propaganda como uma opção, ela é a primeira a ser ignorada. No fim das contas, isso acaba sendo uma batalha mais do que perdida para nós, publicitários.


A solução para isso é o velho ditado “se não pode vencê-los, junte-se a eles”. Precisamos transformar a propaganda em algo que não represente uma interrupção da diversão para as pessoas, mas sim uma continuação ou uma nova opção para preencher o tempo ocioso. Para isso, precisamos mudar um pouco a nossa mentalidade na hora do brainstorm. A primeira coisa é mudar de referência. Deixe os One Show e as Archives na prateleira. Procure livros e sites de arte. Principalmente, os que tratam de intervenções urbanas, arte interativa, vídeo arte e novas tecnologias na arte. Essas referências são o que existe de mais vanguardista em criação para preencher o tempo livre das pessoas. Depois, observe com um olhar mais técnico a programação da TV. Tente dissecar a estrutura narrativa de um episódio de uma série, de um documentário ou de um longa-metragem. A TV é a forma de entretenimento em que as pessoas mais investem seu precioso tempo entre o trabalho e o sono. Por último, preste atenção nas coisas bobas que as pessoas fazem para se divertir. Afinal, toda forma narrativa, como a literatura, o teatro e as novelas da Globo são representações fictícias da vida cotidiana. Quando a gente se referencia na arte, é mais fácil imaginar que margaridas amarelas que formam um corpo num grande parque pode ser uma boa idéia para anunciar uma série, cuja única referência com margaridas está no título: Pushing Daisies.


Quando observamos com um olhar técnico a programação da TV, fica mais simples elaborar falsos documentários, como o Where Are The Joneses? criado para a Ford. Com certeza, uma Archive ou One Show não servirá muito de inspiração para criar a história de uma mulher que descobre que seu pai era doador de esperma e resolve ir atrás dos seus 27 irmãos a bordo de um Ford. Talvez só quando essa ação for premiada numa dessas publicações. Mas aí já vai ser tarde demais pra você. E o viral da Red Bull, onde o maior atleta de X-Games de todos os tempos salta de um avião sem páraquedas? E o viral da Levis em que as pessoas saltam dentro das calças? Estou enganado ou isso parece um quadro de programas sensacionalistas tipo aque-


le quadro “Isto é Incrível” do SBT no domingo à tarde? Por último, quando a gente observa as coisas idiotas que as pessoas fazem para se divertir, é óbvio que vamos saber como aproveitar as oportunidades que surgem a todo o momento. Se a Coca Cola não tivesse abraçado a campanha Menthos + Diet Coke como uma promoção, talvez hoje estaríamos falando sobre vídeo do Menthos + Diet Pepsi. Como já deu para notar, os exemplos de advertainment se encontram muito mais em novas mídias do que nos meios tradicionais. Para produzir adverteinment na TV é preciso ter uma verba muito grande ou se associar com uma emissora. Um caso que eu pude acompanhar de perto foi o da série City Hunters produzido pela Unilever em conjunto com a FOX. Não existe nenhuma referência ao produto ou merchandising dentro da série. É apenas uma série animação com um tema voltado ao público masculino. O Joga TV da Nike e o The Contender da Everlast também são bons exemplos de como uma marca pode investir em conteúdo na TV. Tá, mas o meu cliente não tem muita grana e quer anunciar na TV. E aí como eu faço para criar advertainment na TV com uma verbinha mixuruca? Espero as sugestões de vocês nos comentários e conversamos sobre isso no próximo texto.


DIAMANTES. Nesse final de semana, eu e o Rafa tivemos o privilégio de filmar novamente com o Bernardinho. Ele é um cara fantástico no set. Não reclama, não tem nenhum estrelismo e topa todas as bizarrices que a gente inventa. E ainda é puro alto astral, tá sempre fazendo piada e divertindo a galera da produção. Mas dessa vez, eu tive um privilégio maior que nas edições anteriores. Em determinado momento da filmagem, quando estavam rodando uma cena só com o Giba, ficamos batendo um papo in off. Sem câmeras, sem microfones, sem responsabilidades. Seria até presunção dizer que foi uma conversa. Porque durante aqueles 20 minutos, eu praticamente não falei. Não valia a pena investir aqueles poucos minutos ouvindo a minha própria voz. Vale lembrar: o Bernardinho cobra muito caro pelas palestras que dá. Falamos principalmente de esporte. Eu adoro esporte, e parecia que eu estava lendo um almanaque. Ele sabia datas, placares, nomes, tudo de cor. Detalhes que fariam inveja ao PVC. Impressionante. No meio disso tudo, ele explicou qual é a principal diferença entre um grande jogador e um campeão. Usando outras palavras, ele disse que “o grande jogador é aquele que praticamente não erra. E o campeão é o que não erra quando não pode errar.”


Tá, eu sei que esse não é um ponto de vista muito novo. Muita gente fala isso e não é de hoje. Mas sei lá: ouvir essas palavas do cara que montou o time mais vitorioso da história do esporte, em todos esportes, em todos os tempos, foi diferente. Peguemos como exemplo o Michael Jordan. Sempre que tinha jogo decisivo, a história era sempre a mesma. Faltavam poucos segundos. O técnico adversário sabia que a bola ia para o Jordan. O time adversário sabia que a bola ia para o Jordan. A torcida, o comentarista, o mundo inteiro sabia que a bola ia para o Jordan. E bola ia para o Jordan. Mas parecia impossível marcá-lo. Na pressão, ele não arrepiava. Acho que esse conceito se aplica um pouco ao nosso negócio. Os grandes profissionais com quem convivi foram justamente aqueles que, na hora do aperto, tiraram leite de pedra. Quando alguém virava e dizia “ou a gente acerta nessa campanha, ou vamos perder a conta”. E o cara ia lá, e fazia o melhor anúncio da vida dele. Ou quando dava um problema num comercial, que mudava o roteiro depois de filmado. E a dupla era obrigada a fazer um remendo, com as cenas já captadas, deixando tão bom quanto a versão original. Ou naquelas vezes que tá tudo pronto, montado, e alguém descobre que a concorrência vai lançar uma


campanha igual. Daí é virar a noite e produzir algo tão bom quanto o que acabou de ser feito, mas em tempo recorde. *** Existe um ditado que eu amo, que é: diamantes nascem sob pressão. Sempre que eu vejo os vencedores de um festival principalmente aqui no Salão da Propaganda, que é onde eu tenho mais contato e mais histórico das peças - faço a minha própria avaliação. Cada vez mais eu valorizo aqueles trabalhos de verdade, para produtos de verdade. Que dá para ver o briefing sendo resolvido. O problema que o cliente tinha e a solução que foi encontrada. É aí que estão os diamantes. Só nessas condições, só um trabalho que vai para a rua MESMO é que me impressiona. Porque só assim a idéia é colocada a prova por um diretor de criação que está pensando seriamente sobre o assunto. Que tem um cliente avaliando de forma séria o que vai ao ar. E que é julgado pelo consumidor, o verdadeiro júri das nossas idéias. Criar para o mercado publicitário, ou para filantropia, ou fazer fantasmas, ou até esses clientes que não remuneram a agência e topam qualquer barbaridade, é como jogar um amistoso. Eu já criei, e vez por outra continuo criando para esse segmento. Não sou a favor do fim desse tipo


propaganda. Por favor! Adoro criar as campanhas do Salão da Propaganda, ou os anúncios de fornecedores que vez por outra caem na nossa mesa. Agora, lá no fundinho, eu sei que existe uma grande diferença entre isso e o anúncio produto-e-preço da STIHL que volta e meia entra na nossa pauta. Então, toda vez que pintar um job casca grossa para você, não veja como uma engronha. Veja como um teste. Um teste para saber se você já está preparado para desafios maiores. Um teste para saber se você já pode assumir grandes responsabilidades. Se você já se transformou em diamante, ou se ainda é carvão. E se o prazo for curto, lembre-se do Michael Jordan. Ele normalmente tinha que se virar só com alguns segundos.


O CAVALO ENCILHADO ESTÁ PASSANDO. Por Marco Loco Bezerra* Existe uma teoria, hoje em dia, que diz que a propaganda está mudando. Todo mundo fala disso. Sinceramente, só comecei a pensar mais sobre o assunto quando ingressei na TBWA. Esse é o discurso padrão aqui. Influenciados pelo cabeção e guru da rede Lee Claw, todos os escritórios buscam arduamente alternativas para as mídias tradicionais: TV e Print. Na TBWA essa terceira via é chamada Mídia Arts. Tudo é mídia. Um guardanapo é mídia, um copo de plástico é mídia, um cavalo morto a beira da estrada é mídia, uma bunda de uma guria gata pode ser um billboard maravilhoso. Enfim, qualquer oportunidade de conversar com o público vira uma alternativa ao anúncio. Pode parecer óbvio, o que realmente é, mas no Brasil isso é pouco lembrado. Essa é a primeira parte da teoria sobre as mudanças nos formatos convencionais. A teoria do diálogo. Voltando para a TBWA, vale lembrar que o grupo beneficia-se de outro dado importante sobre a mudança de comportamento do consumidor. Hoje propaganda é cada vez menos unilateral. A forma de comunicar-se com o público é mais dinâmica. A coisa fica muito mais próxima de um diálogo. A marca fala través de qualquer mídia e o cliente responde.


Hoje, se o cara não gosta do que você comunica ele retruca. Pode ser num blog na internet, num cartaz ou em uma música disponível na rede. Como falei, a resposta é rápida. Escrevi esses três parágrafos iniciais para introduzir o assunto que eu realmente gostaria de falar. O tema desse texto é um pouco polêmico. Assim guarde as informações acima, pois quando chegar a hora, vou voltar a martelar nelas. Eu queria falar um pouco sobre propaganda gaúcha. Não sei se algum dos seus professores já falou da MPM. Não essa atual MPM cujo dono é o Nizan. Eu estou referindo-me a uma mais antiga que essa. Se os guris não falaram não tem galho, essa agência é uma lenda até mesmo para nossa geração. Ela é como aquelas histórias sobre Atlântida. Atlântida era uma nação super-desenvolvida, tecnologicamente e socialmente, mas acabou por desaparecer em um cataclismo. Um dilúvio afundou a ilha e escondeu seus vestígios por toda eternidade. O que ficou para a posteridade é uma tradição oral ou fragmentos de poemas de filósofos gregos. Isso se Atlântida realmente existiu. A MPM, para nossa sorte, foi melhor documentada. Ela era a maior agência do Brasil, em sua época. E, segundo a tradição oral que chegou até mim, também uma das mais criativas do mundo. O mais legal é que essa poderosa força tinha seu “head quarter” aqui no nosso rincão: Porto Alegre. Além de ter sido fundada por 3 gaúchos: Mafuz, Petrônio e Macedo. É dessa escola que derivam muitas das agências atu-


ais e a maioria dos profissionais mais antigos. Só para constar, entre esses ilustres ex-MPM está Luis Fernando Veríssimo. Se você quer saber um pouco mais leia aqui no link: http://www.meioemensagem.com.br/fatosmarcantes3 0anos/fato_interno.jsp?ID=143 Ou baixe o PDF: http://www6.ufrgs.br/emquestao/pdf_2004_v10_n2/ EmQuestaoV10_N2_2004_est01.pdf Isso só prova que, essa história de agências boa só em São Paulo, é algo relativamente novo. Hoje, em um mundo globalizado e tecnológico, cada vez menos necessitamos da presença física. Reuniões de todos os tipos podem ser conduzidas facilmente a distância. Sinceramente vejo, a necessidade de nos aglomerarmos em São Paulo, como algo ultrapassado. Então por que tudo lá? Não sei. A verdade é que a diferença, entre trabalhar em uma agência grande em São Paulo e uma grande em Porto Alegre, é muito grande. As condições são muito mais favoráveis. Os caras tem mais estrutura, mais grana e assim, acabam ficando com a melhor produção também. Se formos ainda mais críticos, concordaremos que o resultado criativo também é superior. Parece que no Rio Grande do Sul e no resto do Brasil, perdemos algo. O que é? Não sei também. Em todo caso, arrisco-me a dizer que o dinheiro (ou a falta dele) é apenas parte do problema. Não justifica completamente esse distanciamento.


Agora sim, posso desenvolver mais a idéia que queria apresentar nos primeiros parágrafos. Eu vejo essa mudança na propaganda mundial como uma oportunidade para recolocarmos-nos em uma posição de destaque no cenário Brasileiro. Não estou falando de grana. Acho que ela vem em conseqüência do bom trabalho. Eu falo de fazer coisa boa. De, consequentemente, ganhar prêmios e visibilidade. Como já falei anteriormente, a grana justifica a produção melhor em print e, principalmente, em filme. O grande lance é que, no mundo, essas mídias perdem cada vez mais força. Sendo repetitivo, a idéia não fica mais presa a uma plataforma de revista, jornal ou TV. Os filmes virais, em sua maioria, são caracterizados por uma produção de menor custo. As ações de mídia exterior não necessitam de um fotógrafo caríssimo ou de uma produção caprichada. As coisas podem ser um pouco mais homemade. Claro que, com dinheiro, tudo fica muito melhor. Em todo caso, isso não é mais fundamental. O custo de execução mínimo para essas novas mídias é bem menor. Penso muito sobre isso. No anuário passado, uma agência do Ceará levou uma seqüência de ouros com trabalhos para uma empresa de ônibus. E não eram idéias de mídia convencionais. Esse tipo de ação parece ser a falha na Matrix para os festivais internacionais e o anuário. É para esse conceito que os olhos dos grandes criativos se voltam hoje. Na minha opinião, é nesse ponto que os gaúchos deveriam investir mais fósforo.


Para finalizar, vou apenas comentar que esse texto não trata de um assunto futuro. Essas mudanças estão ocorrendo embaixo de nossos narizes. Como estou longe e pouco posso fazer para ajudar, mando aqui minha contribuição. É apenas uma pequena dica, de um colega que, ainda sonha fazer o que ele mais gosta, em sua terra natal. *** *Marco Loco Bezerra é diretor de criação da TBWA, Berlim e um cara do caralho. Se tudo der certo, em breve vai ser mais um Czar da Perestroika na Europa. O texto acima não foi tirado de lugar nenhum. É uma contribuição exclusiva do Marco para o Blog da Perestroika.


A PERGUNTA DE 1 MILHÃO DE DÓLARES. Uma das coisas mais legais da Perestroika é a relação que a gente tem com os alunos. Sem dúvida, é uma proximidade muito diferente do normal. Pelo menos, muito diferente de tudo o que eu vivenciei como aluno. Seja no colégio, na universidade, quando fiz intercâmbio ou até na Miami Ad School. A gente curte pra caralho isso, se sente feliz por ser importante para os alunos e pelos vários papéis que a gente acaba assumindo nessa relação. Por um lado, nós somos professores - ou facilitadores, como preferimos chamar. A gente procura explicar a técnica, o processo, os atalhos, as dicas, mostrando o que a gente acha que funciona e o que normalmente não funciona. De outro, a gente serve como provocadores. Para provocar a curiosidade, sugerir novas soluções, fomentar o pensamento lateral e a busca de respostas para perguntas que ainda não existem. Mas vários alunos nos procuram para pedir conselhos sobre a profissão e a vida. Meio naquela pilha Sr. Miyagi. O que eu faço, isso ou aquilo? O que é melhor, este ou aquele outro?


Para onde eu vou, para cá ou para lá? A famosa PERGUNTA DE UM MILHÃO DE DÓLARES.

Na teoria, a vida é muito simples. A gente só precisa saber duas coisas. 1) O que a gente quer. 2) O que a gente vai fazer para conseguir aquilo que se quer. Um tanto óbvio, não? Óbvio o caralho. Na prática, a gente sabe que não é bem assim. Às vezes, a gente já está contratado, mas pinta uma proposta de estágio num lugar muito legal. E fica dias e dias se remoendo para saber o que fazer. Em outras, bate aquele desespero. Pedalo a faculdade para apostar no trabalho ou invisto no curso e vejo o que acontece depois? Tem horas que a gente se vê numa encruzilhada. Não sabe se se dedica à vida pessoal ou à vida profissional. Especialmente quando se tem vários amigos que fazem Direito ou Adminitração e sabem do trabalho às 17h30. Porra, é isso mesmo que eu quero fazer nos próximos 30 anos?


Vou para São Paulo ou fico aqui em Porto Alegre? Será que eu sou criativo mesmo ou sou uma farsa? Em meio a tudo isso, há uma boa e uma má notícia. A má notícia é que, desde que a Humanidade é Humanidade, essa é a pergunta mais difícil que existe. Porque só você tem a resposta. A boa é que, como o próprio nome sugere, essa é uma pergunta de 1 milhão de dólares. Se você responder, e responder certo, nada mais segura você. O 1 milhão de dólares - seja em dinheiro, seja em outro tipo de recompensa - é inevitável. Você pode largar o psiquiatra e viver a vida numa boa. O grande problema é que, diferente do Show do Milhão, essa pergunta não dá pra pular. A gente infelizmente (ou felizmente) tem que enfrentar isso de frente. Porque só assim a gente sabe o que é melhor: isso ou aquilo, ir pra lá ou pra cá. Então, valendo 1 milhão de dólares: qual é a sua resposta?


A VIDA SÓ MUDA COM ATITUDE. Eu adoro Poker. Na verdade, adoro o Poker Texas Hold’em. Pratico ao vivo e na internet, vejo as partidas pela televisão, visito diariamente sites, leio livros, artigos, estudo pra caralho. Quando viajo, sempre dou um jeito de aparecer num cassino. (Se você tem algum interesse em aprender o Texas Hold’em, clique aqui e aqui. Se não, siga em frente sem problemas.) O que me fascina nesse jogo, que é considerado a variante mais sofisticada de todos os tipos de poker, é que ele é uma mistura de estatística e atitude, com uma pequena interferência de sorte. Se você só for bom de matemática, e só souber calcular as chances de virar uma carta a seu favor, pode ganhar hoje. Mas ao longo do tempo, é mais provável que quebre. Se você só for corajoso, se só tiver cara-de-pau para blefar na hora certa, pode ganhar hoje. Mas ao longo do tempo, é mais provável que quebre. Um bom jogador precisa ter essas duas habilidades. Porque in the long run, a sorte se dilui. Todo mundo recebe boas cartas. Ganha quem sabe o que fazer quando elas aparecem. Acho que essa comparação serve para o nosso dia-adia.


Primeiro, porque a vida de um criador não se define apenas pelo seu talento, mas também pela sua atitude. Adoro quando vejo alunos da Perestroika demonstrando atitude - atitude que transforma suas carreiras. Teve aluno que vivia no interior, largou tudo, veio para Porto Alegre e hoje está contratado na Escala. Teve diretor de criação que repensou toda a sua carreira a partir do curso, decidiu dar um passo atrás para dar dois passos a frente. E deu certo. Teve redator que já era contratado e aceitou um estágio para investir no portfólio e continuar aprendendo. E está fazendo bonito. O que vale para esses três casos talvez não valha para todo mundo. Mas com certeza, era exatamente isso que essas três pessoas queriam. E só com atitude é que elas conseguiram botar em prática. O segundo ponto é: assim como todo jogador de poker recebe boas cartas, todo mundo têm boas oportunidades na vida. Alguns, percebem e conseguem aproveitá-las, porque estão bem preparados. Outros percebem, mas como não estão bem preparados, não conseguem aproveitar. E outros estão tão mal preparados que nem percebem a oportunidade. E o cavalo passa encilhado. Acredite. Na maioria das vezes, a infelicidade no trabalho está diretamente relacionada a alguma ra-


teada. Essa pessoa provavelmente teve uma chance e pisou na bola na Hora H. E não estou dizendo que essa chance significa uma entrevista numa grande agência. Pode ter sido apenas um job que o cara não deu tanta bola, e que poderia ter se transformado numa campanha com puta visibilidade. Pode ter sido um dupla pilhado, que você não aproveitou e, desmotivado, foi para outra agência. Pode ter sido uma competição que você deixou de participar, e que poderia ter ganho. *** Aproveito o gancho para falar do Young Creative 2008. Muita gente deixa de participar do Young porque acredita que não tem chances de ganhar. Para essas pessoas, eu lembro que, no júri, sempre estão profissionais com poder de contratação de grandes agências. Na primeira vez que fui jurado, eram dois diretores de criação avaliando as pastas, mais um que participava da organização. Todos eles viram os portfólios e anotaram vários nomes. Na última sexta, a história se repetiu. Vencer o Young é muito legal. Mas só participar já é uma experiência que melhora a sua pasta e que dá visibilidade para o seu trabalho.


Vale lembrar: tirando o Rafa, que foi o primeiro Young do RS, acho que ninguém ganhou a competição de cara. Então, ano que vem, nada de cu doce. Coloque a sua pasta a julgamento. Se você for mal, ótimo. É uma boa maneira de saber que você tem que se puxar mais. Se você for bem, ótimo. Sinal de que está no caminho certo. Se você ganhar, daí você me deve uma.


MUDAR FAZ PARTE É importante que estejamos sempre preparados para as mudanças. Faz parte da vida. É natural dos acontecimentos acontecer diferente do imaginado. De fato, é isso que sempre acontece e hoje já tenho esta certeza. Há quase três anos minha vida profissional mudou radicalmente em menos uma semana. Virou 180 graus sem eu parar pra pensar. Sem ter planejado coisa alguma. Surgiu, aconteceu. E eu fui. Numa quarta-feira de setembro de 2005 era um redator que, aos 26 anos, tinha uma carreira que indicava um futuro, no mínimo, digno. Já tinha ganho alguns prêmios e reconhecimento do mercado, coisas bacanas mesmo, entre eles dois anunciados apenas uma semana antes desta virada, o London Festival e a inclusão de duas peças minhas e do Peruca na Archive. No outro dia, tinha virado “cliente”. O grand prix do Prêmio Abril não valia mais nada. Irônico? Só você acha. Eu achei punk mesmo. Sofri pra burro. Alguns, poucos, sabem. Não tinha motivo para trocar, não fosse por algo dentro de mim me empurrando mesmo. Nada verbalizado. Estava realizado com o meu trabalho. Adorava meu dupla, meus chefes, a rotina mesmo. Sou alucinado por propaganda, quem me conhece, sabe. Trabalhar com meu pai era um puta de um prazer. No Moinhos de Vento, então, maravilha. Podia até acordar às 8h30, que


se tomasse banho correndo, ainda chegava às 9h na agência (tá, 9h05). E eu troquei. Acordei gerente de marketing, coisa que, sinceramente, não só NUNCA tinha imaginado, como não sabia exatamente o que era. Tendo que viajar 160 km por dia. No epicentro de um projeto iria custar, no final, mais de 100 milhões de reais para a Azaléia, o maior investimento da história da empresa. Tudo movido apenas por um desejo. Era eu ainda mais perto da construção da marca Olympikus, a maior marca esportiva do Brasil. Era o Pan, uma coisa que o país nunca viu parecido. A única coisa que sabia é que seria a oportunidade, dos sonhos, de tentar materializar na Olympikus meu pensamento de que criação vai além dos formatos tradicionais. Eu ia brifar agora. Eu ia aprovar. “Soluções criativas”. “Tudo é idéia”. Poderia testar na prática o meu discurso. Tudo graças a um cara genial chamado Paulo Santana. Que me contratou, deu uma chance gigante para um sonhador. Um guri até então sem experiência de gestão, mas que conhecia a marca e tinha muita vontade de aprender. Deu pra colocar criatividade na história? Claro. Todos os dias. Fiz muita coisa legal, que me orgulho pra caramba mesmo. Vejo minha cara na marca. Minhas opiniões e idéias. Mas o fato é que aprendi muito mais. A lógica é outra, a criatividade é outra. O negócio é gigante (hoje, depois de crescer mais de 100% de 2006 para 2007, são 60 mil pares POR DIA de Olympikus fabricados), fascinante, e muito mais complexo. Vendas, distribuição, produção, propaganda, produto.


Tudo isso eu aprendi com o Santana. E quando achava que o mar tinha acalmado, que já tinha visto quase tudo, surge uma nova mudança. Na semana passada o Santana despediu-se da direção de marketing do grupo. Tenho um novo chefe, novos desafios. Mudar faz parte.


TEMPO TODO MUNDO TEM. É SÓ UMA QUESTÃO DE PRIORIDADE. Certa vez, estava na noite e vi a cena com meus próprios olhos. Uma loira maravilhosa se aproximou do balcão e pediu um drink. Nem deu tempo dela receber a bebida e já chegou um magrão solando. Fiquei só ouvindo a conversa para ver onde ia terminar. Dava pra sacar que o cara era endinheirado. Só o relógio devia custar mais que o meu apartamento. Era um Patek Philippe todo balaqueiro. Não tinha como não notar. A loirosa também percebeu. Talvez por isso fosse só sorrisos. Papo vai, papo vem, não deu nem dois minutos e o cara largou. - Então, vamos para o meu apê? A loira foi muito elegante, e respondeu sem levantar o tom de voz. - Acho que você se confundiu. Eu não sou dessas. - E se eu pagasse para você 200 reais? - Meu amigo, eu já falei. Você está me ofendendo. - E se eu desse 10 mil reais, agora, na bucha. Você ia? Ela mudou o semblante. Pensou, pensou, olhou o relógio.


- Por 10 mil reais eu vou. - Então eu te ofereço 500. - Tá maluco? Você acha que eu sou puta? - Puta eu já sei que você é. Agora nós só estamos negociando o preço. *** Essa piada é um ótimo exemplo de um conceito que eu defendo insistentemente. Existe uma coisa dentro de cada um de nós que é o nosso combustível. Que nos estimula a fazer absolutamente tudo. É ela que define o que é importante e o que não é importante. Que determina a nossa relação de prioridades na vida. Essa coisa se chama motivação. O sinal mais claro e evidente do que nos dá prazer. *** Se eu oferecer cinco reais para você dar 15 voltas no Parcão, você vai achar a proposta ridícula. Agora, se eu oferecer um milhão de reais, é bem possível que você se interesse. E até consiga dar as 15 voltas, por mais fora de forma que esteja. Um milhão de reais é uma grande motivação. É muito dinheiro, e dinheiro é importante pra todo mundo. Só que no mundo real, ninguém oferece um milhão de reais para você fazer o seu trabalho bem feito. Ou para você chegar na hora nos compromissos. Ou


para fazer as coisas com antecedência, e não em cima da hora. Para fazer tudo isso, você precisa de motivação. É uma força interior. Ninguém precisa dizer nada. Você simplesmente faz porque aquilo é importante. Ninguém precisa dizer para você: dê atenção para a sua namorada. Se você gosta dela, naturalmente vai agradá-la. Se o seu filho adoecer e baixar hospital, você vai dar bola para o rodapé que tinha que layoutar até as 11h? Que nada: você vai sair correndo e deixar tudo pra trás. Afinal, essa é a sua prioridade. Fico imaginando um torcedor fanático dizendo Não fui no jogo porque esqueci que ontem era a final da Libertadores. Portanto, não se engane. As coisas que você lembra, que você dá atenção, que você coloca em primeiro plano são verdadeiramente importantes para você. É que o dá prazer, é o que é relevante, são as coisas que você acredita. O que você faz aos trancos e barrancos, correndo, na última hora, não. *** Todo mundo sabe que, como professor, sou bem exigente. E defendo essa posição pelo princípio da motivação.


Se você tem uma semana para fazer o tema, e deixou para a última hora, me desculpe. É sinal de que fazer o tema não era tão importante para você quando você está tentando me convencer que era. Você tinha outras prioridades. Ver a namorada, ir no jogo do Inter, beber com os amigos, dormir. Respeito e dou o maior apoio. Quem define as prioridades da sua vida é você. Agora, só não me venha dizer que não teve tempo. Porque o dia tem 24h para todos nós. Tempo todo mundo tem. É só uma questão de prioridade. Se você não fez o tema, ou fez mal feito, sinal de que tinha outras prioridades. E aí, essa é uma escolha sua, não minha. Por isso, quem tem que arcar com as conseqüências é você, não eu. *** O mais importante de todo esse papo de motivação, pra mim, é se conhecer. Por exemplo: se você procura determinado amigo só para pedir favores, é sinal de que aquela pessoa não é importante para você. Os favores dela é que são. Se você diz que adora o seu emprego, mas está sempre de saco cheio, sem a menor paciência para fazer o que estão lhe pedindo, contando as horas para o final de semana, pense bem. Tem coisa errada aí.


Perceba: as maiores dicas estão nos seus atos repetidos. É impossível fugir da nossa natureza. Se você sempre chega na hora quando o seu chefe manda, e sempre chega atrasado nos encontros da sua turma, você definitivamente não é um cara pontual. Se você fica todos os dias até tarde na agência, isso tem alguma importância para você. Talvez, você esteja investindo na sua carreira, porque isso é uma coisa na qual você acredita. Talvez você queria só mostrar para os outros como é trabalhador, e por isso não abre mão de entrar noite adentro. Talvez esse seja um valor da sua família, talvez você esteja apenas repetindo o que o seu pai e a sua mãe workaholics fizeram a vida inteira. Talvez você more sozinho, e não queira ficar isolado. Ou talvez você esteja duro e goste de ficar até tarde pra ganhar pizza de graça. Não importa. Seja com a sua namorada, com o seu dupla, com os seus sócios ou com a sua família. Se você não faz espontaneamente determinadas coisas, acredite: elas não são tão importantes quanto você acha que são. *** A minha dica é não ficar lutando contra isso. Se você faz as coisas por obrigação, e não por vontade própria, tente mudar esse panorama. Ou você vai ficar sofrendo a vida inteira. Você tem que estar apaixonado pelas coisas que faz e pelas pessoas com quem convive.


Eu sou apaixonado pela Perestroika. E é por isso que, mesmo viajando, mesmo de férias, eu vou continuar acompanhando o Blog. Só fico triste porque talvez falte tempo para contribuir como gostaria. É que nos próximos 30 dias, a minha única e maior prioridade é coçar o saco bem coçado.


MAIS UM POST QUERENDO SER INTELIGENTE. Está todo mundo na reunião. As pessoas começam a discutir, apresentam seus pontos de vista, concordam, discordam. Aí dá uma brecha, e aquele aspone larga uma das suas tradicionais pérolas. Daquelas que não acrescentam absolutamente nada. Ou só repete a opinião alheia, mas com outras palavras. Ou, quando está mais corajoso, se arrisca e tenta formular uma tese, mas se perde na contradição. Já percebeu? Às vezes a gente se pega tentando dizer coisas inteligentes, mesmo quando não temos nada inteligente para dizer. Parece que a gente quer provar para os outros que é capaz de discutir no mesmo nível. Mesmo quando ninguém está nos cobrando por isso. Eu cansei de me pegar fazendo esse tipo de coisa. Confesso. Fosse numa reunião, fosse aprovando um trabalho do meu assistente, fosse numa conversa de bar. Sempre falei muito. E muitas vezes, falava muito sem dizer absolutamente nada. Como sempre tive facilidade de colocar meus pontos de vista, conseguia influenciar outras pessoas ao meu redor. Que talvez nem concordassem com o que eu tinha a dizer. Mas por timidez, ou por dificuldade de verbalização, ou


por pura falta de saco, simplesmente aceitavam o que eu estava dizendo. O clássico “tá, melhor concordar com ele, porque talvez assim ele cale a boca”. De uns tempos pra cá, observando outras pessoas que também falam muito, percebi que elas gostam mais de ouvir a própria voz do que realmente saber a opinião alheia. E aí, comecei a exercitar um hábito que tem me ajudado muito. Ouvir. Recomendo. Quando são convidadas a contribuir, quando se cria um clima favorável, quando tudo acontece de forma natural, as pessoas - por mais incrível que pareça - dizem coisas interessantes. E é fantástico ver como isso pode contribuir em todos os aspectos da sua vida. No nosso trabalho, então, nem se fala. Um dos lemas do livro “It’s not how good you are it’s how good you want to be” é seek criticism. Busque a crítica, não busque o elogio. Ela faz o seu trabalho crescer. Mais um lema que a Perestroika acredita e estimula. Mas você só vai saber a opinião dos outros se você ouvi-los. Se você QUISER ouvi-los. Perguntar e não levar em conta o que os outros estão dizendo é uma perda de tempo. Ouviu?


QUANDO NADA É TUDO O QUE SE TEM A DIZER. Uma das coisas mais óbvias - e muitas vezes ignorada por nós publicitários - é que um bom produto, por si só, já é uma marca. Certamente daí que saiu a máxima a melhor propaganda que existe é o boca-a-boca. Na verdade, a melhor propaganda existe é fazer um bom produto. Se ele for verdadeiramente bom, naturalmente vai gerar o boca-a-boca espontâneo. Foi a partir desse pensamento que surgiu um tipo de propaganda aparentemente comum, mas extremamente eficiente. A chamada propaganda demonstrativa. Que simplesmente mostra o produto em ação e isso já nos convence a comprá-lo. Um clássico: http://www.youtube.com/v/4q7GCuWFsSs Um clássico moderno: http://www.youtube.com/v/GBCfW9-hjKI Mas existem empresas que levam isso ainda mais a fundo, e nem se preocupam muito em anunciar na mídia tradicional. Investem essa grana, por exemplo, no ponto-de-venda. Para que o cliente se sinta à von-


tade e tenha uma experiência inesquecível. Investem em serviço: um funcionário bem pago trabalha mais e melhor do que um que ganha salário mínimo. Acho que, dentro de umas, a Perestroika trabalha um pouco em cima dessa filosofia. Pode parecer contraditório, mas a gente quase não anuncia na mídia tradicional. A gente cacifa no nosso produto. Se as nossas aulas forem boas, elas naturalmente vão virar assunto nos corredos das universidades. Vira pauta de programas que falam de propaganda. E aí, mission accomplished. **** (ATUALIZADO ÀS 15H57) Falando nisso: essa semana, demos uma entrevista para a TVCom. Ao que tudo indica, a reportagem vai ao ar na próxima sexta, dia 7/3, às 22h. Inclusive enviamos vários trabalhos das turmas 1 e 2 para Lu Adams. Não existe garantia nenhuma, mas é possível que um ou outro apareça durante a reportagem. Então, já fiquem espertos. Sexta que vem, nada de happy hour, nada de BBB. Todo mundo ligado no 36.


THE BIG OLD IDEA Big Idea é a palavra da moda da propaganda. Agora, não basta mais se ter uma simples IDEA. Ela precisa ser BIG. Sempre vi com certo receio essa terminologia. Não porque eu seja contra Big Ideas. Mas só porque, ao meu ver, essa não é exatamente uma novidade. Desde que eu entrei na propaganda, cansei de ouvir idéias que foram maiores do que um simples anúncio. Lembro perfeitamente das tirinhas de Bib’s, criadas de forma maravilhosa pela Escala. Eu era recém um projeto de projeto de publicitário. E já me divertia com as tirinhas no Segundo Caderno da Zero Hora. Um espaço até então marginalizado: entre os quadrinhos e a agenda de filmes em cartaz. Não poderia ser mais adequado. Ótimo tanto como idéia de mídia quanto de criação.


OK, mas aí você pode dizer que isso não é BIG IDEA. É apenas ADVERTAINMENT. Bom, então vamos lembrar dos comerciais antológicos de Rider. Aqueles clipes grandiosos, que iam muito além dos 30″. Sempre com um hit na trilha sonora. Paralamas, Lulu Santos, Barão Vermelho, ih. Teve de tudo. Teve tanta música bacana que até virou um CD da própria Rider. E isso, é Big Idea? http://www.youtube.com/watch?v=CCGcNP_s3uk Ah, mas de certo você deve estar pensando: “ora, um simples CD não chega a ser uma Big Idea. É só uma variante primitiva da atual CROSSMEDIA”. Tá bom, tá bom. Mas que tal esses caras aqui? http://www.youtube.com/watch?v=EU7uojbvoKQ


Tenho certeza que você lembra das pessoas se acotovelando nos supermercados em busca dos mamíferos de pelúcia. A sua irmãzinha queria um. A sua namorada queria um. A sua mãe queria um. Uma campanha que virou produto, e um produto que virou dinheiro extra para a Parmalat. Isso tudo aconteceu em 1997, quando o termo “Big Idea” nem tinha chegado no Brasil. Então, essa campanha é ou não é? E o que falar de uma votação popular para escolher o novo Casal Unibanco, o primeiro comercial interativo da história? E o gesto universal de “número 1″ da Brahma? Tão forte que foi repetido pelos jogadores (alguns por querer, outros sem querer) na final da Copa de 94?


Eu sei que a propaganda mudou. Só tomo cuidado para não ser levado pela onda sem, pelo menos, fazer o saudável exercício da reflexão. Sempre vai ter algum marketeiro querendo embalar o velho de um jeito novo, para colocar num powerpoint e ganhar dinheiro em cima disso. Mas não há como negar: a propaganda atual está produzindo inúmeras Big Ideas. Talvez o próprio termo Big Idea seja uma delas.


SOCO NO QUEIXO. “Apenas 25% da população brasileira entre 15 e 64 consegue ler e escrever plenamente. Os outros 75% apresentam muita dificuldade ou nenhuma habilidade na leitura e na escrita. É o que atesta a terceira pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) no Brasil sobre analfabetismo funcional e absoluto. Entre os dois mil entrevistados, 68% são analfabetos funcionais, isto é, apresentam dificuldade em interpretar textos e não têm muita habilidade na escrita. Uma pequena melhora foi notada entre o grupo do nível dois de alfabetismo, formado por pessoas capazes de ler textos curtos e localizar algumas informações. O aumento de 34% para 38% reflete uma melhora no ensino fundamental no Brasil. A prova aplicada pelo Instituto nos pesquisados tinha 20 perguntas sobre família, estudo e hábitos de leitura e escrita. Os outros níveis de ensino da leitura e escrita abordados pelo Ibope mantiveram os índices da última pesquisa, realizada em 2001 pelo Instituto. O nível rudimentar, em que a pessoa consegue ler títulos e frases isoladas, manteve os 30%. Já o nível pleno continua com os mesmos 26%.” Essa reportagem foi publicada em setembro de 2005. Foi capa da Zero Hora. Além de sublinhar uma realidade triste da nossa sociedade, reforçou a posição dos que acreditam que ninguém lê título. De que


ninguém lê texto publicitário. E de que os poucos que lêem não entendem. Ora, não vamos nos deixar iludir. É óbvio que a minoria absoluta das pessoas perde tempo lendo propaganda. Mas quem lê espera ler um título bom. Espera ler um texto que o faça mudar de opinião sobre o produto. Espera ouvir um diálogo bem escrito, que soe natural. A maioria das pessoas está com a guarda alta, sim. Mas o texto eficiente desarma. E aí, nós temos uma chance, uma única e valiosíssima chance, para acertar o neguinho no queixo. Nessa hora, não dá pra pegar de raspão. Não dá para ser um titulinho qualquer. Tem que ser foda. Tem que botar o cara na lona. Essa pequisa pode induzir a um segundo pensamento equivocado. Porque assim como a maioria da população não interpreta bem os textos, essa mesma maioria não lê determinados veículos. Portanto, o erro não é do redator que faz um título inteligente para a Carta Capital. É do cara que complica a vida da tiazinha que lê Ana Maria. Então, fica a dica. Sempre dá simplificar com dignidade. É aceitável - e coerente - que, num veículo popular, a idéia seja menos criativa. Mas nunca menas criativa. P.S.: Este post não tem imagens por motivos óbvios. P.S. 2: Se você não entendeu os motivos óbvios, dirija-se ao grande grupo. P.S. 3: O P.S. 2 faz referência a um título genial.


PORQUE SIM! Por que anúncio de varejo tem que ser sempre poluído? Por que alguém ainda usa “No nosso aniversário, quem leva o presente é você”? Por que o gerente enlouquece? Por que tem tanto anúncio com uma barra embaixo para colocar todas as informações? Por que propaganda de cerveja sempre tem mulher gostosa? Por que os comerciais da Wella são sempre com umas modelos internacionais e uma dubladora em cima? Por que os comerciais do Sorriso é sempre um monte de gente numa piscina? Por que não se deve começar um título com uma negativa? Por que tem tanto conceito em dois tempos no gerúndio (Fazendo amigos. Produzindo mudanças)? Por que os descendentes de italianos sempre batizam os seus negócios com ARE? Por que os grandes lançamentos sempre acontecem no intervalo do Fantástico?


Por que a assinatura das agências sempre vai no ladinho do anúncio? *************************** Pense bem. Quando você vai num restaurante, sempre pede o mesmo prato? Se chama uma pizza, pede sempre calabresa? Se você respondeu sim, talvez você também esteja ajudando a perpetuar a espécie de propaganda que é sempre igual.


O ATENDIMENTO*. Um dos meus diálogos prediletos do cinema vem do clássico O Poderoso Chefão. Michael e sua esposa estão conversando quando, de repente, ela sugere que seu sogro, Vito Corleone, é mafioso. Usando um brilhante eufemismo, Michael filosofa: - Meu pai é como qualquer homem poderoso. Qualquer homem responsável por outros. Como um senador ou presidente. - Você é ingênuo. Senadores e presidentes não matam. - Quem é ingênuo, Kay? Acho que existe um preconceito, até uma certa ingenuidade, quando se fala que o atendimento é burro. Claro, eles não entendem a sutileza de determinadas idéias. Simplesmente porque não têm o cérebro treinado para isso. Assim como você provavelmente não entende um monte de coisa que eles fazem muito bem. E com uma mão nas costas. Claro, eles não escrevem tão bem quanto um redator. E por isso aparecem erros de português no PIT. Por outro lado, você provavelmente não tem o tato que os atendimentos precisam ter quando o cliente liga bufando porque acabou de ver que o seu anúncio saiu borrado na Zero Hora. Esse tato é talento. Um talento diferente do criador, mas igualmente importante para a agência.


Se você fez um anúncio do caralho e o atendimento não aprovou, não significa que ele tenha apresentado mal. Existem infinitos fatores para que o cliente renegue um trabalho. Quem já esteve na linha de frente sabe como é. Já vi um diretor de arte reclamar que o atendimento tinha enviado sua campanha para o cliente por email. E eu perguntei: “Você foi até o atendimento defender a idéia? Ou mandou por email?”. Ele nem teve coragem de responder. Você já se imaginou no papel do atendimento? Como reagiria se alguém chegasse em cima do prazo e disesse “olha, vai demorar mais uma hora até terminar de montar”. Ou quando apresentassem um anúncio completamente fora do briefing quando não desse mais tempo de refazer? Está cheio de atendimento burro ganhando 4, 5 mil por mês. Assim como está cheio de criador esperto, talentoso e premiado ganhando 600 pila. Conheço muito atendimento que tem o cliente na mão. Que se saísse da agência, levaria a conta junto. E não conheço nenhum criador que tenha esse poder. Até concordo que, na média, eles são menos capacitados que os criadores. Mas discordo da generalização. Até porque, se eu concordar, não aprovo mais nenhuma ideia. ***** *O título foi trocado porque dá uma impressão errada sobre o seu conteúdo.


QUANDO A HISTÓRIA É CONTADA DE TRÁS PARA FRENTE. Essa é a capa da revista Wired. A prova de alguém que gosta de correr riscos.

Aposto que a grande maioria das pessoas, quando leu pela primeira vez, interpretou o “Pray” (Reze) como “Reze em nome da Apple, afinal de contas, ela é foda”.


Observe na foto acima, no canto direito superior. Diz “June 1997″. Sim, essa edição tem mais de dez anos. E, ao contrário do que possa parecer, o significado de “Pray” é “Reze pela Apple, afinal de contas, ela está quase morrendo”. A Wired previa um futuro extremamente nebuloso para a companhia. Justo quando Steve Jobs voltava à empresa como consultor e começava a tornar a Apple uma das empresas mais inovadoras do mundo. Talvez A mais inovadora do mundo. Revista Wired, 1997. A reportagem tem como título “101 maneiras de salvar a Apple”. Curiosamente, o item 1 sugere: “Admita, Apple. Você está fora do ramo de hardwares”. Hoje nós sabemos que a Apple não só aumentou sua fatia no mercado de computadores, como criou uma nova plataforma de hardware: o I-pod.

Canso de ver jogos de futebol que, até os 25 do segundo tempo, estão indefinidos. Um time na pressão, outro na retranca. Aí, num contra-ataque, sai o segundo. A equipe se joga para tentar empatar, mas abre espaços na defesa. Termina 4×0 e o comentarista larga: “foi uma partida de um time só, que mostrou superioridade, soube se defender e matar o jogo na hora certa”. Quando a história é contada de trás para frente, é tudo muito fácil.


Cresci ouvindo meu pai dizer que as pessoas julgam o sucesso dos outros, mas nunca consideram os riscos envolvidos para alcançar esse sucesso. No caso do jogo de futebol: colocar o time inteiro na retranca pode ser um tiro no pé. Se tomar um gol, o técnico é burro. Se ganhar, é um herói.

Muita gente erra porque se arrisca. No ramo de computadores, no futebol e na propaganda. Quantas campanhas a gente vê no ar e diz “caralho, onde é que eles estavam com a cabeça?”. Se dissessem que “para anunciar o PSP, a Sony vai grafitar muros de Nova York com imagens de caras jogando”. Alguém em sã consciência teria coragem de reprovar esse viral?


Vocês com certeza ainda enfrentarão muitas situações assim. Agora, como criadores das suas próprias idéias. E mais para frente, como avaliadores das idéias dos outros. Eu aprendi a admirar quem, no mundo da propaganda, sabe correr riscos. Sejam os doentes ou sejam os comportados. Sim, porque quando se fala em riscos, muitos confundem com ousadia. Às vezes, ser conservador é o mais inusitado, justamente o que garante vida longa para determinada campanha. Veja o exemplo de marcas que não alteram as suas embalagens há décadas. Aposto que algum chato passou anos e anos tentando convencer o Seu Maizena a trocar o rótulo para que o produto não parecesse velho. Então, chega a hora de dar sentido a esse post. Um post aparentemente comum. Mas experimente lê-lo novamente, agora de baixo para cima. Primeiro o último parágrafo, depois o antepenúltimo, e assim por diante. Muita gente vai dizer que não é uma idéia 100% original. Muita gente vai dizer que é moleza. Sabe como é: quando a história é contada de trás para frente, é tudo muito fácil.


O NOVO CRIADOR Todos já conhecem este filme da Dove, certo?! Passei ele pra turma 2 no último dia de aula. http://www.youtube.com/watch?v=Ei6JvK0W60I Um dos criadores se chama Tim Piper, quem já ouviu falar? É dele também o filme mais falado de 2007, ganhador de dois GPs em Cannes, para o mesmo anunciante. http://www.youtube.com/watch?v=hibyAJOSW8U Muito bom, né?! Agora vejam quantas vezes o nome do Tim aparece na ficha técnica: Agency: Ogilvy Toronto Creative Directors: Janet Kestin, Nancy Vonk ACD/Writers: Tim Piper (1), Mike Kirkland Art Directors: Stuart Campbell, Mike Kirkland, Sharon Lee Pan, Tim Piper (2) Production Companies: Worldwide Productions, Miami; Steam, Toronto Director: Tim Piper (3) Photography: Mark Belvedere, Tim Piper (4), Mike Kirkland Post Producer - Stefani Kouverianos (Soho) Online Editor: Kevin Gibson (Soho) Off-line Editor: Tim Piper (5) Sound design: Vapor, Toronto


Cinco vezes. O novo criador, o cara que vai dominar a banda, precisa ser assim. Precisa saber criar -e muito bem, mas deve entender também o máximo sobre tudo aquilo que envolve o processo que começa antes mesmo do PLIM da idéia e vai até depois do OK do cliente pra ir pra rua. Envolve idéias, referências, produção, MAS envolve TAMBÉM estratégia e conhecimento do negócio do cliente. Vale entender mais, até, sobre o resultado da campanha na mídia. A internet, por exemplo, permite ir mensurando ao vivo uma ação e mudando ao longo do caminho. E não espere por ninguém, ou no caso das agências mais estruturadas, o departamento de planejamento. Uma campanha, uma idéia, não precisa necessariamente de um planejador, MAS precisa ser planejada. É batata: quando mais curiosidade, mais informação tivermos, e mais entendermos do todo, melhor vai ser o resultado daquilo que passar pelas nossas mãos. A Perestroika e o conteúdo das aulas, surgiu desta crença, até. A soma das aulas tenta mostrar isso. O estímulo ao “foi lá e fez”. A tentantiva de fazer os alunos experimentarem de tudo: de uma stand up comedy a uma campanha colocada na rua, valendo Brahma. As aulas de referências criativas e marketing criativo com perspectivas, cenários e possibilidades. Isso o novo criador precisa pra caramba. Só que não adianta ter isso e querer ser redator ou DA (ou os dois, como é comum na Ingleterra) e não saber a técnica. Porque só sabendo tecnicamente que o cara coloca CINCO VEZES o nome dele na ficha.


Tem que saber fazer. E bem. Por isso maratona de títulos. O Tim Piper é mesmo um belo exemplo. É neste tipo de gente que o nego que tá começando precisa mirar. Entender o padrão dele. Em entrevista sobre a campanha do Evolution e o filme Onslaught (o primeiro deste post, mas que na real foi ao ar depois do segundo mostrado aqui) o Tim fala que eles sempre souberam que o Evolution tinha mais potencial viral (e tem) que o Onslaught, mas que a mensagem do segundo é muito mais poderosa. Filhodaputa, pensei: primeiro eles viralizaram com o Evolution, depois lançam o segundo já “contaminado”. Todo mundo quer ver, em função do primeiro, e vai tomar um soco na barriga pela mensagem -que eu acho FODA. Essa, pra mim, é outra graaaaande idéia dessa ação que só estudando a gente descobre. E ele sabe disso. Numa outra entrevista, ele conta todo o conceito da marca Dove, da relação aberta com o cliente e a multiplicação de toda a ação numa plataforma incrível. Fala que eles sabem quando precisam seguir policies porque é mais eficiente mesmo e quando o conteúdo da comunicação é a idéia poderosa. Tipo, o cara entende de conceito, de marca, de posicionamento. E sabe fazer. Descobri mais este filme que ele aparece como redator e diretor. http://www.youtube.com/watch?v=47rQkTPWW2I No YouTube dá pra achar o USER dele tb. Que o cara sirva de inspiração. Esse envolvimento e conhecimento dos processos todos deu GP em Cannes em FILMES e CYBER.


PRESSA E VELOCIDADE O último comentário no post anterior foi da nossa aluna Gabriela Oliveira. Ela disse “eu acho que este blog está mudando… não tem mais atualizações. :(” E é engraçado porque eu mesmo já tinha acessado o blog algumas vezes e estava meio ansioso com o novo post que deveria estar para nascer. Mas daí, me dei conta que estávamos há apenas um dia sem post novo, o que na real nem é tanto tempo assim. Só que na minha percepção, na da Gabriela, e provavelmente na de mais gente, parecia que já estava velho. Desatualizado. É a tal da pressa, dessa questão que aparece em tudo o que é pesquisa de comportamento e de tendências de consumo. Como a gente quer informação cada vez mais rápida, cada vez mais instantânea, cada vez mais tudo ao mesmo tempo. De preferência, agora. A tal da snack-culture. O tal do mash-up. (Vejam só como esse negócio de mash-ups musicais. Ouvi numa festa um mash-up de Paradise City com ABC. É ouvir Guns n’ Roses e Jacskon Five ao mesmo tempo. E é muito afudê por sinal.) http://www.youtube.com/watch?v=5HPoB-N6De0 De certa forma essa pressa acaba se refletindo muito na nossa vida profissional. Prazos apertadíssimos, clientes que querem resolução de um briefing para ontem, diretores de criação que querem que seus estagiários de 19 anos já sejam criadores mais maduros. Pior: estagiários de 19 anos já se julgando cria-


dor maduro, querendo fazer leilão entre agências, coelhar trabalhos, achar que todos atendimentos e clientes são caretas, que não entendem o vanguardismo das suas propostas. Não falo do alto da minha experiência, porque ainda não cheguei lá. Mas já tenho 30 anos e só com isso já consigo saber que tem coisas que só vem com o tempo. Que não tem como amadurecer mais rápido. Como o tempo necessário para aprender a lidar com as frustrações da vida profissional de modo igualmente profissional, sabendo o que significa ter jogo de cintura e diplomacia. É saber que daqui a pouco o teu salário vai aumentar. Que uma nova oportunidade vai aparecer em pouco tempo. Que às vezes um trabalho não vai ficar tão bom. E também, é saber que existe um tempo para a idéia chegar, amadurecer e se confirmar como uma idéia boa mesmo. Por isso, hoje em dia, quando eu pego um briefing, não fico arrancando os cabelos se não surje uma idéia logo na primeira hora de brain. Às vezes, isso acontece. Mas muitas vezes, são dias e dias de conversa, discussões, insights, passos para trás e trcandas, muitas trancadas. Mas ela chega. Leva tempo para quebrar a matrix. É como a hora certa de dar o primeiro beijo numa mina. Tem que ter o timming. Se quiser acelerar, é capaz de não rolar. Tem que criar o climinha, estabelecer alguns contatos e química antes de fazer o primeiro movimento de chegar. Mas também não poder demorar muito, porque se também se perde a oportunidade. Agilidade na hora certa. Porque há de se ser rápido. Mas talvez não com tanta pressa.


EU NÃO ACREDITO EM CHUPADA. Durante o último mês, recebi de milhares de emails com dois links do Youtube. Um com um comercial da Adidas para as Olimpíadas de Pequim. Outro, com um comercial criado por mim, pelo Rafa, pelo Beto Callage e pelo Régis Montagna, para Olympikus. http://www.youtube.com/watch?v=MD6APk7o-lI http://www.youtube.com/watch?v=droY_91s5cU

A maioria das pessoas, quando me escrevia, já fazia questão de acusar os chineses de chupadores. Talvez na tentativa de me consolar. Mas mal sabiam eles que, pelo menos a mim, essa coincidência não afetava em quase nada. Eu, assim como grande parte dos criadores da minha geração, me deparo com esse tipo de situação no mínimo uma vez por mês. Alguma idéia nossa, reproduzida de forma idêntica por outra agência, que ou entrou na Archive, ou foi premiada em Cannes, ou no CCSP. E não é porque a gente é foda. Não me sinto nem melhor, nem pior por isso. As coisas simplesmente são assim.


É por isso que, quando esse tipo de coincidência acontece, eu não fico nem feliz, nem triste. Durante um longo período da minha carreira, eu ficava eufórico por ser “tão bom quanto os caras da Crispin Porter”. Ou puto porque “o cliente ficou se enrolando para aprovar, agora deu nisso.” Hoje eu simplesmente volto para a minha pilha de folhas em branco e começo tudo de novo. Eu não acredito em chupada. Não consigo imaginar um criador experiente falando para a sua dupla: “Meu, e se a gente copiasse aquela idéia escondida naquele seu anuário espanhol que ninguém conhece?”. Ainda mais sendo alguém da Crispin Porter, ou da 180 Amsterdam, ou da BBH, ou da Abott, Mead e Vickers. Impossível. O próprio termo “chupada” cai em desuso entre esse grupo de criadores experientes. Com o passar do tempo, percebi que essa gíria quase nunca é utilizada por diretores de criação. Acho que essa galera já se deu conta que a coincidência de idéias não acontece de vez em quando. Acontece SEMPRE. Isso é bem mais comum na gurizada. Um dos motivos é que eles ainda não viveram esse tipo de situação. Ou se viveram, não viveram um número suficiente de vezes para entender que é mais comum do que parece. Outra coisa: o banco de dados de um estagiário ainda está se formando. Ele está enchando o HD com referências de layouts, por exemplo. Layout 1,


Layout 2, Layout 3, Layout 4. Daí, quando ele chega lá no Layout 237, percebe que é muito parecido com o Layout 188. É natural que a primeira reação seja dizer que é uma chupada. Mas normalmente não é. E por último, porque é uma forma de se afirmar no grupo. Quando você está numa rodinha de amigos, e alguém mostra um comercial, e você retruca dizendo que é chupado, está demonstrando ter um conhecimento que os outros não têm. Muitas vezes, o que essa pessoa gostaria de dizer era “eu conheço um comercial bem parecido com este e, pelo visto, vocês não”. A nossa ex-aluna Gabi Elias mandou esses dois sites, que eu achei fantásticos. O primeiro, porque reforça exatamente essa tese. E o segundo porque, mesmo insinuando a chupação em determinadas situações, a recorrência prova o contrário. É evidente que, na maioria das vezes, as coincidências acontecem simplesmente porque acontecem. http://www.coloribus.com/admirror http://www.joelapompe.net A Estação da Propaganda tem uma sessão também interessante, que mostra até algumas “chupadas clássicas”. http://www.dpto.com.br/chupadas Eu não acredito em chupada. Nunca vi ninguém copiando deliberadamente uma idéia publicitária de terceiros. Nunca ouvi falar de algum amigo, colega ou conhecido que tenha feito isso. Mas é como aquele ditado famoso. “Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”.


O CU DOCE DE SALVADOR DALI. Acho que a publicidade, às vezes, tem um discurso um pouco hipócrita. A gente fica falando “da busca pelo novo” quando, na verdade, nada, ou praticamente nada do que a gente faz, é realmente inédito. E sinceramente, não vejo nenhum problema nisso. A única coisa que me incomoda mesmo é ficarmos fazendo de conta que o nosso negócio é mais inovador do que realmente é. Explico. Vejam só esses dois exemplos. O primeiro vídeo foi criado por um fã do Daft Punk, que pegou a música “Harder, Better, Faster, Stronger” e fez um clip caseiro, todo analógico, e muito legal. http://www.youtube.com/watch?v=K2cYWfq--Nw Na seqüência, veio um segundo clip, criado por duas meninas, em cima da mesma música, da mesma linguagem, dos mesmos recursos analógicos - mas de uma forma diferente (contribuição do nosso aluno Pinky Demutti). http://www.youtube.com/watch?v=lLYD_-A_X5E Mesmo conhecendo a primeira versão, e mesmo percebendo elementos comuns, não há como não gostar do segundo vídeo. E por que isso acontece?


Lá em 1500 e pouco, um tal de Giuseppe Arcimboldo inventou os primeiros princípios do Surrealismo. Eram pinturas muitíssimo estranhas para os padrões estéticos da época. Na verdade, o Surrealismo só foi surgir como movimento muitos anos depois. Fico pensando se o Salvador Dali, que pegou esses mesmos princípios e potencializou, que levou ao limite mais fantástico da imaginação, ficasse de cu doce. “Ah, isso já foi visto. Temos que pensar em algo totalmente novo”. E nunca materializasse os quadros que todos nós admiramos. Acho que existe na propaganda um certo purismo exagerado atrás do novo. Pra mim, a questão não é o ponto de partida. É o ponto de chegada. Se você conseguir agregar elementos novos a algo antigo, feito. Como nos clips do Daft Punk acima. Certa vez li e nunca vou mais esquecer. “Saber copiar também é inovação”. Mas claro, tudo sempre dentro do bom senso.


HOJE FUI AO CENTRO Tirei esses 3 primeiros dias da semana para organizar a minha pauta da vida pessoal. Marcar médicos, pagar impostos, arrumar o DVD player. Coisas que vocês vão ver em pouco tempo, a gente nunca tem tempo para fazer. E daí uma das coisas que eu tinha que fazer era no centro. Fazia bastante tempo que eu não ia ao centro. Foi um saco, por causa do trânsito, que tava muito foda. E mais o problemas de estacionar no centro, que é bem foda. E mais caminhar no centro. E ficar meio em dúvida se a Marechal José Inácio é quantas antes da Otávio Rocha ou se é mais pro lado da Dr. Flores. Mas eu vivi uma cena que foi ducaralho lá no prédio da Galeria Malcom. Na hora que aconteceu, pensei “É isso que eu vou postar hoje”. Uma típica cena de piada da vida real, que, inclusive, faz parte do conteúdo da minha aula do Módulo 2. Sensacional. E hoje era meu dia de postar. Tinha que postar até a meia-noite. Mas no fim, tinha tanta coisa na minha pauta pessoal, que acabei chegando tarde em casa. Bem cansado. E essa história precisa ser contada com calma. Com inspiração. Com detalhes. E logo que eu entrei no computador, fiquei trocando uma idéia com o Guile e com o Michel e com a Gabi Elias por MSN, tirando algumas dúvidas deles sobre questões da Peres-


troika, e, quando me dei conta, já tinha passado da meia-noite. Então, peço a todos desculpas por não ter postado no prazo que eu tinha como compromisso. Foi realmente foda meu dia. Mas amanhã mesmo vou escrever a história do centro como ela merece ser contada e vocês vão ver que valeu a pena esperar. Abraço, Felipe *************** Senhoras e senhores, E assim terminamos a aula de hoje. Uma demonstração prática de que o método da Abordagem Sincera, quando usada com técnica, realmente é capaz de sensibilizar o cliente. E transferir a reunião. Obrigado A direção de Perestroika.


UM DIA DE FÚRIA No último sábado, vocês devem ter notado que eu estava um pouco mais tenso que o normal. Em parte porque alguns acontecimentos da aula me deram motivo para reagir assim. Mas o grande vilão foi o stress. É impossível acumular todos os compromissos que assumi nas últimas semanas sem afetar o humor. Se de alguma forma eu ofendi alguém ou disse alguma coisa que possa ter ultrapassado o limite do bom senso, por favor: me desculpem. Definitivamente, não estava no melhor dos meus dias. Com o passar dos anos, fui mudando radicalmente a minha forma de enxergar a propaganda. No início da carreira, era a minha vida. Não saía pra almoçar, ficava sempre até mais tarde, nem reclamava de ir final de semana. Falava para os colegas de faculdade “saí ontem onze da noite, tive que ir sábado e domingo, faz um mês que eu não tenho final de semana”. Achava o máximo. Aos poucos, percebi que grande parte do meu horário extra-pauta era porque eu ficava zoando durante o dia. E aí tinha que recuperar o tempo perdido na noite. Ou pior: muitas vezes eu ficava por ficar. Chegava 19h, puxava um papo, o pessoal pedia pizza, eu ia ficando, trabalhava meia hora, conversava um pouco mais. Aí lá pelas 23h, quando eu estava no bagaço, ia embora. Achando que tinha trabalhado pra caralho.


Na verdade, eu estava tentando convencer a mim mesmo que era mais dedicado que os outros. Quando, na verdade, meu número de horas de trabalho era baixíssimo. Ainda estagiário, me dei conta desse padrão e mudei rapidinho. Notei que o mais importante não era o número de horas dentro da agência, mas o número de horas produtivas dentro da agência. Foi aí que eu vi meu trabalho evoluir bastante. Porque o extrapauta deixou de ser um misencene e se transformou num diferencial competitivo de verdade. O dia-a-dia do criador mascara bastante isso. Na maioria das vezes, se você quiser, pode passar o dia fazendo de conta que trabalha. O exemplo clássico é o brainstorm. Sem muita disciplina, o brain vira conversa fiada em questão de minutos. Mas aonde eu quero chegar com tudo isso? Em duas dicas. Primeira: não deixem a propaganda fuder a vida de vocês. Quem quiser ficar até tarde ou trabalhar no final de semana, beleza. Também não vou ser hipócrita. Acho que o início da carreira é a melhor época para o cara mostrar serviço. Mas façam disso uma coisa produtiva, ou vocês não vão estar perdendo de ambos os lados. Segunda: quando o peso da pauta ultrapassar o lógico, e a vida de vocês se transformar num Carandiru remunerado, pensem bem. A gente não veio ao mundo pra ficar trancado dentro de uma agência. Mas não adianta ficar reclamando para os colegas no ho-


rário de almoço ou se lamentando para a namorada. Ou você faz alguma coisa para mudar, ou aceita as conseqüências. Porque certamente o seu chefe não vai virar para você e oferecer uma folga. Tenho vivido Um Dia De Fúria atrás do outro. Mas dei uma sorte filha da puta. O auge do stress coincidiu justamente com o início das minhas férias. A partir de quarta, eu deixo de ser William D-fens Foster para ser Ferris Buller.


VOLTE ATÉ A PRIMEIRA CASA. Começo a escrever este post às 5:41 da madrugada de sexta para sábado. Tudo porque fui acordado por uma ligação de tirar o fôlego. Meu irmão (não o Pinky, o outro) tomou todas, bateu o carro, se enrolou com a polícia e eu tive que ir lá dar uma força. Missão cumprida. Ninguém se machucou, ninguém foi em cana. Só eu, que agora perdi o sono e aproveitei a internet pra me distrair. Quando a gente é gurizão, faz muita merda. E exatamente por ser gurizão, a gente sempre pensa que não vai dar nada. Não usa camisinha, compra briga por bobagem, dirige no trago. A relação da juventude com a vida é muito instantânea. Um cara de 20 e poucos anos não consegue ter uma visão de médio prazo. É tudo de agora pra agora. Eu canso de ver estagiários talentosos se queimando por bobagem. E confesso pra vocês que, com o passar do tempo, tenho achado isso cada vez mais comum. Gente que não cuida horário, que não respeita a hierarquia, que reclama de qualquer coisinha, que faz corpo mole na hora errada. Acho cômico quando um assistente chega atrasado, nitidamente de ressaca, e inventa uma desculpa esfarrapada. Ou quando vai trabalhar chapado e acha que ninguém vai perceber. Ou quando passa o dia no MSN, ou no email, ou coçando o saco, e acha que não vão notar. Construir uma carreira exige planejamento, dedicação e muitos cuidados. Mesmo que você sempre ande na linha, um passo em falso fode tudo. Mais ou


menos como aqueles jogos de tabuleiro. Você está quase no finalzinho, quando tira uma carta “Seu chefe encheu o saco das suas desculpas. Perdeu tudo. Volte até a primeira casa.” Sugiro que todos vocês releiam o “Manual do Estagiário” do Eugênio Mohallem, que entregamos no CD da aula inaugural, mas também pode ser encontrado com facilidade na internet. Tudo o que ele fala sobre a postura de um assistente é lei. Até porque, tudo o que ele fala sobre qualquer coisa é lei. Você é um produto, mas você também é a agência responsável por esse produto. Pense a médio/longo prazo. Coloque cada tijolinho no capricho. O muro não precisa ficar pronto rápido. O mais importante é que, no final, a parede esteja bem sólida. Se você fizer tudo direitinho, um dia pode estar criando comerciais tão bacanas como este. http://www.youtube.com/watch?v=wJGTkVmVYC4


O PODER DO DESIGN Minha filha acabou de completar 18 meses, que não é 18 anos mas deve ser a maioridade infantil. Deve representar o momento onde a pessoa deixa de ser bebê e vira criança. No meu caso, isso representa que agora ele decide a hora que tem que tirar o sapato, qual o pijama que ela quer vestir e qual o remédio que ela quer tomar. E também representa que agora ela define se vai ou não tomar a mamadeira, o que vem tornando a hora de dormir bem mais complicada à noite. Ela já entendeu que a hora de mamar é hora do sono, e, como ela já é maior de idade, não quer dormir cedo. Dez e meia, onze horas é cedo demais e não dá para pegar a reprise da Pinky Dinky Doo no Discovery Kids. Ontem, depois de negar o mamá, ela, bem bela sentada no sofá assistindo Pinky Dinky Doo, começou a pedir “Água, água. Água, água.” (ela sempre repete as palavras). Aí, eu tive o insight genial. Vou sacanear essa guria, eu pensei. E vou usar todo o poder do design como meu aliado. É aquela velha história: teste cego de cerveja, ninguém adivinha o que tem dentro. O que as pessoas bebem é o rótulo e a imagem da marca, como vocês bem puderam comprovar em aula. Tem também o velho chavão do blind-test da Coca e Pepsi, onde ninguém acertava qual é qual.


Eu tenho um amigo que mantém um pote de ferro da Manteiga Aviação em casa. Aí, ele põe uma manteiga qualquer dentro e depois regozija-se ouvindo os convidados elogiando “Essa manteiga aviação, não tem nada igual, né?” - Eu vi isso acontecendo. O meu plano: colocar o leite que jazia dentro da mamadeira intocada dentro do copinho de água dela, que é fechado e não dá para ver dentro. Certamente, o poder do design ia mexer com a cabecinha inocente da minha filha e ela ia tomar leite sentindo gosto de água. Resultado?

Ela tomou meio gole, jogou o copo longe, olhou pra mim e disse “Água, água.”


Moral da história: Se num blind test você colocar geléia de figo no pote de Aviação, Fanta Uva na lata de Coca ou Sangue de Boi na garrafa da Kaiser, os resultados poderão variar.


EU ADORO VOLANTE BANDIDO. Uma das coisas que eu mais gosto na Perestroika é, como diz o Felipe, quebrar a matrix da turma. Porque no primeiro dia, a gente olha lá de cima e fica imaginando quem vocês são. Mesmo com os questionários, mesmo com aqueles cinco minutos de batepapo na recepção da DCS, fica impossível tirar qualquer conclusão sem cair em preconceitos e estereótipos. Com o passar das semanas, cada um vai se revelando. E é aí que a coisa fica bacana. O Lucas deixa de ser o filho da Helena. O Panichi deixa de ser o pinta que imita o Silvio Santos. Cada um se tranforma num cara diferente daquele neguinho do primeiro dia de aula. E invariavelmente essa nova pessoa é muito mais legal. É nessa hora que a gente vê quem vocês realmente são. O mercado publicitário nos induz a seguir um modelo que nem sempre combina com a gente. Temos que comprar na Mulher do Padre. Temos que cortar o cabelo no Sexton. Temos que andar de All-Star e Ipod. Ou não, mas daí vão olhar você dos pés à cabeça com um ar de reprovação. Justo o mundo da publicidade, que se diz tão mente aberta. Não há nada de errado em gostar da AMP ou de AllStar. O errado é ser engolido por esse universo. Não é fácil ser pagodeiro num meio onde todo mundo gosta de música eletrônica. Não é fácil ser mauricinho quando todo mundo é hype. E se você é pago-


deiro ou mauricinho, tenho certeza que vai concordar comigo. O mais importante é ser autêntico. Porque você só consegue dizer coisas verdadeiras - seja na propaganda, seja na vida - se você for verdadeiro. Quando a gente vive um personagem o tempo todo, e só deixa o papel quando deita na cama, alguma coisa está errada. Se o seu negócio é pagodão, desses bem bagaceiros, não tenha medo de assumir. Até porque, uma hora ou outra, isso vai ser uma puta vantagem competitiva para você. Já pensou, quando tiver que criar um jingle chicletão para a Eldorado? Tenho certeza que vai tirar de letra. Seja autêntico. Os caras mais fodas que eu conheço são assim. E só são fodas porque são assim. Eu adoro volante bandido, jogar poker, Jack Black, cafuné, almoçar sozinho, feijão com farinha, camisa de botão, humor negro, filmes de máfia, dar aula na Perestroika, minha mulher, a sobremesa do Constantino, as piadas do meu vô, Diogo Mainardi, conversar com estrangeiros, Buenos Aires, fazer churrasco ouvindo Sala de Domingo. Eu odeio dirigir, tirar fotos, casamentos, fazer a barba, trabalhar no final de semana, livros com mais de 100 páginas, frutas, verduras, inverno, morar longe dos meus pais, Cinema Novo, gente que dança no meio da rodinha, Faustão e luau com violão. E tudo isso, certo ou errado, eu tento colocar nos meus títulos e roteiros da maneira mais verdadeira possível. Porque essa conjunção de fatores, essa visão de mundo, é um privilégio só meu.


Se eu conseguir tranformar isso numa coisa interessante, será impossível copiar. Nesse sentido, um aluno conquistou meu respeito e admiração. Um cara que é bem resolvido, que não se intimidou nem pelos alunos, nem pelos professores. Que lida com as brincadeiras com bom humor, sem nunca esquentar a cabeça. E que, mesmo com todas as provocações, nunca foi capaz de nos xingar com um único palavrão. http://www.youtube.com/watch?v=uwglXs_UJU8


TENHA SEMPRE UM PLANO B. No último filme da trilogia Bourne, um dos fodões cita uma frase que eu sempre tive como lema, mesmo sem conhecê-la. “Espere o melhor, mas prepare-se para o pior”. Seja otimista, mas sempre tenha um Plano B. Na propaganda esse é um exercício diário. É sempre importante fazer pensamento positivo. Mas nunca deixe de ter uma cartinha na manga, uma idéia na mocosa, caso dê tudo errado com o Diretor de Criação. Um título reserva, caso o cliente reprove na última hora. Um layout coringa, pra quando surgir um pit fura-pauta. Tenha sempre uma saída pela esquerda, porque surpresas numa agência de propaganda são tão comuns que nem surpreendem mais. Por mais que você se planeje, por mais organizado que você seja, por mais que você preveja os acontecimentos, volta-e-meia dá merda. E normalmente quando a bomba está prestes a estourar, quem corta o fio vermelho é a criação. Veja o meu caso: entrei a madrugada por causa de um trabalho muito legal, mas que está queimadaço. Tô aqui, criando roteiro em cima de roteiro, porque amanhã não teremos chance de errar. Já devo estar no plano J. Foda que, assim, faltou tempo para escrever um post inteligente no Blog da Perestroika. E daí, o que se faz? Bom, daí você coloca um vídeo do novo Winning Eleven para Wii. Que não tem nada a ver com propaganda - mas é o jogo predileto de 9 entre 10 Perestroikanos. http://www.youtube.com/watch?v=ntIz_hA4STM


A MOSCA E A SOPA. Balada. Tentando tirar o atraso. Falo que sou publicitário. Banco de bacana. Vai que cola. Mal sabia eu que, naquele exato instante, minha percepção sobre a profissão estava prestes a mudar. - Que legal. Me conta uma propaganda sua. Uma que eu conheça. http://www.youtube.com/watch?v=JlIAtOVY4qo A publicidade nos dá uma falsa sensação de popularidade. Porque o nosso trabalho está lá, na rua, no outdoor, no jornal, no rádio, na TV. Pra todo mundo ver. Só que ninguém dá bola. É cruel saber que a gente trabalha tanto e que, na maioria dos casos, as pessoas simplesmente viram a página. Nós somos a mosca na sopa. Quando sai o nosso primeiro anúncio, a gente recorta, mostra pra família, emoldura, bota na pasta. Abre a Zero Hora, na página 18, e fica babando por um simples rodapé. E isso é muito bacana. Essa relação de criador-criatura, de Dr. Frankenstein, é fundamental. Temos que ter orgulho daquilo que fazemos, assim como uma mãe sempre tem orgulho do filho. Por mais pestinha que seja, por mais este-título-é-do-cliente que seja. Mas não podemos nunca nos deixar iludir. A visibilidade do nosso trabalho é infinitamente menor do que parece.


http://www.youtube.com/watch?v=rKYjC621jhw Demorei muito tempo pra entender essa dicotomia. Mas não entender do tipo “ah, entendi”. E sim o “ah, agoooooooooooooooooora entendi”. Só no dia que uma mina qualquer, de uma noite qualquer, me jogou essa verdade na cara. Que os meus filhos não eram tão bonitos e inteligentes quanto eu gostaria que fossem. A não ser que você tenha uma idéia realmente fantástica, ou que você tenha a sorte de contar com um plano de mídia poderosíssimo, a sua campanha tende a cair numa vala comum. E ao contrário do que possa parecer, este não é um privilégio dos iniciantes. Bem pelo contrário. http://www.youtube.com/watch?v=PIu0a-apuE8 Quanto maior a exposição, maiores são os polices. Maiores são as verbas, maior o medo do cliente perder uma puta grana. Maiores os boards de aprovação, maiores as possibilidades de um aspone botar tudo a perder. Maiores as responsabilidades, maiores as chances de alguém bater nas suas costas e dizer “tem que ficar bom, hein?”. Quanto mais você cresce na profissão, mais difícil as coisas ficam. Menor a sua chance de chegar uma idéia verdadeiramente original. Portanto, aproveite esse início da carreira para ser irresponsável. Para tentar o diferente. Para chutar o pau da barraca. Existe uma estrutura que protege você e que impede que as suas barbaridades saiam


pra rua. Entretanto, essa mesma estrutura vai perceber se você fizer algo novo. Seja cobaia das suas próprias idéias. Faça como o refrão do famoso filme da Schin. Experimenta. http://www.youtube.com/watch?v=qA-_USI0Pe4 É isso que nos dá fôlego. É muito fácil se entregar para o sistema. É muito fácil desistir e fazer o que só o que o cliente vai aprovar. Mas os comerciais memoráveis são fruto da revolta, e não da acomodação. Se você quer que as pessoas não virem a página, é preciso ir pra luta. Se você quer que todo mundo pare na página 18, o seu rodapé tem que ser o melhor do mundo. É fácil ser mosca. Difícil é ser sopa.


POR QUE TUDO É TÃO FEIO? Você já parou pra pensar que o Feio X Bonito não tem relação com o Barato X Caro? Não existe proporção, média ou lógica que associe uma coisa a outra. Mesmo. Nada que diga: não tem dinheiro, então vai ficar feio. Vamos, seguindo essa lógica, refletir um pouco: por que tudo ao nosso redor em Porto Alegre é tão sem graça, tão comum, tão óbvio? Corta. Era uma vez, uma fábrica de sapato que mandou dois de seus vendedores para um país africano, para estudarem as oportunidades de venda naquele mercado local. Dois dias depois, o primeiro email chegou assim: SUBJECT: Problemas. TEXTO: Chefe, complicou tudo aqui. Neste país, por incrível que pareça, ninguém usa sapato. Missão abortada. Volto amanhã. Att, José. O segundo email. SUBJECT: Incrível! TEXTO: Boss, grande notícia. Neste país, por incrível que pareça, ninguém usa sapato. Podemos conquistar o mercado rápido, não existe concorrência. Aguardo próximo passos. Abrsssssss, Raul.


Pois abaixo tem algumas fotos que deixam claro pra galera que quer fazer DA a carência de bom gosto visual em nossa cidade, ao nosso redor. É um caminhão de lixo americano.



Bacana, né?! Com o perdão do trocadinho, joga muita marca aí do sul, no, no, no, no lixo. E é isso que me faz pensar também que Porto Alegre é a terra das oportunidades. Restaurantes, livrarias, lojas de roupa, farmácias, Topics que vendem cachorro quente na frente do estádio. Basta olhar para o lado que se descobre alguém carente por idéias, design e bom gosto. É só saber fazer essas pessoas enxergarem isso. E o resultado que pode trazer. Quem se habilita?


TERAPEUTA DE CASAL - UMA SUGESTÃO PARA NOSSO SALÃO. *Por Marco Loco Bezerra.

Acho legal falar de assuntos um pouco delicados. Hoje vou ser ainda mais provocativo que em meu último texto. Perdão, faz parte da minha personalidade cutucar em feridas já cicatrizadas. Principalmente se eu acho que ainda tem uma infecção por baixo da pele. Eu sou gaúcho e tenho orgulho disso. Mas junto a esse meu gauchismo vive, em mesma proporção, um espírito critico. Aprendi a amar muito mais o Rio Grande do Sul por viver longe dele. E isso não é de hoje. Culpa do meu pai militar que ensinou-me algo precioso. Para estar no Rio Grande não precisa cruzar o Rio Mampituba na direção Sul. Lição que aprendi cedo, logo aos seis anos, quando fui morar fora do estado pela primeira vez. Fugi do assunto um pouco, eu sei. Ser sucinto não é uma qualidade que compartilho com meus colegas redatores. Voltando ao tema, como falava, sou crítico. Ainda mais com as pessoas e coisas que eu amo. Como meu Estado, por exemplo. Verdade seja dita, não encontro alento, no seio do Rio Grande, em alguns aspectos que considero protecionistas e exagerados. Então aqui vai a primeira verdade: nós gaúchos não somos os melhores em tudo. Acreditem nisso. Nem tudo que vem de fora é pior ou ruim. Sim, existem cervejas melhores que Polar.


Baseado nesse pensamento tenho uma sugestão. Para mim o Salão da Propaganda não deveria ser julgado apenas por profissionais gaúchos. Por que não convidar colegas de primeira linha de outros estados? Parece um pouco pecaminoso levantar essa bola. Eu mesmo já defendi opinião contrária. Felizmente, não cristalizo meus pontos de vista. Como sei que esse assunto provoca discussão, vou justificar-me antes de começar a levar porrada. Em 2003, se não me falha a memória, foi a última vez que o Salão da Propaganda foi julgado por profissionais de fora do estado. A experiência, para muitos, não foi proveitosa. As principais justificativas foram relativas a quantidade de prêmios. Os caras chegaram no Sul e levantaram tanto o sarrafo que poucas peças receberam boas pontuações. A média de medalhas foi uma das mais baixas dos últimos anos. A galera não gostou, em geral. Sendo bem egoísta, admito que eu também fiquei puto. Hoje, vendo a coisa por um outro ângulo, entendo que a experiência poderia ter sido melhor, mas longe de ser descartada. Muitas vezes um critério muito alto prejudica a avaliação. Esse foi um dos motivos do nível das questões do ITA terem baixado nos últimos anos. Ficava mais complicado de avaliar os candidatos. Não acho que esse fora o caso do Salão daquele ano. Acho que os paulistas estavam tão desconectados do mercado que não sabiam avaliar um rodapé, por exemplo. Só tinham olhos para formatos maiores e melhor acabados. Ou então não entendiam mais algumas características do nosso mercado. Esse é o motivo de ter co-


locado o “apenas” na minha frase de avaliação. Retomando: —- Para mim o Salão da Propaganda não deveria ser julgado “apenas” por profissionais gaúchos. Não tenho dúvidas que seria legal, para o prêmio, convidar um nego fudido de fora, para a cadeira de presidente do júri. Imaginem o Eugênio Mohallem julgando seus títulos? Tudo bem, fui longe mas por que não a Keka Morele? Ela é uma das melhores diretoras de arte do Brasil, está em grande fase e ficaria honrada. Garanto que não é só ela que aceitaria o convite. Abrindo ainda mais o leque, não acho que deveriam ser só gaúchos os convidados. O André Laurentino é um ótimo exemplo. Ele é um publicitário completo, muito inteligente e casado com uma gaúcha. Será que seria tão difícil traze-lo? Sou partidário do mesmo critério para o Anuário do Clube de Criação. E não falo isso para conseguir uma passagem grátis. Não me incluo numa lista de possíveis candidatos. Seguindo a mesma linha de questionamento pergunto: —-Por que os caras de Sampa não convidam um nego fudido, de fora, para avaliar o maior prêmio brasileiro? Imaginem o Erik Vervroegen como presidente do júri de print do anuário. Eu acho que só valorizaria. Se não querem chamar um gringão convidem o Ícaro Dória ou Juan Cabral. Tudo bem, o argentino seria melhor para o Salão, ia sentir-se mais em casa em Porto Alegre. Em fim, acho que um sopro de ar renovado é fundamental. E acho ainda mais importante, essa avaliação, no nosso mercado gaúcho. Muito mais do que em São Paulo, certamente. Afinal, criadores paulistas


são jurados nos prêmios mais importantes do mundo. Fato que não ocorre com os profissionais da terrinha nos prêmios nacionais. Isso deve ser falado e levado em consideração. Então aqui fica a sugestão. Não tenho nada contra os profissionais que julgam o prêmio, atualmente. O Régis, por exemplo, foi um cara que influenciou muito meu trabalho. Jamais falaria que algum gaúcho não é capaz. A avaliação da minha sugestão deve ser observada de outra forma. Colocaria em outra categoria. Como o terapeuta de casal que, por não estar tão envolvido, pode ajudar o par a solucionar diferenças. *** Marco Loco Bezerra é diretor de arte da TBWA Berlim, um freqüente colaborador da Perestroika e, se tudo der certo, um futuro Czar na Europa.


MARCIO FRITZEN, REDATOR DA DM9. A partir do meu post de ontem, o Márcio Fritzen, parceiro (e se tudo der certo, futuro Czar) da Perestroika, resolveu dar a sua contribuição. O Márcio é um redator do cacete, premiado com Leões em Cannes e que não conseguiu ficar indiferente à situação. *** Tiago, li o seu texto sobre o brilhante Tomás Lorente. E comecei a pensar aqui… Concordo com muita coisa que você escreveu. A vida é sim feita de escolhas, apostas, renúncias, etc. Inclusive a vida publicitária. Só não sei se certas escolhas, estão tão atreladas a outras. Explico: você trabalhar em agências que te exigem muito não é 100% sinônimo de uma vida sem qualidade. Acho que é igual quando você se casa com uma pessoa ciumenta. Todo mundo te fala: “Ela é ciumenta”. “Ela é possessiva”. E você sabe, no fundo, que realmente ela é ciumenta e possessiva.


Você já ganhou e vai ganhar até alguns beliscões dela. Mas mesmo assim você tenta mudá-la. Ou pelo menos tenta fazê-la ser diferente com você. Digo tudo isso, porque trabalho em uma agência que exige muito, mas muito mesmo. A Dm9DDB. Já estamos juntos há quase 4 anos. E hoje ela entende que na minha vida deve existir espaço para tudo e para todos. Família, amigos, pelada na terça-feira, choppinho na sexta, projetos paralelos, etc. Assim, vivemos bem, muito bem. Quando ela mais precisa de mim, sou o melhor dos companheiros. E quando estou muito estressado, eu peço um “tempo”. Não é exatamente um “tempo”, afinal, ela sabe que eu vou voltar. É quando saio de férias. Quando volto, estamos em lua de mel. Porque estou com saudades e cheio de tesão. Enfim, só queria registrar que existe vida dentro e fora de uma agência workaholic. É só você ser também um lifeaholic. Para fechar, um título memorável do mestre Marcelo Aragão para Citibank:


Trabalhe, trabalhe, trabalhe. Mas não se esqueça: vírgulas significam pausas. Resume tudo, não? Abraço e saúde para todos nós. Márcio Fritzen – Criação


SER ASSISTENTE DE ARTE É UM SACO *Por Eduardo Petersen.

Antes de mudar para os Estados Unidos, meu último emprego em Porto Alegre foi como assistente de arte na Escala, onde trabalhei por quase 2 anos. Isso já faz um tempo, mas acredito que as reponsabilidades não tenham mudado muito. Na época, todos assistentes estavam na mesma situação que eu. A gente passava o dia procurando imagens, adaptava layout vertical para formato horizontal, cortava os dedos montando material para apresentação de campanha, se intoxicava com cola spray e de noite ia para a faculdade. Eventualmente se perdia uma aula ou outra, mas sabendo administrar o tempo dava pra sobreviver. Não sei do resto da galera, mas eu curtia muito meu trabalho. Achava a agência do caralho e tive muita sorte de trabalhar com um diretor de arte afú. Ele tinha paciência pra me ensinar as barbadas dos softwares, me motivava o tempo inteiro pra fazer propostas e sempre que eu tava liberado me chamava pra fazer brain junto com a dupla. Claro que nem tudo era uma maravilha. Sempre vai ter aquele sábado que tu planeja ir para um bar com os amigos e tomar cerveja até o sol nascer, mas que vai ser adiado porque o cliente não aprovou a campanha apresentada sexta-feira às 4 da tarde. Levando tudo isso em consideração acho que foi um período super produtivo pra mim pois aprendi muita coisa.


O interessante é que foi só a pouco tempo que me dei conta que não pensava assim na época. Na verdade, eu achava uma merda perder fim de semana, ficar até tarde na agência ou olhar sites de banco de imagem até sair sangue dos olhos. Como que a minha opinião mudou? Bom, mudou quando comecei a trabalhar aqui. Logo nas primeiras semanas fiquei impressionado como a qualidade dos anúncios apresentados para o cliente é inferior a do Brasil. Aquela coisa de layout caprichado com referências legais não existe aqui. Nego pega imagem do Getty Images e toca um título em cima, sem muita frescura, com marca d’água e tudo. Ficava me perguntando: será que o diretor de arte não tem acesso a imagens em alta resolução? A dupla virou noite e não teve tempo pra caprichar mais? Talvez seja a 5ª apresentação e eles já estejam de saco cheio? Ao contrário, eles tem acesso à várias ferramentas e os prazos são bem maiores que aí. Com o passar do tempo me dei conta que falta técnica mesmo e tentei entender o porquê. A formação da maioria dos diretores de arte americanos é bem diferente. A faculdade daqui não prepara para o mercado, ela dá uma idéia geral do que é propaganda. Quando o cara sai do colégio aqui ele pode entrar na faculdade sem ter a mínima noção do que quer fazer da vida. Funciona assim: tu faz as matérias básicas para todos cursos e depois tu vai escolhendo as cadeiras que mais te interessam. Na teoria é muito bonito, mas o resultado nem tanto. Nego sai da faculdade perdido e sem saber exatamente o que fazer. É nesse ponto que surge uma luz no fim do túnel e entram em cena as Portfolio Schools (Miami


Ad School, VCU Brandcenter, etc.). Lá tu pode realmente te especializar na profissão que escolher dentro do mercado publicitário. Os cursos são muito legais e eu realmente acho que preparam melhores profissionais. O grande problema é que na maioria das agências não existe a etapa do assistente, e aí mais uma vez o coitado cai de pára-quedas e tem que sair fazendo campanha sem supervisão de ninguém. Ser assistente é cansativo, mas realmente penso que apesar de ser tortura para muitos, essa etapa do aprendizado é extremamente necessária. Acredito que independente de onde o cara for trabalhar, vai chegar uma hora que ele vai mudar de opinião. Assim como eu mudei. *** *Eduardo Petersen, o Dado, é Diretor de Arte na DDB New York.


UM POR CENTO *Por Beto Baibich

Há um tempo atrás o Felipe me pediu pra escrever algo pro blog da Perestroika. A minha primeira reação foi achar que eu ia falhar miseravelmente. Faz muitos anos que eu saí do Brasil e o meu português já não é o mesmo. E pra ser sincero, ele nunca foi muito bom. Além disso, sobre o que diabos eu podia escrever? A solução tava de baixo do meu nariz. Se é pra escrever sobre alguma coisa, melhor que seja sobre algo que tenha uma boa chance de continuar sendo uma verdade pra mim por um bom tempo. E que possa ser usado por qualquer pessoa que queira testar o método. O trabalho em criação - publicitária ou não - tem muito a ver com a personalidade de quem tá bolando seja lá o que tem que ser criado. E existe um aspecto da personalidade de qualquer criador que acaba fazendo uma diferença enorme na qualidade do trabalho que ele é capaz de fazer e o quão longe ele vai poder chegar em qualquer carreira que involva o processo criativo: o jeito que ele encara o fracasso. É preciso ser meio masoquista pra ser realmente um bom criador. O único jeito de chegar a uma idéia genial é ter outras 2938572938 idéias que vão de completamente estúpidas às que são boas, mas não excepcionais. E a realidade é que 99.999999% de todas as idéias que você tiver têm que morrer. De morte matada, de morte morrida. E assassinar uma idéia não é fácil. Todos nós temos mecanismos pra tentar nos convencer a salvar uma


idéia na beira do abismo. Mas se a idéia chegou na beira do abismo, você tem um só dever: dar o pontapé. A ironia do processo é que a cada idéia matada vem um sentimento de mini-fracasso. A tendência natural é de aprender com os nossos erros, o que leva a maioria dos criativos a cometer um erro ainda maior: eles aprendem a não errar mais. Desenvolvem cacoetes, exploram terrenos conhecidos. Tudo isso por um sentimento falso de segurança. A solução pro problema é algo que beira uma forma de insanidade: encarar cada mini-fracasso como um grande sucesso. É colocar quantidade de idéias como a prioridade número um. E depois de ter 100 idéias, matar as 99 (de vez em quando 100) com um sorriso. O truque é sempre se lembrar que idéias ruins nos ajudam a aprender quais são os caminhos que são mais frutíferos, que a gente sempre vai aprender mais das idéias que a gente matou do que das que sobreviveram. Um dos estagiários mais promissores na agência onde eu trabalho é um cara que passa o tempo inteiro falando as idéias que ele tem, quase sem parar. Praticamente todas são ruins. Mas ele continua mandando ver com um sorriso de orelha a orelha. E vira e mexe ele diz algo interessante, que vale a pena, que começa idéias interessantes. Ele tá com a contratação praticamente garantida. Fracassar mil vezes e se sentir bem a cada idéia que não deu certo é uma fórmula perfeita pra passar o tempo todo se divertindo nessa profissão.


Existe um jeito super simples de começar a encarar criação dessa forma: numere as suas idéias. Todas elas. Não interessa se é uma frase quando você tem que criar um comercial de TV ou se é uma única palavra que lembra algo de interessante. Todas idéias, por menores que forem, merecem seu próprio número. Quando você estiver num brain, comece com o número 1 e coloque objetivos de quantidade, não qualidade. Toda vez que você tiver quantidade, a qualidade acaba vindo junto. É inevitável. Normalmente eu tento ter 100 idéias antes de começar a filtrar as que são interessantes e as que vão pro saco. É super importante não se censurar de nenhum jeito antes de chegar a hora de passar todas as idéias pelo filtro. Depois que vocé escolher as 5 a 10 idéias que você gostar, desenvolva elas um pouco mais. Pense em diferentes execuções. Veja se a idéia rende ou se é difícil desdobrar em diferentes mídias. Faça desenhos simples. Se você tiver algum lugar pra fazer isso, cole tudo na parede. Não há nada como ter uma visão geral da coisa. E daí o lance é voltar pro caderno e voltar ao brain. As primeiras 100 são as mais difíceis. Então agora dá pra parar pra passar o filtro a cada 50 idéias e repetir o processo de novo e de novo. Poucas campanhas realmente boas vem antes de umas 200 idéias. Mais cedo ou mais tarde você vai ter que apresentar as suas idéias pro seu diretor de criação. O trabalho dele vai ser muito mais simples. Ele só vai precisar escolher as idéias que realmente têm potencial, e as que chegaram a esse estágio do processo


são provavelmente já idéias bem melhores do que se você tivesse tentado achar uma idéia genial quando você começou a trabalhar no projeto. O trabalho é muito mais fácil quando a gente realmente gosta duma idéia. É pura diversão. Boa sorte. *** *Beto Baibich é diretor de arte gaúcho e um cara do caralho. Já trabalhou na Fischer America, Dez Propaganda e Escala. Depois de trabalhar um temporada na Taxi, do Canadá, ganhar Leões em Cannes e ser apontado como um dos jovens criativos mais promissores do Canadá, se mudou de mala e cuia para o Colorado. Hoje ele é DA da Crispin Porter + Boguski, uma das agências mais hypadas do mundo. Se tudo der certo, em breve vai ser mais um Czar da Perestroika. O texto acima não foi tirado de lugar nenhum. É uma contribuição exclusiva do Betinho para o Blog da Perestroika.



O autor Tiago Mattos é redator publicitário, reconhecido como um dos nomes mais importantes da nova geração da nossa publicidade. Aos 20 anos, participou de uma competição criativa no Festival Mundial de Publicidade de Gramado e ganhou a tão concorrida bolsa para a Miami Ad School, considerada na época a melhor Portfolio School do mundo. Em 2005, já de volta ao Brasil, foi eleito Young Creative: premiação que elege o melhor portfolio dentre todos os jovens profissionais do estado. No ano seguinte, atingiu o ponto mais alto que poderia conquistar como redator no mercado local: foi eleito o Redator do Ano. Em 2007, em seu último ano como criador de agência, foi o vencendor do Grand Prix na categoria de filmes. Mas apesar de boas perspectivas como criador e de convites para trabalhar fora de Porto Alegre, Tiago decidiu seguir um caminho diferente. Ainda em 2007, fundou a Perestroika, a primeira escola de atividades criativas do Brasil. No final de 2008, fundou a Balalaika: núcleo de comédia que deu origem ao primeiro grupo de Stand Up Comedy do RS.


Hoje, aos 30 anos, é Diretor e professor da Perestroika, onde gerencia projetos de ensino e geração de conteúdo ligados à publicidade, arquitetura da informação, futebol como negócio, internet, design, comportamento do consumidor, comunicação em plataformas digitais, moda, arquitetura efêmera e poker profissional. Ultimamente, Tiago tem investido energia em trabalhos autorais. Está produzindo três livros simultaneamente. Este é o seu primeiro.


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