Empreendedorismo Social Legados da Formação Cidadã para os 80 anos de Londrina
Empreendedorismo Social Legados da Formação Cidadã para os 80 anos de Londrina
Autores
Ariana Almeida Quelho é formada em Biblioteconomia e Ciência da Informação na UEL, pós-graduada em Administração de Marketing e Propaganda. Empresária, Diretora Executiva do Grupo CDI e Membro do Conselho do Jovem Empresário da ACIL.
Cassiana Stersa Versoza Carvalhal é psicóloga, Mestre em Análise do Comportamento pela UEL e com MBA em Gestão de Pessoas. Diretora de Desenvolvimento Organizacional do Grupo CDI e Professora de Ensino Superior nos cursos de Psicologia e Gestão de Recursos Humanos.
Ciliane Carla Sella de Almeida é advogada, formada pela UEL, especializada em Direito Empresarial pela OAB/Inbrape (Londrina) e Mestranda em Engenharia do Desenvolvimento Local pela Universidade Católica de Lyon (França). Sócia fundadora da Priori Consultoria.
Cleufe de Almeida é administradora, especialista em Administração de Marketing e Propaganda, empresária, atua na Seressencial – soluções empresariais, instrutora e consultora em planejamento, gestão de pessoas e empreendedorismo.
Gabriela Guimarães é Diretora Executiva, Coach e Instrutora de Workshops | Team Building corporativos da GROOW|Coaching & D.H. Expert em processos de Coaching para Desenvolvimento de Liderança, Planejamento de Carreira, transferências e sucessão de cargos.
Karen Kohlmann Barbosa é graduada em Relações Públicas pela Universidade Estadual de Londrina e pós-graduanda em Gestão e Planejamento de Projetos Sociais. Atua como articuladora de redes no Junt.us Espaço Colaborativo.
Luciana Yuri Shirado é graduada em Secretariado Executivo Bilíngue (Unifil), Pós Graduada em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria (ISAE/FGV) e em Marketing, Comunicação e Vendas (Unopar). Atua com Consultoria e Gestão de Projetos de Inovação e PD&I.
Luzimar dos Santos Ribeiro Mazetto é formada em Letras pela UEL e possui especialização em Psicopedagogia (UNIFIL), Psicologia da Educação (UEL) e Educação Especial (UNOPAR). Atua há 17 anos na Rede Municipal de Educação de Londrina e atualmente no projeto Pedagogia Empreendedora e Escola de Pais.
Maíra Bendlin Calzavara é advogada, formada pela UEL, pósgraduada em Filosofia Política e Jurídica pela mesma Universidade e possui LLM em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. Sócia fundadora da Priori Consultoria.
Paulo Briguet é jornalista e escritor. Formado pela UEL, atuou na imprensa da cidade e tem três livros de crônicas publicados. É assessor de comunicação da ACIL e colunista do Jornal de Londrina e da Gazeta do Povo.
Paulo Varela Sendin é Engenheiro Agrônomo graduado pela ESALQ / USP, possui especialização em Economia Rural e Planejamento Estratégico. É Consultor em Gestão da Inovação Tecnológica e em Agronegócio. Atuando na Adetec e na Priori Consultoria.
Rafaela Vieira Marinho é especialista em Gestão e Estratégia Empresarial e Gestão de Pessoas pela Unifil. Graduada em Serviço Social pela UEL. Atua como Analista de Responsabilidade Social do Instituto GRPCOM, responsável pela coordenação regional de projetos de Responsabilidade Social.
Rodrigo Martins é consultor empresarial na área de Desenvolvimento Organizacional e Gestão Comercial. Professor convidado dos cursos de pós graduação do ISAE/FGV, PUC-PR e UNOPAR. Formado em Administração de Empresas e especialista em Marketing e Propaganda (UEL). Proprietário da CLEARX CONSULTORIA EMPRESARIAL.
Rosi Sabino é Mestre em Administração. Certificada na metodologia de Investigação Apreciativa pela Case Western Reserve University. Membro da Sociedade Brasileira de Coaching. É sócia-diretora da Link Ideia Desenvolvimento Organizacional.
Sandra Capelo é formada em comunicação social - jornalismo, gestora de negócios da Associação Evangélica Beneficente de Londrina (AEBEL).
Tatiana Bittencourt é especialista em Marketing pela ESPM/SP e graduada em Relações Públicas pela UEL. Participou do curso Usina de Ideias da Artemísia/SP. Atualmente é pós-graduanda em Comunicação Popular e Comunitária pela UEL e coordena o projeto #Partiuvoar, com foco no empreendedorismo jovem na periferia.
Thaís Bruschi é Diretora Executiva, Coach e Instrutora de Treinamentos | Workshops Corporativos da GROOW|Coaching & D.H. Expert em processos de Orientação e Planejamento de Carreira, Coaching para Desenvolvimento de Liderança e Programas de Team Building.
Tiago Garcia é formado Relações Públicas (UEL), especialista em Economia do Meio Ambiente (UEL) e possui MBA Internacional em Gerenciamento de Projetos (FGV). Possui formação pela Global Reporting Initiative, pela Rede Brasileira do Pacto Global das Nações Unidas para o desenvolvimento de Comunicações de Progresso do Pacto Global e participou do Project Management na George Washington University.
Copyright 2014® Maria Rosilene Sabino Copyright 2014® Maíra Bendlin Calzavara Copyright 2014® Ciliane Carla Sella De Almeida 1a Edição Londrina • 2014 Projeto Gráfico, Capa e Diagramação : Magz Comunicação Revisão: Paulo Briguet
Patrocínio / Apoio
Sumário PREFÁCIO
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INTRODUÇÃO
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Acil: o Nós vem antes do Eu
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A importância do Terceiro Setor na dinâmica do desenvolvimento local
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Entendendo melhor os Negócios Sociais
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Instituto GRPCOM: um caso de estratégia empresarial para a sustentabilidade
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Inovação social: instrumento de desenvolvimento e transformação social
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O empreendedorismo social e sua contribuição para formação da cidadania: estudo de caso da Associação Solidariedade Sempre
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Maratona de Empreendedores: Inovação e Desenvolvimento Social em Londrina
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A abordagem apreciativa na construção de uma visão de excelência para a educação
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Pedagogia Empreendedora e suas implicações na rede municipal de Londrina
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AINTEC e o empreendedorismo na escola
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Programa Empresário Sombra: um modelo educativo para a formação cidadã
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Entre ações e mediações: A Pedagogia Murialdo na formação de sujeitos para a sustentabilidade
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O direcionamento profissional como agente transformador
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A Pedagogia do Afeto como instrumento para sustentabilidade social
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Centro de Apoio e Esperança: Transformando vidas
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Resíduo Eletrônico: O lixo que pode levar informação e conhecimento
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POSFÁCIO
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PREFÁCIO
Cidadania Empreendedora em Londrina Ozires Silva
Em pouco mais de 2 anos de atividade o capítulo Londrina da Cátedra Ozires Silva lança seu segundo livro, demonstrando o alto nível de compromisso com o Empreendedorismo, a Inovação e a Sustentabilidade que são características da comunidade londrinense. Neste ano de 2014 a Cátedra em Londrina se preocupou em oferecer um presente de aniversário à cidade, comemorando os 80 anos de existência com o resgate de alguns dos inúmeros exemplos de ações em prol do desenvolvimento social ocorridas nessas 8 décadas. A construção de uma forte cultura local de empreendedorismo e cooperação se inicia logo na chegada dos primeiros pioneiros da ocupação transformadora do território. Nos idos de 1934 a presença do Estado na região era praticamente nula, condição esta que passa a despertar, em todos, um sentido de cidadania voltado para a solução dos problemas locais e não para uma total dependência de ações governamentais tão usual no imaginário brasileiro. Essa junção de empreendedorismo e cooperação promoveu ao longo dos 80 anos de existência de Londrina um enorme elenco de casos de Empreendedorismo Social permitindo aos organizadores deste livro selecionar com facilidade esta “amostra” de 16 exemplos de compromisso desinteressado com o progresso social e econômico da cidade. Aliás, podemos dizer que, de fato, são 17 exemplos, pois a própria “construção” do livro pode também ser considerada um empreendimento social, onde 18 autores colaboraram desinteressadamente para que o objetivo de presentar Londrina em seu aniversário fosse alcançado. E, além desses autores, envolvidos diretamente na elaboração dos textos, outros londrinenses ofereceram também seu trabalho na edição e preparo gráfico da publicação.
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Reafirma-se, portanto, que a criação do Capítulo Londrina da Cátedra Ozires Silva, vem sendo um empreendimento de sucesso. Os dois livros lançados pelo grupo de participantes locais, um voltado para o Desenvolvimento Econômico e a Inovação, e este para o Empreendedorismo Social e a Construção da Cidadania, comprovam que a cultura local de cooperação desinteressada, com foco no bem estar da comunidade, produz bons frutos e é sustentável, já que vem, consistentemente, se fazendo presente ao longo desses 80 anos. Por outro lado, o sucesso do grupo ao produzir esses dois livros nesse curto espaço de tempo tem, em si mesmo, a semente de um grande desafio: como superar as dificuldades inerentes a um trabalho voluntário e conseguir, no próximo ano, alcançar resultados tão relevantes como os obtidos nestes dois anos iniciais? Esse, no entanto e como a história de Londrina mostra, tem sido o desafio permanente da comunidade londrinense nestes últimos 80 anos: a superação dos desafios com base na cooperação de todos e a constante busca de um horizonte cada vez melhor para a cidade. Isso nos dá a certeza de que, em dezembro do próximo ano, estaremos comemorando não só mais um aniversário de Londrina, mas também, o anúncio de um novo conjunto de ações do Capítulo Londrina da Cátedra Ozires Silva.
INTRODUÇÃO
Cátedra Ozires Silva Paulo Varela Sendin (sendin@londrina.net)
Pelo segundo ano consecutivo o capítulo londrinense da Cátedra Ozires Silva vem a público com uma publicação focada em seus objetivos institucionais de promoção do empreendedorismo e inovação sustentáveis. No ano passado o foco foi o empreendedorismo em seu viés de inovação tecnológica. Neste ano, mantendo-se no tema do Empreendedorismo, a opção foi pelo desenvolvimento social e a construção da cidadania. A pertinência do tema, em termos dos objetivos da Cátedra, é indiscutível. Neste ano, no entanto, Empreendedorismo e Cidadania têm um significado especial para Londrina: ao completar 80 anos, a cidade tem o dever de recuperar e o direito de comemorar essas oito décadas de ações empreendedoras e de compromissos de cidadania. Londrina tem todo um passado empreendedor por ter nascido de um grande empreendimento e atraído pessoas comprometidas com atividades igualmente empreendedoras. E seu impressionante crescimento foi essencialmente baseado nessa vocação. Ao lado da vocação empreendedora, a comunidade local tem também uma história de compromisso com o desenvolvimento local baseado na mobilização cidadã. Até pelo isolamento inicial da cidade, com ínfimos suportes governamentais, a superação dos desafios e dificuldades sempre se baseou na organização local e na criação do chamado capital social. Esse conceito de capital Social é muito importante para o entendimento dos processos de desenvolvimento. Historicamente as análises do processo de desenvolvimento econômico (ou, mais adequadamente, de crescimento econômico...) se baseavam nas chamadas “vantagens comparativas” de cada
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local. Assim, se existisse uma boa disponibilidade de fatores físicos – como terras, minérios, localização geográfica, etc. – determinada região estaria “predestinada” ao desenvolvimento. Atualmente, no entanto, sabe-se que o homem é capaz de superar eventuais deficiências das “vantagens comparativas” (e, às vezes, desperdiçar possíveis boas disponibilidade delas...), construindo “vantagens competitivas” a partir da aplicação de conhecimento e organização. Uma das “vantagens competitivas” mais importantes é justamente a construção de capital social, ou seja, a construção da articulação entre pessoas e entidades de forma a definir objetivos comuns e organizar os esforços necessários à consecução desses objetivos. Essa integração entre as pessoas, construindo entidades fortes, e a interação entre essas entidades, buscando a solução dos problemas que se apresentavam, permitiu que Londrina se tornasse um exemplo de dinamismo econômico e social. Este livro se propõe a resgatar, minimamente, algumas dessas histórias de construção de entidades preocupadas com o desenvolvimento da comunidade local, superando a tendência natural de se voltar apenas para seus próprios interesses. Assim, ao completar seus 80 anos de existência, Londrina pode olhar para seus exemplos históricos de empreendedorismo social e construção de cidadania e espelhar-se neles para definir uma nova visão de futuro, buscando na ampliação de seu capital social a alavanca para a construção de um ambiente de alta qualidade de vida para todos os londrinenses.
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Acil: o Nós vem antes do Eu Paulo Briguet
Resumo: Ao longo dos últimos 77 anos, o associativismo contribuiu de maneira decisiva para o desenvolvimento social, econômico, cultural e ambiental de Londrina. O trabalho da ACIL assegura a continuidade e o aprimoramento do processo civilizatório iniciado pela Companhia de Terras Norte do Paraná.
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1. A COMPANHIA “Londrina! Cidade de braços abertos A todos os filhos do nosso Brasil E a todos aqueles de pátrias distantes Que aqui, confiantes, sob um pálio anil Seu lar construíram e aos filhos se uniram E aos filhos se uniram do nosso Brasil.” (Hino de Londrina)
Toda sociedade tem o seu mito fundador. No caso de Londrina, o mito encontra-se diretamente relacionado à verdade histórica. Foi algo que de fato aconteceu na tarde de 21 de agosto de 1929, quando o engenheiro agrimensor russo Alexander Razgulaeff fincou o primeiro marco de colonização no Patrimônio Três Bocas, depois rebatizado Patrimônio Londrina. Hoje o local é conhecido como Marco Zero. “Chegamos”, disse Razgulaeff. “Chegamos aonde?”, perguntou o chefe da expedição, George Craig Smith, que tinha apenas 20 anos de idade. “Ao início das terras da Companhia”, respondeu o russo, com seu forte sotaque. Vários elementos da futura Londrina podem ser identificados naquele momento histórico. A “Companhia” referida por Razgulaeff era uma empresa de capital britânico, a Companhia de Terras Norte do Paraná, que planejaria e executaria a colonização urbana e rural de toda a região. Domingos Pellegrini – autor do romance “Terra-Vermelha”, épico da colonização de Londrina – afirma que a Companhia de Terras realizou no norte paranaense a maior reforma agrária promovida pela iniciativa privada em todo o planeta. Londrina nasceu como empresa. A palavra “companhia” tem origem nos termos latinos com (união) e panis (pão). Ou seja: uma companhia é formada entre homens que confiam uns nos outros a ponto de dividir o mesmo pão. Esse espírito de companheirismo nortearia os primeiros anos da colonização de Londrina – cidade que surgiu no meio da floresta. Sem diminuir a importância dos desbravadores da região – fazendeiros e caboclos que se aventuraram nas profundezas do sertão paranaense –, não há como negar que a história
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de Londrina começava com aquela palavra de Razgulaeff, um veterano da Primeira Guerra, exilado pelos comunistas russos. Chegamos. Outro indício do que viria a ser Londrina está na variedade étnica daquele grupo de pioneiros. Havia homens com origem britânica (George Craig Smith), russa (Razgulaeff), alemã (Erwin Fröhlich), italiana (Spartaco Bambi), portuguesa (Alberto Loureiro) e brasileira (Geraldo Pereira Maia e Joaquim Benedito Barbosa), sem esquecer os demais integrantes da expedição cujos nomes infelizmente a história não guardou. Era a semente de Londrina – e o futuro começaria a germinar numa velocidade assustadora. Em 1938, menos de dez anos depois da caravana, já havia uma pequena Torre de Babel naquela cidadezinha da boca do Sertão, com a presença de 1.823 brasileiros (na maioria vindos de São Paulo e Minas Gerais), 611 italianos, 533 japoneses, 510 alemães, 303 espanhóis, 218 portugueses, 193 poloneses, 172 ucranianos, 138 húngaros, 51 checoslovacos, 44 russos, 34 suíços, 29 austríacos, 21 lituanos, 15 iugoslavos, 12 romenos, 7 ingleses, 5 sírios, 5 argentinos, 3 dinamarqueses, 2 australianos, 2 norte-americanos, 2 suecos, 2 franceses, 2 búlgaros, 2 belgas, 2 liechteinsteinianos, 2 letões, 1 norueguês, 1 indiano e 1 estoniano. Depois viriam outros, como os libaneses e os nordestinos, formando uma cidade reconhecida por sua diversidade cultural.
2. A ASSOCIAÇÃO “Toda a vida (ainda das coisas que não têm vida) não é mais que uma união. Uma união de pedras é edifício: uma união de tábuas é navio: uma união de homens é exército. E sem essa união, tudo perde o nome e mais o ser. O edifício sem união é ruína: o navio sem união é naufrágio: o exército sem união é despojo. Até o homem (cuja vida consiste na união de alma e corpo) com união é homem, sem união é cadáver. (...) Ó Deus! Ó homens! Que só a vossa união vos há-de conservar e só a vossa desunião vos há-de perder!” (Padre Antônio Vieira, 1662)
O processo civilizatório iniciado pela Companhia de Terras ganharia um impulso fundamental em 1937. Dois anos e meio depois da emancipação de
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Londrina como município, um libanês chamado David Dequêch, dono de um armazém, decidiu criar aquilo que poderia parecer loucura aos desavisados. Reuniu um grupo de 19 cidadãos locais – “os 19 companheiros”, como ele definiu – e criou a Associação Comercial de Londrina, hoje conhecida como ACIL. A primeira reunião aconteceu no Líder Clube, na noite de 5 de junho de 1937. Com a ACIL, a cidade que nasceu como empresa ganhou uma associação de classe que, dali em diante, iria participar de todos os momentos importantes da história da cidade. A galeria de presidentes da ACIL reflete a diversidade étnica que marcou Londrina desde o princípio: como na caravana pioneira e na bandeira do município, há ali representantes de todos os continentes. O surgimento da Associação Comercial estava perfeitamente alinhado com o espírito do pioneirismo. Desde aquela noite histórica no Líder Clube, homens de diferentes origens culturais se uniram confiantes – como diz a letra do hino da cidade – em nome do desenvolvimento mútuo. De lá para cá, a ACIL colocaria em prática os princípios basilares do associativismo: 1) livre adesão; 2) gestão democrática; 3) participação econômica dos sócios; 4) aperfeiçoamento contínuo e valorização da educação; 5) interação entre os associados; e 6) cooperação com a comunidade. Ao longo da história das civilizações, percebe-se que existe uma íntima relação entre liberdade e associativismo. O desenvolvimento só é possível quando as pessoas são livres para empreender, produzindo valores e edificando a comunidade. Uma associação cumprirá seu papel institucional na medida em que tiver liberdade e independência para expressar ideias e reivindicações. Não foram poucas as vezes em que as associações de classe funcionaram como focos de resistência a governos ditatoriais, autoritários e corruptos. O primeiro teste de fogo da ACIL viria apenas cinco meses depois da fundação. Em 10 de novembro de 1937, o presidente Getúlio Vargas deu o golpe do Estado Novo, fechando todos os legislativos municipais. Sem vereadores, a cidade recorreu à ACIL para funcionar como poder moderador e fiscalizador da gestão pública. A história se repetiria nos anos 70, durante o regime militar, quando a ACIL atuou como centro catalisador dos movimentos políticos e culturais que lutavam pela democracia e as liberdades públicas no País.
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Entre os desafios da ACIL nos tempos pioneiros, estava a construção de uma ponte sobre o Rio Tibagi, para facilitar o acesso das pessoas e a circulação de mercadorias na cidade. Em pleno Estado Novo, David Dequêch e seus companheiros conseguiram trazer a Londrina o temido e irascível interventor Manoel Ribas, conhecido como “Mané Facão”, e convencê-lo de que era necessário construir a tal ponte do Tibagi recorrendo a uma tática inusitada. No momento em que o interventor decidiu voltar para Curitiba, os cidadãos locais formaram uma imensa fila para esperar a balsa na margem do Tibagi, fazendo com que Mané Facão sentisse na pele a importância da construção da ponte. Em pouco tempo, a obra foi iniciada e concluída. Aquele era apenas o primeiro dos muitos benefícios que a ACIL ajudaria a trazer para a cidade. Entre os principais legados da ACIL, destaca-se a criação de instituições que fazem a diferença na comunidade londrinense. No Palácio do Comércio foram assinadas as atas de fundação da Sociedade Rural do Paraná, da Santa Casa, da Associação Médica, da Universidade Estadual de Londrina, do Instituto Agronômico do Paraná, do Aeroclube, do Conselho Comunitário de Segurança, do Fórum Desenvolve Londrina e de outras entidades que hoje compõem a sociedade civil local. Todas elas foram criadas com o DNA associativista, cuja essência pode ser definida por uma simples frase: “O nós vem antes do eu”. 3. A UNIÃO “O homem das sociedades tradicionais encontra nos mitos os exemplares de todos os seus atos. Os mitos lhe asseguram que tudo que ele faz ou pretende fazer já foi feito no princípio dos Tempos, in illo tempore. Os mitos constituem, portanto, a súmula do conhecimento útil. Uma existência individual se torna, e se conserva, uma existência plenamente humana, responsável e significativa, na medida em que ela se inspira nesse reservatório de atos já realizados e pensamentos já formulados.” (Mircea Eliade) Enquanto Londrina se tornava a Capital Mundial do Café, nos anos 50 e 60, a ACIL atuou decisivamente em questões que envolviam a infraestrutura, a política tributária, o financiamento à produção, o planejamento urbano, o
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resgate da memória e a segurança pública. Toda e qualquer questão relevante para a comunidade também é relevante para a ACIL. Afinal, as empresas só prosperam na medida em que o conjunto da sociedade ganha em qualidade de vida. Há uma relação direta entre livre iniciativa e desenvolvimento humano. Quanto mais empresas, mais prosperidade e melhores indicadores sociais. Com a geada de 1975 e o final do ciclo cafeeiro, Londrina viu-se diante do desafio de reinventar-se. Desde os anos 60, a ACIL já vinha fomentando o debate para a diversificação econômica do município. Com a criação da UEL e do Iapar, nos anos 70, a cidade passou a ser um centro de referência na educação, na pesquisa e no atendimento à saúde. O setor da construção civil teve um grande impulso nos anos 80, tornando Londrina uma das cidades mais verticalizadas do Brasil. O comércio e a prestação de serviços ganharam forte impulso e passaram a atrair visitantes de toda a região. Uma cidade com Londrina não possui apenas uma vocação. A diversidade cultural dos tempos pioneiros transforma-se necessariamente em diversidade produtiva. Em 1987, a ACIL passou a ser denominada oficialmente Associação Comercial e Industrial de Londrina. O estímulo à industrialização tem sido das principais bandeiras do associativismo local, considerando as potencialidades do segmento na produção de valor e na geração de renda. Mais recentemente, o segmento transversal da tecnologia da informação (TI) ganhou destaque nas ações da entidade. A partir dos anos 90, a qualificação dos trabalhadores e empresários tornouse prioridade na ACIL. Anualmente, a entidade sedia mais de 700 palestras, seminários e cursos em seu Centro de Capacitação. A maior parte dessas atividades é voltada para a formação de pessoas, com ênfase no aumento da competitividade empresarial. Há também programas de acesso ao crédito com juros baixos e gestão financeira para pequenos e médios empresários. Os serviços de proteção ao crédito e certificação digital atendem a milhares de pessoas todos os anos. A ACIL dispõe de uma equipe de profissionais qualificados para atendimento a um público cada vez mais exigente.
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Mas a principal contribuição da ACIL para o desenvolvimento de Londrina não pode ser definida por seu patrimônio material. A mais importante riqueza da entidade está nas pessoas e nos valores que elas representam: trabalho, legalidade, conhecimento, eficiência, gratidão. E tudo isso só é possível quando as pessoas se unem em torno de causas comuns. Foi assim no movimento Pé Vermelho Mãos Limpas, em 1999 e 2000, quando as entidades locais, lideradas pela ACIL, conseguiram enfrentar uma onda de corrupção que tomou de assalto a administração pública do município. Os líderes do movimento receberam o Prêmio Integridade, conferido pela Transparência Internacional, em 2001. Hoje o desafio é melhorar a eficiência da gestão pública e tornar Londrina um modelo gerencial para o Brasil. A atual diretoria da ACIL condensou essa tarefa em um lema: Pé Vermelho Mãos Unidas. Nos 80 anos de Londrina, o presente da ACIL para a cidade se chama união – e inspira-se no exemplo dos pioneiros vieram de diversas partes do mundo e construíram um sonho no meio do Sertão paranaense. Iniciamos este artigo citando os primeiros versos do Hino de Londrina. A música foi composta pelo maestro Andrea Nuzzi. O empresário Francisco Pereira Almeida Jr. teve apenas oito dias para escrever a letra do hino, a pedido do prefeito Antônio Fernandes Sobrinho. Os versos traduzem perfeitamente a trajetória da cidade: “Londrina! Cidade que sobe e que cresce/ Que brota e floresce,/ Que em frutos se expande!/ Que a Pátria enriquece,/ Que alta, e que grande,/ O encanto oferece de sempre menina!” Como estamos comemorando o aniversário de Londrina, cidade menina, é justo encerrar este breve perfil institucional dizendo ao leitor que o autor da letra do Hino a Londrina foi um presidente da ACIL. “E aos filhos se uniram do nosso Brasil.”
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A importância do Terceiro Setor na dinâmica do desenvolvimento local Ciliane Carla Sella de Almeida1
RESUMO: Este artigo aborda a importância do Terceiro Setor como um dos eixos do desenvolvimento local e as parcerias que podem ser celebradas com o poder público na qualidade de colaboradoras do Estado e executoras de programas e projetos de interesse público assim como as alianças com as empresas privadas (setor produtivo) que queiram desenvolver seu braço social. Palavras-chave: Desenvolvimento Local, Parcerias, Relações Intersetoriais, Terceiro Setor.
Advogada, Especialista em Direito Empresarial e Mestranda em Engenharia do Desenvolvimento Local. Sócia proprietária da Priori Consultoria.
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INTRODUÇÃO A importância do Terceiro Setor na dinâmica do desenvolvimento local é o texto escolhido para inaugurar esta obra. As experiências relatadas ao longo deste livro confirmarão esta abordagem e poderão servir de inspiração às empresas privadas e aos gestores públicos para uma maior utilização de parcerias com as entidades sem fins lucrativos para execução de projetos de interesse da sociedade. Tema mundialmente debatido e amplamente documentado2, o desenvolvimento local passa a ser um dos desafios da sociedade, conciliando o econômico, o social e o ambiental. Abordamos nestas breves páginas os requisitos necessários para um projeto de desenvolvimento local, o Terceiro Setor na atualidade e as parcerias entre público e privado para a execução de projetos, programas e atividades que têm como finalidade o bem estar das comunidades e a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. O DESENVOLVIMENTO LOCAL Todo projeto de desenvolvimento local tem como objetivo a melhoria de vida das comunidades através da integração entre diferentes setores da sociedade. Há consenso entre os estudiosos do tema que qualquer proposta de desenvolvimento local requer, para seu sucesso, a existência de três eixos: a comunidade local, a parceria e um clima propício à ação. A comunidade local é definida segundo os diversos interesses e em função dos serviços a serem prestados aos cidadãos. Estes podem não estar localizados em territórios definidos pelo Estado, mas sempre correspondem aos locais onde os cidadãos se encontram, onde existe sentimento de pertencimento e de identidade do local. Assim pode haver várias comunidades no interior de uma mesma cidade ou de um mesmo bairro. Nas palavras de Augusto de Franco3, comunidades são mundos pequenos que atingiram certo grau de tramatura do seu tecido social. Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Agências de Cooperação Internacional, Organização Internacional do Trabalho. 3 Franco, Augusto de. A revolução do local: globalização, glocalização, localização. Brasília: Agência de Educação para o Desenvolvimento. São Paulo: Editora de Cultura, 2003/2004 2
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A participação das comunidades nos projetos de desenvolvimento local e na sociedade é o resultado de processos de mobilização permanente e da formação dos cidadãos para que bem exerçam seu papel no interior desta sociedade. Como exemplos de mobilização local, citamos as conferências e conselhos municipais, as audiências públicas, os fóruns de discussões, as associações de bairros, as redes de participação, dentre outras. São espaços de diálogo e deliberação com alto poder de transformar opinião pública em discernimento público, desenvolver uma voz pública, lidar com conflitos, desenvolver o protagonismo público, formar relacionamentos públicos, criar condições para a ação pública. Enfim, são práticas coletivas que levam a outra forma de cidadãos se relacionarem com autoridades, conforme David Mathews4. As parcerias e a criação de redes devem existir na perspectiva do desenvolvimento local. Apesar de os interesses divergentes, os representantes dos setores privado, público e comunitário decidem trabalhar juntos a fim de desenvolver uma participação intersetorial e de intervenções transversais. Como exemplo de redes em nível local, podemos citar a iniciativa do Fórum Desenvolve Londrina5 que tem por objetivo aglutinar a sociedade organizada e mobilizar a comunidade para o desenvolvimento sustentável de Londrina e região, por meio de atividade permanente de prospecção de futuro e planejamento estratégico, independente de política partidária. O que se pretende no processo de reunião de atores provenientes de diferentes setores é o trabalho coletivo de grupos de interesses às vezes opostos e de líderes que são também concorrentes, mas que, elegem os interesses e demandas da sociedade como ponto de diálogo e interação. As parcerias se estabelecem entre todos os intervenientes, porém, mais particularmente entre o poder público e os parceiros sociais e econômicos. A terceira condição necessária ao sucesso das políticas de desenvolvimento local é o estabelecimento de um ambiente e de um clima propícios à colaboração e a ação comunitária.
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MATHEWS, David. Fortalecendo a atuação democrática de comunidades. Curitiba:Inesco:Complexo Pequeno Príncipe.AEW-PR, 2014. Ver www.forumdesenvolvelondrina.com.br
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Criar este ambiente nem sempre é tarefa de fácil cumprimento considerando a existência de diferentes valores, as heranças culturais, a formação/educação e as visões setoriais. Por isto, cabe aos líderes provocar um ambiente propício e facilitar a reunião em torno de projetos intersetoriais através de um processo que permite a fixação de objetivos comuns e de identificação de projetos concretos. O que garantirá a concentração de esforços de cada um dos atores reunidos na mesma direção. Como exemplo e pelo impacto positivo nas comunidades beneficiárias citamos os projetos de desenvolvimento local executados pelo Instituto Votorantim de Responsabilidade Social no sul da Bahia através de parcerias com setor público e privado6. O TERCEIRO SETOR Termo de origem anglo-saxônica7, o Terceiro Setor compreende as organizações que não executam atividades econômicas, têm objetivos sociais, não se encontram na estrutura do Estado, nascem da voluntariedade (não coercitivas) e estão constituídas sob a forma jurídica de associação ou fundação. Despontaram inicialmente no Brasil como instituições filantrópicas. Seu maior exemplo são as Santas Casas de Misericórdia. Com a evolução da sociedade e suas demandas e da abertura do Estado, as associações passaram a atuar em outros campos, não se limitando apenas à defesa dos direitos sociais e políticos, mas colaborando como parceiras do Estado, na execução de projetos sociais, ambientais, culturais e econômicos. Como exemplo pela alta capacidade técnica operacional, de atuação nacional e internacional com projetos voltados à atuação em políticas públicas e desenvolvimento local, citamos o Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais – Instituto Pólis sediado na cidade de São Paulo8. Em nível local, apontamos para a Agência Terra Roxa de Investimentos, que tem como objetivo divulgar mundialmente o potencial regional para atração de Ver www.Institutovotorantim.org.br Third Sector 8 Ver www.institutopolis.org.br 6 7
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investimentos visando ao desenvolvimento socioeconômico equilibrado da região Norte do Paraná9. Ao lado dessas organizações, encontramos as associações e fundações empresariais como manifestação da responsabilidade social corporativa desenvolvendo projetos com impacto nas comunidades carentes. Como exemplos pelos bons projetos executados, citamos a Fundação Odebrecht, o Instituto Votorantim, o Instituto Sírio Libanês, o Instituto Albert Einstein, o Instituto Sadia, o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. AS PARCERIAS Em termos legais, o Estado representado pelas três esferas de poder – União, Estados e Municípios – está autorizado pela Constituição Federal de 1988 a celebrar parcerias com as entidades sem fins econômicos10 em áreas não exclusivas deste11. Importante ressaltar que de forma complementar ao Estado, as entidades sem fins econômicos das áreas de educação e saúde têm preferências às empresas privadas (finalidades lucrativas). Afora a previsão constitucional, a partir da Reforma Administrativa proposta por Bresser Pereira no governo de Fernando Henrique Cardoso, foram sendo introduzidas no sistema legal formas mais delineadas de parcerias como o contrato de gestão, em 1998, e o termo de parceria, em 1999, instrumentos jurídicos específicos das organizações sociais (OS) e das organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP), respectivamente. Mais recentemente, em agosto de 2014, o governo da presidente Dilma Roussef promulgou a Lei n. 13.019, marco legal do relacionamento entre administração pública e organizações da sociedade civil (OSC). Para dar agilidade e eficiência aos projetos executados pelas instituições federais (IFES) e estaduais de ensino superior (IEES) e dos institutos de ciência e tecnologia (ICTs), foi criada a figura da fundação de apoio pela Lei n. 8958 de 20 de dezembro de 1994. Trata-se também de uma entidade pertencente ao Terceiro Setor que tem como função primordial a gestão financeira e administrativa de projetos executados pelas IFES e ICTs. As fundações de apoio Ver www.terraroxa.org.br Com o advento do Código Civil, o termo sem fins lucrativos foi substituído por sem fins econômicos. 11 São áreas exclusivas do Estado aquelas que somente podem ser exercidas diretamente pelo Poder Público como segurança, justiça, fiscalização 9
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têm também o papel de mediadora entre as instituições de ensino e tecnológica, o mercado produtivo (empresas) e outras entidades públicas ou privadas. Ainda como integrantes do Terceiro Setor, temos as cooperativas de catadores que atualmente desenvolvem serviços de coleta e separação de resíduos sólidos em parceria com os municípios. Londrina (PR) foi uma das cidades pioneiras no relacionamento entre administração pública e catadores, inicialmente agrupados em associações e posteriormente em cooperativas de serviços. Além de constituir uma forma de resgate de trabalhadores informais que viviam da catação de materiais recicláveis nos lixões, as cooperativas recolhem impostos e geram postos de trabalho, contribuindo social, ambiental e economicamente para o desenvolvimento local. Assim como as cooperativas de catadores, os municípios podem contratar diretamente (com dispensa de licitação) entidades privadas sem fins lucrativos, para a implementação de cisternas ou outras tecnologias sociais de acesso à água para consumo humano e produção de alimentos, para beneficiar as famílias rurais de baixa renda atingidas pela seca ou falta regular de águas e também para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária, instituído por lei federal12. Como o País necessita desenvolver tecnologia própria para sua competitividade no mundo globalizado, o Estado através da Lei da Inovação Tecnológica13, autorizou a administração pública a contratar diretamente organizações sem fins econômicos voltadas à pesquisa e de reconhecida capacitação tecnológica no setor para a realização de atividades de pesquisa e desenvolvimento que envolvam risco tecnológico ou obtenção de produto inovador. O Estado do Paraná, ao editar sua própria legislação de incentivo à inovação tecnológica14 também contemplou o Terceiro Setor especializado, denominando as organizações de Entidade Científica, Tecnológica e Inovação privada do Estado do Paraná (ECTI). Referida legislação garantelhes participação no Sistema Paranaense de inovação e estímulo para a Lei 8666, de 21 de junho de 1993, art.24, incisos XXVII, XXX, XXXIII. Lei n.10.973, de 2 de dezembro de 2004, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo. 14 Lei n.17.314, publicada no Diário Oficial do Estado do Paraná em 24 de setembro de 2012. 12
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constituição de alianças estratégicas e desenvolvimento de projetos de cooperação com empresas brasileiras localizadas no Paraná, os institutos de ciência e tecnologia e organizações de direito privado objetivando a geração de inovações. O Terceiro Setor ainda constitui instrumento para o setor produtivo (empresas, indústrias, comércios, serviços) que desejando desenvolver projetos sociais se vale das entidades sem fins econômicos para executá-los de forma mais adequada. Tornam-se assim, o braço social do corpo econômico. CONCLUSÃO Ainda que esta abordagem seja breve, ela nos traz elementos para que possamos concluir que é crescente a participação do Terceiro Setor como executora de projetos de interesse social decorrentes de parcerias com o setor público, principalmente, e sua importância na dinâmica do desenvolvimento local. Ressaltamos a evolução da participação das organizações da sociedade civil, antes restrita ao atendimento à saúde pelas Santas Casas de Misericórdia para uma atuação nos mais diversos setores da sociedade. De forma também significativa temos assistido a premente necessidade de o Terceiro Setor se qualificar cada vez mais adotando ferramentas empresariais para planejamento e gestão de suas atividades, investindo na capacitação de seu pessoal, em tecnologia, no compartilhamento de informações e conhecimentos e na formação de redes. Por outro lado, ainda ressentimos a falta de aparelhamento do poder público, tanto na formação de pessoal capacitado quanto em investimentos tecnológicos para potencializar as parcerias com o Terceiro Setor tornando-as cada vez mais modelos de eficiência e de boas práticas. Contudo, o momento é de reconhecer que nosso país evolui nas relações intersetoriais (Estado-empresas privadas-organizações da sociedade civil sem fins econômicos) e que não poderá haver retrocesso nesse processo.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Franco, Augusto de. A revolução do local: globalização, glocalização, localização. Brasília: Agência de Educação para o Desenvolvimento. São Paulo: Editora de Cultura, 2003/2004. MATHEWS, David. Fortalecendo a atuação democrática de comunidades. Curitiba: Inesco: Complexo Pequeno Príncipe. AEW-PR, 2014.
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Entendendo melhor os Negócios Sociais Tatiana Moraes
RESUMO: Em um mundo onde as diferenças sociais são gritantes, novos modelos de negócios devem emergir para solucionar demandas de populações que vivem em situação de extrema pobreza e carente de serviços básicos como energia, água potável e saneamento básico. Neste artigo, iremos entender melhor o conceito de Negócios Sociais, que surge no mercado para atender demandas das classes D & E, com o desafio de se manter por meio do próprio lucro, mas com o propósito maior de gerar impacto social. Palavras-chave: Negócios Sociais, Empreendedorismo Social, Lucro.
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INTRODUÇÃO Diferenças e desigualdades sociais ainda são realidades muito presentes no nosso dia a dia. A população mundial já ultrapassou sete bilhões de pessoas e segundo dados da ONU de março/2014¹, aproximadamente 800 milhões continuam sem acesso a uma fonte de água potável e mais de 35% ainda vivem sem um sistema de saneamento básico adequado. No Brasil, a situação é ainda mais gritante, em um país com mais de 200 milhões de habitantes, aproximadamente 50% ainda não tem acesso à coleta de esgoto. A questão do saneamento é apenas um dos vários exemplos que podemos citar para demonstrar a disparidade social em nosso país. Atualmente as classes D & E representam 24% da população brasileira. São mais de 48 milhões de pessoas carentes em serviços relacionados à saúde, finanças, habitação, educação, saneamento, cultura, entre outros. Hoje, além da atuação do governo, a sociedade movimenta-se para tentar atender parte das necessidades que emergem nas periferias e comunidades brasileiras. De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)² em 2010, havia mais de duzentos e noventa mil fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil. Apesar do relevante número de iniciativas sociais, sabemos que estas ainda dependem de verba governamental e filantropia para manterem suas atividades em exercício, o que limita e dificulta a atuação destas instituições. “O paradoxo é que, nesse processo, os empreendimentos sem fins lucrativos tornaram-se dependentes – de forma incômoda e muitas vezes improdutiva – da generosidade filantrópica e de todas as isenções resultantes às entidades que funcionam voltadas para o interesse público. Em geral, essa dependência vai de encontro à possibilidade de expansão. Em um ambiente cada vez mais competitivo, o número de organizações sem fins lucrativos que buscam financiamento ultrapassou rapidamente a oferta de dólares dos doadores, ao passo que a adequação e a disponibilidade de 1 2
http://www.tratabrasil.org.br/saneamento-no-mundo http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/fasfil/2010/default.shtm
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capital de expansão especificamente direcionado tornaram-se ainda mais problemáticas.” (HARTIGAN & ELKINGTON, 2009, P. 34)
Diante deste cenário, percebe-se como fundamental para a construção de uma sociedade realmente desenvolvida, o surgimento de novos modelos e práticas no campo social, capazes de impactar um grande número de pessoas sem depender de recursos externos, mas sim, que consigam expandir sua atuação por meio do seu próprio modelo de negócios. Nesta perspectiva, nasce um conceito ainda novo, denominado Negócios Sociais. MAS O QUE É UM NEGÓCIO SOCIAL? Existem diversas instituições que definem, com algumas divergências, o conceito de Negócio Social também chamado de Negócio de Impacto. Basicamente, quando falamos em Negócios Sociais, devemos entender que a organização, a priori, tem como propósito maior obter impacto social e sustentar-se por meio do próprio lucro sem depender de recursos externos. Algumas instituições que trabalham no campo dos Negócios Sociais veem esta questão do lucro de forma diferente. Vamos tratar aqui dos conceitos de duas importantes organizações atuantes neste campo: Yunus Centre e Artemísia. Referência em negócios sociais, o indiano ganhador do Nobel da Paz em 2006, prof. Muhammad Yunus, fundador do banco Grameen, possui hoje um centro de estudos e difusão deste modelo de negócios chamado Yunus Centre. De acordo com a visão de Yunus, Negócio Social pode ser definido como empresas que buscam atingir um objetivo social e reinvestem seu lucro no próprio negócio (YUNUS, 2000). Ou seja, neste caso, não é permitida a distribuição dos dividendos aos acionistas. Para Artemísia, instituição pioneira na disseminação do conceito e no apoio ao desenvolvimento de negócios de impacto no Brasil, são negócios sociais: “Empresas que oferecem, de forma intencional, soluções escaláveis para problemas sociais da população de baixa renda.” (www.artemisia.org)
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Neste caso, a divisão do lucro pode ou não existir, porém, não é condição determinante para definir se o negócio é ou não considerado de impacto social. CARACTERÍSTICAS Podemos apontar como as principais características de um Negócio Social: • Solucionar problemas sociais por meio de sua atividade fim ou “core business”; • Ter foco na população de baixa renda – interesses e necessidades deste público são considerados para formulação do que será oferecido; • Ser um produto ou serviço que deve ser comercializado; • Possuir potencial de escala – poder ser disseminado por meio da ampliação do próprio negócio ou através de redes e outros atores; • Ser lucrativo: não depender da doação e verba de terceiros; • Ser inovador – enxergar soluções nos problemas sociais e utilizar mecanismos de mercado para implanta-las. É importante ressaltar que os Negócios Sociais não são programas, projetos ou iniciativas de empresas que caminham de forma separada do seu negócio. Isto é o que chamamos de Responsabilidade Social. O Negócio Social é aquele que soluciona problemas da base da pirâmide através da sua atividade principal. Outro equívoco comum é denominar como Negócio Social, projetos e programas assistencialistas. A importância deste novo modelo negócio é que, como se utiliza de mecanismos de mercado e desta forma, possuem uma estrutura robusta para lhe garantir rentabilidade, os negócios sociais podem acelerar o processo de mudança e as propiciar em larga escala, por não depender de filantropia ou dinheiro público. A disseminação deste modelo de negócios mostra que é possível que empresas que possuem como fator motivacional, também metas sociais e não somente o lucro por si só, serem concorrentes em pé de igualdade com empresas criadas e desenvolvidas nos moldes tradicionais.
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DESAFIOS E SUPERAÇÕES Um dos principais desafios enfrentados pelos Negócios Sociais é a manutenção da sua sustentabilidade financeira. É natural que este modelo de negócio amadureça mais tarde, visto que sua proposta é na maioria das vezes inovadora e requer tempo para desbravar e fortalecer novos mercados e novas propostas de produtos ou serviços. Em geral são necessários novos desenvolvimentos e testes em diversas fases. Nos casos dos negócios que incluem as comunidades no processo, são necessários sensibilização e treinamento antecipado dos envolvidos, práticas que certamente prejudicam a rentabilidade no momento inicial do negócio. Outros aspectos como falta de amparo jurídico e apoio do governo nos âmbitos federal, estadual e municipal, dificultam e prejudicam a atuação e expansão dos negócios sociais. É essencial para fomentar o empreendedorismo social, a criação de um ambiente regulatório favorável e leis de incentivo para quem pretende atuar neste campo. DIFERENÇAS A tabela abaixo mostra de forma concisa e clara as diferenças existentes entre empresas tradicionais, negócios sociais e organizações não governamentais:
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Grameen Bank: O Primeiro Negócio Social do Mundo Em 1974, um encontro mudou a vida de Muhammed Yunus. Ele conheceu a jovem Sufia Begum, de 21 anos que lutava para sobreviver. Para comprar bambu e fazer tamboretes, Sufia emprestou cerca de 25 centavos de dólar americano de um agiota de seu bairro, que lhe cobrava juros de 10% ao dia. O acordo entre eles a obrigava a vender seus tamboretes exclusivamente a ele que lhe pagava um valor muito abaixo do valor de mercado, assim seu lucro não passava de dois centavos de dólar, o que lhe proporcionava uma condição de trabalho equivalente à de escravo. Yunus encontrou 42 mulheres nas mesmas condições e decidiu procurar um banco tradicional para apoia-las para que não precisassem recorrer a agiotas. Depois de percorrer muitas instituições bancárias e ter seu pedido negado em todas, resolveu emprestar seu próprio dinheiro as mulheres a taxas bancárias normais. Inicialmente emprestou 27 dólares, aproximadamente 62 centavos para cada uma. Para sua surpresa, em pouco tempo elas lhe pagaram o empréstimo e passaram a sustentar a si e a suas famílias. Depois deste sucesso, Yunus criou em 1976, o Banco Grameen, chamado de “banco dos pobres”. Neste banco o empréstimo é realizado para grupos de cinco pessoas, mas apenas dois recebem o dinheiro adiantado, após estes dois realizarem o pagamento, o crédito é concedido aos demais. Desta forma desenvolve-se no grupo a confiança mútua e o espírito de comunidade. Ele acredita que quando estendemos o crédito aos pobres e eles ajudarão a si mesmos (YUNUS, 2000). Sua tentativa com a criação do banco Grameen é de quebrar o ciclo histórico no qual os pobres não controlam o capital, por não herdarem e não terem acesso a ele. Yunus reforça que a única maneira de diminuir a pobreza é garantir o acesso dos pobres ao financiamento, geralmente direcionado somente aos que já tem dinheiro, por meio da concessão do microcrédito. A maioria dos clientes do banco são mulheres e 98% destes pagam suas dívidas em dia. É um negócio baseado nas relações e possui um propósito
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claro: tirar as pessoas da pobreza. Atualmente o Banco Grameen é um banco de 2,5 bilhões de dólares, sediado em Bangladesh e o seu modelo de microcrédito se espalhou por mais de cinquenta países, incluindo o Brasil. Já existem também outros empreendimentos sociais como Grameenphone, Grameen Check (roupas tecidas em teares), Grameen Fisheries Foundation, Grameen Cybernet e Grameen Shakti (energia) que atendem outras necessidades da população de baixa renda de Bangladesh. Um caso de bastante sucesso foi a joint-venture criada em 2006 entre o grupo Grameen e a multinacional francesa Danone com a missão de “Trazer saúde por meio de alimentos para o maior número possível de pessoas”. A empresa foi possui quatro objetivos principais: oferecer um produto de valor nutricional elevado, gerar empregos, preservar o meio ambiente e ser economicamente viável. Alguns exemplos de Negócios Sociais no Brasil Rede Asta – Rio de Janeiro, RJ Fundada em 2005, caracteriza-se por ser um negócio social inclusivo que leva a consumidores em todo Brasil produtos de design feitos por grupos produtivos de regiões de baixa renda. “Atuamos no empoderamento de mulheres artesãs e de seus pequenos negócios, por meio de treinamentos, formação de redes de produção e criação de canais de venda. Os produtos são criados com a orientação de designers. São peças únicas, feitas à mão, com o reaproveitamento de diferentes materiais. O modelo valoriza quem produz, respeita o meio ambiente e cria relações econômicas justas para toda a cadeia.” (http://www.redeasta.com. br/quem-somos.html) Programa Vivenda – São Paulo, SP A empresa vende kits de reforma para população de baixa renda a partir
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de mil e quinhentos reais. Com o slogan “Reforma com começo, meio e fim”, pretendem atingir os moradores da periferia que por não terem dinheiro, começam a construir ou reformar, mas não terminam e moram em lugares inacabados e em condições ruins. “Nosso compromisso é fazer com que as pessoas possam morar bem e viver melhor. Sendo assim, desenvolvemos uma solução completa em reformas habitacionais que, de forma rápida e não burocrática possibilita que o cliente possa, em até 15 dias, ter seu projeto elaborado e sua reforma pronta!” (http://programavivenda.com.br/como-trabalhamos) Hand Talk Atua na área da tecnologia assistiva. É uma plataforma de tradução digital para Libras. Foi eleito pela ONU em 2013, ano em que foi fundada, como o melhor aplicativo de inclusão social do mundo. Caracteriza-se como um Negócio Social, pois garante o acesso da população surda a conteúdos diversos. Possui foco e mercado bem específico. “Somos uma plataforma de tradução digital para Libras, a Língua Brasileira de Sinais, utilizada pela comunidade surda no Brasil. A empresa, premiada internacionalmente e referência no serviço de tradução de conteúdos para Libras, é comandada por um simpático intérprete virtual, o Hugo, personagem 3D que torna a comunicação interativa e de fácil compreensão.” (http://www. handtalk.me/sobre) Considerações Finais Diante de um mundo que, apesar de apresentar avanços tecnológicos e econômicos, ainda mantém um grande antagonismo social, os negócios de impacto se apresentam como outro caminho possível para beneficiar pessoas marginalizadas. Este novo modelo é inclusivo e beneficia parte da população, até então inexistente também para o mundo dos negócios, as classes da base da pirâmide. Percebemos que o lucro no contexto do Negócio Social, seja qual for a decisão da empresa sobre a distribuição dos dividendos, não deve transcender o propósito maior pelo qual foi concebido: gerar transformações sociais. Desta
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forma, notamos que este novo estilo de fazer negócios, apresenta-se nos dias de hoje, como parte fundamental ao processo de mudança que tanto desejamos em nossa sociedade. Referências bibliográfica ELKINGTON, John & HARTIGAN, Pamela – Empreendedores Sociais – O exemplo incomum das pessoas que estão transformando o mundo – Rio de Janeiro, Editora Elsevier , 2009 Yunus, Muhammed - O Banqueiro dos Pobres - A Evolução do Microcrédito que Ajudou os Pobres – São Paulo, Editora Ática, 2000 http://www.artemisia.org.br/ http://www.muhammadyunus.org/
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Instituto GRPCOM: um caso de estratégia empresarial para a sustentabilidade Rafaela Vieira Marinho
RESUMO: Este estudo apresenta um caso de estratégia na área da sustentabilidade empresarial, por meio da fundação de uma instituição para a gestão de projetos de intervenção social. Tem por objetivo identificar se este tipo de estratégia contribui para a Sustentabilidade. Palavras-chave: Sustentabilidade, Estratégia Empresarial, Projeto Social.
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INTRODUÇÃO O conceito de Sustentabilidade tem pautado o dia a dia de muitas empresas. Fundar uma instituição para dar maior legitimidade às ações, é uma das estratégias que algumas empresas adotam para viabilizar as atividades em busca da Sustentabilidade. A empresa apresentada nesse artigo, o Grupo Paranaense de Comunicação – GRPCOM, adotou essa estratégia. O GRPCOM fundou e mantém o Instituto GRPCOM, que desenvolve os projetos de Investimento Social Privado do Grupo. Pretendemos analisar nesse artigo, os projetos desenvolvidos pelo Instituto GRPCOM e se esses projetos demonstram impacto positivo na sociedade e corroboram para a Sustentabilidade. 1. OS CONCEITOS Antes de falar em Sustentabilidade, vamos abordar os conceitos de Responsabilidade Empresarial e Investimento Social Privado, práticas essas necessárias para que uma empresa seja sustentável.
1.1 Responsabilidade Social Empresarial
Comecemos dando um significado ao termo Responsabilidade Social Empresarial - RSE. Todas as pessoas fazem escolhas no dia a dia e até mesmo planejam a longo prazo. Somos seres políticos e tomamos decisões que impactam nossas vidas, a vida das pessoas, a sociedade e o meio ambiente. Com as empresas não é diferente. Pessoas que conduzem as empresas tomam decisões diariamente, sejam na área financeira, comercial, vendas, marketing, etc. Responsabilidade Social Empresarial está ligada diretamente à capacidade de fazer escolhas. Tomar decisões e agir de forma socialmente responsável é pensar no impacto que a atividade da empresa vai ter na vida das pessoas, no meio ambiente, na comunidade e, acima de tudo, buscar a garantia de que esse impacto será positivo.
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Em termos gerais, a responsabilidade de um agente refere-se à obrigação de responder pelas conseqüências previsíveis das ações em virtude de leis, contratos, normas de grupos sociais ou de sua convicção íntima (BARBIERI, 2012, p 02).
Para Barbieri (2012) existe uma evolução do conceito de Responsabilidade Social, baseada em duas teorias: a dos acionistas e a dos stakeholders1. Enquanto a primeira está assentada no liberalismo clássico, onde a responsabilidade social da empresa se encerra na obtenção do lucro, no pagamento de impostos e salários, a segunda, considera as mudanças históricas e o protagonismo da sociedade em busca de seus direitos. Em acordo com Barbieri (2012), Tenório(2012) afirma: [...] o liberalismo não estimulava a prática de ações sociais pelas empresas e até as condenava, pois entendia que a caridade não contribuía para o desenvolvimento da sociedade nem era de responsabilidade das companhias. Dessa forma, no início do século XX, a responsabilidade social limitava-se apenas ao ato filantrópico, que inicialmente assumia caráter pessoal, representado pelas doações efetuadas por empresários ou pela criação de fundações[...] (TENÓRIO, (2012, p. 16)
O conceito clássico de RSE (teoria dos acionistas), onde a empresa gera empregos, paga impostos, tem lucro e atua no cumprimento da lei, vai até a década de 1950, quando alguns acontecimentos mudam o rumo da história. É na mudança de contexto histórico que a empresa começa mudar a visão sobre seu papel na sociedade, e alguns acontecimentos contribuem para esse marco2. Um deles foi a promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, que marca o movimento pelos direitos humanos na busca de garantias relacionadas ao trabalho, à saúde, à velhice, à educação, e outras políticas. O contexto contribuiu para o advento da teoria dos stakeholders, onde a visão é de que as empresas fazem parte de uma estrutura muito maior do 1 Entende-se por stakeholder a pessoa ou grupo que afeta ou é afetada pela atividade da empresa. O surgimento desse termo, que passou a ser usado na administração associado à RSE no início da década de 80, deve-se à constatação de que os interesses dos proprietários não são os únicos a serem considerados na condução das empresas (BARBIERI, 2012). 2 Tenório (2006) divide esse marco histórico entre o surgimento da sociedade industrial, com o advento da industria e
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que elas, que é a sociedade, constituída por diversos atores sociais, como governos, as comunidades, o meio ambiente, ou seja, não estão isoladas e necessitam dessa macro estrutura para consumir seus produtos e serviços, insumos para gerar os negócios, mão de obra qualificada, e os outros recursos.
1.2
INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO
Segundo o Grupo de Institutos Fundações e Empresas – GIFE: Investimento social privado é o repasse voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público (GRUPO DE INSTITUTOS FUNDAÇÕES E EMPRESAS, 2014).
O Investimento Social Privado – ISP, integra a prática da RSE no que diz respeito às ações direcionadas à comunidade. Este conceito vem sendo trabalhado há mais de uma década pelo GIFE, que reúne hoje 140 organizações de origem privada: empresas, fundações e institutos de origem empresarial, que além de diretrizes gerenciais, propõe o envolvimento da comunidade nos projetos realizados. De acordo com o GIFE: Diferentemente do conceito de caridade, que vem carregado da noção de assistencialismo, os investidores sociais privados estão preocupados com os resultados obtidos, as transformações geradas e o envolvimento da comunidade no desenvolvimento da ação. (GRUPO DE INSTITUTOS FUNDAÇÕES E EMPRESAS, 2012).
Dados de 2010, apresentados pelo Censo Gife (GIFE, 2012) apontam para um valor médio investido pelos associados respondentes, em 2009, de R$ 18,7 milhões, em diferentes áreas de atuação como assistência social, direitos humanos, cidadania, cultura, arte, desenvolvimento comunitário, meio ambiente, educação, esportes entre outros, e para diferentes públicos, dentre eles crianças, adolescentes, jovens, mulheres, negros e idosos. fortalecimento do capitalismo e a ascensão da sociedade pós-industrial, após a 2ª guerra mundial, que é marcada pelo desenvolvimento tecnológico e pela inovação. Na sociedade pós-industrial, também chamada de a era dos serviços, a informação e o conhecimento passam a incorporação os ativos das empresas, assim como as máquinas e equipamentos.
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O Investimento Social Privado, quando executado, preocupa-se não somente com a forma e lugar onde o dinheiro será investido (ação planejada), mas também com o resultado desse investimento (monitoramento e avaliação).
1.3 SUSTENTABILIDADE
O desenvolvimento sustentável passa a requerer a responsabilidade da empresa por um processo de produção que leve em consideração os impactos ambientais e sociais causados pela atividade empresarial, passando a empresa a assumir responsabilidades sociais e ambientais até então não contempladas na gestão empresarial. Para Barbieri (2012, p. 64), desenvolvimento sustentável é: [...] uma proposta de desenvolvimento socialmente includente e que respeita o meio ambiente, para que ele possa fornecer os recursos necessários para a subsistência humana de modo permanente, pois a Terra é a morada dos humanos e continuará sendo indefinidamente.
A ideia de se ter um modelo de desenvolvimento que se sustente por gerações, tem seu fundamento na própria capacidade de autodestruição do capitalismo, no qual as empresas são protagonistas. Nesse sentido todas as consequências do modelo adotado até hoje esboçam o cenário de um modelo autofágico, que transpira problemas sociais e ambientais. Esses problemas globais só podem ser resolvidos com a participação de todas as nações, governos em todas as instâncias e sociedade civil, cada uma em sua área de abrangência. As empresas cumprem papel central nesse processo, pois muitos problemas socioambientais foram produzidos ou estimulados pelas suas atividades (BARBIERI, 2012, p 65).
O desenvolvimento sustentável propõe uma análise de problemas econômicos, sociais e ambientais de um mundo que está hoje globalizado. Desta forma, parte-se do princípio de pensar globalmente e agir localmente (2102, pg. 65), sem necessariamente esperar por leis estruturais, normas internacionais.
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Portanto, se a RSE é o modo como a empresa vai gerenciar os negócios, a sustentabilidade é o objetivo maior a ser alcançado. Assim, a RSE é o caminho para se chegar à sustentabilidade. A responsabilidade social das empresas é um meio para alcançar a sustentabilidade empresarial, que pode ser definida como a empresa que orienta a sua gestão para obter resultados positivos em termos econômicos, sociais e ambientais (BARBIERI, 2009, p. 133).
2. METODOLOGIA E ESTUDO DE CASO A inquietação em saber se projetos de investimento social privado causam impacto positivo na comunidade e contribuem para a sustentabilidade foi que levou a delimitação do objeto da pesquisa ora apresentada. A escolha do objeto de estudo está relacionada à prática profissional da pesquisadora e o contexto da pesquisa se refere à empresa a qual a pesquisadora possui vínculo empregatício há mais de quatro anos e desenvolve diariamente projetos relacionados ao tema, o que permitiu a observação do fenômeno com maior profundidade de análise. O GRPCOM possui sua sede em Curitiba e está presente em todo o Paraná com regionais em sete cidades: Londrina, Maringá, Paranavaí, Foz do Iguaçu, Cascavel, Guarapuava e Ponta Grossa. Além das unidades de negócio, ou seja, as empresas do grupo, o Instituto GRPCOM foi fundado para o desenvolvimento e assessoramento em projetos sociais e está presente em todas as regionais. A pesquisadora é responsável pelas ações do Instituto GRPCOM no município de Londrina e responde pelo cargo de Analista de Responsabilidade Social. Conforme Quimelli (2009, p. 72) Normalmente, os pesquisadores se envolvem em questões que os preocupam. [...] Os Estudos de Caso estão estreitamente aliados à prática porque eles permitem debater e avaliá-la através dos diferentes dados coletados no contexto pesquisado.
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O Estudo de Caso permite uma investigação qualitativa a partir do momento que utiliza mais de uma fonte de evidência e busca entender o objeto de pesquisa em seu contexto, o que implica na análise do ambiente complexo e repleto de subjetividade em que o objeto se encontra. “Diferentes aspectos, como o social, político, econômico e dimensões comportamentais exercem uma influência sobre o objeto de estudo (QUIMELLE, 2009, p. 72)”. Assim, a análise do objeto dessa pesquisa parte de uma realidade concreta, sendo o estudo de caso realizado a partir de uma pesquisa documental nos arquivos e acervos institucionais complementada por entrevista realizada com o Vice- Oresidente do Grupo (identificado pela sigla VP). A escolha do Vice-Presidente do Grupo se deu pelo nível de responsabilidade que ele possui na tomada de decisões relacionadas às ações de RSE e pela história pessoal e profissional dentro da empresa. A análise documental realizou-se no período de fevereiro a julho de 2012 na regional de Londrina/PR, tendo como fontes principais de pesquisa: Relatório de Sustentabilidade 2009, Relatório de Sustentabilidade 2010, Código de Ética e Conduta; sites institucionais e publicações que contam a trajetória das empresas do Grupo no Paraná. A entrevista foi realizada em Curitiba, na sede da empresa, no dia 22 de maio de 2012, com o livre consentimento do sujeito da pesquisa, com livre aceitação da gravação. A apresentação dos resultados da pesquisa se dará de acordo com a análise da estratégia de se ter investimento em projetos sociais para o alcance da Sustentabilidade, nas categorias assim delimitadas: o investimento do Grupo em projetos sociais e áreas prioritárias. 2.1 O GUPO PARANAENSE DE COMUNICAÇÃO - GRPCOM A história do GRPCOM se inicia no ano de 1962, quando os advogados Francisco Cunha Pereira Filho e Edmundo Lemanski compram o jornal Gazeta do Povo, fundado em 1919, “[...] com a finalidade de ser um espaço
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para a difusão e afirmação das ideias e da gente paranaense” (FERNANDES, SANTOS, 2010, p. 16). A segunda empresa adquirida pelos empresários em 1969 foi no ramo da mídia televisiva, o antigo canal 12 na cidade de Curitiba, que hoje é a RPCTV Curitiba, afiliada à Rede Globo, com mais sete afiliadas no Paraná: RPCTV Londrina, RPCTV Maringá; RPCTV Foz do Iguaçu; RPCTV Ponta Grossa; RPCTV Paranavaí; RPCTV Cascavel e RPCTV Guarapuava. Atualmente, o GRPCOM possui dezenove empresas, que atuam nas áreas da comunicação impressa, televisiva, rádios e internet. São elas: jornais diários Gazeta do Povo, jL – Jornal de Londrina e Tribuna, pelo jornal digital Gazeta Maringá, pelo portal de notícias Paraná Online, pelas rádios 98FM, Mundo Livre FM e Cultura FM de Maringá, pela unidade móvel de alta definição HDView, pelo canal de TV multiplataforma ÓTV, pela RPC TV e suas oito emissoras afiliadas à Rede Globo e pela Zaag, agência especializada em marketing promocional. Toda essa estrutura de negócio o tornou o maior grupo de comunicação do Paraná (GRPCOM, 2012). Seguindo um modelo gestão estratégica, o grupo é conduzido por princípios e diretrizes amplamente difundidos, interna e externamente, a exemplo de sua missão, que é “[...] Promover, com a comunicação, o desenvolvimento da nossa terra e da nossa gente e, assim, alcançar a sustentabilidade e os melhores resultados econômicos (GRPCOM, 2014).
2.2 O INSTITUTO GRPCOM
O Instituto GRPCOM é uma associação sem fins econômicos, fundada em 2001, certificada como OSCIP - Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, com sede em Curitiba e presente em todas as unidades de negócio do GRPCOM, ou seja, nas sete regiões do Paraná onde o GRPCOM possui regionais. Foi fundado com o objetivo de profissionalizar algumas ações sociais que já eram desenvolvidas e para atuar mais próximo às comunidades onde as empresas do grupo estão inseridas. Anteriormente à fundação do Instituto
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GRPCOM, as empresas do grupo já realizavam algumas ações sociais, porém não existia uma sistematização das ações, tampouco a aplicação de critérios para o investimento. Desde a sua criação, cada uma das empresas do Grupo Paranaense de Comunicação exerce a cidadania corporativa por meio de ações sociais, filantrópicas e assistenciais, em prol do desenvolvimento da comunidade paranaense. Com a criação do Instituto GRPCOM, em 2001, foi possível fazer a gestão conjunta dos programas e projetos sociais, culturais e educacionais desenvolvidos diretamente pelas empresas ou apoiados pelas mesmas, o que permitiu potencializar os esforços e multiplicar os resultados alcançados (INSTITUTO GRPCOM, 2014).
A fundação do Instituto colabora com o entendimento da direção do grupo de que o desenvolvimento de uma sociedade não se dá apenas na relação de mercado, ou seja, no desenvolvimento econômico. [...] a organização, como se enxerga fundamentalmente como alguém que pretende realizar, ajudar a promover esse desenvolvimento busca todas as ferramentas, e uma dessas ferramentas é precisamente essa, do relacionamento, de fazer uma série de atuações junto aos atores de mercado, às entidades, às pessoas na sociedade, através de outros formatos que não só os formatos propriamente empresariais, propriamente econômicos [...] (VP).
O Instituo GRPCOM é responsável pelo desenvolvimento dos projetos sociais do GRPCOM, sejam eles internos ou externos, de iniciativa própria ou de apoio a projetos sociais das empresas do Grupo e atua nas áreas de áreas de educação, cultura, desenvolvimento humano e comunitário. Também promove a o fortalecimento das instituições do terceiro setor por meio de informações, parcerias, eventos e prestação de serviços gratuitos. Atualmente são 08 projetos sendo desenvolvidos, sendo que desses, 04 são projetos estratégicos, ou seja, tem seus objetivos diretamente ligados à missão do GRPCOM e contribuem para o seu alcance.
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A seguir, apresentamos os projetos estratégicos e seus resultados em 2013, por entender que esses contemplam o universo de análise do estudo ora proposto. Quadro de Projetos Estratégicos Projeto
Ler e Pensar (1994 2014)
Descrição O Ler e Pensar é um projeto de incentivo à leitura, dirigido a alunos do Ensino Fundamental e Médio de escolas e instituições públicas e particulares do Paraná. Desenvolvido pela Gazeta do Povo há 15 anos, tem como objetivo estimular o hábito da leitura de jornais e ajudar a comunidade escolar a compreender a importância da informação no processo de ensinoaprendizagem, construção do conhecimento e formação de crianças e jovens para o exercício pleno da cidadania. Sua dimensão é garantida a partir da parceria com Secretarias Municipais de Educação, Instituições de Ensino Superior, patrocinadores, apoiadores, além de educadores e pedagogos de escolas públicas e particulares.
RESULTADOS EM 2013 Cidade atendidas no Paraná
Professores parceiros
Instituições atendidas
Alunos beneficiados
58
2972
491
104020
TELEVISANDO O FUTURO (2009 - 2014)
Televisando o Futuro é um projeto que coloca a força da televisão a serviço da comunidade escolar. Seu principal objetivo é promover a reflexão sobre temas sociais relevantes e contribuir para construção da cidadania por meio de reportagens especiais produzidas pelo jornalismo da RPC TV. Desenvolvido em parceria entre as emissoras RPC TV, Instituto GRPCOM e Secretarias de Educação (Municipais e Estadual), o projeto estimula a produção artística e literária dos estudantes a partir dos temas abordados nas reportagens. Os professores ainda têm acesso a conteúdos complementares disponibilizados no hotsite do projeto e capacitações por meio de cursos oferecidos na plataforma de educação à distância contratada pelo Instituto GRPCOM.
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RESULTADOS EM 2013 Cidade atendidas no Paraná
Professores parceiros
Instituições atendidas
Alunos beneficiados
42
2878
801
95325
Serviços e Cidadania (2010-2014)
O canal “Serviços e Cidadania”, contribui para a sustentabilidade das organizações do terceiro setor no Paraná, por meio de um sistema online de comunicação e gestão de serviços voluntários. Pelo canal, as ONGs podem apresentar suas necessidades nas áreas de comunicação e gestão e os parceiros podem disponibilizar serviços gratuitos para atendê-las. Ainda são disponibilizados conteúdos e oportunidades de cursos, palestras, eventos e classificados. Com essa ferramenta, o Instituto GRPCOM ajuda a aprimorar a gestão das organizações do terceiro setor por meio de parcerias com universidades, empresas, instituições representativas de classe e profissionais liberais e também difunde a cultura da responsabilidade social empresarial. Em 2013 foram R$ 321.605,30 em investimentos indiretos, ou seja, esse seria o volume de investimento que as ongs teriam que realizar se os serviços dos parceiros fossem contratados.
RESULTADOS EM 2013 Regiões atendidas no Paraná
8
Corda Bamba (2011-2014)
Serviços realizados
Ongs cadastradas
Parcerias firmadas
86
247
71
Corda Bamba é uma gincana realizada pela rádio 98 FM e pelo Instituto GRPCOM. O projeto é direcionado para escolas estaduais de Ensino Médio de Curitiba e Região Metropolitana, e tem como objetivo principal incentivar o protagonismo juvenil e estimular a mobilização da comunidade. Em 2011, com a temática foi meio ambiente, o projeto visou sensibilizar e incentivar ações de educação ambiental junto à comunidade escolar. A dinâmica de Corda Bamba foi organizada em várias “provas de sustentabilidade”: identificação do problema ambiental da comunidade e das soluções possíveis para tal, organização de campanha ambiental, pesquisa sobre a temática.
RESULTADOS EM 2013 Cidades atendidas no Paraná
Professores parceiros
Instituições atendidas
Alunos beneficiados
13
31
12
128
Fonte: http://www.institutogrpcom.org.br/nossos-projetos
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2.5 O INVESTIMENTO DO GRUPO EM PROJETOS SOCIAIS O desenvolvimento dos projetos sociais é a atividade exclusiva do Instituto GRPCOM. Eles são concebidos a partir de oportunidades e reconhecimento por parte dos gestores de que o projeto é de relevância para o cumprimento da missão do grupo. O investimento em projetos sociais também passa pelo entendimento de que para ser socialmente responsável há que se considerar os diversos stakeholders impactados pela atividade empresarial. [...] a gente tem certeza que a maneira de promover o desenvolvimento não se esgota na relação, no modelo econômico, há outras maneiras de fazer isso, quais são os atores do mercado que interferem, que são importantes na geração de desenvolvimento, na transformação de uma sociedade? Múltiplos atores, você tem os atores empresariais, você tem os atores do terceiro setor, e a organização, como se enxerga fundamentalmente como alguém que pretende realizar, ajudar a promover esse desenvolvimento busca todas as ferramentas, e uma dessas ferramentas é precisamente essa, do relacionamento, de fazer uma série de atuações junto aos atores de mercado, às entidades, às pessoas na sociedade, através de outros formatos que não só os formatos propriamente empresariais, propriamente econômicos [...] (VP).
Desta forma, investir em projetos sociais parece indispensável ao GRPCOM para o cumprimento do papel de uma empresa socialmente responsável e sustentável. Em termos de recursos financeiros, o Instituto GRPCOM é mantido pelo GRPCOM, assim como alguns projetos que desenvolve possuem seu centro de custo alocado na área corporativa. Outros projetos que são desenvolvidos para empresas específicas do grupo, possuem investimento da própria empresa.
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Porém, apesar do alto investimento do grupo, os projetos são concretizados com a celebração de parcerias com Prefeituras Municipais, Secretarias de Educação, Núcleos Regionais de Educação, Federação das Indústrias do Paraná, Sistema S, Sistema Fecomércio SESC/SENAC, Universidades e empresas que prestam serviços voluntários às instituições cadastradas nos projetos, o que dá a entender que o investimento seria maior caso não houvesse essas parcerias. 2.6 ÁREAS SOCIAIS PRIORITÁRIAS Em se tratando de RSE, fica evidente que os projetos sociais sempre vão utilizar as expertises da empresa, ou seja, as áreas de conhecimento e maior impacto que a atividade econômica da empresa possui. No caso do GRPCOM, que atua na área de comunicação, existem segmentos e áreas de maior afinidade. [...] nós sempre encontramos obviamente uma afinidade grande no campo da educação, sempre é um tema muito presente, e um segundo ponto, houve uma definição sobre isso, foi sempre a do terceiro setor, a gente se enxergava com um potencial de servir como instrumento de apoio pra entidades do terceiro setor (VP).
Em relação à avaliação dos resultados dos projetos sociais, o modelo adotado é traçado a partir de indicadores de resultado. Os projetos percorrem todas as fases necessárias a uma boa gestão: planejamento, execução, monitoramento e avaliação. Também é adotado após a execução dos projetos um questionário para medir a satisfação da população atendida, cujo percentual de satisfação é o indicar de desempenho daquele projeto. A ferramenta de avaliação possui indicadores de processo e resultados, dando segurança na avaliação final de cada projeto. Os indicadores de processo medem a eficiência e a eficácia, e os indicadores de resultados medem a efetividade das ações.
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Além das ferramentas, há uma avaliação coletiva, com encontros semestrais em Curitiba de toda a equipe para, além de tratar de questões administrativas como treinamentos e planejamento estratégico, também realizar a avaliação dos projetos. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir do estudo proposto podemos concluir que a Sustentabilidade para o GRPCOM é uma parte essencial do negócio. As ações para a perenidade da empresa não depende somente do desenvolvimento de projetos sociais pelo Instituto GRPCOM, e sim de todas as ações de todos colaboradores e áreas do negócio, seja ela estratégica ou operacional. Os projetos desenvolvidos pelo GRPCOM possuem impacto altamente positivo na comunidade. Isso pode ser evidenciado a partir dos resultados apresentados anualmente e na forma de desenvolvimento dos projetos, principalmente quando da preocupação em conduzir as atividades através da percepção dos beneficiários da ação. Em relação ao desenvolvimento dos projetos, estes são desenvolvidos segundo a aproximação da área de atuação da empresa, que nesse caso é a comunicação. Nesse sentido, foram eleitas as áreas de educação e terceiro setor como prioritárias, esta última por entender que a intervenção junto às instituições do terceiro setor contribui para o desenvolvimento da sociedade e alcance da missão do Grupo. Todavia, percebemos que todos os projetos são desenvolvidos em parceria, o que representa um risco e uma fragilidade para o Grupo, pois sem as parcerias, os projetos provavelmente não seriam desenvolvidos nos formatos propostos e quiçá tivessem o alcance que possuem em todo o Estado do Paraná. Enfim, concluímos que a estratégia de se ter uma instituição que gerencia todas as ações da área social da empresa traz consigo o beneficio de ter projetos focados, qualificados e de alto desempenho, que colaboram não somente na Sustentabilidade da empresa, mas também no desenvolvimento da comunidade do entorno.
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Referências Bibliográficas BARBIEIRI, Jose Carlos. Responsabilidade Empresarial e empresa sustentável: da teoria à prática / Jorge Emanuel Cajazeira. – 2.ed., atual. e ampl. – São Paulo : Saraiva, 2012. 272 p. ; 24 cm FERNANDES, José Carlos. DOS SANTOS, Marcio Renato. Todo o dia nunca é igual: notícias que a vida contou em 90 anos de circulação da Gazeta do Povo / Jose Carlos Fernandes, Marcio Renato dos Santos. Curitiba, PR : Editora Gazeta do Povo, 2010. 228 p. GRUPO DE INSTITUTOS FUNDAÇÕES E EMPRESAS – GIFE (São Paulo). Disponível em: <http: www.gife.org.br/>. Acesso em: 15 ago. 2014. GRUPO PARANAENSE DE COMUNICAÇÃO – GRPCOM (Curitiba). Disponível em: <http: www.grpcom.com.br/>. Acesso em: 18 ago. 2014. INSTITUTO GRPCOM (Curitiba). Disponível institutogrpcom.org.br/>. Acesso em: 20 ago. 2014.
em:
<http:www.
MELO NETO, Francisco Paulo de . Responsabilidade social e cidadania empresarial: a administração do terceiro setor / Francisco Paulo de Melo Neto, César Froes. – Rio de Janeiro: Qualitymark Ed., 1999. QUIMELLI, Gisele Alves de Sá. Considerações sobre o Estudo de Caso na pesquisa qualitativa. In: BOURGUIGNON, Jussara Ayres. Pesquisa Social reflexões teóricas e metodológicas. Editora Todapalavra, Ponta Grossa, 2009. TENÓRIO, Fernando Guilherme. Responsabilidade social empresarial: teoria e prática/ Organizador Fernando Guilherme Tenório; colaboradores Fabiano Christian Pucci do Nascimento... (et. al.). – 2. ed. ver. e ampl. – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006. 260p.
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Inovação social: instrumento de desenvolvimento e transformação social Karen Barbosa
RESUMO: Este artigo tem por objetivo contribuir com a compreensão sobre os termos inovação e inovação social, bem como trazer uma contextualização da relevância desse tema nos dias atuais e apresentar, de forma sucinta, incentivos e processos de implementação voltados à inovação social.
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Inovação como um novo modelo social Pensar em inovação social oportuniza um debate muito amplo a respeito das demandas atuais em que empresas e organizações estão inseridas. O mundo globalizado trouxe à tona diversas realidades e questões sociais que antes eram despercebidas ou percebidas em menores proporções. A situação global da economia, as políticas sociais e culturais, as guerras e vários outros temas hoje geram publicações em todo mundo e influenciam a atuação de diversas instituições, além de trazerem uma nova perspectiva sobre o papel das mesmas. Nesse contexto, as empresas são impulsionadas a manter uma atualização constante. Os avanços tecnológicos e a busca de custos cada vez menores de produção contribuem para que tal necessidade se torne mais latente. Porém, a atualização engloba diversos fatores; não está simplesmente relacionada ao ato de se criar algo melhor, mas sim a uma inovação que realmente transforme e valorize o capital humano, que traga mudanças em comportamentos, posicionamentos e caminhos. Através de uma atuação mais integrada com as atuais demandas por mudanças, as empresas podem atingir um alcance muito mais estável e sustentável, podendo assim permanecer no mercado, explorar novos nichos, manter-se à frente de concorrentes e até se tornarem mais competitivas. É importante ressaltar que o conceito de inovação está associado à aplicabilidade de novas ideias, garantindo uma realização. O sucesso pode estar relacionado a diversos fatores: ideias que proporcionem um maior faturamento de empresas; que expandam as relações comerciais; que beneficiem a qualidade de vida de trabalhadores; que contribuam para a transformação social, entre outros benefícios para a sociedade. A inovação por si só já representa uma transformação dos modelos convencionais de processos, produtos ou serviços; porém, o tema abordado no presente artigo faz a reflexão sobre a inovação no âmbito social, o que não exclui a atuação das empresas e de diversas outras instituições.
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A inovação social está diretamente relacionada a ações que estimulem a resolução de problemas sociais, como por exemplo, a desigualdade e o desemprego, que são resultados da exclusão social proveniente do modelo capitalista. Nesse cenário, as empresas são agentes de transformação que podem potencializar – em parceira com universidades, centros de pesquisa, movimentos sociais, agências de fomento, investidores, governo, fornecedores e concorrentes – as ações necessárias para gerar uma inovação. Por diversas razões o setor privado tem se mostrado envolvido com as problemáticas sociais, buscando uma maior aproximação com a comunidade e comprometendo-se com a qualidade de vida. Muitas vezes as empresas são os centros das ações inovadoras, pelo fato de existir uma grande dedicação à criação de áreas voltadas a inovação e laboratórios de pesquisas. Através das realizações nesse setor, as invenções, produtos e ideias chegam ao mercado. A inovação social difere da definição tradicional de inovação, pois se refere ao desenvolvimento de processos, produtos e serviços que permitam uma transformação social, ou seja, não estão ligados diretamente ao mercado, promovendo em muitos casos um aumento na qualidade de vida e na geração de trabalho e renda. As ações implementadas nessa perspectiva precisam deixar claro o seu potencial transformador para realmente ser reconhecidas como inovação social. É necessária uma real compreensão e envolvimento com o segmento proposto para aí sim intervir através de um impacto positivo, e é também essencial a avaliação desse impacto. Frequentemente as pessoas confundem o ato de inovar e os processos de inovação com uma melhoria contínua, mas a inovação vai além de ações pontuais de otimização. Implementação de ideias A grande maioria das referências sobre inovação é encontrada no Manual de Oslo, criado em 1997 pela OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, segundo o qual os empreendedores de diversos setores se baseiam para realizar mudanças. O Manual também
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aborda o aspecto indissociável entre inovação e desenvolvimento econômico e apresenta quatro tipos de possibilidades no campo da inovação: novos produtos, novos processos, novas estratégias organizacionais e de marketing. De acordo com Schumpeter (1934), o desenvolvimento gerado pela inovação estimula e fortalece também o setor econômico. O autor defende que esse desenvolvimento e a prosperidade só podem acontecer por meio da inovação, através de novas formas de produzir e consumir, e são principalmente os empreendedores os catalisadores dessas mudanças. Independentemente do que será realizado, é preciso levar em consideração a importância da inovação no cenário vigente. Não há como se tornar uma empresa inovadora sem dar a devida relevância ao tema. É a partir da compreensão dessa necessidade que as empresas podem definir uma estratégia que deve estar alinhada aos seus objetivos e sua a visão de futuro. Após essa fase inicial, a empresa pode começar a desenvolver as ferramentas de gestão desse processo de inovação. Essas ferramentas vão ser planejadas de acordo com cada organização, por isso devem ser levados em consideração o tamanho da empresa, o setor de atuação, a cultura, a estrutura organizacional e vários outros aspectos. Além desses fatores é importante ressaltar que a inovação só pode ocorrer quando há um aprendizado organizacional. Senge (1998) afirma “que as organizações que aprendem devem desenvolver continuamente a capacidade de se adaptar e mudar através da criatividade e inovação”. Esse aprendizado estará presente em todas as fases da implementação de uma inovação, sendo essencial para gerar impactos que continuem gerando benefícios para a organização. O processo de implementação da inovação social funciona da mesma maneira, porém no ponto de partida, ou seja, quando se está refletindo sobre a empresa, inclui-se um diagnóstico a respeito dos problemas sociais latentes e que necessitam de novas soluções. A partir da definição desse ponto, é possível partir para o processo criativo, que abrirá caminhos possíveis para resolver os problemas. Os projetos
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pensados podem ser em diversas áreas, tais como: melhoria nas condições de trabalho, lazer, educação, meio ambiente, segurança, saúde, turismo, ocupação e mobilidade urbanas, etc. Após a elaboração dessas etapas, é o momento de realizar alguns testes para verificar o papel realmente transformador das ações e tentar buscar um grau de permanência da atividade, posteriormente, o projeto pode partir para ampliação e difusão do seu modelo para outros locais. O último estágio da inovação social seria a inovação sistêmica, que geralmente envolve uma mudança no setor público, na legislação, no setor privado, por um período longo de tempo. O que é importante é que as organizações produzam inovações em diversos contextos, que possam superar as desigualdades através de novas metodologias e permitir uma atuação mais concisa dos indivíduos na sociedade. Incentivos governamentais Se a inovação é considerada um grande pilar do desenvolvimento econômico, é essencial que ela faça parte dos programas de incentivos do Governo. Atualmente diversas instituições já receberam premiações e benefícios por impulsionarem e multiplicarem a cultura de inovação em seus negócios e/ou na comunidade em que estão inseridos. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação implementou em 21 de novembro de 2005, a Lei n.º 11.196, conhecida como Lei do Bem, que consolidou os incentivos fiscais. A premissa básica é que as pessoas jurídicas que tem o intuito de garantir o fomento, realizem pesquisa tecnológica e contribuam para o desenvolvimento de inovação tecnológica. A FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) é uma empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, que anualmente realiza o Prêmio FINEP de Inovação Tecnológica. Concorrem ao prêmio micro/pequenas, médias e grandes empresas; instituições de ciência e tecnologia; pessoas físicas; OSCIPs; ONGs; cooperativas e outras instituições públicas e privadas.
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Para a FINEP, inovação é a criação de tecnologias, processos e metodologias originais que possam vir a se tornar propostas de novos modelos e paradigmas para o enfrentamento de problemas sociais, combate à pobreza e promoção da cidadania. O intuito do Prêmio é reconhecer as ações inovadoras das empresas e instituições de ciência e tecnologia brasileiras. A premiação é uma forma de elevar o potencial competitivo tanto de instituições públicas ou privadas, e de potencializar o impacto positivo na qualidade de vida da sociedade brasileira. As categorias do prêmio estão baseadas nas definições contidas no Manual de Oslo. São elas: produto, processo, pequena empresa, grande empresa, instituições de ciência e tecnologia (C&T), inovação social. Esta última categoria aborda a inovação como a utilização de tecnologias que permitam promover a inclusão social, geração de trabalho, renda e melhorias nas condições de vida. Dentro da categoria inovação social, podem concorrer ao prêmio instituições de ciência e tecnologia, associações, cooperativas e instituições públicas ou privadas sem fins lucrativos. Atualmente, o Prêmio Finep é o mais importante instrumento de estímulo e reconhecimento à inovação no Brasil. Já garantiu a premiação de centenas de empresas, instituições e pessoas físicas. Em 2014, serão disponibilizados R$ 8 milhões para os primeiros colocados regionais e nacionais de cada categoria. Outro prêmio de bastante relevância no País é o Edital SENAI SESI de Inovação, que seleciona boas ideias e oferece suporte e recursos necessários para que as empresas coloquem projetos inovadores em prática. A meta, de acordo com o Edital, é de incentivar o desenvolvimento de produtos, processos e serviços inovadores na indústria nacional para o aumento da competitividade e da produtividade por meio da promoção da qualidade de vida do trabalhador. As instituições passam por duas etapas que incluem a inscrição das ideias, análise das ideias, plano de negócios, contratação e execução. Podem participar empresas do setor industrial, inclusive startups de base tecnológica, em parceria com uma ou mais unidades operacionais SESI/SENAI.
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Considerações finais A inovação social surge inserida em um cenário precário de transformações. Não é só no Brasil que encontramos desequilíbrios sociais, econômicos e culturais; há urgência de novas soluções em diversas sociedades no mundo. Através das metodologias adequadas, dos processos sistematizados, das alianças estratégicas e de sistemas efetivos de disseminação é possível impulsionar transformações que contribuam para o desenvolvimento socioeconômico sustentável de um país. A inovação é capaz de gerar vantagens competitivas em médio e longo prazo, permitindo que empresas se expandam para novos mercados, aumentem seus rendimentos, realizem novas parcerias, adquiram novas aprendizagens e aumentem o valor de suas marcas; em suma, são essenciais para a sustentabilidade dos negócios em todo o mundo. Para uma implementação efetiva das novas ideias, é preciso existir uma articulação dos indivíduos em rede, trabalhando de forma sincronizada e harmônica, e firmando um compromisso solidário com a transformação, com o reconhecimento e valorização do conhecimento do outro. Apenas dessa forma pode haver uma real mudança dos paradigmas existentes na sociedade, que consolidem de fato um novo modelo de atuação social integrado e sustentável.
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Referências Bibliográficas Tradução: 1990, A Quinta Disciplina: A arte e prática da organização de aprendizagem, Doubleday, New York, 1990 Schumpeter, Joseph. Ciclos econômicos (Business cycles) de 1939; http://www.portaldaindustria.com.br/ http://www.mct.gov.br/ http://premio.finep.gov.br/ http://download.finep.gov.br/imprensa/manual_de_oslo.pdf
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O empreendedorismo social e sua contribuição para formação da cidadania: estudo de caso da Associação Solidariedade Sempre Sandra M. J. Capelo
RESUMO: O artigo propôs situar o desenvolvimento do conceito de empreendedorismo social e ilustrar seu potencial para formação da cidadania. Para isso, resgatou na bibliografia seu histórico e características definidoras para identificar sua contribuição através do estudo de caso da Associação Solidariedade Sempre (ASS). A ASS é mantida pelo Grupo Empresarial Hayapek e oferece formação musical no contra turno escolar para adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Verificou-se que a ASS preenche a maioria das características definidoras do empreendedorismo social e seus resultados confirmam o potencial da prática para transformar a sociedade de maneira sistêmica e duradoura. Palavras-chave: Empreendedorismo social, Sustentabilidade, Cidadania.
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INTRODUÇÃO A música “O que é? O que é?”, de Gonzaguinha (Gonzaguinha, 2014), questiona se “a vida é maravilha ou é sofrimento, se é alegria ou lamento”, e confia: “somos nós que fazemos a vida, sempre desejada por mais que esteja errada”. O presente estudo não pretende discutir se está certa ou errada, mas apontar caminhos que a tornem sempre desejada. Uma vida mais maravilha e alegria do que sofrimento e lamento. Uma vida mais promissora e menos desigual. O escritor africano Mia Couto (2014) expõe, com sua contundente frase “De repente olhamos para a África com medo de que nos contagiem com o ebola1. Normalmente não olhamos para eles, porque a fome não é contagiosa”, o risco e miséria decorrentes do descaso. Propõe-se investigar essa nova maneira de cuidado com o outro através da ação empreendedora. E, ainda, causar reflexão sobre esta ação que, enquanto ação, supõe sustentabilidade, visto ser este um dos diferenciais do empreendedorismo social quando comparado com outras modalidades de intervenção. Enfim: como o empreendedorismo social contribui para a formação da cidadania? E, identificar, na instituição pesquisada, as características definidoras do empreendedorismo social e sua contribuição para a formação da cidadania. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA O empreendedorismo social emerge como uma forma de enfrentamento dos desafios sociais, econômicos e ambientais insuficientemente atendidos pelo Estado. A prática se confunde e diferencia do empreendedorismo privado, da responsabilidade social empresarial, do ativismo social e do assistencialismo, evidenciando tratar-se de um conceito em construção, mas com características já definidoras. Ao buscar essa definição e distinção, encontra-se que o empreendedorismo privado, apesar de ter o objetivo de suprir necessidades humanas, tem o foco no mercado e a medida de seu desempenho é o lucro. A confusão ocorre Vírus ebola. Atinge atualmente (out/2014) 7,5 mil pessoas principalmente nos países Guiné, Serra Leoa e Libéria, no Oeste da África. Destes, cerca de 3,4 mil pessoas já morreram por causa da doença. Uma pessoa está em estado crítico nos EUA após estar na região e viajar e uma enfermeira na Espanha manifestou a doença após prestar assistência a um padre que foi transferido para tratamento no país.
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porque o empreendedorismo social se apropriou do termo empreendedorismo, pois incorporou suas características em um espaço cuja finalidade não é a da acumulação da riqueza ou lucro, como será explicitado (Parente et. al., 2011). A responsabilidade social empresarial traz para o negócio a perspectiva de longo prazo, a inclusão sistemática da visão e das demandas das partes interessadas e a transição para um modelo em que os princípios, a ética e a transparência precedem a implementação de processos, produtos e serviços (Borger, 2001). Seu objetivo principal, no entanto, é agregar valor estratégico ao negócio e atender expectativas do mercado e da percepção da sociedade/ consumidores (Oliveira, 2004). O ativismo social ou político também é provocado pela constatação de desequilíbrio social, mas se diferencia pela orientação da ação transformadora que é focada em influenciar outros, como os governantes, instituições não governamentais, consumidores ou trabalhadores. Embora exija do ator social as mesmas características de inspiração, criatividade e força, a medida do desempenho está relacionada à mobilização alcançada, mais do que à intervenção direta na promoção do equilíbrio, como na atuação de Gandhi2 e Martin Luther King3 (Martin & Osberg, 2007, p. 37-38). O assistencialismo pode ser uma forma de dominação e não de proteção. Demo (2002, p.70) alerta que “os pobres necessitam, mais que ninguém, de solidariedade e cuidado, mas não podem transformar isso em ‘presente grego’... esse tipo de solidariedade é, no fundo, imbecilizante... é o resultado do cultivo da ignorância, a condição de massa de manobra, na qual a pessoa é manipulada..., geralmente sem perceber”. Pode ser a forma inicial de intervenção em situações de extrema pobreza através da disponibilização direta dos produtos que atendam a necessidades básicas, mas requer ações complementares de emancipação e empoderamento. O uso de um conceito pelo outro ocorre pela mescla de orientações que cruzam objetivo social, associado às instituições sem fins lucrativos, com uma vertente empreendedora, aliada ao caráter dinâmico e inovador do negócio. Por outro lado, embora seja importante conceituar adequadamente, Mahatma Gandhi (1869-1948) foi líder pacifista indiano. Principal personalidade da independência da Índia, então colônia britânica. Destacou-se na luta contra os ingleses pelo seu projeto de não violência. 3 Martin Luther King (1929-1968) foi um ativista político e pastor protestante norte-americano conhecido pela luta contra a discriminação racial nos EUA e luta pelos direitos civis dos negros. 2
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o mundo “real” mostrará experiências que combinam essas práticas (Martin & Osberg, 2007). Ademais a distinção dos termos para definir o campo conceitual do empreendedorismo social, buscou-se sua origem, pois práticas similares são identificadas historicamente. No final do século XIX já se verificava a “caridade científica”, uma forma de caridade mais sistemática e estratégica, e alguns personagens identificados com o fenômeno, como Florence Nightingale4 (Parente et. al., 2011). Apesar de se reconhecer essas práticas históricas, o constructo teórico no Brasil data de 1990, ante a crescente problematização social, a redução dos investimentos públicos nesse campo, o crescimento das organizações do terceiro setor e da participação das empresas no investimento e nas ações sociais (Oliveira, 2004). Surgiram correntes e escolas de investigação e o conjunto de ações e características definidoras dos empreendedores sociais foi sendo estabelecido e validado (Dess, 1998). Primariamente, compreendem: a) Adotar uma missão para criar e manter valor social (e não apenas valor privado) (vão direto às causas do problema e procuram criar mudanças sistêmicas e sustentáveis); b) Reconhecer e buscar obstinadamente novas oportunidades para servir essa missão (são persistentes e realizam os ajustes necessários para superar obstáculos); c) Empenhar-se num processo contínuo de inovação, adaptação e aprendizagem (aceitam os riscos e são tolerantes com insucessos); d) Agir com ousadia sem estar limitado aos recursos disponíveis no momento (exploram todas as opções de recursos e desenvolvem estratégias de recursos que tenham possibilidade de apoiar e reforçar a sua missão social); e) Prestar contas com transparência à clientela que serve e em relação aos resultados obtidos (tomam medidas para garantir a criação de valor e retribuir aos investidores, além de verdadeiras melhorias sociais aos seus beneficiários). 4 Florence Nightingale foi uma enfermeira inglesa que desenvolveu práticas modernas de enfermagem e reformas na saúde em todo o mundo, após reduzir o número de mortos do exército inglês em dois terços
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Assim, o empreendedor social é uma espécie no gênero empreendedor, cujo foco central é a missão social e que age através do reconhecimento e busca implacável de novas oportunidades, e engajamento em um processo de contínua inovação, adaptação e aprendizado que sirvam a essa missão. Busca a prosperidade inclusiva, um novo e sustentável equilíbrio que resulte em benefício permanente para o grupo e para a sociedade como um todo (Martin & Osberg, 2007). Os empreendedores sociais servem como um laboratório de aprendizagem para a sociedade ao desenvolverem, testarem e refinarem soluções inovadoras para problemas sociais, através da promoção de uma ampla gama de experiências para descobrir qual solução proposta é viável, de baixo custo (maior impacto social por unidade de investimento financeiro) e escalável (Dess, 2009). Com o amadurecimento do tema, atualizaram-se suas características fundamentais, que abrangem: “ser ideia inovadora, realizável, autossustentável, envolver várias pessoas e segmentos da sociedade, principalmente a população atendida, provocar impacto social e permitir que seus resultados possam ser avaliados” (Oliveira, 2004). Com base nesse levantamento bibliográfico foi possível estabelecer os fundamentos da pesquisa, identificando as teorias e conceitos relevantes para o trabalho e a definição dos elementos que deveriam ser levantados na pesquisa de campo para investigar a hipótese formulada. O método utilizado foi o estudo de caso, porque o fenômeno é contemporâneo e investigado em seu contexto real, buscando-se entender porque as decisões foram tomadas, como foram implantadas e os resultados obtidos (Yin, 2010). A pesquisa caracterizou-se por ser explanatória. A coleta de dados primários baseou-se em entrevista com a assistente social administradora da unidade, com o instrutor musical que frequentou a instituição inicialmente como aluno e foi convidado a ser educador, e com o diretor da instituição
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pesquisada. Quanto aos instrumentos para levantamento e análise de dados secundários, utilizaram-se reportagens publicadas em jornais e revistas, folder e site institucional, depoimentos registrados e internet. Realizouse triangulação dos dados coletados para confrontação das informações. O estudo foi submetido a revisor especializado e, posteriormente, a bibliotecária para adequação das referências bibliográficas. A entidade pesquisada foi a Associação Solidariedade Sempre, uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip), sem fins lucrativos, de direito privado. Formada em abril de 2003, é mantida pelo Grupo Hayapek de Londrina, constituído pelas empresas Hayamax, Hayonik e Sonkey, atuantes na indústria, varejo e distribuição de instrumentos musicais, componentes eletrônicos e vídeo e som. O projeto se iniciou com a visão do diretor Ricardo Akira Hayama, filho do fundador da empresa Kazume Hayama que, inspirado por uma publicação onde se relatava que pessoas da colônia japonesa contribuíam para um mundo melhor, idealizou oferecer oportunidade para que adolescentes vulneráveis à violência se tornassem multiplicadores de uma nova forma de viver baseada em valores como solidariedade, ética e crença no valor individual. Reuniu funcionários e lideranças da empresa para apoiarem o projeto que tem como compromisso a criação de oportunidades e, como missão, ensinar hábitos, princípios e valores a fim de preparar o adolescente para o exercício da cidadania, do voluntariado e da criatividade, como sujeito de um mundo melhor. O processo para seleção de adolescentes ocorre duas vezes ao ano, no final de cada semestre. Os critérios para inclusão dos jovens são: estar na faixa etária entre 10 e 16 anos; ser oriundo de famílias com renda per capita correspondente a 30% do salário mínimo; ter disposição para mudar a própria história. O projeto começou com cinco adolescentes, em uma casa alugada na região leste de Londrina, apontada em estudo como a mais carente da cidade. As atividades eram oferecidas no contra turno escolar e compreendiam
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artesanato, música, inclusão digital e reforço em português e matemática. Atualmente são 64 adolescentes atendidos em sede própria na região central – e a atividade principal é a música. Com a mudança de endereço, o projeto foi estendido para toda a cidade e os alunos passaram a receber vale-transporte, pois a sede ficou longe do local de moradia. O recrutamento conta com a parceria do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da Prefeitura Municipal de Londrina. A ASS possui certificado de Utilidade Pública e de Instituição Parceira do movimento Nós Podemos Paraná. Foi duas vezes finalista no Prêmio Instituto HSBC Solidariedade. Conta com várias empresas parceiras e tem o apoio da Prefeitura Municipal e subsídio do governo através da Lei Rouanet, de incentivo à cultura. Realiza Campanhas de Ação Solidária com a contribuição de pessoas físicas e tem a parceria do Rotary Clube. Quando se avalia a ASS em relação ao empreendedorismo social, encontra-se que atende a maioria de suas características definidoras. A meta é tornar-se autossustentável, imprescindível à reprodutibilidade do modelo. O balanço social é publicado anualmente e as ações de transparência estão em processo de sistematização. A ASS adotou uma missão para criar e manter valor social, atuando sobre a vulnerabilidade dos adolescentes frente a situações de violência em ambientes precários, resumida na frase “as mãos que tocam instrumentos não seguram armas”. Através da música atua sobre a formação pedagógica e social dos adolescentes, contribuindo para a criatividade, expressão da cultura, disciplina e responsabilidade, além de facilitar o acesso a ambientes que o adolescente não frequentaria e promover a inclusão cultural e social. Com a proposta inicial de oferecer artesanato, música, inclusão digital e aulas de português e matemática, a ASS se deparou com a dificuldade de medir resultados em algumas áreas e normativas específicas relacionadas
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às disciplinas da grade curricular, redirecionando e centralizando o foco na atividade musical, que hoje conta com oficinas de musicalização (que engloba a flauta doce, teoria musical, violão popular, repertório, canto e coral), cordas (violino, viola de arco, violoncelo e contrabaixo), madeiras (instrumentos de sopro, como flauta transversal, clarinete, oboé, fagote e saxofone), metais (trompete, trombone, trompa e tuba), piano, percussão sinfônica (tímpanos, bumbo sinfônico, xilofone e gongo sinfônico), música popular (violão popular, cavaquinho, pandeiro, zabumba, guitarra, contrabaixo elétrico, bateria e teclado) e violão clássico. Essa lista minuciosa de oficinas e instrumentos é importante, pois evidencia a extensão da proposta e o desafio da Associação. São investimentos realizados em recursos materiais e humanos para proporcionar acesso a uma linguagem universal que, provavelmente, não acessariam. O jovem pode estudar até três instrumentos, buscando aquele com o qual mais se identifica. Os instrutores, inicialmente voluntários, hoje são assalariados para evitar solução de continuidade nas atividades, exceto pela senhora Nilda Itimura Hayama, que iniciou no projeto com o esposo e permanece como voluntária na coordenação da Associação. Além do planejamento para ofertar opções variadas de instrumentos para favorecer a identificação do adolescente com o projeto, a ASS estruturou a formação de grupos pedagógicos específicos, como a Orquestra de Câmara Solidariedade Sempre (oferece estímulo aos jovens para o desenvolvimento da cultura musical por meio do aprendizado de estruturas da teoria musical e de técnicas instrumentais), Banda Pop (visa promover a aproximação e identificação com a música através das “paradas de sucesso”), Coral InfantoJuvenil (visa desenvolver a afinação, ritmo, percepção corporal e sonora através da técnica vocal aliada à prática do canto), Quarteto de Violão (visa à prática da música de câmara), MPB (visa desenvolver o respeito, disciplina, pontualidade, postura, motivação e relacionamento com o grupo, além dos conceitos da música) e Orquestra Flauta Doce. Através da Orquestra de Câmara Solidariedade Sempre regida pelo educador musical Flávio Collins Costa, e demais grupos pedagógicos, os
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jovens têm tido a oportunidade de apresentarem a diversos públicos o seu aprendizado, além de interagirem com músicos profissionais em ocasiões como o Festival de Música de Londrina. Essa interação e exibição contribuem para elevar a autoestima, como resumido por Venturelli (2010): “os aplausos colocam a pessoa que está se apresentando em um lugar de importância, protagonismo, e essa realidade combate e se contradiz ao que eles são diariamente expostos, na realidade em que vivem”. As apresentações musicais contribuíram para aproximar os familiares dos adolescentes, e aumentou seu envolvimento. Em 2009, a ASS realizou parceria com a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e conta com orientação especializada em psicologia. A Associação é administrada pela assistente social Ellen Priscila Marques Figueiredo, e há iniciativas com instituições parceiras para o encaminhamento dos jovens que demonstram interesse em dar continuidade nos estudos e inserção no mercado de trabalho. Thiago da Silva Santos, residente no Jardim Marabá, entrou no projeto em 2007 e interessou-se pelo estudo de violão. Através do projeto obteve bolsa de estudos para conclusão do ensino médio no Colégio Londrinense e atualmente realiza o segundo ano de Graduação em Música na UEL. Foi contratado pela própria Associação para ser educador musical e identificou-se com o ensino. Deseja concluir a faculdade, tornar-se professor e, eventualmente, realizar um projeto semelhante. Seus amigos de infância não estão na universidade e no bairro se diz que ele é “alguém que deu certo”. A primeira apresentação pública do Tiago ocorreu no início de 2007, mas foi na apresentação de encerramento do ano que viveu um momento especial com a presença de sua mãe. Hoje experimenta a regência da Orquestra no turno matutino. Relata que a confraternização que o projeto proporciona ao fazerem as refeições juntos e viajarem juntos para os concertos também foram aspectos importantes na sua formação. Como Thiago, há histórias semelhantes. Thiago Breguedo e Mírian de Souza são egressos do projeto e hoje trabalham como educadores na Associação Mãos Estendidas, entidade sem fins lucrativos criada por empresários e
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profissionais liberais londrinenses, mantida pelo Estado e iniciativa privada através de doações e repasses governamentais, e atuante na área de sócio educação. Ana Flávia de Mello é egressa e educadora na própria ASS. Thiago Breguedo realiza o terceiro ano de graduação em música na UEL. Jéssica Ribeiro graduou-se em Serviço Social. Diretores das escolas frequentadas por alunos da Associação percebem e comunicam que possuem comportamento diferenciado. Esse é o valor social gerado e a razão de ser do programa. O compromisso do projeto com a sociedade não é formar músicos, mas cidadãos solidários. Ser solidário sempre contribui para um mundo melhor e responde à pergunta de Gonzaguinha: “E a vida o que é? Diga lá, meu irmão... É o sopro do Criador numa atitude repleta de amor”!
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Referências Bibliográficas BORGER, Fernanda Gabriela. Responsabilidade Social: Efeitos da Atuação Social na Dinâmica Empresarial (tese de doutorado), Departamento de Administração. São Paulo: USP, 2001. DEMO, Pedro. Politicidade: razão humana. Campinas, SP: Papirus, 2002. DESS, J. Gregory. Empreendimentos sociais como Laboratórios de Aprendizagem. Inovações, p. 11-16, Boston, MA: Davos-Klosers, 2009. DEES, J. Gregory. The meaning of “Social Entrepreneurship”. Center for Social Innovation, 1998. GONZAGUINHA. Disponível em gonzaguinha/463845>. Acesso em 20 set 14.
<http://letras.mus.br/
MARTIN, Roger L. & OSBERG, Sally. Social Entrepreneurship: The Case for Definition. Stanford Social Innovation Review, Spring, 2007, p. 37-38. VENTURELLI, Edilson. In: MIRANDA, Fábio. Disponível em: http:// sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/Edicoes/30/artigo181620-1.asp. Acesso em 30 set. 14.
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Maratona de Empreendedores: Inovação e Desenvolvimento Social em Londrina Rosi Sabino Paulo Varela Sendin
RESUMO: Trata-se de uma análise da iniciativa realizada pela ADETEC - Associação do Desenvolvimento Tecnológico de Londrina. O texto também busca registrar a história de atividades que contribuíram na construção da cultura empreendedora em Londrina e Região. Palavras-chave: Palavras-chave: cultura empreendedora; inovação; capital social
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Introdução A inserção do tema Inovação neste livro pode parecer fora de contexto, já que o foco central da publicação é o Empreendedorismo Social. Ocorre, no entanto, que a sequência de eventos e atividades da Maratona de Empreendedores, organizada pela Associação do Desenvolvimento Tecnológico de Londrina (Adetec) durante vários anos extrapolava a simples promoção da Inovação e do desenvolvimento tecnológico. De fato, a proposta dessa ação era de perseguir objetivos mais amplos (Sabino, R, 2014) e indutores de mudanças sociais, tais como a promoção da cultura de empreendedorismo, que é importante tanto para o Desenvolvimento Econômico quanto para o Social. É a partir dessa perspectiva, de uma visão abrangente das propostas e resultados da Maratona de Empreendedores, que os autores se propõem a analisar essa iniciativa da Adetec, buscando registrar a história dessa atividade e tentando discutir seu impacto e desdobramentos na construção da cultura empreendedora em Londrina. Contexto da atuação da Maratona O objetivo principal da Maratona de Empreendedores de Londrina, até mesmo por ter o evento nascido no âmbito Plataforma do Conhecimento (Platcon) da Adetec, era de promoção do desenvolvimento tecnológico, focando especialmente na interação entre a academia e o setor empresarial. Assim, conforme menciona o Relatório da III Maratona (Adetec, 2003), ao definir os objetivos dessa Plataforma: “A PLATCON – Plataforma do Conhecimento, uma das ações do projeto Londrina Tecnópolis, coordenado e gerido pela ADETEC – Associação do Desenvolvimento Tecnológico de Londrina, foi criada com o objetivo de estimular as instituições ofertantes do conhecimento – universidades, institutos de pesquisa, escolas técnicas e demais instituições
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de ensino, capacitação e treinamento – integrando-as com o setor produtivo, possibilitando, assim, o desenvolvimento tecnológico por meio de projetos de pesquisa científica e tecnológica cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo”. Analisando-se apenas o objetivo acima mencionado, transparece a impressão de que a Platcon (e, em decorrência, a Maratona) teria seu foco direcionado exclusivamente para o desenvolvimento tecnológico. Entretanto, ao descrever os métodos de trabalho assumidos por essa área da Adetec, o Relatório acima mencionado amplia substancialmente suas possibilidades de impactar a sociedade como um todo e contribuir para a construção de uma cultura empreendedora mais ampla, conforme se pode ver no parágrafo seguinte do texto citado: “As principais ações desta plataforma fundamentaram-se na difusão da cultura empreendedora e da promoção da inovação tecnológica, através da realização de palestras, seminários e workshops de sensibilização e de formação de massa crítica, além de promover cursos de formação de multiplicadores, cujo público-alvo foi a comunidade acadêmica em todos os níveis e a comunidade empresarial”. Além disso, mais adiante especifica-se como essa ação poderia atingir a comunidade como um todo e proporcionar uma mudança cultural no longo prazo: “...uma proposta pedagógica focada nos conceitos de empreendedorismo e inovação, cuja constante é a mudança de atitudes e comportamentos do homem, formando um cidadão ético e, sobretudo propondo a preparação da criança e do adolescente para atuar na sociedade com iniciativa, criatividade, independência e responsabilidade, desenvolvendo competências empreendedoras e que utilizem com eficiência todos os recursos tecnológicos de seu tempo”. Dessa forma, observa-se que a Maratona se propunha a impactar o Desenvolvimento Social de duas formas. Em primeiro lugar, atuando na promoção da Inovação Tecnológica, na busca de níveis maiores de competitividade do setor empresarial, o que proporcionaria uma dinamização do desenvolvimento econômico de Londrina, o que proporcionaria, se adequadamente conduzido e equitativamente distribuído, uma melhoria da
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qualidade de vida e consequente desenvolvimento social. A esse impacto indireto soma-se uma externalidade importante do processo de disseminação da cultura empreendedora, principalmente levando em conta a proposta de atuação junto às escolas, induzindo mudanças nas gerações futuras. Partindo desse pressuposto, considera-se como um dos objetivos da Maratona o desenvolvimento do empreendedorismo na comunidade, estimulando e fornecendo ferramentas adequadas à proposição de projetos inovadores que contribuam para o bem- estar econômico e social de Londrina e região. A relevância desse objetivo deriva do fato de que grande parte das pessoas criativas não possui a cultura de estruturar as ideias e formular projetos viáveis. Dessa forma, boas ideias acabam se perdendo em abstrações, não gerando produtos, processos ou resultados inovadores. Tais produtos, processos ou resultados poderiam trazer maior conforto para a comunidade, melhorar o índice de produtividade dos empreendimentos, salvar vidas, quando a inovação se dá no campo da saúde, enfim, melhorar o padrão de qualidade de vida das pessoas. Histórico do evento Embora conceitualmente considerada como um “evento”, a Maratona de Empreendedores de Londrina sempre foi mais um processo de promoção de empreendedorismo do que um simples “evento”, que ocorria em uma determinada data e se repetia um ano depois. O grande envolvimento de parceiros acadêmicos e empresariais acabava por originar interações constantes antes, durante e após o evento, ocasionando desdobramentos positivos no ambiente de Inovação de Londrina e proporcionando resultados de médio e longo prazos. Esse processo quase permanente durou cerca de 5 anos e deixou legados importantes, dentro e fora da Adetec, induzindo o surgimento de outras iniciativas voltadas ao Empreendedorismo e à Inovação. A Maratona definiu como público alvo os estudantes do ensino superior (graduação e pós-graduação), estudantes do ensino médio profissionalizante
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e ainda, profissionais e inventores da comunidade em geral. Em termos de impactos diretos, resultantes do envolvimento e participação de um grande número de pessoas e entidades, é possível, em um rápido e não exaustivo resumo citar alguns números, como segue. Na primeira edição do evento, em 2001, os resultados foram os seguintes: • 14 projetos selecionados • 1 projeto transformou-se em empresa • 2 foram indicados para incubação • 2 para pré-incubação e • 1 implantado no Colégio Estadual Cristo Rei de Cornélio Procópio • Realizadas 99 palestras nas Escolas de nível médio e Universidades • 2 cursos de empreendedorismo nas cidades de Arapongas e Apucarana • 28 projetos selecionados e expostos • 13 palestras sobre empreendedorismo • 1 rodada de negócios com a presença da Endeavor Brasil, uma ONG internacional de apoio a empreendedores através da aproximação de empresas inovadoras e emergentes com investidores de risco. • Dos 10 empreendedores locais, que foram prospectados 3 foram selecionados e um deles recebeu o prêmio nacional Empreendedores do novo Brasil, promovido pela Endeavor em juntamente com a Você S.A. Na segunda edição, no ano seguinte, a Maratona de Empreendedores contou com 28 projetos selecionados e expostos no Shopping Quintino no período de 18 a 24 de novembro/2002. Além da exposição, também foram realizadas 13 palestras sobre empreendedorismo. Em sua terceira edição, a Maratona de Empreendedores mobilizou 14 instituições das áreas de ensino técnico. Naquele ano, os organizadores ousaram propor que cada instituição de ensino da região de Londrina realizasse maratonas internas. Assim, no período de maio a setembro, as instituições participantes, contaram com o apoio da PLATCON - Plataforma do Conhecimento / Projeto Londrina Tecnópolis e SEBRAE na realização de palestras sobre empreendedorismo e planos de negócios, preparando e incentivando seus alunos para que apresentassem propostas às respectivas maratonas internas.
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O resultado foi a seleção de 52 projetos dos quais, 2 deram origem a empresas, 5 formam encaminhados para pré-incubação, 5 para incubação de empresa e 12 foram implementados nas próprias instituições ou empresas. A IV Maratona, realizada em 2004, conseguiu cumprir praticamente todas as metas a que se propôs, apresentando os seguintes resultados: • 14 instituições foram contactadas, sendo que 8 participaram ativamente de todo o processo. • O Centro Universitário Filadélfia – UNIFIL realizou internamente a I Maratona Unifil de Empreendedores, tendo selecionado 23 projetos e premiou 3 em outubro de 2004. • A UNOPAR também realizou uma chamada interna com o intuito de captar projetos tanto dos alunos como dos docentes e profissionais. • Foram selecionados 35 projetos de um total de 75 para a mostra competitiva no Catuaí Shopping. • Foram prospectados 06 empreendedores de empresas inovadoras e emergentes de Londrina e Região, com a presença do Instituto Empreender Endeavor. • Foram realizados 3 painéis (palestras e depoimentos) enfocando os temas: Como Capitalizar Novas Empresas, Responsabilidade Social e Conjuntura Econômica sob a Ótica do Empreendedor: Cenários e Perspectivas. • Foram realizadas 6 rodadas de negócios, denominadas de Gera-inovação visando a apresentação de novos empreendimentos e identificação de oportunidades. • Em relação ao objetivo de selecionar empresas para incubação, as 3 empresas indicadas foram: ForLogic (instalada no Hotel Tecnológico do CEFET); Slide Control (em processo de prospecção junto à INTUEL) e uma empresa pré-incubados no PROMÍDIA da UNOPAR. Cabe destacar na IV Maratona, pelo seu aspecto de contribuição ao Desenvolvimento Social, a premiação do projeto Rede de Interação Ecológica em Londrina que visava contribuir para o desenvolvimento sustentável da cidade, ressaltando que uma gestão integrada do manejo de resíduos sólidos industriais pode ser um dos caminhos para minimizar o impacto ambiental, causado pelo descarte de materiais sem a verificação de seu valor econômico.
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Em diversas oportunidades durante a trajetória de realização das Maratonas, várias instituições realizaram eventos prévios internos. Entre as instituições de nível superior podem ser citadas a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), em seu campus de Cornélio Procópio (na época ainda como Centro Federal Tecnológico – CEFET), a Universidade Norte do Paraná (UNOPAR) e o Centro Universitário Filadelfia de Londrina (UNIFIL) e a Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana (FECEA), hoje Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) – Campus Apucarana. A V Maratona, realizada em 2005, envolveu um público 40 participantes do Ensino Médio Profissionalizante, abrangendo cursos: técnico em eletroeletrônica, técnico em eletrônica, técnico em eletromecânica e técnico em química industrial; 105 participantes do Ensino Superior, Graduação e Pós-graduação, abrangendo as áreas: engenharia da computação, engenharia elétrica, telecomunicação, marketing e propaganda, fisioterapia, relações públicas, turismo, administração e enfermagem; 20 profissionais e inventores das áreas de educação, TI, saúde, design, entre outras e 81 jovens oriundos da população carente atendidos pela Escola Profissional do Menor de Londrina – EPESMEL. Esse amplo envolvimento das instituições resultou na inscrição de 196 projetos. Destes, foram pré-selecionados 66 projetos de diversas áreas como: automação industrial, eletroeletrônica, eletrônica, social, cultural, ambiental, saúde, veterinária, telecomunicações, Tecnologia da Informação com ênfase para educação e games dentre outros. Tendo em vista o apelo de transformação sócio cultural, a Maratona centrou esforços especiais, junto ao público do ensino médio profissionalizante, para o qual, em função das suas características, são necessárias iniciativas que propiciem a inserção social e produtiva com cidadania. Neste sentido, é imprescindível salientar o envolvimento da escola pública estadual, o CEEP CASTALDI – Centro Estadual de Educação Profissional Professora Maria do Rosário Castaldi, assim como da Escola Profissional do Menor de Londrina – EPESMEL.
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A presença de instituições de ensino de nível médio e profissionalizante na Maratona mostrou que o empreendedorismo não precisava ficar restrito à Academia e poderia ser difundido também entre estudantes mais jovens. Neste caso, “a presença de um representante do CEEP na televisão causou um grande entusiasmo em toda a comunidade Castaldi, fato esse que fez surgir durante os meses seguintes um total de 89 (oitenta e nove) projetos de ideias empreendedoras entre nossos 316 alunos, ou seja, quase 30% dos alunos apresentaram um ou mais projetos para a “Chuva de Ideias” para a Maratona de 2005”. Outro impacto significativo foi observado na EPESMEL, onde, por meio de uma parceria entre a Adetec e a empresa Milênia Agrociencias (atual Adama Brasil) implementou-se o Projeto Empreender, que tinha dentre seus objetivos o de sensibilizar a comunidade empresarial integrando-a às ações de responsabilidade social em prol do jovem adolescente, além de desenvolver a cultura empreendedora na instituição, a partir do protagonismo juvenil. O desenvolvimento do projeto teve um efeito sistêmico na instituição, conforme relato do, então diretor geral da Epesmel, Pe. Vilcionei Baggio, “os resultados do projeto foram surpreendentes”. As surpresas surgiram, especialmente, por parte dos jovens advindos das periferias e dos distritos vizinhos de Londrina. Os jovens carentes produziram maquetes com o que tinham disponível. Houve um aluno que desenvolveu a ideia de um quadro móvel a partir da sua observação. Percebeu que alguns professores e alunos de baixa estatura aproveitavam apenas metade do quadro negro. E assim surgiu a ideia do quadro móvel, com dispositivo de regulagem da altura. Para Baggio, o envolvimento dos professores foi intenso e o comportamento dos alunos também sofreu mudanças. Houve um amadurecimento quanto às atitudes de planejamento e busca da realização dos objetivos e metas pré-estabelecidos”. A Maratona e o legado de empreendedorismo social em Londrina Sendo o processo de mudança cultural algo lento e cumulativo, torna-se praticamente impossível medir ou avaliar o impacto deixado em Londrina pela realização das Maratonas de Empreendedores. Na área de desenvolvimento
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tecnológico essa ação de certa forma se confunde (por estar inserida) com a própria ação da Adetec, que se utilizou de vários outros instrumentos, eventos e iniciativas (Sendin, PV, 2002). E, mesmo nessa área específica de inovação tecnológica, diversas outras instituições londrinenses vêm atuando, embora a maior parte delas tenha se inserido nesse contexto depois da Adetec. Para além dos resultados numéricos apresentados ao longo do histórico da Maratona, constatou-se uma ampla sinergia entre as instituições de ensino e o setor produtivo, induzindo a discussões relevantes sobre as dificuldades enfrentadas pelos empreendedores, sobretudo nos primórdios da transformação da ideia em projeto e deste em produto. Outro resultado foi o aumento significativo da inserção da disciplina de empreendedorismo na grade curricular das escolas técnicas e nas universidades. Desde a primeira edição, em 2001, diversos projetos foram encaminhados para os mecanismos de pré-incubação e incubação existentes na região. Alguns projetos tornaramse empresas, dentre as quais, a ForLogic Software, que atualmente emprega mais de 30 funcionários. No campo específico de Empreendedorismo Social, cabe citar pelo menos duas iniciativas importantes. A primeira delas foi bastante influenciada pela existência da Maratona, até mesmo pelo envolvimento de pessoas originárias da iniciativa da Adetec. Trata-se aqui da inserção do Empreendedorismo nas escolas da rede pública municipal de Londrina, que vem se ampliando ao longo do tempo mas tem muito a ver com as ideias propagadas nas Maratonas. É uma proposta que foi analisada e defendida pelo Fórum Desenvolve Londrina em seu primeiro Estudo Anual (realizado em 2007) e que acabou sendo paulatinamente incorporado pela área de Educação da Prefeitura de Londrina. Cabe também mencionar que o próprio Fórum tem muito a ver com a própria Adetec, que foi uma das organizações fundadoras dessa entidade. Outra iniciativa importante na disseminação da cultura empreendedora voltada ao Desenvolvimento Social e de Cidadania foi o Programa de Redes de Desenvolvimento Local, organizado pelo SESI e FIEP e que funcionou em Londrina por alguns anos. Neste caso, a organização das comunidades de
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bairros na identificação de seus “sonhos de futuro” e na busca de mecanismo empreendedores de concretização dos mesmo mostra a importância da transformação de sonhos em projetos.
Conclusões A análise das ações desenvolvidas, durante cerca de cinco anos, pelas Maratonas de Empreendedores em Londrina, mostra que uma iniciativa que em sua essência era voltada à Inovação Tecnológica, acabou por ter impactos também no desenvolvimento social. Isso se deve ao fato de que o empreendedorismo em si é uma ferramenta, ou, mais ainda, uma forma de encarar a realidade, que se aplica tanto à área econômica quanto à área social. Por outro lado, a busca por Inovações se vincula estreitamente ao Empreendedorismo, pois somente com base em ideias, processos e ações inovadoras é que o desenvolvimento pode ser alcançado, seja em sua vertente econômica, seja em seus aspectos sociais. Finalmente, há que se ressaltar que na base desses processos de mudança cultural encontram-se a Educação e o envolvimento das novas gerações. Esses, com certeza, foram os pressupostos que sustentaram a ação das Maratonas de Empreendedores de Londrina.
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Referências Bibliográficas DINATO, M. R. S. ; FREITAS, C. C. G. ; DALTO, C. E. . Empreendedorismo social projeto Empreender. In: Congresso Internacional de Administração, 2008, Ponta Grossa. Anaís ADM 2008 - Gestão Estratégica na Era do Conhecimento, 2008. SABINO, Rosi. Do Empreendedorismo à Inovação: um relato sobre meus doze anos em Londrina. In Desenvolvimento Tecnológico em Londrina: Uma perspectiva histórica dos 20 anos da Adetec. Dias, Ivan F.L. & Sabino, Rosi; org. Londrina: Kan, 2013 p. 37-50. SENDIN, Paulo V. O papel do Terceiro Setor na definição de Arranjos Locais de Inovação: o caso da Adetec. In Anais do XXII Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica, Salvador, Bahia, novembro, 2002. 15p. ADETEC – Relatórios das Maratonas de Empreendedores. 2001 a 2005.
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A abordagem apreciativa na construção de uma visão de excelência para a educação Rosi Sabino
RESUMO: O texto aborda a aplicação da investigação apreciativa como estratégia para engajar professores da rede pública municipal de Londrina na busca da excelência na Educação baseada nos pilares: Empreendedorismo, Sustentabilidade, Ciência e Tecnologia e Cultura de Paz. O enfoque principal do trabalho é a mudança de um paradigma voltado à resolução de problemas, por meio uma abordagem apreciativa na qual as experiências e imagens positivas têm capacidade inspiradora de longo prazo e impulsionam uma dinâmica mais sustentável direcionada para um futuro almejado, com base no diálogo, na construção coletiva e no protagonismo social. Dentre as proposições, a introdução da cultura empreendedora nas escolas como instrumento de transformação positiva tornou-se realidade com resultados perceptíveis em diversas escolas e com impactos relevantes na comunidade. Palavras-chave:
Educação,
Cultura
Empreendedora,
Investigação
Apreciativa.
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Introdução As experiências vivenciadas no ambiente escolar são os grandes determinantes na formação de adultos mais criativos, com espírito investigativo, mais abertos às inovações, capazes de estabelecer e atingir objetivos, com um alto nível de consciência do ambiente em que vivem, atentos às questões relevantes ligadas à sustentabilidade sócio-ambientalecológica, enfim, CIDADÃOS MAIS CONSCIENTES. Num contexto em que os processos de mudanças são tão radicais e velozes, a função pedagógica é um dos fatores determinantes na criação de um ambiente propício para que o aluno desenvolva a capacidade de assumir responsabilidades sobre o seu próprio futuro e adquirir conhecimentos básicos que viabilizem suas necessidades de reaprender continuamente e com maior rapidez. A introdução de conceitos e atividades de empreendedorismo, desde os primeiros anos da vida escolar, tem se mostrado um importante recurso para transformar a sociedade por meio da formação de futuros cidadãos conscientes e protagonistas. Diversos autores (FILION, 1999; DOLABELA, 2003; GONÇALVES, 2009; SOUZA, 2005; IBERNÓN, 2000) defendem o ensino do empreendedorismo, bem como sugerem metodologias que incorporam atividades diversas e facilitam o aprendizado de conceitos de empreendedorismo na escola. Uma educação empreendedora pressupõe protagonismo. Visa educar para a excelência, para a inovação, para a responsabilidade sobre o próprio futuro e também sobre o futuro das próximas gerações. Dessa forma, uma educação empreendedora significa preparar indivíduos para a responsabilidade sócioambiental-cultural e ecológica, o amor universal, a paz e a ética. No entanto, há um elemento fundamental, que antecede a aplicação efetiva de qualquer metodologia indutora de novos saberes junto ao educando: o modelo mental com o qual o educador conduz as atividades.
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O ensino do empreendedorismo tem início no despertar de um objetivo estruturante, também tratado como “sonho estruturante” pelo autor Fernando Dolabela (2003). Seja como for, o ponto de partida é um objetivo a ser concretizado, cujo ator principal é o educando. Ou seja, o objetivo ou sonho é definido e estruturado pelo educando. O papel do educador passa a ser o de facilitador do processo, que irá contribuir para a transformação dos objetivos em realizações, ou sonhos em realidades. O professor, portanto, deixa o palco para se tornar o diretor de cena, transformando o aluno em protagonista. O elemento fundamental a ser trabalhado inicialmente é a esperança daqueles que idealizam algo que está, no plano atual, fora do seu alcance. A esperança é aqui entendida como uma atitude otimista em relação ao futuro possível. É uma postura cognitiva, emocional e motivacional. É cognitiva – porque leva a pessoa a pensar sobre o futuro e nele projetar imagens. É emocional – porque as imagens formadas no pensamento são capazes de despertar sentimentos e expectativas sobre os eventos e resultados desejados. E, por fim, é motivacional – pois impulsionam à ação para tornar provável aquilo que se almeja, dados os esforços apropriados. O papel do educador passa a ser o de introduzir conceitos como: autorealização, cidadania, legado e senso de missão. Enfim, ele deve conduzir o aluno a distinguir o sonho que pode impulsioná-lo à realização, por meio da coordenação de conhecimentos e ações, daquilo que é mero produto da sua vontade ou capricho, ou da imaginação sem conexão com a realidade. Nesse ponto, vale retomar a reflexão sobre o modelo mental com o qual boa parte dos educadores vem trabalhando. Quer seja pelas próprias condições a que estão sujeitos durante a prática educacional (estruturas precárias, tendo que lidar criativamente com a falta de recursos, em ambientes onde os relacionamentos nem sempre contribuem para a cooperação entre os pares ou, ainda, convivendo com o risco e a insegurança em comunidades onde a violência é uma constante) ou fruto da subjetividade construída ao longo de suas experiências vividas. Estará o educador apto a despertar e a estimular seus alunos a terem esperança num futuro de possibilidades?
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A questão central do presente trabalho é: como preparar o professor para os novos desafios da educação na formação de cidadãos conscientes, protagonistas e empreendedores? É possível que o ponto de partida para a transformação seja mesmo a mudança de paradigmas do educador, com a adoção de uma abordagem centrada no educando. Este artigo busca compreender as relações entre a abordagem apreciativa e a construção de uma cultura empreendedora nas escolas. A abordagem apreciativa será analisada do ponto de vista da visão antecipatória e do diálogo participativo e afirmativo capaz de gerar, nas escolas e na comunidade, um ambiente propício à formação dos futuros empreendedores, tendo em vista a mudança de perspectiva do ponto de vista do educador. A investigação apreciativa, como proposta metodológica para a construção de uma visão positiva do futuro da educação tomou como ponto de partida a mudança de pressupostos e modelos mentais dos educadores. E assim, a partir de uma postura mais positiva em relação à sua prática enquanto educador, contribuir significativamente para a busca da excelência, na qual, a implantação de uma pedagogia empreendedora nas escolas municipais de Londrina seria um dos elementos fundamentais. A metodologia de investigação apreciativa “A-pre-ci-ar, v.1. Valorar, o ato de reconhecer o melhor nas pessoas e no mundo à nossa volta, afirmando as forças, sucessos e potenciais passados e presentes, perceber essas coisas que dão vida (saúde, vitalidade, excelência) aos sistemas vivos. In-ves-ti-gar, v.1. O ato de exploração e descoberta. 2. Fazer perguntas, estar aberto a ver novos potenciais e possibilidades.” (COOPERRIDER; WHITNEY, p.9, 2006)
Os primeiros estudos sobre a investigação apreciativa datam da década de 1980 com as pesquisas de David Cooperrider e Suresh Srivastva, em Ohio, Estados Unidos. Segundo os pesquisadores, as instituições deveriam ser vistas como “milagres da interação humana, diálogo e imaginação infinita” (WATKINS, MOHR,2001, p. 21).
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A Investigação Apreciativa, também chamada de IA, é uma metodologia direcionada à promoção de mudanças e desenvolvimento. Busca identificar as potencialidades das pessoas, das organizações e do ambiente ao redor delas. Essa metodologia possibilita congregar diferentes ideias e ideais na busca de novas abordagens sobre metas, estratégias, organizações, enfim, novos olhares sobre diferentes contextos. Trata-se de um processo composto por quatro fases também chamadas de ciclo de 4-D. Assim, de acordo com os autores Cooperrider e Whitney (2006, p.18) as quatro fases do processo de IA são as seguintes: 1 – DISCOVERY (Descoberta): Mobiliza todo o sistema por meio do engajamento e articulação em torno dos pontos fortes e melhores práticas. 2 – DREAM (Sonho): Cria uma visão clara e compartilhada focada nos resultados almejados, por meio do potencial descoberto e as perguntas provocativas, que expressem o mais alto propósito, como: “O que o mundo está nos convidando a nos tornar?” 3 – DESIGN (Planejamento): Cria possíveis proposições para o cenário ideal no qual o núcleo positivo é amplificado para concretizar o sonho expressado na fase anterior. 4 – DESTINY (Destino): Desenvolve comprometimento baseado na capacidade afirmativa do sistema e na esperança por mudanças positivas e contínuas com alto desempenho. Na IA os participantes pensam coletivamente sobre o todo antes de atuar localmente. Isso melhora o entendimento comum e gera maior compromisso para as ações, ampliando o leque de possibilidades de atuação. Desta forma, por meio da colaboração e do diálogo construtivo, cria-se um ambiente favorável para catalisar forças a partir das experiências bem sucedidas e das potencialidades do presente para identificar as melhores oportunidades e a esperança das pessoas para o futuro de possibilidades.
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Ao identificar as melhores competências, oportunidades, experiências, ou seja, o “núcleo positivo”, torna-se fácil articular qualquer agenda de mudança de forma afirmativa. Por exemplo, em vez de aprofundar as causas do conflito, uma postura apreciativa busca as fontes de melhor cooperação. Em vez de diagnosticar as razões da alta rotatividade, a AI busca descobrir os elementos que tornam os ambientes altamente envolventes. A observação das causas de baixo moral é ressignificada como a busca pelas causas de maior emoção e comprometimento das pessoas no grupo, organização ou equipe (CHERNEY, Phd. Jay K., 2003). A abordagem apreciativa tem o poder de desencadear entusiasmo e impulso para a mudança positiva. Os diálogos são estimulados no sentido de despertar o orgulho e o senso de pertencer a um grupo ou uma organização, que possui valores importantes e alinhados com propósitos maiores. O orgulho é aqui entendido como um sentimento de prazer em ver que os esforços empenhados tiveram efeito positivo. Trata-se, portanto, de um orgulho saudável. Este sentimento confere coesão ao grupo ou organização. O mesmo ocorre no plano individual. Quando o indivíduo tem a sua autoestima elevada, ele se enche de entusiasmo, autoconfiança e força interior capazes de impulsioná-lo à realização. Do contrário, quando são apontadas as suas mazelas, isso lhe desperta o sentimento de vergonha, que o fará esconder-se ou demonstrar outros sentimentos negativos na busca amargurada por aceitação. Normalmente, os diálogos apreciativos contagiam o ambiente com uma atmosfera de otimismo renovado. O contrário pode acontecer quando o ambiente é infectado com críticas. Especialmente quando as críticas ocorrem em público, desencadeiam-se dúvidas. Quando alguém afirma “Você está errado”, pode-se ouvir “Você é incompetente”. A crítica pode despertar as velhas histórias de imperfeição. Dessa forma a confiança no futuro se esvai. Surge, então, uma sensação de ameaça que faz com que o criticado se retire ou lute contra as críticas. Tal atitude defensiva infecta a atmosfera, convertendose em ondas de resistência e crítica.
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Na IA, as imagens têm um significado tão ou mais importante que as palavras. As imagens que representam as aspirações do indivíduo ou do grupo tornam-se uma ferramenta poderosa. Funcionam como um farol capaz de manter as pessoas no caminho certo rumo ao futuro desejado. Segundo o princípio da antecipação, as imagens inspiram a ação. Dessa forma, o foco de atenção torna-se realidade. Stephen Covey (2009), em “Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes”, fala sobre “o modo como a percepção se forma e como ela determina a maneira de nós vermos as coisas, e a maneira como vemos determina nosso comportamento” em relação às coisas e às pessoas. Essa reflexão levou o autor a estudar a teoria da expectativa e das profecias auto-realizáveis, ou “efeito Pigmaleão”, que também é uma das seis áreas de estudo da IA (COOPERRIDER, 2006). Segundo essa teoria, o desempenho de um indivíduo ou grupo pode ser influenciado positiva ou negativamente, segundo as expectativas projetadas sobre estes por terceiros. “Muito similar a um filme projetado em uma tela, os sistemas humanos estão incessantemente projetando para além de si mesmos um horizonte de expectativas que trazem poderosamente o futuro para o presente como um agente causal.” (COOPERRRIDER, D.L, 2009, p.453)
Em outras palavras, as lentes usadas para ver o mundo são as mesmas que modelam a percepção sobre as coisas, os fatos e as pessoas. Os indivíduos agem e seguem padrões comportamentais baseados, em grande parte, nas projeções que terceiros fazem sobre eles. Acreditar no potencial positivo de um indivíduo ou grupo pode contribuir para que esse potencial floresça e dê bons frutos. Educação Empreendedora O contexto atual fortemente influenciado pelo paradigma informacional, no qual a velocidade da informação toma uma relevância extrema, gerando mudanças culturais de grande impacto. A informação se alastra por meio das redes sociais e toma dimensões superiores àquelas proporcionadas pelos meios tradicionais de comunicação. As distâncias territoriais tornamse relativas, sendo possível comunicar-se e estar presente virtualmente em
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qualquer parte do mundo onde a grande rede tenha alcance. Novos ídolos ascendem e desmoronam com a mesma facilidade. Os meios facilitadores da comunicação são os mesmo que a dificultam, tornando as relações virtualizadas e ao mesmo tempo superficiais. A economia ganha uma dinâmica distinta dada a incrível sinergia tecnológica, em grande parte, proporcionada pelas tecnologias da informação. Enfim, mudança é a palavra de ordem na atualidade. Não porque ela não ocorresse em outros tempos, mas porque está ocorrendo a uma velocidade muito superior na atualidade. Nesse sentido, as instituições cuja missão é a formação dos futuros cidadãos do mundo precisam repensar seus pressupostos e paradigmas para avançar vários passos à frente e, ao menos, tentar se aproximar da realidade. A escola, em especial, tem uma longa jornada a percorrer nesta direção. Uma educação empreendedora é aquela que proporciona um ambiente fértil ao desenvolvimento de novas competências baseadas em projetos, flexibilidade, rapidez, criatividade, visão sistêmica, iniciativa, pro atividade, autonomia, capacidade de tomar decisões, entre outras. Nela, a inovação, a sustentabilidade e a busca intensiva do conhecimento podem estar presentes na forma de conceitos ou impregnadas no próprio ambiente, seja na sua arquitetura, na disposição das salas, na maneira como as pessoas se relacionam ou na transversalidade das disciplinas. A educação empreendedora busca despertar potencialidades; instigar a curiosidade para a formação de jovens cientistas; ou, ainda, estimular o nascimento de ideias, que poderão se transformar em projetos viáveis pela ação empreendedora. No ambiente escolar é possível exercitar competências empreendedoras de diversas formas e com resultados que ultrapassam os muros escolares. De acordo com DOLABELA (2003), introduzir o empreendedorismo na educação básica traz significativas contribuições na construção de tecnologias de desenvolvimento social local e sustentável, uma vez que busca ampliar a percepção do ambiente e o envolvimento ativo dos indivíduos enquanto agentes de construção do futuro.
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Nessa perspectiva, pode-se tratar educação empreendedora como um processo de construção de uma cultura empreendedora na escola, que tem muito mais a ver com incutir valores de cidadania, que irão impactar no desenvolvimento do potencial individual e coletivo de contribuir para o bem comum, do que com apenas mais uma disciplina no currículo escolar ou uma nova metodologia pedagógica. Para que a cultura empreendedora seja consolidada, é imprescindível que todo o ecossistema da vida escolar esteja amplamente engajado. Assim, desde os atores envolvidos na formulação de políticas públicas para a educação e para o desenvolvimento econômico, passando pelos dirigentes das escolas, os professores e a comunidade em geral, todos unidos e comprometidos na construção de uma educação condizente com os imperativos da nova conjuntura social. Aplicação da investigação apreciativa junto professores da rede pública municipal de Londrina
aos
Em meados do ano de 2009, a ADETEC (Associação do Desenvolvimento Tecnológico de Londrina e Região) propôs à Secretaria Municipal de Educação de Londrina a aplicação da metodologia de Investigação Apreciativa como recurso para sensibilizar e mobilizar para a ação, os diretores e supervisores das Escolas Públicas do município de Londrina. Como resultado das primeiras reuniões com a diretoria pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, nasceu uma poderosa metáfora como proposta para o dia do evento: “Londrina é reconhecida pela excelência na educação com base nos pilares: Empreendedorismo, Sustentabilidade, Ciência e Tecnologia e Cultura de Paz.” Foi essa metáfora que guiou todo o processo da investigação, desde o convite até a finalização dos trabalhos. A iniciativa, portanto, buscou proporcionar um ambiente fértil para dialogar, descobrir competências e preparar um planejamento que conduzisse à “Excelência na Educação” – o núcleo positivo de todo o processo.
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Para a execução de tal propósito foi planejado um evento cujos objetivos a serem alcançados seriam: 1 - Estimular o desenvolvimento de projetos multidisciplinares envolvendo os principais pilares definidos pela Secretaria de Educação; 2 - Disseminar a cultura de cooperação entre as escolas municipais com vistas a potencializar as ações planejadas; 3 - Criar uma visão coletiva sobre o futuro da educação em Londrina; 4 - Engajar dirigentes e supervisores no propósito de implantar uma educação empreendedora baseada em conexões com a comunidade Após identificar o núcleo positivo, os participantes foram convidados a dialogar sobre o que já é realizado e que deve ser mantido a despeito de qualquer processo de mudança. Algumas escolas municipais trabalham em parceria com as Associações de Pais e Mestres. Há experiências bem-sucedidas de Escola de Pais, em que pais e professores buscam soluções para os desafios da educação. O próximo passo, seguindo o ciclo dos 4 Ds, preconizado na metodologia, foi o momento de sonhar, ou seja, imaginar futuros possíveis. É o momento em que o grupo é desafiado a romper paradigmas. Essa fase é pautada na história da organização, mas também instiga o imaginário buscando expandir o potencial daquilo já é bom. A atividade foi desenvolvida após exibição do filme “Celebrando o que a vida tem de melhor”. O filme inspirador foi importantíssimo para sedimentar os princípios da Investigação Apreciativa e acendeu nos participantes a chama da esperança por mudanças positivas, com base em uma visão apreciativa da vida. O resultado da atividade foi a elaboração da seguinte proposição provocativa: “Em 2015 as escolas municipais estão estruturadas fisicamente, equipadas com laboratórios e oficinas de prática. Os profissionais são valorizados. Há
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investimento na capacitação profissional. As escolas funcionam em tempo integral, sem dualidades administrativas. A administração pública “olha” para a escola, destinando recursos ou pessoal para mantê-la com uma aparencia atraente e com recursos eficazes, onde as crianças sentem prazer em estudar. As parcerias com empresas, comunidades, entidades são efetivas e profícuas. A escola é um espaço aberto valorizado pela comunidade, há um sentimento de pertencimento. O trabalho pedagógico é integrado. A criança é sujeito crítico, consciente de seus direitos e deveres. As escolas trabalham em uma perspectiva de cultura empreendedora e de paz.”
O momento de elaborar o sonho coletivo é mágico e contagiante. É perceptível o entusiasmo tomando conta de todos os participantes, quando entram em um cenário imaginário futuro, que vai aos poucos tomando forma, por meio das representações simbólicas, que são convidados a realizar. O principal desafio neste momento é o “olhar extramuros”. A transposição das atividades escolares para a realidade socioambiental, assim como a via contrária, ou seja, deixar que esta realidade transponha os muros escolares para que as trocas de experiências sejam intensas e significativas. Eis o grande desafio. Mas, diferentemente dos modelos de educação no passado, há predisposição para a mudança. Por fim, os 152 participantes formaram 19 grupos para a realização da atividade de desenvolvimento dos planos de ação. Estes foram classificados de acordo com os pilares da educação: empreendedorismo, sustentabilidade, ciencia e tecnologia e cultura de paz. A construção de parcerias de forma mais ampla – com a comunidade, as universidades e entidades de apoio – foi destaque no plano de ações. A “Escola de Pais” foi eleita forte aliada no relacionamento com a comunidade. A metodologia de investigação apreciativa causou surpresa, pelo fato de propor uma nova abordagem para os processos de mudança. Os professores sentiram-se agentes do processo, não apenas meros executores das políticas pré-definidas e impostas.
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Há muitas ações importantes e significativas sendo realizadas pelas escolas – o ambiente proporcionado pela IA possibilitou a apreciação e valorização das experiências positivas para, então, buscar um cenário almejado. O momento da descoberta sobre as vivências mais agradáveis, as competêmcias mais valorizadas, enfim, aquilo que dá vida ao sistema, é uma experiencia gratificante e contribui para estabelecer uma atmosfera positiva entre os participantes. Conclusão A metodologia mostrou-se válida no sentido de focar nas potencialidades das atividades escolares e assim, levar os educadores a exercitarem a esperança em um futuro repleto de possibilidades positivas. A partir do cenário de possibilidades, foi possível construir um plano de ação que levasse mais rapidamente à concretização do sonho coletivo. Trata-se, portanto, de exercitar o otimismo e a esperança e, dessa forma, facilitar o aprendizado empreendedor, que é possibilitado por um indivíduo atuando não só como professor, mas também como agente desse processo em parceria com aqueles que são os principais atores: os futuros empreendedores.
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Referências Bibliográficas COOPERRIDER, David L.; WHITNEY, Diana. Investigação Apreciativa – Uma abordagem positiva para a gestão de mudanças. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2006. COOPERRIDER, David L; STAVROS, Jacqueline M; WHITNEY, Diana. Manual da Investigação Apreciativa. Rio de Janeiro: QualityMark, 2009. CHERNEY, J. K. Appreciative Team Building: Creating a Climate for Great, em http://teambuildersplus.com/articles/creating-a-climate-for-greatcollaboration, acesso em 10 de setembro de 2014. DOLABELA, Fernando. Oficina do Empreendedor. São Paulo: Cultura, 1999. ______. Pedagogia empreendedora - o ensino do empreendedorismo na educação básica voltado para o desenvolvimento sustentável. São Paulo: Editora de Cultura, 2003. FILION, Louis Jacques. Empreendedorismo: empreendedores e proprietários-gerentes de pequenos negócios. Revista de administração, São Paulo, v. 34, n. 2, p. 05-28, abril/junho, 1999. https://www.youtube.com/watch?v=1e-6_QTig6c, acessado em 10 de julho de 2008. DRUCKER, Peter Ferdinand. Inovação e espírito empreendedor (entrepreneurship): prática e princípios. Tradução de Carlos J. Malferrari. São Paulo: Pioneira, 1986. WATKINS, Jane Magruder, MOHR, Bernard J. Appreciative Inquiry: Change at the Speed of Imagination. San Francisco, CA: Jossey-Bass/Pfeiffer, 2001.
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Pedagogia Empreendedora e suas implicações na rede municipal de Londrina Luzimar dos Santos Ribeiro Mazetto Rosi Sabino
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo trazer elementos para a compreensão do ensino de empreendedorismo no ensino fundamental I na Rede Municipal de Educação de Londrina por meio da metodologia da Pedagogia Empreendedora. Tal proposta é baseada nos estudos de Fernando Dolabela, o qual busca desenvolver a cultura empreendedora na sociedade pautandose na educação escolar. A metodologia atende os alunos dos anos iniciais de educação infantil, a partir dos 4 anos de idade estendendo-se até o quinto ano do ensino fundamental. A pedagogia empreendedora contempla a formulação do sonho individual e coletivo e a busca da realização do mesmo por meio da postura e comportamentos empreendedores. Este artigo também tem como objetivo apresentar, brevemente, o conceito de empreendedorismo a partir de sua origem, a sua evolução conceitual enquanto empreendimento de vida e alguns resultados alcançados na rede municipal de Educação de Londrina, Paraná. Palavras-chave: Empreendedorismo, Sonho, Realização Pessoal.
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1. Introdução A palavra “empreender” vem do latim imprehendere, que significa prender nas mãos, assumir, fazer. Disso derivam as palavras “empreendedor” e “empreendedorismo”, dentre outras. A primeira, com o sufixo “or”, designa o agente, indivíduo que, no caso, empreende. Ou seja, empreendedor é aquele que assume a realização de uma determinada tarefa e, na sociedade capitalista, passou a designar um tipo de empresário, de quem se pode dizer que possui iniciativa e criatividade para correr os riscos de iniciar e efetivar uma determinada atividade produtiva. Já a palavra empreendedorismo, tendo o sufixo “ismo”, diz respeito a uma doutrina, escola ou teoria. Sendo assim, trata-se do princípio, doutrina ou teoria característica da ação de pessoas que possuem iniciativa de começar algo potencialmente arriscado. Pesquisas apontam que os Estados Unidos foram pioneiros na introdução do tema empreendedorismo no currículo escolar. A atuação do Professor Myles L. Mace ganha especial destaque por ter criado o primeiro curso de empreendedorismo em Harvard (e provavelmente em outras escolas), em 1947, com o título de The Management of New Enterprises. Schumpeter também contribuiu com as aulas de empreendedorismo que lecionava já no ano de 1932, a partir da obra do economista Francis Walker Question, publicada em 1876. Em 1953, Peter Drucker, na Universidade de Nova York, iniciou um curso de empreendedorismo que além da gestão de pequenas empresas, explora também a questão da inovação. Em 1974, Karl Vésper reportava a existência de 104 cursos em universidades nos Estados Unidos. Próximo ao ano 2000, já eram 1.400 cursos. Atualmente o ensino relacionado ao empreendedorismo extrapola a administração das empresas e abrange outros temas e metodologias. No Brasil, o professor Ronald Degen foi o primeiro a introduzir um curso de empreendedorismo, com foco na criação de negócios. A disciplina foi ministrada em um curso de especialização da Escola de Administração de empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. Outros conceitos de empreender ou empreendedorismo podem ser encontrados em diversas
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literaturas. A Pedagogia Empreendedora desenvolvida por Dolabela (2003) apresenta-se como uma proposta de educação comprometida com o desenvolvimento humano, social e sustentável com foco principal no indivíduo como protagonista da própria vida. O elemento norteador é o despertar de um sonho estruturante, que orientado para a realização positiva possa trazer contribuições para a sociedade como um todo. 2. Desenvolvimento O projeto da Pedagogia Empreendedora iniciou-se efetivamente na Rede Municipal de Educação no ano de 2010, com a contratação do Prof. Fernando Dolabella. A iniciativa foi resultado de diversos movimentos em prol do desenvolvimento de Londrina desde o final da década de 90. Dentre eles, podese mencionar o Projeto Londrina Tecnópolis, com as iniciativas da Plataforma do Conhecimento voltadas para a promoção da cultura de empreendedorismo e inovação em Londrina e Região. Posteriormente, a intensa articulação da sociedade civil organizada, representada pelo Fórum Desenvolve Londrina, por meio de estudos realizados entre os anos de 2007 e 2008, apontou o ensino do empreendedorismo nas escolas como um importante vetor de desenvolvimento social e indutor do desenvolvimento econômico. Assim, em 2009, o poder público municipal comprometeu-se a introduzir as atividades de empreendedorismo nas escolas municipais. A primeira etapa do projeto foi a realização do Seminário de Transferência da metodologia, com duração de 20 horas. Essa atividade envolveu todos os professores da rede municipal de ensino e teve como foco central nivelar o conhecimento dos professores acerca do conteúdo e proposta de trabalho. A metodologia da Pedagogia Empreendedora concebe o empreendedorismo como uma forma de ser, mais do que uma forma de fazer. Propõe desenvolver o potencial dos alunos para serem empreendedores em qualquer atividade que escolherem. Cabe ao aluno, e somente a ele, fazer opções pessoais e profissionais, decidindo que tipo de empreendedor será.
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A metodologia elege como tema central não o enriquecimento pessoal, mas a preparação do indivíduo para participar ativamente na construção do desenvolvimento social, seja por meio da cooperação, da cidadania, da geração e da distribuição de renda, conhecimento e poder, com vistas à melhoria da qualidade de vida da população e a eliminação da exclusão social. Para concretizar esse propósito a metodologia busca despertar no aluno um sonho estruturante, ao mesmo tempo que incentiva atitudes que contribuam para a realização do mesmo. Pretende-se que o aluno desenvolva o protagonismo sobre a própria vida de forma que perceba relação entre o conteúdo que aprende na escola com a sua vida real. Dessa forma, o processo de ensino aprendizagem toma uma dimensão mais significativa para o aluno. A missão da Pedagogia Empreendedora é criar instrumentos de apoio ao desenvolvimento humano, social e econômico sustentável, por meio da introdução do ensino de empreendedorismo na educação básica, como metodologia de desenvolvimento do espírito empreendedor em todas as áreas da ação humana. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96): “Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Dentre os pilares da Educação, constantes no Relatório da Reunião Internacional da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) retomados em 2010, sendo eles aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser, destacamos o terceiro: aprender a conviver. Para Dalben e Castro, “(...)aprender a viver juntos ou conviver com os outros se constitui como o terceiro pilar e um grande desafio para os educadores. É tarefa da educação a responsabilidade de formar cidadãos capazes de enfrentar preconceitos dialogicamente e criticamente, no intuito de fazer com que nossa sociedade seja mais justa e solidária (…) “A diminuição da violência e a
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busca da paz tornam-se objetivos permanentes da escola e da sociedade. O aprender a viver juntos traduz a preocupação de compreender o diferente, de argumentar, de dialogar, de negociar e participar de programas culturais para um convívio mais fraterno e enriquecedor entre pessoas diferentes.” (2010, p.56 - 57)
Conforme o documento “O Adolescente e, conflito com a Lei – Prevenção, Ressocialização e Medidas Socioeducativas” publicado pelo Fórum Desenvolve Londrina em 2011, é preciso refletir acerca das prioridades quanto ao trabalho com as crianças e adolescentes. Entre as soluções eleitas estão: “Rever o papel da escola quanto à transmissão de valores, incluindo atividades educativas de natureza transversais, como: ética, valores humanos, cidadania, afetividades, sonhos e espiritualidade, visando criar um ambiente preventivo, estendendo-o para a efetiva participação dos pais e familiares; Valorizar os professores da educação básica, bem como capacitá-los para a mediação de conflitos em sala de aula”. (p.33)
Desta forma, empreendedorismo pode ser definido como uma postura diferenciada perante a vida, um estado de espírito, um modo de ser e agir, uma forma determinada de encarar o mundo, na qual a pessoa assume uma postura ousada, criativa, confiante tanto no trabalho quanto no cotidiano da vida pessoal (cf. DOLABELA, 1999; ACÚRCIO; ANDRADE, 2005). Para Fernando Dolabela, “o empreendedor é definido pela forma de ser, e não pela maneira de fazer” (2008, p. 13). É imprescindível pensar em três aspectos fundamentais para que a proposta da uma educação empreendedora possa alcançar resultados satisfatórios. A prática escolar assim tem atrás de si condicionantes sociopolíticos que configuram diferentes concepções de homem e de sociedade e, consequentemente, diferentes pressupostos sobre o papel da escola, aprendizagem, relações professor-aluno, técnicas pedagógicas etc. De acordo com Libaneo,(1988), a democratização da escola pública significa ajudar o aluno se expressar bem, a se comunicar, desenvolver o gosto pelo estudo, a dominar o saber escolar; é ajudá-los na sua formação da personalidade social, na sua organização enquanto coletividade.
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O primeiro aspecto é pensar a escola enquanto formadora de pessoas capazes de garantir sua sobrevivência e sucesso. O professor é quem deve fazer a ponte entre o estudo dos conceitos e características empreendedoras criando possibilidades para o desenvolvimento dessas características. Para tanto, os professores são subsidiados com um caderno pedagógico composto por 36 atividades que podem ser aplicadas semanalmente. As atividades oportunizam a interdisciplinaridade envolvendo todas as áreas do conhecimento: língua portuguesa, matemática, ciências, geografia, história, arte, educação física, ensino religioso. Nessa perspectiva, com o intuito de capacitar e motivar os docentes a desenvolverem as propostas, é ofertada a Oficina do Professor Empreendedor com o tema A Vez e a Voz do Professor. O objetivo é desenvolver atitudes e características empreendedoras nos docentes de forma que este seja capaz de compreender que a educação empreendedora acontece a partir do processo do Ser. O “fazer” será a consequência desta postura interior. Dessa forma, a escola lança mão de variadas estratégias pedagógicas que incluem atividades extraclasse, estimulando a participação e o envolvimento de toda a sociedade. A parceria da comunidade escolar com o setor empresarial é altamente benéfica, pois possibilita a criação e o fortalecimento de uma rede de suporte à consecução do sonho individual dos alunos, do sonho coletivo da comunidade escolar e ainda, gera impactos amplamente positivos na comunidade como um todo. O segundo aspecto contempla a parceria da escola com a família no processo de desenvolvimento do aluno enquanto sujeito empreendedor. Esta proposta segue a Lei Municipal 11.676 de 9 de Agosto de 2012, Art. 1º: “Fica o Executivo Municipal autorizado a criar o programa Escola de pais, sob a gestão da Secretaria Municipal de Educação, para “disponibilizar informações que favoreçam o despertar de aptidões e interesses na busca de atividades laborais e geração de renda; e promover palestras debates e cursos com enfoque no desenvolvimento de crianças e adolescentes”.
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Nesta linha de pensamento, Tiba (2010, p. 167) propõe que “no âmbito familiar os pais podem ensinar uma criança a empreender e para isso é preciso desenvolverem dentro de si essa competência”. Para suprimir essa necessidade a Secretaria Municipal de Educação de Londrina passou a desenvolver o projeto Escola de Pais: Repensar a família, um Gesto Empreendedor. Dessa forma, a família pode ter o seu espaço de reflexão sobre as atitudes e comportamentos junto aos seus filhos, no intuito de educá-los para serem protagonistas de suas vidas. O terceiro aspecto é, do ponto de vista dos autores, o fator fundamental para que a Pedagogia Empreendedora seja efetiva junto aos alunos: a ação docente. É consenso na literatura a reflexão sobre a importância da prática docente e o papel do professor enquanto mediador da aprendizagem junto aos seus alunos. Assim, é fundamental criar oportunidades para que o professor possa refletir sobre o seu papel enquanto profissional. Mais ainda, o seu papel enquanto ser humano investido de uma função profissional cujo instrumento fundamental são pessoas. É necessário que sejam criados espaços para o professor ser ouvido, apreciado e respeitado. É preciso que ele tenha condições de entrelaçar o conteúdo que vai ensinar com uma prática humanizadora. A atividade docente é permeada de expectativas, acertos e também erros que são parte de um processo de intensa aprendizagem, no qual confundemse os papeis, uma vez que ensinando se aprende. Ao mesmo tempo em que ouve, também se é ouvido. O exercício de compartilhar sonhos e vislumbrar possibilidades pode ser compreendido não apenas como uma prática profissional, mas uma prática inerente ao ser humano. Neste ponto, não faz diferença se os objetivos são coletivos ou subjetivos. O mais importante é a possibilidade de desenvolver uma transição de conceitos comuns, que podem ser formados pela e para a própria equipe escolar. É necessário aos profissionais da educação a oportunidade de ampliar a consciência e identificar as próprias habilidades empreendedoras, para, a partir daí, adotar uma postura diferenciada e contribuir para o fenômeno da ação empreendedora no âmbito escolar. (DALBEN e CASTRO; 2010)
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Para Zagury (2006, p.22), “O professor precisa ser ouvido. Falam tanto em afeto em relação ao aluno, por que não se ter afeto também em relação ao professor?”. Refletir sobre as possibilidades profissionais e oportunizar um espaço para a busca dos sonhos pessoais poderá ser uma oportunidade de integrar conhecimento de si e do outro, compreensão sobre sua maneira de pensar e agir entendendo também o que o outro possa lhe causar. É também uma oportunidade da descoberta de potencialidades existentes dentro de si, oferecendo espaço ao professor para validação própria e consciente do papel que ocupa na sociedade e na vida do seu aluno. De acordo com Delors (1999): “Quando se trabalha em conjunto sobre projetos motivadores e fora do habitual, as diferenças e até os conflitos interindividuais tendem a reduzir-se, chegando a desaparecer em alguns casos. Uma nova forma de identificação nasce destes projetos que fazem com que se ultrapassem as rotinas individuais, que valorizem aquilo que é comum e não as diferenças.”( p.98)
Partindo de uma visão holística da educação, pensando no desenvolvimento total da pessoa – espírito, corpo, inteligência, afetividade, é fundamental pensar que, propor uma educação mais humanizadora implica na percepção do professor como ser participativo, comprometido com a transformação social na direção de um viver mais humano. Para responder à necessidade de relações mais humanizadas, não basta dispor de teorias explicativas. São necessárias estratégias e competências que possibilitem responder, na prática, às expectativas detectadas junto aos alunos e aos professores. De acordo com Dolabela, na proposta da Pedagogia Empreendedora, cuja ênfase está no auto-aprendizado, a importância do professor é reforçada uma vez que cabe a ele ampliar as referências e fontes de aprendizado e redefinir o próprio conceito do saber. “As relações sociais e a vida pessoal impregnadas pela emoção constituem a matéria-prima do sonho e a base mais rica para dar significado aos conteúdos escolares.”
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Esse enfoque requer mudanças de modelo mental que reflitam atitudes diferenciadas. Toda mudança, além de conhecimento e de técnicas, requer motivação, empenho, comprometimento com a aprendizagem constante. São essas atitudes que podem contribuir para uma educação responsável e coerente. 3. Avaliação e resultados A partir das observações dos professores que atuam como multiplicadores da proposta da P.E. nas unidades escolares da rede Municipal de educação de Londrina, é possível observar alguns pontos extremamente importantes para os resultados satisfatórios da proposta. Em primeiro lugar, foi observado que, o projeto A VEZ E A VOZ DO PROFESSOR, está sendo um espaço de autoconhecimento fundamental no processo da Pedagogia Empreendedora. Conhecer as próprias potencialidades abre espaço para o desenvolvimento do sonho individual e do sonho coletivo entre a equipe de trabalho. Ao mesmo tempo que contribui para a construção de uma identidade coletiva investida de força e energia positiva capazes de despertar nos docentes o seu protagonismo na história de educação, assim como a liderança pessoal como parte fundamental deste processo. Os professores têm relatado a importância destes momentos também como espaço para fortalecer os vínculos do grupo, tornando-os capazes de construir objetivos comuns para obtenção de resultados significativos. Neste contexto, a diversidade pode ser entendida sob a perspectiva de rede de competências, que somadas potencializam ainda mais as ações positivas na direção dos resultados almejados. Em relação ao processo da P.E. junto aos alunos da educação infantil e do ensino fundamental, os professores conseguem perceber que os mesmos estão conseguindo dar maior significado aos conteúdos que aprendem na escola, uma vez que estabelecem uma relação direta entre o conhecimento e o caminho para a realização do seu sonho. As aulas da P.E. têm sido prazerosas e esperadas pelos alunos. É o momento em que eles podem se expor, falar de si, da sua rotina, de sua família e também de suas necessidades e expectativas.
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É um momento rico, que tem contribuído para que os alunos compreendam a importância da colaboração, da cooperação e do respeito mútuo para alcançar seus sonhos. As parcerias realizadas com empresas, as entrevistas realizadas com empreendedores locais, as aulas extraclasse são oportunidades que contribuem significativamente na aprendizagem, enriquecendo o processo da P.E. Ao conhecer as histórias de pessoas que ousaram sonhar e, que diante dos obstáculos persistiram e concretizaram seus sonhos, os alunos sentemse inspirados pelo exemplo e adotam os personagens dessas histórias como modelos a serem seguidos. 4. Conclusão Após levantamento de dados e reflexão sobre a significância da implantação da P.E. na Rede Municipal de Educação de Londrina, é possível concluir que estamos alcançando avanços significativos dentro do processo. Embora haja ainda algumas resistências de professores em desenvolver a proposta, muitos tem desenvolvido trabalhos significativos com seus alunos. Gradativamente, os objetivos da metodologia vão sendo compreendidos e incorporados na prática pedagógica: É perceptível que há um longo caminho a ser percorrido ainda. Disseminar uma cultura empreendedora na sociedade é um grande desafio. Daí a necessidade de amplo envolvimento da sociedade nos diversos níveis representativos. Afinal, transformar a sociedade por meio do empreendedorismo requer comprometimento amplo, ação contínua e estruturada, políticas públicas que deem sustentação às atividades e, principalmente, monitoramento dos resultados, para que as ações sejam cada vez mais efetivas no sentido de criar capital humano para uma sociedade cada vez mais dinâmica e consciente sob o ponto de vista do desenvolvimento social, ambiental e econômico. Neste sentido, o trabalho na Rede Municipal de Educação está apenas começando.
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Referências Bibliográficas CARDOSO, C. A Canção da Inteireza. Uma visão holística da educação. São Paulo: Summus editorial, 1995. CODO, W. Educação: Carinho e Trabalho. Petrópolis: Vozes, 1999. COLL, C. Desenvolvimento Psicológico e Educação. Psicologia da Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. v. 2. CUNHA, M. I. O Bom Professor e sua prática. Porto Alegre: Papirus, 2001. DOLABELA, F. Pedagogia Empreendedora. São Paulo. Editora de Cultura, 2003. DELORS, J. Educação um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 1999. DEMO, P. Saber pensar. São Paulo: Cortez ,2002. FERNÁNDEZ. A. A Mulher Escondida na Professora. São Paulo: Artmed, 2001. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996. GOLEMAN, D. Inteligência Emocional. Rio de Janeiro: Editora Objetiva.1995. HARDY, M. Toda criança pode aprender. Revista Pátio. São Paulo, p. 25-27, maio junho 2004. KULLOK, M. G. B. Relação Professor Aluno: Contribuições à prática pedagógica. Maceió: Ufal, 2002. LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da Escola Pública. São Paulo: Loyola, 1998. LOPES, Rose Mary A. Lopes. Educação Empreendedora - conceitos, modelos e práticas. Campus. Sebrae.2010.
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AINTEC e o empreendedorismo na escola Maíra Bendlin Calzavara
RESUMO: O artigo relata a importância da AINTEC, criada a partir da Lei de Inovação, enquanto vetor do relacionamento academia-empresa e sua experiência no desenvolvimento do projeto empreendedorismo na escola, que prevê a inserção da metodologia da pedagogia empreendedora em turmas do ensino fundamental. Palavras-chave: Agência de Inovação, Instituição científica e tecnológica, Pedagogia Empreendedora.
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A AINTEC, Agência de Inovação Tecnológica da Universidade Estadual de Londrina - UEL, foi criada em 17 de abril de 2008, pautada na Lei 10.793, publicada em 2 de dezembro de 2004, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, comumente conhecida como Lei de Inovação. O Estado do Paraná somente editou sua Lei de Inovação em 24 de Setembro de 2012 – Lei 17.314 –, tendo replicado as principais disposições da lei federal, sem alteração significativa de conteúdo. Embora anteriormente tenham sido editadas outras leis de fomento à inovação, tais como a como a Lei n. 8.248/91, a Lei n.8.661/93, dentre outras, a Lei n.10.793/04 foi pioneira em reunir todos os três atores envolvidos na PD&I (pesquisa, desenvolvimento e inovação), quais sejam, Estado, setor produtivo e instituições científicas e tecnológicas (ICT), o denominado “Triângulo Sábato”. Para utilizar as ferramentas legais de apoio e incentivo à inovação, a AINTEC1 vale-se da definição de inovação prevista no Manual de Oslo, que inspirou as leis brasileiras de inovação: “Uma inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo método de marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas.2 ”
Assim, tem-se que inovação pode ser desenvolvida pela própria empresa ou adquirida de outra empresa ou instituição, no caso a própria AINTEC. Os resultados tecnológicos podem decorrer de combinações de tecnologias existentes, de novas formas de aplicação das tecnologias ou de pesquisas realizadas pela empresa que gere tecnologia completamente nova. Embora a Lei 10.973/2004 defina inovação de forma mais sintética, como a “introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo ou social que resulte em novos produtos, processos ou serviços3”, também valida a importância de inserir a inovação nas cadeias produtivas. A AINTEC não pode ser considerada tecnicamente uma ICT, já que não possui personalidade jurídica própria, mas entendemos que ela, por órgão de inovação da UEL, será tratada neste artigo como ICT. 2 OECD. Manual de Oslo – Diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. p.55 3 Lei 10.973 de 02 de dezembro de 2004. Publicada no DOU de 3.12.2004. artigo 2º, IV. 1
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Para alcançar seu objetivo principal, a AINTEC busca fomentar parcerias para promover a cultura de inovação e desenvolvimento industrial, unindo governo, academia e empresas sob diversas formas legais a serem consolidadas por meio de instrumentos jurídicos próprios, principalmente envolvendo atores na qualidade de pessoas jurídicas. Conforme constata André Luis de Sá Nunes4, diferentemente do que ocorre com o sistema legal francês, inspirador das normas brasileiras, o Brasil buscou estabelecer parcerias em nível institucional: A segunda diferença é em relação à orientação da interação da pesquisa pública com a iniciativa privada. Na França essa interação se dá em um nível individual (pesquisadores) e estes se deslocam ou deslocam suas atenções da pesquisa pública para a iniciativa privada. No Brasil essa iniciativa tem um caráter mais institucional (entre empresas e ICTs), com a iniciativa privada se deslocando para o ambiente da pesquisa pública (mediante acordos de cooperação e de prestações de serviços).
Não que a lei brasileira exclua as pessoas físicas, como o inventor independente, figura essa expressamente prevista no art.2º, IX e com ferramentas de estímulo indicadas no art.22; ocorre que nossa lei prioriza as relações entre entidades (públicas ou privadas). Neste contexto, pode-se observar que a atenção da Lei de Inovação5 está voltada à ICT, assim definida: Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se: V - Instituição Científica e Tecnológica - ICT: órgão ou entidade da administração pública que tenha por missão institucional, dentre outras, executar atividades de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico;
Por essa definição, ICT possui apenas natureza pública, mas isso não significa que entidades privadas que tenham por objetivo a pesquisa, desenvolvimento e inovação tenham sido excluídas da Lei. Há outras leis 4 5
http://dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/handle/1884/23985/Dissertacao_AndreNunes_UFPR.pdf, acesso em 27/05/2014. p.64 Lei 10.973 de 02 de dezembro de 2004. Publicada no DOU de 3.12.2004.
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relacionadas à inovação, como a Lei do Bem, que previu de forma expressa a participação de entidades privadas com fins não econômicos, ou ainda vai-se mais adiante, como na Lei de Inovação do Paraná6, que incluiu até entidades de pesquisa com fins lucrativos. Para fins de realizar atividades inerentes à ICT, a AINTEC está dividida em três unidades: a Divisão de Incubação de Empresas, onde está alocada a Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (INTUEL) e as Empresas Juniores Associadas (EJA), a Divisão de Propriedade Intelectual, que conta com o Escritório de Propriedade Intelectual (EPI) e o Escritório de Design (EDn), e a Divisão de Transferência de Tecnologia (ETT), com seu Escritório de Transferência de Tecnologia (ETT), além da Secretaria Executiva (SE). A AINTEC, enquanto órgão da UEL, está ligada diretamente ao Gabinete do Reitor, possuindo certa autonomia e agilidade, o que aprimora a interação universidade-setor produtivo. Embora haja inúmeras experiências classificáveis como cases de sucesso, o objetivo deste artigo não é só ressaltar o papel fundamental da AINTEC enquanto promotora da inovação, mas também relatar o projeto intitulado Empreendedorismo na Escola. Referido projeto possui aspecto social e é parte integrante do Programa de Empreendedorismo da AINTEC, incluído nas atividades do Convênio firmado junto ao MEC/SESU, nº 701429/2011 , intitulado “Fortalecimento da cultura empreendedora e de inovação na INTUEL e na Agência de Inovação Tecnológica da UEL, AINTEC ”. Inicialmente, em suas duas primeiras edições ocorridas em 2006 e 2010, o projeto foi desenvolvido junto ao Colégio de Aplicação da UEL. A edição deste ano de 2014 é realizada em parceria com a Escola Municipal Santos Dumont, na cidade de Londrina, sempre com foco em alunos da 4ª e 5ª séries do ensino fundamental.
Lei n.17.314/12, publicada em 24 de setembro de 2012, art.2º Art. 2º Para os efeitos desta Lei considera-se: (...) XVIII - – Entidade Científica, Tecnológica e Inovação privada do Estado do Paraná (ECTI): entidade privada com ou sem fins lucrativos do Estado do Paraná, legalmente constituída, que tenha por missão institucional executar, dentre outras, atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação; 6
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O projeto é pautado na educação empreendedora, conhecimento inovador e espírito transformador, enquanto condicionantes para o surgimento de mudanças benéficas aos alunos e a construção de um futuro mais promissor. Ainda encontra amparo nos quatro pilares da educação que constam do Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI: aprender a saber, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. A justificativa do projeto parte da cultura empreendedora, capaz de transformar espaços e ambientes. Especialmente em relação às crianças, é possível percebê-los enquanto atores do processo de construção da cidadania e promotores de uma sociedade mais produtiva, inovadora e capaz de gerar melhorias econômicas e sociais para a comunidade. Nesse sentido, o projeto é inspirado nas lições de Fernando Dolabela, que prevê o desenvolvimento do empreendedorismo pautado no direito de realizar o sonho e possíveis formas de realização: “Por isso, só o sonho (ou a ideia) não é suficiente para configurar uma ação empreendedora: é preciso transformá-la em algo concreto, viável, sedutor por sua capacidade de trazer benefícios para todos, o que lhe dá o caráter de sustentabilidade.7 ”
Nas três edições desse projeto, as ações realizadas com as crianças foram orientadas por um profissional pedagogo e envolviam temas como: significado de empreendedorismo, Mapa do Sonho, viabilidade do sonho, estratégia para obter recursos, avaliação do aluno, dentre outros. A AINTEC buscou fomentar a participação de parceiros estratégicos, além de ter realizado eventos para lançamento das edições, executou extensas atividades de divulgação do projeto interna e externamente à UEL, contou com apoio de universitários voluntários e doação de prêmios, sendo que no fechamento das duas primeiras edições, foram promovidas Feiras de Empreendedorismo, para que as crianças expusessem o produto de seus sonhos. 7
DOLABELA, Fernando. Pedagogia empreendedora. São Paulo: Editora Cultura, 2003. p.29.
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Com esse projeto, os estudantes obtiveram conhecimento teórico e prático acerca do empreendedorismo, bem como se contribuiu para geração de um ambiente de comprometimento nas aulas e na cultura de inovação. Houve sensível aumento do interesse e participação dos alunos, já que o desenvolvimento dos sonhos e do espírito empreendedor estava sempre atrelado a conteúdos interdisciplinares. Não bastasse, notou-se aumento significativo da autoestima das crianças, vez que puderam projetar novos ideais e a possibilidade de mudar seu entorno. Referências Bibliográficas BRASIL. Lei n. 10.973, de 02 de dezembro de 2004. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 03 de dezembro de 2004. DOLABELA, Fernando. Pedagogia empreendedora. São Paulo: Editora Cultura, 2003. FIGUEIREDO, P.. O “triângulo de Sábato” e as alternativas brasileiras de inovação tecnológica’. Revista de Administração Pública, Brasil, 27, mai. 2013. p. 87. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/ view/8659/7390. Acesso em: 25 Jun. 2014. NUNES, André Luis de Sá. Mudanças promovidas pela Lei da Inovação nas funções e práticas de gestão dos intermediadores da cooperação universidade-empresa das universidades federais. Disponível em http:// dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/handle/1884/23985/Dissertacao_ AndreNunes_UFPR.pdf. Acesso em 27 de maio de 2014. ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Manual de Oslo – Diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. 3. ed. Paris: OCDE, 2005. PARANÁ. Lei n. 17.314, de 24 de setembro de 2012. Diário Oficial do Paraná, Poder Legislativo, Curitiba, PR, 24 de setembro de 2012.
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Programa Empresário Sombra: um modelo educativo para a formação cidadã Ariana Almeida Quelho Cassiana Stersa Versoza-Carvalhal
RESUMO: O Projeto Empresário Sombra Por um Dia é um projeto desenvolvido pela Junior Achivement e que tem como objetivo o desenvolvimento do empreendedorismo em alunos do Ensino Médio, por meio da vivência de um dia de trabalho de um empresário, acompanhado-o em todas as suas atividades. Essa metodologia baseia-se no processo de modelação, processo de aprendizagem pelo qual um observador aprende valores, crenças e comportamentos por meio de um modelo. Em 2013 esse projeto foi realizado pelo Conselho do Jovem Empresário da Associação Comercial e Industrial de Londrina (CONJOVE-ACIL) em parceria com a Junior Achivement. Oito alunos do Colégio Estadual Professora Maria do Rosário Castaldi acompanharam a rotina de uma dia de oito jovens empresários membros do CONJOVE-ACIL de diversas áreas de atuação. O projeto permitiu transmitir aos alunos participantes o dia-a-dia e as responsabilidades de um jovem empreendedor, entendendo que a formação humana é uma construção social e que grande parte do que somos é aprendido por meio dos exemplos que recebemos. Palavras-chave: Modelação, Junior Achivement, Empreendedorismo.
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Comumente tratamos os interesses, as crenças e os valores das pessoas como algo inerente a elas e que são a causa, ou seja, a explicação do por que as pessoas se comportam de uma ou outra maneira. Nessa perspectiva, justificamos o que as pessoas fazem ou as decisões que tomam dizendo que “ela é assim mesmo, não há o que fazer”, por exemplo. Por outro lado, diversas teorias psicólogicas como as de B. F. Skinner (1953) e de A. Bandura (1965ª, 1972), postulam que o desenvolvimento humano se dá na sua interação com o meio e, portanto, o modo como nos comportamos bem como os valores, as crenças e os interesses que possuímos são construídos socialmente, na interação com as pessoas e com o mundo em que vivemos. Essa perspectiva nos possibilita sermos sujeitos ativos tanto do nosso próprio desenvolvimento quanto do desenvolvimento de outrem, uma vez que podemos estabelecer ou proporcionar experiências que permitam o desenvolvimento de certos comportamentos ou valores. É dentro dessa visão em que o homem é sujeito de sua formação, que a Junior Achivement desenvolve seus projetos. Junior Achievement: compromisso empreendedorismo aos jovens
em
disseminar
o
Criada nos Estados Unidos, em 1919, por Horace Moses e Theodore Vail, presidentes da Strathmore Paper Company e da AT&T, respectivamente, a Junior Achievement é uma fundação educativa sem fins lucrativos, mantida pela iniciativa privada. “A vida é um caminho, não um destino e você é o arquiteto do seu caminho.” Essa é a filosofia da Junior Achievement, que acredita na capacidade e potencialidade do ser humano e incentiva os jovens a adotarem responsabilidade pelos próprios destinos, determinação de objetivos específicos, realistas e ambiciosos, atuação na busca das metas, coragem para correr riscos, perseverança e confiança em si próprios. Hoje está presente em mais de 120 países, em todas as capitais dos estados brasileiros e atende mais de 10 milhões de jovens por ano, preparando-os para serem futuros empreendedores. Os programas são desenvolvidos em sala de aula, por meio de encontros semanais, e são ministrados por consultores voluntários, treinados pela Junior Achievement. São quase 30 programas com temas como: Introdução
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ao Mundo dos Negócios, Economia Pessoal, Empresa em Ação, Vantagens de Permanecer na Escola, Ética, Miniempresa, Liderança Comunitária e o Empresário Sombra Por um Dia. Esses programas são voltados para Ensino Fundamental e Médio. Um dos principais programas da Junior Achievement, o Miniempresa, tem 15 jornadas semanais, organizadas em grupos de, aproximadamente, 25 alunos. Esses alunos determinam qual produto será desenvolvido para comercializarem, levantam capital com venda de ações, organizam a administração, elegendo um presidente e seus diretores e recrutam recursos humanos. Os alunos são responsáveis pela produção, finanças, marketing e vendas; compram a matéria-prima; produzem e vendem, buscando o máximo de produtividade e rentabilidade; pagam salários; recolhem encargos e impostos, que são doados a instituições assistenciais. No final do programa, a empresa é encerrada e o resultado financeiro é dividido entre os acionistas. O Programa Miniempresa tem como objetivo “desenvolver o espírito empreendedor, capacidade de liderança, perseverança, determinação, responsabilidade, coragem de correr riscos e trabalho em equipe”. Os alunos aprendem a identificar as necessidades do consumidor, os conceitos de oferta e demanda e a valorização do lucro. Outros programas são: O Management and Economic Simulation Exercise (MESE) — Exercício de Simulação Administrativa e Econômica. É um jogo de empresas, via Internet, para alunos do ensino médio e universitários, que possibilita aos participantes operar suas próprias empresas em um ambiente que reproduz o mercado de negócios. Para participar, os alunos formam equipes de três a cinco integrantes. São empresas que produzem o mesmo produto e que concorrem entre si no mercado, em oito rodadas semanais. Apoiadas por um software, as equipes recebem relatórios com as tendências do mercado, o desempenho dos concorrentes e as variáveis de custos e preços. Decidem sobre o preço, quantidade a ser produzida, investimentos em marketing, melhoria do produto e aumento da capacidade de fábrica. As decisões são analisadas, e são apontados os melhores desempenhos.
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O Global Learning of the Business Enterprise (GLOBE) — Aprendizado Global da Empresa de Negócios. Esse programa associa estudantes de dois países para formar uma empresa importadora e exportadora. Prepara os jovens para o processo de globalização, por meio exercício das técnicas do mercado exterior. O programa tem duração de 21 semanas. Os estudantes trabalham o processo de capitalização pela venda de ações, escolhem um nome para a empresa e elegem seus dirigentes. Concluída essa fase, entram em contato com a empresa estrangeira e analisam as propostas dos produtos que serão exportados e importados. Fecham-se acordos e as vendas são definidas. No final do programa, a empresa é encerrada. Esse programa desenvolve a “compreensão dos princípios do mercado internacional; promove experiências com trâmites alfandegários; treina habilidades de comunicação, análise e tomada de decisões e, estreita relações com diferentes culturas”. O Núcleo de Ex-Achievers (NEXA). Os ex-Achievers que fazem parte do NEXA são aqueles estudantes que participaram anteriormente de Programas da Junior Achievement e resolveram continuar integrados à associação. Esse núcleo visa o “desenvolvimento contínuo” dos ex-alunos com a associação e o empresariado. O NEXA promove visitas a grandes empresas, possibilitando contato direto com as técnicas de produção, organização e administração, palestras e seminários com executivos e empreendedores, programas de integração, desenvolvimento em equipe, dinâmicas em grupos e cursos, eventos e congressos nacionais e internacionais. As atividades oferecidas pelos projetos e programas das empresas nas escolas apresentam um escalonamento similar à seriação. Os temas e conteúdos que interessam às empresas e às demandas de mercado são inseridos nas disciplinas tradicionalmente dispostas nas instituições educativas. Nesse movimento, a empresa reterritorializa-se na escola. Programa Empresário Sombra Por um Dia A formação e o desenvolvimento humano em interação com o mundo em que vivemos se dá de diferentes formas como, por exemplo, pelas consequências de nossas experiências diretas. A Teoria da Aprendizagem
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Social, de Albert Bandura, postula que uma das principais formas pelas quais a aprendizagem de novos comportamentos, de valores e de crenças ocorre é a partir do exemplo de outras pessoas. A esse processo específico de aprendizagem dá-se o nome de Modelação, que é o processo de aquisição de comportamentos a partir de modelos, seja este programado ou incidental (BANDURA, 1965ª, 1972). O Programa Empresário Sombra Por um Dia tem como objetivo proporcionar aos jovens, por meio da modelação programada, a experiência de vivenciar o dia-a-dia de um empresário, ou seja, durante um dia inteiro, o aluno acompanha um empresário em sua jornada diária, desde o café da manhã. Dessa forma, é possibilitada a aproximação entre estudantes e profissionais de maneira que os conhecimentos teóricos sejam vivenciados na prática e, assim, o jovem tenha novas possibilidades de crescimento e aprendizado. Além disso, essa experiência pode despertar nos jovens o interesse pelo mundo dos negócios e mostrar o quanto é importante o empreendedorismo para a nossa sociedade e País. Segundo Schumpeter (1934 apud BENEVIDES, 2002, p. 30) a função do empreendedor é reformar ou revolucionar o modelo de produção, participando, assim, do processo de “destruição criativa” da ordem econômica vigente. Trata-se, portanto, do responsável pela inovação e pela capacidade da economia de se desenvolver. Outro ponto importante do Programa Empresário Sombra é a possibilidade de mostrar aos jovens de que maneira os conceitos aprendidos em sala de aula são colocados em prática na rotina do trabalho. Além disso, é possível apresentar as habilidades necessárias para um futuro profissional de sucesso. É possível verificar que os participantes do Programa Empresário Sombra por um Dia observam que a criação de um negócio, a paixão pelo que se faz e a capacidade de utilizar os recursos de forma criativa podem transformar o ambiente social e econômico em que se vive. Da mesma forma, no comportamento empreendedor é imprescindível a disposição para assumir riscos calculados e a possibilidade de fracassar, ou seja, o empreendedor não está em busca de aventuras e sim de resultados. Além disso, os participantes
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conseguem sentir a grande responsabilidade que um empresário tem, afinal, emprega várias pessoas e precisa tomar decisões que afetarão todas elas. Ao final do dia, após toda essa experiência, o objetivo do programa é que tenha sido alcançado os três efeitos da Modelação citados por Bellico da Costa (2008): a aprendizagem de novos comportamentos que não se encontravam no repertório do aluno; a inibição ou desinibição de comportamentos que já faziam parte de seu repertório; e, principalmente, a instigação do desempenho de comportamentos similares ao do modelo, neste caso, o empreendedorismo. Programa Empresário Sombra Por um Dia em Londrina Em 2013, o Programa Empresário Sombra por um dia foi promovido em Londrina pelo Conselho do Jovem Empresário da Associação Comercial e Industrial de Londrina (CONJOVE-ACIL). Pautado em valores como empreendedorismo, sustentabilidade, associativismo, excelência e melhoria contínua, o CONJOVE-ACIL desenvolve trabalhos por meio de ações que fortaleçam o empreendedorismo jovem. Por meio de seus projetos, o CONJOVE-ACIL trabalha constantemente no fortalecimento de jovens empresários e no desenvolvimento de nossa sociedade. Proporciona ainda, ações de networking, estimulando o fortalecimento de uma rede de jovens empresários. Dentre os projetos do CONJOVE-ACIL está o Empresário Sombra Por um Dia, em parceria com a Junior Achievement. O grande diferencial de se executar o Programa Empresário Sombra Por um Dia com os empresários do CONJOVE é que o poder do modelo enquanto fator que instiga a sua imitação depende, dentre outras coisas, da similaridade entre modelo e observador. Isso significa dizer que o observador compara as características da pessoa que serve de modelo com as suas próprias características, de forma que, quanto mais parecidas elas forem, maior a probabilidade de que o modelo sirva como pista para o observador (BELLICO DA COSTA, 2008). Portanto, o fato de os alunos acompanharem jovens empresários, que, pela pouca diferença de idade, estão mais perto de suas realidades, aumenta
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a probabilidade de que esses alunos tomem como modelo as ações dos jovens empresários. Na edição de 2013 participaram do programa oito alunos do Colégio Estadual Professora Maria do Rosário Castaldi, todos cursando o 2º ano do Ensino Médio Técnico em Administração. Os empresários, membros do CONJOVE-ACIL, receberam os alunos participantes na reunião semanal do grupo, que acontece às terças-feiras das 7h15 às 8h30. A pauta da reunião foi sobre o evento que aconteceria logo mais a noite, o I Fórum Empreender, que faria parte da Semana Global do Empreendedorismo. Os alunos participantes colaboraram com a reunião, apesar de ainda bastante tímidos e observadores, puderam naquele momento vivenciar a preocupação dos Jovens Empresários, que estavam ali voluntariamente, organizando um evento com o intuito de fortalecer e disseminar a cultura empreendedora. Após o final da reunião, os alunos seguiram com os empresários para as suas rotinas de trabalho. Dentre os profissionais estavam empresários nas áreas de engenharia civil, engenharia elétrica, tecnologia da informação, educação, área contábil e de postos de combustível. Os alunos puderam observar, ao longo do dia, diferentes rotinas e um traço em comum dos empresários: o associativismo. Todos eram unidos em torno de uma causa, a de fortalecer o jovem empreendedor e empresário para fazer a diferença pela sociedade. Com isso, foi possível transmitir aos alunos participantes que os empresários são sim profissionais ocupados e com rotinas atribuladas, mas que ainda assim se preocupavam com o próximo e a sociedade em que vivemos. Considerando que os indivíduos se desenvolvem a partir de sua relação com o meio ambiente, a partir da conduta cultural e social, observa-se que seu comportamento pode ser definido como “contínuo desenvolvimento orgânico” constituído pela produção de uma forma particular de padrão cultural, ou seja,
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como a cultura influencia comportamentos direcionados a criação de negócios e como este comportamento contribui para definir o ambiente de negócios de forma temporal e regional (BERGER e LUCKMANN, 1985). A seguir, apresentamos os depoimentos de três alunos que participaram do Programa Empresário Sombra por um dia em 2013: “Após quase um ano de ter participado do Programa Empresário Sombra, guardo ainda a grande lembrança de um dia em que deixei de ser uma simples aluna, e tive a oportunidade de participar de um grande projeto, onde acompanhei no seu dia de trabalho o engenheiro Alexandre Takaoka, e pude ver o esforço que se precisa ter para ser um bom profissional. Porém não basta se importar só com as coisas técnicas no trabalho, o mais importante em que aprendi com ele, é que são as pessoas e o trabalho social os melhores, porque são os que realmente fazem uma grande diferença. E isso me encantou no Programa, isso porque não mostrou só o lado de escritório, trabalho fechado, mas mostrou tudo o que envolve uma sociedade. Por isso posso afirmar que depois desse dia não fui uma aluna normal, agreguei muito mais, e despertou em mim o espírito de mudança e renovação, e só indo ao campo um jovem pode ter tais desejos despertados.” (Juliane Antunes) “No Programa Empresário Sombra tive uma grande oportunidade de conhecer uma profissão diferente, da qual nunca tive contato antes. Passei o dia com o empresário Arthur Versoza, em sua empresa EngeBrazil, que atua no segmento de engenharia elétrica. Nesse dia pude acompanhar o cotidiano de um verdadeiro empresário, desde a sua primeira reunião com os membros do CONJOVE, até suas visitas para vistoriar as obras que a EngeBrazil estava realizando. Posso resumir esse dia como o ponta pé inicial da minha carreira profissional, pois além de conhecer o Arthur e sua empresa, conheci outro empresário que mais tarde vieram a me contratar para trabalhar em sua empresa. Hoje, saí da empresa deles para empreender!” (Felipe Pinheiro). “Minha experiência no Programa Empresário Sombra foi muito bacana! Fiquei em um escritório de contabilidade. Pude acompanhar tudo o que as empresárias Mariana Secco e Analita Soto fazem durante o dia de trabalho.
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Conheci qual o papel do contador, e a sua importância. E também acompanhei atendimentos à alguns de seus clientes. Esse projeto me possibilitou uma excelente oportunidade de emprego. Foi um grande passo para meu futuro profissional.” (Aline Correa) Quando entendemos que a formação humana é uma construção social e que grande parte do que somos é aprendido por meio dos exemplos que recebemos, torna-se clara a relevância de projetos como esse. Referências Bibliográficas BANDURA, A. Modificação do Comportamento através do procedimento de modelação. In: KRASNER, L.; ULLMAN, L. P. (Ed.) Pesquisas sobre modificação de comportamento. São Paulo: Herder, 1972. 1ª.ed. americana: 1965a BELLICO DA COSTA, A. E. Modelação. In: BANDURA, A.; AZZI, R. G.; POLYDORO, S. Teoria Social Cognitiva: conceitos básicos. Porto Alegre: Artmed, 2008 BERGER, P; LUCKMANN, T. A. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2003. JUNIOR ACHIEVEMENT, (s.d.). Fazendo a diferença em educação — material institucional. Porto Alegre. Disponível em: http://www.juniorachievement. org.br/ja/. Último acesso em 02/09/2014. SCHUMPETER, Joseph A. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1982 (Os Economistas) (Edição original: 1911). SKINNER, B. F. Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins Fontes, 1994. Original em inglês 1953.
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Entre ações e mediações: A Pedagogia Murialdo na formação de sujeitos para a sustentabilidade Tiago Rodrigues Garcia
RESUMO: Como pensar a educação num contexto de marginalização social? Existe um método ou um sistema educacional que busca, ao mesmo tempo, preparar o indivíduo para sua autonomia social, intelectual e moral? Estes questionamentos são, pois, o pano de fundo que motivou o desenvolvimento desta publicação, a qual contou com um estudo de caso em uma instituição que aplica os Princípios da Metodologia Murialdo para o cumprimento de sua missão. Palavras-chave: Educação, Pedagogia, Autonomia.
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1. INTRODUÇÃO A pesquisa “Entre Ações e Mediações: Os Princípios da Pedagogia Murialdo na Formação de Sujeitos para a Sustentabilidade” está atrelada a uma inquietude contundente quando se problematiza a questão da formação de profissionais para o século XXI: Quais são os pressupostos que devem nortear a educação de indivíduos no complexo cenário que se configura em torno dos desafios impostos para o desenvolvimento sustentável? E mais: Como pensar a educação num contexto de marginalização social? Existe um método ou um sistema educacional que busca, ao mesmo tempo, preparar o indivíduo para sua autonomia social, intelectual e moral? Estes questionamentos são, pois, o pano de fundo que motivou o desenvolvimento desta publicação, a qual contou com um estudo de caso em uma instituição que aplica ao Princípios da Metodologia Murialdo para o cumprimento de sua missão. Desta forma, o objetivo geral deste trabalho foi de analisar como a metodologia proposta no projeto Pedagógico Murialdo é aplicada na EPESMEL e, assim, buscar suas interfaces do para a formação de sujeitos para a sustentabilidade. A Escola Profissional e Social do Menor de Londrina busca promover a proteção e garantia dos direitos da criança, adolescente e jovem em situação de vulnerabilidade pessoal e social através da formação cidadã e profissional segundo a pedagogia de Murialdo. De acordo com a literatura encontrada sobre esta pedagogia, o método pretende promover uma educação aliada à responsabilidade socioambiental e busca estar atento aos “sinais dos tempos”, dando novas respostas aos novos desafios que a humanidade se depara. O Projeto Educativo revela o jeito próprio dos Colégios Murialdo de exercer a educação, fundamentada em São Leonardo Murialdo, na Pedagogia do Amor e Educação do Coração. Uma pedagogia que leva em consideração a afabilidade nas relações, a doçura com paciência a serviço do amor, a firmeza na correção e na coerência entre o dizer, o prometer e o cumprir.
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Para subsidiar esta pesquisa do ponto de vista teórico, optou-se por um resgate da Pedagogia da Autonomia de Paulo Freire. Este encaminhamento se deu, principalmente, pelo fato de que a pedagogia proposta por Freire sugere práticas e evidencia a possibilidade dos educadores estabelecerem novas relações e condições de educabilidade consigo mesmos, entre seus pares e, por conseguinte, com seus educandos. Além disso, o arcabouço teóricoprático apontado pelo consagrado educador brasileiro, sugere inquietude, problematização e exuberância a serviço do pensar rumo à ação libertadora. Ao passo que a obra de Paulo Freire apresenta práticas educativas enquanto propostas para a construção da autonomia dos educandos, valorizando e respeitando sua cultura, historicidade e individualidade, o estudo realizado na EPESMEL permite certa ilustração dos fundamentos apontados pelo autor. Assim, de acordo com a pesquisa realizada, pode-se considerar que a Pedagogia de Murialdo, ou Pegagogia do Amor, representa, em certo sentido, uma prática educativa postulada na proposta libertadora de Freire. O estudo realizado seguiu um encaminhamento qualitativo à partir do método entrevista em profundidade e análise documental. A entrevista foi realizada em agosto de 2014, na sede da EPESMEL em Londrina e contou com a participação do Pe. Carlos Alberto Wessler, diretor Geral, e Alexandra Alves José, assistente social do ensino profissionalizante da unidade. A análise documental foi realizada a partir de arquivos encontrados na internet e também por meio da consulta de documentos encaminhados pelos dirigentes da EPESMEL. Foram consultados, por exemplo, o Projeto Educativo Rede de Colégios Murialdo, e, ainda, os Princípios, Diretrizes e Normas SócioAssistenciais do Instituto Leonardo Murialdo. 2. DESENVOLVIMENTO
2.1 Fundamentos da educação da Escola Murialdo
Para compreender os aspectos que norteiam a Proposta Pedagógica do Método Murialdo, as informações foram coletadas à partir do Projeto
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Educativo Rede Murialdo, terceira versão. Esta publicação representa a atualização do também chamado Projeto Educativo Josefino (PEJ). Tratase de linhas norteadoras da ação educativo-pedagógica que caracterizam e identificam as escolas da Província Brasileira da Congregação dos Josefinos de Murialdo. De acordo com Pe. Raimundo Pauletti, a pedagogia de Murialdo, Por acreditar na missão de evangelizar pala educação aliada à responsabilidade socioambiental, busca estar atenta aos sinais dos tempos, dando novas respostas aos novos desafios nestes tempos mudados.
Segundo Pauletti, este projeto educativo revela o jeito particular dos colégios da Rede Murialdo de exercer a educação, fundamentada em São Leonardo Murialdo, na Pedagogia do Amor e Educação do Coração. Considera, ainda, trata-se de uma pedagogia que leva em consideração a afabilidade nas relações, a doçura com paciência a serviço do amor, a firmeza na correção e na coerência entre o dizer, o prometer e o cumprir. O Projeto Educativo Rede Murialdo apresenta os fundamentos da Educação da Escola Murialdo e um conjunto de princípios e práticas que constituem a marca da pedagogia, consagrados tanto pela ação educativa dos colégios e também da ação social dos Josefinos de Murialdo no Brasil. A seguir, serão apresentadas, de forma resumida, as concepções de pessoa, de educação, de educando e de sociedade, conforme o Projeto Educativo Rede Murialdo as descreve. 2.1.1 Concepção de Pessoa: A pessoa humana é um ser de relações que se constrói na interação com o mundo, com os outros e com Deus. Ser original, único, capaz de exercer sua capacidade crítica e transformadora.(...) Ser social que necessita do convívio comunitário e da interação grupal para seu desenvolvimento. Traz consigo sua própria cultura, valores e identidade. No processo de ser pessoa, precisa passar pela educação formal ou informal. Enquanto ser de relações, deve abrir-se para o outro, para o mundo e para Deus, com a responsabilidade de transformar e aperfeiçoar a realidade em que está inserido (...).
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2.1.2 Concepção de Educação: A educação é processo que constrói e reconstrói a pessoa e a sociedade. Ela propicia o desenvolvimento do educando através de conhecimentos diversos e suas tecnologias; do conhecimento do outro e de si próprio. Educação é direito de todos e dever da escola, família e sociedade. A educação deve conduzir os indivíduos à prática da ética e da cidadania. É o resultado de um fazer conjunto, um fazer-se na cumplicidade entre aprender e ensinar. A educação não faz da pessoa um instrumento, mas sujeito de sua vida. Leva em conta a dimensão espiritual. Ela só será completa e autêntica ao capacitar a pessoa para humanizar o seu mundo, produzindo cultura e sendo capaz de intervir na realidade através da participação social (...). 2.1.3 Concepção de Educando (...) O educando enquanto criança é merecedora de cuidados do educador. Cuidamos do mais importante da sociedade: as crianças; e o mais valioso nas crianças: o coração. Ela necessita da interação com o grupo e da construção de limites, para apropriar-se do mundo que a cerca e para descobri-lo através da aprendizagem. Para os educadores nas escolas Murialdo, a criança deve ocupar um lugar privilegiado em sua vida e na vida da escola. O educando adolescente continua precisando do cuidado e da orientação do educador; ele busca referências para a sua ação e descoberta do mundo. Está num processo de construção de identidade e autonomia. Apresenta muito potencial cognitivo, porém as transformações hormonais e psicossociais não podem ser ignoradas no processo de maturação. O educando jovem vai aos poucos compreendendo que é sujeito de direitos e deveres, assumindo gradativamente responsabilidades próprias de um jovem que foi educado para ser cidadão, exercendo sua cidadania no dia a dia da escola e na sociedade. O jovem estudante, ao deixar nossa escola, deverá ter atitudes solidárias frente às realidades sociais, construindo novas relações através da responsabilidade social.
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2.1.4 Concepção de Sociedade: Grupo de pessoas organizadas pela maior instituição de todos os tempos: a família. Esse grupo convive e relaciona-se de muitos modos: solidário, participativo, includente, regido por normas, leis e deveres. As mudanças e transformações que atingem a família repercutem na sociedade gerando muitas dificuldades na educação. Acreditamos que é possível, através da educação, construir uma sociedade onde a convivência entre as pessoas seja cada vez mais humana. É pela educação que se possibilita o pensar e o agir crítico em sociedade. Enquanto escola confessional católica, desejamos que o educando tenha como horizonte uma sociedade capaz de valorizar a pessoa, as relações de gênero, o trabalho e a solidariedade.
2.2 EPESMEL: Aplicação do método
A EPESMEL (Escola Profissional e Social do Menor de Londrina) é uma instituição privada sem fins lucrativos, mantida pelo Instituto Leonardo Murialdo. Desde 1974, contribui para a formação integral e inclusão social de seus alunos através da educação profissional. A EPESMEL atende a crianças e adolescentes de 7 a 17 anos com renda familiar de até 3 (três) salários mínimos, geralmente encaminhados pela Vara da Infância e Juventude; Conselho Tutelar; Projetos da Prefeitura Municipal de Londrina, entre outros. Para cumprir sua missão de formação de futuros cidadãos e inclusão social através do encaminhamento dos jovens ao primeiro emprego, a organização desenvolve os seguintes projetos:
• ABC – Aprendendo, Brincando e Criando: Atividades de reforço escolar, artes, esporte, lazer, formação humana e cristã e cidadania;
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• Cursos Profissionalizantes: Costura industrial, eletricidade, marcenaria, artes gráficas e arte finalista, auxiliar administrativo; • Menor Aprendiz: Encaminhamento ao primeiro emprego; • Zona Azul: O Projeto busca inserir adolescentes em situação socioeconômica desfavorável no mercado de trabalho até completarem 18 anos; • Liberdade Assistida: Tem por objetivo cadastrar voluntários para a função de orientadores comunitários; • Agente Jovem: Busca despertar o interesse para o protagonismo juvenil. 2.2.1 Concepções do método Para analisar como a metodologia proposta no projeto Pedagógico Murialdo é aplicada na EPESMEL e, assim, buscar suas interfaces com a formação de sujeitos para a sustentabilidade, primeiramente se fez necessário uma investigação em torno da compreensão e significação do método a partir dos dirigentes da organização. As definições expressas na entrevista realizada permitiram identificar que o método educativo vai muito além de uma formação técnica, baseada na instrumentalização para um suposto mercado de trabalho. O caráter central presente no discurso realizado aponta para uma formação humana cristã. Termos como “educação para a vida”, “valores”, “afetividade”, “amor”, “família” permearam as falas que buscaram definir o método. Murialdo afirmava em seu método
que não bastava só capacitar o
adolescente e jovem para uma profissão, mas era preciso cuidar também do corpo, da mente e da alma; buscar desenvolver uma educação integral a partir da educação do coração, a partir de relações fundamentadas no amor e no respeito com a vida, a individualidade e alteridade tendo como fundamento valores que norteiam a vida e muitas vezes até transcendem a própria vida; valores que levam ao protagonismo, a integração da família e ao exercício da cidadania. Pe Carlos Alberto Wessler
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Importante considerar que a concepção do método reside na aplicação de um conjunto de valores, diretrizes e fundamentos expressos na metodologia proposta por Murialdo sem, contudo, desprezar as peculiaridades da cultura local. Dessa forma, pode-se compreender que existe uma atualização constante da aplicabilidade do método. Inclusive, este aspecto de adaptabilidade também pode ser encontrada na noção de “atenção aos sinais do tempo”, expressão encontrada em muitos momentos da entrevista. É a pedagogia do amor – um método de como interagir com a criança, adolescente e jovem atendido. O educador não se apresenta como um professor, mas como uma “amigo (a), irmão (ã), pai, mãe”, que educa com o coração e não só como um transmissor de conteúdos. O método de Murialdo se faz bem presente na pedagogia de Paulo Freire, onde se acentua o respeito a individualidade e a personalidade de cada educando. No processo de aprendizagem deve-se ter flexibilidade, resiliência, e muito amor; não dá para ser taxativo. É preciso acolher o educando na sua situação real, com seus dons, suas fragilidades,e seus problemas. Murialdo falando sobre o público alvo, afirmava que quanto mais pobre, mais vulnerável, mais excluído (rejeitado); esses eram os prioritários de sua ação educativa. Em seu método, Murialdo prefere a prevenção do que a punição; se utiliza do máximo das intervenções pedagógicas para trazer o educando voltar ao bom caminho, construindo e estabelecendo conjuntamente limites, regras e metas de crescimento e comprometimento. Na EPESMEL os educandos participam da construçaõ regras e normas da instituição (...) (Pe Carlos Alberto Wessler, Diretor Geral da EPESMEL)
A noção de uma educação que busca uma formação baseada em valores humanitários e que pretende considerar o indivíduo em sua essência humana cristã, também pode ser observada nos dizeres: Nossa missão vai para além dos livros, para além daquilo que está posto enquanto regra. Educar para ser um bom pai, uma boa mãe, profissionais respeitados, cidadãos conscientes, participativos... A gramática é importante? É fundamental! Mas a nossa preocupação é que se ele não for um bom escritor, isto pra nós não é tão essencial – melhor que ele seja um
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bom pai, um bom cidadão, um homem de bem. E que ele possa levar estes valores para o mercado de trabalho. (Alexandra Alves José, assistente social de ensino profissionalizante na EPESMEL)
Assim, o que ficou claro nas definições apontadas pelos interlocutores é, sobremaneira, o caráter de um processo educativo que tem, em sua essência, a noção da formação do individuo enquanto pessoa. A formação técnica, que instrumentaliza para o mercado de trabalho é uma consequência de um objetivo maior almejado pela metodologia: a preparação para a vida. 2.2.2 EPESMEL: Uma família educativa em busca da autonomia do indivíduo Um dos pontos que marcaram a investigação em torno da aplicabilidade do Método de Murialdo na EPESMEL foi justamente a noção de “autonomia do indivíduo” e “respeito a sua individualidade” e “historicidade”. Para os entrevistados, a EPESMEL conta com um conjunto de práticas, que estão atreladas ao processo educativo, as quais buscam colocar os indivíduos (educadores e educandos) frente às suas próprias escolhas. Existe, assim, um encaminhamento educativo com vistas a autorreflexão, em que a “culpabilização” dá lugar à auto- responsabilização. O normal do ser humano é culpabilizar; e fazendo somente isso, não vai levar a lugar nenhum. Esse assunto é tratado constantemente com os nossos educadores nos momentos de formação, avaliação e planejamento. Diante de comportamentos e atitudes não adequadas do educando e até mesmo atos de rebeldia, há a tentação de “eliminar o mal pela raiz”, simplesmente culpabilizando e excluindo o mesmo do grupo e da entidade, sem a devida reflexão sobre o fato e circunstância. A exclusão poderá prejudicar ainda mais as relações e o processo de aprendizagem; e propiciar o abandono da Instituição, a começar a ficar na rua e a usar drogas. A exclusão só como última alternativa; mesmo assim, a exclusão vem afirmar que o seu método de ensino não é tão perfeito. Quando o ato de educar tem uma conotação de culpabilização, instigamos ao questionamento: Que
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mediações pedagógicas estás utilizando para recuperar esse educando?. Não é correto expulsar os maus e ficar com os bons. São estes (os indisciplinados) que terão mais chances de se tornarem delinquentes; por isso é preciso resgatá-los. (Pe Carlos Alberto Wessler, Diretor Geral da EPESMEL)
Sobre a autonomia e espaços para o protagonismo, a pedagoga entrevistada aponta: Atualmente a gente trabalha com este termo que é o “protagonismo juvenil”, que vem desta linha de autonomia mesmo. Que é o jovem poder participar dos espações de decisões... Por exemplo: nós fazemos a revisão do regimento interno. Então realizamos uma assembleia com eles, naquilo que era específico em relação aos direitos, deveres e regras para os educandos. Eles puderam participar e opinar. Além disso, sempre procuramos trabalhar com a crítica positiva, porque ele tem este olhar crítico. Então o que a gente sempre diz pra ele: “Olha, dentro da sala de aula, você tem razão e o educador também tem razão... aquilo que não te agrada, que você acha que poderia ser melhor, você tem a liberdade de trazer e de falar”. A gente vai trabalhando nele esta coisa da criticidade, mas também ele deve ter o olhar das possibilidades. E aí nós temos um grupo de adolescente que a gente trabalha mais intensamente esta coisa da autonomia, do protagonismo juvenil, eles são os multiplicadores para outros jovens, debatendo temas de juventude, participação política, eles participam como ouvintes nas assembleias e disseminam dentro da instituição para os demais. A gente trabalha a autonomia em todos os aspectos: seja no âmbito externo da instituição como externo. Debatemos acerca da alimentação, do atendimento que esta sendo realizado, do espaço sala de aula. (Alexandra Alves José, assistente social da EPESMEL)
Discorrendo sobre a aplicabilidade do método, Pe. Carlos aponta para a importância do educador no processo:
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O método é aplicado com toda equipe educativa e também com os educandos. Com a equipe educativa há formação mensal, seminários, cursos presenciais e a distância (EAD) reuniões mensais tanto para avaliação e programação das atividades. Uma das dimensões da pedagogia do amor, que falamos muito é da importância “de ser família educativa”,que educa pelos ensinamentos, testemunho, relação de amizade, trabalho em equipe, e comprometimento, em todos os ambiente da instituição: educa na sala, educa no pátio, educa nos espaços de lazer e esporte, no teatro, na música, na refeições, etc... Murialdo dizia que é preciso dar uma clima de familiaridade nos espaços educativos, com educadores motivados, se querendo bem, com comprometimento e trabalho em equipe. Todos devem participar da preparação e realização de eventos; saber trabalhar juntos. O testemunho de amizade, união e colaboração dos educadores, torna-se referência educativa para o educando. Temos testemunhos de crianças que tem comportamentos bons na EPESMEL, onde se sentem muito acolhidas; e comportamentos muito ruins nas escolas regulares, onde não se tem uma atenção personalizada e pedagógica com o educando.
2.2.3 Sujeitos da sustentabilidade: empreendendo um projeto de vida Dados os pontos analisados, tanto em relação às noções da própria significação do método pelos dirigentes, como também para os aspectos relacionados a formação de uma família educativa, com vistas ao desenvolvimento de indivíduos comprometidos e protagonistas de suas próprias histórias, convém abordar as percepções acerca dos aspectos que fazem da EPESMEL um espaço para a formação de sujeitos da sustentabilidade. Esta questão está presente nas intervenções diárias e mais especificamente nas oficinas de formação humana cristã. A gente trabalha isto de forma ampla. A pessoa precisa, primeiramente, desenvolver o sentimento de pertença: isso é meu, este bairro é meu, esta rua é minha, esta cidade é minha e eu preciso fazer a diferença onde eu estou, em todos os aspectos – seja na participação política, cidadã, ambiental... A gente trabalha assim com eles: vocês são únicos, e precisam fazer a diferença, não esperar que
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o outro faça por você... Isto é uma coisa que a gente fala o tempo todo, e isso está relacionado ao método, ao valor, à parte filosófica do método. (Alexandra Alves José, assistente social)
A questão da sustentabilidade é tratada na EPESMEL enquanto tema transversal, a qual busca desenvolver nos educando um olhar voltado ao compromisso consigo mesmo, com o outro e com a natureza. Nas palavras de Pe. Carlos: É um tema transversal. Várias ações: realização de trabalhos e pesquisas na internet; celebração da semana da ecologia; atividades e artesanato com recicláveis; instalação de lixeiras nos diversos ambientes da instituição para reciclagem do lixo; cuidado com os espaços utilizados e o meio ambiente; educar para posturas corretas, desde o modo de se sentar, de se vestir, etc. ; o cuidado com o corpo e o cuidado com o outro, ; despertar para o cuidado com seu bairro, o compromisso cidadão, as campanhas de vacinação, o combate a dengue.
Aspecto valorizado deste propósito é que a instituição, como já foi dito, busca a formação de sujeitos para a vida, algo que vai além da formação profissional. São os valores humanitários que perpassam toda a filosofia do Projeto Pedagógico de Murialdo que norteiam as atividades da organização. Assim, quando se questionou o tema sustentabilidade, empreendedorismo e inovação, o foco dos interlocutores se concentrou no que chamaram de “projeto de vida”. Assim, a EPESMEL, enquanto instituição que pretende promover a proteção e garantia dos direitos da criança, adolescente e jovem em situação de vulnerabilidade pessoal e social, é entendida pelos seus dirigentes enquanto agente propulsor de uma “nova vida”. Busca-se resgatar o adolescente e oportunizar novos sonhos e projetos de vida. Temos que despertar no educando a arte de sonhar, de sonhar um mundo melhor, onde ele possa acreditar que as mudanças do mundo também passam pela sua própria ação, criatividade e inovação. Buscamos provocar
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no educando a sede de conhecimentos e a se utilizar das oportunidades que a cada momento estão surgindo no mercado de trabalho. (Pe Carlos Alberto Wessler, Diretor Geral da EPESMEL)
Discorrendo sobre as dificuldades encontradas pelos adolescentes em relação ao contexto social, Alexandra comenta: Com o trabalho que realizamos buscamos que o adolescente possa olhar pra dentro de si mesmo, encontrar potencial, e transpor aquela barreira da dificuldade que eles tem, da percepção de que ele não é capaz, que ele não pode... Às vezes o mercado não consegue absorver todo mundo que se forma, então nós incentivamos que ele busque desenvolver seu próprio negócio.
Dentro deste contexto foram apresentados casos de pessoas que estudaram na EPESMEL e que hoje podem ser consideradas enquanto referências para a organização. São pessoas que, graças à determinação para um projeto de vida, hoje se destacam no mercado de trabalho. Citam o exemplo de uma mulher que se tornou gerente de RH. Contam também sobre o caso de um adolescente, que, quando chegou na EPESMEL, não sabia nem ligar um computador – e hoje, está pleiteando uma vaga de doutorado no exterior na área de Tecnologia da Informação. Outras histórias foram mencionadas. Todas apontando para casos de pessoas que passaram pela instituição e que, num certo sentido, representam “referências” tanto para as crianças e adolescentes, como também para a própria equipe da EPESMEL. É como se pudessem verificar, por meios destas históricas, que a Pedagogia do Amor está cumprindo o objetivo à que se propõe. Nas palavras da própria pedagoga da EPESMEL, “buscamos quebrar o paradigma do assistencialismo, buscamos que eles sejam protagonistas de suas histórias, que sejam empreendedores, que tenham um planejamento de vida, que SONHEM!”.
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3.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com os resultados atingidos pela pesquisa, pode-se considerar que o objetivo central do trabalho foi atingido. Com a pesquisa realizada foi possível analisar de forma qualitativa a aplicabilidade do Projeto Educativo Murialdo na EPESMEL. Tanto a pesquisa bibliográfica realizada como a análise da entrevista em profundidade permitiram concluir que a EPESMEL aplica o método seguindo os princípios, diretrizes e fundamentos da Pedagogia Murialdo e isso, por sua vez, contribui para a formação de sujeitos para a sustentabilidade. Como o termo “sustentabilidade” sugere várias significações, no contexto deste trabalho optou-se por enquadrá-lo na perspectiva de um modo de vida que considera o respeito consigo mesmo, com o outro, com a natureza e, por assim dizer, com a vida. Sustentabilidade aqui significaria, desta forma, a sustentação de um propósito de vida diferente daquela situação de vulnerabilidade social vivenciada pelas crianças e adolescentes atendidos pela EPESMEL. Neste contexto, sustentabilidade e empreendedorismo são dois lados de uma mesma moeda. Por um lado busca-se sustentar um novo propósito de vida, pautado pela ética do amor, pela integridade do ser humano, das relações, da família e etc; por outro lado “empreender um projeto de vida” é, ao mesmo tempo, o próprio caminho e a chegada. “Buscamos que eles sejam protagonistas de suas histórias, que sejam empreendedores, que tenham um planejamento de vida, que sonhem!”. Ponto marcante da pesquisa diz respeito ao caráter singular do método e que, na opinião dos dirigentes, o diferencia do paradigma vigente – o acolhimento do jovem tal como ele é. Antes do julgamento, do certo e do errado, da imposição de regras, normas e valores, busca-se valorizar o que o jovem tem de melhor. Assim, se ele é capaz de destruir algo, do mesmo modo, ele também é capaz de construir. Como comenta Pe. Carlos, “é preciso acentuar e fortificar o que há de positivo no educando, em sua autonomia e singularidade e não o negativo, pois assim, aos poucos, ele vai eliminando o negativo, as vulnerabilidades e exercendo o domínio sobre si mesmo e a vida criando o seu próprio projeto de vida, se tornando enfim protagonista. Nas palavras de Murialdo: “Ne Perdantur – Que nenhum se Perca”!
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4. BIBLIOGRAFIA DALTO, Carlos Eduardo; DINATO, Maria Rosilene Sabino; FREITAS, Carlos Cesar. Parceria ADETEC e Milênia – Mudando o Contexto Social. Estudo de Caso EPESMEL e o Ensino de Empreendedorismo. Universidade Estadual de Londrina. Centro de Estudos Sociais Aplicados, 2005. PROJETO EDUCATIVO REDE MURIALDO. Disponível em: http://www. colegiomurialdo.com.br/projeto-educativo?ana-rech. Acesso em 25/08/2014. WERTHEIN, J. R. (Org.); Célio da Cunha (Org.). Educação Cientifica e Desenvolvimento – O que pensam os cientistas. 1. ed. Brasília, DF: UNESCO Brasil, 2005.
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O direcionamento profissional como agente transformador Rodrigo Martins
RESUMO: Busca-se através de artigo, apresentar os benefícios do acesso a informação e ampliação do conhecimento, através do direcionamento profissional como agente transformador na vida de jovens e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. A Guarda Mirim de Londrina completou em 2014, quarenta e nove anos de atividade, atendendo a mais de 500 jovens em situação de risco social. Diversos cursos profissionais são oferecidos, além de projetos operacionais e Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. Palavras-chave: Jovens, Vulnerabilidade Social, Informação, Conhecimento.
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INTRODUÇÃO A Guarda Mirim de Londrina completará, em 2015, cinquenta anos de atividade, e no decorrer desse período passou por muitas modificações e dificuldades, principalmente no que diz respeito à sustentabilidade da instituição. A missão da Guarda Mirim é promover o direcionamento social, educacional e profissional do adolescente, qualificando-o para o mercado de trabalho, visando à transformação de sua realidade. Em 2001, a instituição passou por dificuldades financeiras que quase levaram ao encerramento das atividades exercidas naquele momento. No entanto, por uma indicação da Promotoria da Criança e do Adolescente, formou-se naquele ano uma nova diretoria voluntária que daria inicio a um novo rumo de crescimento e planejamento para a instituição, propiciando melhoras nos âmbitos educacional, estrutural e financeiro. Parte dessa diretoria se faz presente até os dias de hoje e tem como visão ser reconhecida como instituição que prepara o jovem e oferece Educação Profissional de qualidade. Atualmente a Guarda Mirim atende a 519 jovens em situação de vulnerabilidade social e pessoal encaminhados de vários pontos da cidade de Londrina e distritos. Assim, amparados através de entrevista presencial, sobre a Guarda Mirim de Londrina, buscamos apresentar: 1. Os cursos de aprendizagem profissional; 2. O acesso à informação como um grande diferencial junto à cultura da instituição. Fundada em 1965, com o apoio do 5º Batalhão da Polícia Militar até o ano 2000, a Guarda Mirim de Londrina já educou mais de 42 mil jovens de 68 pontos do município.
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Desenvolvimento Atendendo ao planejamento da finalidade deste estudo de caso, fezse necessário o cumprimento de estágios de investigação na construção das informações sobre a Guarda Mirim. Desta forma, este capitulo, será fundamentado através de seis pontos essenciais para sua estruturação: 1. Problematização: a. Como cumprir a missão da instituição de direcionamento social, educacional e profissional do adolescente qualificando-o para o mercado de trabalho visando à transformação de sua realidade? 2. Delimitação: a. Como o direcionamento profissional subsidia a introdução do adolescente no mercado de trabalho? 3. Hipótese: a. Através da oferta dos cursos profissionalizantes da Guarda Mirim, jovens em vulnerabilidade social, residentes nas periferias das mais diversas regiões de Londrina e distritos, são resgatados de sua situação de risco social, evitando influências negativas e incorporando a cultura de planejamento de carreira. 4. Objetivo Geral: a. Apresentar a importância da Guarda Mirim como instituição transformadora de pessoas em situação de risco social. 5. Objetivos Específicos: a. Apresentar os cursos, projetos e serviços oferecidos pela Guarda Mirim; b. Conceituar os temas relacionados a informação e a importância de treinamento profissional. 6. Metodologia: a. Coleta de informações; b. Referencial bibliográfico.
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Abaixo a missão, visão e valores da Guarda Mirim: Missão: “Promover o direcionamento social, educacional e profissional do adolescente qualificando-o para o mercado de trabalho visando a transformação de sua realidade” Visão: “Ser reconhecida como instituição que prepara o jovem e oferece educação profissional de qualidade” Valores: “Compromisso, Respeito, Sensibilidade, Organização, Cidadania, Credibilidade, Reconhecimento, Qualidade, Solidariedade, Honestidade, Transparência, Excelência e Comprometimento” A Guarda Mirim apresenta atualmente os seguintes números: 117 empresas com aprendizes; 65 escolas que provêm os alunos; 400 aprendizes em aprendizagem nas empresas; 60 alunos na Qualificação; 86 alunos no serviço de convivência (Artes Cênicas/Visuais/Musicalização). Total de Educandos: 546 A Guarda Mirim oferece cursos em contraturno escolar de aprendizagem de Auxiliar Administrativo e de Produção Industrial, Padaria e confeitaria em parceria com o SENAI Londrina, Aprendizagem em Auxiliar Administrativo para o Comércio, Curso de Maquetaria, além das atividades do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos com as linguagens: Artes Plásticas e Artes Cênicas, Fanfarra, Danças Urbanas, BadMinton, Musicalização, Coral, esportes e acompanhamento pedagógico. Cursos de Aprendizagem Profissional: • Auxiliar Administrativo para o Comercio • Operador do Comercio em Lojas e Supermercado • Auxiliar Administrativo e de Produção Industrial – Parceria com o SENAI Londrina • Padaria e Confeitaria – Parceria com o SENAI Londrina
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Turmas de Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos Artes Visuais: Turma com 25 educandos. Tem como principal objetivo a inserção social do educando através da linguagem das artes visuais, por meio de oficinas de artesanato, esportes e acompanhamento pedagógico, tornando-o protagonista da na mudança da sua própria realidade. Artes Cênicas: Turma com 25 educandos. Tem como principal objetivo a inserção social do educando através da linguagem das artes cênicas, por meio de oficinas de teatro, circo, rádio e acompanhamento pedagógico, tornando-o protagonista na mudança da sua própria realidade. Musicalização: Turma com 25 educandos. Tem como principal objetivo a inserção social do educando através da linguagem musicalização, por meio de oficinas de música, violão, fanfarra, banda marcial e acompanhamento pedagógico, tornando-o protagonista na mudança da sua própria realidade. Projetos Operacionais: Projeto Higiene: Tem como principal objetivo ofertar aos educandos materiais e orientação a respeito da higiene pessoal, melhorando a autoestima e consequentemente o convívio social, inclusive levando para casa os hábitos aprendidos. Cardápio Musical: Proporciona no horário das refeições um momento de contemplação musical no refeitório da entidade, projeto proporciona ao educando, conhecer novos gêneros musicais saindo da realidade cotidiana. Chefias de Sala: Estimulamos através deste projeto a Autogestão, trabalhando a limpeza e organização dos espaços em comum da entidade. Todas as salas estão equipadas com vassoura, pá de lixo, rodo, guarda-chuva e lixeira. Projeto de Leitura: Sabemos que um dos grandes problemas encontrados hoje no meio educacional é a dificuldade dos adolescentes em interpretar e utilizar a linguagem de forma adequada. Com isso o projeto justifica-se em
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todos os momentos, já que trabalhamos com o principal objetivo de formar cidadãos críticos e informados. Além das atividades já citadas é ofertada a alimentação para os jovens que almoçam e tomam lanche, tanto no período matutino quanto no vespertino. Os alunos também recebem incentivos relacionados a cultura empreendedora através do laboratório de merchandising, Projeto Sabão Mirim e Cooperativa Mirim. Diversas melhoras ocorreram nos últimos anos, através do apoio e empenho da sociedade londrinense. Atualmente o espaço passa por uma grande ampliação da área administrativa e construção de um pequeno teatro para apresentações, com o grande apoio da sra. Kimiko Yoshii e incentivos da empresa A. Yoshii Engenharia. Informação, um grande diferencial A informação é considerada por muitas empresas como um grande ativo. Por isso, ela deve ser armazenada e utilizada de maneira adequada, de forma a gerar bons resultados, a antecipar as necessidades e a produzir um grande diferencial competitivo para a organização. Segundo Cardoso e Gonçalves Filho (2001, p.15), “a informação é hoje poderoso recurso das organizações, permitindo seu perfeito alinhamento estratégico por meio de constantes fluxos bidirecionais entre a empresa e o macro-ambiente, criando condições para que esta viabilize seus objetivos e cumpra sua missão corporativa”. Assim, a cada dia, diversos profissionais necessitam de uma vasta quantidade de informações, haja vista o processo de mudança, em todos os setores, ser constante. Novos produtos são lançados, leis são alteradas ou novas leis são instituídas, ocorrem mudanças na economia e muitos outros eventos se sucedem; enfim, acontecem alterações em todas as camadas do micro e do macroambientes em âmbito nacional e mundial.
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Empresas ou profissionais que estejam bem informados possuem um forte e importante diferencial competitivo, pois transformam suas informações em valiosas oportunidades de negócio, alcançando novos mercados ou idealizando novos produtos e/ou serviços. Isso aumenta, consequentemente, seus rendimentos, suas bases de clientes, suas empresas e também a oferta de novos empregos, o que movimenta a economia. O desempenho humano na prestação de serviços e a importância do treinamento A satisfação do cliente vai além da simples aquisição de um produto ou serviço, sua avaliação continua antes e após a venda, esperando que a empresa continue a lhe prestar atendimento de qualidade depois que a compra tenha se encerrado. Logo, todos os setores envolvidos devem se comprometer com o objetivo primeiro de qualquer ato comercial: a satisfação do cliente, para que ele volte à empresa e utilize, novamente, seus serviços. Para tudo isso, o treinamento constante do quadro de funcionários é primordial, principalmente quando existir a contratação de novos funcionários, seja para o aumento do quadro, seja para a substituição de empregados. “O pessoal de contato com o cliente deve cumprir metas operacionais e de marketing. Por um lado, ajudam a ‘manufaturar’ o produto do serviço. Por outro, também podem ser responsáveis por comercializá-lo” (LOVELOCK; WRIGHT, 2003, p.392). Conclusão: A Guarda Mirim, possibilita a transformação de vidas de jovens em situação de risco social, através do oferecimento de acesso à informação e ao conhecimento, fazendo com que o jovem se torne protagonista de sua realidade. Por meio desse protagonismo, o jovem faz escolhas decisivas e elabora seus projetos de vida, assumindo a responsabilidade pela própria carreira profissional.
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O subsidio transformador da ampliação do conhecimento se deve a profissionais dedicados ao convívio com esses jovens e ao apoio da comunidade londrinense. Referências Bibliográficas: CARDOSO, M.S.; GONÇALVES FILHO, C. CRM em Ambientes e-business. São Paulo: Atlas, 2001. LOVELOCK, Christopher H. WRIGHT, Lauren. Serviços: marketing e gestão. São Paulo: Saraiva, 2003.
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A Pedagogia do Afeto como instrumento para sustentabilidade social Gabriela Guimarães Thaís Bruschi
RESUMO: Neste artigo busca-se apresentar o conceito e metodologia da Pedagogia do Afeto, além de sua aplicação e resultados positivos que a instituição Legião da Boa Vontade (LBV) tem obtido em um de seus projetos, voltado para crianças e adolescentes. Alia-se à esta metodologia o conceito de sustentabilidade social, uma vez que a aplicação desta linha educacional tem por objetivo transformar o mundo em que se vive hoje e no futuro. Palavras-chave: Sustentabilidade Social, Desenvolvimento, Pedagogia do Afeto, Educação, Cidadania Ecumênica, Integridade.
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Introdução O conceito de desenvolvimento sustentável abrange três dimensões básicas: a sustentabilidade ambiental, a sustentabilidade econômica e a sustentabilidade social. Esta última é geralmente pouco disseminada. Muitas empresas têm adotado a responsabilidade social em sua estratégia de condução de seu negócio; contudo, é essencial que as ações voltadas para este objetivo tenham uma base sustentável para que realmente cumpram sua missão de trabalhar nos agravantes de nossa sociedade. Além de promover ou executar ações sociais, é essencial vislumbrar ações que tenham efeitos duradouros e que sejam abrangentes, afetando positivamente também as outras dimensões, uma vez que sustentabilidade é um conceito sistêmico. De uma forma geral, a sustentabilidade visa ao bem-estar da sociedade de hoje e também de gerações futuras. Acredita-se que a equidade é uma condição essencial para a melhoria de uma comunidade. A correção das desigualdades instaladas ao longo da história é uma necessidade para que haja tal desenvolvimento. Uma sociedade sustentável pressupõe que todos os cidadãos tenham os recursos necessários para ter uma vida digna e com qualidade e assim possam contribuir para um mundo melhor. A Legião da Boa Vontade (LBV) é uma instituição que apresenta tal preocupação, por isso, atua com pessoas em situação de vulnerabilidade social e/ou pessoal. Intervém diretamente na realidade social, colabora em situações emergenciais (desemprego, fome, saúde) e, principalmente, na formação integral do ser humano e de seu espírito eterno. Muito mais do que doar ou ensinar algo, opera para educar e formar cidadãos. Para isso, aplica com sucesso, em sua rede escolar e em seus programas socioeducacionais, a Pedagogia do Afeto, que tem por princípio proporcionar a convivência e o fortalecimento de vínculos, promovendo uma cultura de paz.
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Legião da Boa Vontade – LBV A LBV é uma Associação Civil de Direito Privado reconhecida no Brasil e no exterior por seu trabalho socioeducacional, sendo referência internacional em educação com espiritualidade ecumênica. Com a missão de “Promover Desenvolvimento Social, Educação e Cultura com Espiritualidade Ecumênica, para que haja Consciência Socioambiental, Alimentação, Segurança, Saúde e Trabalho para todos, no despertar do Cidadão Planetário”, contribui para a melhoria da qualidade de vida de pessoas em situação de vulnerabilidade ou risco social, além de promover o conhecimento de direitos e deveres do cidadão. Fundada em 1950 pelo jornalista, radialista, escritor e poeta Alziro Zarur, atua na prestação de serviços de proteção social gratuitos, diariamente, de forma planejada e sistemática. Em todo o Brasil, a LBV promove ações transformadoras com mais de 70 unidades socioassistenciais, lares para idosos e escolas. Com o apoio de parceiros, voluntários e uma equipe de colaboradores local, garante um serviço de qualidade às famílias da comunidade em que atua. Multiplicando seus resultados positivos, replica as melhores práticas nacionais também em outros países - Argentina, Uruguai Bolívia, Estados Unidos e na Europa. Em Londrina, a LBV presta serviços à comunidade desde abril de 1957. Conta hoje com uma equipe multidisciplinar com 14 pessoas, atuando em dois projetos principais: Criança: Futuro no Presente! (que atende crianças e adolescentes no contra turno da escola promovendo atividades lúdicas e recreativas) e Vida Plena (voltado para idosos, oferecendo oficinas de artesanato, passeios e bailes). O projeto Criança: Futuro no Presente! em Londrina atende famílias vulneráveis socialmente, crianças com carência afetiva, em situação de negligência, violência física, psicológica ou sexual ou que tiveram rompimento de vínculo. Como critério de participação a criança precisa ter 6 anos completos e estar inserida na escola. A família passa por uma entrevista de triagem
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e à medida que vão abrindo vagas, os casos mais urgentes – com maior vulnerabilidade – vão sendo atendidos. Estruturado dentro da filosofia da Pedagogia do Afeto, o projeto atua no desenvolvimento integral do ser humano, propiciando o resgate da dignidade e dos valores morais e espirituais. Pedagogia do Afeto A Pedagogia do Afeto é assim denominada por acreditar que a estabilidade do mundo começa no coração da criança. Idealizada por Paiva Netto, fundamenta-se nos valores oriundos do Amor Fraterno, formando cérebro e coração, que é a principal finalidade a ser atingida para preparar seres humanos (Paiva Netto, 2010). Essa pedagogia propõe a formação do ser integral: espírito-biopsicossocial, promovendo com qualidade, competência e efetividade a união do sentimento ao desenvolvimento cognitivo dos pequeninos, de forma que carinho e afeto transfiram-se para todo o conhecimento e os ambientes de suas vidas, preparando-os para viver a cidadania ecumênica, firmada no exercício pleno da Solidariedade Espiritual, Humana e Social, iluminando mentes e sentimentos, compartilhados com agentes educacionais – famílias / escola / sociedade (Paiva Netto, 2010). A criança, a família e os educadores são vistos como coautores do processo de aprendizagem, dividindo entre si as responsabilidades e atuando de forma distinta num processo integrado, no qual o diálogo, a discussão e o debate são fundamentais para este processo (Paiva Netto, 2010). O desenvolvimento harmônico da inteligência do corpo e do espírito respeita a faixa etária do educando, bem como sua etnia, cultura e gênero, somando esforços na vivência da cidadania ecumênica, da ética e da solidariedade, contemplando todos os segmentos educacionais, de escolarização formal ou informal (Fundação Boa Vontade, 2009).
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Ir para a escola, de acordo com a Pedagogia do Afeto, significa mais do que pensar no conteúdo a ser transmitido sobre as disciplinas de português, química ou física; significa ponderar sobre os princípios fundamentais e norteadores do efetivo processo de aprendizagem, ou seja, aquele que permite ao indivíduo a busca constante de conhecimento, pois favorece o desenvolvimento do aprender a aprender – um dos quatro pilares para a Educação, da Unesco (Fundação Boa Vontade, 2009). Para a efetiva prática deste aprendizado é essencial: • Vivenciar valores universais que possibilitem o fortalecimento do senso de cidadania em consonância com a família e a sociedade; • Perceber-se como parte de um grupo social, que é, ao mesmo tempo, meio de interação e fonte de estudo e informação, desenvolvendo nele a percepção da realidade; • Praticar e exercitar o pensamento, para desenvolver completa linha de raciocínio, fundamentada na coesão e coerência, que seja sequencial e gradativa, servindo de base para que ele possa pensar os fatos da vida; • Ser incentivada a desenvolver a habilidade investigativa, o senso de pesquisa e a curiosidade saudável, tendo como base a percepção da realidade e a consciência de que o saber e a informação fazem parte de um amplo universo social; • Despertar a memória espiritual exercitando a intuição; • Nortear e Apoiar: monitorar e mediar a atuação de crianças e jovens, balizando os limites necessários e fundamentais para propiciar o amadurecimento de conceitos e ações, favorecendo estudos de pesquisas para temas de interesse; • Valorizar e respeitar: o educador, além de propiciar, momentos ricos de aprendizagem e pesquisa, valoriza a produção e as ações das crianças e jovens, respeitando-lhes os limites e as habilidades, contribui significativamente para que a criança tenha a autoestima em grau satisfatório e, assim, consiga interagir com o meio social, exercendo plenamente sua cidadania; • Despertar potencialidades: pela vivencia social que a escola propicia cabe ao educador despertar habilidades e capacidades nas crianças e incentivá-las, além de possibilitar-lhes experiências nas diversas áreas do saber, visando a futura atuação dessas crianças e jovens na fase adulta, em integração com a sociedade. Fonte: Fundação Boa Vontade, 2009.
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Como forma de estruturar esses objetivos e disseminar o conhecimento, a Pedagogia do Afeto conta com uma metodologia para sua aplicação chamada Método de Aprendizagem por Pesquisa Racional, Emocional e Intuitiva – MAPREI. É uma ferramenta de aprendizagem facilitadora para formar educandos e cidadãos mais fraternos, mais ativos e construtores de conhecimento (Fundação Boa Vontade, 2009). Fundamenta-se na pesquisa e acredita na intuição como um dos bons instrumentos capazes de conduzir a criança a assimilar os temas apresentados em sala de aula, levando em consideração a bagagem cultural e espiritual do indivíduo (conhecimento anterior da criança), contribuindo para sua sociabilidade e autonomia, possibilitando assim a transmissão do conhecimento adquirido e o contato com opiniões variadas acerca de quaisquer temáticas (Fundação Boa Vontade, 2009). O MAPREI tem como objetivo: (1) coletar, sistematizar e contextualizar dados de várias fontes; (2) desenvolver o educando para ouvir opiniões opostas de forma respeitosa; (3) desenvolver no educando a habilidade de argumentação; (4) estimular o educando participar do trabalho em equipe e perceber-se como coautor do processo educacional, exercitando a própria habilidade intuitiva; (5) exercitar valores democráticos e ecumênicos no espaço da sala de aula. Também é inserida nesse método a integração da família à vida escolar. (Fundação Boa Vontade, 2009). ETAPA
SÍNTESE
OBJETIVO
ESTRATÉGIA
1ª : Identificação do Conteúdo “MOBILIZAR”
Intuição que desperte o educando a buscar sua bagagem cultural e espiritual, uma vez que a criança já detém o assunto
Apresentar o tema a ser desenvolvido; pontuar subtemas sugeridos
Roda de Conversas; Chuva de palavras; leitura oral; música ; dinâmicas; filmes; etc.
2ª: Busca Individual do Conteúdo ‘INTUIÇÃO E PESQUISA”
Incentiva o educando a partir de suas ideias intuitivas iniciais a aprofundar-se em pesquisas, direcionando e orientando, indicando caminhos que possam motivá-lo a realizar um bom trabalho.
Mobilizar atividades de pesquisa; propor participação da família; despertar a intuição
Recorte e colagens; produções artísticas; tarefa de casa com a participação dos pais; utilização de fotos, documentos pessoais, etc
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3ª: Socialização do Conhecimento “MEDIAR E APROFUNDAR”
Troca de informações entre integrantes do grupo, valorizando cada material apresentado e suas característica diversificadas, lembrando sempre que a inteligência de cada educando vai além da própria capacidade de aprendizagem e de sua atual potencialidade cognitiva
Propor construção do conhecimento; incentivar o diálogo e a reflexão; aprofundar conceitos; sistematizar conteúdo
Construção de painéis, murais; uso de vídeos, livros, mapas, revistas, etc; exposições, uso de apostila ou livro didático; roda de conversas
4ª: Conclusão “PRODUÇÃO”
Educador organiza as contribuições do grupo e mostra que o caminho do crescimento coletivo se dá na união das ações dos educandos, em prol de uma Sociedade Solidária Altruística Ecumenica
Concluir o conteúdo ou projeto elaborado; elaborar o documento de conclusão; sistematizar o conteúdo propriamente dito
Produção artística individual ou em grupo; registro de conteúdo no álbum didático; uso de apostila, livro didático; uso de cadernos: cartografia, pedagógico, brochura, quadriculado; produção escrita ou plástica sobre a conclusão do assunto
5ª: Apresentação de Resultados “ESCOLAFAMILIACOMUNIDADE”
Educador conduz a apresentação e exposição dos resultados, valorizando igualmente todos os esforços, nas mais variadas manifestações do educando, cuja soma de bagagem (espiritual e intelectual) contribui para o crescimento do grupo.
Compartilhar o conteúdo vivenciado com os demais grupos da escola e com a família.
Exposições na escola mostras ou feiras culturais; gincanas; dramatizações; apresentações musicais
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6ª: Conclusão individual “INTERNALIZAÇÃO (FECHAMENTO)”
O conteúdo da pesquisa inicial do educando recebeu o acréscimo das pesquisas e opiniões dos colegas, com o somatório da medição do educador, retornando para o educando,que o internaliza. Esperase desta criança a capacidade de transformar simples informação em conhecimento solidário, utilizando o que aprendeu em benefício da coletividade.
Registrar o conteúdo assimilado
Atividade plástica, cênica, musical; atividade escrita (caderno, sulfite, apostila ou livro didático).
Cidadania Ecumênica A Pedagogia do Cidadão Ecumênico é direcionada à educação de adolescentes e adultos, dispondo o indivíduo a viver a Cidadania Ecumênica. De acordo com sua etimologia, “ecumênico” (do grego oikoumenikós) significa “de escopo ou aplicabilidade mundial; universal”. Este termo é utilizado pela LBV porque se acredita que não haverá verdadeira Paz Mundial enquanto ela não for estendida a todas as pessoas. Assim, o ecumenismo precisa ser praticado, com a abrangência de suas ações em todos os setores da vida humana: Em uma era de globalização, destaca-se a importância do Cidadão Ecumênico, que compreende a necessidade de superar obstáculos que separam multidões, ainda que estas não cultuem idêntico pensamento religioso, político, social ou não pertençam à mesma cultura ou etnia. Na LBV cultiva-se a Parte Divina, que existe em todos os indivíduos, esperando ser despertada para demonstrar sua eficácia no bem, fração luminosa que cada um traz dentro de si, ao largo de crenças ou descrenças. A
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misericórdia, a compaixão, a justiça – aliada à fraternidade – e outros nobres sentimentos são manifestações desse componente superior do nosso caráter. Tudo o que de bom existe no indivíduo é o que podemos chamar de Parte Divina, ou Porção Solidária, independente se a pessoa sabe ou não que possui. As pessoas infelizes são as que não procuram tal poder, ao contrário das pessoas que buscam a felicidade verdadeira que vão ao encontro dessa nobre parcela. Aplicação da Pedagogia do Afeto Através do projeto Criança: Futuro no Presente! a LBV tem contribuído na vida de muitas famílias. Em Londrina, atende 100 crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos, em dois períodos de 4 horas, no contraturno da escola. Com demanda de agressividade e dificuldade de contato/afeto, os educadores trabalham o relacionamento interpessoal, o diálogo assertivo, a mediação de conflitos, através das rotinas diárias, das oficinas e combinados de convivência. Em oficinas socioeducativas, são trabalhadas temáticas em diferentes áreas como: cidadania ecumênica, arte e cultura, corpo e movimento, taekwondo e musicalização. A palavra-chave da oficina de Cidadania Ecumênica é “respeito”. Nela são trabalhados temas relacionados às necessidades sociais e individuais dos educandos, estimulando a vivência de bons sentimentos e o exercício dos valores éticos (afetividade, convívio, autoestima, solidariedade, respeito mútuo, fortalecimento de vínculos, justiça, autocuidado, projeto de vida, diálogo, conteúdos informativos, etc.) e a reflexão sobre valores morais, esclarecendo-a sobre seus direitos e deveres. Através dessas oficinas, do contato com as outras crianças e das orientações de rotina e higiene, a criança se desenvolve e passa a se sentir parte responsável, como podemos ver no depoimento de T.P, mãe de uma aluna: Elas chegam em casa e dizem ‘mãe, a LBV me ensinou a usar garfo e faca’, porque geralmente só dou colher. E ela fala ‘mãe, a educadora disse que
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a gente tem que aprender a não desperdiçar’. Vocês ajudando a gente e a gente ajudando em casa, acho legal essa parte.
Em oficinas de Arte e Cultura são trabalhadas diversas linguagens da arte. Com atividades de desenho, pintura, teatro dança, culinária e artesanato, é feito o incentivo à observação, sensibilidade e percepção, desenvolvendo a criatividade e diversas habilidades. Através de oficinas de Corpo e Movimento é trabalhado o desenvolvimento das estruturas psicomotoras de base e outros aspectos de percepção e do desenvolvimento corporal e físico, de acordo com as necessidades e características de cada faixa etária. As aulas de taekwondo são realizadas uma vez por semana através de parcerias externas. São trabalhadas habilidades específicas da modalidade, que contribuem para o desenvolvimento físico e social do educando. Há também oficinas de Musicalização, permitindo o contato com o mundo da música, através da leitura de partituras, estudo de ritmos e instrumentos. Todos os projetos elaborados dentro dessas oficinas são norteados pela proposta da Pedagogia do Afeto através da metodologia MAPREI, com o objetivo de promover, com qualidade, o desenvolvimento harmônico do ser integral (inteligência do corpo e espírito). A aluna B.F.S (10 anos) exemplifica esse desenvolvimento através de seu depoimento: Eu gosto de fazer tudo. Me sinto muito alegre. Eu aprendi muito coisa nova, antes nem sabia que tinha. E eu fiquei diferente, antes eu era mais quietinha, agora eu sou mais soltinha. Antes eu não fazia [prece] antes de dormir, agora eu faço. E também tem o que a gente aprende nas oficinas. Por exemplo, artesanato, não sabia fazer um tipo de artesanato e aprendi a fazer aqui. Agora faço em casa todo dia.
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Quando questionado se havia observado alguma mudança em sua filha, um pai relatou: No comportamento de mãe com filho, com irmão, com amigos, ela interage mais, consegue se expressar melhor. (C.S.)
Semanalmente, toda a equipe discute alguns casos e traça estratégias para intervenção. Através desta troca, todos os profissionais se envolvem buscando sempre melhorias em seus atendimentos e orientam as famílias de uma forma mais assertiva. A equipe, de certa forma, funciona como modelo de interação para os pais: Aqui vocês chamam bastante atenção, mas naquela atenção do diálogo. Acredito que a questão do diálogo foi bastante importante. [...] Aqui vocês dão bastante atenção! [...] a gente está passando por um apuro lá com uma criança e vocês sabem como chegar na criança, sabem como chegar nos pais. E a gente percebe que em outras instituições, as pedagogas ficam perdidas às vezes. Então é bem diferente, eu acho que aqui é 100%. Vocês deviam ser exemplo pra outras escolas (T.P – mãe de aluna). Antes, [...] se não obedecesse na hora a primeira coisa era erguer o tom de voz e não explicar. Agora eu explico o porquê que tem que fazer aquilo, o que pode acarretar. Aprender a ouvir a criança (C.S – pai de aluna)
Ainda, uma vez por mês há um encontro de família, onde todos os responsáveis são convidados a discutirem temas que também estão sendo abordados com as crianças. Assim, proporcionam às famílias um espaço de acolhimento, escuta, troca de experiências e informações, conhecimento e acesso à direitos e deveres, estimulando um protagonismo em suas vidas. Através da vivência dos profissionais e também depoimento de usuários, pode-se observar o quanto essa promoção da convivência e da troca de experiências, contribui positivamente:
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A gente conhece pessoas, tem mais amizades com outras mães. A gente conhece outras histórias. Então, isso é interessante, porque às vezes a gente está lá deprimida, a gente pensa só na gente, mas daí a gente participa e vê outras mães e pensa: nossa, então não é só eu que estou passando por isso! (T.P – mãe de uma aluna).
A discussão dos temas nas reuniões de família, além de esclarecer dúvidas, auxiliar nas dificuldades que os responsáveis têm, capacitam a família para abordar e lidar melhor com as crianças, como podemos observar no depoimento abaixo: Nas reuniões uma vez por mês, aborda sempre um assunto que a gente aprende. E a gente também aprende e passa pras crianças. Na hora de educar, a gente consegue ter uma preparação melhor. [...] Às vezes, um assunto que a gente precisa tratar com a criança, sobre sexo, alimentação, religião, e quando a gente participa das reuniões, como a gente vai abordando os assuntos, na hora da gente ter que passar pra criança, na hora de educar, de explicar, acaba aprendendo e na hora da gente passar pras crianças, a gente acaba ensinando um pouco melhor (A.P.A – mãe de aluna).
Muito mais do que ensinar conteúdo, a Pedagogia do Afeto tem por objetivo envolver a criança no processo de aprendizagem. Despertar este interesse pelo conhecimento, favorece o desenvolvimento da criança. R.V.P.J. (8 anos), quando questionada sobre o que aprendia na instituição, relatou: Se comportar, estudar, escrever, fazer as perguntas, ouvir as professoras que estão falando. Gosto de brincar, de estudar, de aprender os exercícios e eu quero aprender tudo isso que está aqui na LBV.
Conclusão Conforme afirma Paiva Netto (2010), o ser humano tem muito mais aptidões para sobrepujar problemas do que acredita. A maioria das pessoas atua de forma muito restrita ao seu potencial. Provavelmente isso se deva à dificuldade de explorar sua capacidade emocional. Ensinam-se conteúdos,
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mas o mais importante, a convivência, o relacionamento, o controle dos sentimentos é deixado para segundo plano. Estudos da neurociência comprovam a influência das emoções na cognição. Ainda, dentro da psicologia do desenvolvimento, as interações sociais têm sido vistas como fator fundamental do desenvolvimento cognitivo e socioemocional dos indivíduos. Desta forma, é pertinente inserir no sistema de ensino uma metodologia que envolva a criança no processo de aprendizagem. Se identificar e se reconhecer é o primeiro passo para despertar a curiosidade, para investigar o assunto e desenvolver o interesse para produzir conhecimento. Poder partilhar de suas ideias e conhecer a opinião do outro é essencial para se reconhecer enquanto ser ativo social. Se a criança, em sua convivência diária, percebe que o seu pensamento e seu sentimento têm valor dentro do grupo que participa, reconhece-se como objeto de transformação no ambiente em que vive. Paiva Netto destaca que o amor solidário é capaz de afastar o crime, a miséria e a dor quando compreendido e desempenhado em todo o seu poder compassivo, justo, e, portanto, eficaz, não somente pela religião, mas também pela política, pela ciência, pela economia, pela arte, pelo esporte. Observa-se a grandiosidade no trabalho realizado pela LBV e a importância da aplicação da Pedagogia do Afeto através dos resultados positivos alcançados, quando, através da convivência diária e das oficinas socioeducativas, conseguem alinhar os valores morais e éticos a uma educação de excelência que desperta o interesse pelo aprender, trazendo o educando como protagonista no processo de aprendizagem. Essa participação ativa, motiva a criança a permanecer no ambiente escolar, reforça sua autoestima para interagir com colegas e mestres e, principalmente, promove a responsabilidade por atuar e modificar a sociedade e o ambiente no qual está inserido. Trabalhar as distintas percepções em todas as áreas da vida, a cidadania ecumênica, mais do que ensinar o jovem a respeitar o que lhe é diferente, desperta a curiosidade para o novo e a busca de melhoria, do aperfeiçoamento.
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Referências Bibliográficas DELL PRETTE, Almir. e DELL PRETTE, Zilda A. P. Psicologia das relações interpessoais: Vivências para o trabalho em grupo. Petrópolis: Vozes, 2001. LBV – Legião da Boa Vontade. Plano de Ação 2014. LBV. Manual da pedagogia do afeto e da pedagogia do cidadão ecumênico. Educação com espiritualidade ecumênica. São Paulo: Editora Elevação, 2009. NETTO, Paiva. É urgente reeducar! São Paulo: Elevação, 2010. Superintendência Socioeducacional. Diretrizes e processos técnicos.
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Centro de Apoio e Esperança: Transformando vidas Yuri Shirado
RESUMO: Este artigo objetiva retratar e evidenciar o case de sucesso denominado Centro de Apoio Esperança – CAE, organização não governamental e sem fins lucrativos que promove a melhoria da qualidade de vida de pacientes em tratamento carcinogêneses junto ao Hospital do Câncer de Londrina – HCL e que se apresentem em vulnerabilidade social. Da origem até os dias atuais, já se passaram algumas décadas, desde que a fundadora e gestora da ONG, a sra. Iracema dos Santos, dedicou e dedica-se diariamente em prol de pessoas que a princípio desconhecidas, tornam-se conhecidas, colegas, amigos, e porque não dizer, parte de uma grande família unida pela empatia, solidariedade e acima de tudo amor ao próximo. Contudo, ao realizar pesquisas atreladas à iniciativa social empreendedora e à inovação sustentável na cidade de Londrina, deparamo-nos com padrões e características peculiares a entidades que integram o terceiro setor. Nesse sentido, o estudo abordará abrangentemente os desafios, as melhores práticas e os impactos de gestão organizacional de uma entidade que busca “oferecer atendimento social, psicológico e espiritual às pessoas em tratamento e aos seus familiares, preparando-as para enfrentarem os dilemas e as dificuldades decorrentes da doença”. ¹ Palavras-chave: Iniciativas Sociais, Empreendedorismo, Gestão e Planejamento Organizacional, Assistência Social e Voluntariado, Inclusão Social.
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Introdução Introdutoriamente, inicio este artigo com uma preocupante estimativa do Instituto Nacional do Câncer – INCA, que conjuntamente com o Ministério da Saúde afirma que no ano de 2014 o Brasil deverá ter cerca de 576 mil novos casos de câncer diagnosticados (Estimativa 2014 – Incidência de Câncer no Brasil).² Adicionalmente e segundo o Ministério da Saúde, atualmente a neoplasia maligna apresenta-se como a segunda principal causa de mortes em nível global, atrás somente das doenças cardiovasculares. E de acordo com reportagem divulgada no site da British Broadcasting Corporation – BBC, o Brasil terá até o ano de 2020 um aumento de 38% de novos casos de câncer diagnosticados.³ Diante tal cenário, e apesar dos avanços da medicina e das pesquisas, esta patologia além dos efeitos dos tratamentos disponíveis, ocasiona efeitos colaterais pelo prisma psicoemocional nos pacientes e em seus familiares. Eis que nesse panorama, mais especificamente na cidade de Londrina, uma empreendedora social com dinamismo fundou a ONG Centro de Apoio e Esperança, que tem por missão: “Minimizar as angústias e dificuldades das pessoas em situação de vulnerabilidade social, que realizam tratamento de câncer em Londrina, através de atendimento social, psicológico e espiritual para um melhor enfrentamento da doença. Bem como a busca pela aplicação dos direitos humanos.”4
Com a expertise da sra. Iracema Santos, que já realizou trabalhos sociais e voluntários em outras instituições e inclusive como missionária e catequista, vislumbrou a necessidade de estruturar um local que permitisse o acolhimento de pacientes em tratamento de câncer e de seus respectivos acompanhantes, considerando-se que o Hospital de Câncer de Londrina – HCL, absorve a demanda dos municípios próximos a Londrina. Nesse sentido indaga-se a você, leitor: Como e de onde surgem as grandes ideias? E as ideias inovadoras e de sucesso? Os diferentes modelos de negócios? Enfim, como desvendar, argumentar e, mais importante, responder a essas perguntas?
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O estudo de caso da organização não-governamental denominada Centro de Apoio e Esperança tem a finalidade de ratificar as singularidades intrínsecas as entidades do terceiro setor, e que representam-se como modelos de negócios inovadores, que impactam principalmente pelo propósito junto à sociedade. Desenvolvimento Mediante a proposição deste trabalho, foi realizada a estruturação do planejamento do artigo, que contemplou a etapa de pesquisa/investigação na jornada do conhecimento do CAE. Tendo em vista o desenvolvimento do trabalho pautamos seis linhas gerais de direcionamento: 1. Problematização: a. Como ações de gestão organizacional transformam os resultados e impactam na sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo? 2. Delimitação: a. Como ações de gestão e planejamento transformam os resultados e impactam na sustentabilidade? 3. Hipótese: a. A gestão e planejamento organizacional transformam os resultados e impactam na sustentabilidade da CAE, visto que essas ações fornecem à entidade informações relevantes de seu cotidiano, fomentando a tomada decisão com maior assertividade. 4. Objetivo Geral: a. Analisar como Planejamento e Gestão Organizacional transformam os resultados e impactam na sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo – CAE; b. Verificar como o Planejamento e Gestão Organizacional transformam os resultados e impactam na sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo – CAE; c. Disseminar a importância da gestão e planejamento para o terceiro setor.
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5. Objetivos Específicos: a. Disseminar o conceito de Empreendedorismo Social; b. Conceituar o tema Planejamento Organizacional e Gestão para o Terceiro Setor; c. Conceituar o tema de Sustentabilidade Organizacional; d. Descrever os benefícios e resultados da aplicabilidade de Gestão e Planejamento Organizacional para o terceiro setor. 6. Metodologia: a. Coleta de informações; b. Referencial bibliográfico. Por intermédio da realização de levantamentos dos estágios deste artigo, o planejamento e a organização das ações foram auferidos e de forma coerente perante ao objetivo final. Mediante a essência deste projeto, efetuou-se coleta de informações via entrevista presencial junto à responsável executiva da entidade, que permitiu obter o embasamento necessário para elaborar e demonstrar que a gestão e planejamento organizacional transformam os resultados e impactam na sustentabilidade do CAE, uma vez que estas ferramentas fornecem a entidade informações relevantes de seu cotidiano, fomentando a tomada decisão com maior assertividade. O Centro de Apoio e Esperança atualmente apresenta a seguinte estrutura: 1. Uma equipe composta por 20 pessoas, que ocupam as funções abaixo: a. Diretoria: 6 pessoas; b. Unidade Gestora de Transferência: 3 pessoas; c. Conselho Fiscal: 3 pessoas; d. Funcionários: 2 celetistas; e. Voluntários: 6 pessoas. 2. A estrutura física atual contempla os espaços a saber: sala de convivência, copa, cozinha, loja da entidade/sala do administrativo, dormitórios femininos e masculinos, pátio aberto e 2 banheiros.
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3. Presentemente, a entidade detém como capacidade máxima de acolhimento de internos o número de 16 pacientes e/ou acompanhantes; 4. Diariamente o CAE fornece alimentação média para 80 pessoas, sendo que os mantimentos são em grande parte advindos de doações de empresas privadas e pessoas físicas; 5. Os recursos para manutenção da entidade advêm de algumas fontes: a. Fontes fixas, como os aportes financeiros na forma de doação de alguns municípios, no valor médio de um salário mínimo; b. Fontes variáveis, como eventos, leilões, venda de artesanato na loja da entidade, doações esporádicas da comunidade e bingos beneficentes; 6. O CAE possui as seguintes qualificações: a. Utilidade Pública Municipal Lei Nº 9.148 – Data: 09/09/2003; b. Utilidade Pública Estadual Lei Nº 14.148 – Data: 19/09/2003; c. OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – 08015.013312/2002-04; d. Registro no Conselho Municipal de Assistência Social Atestado Nº 066 – Data: 20/10/2009; e. Selo da Cidadania Edição 2004 Lei Nº 9.536 de julho de 2004. 7. No ano de 2013 a entidade realizou atendimento a 2.975 pessoas em regime de abrigo e ofertou 8.036 refeições aos paciente em regime de transeuntes e acompanhantes, um aumento percentual de 19,95% e 0,94%, respectivamente em relação ao ano de 2011; a. Adicionalmente a entidade manteve-se em funcionalidade por 258 dias, ou seja, mais de 70% dos ano de 2013; b. Foram atendidos em torno de 160 municípios. 8. A entidade disponibiliza de forma gratuita atendimentos assistenciais, psicológicos e sociais aos pacientes e/ou acompanhantes em vulnerabilidade social;
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9. Um dos próximos projetos da gestora, que a priori está em andamento, é a finalização da nova sede do Centro de Apoio Esperança, que iniciouse em 2012 e que após finalizada propiciará a expansão para 30 leitos de atendimento; 10. A entidade, atenta ao apelo e a divulgação das redes sociais, desenvolveu uma campanha denominada “A Copa ainda não Acabou”, que tem por objetivo angariar fundos para finalização da obra da nova sede. Por meio dos dados coletados, observa-se que a entidade demonstra preocupação com a questão financeira e organizacional para os próximos anos, considerando-se que a alteração para a nova sede acarretará automaticamente em aumento de custos fixos, visto a ampliação dos atendimento. Credita-se o atual cenário da entidade a postura centralizadora da sra. Iracema, Santos, que zela diretamente de todas as necessidades do CAE. Faz-se jus em narrar que nos 12 anos de existência o Centro de Apoio Esperança personifica o ideal empreendedor de sua fundadora, e que na última década desempenha forma impar sua utilidade pública focada essencialmente na inclusão social e na minimização dos efeitos colaterais que a neoplasia maligna resulta nos pacientes e em seus familiares. Planejamento, Gestão e Sustentabilidade Organizacional Contemporaneamente, e de forma indiscriminada, a sociedade se apropriou de termos que antes estavam mais restritos às esferas empresariais e de negócios. Entretanto, as vicissitudes cada vez mais estreitam os limites entre a carreira profissional e a vida pessoal, compelindo o indivíduo a entender e aplicar conceitos como Planejamento, Gestão e Sustentabilidade, seja no âmbito organizacional ou pessoal. Mediante ao preâmbulo acerca da relevância dos termos supracitados, cabe salientar que, via de regra, as organizações não-governamentais originam-se de razões que a priori não objetivam o resultado financeiro, mas sim a favor de uma causa e/ou em prol de pessoas em vulnerabilidade social.
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Nesse sentido, e compreendendo as bases e fundamentos inerentes à criação de uma ONG, e que a grande maioria destas entidades focam seus esforços nas ações práticas, este artigo busca evidenciar a relevância do Planejamento, Gestão e da Sustentabilidade Organizacional. Segundo descrito no site Portal da Administração, “Planejamento é um processo contínuo e dinâmico que consiste em um conjunto de ações intencionais, integradas, coordenadas e orientadas para tornar realidade um objetivo futuro [..]”.5 Assim podemos inferir que o Planejamento representase como o mapa de ações e necessidade de um projeto, e como também os direcionamentos necessários para ascender a proposta inicial, seja esta, um plano pessoal, profissional, acadêmico e/ou familiar. Não obstante, ressalvase que o ato de planejar deveria estar intrínseco no cotidiano dos brasileiros; contudo, essa realidade ainda apresenta-se um pouco distante para o Brasil. Nesse cenário, no qual entidades sem fins lucrativos emergem com escassez de conhecimentos gerais de como planejar e/ou gerir uma entidade a longo prazo, impreterivelmente a sustentabilidade organizacional ficará comprometida e consequentemente situações de insolvência financeira e de operações torna-se uma previsão factível e real. Adicionalmente, faz-se mister relatar que a estruturação de um bom planejamento organizacional influencia diretamente na gestão organizacional, que por fim produz resultados junto à sustentabilidade organizacional, que consequentemente fomenta a perenidade das instituições, sejam estas privadas, públicas ou mistas, visto que, conforme Crozeta apud Merege (2009, p 1), a “Sustentabilidade Organizacional identifica-se com a função de gestão e é onde temos atualmente a maior atenção com relação a formação de dirigentes do terceiro setor em nosso país.”6 Terceiro Setor - Assistência Social e Voluntariado Nas últimas décadas, o Brasil vem internalizando alguns termos estrangeiros, e adaptando-os conforme a realidade brasileira. Assim ocorreu com o termo third sector, que em tradução literal resulta na denominação:
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terceiro setor. Esta área tem atraído e demandado atenção de estudiosos sociais, uma vez que esta área demonstrou um crescimento significativo, além de maturidade e estabilidade perante ao primeiro e segundo setor. Esta afirmação é amparada pelo ministro Gilberto Carvalho: “Existem hoje no Brasil cerca de 290 mil organizações da sociedade civil, segundo o IBGE. Este dado mostra o enorme contingente de associações e fundações existentes no País. A atuação das organizações se dá em diversas áreas, com predominância das que atuam na defesa de direitos e interesses dos cidadãos. Outro dado importante é que as organizações empregam mais de dois milhões de trabalhadores formais, o que representa quase 5% dos trabalhadores do Brasil.”7
Adicionalmente, Carvalho complementa: “Nos últimos 12 anos, foi crescente a colaboração da sociedade civil nas políticas públicas. Um número maior de organizações passou a atuar com recursos públicos, em muitos casos pela primeira vez. Mesmo com essa presença maior da sociedade civil nas políticas públicas, somente uma pequena parte das organizações existentes realizou nos últimos anos parcerias com o governo federal, cerca de 3% do total. Isso demonstra que podemos contar com muito mais organizações na efetivação das políticas públicas do que fazemos atualmente.”8
Vale salientar ainda que, segundo CAVALCANTI, 2004 apud AVANCINI, Eliane V. and. CORDEIRO, Sandra Maria A., o setor em crescimento nos países desenvolvidos para o século XXI serão as organizações sem fins lucrativos, o denominado terceiro setor.9 Já no que tange à questão de assistência social e ao voluntariado, Carvalho menciona que: “A presença do voluntariado também é marcante na atuação das organizações: 72% delas estão em atividade sem possuir nenhum funcionário assalariado. Essa é uma expressão da generosidade do
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povo brasileiro que, historicamente, esteve presente no País – desde as irmandades que faziam o socorro dos desvalidos e dos marginalizados, passando pelas entidades que lutaram pela redemocratização durante a ditadura militar, até as criadas mais recentemente em torno da mobilização por direitos culturais, ambientais, pelo direito à cidade e outras agendas.”10
Cabe mencionar que segundo a GIFE – Grupo de Institutos, Fundações e Empresas, no ano de 2013 o terceiro setor obteve um crescimento de 16% de investimentos11, o que pode ser considerado um índice de grande relevância e expressão. Mediante este novo cenário e a quebra de paradigmas em relação ao terceiro Setor e ao voluntariado, a perspectiva de integração junto a empresas privadas seja cada vez mais fortalecida e benéfica, resultando em uma sociedade mais ativa e sustentável. Conclusão Através das observações e das entrevistas, ou melhor dizendo, das conversas informais com a sra. Iracema Santos, que atua como gestora da entidade, o CAE possui de forma incipiente ações de gestão organizacional e de planejamento estratégico, que a priori foram incutidas na ONG, mediante a experiência e acertos e erros da fundadora, e não necessariamente devido ao conhecimento das ferramentas e de suas vantagens. Assim, vale salientar que, apesar do desconhecimento técnico, a gestora detém a vivência, que permite ao CAE dar continuidade aos projetos e demandas emergentes. E a como diz a sra. Iracema: “Sonhar com o futuro é acreditar no ser humano”.
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Referencial Bibliográfico Em http://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/ redacao/2013/11/27/brasil-tera-576-mil-novos-casos-de-cancer-em-2014diz-ministerio-da-saude.htm disponível em 26/08/2014. Disponível em 26/08/2014. 1 Em http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2013/11/ministerio-estima577-mil-novos-casos-de-cancer-no-brasil-em-2014.html disponível em 26/08/2014. 2 Emhttp://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/04/130426_lancet_ relatoiro_cancer_america_latina_rw disponível em 26/08/2014. 3 Em http://www.centrodeapoioesperanca.org.br/ disponível em 26/08/2014. 4 Em http://www.administradores.com.br/artigos/negocios/o-que-eplanejamento/39381/ disponível em 20/08/2014 5 Emhttp://www.bibliotecavirtual.celepar.pr.gov.br/arquivos/File/ ArtigosFuncionarios/Artigo_Mirian_Sustentab.pdf disponível em 20/08/2014. 6 Em http://www.brasil.gov.br/governo/2014/04/ministro-gilbertocarvalho-fala-sobre-o-terceiro-setor disponível em 20/08/2014. 7 8 10 CAVALCANTI, 2004 apud AVANCINI, Eliane V. and. CORDEIRO, Sandra Maria A. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/ssrevista/c_v7n1_ sandra.htm. disponível em 20/08/2014. 9 Em http://www.revistaleader.com.br/artigos_int.asp?id=28 disponível em 28/08/2014. 11
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Resíduo Eletrônico: O lixo que pode levar informação e conhecimento Cleufe Almeida Yuri Shirado
RESUMO: A proposta deste artigo é elucidar/demonstrar os desafios perpassados por organizações que apresentam características/propriedades sustentados nos pilares da Iniciativa Social Empreendedora e da Inovação Sustentável na cidade de Londrina. Nesse sentido, este estudo abordará a organização nãogovernamental denominada E-Lixo, que foi idealizada no ano de 2007 a partir da congregação da díade: Visão Empreendedora x Diagnóstico do Problema: Inexistência de local para correta destinação de passivos eletroeletrônicos. Assim, contextualmente surgia a primeira etapa de construção da entidade, que se institui como personalidade jurídica em 17/03/2008, e desde então se configura como agente transformador junto à comunidade londrinense nos âmbitos social, econômico e financeiro. A entidade operacionaliza suas ações e esforços sobretudo na Gestão e Reciclagem de Resíduos – Passivos Eletroeletrônicos. Complementarmente a entidade coordena e estrutura campanhas de conscientização e coleta de equipamentos com parceria de entidades públicas e privadas da cidade. Palavras-chave: Iniciativas Sociais, Empreendedorismo, Gestão e Planejamento Organizacional, Sustentabilidade Ambiental, Resíduos Eletrônicos.
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Introdução Eis que se inicia este preâmbulo com alguns questionamentos fundamentais sobre os temas aqui relacionados, a saber: Iniciativas Sociais e Empreendedorismo. Indaga-se a você, leitor: Como e de onde surgem as grandes ideias? E as ideias inovadoras e de sucesso? Os diferentes modelos de negócios? Considerando-se o texto supracitado, e o estudo de caso da organização não-governamental E-Lixo, este artigo tem a proposição de auxiliar a elucidação destes tópicos, na jornada de conhecimento acerca das particularidades intrínsecas a ONGs que se tornaram referência de sucesso e iniciativas sociais de impacto em uma sociedade civil. Aparentemente, e de forma muito simplista, poderíamos ponderar que as ideias e/ou negócios surgem em sua grade maioria de momentos de inspiração e reflexão. Entretanto, creditar e alicerçar o sucesso de uma entidade somente sobre lampejos e insights seria uma decisão prematura e incipiente, pelo prisma empreendedor e organizacional. Nesse sentido, apoiado e corroborado por intermédio da entrevista presencial, no processo de criação a E-Lixo, duas foram as bases de maior significância, a saber: 1. Necessidade e/ou problema a ser solucionado; 2. Visão empreendedora alinhada ao espírito criativo. Fundamentado nas duas premissas citadas, a concepção de constituir uma ONG foi idealizada a partir de uma necessidade/problema com que o fundador Alex Gonçalves se deparou em sua profissão de técnico de informática. Alex defrontou-se com a dificuldade de realizar a correta destinação e descarte dos resíduos e passivos gerados em sua profissão, tais como sucatas, plásticos, vidros, metais, e principalmente equipamentos eletrônicos sem funcionalidade dos clientes atendidos. Mediante ao cenário exposto, e após algumas verificações informativas, o fundador certificou-se de que em Londrina/PR inexistia uma empresa ou
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entidade que executava a Gestão e Reciclagem de Resíduos Ambientais, e desta forma, em 17 de março de 2008 a ONG E-Lixo é constituída juridicamente como Associação de Recicladores de Lixo Eletrônico. A partir dessa data, a grande ideia que tornou-se realidade vem contribuindo na gestão e reciclagem de resíduos eletrônicos de Londrina e Região Metropolitana. Desenvolvimento Considerando-se o planejamento do escopo deste estudo de caso, fez-se mister o cumprimento de estágios de pesquisa/investigação na construção do conhecimento da E-lixo. À vista disso, o desenvolvimento deste trabalho pautou-se em seis vertentes essenciais de norteamento de estruturação deste capítulo: 1. Problematização: a. Como a gestão organizacional influência nos resultados e na sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo? b. A ausência de gestão organizacional influência na sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo? 2. Delimitação: a. Como a gestão e planejamento das ONGs influência em seus resultados e na sustentabilidade? 3. Hipótese: a. A gestão e planejamento organizacional influencia nos resultados e sustentabilidade na ONG E-Lixo, uma vez que viabiliza a entidade a documentar, validar e tomar decisões através das informações de suas atividades diárias, contribuindo para sua missão e visão. 4. Objetivo Geral: a. Analisar como o planejamento e gestão organizacional influencia nos resultados e sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo – ONG E-Lixo;
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b. Verificar como o planejamento e gestão organizacional influencia nos resultados e sustentabilidade de iniciativas sociais de empreendedorismo – ONG E-Lixo; c. Disseminar a importância da gestão e planejamento para o terceiro setor. 5. Objetivos Específicos: a. Disseminar o conceito de Empreendedorismo Social; b. Conceituar o tema Planejamento Organizacional e Gestão para o Terceiro Setor; c. Conceituar o tema de Sustentabilidade Organizacional; d. Descrever os benefícios e resultados da aplicabilidade de Gestão e Planejamento Organizacional para o terceiro setor. 6. Metodologia: a. Coleta de informações; b. Referencial bibliográfico. Assim foi possível organizar as ações a serem efetivas, e por fim atender ao resultado final de entrega deste estudo caso. Considerando-se a natureza deste trabalho, foram efetuada coleta de informações via entrevista presencial junto a responsável executiva da entidade, que possibilitou obter o embasamento necessário para elaborar e demonstrar que a gestão e planejamento organizacional influenciariam diretamente nos resultados e na sustentabilidade da ONG E-Lixo, uma vez que estas ferramentas viabilizariam no aprimoramento dos procedimentos e atividades inerentes a entidade, tais como: documentação, validação e tomada de decisão com maior grau de assertividade, visto que as deliberações seriam amparadas por dados e informações de seu cotidiano, e assim refletir e fomentar a Missão, a Visão e os Valores da ONG. Atualmente a ONG E-Lixo detém/apresenta o seguinte cenário/ perspectiva: 1. Um quadro de 7 colaboradores celetistas, todos devidamente registrados;
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2. Baixos índices de rotatividade, que podem ser creditados parte a predominância/histórico do perfil dos colaboradores e parte pela estabilidade que a entidade propicia; 3. Segundo informações coletadas na entrevista presencial, cerca de 30% da receita é destinada ao custeio de despesas fixas da ONG; 4. A entidade possui um projeto em andamento de alocação e expansão de parte da produção junto ao Creslon – Regime Semiaberto de presidiários de Londrina; a. Esse projeto tem o objetivo, permitir a qualificação e a reinserção deste público na sociedade; b. A priori a demanda média de indivíduos a serem realocados na sociedade está próximo a 150 pessoas; 5. A organização mantém-se de forma independente, sem recursos públicos ou privados. Contudo vale ressaltar que a organização dispõe de alguns formatos de captação de recursos: a. Loja da Entidade: Todos os equipamentos arrecadados como doação são submetidos a uma etapa de triagem, na qual são segregados os equipamentos que apresentam características de função intactas. Estes serão destinados para compor os itens de exposição da loja da ONG para revenda; b. Venda de sucata: Partes dos equipamentos que não podem ser reutilizados tornam-se sucata e são revendidos separadamente, como por exemplo: plástico, metais, vidros e demais passivos; c. Adicionalmente e de forma regular, a entidade realiza ações e campanhas de recolhimento e arrecadação de resíduos eletrônicos, seja de forma isolada ou conjunta com empresas privadas ou públicas. Esta atividade representa um dos principais canais para angariar equipamentos eletroeletrônicos da E-Lixo, de modo a contribuir com o volume de matériaprima na fase de triagem; 6. No que tange ao viés social, a E-Lixo mediante demanda e solicitação, realiza doação de computadores completos para diversos projetos sociais;
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7. Conforme o coleta de informação, a organização necessita adquirir dois maquinários que resultariam em melhores condições financeiras e estruturais, visto que ambos os equipamentos gerariam maior rentabilidade a instituição, pois ambos os passivos (plástico e vidro), atualmente são tratados como sucata, ou seja, as aquisições prioritárias são o Triturador de Plástico e Descontaminador Químico de Vidro. 8. A organização possui setores bem definidos no que tange à tipologia de equipamentos, tais como: Setor de Informática, Setor de Equipamentos de Áudio e Vídeo, Setor de Descarte e Sucatas, Setor Administrativo e Loja da Entidade; a. O atual espaço não mais comporta as demandas da entidade, que objetiva conseguir encaminhar um processo de solicitação de espaço junto ao poder público municipal; 9. A E-Lixo iniciou recentemente um novo desafio e está operacionalizando a implantação/instalação de uma filial na cidade de Curitiba, junto a uma instituição prisional, atuando na qualificação e na ressocialização dos detentos, contribuindo para com a proposta de sistema humanizado de presídios; 10. A ONG E-Lixo foi premiada como a primeira colocação no ano de 2009, junto à pesquisa Top de Marcas na categoria Top Posicionamento – Responsabilidade Ambiental. Segundo dados coletados, a instituição tem-se estruturado financeira e organizacionalmente nos últimos dois anos, e assim vem implantando noções de gestão organizacional. Entretanto, quando questionada acerca de planejamento, a responsável executiva entende que o processo cultural de mudança está em fase embrionária, e reconhece a imprescindibilidade de ferramentas e métodos de planejamento e gestão que resultarão em ganhos e sustentabilidade a longo prazo. De forma pontual, e diante as observações constatadas na visita, observouse a carência e a pertinência de execução do Planejamento Estratégico da E-Lixo, uma vez que, com a ampliação da entidade para Curitiba, haverá demandas na melhoria de processos na comunicação integrada, nas tomadas
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de decisões sincrônicas, e principalmente na unicidade da Missão, Visão e Valores, considerando-se que esta expansão já motivou a mudança de residência do fundador Alex Gonçalves para a cidade de Curitiba. Faz-se jus em narrar que a ONG E-Lixo personifica o ideal empreendedor de seu fundador, e que nos últimos sete anos vem desempenhando de forma impar sua utilidade pública focada essencialmente na Gestão Ambiental, em uma cidade que tem-se tornado referência como polo de tecnologia, e mais recentemente iniciou sua atuação na Gestão Social, apoiando e oportunizando a inserção social. Nesse sentido a entidade apesar das intempéries financeiras, organizacionais e gerenciais, tem dado continuidade ao seu objeto central: Pensamento Verde e Consciência Social. Planejamento Organizacional e Gestão do Terceiro Setor O Planejamento é a maneira organizada de planejar e gerenciar uma ideia que envolva pessoas e resultados é a forma de determinar o direcionamento bem como as ações de correção ao longo do processo. Desta forma independe se a empresa seja pública ou privada, com ou sem fins lucrativos necessita ter visão clara dos objetivos e estratégias a que se propõe. Não obstante lembrar que de uma forma geral planejar não faz parte da cultura do brasileiro, desta forma observa-se resultados negativos, endividamentos e falência dentro das organizações independentemente do modelo que seja. Dentro do Terceiro Setor o planejamento requer mais atenção e organização, pois envolve dinheiro muitas vezes público e pessoas que buscam acima de tudo resultados voltados para a comunidade e sociedade. “Ao contrário do que muitos pensam o setor em crescimento no século XXI em países desenvolvidos não será o de ‘negócios’, isto é, em atividades econômicas organizadas. Estudos confirmam que será o setor social sem fins lucrativos, o chamado terceiro setor, no qual a estratégia de atuação deverá incorporar os princípios e teoria do gerenciamento sistemático para produzir os maiores resultados com maior rapidez.” (CAVALCANTI, 2004 apud AVANCINI, Eliane V. and CORDEIRO, Sandra Maria A.)
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O Terceiro Setor tem a necessidade de se profissionalizar enquanto projeto coletivo voltado para a sustentabilidade. Profissionalização e comportamento empreendedor seriam as formas de garantir a integridade e o sucesso do empreendimento. Diante da complexidade do cenário organizacional, o Terceiro Setor requer um Planejamento Estratégico pontual, bem como a profissionalização no quesito gestão que envolveria a questão de liderança, comportamento empreendedor e relacionamento interpessoal. Com isso, a ONG teria subsídios e parâmetros para tomadas de decisão e identificação, ao longo do tempo, das ações necessárias ao enfrentamento de estrangulamentos e desafios institucionais. Drucker (1995,p.39) reforça esse pensamento ao afirmar que uma organização sem fins lucrativos requer quatro coisas para funcionar: um plano, marketing, pessoas e dinheiro. Isso tudo de forma pensada, planejada e gerida traria possibilidades reais de sustentabilidade. Sustentabilidade Organizacional Até meados da década de 70, uma empresa poderia ser considerada sustentável se fosse economicamente saudável, com um bom patrimônio e lucros crescentes, mesmo se houvesse dívidas. Dentro do cenário empresarial, o Terceiro Setor requer conhecimento dos processos necessários para o acontecimento da sustentabilidade organizacional. A sustentabilidade, quando buscada pelas diversas formas de organizações existentes (empresas, universidades, ONGs, departamentos políticos, etc.) constitui-se em intentos que primam pela busca de um equilíbrio macro dos diversos processos. Para caracterizar uma organização como sustentável, esta deve ser analisada dentro de alguns aspectos relevantes: Sustentabilidade Social (o impacto causado à comunidade); Sustentabilidade Ambiental (preocupação com o meio ambiente); Sustentabilidade Econômica (competitividade, lucratividade, oferta de empregos e capacidade de expansão).
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Conclusão Observa-se que existe atualmente um início de planejamento e mudanças na ONG E-Lixo, existindo ainda a necessidade de ser feito um Planejamento Estratégico e Plano de Capacitação gerencial e de colaboradores. Em decorrência do modelo da ONG E-Lixo e seu papel diante da sociedade, bem como a sua importância no que diz respeito à sustentabilidade ambiental e social, a organização deve focalizar a questão da sustentabilidade econômica. Não é tão simples organizar, planejar e gerir um empreendimento, mas se faz necessário para o desenvolvimento, expansão e a sustentabilidade desse empreendimento tão importante para Londrina. Referências Bibliográficas CAVALCANTI, 2004 apud AVANCINI, Eliane V. and CORDEIRO, Sandra Maria A. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/ssrevista/c_v7n1_sandra.htm. Acesso em 08/08/2014 GONÇALVES, Alex. Disponível em http://www.elixo.org.br/. Acesso em 15/08/2014 Disponível em http://www.priberam.pt/DLPO/sustentabilidade. Acesso em 08/08/2014. DRUCKER, Peter F. Administrando em Tempos de Grandes Mudanças 1995, Ed. Pioneira.
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POSFÁCIO
Empreendedorismo Social: Legados da Formação Cidadã para os 80 anos de Londrina. Norman de Paula Arruda Filho1
Desde a fundação da Cátedra Ozires Silva de Empreendedorismo e Inovação Sustentáveis em 2011, o Instituto Superior de Administração e Economia (ISAE) tem incentivado a disseminação do conhecimento de forma a apoiar o desenvolvimento sustentável. Tendo como premissa a promoção de ações com o objetivo de fomentar o empreendedorismo e inovação, a Cátedra Londrina lança mais uma publicação em sinergia com o seu foco de atuação. Essa edição em homenagem aos 80 anos de Londrina, construída de forma coletiva, apresenta uma compilação de artigos que enaltecem o perfil empreendedor da cidade e o papel do cidadão londrinense nesse processo. Construído com o olhar de autores locais, o livro é uma contação de diferentes histórias, com diferentes perspectivas, mas com o mesmo foco: o processo de desenvolvimento da comunidade de Londrina, ao longo de sua história. Nas páginas você conheceu os contos de quem participou, contribuiu e ajudou a construir uma nova Londrina, permitindo a organização de um ambiente próspero e sustentável. Assim, ao entregar essa publicação à comunidade londrinense, a Cátedra Ozires Silva de Empreendedorismo e Inovação Sustentáveis contribui com quinto pilar de aprendizagem da Unesco, proposto por Jacques Delors: aprender a se transformar e a transformar a sociedade.
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Presidente do ISAE
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