Universidade Presbiteriana Mackenzie Especialização em Neurociência e Psicologia Aplicada
Relações entre as redes sociais online e a teoria da personalidade de acordo com o Big Five
Luciano Freitas
Universidade Presbiteriana Mackenzie Pós-Graduação lato sensu em Neurociência e Psicologia Aplicada Luciano Freitas, Turma A
INTRODUÇÃO Em 2019 é possível notar que palavras como Big Data, Artificial Intelligence e Machine Learning tem feito cada vez mais parte da vida dos cidadãos, direta ou indiretamente. Com os dados expostos em redes sociais online, os cidadãos -- ou usuários -podem ter suas escolhas dirigidas por outrem e tudo pode começar com o mapeamento deste material exposto, a começar com a personalidade dos usuários de uma dessas redes.
Esse trabalho tem o objetivo de elucidar a possibilidade de mapeamento de padrões de personalidade dos usuários das redes sociais de acordo com a teoria do Big Five.
Relações entre as redes sociais online e a teoria da personalidade de acordo com o Big Five
Existem teorias que, de certa forma, visam definir e categorizar a personalidade do ser humano. Apesar de não haver uma definição única e aceita por todos, podemos dizer que personalidade é um padrão de traços relativamente permanentes e características únicas que dão consistência e individualidade ao comportamento de uma pessoa. (ROBERTS, MROCZEK, 2008)
É possível também perceber que estes padrões e características se manifestam e se agrupam em três partes, como constata uma teoria muito famosa e aceita pela American Psychological Association que define personalidade como diferenças individuais de padrões característicos de pensamento, sentimento e comportamento (KAZDIN, 2000).
Ao longo dos últimos anos, muitas destas teorias da personalidade entraram em colapso no que se diz respeito à sua estrutura e conceitos, pois há uma variedade de definições para esse construto. No entanto, de acordo com DIGMAN (1990), de forma geral os pesquisadores concordam que existem cinco tipos robustos de personalidade que podem servir de taxonomia significativa para classificar os atributos da personalidade.
Um dos modelos difundidos para descrever a estrutura da personalidade, é o modelo dos Cinco Grandes Fatores da personalidade, também conhecido como Big Five, considerado uma teoria explicativa e preditiva da personalidade humana e de suas relações com a conduta (GARCIA, 2006).
Embora a literatura internacional diverge em relação aos nomes de cada fator básico desse modelo, no Brasil os cinco fatores têm sido chamados de Extroversão, Neuroticismo, Socialização, Realização e Abertura à Experiência (FISKE, 1949; TUPES, 1957; TUPES, CHRISTAL, 1961).
O modelo Big Five como citado, é uma teoria explicativa e preditiva da personalidade humana e que também explora as relações com a conduta e, de certa forma, as relações interpessoais.
Dois pesquisadores, Evans e Gosling (2007), selecionaram diversos fatores que justificam uma investigação em ambientes virtuais em detrimento de círculos sociais habituais. Atualmente, o ambiente de interação online é conhecido pelo termo Web 2.0 (O'REILLY, 2007). No ambiente Web 2.0, os próprios usuários são os responsáveis pela produção de conteúdo e também seus maiores consumidores e divulgadores de informações.
Para citar meios conhecidos para os usuários exercerem tal atividade no ambiente Web 2.0, estão as Redes Sociais Online (RSO). As RSO são compostas por um grupo de pessoas que interagem por meio de dispositivos virtuais que permite a seus usuários construir perfis públicos ou semipúblicos dentro de um sistema e por eles articular uma lista de outros usuários com os quais é possível compartilhar conexões, produzir e divulgar conteúdo (BOYD, ELLISON, 2007). As RSO também permitem aos usuários encontrarem outras pessoas com interesses e gostos parecidos, seja por interesse profissional, acadêmico, amoroso ou simples interação social. Dentre as mais famosas RSO, estão o Facebook e Instagram, fundados por Mark Zuckerberg em 2004, e o Twitter, fundado por Jack Dorsey em 2006.
Mapeamento de uma RSO e aplicação do modelo Big Five
De acordo com o Google Acadêmico (outubro de 2019), podem ser encontrados aproximadamente 3500 trabalhos em português que relacionam o tema Big Five e RSOs. Muitos destes trabalhos datam muito antes da criação e popularização das redes sociais, ou seja, antes de 2003 quando foi a criação do MySpace, por exemplo. Esse fato nos leva a entender que os modelos e teorias de personalidade, sobretudo o Big Five, se aplicam tanto no offline quanto no online.
Um dos estudos encontrados foi o dos pesquisadores Gosling e Johnson. Em 2010, os pesquisadores coletaram posts públicos de 28 usuários do Twitter. Em seguida, eles realizaram a análise individual do conjunto de posts de cada participante aplicando o PersonalityMiner, uma ferramenta de inferência que consiste em reduzir uma palavra ao seu radical para realização de uma análise sintática e assim, categorizá-las de acordo com dimensões como sentimentos positivos, emoções positivas, processo afetivo etc.
Com a análise feita, foi então gerado o padrão de personalidade de cada participante de acordo com o Big Five, ou seja, foi possível detectar dentre os participantes, uma predisposição para cada tipo de personalidade do modelo citado. No grupo dos 28 usuários, os resultados obtidos foram: • Extroversão: 26% • Neuroticismo: 22% • Socialização: 18% • Realização: 21% • Abertura à Experiência: 12%
Outros estudos mais complexos foram realizados para prever comportamentos de acordo com o Big Five. Um destes estudos (BACHRACH, KOSINSKI, GRAEPEL, KOHLI, STILLWELL, 2013) procurou testar as seguintes hipóteses: a) Abertura à Experiência e Neuroticismo estão positivamente correlacionados com o número de atualizações de perfil, fotos, grupos e curtidas de um indivíduo. b) Realização está negativamente correlacionado com todos os aspectos do uso do Facebook: número de amigos, curtidas, fotos etc. c) Extroversão está positivamente correlacionada com todos os aspectos do uso do Facebook. d) Socialização está positivamente correlacionada com o número de amigos, grupos e curtidas.
Analisando os resultados, foi possível detectar que há a possibilidade de dividir os usuários do Facebook em segmentos de personalidade, como demonstram as tabelas abaixo:
Tabela elaborada pelos autores. Tradução livre: Correlações estatisticamente significantes entre traços de personalidade e características do perfil do Facebook (com um nível de significância de p < 1%).
Tabela elaborada pelos autores. Tradução livre: Predição de traços de personalidade usando características do Facebook por meio de regressão linear multivariada. R²: Regressão linear multivariada RMSE: Raiz quadrada do erro-médio
Ainda de acordo com as tabelas acima, é possível notar que alguns traços de personalidade podem ser preditos com uma certa acurácia, outros nem tanto. Por
exemplo, para Extroversão, a conclusão foi obtida com R² no valor de 0.33, enquanto Socialização, o R² é 0.01.
De acordo com os resultados dos dois estudos apresentados, concluo que, mesmo não tendo 100% de acurácia para afirmar que uma pessoa é, necessariamente, aberta à uma nova experiência, é possível obter dados significativos sobre a personalidade de usuários de uma RSO aplicando o modelo do Big Five.
Não obstante, devido ao pequeno tamanho dos resultados relatados no presente estudo, os argumentos da minha conclusão requerem validação adicional.
REFERÊNCIAS
BOYD, D. M.; ELLISON, N. B.: Social network sites: Definition, history, and scholarship.Journal of Computer-Mediated Communication,13(1), 210-230, 2007. DIGMAN, J.M.: Personality structure: Emergence of the five-factor model. Annual Review of Psychology, 41,417440, 1990. EVANS, D.C.; GOSLING, S.D.: Forming personality impressions from online profiles: A research issue illustrating the science of social computing, 2007. FISKE, D.W.: Consistency of the factorial structures of personality ratings from different sources. Journal of Abnomal Social Psychology, 44,329-344, 1949. GOSLING, S. D.; JOHNSON, J. A.: Advanced methods for conducting online behavioral research. 1a. ed. Washington, DC: American Psychological Association, 2010. KAZDIN, ALAN E. Encyclopedia of Psychology: Develop-Gooden, 2000. KOSINSKI, M; KOHLI, P; STILLWELL, D.J.; BACHRACH, Y.; GRAEPEL, T.: Personality and website choice. ACM Web Science Conference, pp 251–254, 2013. MURRAY R. BARRICK; MICHAEL K. MOUNT: The Big Five personality dimensions and job performance: a meta-analysis,1991. O'REILLY, T.: WhatisWeb2.0: Design Patterns and Business Models for the Next Generation of Software. Communications & Strategies, 65(1), 17-37, 2007. ROBERTS, B. W.; MROCZEK, D. Personality trait in adulthood, 2008. TUPES, E. C.: Personality traits related to effectiveness of junior and senior Air Force officers, 1957. TUPES, E.C.; CHRISTAL, R.E.:Recurrent personality factors based on trait ratings, 1961.