ONDE VIVEM OS EGOS por Lucas Guarnieri
O ego, segundo definições, é “um modelo triádico do aparelho psíquico”. Mas quero enxerga-lo como um bichinho. Nascemos com esse bichinho. Ele se alimenta basicamente de arrogância e prepotência e inúmeras outras coisas que são fontes de vitaminas para o ego. Mora em um paradoxo entre segurança e insegurança e anda de mãos dadas com a percepção. Contudo, o ego não é uma boa companhia para a percepção, pois nos faz pensar que somos coisas que na verdade não somos. Quando bebes, ele é tão pequenino que sua existência é quase nula. Mas já na infância ele começa a crescer. “A bola é minha portanto eu defino as regras”. Cresce o ego, mas é um ego bobo, um ego-criança inconsequente que quer brincar na rua descalço sem se importar com muita coisa. Na pré-adolescência, às vezes um pouco antes, é apresentado para a vaidade, que se torna sua amiga fiel. Mas é na formação da fase adulta onde ele se apresenta como um vilão malvado. É característica do ego estar sempre um passo a frente da gente, de tal forma que seu crescimento pode nos ofuscar por completo. Ofusca também nossas atividades. Por exemplo, o ego de artistas, por vezes são muito grandes e gordos, daqueles que não conseguem nem se levantar às vezes. Bendito o artista que conseguir retratar seu ego em arte, haja tela, haja papel fotográfico, haja notas musicais... É legal imaginar a cena. Um pintor coloca seu ego no rio Sena para pintá-lo, e como é influente, conseguiu quilômetros de tela, mas ao colocar o ego no rio, ele transborda e inunda toda a Paris. Tem os egos gigantes dos pseudo-artistas também. Nossa, e são bastante feios. Crescem tanto que a arte já não mais importa. Por mais bela que seja, o ego está na frente, com uma face horrível, cheia de verrugas, espinhos, olhos distorcidos e tudo mais que assuste. Ele pula em cima da gente e nos sufoca tanto que mandamos pro inferno o artista e sua arte. Até gosto da arte-ego do Andy Warhol, mas vejo beleza mesmo na arte-simpleshumilde do Manoel de Barros. Não há comparação entre cores vivas das telas pop art com as dos primeiros raios que escapam do abridor de amanhecer. Afinal, a humildade é a maior e mais difícil de todas as artes.
A roupa e a coragem O seleto mundo das artes permitiu que o cinema fizesse parte de seu reduto apenas se referido como a “sétima arte”, para lembrar sua dita marginalidade quando comparado às artes clássicas: pintura, dança, teatro, escultura, literatura e música. Tentar colocar a moda no meio desse grupo seria praticamente uma ofensa partindo dessa ótica conservadora. Entretanto, há de se reconhecer algum valor estético no trabalho dos estilistas e costureiros. Colecionar referências culturais e criar algo relevante a partir disso é um processo que envolve elaboração e expressão de conteúdos da ordem do ser – no caso de criações primorosas, é claro. A confecção do que se chama de estilo passa exatamente por esta questão. Mesmo sendo renegado pela alta intelectualidade, o estilo pode ser reflexo de grande exercício da inteligência e demonstração da essência humana. Evidentemente, ele só alcança este patamar se o esforço for o suficiente para quebrar as amarras que o estilo representa no âmbito do senso comum, da massificação das ideias. O intuito aqui é exatamente o de tocar no mesmo paradoxo com que a arte se depara: reafirmar a individualidade e, simultaneamente, se aprofundar no ser. Para os criadores, supõe-se que isso é um dever. Para nós, meros mortais, é opção. A sugestão deste texto é única: não só tornar-se ciente dessa possibilidade, mas também tomar posse dela. O estilo é uma atividade que envolve escolha, decisão, e, para isso, personalidade. É uma maneira visual de se conhecer, descobrir numa cor mais forte, numa proporção menos usual, num tecido atípico, um pedaço esquecido de si. Vestir-se é escavar a alma pela superfície da vestimenta. Um desafio do olhar.
por Pedro Camargo
O amor é um sentimento tão maluco que não entendemos como conseguimos passar a vida ou parte dela fugindo dessa maluquice . Fugir do amor é uma forma de correr da vida e passá-la sem observar o simples. É morrer em vida. “Em 3 de Setembro de 1973, às 18:28:32, uma mosca califorídea, capaz de 14.670 batidas de asas por minuto, pousou na Rua Saint Vicent, em Montmartre; no mesmo segundo, num restaurante perto do Moluin-de-la-Gralette, o vento esgueirou-se como por magia sob uma toalha fazendo os copos dançaram sem que ninguém notasse. Nesse instante, no 5º distrito Eugéne Colere, de volta do enterro de seu amigo Èmile Maginot, apagou seu nome da caderneta de endereços... Ainda nesse mesmo segundo um espermatozóide de cromossomo X, pertencente ao Sr. Raphael Poulain, destacou-se do pelotão e alcançou um óvulo pertencente à Sra. Poulain, em
Solteira, Amandine Fouet. “Nove meses depois nascia Amelie Poulain.” Poderia ser a descrição do nascimento de qualquer um, mas este é o nascimento de Amelie Poulain. Aqui descrevo um personagem, alguém comum, igual a mim ou a você. Alguém com medos, receios, pensamentos, desejos e prazeres. Detalhes incomuns, pois é pelos detalhes que conseguimos, enfim, nos diferenciar dos demais. Amelie se diferencia e nos ensina a viver de forma simples e delicada; ela nos convida, durante 122 minutos, a entramos em um universo íntimo e peculiar: o seu universo particular. Por vezes, nos refugiamos em nossos mundos particulares, onde encontramos o conforto e o equilíbrio necessários para sermos nós mesmos. Aqui observamos, criamos e recriamos sistemas complexos de defesa capazes de nos
O JOGO DE CHARADAS: A VIDA DIVAGANDO ENTRE AS LINHAS DE AMELIE POULAIN
fazer acreditar que aquilo que construímos nos basta. Pois bem, nosso universo tem nos bastado, pois através dele nos conhecemos e reconhecemos gostos, desejos, tons que são familiares ao nosso íntimo. Deste modo, compreendemos que a vida pode consistir em um eterno jogo de charadas, onde a cada instante temos a chance de errar e acertar, por vezes até na mesma proporção. Ahh, mas o bom da vida é sentir... Sentir e se permitir ser sentido. Amelie nos ensina que experimentar e permitir consiste em viver. E viver, por sua vez, consiste em vencer o medo, as amarras e os receios. Fechar os olhos para o externo e abri-los para o interno, para apreciar os próprios gostos, cheiros e cores. Este é o lugar onde realmente nos conhecemos, ao ponto de nos reinventarmos e nos soltarmos para a vida que nos espera. É saltarmos rumo a um tempo livre de
nossos limites para obtermos o prazer genuíno, a satisfação de ser como somos, livres de medos, mas com algum receio e esquisitices; porém plenos dentro de nossos mundos particulares. Agora proponho um brinde ao simples e belo, sem máscaras ou etiquetas. Um brinde a vida e à casca do creme brulee. Brindemos ao encontro, ao amor, ao cinema, ao ato de jogar pedras no lago, ao beijo, ao cheiro de chuva, ao andar de bicicleta... Um brinde ao detalhe e ao simples. Um brinde a vida porque ela não dura aproximadamente 122 minutos, mas dura o suficiente para ser vivida e muito bonita. Desejo que, em sua trajetória, caro leitor, você encontre seu próprio creme burlee e quebre a casca que o envolve, sinta o cheiro, aprecie o gosto e observe a textura. Experimente! Pequenos prazeres, simples detalhes e grandes satisfações. Viva! por Bruna de Vieira Assis
AËLA LABBÉ, FOTÓGRAFA FRANCESA por Isabella Valino
Aëla busca através de seu trabalho mostrar uma interação humana com a natureza, ilustrando a beleza frágil da infância com uma qualidade secretamente assombrada. Tal como acontece com a narrativa ilógica dos sonhos, os eventos parecem se desdobrar sem restrições por limites convencionais de tempo e lugar - uma visão nostálgica do passado flui através das cores que são representadas. Seu trabalho já foi destaque em revistas independentes em todo o mundo, aparecendo em inúmeras exposições na França, Itália, Espanha, Reino Unido e EUA.
E SE FOSSE ARQUITETURA? por Henrique Ramos
Imagine se Marcel Duchamp tivesse sido arquiteto? Se as formas distorcidas e surrealistas de Salvador Dali fizessem parte da composição de um prédio? Ou se Andy Warhol tivesse feito do movimento artístico Pop Art um estilo arquitetônico? Como seriam os projetos de arquitetura se caso tivessem sido construídos em formas expressivas das obras de arte na linguagem desses e de outros artistas? Imaginando isso, o arquiteto e ilustrador italiano Federico Babina fez uma divertida sequência de desenhos intitulada “Archist City”, transformando as obras de artes em prédios. As ilustrações mostram como seriam construções ao estilo de Mondrian, Picasso, Duchamp entre outros artistas de renome.
OS HERÓIS DAS NOSSAS HISTÓRIAS O autor sueco Stieg Larsson descreve na trilogia Millennium, série composta pelos livros Os homens que não amavam as mulheres, A menina que brincava com fogo e A rainha dos castelos de ar, uma Suécia fria e sombria, onde são escassos os meses em que o sol resolve dar o ar de sua graça na Capital Estocolmo. A primeira impressão temos acesso a essas características descritas pelo autor e logo as evidenciamos, criamos um ideal imaginário da cidade e dos espaços descritos, a medida que avançamos na leitura vamos mudando nossa concepção e descobrindo novos detalhes da jornada. Evidentemente, cada leitor fará sua interpretação da história, meu objetivo não é descrevê -la nem distribuir spoilers é apenas explanar as fases que passamos ao adentrar em uma história que nos traz identificação. Lisbeth Salander, a heroína da trilogia, é avessa a qualquer estereótipo. Esqueça o ideal de mocinha que será salva pelo herói, na trama é bem capaz que ela o salve antes. No livro, é descrita como uma garota estranha, antissocial e que não sorri ao primeiro contato. Talvez essa seja a mística toda que faz os amantes da trilogia Millennium amarem a moça. O envolvimento é tanto que Estocolmo parece estar sempre iluminada pelos raios de sol e que Salander se torna doce e gentil, é claro que a capital continua gélida e o humor de Lisbeth continua inconstante, porém nem nos damos mais conta. Já na obra Entre quatro paredes, de Jean Paul Sartre, o inferno ambientado não apresenta cheiro de enxofre, labaredas, calor sufocante ou penitência. É apenas uma sala em que três indivíduos são colocados e se confrontam a todo o momento. Ao final da leitura percebemos que passar a eternidade confrontando
sua consciência é bem mais doloroso do que o inferno tradicionalmente imaginado. Levados a loucura pelo vazio e pela falta de distração, eles tornam-se os próprios carrascos. Evidentemente nenhuma forma de inferno deve ser agradável, porém a ideia do cheiro de enxofre e do calor sufocante poderia ser reconfortante aos condenados. Em A Metamorfose, nosso personagem Gregor Samsa se depara com uma mudança não apenas física, à medida que é transformado em um inseto, inúmeras patas, dorso duro e asas surgem, fazendo-o perder a fé em sua identidade. Aos olhos de seus familiares é tratado com repulsa, porém essa transformação provoca uma mudança em toda a estrutura familiar de um modo positivo. O que nos faz desenvolver certa simpatia pelo inseto e pelas mudanças que sua metamorfose provocou. A mensagem transmitida por cada obra é totalmente particular e subjetiva de cada indivíduo. E é claro, não podemos esquecer da parte que movimenta nossos sentidos sem ao menos sairmos do lugar. Aposto que o livro que você está lendo no momento, também te traz essa sensação ótima que é imaginar-se fazendo parte do enredo. por Nathalia Almeida
CLAUDIO PARMIGGIANI , 71 ANOS , POETA, ARTISTA E ENSAÍSTA ITALIANO por Isabella Valino
Parmiggiani é um artista raro, sua particularidade nas obras é algo para reflexão, subliminarmente jogado para o tema ausência. Seu exílio voluntário no ramo da arte e o seu silêncio obstinado por mais de quarenta anos, hoje ressurge com uma posição única. Deliberadamente longe da “realidade” da arte contemporânea ele tem sido capaz de desenvolver uma linguagem inovadora, profundamente pessoal e universal ao mesmo tempo. Em 2006, o artista criou um impressionante labirinto de vidro quebrado, onde o visitante torna-se o espaço, imaginado como foi dificultosa a saída deste labirinto, vendo que a única alternativa era quebrá-lo para chegar ao final.
TROCA
TROCA
Momentos de surpresa permeados por instalações e galerias, que nos levam à território particulares de artistas, que uma vez se expressaram, e agora reverberam em teorias, impressões, emoções e interpretações. E é preciso se perder e ainda que as placas e mapas nos levem aqui ou alí, não se sabe o que esperar, é preciso ler e reler aquilo com o que se depara, é preciso permitir-se ter a própria interpretação e entender que a qualidade da leitura tem em si, uma relação de interdependência entre expressar e compreender. Todos os dias, as mesmas obras produzem diferentes encontros com diferentes pessoas, em densidades que variam de acordo com o próprio visitante. Quando nos permitimos sair do nosso próprio território e temos a chance de nos perder em outros discursos, encontramos mais do que um ponto de vista diferente, vivenciamos inspiração. Como uma droga, uma paixão, um sonho, ou uma obra de Lewiss Carrol.
TROCA
TROCA
“Alice permaneceu olhando pensativamente para o cogumelo por um minuto, tentando compreender quais eram os dois lados da planta, e, como ela era perfeitamente redonda, sentiu-se em meio a uma difícil questão. Entretanto, afinal a menina esticou seus braços o mais que pôde em torno do cogumelo e cortou um pedaço da borda com cada mão.” Já não é preciso viajar para o país das maravilhas para encontrar cogumelos gigantes ou paisagens surreais. De fato, não é preciso sequer sair deste país para se perder entre abstrações e simbolismos. Basta alguns minutos de caminhada pelo Inhotim, o instituto de arte contemporânea em Brumadinho, Minas Gerais. Mais que uma viagem comum, passear pelo inhotim nos faz percorrer territórios que estão além de qualquer divisa geográfica. A arquitetura em escorço proporciona momentos de surpresa ao expectador que caminha por seu exuberante jardim, repleto de plantas exóticas como, por exemplo, a Socratea exorrhiza, uma palmeira que utiliza suas raízes para caminhar por entre as outras plantas.
REVISTA ALPENDRE ENTREVISTA ALEXANDRE HERCHCOVITCH por Lucas Guarnieri
Como você insere seu universo particular no processo criativo? Bom, o meu universo particular nunca foi à parte do universo da marca. Porque para construir uma marca que tenha um DNA reconhecível, eu tive que colocar nessa marca a única coisa que é diferente de você por exemplo, que é minha vivência, meu estudo, minha criação, onde eu nasci e as influências que eu tive durante a minha vida. Então, eu penso que pra moda é muito importante colocar a sua personalidade nas suas criações porque só assim você vai fazer alguma coisa diferente de outro estilista.
ECHOLILIA: SOMETIMES I WONDER por Lucas Guarnieri
O pai, Timothy Archibald frustrado por não encontrar uma perspectiva na doença (autismo) de seu filho, resolveu tentar senti-la através de um ensaio fotográfico que capta todo o seu universo particular. Eli, o filho, foi fotografado de forma genuína. Nenhuma foto foi posada. E o pai, ao contrário dos outros que sempre fotografavam os filhos sorridentes e em situações graciosas, apoiou-se nessa alternativa para viver com o diagnóstico do filho que, para ele, já não tem mais importância. O que importa verdadeiramente é relação entre os dois.
James Blake - Overgrown
Portishead - Dummy
Sigur R贸s - ( )
Spiritualized - Ladies and Gentlemen We are Floating in Space
Bj枚rk - Post
THE TEHRAN TIMES: A PRIMEIRA PÁGINA DE MODA E LIFESTYLE DO IRÃ por Nathalia Brunini
Com a intenção de mostrar ao mundo que no Irã não há apenas conflitos com vizinhos e países ocidentais, o designer Araz Fazaeli criou a primeira página iraniana sobre moda e lifestyle exclusivos do país. Há cerca de um ano, Fazaeli começou a fotografar mulheres nas ruas de Teerã, capital do país, e publicá-las no tumblr The Tehran Times, mas só agora a página começou a ter grande visibilidade na imprensa internacional. Segundo Fazaeli, as pessoas têm um entendimento errado dos iranianos. “Eles acreditam no que veem nas notícias, e apesar de muita coisa ser verdade, há ainda muito mais para ver. Os iranianos são muito interessados em moda e a fazem bem”, em entrevista a revista norte-americana The Atlantic.
ARTHUR
BISPO DO
ROSÁRIO por Lucas Guarnieri
Sem enganar a si mesmo, procure em sua memória quantas vezes você atravessou a rua por se deparar com uma pessoa suspeita. Trapos no corpo, barba grande e mal feita e cabelos desarrumados são características que causam incômodo. Se for negro então, beira o pânico. Mas fique calmo, isso não é sua culpa. A sementinha do estereótipo foi plantada pela sociedade na sua cabeça e germina brotos de preconceito. Saber podá-los é o que diferencia seu jardim moral e ético. Para fins de contexto, cito o termo criado por Francis Galton. Eugenia, que em significado literal quer dizer “bem nascido”, é o termo empregado para designar “o estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente”. Há de se admitir que seja uma área controversa, principalmente, após o holocausto com sua eugenia nazista que foi peça chave para a construção da ideologia de “pureza racial”. Um exemplo disso está no filme norte-americano de ficção científica Gattaca, de 1997 que retrata um futuro onde acontece uma seleção de embriões e apenas os perfeitos são implantados no útero. Portanto, aqueles que não são geneticamente planejados são considerados inválidos e, por conseguinte discriminados pela sociedade. Foi eleito como filme de ficção científica mais plausível pela NASA. O que quer dizer que em breve você poderá escolher todas as características do seu filho. Olhos azuis? Sim, por favor. Acréscimo de 25% no preço de embriões livres de alguma doença hereditária? Eu pago. Cabelos lisos? Esse é meu filho. Diante dessa realidade, é certo que Arthur Bispo do Rosário seria protagonista de inúmeras situações como essa. Negro, pobre e nordestino, sua figura não seguia padrão estético algum. Mas imagine que falta de respeito cruzar a rua para não se deparar de frente com um dos maiores artistas contemporâneos brasileiros.
“Um dia, eu simplesmente apareci.” Era dessa forma que ele respondia aos curiosos a respeito de sua origem. Foi membro da marinha e pugilista, mas ninguém sabia muita coisa sobre sua pessoa e também se recusava a falar sobre sua família e raízes. Em suas palavras, era filho de Deus. Havia sido adotado pela Virgem Maria e “aparecido” no mundo em seus braços. A consequência dessas histórias julgada por muitos como insanidade, o rendeu o diagnóstico de esquizofrênico-paranóico em diversos manicômios onde passou boa parte de sua vida. Sua cela na ala de psiquiatria virou seu atelier particular. Equilibrando-se na fina linha entre a realidade e o delírio, utilizava de lixo e sucata para produzir suas obras que eram dedicadas apenas a Deus. Dizia ser o enviado dos céus para reproduzir o mundo em miniaturas. Toda sua fé e devoção não foram suficientes para livrá-lo do terror dos manicômios que mais parecia um
campo de experimentação. Em meio a eletrochoques, lobotomias e tratamentos violentos, Bispo driblava o poder regente do manicômio e utilizava de sobras de materiais hospitalares para criar suas obras em um dos períodos mais obscuros da psiquiatria. Foi nesse ambiente em que ele criou um universo extremamente particular, um mundo paralelo onde ele era rei. Bordava, fazia colagens, estandartes e assemblages de todo e qualquer material que obtivesse para compor sua arte. Aliás, em vida, não gostava de ser chamado de artista, pois o termo, para ele, não representava sua verdadeira função como um enviado dos céus que foi confiado uma tarefa divina. Um dos frutos de toda essa religiosidade foi uma das histórias mais célebres a seu respeito. Foi na noite de 22 de janeiro de 1938 que Bispo, conduzido por um imaginário de anjos, seguiu pelo caminho da igreja da Candelária e depois peregrinou pelas ruas do rio e terminou no Mosteiro de São Bento e lá anunciou aos padres que era um enviado de Deus incumbido de “julgar os vivos e os mortos”. A história remota a detalhes que Bispo utilizava um estandarte bordado por ele, uma de suas peças dentre sua vasta obra. Nele, o artista registra a frase-síntese de sua vida “Eu preciso destas palavras - Escrita”. Para Bispo, a palavra havia status extraordinário, por isso seus bordados são repletos de palavras, trechos poéticos, mensagens e nome de pessoas.Após esse episódio, foi enviado ao Hospital Nacional dos Alienados na Praia Vermelha, onde sua ficha era marcada como: negro, sem documentos e indigente. Foi transferido para a Colônia Juliano Moreira, hospício considerado na época como “fim de linha” para depois ser remanejado para um engradado de doentes perigosos. Sua cela tinha um colchão fino e um buraco no solo para suas necessidades. Nada digno da inspiração para sua obra. Quando tinha fortes crises, pedia para os funcionários o trancar e por lá ficava meses a fio. Recusava refeições e passava fome, “Vou secar pra virar santo”, prometia.Pois foi nesse período de isolamento que sua arte mais frutificou. Na falta de material, Bispo desfiava seu uniforme e aproveitava fio por fio, não é a toa que o azul - cor das vestimentas do manicômios - se destaca em suas peças. E foi assim que começou a cerzir o Manto Da Apresentação durante toda sua vida para usá-lo no dia do Juízo Final. O manto possui nomes bordados das pessoas que conhece que para ele são merecedoras de subir aos céus, a maioria mulheres. Em 1982, a primeira oportunidade de reconhecimento de seu trabalho veio do Museu de Arte Moderna do Rio De Janeiro. O MAM expôs alguns exemplares do universo particular de Bispo numa coletiva que reunia presidiários, menores infratores e idosos em uma exposição com o nome “À margem da vida”. O crítico de arte, Federico Morais, ofereceu a Bispo uma sala inteira para exposição no museu onde ele poderia se expressar e se alojar por um tempo. Ele sequer pensou no assunto e morreu na solidão de sua cela sete anos depois. Nos últimos momentos de sua vida, o reconhecimento já lhe era conferido. Mas foi após sua morte que suas obras foram consagradas no mercado internacional de arte contemporânea. Arthur Bispo do Rosário não pode assistir suas obras viajarem o mundo e nem ouvir, a seu contragosto, o título de artistas vanguardistas cuja obra foi comparada com as de Marcel Duchamp, tamanho reconhecimento que lhe foi dado mundo a fora.Bispo nunca foi perigoso como disseram. Loucura e lucidez foram apenas duas extremidades nas quais ele perambulou. Como a essência e a aparência, a arte que entretém, é como um tigre de garras limadas. Não fere, não cumpre o que promete. Contudo, no caso do “enviado de Deus”, acontece o inverso. Ele pode não oferecer perigo, mas sua arte nos rasga e atravessa como o ataque de um batalhão de felinos.
MIRROR CITY por Lucas Guarnieri
Mirror City é um projeto que tem a pretensão de transformar a ótica de pessoas que visitam algumas cidades americanas todos os dias. Prédios e ruas se refletem em um caleidoscópio em cidades como San Diego, Chicago, San Francisco, Las Vegas e Los Angeles. As imagens são capturadas de uma forma peculiar utilizando o Time Lapse, técnica que consiste em filmar paisagens urbanas por muito tempo e acelerar. O fotógrafo e cineasta Michael Shainblum explica sua pretensão com o projeto: “Eu queria misturar formas geométricas construídas pelo homem com elementos de cor e movimento para criar um vídeo menos estruturado, e mais uma pletora de estímulos visuais”.
ILUSÃO DE ÓTICA X GRAVIDADE por Lucas Dias
Encomendado pelo Barbican, em Londres, o Artista argentino Leandro Erlich instala uma versão de sua ilusão de ótica popular que cria o efeito visual de leveza. Usando uma parede de espelhos gigantes apoiados contra uma enorme impressão horizontal de uma casa com terraço vitoriano, os visitantes são livres para escalar e saltar em torno de como as suas reflexões parecem mover-se livremente, sem os efeitos desagradáveis da gravidade. Intitulado Dalston House a peça foi erguido em Hackney e fica em esposição até o dia 4 de Agosto
AS DEZESSETE PRIMAVERAS DE ANGELO BONINI Angelo Bonini contou apenas dezessete primaveras mas suas fotografias imprimem um olhar sólido e somam várias referências que educaram seu olhar para as coisas simples.
“A fotografia foi o que eu escolhi para apresentar as pessoas o mundo que eu enfrento e a maneira que o mundo externo se apresenta para mim. Comecei a compreender cada vez mais que ninguém vê a mesma coisa ao olhar pela janela e isso é o que mais me surpreende dentro da arte. O fato de sermos diferentes e vivermos em um mundo completamente diferente. Tenho a crença de que é o papel do artista representar o que há nele. Já não sei o que fotografo, o meu trabalho é bastante baseado no inconsciente, no meu jeito de ver o mundo e a junção de tudo que carrego comigo. Hoje ando de olhos abertos e busco cada vez mais estar dentro das minhas concepções e atender ao que espero de mim. Não sei onde vou estar daqui alguns anos, mas espero estar longe. Bem longe. Talvez fazendo filmes, ou fotografando, ou mesmo vendendo arte na praia, só não me vejo fazendo outra coisa se não vendo a vida nesse ângulo tão criativo e trabalhando com a gratidão como recompensa.”
POR QUE JOGAR FORA? por Lucas Guarnieri
Para alguns, objetos e móveis têm prazo de validade. Exercem seu papel funcional e logo são substituídos ou simplesmente jogados fora por estar velho. Dar outro valor a esses objetos é um exercício criativo constante e que possibilita criar resultados originais que dão elegância a sua produção. Objeto não vem com obrigatoriedade de desapego. Reformar ou evidenciar o caráter do tempo é uma boa opção de continuar a história de outra forma.
A ARTE DO ERRO DIGITAL por Lucas Guarnieri
Sabe quando seu computador trava e a imagem fica distorcida? Pois bem, quem poderia imaginar que isso seria uma tendência a ser obervada com olhos clínicos pela arte contemporânea? A Glitch Art é a estética inpirada nos erros digitais gerados por tecnologia corrompida. Essa nova tendência em plena era de perfeição tecnológica questiona o papel da arte digital. Se os gadgets hoje em dia apresentam erros, bugs e outras séries de falhas tecnológicas, a Glitch Art celebra o caos e a fragmentação transformando o que antes era defeituoso e inútil em arte contemporânea.
UNIVERSO PARTICULAR
Vamos brincar?
Funciona assim: vocês preenchem os espaços vazios da frase abaixo para dar forma ao seu universo particular.
Hoje eu desejo ______________________________ com_______________________ no(a) ______________!