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Diversão&Arte
• Brasília, quinta-feira, 27 de março de 2014 •
CORREIO BRAZILIENSE • 3
ENTRETENIMENTO / O Brasil é um dos cinco mercados mais importantes da televisão sob demanda. A nova prática representa 4% de todo o consumo audiovisual do país e, de acordo com especialistas, tende a crescer nos próximos anos
Nocontroledaprogramação » LUANA BRASIL ESPECIAL PARA O CORREIO forma de acompanhar séries, filmes e programas mudou: ficar atento ao horário de exibição das atrações não é mais obrigatório. Nos últimos cinco anos, a oferta de plataformas de vídeo sob demanda cresceu e se multiplicou, permitindo à audiência escolher o que vai assistir e na hora que bem entender. Após o frenesi dos gravadores digitais, a tevê on demand aparece como uma tendência global e começa a ganhar força no Brasil — um dos cinco mercados mais importantes para o negócio. O brasileiro tem aderido à ideia de ser o dono da programação, fazendo valer a máxima do cientista Nicholas Negroponte: “O horário nobre é o meu!”. Segundo pesquisa do Ibope, a tevê por demanda corresponde a 4% do conteúdo audiovisual consumido pelas pessoas. Desses, 49% fazem uso por meio da tevê por assinatura e 67% estão conectados à internet. Um prato cheio para o Netflix, que chegou ao país em 2011 e conquistou o público brasileiro. Com uma interface amigável, a empresa norte-americana oferece o serviço de tevê por internet, disponibilizando mais de 1 bilhão de horas de filmes, séries e documentários. No último trimestre de 2013, o provedor de conteúdo anunciou possuir 44 milhões de assinantes ao redor do mundo e uma receita de US$ 1,2 bilhão. Contudo, segue com uma política fechada no que diz respeito à divulgação local e não revela a quantidade de assinantes brasileiros. “A tecnologia não é nada sem a apropriação da cultura. Esses serviços só ficam em cena porque há aceitação e procura das pessoas. A tevê on demand é uma necessidade de nossa época corrida, fragmentada e customizada, é um reflexo do nosso tempo”, explica André Pase, pesquisador de mídias digitais da PUC-RS. Um exemplo dessa mudança de hábito é o publicitário Leonardo Dora, que não possui aparelho de tevê convencional há mais de três anos. “Quando chego do trabalho, acesso o conteúdo pelo computador, e um projetor lança a imagem na parede branca. É como ter um cinema em casa”, diz Dora. Como quem chegou para ficar, o on demand é uma tendência que deverá pautar os negócios e fazer parte dos produtos a serem oferecidos pelas operadoras de tevê, acrescenta Antônio Sales, da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA). As empresas já estão revendo padrões e adequando os produtos. Canais e operadoras buscam essa fatia de audiência. Um exemplo é a HBO on demand, serviço lançado em outubro passado, em parceria com a Net, no qual os assinantes conseguem as-
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US$ Assista ao trailer da segunda temporada de House of cards.
1,2 BILHÃO
Receita do serviço por streaming do Netflix
Netflix/Divulgação - 19/12/13
sistir aos programas da emissora norte-americana a qualquer momento. Outra novidade é a HBO go, plataforma on-line, na qual filmes, séries, shows e programas esportivos dos canais HBO e MAX estão disponibilizados.
canas, donas de sér ies e de superproduções, continua ditando a agenda da audiência. O especialista entende que os recursos trazem mais flexibilidade ao público e, por consequência, um aumento no consumo da programação. Com ou sem liberdade, mercado e público buscam compreender as engrenagens do novo modo de consumir tevê. A cada semana, os serviços de streaming elaboram novas formas de disponibilizar conteúdo. Muitas vezes, a ânsia em ganhar espaço gera problemas, como o Popcorn time — que oferecia filmes em streaming, mas foi acusado de pirataria e retirado do ar. André Pase argumenta que a forma de se manter nesse novo cenário é oferecer programação própria. “Manter-se num mercado competitivo requer astúcia.
Flexibilidade Segundo o Instituto Nielsen (espécie de Ibope norte-americano), nos EUA, 10% dos telespectadores não acompanham mais a grade das emissoras. No entanto, David Carr, crítico do NewYork Times, questiona a sensação de autonomia que o espectador tem ao escolher a própria programação. Para ele, o fenômeno não revela maior liberdade do público. Dados publicados em sua coluna revelam que o prime time (horário nobre) das emissoras norte-ameri-
House of cards: uma das séries mais assistidas sob demanda O pulo do gato no marketing na indústria on demand é o conteúdo exclusivo e de qualidade, como a série americana House of cards, do Netflix”, exemplifica o
especialista. Dirigida pelo renomado diretor de cinema David Fincher (Clube da luta e Seven), a série arrecada milhares de novos assinantes para o serviço.
CINEMA Tucuman Filmes/Divulgação
Sementes da desesperança Houve tentativa de a produção colombiana La playa — que entra em cartaz hoje — passar pela peneira do Oscar de melhor filme estrangeiro. Mas, ainda que vetado, o longa já teve o trânsito internacional garantido, pela exibição na mostra Um Certo Olhar, que reserva atrações de ponta para o Festival de Cannes. Colombiano, o diretor Juán Andrés Arango não deixa de se identificar com profissionais como o roteirista Guillermo Arriaga (de Babel) e os irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne (O filho), providenciais, quando se trata de uma câmera acoplada ao corpo dos personagens. “De verdade,
os respeito, mas creio que haja diferenças, em termos de estilo: o meu é mais das ruas”, explica. Do México, em pleno Festival de Guadalajara, Arango atende ao chamado do Correio, no momento em que apara arestas do roteiro para o longa X-Quinientos, a ser rodado em 2015. Novamente, é possível vislumbrar um reflexo de La playa nessta produção. “Três adolescentes estão conectados por perdas, num cenário de transformação radical, mas em realidade vivida em contextos diferentes: um em Montreal (Canadá), outro na Cidade do México e o terceiro, na colombiana Buenaventura (com área recentemente militarizada)”, adianta.
Um paralelo interessa bastante ao diretor: o resplandecente feito do cineasta Luis Buñuel e o clássico de uma juventude debilitada que dá forma a Os esquecidos (1950). “La playa fala de assunto parecido, mas em contexto contemporâneo e urbano. No filme do Buñuel, vê-se indígenas, adolescentes, em meio bem hostil. Diria que minha visão seria pós-moderna, em comparativo”, referenda. La playa mostra um rapaz que, saído da costa pacífica (diante de uma guerra urbana pelo domínio da região amplamente povoada por afrodescendentes ), vai a Bogotá, e encontra “aquela conexão universal que encampa a busca de identidade”. “Tanto o La playa quanto o
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» RICARDO DAEHN
Juán Andrés Arango: Brasília é uma das cidades mais diferentes do mundo X-Quinientos falam de cidades globais que estão em constante transformação. Além disso, mudam os migrantes, pessoas que crescem e largam traços
culturais. Se reinventam para estabelecer uma comunicação mais radical”, atesta o diretor. Até para os colombianos, a vivência de Tomás (protagonista de La
playa) e dos irmãos dele delimita “diversidade de contexto, com receptividade do público nutrida por curiosidade e estranheza”. “Ser expressivo” (com tendência a abraçar elementos de documentários) está entre as prioridades de Arango, que teve uma “conexão sincera” com o Brasil, desde uma das edições do Festival do Rio, evento que rendeu coprodução com o país para a construção da “visão muito subjetiva e pessoal” de La playa. De Brasília — onde esteve, ano passado, para o BIFF —, o diretor acalenta boas lembranças do público na cidade que “é das mais diferentes do planeta — parece uma ilha”.
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Assista ao trailer de La playa.