ANOTAÇÕES SOBRE O PROCESSO PENAL BRASILEIRO - Volume 2

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ANOTAÇÕES

SOBRE O PROCESSO PENAL

BRASILEIRO

1ª edição 2024

Volume 2

Prova Procedimentos Atos jurisdicionais Sentença Nulidades Recursos Habeas Corpus Revisão Criminal Mandado de Segurança Reclamação

Diagramação: LivroEbook Diagramação eDesign

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Figueiredo Neto, Luis Nicomedes de Anotações sobre o processo penal brasileiro [livro eletrônico] : volume II / Luis Nicomedes de Figueiredo Neto. Campina Grande, PB : Ed. do Autor, 2024.

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Bibliografia.

ISBN 978-65-01-04540-5

1. Direito processual penal - Brasil I. Título.

24-210021 CDU-343.1 (81)

Índices para catálogo sistemático:

1. Brasil : Direito processual penal 343.1(81)

Eliane de Freitas Leite - Bibliotecária - CRB 8/8415

Data de fechamento da edição: 20.05.2024.

ANOTAÇÕES

SOBRE O PROCESSO PENAL

BRASILEIRO

Volume 2
Sumário Apresentação 12 Prova 1 ___________________________________________________________________________ 16 1.1. TEORIA GERAL DA PROVA 16 1.1.1. CLASSIFICAÇÃO 16 1.1.2. FINALIDADE 16 1.1.3. OBJETO 16
FONTE DE PROVA, MEIOS DE PROVA E MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA 17 1.1.5. SISTEMAS DE VALORAÇÃO DA PROVA 17 1.1.6. ÔNUS DA PROVA 17 1.1.7. INICIATIVA PROBATÓRIA DO JUIZ 18 1.1.8. ELEMENTO INFORMATIVO E PROVA 18 1.1.9. PROCEDIMENTO PROBATÓRIO 19 1.1.10. PRINCÍPIOS 20 1.1.11. PROVA ILÍCITA 21 1.1.12. PROVA EMPRESTADA 24 1.2. PROVAS EM ESPÉCIE - MEIOS DE PROVA 24 1.2.1. PROVA PERICIAL 24 1.2.2. INTERROGATÓRIO 32 1.2.3. CONFISSÃO 36 1.2.4. DECLARAÇÕES DO OFENDIDO 37 1.2.5. PROVA TESTEMUNHAL 37 1.2.6. RECONHECIMENTO DE PESSOAS OU COISAS 46 1.2.7. ACAREAÇÃO 47 1.2.8. PROVA DOCUMENTAL 47 1.2.9. INDÍCIO 48 1.3. PROVA EM ESPÉCIE - MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA 49 1.3.1. BUSCA E APREENSÃO 49 1.3.2. INTERCEPTAÇÃO DAS COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS E TELEMÁTICAS 55 1.3.3. ACESSO A REGISTROS TELEFÔNICOS E DADOS CADASTRAIS 60 1.3.4. CAPTAÇÃO AMBIENTAL 61 1.3.5. QUEBRA DE SIGILO FINANCEIRO, BANCÁRIO E FISCAL 64 1.3.6. AÇÃO CONTROLADA 66 1.3.7. INFILTRAÇÃO DE AGENTES POLICIAIS 67 1.3.8. O ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA 71 1.4. ENUNCIADOS DE SÚMULAS 77 1.4.1. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 77 Procedimentos 2 80 2.1. FASES DO PROCEDIMENTO PENAL 80 2.2. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO 80 2.3. CLASSIFICAÇÃO ____________________________________________________________________ 81 2.4. PROCEDIMENTO COMUM 82 2.4.1. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO 82 2.4.2. PROCEDIMENTO SUMÁRIO 87 2.4.3. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO 87
PROCEDIMENTOS ESPECIAIS PREVISTOS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL 91 2.5.1. TRIBUNAL DO JÚRI 91 2.5.2. DO PROCESSO E DO JULGAMENTO POR CRIME FUNCIONAL CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 106 2.5.3. DO PROCESSO E DO JULGAMENTO POR CRIME CONTRA A HONRA 107
1.1.4.
2.5.

2.6. PROCEDIMENTOS ESPECIAIS PREVISTOS EM LEIS ESPECIAIS

2.6.1. PROCEDIMENTO DAS AÇÕES PENAIS DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOSTRIBUNAIS

2.6.2. PROCEDIMENTO DAS AÇÕES POR CRIMES PRATICADOS COM VIOLÊNCIADOMÉSTICA E FAMILIAR

2.6.3. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL DOS CRIMES NO ÂMBITO DA ORGANIZAÇÃOCRIMINOSA

2.6.4. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL DOS CRIMES DE DROGAS

2.6.5. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A ECONOMIA POPULAR

2.6.6. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES FALIMENTARES

2.6.7. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE

2.6.8. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES AMBIENTAIS

2.6.9. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES DE LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DEBENS, DIREITOS E

2.7.

2.5.4. DO PROCESSO E DO JULGAMENTO DOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADEIMATERIAL 108
110
110
CONTRA
114
A MULHER
119
121
127
128
129
131
VALORES 132
ENUNCIADOS DE SÚMULAS 135
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 135 2.7.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 136 Provimentos judiciais 3 139
CLASSIFICAÇÃO 139 3.1.1. DESPACHOS DE MERO EXPEDIENTE 139 3.1.2. DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS 139 3.1.3. DECISÕES DEFINITIVAS 140
SENTENÇA _______________________________________________________________________ 140 3.2.1. CLASSIFICAÇÃO 140 3.2.2. PRINCÍPIOS 141 3.2.3. REQUISITOS DA SENTENÇA 143 3.2.4. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA 144 3.2.5. SENTENÇA CONDENATÓRIA 145 3.2.6. PUBLICAÇÃO E REGISTRO DA SENTENÇA 147 3.2.7. INTIMAÇÃO DA SENTENÇA 147 3.2.8. COISA JULGADA 148 3.3. ENUNCIADOS DE SÚMULAS 149 3.3.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 149 3.3.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 149 Nulidades 4 152 4.1. CLASSIFICAÇÃO DAS NULIDADES 152 4.1.1. NULIDADE ABSOLUTA 152 4.1.2. NULIDADE RELATIVA 152 4.2. PRINCÍPIOS GERAIS APLICÁVEIS ÀS NULIDADES 153 4.2.1. PRINCÍPIO DO PREJUÍZO 153 4.2.2. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS 153 4.2.3. PRINCÍPIO DA EFICÁCIA DOS ATOS PROCESSUAIS 153 4.2.4. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE 153 4.2.5. PRINCÍPIO DO INTERESSE 153 4.2.6. PRINCÍPIO DA CONVALIDAÇÃO 154 4.2.7. PRINCÍPIO DA CONSERVAÇÃO 154 4.3. CAUSAS DE NULIDADE _____________________________________________________________ 155 4.3.1. NULIDADE ABSOLUTA 155 4.3.2. NULIDADE RELATIVA 157 4.4. MOMENTO PARA ARGUIÇÃO DAS NULIDADES _________________________________________ 157 4.5. CONVALIDAÇÃO DAS NULIDADES RELATIVAS __________________________________________ 158
2.7.1.
3.1.
3.2.

5.1.

5.3.

5.3.1.

5.3.3.

6.2.9.

6.2.10.

4.6. ENUNCIADOS DE SÚMULAS 158 4.6.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 158 4.6.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 159 Recursos 5 162
TEORIA GERAL DOS RECURSOS 162 5.1.1. PRINCÍPIOS 162
CLASSIFICAÇÃO 166
PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE 167 5.1.4. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL 168 5.1.5. JUÍZO DE MÉRITO RECURSAL 168 5.1.6. EFEITOS 168
RECURSO NECESSÁRIO _____________________________________________________________ 170
5.1.2.
5.1.3.
5.2.
RECURSOS EM ESPÉCIE 171
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO 171 5.3.2. APELAÇÃO 178
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO 185 5.3.4. CARTA TESTEMUNHÁVEL 186 5.3.5. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE 188 5.3.6. AGRAVO EM EXECUÇÃO 190 5.3.7. CORREIÇÃO PARCIAL 190 5.3.8. RECURSOS CONSTITUCIONAIS EM MATÉRIA CRIMINAL 192 5.3.9. AGRAVO INTERNO 198 5.3.10. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA 198 5.4. SÍNTESE DOS PRAZOS RECURSAIS 200 5.5. ENUNCIADOS DE SÚMULAS _________________________________________________________ 201 5.5.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 201 5.5.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 203 Ações Autônomas de Impugnação 6 207
HABEAS CORPUS 207 6.1.1. NATUREZA JURÍDICA 207 6.1.2. PREVISÃO LEGAL 207 6.1.3. CLASSIFICAÇÃO 207
CONDIÇÕES DA AÇÃO 208 6.1.5. CABIMENTO 209 6.1.6. COMPETÊNCIA 210 6.1.7. PROCESSAMENTO 211 6.1.8. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS 213 6.2. REVISÃO CRIMINAL 214 6.2.1. NATUREZA JURÍDICA 214 6.2.5. CABIMENTO 215 6.2.6. ÔNUS DA PROVA 217 6.2.7. COMPETÊNCIA 217
PROCESSAMENTO 217
6.1.
6.1.4.
6.2.8.
EFEITOS 219
DIREITO À INDENIZAÇÃO PELO ERRO JUDICIÁRIO 219 6.2.11. COISA JULGADA 220
MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JURISDICIONAL PENAL 220 6.3.1. NATUREZA JURÍDICA 220 6.3.2. PREVISÃO LEGAL 220 6.3.3. PRAZO 221
LEGITIMIDADE 221
6.3.
6.3.4.

6.3.5.

CABIMENTO 221 6.3.6. PROCESSAMENTO 222 6.3.7. COMPETÊNCIA 224 6.3.8. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 225 6.4. RECLAMAÇÃO ____________________________________________________________________ 226
NATUREZA JURÍDICA 226 6.4.2. PREVISÃO LEGAL 226 6.4.3. HIPÓTESES DE CABIMENTO 226 6.4.4. MOMENTO PARA APRESENTAÇÃO 226 6.4.5. PROCESSAMENTO 226 Bibliografia ______________________________________________________________________ 229
6.4.1.

Trata-se do segundo volume de uma obra que, mediante exposição em linguagem clara, objetiva e didática, fundamentada em minucioso trabalho de pesquisa na Constituição Federal, Código de Processo Penal, legislação especial, entendimentos doutrinários e decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, traz anotações sobre o conteúdo do direito processual penal pátrio.

O livro foi idealizado a partir de conhecimentos adquiridos com o exercício da docência na disciplina de direito processual penal em curso de Bacharelado em Direito desde o ano de 2004, em pós-graduações de direito processual penal, nas atividades profissionais como integrante do Ministério Público brasileiro desde o ano de 1991 e membro de comissões examinadoras de concursos públicos de provas e títulos para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Paraíba.

Em seis capítulos, atualizados com a legislação e jurisprudência publicados até o fechamento desta edição, inclusive com o julgamento das ADI”s nºs 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305, propostas contestando dispositivos da Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), com acórdãopublicado em 19 de dezembro de 2023, e, ainda, das ADI’s nºs 2.943, 3.309 e 3.318, concluído em 02 de maio de 2024, que estabeleceu parâmetros para as investigações criminais pelo Ministério Público, colocamos à disposição de acadêmicos, candidatos a concursos públicose profissionais com atuação na área penal uma obra para servir como fonte de consulta sobreprova, procedimentos, provimentos judiciais, nulidades, recursos e ações autônomas de impugnação.

Boa leitura.

20 de maio de 2024.

O autor.

12 Apresentação

Prova 1

O estudo sobre a prova se divide em teoria geral da prova e meios de prova (ou provas em espécie).

1.1. TEORIA GERAL DA PROVA

1.1.1.CLASSIFICAÇÃO

A prova se divide em:

a) direta: a que permite conhecer o fato probando de forma imediata; b) indireta: aquela que, por ilação, leva ao fato probando.

1.1.2.FINALIDADE

A finalidade da prova é a formação do convencimento do órgão julgador sobre os elementos essenciais para o deslinde da causa.

1.1.3.OBJETO

O objeto da prova é a coisa, o fato, o acontecimento ou a circunstância que interessa ao deslinde do processo.

No processo penal, mesmo os fatos não contestados ou incontroversos deverão ser provados.

Do mesmo modo, ainda que o acusado venha a confessar a prática de um crime, subsisteo ônus da acusação, nosentido de provar a imputação constante da peça acusatória.

Todavia, existem afirmações que independem de prova, a saber:

a) os fatos notórios que são os de conhecimento público geral. Ex.: a afirmação de que a água do mar é salgada;

b) os fatos intuitivos ou axiomáticas que são os evidentes, as verdades axiomáticas do mundo do conhecimento. Ex.: não é necessário provar que o fogo queima;

c) os fatos inúteis ou irrelevantes que são aqueles que não interessam à decisão da causa, sejam eles verdadeiros ou falsos;

d) as presunções legais, considerando-se que a presunção é a afirmação feita pela lei de que um fato é existente ou verdadeiro, independentemente de prova. Assim, provado o fato que serve de base à presunção, considera-se provado o fato probando objeto da presunção. Ex.: comprovado que o acusado é menor de 18 anos, presume-se que seja inimputável.

As presunções legais são subdivididas em:

a) presunção absoluta (juris et de jure): não admite prova em contrário. Ex.: ao menor de 18(dezoito) anos, presume-se a inimputabilidade penal;

b) presunção relativa (juris tantum): é aquela que permite prova em contrário. Ex.: o maior de 18 anos, presume-se imputável. Entretanto, caso fique demonstrado que não possuía, à época do fato, a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, em virtude de doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto ou retardado, passa a ser considerado como inimputável.

16

1.1.4.FONTE DE PROVA,

DE PROVA

A fonte de prova é utilizada para designar as pessoas ou coisas das quais se consegue a prova, classificando-se em:

a) fonte pessoal que é a pessoa de quem provém a prova (ex.: acusado, vítima, testemunha, perito, etc.);

b) fonte real que é a coisa da qual promana a prova (ex.: documentos).

Os meios de prova introduzem a fonte de prova no processo. Por exemplo, a pessoa da testemunha é a fonte de prova, enquanto oseu depoimento emjuízo será o meio de prova. Por sua vez, os meios de obtenção da prova se referem a procedimentos regulados por lei, com o objetivo de conseguir provas materiais. Podem ser realizados por outros agentes que não o juiz, por exemplo, policiais. De regra, são executados sem prévia ciência à parte contrária (por exemplo: interceptação telefônica, infiltração de agentes, busca e apreensão).

Os meios de prova e os meios de obtenção da prova se diferenciam também quanto às consequências de eventual reconhecimento de irregularidade ocorrida no momentoda produção da prova: a do meio de prova importará na nulidade (absoluta ou relativa) da prova colhida, enquanto a dos meios de obtenção da prova ensejará a ilicitude, e, portanto, a inadmissibilidade da prova obtida.

1.1.5.SISTEMAS DE VALORAÇÃO DA PROVA

São três os sistemas de valoração da prova:

a) sistema da prova tarifada (ou prova legal): é o que estabelece que cada prova tem o valor prefixado em lei, cabendo ao magistrado tão somente apreciar o conjunto probatórioe atribuir o peso que lhe é previsto pela legislação. Por vezes, nele a lei prevê a maneira como determinados fatos devem ser provados;

b) sistema da livre convicção: é aquele em que o julgador tem liberdade para apreciare valorar as provas sem obrigação de expor as razões do seu convencimento. No ordenamento jurídico brasileiro, sua adoção é admitida unicamente em relaçãoàs decisões do Conselho de Sentença no Tribunal do Júri, as quais, como medida de garantia ao sigilo das votações (art. 5º, inciso XXXVIII da CF), não podem ser motivadas, sendo suficiente que o jurado responda, de modo sigiloso, “sim” ou “não” acada quesito submetido ao seu julgamento;

c) sistema da persuasão racional (ou do livre convencimento motivado): é o que confere ao julgador liberdade para apreciar e valorar as provas produzidas no processo, apresentando, na sua decisão, as razões de seu convencimento. Com a exceção referida no número anterior, é o sistema adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro, consoante disposto no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, o qual exige que todas as decisões do Poder Judiciário sejam fundamentadas, sob pena de nulidade.

1.1.6.ÔNUS DA PROVA

À luz do art. 156 do CPP, pode-se afirmar que o ônus da prova no processo penal se divide entre a acusação e a defesa:

a) à acusação, caberá provar:

• a existência do fato típico;

• a autoria ou participação;

• a relação de causalidade e

• o elemento subjetivo do agente: dolo ou culpa.

17
MEIOS DE PROVA E MEIOS DE OBTENÇÃO

b) à defesa, caberá provar:

• o fato impeditivo (exclusão da vontade e exclusão da culpa);

• o fato modificativo (exclusão da antijuridicidade, de causas supralegais, dentre outros)

• o fato extintivo do direito de punir (prescrição, decadência, dentre outros).

Em respeito ao princípio favor rei ou in dubio pro reo, costuma-se afirmar que à acusação éimputado oônus de produzir umjuízo de certeza emrelaçãoaofatodelituoso e àsua autoria, enquanto à defesa será suficiente gerar no julgador um juízo de dúvida, o qual levará a uma decisãoabsolutória.

1.1.7.INICIATIVA PROBATÓRIA DO JUIZ

A Lei nº 13.964/2019, ao introduzir no CPP o art. 3º-A, vedou a iniciativa probatória do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação em qualquer fase do processo.

No entanto, no curso da ação penal, permanece a possibilidade de produção de prova de ofício, sendo imperioso, todavia, que a atividade aconteça de modo subsidiário, sem quesubstitua o dever probatório da acusação.

Nesse sentido, no julgamento das ADI’s nºs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/ DF, concluído no dia 28 de agosto de 2023, com acordão publicado em 19 de dezembro seguinte1, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o art. 3-A do CPP, com a redação dada pela Lei nº 13.964/2019, “deve ser interpretado de modo a vedar a substituição da atuação de qualquer das partes pelo juiz, sem impedir que o magistrado, pontualmente, nos limites legalmente autorizados, determine a realização de diligências voltadas a dirimir dúvida sobre ponto relevante”.

Assim, nos termos do art. 156 do CPP, o juiz, de ofício, poderá:

a) na fase investigatória, ordenar a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da medida. Para parcela considerável da doutrina nacional, com a qual comungamos,o disposto no art. 156, inciso I do CPP deve ser interpretado conforme a Constituição Federal, de modo que, na fase investigativa, por iniciativa judicial, apenas será possívelaproduçãoantecipadadeprovasafim deevitarodesaparecimentodafonteprobatóriapelaação dotempo;

b) durante a instrução criminal ou antes de proferir sentença, determinar a realização de diligências para dirimir suas dúvidas sobre ponto que considere relevante para o deslinde da causa. Nesse caso, o poder instrutório do juiz deverá ser exercido de formasupletiva, com moderação, sem que substitua as partes na atividade probatória.

Não há que se confundir a iniciativa probatória do juiz na fase de investigação criminal com a sua atuação em pedido de medida cautelar probatória, formulado pelo delegado de polícia, pelo órgão do Ministério Público ou pelo ofendido, quando exercerá o controle das restrições àsinviolabilidades constitucionais.

1.1.8.ELEMENTO INFORMATIVO E PROVA

O art. 155, caput, do CPP dispõe que “O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas”.

1Consulta realizada na página eletrônica https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15363755297&ext=.pdf, acesso em 11 mai 2024.

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Pela leitura do referido dispositivo legal, pode-se concluir pela

a) adoção no ordenamento jurídico brasileiro do sistema da persuasão racional (livre convencimento motivado) quanto à valoração da prova;

b) vedação de condenação fundada exclusivamente em elementos produzidos na fase investigatória. Os elementos informativos poderão alicerçar o convencimento do julgador desde que, subsidiariamente, complemente a prova colhida na instrução criminal.

c) possibilidade de o magistrado formar o seu convencimento unicamente com base em provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, ainda que produzidas na fase pré- processual.

Para uma melhor compreensão sobre otema, é preciso diferenciar o elemento informativoe a prova. O elemento informativo se caracteriza pela coleta da informação na fase préprocessual, em caráter unilateral, sem que seja assegurado o contraditório, com a finalidade de subsidiar o procedimento investigativo, e, oportunamente, formar a opinio delicti do titular do direito de ação; a prova, por sua vez, representa os elementos produzidos sob o crivo do contraditório judicial (real ou diferido), com o objetivo precípuo de formar o convencimento dojulgador acerca do objeto do processo.

A propósito, vejamos as diferenças entre provas cautelares, não repetíveis e antecipadas:

Éaprovaemquehá risco de perecimento do seu objeto em razão do de-cursodotempo.

É a prova que, uma vez colhida, não há como ser novamente produzida em virtudedo desaparecimento, da destruição ou do perecimento da fonte probatória.

Sujeitam-se ao contraditório diferido ou postergado (contraditóriosobreaprova)

É a prova produzida em momento diverso daquele inicialmente previstopelalegislação, a fim de que se evite o desaparecimento dafontedaprova.

Sujeita-seao contraditório real (contraditórioparaaprova)

Dependede autorização judicial Independedeautorização judicial Necessária autorizaçãojudicial

Podemserproduzidastantonafaseinvestigativa,comonajudicial

Ex.:interceptação telefônica

1.1.9.PROCEDIMENTO

Ex.:Examedolocaldocrime

PROBATÓRIO

Ex.: inquirição de testemunha que está na iminência de falecer por doença em estado terminal (art. 225, CPP).

Etapas do procedimento probatório:

a) Indicação: é a etapa em que as partes indicam a prova que desejam produzir;

b) Admissibilidade: é aquela etapa em que a autoridade judiciária avalia se a prova é lícita (ou não), bem como a pertinência de sua produção. Fazendo um juízo de valorpositivo, irá aceitála, sem valorar meritoriamente sua importância para o deslinde da ação penal;

c) Produção: admitida a prova, segue-se para a sua produção, a fim de possibilitar quefaça parte do processo;

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CAUTELAR PROVA
PROVA
PROVA
NÃO REPETÍVEL
ANTECIPADA

d) Valoração: momento em que a autoridade judiciária, após apreciá-la, procederá à valoração fundamentada da prova. Ocorre por ocasião do julgamento pelo juiz monocraticamente ou por órgão colegiado.

1.1.10. PRINCÍPIOS

São princípios aplicáveis, especificamente, à prova:

(1) Princípio da comunhão (ou da comunicação)

O princípio dacomunhão(ou dacomunicação) estabelece quea prova produzida passará a compor o processo, podendo qualquer das partes e o juiz dela se utilizar para sustentar suas argumentações, independentemente de quem a indicou.

(2) Princípio da concentração

O princípio da concentração prevê que as provas, tanto quanto possível, deverão ser produzidas em uma única audiência.

O objetivo da aplicação do princípio é encurtar o tempo entre a data do fato e a do julgamento.

Nessesentido,vejamosoart.400,§1º,CPP:“Asprovasserãoproduzidasnumasóaudiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias”.

(3) Princípio da liberdade probatória

No processo penal, há ampla liberdade probatória não apenas em relação ao momento deindicação ou de produção da prova, mas, também, quanto aos meios de prova.

Em geral, a produção de provas poderá ocorrer no curso de todo o processo.

Quanto aos meios de prova, as partes podem se valer tanto de meios de prova nominados na lei processual penal, quanto de meios de prova inominados, exigindo-se apenas que sejam lícitos.

Constituem exceções ao princípio da liberdade probatória a proibição de juntada de prova documental dentro do intervalo de 03(três) dias que antecede a realização do julgamento pelo Tribunal do Júri (art. 479, CPP) e quanto à prova referente ao estado de pessoas, a qual observará as restrições previstas na lei civil (art. 155, parágrafo único, CPP).

(4) Princípio da autorresponsabilidade

O princípio da autorresponsabilidade prevê que as partes assumem as consequências de sua (in)atividade, erro ou negligência com relação à prova de suas alegações.

Logo, por exemplo, nada impede que o juiz possa se utilizar de informações negativas em desfavor do denunciado prestadas em depoimento de testemunha indicada pela defesa para proferir uma decisão condenatória.

(5) Princípio da identidade física do juiz

O art. 399, § 2º, do CPP, reconhece expressamente a adoção do princípio da identidade física do juiz no processo penal. Assim, o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença, uma vez que, em tese, encontra-se mais habilitado para julgá-la, já que participou diretamente da produção da prova.

Entretanto, o princípio não se reveste de caráter absoluto, possuindo exceções em casos de motivos legais que impeçam o magistrado que presidiu a instrução de sentenciar o feito (por exemplo: gozo de férias, licença, remoção, promoção, aposentadoria, convocação, dentre outros motivos), hipótese em que a ação penal será validamente julgada pelo seu sucessor ou substituto.

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1.1.11.1. Conceito

Prova ilícita é a prova obtida originariamente com violação a normas constitucionais ou legais.

A sua inadmissibilidade é reconhecida no art. 5º, inciso LVI da Constituição Federal: “São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

O art. 157, caput do CPP, por sua vez, prescreve: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”.

Parte da doutrina nacional, com cuja posição concordamos, considera que o dispositivo legal supracitado se refere única e exclusivamente às normas de direito material, razão pela qual as provas ilegítimas devem receber o tratamento destinado às nulidades (art. 573, CPP), enquanto as provas ilícitas devem ser desentranhadas da ação. A ilegalidade das provas ilícitas ocorre no momento de sua obtenção, enquanto a das provas ilegítimas ocorre durante a sua produção ou inserção nos autos.

Nessa linha de raciocínio, temos a seguinte classificação:

A prova originariamente ilícita é a prova colhida com violação ao direito material. A ilegalidade ocorre no momento de sua obtenção, cuja consequência é a sua inadmissibilidade (art. 157, caput, CPP), enquanto a prova ilegítima viola normas processuais no momento da sua produção ou da sua inserção no processo, devendo ser reconhecida a sua nulidade. Essa prova é sempre endoprocessual Porém, nada impede a renovação do ato com a correção do vício (art. 573, caput, CPP). Exemplos: a quebra de sigilo das comunicações telefônicas sem autorização judicial ofende o direito material à intimidade, constitucionalmente assegurado, constituindose, pois, prova ilícita originária; a coleta de depoimento testemunhal sem obediência à ordem legal fixada noart. 400 do CPP é prova ilegítima

Por outro lado, inexiste a ocorrência de qualquer ilicitude na hipótese:

a) da regra da propriedade abandonada (abandoned property): quando o indivíduo renuncia ao direito à privacidade mediante o abandono de determinado objeto, permitindo a busca e a investigação sobre ele;

b) da teoria do risco ou assunção do risco: quando o detentor do direito à intimidade, porsua própria conduta e atitude, assume a potencialidade de divulgação de sua esfera íntima. Ao fazer revelações em público, por exemplo, não poderá, posteriormente, alegar violação à intimidade sobre aqueles fatos;

c) da doutrina davisão aberta: a que autoriza ao agente, durante a execução de diligência de busca e apreensão, recolher material alheio aos limites da autorização judicial, mas que se encontrava visível. É o denominado encontro fortuito de provas, o qual será abordado adiante.

21 1.1.11. PROVA ILÍCITA

1.1.11.2. (In)admissibilidade das provas obtidas por meio ilícito

A consequência jurídica do reconhecimento da obtenção da prova por meio ilícito (prova ilícita originária) é a sua inadmissibilidade no processo, na forma disposta no art. 5º, inciso LVI, da Constituição Federal, c/c o art. 157, caput, do CPP.

Entretanto, de forma excepcional, será possível a sua utilização pro reo, haja vista que as garantias do direito de defesa (art. 5º, inciso LV, CF) e da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, CF) superam o direito estatal de punir (jus puniendi), não tendo sentido uma regra deefetiva proteção de direitos fundamentais voltar-se contra o seu primitivo e originário titular.

Relativamenteàutilizaçãodaprovailícitaemfavor daacusação(provailícitaprosocietate), a possibilidade é rejeitada pela doutrina e pela jurisprudência pátria.

Por fim, não há que se falar em prova ilícita quando colhida pela vítima para defender direito próprio decorrente do exercício da legítima defesa ou do estado de necessidade, ambos excludentes de ilicitude.

1.1.11.3. Prova ilícita por derivação

É a prova que, embora, em si mesma, tenha sido produzida por meios lícitos, restará contaminada pela ilicitude da prova que a originou. Teremos, portanto, uma prova originariamente ilícita e a prova dela derivada

Sob influência direta da teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree), originária da jurisprudência norte-americana, preceitua o art. 157, § 1º, primeira parte do CPP, que “São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas”.

Assim, como exemplo, submetido a sessão de tortura, determinado acusado de um homicídio doloso confessou o paradeiro do instrumento do crime. A autoridade policial, sem informar a verdadeira origem da informação, obtém uma ordem de busca e apreensão e a cumpre de maneira regular, apreendendo o que procurava. Logo, embora, por si só, tenha sido a apreensão da arma do crime alcançada por meio lícito, diante do seu nexo de causalidade com a prova ilícita (confissão mediante tortura), tornou-se também prova ilícita. A consequência jurídica será também a sua inadmissibilidade por constituir prova ilícita por derivação.

Teorias da fonte independente, da descoberta inevitável e da contaminação expurgada

Dispõe o art. 157, § 1º, do CPP, que “São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras”, complementando, prevê o § 2º: “Considera-se fonte independente aquela que, por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova”.

Dessarte, desenvolveram-se teorias de exclusão da aplicação da regra da prova ilícita por derivação, a saber:

a) a teoria da fonte independente em que se demonstra a inexistência de nexo decausalidade entre as provas, isto é, que a prova ilícita não originou a outra prova, uma vez que esta foi obtida de forma lícita e autônoma (art. 157, § 1º, CPP);

b) a teoria da descoberta inevitável que reconhece o vínculo causal entre a prova lícita subsequente e a prova ilícita anterior. Porém, demonstra-se que aquela seria produzida inevitavelmente como resultado natural da investigação ou da instrução criminal regular, independentemente da existência da prova anterior (art. 157, §§ 1º e 2º, CPP);

c) a teoria da contaminação expurgada (ou limitação da mancha purgada ou da tintadiluída), a qual não desconhece o nexo de causalidade entre as provas. No entanto,a influência da prova originária ilícita sobre a prova lícita dela derivada é atenuada em virtude de causas

22

supervenientes no curso da ação penal ou pelo lapso temporal entre elas. É tão ínfima a influência da prova originariamente ilícita que sequer deveser levada em consideração.

1.1.11.4. Incidente de inutilização

A consequência material da inadmissibilidade da prova obtida por meio ilícito é o seu desentranhamento dos autos e a sua inutilização por decisão judicial, facultando-se às partes acompanhar oincidente (art. 157, § 3º, CPP).

1.1.11.5. Encontro fortuito da prova

É a chamada serendipidade, que se configura quando a prova de determinada infração penaléencontradacasualmentedurantediligênciaautorizadaparaainvestigaçãodeoutrocrime.

A prova será válida desde que, no cumprimento da ordem judicial, inexista desvio de finalidade ou abuso de autoridade pelo seu executor.

Nesse sentido: “[...] I. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF entende válido o encontro fortuito de provas (princípio da serendipidade), assim como legítima a cooperação entre os órgãos de investigação e de persecução penal, desde que o emprego desse método especial de investigação tenha sido validamente autorizado. II. No caso, a partir da prisão em flagrante de uma pessoa por suposta prática do crime de receptação qualificada, com quem foi apreendido um aparelho celular, houve a autorização judicial para que os dados telemáticos do referido aparelho fossem acessados. Com essa medida, descobriu-se o envolvimento de várias outras pessoas em suposta prática de receptação de cargas roubadas, bem como em possível esquema de lavagem de dinheiro oriundo do roubo de cargas e fraudes em certames públicos de licitação em várias Prefeituras, entre elas o ora recorrente. III. O acesso ao referido aparelho celular deu-se mediante autorização judicial, sendo, portanto, legitima a utilização das informações obtidas nessa medida cautelar para a abertura de novo inquérito policial visando à apuração dos crimes que foram descobertos fortuitamente. lV. Não se há falar em vício de inobservância ou alargamento daquela limitação constitucional da garantia à inviolabilidade de sigilo, uma vez que houve apenas o aproveitamento da mesma fonte de prova obtida legitimamente em outro procedimento criminal, sem que tanto configure ofensa à intimidade já afastada do agente. V. Agravo regimental improvido”. (STF, 1a T., RHC-AgR 239.805/PE, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, j. em 07/05/2024, pub. no DJE 09/05/2024).

E, ainda: “[...] 1. O encontro fortuito de provas (serendipidade) é admitido pela jurisprudência desta Corte, considerando-se, portanto, válidas as provas encontradas casualmente pelos agentes policiais, relativas à infração penal até então desconhecida, por ocasião do cumprimento de medidas de investigação de outro delito regularmente autorizadas, ainda que inexista conexão ou continência com o crime supervenientemente encontrado, desde que não haja desvio de finalidade na execução das diligências das quais se originaram os elementos probatórios. - Anote-se que o cumprimento do mandado de busca e apreensão autoriza a abertura de gavetas, não sendo necessário que a descoberta fortuita se dê pela teoria da visão aberta. Ademais, a alegação no sentido de que não existiu referido mandado vai de encontro às provas pré-constituídas constantes dos autos, tendo a alegação defensiva sido analisada, em todas as instâncias, levando em consideração a existência do referido documento. - Assim, a partir da análise do contexto fático delineado pelas instâncias ordinárias, emboraa medida invasiva tenha sido autorizada no curso de investigação relativa a delito diverso, osagentes de polícia encontraram fortuitamente as provas referentes aos delitos de tráfico de drogas. Nesse contexto, reafirmo que não há se falar em desvio de finalidade no cumprimento do mandado judicial, mas sim em descoberta inevitável, não se verificando irregularidade nareferida diligência [...]”. (STJ, 5a T., AgRg-HC 889.148/DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,pub. no DJE 18/04/2024).

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1.1.12. PROVA EMPRESTADA

Prova emprestada é “aquela produzida em outro processo e, através da reprodução documental, juntada no processocriminal pendente de decisão”2

A jurisprudência pátria tem aceitado a prova emprestada, desde que, no processo de destino, seja franqueado às partes o acesso a ela, o exercício do contraditório e da ampla defesa e, ainda, que nãoseja o únicoelemento probatório produzido nos autos.

Ademais, “não é necessário que haja absoluta identidade de partes entre o processo de que se empresta a prova e o processo para o qual esta é emprestada, pois ocontraditório sobre a prova (contraditório postergado ou diferido) satisfaz esses princípios. A circunstância de o agravante não haver participado originariamente da elaboração da prova não impede que ela seja empregada no processo em que ele figura como acusado” (5a T., STJ, AgRg no Agravo em Recurso Especial nº 2259657/SC, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. em 27/02/2024, pub. no DJE de 01/03/2024).

1.2. PROVAS EM ESPÉCIE - MEIOS DE PROVA

1.2.1.PROVAPERICIAL

1.2.1.1. Cadeia de custódia dos vestígios

A Lei nº 13.964/2019, ao inserir os arts. 158-A a 158-F no Código de Processo Penal, regulamentou a cadeia de custódia da prova pericial.

1.2.1.1.1. Conceito

Nos termos do art. 158-A, caput, do CPP, conceitua-se cadeia de custódia como o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio, a partir de seureconhecimento até o descarte.

Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal (art. 158-A, § 3º, CPP).

1.2.1.1.2. Etapas

A cadeia de custódia dos vestígios, consoante dispõe o art. 158-B, do CPP, deverá atender às seguintes etapas:

1º. Reconhecimento

Ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial. Ex: a identificação de um cadáver na cena do crime;

2º. Isolamento

Ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime. Ex: o isolamento do local onde o corpo foi encontrado realizado pela autoridade policial;

3º. Fixação

Descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável

2 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal 10. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p.337.

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pelo atendimento. Ex: a ilustração do laudo pericial de local de morte com fotografias mostrando a descrição detalhada da posição em que o cadáver foi encontrado;

4º. Coleta

Ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza. Ex: a retirada do cadáver da casa em que foi encontrado, adotandose as cautelas necessárias para evitar comprometimento da qualidade da prova;

5º Acondicionamento

Procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento. Ex: acondicionamento adequado do cadáver;

6ºTransporte

Ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse. Ex: remoção do cadáver em veículo adequado ao Instituto Médico Legal;

7º Recebimento

Ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu. Ex: recebimento do corpo pelo médico legista do IML;

8º Processamento

Exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito. Ex: realização do exame pericial no cadáver por profissional habilitado;

9º Armazenamento

Procedimento referenteà guarda,em condiçõesadequadas, do material aser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente. Ex: concluído o exame, o corpo é colocado numa geladeira do IML até osepultamento;

10º Descarte

Procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quandopertinente, mediante autorização judicial. Ex: liberação e sepultamento do morto.

1.2.1.1.3. Preservação do local do crime

A preocupação na cadeia de custódia de vestígios é assegurar a preservação e idoneidade do vestígiocoletado até o seu descarte.

O seu início se dará com a preservação do local do crime, podendo, também, começar a partir de outros procedimentos policiais ou periciais de conhecimento da existência de vestígio. Oagentepúblico,aoreconhecerumelementocomodepotencialinteresseparaaprodução da prova pericial, ficará responsável por sua preservação, isolando-o e vigiando-o para evitar quese altere oestado dascoisas, comcomprometimento da idoneidade dolocal,até a chegada da autoridade policial investigativa e/ou de peritos criminais.

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A cautela quanto à preservação do local do crime e dos vestígios nele encontrados já estava presente nas disposições contidas no art. 6º do CPP, o qual impõe que a autoridade policial, tão logo tenha conhecimento da prática da infração penal, dirija-se ao local, providenciando:

a) para que não se alterem o estado e a conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais;

b) a apreensão dos objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;

c) a coleta de todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias.

De igual modo, o disposto no art. 169, do CPP, preceitua que, para o efeito de exame do local onde houver sido praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente para que nãose altere oestado das coisas até a chegada dos peritos.

O art. 158-C, § 2º, do CPP, de forma complementar, prevê a proibição da entrada de pessoas em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios de locais de crime antes da sua liberação por parte do perito responsável, sendo tipificada a sua inobservância como fraude processual3 .

1.2.1.1.4. Coleta de vestígios

A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que o encaminhará para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de exames complementares.

Inexistindo perito oficial, a tarefa caberá aos peritos não oficiais.

Quanto ao recipiente a ser utilizado para acondicionamento do vestígio, exige-se:

a) sua adequação à natureza do material;

b) ser selado com lacre, com numeração individualizada, de forma a garantir ainviolabilidade e a sua idoneidade durante o transporte;

c) individualizar o vestígio, preservando suas características, impedindo contaminação e vazamento, e, ainda, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de informações sobre seu conteúdo.

E mais:

a) o recipiente somente poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e, motivadamente, por pessoa autorizada;

b) após cada rompimento de lacre do recipiente, faça-se constar, na ficha de acompanhamento de vestígio, o nome e a matrícula do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como as informações referentes ao novo lacre utilizado;

c) que o lacre rompido seja acondicionado no interior do novo recipiente.

1.2.1.1.5. Guarda e controle dos vestígios

A guarda e o controle dos vestígios ficarão sob responsabilidade da central de custódia,a ser instalada em todos os Institutos de Criminalística, com gestão vinculada diretamente ao órgão central de perícia oficial de natureza criminal.

A central de custódia deve:

a) possuir os serviços de protocolo, com local para conferência, recepção, devolução de materiais e documentos, de modo a possibilitar a seleção, a classificação e a distribuiçãode

3 Art. 347 - Inovar artificiosamente, na pendência de processo civil ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, como fim de induzir a erro o juiz ou o perito: Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa. Parágrafo único - Se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal, ainda que não iniciado, as penas aplicam-se em dobro.

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materiais, devendo ser um espaço seguro e que apresente condições ambientais que não interfiram nas características do vestígio;

b) controlar, mediante protocolo, a entrada e a saída de vestígio, consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito que a eles se relacionam;

c) identificar todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado, com registro da data e hora do acesso;

d) por ocasião da tramitação do vestígio armazenado, registrar todas as ações, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, a destinação, a data e ohorário da ação.

Na hipótese de a central de custódia não possuir espaço ou condições de armazenar determinado material, deverá a autoridade policial ou judiciária, consoante previsão do art. 158-F, parágrafo único, do CPP, determinar as condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento do diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal.

Por fim, após a realização da perícia, o material periciado deverá ser devolvido à central de custódia, devendo nela permanecer.

1.2.1.1.6. Consequências da quebra da cadeia de custódia de vestígios

A não observância do regramento atinente à cadeia de custódia de vestígios pela Lei nº 13.964/19, com eventual violação à sistemática adotada pelos arts. 158-A a 158-F do CPP, acarretará a imprestabilidade da prova, haja vista a violação a regras de direito processual, com a consequente aplicação das teorias que regem as nulidades processuais, referidas no Capítulo 4, adiante.

1.2.1.2. Exames periciais

1.2.1.2.1. Disposições comuns

1º. Realização dos exames periciais

A realização dos exames periciais, a priori, caberá ao perito oficial, portador de diploma de cursosuperior, ocupante docargo público de perito.

Na falta de perito oficial, o exame poderá ser realizado por pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame, as quais prestarão o compromisso de beme fielmente desempenhar o encargo.

Para a execução da perícia, nos termos do art. 159, caput e § 1º do CPP: a) basta um único perito oficial; b) número mínimo de 02(duas) peritos não oficiais.

2º. Assistente técnico

As partes ou interessados poderão indicar assistente técnico para atuar no processo, a partir da admissão pelo juiz e após a conclusão do(s) exame(s) pericial(ais) e a elaboração do laudo pelo(s) perito(s).

Sendo perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, as partes ou interessados poderão indicar mais de um assistente técnico, como prescreve o art. 159, § 7º do CPP.

As partes serão intimadas da decisão que (in)admite assistente técnico (art. 159, § 4º, CPP).

Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base à perícia será disponibilizadonoambientedoórgãooficial,quemanterásempresuaguarda,e,na presençade perito oficial, para exame pelos assistentes técnicos, salvo se for impossível a sua conservação.

O parecer oferecido pelo assistente técnico poderá servir para impugnar em juízo as conclusões do exame pericial oficial, cabendo ao julgador dar a ele motivadamente a credibilidade que considerar adequada por ocasião dojulgamento.

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(2.1) O assistente técnico e a fase pré-processual

Por força do disposto no art. 159, §§ 3º e 5º, inciso II do CPP, como visto, a indicação de assistente técnico é permitida às partes, durante o curso do processo judicial, mediante autorização judicial prévia.

A inclusão, no CPP, do art. 3º B, inciso XVI, pela Lei nº 13.964/2019, trouxe a possibilidade de indicação de assistente técnico para acompanhar os exames periciais ainda na fase da investigação criminal. É o que se depreende da exegese do dispositivo acima que confere ao juiz das garantias a atribuição para analisar pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia. Ora, como a competência de referidaautoridade judiciária somente se exaure com o oferecimento da denúncia ou da queixa-crime (art. 3º-C, caput, parte final, CPP)4 , conclui-se que a admissão do assistente técnico poderá ocorrer também na fase pré-processual, isto é, durante as investigações preliminares.

3º Momento para realização do exame pericial e possibilidade de oitiva do(s) perito(s)

O exame pericial poderá ocorrer na fase investigativa ou durante o processo penal.

A prova pericial colhida durante a fase pré-processual será submetida ao contraditório diferido5

À luz do disposto no art. 159, § 5º, do CPP, durante a ação penal, a acusação, na peça acusatória inicial, e a defesa, na resposta à acusação, poderão:

a) requerer a oitiva do(s) perito(s) para esclarecer(em) a prova ou para responder(em) a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias, sendo- lhe(s) facultado apresentar as respostas em laudo complementar; b) indicar, cada um, assistente técnico que poderá apresentar parecer, em prazo a ser fixado pelo juiz, ou ser inquirido em audiência. Caso as partes não façam a indicação, a providência estará temporalmente preclusa, salvo se a necessidade de eventuais esclarecimentos sobre a prova pericial surgirem somente na fase de instrução, o que permitirá pedido de diligência complementar, nos termos do art. 402 do CPP..

A análise da pertinência de eventual pedido de exame pericial formulado pelo interessado caberá à autoridade policial, na etapa investigativa; sendo formulado pelas partes, caberá à autoridade judiciária, na fase judicial.

4º Formalização

O exame pericial oficial é formalizado por meio do laudo pericial, instrumento em que o(s) perito(s) minuciosamente descreverá(ão) todas as etapas da perícia e responderá(ão) objetivamente aos quesitos formulados, rubricando-o, em todas as suas folhas, e, ao final, assinando-o.

O laudo pericial é composto de quatro partes:

a) Preâmbulo: qualificação do(s) perito(s) e do objeto da perícia;

b) Descrição: narrativa do que é observado pelo(s) perito(s);

c) Fundamentação: exposição do(s) motivo(s) que levou (ou levaram) o(s) perito(s) à conclusão;

d) Conclusão: resposta aos quesitos apresentados.

O art. 160, parágrafo único do CPP, fixa o prazo máximo de 10(dez) dias para confecção do laudo pericial, a contar da realização do exame, podendo ser prorrogado pela autoridade requisitante a requerimento do(s) perito(s).

4 No julgamento conjunto das ADI’s nºs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/DF, com acordão publicado em 19 de dezembro de 2023, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, dando ao art. 3-C, caput, parte final, do CPP, interpretação conforme a Constituição, decidiu que a competência do juiz das garantias cessará com o oferecimento da denúncia ou queixa.

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No entanto, o eventual descumprimento do prazo acima constituirá mera irregularidade,sem qualquer repercussão na validade do ato.

Quando o exame pericial for realizado por mais de um perito, existindo entre eles divergência, serão consignadas no laudo as declarações e respostas de um e de outro, ou cada um redigirá separadamente o seu laudo, caso em que a autoridade requisitante nomeará um terceiro perito. Se este divergir de ambos, a autoridade poderá mandar proceder a novo exame por outros peritos.

Contendo o laudo pericial inobservância de formalidades, omissões, obscuridades ou contradições, a teor do disposto no art. 181 do CPP, a autoridade requisitante, de ofício ou mediante provocação dointeressado, poderá:

a) mandar suprir a formalidade, complementar ou esclarecer o laudo; ou b) ordenar a realização de novo exame, por outros peritos, se necessário.

Recebido o laudo, a autoridade requisitante providenciará a sua juntada aos autos do inquérito policial ou do processo judicial, conforme o caso.

Nos crimes em que não couber ação penal de iniciativa pública, o laudo pericial será juntado aos autos do inquérito policial e remetidos ao juízo competente, no qual aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado (arts. 183 c/c 19, todos do CPP).

5º Quesitos

Os quesitos que deverão ser respondidos pelo(s) perito(s) poderão ser formulados pela autoridade requisitante e pelos interessados ou partes, até antes do início do exame, conforme previsto noart. 176 do CPP.

O art. 7º, inciso XXI da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), prevê como direito do advogado assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, podendo, inclusive, apresentar quesitos, o que pressupõe que seja referente ao exame pericial na fase investigativa.

6º Execução por carta

Quando houver de se realizar oexame pericial por carta, a nomeação do(s) perito(s) farse-á no juízo deprecado. No caso de ação de iniciativa privada, porém, havendo acordo das partes, a nomeação poderá ser feita pelo juiz deprecante.

Inobstante o art. 177, parágrafo único do CPP, mencionar somente a transcrição na precatória dos quesitos do juiz e das partes, obviamente, se o exame ocorrer na fase investigativa, a providência caberá à autoridade policial, mediante precatória expedida para delegado de polícia atuante na circunscrição deprecada, consignando-se, então, os quesitos apresentados pela autoridade deprecante e interessados.

7º Valor probatório

Como corolário do princípio da persuasão racional no sistema de apreciação da prova, o legislador brasileiro adotou o sistema liberatório5 no art. 182 do CPP, o qual prevê que o juiz não ficará adstrito ao laudo pericial, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte, desde que ofaça motivadamente.

1.2.1.2.2. Particularidades dos exames periciais

(1) Exame de corpo de delito (art. 158, CPP)

O exame de corpo de delito se classifica em:

a) exame de corpo de delito direto: representa o contato direto e imediato do(s) perito(s) com os vestígios do crime (ex.: o exame do cadáver feito pelo(s) perito(s));

5 Emcontraposição ao sistema vinculatório, que prevê que o juizficará adstrito às conclusões do perito, não podendo rejeitar o laudo pericial

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b) exame de corpo de delito indireto: utilizado de forma subsidiária, consiste na avaliaçãodo(s) perito(s) de maneira mediata, a partir de análise e descrição técnicas feitas por outros profissionais (ex.: perícia a partir de prontuário médico descritivo do quadro da vítima de crime violento)6 .

O corpo de delito, por sua vez, compreende os elementos e circunstâncias definidos no tipo penal, os instrumentos utilizados na prática da conduta e demais dados correlatados que ajudem na reconstrução do fato7

Como visto no item 1.2.1.1., vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal.

A finalidade do exame de corpo de delito é comprovar a existência material (materialidade) do fato nos casos em que a infração deixar vestígios, sendo a sua realização (direta ou indireta) imprescindível, não podendo ser suprida pela confissão do acusado.

O exame de corpo de delito somente poderá ser substituído pela prova testemunhal quando desaparecidos os vestígios do delito, nos termos do art. 167 do CPP.

Nessa última hipótese, tem-se o corpo de delito indireto, que não se confunde com exame de corpo de delito indireto, que é forma de perícia subsidiária ao exame direto, porquanto realizada a partir de outros laudos técnicos, e não por exame imediato dos vestígios8

Na realização do exame de corpo de delito, consoante art. 158, parágrafo único do CPP, terá prioridade a vítima de crime que envolva:

a) violência doméstica e familiar contra mulher; b) violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.

(2) Exame cadavérico (art. 162, CPP)

É o exame exterior do cadáver e de suas partes internas com a finalidade de se certificar a causa da morte (causa mortis) e outras circunstâncias penalmente relevantes. Com certa impropriedade terminológica, é também denominado de necropsia ou autópsia.

Por cautela, olegislador estabelece, para a realização do exame, o prazo mínimo de06 (seis) horas após o suposto óbito, lapso temporal suficiente para aparecerem as primeiras evidências confirmatórias da morte, exceto se o(s) perito(s), antes do referido tempo, identificar(em) sinais que tornem induvidoso o falecimento, o que declarará (rão) no laudo.

Poderá ser dispensado o exame interno do cadáver nos casos de morte violenta, bastando osimples exame externo do cadáver:

a) quando não houver infração penal a apurar; ou

b) quando as lesões externas permitirem precisar a causamortis, e não houver necessidadede verificação de alguma circunstância relevante.

(3) Exumação (art. 163, CPP)

Inumar é sepultar o cadáver, enquanto exumar significa desenterrá-lo.

Nesse sentido, a realização da diligência de exumação para realização de exame pericial deverá seguir o disposto no art. 163 do CPP, o qual define que a autoridade providenciará para que, em dia e hora previamente marcados, após devidamente indicado o lugar da sepultura pelo administrador do cemitério público (ou particular), possa(m) o(s) perito(s) recolher os restos mortais para a devida análise.

No caso de recusa ou de falta de quem indique a sepultura, ou de encontrar-se o cadáver em lugar não destinado a inumações, a autoridade procederá às pesquisas necessárias, tudo devendo constar doautocircunstanciado.

6 REBOUÇAS, Sérgio. Curso de direito processual penal Salvador: Juspodivm, 2017, p. 573.

7 Ibid., p. 570/571.

8 Id. Ibid., p. 574.

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Havendo dúvida sobre a identidade do cadáver exumado, proceder-se-á ao reconhecimento pelo Instituto de Identificação e Estatística ou repartição congênere ou pela inquirição de testemunhas, lavrando-se auto de reconhecimento e de identidade, no qual se descreverá o cadáver, comtodos os sinais e indicações.

Em qualquer caso, serão arrecadados e autenticados todos os objetos encontrados que possam ser úteis para a identificação docadáver.

(4) Exame de ofensa física complementar (art. 168, CPP)

Em se tratando de lesões corporais, é possível que surja a necessidade de complementação do primeiro exame de corpo de delito, considerado incompleto, ou para comprovar a incapacidade da vítima para as ocupações habituais por mais de 30(trinta) dias, contados da data do crime. Nesse último caso, o exame somente poderá ser realizado, após decorrido o referido lapso temporal, para fins de tipificação da lesão corporal de natureza grave (art. 129, § 1º, incisoI, CP).

A nova perícia será realizada por determinada autoridade policial ou judiciária, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público, do ofendido, do acusado ou de seu defensor, conforme ocaso.

No exame complementar, os peritos terão presente cópia do auto de exame de corpo de delito anterior, a fim de suprir-lhe a deficiência ou de retificá-lo.

Desaparecidos os vestígios do crime, a falta do exame complementar poderá ser suprida pela prova testemunhal.

(5) Exame do local do crime (art. 169, CPP)

Uma das primeiras medidas que deverá tomar a autoridade policial, tão logo tome conhecimento do delito, é comparecer ao local de sua ocorrência, providenciando para que não se alterem o estado e a conservação das coisas, até a chegada da perícia criminal (art. 6º, incisoI, CPP).

O(s) perito(s), visando a instruir o laudo pericial, poderá(ão) utilizar fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos, registrando, ainda, eventuais alterações do estado das coisas, discutindo, no relatório, as consequências dessas alterações na dinâmica dos fatos.

Para complementação, recomendamos a leitura do item 1.2.1.1.

(6) Exame laboratorial (art. 170, CPP)

Na perícia laboratorial, o(s) perito(s) guardará(ão) material suficiente para a eventualidade de novo exame.

Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas fotográficas, ou microfotográficas, desenhos ou esquemas.

Recomendamos, mais uma vez, a leitura do item 1.2.1.1.

(7) Exame de destruição e rompimento de obstáculos (art. 171, CPP)

Nos crimes cometidos com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa, ou por meio de escalada, o(s) perito(s), além de descrever(em) os vestígios, indicará(ão) com que instrumentos, por quais meios e em que época presume(m) ter sido ofato praticado.

(8) Exame de avaliação (art. 172, CPP)

Proceder-se-á, quando necessário, à avaliação de coisas destruídas, deterioradas ou que constituam produto do crime.

Se for impossível a avaliação direta, o(s) perito(s) procederá(ão) à avaliação por meio dos elementos existentes nos autos e dos que resultarem de diligências.

(9) Exame de incêndio (art. 173, CPP)

No exame pericial, o(s) perito(s) verificará(ão):

a) a causa do incêndio;

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b) o lugar em que começou;

c) o perigo que dele tiver resultado para a vida ou para o patrimônio alheio;

d) a extensão do dano e o seu valor e

e)demais circunstâncias que interessarem à elucidação do fato, inclusive aquelas estabelecidas como causas de aumento de pena (art. 250, § 1º, CP).

(10) Exame grafotécnico (art. 174, CPP)

No exame para o reconhecimento de escritos, por comparação de letra, observar-se-á o seguinte:

1. a pessoa a quem se atribua ou se possa atribuir o escrito será intimada para o ato, sefor encontrada;

2. para comparação, poderão servir quaisquer documentos que a dita pessoa reconhecer ou já tiverem sido judicialmente reconhecidos como de seu punho, ou sobre cuja autenticidade não houver dúvida;

3. a autoridade, quando necessário, requisitará, para o exame, os documentos que existirem em arquivos ou em estabelecimentos públicos, ou nestes realizará a diligência, se daí não puderem ser retirados;

4. Quando não houver escritos para a comparação ou forem insuficientes os exibidos, a autoridade mandará que a pessoa escreva o que lhe for ditado. Se estiver ausente apessoa, mas em lugar certo, esta última diligência poderá ser feita por precatória, na qual se consignarão as palavras que a pessoa será intimada a escrever.

Em razão do direito à não autoincriminação (nemo tenetur se detegere), poderá o acusado recusar o reconhecimento de escritos como de próprio punho ou fornecer padrões gráficos para realização do exame grafotécnico. Todavia, a recusa não impede que os órgãos de investigação possam obtê-los por intermédio de outros mecanismos, v.g.:

a) de documentos já reconhecidos judicialmente como do próprio punho do imputado esobre sua autenticidade não houver dúvida (art. 174, inciso II, CPP); b) de documentos inexistentes em arquivos ou estabelecimentos públicos (art. 174, inciso III, CPP).

(11) Exame do instrumento do crime (art. 175, CPP)

O exame pericial no instrumento docrime utilizado na prática da infração penal tem por finalidade verificar sua naturezae sua eficiência.

1.2.2.INTERROGATÓRIO

É o ato processual em que o juiz ouve o acusado sobre a sua pessoa e a imputaçãoque lhe é feita.

Em decisões proferidas nas ADPF 395/DF e ADPF 444/DF, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, por considerar não obrigatória a participação no ato, declarou a impossibilidade de condução coercitiva de investigados ou de réus para interrogatório, pronunciando a incompatibilidade com a Constituição Federal da expressão “para o interrogatório”, constante do art. 260, caput do CPP.

1.2.2.1. Natureza jurídica

O interrogatório possui natureza jurídica dupla: é meio de prova e meio de defesa

É meio de prova, quando o interrogando responde às questões formuladas e dele poderá se servir o magistrado para formar o seu convencimento.

É meio de defesa, quando oportuniza ao interrogando, dirigindo-se diretamente ao juiz da causa, apresentar sua versão sobre a acusação que recai em seu desfavor.

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1.2.2.2. Características

São características do ato de interrogatório:

a) público: é ato processual público, em regra, exceto nos casos em que houver risco de escândalo, inconveniente grave ou perturbação da ordem pública (art. 792, § 1º, CPP);

b) personalíssimo: somente o réu, pessoalmente, será interrogado, não podendo se fazer representar por terceiro;

c) individual: havendo mais de um acusado, serãointerrogados separadamente;

d) judicial: será realizado em juízo, perante a autoridade judiciária. Assim, tecnicamente, o interrogatório é realizado somente em juízo, nos termos do art. 186, caput do CPP.Na fase investigativa, se dá a oitiva do investigado mediante aplicação subsidiária das regras próprias do interrogatório (arts. 185 a 196, CPP), conforme prescreve o art. 6º, inciso V do CPP;

e) oral: em regra, o interrogatório seguirá com perguntas e respostas formuladas oralmente;

f) direito do acusado: o interrogatório é oportunidade para o exercício da autodefesa pelo acusado, não cabendo qualquer forma de dispensa judicial. A falta do interrogatório constituirá causa de nulidade processual (art. 792, caput, CPP).

1.2.2.3. Presença da defesa técnica

A presença de defensor, constituído ou nomeado, acompanhando o interrogatório é obrigatória, devendo o juiz que presidir o ato assegurar ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com aquele, nos termos do art. 185 do CPP, sob pena de constituir nulidade processual absoluta.

1.2.2.4. Procedimento

1º) Qualificação: será o acusado qualificado, devendo fornecer seus dados pessoais verdadeiros sob pena de incorrer no crime de falsa identidade, tipificado no art. 307 do Código Penal. Recusando-se a se identificar, cometerá a Contravenção Penal prevista noart. 68 da LCP;

2º) Se necessário, entrevista pessoal e reservada com o defensor: ao juiz, consoante art.185, § 5º do CPP, caberá garantir ao réu o direito de entrevista prévia e reservada como seu defensor;

3º) Cientificação pelo juiz do inteiro teor da acusação e que tem o direito de permanecercalado e de não responder às perguntas que lhe forem formuladas e que o seusilêncionão importará em confissão, nem poderá ser interpretado em prejuízo de sua defesa,na forma contida no art. 186 do CPP. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.869/2019, a conduta de quem prossegue com o interrogatório quando o interrogando tenha decidido exercer o direito ao silêncio passou a ser tipificada como crime no art. 15, parágrafo único, inciso I, quando investida do elemento subjetivo especial previsto no art. 1º, § 1º do mesmo diploma legal9. Assim, manifestando o interrogando a intenção de silenciar, deve a autoridade, imediatamente, encerrar o ato, sem consignação de eventuais perguntas não respondidas. Entretanto, a jurisprudência pátria passoua admitir o denominado silêncio seletivo ou parcial, permitindo ao interrogando responder apenas às perguntas formuladas por seu defensor10;

9 Art. 1º [...] § 1º As condutas descritas nesta Lei constituem crime de abuso de autoridade quando praticadas pelo agente com a finalidade específicade prejudicar outremou beneficiar a simesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal. 10 Por exemplo: [...] 1. O direito constitucional ao silêncio deve ser exercido pelo acusado da forma que melhor lhe aprouver, deven- do ser compatibilizado com a sua condição de instrumento de defesa e de meio probatório. 2. A escolha das perguntas que serão respondidas e aquelas para as quais haverá silenciamento, harmoniza o exercício de defesa com a garantia da não incriminação. [...]” (SFT, 2ª T., RHC 213849 AgR, Rel. Ricardo Lewandowski, Rel. p/ Acórdão: Edson Fachin, j. em 15/04/2024, pub. no DJE de 16/05/2024), e, “[...] 1. O fato de o juiz conduzir o interrogatório não significa que o réu está impossibilitado de responder apenas a algumas perguntas, em especial às da defesa, fazendo uso assim do silêncio seletivo. De

33

4º) Passa-se ao interrogatório propriamente dito, que se caracteriza por ser ato bifásico,nos termos do art. 187 do CPP:

1ª parte - Indagações sobre a vida pessoal (individualização social):

O interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais. Deverá, ainda, ser indagado sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos (art. 187, § 10, CPP).

2ª parte - Indagações sobre os fatos (interrogatório de mérito):

O interrogando, após cientificado de que poderá invocar o direito ao silêncio, não respondendo ao que lhe for indagado, será perguntado sobre:

a) se é verdadeira a acusação que lhe é feita. Caso confesse a autoria, será perguntado sobre os motivos e circunstâncias do fato e se outras pessoas concorreram para a infração, e quais sejam. Se negar a acusação, no todo ou em parte, poderá prestar esclarecimentos e indicar provas;

b) em não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a quem atribuíla, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;

c) onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;

d) se conhece as provas já apuradas;

e) se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e setem o que alegar contra elas;

f) se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sidoapreendido;

g) todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;

h) se tem algo mais a alegar em sua defesa.

O rol de indagações não é exauriente, podendo outras ser formuladas de acordo com o casoconcreto;

Depois de proceder ao interrogatório, o juiz indagará das partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes (primeiramente da acusação) se o entender pertinente e relevante (art. 188, CPP).

No entanto, a liberdade que goza o interrogando para apresentar sua versão sobre os fatos não afasta a possibilidade de incorrer no crime de denunciação caluniosa (art. 339, CP)111 ou auto acusação falsa (art. 341, CP) 12

Havendo mais de um acusado, serão interrogados separadamente, embora (o)s defensor(es) do(s) corréu(s), quando diverso(s), devidamente intimado(s), possa(m), querendo, participar do ato, inclusive formulando indagações, se necessário13 .

fato, é cediço que quem pode o mais pode o menos. Assim, se é possível não responder a nenhuma pergunta, é possível também responder apenas a algumas perguntas. Anote-se que o direito ao silêncio é consectário do princípio nemo tenetur se detegere, tratando-se, portanto, de garantia à não autoincriminação. Ademais, é assente que o interrogatório não é apenas meio de prova, mas especial instrumento de autodefesa, competindo, dessa forma, à defesa escolher a melhor estratégia defensiva.[...]. (STJ, 5ª T., AgRg no HC n. 833.704/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 8/8/2023, pub. no DJe de 14/8/2023).

11 Art. 339. Dar causa a instauração de inquérito policial, de procedimento investigatório criminal, de processo judicial, de processo ad- ministrativo disciplinar, de inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente: (Redação dada pela Lei nº 14.110, de 2020). Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa. § 1º - A pena é aumentada de sexta parte, se o agente se serve de anonimato ou de nome suposto. § 2º - A pena é diminuída de metade, se a imputação é de prática de contravenção

12 Art. 341 - Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem: Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa.

13 [...]É legítimo, em face do que dispõe o artigo 188 do CPP, que as defesas dos co-réus participem dos interrogatórios de outros réus. Deve ser franqueada à defesa de cada réu a oportunidade de participação no interrogatório dos demais co-réus, evitando-se a coincidência de datas, mas a cada

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Por fim, se o interrogado não souber escrever, não puder ou não quiser assinar o termo de interrogatório, será ofato nesse consignado.

1.2.2.5. Momento processual

O interrogatório será realizado ao final da instrução, o que permite ao interrogado o exercício da ampla defesa, uma vez que será ouvido já tendo conhecimento da prova produzida. Inobstante tal previsão, a todo tempo, o juiz, de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das partes, poderá proceder a um novo interrogatório (art. 196, CPP).

Nos crimes de competência do Tribunal do Júri, o réu será interrogado em Plenário, após ainstrução, naforma do art. 474, caput do CPP.

1.2.2.6. Lugar

O interrogatório deve ser realizado na sede do juízo (art. 792, caput, CPP).

Admite-se, excepcionalmente, a sua realização no estabelecimento prisional em que estiver recolhido, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade do ato (art. 185, § 1º, CPP).

Estando o réu preso, ao responsável pelo estabelecimento prisional será requisitada sua apresentação em juízo para o interrogatório (art. 399, § 1º, CPP).

1.2.2.7. Interrogatório por videoconferência

Em caráter excepcional, nos termos do art. 185, § 2º do CPP, é possível a realização do interrogatório do réu preso por videoconferência ou outrorecurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, mediante decisão fundamentada do juiz, de ofício ou a requerimento das partes, para atender a uma das seguintes finalidades:

a) prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;

b) viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou por outra circunstância pessoal;

c) impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 do CPP;

d) responder à gravíssima questão de ordem pública.

Nesse caso, as partes serão intimadas com 10(dez) dias de antecedência da decisão que determinar a realização do interrogatório por videoconferência (art. 185, § 3º, CPP)

Precedendo ao interrogatório por videoconferência, o preso terá o direito de acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531 do CPP (art. 185, § 4º, CPP).

Além de ser garantido ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor, para realização do interrogatório por videoconferência, deve ser assegurado também o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso (art. 185, § 5º, CPP).

A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil (art. 185, § 6º, CPP).

um cabe decidir sobre a conveniência de comparecer ou não à audiência. [...]. (STF, Pleno, AP-470 AgR/MG, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em 06/12/07, publ. no DJe-047, de 14/03/08)

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1.2.2.8. Formas especiais de interrogatório

O Código de Processo Penal, em seu art. 192, estabelece formas especiais de interrogatório, asaber:

• Ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente;

• Ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por escrito;

• Ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo modo ele dará asrespostas;

• Ao surdo, mudo e surdo-mudo, que não saiba ler ou escrever, intervirá no ato, como intérprete e sobcompromisso, pessoa habilitada a entendê-lo.

Por fim, quando se tratar de interrogando que não saiba falar a língua nacional, o interrogatório será feito por meio de intérprete (art. 193, CPP).

1.2.3.CONFISSÃO

É o reconhecimento pelo acusado da imputação feita em desfavor de sua pessoa. A confissão, prevista nos arts. 197 a 200 do CPP, apresenta como características:

a) pessoalidade: deverá ser manifestada pelo próprio acusado;

b) voluntariedade: o acusado deverá manifestar a confissão livremente;

c) caráter expresso: deverá ser feita de forma expressa e inequívoca;

d) oralidade: é preciso que seja feita de forma oral perante a autoridade judiciária;

e) formalidade: deverá ser tomada por termo;

f) ) judicialidade: para ter valor como prova deverá ser apresentada perante o juiz;

g) divisibilidade: a autoridade judiciária poderá levar em consideração apenas parte do quanto confessado pelosujeito;

h) retratabilidade: permite que o acusado reconsidere sua confissão. Ao julgador, diante das demais provas do processo, caberá, de forma motivada, valorar a veracidade da confissão anterior e da retratação.

A confissão tem valor probatório relativo, não afastando o ônus da parte acusadora de provar a existência material e a autoria do fato criminoso, razão pela qual, por si só, não é suficiente para um juízo condenatório, sendo necessário confrontá-la com as demais provas do processo.

Repita-se: o silêncio do réu não importa em confissão.

1.2.3.1. Delação premiada

Delação premiada (ou chamamento de corréu) tem como característica ser ato unilateral,praticado pelo agente que, espontaneamente, opta por prestar auxílio à atividade de investigação ou à instrução procedimental sem que exista prévio acordo entre as partes interessadas. Nessesentido, não apenas confessa a autoria da infração penal, mas também revela outras pessoasque dela participaram.

Difere-se da colaboração premiada que, além da confissão e revelação dos partícipes ou coautores, exige a prestação de informações sobre a estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa, a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa, a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada, dentre outras14 .

Em contrapartida, de acordo com a norma legal a ser aplicada, o delator poderá fazer jusa redução da pena, substituição da pena e até mesmo o perdãojudicial.

14 Ver item1.3.2.

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1.2.4.DECLARAÇÕES DO OFENDIDO

O ofendido, consoante disposto no art. 201 do CPP, sempre que possível, será qualificado e ouvido por termo sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor e sobre eventuais provas que possa indicar.

Não prestará o compromisso de dizer a verdade, e, consequentemente, não estará sujeitoao crime de falso testemunho, previsto no art. 342 do CP.

O não comparecimento do ofendido em juízo, devidamente intimado, sem motivo justo, poderá ensejar na sua condução coercitiva à presença da autoridade.

1.2.5.PROVA TESTEMUNHAL

1.2.5.1. Características

São características da prova testemunhal:

a) judicialidade: a prova testemunhal é produzida em juízo. Depoimento prestado nafase pré-processual deve ser ratificado perante a autoridade judiciária;

b) oralidade: em geral, sua produção observa a forma oral, sendo vedado trazê-lo por escrito;

c) objetividade: a testemunha não apresenta valoração pessoal sobre os fatos, salvo quando inseparáveis da narrativa, depondo objetivamente sobre o ocorrido;

d) retrospectividade: a testemunha falará sobre fato ocorrido no passado, jamais sobrefato futuro;

e) individualidade: as testemunhas serão ouvidas separadamente de modo que umasnão saibam nem ouçam os depoimentos das outras.

1.2.5.2.

Classificação das testemunhas

Classificam-se as testemunhas em:

a) Testemunhas extranumerárias: não são computados no limite legal de testemunhasque cada parte poderá indicar:

a.1) Testemunhas não compromissadas: testemunhas indicadas pela acusação ou pela defesa, no momento procedimental específico, que, por circunstâncias legais, não prestam o compromisso legal. São, comumente, denominadas de declarantes;

a.2) Testemunhas do juízo: testemunhas apontadas pela autoridade judiciária que preside a ação penal, na forma do art. 209, caput do CPP. Prestarão (ou não) o compromissolegal;

a.3) Testemunhas referidas: testemunhas mencionadas no curso da instrução processual e cuja oitiva poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou mediante requerimento daspartes (art. 209, § 1º, CPP). Prestarão (ou não) o compromisso legal;

b) Testemunhas numerárias: testemunhas indicadas pela acusação (na denúncia ou na queixa-crime) e pela defesa (na resposta à acusação), observado o número legalprevisto para cada procedimento. Prestarão o compromisso legal.

1.2.5.3. Obrigatoriedade de depor

A princípio, toda pessoa poderá ser testemunha, não podendo se eximir da obrigação de depor (arts. 202 c/c 206, primeira parte, ambos do CPP).

O não comparecimento em juízo da testemunha, devidamente intimada, poderá ensejar a sua condução coercitiva a ser determinada pelo juiz do processo e executada pela autoridade policial ou por oficial de justiça, que, para tanto, poderá solicitar o auxílio da força pública, sem prejuízo de eventual imposição à faltosa da multa prevista no art. 453 do CPP, sujeição ao

37

crime de desobediência e condenação ao pagamento das custas da diligência, tudo consoante previsto nosarts. 218 e 219, ambos do CPP.

1.2.5.4. Recusa de depor

Poderão se recusar a depor as pessoas mencionadas no art. 206 do CPP: o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge15 , ainda que divorciado ou separado, o irmão e opai,a mãe, ou o filho adotivo do acusado.

A recusa, no entanto, poderá ser inaplicável caso entenda o juiz que não é possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias.

Nessa situação ou mesmo quando se dispuserem voluntariamente a prestar declarações, ditas pessoas serão ouvidas, porém sem assumirem o compromisso legal (art. 208, parte final, CPP).

1.2.5.5. Proibição de depor

As pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo são proibidas de depor.

É que não lhes é lícito exigir a quebra do sigilo, objeto de proteção legal, cujas condutas subsumirão ocrime doart. 154 do Código Penal16

Nessa situação, tem-se, v.g., o sigilo profissional do médico em relação ao seu paciente, do padre com o confessor, dentre outros.

A proibição, no entanto, estará afastada caso, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seutestemunho (art. 207, CPP).

1.2.5.6. Testemunhas compromissadas

O art. 203 do CPP expressa que a testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado. Assumido o compromisso, caso se verifique que fez afirmação falsa, ou negou ou calou a verdade, incorrerá no tipo penal previsto no art. 342 do CP (falsotestemunho).

Nesse caso, poderá ser presa em flagrante delito ou, reconhecido o crime no momento da sentença, determinada pelo seu prolator a remessa de cópia do depoimento à autoridade policial para a devida apuração. Caso as declarações tenham sido prestadas em plenário de julgamento, o juiz, no caso de proferir decisão na audiência, o tribunal, ou o conselho de sentença, após a votação dos quesitos, poderão fazer apresentar imediatamente a testemunha à autoridade policial, tudo amparado no disposto no art. 211 do CPP.

1.2.5.7. Testemunhas nãocompromissadas (declarantes)

Diferentemente das testemunhas compromissadas, existem pessoas que são ouvidas em juízo, mas que não prestam o compromisso de dizer a verdade do que souber e lhes for perguntado, e, portanto, não estarão sujeitas ao cometimento do crime de falso testemunho. São as chamadas testemunhas não compromissadas, também conhecidas como declarantes, cuja valoração das informações prestadas será aferida pelo juiz, por ocasião da sentença.

Serão ouvidos como declarantes, nos termos do art. 208 do CPP:

a) os doentes e deficientes mentais;

b) os menores de 14(quatorze) anos;

c) o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge (ou companheiro(a)), ainda que separado judicialmente ou divorciado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado.

15 Considera-se também os companheiros emunião estável.

16 CP, Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: [...].

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1.2.5.8. Produção da prova testemunhal

1.2.5.8.1. Incomunicabilidade das testemunhas

Nos termos do art. 210 do CPP, as testemunhas serão inquiridas individualmente, adotando-se as cautelas necessárias para que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras.

A medida tem por objetivo evitar qualquer influência sobre o ânimo e a convicção da outra testemunha.

Nesse sentido, antes do início da audiência e durante a sua realização, deverão ser reservados espaços separados para a garantia da incomunicabilidade das testemunhas.

Todavia, na prática, em geral, nem sempre é observada a incomunicabilidade em razão das estruturas físicas dos fóruns, mantendo-se testemunhas lado a lado, em corredores ou em salas.

1.2.5.8.2. Oralidade dosdepoimentos

A oralidade deve ser a tônica dos atos processuais, razão pela qual a produção da prova testemunhal se faz pela inquirição oral da testemunha emaudiência judicial.

Nesse aspecto, estabelece o Código de Processo Penal: “Art. 204. O depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito. Parágrafo único. Nãoserá vedada à testemunha, entretanto, breve consulta a apontamentos”.

Entretanto, circunstâncias especiais previstas na legislação levarão ao afastamento da regra da oralidade, na forma dos arts. 223, parágrafo único c/c 192, ambos do CPP, a saber:

• Ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente;

• Ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por escrito;

• Ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo modo dará as respostas;

• Ao surdo, mudo e surdo-mudo, que não saiba ler ou escrever, intervirá no ato, como intérprete e sobcompromisso, pessoa habilitada a entendê-lo.

1.2.5.8.3. Direito de presença

Uma das formas de exercício da ampla defesa, na vertente da autotutela, dar-se-á com o direito de presença do acusado aos atos processuais, inclusive, durante a produção da prova testemunhal, quando, por meio de seu defensor, poderá confrontar as declarações da testemunha.

Para o exercício do direito ao confronto, é assegurado ao acusado:

a) que a prova testemunhal seja produzida em audiência pública, exceto quando houver exigência de restrição à publicidade, na forma do art. 5º, inciso LX da CF;

b) presenciar a produção da prova testemunhal, salvo, excepcionalmente, na hipótese do art. 217 do CPP17, quando deverá ser determinada a retirada do réu da sala pelo juiz que preside o ato, consignando os motivos no termo respectivo;

c) que a prova testemunhal seja colhida pelo julgador que irá proferir a sentença, em respeito ao princípio da identidade física do juiz (art. 399, § 2º, CPP);

d) impor à testemunha o compromisso de dizer a verdade (art. 203, CPP), sob pena de cometer ocrime de falso testemunho;

e) conhecer a verdadeira identidade das fontes de prova testemunhal, a fim de que possa eventualmente suscitar contradita ou arguir circunstâncias ou defeitos, que a tornem suspeita de parcialidade, ou indigna de fé (art. 214, CPP).

17 Art. 217. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor.

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Caso esteja preso, deverá ser requisitada à autoridade responsável pela custódia sua apresentação em juízo para acompanhar a audiência de instrução, ainda que se encontre em unidade diversa da Federação.

Porém, trata-se de um direito renunciável pela defesa, sendo possível formulação de pedido de dispensa do comparecimento doréuaoato.

A ausência do acusado à audiência por falta de intimação, como reconhecido pela jurisprudência majoritária, constitui nulidade relativa, exigindo-se demonstração de prejuízo e arguição em momento oportuno, sob pena de restar convalidada.

Nesse sentido, v.g.: “[...] II - O direito de presença aos atos processuais não é indisponívele irrenunciável, de modo que o não comparecimento do acusado em audiência de oitiva de testemunhas não enseja, por si só, declaração de nulidade do ato, sendo necessária a arguiçãono momento oportuno e a comprovação do prejuízo, em consonância com o princípio pas denullite sans grief, consagrado no art. 563 do CPP e no Enunciado N. 523 da Súmula do STF[...]”. (STJ; 5a Turma; RHC 106.713/MG; Rel. Min. Felix Fischer; Julg. 19/03/2019; DJE 26/03/2019).

1.2.5.8.4. Qualificação da testemunha

A qualificação da testemunha diz respeito aos dados referentes ao nome, idade, estado e endereço residencial, profissão, lugar onde exerce sua atividade, se é parente e em que grau de alguma das partes ou quais suas relações com qualquer delas, Havendo dúvidas sobre a sua identidade, o juiz procederá à verificação pelos meios ao seu alcance, podendo, entretanto, tomar-lhe o depoimento, desde logo, consoante previsão do art. 205 do CPP.

A Lei nº 9.807/99, que estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas, em seu art. 7º, inciso IV prevê que, dentre as medidas possíveis de adoção, está a preservação da identidade, imagem e dados pessoais da pessoa sob proteção.

Nesse caso, deverá o juiz que presidir o ato adotar as providências necessárias para restringir, em razão do interesse social, a publicidade do depoimento, bem como a própria presença do réu na audiência, consoante faculta o art. 93, inciso IX (“todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;[...] ”) e o art. 5º, inciso LX (“a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; [...] ”), todos da Constituição Federal.

Entretanto, o acesso prévio, por parte do defensor, aos dados qualificativos da testemunha deve ser garantido, sob pena de se violar o princípio da ampla defesa.

1.2.5.8.5. Impugnação dodepoimento testemunhal

O Código de Processo Penal prevê duas formas de impugnação do depoimento de testemunha: a contradita ou a arguição de circunstância ou defeitos, que a tornem suspeita de parcialidade, ou indigna de fé.

A contradita diz respeito a alegação de motivo de proibição da testemunha depor (art. 207, CPP) ou de dispensa do compromisso legal (art. 208, CPP), enquanto a arguição de circunstância ou defeito em desfavor da testemunha, refere-se a motivos diversos das causas legais de proibição ou de dispensa, mas influentes na imparcialidade e na credibilidade esperadas do depoimento testemunhal.

O momento oportuno para a arguição da contradita ou de circunstâncias ou defeitos que tornem a testemunha suspeita de parcialidade ou indigna de fé, nos termos do art. 214 do CPP, é antes de iniciar o depoimento, logo após a sua qualificação. O juiz fará consignar a alegação

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e a resposta da testemunha, mas só excluirá a testemunha ou não lhe deferirá compromisso nos casos previstos nos arts. 207 (ver item 1.2.5.5) e 208 (ver item 1.2.5.7), ambos do CPP,respectivamente.

Nãoapresentada contraatestemunha contradita,circunstâncias oudefeitos queatornem suspeita de parcialidade ou indigna de fé, opera-se a preclusão temporal, salvo conhecimento superveniente da causa.

1.2.5.8.6. Coleta dodepoimento testemunhal

O depoimento da testemunha se dará no sistema direto e cruzado (art. 212, CPP), isto é, as partes perguntarão diretamente ao depoente, primeiramente, quem a indicou (directexamination), e, em seguida, a parte adversa (cross-examination), assegurando-se, desse modo, o exercício do contraditório na produção da prova testemunhal. Ao final, de forma complementar, o juiz formulará suas indagações18 .

A testemunha (compromissada ou não) relatará o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar sua credibilidade.

Ao juiz presidente do ato caberá intervir nas perguntas apresentadas pelas partes, não admitindo as que puderem induzir a resposta, nãotiverem relação com acausa ou importarem narepetição de outra já respondida.

Igualmente, ele não permitirá que a testemunha manifeste suas apreciações pessoais, salvo quando inseparáveis da narrativa do fato, devendo, na redação das declarações, se for o caso, cingir-se, tanto quanto possível, às expressões usadas pelas testemunhas, reproduzindo fielmente as suasfrases.

Oart.405doCPP, aotratar sobreainstrução criminal,indica queoregistro dosdepoimentos das testemunhas, sempre que possível, será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações, afastando, assim, a possibilidade de distorção, no registro, do que foi afirmado pela testemunha.

Nesse caso, o juiz mandará lavrar termo de audiência, assinado por todos, com o resumo dos fatos relevantes, consignando que o depoimento foi registrado por meio audiovisual, com gravação em mídia própria, que será juntada aos autos e disponibilizada às partes.

Parcela doutrinária defende que, excepcionalmente, em razão do temor pela segurança da testemunha, poderá o juiz determinar não apenas a retirada do réu da sala de audiência, mas também que o registro do depoimento seja reduzido a termo, ainda que se tenha sistema de gravação audiovisual, ou registrado unicamente em áudio.

Por outrolado, sea testemunha nãosouberassinar, ou não puder fazê-lo, pedirá aalguém que o faça por ela, depois de lido o seu depoimento na presença de ambos. É a chamada assinatura arogo.

Acaso a testemunha não conheça a língua nacional, será nomeado um intérprete para traduzir as perguntas e respostas.

1.2.5.8.7. Depoimento por meiodecarta (deordem,precatória ourogatória)

Quando a testemunha residir fora do território da jurisdição do juízo processante, deverá ser inquirida mediante carta (de ordem, precatória ou rogatória), nos moldes do art. 222 do CPP. Para coleta do seu depoimento, será expedida a referida carta, que não suspenderá a instruçãocriminal e terá prazorazoável para cumprimento, intimadas as partes.

A intimação das partes se dará somente quanto à expedição da carta, não se exigindo que elas sejam intimadas da audiência designada pelo juízo destinatário.

18 [...] Não cabe ao juiz, na audiência de instrução e julgamento de processo penal, iniciar a inquirição de testemunha, cabendo-lhe, apenas, complementar a inquirição sobre os pontos não esclarecidos. [...] Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, deferiu a ordem de habeas corpus, para reconhecer a nulidade do processo-crime a partir da audiência de instrução, com a necessária renovação do ato. [...]. (STF, HC 187035/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 06/04/2021).

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19

Nessa linha, o enunciado da Súmula 273 do STJ expressa: “Intimada a defesa da expedição dacartaprecatória,torna-sedesnecessáriaaintimaçãodadatadaaudiêncianojuízodeprecado”.

Aliás, a própria falta da comunicação da expedição da carta é considerada como causa de nulidade relativa que deverá ser arguida notempo oportuno, sob pena de preclusão,consoante entendimento consolidado pelo STF na Súmula 155, com o seguinte enunciado: “É relativa a nulidade do processo criminal por falta de intimação da expedição da precatória para inquirição detestemunha”.

Em que pese dispor oart. 222, §§ 1º e 2º do CPP que a expedição de carta precatória não suspende a instrução criminal e que, findo o prazo marcado para o seu atendimento pelo juízo deprecante, sem que ela tenha sido devolvida, poderá este realizar o julgamento, o Superior Tribunal de Justiça19 já decidiu que o interrogatório do réu somente pode ser realizado após aoitiva de todas as testemunhas, inclusive aquelas ouvidas por precatória.

Por sua vez, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal20 julgou que o fato da testemunha ter sido ouvida, por meio da expedição de carta precatória, após a realização do interrogatório do réu não é razão suficiente para nulificar o processo criminal quando não demonstrado oefetivo prejuízo causadoà parte.

Nada impede, entretanto, que, ao invés de expedir a carta, havendo condições operacionais, aautoridadejudiciáriaprocedaàoitivadatestemunha pormeiodevideoconferência oudeoutro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, permitida a presença do defensor, podendo essa oitiva ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução ejulgamento.

Por seu turno, para coleta de depoimento testemunhal por meio de carta rogatória, o art. 222-A, caput do CPP exige, para que sua expedição seja efetivada, que a parte requerente demonstre, previamente, a sua imprescindibilidade, arcando, ainda, com os custos do envio.

Expedida a carta rogatória, aplicam-se, nos termos do parágrafo único do art. 222-A do CPP, as regras estabelecidas para a carta precatória, previstas nos §§ 1º e 2º do art. 222 do mesmo diploma legal.

1.2.5.8.8. Número legal de testemunhas compromissadas

O número legal de testemunhas compromissadas a serem indicadas pelas partes dependerá do procedimento adotado:

• Procedimento comum ordinário: até 08 (oito) testemunhas, a cada infração imputada;

• Procedimento comum sumário: até 05 (cinco) testemunhas;

• Procedimento comum sumaríssimo: até 03 (três) testemunhas (por aplicação subsidiária do art. 34 da Lei nº 9.099/95);

• Procedimento especial do Tribunal do Júri: até 08 (oito) testemunhas pelas partes, individualmente, e em relação a cada uma das infrações imputadas.

Por outro lado, a pessoa que nada souber que interesse à decisão da causa não será computada no número máximo legal a que tem direito cada uma das partes, conforme o rito adotado.

1.2.5.8.9. Depoimentos em circunstâncias especiais

1.2.5.8.9.1. Depoimento especial

A Lei nº 13.341/2017, em seus arts. 8º a 12, instituiu procedimento para o depoimento especial de crianças e adolescentes vítima ou testemunha de violência, perante a autoridade policial ou judiciária.

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HC nº 585.942.
HC nº 175.357.
20

A medida visa a impedir que crianças e adolescentes, vítimas de qualquer forma de violência, sejam submetidas a métodos inadequados para coleta de seus depoimentos, por parte de agentes de instituição pública ou conveniada, evitando a revitimização, que constitui forma de violência institucional (art. 4º, inciso V da Lei nº 13.341/2017), o que não poderia ser diferente já que, como cita Vilela2126 , uma das formas de revitimização ocorre pela repetição dalembrança de atos de violência sofridos quando o relato do trauma necessita ser repetido para vários profissionais. Cada depoimento, revivendo a história, inegavelmente, é um sofrimentorenovado, o que, inclusive, pode comprometer a apuração dos fatos.

Nesse contexto, os órgãos do sistema de justiça deverãoatuar de forma articulada com a rede de proteçãoa crianças e adolescentes.

A Lei nº 13.341/2017, em seu art. 4º § 1º, fixa que a criança e o adolescente serão ouvidos sobre a situação de violência por meio de escuta especializada ou de depoimento especial

A escuta especializada diz respeito ao procedimento de entrevista sobre situação de violência contra criança ou adolescente, perante órgão da rede de proteção, limitado o relato estritamente ao necessário para o cumprimento de sua finalidade (art. 7º, Lei nº 13.341/2017).

O depoimento especial é o procedimento de oitiva da criança ou do adolescente, perante a autoridade judiciária ou policial (art. 8º, Lei nº 13.341/2017).

Tanto na escuta especializada como no depoimento especial, a criança ou o adolescente serão resguardados de qualquer contato, ainda que visual, com o suposto autor ou acusado, ou com outra pessoa que represente ameaça, coação ou constrangimento. O ato deverá ser realizado em local apropriado e acolhedor, com infraestrutura e espaço físico que garantam a privacidade da vítima.

Especificamente, quanto ao depoimento especial, deve-se atentar que:

a) será regido por protocolos e, sempre que possível, realizado uma única vez, tendo comoobjeto questões relativas ao fato probando, garantida a ampla defesa do investigado;

b) seguirá o rito cautelar de antecipação de prova: (1) quando a criança ou o adolescente tiver menos de 7 (sete) anos; (2) em caso de violência sexual. Pensamos que se faznecessário que também estejam presentes os requisitos gerais próprios da antecipação da prova, mencionada noitem 1.2.5.9.2;

c) não será admitida a tomada de novo depoimento especial, salvo quando justificada asua imprescindibilidade pela autoridade competente e quando houver a concordância da criança (ouadolescente), ou de seurepresentante legal.

Na coleta do depoimento especial,

a) Os profissionais especializados esclarecerão a criança ou o adolescente sobre a tomada do depoimento especial, informando-lhe os seus direitos e os procedimentos a seremadotados e planejando sua participação, sendo vedada a leitura da denúncia ou de outras peças processuais;

b) É assegurada à criança ou ao adolescente a livre narrativa sobre a situação de violência, podendo o profissional especializado intervir quando necessário, utilizando técnicasque permitam a elucidação dos fatos;

c) No curso do processo judicial, o depoimento especial será transmitido em tempo real para a sala de audiência, preservado o sigilo;

d) Findo o procedimento do item anterior, o juiz, após consultar o Ministério Público, o defensor e os assistentes técnicos, avaliará a pertinência de perguntas complementares, organizadas em bloco;

e) O profissional especializado poderá adaptar as perguntas à linguagem de melhor compreensão da criança ou do adolescente;

21 VILELA, Laurez Ferreira (Coord.). Enfrentando a violência na rede de saúde pública do Distrito Federal. Brasília: Secretaria deEstado de Saúde do Distrito Federal, 2005, p. 52.

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f) O depoimento especial será gravado em áudio e vídeo.

No entanto, à criança ou ao adolescente é garantido o direito de prestar depoimento diretamente aojuiz, se assim oentender.

O juiz tomará todas as medidas apropriadas para a preservação da intimidade e da privacidade da criança ou doadolescente, na condição de vítima ou de testemunha.

O profissional especializado responsável pela realização do depoimento especial comunicará ao juiz se verificar que a presença do autor da violência, na sala de audiência, pode prejudicar a coleta das informações ou colocar o depoente em situação de risco, caso em que, fazendoconstar emtermo, será determinado o afastamento do imputado.

Nas hipóteses em que houver risco à vida ouà integridade física da vítima ouda testemunha, o juiz tomará as medidas de proteção cabíveis, sendo, inclusive, o depoimento transmitido em tempo real para a sala de audiência, gravado em áudio e vídeo, preservando-se o sigilo.

As condições de preservação e de segurança da mídia relativa ao depoimento da criança ou do adolescente serão objeto de regulamentação, de forma a garantir o direito à intimidade e à privacidade da vítima e da testemunha, tramitando o depoimento especial em segredo de justiça.

Obviamente, se a oitiva se der perante o órgão do Ministério Público, em procedimento investigatório por esse diretamente conduzido, devem ser observadas as normativas previstas para o depoimento especial.

1.2.5.8.9.2. Depoimentotestemunhal antecipado

1º Hipótese do art. 255 do CPP

Quando a testemunha precisar se ausentar, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que, ao tempo da instrução criminal, já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento, consoante faculdade conferida pelo art. 225 do CPP. É o chamado depoimento ad perpetuam rei memoriam

Na fase pré-processual, havendo risco de ser impossível a repetição do depoimento da testemunha em juízo, essa providência deverá ser adotada mediante instauração de incidente para a antecipação desse depoimento emcontraditório judicial, tendo, pois, natureza cautelar.

Nesse caso, deverá o juiz proceder à inquirição da testemunha, com a intimação dos interessados para a audiência. Se houver acusado identificado, será intimado para comparecer ao ato processual acompanhado de defensor para, querendo, exercer o direito ao confronto, assegurando-se, desse modo, o exercício do contraditório e da ampla defesa. Inexistindo investigado conhecido, é de bom alvitre a nomeação de defensor dativo para participar do ato processual.

Todavia, caso a testemunha esteja disponível na instrução processual, deverá ser novamente ouvida.

Na hipótese de a necessidade de antecipação do depoimento ocorrer com a ação penal já em tramitação, o juiz designará audiência com o fim específico de ouvir a(s) testemunha(s) em situação de risco,intimando as partes para oato.

2º Hipótese do art. 366 do CPP

O art. 366 do CPP dispõe que se o acusado, citado por edital, não comparecer em juízo, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes. Essa medida se justifica pela real possibilidade de desaparecimento da prova testemunhal, caso se tenha que esperar, para a sua produção, audiência de instrução a ser realizada em data imprevisível, sendo feito o registro dos depoimentos nos próprios autos da ação penal.

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1.2.5.8.9.3. Depoimento no local em que estiver atestemunha

As pessoas impossibilitadas, por enfermidade ou por velhice, de comparecerem na sededo juízo para depor, poderão ser inquiridas onde estiverem, assegurada a presença das partes.

1.2.5.8.9.4. Depoimentotestemunhal por escrito

A oralidade é uma das características da prova testemunhal.

No entanto, o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal poderão optar pela prestação de depoimento por escrito, caso em que as perguntas, formuladas pelas partes e deferidas pelo juiz, ser-lhes-ão transmitidas por ofício (art. 221, § 1º, CPP).

1.2.5.8.9.5. Testemunhas com prerrogativa de ajuste prévio de local, dia e hora para depoimento

Nos termos do art. 221, caput do CPP, o Presidente e o Vice-Presidente da República, os Senadores e deputados federais, os ministros de Estado, os governadores deEstados eTerritórios, os secretários de Estado, os prefeitos do Distrito Federal e dos Municípios, os deputados das Assembleias Legislativas Estaduais, os membros do Poder Judiciário, os ministros e juízes dos Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal, bem como os do Tribunal Marítimo serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz. De igual modo, são tratados os membros do Ministério Público, em virtude do previsto no art. 40, incisoI da Lei nº 8.625/93.

1.2.5.9. Considerações especiais sobre a prova testemunhal

• As testemunhas comunicarão ao juiz, dentro de 01(um) ano, qualquer mudança de residência, sujeitando-se, pela simples omissão, às penas do não-comparecimento;

• Quando indicados como testemunhas, os militares deverão ser requisitados àautoridade superior;

• Ao funcionário público, indicado como testemunha, descabe tal requisição, porém a expedição do mandado de intimação deverá ser imediatamente comunicada ao chefeda repartição em que servir, com indicação do dia e da hora marcados. Se, regularmente intimado, deixar de comparecer ao ato, sem motivo justificado, o juiz poderá requisitarà autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzido por oficial dejustiça, o qual poderá solicitar o auxílio da força pública (art. 218 do CPP).

• O agente diplomático não é obrigado a prestar depoimento como testemunha;

• Um empregado consular ou um membro do pessoal de serviço não poderá negar-sea depor como testemunha, exceto sobre fatos relacionados com o exercício de suas funções;

• A autoridade que solicitar o testemunho deverá evitar que o funcionário consular seja perturbado no exercício de suas funções, podendo tomar o depoimento deste nodomicílio ou na repartição consular, ou aceitar sua declaração por escrito, sempre que for possível;

• Os Deputados Federaise Senadoresnãosãoobrigadosatestemunharsobreinformações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações (art. 53, § 6º, CF). De igual modo, porsimetria, aplica-se a regra aos Deputados Estaduais (art. 27, § 1º, CF).

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1.2.6.RECONHECIMENTO

DE PESSOAS OU COISAS

1.2.6.1. Previsão legal

Arts. 226 a 228, todos do CPP.

1.2.6.2. Procedimento

O art. 226 do CPP estabelece o procedimento formal a ser adotado para a realização do reconhecimento de pessoas:

1º) A pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a que devaser reconhecida;

2º) A pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado deoutras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazeroreconhecimento a apontá-la222

3º) Se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da que deve serreconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;

4º) Do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.

Determina o art. 226, parágrafo único do CPP, que o disposto no 3º item não terá aplicação na fase da instruçãocriminal ouem plenário de julgamento.

Importante registrar que, consoante prescreve o art. 228 do CPP, se várias forem as pessoas chamadas a efetuar o reconhecimento de pessoa ou de objeto, cada uma fará a prova individualmente, em separado, evitando-se qualquer comunicação entre elas, e, consequentemente, influência de uma sobre a outra, o que inquina de vício o meio de prova.

Por outro lado, em que pese o disposto no art. 185, § 8º do CPP, para parcela da doutrina pátria, mostra-se inaplicável o reconhecimento de pessoas e coisas por meio de videoconferência, uma vez que, ausentes as formalidades legais previstas para o procedimento (art. 226, CPP),importaria em mácula à ampla defesa.

Vale acrescentar que, no reconhecimento de objeto, proceder-se-á como no de pessoas, no que for aplicável, registrando-se a possibilidade da realização do reconhecimento de pessoas e/ou coisas no inquérito policial, à luz do art. 6º, inciso VI do CPP.

Emreforço às regrasdo art. 226 doCPP, o Conselho Nacional deJustiça editou a Resolução nº 484/2022, que estabelece diretrizes para a realização do reconhecimento de pessoas (presencial ou fotográfico) em procedimentos e processos criminais e sua avaliação no âmbito do Poder Judiciário, pormenorizando os parâmetros e etapas que deverão ser observados para a validade da prova23

Nesse particular, a Resolução CNJ nº 484/2022 preceitua que, para fins de aferição dalegalidade e garantia do direito de defesa, o procedimento será integralmente gravado, desde a entrevista prévia até a declaração do grau de convencimento da vítima ou testemunha, com adisponibilização do respectivo vídeo às partes, caso solicitado.

Por fim, é preciso ressaltar que o reconhecimento por fotografia ou fonográfico (clichê fônico) é considerado como prova inominada, admitida pelos Tribunais Superiores, em razão

22 [...] 4.2 O procedimento de reconhecimento de pessoas, para sua validade, deve assegurar a semelhança física entre o suspeito e os demais indivíduos apresentados, conforme estabelece o art. 226, II, do CPP, evitando-se sugestões que possam influenciar a decisão da testemunha e comprometer o reconhecimento[...] (STJ, 5ª T., AREsp n. 2.408.401/PA, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em 2/4/2024, pub. no DJe de 10/4/2024).

23 Disponível emhttps://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/4883, acessoem19 mai 2024

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dos princípios da busca da verdade real e da liberdade probatória, desde que corroborada por outras provas24 .

1.2.7.ACAREAÇÃO

A acareação consiste no ato probatório de confronto oral entre sujeitos que prestaram declarações contraditórias entre si25

1.2.7.1 Previsão legal

Arts. 6º, inciso VI, 229 e 230, todos do CPP.

1.2.7.2. Cabimento

Nos termos do art. 229 do CPP, a acareação será admitida sempre que divergirem, em suas declarações, sobre fatos ou circunstâncias relevantes:

a) os acusados, entre si; b) o acusado e testemunha; c) as testemunhas entre si; d) oacusado ou testemunha e a pessoa ofendida; e e) as pessoas ofendidas, entre si.

Na acareação, o acusado poderá exercer o direito ao silêncio.

1.2.7.3. Procedimento

O art. 229, parágrafo único do CPP, disciplina o procedimento a ser adotada na acareação, apontandoqueosacareadosserãoreperguntados, paraqueexpliquemospontosdedivergências, reduzindo-se a termo o ato de acareação.

Nos termos do art. 230 do CPP, ausente qualquer das testemunhas por residir em outro foro, cujas declarações divirjam das de outra que esteja presente, a esta se dará a conhecer os pontos da divergência, consignando-se, no auto, o que explicar ou observar. Se subsistir a discordância, expedir-se-á precatória à autoridade do lugar onde resida a testemunha ausente, transcrevendo-se as declarações desta e as da testemunha presente, nos pontos em que divergirem, bem como o texto do referido auto, a fim de que se complete a diligência, ouvindose a testemunha ausente, pela mesma forma estabelecida para a testemunha presente.

A realização de acareação a distância será possível, desde que a diligência não importe demora prejudicial ao processo e o juiz a entenda conveniente.

Na tentativa de facilitar o procedimento da acareação a distância, o legislador, no art. 185, § 8º do CPP, estabeleceu a possibilidade de sua realização por videoconferência, quando a pessoa estiver presa.

1.2.8.PROVA DOCUMENTAL

Considera-se como prova documental quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares (art. 223, caput, CPP).

Documento, em uma interpretação extensiva, é todo objeto ou coisa de que se possa extrair a existência de um fato, em virtude de linguagem simbólica26 .

24 [...] 1. Ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça alinharam a compreensão de que "o reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa” (HC 652.284/SC, Rel. MinistroREYNALDO Soares DA Fonseca, QUINTA TURMA, julgado em 27/4/2021, DJe 3/5/2021)[...] (STJ, 5ª T., AgRg-HC 899.715, Rel. Min. Ribeiro Dantas, pub. no DJE 15/05/2024).

25 REBOUÇAS, Sérgio. op. cit., p. 629.

26 FILHO, Vicente Greco. Manual de Processo Penal 8. ed., São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 227.

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Assim, por exemplo, édocumento não só o escrito, como a fotografia, a gravação magnética de som ou de dados de computador.

1.2.8.1. Previsão legal

Arts.231a 238doCPP.

1.2.8.2. Documentos em língua estrangeira

Os documentos em língua estrangeira, sem prejuízo de juntada imediata, serão, se necessário, traduzidos por tradutor público, ou, na falta, por pessoa idônea nomeada pela autoridade (art. 236, CPP).

1.2.8.3. Momento paraprodução

As partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo, salvo a exceção prevista no art. 479, caput e parágrafo único do CPP, a qual expressa que, durante o julgamentodo Tribunal do Júri, não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 03 (três) dias úteis, dando-seciência à outra parte.

Nesse caso, na proibição, compreende-se a leitura de jornais ou qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação eao julgamento dos jurados.

É importante observar a necessidade de se assegurar o contraditório, dando-se à parte adversa àquela que juntou o documento a oportunidade de tomar conhecimento do seu teor e, se quiser, sobre ele se manifestar27

1.2.8.4. Outras considerações sobre a prova documental

• Se o juiz tiver notícia da existência de documento relativo a ponto relevante da acusação ou da defesa, providenciará, independentemente de requerimento de qualquer das partes, sua juntada aos autos, se possível.

• À fotografia do documento, devidamente autenticada, dar-se-á o mesmo valor do original.

• A pública-forma, que “é a cópia de documento avulso, extraído por oficial público”, só terá valor quando conferida com o original, em presença da autoridade.

• A letra e a firma dos documentos particulares serão submetidas a exame pericial, quando contestada a sua autenticidade.

• Os documentos originais, juntos a processo findo, quando não exista motivo relevante que justifique a sua conservação nos autos, poderão, mediante requerimento e ouvido oMinistério Público, ser entregues à parteque os produziu, ficando otraslado nos autos.

1.2.9.INDÍCIO

No art. 239 do Código Penal, o legislador define indício como sendo a circunstância conhecida e provada, a qual, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou de outras circunstâncias.

Indício é a prova circunstancial ou indireta. É o resultado obtido por intermédio de um meio de prova.

27 [...] 5. As partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo, exigindo-se, contudo, que seja franqueado à parte contraposta manifestar-se sobre eles, o que ocorreu na espécie. Inteligência do art. 231 do Código de Processo Penal. [...]. (STF, 1ª T., RHC 186694 AgR, Relª. Minª. Rosa Weber, j. em 08/02/2021, pub. no DJe de 12/02/2021)

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As medidas cautelares de ordem probatória são meios de obtenção de prova. São elas: a busca e apreensão, a interceptação telefônica, a quebra de sigilos, as captações e interceptações ambientais, a infiltração de agentes e a ação controlada.

Se requeridas durante a fase pré-processual, a apreciação do pedido caberá à autoridade judiciária competente para a ação principal.

Implementado ojuiz das garantias, passará este aser ocompetente para deliberar sobre a medida(art. 3º-B, incisos XI e XVIII, CPP).

No curso da ação penal, a competência será do juiz processante.

1.3.1.BUSCA E APREENSÃO

Inobstante ter sido inserida pelo legislador no Código de Processo Penal, no título “Da prova”, não se trata de um meio direto de prova, mas de obtenção de prova referente ao fato investigado e a todas as suas circunstâncias.

A busca e apreensão compreende duas providências: a busca, que é a procura pelo bem ou pessoa, e a apreensão, que é o seu resultado positivo.

1.3.1.1. Previsão legal

Arts. 240 a 250 do CPP.

1.3.1.2. Finalidade

Obtenção de fontes materiais de prova.

1.3.1.3. Espécies

Há duas espécies de busca: a domiciliar e a pessoal.

1.3.1.3.1. Busca domiciliar

A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XI, expressa que a “casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

O art. 150, § 4º do Código Penal, considera como casa:

a) qualquer compartimento habitado;

b) aposento ocupado de habitação coletiva; e

c) compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

Esse artigo, no parágrafo quinto, exclui da definição a:

• hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvoquanto aoaposento ocupado desta última;

• taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

Por seu turno, a jurisprudência pátria alargou a abrangência do termo “casa”: quarto ocupado de hotel, motel e similares; quarto ocupado em hospital; ambientes integrados à residência (pátio, jardim, quintal, garagem), locais destinados à habitação, ainda que provisoriamente (trailers, motor home, barcos-residência, parte traseira do interior da boleia do caminhão que serve como dormitório, dentre outros do gênero).

Destarte,oingressonacasaparacumprimentodebuscaeapreensão,semoconsentimento do morador, exige ordem judicial e que sua execução ocorra durante o dia.

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EM ESPÉCIE
1.3. PROVA
- MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA

Em contrapartida, o consentimento do morador, livre de qualquer coação, legitima o ingressoem sua casa a qualquer horário, inclusive sem ordem judicial, consoante se extrai do citadoart. 5º, inciso XI da Carta Magna.

No entanto, para que o mencionado consentimento tenha validade, o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio de suas Turmas criminais28 , exige como prova da sua legalidade e voluntariedade declaração assinada pela pessoa que autorizou a entrada no domicílio, com indicação, sempre que possível, de testemunhas do ato, e, ainda, o registro da operação em áudio-vídeo, preservada tal prova enquanto durar o processo.

(1) Objeto

O objeto da busca domiciliar está delineado no art. 240, § 1º do CPP, que a autoriza diante defundadas razões para:

a) prender criminosos;

b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;

d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime oudestinadosa fim delituoso;

e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu29;

f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que oconhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;

g) apreender pessoas vítimas de crimes;

h) colher qualquer elemento de convicção.

Relativamente ao disposto no art. 240, § 1º, letra “f”, do CPP, existem controvérsias sobre a suaconstitucionalidade, à luzdoart.5º,inciso XII da CF, oqual expressa que“éinviolável osigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

No tocante às cartas abertas, cujo conteúdo é de conhecimento público, nenhuma restrição haverá quantoàsuaapreensãoeaoexame da utilidade paraaformaçãoda prova, uma vez que não são resguardadas pelo sigilo epistolar. Todavia, não se deve confundir essas cartas com as lacradas que foramabertas pelo destinatário, uma vez que as últimas permanecem sob a proteção do sigilo constitucional.

Prevalece, todavia, o entendimento da possibilidade de afastamento da inviolabilidade epistolar, quando utilizada como instrumento para práticas criminosas.

É que nenhum direito fundamental tem caráter absoluto, de modo que, quando colidir com outros direitos fundamentais, deve preponderar o de maior relevância, com base no princípio da proporcionalidade.

Assim, a apreensão de correspondência será possível quando:

a) houver consentimento do acusado;

b) se tratar do próprio objeto material do crime; c) for obtida em circunstâncias que caracterizem causa excludente da ilicitude; d) for mediante ordem judicial.

Nos demais casos, constituirá prova obtida por meio ilícito e, portanto, inadmissível a teor do art. 5º, inciso LVI da CF e art. 157, caput do CPP.

28 Sexta Turma (HC 598.051/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. em 02.02.2021, pub. no DJe de 15.03.2021) e Quinta Turma (HCnº 616.584/RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em 30.03.2021, pub. no DJe de 06.04.2021).

29 "O artigo 240 do Código de Processo Penal, ao tratar da busca e apreensão, apresenta um rol exemplificativo dos casos em que a medida pode ser determinada, no qual se encontra a hipótese de arrecadação de objetos necessários à prova da infração ou à defesado réu, não havendo qualquer ressalva de que não possam dizer respeito à intimidade ou à vida privada do indivíduo" (STJ, 5ª T., HC 142.205/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, pub. no DJe de 13/12/2010).

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Abusca e apreensão eo Estatuto da Advocacia

O Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94, com as alterações legislativas posteriores) estabelece que constitui prerrogativa do advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho,bemcomodeseusinstrumentos detrabalho,desuacorrespondência escrita,eletrônica, telefônica etelemática, desde querelativasaoexercício da advocacia (art. 7º, inciso II).

Inobstante a prerrogativa, estando presentes indícios de autoria e materialidade da práticade crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebrade dita inviolabilidade, em decisão motivada, determinando a expedição de mandado de buscae apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB,sendo vedada, em qualquer hipótese, a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos apreendidos que pertencerem a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre seus clientes (art. 7º, § 6º, Lei nº8.906/94), salvo quando estes também estejam formalmente investigados como seus partícipes ou coautores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade (art. 7º, § 7º, Lei nº 8.906/94).

O art. 243, § 2º do CPP, prescreve que “Não será permitida a apreensão de documento em poder do defensor do acusado, salvo quando constituir elemento do corpo de delito”.

A violação da prerrogativa supramencionada constitui crime capitulado no art. 7º-B da Lei nº 8.906/94, com as alterações advindas da Lei nº 13.869/2019, com pena de detenção de 03(três) meses a 01(um) ano e multa.

(2) Momento

A busca domiciliar pode ser realizada no curso do procedimento de investigação ou durante o processo penal.

Quando executada na fase pré-processual, a busca domiciliar qualifica-se como prova cautelar, sujeitaao contraditório diferido.

(3) Iniciativa

A medida está sujeita à clausula de reserva de jurisdição, e, portanto, necessita de autorização judicial.

O seu deferimento na fase pré-processual, conforme interpretação constitucional, depende de representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público, quando este não for o requerente.

Na fase judicial, poderá ser decretada pelo juiz de ofício ou atendendo a requerimento de qualquer das partes (art 242, CPP).

(4) Execução

 Mandado judicial

Deverá:

a) indicar, o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário ou morador: trata-se de requisito de grande relevância para evitar abusos ou arbitrariedades. Ainda que não seja possível explicitar rua e número da casa, deve ser determinável, pelo menos, o local da busca, bem como quem lá reside ou está sendo investigado30. Ou seja, no mínimo, o endereço do imóvel ou quem seja seu morador. Haverá ilegalidade na expedição de mandado coletivo de busca e apreensão, sem individualizar o domicílio que deverá ser objeto da diligência, tampouco poderão os seus executores estendê-la a outros domicílios não descritos na

30 AVENA, Noberto Claúdio Pâncaro. Processo penal esquematizado. 2. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010, p. 627.

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ordem judicial. Nesse caso, a diligência ficaria ao inadmissível critério da autoridade responsável pelo seu cumprimento, a quem caberia escolher o local a ser violado; b) mencionar o motivo e os fins da diligência: é preciso que o executor se limite ao objeto da diligência, constante do mandado. Todavia, não há necessidade de que a decisão judicial (e o mandado) especifique detalhadamente o que se busca apreender37 Havendo necessidade de se imiscuir em outra esfera de intimidade, constitucionalmente assegurada, não contida na ordem expedida, deverá obter autorização judicial específica, não podendo ser considerada como decorrência natural do ato. Por exemplo, os dados de um celular apreendido no curso de diligência de busca domiciliar somente poderão ser acessados se houver autorização judicial específica concedida nos termos da Lei nº 9.296/96. É que as informações se inserem no contexto de intimidade das comunicações telemáticas;

c) ser subscrito pelo escrivão e assinado pela autoridade que o fizer expedir;

d) conter a ordem de prisão, se houver.

• Horário para cumprimento da ordem judicial

A execução de mandado de busca e apreensão domiciliar à luz do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal e do art. 245 do Código de Processo Penal deverá ocorrer durante o dia, salvo se o morador consentir que se realiza à noite. Infelizmente, na jurisprudência pátria não existe um consenso a respeito do conceito de dia, porquanto há quem o defina a partir do critério físico (entre a aurora e o crepúsculo), do critério cronológico (entre 6 e 18h), do critério misto (entre 6 e 18h, desde que haja luminosidade). Com o advento do art. 22, § 1º, inciso III, da Lei nº 13.869/2019, imaginou-se que haveria uma pacificação em torno da celeuma, fixando-se como dia, para fins de licitude do início decumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar, o período compreendido entre as 5he 21hs. Nãofoi o que aconteceu, permanecendo a insegurança jurídica em torno da questão.

Por outro lado, uma vez iniciada durante o dia, havendo risco de a suspensão das buscas prejudicar a diligência ou causar dano grave, poderá prosseguir durante a noite.

 Responsabilidade pelo cumprimento

Na fase pré-processual, o mandado de busca e apreensão deve ser executado pela polícia federal ou civil, conforme atribuição.

No curso da instrução criminal, pelo oficial de justiça que poderá se utilizar do auxílio da força pública.

Por sua vez, não é de hoje que o Supremo Tribunal Federal tem admitido o cumprimento de mandado de busca e apreensão pela polícia militar sob o argumento de que não há violação às atribuições exclusivas de polícia investigativa e judiciária das polícias federal e civil, previstas no art. 144, §§ 1º e 4º da Constituição Federal, porquanto nãorealizados atos de investigação, tampouco de instrução, mas, sim, a mera execução de uma medida cautelar.

Nesse sentido, v.g., decidiu:” [...] O cumprimento do mandado de busca e apreensão pela polícia militar não contraria o art. 144, §§ 4º e 5º, da Constituição Federal” (2a T., HC 137.575, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, pub. no DJe de 22/06/2017).

E, ainda: “[...] 2. Ação penal. Prova. Mandado de busca e apreensão. Cumprimento pela polícia militar. Licitude. Providência de caráter cautelar emergencial. Diligência abrangida na competência da atividade de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública. Recurso extraordinário improvido. Inteligência do art. 144, §§ 4º e 5º da CF. Não constitui prova ilícita a

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queresultedocumprimentodemandadodebuscaeapreensãoemergencialpelapolíciamilitar” (2a T., RE 404.593/ES, Rel. Min. Cezar Peluso, j. em 18/08/2009, pub. no DJe de 23/10/2009).

Na mesma linha, segue o Superior Tribunal de Justiça: “[...] 1. Nos termos do art. 144 da Constituição Federal, à polícia federal e às polícias civis compete, com exclusividade, para as investigações já era conhecida, inexiste qualquer ilegalidade na arrecadação de outros objetos relevantes para o deslinde da controvérsia, encontrados durante o cumprimento da medida. Precedente do STF. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ; 5ª Turma, AgRg-HC 524.581/ RJ, Rel. Min. Jorge Mussi; j. em 04/02/2020, pub. no DJe de 13/02/2020).

E: “[...] 1. A Constituição da República diferencia as funções de polícia judiciária e de polícia investigativa, sendo que apenas a primeira foi conferida com exclusividade à polícia federal e à polícia civil, evidenciando a legalidade de investigações realizadas pela polícia militar e da busca e apreensão por aquela corporação realizada, mediante ordem judicial. [...]” (6a T., RHC 97886 / SP, Rel. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. em 07/08/2018, pub. no DJe de 14/08/2018).

Por fim, a própria autoridade judiciária responsável pela ordem poderá realizar o seu cumprimento (art. 241, CPP).

 Procedimento de execução

Como a busca domiciliar exige ordem judicial por imposição constitucional como visto, a parte inicial do art. 241 do CPP, que autoriza a diligência pela autoridade policial, mediante dispensa de mandado, encontra-se derrogada.

Nos termos do art. 245 do CPP, o executor, de posse do mandado de busca e apreensão, comparecerá ao local a ser diligenciado e, durante o dia, salvo se o morador consentir que se realize à noite, antes de penetrar na casa, mostrará e lerá o mandado ao morador, ou a quem o represente,intimando-o,emseguida,aabriraportaemostraracoisaprocurada,sedeterminada.

O mandado somente será dispensável quando a autoridade judiciária realizar pessoalmente a busca, hipótese em que declarará sua qualidade e o objeto da diligência.

Não atendida a ordem, será arrombada a porta e forçada a entrada.

Apresentando o morador resistência ao cumprimento da determinação, será permitido o emprego de força contra coisas existentes no interior da casa, para o descobrimento do que se procura.

Idêntico procedimento será adotada quando ausentes os moradores, devendo, nessa situação, ser intimado qualquer vizinho a assistir à diligência, se houver e estiver presente.

Encontrada a coisa quese procura, será imediatamente apreendida e posta sob guarda da autoridade ou de seus agentes.

Não sendo encontrada a coisa procurada, os motivos da diligência serão comunicados a quemtiver sofrido a busca, se orequerer.

Em casa habitada, a busca será feita de modo que não moleste os moradores mais do que oindispensável para oêxito da diligência.

 Formalização

Concluída a diligência, lavra-se auto de busca e apreensão, assinando-o o(s) executor(es) com 02(duas) testemunhas presenciais, e, caso tenha sido necessário, do vizinho que assistiu ao arrombamento da entrada da porta da casa na ausência do morador.

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 Cumprimento em território alheio

Nos termos do art. 250 do CPP, a autoridade ou seus agentes poderão penetrar no território de jurisdição alheia, ainda que de outro Estado, quando, para o fim de apreensão, forem no seguimento de pessoa oucoisa, devendoapresentar-seà competente autoridade local,antes da diligência ou após, conforme a urgência desta.

Compreende-se que a autoridade ou seus agentes vão em seguimento da pessoa ou coisa, quando:

a) tendo conhecimento direto de sua remoção ou transporte, seguirem-na sem interrupção, embora depois a percam de vista;

b) ainda que não a tenham avistado, mas sabendo, por informações fidedignas ou circunstâncias indiciárias, que está sendo removida ou transportada em determinada direção, foremao seuencalço.

Na hipótese em que as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade das pessoas que, nas referidas diligências, entrarem em seu território, ou da legalidade dos mandados que apresentarem, poderão exigir as provas dessa legitimidade, mas evitando frustrar a diligência.

 Encontro fortuito de provas ou serendipidade

É o que se chama de serendipidade, que se configura quando a prova de determinada infração penal é encontrada casualmente durante diligência autorizada para a investigação de outrocrime.

Nesse contexto, a prova será válida desde que, no cumprimento da ordem judicial, inexista desvio de finalidade ou abuso de autoridade pelo seu executor.

 Criminalização

Nos termos da Lei nº 13.869/2019, em seu art. 22, caput e seu § 1º, constitui crime invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei:

Incorre ainda, em crime, quem:

a) coagir alguém, mediante violência ou grave ameaça, a franquear-lhe o acesso a imóvel ou suas dependências;

b)cumprir mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h (vinte e uma horas) ouantes das 5h(cinco horas).

A pena prevista, em qualquer dos casos, é de detenção, de 01 (um) a 04 (quatro) anos, e multa.

Não haverá crime se o ingresso for para prestar socorro, ou quando houver fundados indícios que indiquem a necessidade do ingresso em razão de situação de flagrante delito ou de desastre (§ 2º).

1.3.1.3.2. Busca pessoal

Nos termos do art. 240, § 2o do CPP, proceder-se-á à busca pessoal, quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou os seguintes objetos:

a) coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

b) instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;

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c) armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;

d) objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

e) colher qualquer elemento de convicção.

De igual modo, poderá acontecer durante a execução de ordem de busca e apreensão domiciliar (art. 244, parte final, CPP).

A busca veicular equipara-se à busca pessoal.

Considera-se, ainda, que abrange o corpo da pessoa suas vestes e outros objetos que estejam por ela sendo transportados (bolsa, mochilas, malas, etc.).

Nos termos do art. 244 do CPP, a busca pessoal independerá de mandado:

a) no caso de prisão;

b) quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida oude objetos ou papéis que constituam corpo de delito;

c) quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.

Por outro lado, o cumprimento da ordem judicial poderá ocorrer em qualquer hora do dia, exceto se o sujeito procurado estiver dentro de domicílio, quando deverão ser observadas as regras da busca domiciliar para fins de preservação da inviolabilidade de domicílio.

A busca em mulher será feita por outra mulher, se não importar retardamento ou prejuízo da diligência (art. 249, CPP).

Ademais, somente as autoridades judiciais, policiais ou seus agentes estão legitimados a realizar a busca pessoal.

O procedimento de busca pessoal acima tratado não se confunde com a revista corporal realizada por razões preventivas de segurança de natureza contratual e que deverá sempre ocorrer com moderação e proporcionalidade. A recusa do indivíduo em se submeter a tal modalidade de revista resultará na proibição de ingressar no recinto ou acessar ao serviço oferecido. Nada mais. É o que acontece, por exemplo, na entrada de casas de show, festas, aeroportos, dentre outros.

1.3.2.INTERCEPTAÇÃO DAS COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS E TELEMÁTICAS

A Constituição Federal, no art. 5º, inciso II, determina: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

Nesse aspecto, a norma regulamentadora do dispositivo constitucional é a Lei nº 9.296/96 que, em seu art. 1º, caput, disciplina o procedimento de interceptação das comunicações telefônicas de qualquer natureza.

A expressão interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza abrange aquelas feitas por terceiro, com ou sem consentimento de um dos interlocutores.

Como se trata de medida cautelar probatória, exige-se, para sua concessão, a demonstração de elementos contundentes da existência de crime e de sua autoria (fumus commissi delicti), os quais, se não forem coletados imediatamente, perder-se-ão (periculum in mora).

O Conselho Nacional de Justiça, por intermédio da Resolução CNJ nº 59, de 09 de setembro de 2008, com as alterações posteriores, disciplina e uniformiza as rotinas visando ao aperfeiçoamento do procedimento de interceptação de comunicações telefônicas e de sistemas de informática e telemática nos órgãos jurisdicionais do Poder Judiciário, aos quais se refere a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996.

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1.3.2.1. Interceptação telefônica, escuta telefônica e gravação telefônica

Não se confundem interceptação telefônica, escuta telefônica e gravação telefônica:

a) interceptação telefônica é a captação e o registro, realizado por terceiro, do conteúdo de comunicação telefônica entre duas ou mais pessoas, sem o conhecimento dos interlocutores;

b) escuta telefônica é a captação e o registro, executado por um terceiro, com o consentimento de um dos participantes do diálogo telefônico; e

c) gravação telefônica clandestina, a captação de conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem que o outro saiba, ainda que conte com o auxílio de um terceiro31 .

As interceptações telefônicas e as escutas telefônicas estão sujeitas à cláusula de reserva de jurisdição, necessitando de autorização judicial prévia para sua realização, o que não se exige da gravação telefônica clandestina desde que realizada em razão do exercício de direito idôneo.

1.3.2.2. Interceptações eletrônica e telemática

A Lei nº 9.296/96, consoante dispõe o seu art. 1º, parágrafo único, tem também aplicação para as interceptações do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática. Interceptação eletrônica é a captação e o registro de comunicações havidas por meios informáticos, com transmissão pela rede mundial de computadores, como o correio eletrônico (e-mail); Interceptação telemática, a captação e o registro de comunicação havida mediante a transmissão de escritos e de mídias audiovisuais (áudio, vídeo e fotografia) pela utilização de instrumentos telefônicos, associados a sinais da rede mundial de computadores32 .

Assim, sujeitam-se ao mesmo regime de autorização judicial previsto na Lei nº 9.296/96 a interceptação de comunicações mantidas por intermédio de mensagens de e-mail e demais mensagens privadas transmitidas pela rede mundial de computadores (internet), a exemplo das comunicações individuais mantidas por sistema como o inbox do facebook e o Messenger, bem com mensagens transmitidas por sistemas e tecnologias de telefone celular, do tipo SMS ou, ainda, por whatsapp e telegram

Por sua vez, a obtenção será lícita, ainda que não haja autorização judicial, caso exista permissão prévia doacusado.

De outra banda, a prova obtida decorrente de conduta em que a autoridade policial, sem qualquer autorização judicial ou pessoal, passando-se pelo acusado, atende ligaçãotelefônica a este direcionada, foi, por decisão proferida pela 6a Turma do STJ, considerada ilícita por violar a privacidade daquele e constituir quebra do sigilo das comunicações telefônicas33 .

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça evoluiu no sentido de admitir o procedimento consistente na prática do espelhamento via whatsapp web das conversas realizadas pelo investigado contra terceiros, desde que o uso da ação controlada na investigação criminal esteja amparada por autorização judicial.

Na hipótese de e-mail corporativo, dispensa-se a necessidade de prévia autorização judicial para a quebra do sigilo das informações nele contidas, quando, nas disposições normativas para seu uso, constar a advertência ao usuário de que se destina somente a assuntos estritamente profissionais, e, portanto, às comunicações sujeitas a monitoramento e acesso pelo empregador. Relativamente às prerrogativas de advogados, a Lei nº 8.906/94, em seu art. 7º, inciso II, estabelece “a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus

31 [...] 3. No caso concreto, a genitora da vítima solicitou auxílio técnico a terceiro para a gravação de conversas realizadas através de terminal telefônico de sua residência, na qualidade de representante civil do menor impúbere e investida no poder-dever de proteção e vigilância do filho, não havendo ilicitude na gravação. Dada a absoluta incapacidade da vítima para os atos da vida civil. E ante a notícia de que estava sendo vítima de crime de natureza hedionda. A iniciativa da genitora de registrar conversa feita pelo filho com o autor da conjecturada prática criminosa se assemelha à gravação de conversa telefônica feita com a autorização de um dos interlocutores, sem ciência do outro, quando há cometimento de delito por este último, hipótese já reconhecida como válida pelo Supremo Tribunal Federal. [...]. (STJ; 6ª Turma; REsp 1.026.605/ES; Rel. Min. Rogério Schietti Cruz; DJe 13/06/2014).

32 REBOUÇAS, Sérgio. op. cit., p. 698.

33 HC511.484/RS.

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instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativasao exercício da advocacia; [...]”.

A violação de dita prerrogativa constitui crime previsto no art. 7º-B da Lei nº 8.906/94, dispositivo incluído pela Lei nº 13.869/2019.

Nesse contexto, perfeitamente possível a medida cautelar ora examinada quando houver indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, sendo, todavia, vedada a utilização das informações relativas aos seus clientes, exceto se esses estejam sendo formalmente investigados como partícipes ou coautores no delito que deu causa à quebra da inviolabilidade, na forma disposta no art. 7º, §§ 6º e 7º da Lei nº 8.906/94.

1.3.2.3. A interceptação de comunicações telefônicas e de sistemas de informáticae telemática realizada diretamente pelo membro do Ministério Público medianteautorização judicial

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), via Resolução CNMP nº 36/09, disciplina o pedido e a utilização das interceptações telefônicas no âmbito do Ministério Público, prevendo a possibilidade de o membro do Ministério Público, em procedimento investigatório criminal ou na instrução processual penal, sempre mediante autorização judicial, realizar diretamente o procedimento de interceptação de comunicações telefônicas e do fluxode comunicações em sistemas de informática e telemática a que se refere a Lei nº 9.296/96,observando as cautelas e providências previstas no ato do CNMP.

A Resolução, a propósito, foi objeto da ADI 5.315/DF, tendo o Pleno do Supremo Tribunal Federal, com Relatoria do Min. Luis Roberto Barroso, em julgamento concluído em 04 de setembro de 2023, com trânsito em julgado em 16 de novembro de 2023, reconhecido sua constitucionalidade, com a fixação da seguinte tese: “É constitucional o estabelecimento, por Resolução do CNMP, de cautelas procedimentais para proteção de dados sigilosos e garantia da efetividade dos elementos de prova colhidos via interceptação telefônica”.

1.3.2.4. Procedimento

Ao regulamentar o inciso XII, parte final do art. 5º da Carta Magna, a Lei nº 9.296/96 estabeleceu regras que deverão ser observadas na realização das interceptações de comunicações telefônicas e do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática, pontualmente abaixo destacadas.

1.3.2.4.1. Pressupostos de admissibilidade

Infere-se da exegese dos arts. 1º e 2º da Lei nº 9.296/96, que são pressupostos cumulativos para admissibilidade da interceptação:

a) a utilização da prova coletada em investigação criminal ou em instrução processual penal;

b) a existência de indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; c) que a prova não possa ser feita por outros meios disponíveis; e d) que o fato investigado constitua infração penal punida com pena de reclusão.

Streck34, com propriedade, adverte que a expressão “meios disponíveis” contida na parte final do inciso II do art. 2º da aludida lei, referida no parágrafo anterior na letra “c”, não deve ser interpretada como os meios que, materialmente, estejam à disposição da autoridade policial, mas, sim, como os meios legais-processuais.

Entretanto, é ônus da defesa, quando alega violação ao disposto no artigo 2º, inciso II, da Lei 9.296/1996, comprovar que existiam, de fato, outros meios investigativos como alternativa à interceptação das comunicações telefônicas e telemáticas.

34 STRECK, Lênio Luiz. As interceptações Telefônicas e os Direitos Fundamentais – Constituição – Cidadania – Violência: A lei 9.296/96 e seus reflexos penais e processuais. 2ª ed. rev. ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2001, p. 54.

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É bom destacar que não se admite a denominada interceptação de prospecção, isto é, a interceptação de comunicações telefônicas realizada com a finalidade de se obter indícios de autoria ou de participação em infração penal do indivíduo a suportar a medida. Como visto, estes indícios devem existir anteriormente ao pedido da diligência, cuja finalidade será a obtenção de prova de que aquele concorreu para a prática de umcrime.

Na mesma linha de raciocínio, pedido de interceptação formulado unicamente com baseem denúncia anônima deve ser indeferido.

1.3.2.4.2. Iniciativa

O art. 3º, caput da Lei nº 9.296/96, estabelece que a interceptação ora abordada poderá ser determinada pelo juiz, de ofício, ou a requerimento da autoridade policial, na investigação criminal, ou do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal.

Com relação à possibilidade de decretação da medida de ofício pelo magistrado na fase investigatória, parece-nos que se mostra incompatível com o modelo acusatório do processo penal, além de violar a garantia da imparcialidade do juiz.

Tramita no Supremo Tribunal Federal, a ADI nº 3.450/DF, proposta pela ProcuradoriaGeral da República em 31 de março de 2005, com Relatoria do Min. Gilmar Mendes 35, que requer a inconstitucionalidade parcial do citado dispositivo, sem redução do texto, para excluir a possibilidade de o magistrado, na fase pré-processual, determinar de iniciativa própria a interceptação de comunicações telefônicas.

Quanto a eventual representação formulada pela autoridade policial pela interceptação de comunicações telefônicas, a lei específica nada expressa com relação à necessidade de oitiva prévia do Ministério Público. Todavia, o procedimento ora abordado deve ser interpretado em conformidade com a Constituição Federal que, nesse caso, torna necessária a oitiva prévia do órgão do Ministério Publico a respeito do pleito diante de seu status de dominus litis e na condição de guardião dos direitos individuais e coletivos da sociedade, como aponta Streck36 1.3.2.4.3. Pedido

Opedidodeinterceptaçãodeveráconter, comclareza, ademonstraçãodasituaçãoobjetoda investigação, inclusive com a indicação e a qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada e ainda que a sua realização se faça necessária à apuração da infração penal, com indicação dos meios a serem empregados.

Inobstante o art. 4º, § 1º da Lei nº 9.296/96, expressar a possibilidade de admissão, em caráter excepcional, de pedido formulado verbalmente, caso em que a concessão da medida será condicionada à sua redução a termo, o comum é que se requeira por escrito mediante petição subscrita pela autoridade requerente e que contenha os pressupostos referidos no parágrafo anterior.

Formulado o pedido, o juiz terá até 24 (vinte e quatro) horas para decidir sobre ele.

1.3.2.4.4. Prazo dainterceptação

A decisão concessiva, devidamente fundamentada na presença dos pressupostos de admissibilidade da medida, indicará a forma de execução da diligência que, prima facie, não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável, entretanto, de forma sucessiva, quantas vezes for necessário desde que demonstrada a inevitabilidade da manutenção da interceptação.

35 Disponívelemhttps://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2282869, acessoem12 mai 2024.

36 STRECK, Lênio Luiz. As interceptações Telefônicas e os Direitos Fundamentais – Constituição – Cidadania – Violência: A lei 9.296/96 e seus reflexos penais e processuais. 2ª ed. rev. ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2001, p. 76.

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1.3.2.4.5. Execução e formalização da interceptação

Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos da interceptação, dando ciência ao Ministério Público, o qual poderá acompanhar a sua realização, nos termos do art. 6º, caput da Lei nº 9.296/96.

Para execução desses procedimentos, a autoridade policial poderá requisitar serviços e técnicos especializados às concessionárias de serviço público (art. 7º, Lei nº 9.296/96).

No caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição, que deve representar o conteúdo fiel das conversas gravadas, sendo desnecessária a degravação integral do material obtidocom a quebra do sigilo referido, bastando que se confira às partes o acesso aos diálogos interceptados37

Encerrado o procedimento, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptaçãoao juiz competente, acompanhado do auto circunstanciado, que deverá conter o resumo dasoperações realizadas, e das mídias de gravação e transcrição dos diálogos, se for o caso, o que permitirá, oportunamente, verificar se os meios empregados foram, de fato, os citados no pedido e a decisão, e se não houve extrapolação do prazo por parte da autoridade executora.

Recebidas as peças, o juiz determinará a sua autuação em autos apartados, como procedimento cautelar de interceptação. Esses autos serão apensados aos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrição respectivas, cientificado o Ministério Público.

A apensação será realizada imediatamente, antes do relatório da autoridade, quando se tratar de inquérito policial (art.10, § 1°, CPP), ou na conclusão do processo aojuiz, para sentença.

É que os dispositivos citados na parte final do parágrafo único do art. 8º da Lei nº 9.296/96, sofreram modificações legislativas: o art. 407 teve sua redação alterada pela Lei nº 11.689/2008, passando a tratar do procedimento incidente das Exceções; o art. 502 foi revogado pela Lei nº 11.719/2008; e o art. 538, com redação alterada pela Lei nº 11.719/2008, passou a versar sobre infrações penais de menor potencial ofensivo, todos do Código de Processo Penal.

Atente-se que a formalização da interceptação telefônica nos autos ocorrerá somente depois doencerramento da diligência, sob pena de prejudicar a operação.

Nesse contexto, é permitido que a autoridade competente restrinja o acesso de advogados aos autos, sem que constitua violação de prerrogativa, consoante dispõe o art. 7º, § 11 da Lei nº 8.906/9438

Acostado todo o material ao processo, deverá ser assegurado às partes o exercício do contraditório diferido e da ampla defesa.

1.3.2.5. Incidente de inutilização de gravação

Nos termos do art. 9º da Lei nº 9.296/96, a gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada.

O incidente de inutilização será assistido pelo Ministério Público, sendo facultada a presença doacusado ou de seu representante legal.

1.3.2.6. Criminalização

O art. 10, da Lei nº 9.296/96, co a redação dada pela Lei nº 13.869/2019, define que constitui crime, com pena de reclusão de 02(dois) a 04(quatro) anos, e multa, realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, promover escuta ambiental ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não

37 STF, 1ª Turma, Rcl-AgR 33.783/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, j. em29/11/2019, pub. no DJe de 13/12/2019.

38 Art. 7º: São direitos do advogado: [...] § 11. No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências

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autorizados em lei, estando sujeito à mesma pena, a autoridade judicial que determina a execução de quaisquer dessas condutas com idêntico objetivo.

1.3.3.ACESSO A REGISTROS TELEFÔNICOS E DADOS CADASTRAIS

O acesso a registros telefônicos não se confunde com a interceptação das comunicações telefônicas, pois representa o conhecimento das ligações telefônicas efetuadas e recebidas por determinada pessoa, em um certo lapso temporal, revelando os números de origem e de destino, o mesmo ocorrendo em relação ao acesso aos seus dados de cadastro (qualificação pessoal, filiação e endereço).

A Lei nº 12.850/2013, que trata do combate às organizações criminosas, no seu art. 3º, inciso IV, informa que, em qualquer fase da persecução penal, será permitido, como meio de obtenção de prova, “acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, a dados cadastrais constantes de bancos de dados públicos ou privados e a informações eleitorais ou comerciais”. Nesse caso, estabelecem os seus arts. 15, 16 e 17 que:

a) o delegado de polícia e o órgão do Ministério Público terão acesso, independentemente de autorização judicial, apenas aos dados cadastrais do investigado que informem exclusivamente a qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de crédito;

b) as empresas de transporte possibilitarão, pelo prazo de 05 (cinco) anos, acesso diretoe permanente do juiz, do Ministério Público ou do delegado de polícia aos bancos de dados de reservase registro de viagens;

c) as concessionárias de telefonia fixa ou móvel manterão, pelo prazo de 05 (cinco) anos,à disposição das autoridades mencionadas no art. 15, registros de identificação dos .números dos terminais de origem e de destino das ligações telefônicas internacionais, interurbanas e locais.

Na forma do art. 13-A do CPP, para apuração dos crimes de sequestro e cárcere privado (art. 148), redução a condição análoga à de escravo (art. 149), tráfico de pessoas (art. 149-A), extorsão (art. 158, § 3º), extorsão mediante sequestro (art. 159), todos previstos no Código Penal, e no tipificado do art. 239 do ECA, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia poderá requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos.

A requisição, que será atendida no prazo de 24(vinte e quatro) horas, conterá: o nome da autoridade requisitante; o número doinquérito policial e a identificação da unidade de polícia judiciária responsável pela investigação.

De acordo com o art. 13-B do CPP, se for necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de polícia, mediante autorização judicial, poderão requisitar às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais47 , informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delitoem curso.

Nessa hipótese, o sinal:

a) não permitirá acesso ao conteúdo da comunicação de qualquer natureza, o que dependerá de autorização judicial, conforme disposto em lei;

b) deverá ser fornecido pela prestadora de telefonia móvel celular por período não superior a 30 (trinta) dias, renovável por uma única vez, por igual período;

c) para períodos superiores àqueles de que trata a letra “b”, será necessária a apresentaçãode ordem judicial.

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O art. 13-B, § 4º do CPP, estabelece que, não havendo manifestação judicial no prazo de 12 (doze) horas, a autoridade competente (delegado de polícia ou membro do Ministério Público) requisitará às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso, com imediata comunicação ao juiz.

A permissibilidade acima foi objeto da ADI 5.642/DF, proposta pela Associação Nacional das Operadoras Celulares (ACEL), atualmente em tramitação no STF, sob relatoria do Min. Edson Fachin, com julgamento pela improcedência do pedido concluído em 18 de abril de 202439

É de se destacar que a consulta direta ao aparelho telefônico para coleta de citados dados deve ser precedida de ordem judicial uma vez que, diante das inovações tecnológicas, o acesso viabiliza a conferência de extratos bancários, fotos, e-mails, vídeos, conversas em aplicativos WhatsApp, Telegram, entre outros.

1.3.3.1. Criminalização

A recusa ou a omissão de dados cadastrais, registros, documentos e informações requisitadas pelo juiz, Ministério Público ou delegado de polícia, no curso de investigação ou do processo, constitui crime, com pena de reclusão de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, incorrendo na mesma sanção quem, de forma indevida, se apossa dos dados cadastrais retromencionados, propala-os, divulga-os ou faz uso deles, a teor do disposto no art. 21, caput e parágrafo único da Lei nº 12.850/2013.

1.3.4.CAPTAÇÃO AMBIENTAL

Classifica-se a captação ambiental em interceptação ambiental, escuta ambiental e gravaçãoambiental.

1.3.4.1. Interceptação ambiental, escuta ambiental egravação ambiental

A interceptação ambiental é a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, feita por terceiro, realizada sem conhecimento dos comunicadores. Por sua vez,a escuta ambiental é a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, feita por terceiro, com o consentimento de um dos comunicadores. Já a gravação ambiental éa captação noambiente da comunicação, feita por um dos comunicadores.

A captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos tinha previsão normativa somente no art. 3º, inciso II da Lei nº 12.850/2013, aplicável no combate às organizações criminais.

Com a entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019, o art. 8º-A foi acrescentando à Lei nº 9.296/96, passando a prever expressamente a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos como meio de obtenção de prova fora da esfera das investigações sobre organizações criminosas, mediante atendimento dos pressupostos adiante abordados.

Diferentemente das comunicações telefônicas em que se tem o sigilo dos diálogos, os quaissãorestritosaosinterlocutores, nacomunicaçãoambientalentrepessoasissonemsempre acontece, pois ela poderá ter (ou não) o caráter sigiloso, a depender do contexto em que se der, o que pode constituir (ou não) invasão da privacidade do indivíduo. Assim, a comunicação ambiental, que é constitucionalmente assegurada, poderá ocorrer nos seguintes moldes: a) captação ambiental de comunicação (ou imagens) mantida em lugar público, sem contexto de intimidade: não necessita de autorização judicial. Entende-se por lugar público o local de livre acesso e trânsito das pessoas em geral, sem qualquer nota de

39 Disponível em https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5117846, acesso em 14 mai 2024.

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reserva. Aplica-se, nesse caso, a teoria do risco(ex.: salas de espera de repartiçãopública, praçaspúblicas, shoppingscenters etodososlugaresdelivreacesso aopúblico);

b) captação ambiental de comunicação (ou imagens) mantida em lugar público, mas em caráter reservado: há proteção jurídica à intimidade, dependendo, portanto, de autorização judicial (ex.: duas pessoas se põem em um contexto de intimidade e de sigilo ao conversarem, mesmo que se encontrem em lugar de livre acesso ao público);

c) captação ambiental de comunicação mantida em lugar privado não aberto ao público: necessita de autorização judicial, diante da proteção à inviolabilidade de domicílio.

Ao analisar a captação ambiental no âmbito do combate às organizações criminosas, o entendimento pretoriano é o de que, para a interceptação ambiental e para a escuta ambiental, exige-se autorização judicial, quando em local privado, sendo ela dispensada para a gravação ambiental, aplicando-se, no que couber, tratamento normativo idêntico àquele das comunicações telefônicas.

As comunicações que dizem respeito ao patrocínio da causa, mantidas entre o advogado e seu cliente, terão garantido o sigilo, não estando este sujeito a quebra sequer mediante autorização judicial, independentemente do local em que elas se derem, como prevê o art. 7º,inciso II da Lei nº 8.906/94. O afastamento da inviolabilidade somente poderá ocorrer no cenáriode envolvimento do profissional na prática de infração penal, nos termos dos parágrafos sexto esétimo do mesmo diploma legal.

1.3.4.2. Procedimento

1.3.4.2.1. Pressupostos de admissibilidade

A captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos poderá ser autorizada judicialmente para a investigação ou instrução criminal, nos termos do art. 8º-A da Lei nº 9.296/96, quando:

a) a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes; e b) houver elementos provatórios razoáveis de autoria e participação em infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 04 (quatro) anos ou em infrações penais conexas.

1.3.4.2.2. Iniciativa

Será autorizada pelo juiz a requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público.

1.3.4.2.3. Pedido

O requerimento, que conterá a comprovação do atendimento dos pressupostos de admissibilidade, deverá também descrever circunstanciadamente o local e a forma de instalação do dispositivo de captação ambiental.

1.3.4.2.4. Decisão concessiva

Formulado o pedido, o juiz terá até 24(vinte e quatro) horas para decidir sobre ele.

A decisão, devidamente fundamentada com a presença dos pressupostos de admissibilidade da medida, indicará a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável por decisão judicial por igual período, se comprovada a indispensabilidade do meio de prova e quando presente atividade criminal permanente, habitual ou continuada.

1.3.4.2.5. Execução da medida e o incidente de inutilização de gravação

Para execução da medida e quanto ao incidente de inutilização de gravação, aplicamse, subsidiariamente, as regras previstas na Lei nº 9.296/96, referentes à interceptação das

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comunicações telefônicas, examinada, respectivamente, nos itens 1.3.2.9 e 1.3.2.10, para os quais remetemos oleitor.

Ressalte-se que, para a efetivação da captação ambiental, por vezes, é necessária a realização da denominada busca exploratória (também chamada de exploração de local), a qual consiste no ingresso no imóvel de policiais ou técnicos especializados no imóvel, mediante prévia autorização judicial, para, de forma não ostensiva, além de registrarem informações e elementos probatórios, instalarem equipamentos para captação de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, mantendo a configuração original do local, de modo que o investigado não percebaa intromissão em seuespaço físico.

A busca exploratória não obedece ao período de execução atinente à busca e à apreensão comum, podendo ser executada em qualquer dia e horário e não se sujeitando aos termos do art. 245 do CPP. Ao final, deverá ser lavrado termo circunstanciado respectivo para fins de registro da diligência.

Entretanto, por força da derrubada pelo Congresso Nacional de veto presidencial à Lei nº 13.964/2019 (VT 56/2019), em 19 de abril de 2021, foram incluídos os §§ 2º e 4º ao art. 8º-A da Lei nº 9.296/96, in verbis:

(1) Art. 8º [...] § 2º A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno,exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do art. 5º da Constituição Federal.

Nesse sentido, para que não haja desarrazoado retrocesso ao combate à criminalidade, deve-se interpretar que a vedação contida no referido dispositivo diz respeito exclusivamente à realização do procedimento de instalação de equipamentos de captação ambiental em “casa”, durante o período noturno, como medida de respeito à inviolabilidade de domicílio prevista no inciso XI do caput do art. 5º da Constituição Federal.

Ademais, é técnica de investigação que se sujeita à cláusula de reserva de jurisdição, necessitando, portanto, de autorização judicial para a sua execução.

(2) Art. 8º [...] § 4º A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação.

No referido dispositivo, o legislador não atentou que a captação ambiental é gênero, o qual apresentacomoespéciesainterceptaçãoambiental,aescutaambientale agravaçãoambiental.

Nesse contexto, é inconcebível dar à captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro (gravação ambiental) o caráter de prova ilícita, e, portanto, somente sendo possível sua utilização, em matéria de defesa, em face da inexistência de prévio conhecimento de sua realização pela autoridade policial ou pelo órgão do Ministério Público.

Ora, qual o sentido de se dar conhecimento prévio da realização de uma gravação ambiental para a autoridade policial ou para o órgão do Ministério Público? Nenhum, já que é absolutamente desnecessária qualquer autorização prévia para a realização do ato.

A ilicitude da prova produzida mediante captação ambiental apenas deve ser reconhecida quando, exigida a autorização judicial, essa não tiver sido obtida de forma antecedente à diligência. Nãoé o caso da gravação ambiental40 .

Restringir a utilização da captação ambiental (na modalidade gravação ambiental), obtida sem prévio conhecimento da autoridade policial ou do órgão do Ministério Público, dando-lhe o indevido tratamento de prova ilícita e permitindo seu uso unicamente em matéria de defesa, fereos princípios daisonomia,porquanto maculaachamada paridadedearmasentreacusação

40 Tese de Repercussão Geral fixada pelo STF no Tema 237: “É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro”.

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e defesa, e da comunhão das provas, haja vista que a prova produzida pertence ao processo, podendo ser utilizada por qualquer das partes.

Ademais, por força do princípio da proporcionalidade, os nossos tribunais reconhecem a licitude da gravação ambiental quando for utilizada como meio de defesa para comprovar a inocência do acusado ouquando for a prova de uma investida criminosa de um dos interlocutores contra o outro.

Por fim, a necessidade de preservação da integridade da gravação é inerente a todo elemento probatório, razão precípua da cadeia de custódia, na forma estabelecida nos arts. 158Aa 158-F do CPP.

Nesse sentido, sem sombra de dúvidas, a redação do novel dispositivo legal deverá ser objeto de controvérsia a ser dirimida por nossos tribunais.

1.3.4.3. Criminalização

Constitui crime:

a) promover escuta ambiental ou quebrar segredo de justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei, com pena de reclusão de 02 (dois) a 04(quatro) anos, e multa (art. 10, caput da Lei nº 9.296/96);

b) determinar a autoridade judicial a execução da conduta citada no item anterior com objetivo não autorizado em lei, com pena de reclusão de 02 (dois) a 04(quatro) anos, e multa (art. 10, parágrafo único da Lei nº 9.296/96);

c) realizar captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos para investigação ou instrução criminal sem autorização judicial, quando esta for exigida,com pena de 02(dois) a 04(quatro) anos, e multa. A pena será aplicada em dobro ao funcionário público que descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a captação ambiental ou revelar o conteúdo das gravações enquanto mantido o sigilo judicial (art. 10-A, caput e § 2º da Lei nº 9.296/96).

Todavia, não haverá crime se a captação for realizada por um dos interlocutores.

1.3.5.QUEBRA DE SIGILO FINANCEIRO, BANCÁRIO E FISCAL

A Constituição Federal assegura no art. 5º, incisos X e XII41 , a proteção ao sigilo financeirocomo decorrência do direito à inviolabilidade da vida privada e de seus dados.

A Lei nº 12.850/2013, no art. 3º, inciso VI, aponta a possibilidade de afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da legislação específica, em qualquer fase da persecução penal, como meio de obtenção de prova (ato investigatório).

O resultado da diligência se constituirá em meio de prova (prova documental em que constarão os dados obtidos com a quebra do sigilo).

O art. 1º, caput da Lei Complementar nº 105/2001, indica que “As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados”.

O sigilo financeiro tem um sentido mais amplo que o sigilo bancário, por força do conceito de instituição financeira estabelecido no art. 1º, § 1º da LC nº 105/200142

41 Art. 5º: [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; [...] XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações te- legráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; [...].

42 LC nº 105/2001, art. 1º[...] § 1º São consideradas instituições financeiras, para os efeitos desta Lei Complementar: I – os bancos de qualquer espécie; II – distribuidoras de valores mobiliários; III – corretoras de câmbio e de valores mobiliários; IV – sociedades de crédito, financiamento e investimentos; V – sociedades de crédito imobiliário; VI – administradoras de cartões de crédito; VII – sociedades de arrendamento mercantil; VIII –administradoras de mercado de balcão organizado; IX – cooperativas de crédito; X – associações de poupança e empréstimo; XI – bolsas de valores e de mercadorias e futuros; XII – entidades de liquidação e com-pensação; XIII – outras sociedades que, em razão da natureza de suas operações, assim venhamaser consideradas peloConselho Monetário Nacional

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O dever de sigilo é extensivo ao Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, em relação às operações que realizar e às informações que obtiver no exercício de suas atribuições, na forma prevista no art. 2º da LC nº 105/2001.

O sigilo financeiro, a teor do art. 1º, § 4º da LC nº 105/2001, poderá ser afastado, quando for necessário para apuração de ocorrência de qualquer ilícito, na fase investigativa ou do processo judicial, e especialmente nos seguintes crimes:

a) de terrorismo;

b) de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou de drogas afins;

c) decontrabandooudetráficodearmas,muniçõesoumaterialdestinadoasuaprodução;

d) de extorsão mediante sequestro;

e) contra o sistema financeiro nacional;f) contra a Administração Pública;

f) contra a ordem tributária e a previdência social;

g) de lavagem de dinheiro ou de ocultação de bens, direitos e valores;

h) praticados por organização criminosa.

No pedido de quebra de sigilo, a ser formulado pelo delegado de polícia ou pelo membro do Ministério Público, deverá ser demonstrada a presença de indícios da autoria e de prova da materialidade do crime investigado e a imprescindibilidade da medida para a investigação ou instrução processual criminal.

Concedida a medida, nos termos do art. 3º da LC nº 105/2001, as informações requisitadas serão prestadas pelo Banco Central do Brasil, pela Comissão de Valores Mobiliários e pelas instituições financeiras, preservado o seu caráter sigiloso, mediante acesso restrito às partes que delas não poderão servir-se para fins estranhos ao processo.

Por outro lado, a 5a Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, decidiu que não viola a ordem pública brasileira o compartilhamento direto de dados bancários pelos órgãos investigativos mesmo que, no Estado de origem, sejam obtidos sem prévia autorização judicial, se a reserva de jurisdição não é exigida pela legislação local43

Tratando-se de dados sobre operações envolvendo recursos públicos, dispensa-se prévia autorização judicial, podendo o órgão do Ministério Público requisitar diretamente informações bancárias de conta corrente de titularidade da prefeitura municipal e, por extensão, ter acesso aos registros das operações bancárias realizadas por particulares, a partir das verbas públicas creditadas naquela conta. Entendimento em sentido diverso implicaria o esvaziamento da própria finalidade do princípio da publicidade, que é permitir o controle da atuação do administrador público e do emprego de verbas públicas44

1.3.5.1. Compartilhamento de dados com o Ministério Público

O Pleno do Supremo Tribunal Federal julgou constitucional o compartilhamento de dados dos órgãos de fiscalização com o Ministério Público: “1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil, que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecuçãopenal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional. 2. O compartilhamento pela UIF e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.” (RE 1055941, Rel. Min. Dias Toffoli, j. em 04/12/2019, pub. no DJe de 18/03/2021).

O referido julgamento resultou na fixação doTema 990 derepercussão geral:“Possibilidade de compartilhamento com o Ministério Público, para fins penais, dos dados bancários e fiscais

43 AREsp 701833/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em04/05/2021, pub. no DJe de 10/05/2021.

44 STF, 2ª Turma, RHC 133118/CE.

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do contribuinte, obtidos pela Receita Federal nolegítimo exercício de seu dever de fiscalizar, semautorização prévia do Poder Judiciário”.

1.3.5.2. Criminalização

Estabelece o art. 10 da LC nº 105/2001 que a quebra de sigilo, fora das hipóteses nela autorizadas, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. Incorre nas mesmas penas quem omitir, retardar injustificadamente ou prestar falsamenteas informações legalmente requeridas.

Nos termos do art. 1º, § 3o da LC nº 105/2001, não constitui violação do dever de sigilo:

a) a troca de informações entre instituições financeiras, para fins cadastrais, inclusivepor intermédio de centrais de risco, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

b) o fornecimento de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisão de fundos e de devedores inadimplentes, a entidades de proteção ao crédito, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

c) o fornecimento das informações de que trata o art. 11, § 2º, da Lei no 9.311/96;

d) a comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa;

e) a revelação de informações sigilosas com o consentimento expresso dos interessados;f) a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2o , 3o , 4o , 5o , 6o , 7o e 9 desta Lei Complementar; e

f) o fornecimento de dados financeiros e de pagamentos, relativos a operações de créditoe obrigações de pagamento adimplidas ou em andamento de pessoas naturais ou jurídicas, a gestores de bancos de dados, para formação de histórico de crédito, nos termos de lei específica.

1.3.6.AÇÃO CONTROLADA

1.3.6.1. Conceito

A Lei nº 12.850/2013, em seu art. 8º, caput, conceitua a ação controlada como sendo o retardo da intervenção policial ou administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento, para quea medida legal se concretize no momento mais eficaz para a formação de provas e obtenção deinformações.

1.3.6.2. Previsão Legal

• Art. 4º-B da Lei nº 9.613/1998, com redação dada pela Lei nº 12.683/2012;

• Art. 53, inciso II e parágrafo único da Lei nº 11.343/2006;

• Arts.3º,inciso III,8ºe9ºda Leinº 12.850/2013,comasalteraçõesdaLei nº13.964/2019.

1.3.6.3. Procedimento

(1) Lei nº 9.613/1998, com redação dada pela Lei nº 12.683/2012 (Lei de Lavagem deCapitais)

Para não comprometer as investigações, o art. 4º-B dessa lei estabelece que a ordem de prisão de pessoas ou as medidas cautelares de ordem assecuratórias poderão ser suspensas pelojuiz, ouvido o Ministério Público.

66

(2) Lei nº 11.343/2006 (Lei Antidrogas)

Nostermosdoart.53, caput, inciso II eparágrafo único da Lei Antidrogas, emqualquer fase da persecução penal relativa aos crimes nela previstos, mediante autorização judicial e ouvido o Ministério Público, será permitida a não autuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível.

Todavia, a autorização judicial para a ação controlada ficará condicionada ao conhecimento do itinerário provável e à identificação dos agentes do delito ou de colaboradores.

(3) Lei nº 12.850/2013, com as alterações da Lei nº 13.964/2019 (Lei de Combate àsOrganizações Criminosas)

Em qualquer fase da persecução penal, será permitida a ação controlada, devendo a medida ser previamente comunicada (e não requerida) ao juiz competente, o qual, ouvido o Ministério Público, poderá, se for o caso, estabelecer os seus limites, inclusive temporal.

Por cautela, a referida comunicação será sigilosamente distribuída, de forma a não conter informações que possamindicar a operação a ser efetuada.

Até o encerramento da diligência, para garantir o êxito das investigações, o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia.

Concluída a diligência, elaborar-se-á auto circunstanciado, descrevendo toda a ação controlada.

Na hipótese em que a ação envolver transposição de fronteiras, o retardamento da intervenção policial ou administrativa somente poderá ocorrer com a cooperação das autoridades dos países que figurem como provável itinerário ou destino do investigado, de modo a reduzir os riscos de fuga e extravio do produto, objeto, instrumento ou proveito do crime.

1.3.7.INFILTRAÇÃO DE AGENTES POLICIAIS

1.3.7.1. Conceito

O procedimento consiste na introdução de forma dissimulada de um agente policial em uma organização criminosa de modo que possa dela participar para fins de obtenção de informações e identificar fontes de prova.

1.3.7.2. Previsão Legal

• Art. 53, inciso I da Lei nº 11.343/2006.

• Arts. 3º, inciso VII e 10 a 14 da Lei nº 12.850/2013, com as alterações oriundas da Lei nº 13.964/2019.

1.3.7.3. Procedimento

A Lei nº 11.343/2006 (Lei Antidrogas), em seu art. 53, inciso I, faz menção genérica à possibilidade de utilização da técnica da infiltração de agentes de polícia em tarefas de investigação, mediante autorização judicial e ouvido o Ministério Público.

A Lei nº 12.850/2013 (Lei de Combate às Organizações Criminosas), com as alterações oriundas da Lei nº 13.964/2019, além de prever a utilização da infiltração por policiais, em atividades de investigações, preocupou-se em estabelecer o rito procedimental a ser adotada para realização da técnica investigativa, de modo a assegurar o seu desenvolvimento dentro de padrões de segurança e sigilo necessários para a preservação da integridade do agente infiltrado.

A não observância do contido no art. 10 da Lei nº 12.850/2013 importará em nulidade da prova por acaso obtida.

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Nesse diapasão, temos:

1º A necessidade de autorização judicial prévia

A infiltração será precedida de circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites e atenderá obrigatoriamente:

a) representação da autoridade policial, hipótese em que, antes de decidir, a autoridade judiciária deverá ouvir o Ministério Público, a respeito do pedido;

b) requerimento formulado pelo Ministério Público, devendo o juiz, antes de decidir, munir-se de manifestação técnica do delegado de polícia, quando solicitada no cursode inquérito policial.

No pedido, orequerente (delegado de polícia ou membro do Ministério Público) deverá demonstrar a necessidade da medida, o alcance das tarefas dos agentes e, quando possível, os nomes e/ou apelidos das pessoas investigadas, bem como o local da infiltração.

2º Requisitos

Diante da exegese da Lei nº 12.850/2013, verifica-se que são requisitos para concessão da medida:

a) a demonstração da existência de indícios de crimes praticados por organização criminosa (art. 10, § 2º) e a necessidade da medida para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e para evitar a prática de infrações penais;

b) a sua indispensabilidade diante da impossibilidade de produção da prova por outros meios disponíveis (art. 10, § 2º, parte final);

c) a aceitação do agente policial que será infiltrado (art. 14, inciso I).

3º Prazo

O prazo de duração da infiltração será de até 06(seis) meses, sem prejuízo de eventuais renovações, desde que comprovada a sua necessidade.

4º Sigilo da operação

Considerando o risco a que o agente policial estará submetido, o sigilo da medida é fundamental, não apenas para garantir a eficiência da investigação, mas, também, para a própria segurança doinfiltrado, durante ouapós a operação.

Nesse sentido, a Lei nº 12.850/2013 prevê uma série de cautelas que deverão ser adotadas:

a) o pedido de infiltração será sigilosamente distribuído, de forma a não conter informações que possam indicar a operação a ser efetivada ou identificar o agente que será infiltrado (art. 12, caput);

b) os autos contendo as informações da operação de infiltração acompanharão a denúncia do Ministério Público, quando serão disponibilizados à defesa, assegurando- se a preservação da identidade do agente (art. 12, § 2º);

c) havendo indícios seguros de que o agente infiltrado sofre risco iminente, a operaçãoserá sustada, mediante requisição do Ministério Público ou pelo delegado de polícia,dando-se imediata ciência ao Ministério Público e à autoridade judicial (art. 12, § 3º);

d) o agente deve ter sua identidade alterada, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9º da Lei nº 9.807/99, bem como deve usufruir das medidas de proteção a testemunhas (art. 14, inciso II);

e) o agente deve ter o seu nome, sua qualificação, sua imagem, sua voz e demais informações pessoais preservadas durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em contrário (art. 14, inciso III);

f) o agente não deve ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos meios de comunicação, sem sua prévia autorização por escrito (art. 14, inciso IV).

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No aspecto criminal, o descumprimento de determinação de sigilo das investigações que envolvam a ação controlada e a infiltração de agentes constitui crime, previsto no art. 20 da Lei nº 12.850/2013, com pena de reclusão de 01(um) a 04(quatro) anos, e multa.

5º Relatório

Após o encerramento do prazo da atividade de infiltração, será confeccionado e apresentado relatório circunstanciado ao juiz competente (juiz das garantias, se instalado) que, imediatamente, dará ciência do seu teor ao Ministério Público.

De igual modo, no curso do inquérito policial, o delegado de polícia poderá determinar aos seus agentes relatório da atividade, podendo o Ministério Público requisitá-lo a qualquer tempo.

1.3.7.4. Limitação material à conduta do agente policial infiltrado

Ponto nevrálgico na medida de infiltração é o de uma eventual prática de crime pelo agente infiltrado, como pseudo membro da organização criminosa.

Nesse particular, o parágrafo único do art. 13 da Lei nº 12.850/2013 dispõe que não será punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente infiltrado, no curso da investigação, quando inexigível conduta diversa.

Obviamente, qualquer desproporcionalidade da atuação do agente com a finalidade da investigação o levará a responder criminalmente pelos excessos praticados, na forma do art. 13, caput da lei ora discutida.

Não se perca de vista que os limites substanciais à ação do infiltrado deverão estar delineados na decisãojudicial que autorizar a medida.

1.3.7.5. Infiltração virtual de agentes policiais

A Lei nº 13.964/2019 incluiu na Lei nº 12.850/2013 os arts. 10-A a 10-D, dispondo sobre a admissibilidade de infiltração virtual de agentes de polícia na internet, com o fim de investigar os crimes nela previstos e os a eles conexos, praticados por organizações criminosas, e conceituando para efeitos da Lei:

a) Dados de conexão: informações referentes a hora, data, início, término, duração, endereço de Protocolo de Internet (IP) utilizado e terminal de origem da conexão; b) Dados cadastrais: informações referentes a nome e endereço de assinante ou de usuário registrado ou autenticado para a conexão a quem endereço de IP, identificação de usuário oucódigo de acessotenha sido atribuído no momento da conexão.

Destaque-se que será nula a prova obtida sem a observância do procedimento previsto no art. 10-A da Lei nº 12.850/2013.

1.3.7.5.1. Procedimento

1º Necessária autorização judicial

Assimcomo na infiltração física, a infiltração virtual será precedida de circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites e atenderá obrigatoriamente:

a) representação da autoridade policial, hipótese em que, antes de decidir, a autoridade judiciária deverá ouvir o Ministério Público, a respeito do pedido

b) requerimento formulado pelo Ministério Público.

No pleito, o requerente (delegado de polícia ou membro do Ministério Público) deverá demonstrar a necessidade da medida, indicando o alcance das tarefas dos policiais, os nomes ou apelidos das pessoas investigadas e, quando possível, os dados de conexão ou cadastrais que permitam a identificação dessas pessoas.

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O pedido de infiltração será sigilosamente distribuído, de forma a não conter informações que possam indicar a operação a ser efetivada ou identificar o agente que será infiltrado.

Asinformaçõesquantoànecessidadedaoperaçãodeinfiltraçãoserãodirigidasdiretamente aojuiz competente, que decidirá, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, após manifestação do Ministério Público, na hipótese de representação do delegado de polícia, devendo-se adotar as medidas necessárias para o êxito das investigações e a segurança do agente infiltrado.

Os órgãos de registro e cadastro público poderão incluir nos bancos de dados próprios, mediante procedimento sigiloso e requisição da autoridade judicial, as informações necessárias à efetividade da identidade fictícia criada, nos casos de infiltração de agentes na internet. Havendo indícios seguros de que o agente infiltrado sofre risco iminente, a operação será sustada, mediante requisição do Ministério Público ou pelo delegado de polícia, dando-se imediata ciência ao Ministério Público e à autoridade judicial.

2º Requisitos

Diante da análise da Lei nº 12.850/2013, verifica-se que são requisitos para concessão da medida:

a) a demonstração de que há indícios da existência de infração penal relativa à organização criminosa (art. 10-A, § 3º);

b) a sua indispensabilidade, diante da impossibilidade de produção da prova por outros meios disponíveis (art. 10-A, § 3º, parte final);

c) a aceitação do agente policial que será infiltrado (art. 14, inciso I).

3º Prazo

O prazo de duração da infiltração será de até 06(seis) meses, sem prejuízo de eventuais renovações, mediante ordem judicial fundamentada, desde que o total não exceda a 720 (setecentos e vinte) dias e que seja comprovada sua necessidade.

4º Sigilo da Operação

Considerando ser uma operação sensívelsob o ponto de vista de se garantir, nãoapenas a eficiência da investigação, mas, também, a segurança do agente policial infiltrado virtualmente, são previstas uma série de providências que deverão ser adotadas para preservação do sigilo:

a) o pedido de infiltração será sigilosamente distribuído, de forma a não conter informações que possam indicar a operação a ser efetivada ou identificar o agente que será infiltrado (art. 12, caput);

b) as informações da operação de infiltração serão encaminhadas diretamente ao juiz responsável pela autorização da medida, que zelará por seu sigilo (art. 10-B, caput);

c) antes da conclusão da operação, o acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia responsável pela operação, com o objetivo de garantiro sigilo das investigações (art. 10-A, parágrafo único);

d) os atos eletrônicos registrados na investigação serão reunidos em autos apartados e apensados ao processo criminal juntamente com o inquérito policial, assegurando-sea preservação da identidade do agente policial infiltrado e a intimidade dos envolvidos (art. 10-D, parágrafo único);

e) os autos contendo as informações da operação de infiltração acompanharão a denúncia do Ministério Público, quando serão disponibilizados à defesa, assegurando- se a preservação da identidade do agente (art. 12, § 2º);

f)havendo indícios seguros de que o agente infiltrado sofre risco iminente, a operação será sustada mediante requisição do Ministério Público ou pelo delegadode polícia, dandose imediata ciência ao Ministério Público e à autoridade judicial (art. 12, § 3º);

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g) ter o agente sua identidade alterada, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9ºda Lei nº 9.807/99, bem como usufruir das medidas de proteção a testemunhas (art.14, incisoII);

h) ter o agente o seu nome, sua qualificação, sua imagem, sua voz e demais informações pessoais preservadas durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em contrário (art. 14, inciso III);

i)não ter o agente sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos meios de comunicação, sem sua prévia autorização por escrito (art. 14, inciso IV).

5º Relatório

Concluída a diligência ou o prazo máximo para sua execução, o relatório circunstanciado e todos os atos eletrônicos praticados durante a operação deverão ser registrados, gravados, armazenados e apresentados ao juiz competente que, imediatamente, cientificará o Ministério Público.

Com o término da investigação, todos os atos eletrônicos praticados durante a operação deverão ser registrados, gravados, armazenados e encaminhados ao juiz e ao Ministério Público, juntamente com relatório circunstanciado.

No curso do inquérito policial, a qualquer tempo, poderão ser realizados relatórios da atividade de infiltração mediante determinação do delegado de polícia ou requisição do órgão do Ministério Público ou do juiz competente.

1.3.7.5.2. Limitação material à conduta do agente infiltrado

Como dissemos alhures, questão crucial da infiltração (física ou virtual) é a de um possível envolvimento na prática de crime pelo agente infiltrado, como, em tese, membro de uma organização criminosa.

Nesse sentido, o art. 10-C da Lei nº 12.850/2013 expressa que não comete crime o policial queocultaasuaidentidadepara,pormeiodainternet,colherindíciosdeautoriaematerialidade dos crimes previstos no seuart. 1º.

O parágrafo único do art. 13 da Lei nº 12.850/2013 dispõe que não será punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente infiltrado no curso da investigação, quando inexigível conduta diversa.

Por outro lado, se o agente agir com desproporcionalidade à finalidade da investigação, responderá criminalmente pelos excessos cometidos na forma do art. 10-C, parágrafo único da Lei nº 12.850/2013.

Não se perca de vista que os limites substanciais à ação do infiltrado deverão estar delineados na decisãojudicial que autorizar a medida.

1.3.8.O ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA

O acordo de colaboração premiada consubstancia negócio jurídico processual, de modo que seuaperfeiçoamento pressupõe voluntariedade de ambas as partes celebrantes.

1.3.8.1. Natureza jurídica

O acordo de colaboração premiada é meio de obtenção de prova.

1.3.8.2. Previsão legal

Arts. 3º, inciso I, 3º-A a 7º da Lei nº 12.850/2013, com as alterações da Lei nº 13.964/2019.

1.3.8.3. Momento

O acordo de colaboração premiada poderá ser firmado em qualquer fase da persecução penal

71

1.3.8.4. Direitos do colaborador

São direitos do colaborador:

• Usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica;

• Ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservadas;

• Ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;

• Participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;

• Não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;

• Cumprir pena ou prisão cautelar em estabelecimento penal diverso dos demais corréusou condenados.

1.3.8.5. Admissibilidade

O art. 4º da Lei nº 12.850/2013, com as alterações da Lei nº 13.964/2019, indica ser admissível o acordo de colaboração desde que advenha um ou mais dos seguintes resultados:

a) a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; e/ou

b) a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; e/ou

c) a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; e/ou

d) a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadaspela organização criminosa; e/ou

e) a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

1.3.8.6. Prêmio legal

Nos termos dos art. 4º da Lei nº 12.850/2013, com as alterações da Lei nº 13.964/2019, constitui prêmio legal:

a) a concessão de perdão judicial, ainda que o benefício não tenha sido previsto na proposta inicial;

b) a redução em até 2/3 (dois terços) da pena privativa de liberdade;

c) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos;

d) o sobrestamento do prazo para oferecimento de denúncia ou do processo por até 06(seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam cumpridas as medidasde colaboração, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional;

e) o não oferecimento de denúncia (denominado de acordo de imunidade) se a proposta de colaboração se referir a infração de cuja existência não tenha prévio conhecimento e o colaborado, desde que não seja o líder da organização criminosa e tenha sido o primeiro a prestar efetiva colaboração. A própria lei define que se considera existente oconhecimento prévio da infração quando o Ministério Público ou a autoridade policialcompetente tenha instaurado inquérito ou procedimento investigatório para apuração dos fatos apresentados pelo colaborador.

Se o acordo de colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade ou será admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos previstos na Lei nº 7.210/84.

1.3.8.7. Procedimento

1.3.8.7.1. Negociação do acordo

De início, esclareça-se que possuem legitimidade para as negociações visando ao acordo de colaboração premiada:

72

a) o delegado de polícia, o investigado e seu defensor, com a manifestação do Ministério Público; ou

b) entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

Não há qualquer participação do juiz nas negociações ou subscrição do acordo de colaboração premiada.

O recebimento da proposta para formalização de acordo de colaboração demarca o início das negociações e constitui, também, marco de confidencialidade, configurando violação de sigilo e quebra da confiança e da boa-fé a divulgação de tais tratativas iniciais ou de documentoque as formalize, até o levantamento de sigilo por decisão judicial.

A proposta de acordo de colaboração premiada poderá ser sumariamente indeferida, com a devida justificativa, cientificando-se o interessado.

Caso não haja indeferimento sumário, as partes deverão firmar Termo de Confidencialidade para prosseguimento das tratativas, o que vinculará os órgãos envolvidos na negociação e impedirá oindeferimento posterior semjusta causa.

Nenhuma tratativa sobre colaboração premiada deve ser realizada sem a presença de advogado constituído ou de defensor público.

Nos depoimentos que prestar, ocolaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 5.567, com trânsito em julgado em 09 de fevereiro de2024, conferiu aoart.4º, §14º, da Lei nº 12.850/201345,interpretação conforme à Constituição Federal a fim de declarar que o termo “renúncia” “[...] deve ser interpretado não como forma de esgotamento da garantia do direito ao silêncio, que é irrenunciável e inalienável, mas sim como forma de “livre exercício do direito ao silêncio e da não autoincriminação pelos colaboradores, em relação aos fatos ilícitos que constituem o objeto dos negócios jurídicos”, haja vista que o acordo de colaboração premiada é ato voluntário, firmado na presença da defesa técnica (que deverá orientar o investigado acerca das consequências do negócio jurídico) e que possibilita grandes vantagens aoacusado. Portanto, a colaboração premiada é plenamente compatível com o princípio do “nemo tenetur se detegere” (direito de não produzir prova contra si mesmo)”.

Em todos os atos de negociação, confirmação e execução da colaboração, o colaboradordeverá estar assistido por defensor.

O recebimento de proposta de colaboração para análise ou o Termo de Confidencialidade não implica, por si só, a suspensão da investigação, ressalvado acordo em contrário quanto à propositura de medidas processuais penais cautelares e assecuratórias, bem como de medidas processuais cíveis admitidas pela legislação processual civil em vigor.

Os termos de recebimento de proposta de colaboração e de confidencialidade serão elaborados pelocelebrante e assinados por ele, pelo colaborador e pelo advogado ou defensor públicocom poderes específicos.

Na hipótese de não ser celebrado o acordo por iniciativa do celebrante, esse não poderá sevaler de nenhuma dasinformações ou provas apresentadas pelocolaborador, de boa-fé, para qualquer outra finalidade.

A proposta de colaboração premiada deve estar instruída com procuração do interessado com poderes específicos para iniciar o procedimento de colaboração e suas tratativas, ou firmada pessoalmente pela parte que pretende a colaboração e por seu advogado ou defensor público.

Em caso de eventual conflito de interesses, ou de colaborador hipossuficiente, o celebrante deverá solicitar a presença de outro advogado ou a participação de defensor público.

45 Art. 4º [...] § 14. Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade. [...] (Lei nº 12.850/2013).

73

No acordo de colaboração premiada, o colaborador deve narrar todos os fatos ilícitos para os quais concorreu e que tenham relação direta com os fatos investigados.

Incumbe à defesa instruir a proposta de colaboração e os anexos com os fatos adequadamente descritos,comtodasassuascircunstâncias,indicandoasprovaseoselementos de corroboração.

1.3.8.7.2. Registro dos atos

O registro das tratativas e dos atos de colaboração deverá ser feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações, garantindo-se a disponibilização de cópia do material aocolaborador.

1.3.8.7.3. Formalização do acordo

A formalização do acordo de colaboração premiada se dará por escrito, devendo seu instrumento conter:

a) o relato da colaboração e seus possíveis resultados;

b) as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia;

c) a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor;

d) as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor;

e) a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário.

1.3.8.7.4. Controle judicial

Com alterações oriundas da Lei nº 13.964/2019, a Lei nº 12.850/2013, no seu art. 4º, § 7º, dispõe sobre o controle judicial a ser realizado no acordo de colaboração premiada.

O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto.

Assim, após ser firmado esse acordo, orespectivo termo, as declarações do colaborador e cópia da investigação serão remetidos ao juízo competente, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, devendo ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu defensor, cabendo-lhe analisar:

a) a regularidade e a legalidade do acordo;

b) a adequação dos benefícios pactuados àqueles previstos no caput e nos §§ 4º e 5º doart. 4º da Lei nº 12.850/2013 (ver item adiante), declarando nulas as cláusulas que violem o critério de definição do regime inicial de cumprimento de pena do art. 33 do Código Penal, as regras de cada um dos regimes previstos no Código Penal e na Lei nº7.210/84 (LEP) e os requisitos de progressão de regime não abrangidos pelo § 5º doreferidoart. 4º;

c) a adequação dos resultados da colaboração aos resultados mínimos exigidos nosincisos I, II, III, IV e V do caput do art. 4º;

d) a voluntariedade da manifestação de vontade, especialmente nos casos em que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares.

Antes de conceder os benefícios pactuados, o juiz ou o tribunal deve proceder à análise fundamentada do mérito da denúncia, do perdão judicial e das primeiras etapas de aplicação da pena, nos termos do CP e do CPP, exceto quando o acordo previr o não oferecimento da denúncia, na forma dos §§ 4º e 4º-A do art. 4º do CPP, ou se já tiver sido proferida sentença.

São nulas de pleno direito as previsões de renúncia ao direito de impugnar a decisão homologatória.

O juízo poderá recusar a homologação da proposta que não atender aos requisitos legais, devolvendo-a às partes para as adequações necessárias.

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Para o Superior Tribunal de Justiça, contra a decisão do juiz que recusa a homologação do acordo de colaboração premiada caberá o recurso de apelação46 .

Antes da homologação judicial, as partes poderão se retratar da proposta, caso em queos elementos probatórios fornecidos pelo colaborador poderão ser usados livremente no curso do processo, salvoem seu desfavor.

Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo delegado de polícia responsável pelas investigações.

O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências emandamento.

O acordo de colaboração premiada e os depoimentos do colaborador serão mantidos em sigilo, até o recebimento da denúncia ou da queixa-crime, sendo vedado ao magistrado decidir sobre sua publicidade em qualquer hipótese.

Em todas as fases do processo, deve-se garantir ao réu delatado a oportunidade de se manifestar após o decurso do prazoconcedido ao corréu que o delatou.

A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia.

Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo, a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial.

Ressalte-se que, comprovada a eficácia da colaboração, a concessão do prêmio é medida que se impõe, cabendo ao magistrado, unicamente, fazer a escolha por um dos benefícios previstos, levando em consideração, como preceitua o art. 4º, § 1º, da Lei 12.850/2013, a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fatocriminoso.

1.3.8.8. Eficácia objetiva da colaboração premiada

Para que se possa conferir ao colaborador o prêmio legal, é necessário que o julgador aquilate a relevância e a eficácia objetiva das informações prestadas. Não basta a mera confissão da práticacriminosa,masquesetenhachegadoaresultados que,semacolaboração, nãoteriam sidoalcançados.

É preciso, ainda, que, quando essa colaboração for realizada na fase de investigação, o colaborador a confirme em juízo, assegurando ao(s) corréu(s) delatado(s) o exercício do contraditório.

1.3.8.9. Rescisão do acordo de colaboração premiada

O acordo homologado poderá ser rescindido em caso de omissão dolosa sobre os fatos objeto da colaboração.

Além disso, pressupõe-se que o colaborador cessou o envolvimento em conduta ilícita relacionada ao objeto da colaboração. Caso contrário, será causa para a rescisão.

Diferentemente do que ocorre na retratação, quando o colaborador der causa exclusivamente à rescisão, dar-se-á a perda do prêmio negociado, assim como o aproveitamento integral das provas por ele fornecidas, incluindo as autoincriminatórias56

Se a rescisão for causada pelo órgão do Ministério Público, ao colaborador deve ser assegurada a manutenção dos benefícios concedidos e das provas produzidas. 46 STJ, 6ª Turma, RESp 1.834.215/RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. em

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27/10/2020, pub. no DJE de 12/11/2020.

1.3.8.10. Valor probatório

É importante que o colaborador traga elementos probatórios que demonstrem a confiabilidade de suas declarações, buscando-se evitar falsas colaborações com o fito exclusivo de obtenção de prêmios legais. É o que a doutrina chama de regra da corroboração

Havendo necessidade, o próprio colaborador deve ser formalmente ouvido em juízo, com a participação dialética das partes, assegurando-se ao(s) corréu(s) ou partícipe(s) delatado(s) a possibilidade do exercício do contraditório e da ampla defesa, conferindo, assim, ao ato o valor de prova.

É de se observar que as perguntas eventualmente formuladas ao delator pelo(s) advogado(s) do(s) delatado(s) sejam restringidas aos fatos que incriminam aquele(s), a fim de se garantir aocolaborador o direito de não produzir prova contra si mesmo, inclusive, quando julgarconveniente, exercer o direitoaosilêncio.

Por força da regra da corroboração, há vedação legal (art. 4º, § 16, Lei nº 12.850/2013) de decretação ou prolatação com fundamento apenas nas declarações docolaborador de: a) medidas cautelares reais ou pessoais; b) recebimento de denúncia ou queixa-crime; c) sentença condenatória.

Registre-se que parcela considerável da doutrina defende a inadmissibilidade da chamada corroboração recíproca ou cruzada (ou mutual corroboration), isto é, a confirmação de uma delação premiada unicamente por outra delação premiada, realizada por agente diverso, ainda que apresentem idêntico conteúdo, exigindo-se, para sua validade, convergência com elementos probatórios independentes.

Nesse diapasão: “[...] Não se admite a utilização da corroboração cruzada/recíproca, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos Embargos de Declaração na Ação Penal 1.015/DF, in verbis: “a jurisprudência do STF proíbe o uso da corroboração cruzada, ou seja, a utilização dos depoimentos de colaboradores como elementos de validação das declarações apresentadas por outros colaboradores, sob pena de se admitir uma tautologia no sistema de validação racional das provas” (AP 1015 ED, Relator(a): Edson FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR Mendes, Segunda Turma, julgado em 02/05/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-114 DIVULG 10-06-2022 PUBLIC 13-06-2022). 5. Agravo regimental desprovido”. (6a T., STJ, AgRg-REsp 2.097.217, Rel. Min. Jesuíno Rissato, pub. no DJE de 25/04/2024).

1.3.8.11. Compartilhamento das informações prestadas no acordo de colaboração premiada

Inexiste qualquer óbice para o compartilhamento das declarações prestadas pelo colaborador e documentos que instruem a colaboração premiada a fim de que possam ser apurados fatos que, em tese, configuram crime de competência de outro juízo, não conexos com oapurado nojuízo cedente.

A providência é amplamente admitida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 57 porquanto,aocontrário dacolaboração premiada, queé meiode obtençãodeprovas, ostermos de declaração do colaborador constituem meios de prova, configurando prova emprestada (Ver item 1.1.12).

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1.4. ENUNCIADOS DE SÚMULAS

1.4.1.SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Súmula 455 : A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso dotempo.

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Procedimentos 2

Não há que se confundir processo e procedimento: o primeiro é o conjunto de atos processuais que se sucedem, de forma coordenada, com a finalidade de resolver, jurisdicionalmente, o litígio47; o segundo é a forma de desenvolvimento do processo. É o ritoprocessual.

2.1. FASES DO PROCEDIMENTO PENAL

O procedimento penal é composto por 04 (quatro) fases:

a) fase postulatória: quando as partes apresentarão seus argumentos em favor do acolhimento do direito que entendem possuir;

b) fase instrutória: etapa em que serão produzidas as provas indicadas pelas partes oupelo juiz de ofício. A fase de instrução visa à reconstrução histórica do fato;

c) fase decisória: momento processual em que o julgador, por intermédio da sentença,irá se pronunciar sobre as provas carreadas aos autos, dando, motivadamente, a cadauma delas, o valor que julgar conveniente de acordo com o seu livre convencimento;

d) fase recursal: a parte, querendo, poderá interpor recurso das decisões judiciais em que foi sucumbente, parcial ou integralmente.

2.2. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO

O sursis processual é o instituto previsto no art. 89 da Lei nº 9.099/95 que permite a suspensão condicional do processo por um determinado período, denominado período de prova, mediante atendimento de condições acordadas entre as partes e homologadas judicialmente.

Para consegui-lo, é necessário que o beneficiado atenda aos seguintes requisitos:

a) esteja sendo acusado do cometimento de crime em que a pena mínima cominada é igual ou inferior a 01(um) ano, ressalvadas as hipóteses de infrações praticadas com violência doméstica ou familiar contra a mulher;

b) nãoesteja sendo processado ou nãotenha sido condenado por outrocrime;

c) não seja reincidente em crime doloso, e que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;

d) não haja indicação ou cabimento da substituição prevista no art. 44 do CP. Admite-se o benefício em relação aos crimes de ação penal de iniciativa privada.

A proposta de sursis processual será apresentada por iniciativa do titular do direito de ação (o órgão do Ministério Público ou o querelante), sendo vedado ao juiz oferecê-la de ofício.

Discordando o juiz de uma eventual recusa de oferecimento da aludida proposta, tratando-se de ação penal de iniciativa pública, deve aplicar, por analogia, o disposto no art. 28 do CPP, remetendo a questão para apreciação do Procurador-Geral de Justiça (ou para o órgão competente do MPF)48 .

80
47 FILHO, Fernando da Costa Tourinho. Manual de processo penal, 14. ed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 712. 48 Súmula 696 do STF.

Na ação penal de iniciativa privada, a recusa pelo querelante de oferecimento da proposta de suspensão condicional do processo inviabiliza o benefício.

Desclassificado o crime para outro delito que admita o sursis processual, deverá ser oportunizado ao órgão do Ministério Público que se manifeste sobre o oferecimento (ou não) da proposta do benefício. Adota-se idêntico procedimento diante de nova situação jurídica surgida a partir da absolvição do acusado em infração penal que, em razão de concurso de crimes, inviabilizava o benefício.

Apropósito,aSúmula337 doSTJ,expressa:“É cabível asuspensão condicionaldoprocesso na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva”.

Apresentada a proposta, será essa submetida à apreciação do acusado e doseu defensor, prevalecendo, caso divirjam, quanto à aceitação, a vontade do primeiro.

Rejeitada a proposta, a ação penal prosseguirá em seu curso normal.

Na hipótese de aceitação da proposta, o juiz, após homologá-la, receberá a denúncia (ou a queixa-crime), se já não o tiver feito, e, em seguida, suspenderá o processo pelo período de prova (02 a 04 anos) e nas condições acordadas, dentre as quais, sem prejuízo de outras especificadas pelo juiz, adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado:

a)reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;

b)proibição de frequentar determinados lugares; c)proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz; d)comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificarsuas atividades.

Nos termos da Súmula 667, do Superior Tribunal de Justiça, “Eventual aceitação de proposta de suspensão condicional do processo não prejudica a análise do pedido de trancamento de ação penal”.

Durante o período de prova, o lapso prescricional ficará suspenso (art. 89, § 6º, Lei nº 9.099/95).

A revogação da suspensão ocorrerá (art. 89, §§ 3º e 4º da Lei nº 9.099/95):

a) obrigatoriamente, se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano; b) facultativamente, se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ouse descumprir qualquer outra condição imposta.

É importante observar que o prazo prescricional não correrá durante o prazo de suspensãodo processo.

Expirado o período de prova sem que o benefício tenha sido revogado, o juiz declarará extinta a punibilidade.

2.3. CLASSIFICAÇÃO

Dispõe o art. 394 do CPP que o procedimento penal será comum ou especial

Nas hipóteses de conexão ou continência entre infrações penais sujeitas a ritos distintos será observado:

1) No concurso com crimes de competência do Tribunal do Júri, será aplicável o procedimento especial do Júri em virtude da força atrativa estabelecida no art. 78, I do CPP49;

2) Nos demais casos, por oferecer condições mais amplas de defesa, aplicar-se-á o procedimento comum ordinário.

49 Art. 78 do CPP: Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: I - no concur- so entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri; [...].

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Havendo conexão ou continência com infrações de menor potencial ofensivo será aplicado o disposto no art. 60, parágrafo único da Lei nº 9.099/95, com as alterações advindas da Lei nº 11.313/06, que expressa: “Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis”5061

2.4. PROCEDIMENTO COMUM

O procedimento comum se classifica em: procedimento ordinário, procedimento sumário e procedimento sumaríssimo.

2.4.1. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO

2.4.1.1. Previsão legal

Arts.394a 405doCPP.

2.4.1.2. Cabimento

O procedimento comum ordinário será aplicado ao processo que tenha por objeto infração penal com sanção máxima cominada igual ou superior a 04 (quatro) anos de pena privativa de liberdade.

2.4.1.3. Procedimento

1º Oferecimento de denúncia ou da queixa-crime

Havendo justa causa para a propositura da ação penal, será oferecida a denúncia ou a queixa-crime, de acordo com a natureza do crime (de iniciativa pública ou privada) imputado ao(s) investigado(s), que deverá atender aos requisitos formais estabelecidos no art. 41 do CPP:

a) O fato criminoso, com todas as suas circunstâncias:

É imprescindível que o acusador, na denúncia (ou na queixa-crime), não só individualize o fato tido como criminoso, com todas as suas circunstâncias, mas, também, qual a contribuição do acusadoparaa sua ocorrência, afim de queesse possaexercer,com plenitude, oportunamente, ocontraditório e a ampla defesa, defendendo-se da conduta criminosa que lhe é atribuída.

Deve ser demonstrada a existência do crime e indícios suficientes de sua autoria, sendo descabida uma acusação vaga, imprecisa ou alternativa.

Em se tratando de delito cometido em pluralidade de agentes (crimes de autoria coletiva),é dispensada a exigência de descrição detalhada das condutas dos corréus na execução do fato criminoso, desde que seja possível da narrativa extrair a plausibilidade da imputação e que cada um possa exercer o contraditório e o direito de defesa.

b) Individualização do denunciado (ou do querelado)

É indispensável a individualização do acusado, a qual poderá ser realizada mediante sua qualificação (total ou parcial) ou, quando não for possível, pela indicação de sinais característicos que permitam identificá-lo fisicamente na sociedade, tudo na forma prevista no art. 259 do CPP.

c) Classificação jurídica atribuída ao fato criminoso

Inobstante oacusado se defender da imputação fática narrada na denúncia ou na queixacrime, ao acusador cabe indicar a classificação jurídico-penal a ela atribuída.

50 O Pleno do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, em sessão virtual realizada de 27/11 a 04/12/2020, julgou improcedente o pedido formulado na ADI 5.264/DF, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República, para declarar constitucional os dispositivos que permitem o deslocamento de causas da competência dos Juizados Especiais Criminais para a Justiça Comum ou para o Tribunal do Júri, em casos de situação processual de conexão e continência.

82

d) Quando necessário, o rol testemunhal

Na peça inicial, deve a parte acusadora, dentro do limite máximo estabelecido por lei, conformeoprocedimentoaplicável,indicaraprovatestemunhal quepretendaproduzir durante ainstrução processual.

Além dos requisitos estabelecidos no art. 41 do CPP, por aplicação subsidiária das regras do art. 319 do CPC, deve a denúncia (ou a queixa-crime) conter:

a) o juízo a quem é dirigida;

b) a qualificação e o endereço do autor;

c) o pedido com as suas especificações;

d) as demais provas com que pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados.

No tocante à queixa-crime, acrescente-se o requisito específico referente à exigência de que a procuração outorgada aoadvogado contenha poderes especiais, mencionando o fatoem tese constitutivo do direito e o nome do querelado, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que deverão ser previamente requeridas no juízo criminal, conforme previsto no art. 44 do CPP.

• Proposta de suspensão condicional do processo: ver item 2.2.

2º Juízo de admissibilidade da denúncia ou da queixa-crime

Oferecida a petiçãoinicial (denúncia ou queixa-crime), a autoridade judiciária exercerá prévio juízo de admissibilidade, podendo, nos termos do art. 395, inciso I do CPP, rejeitar a peça liminarmente nos casos em que reconhecer:

a) a inépcia da inicial (inobservância dos requisitos formais do art. 41 do CPP);

b) a ausência de pressuposto processual ou de condição para o exercício da ação penal;ou c) faltar justa causa para o exercício da ação penal.

Por outro lado, se reconhecer, de ofício, sua incompetência para processar e julgar a ação penal, assim como circunstância que configure suspeição, impedimento ou incompatibilidade, deverá a autoridade judiciária remeter os autos para ojuízo competente ou para seu substituto legal, conforme o caso.

Recebida a denúncia (ou a queixa-crime), marco interruptivo da prescrição (art. 117, incisoI, CP), segue-se com a expedição de citação.

No entanto, a falta de recebimento formal da peça acusatória não nulifica o processo penal, uma vez que, sendo ato que dispensa maior fundamentação, não se subsume à norma prevista noart. 93, incisoIX da Carta Magna.

Desse modo, caso o juiz determine unicamente o prosseguimento do processo pela citação doacusadosemqueformalmente recebaa peçaacusatória inicial, será a data desse despacho o marco de recebimento da denúncia e, portanto, de interrupção da prescrição.

3º Citação

A parte acusada será citada para a apresentação de resposta à acusação, no prazo de 10(dez) dias.

No caso de citação por edital, o prazo para a defesa somente começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído em juízo.

(3.1) Suspensão do processo na hipótese do art. 366 do CPP

Citado por edital, seo acusado não comparecer, nem constituir advogado, será determinada a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes, e, se necessário, decretar-lhe a prisão preventiva (art. 366 do CPP).

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Todavia, o prazo prescricional ficará suspenso pelo lapso temporal previsto no art. 109 do Código Penal51 . Vencido o período da suspensão, a prescrição voltará ao seucurso regular, continuando o processo penal sobrestado.

O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo.

Comparecendo o acusado em juízo, prosseguirá na ação penal, a partir da fase em que o processose encontrar.

4º Resposta à acusação

Na resposta à acusação, o defensor técnico poderá suscitar preliminares, alegar tudo o que interessar à defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar até 08(oito) testemunhas numerárias, qualificando-as e requerendo suas intimações, quando necessário.

No mesmo prazo para a resposta à acusação, poderá arguir exceções (de suspeição, de incompetência, de ilegitimidade de parte, de litispendência ou de coisa julgada), as quais serão processadas em apartado.

Caso a defesa não apresente resposta à acusação, o juiz nomeará um defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10(dez) dias. A não apresentação de resposta à acusação implica em nulidade absoluta, por força do art. 564, inciso III, “e”, do CPP.

5º Réplica, se necessária

Apesar da falta de expressa previsão legal, por respeito ao princípio do contraditório, é reconhecida a necessidade de oitiva da parte acusadora sobre a resposta à acusação que suscitarpreliminares e causas de absolvição sumária, alegações, fatos ou provas de que a acusação não tinha prévia ciência.

6º Ratificação do recebimento da denúncia ou da queixa-crime

Diante da resposta à acusação e da réplica, se apresentada, a autoridade judiciária procederá à (ao):

• retratação do recebimento da denúncia (ou queixa-crime) desde que verifique qualquer das circunstâncias estabelecidas no art. 395 do CPP, isto é, inépcia, ausência de pressupostos processuais ou de condições para o exercício da ação penal, ou, ainda,falta de justa causa para a acusação. Da decisão que rejeita a denúncia (ou queixa- crime) caberá recurso em sentido estrito (art. 581, inciso I, CPP);

• extinção do processo com julgamento de mérito nos casos de reconhecimento da extinção de punibilidade ou, sem resolução de mérito, na exceção peremptória (litispendência ou coisa julgada);

• suspensão do processo, quando reconhecer questão prejudicial (arts. 92 e 93 do CPP) ou acolher exceção dilatória (suspeição, impedimento ou incompatibilidade);

• declinação de sua competência para conhecer da ação penal, remetendo os autos ao juízo que reputar competente;

• julgamento antecipado da lide, absolvendo sumariamente o acusado, quando reconhecer a existência de qualquer das hipóteses previstas no art. 397, incisos I, II eIII e IV do CPP: a) atipicidade do fato; b) existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;

51 CP, art. 109. Aprescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 desteCódigo, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: I - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze; II - em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze; III - em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito; IVem oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro; V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

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c) existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade, ou, d) ocorrência de causa de extinção de punibilidade.

• ratificação do recebimento da denúncia (ou da queixa-crime), quando deve:

a) inexistindo proposta de suspensão condicional do processo, designar audiência de instrução e julgamento, determinando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente para o ato (art. 399, CPP);

b) tendo sido apresentada com a inicial proposta de suspensão condicional do processo, designar audiência para oitiva do denunciado (ou querelado) sobre os termos propostos.

7º Audiência para oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo,se houver.

Ver item2.2.

8º Audiência de instrução e julgamento

Em atendimento aos arts. 400 a 405, todos do CPP, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, será realizada audiência de instrução e julgamento, intimando-se o acusado, seu defensor, o órgão do Ministério Público, e, se for o caso, o querelante e o assistente.

De igual modo, a vítima deverá ser cientificada para o ato (art. 201, § 2º, CPP).

Nessa audiência, serão tomadas as declarações do ofendido, seguindo-se a inquirição de até 08(oito) testemunhas indicadas pela acusação e, em igual número, pela defesa, nessa ordem, bem como serão prestados esclarecimentos por peritos, quando previamente requeridos pelas partes, seguindo-se a realização de acareações e o reconhecimento de pessoas e coisas, e, por fim, ointerrogatório do réu.

Não se compreende no limite de testemunhas numerárias aquelas que não prestam compromisso e as testemunhas referidas, assim como as pessoas que nada souberem que interesse à decisão da causa.

A parte poderá desistir da inquirição de qualquer das testemunhas que houver arrolado, salvo se o juiz reputar necessária sua oitiva. Ele, igualmente, poderá ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes52 .

Em seguida, será realizado o interrogatório do acusado, na forma prevista nos arts. 185 a 196 do CPP.

Há, ainda, o caso dos depoimentos prestados mediante carta, os quais, inclusive, poderão resultar na inversão da ordem processual de inquirição (em primeiro lugar, as testemunhas indicadas pela acusação, e, em seguida, as arroladas pela defesa). É que, segundo o disposto nos arts. 222 e 222-A, ambos do CPP, as cartas não suspendem a instrução criminal, podendo ser juntadas ao processo a qualquer tempo.

Encerrada a fase probatória, ao órgão do Ministério Público, ao querelante, ao assistente e aoacusadoserá concedida a oportunidade de requererem diligências, cuja necessidade surja a partir de circunstâncias oufatos apurados na instrução.

No entanto, em observância ao princípio da busca da verdade real, a jurisprudência pátria tem admitido a realização de diligência cuja necessidade já existia em momento anterior à audiência de instrução, desde que essa diligência se mostre útil ao esclarecimento do fato.

Prioriza-sea produção da provaemaudiência única,sendofacultadoaopresidente doato indeferir as provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias.

52 Art. 209. O juiz, quando julgar necessário, poderá ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes. § 1o Se ao juiz pare-cer conveniente, serão ouvidas as pessoas a que as testemunhas se referirem.

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Nolimitedetestemunhas numerárias, nãoestãocompreendidas aquelas quenãoprestam compromisso nem as testemunhas referidas, tampouco as pessoas que nada souberem que interesse à decisão da causa.

A parte poderá desistir da inquirição de qualquer das testemunhas que houver arrolado, salvo se o juiz reputar necessária a sua oitiva, podendo, igualmente, ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes.

Inexistindo pedido de diligências ou sendo este indeferido, segue-se com as alegaçõesorais pela acusação e pela defesa, nessa ordem, por 20(vinte) minutos para cada uma das partes,prorrogáveis por mais 10(dez) minutos.

Ao assistente do Ministério Público, se habilitado, após manifestação do parquet, será concedido o prazo de 10(dez) minutos para apresentar suas alegações finais, prorrogando-se, por igual período, o tempo de manifestação da defesa.

Por analogia, tratando-se de ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, aplica-se o disposto no art. 403, § 2º do CPP, pronunciando-se o órgão do Ministério Público após o querelante.

Em sendo mais de um acusado, o tempo previsto para a defesa de cada um deles será individual, ainda que patrocinados pelo mesmo advogado.

O registro da audiência será objeto de formalização em termo próprio. Deve ser assinado pelo juiz e pelas partes e conter breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos. Para maior fidelidade às informações prestadas nos depoimentos colhidos no ato, deve-se optar pela utilização de meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital outécnica similar, inclusive audiovisual, encaminhando-se às partes, nesse caso, cópia do registro original, sem necessidade de transcrição.

9º Apresentação de alegações finais em forma de memoriais, se for o caso

As alegações finais orais poderão ser substituídas por memoriais (alegações escritas), no prazosucessivo de 05(cinco) dias, quando:

a) ordenada diligência complementar, de ofício ou a requerimento da parte;

b) o acusado for interrogado mediante carta precatória;

c) o juiz, diante da complexidade do caso ou do número de acusados, julgar convenientea substituição.

O STF, em julgamento realizado no dia 02 de outubro de 2019, por maioria, concedeu ordem de habeas corpus, para anular a decisão do juízo de primeiro grau e determinar o retorno dos autos à fase de alegações finais para que se observasse a seguinte ordem de apresentação das alegações finais: primeiramente, a acusação, depois, o réu delator, e, por fim, o réu delatado53

A respeito das alegações finais é bom registrar que:

a) a sua apresentação pela acusação é obrigatória, em se tratando de ação penal de iniciativa pública, sob pena de nulidade absoluta, devendo a autoridade judiciária aplicar, subsidiariamente, o previsto no art. 28 do CPP, determinando a remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça para conhecimento da omissão e adoção de providências para supri-la;

b) na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, o não oferecimento de alegações finais por parte do querelante evidencia negligência, retomando o órgão do Ministério Público a titularidade da ação penal, na forma do art. 29, parte final do CPP;

c) na ação penal de iniciativa privada exclusiva ou personalíssima, o não oferecimentode alegações finais constitui causa de extinção de punibilidade em decorrência da perempção (art. 60, incisoIII, CPP);

86
53
HC nº 166373.

d) omissa a defesa quanto à apresentação de alegações finais, deverá ser intimado o acusado para constituir novo advogado, sob pena de nomeação de defensor dativo para suprir a falta. A providência tem por finalidade evitar violação às garantias do contraditório e da ampla defesa, o que importaria em nulidade absoluta.

10º. Sentença não prolatada em audiência

Se o juiz não prolatar a sentença em audiência, deverá fazê-lo no prazo de 10(dez) dias.

2.4.2. PROCEDIMENTO SUMÁRIO

2.4.2.1. Previsão legal

Arts. 531 a 538 do CPP.

2.4.2.2. Cabimento

Aplica-se o rito sumário aos crimes cuja sanção máxima cominada seja superior a 02(dois) e inferior a 04(quatro) anos de pena privativa de liberdade (exegese do art. 394, § 1º, CPP) e também às infrações de menor potencial ofensivo, quando oriundas do JuizadoEspecial Criminal (art. 538, CPP).

Nada impede a aplicação dos institutos despenalizadores previstos na Lei nº 9.099/95, se preenchidos os respectivos pressupostos objetivos e subjetivos.

2.4.2.3. Procedimento

Aplica-se o mesmo rito do procedimento comum ordinário ao procedimento sumário, comas seguintes alterações:

a) a audiência de instrução e julgamento deverá ser realizada no prazo máximo de 30 (trinta) dias;

b) poderãoser indicadas até 05(cinco) testemunhas por cada uma das partes;

c) nãohádiligências, salvo, evidentemente, quandodemonstradasuaimprescindibilidade para busca da verdade real;

d) inexiste previsão legal para substituição das alegações orais por memorais;

e) a sentença deverá ser proferida em audiência.

2.4.3. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO

2.4.3.1. Previsão legal

Art. 98, inciso I da Constituição Federal, art. 394, § 1º, III do CPP e Lei nº 9.099/95.

2.4.3.2. Cabimento

É o rito utilizado nos Juizados Especiais Criminais, os quais julgam as infrações penais de menor potencial ofensivo, que são as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 02 (dois) anos, cumulada ou não com multa, nos termos do art. 61 da Lei nº 9.099/95, com as alterações advindas da Lei nº 11.313/06

Para fixação da competência dos Juizados Especiais, e, consequentemente, do procedimento sumaríssimo, deve-se levar em consideração as causas de aumento e diminuição da pena, ou, quandocometidos dois ou maiscrimes, oresultado de seusomatório, respeitado o limite de 02(dois) anos para a pena máxima em abstrato.

Praticada a infração de menor potencial ofensivo em conexão ou continência com outro crime que não se enquadre no conceito, é inaplicável o procedimento sumaríssimo, embora possa ser cabível, quanto ao primeiro delito, a transação penal e a composição civil. Nesse

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contexto, no juízo prevalente54, deverá ser designada audiência preliminar para fins de tentativa de composição civil ou de transação penal quanto à infração de menor potencial ofensivo. Alcançado qualquer dos objetivos, o órgão do Ministério Público oferecerá a denúncia somente emrelaçãoao crime remanescente.

Entretanto, no âmbito das infrações penais cometidas em contexto de violência doméstica efamiliar contraa mulher, por força do disposto noart.41 da Lei nº 11.340/200655 , nãoseaplicam osinstitutos despenalizadores da Lei nº 9.099/95.

De modo diverso, estabelece o art. 94 da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), o qual prevê que, ainda que não se trate de infração de menor potencial ofensivo, o procedimento sumaríssimo estabelecido na Lei nº 9.099/95 será aplicado aos crimes naquela previstos, se a pena máxima cominada em abstrato não ultrapassar 04(quatro) anos. Não será cabível, porém, os institutos despenalizadores e de interpretação benéfica ao autor do crime nela previstos, consoante decidiu o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 3.096/DF56 .

Sob outro aspecto, a Lei nº 9.099/95 estabelece duas circunstâncias modificativas da competência dos Juizados Especiais Criminais:

a) se não for possível a citação pessoal do acusado (art. 66, parágrafo único); ou b) quando a complexidade ou as circunstâncias do caso impossibilitarem a formulação da denúncia (art. 77, § 2º).

2.4.3.3 Procedimento

1º Audiência preliminar

Encaminhado o termo circunstanciado de ocorrência (TCO) ao Juizado Especial Criminal, será designada audiência preliminar para a qual serão intimados o órgão do Ministério Público, a vítima e o autor do fato, e, se possível, o seu responsável civil, acompanhados de advogado57 .

Na audiência, de início, serão os presentes esclarecidos sobre a possibilidade de composição dos danos e da transação penal, quando cabível.

A conciliação será conduzida pelo juiz ou por conciliador sob sua orientação.

(1.1) Composição civil

A composição civil tem como objetivo a reparação do dano patrimonial eventualmente causado pelo ato criminoso. Obtida, será reduzida a termo e, após homologada pelo juiz, mediante sentença irrecorrível, com eficácia de título executivo, produzirá, conforme a natureza do delito, os seguintes efeitos:

• ação penal de iniciativa privada: renúncia ao direito de queixa (art. 74, parágrafo único da Lei nº 9.099/95);

• ação penal de iniciativa pública condicionada à representação: renúncia ao direito de representação (art. 74, parágrafo único da Lei nº 9.099/95);

• ação penal de iniciativa pública incondicionada: servirá como antecipação da certeza sobre o valor da indenização pelo dano causado pelo fato, em tese, criminoso, não impedindo a continuação do procedimento penal.

54 CPP, Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: I - no concursoentre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri; Il - no concurso de jurisdi- ções da mesma categoria: a) preponderará a do lugar da infração, à qual for cominada a pena mais grave; b) prevalecerá a do lugar em que houver ocorrido o maior número de infrações, se as respectivas penas foremde igual gravidade;c) firmar-se-á a competên- cia pela prevenção, nos outros casos; III - no concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de maior graduação; IV - no concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá esta.

55 Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.

56 STF, Tribunal Pleno, ADI 3.096, Rel. Minª Carmem Lúcia, julg. em 16.06.2010, publ. no DJe 164, de 03.09.2010.

57 Lei nº 9.099/95, art. 67. A intimação far-se-á por correspondência, com aviso de recebimento pessoal ou, tratando-se de pessoa jurí- dica ou firma individual, mediante entrega ao encarregado da recepção, que será obrigatoriamente identificado, ou, sendo necessá- rio, por oficial de justiça, independentemente de mandado ou carta precatória, ou ainda por qualquer meio idôneo de comunicação. Parágrafo único. Dos atos praticados em audiência considerar-se-ão desde logo cientes as partes, os interessados e defensores anteriormente concedida”. (5a T., HC 284.107; Proc. 2013/0401393-3; MG; Rel. Min. Jorge Mussi; DJE 21/08/2014).

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(1.2) Oferecimento (ou não) de representação

Na hipótese de crime de natureza pública condicionada à representação, não alcançada a composição civil dos danos, será oportunizado imediatamente ao ofendido apresentá-la verbalmente, reduzindo-a a termo (art. 75, caput da Lei nº 9.099/95).

Todavia, o não oferecimento da representação pela vítima na audiência preliminar não implicaemimediata decadência dodireito. É queestasomente poderáserreconhecida quando escoado o prazo decadencial estabelecido noart. 38 do CPP58 Nesse caso, osautos permanecerão sobrestados em cartório aguardando o atendimento da condição de procedibilidade (representação) oua ocorrência da decadência.

(1.3) Proposta de transação penal

Não obtido o acordo civil e havendo representação ou se tratando de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo o caso de arquivamento, o órgão do Ministério Público deverá apresentar proposta de transação penal, com a aplicação imediata de penas restritivas de direitos ou multa, quando o autor do fato satisfaça as exigências legais previstas no art. 76 da Lei nº 9.099/95:

a) não tenha sido condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva;

b) não tenha sido beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, de transação penal anterior;

c) não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.

Apresentada a proposta detransação penal, será essa submetida à apreciação doautor do fato e do seu defensor, prevalecendo, em caso de discordância quanto à aceitação, a vontade do primeiro.

Aceita a proposta, seguirá para exame judicial, oportunidade em que a autoridade judiciária, por sentença de natureza homologatória, aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, a qual não importará em reincidência, sendo registrada unicamente para impedir concessão do mesmo benefício nos 05(cinco) anos subsequentes. Trata-se de decisão de natureza declaratória.

Cumprido oacordo, será decretada a extinção da punibilidade do agente.

A transação penal não constitui direito subjetivo do autor do fato, não sendo o caso de a autoridade judiciária oferecê-la em substituição ao titular do direito de ação59 .

Por outro lado, para os crimes de ação penal de iniciativa privada, admite-se o cabimento da transação penal.

Na ação penal de iniciativa pública, quando o órgão do Ministério Público se recusar a apresentá-la, a autoridade judiciária poderá provocar a instância de revisão ministerial aplicando, por analogia, o disposto no art. 28 do CPP. Por sua vez, nada poderá fazer quando a recusa se der na ação penal de iniciativa privada, uma vez que só ao titular do direito de ação caberá ooferecimento da proposta de transação penal.

Sob outro diapasão, quanto às consequências decorrentes do descumprimento injustificado da transação penal, o Supremo Tribunal Federal editou o enunciado da Súmula Vinculante nº 35, cujo verbete estabelece: “A homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal, mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial”.

58 CPP, art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representa- ção, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime [...].

59 STF, 1ª T., Inq. 3.438, Rel. Min. Rosa Weber, j. 11/11/2014, DJe de 10/02/2015.

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Por falta de previsão legal, durante o cumprimento das condições acordadas em transação penal, inexiste suspensão ouinterrupção do curso da prescrição da pretensão punitiva estatal. (1.4) Apresentação de denúncia ou de queixa-crime

Não tendo sido aplicada a transação penal, o titular do direito de ação, oralmente, apresentará, de imediato, denúncia ou queixa-crime, se não houver necessidade de diligências, podendo indicar até 03(três) testemunhas6072 para serem ouvidas em juízo (art. 77, caput, Lei nº9.099/95).

A materialidade da infração, por seu turno, poderá ser comprovada por boletim médico ou prova equivalente, prescindindo-se do exame de corpo de delito (art. 77, § 1º, Lei nº 9.099/95).

Se a complexidade ou circunstâncias do caso não permitirem a formulação da denúncia, serão os autos remetidos para o juízo comum, no qual seguirá o procedimento sumário.

Com o oferecimento da peça inicial acusatória, inicia-se o procedimento sumaríssimo propriamente dito.

2º Citação

Apresentada a denúncia (ou a queixa-crime), será reduzida a termo, entregando-se cópia ao acusado que com ela ficará citado e imediatamente cientificado da designação de dia e hora para a audiência de instrução e julgamento.

Não estando presente na audiência preliminar, o acusado será citado, na forma dos arts. 66 e 68 da Lei nº 9.099/95, e cientificado da data da audiência de instrução e julgamento. Para essa audiência, o acusado deverá trazer suas testemunhas, independentemente de intimação, ouapresentar requerimento para intimação delas, no mínimo, 05(cinco) dias antes darealização doato.

A citação será sempre pessoal. Caso o acusado não venha a ser encontrado, serão as peçasexistentes encaminhadas para o juízo comum (art. 66, parágrafo único da Lei nº 9.099/95).

3ª - Audiência de instrução e julgamento

No diae hora designados para audiência de instrução e julgamento, não sendo a hipótese de tentativa de composição civil ou de oferecimento de proposta de transação penal, por já ter sido ofertada na fase anterior, após abertos os trabalhos, faculta-se ao defensor apresentar defesa preliminar oral, respondendo à acusação, sendo adequado arguir circunstâncias que levem à rejeição da peça acusatória inicial ou eventual absolvição sumária e especificação de provas.

A ausência do acusado na ação penal de iniciativa pública ou de iniciativa privada importará na impossibilidade de conciliação (composição civil outransação penal) ou na não realização do seu interrogatório, nos moldes do art. 81, caput da Lei nº 9.099/95.

Na ação penal de iniciativa privada, a ausência do querelante importará em perempção (art. 60,inciso III, CPP).

O não comparecimento de qualquer das testemunhas poderá ensejar a sua condução coercitiva, nos termos do art. 80 da Lei nº 9.099/95.

Rejeitada liminarmente a peça acusatória inicial61 , caberá recurso de apelação, no prazo de 10(dez) dias, por petição escrita, da qual constarão as razões e o pedido do recorrente, intimando-se o recorrido para apresentar resposta escrita em igual prazo. Esse recurso será julgado pela turma recursal dos juizados especiais criminais, tudo na forma prevista no art. 82 da Lei nº 9.099/95.

Em sendo o caso, será concedida a palavra à acusação para oferecer proposta de suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89, Lei nº 9.099/95, ouvindo-se o acusado e seu

60 Diante do silêncio da lei, há quem sustente que o número legal de testemunhas seria de 05 (cinco), utilizando-se das regras esta- belecidas no procedimento sumário (art. 532, CPP), ou, ainda, 08 (oito), número legal para o procedimento ordinário (art. 401, CPP). Adotamos posicionamento doutrinário que aplica o número legal previsto para as ações cíveis no juizado especial (art. 34 da Lei nº9.099/95).

61 CPP, art. 395. A denúncia ou a queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.

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defensor sobre as condições propostas, adotando-se, em caso de aceitação, as providências contidas no referido dispositivo legal (ver item 2.2).

Para parcela da doutrina, muito embora a literalidade do artigo legal mencionado no parágrafo anterior preveja o contrário, a boa técnica processual recomenda que o momento adequado para oferecimento do sursis processual deve ser depois do recebimento da denúncia e antes do início da instrução, evitando-se, assim, a análise do instituto sem que se tenha a certeza de admissibilidade da acusação já que, em tese, existe a possibilidade de se absolver sumariamente o acusado62

Recebida a denúncia (ou a queixa-crime), não sendo a hipótese de absolvição sumária, nem de suspensão condicional do processo, prossegue-se a audiência com a produção dos depoimentos da vítimae dastestemunhas indicadas pela acusaçãoe pela defesa,interrogandose, em seguida, o acusado, se presente. Ato contínuo, passam-se aos debates orais e à sentença que, dispensado relatório, mencionará os elementos de convicção do seu prolator.

Da sentença, caberá apelação, no prazo de 10(dez) dias (art. 82 da Lei nº 9.099/95).

2.5. PROCEDIMENTOS ESPECIAIS PREVISTOS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

2.5.1. TRIBUNAL DO JÚRI

2.5.1.1. Previsão legal

Art. 5º, inciso XXXVIII da CF earts. 406 a 497 doCPP.

2.5.1.2. Cabimento

O Tribunal do Júri é competente para processar e julgar os crimes dolosos contra a vida (homicídio, induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, infanticídio e aborto), tentados ou consumados, eoscom eles conexos, consoante expressa oart.5º, inciso XXXVIII da Constituição Federal c/c o art. 78, inciso I do Código de Processo Penal.

2.5.1.3. Composição

O Júri é composto de 01 (um) Juiz Togado, como seu presidente, e de 25 (vinte e cinco) jurados, dentre os quais serão sorteados 07(sete) para formar o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.

2.5.1.4. Jurados

O serviço do Júri é obrigatório para os cidadãos maiores de 18(dezoito) anos de notória idoneidade (art. 436, caput, CPP) e facultativo aos maiores de 70(setenta) anos de idade (art. 437, CPP).

Inobstante não existir previsão legal, torna-se lógico que o jurado resida em localidade pertencente à comarca (ou subseção) do Júri, uma vez que é sua característica ser a pessoa pronunciada julgada pelos seus concidadãos.

Nenhum cidadão poderá ser alijado dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau deinstrução (art. 436, § 1º, CPP).

Ainda que seja irrelevante o grau de instrução do jurado, obviamente, é necessário que seja alfabetizado e possua saúde física e mental compatível com a função.

Porém, estão isentos do serviço do júri:

a) o Presidente da República e os Ministros de Estado;

62 CPP, art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa ex- cludente da culpabilidade do agente, salvoinimputabilidade;III- queo fato narradoevidentemente nãoconstituicrime;ou IV-extinta a punibilidade do agente.

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b) os Governadores e seus respectivos Secretários;

c) os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Distrital e Municipais;

d) os Prefeitos Municipais;

e) os Magistrados e membros do Ministério Público e da Defensoria Pública;

f) os servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública;

g) as autoridades e os servidores da polícia e da segurança pública;os militares em serviço ativo;

h) aqueles que orequererem, demonstrando justo impedimento.

Diante do caráter impositivo do serviço doJúri, a recusa injustificada dojurado em dele participar poderá resultar em multa em seu desfavor no valor de 01(um) a 10(dez) salários mínimos, a critério da autoridade judiciária, de acordo com a sua condição econômica.

Entretanto, admite-se a recusa fundada em escusa de consciência63, isto é, motivada por convicção religiosa, filosófica ou política, desde que haja o cumprimento de serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos enquanto não prestar o serviço alternativo imposto (art. 438, CPP).

O serviço alternativo, a ser estabelecido em contrapartida pelo juiz atendendo aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, será cumprido mediante o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, no Poder Judiciário,naDefensoria Pública,noMinistérioPúblicoouementidadeconveniada paraessefim.

O exercício efetivo da função de jurado, nos termos dos arts. 439 e 440 do CPP:

a) constituirá serviço público relevante;

b) estabelecerá presunção de idoneidade moral;

c) assegurará preferência, em igualdade de condições, nas licitações públicas e no provimento, mediante concurso, de cargo ou função pública, bem como nos casos de promoção funcional ou remoção voluntária;

d) conferirá direito à prisão especial até o julgamento definitivo (art. 295, inciso X, CPP).

O jurado sorteado que comparecer à sessão de julgamento não sofrerá qualquer descontonos seus vencimentos ou salários.

No exercício da função ou a pretexto de exercê-la, o jurado é considerado funcionário público para os efeitos penais64, sendo responsável criminalmente nos mesmos termos em que são os juízes togados.

2.5.1.5. Alistamento

Para composição do corpo de jurados, anualmente, serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri:

a) de 800 (oitocentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes;

b) de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes; e

c) de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população.

Caso necessário, poderá ser aumentado o número de jurados e, ainda, organizada lista de suplentes, depositadas as cédulas respectivas em urna especial.

Por sua vez, o jurado que tiver integrado o Conselho de Sentença nos 12 (doze) meses que antecederem à publicação da lista geral ficará dela excluído.

63 “Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para exi- mir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;” (art. 5º, VIII, CF). “É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: (…) IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII; [...]” (art. 15, CF).

71 64 Art. 327 do Código Penal.

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Para formar a lista, o juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado.

Composta a lista geral dos jurados, com indicação das respectivas profissões, deverá ser publicada até o dia 10(dez) de outubro de cada ano e divulgada em editais afixados à porta do Tribunal do Júri para conhecimento da sociedade, podendo qualquer do povo formular reclamação ao juiz presidente até o dia 10(dez) de novembro subsequente. Decididas as reclamações eventualmente apresentadas, inexistindo, ainda, motivos para alteração de ofício, no mesmo dia a lista definitiva será publicada definitivamente.

Os nomes e endereços dos alistados, em cartões iguais, após verificação na presença do Ministério Público, de representante da Ordem dos Advogados do Brasil e de defensor indicado pelas Defensorias Públicas, permanecerão guardados em urna fechada a chave, sob a responsabilidade do juiz presidente.

2.5.1.6. Reunião periódica

É a época do ano estabelecida pela legislação de organização judiciária local para a realização das sessões de julgamento do Tribunal do Júri.

A pauta de julgamentos será confeccionada de acordo com os processos prontos para ira Plenário, observando-se, salvo motivo relevante, a ordem abaixo:

a) os acusados presos;

b) dentre os acusados presos, aqueles que estiverem há mais tempo na prisão; c) emigualdade de condições, os precedentemente pronunciados.

Será possível a inclusão de novos processos até o dia anterior ao estabelecido para a primeira sessão da reunião periódica, quando deverá ser afixada a pauta de julgamentos para o período que, aliás, poderá ter datas reservadas para a inclusão de processo que eventualmentetiver ojulgamento adiado dentro da mesma reunião periódica.

O sorteio dos jurados que irão atuar na reunião periódica será realizado entre o 15º (décimo quinto) e o 10º (décimo) dia útil antecedente à sua instalação, a portas abertas, cabendo aojuiz retirar as cédulas da urna até completar o número de 25(vinte e cinco) jurados.

Para o ato, deverão ter sido intimados o órgão do Ministério Público, as representações da Ordem dos Advogados do Brasil e da Defensoria Pública, cujas presenças, no entanto, não são obrigatórias.

Os jurados sorteados serão convocados, pelo correio ou por qualquer outro meio hábil, para comparecer no dia e hora designados para o início das sessões da reunião periódica, sob as penas da lei65 .

A relação dos jurados convocados, os nomes do acusado e dos procuradores das partes, além do dia, hora e local das sessões de instrução e julgamento serão afixadas na porta do edifício do Tribunal do Júri.

Incluído o processo na pauta, serão intimadas para a sessão de julgamento as partes, o ofendido, se possível, as testemunhas e os peritos, quando houver.

O assistente de acusação, ainda não admitido na ação penal, somente atuará se requerer sua habilitação até 05(cinco) dias antes da sessão de julgamento.

65 CPP, Art. 442. Ao jurado que, sem causa legítima, deixar de comparecer no dia marcado para a sessão ou retirar-se antes de ser dispensado pelo presidente será aplicada multa de 1 (um) a 10 (dez) salários-mínimos, a critério do juiz, de acordo com a sua con-dição econômica.

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2.5.1.7. Procedimento

Trata-se de um procedimento bifásico:

1ª Fase: Fase do juízo de admissibilidade da acusação ou fase de instrução, também denominada de fase do sumário de culpa (iudicium accusationis), a qual se inicia com o oferecimento da peça acusatória e segue até o juízo de admissibilidade da acusação (impronúncia, absolvição sumária, desclassificação, pronúncia);

2ª Fase: Fase de julgamento (iudicium causae) diz respeito ao julgamento em plenário e a seusatos preparatórios.

2.5.1.7.1. Juízo de admissibilidade da acusação (1ª fase)

Aplica-se o mesmo rito do procedimento comum ordinário, cabendo ao juiz, após a apresentação das alegações finais, proferir decisão de desclassificação, absolvição sumária, impronúncia ou pronúncia, a saber:

a) Desclassificação

Decisão interlocutória simples que conclui por desclassificar o crime denunciado paradelito não doloso contra a vida, de modo a afastar a competência do Tribunal do Júri para o seu julgamento, procedendo-se a remessa do processo para análise do juízo competente (art.419, CPP).

b) Absolvição sumária

A absolvição sumária é decisão com julgamento de mérito, sendo, portanto, sentença, e fazendo, em consequência, coisa julgada formal e material.

Será proferida quando a autoridade judiciária reconhecer estar provada a inexistência do fato, não ser o denunciado o autor ou partícipe do fato, que o fato não constitui infração penal, ou, ainda, quando for demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão de crime (art. 415, CPP).

c) Impronúncia

Decisão com força definitiva, embora, erroneamente, o legislador a designe como sentença no art. 416 do CPP. Não há julgamento de mérito, não fazendo, em consequência, coisa julgada material, mas, apenas, coisa julgada formal, e, portanto, enquanto não ocorrer a extinção de punibilidade, é cabível a formulação de denúncia ou de queixa-crime, diante do surgimento de prova nova (art. 414, parágrafo único, CPP).

A impronúncia será proferida quando a autoridade judiciária não se convencer da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação (art. 414, CPP).

d) Pronúncia

Decisãointerlocutória mista nãoterminativa, a qual sujeita o pronunciado a julgamento perante o plenário do Tribunal do Júri pelo(s) crime(s) nela reconhecido(s), quando a autoridade judiciaria que a proferiu se convencer da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação (art. 413, caput, CPP).

A decisão de pronúncia não valora o mérito da acusação, restringindo-se a examinar o fumus boni iuris acusatório, sem abusar da linguagem acusatória e sem extrapolar a simples demonstração da ocorrência dos seus pressupostos legais.

Porém, não se admite que a pronúncia seja proferida com apoio exclusivamente em elementos de informação produzidos, única e unilateralmente, na fase de inquérito policial ou de procedimento de investigação criminal instaurado pelo Ministério Público, sob pena de

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frontal violação aos postulados fundamentais que asseguram a qualquer acusado o direito ao contraditório e à plenitude de defesa.

A pronúncia apontará o(s) dispositivo(s) legal(ais) em que incorrer o(s) pronunciado(s) e especificará as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena (art. 413, § 1º, CPP), utilizando, se necessário, as regras da emendatio libelli (art. 418, CPP)66 ou da mutatiolibelli (art. 411, § 3º, CPP)67

Com relação a eventual infração conexa, o juiz pronunciante a incluirá na decisão, sem proceder a qualquer análise sobre sua admissibilidade ou sobre seu mérito, limitando-se ao exame da conexidade, remetendo-a a julgamento, juntamente com o crime de competência própria do Tribunal do Júri.

A pronúncia não faz coisa julgada material, podendo sofrer alteração diante de circunstância superveniente que altere a classificação do crime (art. 421, § 1º, CPP). Para melhor compreensão, veja-se o exemplo doutrinário clássico em que o denunciado foi pronunciado por homicídio em sua forma tentada e, antes da sessão de julgamento perante o Tribunal do Júri, a vítima veio a óbito em consequência da conduta imputada ao agente. Nesse caso, deve-se adequar a acusação à nova situação fática, mediante o procedimento pertinente à mutatio libelli.

Na pronúncia, o magistrado deve, ainda, deliberar sobre a manutenção, revogação ou substituição da prisão ou da medida restritiva de liberdade anteriormente decretada, ou, se o pronunciado estiver solto, quanto à eventual decretação ou imposição de quaisquer das medidas cautelares diversas da prisão, tudo na forma prevista no art. 413, § 3º do CPP.

Ademais, é a decisão de pronúncia uma das causas interruptivas da prescrição da pretensãopunitiva estatal (art. 117, inciso II, CP).

Por sua vez, a intimação da decisão, nos moldes do art. 420 do CPP, dar-se-á:

a) pessoalmente ao pronunciado, ao defensor nomeado e ao Ministério Público; b)ao defensor constituído, ao querelante (por seu advogado) e ao assistente do Ministério Público (por seu advogado), mediante publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca, incluindo, sob pena de nulidade, o nome do acusado; c) não sendo o pronunciado solto encontrado, a intimação se dará por edital, cujo prazo, diante do silêncio da lei, será o previsto no art. 361 do CPP, isto é, 15(quinze) dias por ser o único estabelecido para ato editalício, com fluência a partir de sua publicação oficial e início da contagem do prazo para eventual recurso após o seu término.

A pronúncia fixa os limites objetivos da acusação dedutível no plenário do Tribunal do Júri, passando-se, com a sua preclusão, para a segunda fase do procedimento.

2.5.1.7.2. Atos preparatórios e julgamento em plenário (2ª fase)

A segunda fase do procedimento dos processos de competência do Tribunal do Júri diz respeito aos atos preparatórios e ao julgamento em plenário.

Sinopticamente:

1º Juiz Presidente do Tribunal do Júri

Pronunciado o réu, inicia-se a segunda fase do procedimento do Tribunal do Júri, cabendo aoseujuiz presidente ordenar os atos preparatórios para ojulgamentoem plenário.

2º Convocação da reunião periódica

Ver item2.5.1.6.

66 Ver item3.2.2.3.1.

67 Ver item3.2.2.3.2.

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3º Inclusão na pauta de sessões

Em seguida, a autoridade judiciária fará relatório sucinto do processo, determinando a sua inclusão na pauta da próxima reunião periódica do Tribunal do Júri.

Para maior detalhamento, remetemos o leitor ao item 2.5.1.6.

4º Intimação das partes para apresentação de pedido de diligências e/ou roltestemunhal

O juiz presidente do Tribunal do Júri, na forma do art. 422 do CPP, determinará a intimação das partes para, no prazo de 05(cinco) dias, indicarem, querendo, cada uma, até o máximo de 05(cinco) testemunhas para depor em plenário, independentemente de terem sido ouvidas na fase investigativa e/ou na primeira fase do procedimento.

Na oportunidade, as partes deverão declarar expressamente se o fazem em caráter de imprescindibilidade, postulando, em caso positivo, suas intimações.

Feita a ressalva da imprescindibilidade, uma eventual ausência ao julgamento importará noadiamento da sessão, àluz doart. 461 do CPP.

Na ocasião, as partes poderão, ainda, juntar documentos e requerer diligências.

5º Despacho saneador e realização de diligências, se houver

O juiz deliberará sobre os requerimentos de provas a serem produzidas ou exibidas no plenário do Júri, ordenando as diligências necessárias para sanar eventual nulidade ou para esclarecer fatos que interessem ao julgamento.

6º Sessão de julgamento

No dia e hora designados, em sessão pública, será realizado o julgamento pelo Tribunal do Júri, observando-se:

(6.1) Presidência dos trabalhos

O julgamento em Plenário do Tribunal do Júri será presidido por um juiz togado que, na condução dos trabalhos, dentre outras atividades, terá responsabilidade de:

• Regular a polícia das sessões e prender os desobedientes;

• Requisitar o auxílio da força pública, que ficará sob sua exclusiva autoridade;

• Dirigir os debates, intervindo em caso de abuso, excesso de linguagem ou mediante requerimento de uma das partes;

• Resolver as questões incidentes que não dependam de pronunciamento do júri;

• Nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o conselho e designar outro dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor;

• Mandar retirar da sala o acusado que dificultar a realização do julgamento, o qual prosseguirá sem a sua presença;

• Suspender a sessão pelo tempo indispensável à realização das diligências requeridas ouentendidas necessárias, mantida a incomunicabilidade dos jurados;

• Interromper a sessão por tempo razoável, para proferir sentença e para repouso ou refeição dos jurados;

• Decidir, de ofício, ouvidos o Ministério Público e a defesa, ou a requerimento de qualquer destes, a arguição de extinção de punibilidade;

• Resolver as questões de direito suscitadas no curso do julgamento;

• Determinar, de ofício, a requerimento das partes ou de qualquer jurado, as diligências destinadas a sanar nulidade ou a suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade;

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• Regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 03 (três) minutos para cada aparte requerido, os quais serão acrescidos ao tempo desta última.

(6.2) Abertura dos trabalhos

Antes da instalação dos trabalhos da sessão de julgamento, o juiz presidente verificará se as partes e as testemunhas estão presentes norecinto, e, em caso de ausência:

a) membro do Ministério Público:

Adiamento do julgamento para o primeiro dia desimpedido da mesma reunião, cientificadas as partes e as testemunhas, se houver. Na hipótese de ausência não justificada, o fato será imediatamente comunicado à Chefia da Instituição, informandolhe, inclusive, a data designada para a nova sessão (art. 455, CPP);

b) advogado do querelante:

Na hipótese de ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, se não houver justificativa aceita, evidencia-se negligência a ensejar a retomada da titularidade do processo pelo Ministério Público (art. 29, CPP);

Na ação penal em que há conexão com crime de natureza privada, ocasionará,em relação a este crime, a perempção68 , com a consequente extinção de sua punibilidade;

c) advogado do assistente:

Havendo sido intimado regularmente, realizar-se-á o julgamento (art. 457, CPP);

d) advogado do acusado:

Ausente o defensor público que funcionar na causa, injustificadamente, será comunicada a sua falta à Chefia da Defensoria Pública para as providências cabíveis, designando-se nova data para julgamento;

Na hipótese de advogado particular, se não houver escusa legítima para a ausência,será adiada a sessão, por uma única vez, intimando-se a Defensoria Pública para o novo julgamento, cuja realização deverá acontecer no primeiro dia desimpedido da reunião periódica, observado o prazo mínimo de 10(dez) dias. Todavia, se o advogado constituído comparecer na nova data, funcionará no ato. Em relação aofaltoso, será dado conhecimento do fato ao presidente da seccional da Ordem dosAdvogados do Brasil, com a data designada para a nova sessão;

e) qualquer testemunha:

Importará no adiamento do julgamento, se uma das partes tiver requerido a intimação da faltosa por mandado, declarando, na ocasião, não prescindir do depoimento. Se foi intimada, o juiz-presidente poderá suspender os trabalhos e mandar conduzi-la coercitivamente ou adiar o julgamento para o primeiro dia desimpedido, ordenando a sua condução coercitiva. Porém, o julgamento será realizado, quando a testemunha não for encontrada no local indicado pela parteque a indicou. As testemunhas que, sem justa causa, deixarem de comparecer ao julgamento, sem prejuízo do crime de desobediência, estarão sujeitas ao pagamento de multa;

f) acusado:

Causará o adiamento do julgamento, caso seja aceita eventual justificativa. Do contrário, comprovada sua regular intimação para o ato, este será realizado sem a sua

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68 Art. 60 do CPP.

presença. Tratando-se de acusado preso, sua apresentação em juízo será deresponsabilidade da autoridade que otiver sob custódia.

Os pedidos de adiamento da sessão e as justificações de não comparecimento deverão ser, exceto comprovado motivo de força maior, previamente submetidos à apreciação do juiz presidente do Tribunal do Júri (art. 457, § 1º, CPP).

Outrossim, o uso de algemas pelo acusado no plenário somente será possível se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes, consoante estabelece o art. 474, § 3º do CPP.

(6.3) Instalação da sessão

Presentes as partes, e, se for ocaso, testemunhas e acusado, passa-se à chamada nominal dos 25(vinte e cinco) jurados sorteados para a reunião periódica, a fim de verificar se estão presentes, devendo o juiz presidente declarar instalados os trabalhos se, pelo menos, 15 (quinze) jurados tiverem comparecido69, anunciando, em seguida, o processo que será submetido a julgamento.

Inexistindo o número mínimo legal, proceder-se-á ao sorteio de quantos suplentes forem necessários para substituir os faltosos, designando data para nova sessão de julgamento e expedindo-se as respectivas notificações (arts. 434 e 435 do CPP).

Declarando o juiz-presidente que há número mínimo legal, será instalada a sessão, passando o oficial de justiça a fazer o pregão, anunciando, em voz alta, o processo que será submetido a julgamento, com menção expressa ao nome do juiz que o preside, do acusado, do órgão do Ministério Público e do defensor, informando se há testemunhas a serem ouvidas.

Tãologo concluído o pregão, deverão as partes, sob pena de preclusão, arguir eventuais nulidades relativas ocorridas posteriormente à pronúncia.

(6.4) Formação do Conselho de Sentença

O Conselho de Sentença será composto por 07(sete) membros, sorteados dentre os jurados presentes.

Antes da escolha, o presidente do Tribunal do Júri esclarecerá sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades constantes dos arts. 448 e 449, ambos do CPP70 . Repitase: aqueles que forem eventualmente excluídos por impedimento, suspeição ou incompatibilidade serão considerados para a constituição do número legal exigível para a realização da sessão.

Os jurados serão advertidos que, uma vez sorteados, não poderão manter comunicação entresioucomoutrem,nemmanifestar suaopiniãosobreoprocesso,tudosobpenadeexclusão do Conselho e sujeição a multa. Dita incomunicabilidade, ao final, será certificada nos autos por oficial dejustiça.

O impedimento, suspeição ou incompatibilidade poderão ser reconhecidos espontaneamente pelo próprio jurado ou arguidos oralmente por qualquer das partes, imediatamente após a escolha e anúncio do nome. Nesse último caso, o jurado será ouvido e, se não reconhecer a circunstância, terá o requerente a oportunidade de comprovar o alegado, decidindo, em seguida, a autoridade judiciária. Acatada a exceção, será o jurado excluído, prosseguindo-se com osorteio.

Duranteosorteio, cada umadaspartes poderárecusarojurado escolhido(Art.468,CPP):

69 CPP, art. 451. Os jurados excluídos por impedimento, suspeição ou incompatibilidade serão considerados para a constituição do número legal exigível para a realização da sessão.

70 Art. 448. São impedidos de servir no mesmo Conselho: I – marido e mulher; II – ascendente e descendente; III – sogro e genro ounora; IV – irmãos e cunhados, durante o cunhadio; V – tio e sobrinho; VI – padrasto, madrasta ou enteado. § 1º O mesmo impedi- mento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar. § 2º Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados.

Art. 449. Não poderá servir o jurado que: I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior; II – no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado; III – tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado.

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a) motivadamente: em número ilimitado;

b) imotivadamente: até o número de 03(três), primeiramente, a defesa, e, em seguida, o Ministério Público.

As recusas imotivadas devem incidir isoladamente para cada um dos acusados, independentemente de serem defendidos por um único advogado ou causídicos diversos.

Caso, em razão das recusas pela acusação e pela defesa, não seja alcançado o número mínimo de 07(sete) jurados para compor o Conselho de Sentença, o julgamento será cindido.

Nessa hipótese, será julgado primeiramente o acusado a quem foi atribuída a autoria do fato, aplicando-se, em caso de coautoria, o critério de preferência estabelecido no art. 429 do CPP7184 .

Formado o Conselho de Sentença, o juiz presidente, levantando-se, e, com ele, todos os presentes, fará aos jurados a seguinte exortação: “Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciênciae os ditames da justiça”

Chamados nominalmente pelo juiz, os jurados, individualmente, responderão: “Assim o prometo”.

Em seguida, receberão cópias da pronúncia, ou, se for o caso, das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, e do relatório do processo, que não poderá conter qualquer análise meritória e apreciação de natureza subjetiva.

(6.5) Instrução

Na instrução, em plenário, o juiz-presidente, o órgão do Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão, direta e sucessivamente, as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as testemunhas porventura indicadas para serem ouvidas em plenário. Primeiramente, as que tiverem sido arroladas pela acusação e, em seguida, as arroladas pela defesa.

Se algum dos jurados desejar formular perguntas, essas serão feitas por intermédio do juiz-presidente, a fim de preservar a incomunicabilidade.

Urge esclarecer que, ao contrário do procedimento comum em que não se computa, no número legal de testemunhas indicadas pelas partes, aquelas que não prestem compromisso legal e as referidas (art. 401, § 1º, CPP), o procedimento no Tribunal do Júri não as exclui do limite máximo permitido (art. 406, § 2º, CPP).

As partes e os jurados poderão requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimentos dos peritos, bem como a leitura de peças que digam respeito, exclusivamente,às provas colhidas por carta precatória e às provas cautelares, antecipadas ou não repetíveis.

O juiz-presidente procederá ao interrogatório do acusado, indagando dos jurados se há algo que desejam que seja esclarecido, facultando, em seguida, a palavra ao órgão do Ministério Público, aoassistente, ao querelante e ao defensor, nessa ordem, para, querendo, formularem suas perguntas diretamente ao interrogando.

O registro dos depoimentos e do interrogatório será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, eletrônica, estenotipia ou técnica similar destinada a obter maior fidelidade e celeridade na colheita da prova, devendo a transcrição do registro, após feita a degravação, ser acostada aos autos.

(6.6) Debates

Encerrada a instrução, passam-se aos debates.

As partes terão o prazo de 01 (uma) hora e 30(trinta)minutos, cada uma, acrescido em01 (uma) hora, na hipótese de mais de umacusado.

71 Art. 429. Salvo motivo relevante que autorize alteração na ordem dos julgamentos, terão preferência: I – os acusados presos; II – dentre os acusados presos, aqueles que estiverem há mais tempo na prisão; III – em igualdade de condições, os precedentemente pronunciados.

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Havendo mais de um acusador ou defensor, a distribuição do tempo será resultado de acordo entre eles, ou, na sua falta, dividido pelo juiz-presidente.

As partes não poderão fazer uso de argumento de autoridade, vedando-se, nos termosdo art. 478 do CPP, fazer referência:

a) à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem oacusado72;

b) ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, emseu prejuízo.

Por outro lado, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, em sessão virtual realizada de 05 a 12/03/2021, referendou a concessão parcial da medida cautelar na ADPF 779 para: “(i) firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção à vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF); (ii) conferir interpretação conforme à Constituição aos arts. 23, inciso II, e 25, caput e parágrafo único, do Código Penal e ao art. 65 do Código de Processo Penal, de modo a excluir a legítima defesa da honra do âmbito do instituto da legítima defesa e, por consequência, (iii) obstar à defesa, à acusação, à autoridade policial e ao juízo que utilizem, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza à tese) nas fases pré-processual ou processual penais, bem como durante julgamento perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e dojulgamento”.

A palavra, em primeiro lugar, será concedida ao órgão do Ministério Público para que, dentro dos limites da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, sustente sua tese, e, caso necessário, a existência de circunstância agravante. Na sequência, falará o advogado do assistente, se houver. Em sendo ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, inverte-se a ordem.

Em seguida, a defesa terá a palavra para se opor à pretensão punitiva pugnada pela acusação, ainda que apresente tese distinta daquela apresentada na primeira fase processual.

Concluído o pronunciamento da defesa, ojuiz-presidente indagará da acusação se deseja ir à réplica, pelo prazo máximo de 01(uma) hora, salvo havendo mais de um acusado, caso em que o tempo será elevado para 02(duas) horas, sendo facultado ao advogado do assistente, se houver, utilizar-se doreferido momento processual, ainda que o Ministério Público nãotenha interesse de replicar.

Ocorrendo a réplica, passará a defesa a ter direito à tréplica, pelo prazo máximo de 01(uma) hora, ou de 02(duas) horas, se dois ou mais acusados, dividindo-se o tempo total se forem defendidos poradvogados distintos.

A inovação na tréplica de tese ainda não suscitada no processo é tema controvertido, carecendo de unanimidade jurisprudencial. No Superior Tribunal de Justiça, prevalece a posição de que ela viola o princípio do contraditório, porquanto impossibilita a manifestação da parte contráriasobrea matériaexposta emplenário,senão vejamos, v.g.:“[...]1.Ainovaçãodeconteúdo na tréplica viola o princípio do contraditório, pois, embora seja assegurada ao defensor a palavra por último - como expressão inexorável da ampla e plena defesa - tal faculdade, expressa no art. 477 do CPP, não pode implicar a possibilidade de inovação em momento que não mais permita aotitular da ação penal refutar seus argumentos. [...]”. (6a Turma, REsp 1.451.538/ DF; Rel. Min. Rogério Schietti Cruz; Julg. 08/11/2018; DJe23/11/2018; Pág. 1764).

72 A 6ª Turma do STJ já decidiu que: “[...] De início, anota-se que "esta Corte Superior, em inúmeros julgados, já reconheceu que a mera leitura da pronúncia, ou de outros documentos em plenário, não implica, obrigatoriamente, a nulidade do julgamento, notadamente porque os jurados possuem amplo acesso aos autos. Assim, somente fica configurada a ofensa ao art. 478, I, do Código de Processo Penal, se as referências forem feitas como argumento de autoridade que beneficie ou prejudique o réu" (HC n. 149.007/MT, relator Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 5/5/2015, DJe 21/5/2015). [...]”. (AgRg no AREsp 1304341 / RS, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. em 03/09/2019, pub. no DJe de 10/09/2019).

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Ressalte-se que, tanto na réplica como na tréplica, será possível a reinquirição de testemunha já ouvida em plenário.

Os apartes fazem parte dos debates no plenário do Tribunal do Júri, sendo de duas ordens:

a) oaparte concedido pelo orador no momento de sua fala; b) o aparte decidido pelo juiz presidente, a pedido do aparteante, regulamentado peloart. 497, inciso XII do CPP. Na hipótese do aparte regulamentado, o juiz-presidente o concederá por até 03(três) minutos para cada um, sendo estes acrescidos ao tempo da parte que estiver com a palavra.

Sob outro ponto, a qualquer momento dos debates, a acusação, a defesa ou os jurados poderão requerer ao juiz-presidente que determine ao orador que faça menção às folhas dos autos onde se encontra a peça por ele lida ou citada (art. 480, caput, CPP)

(6.7) Leitura de documentos e/ou exibição de objetos

A leitura de documentos ou a exibição de objetos em plenário são permitidas, desde que eles sejam juntados aos autos com a antecedência mínima de 03(três) dias úteis do julgamento, assegurada a ciência prévia doseuconteúdo à parte contrária.

A limitação abrange a leitura de jornais ou de qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croquis ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e ao julgamento dos jurados.

Desde que não contenham elemento novo de fato, não há vedação à apresentação de mídias pelas partes para melhor exposição de seus argumentos.

(6.8) Formulação e apresentação dos quesitos

Encerrados os debates, o juiz presidente indagará aos jurados se estão habilitados a julgar ouse necessitam de outros esclarecimentos, sendo-lhes permitido acessar os autos e os instrumentos do crime.

Se a verificação de qualquer fato, reconhecida como essencial para o julgamento da causa, não puder ser realizada imediatamente, o juiz-presidente dissolverá o Conselho, ordenando a realização das diligências que entender serem necessárias. Consistindo em produção de prova pericial, o juiz-presidente, desde logo, nomeará perito e formulará quesitos, facultando às partes também formulá-los e indicar assistentes técnicos, no prazo de 05 (cinco) dias.

Dirimidas eventuais dúvidas, o juiz-presidente apresentará os quesitos que serão submetidos ao Conselho de Sentença, formulados em proposições afirmativas, simples e distintas, obedecendo aos termos da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e dos debates, e que indagarão:

1) sobre a materialidade do fato;

2) sobre a autoria ou participação:

a) Sustentada a desclassificação da infração para outra de competência do juiz singular, será formulado quesito específico, para ser respondido após o 2º ou 3º quesitos, conforme ocaso;

b) Defendida a tese de ocorrência do crime na sua forma tentada ou havendo divergência sobre a tipificação do delito, sendo este da competência do Tribunaldo Júri, o juiz formulará quesito acerca dessas questões, para ser respondido após o 2º quesito;

3) se o acusado deve ser absolvido;

4) se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa;

5) se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.

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Estando em julgamento mais de um crime ou mais de um acusado, os quesitos serão formulados emséries distintas.

Feita a leitura dos quesitos, serão as partes indagadas se têm requerimento ou reclamação a fazer, decidindo-se, em caso afirmativo, imediatamente, com posterior registro na ata.

Ato contínuo, ojuiz presidente, em plenário, explicará aos jurados o significado de cada quesito, esclarecendo eventuais dúvidas surgidas.

(6.9) Votação

Em sala secreta, se existente, ou, em plenário, sem a presença do público, o juiz-presidente, diante dos jurados, da acusação, da defesa técnica, do escrivão e dos oficiais de justiça, submeterá os quesitos à votação pelo Conselho de Sentença, advertindo as partes de que não será permitida qualquer intervenção que possa perturbar a livre manifestação do Conselho e que fará retirar-se da sala quem se portar inconvenientemente.

Aos jurados serão distribuídas pequenas cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, contendo 7 (sete) delas a palavra sim e 7 (sete) a palavra não

Duranteo processo de votação, para assegurar osigilo dovoto, ooficial de justiça recolherá, emurnas separadas, as cédulas correspondentes aos votos e as cédulas não utilizadas.

A resposta negativa de 04(quatro) jurados a quaisquer dos quesitos sobre a materialidade do fato e a autoria ou participação encerra a votação e implica a absolvição do acusado.

Respondidos afirmativamente por 04 (quatro) jurados os quesitos relativos à materialidade do fato e à autoria ou participação, será formulado quesito com a seguinte redação: O jurado absolve o acusado?

A votação prosseguirá somente se os jurados decidirem negativamente, devendo ser apresentados os 4º e 5º quesitos que indagarão sobre:

4º quesito - causa de diminuição de pena alegada pela defesa;

5º quesito -circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.

Se a resposta a quaisquer dos quesitos estiver em contradição com outra ou com outras já dadas, o juiz-presidente, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá novamente à votação os quesitos a que se referirem tais respostas.

Em outro aspecto, imagine-se uma situação em que os jurados responderam afirmativamente ao 2º quesito (quesito da autoria), isto é, reconheceram que o acusado, que sustentou a tese de negativa de autoria, foi o autor do crime. Ao quesito genérico de absolvição (3º quesito), no entanto, votaram SIM, ou seja, absolveram-no da acusação. Nesse caso, operase a denominada absolvição por clemência, sendo válido o veredicto73

Evidenciado, pela resposta dada a um dos quesitos, que ficam prejudicados os quesitos seguintes, o juiz-presidente assim o declarará, dando por finda a votação.

As decisões serão tomadas por maioria de votos, devendo ser suspensa a votação tão logo seatinja oquarto voto vencedor.

Apósa resposta, verificados os votos e cédulasnão utilizados, o juiz-presidente determinará que o escrivão registre no termo a votação de cada quesito, bem como o resultado do julgamento, o qual, encerrada a votação, será assinadotambém pelos jurados e pelas partes.

Decidindo o Conselho de Sentença pela desclassificação do crime para outro, de competência do juiz singular, ao juiz presidente caberá proferir sentença.

73 Tratando-se, entretanto, do crime de feminicídio, o Supremo Tribunal Federal, por intermédio da 2ª Turma, decidiu ser incabível a absolvição por clemência, senão vejamos: “[...] 3. Aexistência de diversas novas hipóteses de absolvição diante da previsão do que- sito genérico, não significa que elas sejam indetermináveis, nem ilimitadas. 4. Ainda que fundada em eventual clemência, a decisãodo júri não pode implicar a concessão de perdão a crimes que nem mesmo o Congresso Nacional teria competência para perdoar. 5. Não se podendo identificar a causa de exculpação ou então não havendo qualquer indício probatório que justifique plausivelmente uma das possibilidades de absolvição, ou ainda sendo aplicada a clemência a um caso insuscetível de graça ou anistia, pode o Tribunal ad quem, provendo o recurso da acusação, determinar a realização de novo júri. 6. In casu, tendo o recorrido praticado, em tese, o crime hediondo de feminicídio, para o qual não cabe a concessão de clemência, tal hipótese sequer deve ser considerada, a fim de que possa justificar o não cabimento do recurso de apelação interposto contra a decisão absolutória do Tribunal do Júri. Agravo regimental provido para o fim de manter a decisão do Tribunal de Justiça exarada para determinar a realização de novo julgamento”.(2ª T., RHC 229558 AgR, Rel. Min. Nunes Marques, Rel. p/Acórdão: Min. EdsonFachin, j. em21/11/2023, pub. no DJe em 16/02/2024, rep. no DJe de 19/02/2024)

102

Nessa circunstância, havendo crime conexo não doloso contra a vida, este também será julgado pelo juiz presidente, aplicando, em ambos os casos, se cabível, os institutos despenalizadores da Lei nº 9.099/95.

Entretanto, se o Conselho de Sentença, absolver o acusado pelo crime de competência do Tribunal do Júri, continuará competente para julgá-lo pelo crime conexo.

(6.10) Sentença

Trata-se de sentença tida como subjetivamente complexa por resultar da junção de decisões de dois órgãos jurisdicionais: o Conselho de Sentença, que julgou o fato e suas circunstâncias, e o juiz-presidente, o qual aplicará a pena e resolverá algumas questões de direito, de acordo com a decisão dos jurados.

O juiz-presidente, ao proferir a sentença, no caso de:

• Condenação:

a) fixará a pena-base;

b) considerará as circunstâncias agravantes ouatenuantes alegadas nos debates; c) imporá os aumentos ou diminuições da pena, em atenção às causas admitidas pelojúri; d) observará as demais disposições do art. 387 do CPP74;

e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra,se presentes os requisitos da prisão preventiva, ou, no caso de condenação a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos (art. 492, inciso I, alínea “e”, CPP);

f) estabelecerá os efeitos genéricos e específicos da condenação.

Por sua vez, a Lei nº 13.964/2019 introduziu, no art. 492 do CPP, os parágrafos terceiro ao sexto, para determinar que, nos casos de condenação a pena igual ou superior a 15(quinze) anos:

a) o juiz-presidente, excepcionalmente, poderá deixar de autorizar a execução provisória da pena, se houver questão substancial cuja resolução, pelo tribunal ao qual competir o julgamento, possa, plausivelmente, levar à revisão da condenação;

b) a apelação interposta contra decisão condenatória do Tribunal do Júri não terá efeito suspensivo, podendo, excepcionalmente, o tribunal ad quem atribuir tal efeito ao recurso apelatório, quando verificado, cumulativamente, que este não tem propósito meramente protelatório, levantando questão substancial e que pode resultar em absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução da pena para patamar inferior inicialmente fixado.

O pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso poderá ser feito de duas formas: a) incidentemente, na própria apelação; ou b) por meio de petição em separado, dirigida diretamente ao relator, instruída com cópiasda sentença condenatória, das razões da apelação e de prova da tempestividade, das contrarrazões e das demais peças necessárias à compreensão da controvérsia.

74 Art.387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: I- mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código Penal, e cuja existência reconhecer; II - mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deva ser levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos arts. 59 e 60 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; II - aplicará as penas de acordo com essas conclusões; III - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; IV - atenderá, quanto à aplicação provisória de interdições de direitos e medidas de segurança, ao disposto no Título Xl deste Livro;V - determinará se a sentença deverá ser publicada na íntegra ou em resumo e designará o jornal em que será feita a publicação (art. 73, §1º, do Código Penal). § 1º O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. § 2 º O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade.

103

Entretanto, a aplicação do disposto no art. 492, inciso I, alínea “e” do CPP, com a redaçãodada pela Lei nº 13.964/2020, é rejeitada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça que considera como ilegal a execução da pena como decorrência automática da condenação proferida peloTribunal do Júri, senão vejamos, v.g.: “[...]1. Após o julgamento da Suprema Corte das Ações Declaratórias de Constitucionalidade n. 43, 44 e54, houvealteração legal no art. 492, inc. I, alínea“e”, do CPP, em que é determinado que o Juiz Presidente do Tribunal de Júri proferirá sentença que, em caso de condenação, “mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão emque se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva, ou, no caso de condenação a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos”. 2. Contudo, é pacífica a jurisprudência desta Corteno sentido de que é ilegal a execução provisória da pena como decorrência automática da condenação proferida pelo Tribunal do Júri. 3. Habeas corpus concedido para obstar as execuções provisórias das penas impostas aos pacientes. (STJ, 6a Turma, HC 623.107/PA, Rel.Min. Nefi Cordeiro, j. em 15/12/2020, pub. no DJe de 18/12/2020).

No Supremo Tribunal Federal, a matéria é objeto de discussão no RE 123534075

• Absolvição:

a) mandará colocar em liberdade o acusado se por outro motivo não estiver preso; b) revogará as medidas restritivas provisoriamente decretadas; c) imporá, se for o caso, a medida de segurança cabível (absolvição imprópria).

Lavrada, a sentença será lida em plenário, dando-se por intimadas as partes, salvo na hipótese em que o acusado não se fizer presente, quando deverá ser posteriormente intimado da decisão.

(6.11) Ata

Ao final da sessão de julgamento, será lavrada ata que, assinada pelo juiz-presidente e pelas partes, descreverá:

 A data e a hora da instalação dos trabalhos;

 O magistrado que presidiu a sessão e os jurados presentes;

 Os jurados que deixaram de comparecer, com escusa ou sem ela, e as sanções aplicadas;

 O ofício ou requerimento de isenção ou dispensa;

 O sorteio dos jurados suplentes;

 O adiamento da sessão, se houver ocorrido, com a indicação do motivo;

 A abertura da sessão e a presença do ministério público, do querelante e doassistente, se houver, e a do defensor do acusado;

 O pregão e a sanção imposta, no caso de não comparecimento;

 As testemunhas dispensadas de depor;

 O recolhimento das testemunhas a lugar de onde umas não pudessem ouvir o depoimento das outras;

 A verificação das cédulas pelo juiz presidente;

 A formação do conselho de sentença, com o registro dos nomes dos jurados sorteados e recusas;

 O compromisso e o interrogatório, com simples referência ao termo;

 Os debates e as alegações das partes com os respectivos fundamentos;

 Os incidentes;

 O julgamento da causa;

75 Consulta realizada no endereço http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5776893, acessoem20 mai. 2024.

104

 A publicidade dos atos da instrução plenária, das diligências e da sentença.

 A falta da ata sujeitará o responsável a sanções administrativa e penal.

2.5.1.8. Desaforamento

O desaforamento se constitui em excepcional alteração da competência territorial do Tribunal do Júri para o julgamento da ação penal, somente aplicável após ultrapassada a primeira fase do procedimento, ouseja, depois da preclusão da decisão de pronúncia.

O pedido de desaforamento, formulado por representação do juiz ou a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado, a ser apreciado pelo tribunal de segundo grau (Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal), deverá ser justificado:

a) nointeresse da ordem pública;

b) na existência de dúvida sobre a imparcialidade do júri;

c) como medida de segurança pessoal doacusado;

d) na impossibilidade, em razão do comprovado excesso de serviço, de realização do julgamento dentro do prazo de 06(seis) meses, contado da preclusão da decisãode pronúncia. No prazo, não se computará o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa. Nessa hipótese, não poderá o juiz-presidente ser o requerente, embora em todos os casos, sua oitiva prévia seja imprescindível, assimcomo a manifestação da parte contrária à requerente, sob pena de nulidade.

É necessária, sob pena de nulidade, a oitiva da parte contrária à requerente sobre o pedido.

Destaque-se a inexistência de óbice para que o desaforamento venha a ser requerido depois da realização de um primeirojulgamento, desde que anulado em eventual recurso e os motivos que justifiquem o pedido tenham surgido no curso desse julgamento ou após a sessão anulada.

Julgando procedente o pedido, o tribunal determinará que o julgamento se realize em comarca (ou subseção judiciária) mais próxima possível em que não persistam os motivos que ensejaram o deslocamento.

Especificamente com relação aos crimes sujeitos a julgamento no Tribunal do Júri Federal, a mudança poderá ocorrer para outro Estado da Federação, dentro dos limites territoriais decompetência do respectivo Tribunal Regional Federal.

A princípio, havendo motivo que julgue relevante, poderá o Relator conferir efeito suspensivo ao pedido de desaforamento.

Reaforamento, por outro lado, como o próprio nome sugere, representa o retorno da competência para o julgamento ao Tribunal do Júri de origem.

2.5.1.9. Enunciados de Súmulas

2.5.1.9.1. Supremo Tribunal Federal

Súmula 156: É absoluta a nulidade do julgamento, pelo júri, por falta de quesito obrigatório.

Súmula 160: É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.

Súmula 162: É absoluta a nulidade do julgamento pelo júri, quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes.

Súmula 206: É nulo o julgamento ulterior pelo júri com a participação de jurado que funcionou emjulgamento anterior do mesmo processo.

2.5.1.9.2. Superior Tribunal de Justiça

Súmula 191: A pronúncia e causa interruptiva da prescrição, ainda que o tribunal do júri venha a desclassificar o crime.

105

2.5.2.1. Previsão legal

Arts. 513 a 518 do CPP.

2.5.2.1. Cabimento

Rito processual aplicável exclusivamente aos crimes praticados por funcionário público 76 contra a administração pública, no exercício da função ou no pretexto de exercê-la, previstos nos arts. 312 a 326 do Código Penal.

Entretanto, os funcionários públicos que gozam de foro especial por prerrogativa de função estarão sujeitos aos ditames das Leis nºs 8.038/90 e 8.658/93, conforme o caso

2.5.2.2. Procedimento

O rito a ser observado é o comum ordinário, com as alterações abaixo:

(1) Defesa preliminar:

Para os crimes funcionais afiançáveis, prevê o legislador, no art. 514, caput do CPP, a chamada defesa preliminar, a qual confere ao acusado a possibilidade de demonstrar previamente por escrito, no prazo de 15(quinze) dias, a inconsistência da denúncia ou queixa oferecida em seu desfavor, evitando a instauração de uma ação penal temerária.

Entretanto, a começar pelos Tribunais Superiores, a jurisprudência pátria é vacilante com relação à dispensa da referida providência, se a peça acusatória inicial tiver sido oferecida com base em inquérito policial.

Nesse diapasão, dispõe, por exemplo, o enunciado da Súmula 514, editada pelo Superior Tribunal de Justiça: “É desnecessária a resposta preliminar de que trata o art. 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial”.

Em posição antagônica, o Supremo Tribunal Federal, no HC 121.100/SP 77, decidiu que “[...] I. A partir do julgamento do HC 85.779/RJ, passou-se a entender, nesta corte, que é indispensável a defesa prévia nas hipóteses do art. 514 do código de processo penal, mesmo quando a denúncia é lastreada em inquérito policial (informativo 457/STF). [...], acrescentando, porém, que “[...] a falta de defesa preliminar constitui apenas nulidade relativa [...]”.

No entanto, a citada providência preliminar não se aplica:

a) aos crimes inafiançáveis;

b) quando houver imputação de crimes comuns conexos ao crime funcional;

c) quando o acusado não mais exercer a função pública em cujo exercício cometeu o delito;

d) emrelação ao particular que tenha sidocoautor ou partícipe docrime funcional.

Na hipótese em que o acusado não tenha residência conhecida, será nomeado um defensor para patrocinar os seus interesses, cabendo-lhe oferecer a defesa preliminar.

Em observância ao princípio da ampla defesa, caso o acusado se encontre em outra comarca, com endereço conhecido, será notificado por carta precatória.

(2) Sentença:

O juiz sentenciará no prazo de 10(dez) dias, se não o fizer em audiência.

Nos crimes cometidos com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública, se houver condenação por crime funcional, a perda do cargo, função pública ou

76 CP, art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública 77 STF; HC 121.100; SP; Segunda Turma;Rel. Min. Ricardo Lewandowski;Julg. 25/03/2014;DJe 06/06/2014;Pág. 72.

106
JULGAMENTO POR CRIME FUNCIONAL CONTRA A ADMINISTRAÇÃO
2.5.2. DO PROCESSO E DO
PÚBLICA

mandato eletivo, quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 01(um) ano, não constitui efeito automático da decisão, devendo ser esta motivadamente declarada na sentença (art. 92, inciso I, “a” e parágrafo único do CP78).

2.5.3. DO PROCESSO E DO JULGAMENTO POR CRIME CONTRA A HONRA

2.5.3.1. Previsão legal

Arts. 519 a 523 do CPP.

2.5.3.2. Cabimento

Cabível para os crimes de calúnia (art. 138, CP), de injúria (art. 140, CP) e de difamação (art. 139, CP) que:

a) não possam tramitar nos juizados especiais criminais, nos termos da Lei nº 9.099/95; b) não constituam crime eleitoral; c) não configurem crimes contra a honra definidos no Código Penal Militar; ou d) não sejam de competência originária dos tribunais.

2.5.3.3. Procedimento

O rito a ser observado é o comum ordinário, com as alterações abaixo:

1º Oferecimento da peça inicial

De acordo com a natureza do crime (art. 145, CP79), tem-se a:

a) denúncia: ação penal de iniciativa pública incondicionada (crime de injúria real que resulte lesão corporal decorrente da violência empregada);

b) denúncia: ação penal pública condicionada à representação (ofensa praticada contra funcionário público em razão de suas funções ou crime de injúria racial ou preconceituosa) ou requisição do Ministro da Justiça (ofensa contra o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro);

c) queixa-crime: ação penal privada, nos demais casos.

Se a vítima for funcionário público no exercício de suas funções, poderá, ao invés de oferecer representação, propor diretamente a ação penal, mediante apresentação de queixacrime.

Nesse diapasão, é o enunciado da Súmula 714 do STF: “É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções”.

2º Audiência de tentativa de conciliação

Nos crimes de natureza privada, antes do recebimento da queixa-crime, o juiz designará audiência para tentativa de conciliação entre as partes, ouvindo-as separadamente, sem a presença de seus advogados.

Achando possível a conciliação, o juiz promoverá o entendimento entre elas, na sua presença, lavrando-se, se positivo, termo de desistência da ação penal, hipótese em que se extingue a punibilidade do agente, arquivando-se a queixa-crime.

78 CP, art. 92 - São também efeitos da condenação: I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; [...] Parágrafo único - Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivada-mente declarados na sentença.

79 CP, art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso Ido caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso IIdo mesmo artigo, bemcomo no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

107

O não comparecimento de qualquer das partes ao ato faz presumir que há desinteresse emconciliar.

Há, entretanto, parcela doutrinária que entende que, se a ausência for do querelado, poderá o juiz determinar a sua condução coercitiva (art. 260, CPP), e, se for do querelante, reconhecer a perempção (art. 60, incisoIII, CPP).

3º Exceção da verdade (ou da notoriedade do fato)

No prazo da resposta à acusação (art. 396 do CPP80), o querelado poderá apresentar exceção da verdade (ou da notoriedade do fato) quando a acusação que lhe é feita recair em crimes de calúnia81 ou de difamação82 , podendo arrolar testemunhas, cujo número, somado àsque já tiverem sido indicadas na resposta escrita, não deve ultrapassar 08 (oito) pessoas.

Apresentada a exceção, a autoridade judiciária suspenderá o curso da ação penal, intimando o querelante (aqui excepto) para, querendo, no prazo de 02(dois) dias, oferecer contestação e, se quiser, indicar as testemunhas arroladas na queixa ou apontar outras, respeitado, em qualquer dos casos, o máximo de 08(oito) pessoas.

Quando o crime contra a honra for de ação penal de iniciativa pública, ao órgão do Ministério Público será possível contestar a exceção, havendo, nesse ponto, equívoco do legislador em se referir apenas ao querelante como possível excepto.

O incidente processual referido tramitará nos mesmos autos da ação principal, sendo o seu julgamento em conjunto com ela. No entanto, se julgado procedente, não poderá resultar em condenação do querelante (excepto), devendo-se remeter sua cópia ao órgão do Ministério Público para apreciação e adoção das providências que julgar pertinentes.

Quando proposta contra querelante detentor de foro por prerrogativa de função, a exceção deverá ser julgada pelo tribunal a quem cabe apurar o crime imputado ao excepto, nele sendo deliberado sobre a admissibilidade (ou não) do incidente, seu processamento e, se for o caso, realizada a instrução probatória e o julgamento. Decidida a exceção, serão os autos devolvidos ao juízo de origem, o qual ficará vinculado à decisão que a julgou procedente, absolvendo o excipiente (querelado). Por sua vez, a improcedência do incidente possibilitará o regular prosseguimento da ação penal.

Sob outro aspecto, na hipótese de autos oriundos do juizado especial criminal, a ação penal seguirá o rito comum sumário.

2.5.4. DO PROCESSO E DO JULGAMENTO DOS CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL

2.5.4.1. Previsão legal

Arts. 524 a 530-I do CPP.

2.5.4.2. Cabimento

Cabível para o processamento e julgamento dos crimes contra a propriedade imaterial, atualmente, a saber:

• Crimes contra a propriedade intelectual (arts. 184 e 186 do CP): a) violação de direito autoral (art. 184, CP);

80 CPP, art. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.

81 CP, art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: [...] § 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo: I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141; III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

82 Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: [...] Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

108

• Crimes relativos à propriedade industrial (Lei nº 9.279/1996):

a) crimes contra as patentes (arts. 183 a 186);

b)crimes contra os desenhos industriais (arts. 187 a 188);

c) crimes contra as marcas (arts. 189 a 190);

d)crimes cometidos por meio de marca, título de estabelecimento e sinal de propaganda(art. 191);

e) crimes contra indicações geográficas e demais indicações (arts. 192 a 194);

f) f) crimes de concorrência desleal (art. 195).

2.5.4.3. Procedimento

No processo e julgamento dos crimes contra a propriedade imaterial, não sendo hipótese de competência dos juizados especiais criminais, aplica-se o procedimento comum ordinário, comas modificações abaixo:

1º Para os crimes de ação penal de iniciativa privada (arts. 524 a 530, CPP):

a) há a necessidade de prova prévia da legitimidade ativa, sob pena de não recebimentoda queixa-crime ou de qualquer diligência requerida pelo ofendido na fase préprocessual;

b) na hipótese de o crime ter deixado vestígio, a queixa-crime deve, obrigatoriamente, ser instruída com laudo de exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito,sob pena de não recebimento. É, portanto, o exame de corpo de delito condição de procedibilidade para o exercício da ação penal. No exame pericial83, a ser realizado com a finalidade de atestar a violação, observar-se-á:

• a diligência de busca e apreensão será executada por 02(dois) peritos nomeados pelo juiz, os quais verificarão a existência de fundamento para a apreensão;

• realizada ou não a apreensão, será expedido laudo pericial, em 03(três) dias após o encerramento da diligência, sendo os autos conclusos ao juiz para deliberar sobre o laudo, procedendo (ou não) à sua homologação;

• na hipótese de laudo pericialcontrário à apreensão, orequerente da diligência poderá impugná-lo, cabendo à autoridade judiciária decidir o incidente.

c) a queixa-crime com fundamento em apreensão e em perícia deverá ser propostaem até 30(trinta) dias, contados da homologação do respectivo laudo, sob pena de decadência84 Se ocorrer prisão em flagrante e o réu não for posto em liberdade, o prazo decadencial será de 08(oito) dias.

2º Para os crimes de ação penal de iniciativa pública previstos no art. 184, §§ 1º, 2º e 3º do Código Penal (art. 530-B do CPP) e demais crimes de ação penal de iniciativa pública,incondicionada ou condicionada (art. 530-I do CPP),

a) a inaplicabilidade do disposto no art. 525 do CPP à ação penal de iniciativa pública,cujo regramento é o contido nos arts. 530-B a 530-H do mesmo diploma legal; b) a autoridade policial procederá à apreensão dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos, emsuatotalidade, juntamentecomosequipamentos, suportesemateriais que

83 “Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem”. (Súmula 574, STJ). 84 “RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA REGISTRO DE MARCA E CONCORRÊNCIA DESLEAL. QUEIXA-CRIME REJEITADAPOR DECADÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 529 DO CPP. TESE DE QUE O PRAZO PREVISTO NA NORMA AFASTA A PREVISÃO CONTIDA NO ART. 38 DO CPP. IMPROCEDÊNCIA. 1. É possível e adequado conformar os prazos previstos nos arts. 38 e 529, ambos do CPP, de modo que, emse tratando de crimes contra a propriedade imaterial que deixemvestígio, a ciência da autoria do fato delituoso dá ensejo ao início do prazo decadencial de 6 meses, sendo tal prazo reduzido para 30 dias se homologado laudo pericial nesse ínterim. 2. A adoção de interpretação distinta, de modo a afastar o prazo previsto no art. 38 do CPP em prol daquelepreconizado no art. 529 doCPP, afigura-se desarrazoada, pois implicariasujeitar à vontade de querelante o início do prazo decaden- cial, vulnerando a própria natureza jurídica do instituto, cujo escopo é punir a inércia do querelante. 3. Recurso especial improvido”(STJ, 6ª T., REsp 1762142, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. em 13/04/2021, pub. no DJe de 16/04/2021).

109

possibilitaram a sua existência, desde que estes se destinem precipuamenteà prática do ilícito. A instrumentalização da diligência se dará mediante termo, assinado por 02(duas) ou mais testemunhas, com a descrição dos bens apreendidos e informações sobre suas origens, com juntada, posterior, aos autos do inquérito policialou da ação penal, se já iniciada.

Em seguida, o produto apreendido deverá ser submetido à perícia, a ser realizada por perito oficial, ou, na falta deste, por pessoa tecnicamente habilitada, com fornecimento do laudo técnico respectivo para compor o inquérito policial ou a ação penal.

Na fase pré-processual, os titulares de direito de autor e os que lhe são conexos serão os fiéis depositários de todos os bens apreendidos, devendo colocá-los à disposição do juiz quando do ajuizamento da ação. Ademais, poderão requerer à autoridade judiciária a destruição da produçãooureproduçãoapreendida, que,ressalvadaanecessidade depreservação docorpode delito, poderá determiná-la quando não houver impugnação quanto à sua ilicitude ou quando a ação penal não puder ser iniciada por falta de determinação de quem seja oautor do ilícito.

Na sentença condenatória, a autoridade judiciária poderá determinar a destruição dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos e o perdimento dos equipamentos apreendidos, desde que precipuamente destinados à produção e reprodução dos bens, emfavor da Fazenda Nacional, que deverá destruí-los ou doá-los aos Estados, Municípios e Distrito Federal, a instituições públicas de ensino e pesquisa ou de assistência social, bem como incorporá-los, por economia ou interesse público, ao patrimônio da União, os quais não poderãoretorná-los aos canais de comércio.

Permite-se que associações de titulares de direitos de autor e os que lhes são conexos, em seu próprio nome, funcionem como assistente da acusação nos crimes previstos no art. 184 do Código Penal, quando praticado em detrimento de qualquer de seus associados.

2.6. PROCEDIMENTOS ESPECIAIS PREVISTOS EM LEIS ESPECIAIS

2.6.1. PROCEDIMENTO DAS AÇÕES PENAIS DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS

2.6.1.1. Previsão legal

Arts. 1º a 12 da Lei nº 8.038/90 e art. 1º da Lei nº 8.658/9385 .

2.6.1.2. Cabimento

Nas ações penais originárias no âmbito do Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal.

2.6.1.3. Procedimento

É de se observar que a Lei nº 8.038/90 tem natureza especial, sendo as normas gerais do Código de Processo Penal aplicadas, portanto, de forma subsidiária.

2.6.1.3.1. Fase pré-processual

A instauração de procedimento investigatório contra os detentores de foro por prerrogativa de função dependerá deautorização préviae de supervisão dotribunal competente paraa ação penal e será desempenhada durante toda a tramitação das investigações desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual oferecimento, ou não, de denúncia pelo titular do direito de ação.

85 Arts. 556 a 562 do CPP (Revogados pelo art. 3º da Lei nº 8.658/93).

110

Logo, a autoridade policial não poderá instaurar inquérito policial, tampouco o órgão do Ministério Público poderá instaurar procedimento investigatório criminal, sem a prévia autorização dotribunal com competência para o processo e para ojulgamento da ação penal.

Do mesmo modo, para que se promova o indiciamento do investigado no procedimento policial, faz-se necessária a permissão do tribunal.

A competência para os atos acima será do Ministro (ou Desembargador) relator, escolhido consoante o regimento interno de cada Corte, o qual se torna prevento para os demais atos da fase investigatória e daação penal.

Na hipótese de crimes de menor potencial ofensivo, aplicam-se, no que couber, os institutos despenalizadores da Lei nº 9.099/95.

Em se tratando de acusados parlamentares federais (art. 53, §§§ 3º, 4º e 5º da CF) ou estaduais (art. 27, § 1º da CF), deve-se atentar para as imunidades formais que lhes são conferidas pela legislação. De modo idêntico, quando se tratar do Presidente da República (art. 86 c/c art. 102, inciso I, alínea “b”, todos da CF).

2.6.1.3.2. Fase processual

1º Oferecimento da denúncia ou queixa-crime

Nos crimes de ação penal de iniciativa pública, não sendo caso de arquivamento do inquérito policial ou das peças informativas, o órgão do Ministério Público terá o prazo de 05(cinco) dias para o oferecimento da denúncia, se o acusado estiver preso, ou de 15 (quinze) dias, se estiver solto.

Eventuais diligências complementares indispensáveis para a apresentação da peça acusatória poderão ser deferidas pelo relator, com a interrupção do prazo, se o acusado estiver solto. Estando preso, salvo se houver relaxamento da prisão, inexistirá tal interrupção.

Tratando-se de ação penal de iniciativa privada, o prazo para oferecimento da queixacrime será de 06(seis) meses, contados na forma do art. 38 do CPP86 .

Poderão ser indicadas até 08(oito) testemunhas, consoante se depreende do art. 401, caput do Código de Processo Penal c/c art. 9º, caput da Lei nº 8.038/90.

Se cabível, será apresentada com a peça inicial a proposta de suspensão condicional do processo(art. 89 da Lei nº 9.099/95)87 .

2º Distribuição ao relator

Além de deliberar sobre a concessão de autorização para a instauração do procedimento investigatório, supervisioná-lo, se for o caso, e autorizar o indiciamento do investigado, caberá aorelator, monocraticamente:

a) decidir sobre medidas cautelares, em caso de urgência, ad referendum, do órgão colegiado, consoante determinar o regimento interno do tribunal;

b) quando for o caso, designar audiência preliminar para os fins previstos na Lei nº 9.099/95, homologando eventual autocomposição das partes;

c) deliberar sobre a promoção de arquivamento do inquérito ou de peças informativas, apresentada pelo órgão do Ministério Público, ou submetê-la à decisão competente do tribunal;

d) decretar a extinção da punibilidade, nos casos previstos em lei;

e) nos processos dos Tribunais Superiores, convocar desembargadores de Turmas Criminais dos Tribunais de Justiça ou dos Tribunais Regionais Federais, bem como juízes de varas criminais da Justiça dos Estados e da Justiça Federal, pelo prazo de 06 (seis) meses, prorrogável por igual período, até o máximo de 02 (dois) anos, para a

86 CPP, art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de represen- tação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

87 Ver item2.2.

111

realização do interrogatório e de outros atos da instrução, na sede do tribunal ou no local onde se deva produzir oato; f)conduzir os atos da instrução criminal; g) pedir dia para que o Tribunal delibere sobre o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa-crime, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender deoutras provas.

3º Intimação do acusado para resposta escrita

Em seguida, o relator, encaminhando cópia da denúncia ou da queixa-crime, do seu despacho e de documentos que indicar, determinará a intimação (a que a lei denomina notificação) do acusado para que, no prazo de 15(quinze) dias, querendo, ofereça resposta escrita.

Todavia, a intimação se dará mediante edital, quando for desconhecido o paradeiro do acusado, ou se este criar dificuldades para que o oficial cumpra a diligência.

Nesse caso, o ato intimatório conterá o teor resumido da acusação e o chamamento do acusado para que, em 05 (cinco) dias, compareça ao tribunal, onde terá vista dos autos pelo prazo de 15 (quinze) dias, a fim de apresentar resposta preliminar, se desejar.

4º Apresentação de resposta escrita e réplica, se necessário

Em atendimento ao princípio do contraditório, se, com a resposta escrita, forem apresentados nãoapenas novos documentos, mas,também, arguidas preliminarese/oucausas de absolvição sumária, será a parte acusatória intimada para, no prazo de 05(cinco) dias, querendo, apresentar réplica.

5º Vista ao órgão do Ministério Público, se não for a parte autora

Não sendo a parte autora da ação penal, o órgão do Ministério Público será intimado para pronunciamento, no prazo de 05(cinco) dias.

6º Sessão de deliberação pelo tribunal sobre o recebimento (ou não) da denúncia ou da queixa-crime

Conforme disposição regimental (plenário ou órgão especial), o relator pedirá dia para que otribunal delibere sobre:

a) o recebimento da peça inicial;

b) a rejeição da peça inicial, quando verificar a ocorrência de qualquer das circunstâncias previstas noart. 395 do CPP88;

c) a improcedência da acusação, se identificar a presença de qualquer das hipóteses de absolvição sumária estabelecidas no art. 397 do CPP89 .

No julgamento, será facultada a sustentação oral pelo prazo de 15 (quinze) minutos, primeiro à acusação, depois à defesa.

Encerrados os debates, passará o órgão colegiado a decidir, podendo o seu presidente restringir a presença no recinto às partes e a seus advogados, ou somente a estes, se o interesse público oexigir.

7º Citação

Recebida a denúncia (ou a queixa-crime), deve o relator determinar a citação do denunciado (ou querelado) para a apresentação de defesa prévia, no prazo de 05(cinco) dias, contado do ato citatório, uma vez que, com o advento da Lei nº 11.719/2008, o interrogatório

88 CPP, art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou con-dição para o exercício da ação penal; III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.

89 CPP, art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa ex cludente da culpabilidade do agente, salvoinimputabilidade;III-que ofatonarradoevidentemente não constituicrime;ou IV– extinta a punibilidade do agente.

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deverá ser realizado como último ato da instrução também nas ações penais originárias, por melhor se coadunar coma garantia da ampla defesa.

8º Defesa prévia

Na defesa prévia, por aplicação do art. 396-A do CPP, o réu poderá suscitar preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar até 08(oito) testemunhas90, qualificando-as e requerendo suas intimações, quando necessário.

Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir advogado, o relator nomeará defensor dativo para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 05 (cinco) dias (art. 8º da Lei nº 8.038/90).

9º Inquirição de testemunhas

Apresentada a defesa prévia, passa-se para a fase de instrução que obedecerá, no que couber, ao procedimento comum do Código de Processo Penal.

Assim, será realizada audiência para oitiva do ofendido, inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nessa ordem, esclarecimentos dos peritos, acareações, reconhecimento de pessoas e coisas.

Havendo necessidade, o relator poderá delegar a realização do interrogatório ou de outro ato da instrução ao juiz ou a um membro de tribunal com competência territorial no local de cumprimento da carta de ordem.

O art. 9º, § 2º da Lei nº 8.038/90, faculta a possibilidade de realização, por expressa determinação do relator, das intimações por carta registrada com aviso de recebimento.

10º Interrogatório

O interrogatório observará o que dispuser os arts. 185 a 196 do Código de Processo Penal, no que couber.

11º Prazo para requerimento de diligências

Concluída a audiência de instrução, a acusação e a defesa serão intimadas para requerimento de diligências no prazo de 05 (cinco) dias (art. 10, Lei nº 8.038/90).

12º Realização de diligências, se requeridas

13º Apresentação de alegações finais

Realizadas as diligências, ou não sendo estas requeridas nem determinadas pelo relator, serão intimados o órgão do Ministério Público e o assistente, se houver, para, no prazo comum de 15(quinze) dias, oferecerem alegações finais escritas.

Em seguida, intima-se a defesa, pelo mesmo prazo e para idêntica finalidade.

Havendo corréu delator, deve-se, primeiramente, conceder o prazo para a acusação, depois, ao delator, e, por fim, ao delatado.

14º Vista ao órgão do Ministério Público, se ação penal de iniciativa privada

Na ação penal de iniciativa privada, o Ministério Público terá vista dos autos, pelo prazo de 15 (quinze) dias, após as alegações das partes.

15º Relatório

O relator poderá, após as alegações escritas, determinar, inclusive de ofício, a realização de diligências reputadas imprescindíveis para o julgamento da causa, assegurando-se o contraditório. Em seguida, apresentará relatório.

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90 Art. 401, caput do Código de Processo Penal c/c art. 9º, caput da Lei nº 8.038/90

16º Revisor

Após receber o relatório, orevisor, escolhido conforme o regimento interno do tribunal, pedirá dia para seu julgamento, podendo aditá-lo ou retificá-lo.

17º Sessão de julgamento

Seguindo as normas dispostas noregimentointernodotribunal correspondente, passa-se para a fase de julgamento, observando-se que:

a) a acusação e a defesa terão, sucessivamente, nessa ordem, prazo de 01 (uma) hora para sustentação oral, assegurado aoassistente ¼(um quarto) do tempo da acusação; b) encerrados os debates, o órgão colegiado passará a proferir o julgamento, podendo o presidente limitar a presença no recinto às partes e a seus advogados, ou somente a estes, se ointeresse público oexigir.

Por aplicação analógica do art. 615, § 1º do CPP, o tribunal decidirá por maioria de votos, e, em caso de empate na votação, se o seu presidente não tiver tomado parte na votação, proferirá o voto de desempate. Se já tiver votado, prevalecerá a decisão mais favorável ao réu.

2.6.2. PROCEDIMENTO DAS AÇÕES POR CRIMES PRATICADOS COM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EFAMILIARCONTRA

AMULHER

2.6.2.1. Previsão legal

Arts. 13 ao 28 da Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).

De forma subsidiária, aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com oestabelecido na lei supra.

2.6.2.1. Cabimento

Ao processo, ao julgamento e à execução de causas criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, na forma dos arts. 5º a 7º da Lei nº 11.340/2006.

A vítima de violência doméstica, sob o enfoque da Lei Maria da Penha, é aquela quese apresenta ante seu algoz, na relação íntima de afeto, fragilizada, subordinada, em situação de dependência, em qualquer de suas modalidades, seja moral, afetiva, financeira. Baseia-se a conduta delitiva numa relação de poder do autor sobre a vítima e sua submissão a ele.

Nos termos do art. 5º da referida lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher, a qual constitui uma das formas de violação dos direitos humanos, qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

a) no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

b) no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos quesão ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

c) em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convividocom a ofendida, independentemente de coabitação.

São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, dentre outras, a:

a) violência física: qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

b) violência psicológica: qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a

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degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

c) violência sexual: qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade; que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação, ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

d) violência patrimonial: qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

e) violência moral: qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

O art. 5º da Lei nº 11.340/2006, em seu parágrafo único, estabelece a incidência dessa lei, independentemente da orientaçãosexual da vítima.

Nesse sentido, nenhuma dúvida sobre a aplicação da referida lei nas relações homoafetivas que envolvam duas mulheres, pois atendem a elementar “mulher” prevista no caput do art. 5º.

Por sua vez, a aplicabilidade da Lei Maria da Penha em proteção de vítimas transexuais femininas, inobstante ausência de dispositivo específico para esse fim, é admitida pela jurisprudência pátria.

Com relação ao agente ativo, não existe dúvida de que o delito pode ser cometido tanto por homem, como por mulher.

2.6.2.2. Medidas protetivas

2.6.2.2.1. Medidas administrativas na esfera policial

Nos termos do art. 11 da Lei nº 11.340/2006, na hipótese de iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, caberá à autoridade policial, no atendimento à vítima em situação de violência doméstica e familiar, dentre outras providências:

a) garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao órgão do Ministério Público e ao Poder Judiciário;

b) encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;

c) fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;

d) se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences dolocal da ocorrência ou do domicílio familiar;

e) informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis, inclusive os de assistência judiciária para o eventual ajuizamento, perante o juízo competente, da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de uniãoestável;

2.6.2.2.2. Medidas protetivas de urgência de natureza penal

1º Que obrigam o agressor

Nos termos do art. 22 da Lei nº 11.340/2006, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente:

115

a) suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826/2003. Nesse caso, encontrando-se o agressornas condições mencionadas no art. 6º, caput e incisos da Lei nº 10.826/200391, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso;

b) afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

c) proibição de determinadas condutas, entre as quais:

1.aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limitemínimo de distância entre estes e o agressor;

2.contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

3.frequentar determinados lugares, a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

d) comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e

e) acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ouem grupo de apoio.

As medidas acima referidas constituem rol exemplificativo, podendo ser aplicadas outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público (art. 22, § 1º).

Para assegurar a efetividade das medidas protetivas de urgência, o juiz poderá requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

2º À ofendida e seus familiares

O juiz, quando necessário, em atendimento ao disposto no art. 23 da Lei nº 11.340/2006, poderá determinar:

a) o encaminhamento da ofendida e de seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

b) a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento doagressor;

c) a matrícula dos dependentes da ofendida em instituição de educação básica mais próxima do seu domicílio, ou a transferência deles para essa instituição, independentemente da existência de vaga;

d) conceder à ofendida auxílio-aluguel, com valor fixado em função de sua situação de vulnerabilidade social e econômica por período não superior a 06 (seis) meses.

91 Art. 6º É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:I – os integrantes das Forças Armadas; II - os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP); III – os integrantes das guardas municipaisdas capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condições estabelecidas no re- gulamento desta Lei; IV - os integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) e menos de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, quando em serviço; V – os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os agentes do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; VI – os integrantes dos órgãos policiais referidos no art. 51, IV, e no art. 52, XIII, da Constituição Federal; VII – os integrantes do quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais, os integrantes das escoltas de presos e as guardas portuárias; VIII – as empresas de segurança pri- vada e de transporte de valores constituídas, nos termos desta Lei; IX – para os integrantes das entidades de desporto legalmenteconstituídas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observandose, no que couber, a legislação ambiental; X - integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscaldo Trabalho, cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário; XI - os tribunais do Poder Judiciário descritos no art. 92 da ConstituiçãoFederal e os Ministérios Públicos da União e dos Estados, para uso exclusivo de servidores de seus quadros pessoais que efetiva-mente estejam no exercício de funções de segurança, na forma de regulamento a ser emitido pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ e pelo Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP.

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2.6.2.3. Procedimento

2.6.2.3.1. Procedimento para aplicação de medidas protetivas

1º Na esfera policial (art. 12)

No prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a autoridade policial encaminhará expediente apartadoaojuiz,comopedidodaofendida, paraaconcessão demedidas protetivasde urgência (art. 12,inciso III).

O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:

a) qualificação da ofendida e do agressor;

b) nome e idade dos dependentes;

c) descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida;

d) informação sobre a condição de a ofendida ser pessoa com deficiência e se, da violência sofrida, resultou deficiência ou agravamento de deficiência preexistente.

Com o pedido, deverá ser anexado, pela autoridade policial, o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida, sendo admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde (art. 12, §§ 1º a 3º)

Na forma prevista no art. 12-C da Lei nº 11.340/2006, verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local deconvivência com a ofendida:

a) pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou b) pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia.

Em qualquer das hipóteses acima, o juiz será comunicado, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, e decidirá, em igual prazo, sobre a manutenção ou a revogação da medida aplicada, devendo dar ciência ao Ministério Público, concomitantemente.

Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso.

2º Na esfera judicial

Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida pela autoridadejudicial (art. 12-C, caput, incisoI).

Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso.

O pedido de medidas protetivas de urgência deverá ser formulado pelo órgão do Ministério Público ou pela própria ofendida.

Recebido o expediente, o juiz terá o prazo de 48(quarenta e oito) horas para:

a) conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;

b) determinar oencaminhamento da ofendida aoórgão de assistência judiciária, quandofor o caso, inclusive para o ajuizamento da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissoluçãode uniãoestável perante ojuízocompetente;

c) comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis;

d) determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor.As medidas protetivas de urgência:

a) poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado;

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b) serão aplicadas isolada ou cumulativamente, podendo ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei foremameaçados ou violados;

c) requerimento do órgão do Ministério Público ou a pedido da ofendida, poderá o juiz conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público;

d) serão concedidas em juízo de cognição sumária a partir do depoimento da ofendida perante a autoridade policial ou da apresentação de suas alegações escritas e poderãoser indeferidas no caso de avaliação pela autoridade de inexistência de risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes;

e) serão concedidas independentementedatipificação penal daviolência, doajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência.

f) não possuem prazo. Vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida e de seus dependentes.

A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público.

A vítima não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor (art. 21, caput e parágrafo único).

A teor do art. 24-A da Lei nº 11.340/2006, constitui crime descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas no referido diploma legal, com previsão de pena de detenção, de 03 (três) meses a 02 (dois) anos. A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas. Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança.

2.6.2.3.2. Procedimento daação penal

O Procedimento a ser adotado para o processo e julgamento da ação penal será o:

a) procedimento comum ordinário: se for o caso de infração a que a pena máxima privativada liberdade sejaigual ousuperior aquatroanosdeprisão (art.394,§1º,inciso I, CPP); ou

b) procedimento comum sumário: caso a pena máxima privativa da liberdade seja inferiora quatro anos de prisão (art. 394, § 1º, inciso II, CPP); ou c) procedimento do Tribunal do Júri: no caso de feminicídio92 - crime doloso contra avida (art. 394, § 3º, CPP).

A Lei nº 11.340/2006, em seu art. 41, estabelece, independentemente da pena máxima in abstrato prevista, a inaplicabilidade das normas da Lei nº 9.099/95. Descabe, portanto, a lavratura de termo circunstanciado de ocorrência (TCO) e a incidência dos institutos da composição civil, transação penal e suspensão condicional do processo.

Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que tratana Lei nº 11.340/2006, só será admitida a renúncia à representação antes do recebimento da denúncia perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, ouvido o órgão do Ministério Público.

É bom destacar que inexiste a obrigatoriedade de ratificação da representação já oferecida, mas, sim, e tão somente a imposição de uma condição especial para que eventual retratação, denominada, indevidamente, “renúncia”, pelo legislador, produza efeitos: a sua apresentação

92 Crime de homicídio praticado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, envolvendo violência doméstica e familiarou menosprezo ou discriminação à condição de mulher (art. 121, § 2º, inciso VI e § 2º-A, incisos I e II, todos do CP).

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em audiência perante a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, para que se possa aquilatar se a ofendida age espontaneamente, livre de qualquer coação.

Dessa forma, inexistindo qualquer manifestação expressa ou tácita da vítima no sentido de se retratar da representação, exigir o seu comparecimento em juízo para confirmar o interesse em processar seu agressor é impor condição injustificável, a qual fogeaoespírito protetivo da Lei.

Veda-se, ainda, a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa (art. 17, Lei nº 11.340/2006).

Relativamente à fixação da competência para processo e julgamento do crime de ameaça, no âmbito da Lei Maria da Penha, praticado por redes sociais, o Superior Tribunal de Justiça firmou posição de que essa competência é do local em que a vítima toma conhecimento das ameaças93 .

Ressalte-se que a Lei Maria da Penha será aplicada a todas as situações previstas em seu art. 5º, independentemente da causa ou da motivação dos atos de violência e da condição do ofensor ou da ofendida.

2.6.3. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL DOS CRIMES NO ÂMBITO DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

2.6.3.1. Previsão legal

Art. 22 da Lei nº 12.850/2013.

2.6.3.2. Cabimento

Considera-se organização criminosa a associação de 04(quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 04(quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional (art. 1º, § 1º, Lei nº 12.850/2013).

A Lei nº 12.850/2013 também se aplica:

a) às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

b) às organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a prática dos atosde terrorismo legalmente definidos.

2.6.3.3. Procedimento

Foram previstos na legislação instrumentos de investigação criminal e meios de obtenção da prova, a saber: a colaboração premiada, a captação ambiental, o acesso a registros, dados cadastrais, documentos e informações, a ação controlada e a infiltração de agentes policiais. Por outro lado, dispõe o art. 22, da Lei nº 12.850/2013, que os crimes nela previstos e as infrações penais conexas serão apurados mediante procedimentocomumordinário, observandose que:

a) a instrução criminal deverá ser encerrada em prazo razoável, o qual não poderá exceder120 (cento e vinte) dias, quando o réu estiver preso, prorrogável em até igual período, por decisão fundamentada, devidamente motivada, pela complexidade da causa oupor fato procrastinatório atribuível ao réu;

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93 CC 156.284/PR.

b) a condenação com trânsito em julgado acarretará ao funcionário público a perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo e a interdição para o exercício de funçãoou cargo público pelo prazo de 8(oito) anos subsequentes aocumprimento da pena;

c) as lideranças de organizações criminosas armadas ou que tenham armas à disposição deverão iniciar o cumprimento da pena em estabelecimentos penais de segurança máxima;

d) o condenado em sentença que, expressamente, reconheceu-o como integrante de organização criminosa ou que o condenou por crime praticado por meio de organização criminosa não poderá progredir de regime de cumprimento de pena, obter livramento condicional ou outros benefícios prisionais, se houver elementos probatórios que indiquem que ele mantém o vínculo associativo.

2.6.3.3.1. Julgamentos por juízos colegiados no 1º grau de jurisdição

(1) Formação de colegiado por opção do juiz natural

O art. 1º, da Lei nº 12.694/2012, faculta ao juiz natural decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, nos processos ou procedimentos que tenham por objeto apuração de crimes praticados por organizações criminosas, especialmente:

a) decretação de prisão ou de medidas assecuratórias;

b) concessão de liberdade provisória ou revogação de prisão;

c) sentença;

d) progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena;

e) concessão de liberdade condicional;

f) transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima; e g) inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.

A respeito do juízo colegiado, deve-se observar que:

a) a sua instauração se dará pelo juiz natural, o qual indicará em decisão fundamentadaos motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física, dando-se conhecimento ao órgãocorrecional;

b) será composto pelo juiz do processo e por 02(dois) outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no 1º grau de jurisdição;

c) a sua competência limita-se ao ato para o qual foi convocado;

d) as reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulteem prejuízo à eficácia da decisão judicial, podendo ser feitas pela via eletrônica, quando esse juízo colegiado for formado por juízes domiciliados em cidades diversas;

e) as suas decisões, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro;

f) os tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento;

g) obviamente, somente será cabível a sua formação onde não houver sido instalada vara criminal colegiada.

(2) Criação de varas criminais colegiadas

ALei nº 13.964/2019,aointroduzir oart.1º-Ana Lei nº 12.694/2012, autorizou osTribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais a instalar, nas comarcas sedes de Circunscrição ou Seção Judiciária, mediante resolução, varas criminais colegiadas com competência para o processo e julgamento:

a) de crimes de pertinência a organizações criminosas armadas ou que tenham armas à disposição;

120

b) do crime do art. 288-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e

c) das infrações penais conexas aos crimes a que se referem os incisos I e II do caput desse artigo.

As varas criminais colegiadas terão competência para prática de todos os atos jurisdicionais no decorrer da investigação, da ação penal e da execução da pena, inclusive para decidir sobre transferência do preso para estabelecimento prisional de segurança máxima ou para regime disciplinar diferenciado.

2.6.4. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL DOS CRIMES DE DROGAS

2.6.4.1. Previsão legal

Arts. 48, 54 a 58, todos da Lei nº 11.343/2006.

2.6.4.2. Cabimento

Aos crimes dispostos nos arts. 28, 33 a 39 da Lei nº 11.343/2006.

2.6.4.3. Procedimento

2.6.4.3.1. Crimesprevistos nos arts.28, 33, § 3º e 38, todos da Lei nº11.343/2006

Para as condutas previstas no art. 28, caput (primeira parte) e § 1º da Lei nº 11.343/200694 , salvo se houver concurso com os crimes previstos nos arts. 33 a 37, o processo e o julgamento se darão mediante procedimento sumaríssimo no Juizado Especial Criminal, sujeitando-se aos ditames da Lei nº 9.099/95 (art. 48, §1º da Lei nº 11.343/2006).

Os crimes estabelecidos nos arts. 33, § 3º e 38, ambos da Lei nº 11.343/2006, cujas penas máximas não superam 02(dois) anos, igualmente, serão processados no Juizado Especial Criminal.

Nesses casos, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhadoaojuízocompetenteou, nafaltadeste, assumirocompromissodeaelecomparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários (art. 48, §2º, Lei nº 11.343/2006).

Seausenteaautoridadejudicial,asrequisiçõesserãotomadasdeimediatopelaautoridade policial, no local em que o agente se encontrar, vedada a sua detenção.

Concluído o procedimento na repartição policial, o agente será submetido a exame de corpo de delito, se o requerer, ou se a autoridade policial entendê-lo conveniente, e, em seguida, liberado.

Na aplicação da proposta de transação penal, o órgão do Ministério Público somente poderá propor as medidas despenalizadoras previstas no art. 28 da Lei nº 11.343/2006, a serem especificadas na proposta.

Para maior detalhamento sobre o rito, remetemos o leitor para o item 2.4.3.3.

2.6.4.3.2. Demais crimes previstos na Lei nº 11.343/2006

1º Oferecimento de denúncia (art. 54)

Recebidos os autos da investigação preliminar, o órgão do Ministério Público disporá do prazo de 10(dez) dias, independentemente de estar oindiciado preso ou solto, para:

a) requerer o arquivamento;

b) requisitar as diligências que entender necessárias;

94 Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorizaçãoou em desacordo com determinação legal ou regulamentar [...] § 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pes- soal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.

121

c) oferecer denúncia, podendo arrolar até 05(cinco) testemunhas e requerer as demais provas que entender pertinentes.

(1.1) Oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo, se cabível

Ver item2.2.

2º Notificação do acusado para defesa prévia (art. 55)

Apresentada a denúncia, não sendo o caso de sua rejeição liminar, será o acusado notificado para oferecer defesa prévia, por escrito, no prazo de 10(dez) dias.

3º Defesa prévia (art. 55)

Na defesa previa, o acusado poderá arguir preliminares e invocar toda as razões de defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas que pretende produzir e arrolar até 05(cinco) testemunhas.

Dentro do prazo, a defesa poderá, ainda, apresentar qualquer das exceções, a qual será autuada em apartado na forma prevista nos arts. 95 a 113 do CPP.

A defesa prévia é peça obrigatória, razão pela qual, na hipótese de não apresentação, o juiz nomeará defensor dativo para oferecê-la em até 10(dez) dias.

4º Recebimento (ou rejeição) da denúncia

Com a defesa prévia, a autoridade judiciária, em até 05(cinco) dias, decidirá pelo recebimento (ou não) da denúncia.

Se entendê-la imprescindível para decidir, o juiz poderá determinar que o preso lhe seja apresentado, a realização de diligências, exames e perícias, que deverão ser efetivados no prazo máximo de 10 (dez) dias.

É suficiente, para o recebimento da denúncia, como objetivo de estabelecer amaterialidade, o laudo de constatação da natureza e da quantidade da droga, firmado por perito oficial ou, nafalta deste, por pessoa idônea (art. 50, § 1º da Lei nº 11.343/2006).

Tratando-se de condutas tipificadas nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37, ao receber a denúncia, o juiz poderá decretar o afastamento cautelar do denunciado de suas atividades, se for funcionário público, comunicando esse fato ao órgão público de sua lotação (art. 56, § 1º).

A rejeição da peça acusatória inaugural se dará quando presentes qualquer das circunstâncias estabelecidas no art. 395 do CPP95

5º Citação (art. 56)

Recebida a denúncia, o juiz designará dia e hora para a audiência de instrução e julgamento, ordenará a citação pessoal do acusado, a intimação do órgão do Ministério Público, do assistente, se for o caso, e requisitará os laudos periciais.

6º Audiência de instrução e julgamento (arts. 57 e 58)

A audiência será realizada dentro dos 30 (trinta) dias seguintes ao recebimento da denúncia, ou em até 90 (noventa) dias, se for determinada a realização de avaliação para atestar dependência de drogas.

No caso de citação por edital96 , se o acusado não comparecer, nem constituir advogado, o juiz, nos termos do art. 366 do CPP, determinará a suspensão do processo e o curso do prazo prescricional, podendo realizar a produção antecipada das provas consideradas urgentes, e, se necessário, decretara prisão preventiva.

95 Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condiçãopara o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para o exercício da ação penal

96 CPP. Art. 363. O processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado. [...] § 1o Não sendo encontrado o acusado, será procedida a citação por edital.

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O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo.

Nesse caso, comparecendo em juízo, prosseguirá na ação penal a partir da fase em que o processose encontrar.

Em que pese a lei não estabelecer expressamente o momento de juntada do laudo pericial definitivo, é de bom alvitre que a providência seja adotada antes da audiência instrutória, a fim de que se possa tomar conhecimento previamente do seu teor, inclusive, se for o caso, a parte contestá-lo e requerer contraprova, assegurando-se, assim, o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa.

Na audiência de instruçãoe julgamento,serãoinquiridas as testemunhas, procedendo-se ao interrogatório do denunciado, sendo, em seguida, dada a palavra, sucessivamente, ao órgão do Ministério Público e ao defensor do acusado, para sustentação oral, pelo prazo de 20 (vinte) minutos para cada um, prorrogável por mais 10 (dez), a critério do juiz.

7º Sentença (arts. 58 e 63)

Na sentença, o juiz, em caso de condenação, estabelecerá:

a) o perdimento do produto, bem, direito ou valor apreendido ou objeto de medidas assecuratórias; e b) o levantamento dos valores depositados em conta remunerada e a liberação dos bens utilizados provisoriamente pelos órgãos públicos.

Se não proferir a sentença em audiência, o juiz terá até 10(dez) dias para proferi-la.

2.6.4.4. Daapreensão, alienação, arrecadação e destinação debens doacusado

1º Apreensão

Nos termos do art. 60 da Lei nº 11.343/2006, no curso do inquérito policial ou da ação penal,aautoridadejudiciária,medianterepresentaçãodaautoridadepolicialouarequerimento do órgão do Ministério Público ou do assistente de acusação, poderá determinar a apreensão e outras medidas assecuratórias, quando houver suspeita de que os bens, direitos ou valoressejam produto do crime ou constituam proveito dos crimes previstos na lei antidrogas.

O procedimento adotado será o previsto nos arts. 125 e seguintes do CPP.

Em se tratando de hipótese de suspensão do processo na forma do art. 366 do CPP, o juiz determinará a prática de atos necessários à conservação dos bens, direitos ou valores.

Dispõe o art. 60-A, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, que, se as medidas cautelares de ordem patrimonial recaírem sobre moeda estrangeira, títulos, valores mobiliários ou cheques emitidos comoordemdepagamento,será determinada,imediatamente,aconversãoemmoedanacional corrente e feito o depósito das correspondentes quantias emconta judicial.

A moeda estrangeira apreendida em espécie deverá ser encaminhada para instituição financeira ou equiparada, para fins de alienação na forma prevista pelo Conselho Monetário Nacional. Não sendo possível a operação, ela ficará custodiada pela instituição financeira até decisão sobre o seu destino. Não sendo verificada a existência de valor de mercado, seus espécimes poderãoser destruídos ou doados à representação diplomática do país de origem.

A apreensão de veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte e dos maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de qualquer natureza utilizados para a prática dos crimes definidos na lei antidrogas será imediatamente comunicada ao juízo competente pela autoridade de polícia judiciária responsável pela investigação.

2º Alienação

Comunicado daapreensão,ojuiz,noprazodeaté 30(trinta)dias, determinaráaalienação dos bens apreendidos, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma da legislação

123

específica, ordenando às secretarias de fazenda e aos órgãos de registro e controle que efetuem as averbações necessárias, tão logo tenha conhecimento da medida. Ao órgão do Ministério Público caberá fiscalizar o cumprimento da providência.

A alienação será realizada em autos apartados, dos quais constarão a exposição sucinta do nexo de instrumentalidade entre o delito e os bens apreendidos, a descrição e especificação dos objetos, as informações sobre quem os tiver sob custódia e o local em que se encontrem.

A autoridade judiciária determinará a avaliação dos bens apreendidos, a qual será realizada por oficial de justiça, no prazo de até 05 (cinco) dias a contar da autuação, ou, caso sejam necessários conhecimentos especializados, por avaliador nomeado pelo juiz, em prazo não superior a 10 (dez) dias.

Feita a avaliação, o juiz intimará o representante da Secretaria Nacional de Políticas sobre asDrogas(SENAD) - órgão pertencente à estrutura do Ministério da Justiça eSegurança Pública e responsável pela gestão do Fundo Nacional Antidrogas (FUNAD), o órgão do Ministério Público e o interessado para se manifestarem no prazo de até 05 (cinco) dias e, dirimidas eventuais divergências, homologará o valor atribuído aos bens.

Os bens móveis eimóveis devem ser vendidos por meio dehasta pública, preferencialmente por meio eletrônico, assegurada a venda pelo maior lance, por preço não inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor da avaliação judicial.

Na alienação de veículos, embarcações ou aeronaves, a autoridade de trânsito ou o órgão congênere competente para o registro, bem como as secretarias de fazenda devem proceder à regularização desses bens no prazo de 30 (trinta) dias, ficando o arrematante isento do pagamento de multas, encargos e tributos anteriores, sem prejuízo de execução fiscal em relação ao antigo proprietário. A autoridade de trânsito ou o órgão congênere competente para o registro poderá emitir novos identificadores dos bens.

Eventuais multas, encargos ou tributos pendentes de pagamento não podem ser cobrados do arrematante ou do órgão público alienante como condição para regularização dos bens.

3º Arrecadação

O depósito, em dinheiro, de valores referentes ao produto da alienação ou a numerários apreendidos ou que tenham sido convertidos deve ser efetuado na Caixa Econômica Federal, por meio de documento de arrecadação destinado a essa finalidade.

A transferência se dará para a conta única do Tesouro Nacional na Caixa Econômica Federal, independentemente de qualquer formalidade, dentro do prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contado do momento da realização do depósito, ficando à disposição do FUNAD.

A instituição bancária deverá manter o controle dos valores depositados.

4º Destinação provisória

Comprovado o interesse público na utilização de qualquer dos objetos apreendidos, os órgãos de polícia judiciária, militar ou rodoviária poderão deles fazer uso, sob sua responsabilidade e com o objetivo de sua conservação, mediante autorização judicial, ouvido o Ministério Público e garantida a prévia avaliação dos respectivos bens.

O juízo deve cientificar o órgão gestor do FUNAD para que, dentro de 10 (dez) dias, avalie a existência do interesse público na utilização dos bens apreendidos e indique o(s) órgão(s) que deve(m) recebê-los, recaindo a prioridade nos órgãos de segurança pública que participaram das ações de investigação ou repressão ao crime que deu causa à medida.

A autorização judicial de uso de bens deverá conter a descrição do bem e a respectiva avaliação, indicando o órgãoresponsável por sua utilização. Esse órgão deverá enviar aojuiz, periodicamente, ou a qualquer momento quando por este solicitado, informações sobre seu estado de conservação.

124

Quando a autorização judicial recair sobre veículos, embarcações ou aeronaves, o juiz ordenará à autoridade ou ao órgão de registroe controle a expedição de certificado provisório de registro e licenciamento em favor do órgão ao qual tenha deferido o seu uso ou a sua custódia, ficando este livre do pagamento de multas, encargos e tributos anteriores à decisão de utilização do bem até o trânsito em julgado da decisão que decretar o seu perdimento em favor da União.

5º Destinação final

Nenhumpedidoderestituiçãoseráconhecidosemocomparecimentopessoaldoacusado, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores.

O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens, direitos e objeto de medidas assecuratórias, quando comprovada a licitude de sua origem, mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal.

Transitada em julgado a sentença condenatória, o juiz do processo, de ofício ou a requerimento do órgão do Ministério Público, remeterá à SENAD, relação dos bens, direitos e valores declarados perdidos em favor da União, indicando, quanto aos bens, o local em que se encontram e a entidade ou o órgão em cujo poder estejam, para os fins de sua destinação, nos termos da legislação vigente.

Os bens, direitos ou valores apreendidos ou objeto de medidas assecuratórias, que tiveram decretado o perdimento em favor da União, serão revertidos diretamente ao FUNAD.

O juizremeterá aoórgão gestor do FUNAD a relação dos bens, direitos e valoresdeclarados perdidos,indicandoolocalemqueseencontrameaentidadeouoórgãoemcujopoderestejam, para os fins de sua destinação, nos termos da legislação vigente.

Antes de encaminhar os bens ao órgão gestor do FUNAD, o juiz deve:

a) ordenar às secretarias de fazenda e aos órgãos de registro e controle que efetuem as averbações necessárias, caso nãotenham sido realizadas quando da apreensão; e b) determinar, no caso de imóveis, o registro de propriedade em favor da União no cartório de registro de imóveis competente, nos termos do caput e do parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal97113, afastada a responsabilidade de terceiros, prevista no inciso VI do caput do art. 134 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 196698, bem como determinar à Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União a incorporação e a entrega do imóvel, tornando-olivre e desembaraçado de quaisquer ônus para sua destinação.

Compete à SENAD, proceder à destinação dos bens apreendidos e não leiloados em caráter cautelar, cujo perdimento seja decretado em favor da União, por meio das seguintes modalidades:

a) alienação, mediante:

1. licitação;

2. doação com encargo a entidades ou órgãos públicos, bem como a comunidades terapêuticas acolhedoras que contribuam para o alcance das finalidades do FUNAD; ou

97 Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psico- trópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º. Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinaçãoespecífica, na forma da lei.

98 Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solida- riamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: [...] VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;

125

3. venda direta, observado o disposto no art. 24, caput, inciso II da Lei nº 8.666/9399; 4. incorporação ao patrimônio de órgão da administração pública, observadas as finalidades do FUNAD; b) destruição; ou c) inutilização.

Na licitação dos bens móveis e imóveis, deverá ser observado que:

a) a sua realização deverá ocorrer na modalidade leilão de bem ou de lotes, independentemente do valor de avaliação, isolado ou global, assegurada a venda pelo maior lance, por preço não inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor da avaliação;

b) o edital do leilão será amplamente divulgado em jornais de grande circulação e em sítios eletrônicos oficiais, principalmente no Município em que será realizado, dispensada a publicação em diário oficial. Caso realizada por meio de sistema eletrônico da administração pública, a publicidade dada pelo sistema substituirá a publicação em diário oficial e em jornais de grande circulação; c) tratando-se de imóveis, o arrematante fica livre do pagamento de encargos e tributos anteriores, sem prejuízo de execução fiscal em relação ao antigo proprietário; se se tratarde veículos, embarcações ou aeronaves, a autoridade de trânsito ou o órgão congênere competente para o registro, bem como as secretarias de fazenda, devem proceder à regularização dos bens no prazo de 30 (trinta) dias, ficando o arrematante isento do pagamento de multas, encargos e tributos anteriores, sem prejuízo de execução fiscal em relação ao antigo proprietário. Nessa situação, a autoridade de trânsito ou o órgão congênere competente para o registro poderá emitir novos identificadores dos bens; d) ficam proibidas de cobranças ao arrematante ou ao órgão público alienante, como condição para regularização dos bens, eventuais multas, encargos ou tributospendentes de pagamento;

e) observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, fica autorizada a contrataçãoda iniciativa privada para a execução das ações de avaliação, de administração e de alienação dos bens.

A SENAD poderá celebrar convênios ou instrumentos congêneres com órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, bem como com comunidades terapêuticas acolhedoras, a fim de dar imediato cumprimento ao procedimento de destinação dos bens perdidos emfavor da União.

Compete ao Ministério da Justiça e Segurança Pública regulamentar os procedimentos relativos à administração, à preservação e à destinação dos recursos provenientes de delitos e atos ilícitos e estabelecer os valores abaixo dos quais se deve proceder à sua destruição ou inutilização.

O produto da alienação dos bens apreendidos ou confiscados será revertido integralmente ao FUNAD, nos termos do art. 243, parágrafo único da Constituição Federal100, vedada a subrogação sobre o valor da arrematação para saldar eventuais multas, encargos ou tributos pendentes de pagamento, sem prejuízo de eventual ajuizamento de execução fiscal em relação aos antigos devedores.

Na hipótese de condenação por infrações às quais a Lei nº 11.343/2006 comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele compatível com o seu rendimento lícito.

99 Art. 24. É dispensável a licitação: [...] II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez; 100 Art. 243. [...] Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecen- tes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, naforma da lei.

126

Entretanto, a decretação da perda fica condicionada à existência de elementos probatórios que indiquem conduta criminosa habitual, reiterada ou profissional do condenado ou sua vinculação à organização criminosa.

Nesse sentido, entende-se por patrimônio do condenado todos os bens:

a) de sua titularidade, ousobre os quais tenha domínio e benefício direto ou indireto, nadata da infração penal, ourecebidos posteriormente, e b) transferidos a terceiros, a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir do início da atividade criminal.

Nesse caso, o condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência lícita do patrimônio.

A União, por intermédio da SENAD, poderá firmar convênio com os Estados, com o Distrito Federal e com organismos orientados para a prevenção do uso indevido de drogas, a atenção e a reinserção social de usuários ou dependentes e a atuação na repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas, com vistas à liberação de equipamentos e de recursos por ela arrecadados para a implantação e a execução de programas relacionados à questão das drogas.

Na hipótese de decretação do seu perdimento em favor da União, o valor do depósito mantido na instituição bancária será transformado em pagamento definitivo, respeitados os direitos de eventuais lesados e de terceiros de boa-fé.

Decorridos 360 (trezentos e sessenta) dias do trânsito em julgado e do conhecimento da sentença pelo interessado, os bens apreendidos, os que tenham sido objeto de medidas assecuratórias ou os valores depositados que não forem reclamados serão revertidos ao FUNAD. Por outro lado, em sendo o réu absolvido:

a) na hipótese de absolvição do acusado em decisão judicial, o valor do depósito será aele devolvido pela Caixa Econômica Federal, em até 03 (três) dias úteis, acrescido de juros, na forma estabelecida pelo § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250/95;

b) na hipótese de levantamento, se houver indicação de que os bens utilizados provisoriamente por órgãos públicos sofreram depreciação superior àquela esperadaem razão do transcurso do tempo e do uso, poderá o interessado requerer nova avaliação judicial;

c) constatada a depreciação do bem, o ente federado ou a entidade que o utilizou indenizará oseu detentor ou o seu proprietário.

2.6.5.

PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A ECONOMIA POPULAR

2.6.5.1. Previsão legal

Lei nº1.521/51.

2.6.5.2. Cabimento

Aplicável para o processo e julgamento dos crimes tipificados nos arts. 2º a 4º da Lei nº 1.521/51.

Ressalte-se que não mais subsiste a previsão contida no art. 12, a qual atribuía a competência do Tribunal do Júri para julgamento dos crimes previstos no art. 2º da Lei nº 1.521/51, porquanto a competência do referido órgão jurisdicional está delimitada constitucionalmente aos crimesdolosos contra a vida e, por força das regras de competência, aos com eles conexos.

127

2.6.5.3. Procedimento

Será aplicado o procedimento comum:

a) ordinário: crimes com pena privativa de liberdade máxima igual ou superior a 04 (quatro) anos (art. 394, § 1º, inciso I, CPP);

b) sumário: crimes com pena privativa de liberdade máxima cominada inferior a 04 (quatro) anos, com previsão nos art. 394, § 1º, inciso II, CPP);

c) sumaríssimo: crimes de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei nº 9.099/95).

Porém, deve-se observar que:

a) oprazo para oferecimento da denúncia será de 02(dois) dias,esteja ou nãooréu preso(art. 10, § 2º, da Lei nº 1.521/51);

b) a sentença do juiz será proferida dentro do prazo de 30 (trinta) dias contados do recebimento dos autos da autoridade policial (art. 536, CPP);

c) os juízes recorrerão de ofício sempre que absolverem os acusados em processo por crime contra a economia popular ou contra a saúde pública, ou quando determinaremo arquivamento dos autos do respectivo inquérito policial (art. 7º, Lei nº 1.521/51).

2.6.6.

PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES FALIMENTARES

2.6.6.1. Previsão legal

Arts. 183 a 188 da Lei nº 11.101/2005.

2.6.6.2. Cabimento

Para processamento e julgamento dos crimes tipificados nos arts. 168 a 178 da Lei nº 11.101/2005.

A competência para o processamento e o julgamento da ação penal é do juiz criminal da jurisdição na qual tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial.

Em qualquer fase processual, surgindo indícios da prática dos crimes previstos nesta Lei, o juiz da falência ou da recuperação judicial ou da recuperação extrajudicial cientificará o Ministério Público para as providências que entender cabíveis.

2.6.6.3. Procedimento

Não sendo a pena máxima superior a 02(dois) anos, de início, adotar-se-á o procedimento sumaríssimo

Para os demais crimes, independentemente de ser a sanção privativa de liberdade igual, inferior ou superior a 04(quatro) anos, o rito a ser observado é o procedimento sumário101, com as particularidades decorrentes da Lei nº 11.101/2005:

1º Denúncia (ou queixa-crime)

Os crimes previstos na Lei nº 11.101/2005 são de ação penal de iniciativa pública incondicionada.

Exaurido o prazo de oferecimento da denúncia, permanecendo inerte o órgão do Ministério Público, qualquer credor habilitado ou o administrador judicial poderá propor a ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, mediante queixa-crime, observado o prazo decadencial de 06(seis) meses (art. 184, parágrafo único, CPP).

101 Ver item2.4.2.3.

128

O prazo para a apresentação de denúncia é o previsto no art. 46 do CPP, isto é, estando o réu preso, será de 05(cinco) dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15(quinze) dias, se o réu estiver solto ou afiançado.

Poderá, entretanto, o órgão do Ministério Público, estando o réu solto ou afiançado, decidir aguardar a apresentação da exposição circunstanciada de que trata o art. 186 da Lei nº 11.101/2005102 , devendo, em seguida, oferecer a denúncia em 15 (quinze) dias.

Nadaimpedeque,intimadodasentença quedecretarafalênciaouconcederarecuperação judicial, o órgão do Ministério Público, verificando a ocorrência de qualquer crime previsto na Lei nº 11.101/2005, promova imediatamente a competente ação penal ou, se entender necessário, requisite a abertura de inquérito policial.

2º Juízo de admissibilidade da peça acusatória inicial

É de se destacar que, nos termos do art. 180 da Lei nº 11.101/2005, a sentença que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou concede a recuperação extrajudicial de que trata o art. 163 é condição objetiva de punibilidade das infrações penais falimentares.

A prescrição reger-se-á pelas disposições do Código Penal, começando a correr do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial.

Por sua vez, a decretação da falência do devedor interrompe a prescrição, cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial (art. 182, caput e parágrafo único da Lei nº 11.101/2005).

3º Sentença

São efeitos da condenação definitiva:

a) a inabilitação para o exercício de atividade empresarial;

b) o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a esta Lei;

c) a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio.

Ditos efeitos não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença. Perdurarão por até 05(cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação penal.

Transitada em julgado a sentença penal condenatória, será notificado o Registro Público de empresas para que tome as medidas necessárias para impedir novo registro em nome dos inabilitados.

2.6.7. PROCEDIMENTO

2.6.7.1. Previsão legal

DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE

Lei nº 13.869/2019.

2.6.7.2. Cabimento

Cabível para o processo e o julgamento dos crimes de abuso de autoridade, previstos nos arts. 9º ao 38 da Lei nº 13.869/2019.

Será sujeito ativo do delito qualquer agente público, servidor ou não, da administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de Território, compreendendo, mas não se limitando a:

102 Art. 186. No relatório previsto na alínea e do inciso III do caput do art. 22 desta Lei, o administrador judicial apresentará ao juiz da falência exposição circunstanciada, considerando as causas da falência, o procedimento do devedor, antes e depois da sentença, e outras informações detalhadas a respeito da conduta do devedor e de outros responsáveis, se houver, por atos que possam cons- tituir crime relacionado com a recuperação judicial ou com a falência, ou outro delito conexo a estes. Parágrafo único. A exposição circunstanciada será instruída com laudo do contador encarregado do exame da escrituração do devedor.

129

a) servidores públicos e militares ou pessoas a eles equiparadas;

b) membros do Poder Legislativo; c) membros do Poder Executivo; d) membros do Poder Judiciário; e) membros do Ministério Público; f) membros dos tribunais ou conselhos de contas.

Considera-se agente público, para os efeitos da lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função em órgão ouentidadedaadministraçãodireta,indiretaoufundacional dequalquer dosPoderesdaUnião, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de Território.

2.6.7.3. Procedimento

Os crimes previstos nesta Lei são de ação penal de iniciativa pública incondicionada,com titularidade privativa do Ministério Público (art. 129, inciso I, CF). Após o prazo legal para oferecimento de denúncia, se constatada inércia do órgão ministerial, é admitida a ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, prevista no art. 29 do CPP.

Nos termos do art. 39 da Lei nº 13.869/2019, aplicam-se, no que couber, além das disposições contidas no CPP, as regras da Lei nº 9.099/95.

Assim, temos, em síntese:

a) sujeitos, a priori, ao procedimento sumaríssimo do Juizado Especial Criminal, nos termos do art. 61 da Lei nº 9.099/95, os crimes previstos nos arts. 12, 16, 18, 20, 27, 29,31, 32, 33, 37 e38 da Lei nº 13.869/2019;

b) cabível a suspensão condicional do processo (art. 89, Lei nº 9.099/95103), quando preenchidos os requisitos de caráter individual relativos ao autor do fato, nos delitos previstos nos arts. 9º, 10º, 13, 15, 19, 21, 22, 23, 24, 25, 28, 30 e 36.

Por outro lado, diante da necessária qualidade de funcionário público do agente ativo, o processamento e o julgamento dos crimes que não forem da competência do Juizado Especial Criminal obedecerão ao rito previsto para o procedimento dos crimes funcionais previstos nos arts. 513 a 518 do CPP, observando as particularidades contidas nos arts. 4º, 7º e 8º da Lei nº 13.869/2019, a saber:

a) Efeitos da condenação:

1. tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, devendo o juiz,a requerimento do ofendido, fixar na sentença o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos por ele sofridos;

2. a inabilitação para oexercício de cargo, mandato ou função pública, pelo períodode 1(um) a 5(cinco) anos;

3. a perda do cargo, do mandato ou da função pública.

Os efeitos previstos nos itens 1 e 2 são condicionados à ocorrência de reincidência em crime de abuso de autoridade e não são automáticos, devendo ser declarados motivadamente na sentença;

a) as responsabilidades civil e administrativa são independentes da criminal, não se podendo mais questionar sobre a existência ou a autoria do fato quando essas questões tenham sido decididas no juízo criminal;

b) faz coisa julgada em âmbito cível, assim como no administrativo-disciplinar, a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, [...]”.

130
103

2.6.8.1. Previsão legal

Arts. 26 a 28 da Lei nº 9.605/98.

2.6.8.2. Cabimento

Cabível para o processo e o julgamento dos crimes previstos nos arts. 29 a 69-A da Lei nº 9.605/98.

Há, ainda, a possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica, na forma prevista noart. 3º do referido diploma legal, estando ela sujeita, isolada, cumulativa ou alternativamente, às penas de:

a) multa;

b) sanções restritivas de direitos (art. 22);

c) prestação de serviços à comunidade (art. 23).

2.6.8.3. Procedimento

As ações penais são de iniciativa pública incondicionada.

Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, sujeito ao rito sumaríssimo dos Juizados Especiais Criminais, consoante arts. 60 e 61 da Lei nº 9.099/95, a proposta de transação penal, prevista no art. 76 da referida lei, somente será formulada se tiver sido assumido pelo autor do fato, previamente, o compromisso de composição do dano ambiental de que trata o art. 74104 , exceto em caso de comprovada impossibilidade.

Nos demais crimes, seguir-se-á:

a) o procedimento ordinário: se a sanção privativa de liberdade máxima cominada for igual ou superior a 04(quatro) anos; ou

b) o procedimento sumário: se a pena máxima prevista for superior a 02(dois) anos e inferior a 04(quatro) anos.

Aplicar-se-á, quando couber, proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/95), com as seguintes peculiaridades:

a) a declaração de extinção de punibilidade dependerá de laudo de constatação de reparação do dano ambiental, salvo impossibilidade de fazê-lo;

b) na hipótese de o laudo de constatação comprovar não ter sido completa a reparação, o prazo de suspensão do processo será prorrogado, até o período máximo de 04(quatro) anos, acrescido de mais um ano, com suspensão do prazo da prescrição. No períodode prorrogação, não haverá proibição de frequentar determinados lugares; proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz; obrigatoriedade de comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades;

c) findo o prazo de prorrogação, proceder-se-á à lavratura de novo laudo de constatação de reparação do dano ambiental, podendo, conforme seu resultado, ser novamente prorrogado o período de suspensão nos mesmos moldes da prorrogação anterior, citados na letra anterior; d) esgotado o prazo máximo de prorrogação, a declaração de extinção de punibilidade dependerá de laudo de constatação que comprove ter o acusado tomado as providências necessárias à reparação integral do dano.

104 Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficáciade título a ser executado no juízo civil competente. Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.

131 2.6.8.
DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES AMBIENTAIS
PROCEDIMENTO

2.6.9.1. Cabimento

Cabível para o processamento e ojulgamento dos crimes tipificados na Lei nº 9.613/98, com as alterações advindas com a Lei nº 12.683/2012.

2.6.9.2. Procedimento

Nos termos do art. 2º da Lei nº 9.613/98, o procedimento:

a) seguirá as disposições relativas ao procedimento comum. É que o Código de Processo Penal, a partir da Lei nº 11.719/2008, classifica os ritos segundo o quantum máximo dapena em abstrato imposta: ordinário, sumário e sumaríssimo. Logo, inaplicável o art.2º, inciso I da Lei nº 9.613/98105;

b) independerá do processo e do julgamento de infração penal antecedente, aindaque sejam praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes delavagem ou ocultação de bens, direitos e valores a decisão sobre a unidade de processoe julgamento;

c) a denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos na lei ora tratada, ainda que extinta a punibilidade daquela, desconhecido ou isento de pena o seu autor. A apuração do crime de lavagem de dinheiro é autônoma e independe do processamento e da condenação em crime antecedente;

a) a competência será da Justiça Federal quando i) os crimes forem praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômicofinanceira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas; ii) a infração penal antecedente for de competência da Justiça Federal.

Por sua vez, o art. 2º, § 2º da Lei nº 9.613/98 dispõe que às ações penais que apuram o crime de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores não se aplica o disposto no art. 366 do CPP, devendo prosseguir o feito com a nomeação de defensor dativo para assisti-lo, na hipótese de citação por edital em que o acusado não atender ao chamamento judicial nem constituir advogado.

2.6.9.2.1. Decretação de medidas cautelares deordem patrimonial

O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em 24(vinte e quatro) horas, nos termos do caput do art. 4º da Lei nº 9.613/98, havendo indícios suficientes de infração penal, poderá decretar medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas – conhecidas popularmente como “laranjas”, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes nela previstos ou das infrações penais antecedentes.

Para preservação do valor dos bens que estiverem sujeitos a deterioração ou a depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção, poderá ser autorizada a alienação antecipada.

O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens, direitos e valores, quando comprovada a licitude de sua origem, mantendo-se a constrição daqueles necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal.

105 Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei: I – obedecem às disposições relativas ao procedimento comum dos crimes punidos com reclusão, da competência do juiz singular.

132
2.6.9. PROCEDIMENTO DA AÇÃO PENAL NOS CRIMES DE LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DEBENS, DIREITOS EVALORES

Entretanto, como preceitua o art. 4º, § 3º da Lei nº 9.613/98, nenhum pedido de liberação seráconhecidosemocomparecimentopessoaldoacusadooudapessoainterposta,considerada aquela em cujo nome estejam os bens, direitos ou valores, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à sua conservação, sem prejuízo de eventual alienação antecipada.

Poderão, ainda, ser decretadas medidas assecuratórias sobre bens, direitos ou valores para garantir a reparação do dano decorrente da infração penal antecedente da prevista na Lei nº 9.613/98 ou para pagamento de prestação pecuniária, multa e custas.

Para fins de preservação do valor dos bens sob constrição, poderá ser realizada a sua alienação antecipada, na forma do art. 4º-A da Lei nº 9.613/98, para tanto, observando-se que: a medida será determinada pela autoridade judiciária, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou por solicitação da parte interessada, mediante petição autônoma,a qual será autuada em apartado e cujos autos tramitarão emseparado, em relação aoprocesso principal;

a) o requerimento de alienação deverá conter a relação de todos os demais bens, com a descrição e a especificação de cada um deles, e informações sobre quem os detém e o local onde se encontram;

b) o juiz determinará a avaliação dos bens, nos autos apartados, e intimará o órgão do Ministério Público;

c) feita a avaliação e dirimidas eventuais divergências sobre o respectivo laudo, o juiz, por sentença, homologará o valor atribuído aos bens e determinará sejam alienados em leilão ou pregão, preferencialmente eletrônico, por valor não inferior a 75% (setenta e cinco por cento) da avaliação;

d) realizado o leilão, a quantia apurada será depositada em conta judicial remunerada, adotando-se a seguinte disciplina:

1) nos processos de competência da Justiça Federal e da Justiça do Distrito Federal:

i. os depósitos serão efetuados na Caixa Econômica Federal ou em instituição financeira pública, mediante documento adequado para essa finalidade;

ii. os depósitos serão repassados pela Caixa Econômica Federal ou por outra instituiçãofinanceira pública para a Conta Única do Tesouro Nacional, independentemente de qualquer formalidade, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, e

iii. os valores devolvidos pela Caixa Econômica Federal ou por instituição financeira pública serão debitados na Conta Única do Tesouro Nacional, em subconta de restituição;

2) nos processos de competência da Justiça dos Estados:

i. os depósitos serão efetuados em instituição financeira designada em lei, preferencialmente pública, de cada Estado ou, na sua ausência, em instituição financeira pública da União;

ii. os depósitos serão repassados para a conta única de cada Estado, na forma da respectiva legislação;

e) serão deduzidos, da quantia apurada no leilão, todos os tributos e multas incidentes sobre o bem alienado, sem prejuízo de iniciativas que, no âmbito da competência de cada ente da Federação, venham a desonerar daqueles ônus bens sob constrição judicial;

f) feito o depósito, os autos da alienação serão apensados aos do processo principal;

g) mediante ordem da autoridade judicial, após o trânsito em julgado da sentença proferida na ação penal, o valor do depósito será:

1. em caso de sentença condenatória, nos processos de competência da Justiça Federal e da Justiça do Distrito Federal, incorporado definitivamente ao patrimônio

133

da União, e, nos processos de competência da Justiça Estadual, incorporado ao patrimônio do Estado respectivo;

2. em caso de sentença absolutória extintiva de punibilidade, colocado à disposição do réu pela instituição financeira, acrescido da remuneração da conta judicial; h) a instituição financeira depositária manterá controle dos valores depositados ou devolvidos.

i) terão apenas efeito devolutivo os recursos interpostos contra as decisões proferidas no curso do procedimento da alienação antecipada.

Por suavez, com o trânsito em julgado desentença penalcondenatória,ojuizdecretará,em favor da União ou doEstado, conforme o caso:

a) a perda dos valores depositados na conta remunerada e da fiança;

b) a perda dos bens não alienados antecipadamente e daqueles aos quais não foi dada destinação prévia, e

c) a perda dos bens não reclamados no prazo de 90 (noventa) dias, contados após o trânsito em julgado da sentença condenatória, ressalvado o direito de lesado ou terceiro de boa-fé.

No caso dos bens a que se referem os itens “b” e “c”, serão adjudicados ou levados a leilão, depositando-se o saldo na conta única do respectivo ente (art. 4-A, §§ 10 e 11, Lei nº 9.613/98).

O juiz determinará ao registro público competente que emita documento de habilitação à circulação e utilização dos bens colocados sob o uso e custódia das entidades (Art. 4º-A, § 12, Lei nº 9.613/98).

Entretanto, os recursos arrecadados com a alienação antecipada de bens, direitos e valores oriundos do crime de tráfico ilícito de drogas e que tenham sido objeto de dissimulação e ocultação nos termos da Lei nº 9.613/98 permanecem submetidos à disciplina definida na lei específica (Lei nº 11.343/2006).

Quandoas circunstâncias oaconselharem, ojuiz, ouvido o órgão do Ministério Público, nomeará pessoa física ou jurídica qualificada para a administração dos bens, direitos ou valores sujeitos a medidas assecuratórias, mediante termo de compromisso (art. 5º, Lei nº 9.613/98).

Nos termos do art. 6º, da Lei nº 9.613/98, a pessoa nomeada:

a) fará jus a uma remuneração, fixada pelo juiz, que será satisfeita com o produto dos bens objeto da administração;

b) prestará, por determinação judicial, informações periódicas da situação dos bens sob sua administração, bem como explicações e detalhamentos sobre investimentos e reinvestimentos realizados.

Ademais, os atos relativos à administração dos bens sujeitos às medidas assecuratórias serão levados ao conhecimento do órgão do Ministério Público, o qual requererá o que entender cabível.

Com relação ao disposto no art. 17-D da Lei nº 9.613/98, que determinava o afastamento automático de servidor público indiciado em inquérito instaurado para apurar crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 4.911/DF, realizado em 23 de novembro de 2020, pub. no DJe de 03.12.2020, decidiu pela inconstitucionalidade do referido dispositivo.

2.6.9.2.2. Ação controlada

A ordem de prisão de pessoas ou as medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores poderão ser suspensas pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações (art. 4º-B, Lei nº 9.613/98).

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2.7. ENUNCIADOS DE SÚMULAS

2.7.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Súmula Vinculante 11: Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Súmula Vinculante 15: A homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial.

Súmula 310: Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir.

Súmula 351: É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da Federação em que o juiz exerce a sua jurisdição.

Súmula 352: Não é nulo o processo penal por falta de nomeação de curador ao réu menor que teve a assistência de defensor dativo.

Súmula 366: Não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia.

Súmula 396: Para a ação penal por ofensa à honra, sendo admissível a exceção da verdade quanto ao desempenho de função pública, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que já tenha cessado o exercício funcional do ofendido.

Súmula 451: A competência especial por prerrogativa de função não se estende ao crime cometido após a cessação definitiva do exercício funcional.

Súmula 453: Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa.

Súmula 524: Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.

Súmula 554: O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal.

Súmula 560: A extinção de punibilidade, pelo pagamento do tributo devido, estende-se ao crime de contrabando ou descaminho, por força do art. 18, § 2º, do Decreto-lei 157/67.

Súmula 594: Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, independentemente, pelo ofendido ou por seu representante legal.

Súmula 603: A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do Juiz singular e não do Tribunal do Júri.

Súmula 608: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.

Súmula 609: É pública incondicionada a ação penal por crime de sonegação fiscal.

Súmula 696: Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.

Súmula 703: A extinção do mandato do prefeito não impede a instauração de processo pela prática dos crimes previstos no art. 1º do Dl. 201/67.

Súmula 709: Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela.

135

Súmula 710: No processo penal, contam-se os prazos da data da intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem.

Súmula 712: É nula a decisão que determina o desaforamento de processo da competência do júri sem audiência da defesa.

Súmula 714: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público,condicionada àrepresentação doofendido, para aaçãopenal porcrime contraa honra de servidor público em razão do exercício de suas funções.

2.7.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Súmula 21: Pronunciado o réu, fica superada a alegação do constrangimento ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução.

Súmula 33: A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.

Súmula 52: Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo.

Súmula 64: Não constitui constrangimento ilegal oexcesso de prazo na instrução, provocado pela defesa.

Súmula 74: Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil.

Súmula 191: A pronúncia é causa interruptiva da prescrição, ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime.

Súmula 234: A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

Súmula 243: O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um(01) ano.

Súmula 330: É desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial.

Súmula 415: O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada.

Súmula 438: É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamentoempena hipotética, independentemente da existência ousortedoprocessopenal.

Súmula 455: A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, nãoa justificando unicamente o mero decurso do tempo.

Súmula 536: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.

Súmula 542: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada.

Súmula 667: Eventual aceitação de proposta de suspensão condicional do processo não prejudica a análise do pedido de trancamento de ação penal.

136
138

Provimentos judiciais 3

Também chamados de atos jurisdicionais, os provimentos judiciais são os atos praticados pelo juiz, no processo, com o objetivo de solucionar questões ou de determinar providências106

3.1. CLASSIFICAÇÃO

Classificam-se os provimentos judiciais em:

3.1.1. DESPACHOS DE MERO EXPEDIENTE

São os provimentos judiciais destinados ao impulso processual, sem qualquer carga decisória (ex.: despacho de designação de audiência; juntada de documentos ao processo, dentre outros).

3.1.2. DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS

São as decisões dotadas de carga decisória, porém sem a análise meritória da ação principal.

Classificam-se em:

a) decisões interlocutórias simples: resolvem incidentes processuais ou atinentes à regularidade formal do processo, sem acarretar a extinção do processo ou de uma desuas etapas (ex: decisão de recebimento da denúncia; decisão de rejeição das exceçõesde coisa julgada, de litispendência e de ilegitimidade de parte; decisão que julga procedente a exceção de incompetência; dentre outras);

b) decisões interlocutórias mistas:

1. terminativas(oudecisões com força de definitivas): extinguem o processo, sem julgamento de mérito, ou resolvem um procedimento incidental de maneira definitiva, sem possibilidade de reexame no mesmo grau de jurisdição (ex: rejeição da peça 106 PACHECO, Denílson Feitosa. Direito processual penal: teoria, crítica e práxis 3. ed. rev. ampl. e atual. Niterói, RJ: Impetus, 2005, p. 1139.

139

acusatória; impronúncia; decisões que julgam procedentes exceções de litispendência, de coisa julgada, de ilegitimidade ad causam daparte, etc.);

2. não terminativas: não encerra, mas põem fim a uma etapa do procedimento, sem julgamento de mérito (ex: decisão de pronúncia).

3.1.3.

DECISÕES DEFINITIVAS

São provimentos judiciais que julgam o mérito (o direito de punir estatal), ocasionando a extinção do processo ou do procedimento.

Dividem-se em:

a) sentença ou decisão definitiva em sentido estrito: o juiz aprecia o mérito da ação penal, condenando ou absolvendo oacusado;

b) decisões definitivas em sentido amplo ou decisões terminativas de mérito: o juiz decideo mérito e extingue o processo ou o procedimento, mas não condena, nem absolve o acusado.

3.2. SENTENÇA

Sentença (ou decisão definitiva em sentido estrito) é o provimento judicial que, apreciando o mérito da ação penal, condena ouabsolve oacusado.

3.2.1.

CLASSIFICAÇÃO

As sentenças se classificam quanto ao órgão prolator, quanto aos efeitos e quanto à sua natureza, senão vejamos:

3.2.1.1. Quanto ao órgão prolator

a) subjetivamente simples: sentença proferida por apenas uma pessoa (ex.: sentençaproferida pelo juiz singular);

b) subjetivamente plúrima: sentença proferida por órgão colegiado homogêneo (ex.:decisão de câmaras, turmas ou seções de Tribunais);

c) subjetivamente complexa: sentença proferida por órgão colegiado heterogêneo (ex.: sentença do Tribunal do Júri em que o Conselho de Sentença decide sobre o crime e autoria, enquanto ao juiz-presidente incumbe a fixação da pena, tudo em uma única peça).

3.2.1.2. Quanto aos efeitos

a) executável: sentençaquepodeserexecutadaimediatamente(ex.: sentençaabsolutória);

b) não executável: sentença que não admite execução imediata (ex.: sentença pendentede recurso);

c) condicional: sentença que carece de um acontecimento futuro e incerto (ex.: a que concede a suspensão condicional da pena, o livramento condicional).

3.2.1.3. Quanto à sua natureza

a) condenatória: sentença que julga procedente a pretensão punitiva, total ou parcialmente;

b) absolutória:

• própria: não acolhe a pretensão punitiva;

140

• imprópria: não acolhe a pretensão punitiva, entretanto impõe medida de segurança ao réu por reconhecer a existência de um fato típico e ilícito, praticado por inimputável (art. 26, CP)107;

c) declaratória: limita-se a declarar uma situação preexistente (ex.: decisão que reconhecea extinção de punibilidade doacusado, emrazão de sua morte);

d) constitutiva108:

• positiva: é a que faz surgir uma nova situação jurídica (ex.: decisão concessiva da reabilitação criminal);

• negativa: é aquela que importa em desconstituir um ato jurídico anterior, até então válido e eficaz (ex.: decisão de revisão criminal);

e) mandamental: é a decisão que, além de declaração, contém uma ordem a ser executada imediatamente (ex.: decisão concessiva de habeas corpus);

f) executiva: é a decisão que, por si mesma, determina o cumprimento satisfativo da pretensão (ex.: decisão que determina a venda dos bens inscritos no registro de imóveis, após a sentença condenatória transitada em julgado).

3.2.2.

PRINCÍPIOS

3.2.2.1. Princípio da identidade física do juiz

O art. 399, § 2º do CPP, determina que o juiz que presidir a instrução criminal deverá proferir a sentença.

No entanto, a aplicabilidade do princípio da identidade física do juiz não é absoluta, justificando-se a prolatação da decisão por autoridade judiciária diversa, quando aquela que presidiu a instrução estiver impossibilitado de fazê-lo, em virtude de convocação, licença, promoção, férias ou outro motivo legal.

3.2.2.2. Princípio da motivação

A Constituição Federal, em seu art. 93, inciso IX, estabelece que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”.

Portanto, a fundamentação de uma decisão deve abranger a exposição das razões de fatoe de direito que serviram para formação do convencimento do julgador.

3.2.2.3. Princípio da correlação (ou da congruência)

Pelo princípio da correlação (ou da congruência), a sentença deve ser proferida de acordo com os limites demarcados pela pretensão acusatória (objeto do processo penal), constante da denúncia (ou da queixa-crime) oucomplementada em eventual aditamento à peça exordial109 . O objeto do processo, portanto, é o tema proposto como res judicanda, cuja finalidade mais característica é a obtenção da res judicata.

Não poderá o juiz ampliar ou restringir a pretensão acusatória, proferindo decisão extra petita (fora do pedido), citra petita (aquém do pedido) ou ultra petita (fora do pedido), sob pena de violar o princípio da correlação e ensejar nulidade absoluta do julgamento.

107 127 Ibid., p. 1143

108 AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Op. Cit., p. 977/978

109 “[...] 2. Para o Supremo Tribunal Federal, o princípio da congruência significa que o acusado se defende dos fatos descritos na denúncia; e não da capitulação jurídica que se lhes dá. Assim, é suficiente a correlação entre o fato descrito na peça acusatória e o fato pelo qual o réu foi condenado, sendo irrelevante a menção expressa na denúncia de eventuais causas de aumento ou dimi- nuição de pena (HC 120.587, Rel. Min. Luiz Fux). É também o que prevê o art. 383 do CPP. 3. Agravo regimental desprovido”. (1ªTurma; HC 184.198 AgRg no HC 184.198/DF; Rel. Min. Roberto Barroso; j. em sessão virtual de 07.08 a 17.08.2020; pub. no DJe de 01.09.2020).

141

3.2.2.3.1. Emendatio libelli

Por força do disposto no art. 383 do CPP110 , a autoridade judiciária, na sentença, poderá dar ao fato classificação jurídica diversa da atribuída pela acusação, desde que preservada a suadescriçãofática.

É que o processo penal é informado pelo princípio jura novit curia (livre dicção do direito), entendendo-se que o juiz conhece o direito, e pelo princípio narra mihi factum, dabo tibi jus (narra-me o fato e te darei o direito). Portanto, o juiz usufrui de liberdade para interpretar os fatos e o direito, motivadamente.

Nessa linha de raciocínio, o acusado não se defende da classificação jurídica atribuída ao fato na peça inicial, mas da situação fática que lhe é imputada pela acusação.

Logo, desde que não haja modificação da descrição fática contida na peça acusatória, poderá o juiz atribuir-lhe tipo penal diverso da definição jurídica originalmente conferida pela acusação, sem que isso constitua violação ao princípio da correlação, ainda que tenha que aplicar pena mais grave (art. 383, CPP). É a denominada emendatio libelli, a qual poderá ser aplicada a qualquer tipo de ação penal.

Feita a reclassificação jurídica do fato, na hipótese de cabimento de suspensão condicional do processo, deve a autoridade judiciária, antes de prosseguir com o julgamento da causa, determinar a intimação do órgão do Ministério Público para os fins previstos no art. 89 da Lei nº 9.099/95.

De igual modo, verificando que a providência redefine o fato para infração da competência de outrojuízo, deverá para este encaminhar os autos.

Admite-se, também, a possibilidade de emprego da emendatio libelli em 2ª instância, nos julgamentos de eventuais recursos, a teor do disposto no art. 617, primeira parte do CPP 111 , desde que respeitado o princípio da proibição da reformatio in pejus.

3.2.2.3.2. Mutatio libelli

Por outro lado, durante a instrução criminal, poderá surgir prova de elemento ou circunstância de infração penal não contida na acusação, a qual importe na necessidade de uma nova definição jurídica ao fato tido como criminoso, e, como consequência, a modificação superveniente da própria causa petendi.

Para evitar violação aos princípios da correlação (ou da congruência), da inércia da jurisdição, docontraditório edaampladefesa, aplica-se o instituto da mutatiolibelli, estabelecido no art. 384 do CPP112 .

Registre-se que a mutatio libelli somente terá aplicação se o fato constitutivo de elementar ou circunstância da infração penal, surgido na instrução probatória, guardar relação com a imputação fática originária da peça acusatória a ponto de modificá-la, conferindo-lhe nova definiçãojurídica.

110 Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave. § 1o Se, em consequência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei. § 2o Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.

111 Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença

112 Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente. § 1o Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código. § 2o Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento. § 3o Aplicam-se as disposições dos §§ 1o e 2o do art. 383 ao caput deste artigo. § 4o Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento. § 5o Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá

142

Na hipótese de surgir fato novo, isto é, fato autônomo sem qualquer relação com o objeto da peça inicial, deverá ser adotada a providência contida no art. 569 do CPP113 , em caso de conexão oucontinência,ouaproposituradeaçãopenalprópria,conformesemostremaisadequado.

Para uma melhor compreensão, exemplifica-se: a denúncia imputa ao indivíduo a descrição da prática de crime de roubo simples. Durante a instrução, a prova testemunhal demonstra que ele se utilizou de arma de fogo para obrigar a vítima a entregar os pertences, dado fático não disposto na peça acusatória inicial, cuja circunstância é causa de aumento da pena, devido ao emprego de arma de fogo. Assim, será preciso aditar a acusação para incluir esse fato, mediante aplicação da mutatiolibelli

Nesse contexto,a autoridadejudiciária determinará, após encerrada ainstrução criminal, a abertura de vista ao órgão do Ministério Público para que, no prazo de 05(cinco) dias, adite a denúncia ou a queixa-crime (na ação penal de iniciativa privada subsidiária), se, em virtude desta, houver sido instaurado o processo em crime de ação pública. Se o aditamento for feito oralmente, será reduzido a termo.

Apresentado o aditamento, o defensor do acusado será ouvido sobre o seu teor, no prazo de 05 (cinco) dias.

Deliberando pelo recebimento do aditamento, a requerimento de qualquer das partes, a autoridade judiciária designará dia e hora para audiência, podendo ser inquiridas até 03 (três) testemunhas para cada uma das partes, com o interrogatório do acusado, e, em seguida, a realização de debatese ojulgamento.

Destarte, se a nova imputação fática importar em crime de competência de outro juízo, os autos deverãoser-lhe encaminhados.

Igualmente, passando a admitir o cabimento de suspensão condicional do processo, deverá a autoridade judiciária, antes de prosseguir no julgamento da causa, determinar a intimação do órgão do Ministério Público para que se pronuncie sobre o previsto no art. 89 da Lei nº 9.099/95.

Não recebido o aditamento, o processo seguirá com base na imputação acusatória originária.

Na hipótese de discordância entre o posicionamento da autoridade judiciária, que insistir pela aplicabilidade da mutatio libelli, e o entendimento do órgão do Ministério Público, que se recusa a proceder ao aditamento, aquele deverá remeter os autos para a instância revisional ministerial para pronunciamento, nos termos do art. 384, § 1º c/c 28, todos do CPP:

Posicionando-se a instituição supracitada pela confirmação do não oferecimento do aditamento, deverá a autoridade judiciária absolver o denunciado pelo fato criminoso não descrito na acusação.

Sob outro aspecto, ao contrário da emendatio libelli, inexiste aplicação da mutatio libelli em sede recursal.

A propósito, sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 453, com o seguinte enunciado: “Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa”.

3.2.3. REQUISITOS DA SENTENÇA

A sentença deverá conter requisitos intrínsecos (relatório, fundamentação e parte dispositiva) e requisitos extrínsecos (autenticação).

113 Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da sentença final.

143

3.2.3.1. Requisitos intrínsecos da sentença

3.2.3.1.1. Relatório

O relatório (art. 381, incisos I e II, CPP) é a síntese do que ocorreu no processo, devendo conter os nomes das partes, ou, quando não for possível, as indicações necessárias para identificá-las, a exposição sucinta da acusação e da defesa e os demais atos principais praticados no curso da persecução penal.

No âmbito dos juizados especiais criminais, há dispensa de sua apresentação (art. 81, § 3º da Lei nº 9.099/95).

3.2.3.1.2. Fundamentação

Na fundamentação da sentença (art. 381, incisos III e IV, CPP), o seu subscritor irá expor analiticamente os motivos de fato e de direito que concorreram para a formação do seu convencimento sobre o objeto da ação, a partir dos elementos probatórios produzidos durante a instrução, esclarecendo, igualmente, os elementos jurídicos que fundamentam a decisão, com indicação dos artigos de lei aplicados ao caso em exame.

Todavia, será desnecessária a menção expressa a cada uma das teses arguidas pelas partes, desde que reste evidenciado que todas elas foram devidamente enfrentadas, direta ou indiretamente, ainda que de maneira sucinta.

3.2.3.1.3. Parte dispositiva

Na parte dispositiva da sentença (art. 381, inciso V, CPP), o julgador irá lançar a sua conclusão, tendo em vista a fundamentação já exposta, a qual,

a) na decisão condenatória, compreenderá a constituição da procedência da pretensão,a aplicação da pena concreta e suas consequências legais (art. 387, caput e incisos I, II e III, CPP), e, ainda, a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causadospela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido (art. 387, caput, inciso IV, CPP);

b) na decisão absolutória, expressará a declaração da absolvição do acusado e o respectivo motivo (art. 386, CPP).

3.2.3.2. Requisito extrínseco da sentença

3.2.3.2.1. Autenticação

Data e assinatura do juiz sentenciante (art. 381, inciso VI, CPP).

3.2.4. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA

A sentença absolutória se caracteriza como sentença stricto sensu, a qual analisa o mérito da causa em todos seus aspectos, e, ao final, julga improcedente a acusação feita pelo autor da ação.

Classifica-se em:

a) sentença absolutória própria: não há imposição de qualquer consequência jurídica; b) sentença absolutória imprópria: absolve o acusado, no entanto, impõe-lhe medida de segurança por reconhecer a sua inimputabilidade aotempo do fato

3.2.4.1. Fundamentos dasentença absolutória

À luz do art. 386, caput, incisos I a VII do CPP, um juízo absolutório deverá ser proferido nas seguintes hipóteses:

a) estar provada a inexistência do fato;

b) não haver prova da existência do fato;

144

c) não constituir o fato infração penal;

d) estar provado que oréu nãoconcorreu para a infração penal; e) não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;

f)existirem circunstâncias que excluam o crime114 ou isentem o réu de pena115;

g) houver fundada dúvida sobre a existência de circunstância que exclua o crime ou isente oréu de pena;

h) não existir prova suficiente para a condenação.

3.2.4.2. Efeitos da sentença absolutória

A sentença absolutória produzirá:

1º Efeito principal

a) a imediata colocação do absolvido em liberdade, se for o caso (art. 386, parágrafo único,incisoI, CPP);

b) a cessação das medidas cautelares de ordem pessoal diversas da prisão eventualmente aplicadas (art. 386, parágrafo único, inciso II, CPP);

c) na hipótese de sentença absolutória imprópria (art. 386, parágrafo único, inciso III, CPP), considerando que não há aplicação de medida de segurança provisória, deverá:

• se estiver em liberdade, aguardar o trânsito em julgado da decisão, salvo se houver motivos para decretação da prisão preventiva;

• se já estiver internado, continuará na mesma situação, aguardando o trânsito em julgado da decisão para início do cumprimento da medida de segurança;

2º Efeitos secundários

a) a restituição integral da fiança (art. 337 do CPP);

b) a impossibilidade de novo processo contra o acusado, em face do mesmo fato criminoso116;

c) o levantamento do sequestro (art. 131, inciso III do CPP), arresto ou cancelamento da hipoteca (art. 141 do CPP);

d) aretirada daidentificação fotográfica dosautos do processo (art.7ºda Lei nº 12.037/09).

3.2.5. SENTENÇA CONDENATÓRIA

Na sentença penal condenatória, a autoridade judiciária decidirá:

a) a pena privativa de liberdade: nos termos do art. 387, caput, incisos I, II e III do CPP, ojuiz sentenciante, levando em consideração as etapas do sistema trifásico, previsto no art. 68 do CP, objeto de estudo de direito penal, fixará:

1 a pena-base (art. 59 do Código Penal);

2. as atenuantes e agravantes (arts. 65 e 66, 61 e 62, respectivamente, todos do Código Penal);

3. as causas de diminuição (minorantes) e de aumento (majorantes) estabelecidas pela lei penal;

b) a pena de multa, quando cabível, a ser estabelecida em duas etapas: a primeira, para definição da quantidade de dias-multa - de acordo com as circunstâncias do art. 59 do Código Penal - e a segunda, a fim de arbitrar o valor de cada dia-multa, levando-se em consideração a capacidade econômica dos réus;

114 Art. 23 do Código Penal.

115 Arts. 20, caput, 1ª parte e § 1º, 1ª parte do Código Penal.

116 Princípio ne bis in idem

145

c) o regime prisional inicial: a fixação do regime inicial para cumprimento de pena deve seguir os parâmetros estabelecidos nos arts. 33, §§ 2º e 3º e 59, do Código Penal, sendo observado que, por força do disposto no 387, § 2º do CPP, o tempo de prisãoprovisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será abatido para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade;

d) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, se couber: aplicada a pena privativa de liberdade em concreta e determinado o regime prisional inicial, deve a autoridade judiciária, na própria decisão, proceder à substituição da pena privativa em liberdade pela restritiva de direitos ou por multa, nos moldes do art.44, caput do Código Penal;

e) a suspensão condicional da pena: aplicada a pena em concreto e decidido o regime prisional inicial, e, sendo cabível, será decidido sobre a suspensão condicional da pena(art. 77 do Código Penal);

f) sobre a imposição ou a manutenção da prisão preventiva ou de medidas cautelares diversas da prisão;

g) eventual arbitramento de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. Todavia, há necessidade da existência de pedido expresso na queixa ou na denúncia, a fim de oportunizar ao réuo contraditório e a ampla defesa sobre a existência do dano, inclusive com instrução específica e, em caso de procedência, a mensuração do seu valor.

O Supremo Tribunal Federal117 e o Superior Tribunal de Justiça118 admitem a possibilidade de condenação à indenização por dano moral coletivo no âmbito do processocriminal (art. 387, IV, CPP);

h) após o trânsito em julgado da decisão, em condenação resultante de crimes contra as relações de consumo, pela publicação, em jornal, da sentença na íntegra ou em resumo, nos termos do art. 78, inciso II da Lei nº 8.078/90.

3.2.5.1. Efeitos da sentença condenatória

1º Efeitos penais

a) primários:cumprimentodapenaeainclusãodonomedoacusadonoroldosculpados; b) secundários: indução de reincidência, possibilidade de regressão do regime carcerário, revogação do sursis ou do livramento condicional da pena.

2º Extrapenais

a) obrigatórios:

• obrigação de reparar o dano (art. 91, inciso I, CP);

• perda, em favor da União, dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé (art. 91, inciso II, alínea “a”, CP);

• perda, em favor da União, do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé (art. 91, inciso II, CP).

b) específicos:

• perda do cargo, função pública ou mandato eletivo;

• incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, no caso de condenação por crime doloso, punido com reclusão, contra filho, tutelado e curatelado;

• inabilitação para dirigir automóveis.

117 Pleno, STF, AP 1025, Rel. Min. Edson Fachin, Rel. p/ Acórdão: Min. Alexandre de Moraes, j. em 31/05/2023, pub. no DJe de 21/09/2023

118 STJ, 5º Resp nº 2.018.442-RJ, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em 12/12/2023, pub. no DJe de 19/12/2023.

146

3.2.6. PUBLICAÇÃO E REGISTRO DA SENTENÇA

A publicidade da sentença é o que a torna efetivamente existente como ato jurisdicional.

Na forma do art. 389 do CPP, a sentença será publicada pelo escrivão que, procedendo à anotação registral, lavrará, nos autos, termo atestando a ocorrência.

É da data da publicação que a sentença se considera proferida.

Com a publicação da sentença, há o chamado esgotamento da instância, porquanto a autoridade judiciária que a proferiu exaure a sua função jurisdicional, somente podendo alterála para correção de erros materiais ou na hipótese de procedência de embargos declaratórios eventualmente interpostos119

3.2.7. INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Após a publicação e oregistro da sentença, o escrivão, no prazo de 03(três), procederá à intimação dos interessados, a saber:

• o Órgão do Ministério Público: pessoalmente e mediante entrega dos autos com vista120;

• o querelante e o assistente de acusação: pessoalmente ou por intermédio do advogado por ele constituído. Se nenhum deles for encontrado, a intimação se dará mediante edital com prazo de 10(dez) dias;

• Vítima: por força do disposto no art. 201, §§ 2º e 3º do CPP121 , será cientificada do teor da sentença e dos respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem, podendo a comunicação ocorrer no endereço por ela indicado na ação penal, ou, por sua opção, mediante uso de meio eletrônico;

• Réu, na forma do art. 392 do CPP:

» pessoalmente, se estiver preso;

» pessoalmente, ou ao defensor que houver constituído, quando se livrar solto, ou, sendo afiançável a infração, tiver prestado fiança. Se ele não for encontrado, nem o defensor que houver constituído, e assim o certificar o oficial de justiça, a intimação sefará mediante edital;

» por intermédio de defensor que houver constituído, se, afiançável, ou não, a infração, expedido o mandado de prisão, não tiver sido encontrado, e assim o certificar o oficial de justiça. Se o defensor que houver constituído também não for encontrado, e assim o certificar o oficial de justiça, proceder-se-á à sua intimação por edital;

» mediante edital, se, não tendo constituído defensor, ele não for encontrado, e assimo certificar o oficial de justiça.

O prazo do edital será de 90(noventa) dias, se tiver sido imposta pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 01(um) ano, e de 60(sessenta) dias, nos demais casos.

• Defensor constituído, do advogado do querelante e do assistente: consoante art. 370 do CPP, far-se-á por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca, incluindo, sob pena de nulidade, o nome do acusado. Inexistindo órgão

119 Ver item5.3.3.

120 Lei nº 8.625/93, art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica: [...] IV - receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, através da entrega dos autos com vista; [...].

121 Art. 201. Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presu-ma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. [...] § 2o O ofendido será comunicadodos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem. § 3o As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por eleindicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico.

147

de publicação dos atos judiciais na comarca, a intimação far-se-á diretamente pelo escrivão, por mandado, por via postal com comprovante de recebimento, ou por qualquer outro meioidôneo.

• Defensor nomeado pelo juízo: pessoalmente (art. 370, § 4º do CPP122). Em sendo Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, observar-se-á o benefício de contagem em dobro de todos os prazos (art. 5º, § 5º da Lei nº 1.060/50).

Importante atentar que o prazo para interposição de recurso começará a contar somente após o término do período fixado no edital, salvo se, no curso deste, for feita a intimação por qualquer das outras formas acima mencionadas.

A intimação pessoal, realizada diretamente pelo escrivão, dispensa a publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca.

Atente-se que, se a intimação do sentenciado e a do seu advogado ocorrerem em datas distintas, prevalecerá, para fins de início da fluência do prazo, aquele que terminar por último.

Não se perca de vista que a ausência de intimação da sentença é causa de nulidade (art. 564, inciso III, alínea “ o”, CPP).

3.2.8.

COISA JULGADA

A coisa julgada se divide em:

a) coisa julgada formal: torna imutável os efeitos da decisão que, embora não examine o mérito, encerra o processo;

b) coisa julgada material: impede o reexame da matéria não somente no processo em quefoi proferida, mas em qualquer outro.

A coisa julgada material pressupõe a ocorrência da coisa julgada formal.

Nas decisões de natureza processual, com a preclusão das vias recursais, por não analisarem o mérito do processo, haverá apenas coisa julgada formal. Como exemplo, citam-se a decisão de rejeição liminar da denúncia, com base na inépcia, e a decisão de impronúncia, dentre outras.

Em contrapartida, a sentença (absolutória ou condenatória) e a decisão definitiva (v.g., a decisão que decreta a extinção de punibilidade), como atos terminativos de mérito, ao se tornarem definitivas, pela ausência ou pelo esgotamento dos meios de impugnação recursal, fazem coisajulgada formal e material.

A coisa julgada material assegura que as questões que foram objeto da sentença não poderão ser mais revistas em face do mesmo réu, ainda que a decisão esteja eivada de erro in judicando ou erro in procedendo, salvo em seu benefício, por intermédio da revisão criminal ou do habeas corpus

Em que pese a coisa julgada atingir sua plenitude de efeitos, na hipótese de sentença absolutória ou declaratória de extinção da punibilidade (coisa soberanamente julgada), tem-se admitido, excepcionalmente, a revisão da sentença absolutória, quando o seu objetivo for alterar os fundamentos da decisão, a fim de afastar a possibilidade do sentenciado ser demandado em açãocivil ex delicto.

Por sua vez, à sentença condenatória não se reconhece a plena imutabilidade de seus efeitos, uma vez que ela é passível de revisão criminal a qualquer tempo, até mesmo após a morte do condenado, conforme prevê o art. 623 do CPP.

3.2.8.1. Limites objetivos e subjetivos da coisa julgada penal

Os limites objetivos da coisa julgada se circunscrevem aos pontos ou às questões litigiosas que foram decididas na sentença.

122 CPP,Art. 370. [...] § 4o Aintimação do Ministério Público e do defensor nomeado será pessoal.

148

Éimportante destacar que o que interessa é o fato natural imputado, independentemente da classificação jurídica a ele atribuída.

Em síntese, o que a coisa julgada material proíbe é nova acusação pelo mesmo fato natural em face daquele que já foi julgado em processo anterior. Trata-se do efeito negativo da coisa julgada.

Nesse aspecto, quanto aos limites objetivos da coisa julgada, no art. 110, § 2º do CPP, o legislador dispõe que “A exceção de coisa julgada somente poderá ser oposta em relação ao fato principal, que tiver sido objeto da sentença”.

Por outro lado, os limites subjetivos da coisa julgada asseguram a qualidade da sua imutabilidade unicamente entre as partes da ação, nada impedindo que outras pessoas sejam acusadas pelo mesmo fato.

3.3. ENUNCIADOS DE SÚMULAS

3.3.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Súmula 146: A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação.

Súmula 424: Transita em julgado o despacho saneador de que não houve recurso, excluídas as questões deixadas, explícita ou implicitamente, para a sentença.

Súmula 611: Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.

Súmula 719: A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.

3.3.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Súmula 18: A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, nãosubsistindo qualquer efeitocondenatório.

Súmula 269: É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos, se favoráveis as circunstâncias judiciais.

Súmula 440: Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidadeabstrata do delito.

Súmula 444: É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.

Súmula 588: A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Súmula 631: O indulto extingue os efeitos primários da condenação (pretensão executória), mas não atinge os efeitos secundários, penais ou extrapenais.

Súmula 636: A folha de antecedentes criminais é documento suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência.

149
151

Inicialmente, para melhor compreensão das nulidades, vejamos as espécies de ato processual defeituoso:

i) ato inexistente: é aquele que atinge os elementos essenciais do ato processual, sequer sendo considerado como existente. Logo, independentemente de pronunciamento judicial, jamais será válido e eficaz (Ex.: sentença proferida por quem não se acha investido de funçãojurisdicional);

j) ato anulável: é o ato atingido por vício processual capaz de invalidar o processo no todo ou em parte, e que é decorrente da inobservância de exigências legais.

k) ato irregular: é o ato cujo defeito não produz qualquer prejuízo às partes ou ao processo, sendo considerado como válido e eficaz.

4.1. CLASSIFICAÇÃO DAS NULIDADES

As nulidades se classificam em nulidade absoluta e nulidade relativa.

4.1.1. NULIDADE ABSOLUTA

Trata-se de vício que, por atingir normas de ordem pública, ou seja, normas que tutelam garantias ou matérias tratadas direta ou indiretamente pela Constituição Federal123 , poderá ser alegado a qualquer tempo, não sendo convalidado pelo decurso temporal (preclusão temporal)ou pela aceitação da parte, ainda que tacitamente (preclusão lógica).

A nulidade absoluta gera presunção juris tantum (presunção relativa) de prejuízo às partes.

Entretanto,ajurisprudência pátriaadmitequeapartequeseráprejudicadapeladeclaração da nulidade demonstre a inexistência, de fato, de qualquer prejuízo à parte que a alegou ou ao processo, afastando, desse modo, a possibilidade de reconhecimento do vício.

Por outro lado, não há que se confundir ato processual inexistente e nulidade absoluta: no primeiro, o ato é desprezado, não havendo possibilidade de ser válido ou eficaz, dispensandose qualquer provimento judicial que declare sua inexistência. Para que tenha validade, o ato deverá ser novamente praticado; na nulidade absoluta, por sua vez, enquanto não houver pronunciamento judicial reconhecendo a mácula, o ato existe e produzirá efeitos.

A nulidade absoluta poderá ser arguida pelas partes ou reconhecida ex officio pela autoridade judiciária.

4.1.2. NULIDADERELATIVA

A nulidade relativa atinge normas que tutelam o interesse privado da parte, sem repercussões de ordem pública.

O reconhecimento judicial do vício processual depende de provocação tempestiva e de demonstração da existência de prejuízo pela parte, sob pena de restar convalidado.

123 AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Processo penal esquematizado 2. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010, p. 918.

152
Nulidades 4

4.2. PRINCÍPIOS

4.2.1. PRINCÍPIO DO PREJUÍZO

Para o reconhecimento da nulidade absoluta ou da nulidade relativa, há necessidade de comprovação do efetivo prejuízo para o processo ou para as partes (art. 563, CPP)124

É a síntese do brocardo pas de nullité sans grief (“Não há nulidade sem prejuízo”).

Domesmomodo,nãoserádeclaradaanulidadedeatoprocessualquenãohouverinfluído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa (art. 566, CPP).

4.2.2. PRINCÍPIO

DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS

Também chamado de princípio da economia processual, o princípio da instrumentalidade das formas consagra que não se declara a nulidade de ato que, embora não tenha observado o modelo disposto em lei, teve a sua finalidade atingida, sem causar prejuízo para o processo e para as partes (art. 572, incisoII, CPP).

4.2.3. PRINCÍPIO DA EFICÁCIA DOS ATOS PROCESSUAIS

O princípio assegura que o ato processual, enquanto não declarada a sua nulidade por decisão judicial, continuará a produzir os seus efeitos regulares.

4.2.4. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE

O princípio da causalidade (ou da sequencialidade) se refere aoalcance da decretação de invalidade do ato processual (nulidade originária), a qual provocará a invalidação dos atos que lhe foram consequência ou decorrência (nulidade derivada).

Nesse contexto, a autoridade judiciária, ao decidir pelo reconhecimento da nulidade, deverá indicar o ato processual originariamente nulo e os atos que serão invalidados por derivarem dele, tudo em atendimento ao disposto no art. 573, §§ 1º e 2º do CPP.

4.2.5. PRINCÍPIO DO INTERESSE

O princípio dointeresse veda que a nulidadeseja alegada pela parte que lhe deucausa ou para a qual tenha concorrido, consoante disposto no art. 565, primeira parte do CPP. Portanto, proíbe-se que a parte tire proveito da sua própria má-fé ou malícia, na prática de um ato processual125 .

De igual forma, por falta de interesse processual, a parte não poderá alegar nulidade de formalidade cuja observância só interessa à parte adversa (art. 565, parte final, CPP).

124 “[...] I – Esta Suprema Corte possui entendimento consagrado no sentido de que, para o reconhecimento de eventual nulidade, ain- da que absoluta, faz-se necessária a demonstração do efetivo prejuízo, o que não ocorreu na espécie. Isso porque a demonstração de prejuízo, “[a] teor do art. 563 do CPP, é essencial à alegação de nulidade, seja ela relativa ou absoluta, eis que (…) ‘o âmbito normativo do dogma fundamental da disciplina das nulidades –pas de nullité sans grief – compreende as nulidades absolutas’” (HC 85.155/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 15/4/2005). [...]” (STF, 2ª T., HC 115114 AgR, Rel. Min. Cristiano Zannin, j. em12/12/2023, pub. no DJe de 18/12/2023).

125 “[...] Nãopode a defesa valer-se desuposto prejuízo a que venha a dar causa ou para o qual concorra, nos termos do artigo 565 do Código de Processo Penal. Precedente. [...]” (STF, Pleno, RvC 5532AgR, Rel. Min. LuizFux, j. em09/10/2023, pub. no 24/10/2023).

153
GERAIS APLICÁVEIS ÀS NULIDADES

O princípio da convalidação, com aplicação específica para as nulidades relativas, estabelece que a nulidade estará sujeita à preclusão temporal, se não for alegada no momento processual oportuno126

Os arts. 568, 579 e 572, todos do CPP, contêm hipóteses de convalidação de atos ou omissões inicialmente eivadas de nulidade.

Com relaçãoà falta ou nulidade da citação, da intimação ou da notificação, o art. 570 do CPP expressa que o comparecimento do interessado, antes de o ato se consumar, ainda que o faça somente para arguir a irregularidade, sanará o vício. Todavia, o juiz ordenará a suspensão ou adiamento do ato processual, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

A convalidação do ato processual, evitando a declaração de sua nulidade, dar-se-á por intermédio do(a):

a) suprimento: é a complementação de eventuais omissões no curso do processo;

b) retificação: correção do ato processual defeituoso;

c) ratificação: é a ratificação do ato processual eivado de nulidade após ser devidamente sanado o vício. Por exemplo, prevê o art. 568 do CPP que a nulidade por ilegitimidadedo representante da parte poderá ser a todo tempo sanada, mediante ratificação dosatos processuais;

d) preclusão:

1. preclusão temporal, a qual ocorre quando a nulidade relativa não for arguida no momento processual oportuno (art. 571, CPP);

2. preclusão lógica, que acontece quando a parte, ainda que tacitamente, aceita os efeitos da nulidade relativa;

3. preclusão consumativa, que ocorre quando o ato processual já foi validamente consumado.

e) sentença: a prolatação da sentença, quando favorável à parte prejudicada pelo ato processual viciado, afasta a conveniência do reconhecimento da nulidade. É que, nesse caso, o juiz, a despeito de reconhecer a nulidade relativa, entende que a causa está suficientemente pronta para uma apreciação meritória em favor da parte prejudicadapelo ato processual viciado. É a aplicabilidade da teoria da causa madura, reconhecida no art. 282, § 2º do CPC e aplicada ao processo penal por força do disposto no art. 3º doCPP. Igualmente, a providência deve ser adotada em caso de recurso, quando o juízo ad quem, ao invés de declarar nulo o processo, considera-o suficientemente instruído para absolver o acusado, assim o fazendo.

f) coisa julgada: a coisa julgada funciona como uma causa de saneamento geral, pois a imutabilidade da decisão alcança as irregularidades não alegadas ou não apreciadas durante a tramitação do processo. Há exceção quanto às nulidades absolutas em favor da defesa, as quais poderão ser arguidas até mesmo após o trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria, por meio de habeas corpus ou de revisãocriminal.

4.2.7.

PRINCÍPIO DA CONSERVAÇÃO

O princípio da conservação possibilita o aproveitamento dos atos processuais que não guardem relação de dependência ou de consequencialidade com oatotido como nulo.

154 4.2.6. PRINCÍPIO DA CONVALIDAÇÃO
126 Art. 571 do CPP.

4.3.1.

NULIDADE ABSOLUTA

Ocorrerá a nulidade absoluta do processo por:

(1) Incompetência do juízo em razão da matéria ou da pessoa

A incompetência do juízo em razão da matéria (ratione materiae) ou em razão da pessoa (ratione personae) constitui causa de nulidade absoluta por afrontar o princípio constitucional do juiz natural, sendo, pois, matéria de ordem pública.

Nessa hipótese, não há possibilidade de convalidação do juízotido como incompetente, podendo o vício ser reconhecido ex officio ou por provocação das partes, a qualquer tempo, sendo inaproveitáveis os atos processuais praticados a partir de sua ocorrência, o que afasta a aplicação do preceituado noart. 567 do CPP127

Por outro lado, a doutrina e a jurisprudência pátria apresentam resistência quanto ao reconhecimento na instância recursal de nulidade absoluta prejudicial ao acusado, quando o vício não tiver sido objeto de alegação em recurso interposto pela acusação.

Nesse diapasão, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 160, com o seguinte enunciado: “É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício”.

No entanto, a própria Excelsa Corte, por intermédio da 2ªTurma, aojulgar oHC 107.457128 , decidiu que a “competência penal em razão da matéria é de ordem pública, podendo ser alegada ou reconhecida a qualquer momento, inclusive de ofício, não sendo suscetível de convalidação. Ela decorre de uma ofensa a princípio constitucional do processo penal, no caso, o do juiz natural, sendo irrelevante o fato de a parte sentir-se prejudicada, pois o interesse maior, consistente na proteção às normas constitucionais, prevalece sobre o interesse pessoal. Consequentemente, não se lhe aplicam a regra do art. 571, I, do Código de Processo Penal, e a Súmula 160 do Supremo Tribunal[...]”.

Todavia, diante de uma sentença transitada em julgado, a parte acusatória nada mais poderá fazer, já que é vedada a impetração de habeas corpus ou a apresentação de revisão criminal pro societate, ao contrário da defesa que poderá se utilizar de ditos instrumentos jurídicos para reconhecimento da nulidade absoluta, o qual resultará na anulação do processo, a partir da ocorrência do insanável defeito processual.

(2) Suspeição ou suborno do juiz

É nulidade que afeta o princípio da imparcialidade do juiz, devendo ser declarados nulos os atos por ele praticados, quando reconhecido como suspeito (art. 254, CPP).

Os casos de impedimento (arts. 252 e 253, CPP) e de incompatibilidade (art. 112, CPP) serão considerados também como hipótese de nulidade absoluta, por, igualmente, afetarem a imparcialidade do juiz.

Com relação ao suborno, revela desonestidade funcional, porquanto decorre do recebimento pelo juiz de vantagem ilícita para si ou em proveito alheio, o que compromete a sua imparcialidade no processo.

(3) Ilegitimidade de parte

A ilegitimidade de parte ad causam, ativa ou passiva, representada pela impertinência subjetiva da ação, em razão de o seu autor não ser o titular ou de o réu não poder integrar a relação jurídica processual, não poderá ser convalidada, sendo vício insanável. Por exemplo:

127 CPP, Art. 567. A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.

128

155 4.3.
DE NULIDADE
CAUSAS

oferecimento de denúncia em crime de iniciativa privada (ilegitimidade ativa ad causam); um menor de 18(dezoito) anos, à época do fato, denunciado pelo crime (ilegitimidade passiva ad causam).

No tocante à ilegitimidade de parte ad processum, representada pela impossibilidade de estar alguém agindo em juízo em nome próprio ou de outrem, embora o entendimento doutrinário majoritário a tenha como nulidade relativa, filiamo-nos à corrente divergente que a considera como nulidade absoluta. É que, na hipótese de não ser mais possível sanar o vício pela ocorrência da decadência (art. 38, CPP), impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade de parte a qualquer tempo, inclusive, após o trânsito em julgado de uma eventual condenação. Por exemplo: na ação penal de iniciativa pública condicionada à representação, o órgão do Ministério Público promove a ação sem que haja representação. Nesse caso, a vítima poderá sanar a omissão, enquanto não tiver decaído do direito de representação (art. 38 do CPP). Ocorrendo a decadência, nada mais haverá que se fazer, tornando-se insanável o defeito, de modo que o processoestará nulo.

(3) Falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

1) da denúncia (ou da queixa-crime) na ação penal;

2) da representação ou da requisição do Ministro da Justiça. Quanto à representação, a omissão poderá ser sanada, enquanto não decorrido o prazo decadencial previsto noart. 38 do CPP129;

3) do exame do corpo de delito, nos crimes que deixam vestígios, enquanto estes persistirem;

4) da nomeação de defensor ao réu presente, caso não o tenha, ou ao ausente. A defesa técnica é irrenunciável e imprescindível para o regular andamento do feito, devendoser assegurada pelo juiz que preside o feito;

5) da intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação penal por ele intentada;

6) da citação do réu para se ver processar130 131;

7) do interrogatório do acusado, quando presente;

8) de concessão de prazo para a realização de ato processual conferido à acusação ou à defesa;

9) da sentença;

10)nos processos de competência do Tribunal do Júri:

• da decisão de pronúncia e entrega de relatórioe rol testemunhal;

• da intimação do acusado para a sessão de julgamento ou de testemunhas indicadas pelas partes. Porém, o comparecimento ao ato, espontaneamente, sanará a nulidade (art. 570, CPP);

• da presença para instalação do júri do quórum mínimo de 15 (quinze) jurados;

• do sorteio dos jurados para composição do conselho de sentença em número legal;

• de observância da incomunicabilidade dos jurados;

• dos quesitos e respectivas respostas;

• de erro na elaboração dos quesitos ou incompatibilidades nas respostas;

129 Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia. Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do mesmo prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31.

130 CPP, Art. 570. A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argui-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adia- mento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

131 “[...] 3. De acordo com o artigo 565 do Código de Processo Penal, "nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse". 4. Se o recorrente tem plena ciência da ação penal, tanto que outorgou procuração nos autos na qual conferiu poderes amplos para a sua represen- tação judicial, não pode alegar que a relação jurídicoprocessual não se completou, uma vez que o ordenamento jurídico repudia aadoção de comportamentos contraditórios em sede processual. [...]”. (STJ, 5ª Turma,AgR RHC nº 123.781/ES, Rel. Jorge Mussi, j. em 19/05/2020, pub. no DJe de 27/05/2020).

156

• de acusação ou de defesa, na sessão de julgamento;

• da sentença ou da sua prolatação sem observância das formalidades essenciais;11)do recurso de ofício, nos casos em que a lei o tenha estabelecido;

12)da intimação, nas condições estabelecidas pela lei, para ciência de sentenças e despachos de que caiba recurso;

13)do quórum legal mínimo para o julgamento nos Tribunais Superiores, nos Tribunais Regionais Federais e nos Tribunais de Justiça;

14)por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato; 15)em decorrência de decisão carente de fundamentação.

4.3.2. NULIDADERELATIVA

Considera-se como nulidade relativa:

(1) Incompetência de juízo em razão do lugar (ratione loci)

Trata-se de competência disponível, sendo regida por normas de ordem privada, estabelecidas na legislação infraconstitucional. Caso não seja arguida pelas partes no momento processual oportuno ou reconhecida de ofício pelo juiz, restará convalidada.

Em que pese o enunciado da Súmula 33 do STJ132, a jurisprudência nacional admite o reconhecimento ex officio da incompetência de juízo em razão do lugar, nos termos do art. 109 do CPP133 .

Todavia, uma vez reconhecida judicialmente essa incompetência, serão anulados apenas os atos decisórios, com remessa dos autos ao juízo competente134 , o qual, se julgar adequado,poderárefazê-los.

Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça flexibilizou a regra para admitir que os atos decisórios também possam ser ratificados por força do disposto no art. 108, § 2º do CPP135

A não observância da competência de juízo fixada pela prevenção (art. 83 do CPP), igualmente, constitui nulidade relativa.

(2) A falta das fórmulas ou dos termos dispostos no art. 564, inciso III do CPP:

1) a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública ou da ação penal privada exclusiva ou personalíssima;

2) os prazos concedidos à acusação e à defesa;

3) a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei não permitir ojulgamento à revelia;

4) a intimação das testemunhas para a sessão do Tribunal do Júri; 5) por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.

4.4. MOMENTO PARA ARGUIÇÃO DAS NULIDADES

As nulidades absolutas poderãoser arguidas a qualquer tempo, inclusive após o trânsito emjulgado da decisão.

Por outro lado, as nulidades relativas, na forma do art. 571 do CPP, deverão ser suscitadas:

132 “A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício”. (Súmula 33, STJ)

133 Art. 109. Se emqualquer fase do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente, declará-lo-á nos autos, haja ou não alegação da parte, prosseguindo-se na forma do artigo anterior.

134 CPP, Art. 567. A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.

135 AgRg-HC 479.729/SP.

157

a) as ocorridas durante a instrução criminal, independentemente do procedimento adotado, na fase de alegações finais;

b) no processo sumário, no prazo da resposta escrita (art. 396, CPP). As ocorridas apóso oferecimento da resposta escrita e antes da audiência de instrução e julgamento, depois da abertura do ato, logo após feito o pregão das partes;

c) as ocorridas posteriormente à pronúncia, logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes ;

d) as ocorridas no âmbito das ações penais originárias, na fase de alegações finais escritas;

e) se verificadas após a sentença definitiva, em preliminar, nas razões de recurso ou logo depois de anunciado ojulgamento do recurso e apregoadas as partes;

f) as do julgamento em plenário, em audiência ou em sessão do tribunal, tão logo ocorrerem.

Por sua vez, é de se destacar que a chamada nulidade de algibeira é repelida pela jurisprudência pátria por afrontar o princípio da boa-fé processual, que exige lealdade de todos os sujeitos processuais. Trata-se de nulidade que poderia ter sido sanada pela insurgência imediata da defesa após ciência do vício, mas silencia sob uma perspectiva estratégica de melhor conveniência futura.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que: “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ, em respeito à segurança jurídica e à lealdade processual, tem se orientado no sentido de que, mesmo as nulidades denominadas absolutas, ou qualquer outra falha ocorrida no acórdão impugnado, também devem ser arguidas em momento oportuno, sujeitando-se à preclusão temporal (5a T., AGRG no HC n. 690.070/PR, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. em 19/10/2021, pub. no DJe de 25/10/2021)”.

No mesmo diapasão, o Supremo Tribunal Federal, v.g.: “[...] A alegação de nulidade, após o esgotamento do trâmite processual, caracteriza-se como ‘nulidade de algibeira’. Portanto, ‘emboratenhaodireitodealegaranulidade,mantém-seinertedurantelongoperíodo,deixando para exercer seu direitosomente no momentoem que melhor lhe convier, acaba por renunciar tacitamente ao seu direito de alegá-la. [...]. Nessa quadra, também se revela incompatível com o princípio da boa-fé processual o reconhecimento de nulidades em qualquer momento processual, sem a possibilidade de se declarar a preclusão’ (ACO 847 AgRsegundo, de minha relatoria, Tribunal Pleno, julgado em 23/8/2019) [...]” (1a T., Rcl nº 46.835-AgR/RJ, Rel. Min. Alexandre de Moraes, pub. no DJe de 12/8/21).

4.5. CONVALIDAÇÃO DAS NULIDADES RELATIVAS

Na forma prevista no art. 572 do CPP, as nulidades relativas restarão convalidadas:

a) se não forem arguidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no art. 571 do CPP;

b) se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim;

c) se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceitado os seus efeitos.

4.6. ENUNCIADOS DE SÚMULAS

4.6.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Súmula 155: É relativa a nulidade do processo criminal por falta de intimação da expedição de precatória para inquirição de testemunha.

Súmula 156: É absoluta a nulidade do julgamento, pelo júri, por falta de quesito obrigatório.

158

Súmula 160: É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.

Súmula 162: É absoluta a nulidade do julgamento pelo júri, quando os quesitos da defesa não precedem aos das circunstâncias agravantes.

Súmula 351: É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da Federação em que o juiz exerce a sua jurisdição.

Súmula 352: Não é nulo o processo penal por falta de nomeação de curador ao réu menor que teve a assistência de defensor dativo.

Súmula 361: No processo penal, é nulo o exame realizado por um só perito, considerando-se impedido o que tiver funcionado, anteriormente, na diligência de apreensão.

Súmula 366: Não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia.

Súmula 431: É nulo o julgamento de recurso criminal, na segunda instância, sem prévia intimação, ou publicação da pauta, salvo em habeas corpus.

Súmula 523: No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.

Súmula 706: É relativa a nulidade decorrente da inobservância da competência penal por prevenção.

Súmula 707: Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões aorecursointerposto da rejeição da denúncia, nãoa suprindo a nomeação de defensor dativo.

Súmula 708: É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro.

Súmula 709: Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela.

Súmula 712: É nula a decisão que determina o desaforamento de processo da competência do júri sem audiência da defesa.

4.6.2.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Súmula 117: A inobservância do prazo de 48 horas, entre a publicação de pauta e o julgamento sema presença das partes, acarreta nulidade.

Súmula 639: Não fere o contraditório e o devido processo decisão que, sem ouvida prévia da defesa, determine transferência ou permanência de custodiado em estabelecimento penitenciário federal.

159

Recursos 5

Recurso é o instrumento de impugnação de decisão judicial, manejável antes do seu trânsito em julgado ou da sua preclusão, no próprio processo em que foi proferida, com a finalidade de reformar, invalidar, esclarecer ou integrar a decisão impugnada. Em outras palavras, é o meio pelo qual se obtém o reexame de uma decisão.

Haverá um juízo a quo (juízo contra o qual se recorre) e um juízo ad quem (juízo para o qual se recorre).

5.1. TEORIA GERAL DOS RECURSOS

5.1.1. PRINCÍPIOS

5.1.1.1. Princípio do duplo grau de jurisdição

O princípio do duplo grau de jurisdição assegura à parte sucumbente a possibilidade de submeter a decisão, total ou parcialmente, a uma nova apreciação jurisdicional pela mesma ou por superior instância, conforme o recurso manejado.

A Constituição Federal o prevê implicitamente, ao estabelecer órgãos de segundo grau de jurisdição, comcompetência recursal.

Porém, o direito ao duplo grau de jurisdição não é absoluto, sendo inaplicável às ações penais originárias de competência privativa dos tribunais.

É que, após decididas, somente serão passíveis de recurso especial para o STJ136 e/ou de recurso extraordinário para o STF137, ambas irresignações com objeto limitado à análise de matéria de direito. A apreciação da matéria de fato (quaestiones facti), mediante exame do conjunto probatório, esgotou-se no órgão originariamente julgador.

5.1.1.2. Princípio da taxatividade

O princípio da taxatividade impõe que a parte somente poderá utilizar recurso expressamente previsto em lei, e nos casos em que esta o admite.

Trata-se de taxatividade dos casos de impugnação e dos meios de impugnação.

Todavia, quanto às hipóteses de cabimento recursal, será possível a utilização de interpretação extensiva (art. 3º, CPP), como será visto mais adiante.

5.1.1.3. Princípio da unirrecorribilidade

Em razão do princípio da unirrecorribilidade, para cada decisão será cabível um único recurso de cada vez, ainda que apresentado por defensores diferentes.

Nesse caso, a interposição de vários recursos pela mesma parte contra a mesma decisão inviabiliza o exame daqueles que tenham sido protocolizados por último, haja vista a ocorrência de preclusão consumativa e a aplicação do princípio da unirrecorribilidade das decisões.

Constituem exceções ao referido princípio:

136 CF, art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça [...] III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de leifederal; c) der à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

137 CF, art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal [...] III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em únicaou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

162

a) a interposição simultânea de recurso especial e de recurso extraordinário contra a mesma decisão, caso contrarie preceito constitucional e lei federal; b) a decisão de órgão fracionário de segunda instância, desfavorável ao réu, em que háa possibilidade de interposição simultânea de embargos infringentes e de nulidade da parte não unânime e de recurso especial e/ou extraordinário da parte unânime, osquais deverão aguardar o julgamento dos embargos, que poderá ensejar outro recurso especial e/ourecurso extraordinário.

5.1.1.4. Princípio da fungibilidade

O princípio da fungibilidade possibilita o conhecimento e o processamento de recurso equivocadamente interposto como se fosse o recurso cabível. Porém, é necessário que não tenha existido má-fé na escolha do recurso manejado.

É o que se depreende do disposto no art. 579, caput e parágrafo único do CPP: “Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro. Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso interposto pela parte, mandará processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível”.

Contudo, o que se deve entender por má-fé não foi definido pelo legislador.

Para corrigir a lacuna, a doutrina e a jurisprudência consideram a ocorrência da má-fé a partir de situações concretas, sendoafastada quando não se tratar de erro grosseiro, ou quando a interposição do recurso equivocado ocorrer dentro do prazo cabível para o recurso correto.

No último caso, a cautela visa a evitar a utilização de um recurso inadequado, unicamente com o objetivo de contornar a perda do prazo da irresignação verdadeiramente cabível.

Sob outro aspecto, não será possível a utilização da fungibilidade quando se tratar de recurso de fundamentação vinculada em que a invocação de um dos fundamentos fixados em lei é obrigatória, sob pena de sua inadmissibilidade. É que não terá existido impugnação nos limites estritos da fundamentação exigida para tal situação.

Em síntese, será possível a aplicabilidade do princípio da fungibilidade quando demonstrada a ausência de má-fé, a inexistência de erro grosseiro e a observância ao prazo prescrito para orecurso correto.

Uma vez aplicado o princípio, ao juiz caberá corrigir o recurso equivocadamente interposto, recebendo-o como se correto fosse e dando-lhe o rito adequado (art. 579, parágrafo único, CPP).

5.1.1.5. Princípio da convolação

O princípio da convolação resultará no recebimento e conhecimento pelo juízo ad quem de um recurso, adequadamente interposto, como se fosse outro, com o objetivo de beneficiar o recorrente:

a) quando, não obstante adequada a irresignação interposta, estejam ausentes outros pressupostos recursais (ver item 5.1.3). Ex.: suponhamos que determinado indivíduo tenha impetrado habeas corpus perante o Tribunal de Justiça contra decisão proferida por juiz de 1º Grau. A Corte estadual denegou a ordem. Assim, insatisfeito, ele interpõe recurso ordinário para o STJ (art. 105, inciso II, “a”, CF), que, no entanto, reputa-o intempestivo. Nesse caso, por força do princípio acima, nada impede que a Corte possaconhecê-lo como se fosse outro habeas corpus, instrumento não sujeito a prazos; b) quando adota uma via impugnativa que, processualmente, seja mais vantajosa para oréu. Ex.: o réu é condenado a pena privativa de liberdade. Após o trânsito em julgado da decisão, inicia o cumprimento da sanção. O seu advogado ingressa com revisão criminal, alegando que a sentença foi prolatada por juiz absolutamente incompetente, pugnando pela anulação do decisum. Nada impede que o Tribunal de Justiça conheça da

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revisional como se fosse um habeas corpus, procedimento mais célere em relação ao primeiro.

5.1.1.6. Princípio da voluntariedade

Nos termos do art. 574, caput, primeira parte do CPP, a priori, a interposição do recurso depende de ato voluntário da parte sucumbente para que a decisãorecorrida seja reexaminada e modificada.

No processo penal, a exceção diz respeito ao denominado recurso ex officio, que impõe ao julgador o dever de recorrer de sua decisão à instância superior em casos expressamente definidos em lei, conforme será objeto de análise detalhada no item 5.2.

5.1.1.7. Princípio da (in)disponibilidade recursal

O princípio da (in)disponibilidade recursal diz respeito à liberdade concedida à parte para decidir sobre a conveniência de interposição do recurso, sendo tratada de forma diversa, a depender da qualidade da parte sucumbente.

Sendo o particular a parte sucumbente, será possível, querendo, renunciar ao direito de recorrer ou mesmo desistir de eventual recurso já interposto.

No entanto, para o órgão do Ministério Público, embora tenha liberdade para decidir sobre a apresentação de recursoe até mesmo renunciar ao direito de recorrer, caso opte por recorrer, não poderá desistir da irresignação interposta, ainda que parcialmente, consoante prevê o art. 576 do CPP.

A vedaçãoalcança, inclusive, o conteúdo das razões recursais, que deverá ter por objeto os mesmos pontos fixados na petição recursal, sob pena de se ter configurada a disponibilidade parcial do recurso pelo órgão ministerial em relação ao ponto excluído, o que não é aceito.

Por fim, registre-se que a renúncia ao direito de recorrer é irretratável.

5.1.1.8. Princípio da proibição de reformatio in pejus

5.1.1.8.1. Reformatio in pejus direta

O princípio da proibição da reformatio in pejus assegura que o acusado não poderá sofrer agravamento de sua situação processual em razão de seu próprio recurso.

Nesse caso, o recurso somente poderá ser aproveitado em favor da defesa, caso provido, e, seimprovido, a decisão será mantida inalterada.

Em sentido contrário, a regra não tem aplicação quanto ao recurso exclusivo apresentado pela parte acusadora, podendo a decisão recorrida ser alterada em favor do acusado (reformatio in melius), o que, a contrario sensu, importa em admissibilidade da reformatio in pejus para a acusação.

5.1.1.8.2. Reformatio in pejus indireta

Destarte, também é inadmissível a denominada reformatio in pejus indireta, que se configura, por exemplo, quando, dando provimento a recurso exclusivo da defesa, oórgão revisor determina a anulação do processo e da decisão condenatória, determinando a renovação dos atos processuais a partir da nulidade, e, consequentemente, a formulação de outra sentença. Não obstante a liberdade que gozará o juiz sentenciante, a nova decisão não poderá ser mais gravosa que aquela inicialmente proferida e sobre a qual foi interposto recurso pela defesa de forma exclusiva, sob pena de representar, indiretamente, agravamento em desfavor da parte recorrente.

A proibição da reformatio in pejus indireta, segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritários, aplica-se, inclusive, aos julgamentos do Tribunal do Júri, quando, anulada a sentença em decorrência de recurso interposto exclusivamente pela defesa, for determinado que oacusado se submeta a um novo julgamento.

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Nesse caso, ainda que o Conselho de Sentença considere circunstâncias qualificadoras, causas de aumento de pena e/ou agravantes não reconhecidas na decisão anulada, não poderá ser imputada ao acusado condenação maior do que a naquela atribuída.

A vedação da reformatio in pejus indireta se aplica também aos casos de anulação da sentença por incompetência constitucional (em razão da matéria e em razão da pessoa) decorrente de recurso exclusivo da defesa, haja vista que, como será uma decisão nula – e não inexistente, gera o efeito de fixar os limites do segundo julgamento.

5.1.1.9. Princípio da dialeticidade

O recurso é dialético na medida em que assegura o contraditório recursal, garantindo ao recorrido o conhecimento e a possibilidade de se contrapor às razoes de impugnação apresentadas pela parte recorrente.

Desse modo, não basta que a parte manifeste o desejo de contestar a decisão, sendo indispensável que exponha as razões de sua discordância.

Recurso sem motivação, que corresponde a pedido inepto.

5.1.1.10. Princípio dacomplementariedade

O princípio da complementariedade estabelece que, se uma das partes tiver interposto recurso e a parte adversa apresentar embargos de declaração que, acolhidos, modifiquem o julgado, poderá aquela complementar as razões de seu recurso, de acordo com a decisão superveniente.

A previsão, aliás, está expressamente no art. 1.024, § 4º do CPC, passível de aplicação subsidiária ao processo penal (art. 3º, CPP), que dispõe: “Art. 1.024. [...] § 4º Caso o acolhimento dos embargos de declaração implique modificação da decisão embargada, o embargado que já tiver interposto outro recurso contra a decisão originária tem o direito de complementar ou alterar suas razões, nos exatos limites da modificação, no prazo de 15 (quinze) dias, contado da intimação da decisão dos embargos de declaração”.

Exemplificando: com a finalidade de reverter uma sentença condenatória, o sentenciado apresenta recurso apelatório, enquanto o órgão do Ministério Público interpõe embargos declaratórios. Foram acolhidos os argumentos ministeriais, dando-se provimento aos embargos para modificar parcialmente a decisão anterior, sendo mantida a condenação. Nesse caso, em face do princípio ora examinado, o condenado que já apresentou as razões apelatórias terá o direito de complementar o recurso, acrescentando novos argumentos.

Por outro lado, sendo desprovidos os embargos declaratórios ou se eles não alterarem a conclusão do julgamento embargado, a parte embargada não terá que ratificar a apelação já apresentada (art. 1.024, § 5º, CPC138)139 .

Não se deve confundir o princípio da complementariedade com a vedação ao aditamento de recurso após sua apresentação, ainda que não escoado o prazo original para recorrer, uma vez que, nesse caso, já se operou a preclusão consumativa, com a antecipação do vencimento do prazo recursal.

5.1.1.11. Princípio da colegialidade

O princípio da colegialidade assegura à parte recorrente o direito de ver o julgamento de seu recurso apreciado por órgão colegiado, composto por um grupo de magistrados. Trata-se de um julgamento coletivo, cujo resultado final será representado pela unanimidade ou pela maioria simples dos votos dos julgadores, cuja proclamação caberá ao presidente do colegiado, sendo, posteriormente, lavrado o respectivo acórdão pelo relator ou, se tiver restado vencido no

138 CPC, art. 1.024, [...] § 5º Se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração será processado e julgado independentemente de ratificação.

139 STJ, Corte Especial, REsp 1.129.215-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em16/9/2015, pub. no DJe de 3/11/2015.

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seu ponto de vista, pelo autor do primeiro voto vencedor, salvo disposição em contrário prevista no regimentointerno do tribunal.

Nesse sentido, prevê o art. 609, caput do CPP: “Os recursos, apelações e embargos serão julgados pelos Tribunais de Justiça, câmaras ou turmas criminais, de acordo com a competência estabelecida nasleis de organização judiciária”.

Nos termos do art. 615, § 1º do CPP, com as alterações advindas com a Lei nº 14.836/2024, em todos os julgamentos em matéria penal ou processual penal em órgãos colegiados, havendo empate, prevalecerá a decisão mais favorável ao indivíduo imputado, proclamandose de imediato esse resultado, ainda que, nas hipóteses de vaga aberta a ser preenchida, de impedimento, de suspeição ou de ausência, tenha sido o julgamento tomado sem a totalidade dos integrantes do colegiado.

Quanto ao processamento do Recurso Extraordinário (RE), Recurso Especial (REsp) e habeas corpus junto aos Tribunais Superiores, será possível o julgamento monocrático pelo Ministro Relator, nos termos do art. 932, incisos IV e V do CPC140 .

Por sua vez, dianteda nova redação doart.41-A, caput eparágrafo único, daLei nº 8.038/90, a decisão de Turma, no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, será tomada pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assim como em todos os julgamentos em matéria penal ou processual penal em seus órgãos colegiados, havendo empate, prevalecerá a decisão mais favorável ao indivíduo imputado, proclamando-se de imediato esse resultado, ainda que, nas hipóteses de vaga aberta a ser preenchida, de impedimento, de suspeição ou de ausência, tenha sido o julgamento tomado sem a totalidade dos integrantes do colegiado.

5.1.2.

CLASSIFICAÇÃO

Os recursos se classificam quanto à obrigatoriedade (voluntário ou obrigatório); à fundamentação (fundamentação livre ou fundamentação vinculada); à extensão (plena ou parcial); aos pressupostos de admissibilidade (genérico ou específico) e ao objeto imediato (extraordinário ou ordinário).

5.1.2.1. Quanto à obrigatoriedade

a) recurso voluntário: a interposição do recurso está condicionada à manifestação de vontade da parte sucumbente;

b) recurso obrigatório: também chamado de reexame necessário ou recurso de ofício, refere- se à obrigatoriedade de reanálise pela instância superior do conteúdo da decisão paraque transite emjulgado141 .

5.1.2.2. Quanto àfundamentação

a) recurso de fundamentação livre: o recorrente tem ampla liberdade, no tocante às matérias de fato e de direito a serem alegadas em sua fundamentação (ex.: apelação, recursoemsentido estrito, etc);

b) recursos de fundamentação vinculada: a matéria a ser objeto do recurso está disposta em rol taxativo constante da Constituição Federal ou de lei infraconstitucional, devendo o recorrente apontá-la, sob pena de inadmissibilidade da irresignação por irregularidade formal (ex.: recurso especial, recurso extraordinário, apelação de decisão do Tribunal do Júri, embargos de declaração).

140 CPC, Art. 932. Incumbe ao relator: [...] IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;[...]”. 141 “Não transita emjulgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que seconsidera interposto ex lege” (Súmula 423, STF).

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5.1.2.3. Quanto à extensão da matéria impugnada

a) recurso pleno: a irresignação tem como objeto a decisão impugnada em sua integralidade;

b) recurso parcial: há impugnação apenas de parte da decisão recorrida.

5.1.2.4. Quanto aos pressupostos de admissibilidade

a) recurso genérico: inexiste a necessidade de preenchimento de requisitos específicospara sua admissão, bastando a simples irresignação da parte (ex.: apelação);

b) recurso específico: além das exigências comuns a todos os recursos, possui requisitos específicos que deverão ser observados para a sua interposição (ex.: recurso especialque exige o prequestionamento da matéria).

5.1.2.5. Quanto ao objeto imediato

a) recurso extraordinário: visa a assegurar, de forma imediata, a proteção e a preservaçãoda boa aplicação da legislação infraconstitucional e da Constituição Federal. A sua função direta não é garantir o direito subjetivo da parte recorrente, que, obviamente, seprocedente, ocorrerá de modo mediato no caso concreto. (ex: o recurso extraordinário e o recurso especial);

b) recurso ordinário: visa a proteger o interesse particular da parte sucumbente (ex.: apelação, recursoemsentido estrito, dentre outros).

5.1.3. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

Classificam-se os pressupostos (ou requisitos) de admissibilidade dos recursos em objetivos (cabimento, adequação, tempestividade, ausência de fato impeditivo, inexistência de fato extintivo e regularidade formal) e subjetivos (interesse e legitimidade).

5.1.3.1. Pressupostos objetivos de admissibilidade

Os pressupostos (ou requisitos) objetivos de admissibilidade dizem respeito ao próprio recurso, sendo:

a) cabimento: previsão legal da existência do recurso contra o ato a ser impugnado;

b) adequação: utilização do recurso correto para se insurgir contra a decisão. Poderá, todavia, ser relativizado pelo princípio da fungibilidade142;

c) tempestividade: o recurso deve ser interposto dentro do prazo previsto em lei, sob penade preclusão do direito de recorrer, caso em que não será conhecido. O marco inicial do prazo recursal e sua contagem seguem o estabelecido no art. 798 do CPP143. Por força dos arts. 44, inciso I, 89, inciso I e 128, todos da Lei Complementar nº 80/94, os membros da Defensoria Pública da União, da Defensoria Pública do Distrito Federale Territórios e da Defensoria Pública dos Estados têm prazo em dobro para recorrer; d) ausência de fato impeditivo: há que se verificar se inexistem fatos impeditivos do conhecimento dorecurso, a saber, a renúncia ao direito de recorrer e a preclusão;

142 Ver item5.1.1.4.

143 CPP, art. 798. Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado. § 1º Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento. § 2º A terminação dos prazosserá certificada nos autos pelo escrivão; será, porém, considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do dia em que começou a correr. § 3º O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o diaútil imediato. §4º Não correrão os prazos, se houver impedimento do juiz, força maior, ou obstáculo judicial oposto pela parte contrá- ria. § 5º Salvo os casos expressos, os prazos correrão: a) da intimação; b) da audiência ou sessão em que for proferida a decisão,se a ela estiver presente a parte; c) do dia em que a parte manifestar nos autos ciência inequívoca da sentença ou despacho.

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e) inexistência de fato extintivo: são fatos extintivos do recurso a sua desistência e a deserção (falta de pagamento das despesas do recurso do querelante em crimes de ação penal exclusivamente privada);

f)) regularidade formal: deve-se observar as formalidades estabelecidas em leipara o recurso manejado. No entanto, o pressuposto é mitigado pelo princípio da instrumentalidade das formas144

5.1.3.2. Pressupostos subjetivos de admissibilidade:

São pressupostos (ou requisitos) subjetivos de admissibilidade

a) interesse: a parte recorrente deve ser sucumbente na decisão recorrida, total ou parcialmente, demonstrando que possuiinteresse na sua reforma ou modificação (art.577, parágrafo único, CPP);

b) legitimidade: o sujeito processual deverá ter legitimidade prevista em lei para recorrer.

5.1.4. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL

Também chamado de juízo de prelibação, consiste na análise do atendimento dos pressupostos de admissibilidade recursal, a ser efetivado, em regra geral, em um primeiro momento, no juízo a quo (juízo recorrido) e, em um segundo momento, no juízo ad quem (juízo revisor) que, sem qualquer vinculação à decisão anterior, fará oreexame da matéria de forma definitiva.Haverá,pois,emalgunscasos,submissãodorecursoao duplojuízodeadmissibilidade. Verificada, pelo juízo a quo, a presença dos pressupostos de admissibilidade, será o recurso encaminhado ao juízo ad quem, o qual, admitindo-o, passará à sua análise meritória. Entretanto, existem recursos que estarão sujeitos ao juízo de admissibilidade apenas em um grau de jurisdição, a exemplo da carta testemunhável e dos embargos de declaração.

5.1.5.

JUÍZO DE MÉRITO RECURSAL

Com o juízo de admissibilidade positivo, será o recurso conhecido pelo tribunal, o qual passará ao juízo de delibação, ou, em outras palavras, ao julgamento meritório da irresignação.

Na hipótese em que o recurso interposto permitir o exercício de juízo de retratação,o próprio órgão que proferiu a decisão recorrida examina, em primeiro instante, o mérito da irresignação: acolhendo-o, proferirá nova decisão; rejeitando-o, confirmará a decisão impugnada, determinando o encaminhamento do recurso para apreciaçãopelo juízo ad quem. No tribunal recorrente, se o juízo de mérito for positivo, será dado provimento, parcial ou integral, aorecurso.

É importante destacar que o acórdão do juízo ad quem substituirá a decisão recorrida no que tiver sido objeto do recurso145, ainda que somente a tenha confirmado, devendo ser contra essa nova decisão interposto eventual recurso, quando couber.

5.1.6.

EFEITOS

São efeitos do recurso, conforme o instrumento a ser manejado: devolutivo, suspensivo, regressivo (iterativo ou diferido), extensivo, substitutivo e translativo.

144 Ver item4.2.2.

145 CPC, art. 1.008. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão impugnada no que tiver sido objeto de recurso.

168

5.1.6.1. Efeito devolutivo

O efeito devolutivo, inerente atodososrecursos, consiste na transferência doconhecimento da matéria impugnada ao órgão jurisdicional recursal, o qual poderá reformar, invalidar, integrar ou esclarecer a decisão impugnada.

Na petição de interposição do recurso146 , caberá à parte recorrente delimitar a matéria aser objeto de reapreciação e de nova decisão.

Nesse sentido, por força da aplicabilidade da regra tantum devolutum quantum apppelatum, ojuízo ad quem somente conhecerá da matéria impugnada pela parte recorrente, a qual deverá ser apontada na petição recursal, não cabendo limitá-la somente nas razões recursais. Não ofazendo, prevalece o entendimento de que se devolve integralmente ao juízo ad quem oconhecimento da matéria que gerou a sucumbência.

Haverá exceção quando se tratar de recurso de fundamentação vinculada em que a parte recorrente é obrigada a declinar, na petição de interposição do recurso, ou, pelo menos, nas razões recursais, um dos seus fundamentos previstos na lei (ex.: apelaçãocontra a decisão do Tribunal do Júri, recurso especial e recurso extraordinário).

Em sendo o recurso da acusação, não será possível o agravamento da situação do réu quando não tiver sido objeto da irresignação, consoante, aliás, prevê o enunciado da Súmula 160 do STF: “É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício”.

Em sentido contrário, poderá o juízo ad quem melhorar a situação do réu, ainda que apenasa acusação tenharecorrido oua matéria nãotenhasido objetode impugnação, tudo em razão da aplicabilidade do princípio da reformatio in mellius.

Porém, tratando-se de apelação contra decisão do Tribunal do Júri, é expresso o enunciado da Súmula 713 do STF: “O efeito devolutivo da apelação contra decisões do júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição”.

5.1.6.2. Efeitosuspensivo

A previsão legal de recurso dotado de efeito suspensivo impede a eficácia da decisão proferida enquanto transcorrer o prazo recursal, e, caso apresentada a irresignação, até o seu julgamento.

É que, de fato, o que suspende a aplicação da decisão não é a interposição de recurso com efeito suspensivo, mas, sim, a possibilidade de se utilizar do mencionado instrumento jurídico. Se a eficácia fosse suspensa somente com a apresentação do recurso, significaria que a decisão seria eficaz até que o recurso fosse protocolado147 .

Para que o recurso tenha efeito suspensivo é necessária a expressa disposição legal.

5.1.6.3. Efeitoregressivo (iterativo ou diferido)

O efeito regressivo (iterativo ou diferido) devolve ao órgão jurisdicional que proferiu a decisão recorrida o reexame da matéria impugnada, permitindo que se exerça o juízo de retratação, antes que os autos sejam remetidos à instância superior (ex.: recurso em sentido estrito).

5.1.6.4. Efeito extensivo

O efeito extensivo permite que o resultado favorável de recurso interposto por um dos acusados seja estendido aos corréus. Porém, exige-se que tenham situações processuais idênticas e que a irresignação não tenha sido fundada em motivos de caráter exclusivamente pessoal.

146 Há entendimento jurisprudencial de que a apelação contra a sentença do Tribunal do Júri pode ter seu alcance estabelecido pelo teor das razões recursais. (STF, 2ª T., HC 93.942/RS, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 06/05/2008, pub. no DJe de 31.07.2008).

147 BADARÓ, Gustavo Henrique. Manual dos recursos penais São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 171.

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O art. 580 do CPP prevê: “No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25148), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros”.

A doutrina pátria tem divergido sobre a aplicação do efeito extensivo:

a) uma parcela somente o admite se os corréus tiverem sido julgados no mesmo processo daquele que recorreu, por crimes que praticaram em concurso de pessoas (simultaneus processus);

b) para outra corrente doutrinária, com respaldo na jurisprudência majoritária, o efeitoserá aplicado ainda que se trate de ações penais distintas, quando, por exemplo, nãose tenha observado a unidade de processo e julgamento prevista nos casos de conexão ou de continência, bastando que sejam acusados pelo cometimento do mesmo crime em concurso de agentes.

O reconhecimento do efeito extensivo caberá ao juízo que apreciou o recurso. Em caso de omissão ou negativa de seu reconhecimento, poderá ser impetrado habeas corpus junto ao tribunal competente.

5.1.6.5. Efeito substitutivo

Em razão do efeito substitutivo, o julgamento proferido pelo juízo ad quem em recurso, cuja causa de pedir estiver fundada em erro de julgamento (error in judicando), substituirá a decisão impugnada no que tiver sido objeto da irresignação149 . Entretanto, se a causa de pedir estiver fundada em erro de procedimento (error in procedendo), pleiteando a anulação da decisão, só haverá que se falar em efeito substitutivo na hipótese de não provimento do recurso, pois, se provido, uma nova decisão terá que ser prolatada pelo juiz a quo.

5.1.6.6. Efeito translativo

Em sede de processo penal, o efeito translativo está presente unicamente no chamado recurso ex officio e consiste na devolução ao juízo ad quem de toda a matéria não atingida pela preclusão, favorável ou contrária a qualquer das partes.

5.2. RECURSO NECESSÁRIO

Sob outroaspecto, apesar da marcante característica da voluntariedade dos recursos (art. 574, caput, primeira parte do CPP), o legislador estabelece a obrigatoriedade de o juiz prolator recorrer de ofício de determinadas decisões (art. 574, caput, parte final, CPP), submetendoas à apreciação da instância superior. É o chamado reexame necessário, impropriamente denominado de recurso ex officio, e que devolve ao juízo ad quem o conhecimento integral da causa, sem que haja necessidade de apresentação de razões/contrarrazões pelas partes, nem motivação pela autoridade judiciária que proferiu a decisão.

A interposição do recurso voluntário não afasta a obrigatoriedade do recurso de ofício da decisão:

a) que conceder habeas corpus (art. 574, inciso I, CPP);

b) que conceder reabilitação criminal (art. 746, CPP);

c) que absolver acusados em processo por crime contra a economia popular ou contraa saúde pública, ou determinar o arquivamento dos autos do respectivo inquérito policial (art. 7º da Lei nº 1.521/51);

d) que conceder o mandado de segurança (art. 14, § 1º da Lei nº 12.016/09);

148 Atual art. 29 do CP.

149 CPC, art. 1.008. O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão impugnada no que tiver sido objeto de recurso.

170

e) do relator que indefere in limine revisão criminal em razão de julgar insuficientemente instruído o pedido(art. 625, § 3º, CPP).

Por outro lado, a Lei nº 11.698/2008, ao tratar da absolvição sumária e ter silenciado sobre o reexame necessário, revogou tacitamente o previsto no art. 574, inciso II do CPP.

5.3. RECURSOS EM ESPÉCIE

5.3.1.

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

5.3.1.1. Previsão legal

Arts. 581 a 592 do CPP.

5.3.1.2. Cabimento

As hipóteses de cabimento do recurso em sentido estrito (RESE) estão previstas no art. 581 do CPP, a saber:

1º Decisão com força de definitiva que rejeita a denúncia ou a queixa-crime (art. 581,inciso I, CPP)

A rejeição(total ou parcial) da denúncia ou da queixa-crime ocorrerá quando a peça for manifestamente inepta, faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal ou, ainda, justa causa para o exercício da ação penal, tudo conforme previsto no art. 395 do CPP.

O recurso será cabível tanto da rejeição liminar (art. 396, caput, CPP) quanto da rejeição após a apresentação da resposta escrita (art. 397, CPP).

Por interpretação extensiva, caberá recurso em sentido estrito contra decisão que rejeitar liminarmente o aditamento da denúncia ou da queixa-crime, por se constituírem em peça postulatória de natureza acusatória.

Noentanto,tratando-sedecrimedecompetência dojuizadoespecial,orecursoadequado para rejeição da peça inicial será o de apelação, por força da regra especial prevista no art. 82, caput da Lei nº 9.099/95.

Importante destacar que, havendo o recurso contra a decisão que rejeitou a peça acusatória, o acusado ou o querelado deverá ser intimado para apresentar contrarrazões, sob pena de se violar ocontraditório, incorrendo, consequentemente, em nulidade processual150 Quanto ao marco temporal de interrupção do curso da prescrição da pretensão punitiva estatal151,considera-se:

a) sendo o recurso provido com o fundamento do reconhecimento de erro de julgamento (error in judicando), a data de publicação do acórdão;

b) na hipótese de se julgar nula a decisão de primeiro grau por erro de procedimento (error in procedendo), a data de publicação da nova decisão152 .

2º Decisão interlocutória que concluir pela incompetência do juízo (art. 581, incisoII, CPP)

Qualquer decisão de juiz do 1º graureconhecendo de modo próprioa suaincompetência desafia recurso em sentido estrito.

150 “Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo” (Súmula 707, STF).

151 “O curso da prescrição interrompe-se: I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa” (Art. 117, I, CP).

152 “Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela” (Súmula 709, STF).

171

Igualmente, caberá o recurso em sentido estrito quando se tratar de procedimento referente aos crimes dolosos contra a vida e o juiz, ao final da primeira fase, desclassificar o crime, retirando a competência do Tribunal do Júri (art. 419, CPP).

3º Decisão com força de definitiva que julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição (art. 581, inciso III, CPP)

A decisão terminativa que julgar procedente as exceções de incompetência de juízo, de litispendência, de ilegitimidade de parte ou de coisa julgada estará sujeita a recurso em sentido estrito.

Por outro lado, as decisões que julgá-las improcedentes serão irrecorríveis.

A exclusão do cabimento de recurso em sentido estrito contra a decisão que julgar procedente a exceção de suspeição se justifica em virtude de ser esta julgada no órgão de 2º grau, a teor do disposto noart. 100 do CPP.

As decisões que julgam procedentes as exceções de coisa julgada, de litispendência ou de ilegitimidade de parte são consideradas como sentenças terminativas, enquanto a que acolhe a exceção de incompetência de juízo é decisão interlocutória

4º Decisão que pronunciar o réu (art. 581, inciso IV, CPP)

A decisãode pronúncia comporta recursoemsentidoestrito, enquanto a de impronúncia comporta apelação.

Trata-se de decisãointerlocutória mista porencerrar umafase doprocedimento dasações penais afeitas ao Tribunal do Júri, passando-se, com a sua preclusão, para a segunda etapa (iudicium causae).

Por outro lado, apesar de o art. 584, § 2º do CPP dispor que o recurso da pronúncia suspenderá tão somente o julgamento em plenário, de fato, suspenderá o andamento do processo, uma vez que o art. 421, caput, do mesmo diploma legal153 , estabelece que os autos da ação penal somente serão encaminhados para o juiz-presidente do tribunal do júri quando preclusa a decisão de pronúncia, o que não será o caso.

Nesse caso, os atos preparatórios para o julgamento em plenário somente poderão ser praticados quando restar decidido o recurso, com a devolução do caderno processual para ojuízo de origem.

5º Decisão interlocutória que conceder, negar, arbitrar, cassar, julgar inidônea a fiança (art. 581, inciso V, primeira parte, CPP), quebrada ou perdido o seu valor (art. 581,inciso VII, CPP)

De início, é preciso destacar que, se qualquer dessas decisões constar da própria sentença, deverá ser objeto de impugnação mediante recurso de apelação, por força da vedação contida no art. 593, § 4º do CPP154 .

No caso de a decisão recorrida julgar quebrada a fiança, o recurso terá efeito suspensivo unicamente quanto ao perdimento da metade do valor da fiança (art. 584, § 3º, CPP) e poderá ser interpostoaté mesmo peloterceiro que a prestouem favor de outrem.

Caso julgue o perdimento da fiança, terá o recurso efeito suspensivo quanto à destinação do valor remanescente (art. 584, caput, CPP).

Se o perdimento do valor da fiança tiver sido decretado em sede de execução penal, o recursocabível será oagravoem execução.

É de se observar que, na hipótese de negativa de concessão de fiança pelo delegado de polícia, quando cabível, o seu arbitramento poderá ser requerido diretamente ao juiz competente, na forma prevista noart. 335 do CPP.

153 Art. 421. Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri.

154 CPP, art. 593 [...] § 4º - Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o recurso em sentido estrito, ainda que somente de parte da decisão se recorra.

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6º Decisão interlocutória que indeferir requerimento de prisão preventiva ou revogá- la, conceder liberdade provisória ou relaxar a prisão em flagrante (art. 581, inciso V, partefinal, CPP)

Além da possibilidade de manejo de recurso em sentido estrito contra decisão que indefere requerimento de prisão preventiva ou a revoga, por interpretação extensiva, deve-se acrescentar o seu cabimento para combater eventual negativa ou revogação de prisão temporária e/ou medida cautelar diversa da prisão ou que revoga e/ou determina a substituição das medidas cautelares de natureza pessoal.

Sob outro aspecto, diante da ausência de previsão legal, o combate à decisão que decreta a prisão preventiva e/ou quaisquer das medidas cautelares diversas da prisão, assim como indefere pedido de revogação e/ou substituição destas, deverá ser feito mediante habeas corpus, já que haverá ameaça ou cerceamento à liberdade de locomoção (ver item 6.1).

7º Decisão que declarar ou rejeitar pedido de extinção de punibilidade (art. 581, incisos VIII e IX, CPP)

Além das causas extintivas da punibilidade, relacionadas no art. 107 do CP155 , deve ser incluído o cabimento do recurso em sentido estrito contra decisão que reconhece o cumprimentodo período de prova da suspensão condicional do processo sem revogação (art. 89, § 5º da Lei nº 9.099/95), bem como o pagamento do débito fiscal, nos crimes contra a ordem tributária (art.83, § 4º da Lei nº 9.430/96, com a redação dada pela Lei nº 12.382/2011).

Trata-se de recurso residual, cabível somente quando a extinção da punibilidade não for reconhecida em sentença ou em decisão proferida pelo juízo da execução penal, sujeitas, respectivamente, à apelação e ao agravo em execução. Igualmente, por constituir decisão autônoma, sem julgamento do mérito da causa, e, como tal, sem a natureza de sentença, será admissível o recurso em sentido estrito quando houver absolvição sumária em face de reconhecimento da extinção de punibilidade, na forma prevista noart. 397, incisoIV do CPP156 .

Todavia, nada impede que, ao invés da interposição de recurso em sentido estrito, o interessado impetre habeas corpus para ver reconhecida a prescrição ou outra causa extintiva da punibilidade.

8º Sentença do juiz de 1º grau que conceder ou negar habeas corpus (art. 581, incisoX, CPP)

Na hipótese de concessão do habeas corpus, o recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, pelo assistente da acusação, se na fase judicial, e pelo querelante, no âmbito da ação penal de iniciativa privada.

Não se perca de vista que a sentença que concede ordem de habeas corpus por juiz de 1º grau será objeto de recurso ex officio (art. 574, inciso I, CPP).

Por questão de celeridade processual, caso o impetrante tenha a ordem de habeas corpus denegada, ao invés de recorrer da decisão, poderá impetrar novo writ diretamente ao tribunal competente, uma vez que a autoridade coatora passará a ser o juiz que, ao denegar o pedido, encampou eventual ilegalidade.

155 Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: I - pela morte do agente; II - pela anistia, graça ou indulto; III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso; IV - pela prescrição, decadência ou perempção; V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada; VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite; VII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005); VIII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005); IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.

156 CPP, art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: [...] IV - extinta a punibilidade do agente.

173

9º Decisão que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte (art. 581,inciso XIII, CPP)

É pacífico oentendimento de que é possível a interposição do recursoem sentido estrito contra decisão interlocutória que anula o processo ou qualquer ato nele praticado, mesmo antes da instrução criminal.

Entretanto, quando se tratar de decisão com natureza de sentença, o recurso adequado será a apelação.

De igual modo, por interpretação extensiva, é permitida a utilização do inciso XIII do art. 581 do CPP para combater a decisão que reconhece a ilicitude da prova e determina oseu desentranhamento (art. 157, § 3º, CPP)157

10º Decisão interlocutória que incluir ou excluir jurado na lista geral (art. 581, incisoXIV, CPP)

Trata-se de previsão legal que tem provocado divergência doutrinária sobre a sua aplicabilidade nos tempos atuais.

É que o art. 426, § 1º do CPP, com a redação que lhe deu a Lei Federal nº 11.689/08, permite que a lista geral de jurados venha a ser alterada de ofício ou mediante reclamação de qualquer do povo ao juiz presidente até o dia 10 de novembro, data de sua publicação definitiva.

Nesse sentido, parcela doutrinária sustenta que o instrumento de impugnação da lista geral de jurados passou a ser a reclamação, com a consequente revogação tácita do art. 581, inciso XIV, do CPP.

Todavia, há quementenda que orecursoemsentidoestritocontinuasendocabível contra a lista geral de jurados, com prazo para interposição de 20(vinte) dias, contado da data da publicação definitiva da lista de jurados, nos termos dos arts. 581, inciso XIV c/c 582, parágrafo únicoe 586, parágrafo único, todos do CPP158

11º Decisão que denegar a apelação ou que a julgar deserta (art. 581, inciso XV, CPP)

Trata-se da decisão interlocutória em primeiro juízo de admissibilidade que denega seguimento a apelação, quando verificada a ausência de condição ou de pressuposto recursal (objetivos e subjetivos de admissibilidade recursal) ou que a considerar deserta.

A propósito, a apelação será julgada deserta quando o querelante, nas ações em que somente se procede mediante queixa, não efetuar o devido preparo (pagamento das custas). Constitui-se em modo de extinção anômala do recurso.

12º Decisão que ordenar a suspensão do processo em virtude de questão prejudicial (art. 581, inciso XVI) ou por força do disposto no art. 366 do CPP

As questões prejudiciais, tratadas nos arts. 92 e 93 do CPP, podem motivar a suspensão do processo (obrigatória ou facultativa) e, consequentemente, da prescrição (art. 116, inciso I, CP159), e é contra tal decisão que caberá o recurso em sentido estrito.

157 Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. (…) § 3º Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.

158 Art. 581. Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença: (…) XIV - que incluir jurado na lista geral ou desta o excluir; [...] Art. 582 - Os recursos serão sempre para o Tribunal de Apelação, salvo nos casos dos ns. V, X e XIV. Parágrafo único. O recurso, no caso do no XIV, será para o presidente do Tribunal de Apelação. [...] Art. 586. O recurso voluntário poderá ser interposto no prazo de cinco dias. Parágrafo único. No caso do art. 581, XIV, o prazo será de vinte dias, contado da data da publicação definitiva da lista de jurados.

159 Art. 116 - Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I - enquanto não resolvida, em outro processo, ques-tão de que dependa o reconhecimento da existência do crime;[...].

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13º Decisão que ordenar a suspensão do processo por força do disposto no art. 366 do CPP

Tendo como fundamento a interpretação extensiva das disposições contidas no art. 581, inciso XVI do CPP, também será possível a utilização do recurso em sentido estrito contra a decisão que determina a suspensão do processo e da prescrição, quando oacusado, citado por edital, não comparecer em juízo, nem constituir defensor, nos termos do art. 366 do CPP.

14º Decisão que julgar o incidente de falsidade (art. 581, inciso XVIII, CPP)

O art.581, inciso XVIII doCPP, estabelece ocabimento dorecurso em sentido estrito contra decisão interlocutória que julgar o incidente de falsidade previsto nos arts. 145 a 148 do CPP.

15º Decisão que recusa homologação à proposta de acordo de não persecução penal (art. 581, inciso XXV, CPP)

Acrescentado pela Lei nº 13.964/2019, o novo dispositivo legal estabelece ser o recurso em sentidoestritoinstrumentojurídicohábil paracombater a decisão querecusar homologação ao acordo de não persecução penal, previsto no art. 28-A do CPP.

ATENÇÃO

Diante do art. 197 da Lei nº 7.210/84 (Lei das Execuções Penais), foram tacitamenterevogadas as hipóteses de recurso em sentido estrito contra a decisão que:

• conceder, negar ou revogar a suspensão condicional da pena (art. 581, inciso XI, CPP);

• conceder, negar ou revogar livramento condicional (art. 581, inciso XII, CPP);

• tratar da unificação de penas (art. 581, inciso XVII, CPP);

• tratar de medidas de segurança (art. 581, incisos XIX, XX, XXI, XXII e XXIII, CPP)

Igualmente, o disposto no inciso XXIV do art. 581 do CPP (decisão que converter a multaem detenção ou em prisão simples) foi revogado tacitamente pela Lei nº 9.268/96, que eliminou a possibilidade de conversão de pena de multa em detenção ou prisão simples.

5.3.1.3. Prazo

O recurso deve ser interposto por petição ou termo nos autos, dentro de05(cinco) dias (art. 586, caput, CPP).

Paraquemadmiteapossibilidade deapresentação dorecursocontraa decisãoqueincluir ouexcluirjurado dalista geral(art.581,inciso XIV, CPP), oprazo será de20(vinte)dias, contados da data da publicação definitiva da lista de jurados (art. 586, parágrafo único, CPP).

Quanto ao prazo para interposição do recurso em sentido estrito pelo ofendido contra decisão que decreta a extinção da punibilidade, na hipótese prevista no art. 271, caput c/c art. 584, § 1º e art. 598, caput, todos do CPP, contado a partir do término do prazo de recurso para o órgão do Ministério Público, deve-se observar que:

a) se estiver habilitado como assistente de acusação, o prazo será de 05(cinco) dias; b) não estando habilitado como assistente de acusação, o prazo será de 15(quinze) dias.

175

5.3.1.4. Procedimento

1º Interposição

Nos moldes do art. 577, caput do CPP, possuem legitimidade para apresentar o recurso o órgão do Ministério Público, o querelante, o acusado e o seu defensor.

O ofendido, habilitado ou não como assistente de acusação, no caso de decisão que decreta a extinção da punibilidade, poderá interpor recurso em sentido estrito, na forma preceituada no art. 271, caput c/c art. 584, § 1º, ambos do CPP. Igualmente, por analogia, poderá recorrerem sentido estrito da decisão que denega seguimento à apelação por ele interposta, com fundamento no disposto no art. 598 do CPP (art. 581, inciso XV, CPP).

O recurso voluntário deve ser interposto por petição ou termo nos autos (art. 578, caput,CPP).

2º Juízo de Admissibilidade

Será observado pelo juiz a quo se a irresignação atende aos pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, pormenorizados no item 5.1.3, a saber: cabimento, adequação, tempestividade, ausência de fato impeditivo, inexistência de fato extintivo, regularidade formal, legitimidade e interesse. Também denominado de juízo de prelibação.

3º Inadmissibilidade do recurso

Desatendidos os pressupostos de admissibilidade acima referidos, o recurso em sentido estrito será inadmitido ainda nojuízo a quo

4º Admissão do recurso

Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o recurso será admitido, dando-se prosseguimento emsua tramitação.

5º Processamento

O RESE será processado nos próprios autos do processo, conforme art. 583 do CPP:

a) nos casos da decisão que:

• rejeitar a denúncia ou a queixa;

• julgar procedentes as exceções, salvo a de suspeição;

• pronunciar o réu, exceto quando houver mais de um acusado e qualquer deles se conformar com a decisão ou todos não tiverem sido ainda intimados da pronúncia, circunstância em que haverá a cisão do processo;

• julgar extinta a punibilidade;

• conceder ou negar a ordem de habeas corpus.

b) quando o recurso não prejudicar o andamento do processo. Por exemplo: contra a decisão que determina a suspensão do processo em virtude do reconhecimento de questão prejudicial, ou pelo fato de o acusado, citado por edital, não ter comparecido, nem constituído defensor (art. 366, CPP).

Nos demais casos, orecursoserá processado por instrumento(autos apartados), que será formado, inicialmente, com as peças indicadas pela parte recorrente no termo ou na petição recursal.

O traslado será extraído, conferido e consertado no prazo de 05 (cinco) dias, e dele constarão, obrigatoriamente, a decisão recorrida, a certidão de sua intimação, se por outra forma não for possível se verificar a oportunidade do recurso, e o termo de interposição.

A comprovação que demonstre ser o seu subscritor defensor da parte recorrente (procuração, cópia do termo de interrogatório ou certidão cartorária informando sobre sua nomeação) deverá também compor o instrumento.

176

6º Razões recursais

Independentemente de o recurso seguir nos próprios autos ou por instrumento, a parte recorrente será intimada para, no prazo de 02(dois) dias, apresentar suas razões recursais.

Havendo assistente de acusação habilitado no processo, este terá vista dos autos para apresentação de razões (ou contrarrazões) após o órgão do Ministério Público, no prazo de 02(dois) dias, aplicando-se, por analogia, diante do silêncio da lei, o previsto no art. 600 do CPP.

Na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, o órgão do Ministério Público apresentará suas razões (ou contrarrazões) após o querelante, seja ele recorrente ou recorrido, no prazo de 02(dois) dias. Na ação penal privada exclusiva ou personalíssima, na qualidade de custos legis, depois das partes.

7º Contrarrazões recursais

Com as razões, intima-se a parte recorrida para, em 02(dois) dias, oferecer contrarrazões recursais.

Se o recorrido for o réu, será intimado do prazo na pessoa de seu defensor (art. 588, parágrafo único, CPP).

8º Deliberação pelo juízo a quo

Com a resposta do recorrido ou sem ela, o recurso será concluso ao juiz processante que, dentro de 02(dois) dias, deliberará sobre a pretensão recursal, reformando ou sustentando a decisão impugnada, mandando, ainda, instruir o recurso com os traslados que lhe parecerem necessários (art. 589, caput, CPP).

9º Nova decisão e apresentação de recurso invertido

Havendo retratação, com a reforma da decisão recorrida, a parte inicialmente recorrida passará a ser sucumbente à nova decisão. Nesse caso, poderá, por simples requerimento, pedir que o recurso original suba para a instância superior, sem necessidade de novas razões e contrarrazões (art. 589, parágrafo único do CPP). É o que se denomina “recurso invertido”, que, entretanto, somente será admitido se orecurso em sentido estrito for cabível pro et contra, ou seja, nas duas hipóteses de sucumbência (acusaçãoe defesa).

Para facilitar a compreensão, vejamos os exemplos abaixo:

a) 1º CASO: inconformado com decisão que declarou extinta a punibilidade dodenunciado pela prescrição, o órgão do Ministério Público interpôs recurso emsentido estrito (art. 581, inciso VIII, CPP), que resultou em retratação pela autoridade judiciária, a qual modificou a decisão recorrida para indeferir o reconhecimento da extinção de punibilidade. Nesse caso, a defesa poderá, por simples petição, recorrercontra a nova decisão, uma vez que há previsão legal para o manejo de recurso em sentido estrito contra decisão que indeferir pedido de extinção de punibilidade (art. 581, inciso IX, CPP);

b) 2º CASO: o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de determinado indivíduo. Liminarmente, a autoridade judiciária rejeitou a peça acusatória. Inconformado, o parquet interpôs recurso em sentido estrito contra a decisão (art. 581,inciso I, CPP). Devidamente processado, após apresentação de razões e contrarrazões recursais, seguiram os autos para apreciação do magistrado que, retratando-se, deliberou pelo recebimento da inicial. Nesse caso, diante da inexistência de recursocontra decisão que recebe a peça acusatória inicial, será descabido o recurso invertido.

Poderá ocorrer que, da decisão decorrente da retratação, embora não caiba o “recurso invertido”, esteja ela sujeita à apelação. Nesse caso, a parte que se sentir prejudicada, atendidos os pressupostos recursais, poderá manejar o recurso apelatório contra a nova decisão. Por exemplo: a retratação de uma decisão de pronúncia, que resulte na absolvição sumária do réu(art. 416, CPP).

177

Havendo retratação parcial e não sendo o caso de recurso pro et contra, deverá o recurso originário ter regular seguimento, já que haverá uma parcela preservada da decisão impugnada que deverá ser apreciada pelo juízo ad quem

10º Manutenção no juízo a quo da decisão recorrida

Não convencido dos argumentos apresentados pela parte recorrente, o juiz manterá a decisãoimpugnada pelos seus próprios fundamentos.

11º Remessa ao juízo ad quem

Formado o instrumento, inclusive com a eventual complementação de traslados de outras peças indicadas pelo juiz a quo, ou, os próprios autos do processo, conforme o caso, serão encaminhados à segunda instância (juízo ad quem) para processamento.

Publicada a decisão que julgou o recurso, serão os autos devolvidos para a instância inferior, dentro de 05(cinco) dias.

5.3.1.5. Efeitos

Como todo e qualquer recurso, o RESE tem efeito devolutivo para o tribunal.

Esse recurso não é dotado de efeito suspensivo, exceto nos casos remanescentes, determinados pelo art. 584 do CPP:

a) decisão que determina a perda fiança (art. 581, inciso VII, CPP); ou

b) decisão que denega a apelação ou a julga deserta (art. 581, inciso XV, CPP).

Ao recurso será conferido, ainda, efeito suspensivo, embora limitado, quando:

a) apresentado contra a sentença que declarar extinta a punibilidade. Todavia, não será suficiente para impedir que o acusado, se estiver preso, seja colocado em liberdade,em razão da remissão ao art. 596 do CPP. (art. 584, § 1º, CPP);

b) interposto contra a decisão de pronúncia visando a suspender tão somente ojulgamento (art. 584, § 2º, CPP);

c) combater a decisão que julgar quebrada a fiança. Nesse caso, o efeito suspensivo incidirá apenas com relação à perda da metade do valor afiançado (art. 584, § 3º, CPP), não sendo óbice para a decretação de outras medidas cautelares, inclusive, a prisão preventiva, se cabível.

O RESE possui, ainda, efeito regressivo (iterativo ou diferido - ver item 5.1.6.3.), e, a depender da hipótese, também efeito extensivo (ver item 5.1.6.4.).

5.3.2.

APELAÇÃO

5.3.2.1. Previsão legal

Arts. 593 a 603 do CPP.

5.3.2.2. Classificação

Classifica-se a apelação quanto:

a) ao objeto:

• plena: abrange a totalidade da decisão que gerou sucumbência à parte recorrente;

• parcial: abrange somente uma parte da decisão que gerou sucumbência à parte recorrente;

b)à legitimidade:

• principal: É a apelação interposta pelas partes;

• subsidiária (ou supletiva): É a interposta pelo ofendido (ou seus sucessores - art. 31, CPP), ainda que não se tenha habilitado como assistente (art. 598, caput, CPP);

178

c) ao procedimento:

• sumária: é a cabível no procedimento comum sumário;

• ordinária: é a interposta no procedimento comum ordinário

5.3.2.3. Cabimento

Nos termos do art. 593 do CPP, a apelação é admitida:

1) das sentenças definitivas de condenação ou absolvição proferidas por juiz singular;

2) das decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular nos casos em que não caiba recursoem sentido estrito.

3) das decisões do Tribunal do Júri, quando:

a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia:

Em sendo nulidade relativa, deverá ser arguida tão logo apregoadas as partes e anunciado o julgamento, sob pena de preclusão (art. 571, inciso V c/c art. 572, inciso I, todos do CPP).

A nulidade absoluta poderá ser alegada a qualquer tempo.

Àparterecorrente caberáapontara nulidade ocorridapara queaapelaçãosejaconhecida, devolvendo ao juízo ad quem a reapreciação da regularidade processual, o qual, dando provimento ao recurso, anulará o julgamento, determinando a renovação dos atos, a partir do ato processual viciado, e a realização de um novo julgamento.

b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados:

Nessecaso,caberáaotribunal adquem,aoreconheceraprocedênciadorecursoapelatório, corrigir a sentença, julgando o mérito, conforme prescreve a lei ou tenham decidido os jurados (art. 593, § 1º, CPP).

c) houver erro ou injustiça, no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança:

O equívoco aqui é imputado ao juiz-presidente, a quem cabe a aplicação da pena ou da medida de segurança. Desse modo, se ele incorrer em erro ou injustiça na fixação da pena ou da medida de segurança, por exemplo, estabelecendo a pena-base acima do máximo legal ou elevando excessivamente a pena em virtude da reincidência, caberá ao tribunal ad quem retificá-la (art. 593, § 2º, CPP).

d) decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos

A sentença do Tribunal do Júri é subjetivamente complexa, composta das decisões do conselho de sentença e do juiz presidente. O primeiro, soberanamente, julga questões relativas à existência do fato, sua autoria e a presença (ou não) de qualificadoras, causas de aumento e de diminuição da pena. Ao juiz presidente caberá a aplicação da pena e questões específicas de Direito, tudo de acordo com o que foi decidido pelos jurados.

Nesse contexto, em respeito ao princípio da soberania do Júri, o juízo ad quem, caso reconheça a procedência do recurso apelatório por nulidade posterior à pronúncia ou por decisão manifestadamente contrária à prova dos autos, somente fará o juízo rescindente (judicium rescindens), cassando a decisão anterior e devolvendo o processo para novo julgamento (art. 593, § 3º, CPP)160 Nos demais casos, o tribunal exercerá o juízo rescisório (judicium rescisorium),substituindo a decisão impugnada (art. 593, §§ 1º e 2º, CPP).

A decisão do conselho de sentença manifestadamente contrária à prova dos autos é aquela que está totalmente divorciada dos elementos probatórios carreados ao bojo processual, não encontrando qualquer sustentáculo probatório nos autos, embora esteja

160 “[...] 2. A decisão do Júri, no entanto, não se reveste de intangibilidade, de modo a autorizar os jurados a julgar em completo des- compasso com o conjunto probatório. Dessa maneira, o art. 593, inciso III, alínea d, do Código de Processo Penal atribui à instância recursal a possibilidade de revisar a decisão proferida pelo Tribunal Popular e, caso constate a dissociação entre a decisão e o conjunto probatório, poderá determinar a realização de novo julgamento [...]. (STJ, 5ª Turma, AgRg no HC nº 638.808, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 23/02/2021, pub. no DJe de 01/03/2021).

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relacionada ao fato principal, à autoria, às causas excludentes da ilicitude ou da culpabilidade, reconhecimento de uma qualificadora, causa de aumento ou de diminuição da pena.

Nessa linha de raciocínio, a decisão dos jurados que opta por acolher prova que sustenta uma das versões conflitantes em plenário é fundamento suficiente para se rejeitar o recurso apelatório por respeito à soberania do seu veredicto.

No caso de um novo julgamento pelo reconhecimento de uma decisão anterior manifestadamente contrária à prova dos autos, as partes não poderão inovar na apresentação de rol testemunhal, porquanto o momento processual adequado para o fazer antecedeu ao primeiro julgamento (art. 422, CPP). Além do mais, não se admite uma segunda apelação pelo mesmo fundamento, pouco importando qual parte recorreu (art. 593, § 3º, parte final, CPP161).

Esclareça-se, ainda, que, havendo um segundo julgamento, não poderão fazer parte do conselho de sentença os jurados que atuaram no júri anterior (art. 449, inciso I, CPP162).

Por respeito ao princípio da unirrecorribilidade, reconhecido no art. 593, § 4º do CPP, quando cabível apelação, não poderá ser utilizado o recurso em sentido estrito, mesmo que se recorra somente de parte da decisão.

Porfim,trata-sederecursodefundamentação vinculada,recaindosobreoapelanteoônus de invocar um ou mais dos fundamentos dentre os relacionados no art. 593, inciso III do CPP, ao qual ficará o juízo ad quem subordinado, não podendo conhecê-lo por motivo diverso163

4) Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária (art. 416, CPP)

5) No âmbito da Lei nº 9.099/95

Na Lei nº 9.099/95, caberá apelação para Turma Recursal, composta de 03 (três) juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado, contra a: a) decisão que homologar a transação penal (art. 76, § 5º);

b) decisão que rejeitar a denúncia ou queixa (art. 82, caput, segunda parte); c) sentença (art. 82, caput).

5.3.2.4. Prazo

A apelação deve ser interposta por petição ou por termo nos autos, dentro do prazo de 05 (cinco) dias(art. 593, CPP).

Na hipótese de apelação subsidiária (ou supletiva), o prazo começará a fluir imediatamente após o transcurso do prazo do órgão do Ministério Público164 e será de 15 (quinze) dias, caso não esteja o ofendido ou qualquer dos seus sucessores processuais165 habilitado como assistente (art. 598, parágrafo único, CPP). Se já estiver habilitado, será de 05(cinco) dias166 .

Na apelação prevista na Lei nº 9.099/95, o prazo será de 10(dez) dias, contados da ciência da sentença pelo Ministério Público, pelo réu e por seu defensor (art. 82, § 1º).

5.3.2.5. Processamento

1º Interposição do recurso

Na forma prevista no art. 577, caput do CPP, possuem legitimidade para a interposição do recurso o órgão do Ministério Público, o querelante, o acusado e seu defensor.

161 Art. 593. [...] § 3o Se a apelação se fundar no nº III, d, deste artigo, e o tribunal ad quem se convencer de que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, dar-lhe-á provimento para sujeitar o réu a novo julgamento; não se admite, porém, pelo mesmo motivo, segunda apelação.

162 Art. 449. Não poderá servir o jurado que: I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior;[...].

163 Súmula 713 do STF: “O efeito devolutivo da apelação contra decisões do Júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição”.

164 O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público”(Súmula 448, STF).

165 Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

166 “HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. APELO INTERPOSTO PELO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. PRAZO DE CINCO DIAS. INTEMPESTIVIDADE. SÚMULA N.º 448 DO STF. HABEAS CORPUS CONCEDIDO. 1. O prazo para o Assistente de Acusação habilitado nos autos apelar é de 5 (cinco) dias, após a sua intimação da sentença, e terminado o prazo para o Ministério Público apelar. Incidência do enunciado da Súmula n.º 448 do Supremo Tribunal Federal. 2. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3.Habeas corpus concedido”. (HC 237.574/SP, Rel. Ministra LAURITAVAZ, QUINTATURMA, julgado em13/11/2012, DJe 23/11/2012).

180

O ofendido, habilitado ou não como assistente de acusação, poderá apelar subsidiariamente (ou supletivamente) na hipótese estabelecida no art. 598 do CPP167 .

O recurso voluntário deve ser interposto por petição ou por termo nos autos (art. 578, caput, CPP), abrangendo o julgado, total ou parcialmente (art. 599, CPP).

2º Juízo de Admissibilidade (juízo de prelibação)

O juiz a quo observará se a irresignação atende aos pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, pormenorizados no item 5.1.3, a saber: cabimento, adequação, tempestividade,ausência de fato impeditivo, inexistência de fato extintivo, regularidade formal, legitimidade e interesse.

3º Inadmissibilidade do recurso

Desatendidos os pressupostos de admissibilidade acima referidos, será a apelação inadmitida, cabendo, da decisão, recursoem sentidoestrito.

4º Admissão do recurso

Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, será a apelação admitida, dando-se prosseguimento emsua tramitação.

5º Processamento

A apelação será processada nos próprios autos do processo, conforme o art. 583 do CPP. Todavia, subirá por instrumento, na forma do art. 601, § 1º do CPP, se, havendo mais de um réu, não tiverem todos sido julgados ou apelados.

Ao apelante caberá extrair o traslado integral dos autos, o qual deverá ser remetido à instânciasuperior no prazode 30(trinta) dias,contado da data da entrega das últimas razões de apelação, ou do vencimento do prazo para a apresentação das do apelado.

As despesas do traslado correrão por conta de quem o solicitar, exceto se o pedido for de réu pobre ou do órgão do Ministério Público.

6º Razões (art. 600, CPP)

Para a apresentação das razões recursais, será observado:

a) o apelante terá o prazo de 08 (oito) dias para oferecer as razões recursais;

b) quando forem dois ou mais apelantes, os prazos serão comuns.

c) se houver assistente de acusação, este arrazoará, no prazo de 03(três) dias, após o órgão do Ministério Público;

d) sendo a apelação subsidiária (ou supletiva), o ofendido será o recorrente, tendo o prazo de 08(dias) para oferecer razões recursais, seguindo-se pelo órgão do MinistérioPúblico, pelo prazo de 03(três) dias;

e) na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, o órgão do Ministério Público, não sendo o recorrente, apresentará suas razões (ou contrarrazões) após o querelante, seja ele recorrente ou recorrido, no prazo de 03(três) dias;

f) na ação penal privada exclusiva ou personalíssima, o órgão do Ministério Público, na qualidade de fiscal da correta aplicação da lei (custos legis), terá, depois das partes, vista dos autos para pronunciamento em até 03(três) dias.

O apelante, desde que não seja o órgão do Ministério Público, ao interpor a apelação, poderá declarar, na petição ou no termo, que deseja arrazoar na superior instância. Nesse caso, os autos serão remetidos ao tribunal ad quem, que, mediante publicação em órgão oficial, intimará a parte recorrente para apresentação das razões.

167 Art. 598. Nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo Mi- nistério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo. Parágrafo único. O prazo para interposição desse recurso será de quinze dias e correrá do dia em que terminar o do Ministério Público.

181

7º Contrarrazões (art. 600, CPP)

Para apresentação das contrarrazões, observar-se-á:

a) a parte recorrida será intimada para oferecer as contrarrazões em até 08(oito) dias;

b) quando forem dois ou mais apelados, inobstante o art. 600, § 3º do CPP estabelecer queos prazos serão comuns, admite-se que eles sejam sucessivos por se reconhecer que a restrição viola o contraditório e a ampla defesa, uma vez que, ao impedir a retirada por aqueles dos autos do cartório, macula o princípio da igualdade em relação à parte adversa;

c) se houver assistente de acusação, este contrarrazoará, em até 03(três) dias, após o órgão do Ministério Público;

d) na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, o órgão do Ministério Público apresentará suas contrarrazões após o querelante recorrido, no prazo de até 03(três) dias.

Na hipótese de a parte recorrente ter manifestado o desejo de arrazoar na superior instância, após seguirem os autos para o Tribunal (juízo ad quem) e depois de oferecidas as razões apelatórias, será a parte recorrida, oportunamente, intimada por publicação oficial para apresentação de suas contrarrazões, nos termos do art. 600, § 4º do CPP.

Tratando-se de ação penal de iniciativa pública ou de ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, os autos serão devolvidos ao juízo de origem, para que o órgão do Ministério Público de1º Grau ofereça ascontrarrazões, retornando, em seguida, para julgamento.

8º Remessa ao juízo ad quem

Findos os prazos para oferecimento das razões de apelação, com ou sem elas, os autos serão encaminhados ao Tribunal correspondente (juízo ad quem) para processamento e julgamento(art. 601, caput, CPP).

Por sua vez, a interpretação adequada que se deve dar ao art. 601, caput do CPP, é que, nãohavendoaapresentação dasrazões, osautosserãoencaminhados paraainstância superior, porém não poderão, nessas condições, ser julgados, sob pena de violação ao princípio da dialeticidade.

Assim, havendo inércia da parte apelante em apresentar suas razões, o relator deverá:

a) sendo a defesa a parte omissa, determinar a intimação pessoal do acusado para constituir outro defensor, sob pena de ser-lhe nomeado um defensor dativo para fazê-lo;

b) se a omissão for do órgão do Ministério Público, oficiar ao Chefe da instituição para que encaminhe os autos ao substituto legal do omisso ou designe outro membro ministerial para apresentá-las;

c) se for o recurso exclusivo do querelante omisso, deverá ser reconhecida a desistência tácita, com a extinção do processo sem julgamento de mérito, nos termos do art. 485, caput, inciso VIII do CPC, aplicado subsidiariamente.

Ressalte-se que a apresentação das razões de forma extemporânea constitui mera irregularidade processual.

Por fim, se houver mais de um réu, e não tiverem todos sido julgados, ou não tiverem todos apelado, caberá ao apelante promover a extração de traslado dos autos, o qual deverá ser remetido à instância superior no prazo de até 30(trinta) dias, contado da data da entrega das últimas razões de apelação, ou do vencimento do prazo para a apresentação das do apelado, correndo as despesas do traslado por conta de quem o solicitar, salvo se o pedido for de réu pobre ou do Ministério Público (art. 601, §§ 1º e 2º, CPP).

182

9º Processamento da apelação no Tribunal (juízo ad quem)

Inobstante, de fato, não existir diferença de procedimento no 1º grau, a legislação estabelece ritos diversos para a apelação ordinária (cabível no procedimento comum ordinário) e para a apelação sumária (cabível no procedimento comum sumário):

a) Apelação ordinária:

1) distribuição da apelação ordinária ao órgão fracionário do Tribunal (Câmara ou Turma);

2) escolha do relator (por sorteio);

3) nãoconhecimento do recurso;

4) conhecimento dorecurso;

5) parecer do órgão do Ministério Público em 2º Grau, no prazo de até 10(dez) dias;

6) vista ao Relator, no prazo de até 10(dez) dias;

7) elaboração do relatório;

8) vista ao revisor, pelo prazo de até 10(dez) dias;

9) sessão de julgamento: vota o relator, depois o revisor e por último o terceiro julgador, proclamando o presidente o resultado (art. 613, inciso I, CPP).

b) Apelação sumária:

1) distribuição da apelação sumária ao órgão fracionário (Turma ou Câmara);

2) escolha do relator (por sorteio);

3) nãoconhecimento do recurso;

4) conhecimento dorecurso;

5) parecer do órgão do Ministério Público em 2º Grau, em até 05(cinco) dias;

6) vista ao elator, em até 05(cinco) dias;

7) designação de data para julgamento;

8) sessão de julgamento: voto do relator, e, em seguida, votam os 2º e 3º julgadores, proclamando o presidente o resultado (art. 610, caput, CPP).

 Processamento no Juizado Especial (Lei nº 9.099/95)

A sistemática a ser observada para a apelação é a prevista na Lei 9.099/95, no art. 82, caput e seus parágrafos.

1) interposição do recurso, acompanhado das razões recursais; (Ao interpor o recurso apelatório, por petição escrita, a parte recorrente já deverá apresentar as respectivas razõesrecursais)

2) juízo de admissibilidade;

3) inadmissibilidade do recurso;

4) admissão do recurso;

5) processamento nos próprios autos;

6) intimaçãoeapresentação dascontrarrazões;(Orecorridoseráintimadoparaapresentar contrarrazões no prazo de até 10 (dez) dias)

7) remessa ao juízo ad quem.

A apreciação dorecurso caberá à Turma Recursal, composta de03(três) Juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado.

Para instruir o recurso, as partes poderão requerer a transcrição da gravação da fita magnética referente aos atos praticados na audiência de instrução e julgamento.

As partes serão intimadas da data da sessão de julgamento pela imprensa.

Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento serviráde acórdão.

Sinopticamente, eis o rito na Turma Recursal:

183

1) distribuição da apelação para a Turma Recursal; 2) escolha do relator (por sorteio);

3) nãoconhecimento do recurso

4) conhecimento do recurso

5) parecer do órgão do Ministério Público em 2º Grau, em até 05(cinco) dias;

6) vista ao Relator, em até 05(cinco) dias;

7) sessão de julgamento: no julgamento, vota o relator, e, em seguida, votam os 2º e 3º julgadores, proclamando o presidente o resultado. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.

5.3.2.6. Efeitos

5.3.2.6.1. Efeito devolutivo

A apelação devolve ao tribunal revisor o conhecimento de toda a matéria impugnada e questões de ordem pública, cognoscível de ofício, atendido o princípio da vedação da reformatio in pejus168

Na hipótese de o recorrente apelar parcialmente da decisão, deverá declarar expressamente o ponto da sentença que deseja modificar. Não o fazendo, entende-se que apela integralmente daquilo quelhe é desfavorável no decisum.

Na apelação parcial, o recorrente deverá delimitar, na petição recursal ou nas razões recursais, o(s) ponto(s) impugnado(s). Todavia, caso o(s) indique no ato de recorrer, não poderá modificá-lo(s), posteriormente, nas razões.

Nessa linha de raciocínio, respeitado o princípio da proibição de reformatio in pejus, não há qualquer óbice para que o juízo ad quem aplique, no exame do recurso apelatório, a emendatio libelli por constituir o juízo de tipicidade penal matéria de ordem pública.

Por outro lado, a aplicação da mutatio libelli é vedada à segunda instância, consoante, aliás, deliberado pelo Supremo Tribunal Federal, por intermédio do enunciado da Súmula 453: “Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa”.

5.3.2.6.2. Efeito suspensivo

Quanto ao efeito suspensivo, observa-se que se a apelação impugnar a

a) sentença penal absolutória própria, não terá efeito suspensivo, por força do disposto no art. 386, parágrafo único, incisos I e II e art. 596, caput, ambos do CPP. Nesse caso, o acusado será posto imediatamente em liberdade e, caso existentes, serão tomadasoutras medidas cautelares porventura provisoriamente aplicadas;

b) sentença penal absolutória imprópria, o recurso não terá efeito suspensivo, devendo a execução da medida de segurança ser imediatamente aplicada, na forma prevista noart. 596, parágrafo único do CPP;

c) sentença penal condenatória, o recurso terá efeito suspensivo, o que não impede a imposição de medidas cautelares de natureza pessoal, a teor do disposto no art. 387, parágrafo único do CPP.

Por seu turno, a apelação subsidiária (ou supletiva) não possui efeito suspensivo, conforme previsão doart. 598, caput, parte final do CPP169

168[...] 2. Oamplo efeito devolutivodaapelaçãoautoriza oTribunal, ainda que emjulgamento de recurso exclusivo da Defesa, a alterar e/ou incrementar a fundamentação da sentença, desde que o desfecho não agrave o quantum final de pena fixado. Precedentes. [...]. (STF, 1ª T., RHC-123900 Agr, Relª. Minª. Rosa Weber, j. em 08/03/2021, pub. no DJe de 09/04/2021).

169 Art. 598. Nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juizsingular, se da sentença não for interposta apelação pelo Minis- tério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo.

184

5.3.2.6.3. Efeito extensivo

A apelação terá efeito extensivo, na forma prevista no art. 580 do CPP. Por exemplo, no recurso de um dos corréus, o tribunal julga procedente a irresignação para reconhecer a atipicidade do fato tido como criminoso. Nesse caso, a decisão se estenderá aos demais acusados, ainda que dela nãotenham recorrido.

5.3.3. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

5.3.3.1. Previsão legal

• no 1º Grau: art. 382 do CPP;

• nos tribunais: arts. 619 e 620 do CPP;

• no juizado especial criminal e na turma recursal: art. 83 da Lei nº 9.099/95.

5.3.3.2. Cabimento

Os embargos de declaração são admitidos para sanar ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão,

• no 1º grau, de qualquer ato decisório do juízo monocrático (art. 382, CPP);

• no âmbito da Lei nº 9.099/95 (art. 83):

» da sentença (juizado especial criminal);

» de acórdão (Turmas Recursais);

• nos Tribunais, somente de acórdãos (art. 619, CPP). Para decisões proferidas monocraticamente, será cabível o agravo interno ou o agravo regimental, conforme dispuser oregimento interno da Corte.

5.3.3.3. Prazo

a) Supremo Tribunal Federal: até 05 (cinco) dias (art. 337, § 1º do RISTF);

b) Superior Tribunal de Justiça: até 02 (dois) dias (art. 263, caput do RISTJ);

c) 2º Grau: até02 (dois) dias (art. 619, CPP);

d) 1º Grau: até02 (dois) dias (art. 382, CPP);

e) Juizados Especiais: até 05 (cinco) dias (art. 83 da Lei nº 9.099/95).

É preciso destacar que os embargos declaratórios suspendem o prazo para os demais recursos, salvo quando intempestivos, circunstância que afasta o efeito interruptivo.

5.3.3.4. Processamento

1º Petição recursal

Qualquer das partes poderá opor embargos de declaração, por escrito, com as respectivas razões, cabendo sua apreciação ao próprio juízo ou tribunal que houver proferido a decisão embargada. Deve o embargante indicar em que consiste a ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão(art. 620, caput, CPP).

No âmbito dos juizados especiais criminais, os embargos poderão ser opostos por escrito ou oralmente.

Os embargos declaratórios serão processados nos próprios autos da decisão embargada.

2º Juízo de admissibilidade

Ao serem apresentados, os embargos serão encaminhados para a autoridade judiciária (juiz ou relator, conforme o órgão prolator da decisão embargada) que os indeferirá liminarmente,quando não atendidas as condições ou os seus pressupostos de admissibilidade (art. 620, § 2º,CPP).

185

3º Contrarrazões, se tiver efeitos infringentes

Admitido o recurso e, sendo hipótese de ser dotado de efeitos modificativos (infringentes), isto é, efeitos que possam modificar substancialmente a decisão embargada, deverá a parte adversa ser intimada para se manifestar sobre o seu teor, no mesmo prazo de oposição do recurso, por analogia, mutatis mutandis, do art. 1.023, § 2º do CPC170. É o que se denomina embargos de declaração com efeitos infringentes

Inexistindo a possibilidade de efeitos modificativos, não há previsão de manifestação da parte contrária à embargante.

4º Julgamento

Ato contínuo, seguirão para decisão pelo juiz monocrático, em caso de impugnação de decisão de 1º Grau, ou, para o órgão colegiado, na hipótese de recair sobre acórdão por ele proferido.

A decisão que julga procedente os embargos de declaração e a sentença embargada (ou o acórdãoembargado) passam a integrar uma mesma decisão.

5.3.3.5. Efeitos

Os embargos de declaração, caso sejam conhecidos, interrompem, para as partes, o prazo para a apresentação de outros recursos, pouco importando se foremconsiderados, mais adiante, procedentes ouimprocedentes.

Providos os embargos declaratórios e corrigido o vício apontado, como visto, poderá ocorrer modificação na decisão embargada.

Nesse caso, tendo sido apresentado, anteriormente aos embargos, outro recurso, aplicase o princípio da complementaridade para permitir que se proceda à complementação das razões da irresignação já interposta.

Os embargos de declaração apresentam efeito devolutivo restrito à ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão apontada, não tendo efeito regressivo, já que não é possível oexercício dojuízo deretratação.

Há, ainda, a possibilidade de que esses embargos tenham o efeito extensivo previsto no art. 580 do CPP.

5.3.4. CARTATESTEMUNHÁVEL

5.3.4.1. Previsão legal

Arts. 639 a 646 do CPP.

5.3.4.2. Cabimento

A carta testemunhável será cabível:

a) contra a decisão do juízo a quo que denegar o recurso (art. 639, inciso I, CPP); ou b) que, embora o admita, obste à sua expedição e seguimento para o juízo ad quem (art.639, incisoII, CPP.

Trata-se de recurso residual (ou subsidiário), a ser utilizado apenas quando não houver recurso específico para combater a decisão ou a obstacularização, antes citadas.

Atualmente, a carta testemunhável é manejada para combater a decisão que denega ou não determina oseguimento dorecursoem sentidoestrito.

A outra hipótese para sua utilização diz respeito ao agravo em execução (art. 197 da LEP), em sede de execução penal, para o qual se aplica o procedimento do recurso em sentido estrito.

170 CPC,Art. 1.023. [...] § 2º O juizintimará o embargado para, querendo, manifestar-se, no prazo de 5 (cinco) dias, sobre os embargos opostos, caso seu eventual acolhimento implique a modificação da decisão embargada.

186

5.3.4.3. Prazo

Nos termos do art. 640 do CPP, o prazo para interposição da carta testemunhável será de 48(quarenta e oito) horas, contado a partir da intimação da decisão que denegou o recurso ou que impediu o seu processamento (arts. 640 c/c 798, § 5º, CPP).

5.3.4.4. Processamento

A carta testemunhável será interposta, por petição escrita, ao escrivão (Justiça Estadual), ao diretor da Secretaria (Justiça Federal) ou ao secretário da Presidência do Tribunal. Nela, o requerente indicará as peças do processo que deverão ser trasladadas (art. 640, CPP).

Em seguida, o serventuário da Justiça dará recibo da petição à parte e, no prazo máximo de 05(cinco) dias, por se tratar de recurso em sentido estrito, fará entrega da carta, devidamente conferida e consertada.

Se o serventuário se negar a dar esse recibo, ou deixar de entregar o instrumento, sob qualquer pretexto, estará sujeito a suspensão funcional por trinta dias.

Ojuiz, ou o presidente do Tribunal, em face de representação do testemunhante, imporá a pena e mandará que o instrumento seja extraído, sob a mesma sanção, pelo substituto do escrivãoou dosecretário dotribunal. Se otestemunhante nãoforatendido, poderáreclamar ao presidente do tribunal ad quem, o qual avocará os autos, para o efeito do julgamento do recurso ea imposição da pena.

Extraído e autuado o instrumento, nos termos do art. 643 do CPP, a carta testemunhável adotará o mesmo procedimento do recurso denegado ou que teve o seu seguimento obstado, isto é, atualmente, o previsto para o recurso em sentido estrito.

Assim,

1) Recebendo o instrumento, o testemunhante terá o prazo de até 02(dois) dias para apresentar as razões, devolvendo-o, ao cartório;

2) Em seguida, será o testemunhado intimado para apresentar, em até 02(dois) dias, assuas contrarrazões, podendo indicar as peças que pretende que sejam trasladadas no instrumento;

3) Seguem, então, para deliberação sobre o juízo de retratação (ou não). Havendo retratação, processa-se o recurso denegado. Caso contrário, remete-se a carta testemunhável para a instância superior;

4) Na instância superior, a carta testemunhável seguirá o rito do recurso em sentido estrito (art. 645, CPP).

O Tribunal, Câmara ou Turma a que competir o julgamento da carta testemunhável, se a julgar procedente, mandará processar o recurso que a motivou, a fim de que possa este último subir à instância superior para a devida apreciação. Entretanto, se a considerar suficientemente instruída, poderá decidi-la, como se fosse o próprio recurso (art. 644, CPP).

5.3.4.5. Efeitos

A carta testemunhável não possui efeito suspensivo. Já o seu efeito devolutivo é limitado aoexame da admissibilidade ou do processamento efetivo do recurso que a originou, in casu, o recurso em sentido estrito ou o agravo em execução, salvo quando estiver suficientemente instruída, caso em que é devolvida ao Tribunal para o conhecimento do mérito desses recursos (art. 644, CPP). É o que se denomina efeito devolutivo ampliado

Ela admite efeito regressivo (iterativo ou diferido), cabendo juízo de retratação.

187

5.3.5.1. Previsão legal

Art. 609, parágrafo único do CPP.

5.3.5.2. Cabimento

Embargosinfringentesede nulidade são recursos privativos da defesa,cabíveis, naformado art. 609, parágrafo único do CPP, quando não for unânime a decisão de segunda instância, desfavorável ao réu, proferida em apelação, recurso em sentido estrito ou agravo em execução. Esses embargos são restritos à matéria objeto da divergência.

Se o acórdão contiver vários capítulos ou questões preliminares ou prejudiciais, cada um deles será considerado como uma decisão, para fins de embargos infringentes e de nulidade.

Na verdade, trata-se de dois recursos com objetivos diversos, a saber:

a) embargos infringentes: quando o acórdão impugnado possuir divergência em matéria de mérito. Pretendem modificar o julgado;

b) embargos de nulidade: quando houver divergência no acórdão impugnado em matériade natureza processual, capaz de anular o processo.

Épossívelqueoacórdãocontenha parte unânimeeparte nãounânime,porexemplo, uma decisãoproferidaemapelação que mantém, por unanimidade, a condenação, e, por maioria de votos, modifica o quantum da pena a ser aplicada.

Nesse caso, deve-se observar que:

a) os embargos infringentes somente poderão ser manejados em relação à matéria objeto da divergência, ou seja, em relação ao quantum da pena; b) relativamente à parte unânime do acórdão, esta deverá ser simultaneamente impugnada por recurso especial e/ou por recursoextraordinário, se couber, sob penade preclusão; c) depois de julgados os embargos, se for o caso, deverá ser apresentado recurso especiale/ou recursoextraordinário contra o novoacórdão.

O Supremo Tribunal Federal, deliberando sobre a matéria, editou os seguintes enunciados: “Em caso de embargos infringentes parciais, é definitiva a parte da decisão embargada em que não houve divergência na votação” (Súmula 354), e, ainda, “Em caso de embargos infringentes parciais, é tardio o recurso extraordinário interposto após o julgamento dos embargos, quanto à parte da decisão embargada que não fora por eles abrangida” (Súmula 355).

Trata-se, pois, de uma das exceções ao princípio da unirrecorribilidade171

Por outro lado, descabem embargos infringentes e de nulidade na Turma Recursal dos Juizados Especiais Criminais, por falta de previsão legal.

5.3.5.3. Prazo

O prazo para interposição de embargos infringentes e de nulidade é de até 10 (dez) dias, contados da publicação do acórdão (art. 609, parágrafo único, CPP).

Porém, a interposição dos embargos não suspende o prazo para apresentação de recursos quanto à parte unânime do acórdão.

5.3.5.4. Processamento

1º Interposição do recurso

Os embargos infringentes e de nulidade deverão ser interpostos por escrito e endereçados ao relator do acórdão embargado (art. 609, parágrafo único, CPP), já acompanhados das respectivas razões, as quais podem se limitar a invocar o voto divergente. Todavia, caso este

171 Ver item5.1.1.3.

188 5.3.5. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE

ocorra, deverá o juízo ad quem não conhecer de eventuais excessos aos limites da divergência. Por exemplo: a divergência diz respeito unicamente ao regime inicial da pena, mas o embargante requer, além da matéria, a redução do quantum da pena. Nesse caso, o Tribunal conhecerá dos embargos somente notocante à discussão sobre oregime de pena.

Contrarrazões pela parte embargada (acusação) não são previstas. Entretanto, tem-se admitido, em atendimento ao princípio do contraditório, a sua apresentação pelo assistente de acusação, se tiver, ou pelo querelante, no caso de ação penal privada.

O Ministério Público irá se pronunciar por intermédio do parecer do(a) Procurador(a) de Justiça que oficiar junto ao Tribunal.

A forma de interposição do recurso e o seu processamento no tribunal poderá sofrer alteração, de acordo com o que determina a lei de organização judiciária respectiva e o regimento interno de cada Corte.

1) Parecer do órgão do Ministério Público em 2º Grau

2) Distribuição

3) Vista ao Relator

4) Apresentação do relatório

5) Vista ao Revisor

6) Sessão de julgamento

Nojulgamento, oTribunal ficará limitado a adotara posição seguida pelos votosvencedores ou pelo voto vencido, sendo-lhe vedado trilhar por uma terceira posição. No entanto, poderá chegar a uma solução quantitativamente intermediária entre aquelas. Por exemplo, se a maioria aplicou pena de seis anos e o voto divergente, de três anos, poderá o resultado do julgamento impor pena intermediária172 .

Obviamente, no julgamento, deverão ser apreciadas questões de ordem pública, ainda que não constem do voto divergente.

Entretanto, algumas vezes, o julgamento sobre a questão não unânime poderá ter repercussão em todo o julgado, incluindo a parte unânime. Por exemplo, suponhamos que a divergência diga respeito ao recebimento da denúncia, tendo, por maioria de votos, sido afastada a alegação de inépcia. Superada a questão, passou-se ao exame meritório do recurso deapelação,tendosidoconfirmada acondenação, por unanimidade. Os embargosinfringentes foram providos, reconhecendo-se a inépcia da denúncia. Logo, a condenação confirmada em sede de apelação, de forma unânime, será necessariamente revista.

5.3.5.5. Efeitos

Os embargos infringentes e de nulidade são dotados de efeito devolutivo, no que se refere à matéria constante do voto divergente e objeto do recurso.

Diante do silêncio da lei, considera-se que os embargos infringentes e de nulidade possuem efeitosuspensivo.

São dotados de efeito suspensivo indireto, já que o início da execução da pena somente ocorrerá quando se operar o trânsito em julgado da condenação, consoante decidiu o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão do dia 07 de novembro de 2019, no julgamento do mérito das ADC’s nºs 43, 44 e 54.

Sob outro aspecto, comungamos do entendimento de que os embargos infringentes e de nulidade não são dotados de efeito regressivo, uma vez que, ainda que os desembargadores que prolataram o acórdão vierem a apreciar recurso contra a decisão, modificando voto anterior, isso seria feito no curso de outro julgamento, realizado no juízo ad quem, o que afastaria característica do juízo de retratação, que seria a revisão no próprio juízo a quo.

Poderão também apresentar efeito extensivo, nos termos do art. 580 do CPP.

172 BADARÓ, Gustavo Henrique. op. cit., p. 287.

189

5.3.6.1. Previsão legal

Art. 197 da Lei nº 7.210/84 da Lei de Execuções Penais (LEP).

5.3.6.2. Cabimento

Cabível das decisões proferidas pelo juiz das execuções penais (art. 66 da Lei nº 7.210/84).

5.3.6.3. Processamento

São partes legítimas para interpor o agravo em execução, diante da exegese do art. 195 da Lei nº 7.210/84, o órgão do Ministério Público, o condenado, quem o represente, seu cônjuge, parente ou descendente.

A interposição se dará por petição escrita, cabendo ao agravante indicar as peças a serem trasladadas, tudo, posteriormente, autuado por instrumento.

Diante da falta de previsão legal, para prosseguimento da irresignação, aplica-se, ao agravo em execução, o procedimento estabelecido para o recurso em sentido estrito, no que couber, razão pela qual remetemos oleitor ao item 5.3.1.

5.3.6.4. Efeitos

O agravo em execução é dotado de efeitos devolutivo e regressivo (iterativo ou diferido), na forma prevista para o recurso em sentido estrito.

Todavia, não possui efeito suspensivo, por expressa proibição contida no art. 197, parte final, da LEP.

Nessecaso, quandoa decisãopuder causar danoirreparável, ocondenado poderá utilizar o habeas corpus, para buscar efeito suspensivo da decisão agravada, enquanto o órgão do Ministério Público, o mandado de segurança.

5.3.7. CORREIÇÃO PARCIAL

5.3.7.1. Previsão legal

a) No âmbito da Justiça Federal, determina o art. 6º, inciso I da Lei nº 1.050/66: “Ao Conselho da Justiça Federal compete: [...] I - Conhecer de correição parcial requerida pela parte ou pela Procuradoria da República, no prazo de cinco dias, contra ato oudespacho do Juiz de que não caiba recurso, ou comissão que importe erro de ofício ou abuso de poder”;

b) A Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), em seu art. 32, caput e inciso I, dispõe: “Art. 32. Além de outras funções cometidas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e demais leis, compete aos Promotores de Justiça, dentro de suas esferas de atribuições: I - impetrar habeas-corpus e mandado de segurança e requerer correição parcial, inclusive perante os Tribunais locais competentes;”;

c) Leis de organização judiciária e/ou regimentos internos dos tribunais.

5.3.7.2. Cabimento

A correição parcial tem cabimento contra atos (comissivos ou omissivos) eivados de erro ou de abuso que provoquem tumulto processual, sem que haja previsão legal de recurso específico para combatê-los.

Trata-se de recurso residual (ou subsidiário), cujo objetivo é proceder somente à correção doerro de procedimento (error in procedendo).

190 5.3.6. AGRAVO EM EXECUÇÃO

A Lei de Organização Judiciária do Estado da Paraíba, por exemplo, estabelece, em seu art. 286, caput e parágrafos, que cabe correição parcial para sanear erros ou abusos que importem na inversão tumultuária de atos e fórmulas legais, na paralisação injustificada dos feitos ou na prorrogação abusiva de prazos, quando, para o caso, não haja recurso previsto em lei.

Nesse ponto, o Regimento Interno do Tribunal de Justiça da Paraíba, em seu art. 18, §§ 1º e 2º, indica que “ Caberá à parte prejudicada, ou ao órgão do Ministério Público, pedir correição parcial nos seguintes casos: a) nas omissões graves do Juiz, inércia, desídia ou excesso de prazos; b) contra despacho que negue formação ou seguimento do agravo de instrumento ou que receba recurso com efeito diverso dos previstos em lei; c) quando o Juiz inovar no processo, com infração do art. 521, do Código de Processo Civil; c) quando o juiz inovar no processo, com infração do art. 1.012, do Código de Processo Civil. § 1º. Não se dará correição se a medida comportar recurso. § 2º. Para atacar os despachos mencionados nas letras b e c deste artigo, o prazo para pedir correição é de cinco dias, contados da ciência ou publicação do ato”.

A título de exemplificação de decisões judiciais que comportam correição parcial, podemos citar: a) o não envio dos autos do inquérito à autoridade policial para realização de diligências complementares requisitadas pelo Ministério Público, tidas como imprescindíveis à formação da opinio delicti; b) a falta de apreciação da promoção de arquivamento formulado pelo Ministério Público, determinando o juiz o encaminhamento dos autos à autoridade policial para realização de novas diligências; c) a dispensa de testemunha indicada na denúncia, sem desistência do Ministério Público; d) o indeferimento de instauração de incidente de insanidade mental, dentre outras.

5.3.7.3. Prazo

O prazo para interposição do recurso é estabelecido na lei de organização judiciária e/ou no regimentointerno do tribunal respectivo.

Na esfera da Justiça Federal, é de até 05(cinco) dias (art. 6º, inciso I da Lei nº 1.050/66).

5.3.7.4. Legitimidade

Possuem legitimidade para interpor correição parcial o órgão do Ministério Público, o querelante, oréu, seu defensor, e, ainda, oassistente de acusação.

5.3.7.5. Processamento

O procedimento seguirá o rito estabelecido na lei de organização judiciária e no regimento interno dotribunal.

Novamente, como exemplo, trazemos a lume o rito adotado no Regimento Interno do Tribunal de Justiça da Paraíba (arts. 18 a 21) que, basicamente, é o seguido nos demais tribunais. Sinopticamente:

1º Interposição do recurso

A petição recursal será dirigida diretamente ao Presidente do Tribunal a que está sujeito o prolator da decisãoimpugnada, contendo as razões de fatoe de direito do pedido, e instruída com documentos e certidões, inclusive, quando for o caso, a que comprove a tempestividade do pedido.

2º Escolha do relator

A escolha do relator será feita conforme dispuser o regimento interno do tribunal.

3º Inadmissibilidade da correição parcial

O relator poderá inadmitir o pedido: a) se intempestivo ou deficientemente instruído; b) se inepta a petição; c) se o ato impugnado comportar recurso; ou d) se, por outro motivo, for manifestamente incabível a correição.

191

4º Admissibilidade e possibilidade de suspensão liminar do ato

Admitida a correição parcial, o relator poderá deferir liminarmente a medida acauteladora do interesse da parte, ou da exata administração da Justiça, inclusive, suspendendo o feito, se forem relevantes os fundamentos do pedido e se houver possibilidade de prejuízo grave, em caso de retardamento.

5º Pedido de informações ao juiz, se necessário

O Juiz prestará a informação no prazo de até 10(dez) dias, sendo que, em caso de evidente urgência e estando o pedido devidamente instruído, poderá orelator dispensá-las.

6º Retratação pelo juiz

Ao receber o pedido de informações, poderá o magistrado se retratar da decisão impugnada, casoem que a correiçãoficará prejudicada.

7º Parecer do órgão do Ministério Público em 2º Grau

Prestadas as informações, seguem os autos para pronunciamento do órgão do Ministério Públicoem 2º Grau.

8º Sessão de julgamento

O julgamento do pedido correcional dispensa a exposição escrita nos autos, a revisão e a publicação de pauta no órgão oficial, bem como inadmite sustentação ou resposta em plenário.

Julgada a correição, remeter-se-á cópia do acórdão ao Juiz do feito que lhe deu causa.

5.3.7.6. Efeitos

A correição parcial tem efeito devolutivo, em relação à questão processual objeto do recurso.

Em regra, ela não possui efeito suspensivo. Todavia, alguns regimentos internos admitem asuspensão doato ou do despacho impugnado pelorelator, quando o prosseguimento do feito puder causar dano irreparável à(s) parte(s).

5.3.8.

RECURSOS CONSTITUCIONAIS EM MATÉRIA CRIMINAL

5.3.8.1. Recurso Especial e Recurso Extraordinário

5.3.8.1.1. Previsão legal

• Recurso especial: art. 105, inciso III da Constituição Federal e art. 638 do CPP;

• Recurso extraordinário: art. 102, inciso III da Constituição Federal e art. 638 do CPP;

O art. 1.072, inciso IV do Código de Processo Civil, revogou os arts. 26 a 29 da Lei nº 8.038/90.

5.3.8.1.2. Cabimento

(1) Recurso especial

O recurso especial, nos termos do art. 105, inciso III da CF, é cabível nas causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar ou negar vigência a tratado ou lei federal;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

192

(2) Recurso extraordinário

Nos termos do art. 102, inciso III da Carta Magna, o recurso extraordinário terá cabimento nas causas decididas, em única ou última instância, quando a decisãorecorrida:

a) contrariar dispositivo da Constituição Federal; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face dessa Constituição; d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Verifica-se que o recurso extraordinário (RE) e o recurso especial (REsp) não se prestam a analisar matéria de fato, reexaminando a prova, mas, unicamente, questões de direito, isto é, se o acórdão contestado aplicou de forma equivocada qualquer regra de direito.

Nessa linha de raciocínio, tem-se o enunciado da Súmula nº 279 do STF (“Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”) e o da Súmula nº 07 do STJ (“A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”).

É necessário se fazer a distinção entre reexame de prova e valoração da prova.

O reexame da prova é o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, ao passo que a valoração da prova, permitida no recurso especial, diz respeito à atribuição do devido valor jurídico a fato incontroverso, reconhecido na decisão recorrida.

É de destacar, ainda, que o recurso especial se limita a conhecer de acórdãos de Tribunais Regionais Federais ou Tribunais de Justiça dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, enquanto o recurso extraordinário é cabível contra decisão proferida em segunda ou terceira instância.

A decisão recorrida deve ter sido proferida pelo Tribunal de Justiça ou pelo Tribunal Regional Eleitoral em “única ou última instância”. Significa, portanto, que não está sujeita a qualquer recurso ordinário. Caso contrário, o recurso não será admitido, conforme, aliás, indica o verbete da Súmula 207 do STJ: “É inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem”

Além do esgotamento das instâncias ordinárias, exige-se que a matéria objeto de prequestionamento tenha sido examinada no acórdão recorrido.

Entretanto, é suficiente o prequestionamento implícito, bastando que no acórdão conste a questão federal enfrentada, sendo desnecessário mencionar expressamente o dispositivo da lei federal violado.

Igualmente, orecurso especial é inadmitido quando, embora existente divergência entre julgados de tribunais de segunda instância, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se posicione no mesmosentido da decisãorecorrida.

É o que aponta o enunciado da Súmula 83: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”.

No mais, as hipóteses de cabimento do recurso extraordinário e do especial estão bem delineadas nos dispositivos constitucionais referidos no início do item.

Atente-se, ainda, que o manejo do recurso extraordinário exige a demonstração de repercussão geral das questões discutidas no caso, conforme disposição contida no art. 102, § 3º da CF173 , compreendendo-se, nos termos do art. 1.035, § 3º do CPC, que “Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que: I - contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal; [...] III - tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal”.

173 CF, art.102, § 3º. No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.

193

5.3.8.1.3. Prazo

O recurso especial e o recursoextraordinário poderão ser interpostos em até 15 (quinze) dias, contados da intimação da decisão, na forma do art. 1003, caput e § 5º, CPC, haja vista que o art. 1.072, inciso IV do Código de Processo Civil revogou os arts. 26 a 29 da Lei nº 8.038/90.

5.3.8.1.4. Processamento

Como referido no item anterior, o processamento do recurso especial e do recurso extraordinário segue as regras previstas nos arts. 1.029 a 1.044 do CPC.

1º Interposição do recurso

Possuem legitimidade para o recurso o órgão do Ministério Público, o querelante e o réu.

O ofendido, habilitado ou não como assistente de acusação, dispõe de legitimidade supletiva para os recursos extraordinário e especial, nos termos do enunciado da Súmula 210 do STF: “O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos casos dos arts. 584, § 1º e 598 do Código de Processo Penal”.

Entretanto, não poderá recorrer extraordinariamente contra decisão concessiva de habeas corpus, consoante Súmula 208 do STF: “O assistente do Ministério Público não pode recorrer extraordinariamente de decisão concessiva de habeas corpus”.

O recurso será interposto em petição dirigida ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, conforme a competência para o exercício do juízo de admissibilidade no tribunal a quo, nos termos do art. 1.029, caput do CPC, contendo:

a) a exposição do fato e do direito: necessário se faz expor a questão fática e de direito, envolvendo dispositivo constitucional ou lei federal, conforme decidido no acórdão recorrido;

b) a demonstração do cabimento do recurso interposto: é a exposição dos pressupostos (ou requisitos) de admissibilidade recursal;

c) as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão recorrida : os argumentos do recorrente justificando a reforma ou a invalidação do acórdão recorrido, além dopedido propriamente dito. Se esse recurso versar sobre erro de julgamento ( error in iudicando), pede-se, ao tribunal ad quem que acolha a pretensão, para realizar acorreta aplicação do direito, reformando o julgamento do tribunal local. Na hipótesede erro de procedimento (error in procedendo), o pedido deve ser no sentido de que,reconhecida a contrariedade a dispositivo de lei federal ou da Constituição Federal,seja determinada a anulação do acórdão recorrido, ou, do próprio processo, com a consequente devolução dos autos para renovação do feito a partir do ato processual invalidado.

No caso do recurso especial, se ele tiver como fundamento dissídio jurisprudencial (art. 105, inciso III, alínea “c” da CF), o recorrente fará a prova da divergência com “[...] a certidão, cópia ou citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que houver sido publicado o acórdão divergente, ou ainda com a reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores, com indicação da respectiva fonte, devendo-se, em qualquer caso, mencionar as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem oscasosconfrontados”.

O Supremo Tribunal de Justiça e o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio do ministro relator, oportunamente, poderão desconsiderar eventual vício formal do recurso apresentado, desde que tempestivo, ou determinar sua correção, caso não o repute grave (art. 1029, § 3º, CPC).

Porém, não serão admitidos os recursos que, em razão de deficiência da fundamentação, não seja possível a exata compreensão da controvérsia.

194

2º Intimação e apresentação de contrarrazões

Recebida a petição recursal pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões, em até 15 (quinze) dias.

3º Juízo de admissibilidade

Com ou sem as contrarrazões recursais, os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente dotribunalrecorrido, conforme regimentointerno, para,fundamentadamente, exercer juízo de admissibilidade provisório (art. 1.030, CPC), devendo:

(3.1) negar seguimento

a)a recurso extraordinário que discuta questão constitucional na qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral, ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja, em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal, exarado no regime de repercussão geral;

b)a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos;

(3.2)encaminhar o processo ao órgão julgador para realização do juízo de retratação, se o acórdão recorrido divergir do entendimento do Supremo Tribunal Federal ou doSuperior Tribunal de Justiça, exarado, conforme o caso, nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos;

(3.3)sobrestar o recurso que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo, ainda não decidida pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional;

(3.4)selecionar o recurso como representativo de controvérsia constitucional ou infraconstitucional, nos termos do § 6º do art. 1.036 do CPC;

(3.5) admitindo o recurso, remeter o feito ao Supremo Tribunal Federal ou ao SuperiorTribunal de Justiça, desde que:

a) o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão geral ou dejulgamento de recursos repetitivos; b) o recurso tenha sido selecionado como representativo da controvérsia, ou c) otribunal recorridotenha refutado ojuízo de retratação.

5.3.8.1.5. Interposição simultânea dos recursos extraordinário e especial

Admitidos no tribunal a quo o recurso extraordinário e o recurso especial, interpostos conjuntamente, os autos serão remetidos, primeiramente, ao Superior Tribunal de Justiça. Concluído o julgamento do recurso especial, os autos seguirão ao Supremo Tribunal Federal para apreciação do recurso extraordinário, se este não estiver prejudicado. O relator do recurso especial, se considerar prejudicial o recurso extraordinário, em decisão irrecorrível, sobrestará o julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal. Todavia, se o relator do recurso extraordinário, em decisão irrecorrível, rejeitar a prejudicialidade, devolverá os autos ao Superior Tribunal de Justiça para o julgamento do recursoespecial.

No Superior Tribunal de Justiça, se orelator entender que o recurso especial versa sobre questão constitucional, deverá conceder prazo de 15 (quinze) dias para que o recorrente demonstre a existência de repercussão geral e se manifeste sobre a questão constitucional.

195

Cumprida a diligência, o relator remeterá o recurso ao Supremo Tribunal Federal, o qual, em juízo de admissibilidade, poderá devolvê-lo ao Superior Tribunal de Justiça.

O Supremo Tribunal Federal, considerando como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como recurso especial.

Admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial, o Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça julgará o processo, aplicando o direito.

O recurso extraordinário ou o recurso especial, aceito por um fundamento, devolve ao Tribunal Superior o conhecimento dos demais fundamentos para a solução do capítulo impugnado.

O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral.

Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.

O recorrente deverá demonstrar a existência de repercussão geral para apreciação exclusiva do recurso extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal.

Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que:

a) contrarie súmula oujurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal; b) tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal.

O relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versemsobre a questãoe que tramitem no território nacional.

O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de origem, que exclua da decisão de sobrestamento o recurso extraordinário e que não o admita, caso tenhasidointerpostointempestivamente, tendo orecorrente oprazode até 05(cinco) dias para se manifestar sobre esse requerimento.

Caberá agravo interno da decisão que indeferir o requerimento acima, ou que aplicar entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos Negada a repercussão geral, o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos extraordinários sobrestados na origem, e que versem sobre matéria idêntica.

O recurso que tiver a repercussão geral reconhecida deverá ser julgado no prazo de até 01 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.

A súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, a qual será publicada no diário oficial e valerá como acórdão.

5.3.8.1.6. Efeitos

 Devolutivo

O recurso extraordinário e o especial possuem efeito devolutivo no âmbito da matéria impugnada, não sendo possível conhecê-los por outro fundamento (art. 27, § 2º da Lei nº 8.038/90).

196

Nos citados recursos, os Tribunais Superiores realizam tanto o juízo rescindente (cassam ou revogam a decisão anterior), quanto o juízo rescisório (proferem nova decisão de mérito, substituindo a anterior). No entanto, se a decisão recorrida se caracterizar como erro in procedendo, o tribunal deverá realizar apenas o juízo rescindente, anulando a decisão e determinando que se baixem os autos para que outra decisão seja proferida, sob pena de se suprimir um grau de jurisdição.

Como não são Cortes de cassação, cabe tanto ao STF quanto ao STJ aplicar o direito –constitucional e federal, respectivamente, ao fato, julgando o processo. Assim, admitido e provido o recurso, caberá ao STF e ao STJ exercer o juízo de revisão, com a reforma do acórdão do tribunal local. Por outro lado, o recurso especial e o extraordinário podem ser conhecidos, mas improvidos, hipótese em que não será aplicado o direito à espécie, na medida em que já terá o tribunal local aplicado corretamente o direito federal ao caso concreto.

 Suspensivo

De regra, o recurso extraordinário e o recurso especial não possuem efeito suspensivo, porém, excepcionalmente, pode ser atribuído, a cada um deles, efeito suspensivo, à luz do disposto no art. 995 do CPC, que é aplicável, subsidiariamente, ao processo penal, por força do art. 3º do CPP174 Nesse sentido, dispõe o art. art. 995: “Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento dorecurso”.

O pedido de concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário ou a recurso especial poderá ser formulado por requerimento dirigido ao:

a) Tribunal Superior respectivo, no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição, ficando, para julgá-lo, o relator designado para seu exame prevento;

b) relator, se já distribuído o recurso;

c) presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, no período compreendido entre a interposição do recurso e a publicação da decisão de admissão do recurso, assim como no caso de o recurso ter sido sobrestado, nos termos do art. 1.037 do CPC.

 Extensivo

Nos termos do art. 580 do CPP, o recurso extraordinário e o recurso especial poderão ter efeito extensivo, quando a questão de direito constitucional ou federal decidida for comum ao(s) corréu(s).

5.3.8.1.7. Agravo para o Tribunal Superior

Caberá,no prazo deaté15(quinze) dias(art.1003,§5º,CPC), agravo, para ocorrespondente Tribunal Superior, da decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal recorrido que não admite o recurso extraordinário ou o recurso especial, salvo quando essa decisão for fundada na aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos (art. 1.042, caput c/c 1.030, § 1º, todos do CPC).

O agravo será dirigido ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de origem e independedopagamentodecustasedespesaspostais,aplicando-se-lheoregimederepercussão geral e de recursos repetitivos, inclusive quanto à possibilidade de sobrestamento e do juízo de retratação (art. 1.042, § 2º, CPC).

174 CPP, art. 3o: A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

197

Em seguida, será o agravado intimado para oferecer resposta no prazo de até 15 (quinze) dias.

Após o prazo de resposta, não havendo retratação, o agravo será remetido ao tribunal superior competente.

O agravo poderá ser julgado, conforme o caso, conjuntamente com o recurso extraordinário ou com o recurso especial, assegurada, nesse caso, a sustentação oral, observando-se, ainda, o disposto no regimento interno do respectivo Tribunal Superior.

Na hipótese de interposição conjunta dos recursos extraordinário e especial, o agravante deverá interpor um agravo para cada recurso não admitido.

Havendoapenasumagravo,orecursoseráremetidoaotribunalcompetente,e,nahipótese de interposição conjunta, os autos serão primeiramente remetidos ao Superior Tribunal de Justiça.

Concluído o julgamento do agravo pelo Superior Tribunal de Justiça e, se for o caso, do recurso especial, independentemente de pedido, os autos serão encaminhados ao Supremo Tribunal Federal para apreciação do agravo a ele dirigido, salvo se estiver prejudicado diante da decisão do STJ.

5.3.9. AGRAVO INTERNO

Da decisão de inadmissibilidade recursal, proferida com fundamento no art. 1.030, incisos I e III do CPC175 , caberá agravo interno (art. 1.021, CPC), em até 15(quinze) dias (art. 1003, § 5º, CPC).

Na petição de agravo interno, que será dirigida ao relator, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada.

O agravado será intimado para se manifestar sobre orecurso no prazo de até 15 (quinze) dias, ao final do qual, não havendo retratação, o relator o incluirá em pauta, levando-o a julgamento pelo órgão colegiado.

O processamento do recurso se dará consoante determinar o regimento interno do tribunal agravado.

Ao relator é vedado se limitar à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgarimprocedente o agravointerno.

Quando esse agravo for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa.

A interposição de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor da multa supracitada, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento aofinal.

5.3.10.

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA

É o recurso cabível, no âmbito dos Tribunais Superiores, para coibir decisões divergentes entre os seus órgãos fracionários nos recursos especial ou extraordinário, conforme o caso.

175 CPC, art. 1030 [...] I – negar seguimento: a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo TribunalFederal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral; b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos; [...] III – sobrestaro recurso que versar sobre controvérsia de caráter repetitivo ainda não decidida pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de matéria constitucional ou infraconstitucional; [...].

198

5.3.10.1. Previsão legal

Arts. 1.043 e 1.044 do CPC176 .

5.3.10.2. Cabimento

Nos termos do art. 1.043, caput, incisos I e III do CPC, os embargos de divergência serão cabíveis quando o acórdão de órgão fracionário177 , em recurso extraordinário ou em recursoespecial, ainda que unânime, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo:

a) os acórdãos, o embargado e o paradigma, de mérito; b) um acórdão de mérito e um outro que não tenha conhecido do recurso, embora tenha apreciado a controvérsia.

No entanto, é preciso que o acórdão a ser embargado tenha sido proferido no julgamento derecursoextraordinário ou de recurso especial.

E mais: o acórdão a ser utilizado como paradigma deve ter sido proferido pelo mesmo tribunal que proferiu a decisãoa ser embargada.

No âmbito do STJ, também é necessário que o acordão paradigma tenha sido proferido por órgão que ainda tenha competência para o julgamento da matéria, consoante enunciado da Súmula 158: “Não se presta a justificar embargos de divergência o dissídio com acórdão de Turma ou Seção que não mais tenha competência para a matéria neles versada”.

Igualmente, caberão embargos de divergência quando o acórdão paradigma for da mesma Turma que proferiu a decisão embargada, desde que sua composição tenha sofrido alteração em mais da metade de seus membros (art. 1.043, § 3º, CPC).

O STJ, por meio do enunciado da Súmula 316, admite que seja acórdão que, em agravo regimental, decidiurecursoespecial.

No mesmo sentido, sinaliza o STF, ao revogar a Súmula 599, cujo verbete afirmava: “São incabíveis embargos de divergência de decisão de Turma em agravo regimental”.

Tem-se admitido embargos de divergência contra acórdão de embargos declaratórios proferidos em julgamento de recurso extraordinário ou de recurso especial, ou mesmo em agravo regimental que julgue o mérito do referido recurso.

A divergência que autoriza a interposição de embargos de divergência pode se verificar na aplicação do direito material ou do direito processual, podendo ser confrontadas teses jurídicas contidas em julgamentos de recursos ou de ações penais de competência originária.

A prova da divergência será feita pelo recorrente com certidão, cópia ou citação de repositório oficial ou credenciado de jurisprudência, inclusive em mídia eletrônica, onde foi publicado o acórdão divergente, ou com a reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores, indicando a respectiva fonte e mencionando as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados.

5.3.10.3. Prazo

Segue a regra estabelecida no art. 1.003, § 5º do CPC, ou seja, prazo de até 15 (quinze) dias, cujo termo inicial é a intimação do acórdão proferido no recurso extraordinário ou no recurso especial (art. 798, § 5º, CPP).

5.3.10.4. Processamento

O processamento do recurso se dará na forma estabelecida pelo regimento interno do respectivo Tribunal Superior.

176 Aadmissibilidade e processamento dos embargos de divergência seguem as regras previstas nos arts. 1.043 e 1.044 do CPC diante da revogação pelo art. 1072, inciso IV do CPC dos arts. 26 a 29 da Lei nº 8.038/90.

177 Não se aplica a decisões monocráticas do Relator, nem tampouco do Plenário do STF ou Órgão Especial do STJ.

199

 Superior Tribunal de Justiça: arts. 266 e 267 do RISTJ.

» Competência:

a) Corte Especial (art. 266, caput, 2a parte, RISTJ): quando a divergência for entreTurmas de Seções Diversas ou entre a Turma e outra Seção ou com a própria Corte Especial; b) Seção (art. 226, caput, 1a parte, RISTJ): quando a Turma divergir de outra Turmada mesma Seção ou da própria Seção.

 Supremo Tribunal Federal: arts. 330 a 336 do RISTF.

» Competência: Plenário (art. 6º, inciso IV, RISTF).

Observe-se que a interposição de embargos de divergência no Superior Tribunal de Justiça interrompe o prazo para apresentação de recursoextraordinário por qualquer das partes.

Na hipótese de desprovimento do recurso ou se ele nãotiver como consequência alterar a conclusão do julgamento anterior, o recurso extraordinário interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de divergência será processado e julgado, independentemente de ratificação.

5.3.10.5.

Efeitos

• Devolutivo

O efeito devolutivo está limitado ao âmbito da divergência entre o acórdão divergido e o acórdão paradigma.

• Suspensivo

Não possuem efeito suspensivo.

• Regressivo

Não terão efeito regressivo, pois, ainda que o ministro que tenha participado do julgamento do acórdão divergido altere o sentido do voto anteriormente proferido, ele fará essa alteração em julgamento de outro recurso, o que afasta o conceito clássico do efeito regressivo.

• Extensivo

Nos termos do art. 580 do CPP, poderão ter o chamado efeito extensivo em relação a corréu que nãotiver recorrido.

5.4. SÍNTESE DOS PRAZOS RECURSAIS

• Recurso em Sentido Estrito: até 05 (cinco) dias (art. 586, caput, CPP);

• Recurso em Sentido Estrito, na hipótese do art. 581, inciso XIV do CPP: até 20 (vinte)dias (art. 586, parágrafo único, CPP);

• Apelação: até 05 (cinco) dias (art. 593, caput, CPP);

• Apelação no Juizado Especial: até 10 (dez) dias (art. 82 da Lei nº 9.099/95);

• Embargos de declaração no STF: até 05 (cinco) dias (art. 337, § 1º do RISTF);

• Embargos de declaração no STJ: até 02 (dois) dias (art. 263, caput do RISTJ);

• Embargos de declaração no 2º Grau: até 02 (dois) dias (art. 619, CPP);

• Embargos de declaração no 1º Grau: até 02 (dois) dias (art. 382, CPP);

• Embargos de declaração nos Juizados Especiais: até 05 (cinco) dias (art. 83 da Lei nº 9.099/95);

• Carta testemunhável: até 48 (quarenta e oito) horas (art. 640, CPP);

• Embargos infringentes e de nulidade: até10 (dez) dias (art. 609, parágrafo único, CPP);

• Agravo em execução: até 05 (cinco) dias (art. 586, caput, CPP);

200

• Correição parcial: Justiça Federal: até 05(cinco) dias (art. 6º, inciso I da Lei nº 1.050/66); Justiça Estadual: a depender da regulamentação local (Lei de organização judiciária e/ou regimento interno do tribunal respectivo);

• Recurso especial, recurso extraordinário, agravo para o Tribunal Superior, agravo interno e embargos de divergência: até 15 (quinze) dias (art. 1003, § 5º, CPC).

5.5. ENUNCIADOS DE SÚMULAS

5.5.1. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Súmula 208: O assistente do Ministério Público não pode recorrer, extraordinariamente, de decisãoconcessiva de habeas corpus.

Súmula 210: O assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598 do Cód. de Proc. Penal.

Súmula 211: Contra a decisão proferida sobre o agravo no auto do processo, por ocasião do julgamento da apelação, nãose admitem embargos infringentes ou de nulidade.

Súmula 279: Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.

Súmula 281: É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na Justiça de origem, recurso ordinário da decisãoimpugnada.

Súmula 282: É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questãofederal suscitada.

Súmula 283: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.

Súmula 284: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia.

Súmula 285: Não sendo razoável a arguição de inconstitucionalidade, não se conhece do recurso extraordinário fundado na letra c do art. 101, III, da Constituição Federal.

Súmula 286: Não se conhece do recurso extraordinário fundado em divergência jurisprudencial, quandoa orientação do plenário do Supremo Tribunal Federal já se firmou no mesmo sentido da decisãorecorrida.

Súmula 287: Nega-se provimento ao agravo, quando a deficiência na sua fundamentação, ou na do recurso extraordinário, não permitir a exata compreensão da controvérsia.

Súmula 288: Nega-se provimento a agravo para subida de recurso extraordinário, quando faltar no traslado o despacho agravado, a decisão recorrida, a petição de recurso extraordinário ou qualquer peça essencial à compreensão da controvérsia.

Súmula 289: O provimento do agravo por uma das Turmas do Supremo Tribunal Federal ainda que sem ressalva, não prejudica a questão do cabimento do recurso extraordinário.

Súmula 290: Nos embargos da L. 623, de 19.2.49, a prova de divergência far-se-á por certidão, ou mediante indicação do Diário da Justiça ou de repertório de jurisprudência autorizado, que a tenha publicado, com a transcrição do trecho que configure a divergência, mencionadas as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados.

Súmula 291: No recurso extraordinário pela letra d do art. 101, n. III, da Constituição, a prova do dissídio jurisprudencial far-se-á por certidão, ou mediante indicação do Diário da Justiça ou de repertório de jurisprudência autorizado, com a transcrição do trecho que configure a divergência, mencionadas as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados.

Súmula 292: Interposto o recurso extraordinário por mais de um dos fundamentos indicados no art. 101, n. III, da Constituição, a admissão apenas por um deles não prejudica o seu conhecimento por qualquer dos outros.

201

Súmula 293: São inadmissíveis embargos infringentes contra decisão em matéria constitucional submetida ao plenário dos Tribunais.

Súmula 294: São inadmissíveis embargos infringentes contra decisão do Supremo Tribunal Federal em mandado de segurança.

Súmula 295: São inadmissíveis embargos infringentes contra decisão unânime do Supremo Tribunal Federal em ação rescisória.

Súmula 296: São inadmissíveis embargos infringentes sobre matéria não ventilada, pela Turma, nojulgamento do recursoextraordinário.

Súmula 299: O recurso ordinário e o extraordinário interpostos no mesmo processo de mandado de segurança, ou de habeas corpus, serão julgados conjuntamente pelo Tribunal Pleno.

Súmula 319: O prazo do recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal, em habeas corpus ou mandado de segurança, é de cinco dias.

Súmula 320: A apelação despachada pelo juiz no prazo legal não fica prejudicada pela demora dajuntada, por culpa do cartório.

Súmula 322: Não terá seguimento pedido ou recurso dirigido ao Supremo Tribunal Federal, quando manifestamente incabível, ou apresentado fora do prazo, ou quando for evidente a incompetência do Tribunal.

Súmula 344: Sentença de primeira instância concessiva de habeas corpus, em caso de crime praticado em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, está sujeita a recurso ex officio.

Súmula 354: Em caso de embargos infringentes parciais, é definitiva a parte da decisão embargada em que não houve divergência na votação.

Súmula 355: Em caso de embargos infringentes parciais, é tardio o recurso extraordinário interposto após ojulgamentodosembargos, quantoà parte da decisãoembargada que nãofora por eles abrangida.

Súmula 356: O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar orequisito do prequestionamento.

Súmula 369: Julgados do mesmo Tribunal não servem para fundamentar o recurso extraordinário por divergência jurisprudencial.

Súmula 392: O prazo para recorrer de acórdão concessivo de segurança conta-se da publicação oficialdesuasconclusões,e nãodaanteriorciênciaàautoridade paracumprimento dadecisão.

Súmula 393: Para requerer revisão criminal, o condenado não é obrigado a recolher-se à prisão.

Súmula 395: Não se conhece de recurso de habeas corpus cujo objeto seja resolver sobre o ônus das custas, por não estar mais em causa a liberdade de locomoção.

Súmula 399: Não cabe recurso extraordinário, por violação de lei federal, quando a ofensa alegada for a regimento de tribunal.

Súmula 400: Decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra a do art. 101, III, da C.F.

Súmula 423: Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege.

Súmula 425: O agravo despachado no prazo legal não fica prejudicado pela demora da juntada, por culpa do cartório; nem o agravo entregue em cartório no prazo legal, embora despachado tardiamente.

Súmula 427: A falta de petição de interposição não prejudica o agravo no auto do processo tomado por termo.

Súmula 428: Não fica prejudicada a apelação entregue em cartório no prazo legal, embora despachada tardiamente.

Súmula 431: É nulo o julgamento de recurso criminal, na segunda instância, sem prévia intimação, ou publicação da pauta, salvo em habeas corpus.

Súmula 432: Não cabe recurso extraordinário com fundamento no art. 101, III, d, da Constituição Federal, quando a divergência alegada for entre decisões da Justiça do Trabalho.

202

Súmula 448: O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após otranscurso do prazo do Ministério Público.

Súmula 602: Nas causas criminais, o prazo de interposição de Recurso Extraordinário é de 10 (dez) dias.

Súmula 690: Compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal o julgamento de habeas corpus contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais.

Súmula 691: Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.

Súmula 692: Não se conhece de habeas corpus contra omissão de relator de extradição, se fundado em fato ou direito estrangeiro cuja prova não constava dos autos, nem foi ele provocado arespeito.

Súmula 693: Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processoemcurso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada.

Súmula 694: Não cabe habeas corpus contra a imposição da pena de exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública.

Súmula 695: Não cabe habeas corpus quando já extinta a pena privativa de liberdade.

Súmula 699: O prazo para interposição de agravo, em processo penal, é de cinco dias, de acordo com a Lei 8.038/90, não se aplicando o disposto a respeito nas alterações da Lei 8.950/94 ao Código de Processo Civil.

Súmula 700: É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal.

Súmula 701: No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo.

Súmula 705: A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, nãoimpede oconhecimento da apelação por este interposta.

Súmula 707: Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões aorecursointerposto da rejeição da denúncia, nãoa suprindo a nomeação de defensor dativo.

Súmula 708: É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro.

Súmula 709: Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela.

Súmula 713: O efeito devolutivo da apelação contra decisões do Júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição.

Súmula 727: Não pode o magistrado deixar de encaminhar ao Supremo Tribunal Federal o agravo de instrumento interposto da decisão que nãoadmite recurso extraordinário, ainda que referente a causa instaurada no âmbito dos juizados especiais.

5.5.2. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Súmula 09: A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência.

Súmula 13: A divergência entre julgados do mesmo Tribunal não enseja recurso especial.

Súmula 41: O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar, originariamente, mandado de segurança contra ato de outros tribunais ou dos respectivos órgãos.

Súmula 83: Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.

Súmula 99: O Ministério Público tem legitimidade para recorrer no processo em que oficiou como fiscal da lei, ainda que não haja recurso da parte.

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Súmula 115: Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos.

Súmula 116: A Fazenda Pública e o Ministério Público têm prazo em dobro para interpor agravo regimental no Superior Tribunal de Justiça.

Súmula 123: A decisão que admite, ou não, o recurso especial deve ser fundamentada, com o exame dos seus pressupostos gerais e constitucionais.

Súmula 126: É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário.

Súmula 158: Não se presta a justificar embargos de divergência o dissídio com acórdão de Turma ou Seção que não mais tenha competência para a matéria neles versada.

Súmula 168: Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado.

Súmula 267: A interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão.

Súmula 315: Não cabem embargos de divergência no âmbito do agravo de instrumento que não admite recursoespecial.

Súmula 316: Cabem embargos de divergência contra acórdão que, em agravo regimental, decide recursoespecial.

Súmula 320: A questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento.

Súmula 347: O conhecimento de recurso de apelação do réu independe de sua prisão.

Súmula 376: Compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato dejuizadoespecial.

Súmula 390: Nas decisões por maioria, em reexame necessário, não se admitem embargos infringentes.

Súmula 518: Para fins do art. 105, III, a, da Constituição Federal, não é cabível recurso especial fundadoemalegada violação de enunciado de súmula.

Súmula 568: O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca dotema.

Súmula 579: Não é necessário ratificar o recurso especial interposto na pendência do julgamento dos embargos de declaração, quando inalterado oresultado anterior.

Súmula 604: O mandado de segurança não se presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério Público.

Súmula 628: A teoria da encampação é aplicada no mandado de segurança quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; b) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas; e c) ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal.

204
206

Ações Autônomas de Impugnação 6

Inobstante o habeas corpus e a revisão criminal estarem inseridos no Código de Processo Penal em capítulo que trata dos recursos em geral, eles constituem verdadeiras ações autônomas de impugnação, originando um processoautônomo.

6.1. HABEAS CORPUS

6.1.1.

NATUREZA JURÍDICA

Trata-se de ação autônoma de impugnação, com previsão constitucional, destinada à tutela da liberdade de locomoção (direito de ir, vir e ficar) ilegalmente ameaçada ou violada.

O habeas corpus, se for julgado procedente, poderá gerar tutela declaratória (ex: quando declara extinta a punibilidade), constitutiva (ex.: ao anular o processo) ou mandamental (ex.: ordenar a liberdade do paciente).

O art. 5º, inciso LXVIII da CF prevê: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.

De outro modo, será cabível a concessão de habeas corpus coletivo sempre que a ameaça ou a violação ao direito de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, atingir uma coletividade de pessoas.

Nesse sentido, dispõe o art. 647-A do Código de Processo Penal, incluído pela Lei nº 14.836/2024: “No âmbito de sua competência jurisdicional, qualquer autoridade judicial poderáexpedir de ofício ordem de habeas corpus, individual ou coletivo, quando, no curso de qualquerprocesso judicial, verificar que, por violação ao ordenamento jurídico, alguém sofre ou se acha ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção”.

6.1.2. PREVISÃO LEGAL

Art. 5º, inciso LXVIII da CF e arts. 647 a 667 doCPP.

6.1.3. CLASSIFICAÇÃO

Classifica-se o habeas corpus em:

a) preventivo: quando o paciente está ameaçado de sofrer restrição ilegal em sua liberdade de locomoção, evitando, assim, a prática da violência ou de coação iminente, mediante expedição de ordem de salvo-conduto. Admitido, ainda, em caso de nulidadeprocessual, uma vez que a ação penal poderá levar, futuramente, a uma condenação àpena privativa deliberdade ilegal;

b) repressivo (ou liberatório): cabível na hipótese em que a lesão à liberdade de locomoçãoé atual. A sua concessão faz cessar a violência ou a coação já efetivada, por meio da imediata expedição de alvará de soltura em favor do sujeito ilegalmente preso ou documento aptoa suspender eventual medida cautelar de caráter pessoal aplicada.

207

Tratando-se de habeas corpus preventivo, inobstante o contido no art. 660, § 4º do CPP178, nem sempre haverá necessidade de salvo conduto, bastando que se recolha o mandado de prisão eventualmente expedido ou que se comunique ao juízo a retirada da eficácia dos atos processuais ou ofim do processo.

6.1.4. CONDIÇÕES DA AÇÃO

6.1.4.1. Legitimidade

Qualquer pessoa, física ou jurídica, nacional ou estrangeira, tem legitimidade ad causam ativa para impetrar habeas corpus, que, inclusive, poderá ser concedido de ofício pelo juiz ou tribunal, quando, no curso de processo, for verificado que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coaçãoilegal (art. 654, § 2º do CPP).

São sujeitos no habeas corpus:

a) impetrante: quem impetra o habeas corpus;

b) paciente: titular do direito à liberdade de locomoção;

c) coator: agente responsável pelo ato de restrição ou ameaça ao direito de locomoção; d) detentor: aquele que, por ordem do coator, mantém o paciente preso ou detido.

Quando as figuras do impetrante e do paciente não coincidem, o primeiro age como substituto processual deste último, pois estará defendendo, em nome próprio, direito alheio.

O órgão do Ministério Público, também, na condição de substituto processual, poderá impetrar habeas corpus no exercício de sua função, desde que favorável ao paciente, sob pena de desnaturar a destinação própria do instrumento processual, que é garantir a liberdade de locomoção do cidadão179

O paciente, quando não for o impetrante, poderá intervir no feito como litisconsorte ativo

A posição jurisprudencial se inclina pela impossibilidade de a pessoa jurídica ser paciente em habeas corpus, por lhe faltar o atributo da liberdade de locomoção, exclusivo de pessoa física.

O legitimado ad causam passivo (coator ou impetrado) pode ser autoridade pública, órgão colegiado ou o particular.

Por fim, o detentor é a pessoa que tem a guarda física do paciente preso, que, por vezes, poderá se confundir com a própria figura do coator. Todavia, a legitimidade passiva no habeas corpus é determinada por aquele que detém o controle da restrição ao direito à liberdade de locomoção do paciente e nãoapenas executa a ordememanada pelocoator.

6.1.4.2. Possibilidade jurídica do pedido

O pedido deve apresentar como fundamento a situação de alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder(art. 5º,inciso LXVIII da CF).

Com o advento da Lei nº 12.403/2011, o uso do habeas corpus, para atacar ilegalidade referente às medidas cautelares diversas da prisão, por se reconhecer restrição ao direito de locomoção, passoua ser cabível.

Admite-se, também, o seu manejo para impugnar decisão de quebra de sigilo bancário, fiscal, de dados ou telefônico que contenha ilegalidade, porquanto, de forma mediata, poderá representar risco para a liberdade de locomoção do indivíduo, posto que a documentação que vier a ser obtida com a diligência poderá servir de base para um pedido de prisão preventiva ou para uma sentença condenatória.

178 Art. 660. § 4º Se a ordem de habeas corpus for concedida para evitar ameaça de violência ou coação ilegal, dar-se-á ao paciente salvo-conduto assinado pelo juiz.

179 STF, 1ª T. HC 72046/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em25/04/1995, publ. no DJ 09/06/1995.

208

6.1.4.3.Interesse de agir

O interesse de agir surge a partir do momento em que, concretamente, houver restrição ou ameaça de restrição ao direito de locomoção de um indivíduo, em razão de abuso de poder ou de conduta revestida de ilicitude por parte doagente apontado como coator.

No entanto, se, durante a tramitação do habeas corpus, cessar a violência ou coação ilegal, o juiz ou Tribunal deverá julgar prejudicado o pedido, determinando a extinção do processo sema apreciação do mérito, diante do desaparecimento superveniente dointeresse de agir, nos moldes doart. 659 do CPP.

6.1.5. CABIMENTO

Como já visto, caberá o habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (art. 5º, inciso LXVIII da CF).

O art. 648 do CPP descreve circunstâncias configuradoras de constrangimento ilegal à liberdade de locomoção a ser combatida por habeas corpus:

a) a ausência de justa causa (art. 648, inciso I, CPP)

Exige-se suporte fático e jurídico mínimo para justificar a imposição de medida cautelar de ordem pessoal ou deflagração de persecução penal contra o indivíduo. Logo, a contrario sensu, a ausência de justa causa, consubstanciada na inexistência de lastro probatório mínimo (justa causa formal) ou flagrante ilegalidade da persecução penal (justa causa material), importa em constrangimento ou coaçãoilegal;

b) o excesso de prazo da prisão (art. 648, inciso II, CPP)

Compreenderá a manutenção do indivíduo preso (provisoriamente ou em cumprimento de pena) por mais tempo do que a lei determina.

c) a incompetência de quem ordenou a coação (art.648, inciso III, CPP)

Qualquer medida que importe em restrição à liberdade de locomoção somente poderá ser determinada pela autoridade judiciária competente, sob pena de ser considerada constrangimento ilegal. É o que se depreende da exegese do art. 5º, incisos XXXVII, LIII, LXI, LXII, LXV e LXVI, da Carta Magna180 .

d) a cessação do motivo que autorizou a coação (art. 648, inciso IV, CPP)

A decretação da prisão exige o preenchimento de pressupostos autorizativos da medida cerceadora da liberdade. Logo, desaparecidos tais motivos, deve a medida ser revogada, sob pena de constituir coaçãoilegal.

e) a não admissão da concessão de liberdade provisória com fiança, quando cabível (art. 648, inciso V, CPP)

O art. 5º, inciso LXVI, da Constituição Federal, expressa que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória com ou sem fiança”.

Logo, havendo negativa de concessão de liberdade provisória com fiança, quando cabível181 , a manutenção da prisão constituirá constrangimento ilegal à liberdade de locomoção.

180 Art. 5º [...] XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; [...] LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela au- toridade competente; [...] LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei; LXII - a prisão de qual- quer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juizcompetente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada; [...] LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança

181 As infrações penais que admitem liberdade provisória mediante fiança são todas aquelas não referidas nos arts. 323 e 324 do CPP. É que a legislação processual penal somente menciona nos dispositivos supra as hipóteses de inafiançabilidade.

209

Sob tal fundamentação estão também incluídas as hipóteses de cabimento de qualquer das modalidades de liberdade provisória do art. 310 do CPP.

f) o processo manifestadamente nulo (art.648,inciso VI, CPP)

O habeas corpus é instrumento apto a ver reconhecida nulidade processual (art. 564, CPP), e, em sendo nulidade absoluta, cassar sentença condenatória ou absolutória imprópria, se já transitada em julgado, ou provocar a nulidade do processo, parcial ou total, caso a ação penal esteja em tramitação.

Porém, é necessário que o vício processual insanável seja manifesto, isto é, que possa ser demonstrado sem que gere dúvidas acerca da sua ocorrência.

g) quando extinta a punibilidade (art. 648,inciso VII, CPP)

Constatando o juiz a extinção de punibilidade do agente, deverá reconhecê-la de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública, ou mediante provocação do interessado. Se não o declarar, transforma-se em autoridade coatora, dando ensejo à possibilidade de impetração de HC perante o Tribunal competente, com a finalidade de trancar a investigação preliminar ou a ação penal em curso.

6.1.6. COMPETÊNCIA

Para fixação da competência para o processamento e o julgamento do habeas corpus, são levados em consideração o grau de hierarquia e a territorialidade.

No tocante ao grau de hierarquia, expressa o art. 650, § 1º do CPP: “A competência do juiz cessará sempre que a violência ou coação provier de autoridade judiciária de igual ou superior jurisdição”.

Quanto à territorialidade, a competência será determinada pelo local em que ocorreu o fato, aplicando-se, por analogia, o disposto no art. 70, caput do CPP, e, se ali houver mais de um juiz competente, ela será firmada pela distribuição (art. 75, CPP).

Por outro lado, não se admitea impetração de habeas corpusper saltum, isto é, a impetração do instrumento constitucional perante a instância superior, sem que a instância inferior, juízo natural para a causa, tenha sido provocada a se manifestar sobre o eventual constrangimento ilegal à liberdade de locomoção do paciente, sob pena de se ter a indevida supressão de instância, o que viola o princípio da hierarquia dos graus de jurisdição e da competência, e, ainda, o princípio do duplo grau de jurisdição.

A propósito, vejamos o enunciado da Súmula 691 do STF: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”.

Para estabelecimento do órgão competente para apreciação do habeas corpus, segue o quadro sinóptico abaixo:

a)Supremo Tribunal Federal

• Sendo paciente o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente (art. 102, inciso I, alínea “d”, CF);

• Quando o coator for Tribunal Superior (art. 102, inciso I, alínea “i”, CF);

• Quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal (art. 102, inciso I, alínea “i”, CF);

• Quando se tratar de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única instância (art. 102, inciso I, alínea “i”, CF);

210

b) Superior Tribunal de Justiça

• Quando o coator ou paciente for Governador de Estado ou do Distrito Federal, desembargador dos Tribunais de Justiça dos Estados ou do Distrito Federal, membro dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Distrito Federal, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais ou do Trabalho, membro dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios ou do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais (art. 105, inciso I, alínea “c”, primeira parte, CF);

• Quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral (art. 105, inciso I, alínea “c”, parte final, CF);

c) Tribunal Regional Federal

• A autoridade coatora for juiz federal (art. 108, inciso I, alínea “d”, CF);

• A autoridade coatora for juiz da Justiça Militar da União ou da Justiça do Trabalho e o ato coator estranho ao desempenho de suas jurisdições (art. 108, inciso I, alínea “a”, CF);

• A autoridade coatora for membro do Ministério Público da União com atuação na 1ª instância (art. 108, inciso I, alínea “a”, CF182);

• Ato de Turma Recursal dos Juizados Especiais Criminais Federais183;

d) Tribunal Regional do Trabalho

• Tratando-se de ato envolvendo matéria sujeita à jurisdição trabalhista, a autoridade coatora for juiz do trabalho (art. 114, inciso IV, CF);

e) Tribunal de Justiça

• A autoridade coatora ou paciente for juiz de direito estadual ou do Distrito Federale Territórios, membro do Ministério Público Estadual, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral (Art. 96, inciso III, CF);

• A autoridade coatora ou paciente for autoridade diretamente sujeita à jurisdição da Corte, consoante previsto na Constituição Estadual;

• Ato de Turma Recursal184;

f) TurmaRecursal

• A autoridade coatora for Juiz do Juizado Especial Criminal;

g) Juízes de 1º Grau

• O coator for o particular ou a autoridade pública que não seja dotada de foro por prerrogativa de função (ex: delegado de polícia).

6.1.7.

PROCESSAMENTO

Oprocessamento do habeas corpus está regulado nos arts. 654 a 667 do CPP, complementado peloregimento interno de cada Tribunal. Sinopticamente:

182 [...] 2. O Ministério Público Militar integra o Ministério Público da União, nos termos do disposto no art. 128, I, c, da Constituição Federal, sendo que compete ao Tribunal Regional Federal processar e julgar os membros do Ministério Público da União (art. 108,I, a, CF). 3. Consoante já decidiu esta Corte, "em matéria de competência para o habeas corpus, o sistema da Constituição Federal - com a única exceção daqueles em que o coator seja Ministro de Estado (CF, arts. 105, I, c, e 102, I, e) -, é o de conferi-la originariamente ao Tribunal a que caiba julgar os crimes da autoridade que a impetração situe como coator ou paciente (CF, arts. 102, I, d; 105, I, c). (RE 141.209, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 20.03.1992). [...]”. (STF, 2ª T., RMS 27872/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, j.em 02/03/2010, DJe 050, divulg. 18/03/2010, publ. 19/03/2010). 183 [...] 3 A competência para julgar habeas corpus impetrado contra ato de integrantes de turmas recursais de juizados especiais é doTribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal, conforme o caso. Precedentes. [...].(STF, 2ª T., ARE 676275 AgR/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 12/06/2012, pub. DJe-150 de 01/08/2012). 184 Idem.

211

1º Petição inicial

A petição inicial, que poderá ser subscrita por qualquer pessoa, independentemente da condição de advogado, devidamente instruída (prova documental pré-constituída), conterá:

a) o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o de quem exercer a violência, coação ou ameaça;

b) a declaração da espécie de constrangimento ou, em caso de simples ameaça de coação,as razões em que funda oseutemor;

c) a assinatura do impetrante, ou de alguém a seu rogo, quando não souber ou não puder escrever, e a designação das respectivas residências.

2º(In)deferimento de medida liminar

Presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, poderá ser concedida eventual medida liminar, independentemente de requerimento do impetrante. A própria legislação autoriza os juízes ou tribunais a concederem ordem de habeas corpus de ofício (art. 654, § 2º, CPP).

Por outro lado, descabe recurso da decisão de indeferimento do pleito de liminar185 , sendo, igualmente, inadmissível novo habeas corpus dirigido ao tribunal superior para buscar reverter tal decisão, sob pena de indevida supressão de instância. É o que preceitua o enunciado da Súmula 691 do STF186, cuja aplicabilidade tem sido, excepcionalmente, mitigada pela própria Corte diante da existência de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia na decisão hostilizada187

Nos tribunais de segunda instância, eventual indeferimento liminar de habeas corpus somente será possível mediante chancela do órgão colegiado, não cabendo a providência monocraticamente ao relator, a teor da exegese do art. 663 do CPP188

Com relação ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, cabível agravo para o Órgão Especial, Seção ou Turma, conforme examinado em item mais adiante.

3º Apresentação do preso, se necessário

Recebida a petição, a autoridade judiciária, se julgar necessário e estiver o paciente preso, mandará que este lhe seja imediatamente apresentado em dia e hora que designar. Em caso de desobediência, ojuiz providenciará para que o paciente sejatirado da prisãoe apresentado em juízo,expedindo-se mandado de prisãocontra odetentor, que será processado na forma dalei.

4º Solicitação de informações

Em seguida, caso necessário, serão solicitadas informações à autoridade apontada como coatora que, ao prestá-las, poderá juntar documentos.

5º Julgamento

Acostadas as informações, decidirá o juiz ou o órgão competente, determinando, se for o caso, a imediata soltura do paciente ou a expedição de salvo-conduto em seu benefício.

A doutrina e a jurisprudência se posicionam pela aplicação do efeito extensivo, previsto no art. 580 do CPP, ao habeas corpus. Assim, a decisão favorável do writ impetrado por um dos

185 [...] A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que não cabe agravo regimental contra a decisão do relator que, em habeas corpus, defere ou indefere a liminar, de forma motivada. [...]. (STJ, 6ª T., RCD no HC 543489 / CE, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. em 10/12/2019, pub. no DJe de 13/12/2019).

186 “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar” (Súmula 691, STF)

187 [...] 1. A teor da Súmula 691/STF, é inadmissível a impetração de habeas corpus contra decisão denegatória de liminar, salvo emhipóteses excepcionais, em que o impetrante demonstre a existência de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia na decisão hostilizada. 2. Inocorrência das hipóteses de excepcional superação do verbete sumular. 3. Agravo regimental desprovido.(HC 171809 Agr HC/ PI – PIAUÍ, Rel. Min. Edson Fachin, j. em 29/11/2019, pub. no DJe-275 de 12/12/2019).

188 CPP, Art. 663. As diligências do artigo anterior não serão ordenadas, se o presidente entender que o habeas corpus deva ser indeferido in limine Nesse caso, levará a petição ao tribunal, câmara ou turma, para que delibere a respeito.

212

acusados, no caso de concurso de agentes, fundando-se em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos demais.

A sentença concessiva de habeas corpus no 1º grau estará sujeita a recurso em sentido estrito (art. 581, inciso X, CPP) e a recurso de ofício (art. 574, inciso I, CPP). Se denegatória, comportará apenas o recurso em sentido estrito (art. 581, inciso X, CPP).

Por sua vez, o habeas corpus decidido

a) em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão, comporta recurso ordinário constitucional para o STF (art. 102, inciso II, alínea “a”, CF);

b) em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios comporta recurso ordinário constitucional para o STJ (art. 105, inciso II, alínea “a”, CF).

Quanto ao procedimento do habeas corpus, observa-se, ainda, que:

• A oitiva prévia do órgão do Ministério Público somente será obrigatória na hipótese de apresentação do writ em 2º grau. No entanto, em 1º grau, deverá ser intimado da decisão para que, querendo, possa dela recorrer (art. 581, inciso X, CPP);

• Se tiver o habeas corpus como objetivo o trancamento da ação penal de iniciativa privada, o querelante tem legitimidade e interesse para intervir no feito189219;

• A concessão do habeas corpus não obstará, nem porá termo ao processo, desde que não esteja em conflito com os fundamentos daquela (art. 651, CPP);

• Se o habeas corpus for concedido em virtude de nulidade do processo, este será renovado (art. 652, CPP), salvo se tiver ocorrido a extinção da punibilidade;

• A ordem de habeas corpus poderá ser concedida de ofício pelo juiz ou pelo tribunal em processo de competência originária ourecursal, ainda que nãoconhecidos a ação ou o recurso em que veiculado o pedido de cessação da coação ilegal (art. 647-A, parágrafo único, CPP)”.

6.1.8. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS

6.1.8.1. Previsão legal

• Art. 102, inciso II, alínea “a” e art. 105, inciso II, alínea “a”, ambos da Constituição Federal;

• Arts. 30 a 32 da Lei nº 8.038/90.

6.1.8.2. Cabimento

No âmbito criminal, o recurso ordinário é cabível contra acórdão denegatório de habeas corpus, emjulgamento originário de tribunal:

a) ao Supremo Tribunal Federal: da decisão denegatória de habeas corpus proferida em única instância pelos Tribunais Superiores (art. 102, inciso II, alínea “a” da CF);

b) ao Superior Tribunal de Justiça: da decisão denegatória de habeas corpus proferida em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais de Justiça dos Estados, do Distrito Federal e Territórios (art. 105, inciso II, alínea “a” da CF).

Por decisão denegatória, entende-se toda aquela que julga o writ improcedente, analisando ou não o seu mérito.

189 ARE 859251 RG/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em16/04/2015, publ. no DJe-94, divulg. em20/05/2015.

213

6.1.8.3. Prazo

O prazo para interposição do recurso ordinário é de até 05 (cinco) dias (art. 30 da Lei nº 8.038/90), sendo seu termo inicial a data da intimação do impetrante acerca do acórdão quedenegou o habeas corpus (art. 798, § 5º, CPP).

6.1.8.4. Processamento

Sinopticamente:

1º Petição recursal

O recurso ordinário deve ser apresentado por petição dirigida ao presidente do Tribunal recorrido ou, de acordo com o regimento interno da Corte, com as razões de reforma da decisãodenegatória do habeas corpus, nos termos do art. 30 da Lei nº 8.038/90.

2º Inadmissibilidade liminar

Por falta de atendimento aos pressupostos recursais, não será o recurso admitido liminarmente.

3º Remessa ao STJ ou STF

Na hipótese de não ser indeferido liminarmente, o recurso seguirá nos próprios autos do HC para o STJ ou para o STF, conforme o caso,

4º Distribuição ao relator

A escolha do relator se dará conforme disposição em regimento interno do Tribunal ad quem.

5º Vista ao órgão do Ministério Público

Distribuído o recurso, a Secretaria do Tribunal Superior, imediatamente, fará vista ao órgão do Ministério Público pelo prazo de até 02(dois) dias (art. 31, caput da Lei nº 8.038/90).

6º Conclusão ao relator

Concluso ao relator, o recurso será submetido a julgamento na sessãoseguinte do órgão competente da Corte, independentemente de pauta.

7º Julgamento

Na sessão de julgamento, será seguido, no que couber, o procedimento do habeas corpus originário (art. 32 da Lei nº 8.038/90).

6.1.8.5. Efeitos

O recurso ordinário terá efeito devolutivo, devolvendo ao Tribunal Superior a matéria quefoi o objeto da sua interposição perante o tribunal de origem.

Não terá efeito suspensivo, continuando o ato inicialmente impugnado pelo habeas corpus para produzir efeito.

Igualmente, não terá efeito regressivo, já que inexiste previsão de juízo de retratação. Por fim, há possibilidade de efeito extensivo ao recurso ordinário, na forma do art. 580 do CPP.

6.2.

REVISÃO CRIMINAL

6.2.1. NATUREZA

JURÍDICA

Trata-se de ação autônoma de impugnação visando à desconstituição de decisões proferidas em ações penais, eivadas de grave erro judiciário, já transitadas em julgado.

214

6.2.4.3. Interesse de agir

O interesse de agir se configura com a existência da coisa julgada, haja vista que a revisão criminal somente poderá ser ajuizada depois do trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria.

Haverá interesse de agir não apenas para restaurar o status dignitatis do condenado, mas, também, diante dos efeitos civis decorrentes da desconstituição da decisão, a exemplo de reparação pelos danos causados pelo erro judiciário.

6.2.5. CABIMENTO

Caberá a revisão criminal quando:

1º A sentença condenatória contrariar o texto expresso da lei penal (art. 621, inciso I,primeira parte, CPP)

Haverá erro na aplicação da lei penal no caso de equívoco na subsunção dos fatos à lei penal. Por exemplo: erro no cálculo da pena, que resulte em sanção mais grave que aquela que legalmente deveria ter sido aplicada; quando a condenação se fundamentar em prova reconhecidamenteilícita.

Para fins de cabimento da revisional, faz-se necessário, entretanto, que a contrariedade seja evidente, não havendo que se invocar a providência por mera divergência de interpretação.

Nesse ponto, conforme o enunciado da Súmula 343 do STF (“Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”), embora referente à ação rescisória, aplica-se o mesmo entendimento à revisão criminal.

Tema palpitante diz respeito à possibilidade de admissão da revisão criminal, quando houver mudança da interpretação jurisprudencial de questão de direito, controvertida à época da sentença rescindenda, para posiçãocontrária pacífica.

Hácorrente doutrinária que defendesuaaceitaçãosoboargumento de que,seépossívela aplicação retroativa de lei benigna, também, interpretando-se, extensivamente, o art. 621, inciso I, do CPP, deveria ser aceita a revisão criminal, com fundamento na mudança de jurisprudência que seja mais favorável aocondenado.

A6a Turma doSuperior Tribunal deJustiça decidiu que: “[...] Segundo posição consolidada da Terceira Seção, é “Cabível o manejo da revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP em situações nas quais se pleiteia a adoção de novo entendimento jurisprudencial mais benigno, desdequeamudançajurisprudencialcorrespondaaumnovoentendimentopacíficoerelevante. Precedente” (RVCR n. 5.627/DF, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, 3a S., DJe 22/10/2021)” (AgRgHC 848.476/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, pub. no DJe de16/05/2024).

Em outro diapasão, prevalece o entendimento doutrinário e jurisprudencial da possibilidade de utilização da revisão criminal nos casos de nulidade processual absoluta, à luz daexegese doart. 626, caput, parte final do CPP.

Assim, muito embora não conste expressamente do art. 621, inciso I do CPP, a decisão judicial proferida em ação penal com insanável vício processual, inegavelmente, contraria texto expresso da lei, podendo, portanto, a revisional ter como fundamento o referido diploma legal. Destarte, julgada procedente, a revisional desconstituirá a decisão condenatória ou absolutóriaimprópria, com aanulação daação penal, apartir daocorrênciado vício reconhecido, retornando o seu curso no juízo de origem, salvo se extinta a punibilidade.

Em observância ao princípio non reformatio in pejus indireta, em caso de nova condenação, a situação do sentenciado, em relação à decisão anulada, não poderá ser agravada (art. 626, parágrafo único, CPP).

215

2º A sentença condenatória contrariar a evidência dos autos (art. 621, inciso I, partefinal, CPP)

Não se trata, aqui, de tentativa de rever decisão condenatória final em virtude da alegação de insuficiência ou precariedade do conjunto probatório, como se houvesse “uma terceira instância de julgamento”, mas, sim, da correção de um claro erro judiciário.

É preciso que a decisão que se pretende rescindir tenha sido proferida frontalmente contrária à prova dos autos, não se tratando, pois, de uma mera reapreciação de tese afastada por ocasião da sentença.

3º A sentença condenatória for fundada em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos (art. 621, inciso II, CPP)

Na ação revisional, não há fase instrutória, devendo a petição inicial vir acompanhada da prova pré-constituída.

Para que o pedido revisional possa prosperar, é necessário que a prova falsa tenha influído decisivamente na condenação, de modo que, se fosse excluída, o sentenciado não teria sido condenado, ainda que diante das demais provas existentes nos autos. Caso contrário, a revisão deverá ser julgada improcedente.

4º Forem descobertas novas provas da inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena (art. 621, inciso III, CPP)

A revisão será cabível quando surgirem novas provas da inocência do acusado.

Não é necessário que tenham surgido posteriormente ao processo, sendo suficiente que a sua existência seja até então desconhecida ou que não tenha sido possível a sua utilização na ação penal.

É de se destacar, ainda, que a prova apta a reavivar a discussão meritória da decisão condenatória deve ser não apenas substancialmente nova, ou seja, inédita no processo, mas, também,terforçasuficiente para demonstrar cabalmente ocometimento de umerrojudiciário, legitimando, desse modo, a desconstituição da coisa julgada, com supressão das provas existentes.

Observe-se que a prova nova que instruirá a revisão criminal deverá ser pré-constituída. Baseada em fonte pessoal (depoimento de testemunha ou da vítima)190 , será produzidaem contraditório judicial pleno, adotando-se, nesse particular, por força do art. 3º do CPP, oprocedimento relativo à produção antecipada de provas, prevista nos arts. 381 a 383 do CPC.

Sob outro aspecto, a prova nova deverá ser analisada em conjunto com as provas já carreadas ao bojo processual, devendo, todavia, mostrar-se decisiva para a alteração do convencimento anteriormente firmado.

Questão controversa diz respeito à utilização da revisional para corrigir a identificação nominal do condenado que se utilizou falsamente da identificação de pessoa inocente, passando-se por ela durante todo o processo, tendo, em consequência, constado, na condenação, onomedotitular do documentoe não o do verdadeiro autor do crime.

Nesses casos, tem sido majoritário o entendimento de que a revisão criminal, por não ter como objetivo alterar a classificação da infração, absolver o réu, modificar a pena ou anular o processo, na forma do art. 626, caput do CPP, será incabível, devendo o imbróglio ser

190 [...] 3. A eventual retratação das testemunhas de acusação deve ser feita, necessariamente, por meio do prévio procedimento de justificaçãojudicial, perante oJuízo de primeiro grau, e somente depois deveser ajuizado opedido revisional, não bastando, para tal mister, uma simples declaração com firma reconhecida. [...]. (STJ, 6ªTurma,AgRg-HC 302.652/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. em 17/05/2018, pub. no DJe 01/06/2018; Pág. 1775).

216

solucionado, se estiver certa a identidade física doreal autor do crime, mediante aplicação do art. 259 do CPP191221 , procedendo-se à devida retificação.

6.2.6. ÔNUS DA PROVA

Na ação revisional, o ônus da prova incumbe ao autor, ao qual cabe demonstrar o fato constitutivo de seu direito. Na hipótese, considerando-se que se pretende rescindir sentençatransitada em julgado em que há a certeza do direito de punir do Estado, não se aplica a regrado in dubio pro reo Ao contrário, tem-se o in dubio contra reum, julgando-se improcedente arevisão criminal, no caso de dúvidas sobre o direito do requerente.

Não se perca de vista que a prova deve ser pré-constituída, apresentada com a petição inicial, já que é indevida a realização de audiência de instrução.

6.2.7. COMPETÊNCIA

A competência para processamento e julgamento da revisão criminal observará:

a) Supremo Tribunal Federal, julgados proferidos em:

• ação penal originária (art. 102, inciso I, alínea “j” da CF);

• recurso extraordinário, desde que o fundamento da revisão coincida com a questão federal julgada pelo recurso (art. 263, parágrafo único, RISTF);

b) Superior Tribunal de Justiça, julgados proferidos em:

• ação penal originária (art. 105, inciso I, alínea “e” da CF);

• recurso especial, desde que o fundamento da revisão coincida com a questão federal julgada no recurso(art. 240, RISTJ);

c) Tribunais Regionais Federais, julgados proferidos em:

• ação penal originária (art. 108, inciso I, alínea “b”, CF);

• sede recursal, sempre que o trânsito em julgado ocorra no âmbito do próprio Tribunal ou, ainda que ocorra em Tribunal Superior, sempre que o fundamento da ação revisional não coincidir com a questão versada no recurso extraordinário ou especial (art. 108, incisoI,alínea“b”, CF);

• por juízes federais, com trânsito em julgado no primeiro grau (art. 108, inciso I, alínea “b”, CF);

d) Tribunais de Justiça, julgados proferidos em:

• ação penal originária;

• sede recursal, quando o trânsito em julgado ocorra no âmbito do próprio Tribunal ou, ainda que ocorra em Tribunal Superior, sempre que o fundamento da ação revisional não coincidir com a questão versada no recurso extraordinário ou especial;

• por juízes de direito, com trânsito em julgado no primeiro grau;

e) Turmas Recursais:

• Julgados proferidos pelos juizados especiais criminais.

No tribunal, a definição do órgão com competência para julgar a revisão criminal seguirá o que dispuser oregimentointerno.

6.2.8. PROCESSAMENTO

Sinopticamente:

191 Art. 259. A impossibilidade de identificação do acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos não retardará a ação penal, quando certa a identidade física. Aqualquer tempo, no curso do processo, do julgamento ou da execução da sentença, se for descoberta a sua qualificação, far-seá a retificação, por termo, nos autos, sem prejuízo da validade dos atos precedentes.

217

1º Petição inicial

A petição inicial será instruída com:

a)oinstrumento de mandato, se apresentada por advogado192; b)a certidão de haver passado em julgado a sentença condenatória (art. 625, § 1º, primeiraparte, CPP); e c)as peças necessárias à comprovação dos fatos arguidos.

2º Distribuição a um relator e a um revisor

A exordial será distribuída a um relator e a um revisor, consoante regimento interno da Corte respectiva, devendo funcionar, como relator, o julgador que não tenha pronunciado decisão em qualquer fase do processo (art. 625, caput, CPP).

3º Relator

Escolhido o relator, será a revisional submetida à sua apreciação.

4º Apensamento dos autos originários, se conveniente

O Relator poderá determinar o apensamento dos autos originários, se daí não advier dificuldade à execução normal da sentença (art. 625, § 2º, CPP).

5º Indeferimento liminar

Na hipótese de o relator julgar insuficientemente instruído o pedido e inconveniente ao interesse da justiça que se apensem os autos originais, indeferirá liminarmente o pleito revisional.

(5.1.) Recurso

Da decisão de indeferimento liminar, caberá recurso voluntário ao próprio órgão. Interposto orecursoporpetição,independentemente determo, orelatorapresentará oprocesso em mesa para o julgamento e o relatará, sem tomar parte do julgamento (art. 625, § 4a, CPP).

6º Vista ao órgão do Ministério Público

Se a petição inicial não for indeferida in limine, será aberta vista ao órgão do Ministério Público para que, em até 10(dez) dias, oferte parecer sobre a pretensão.

Antes de determinar a remessa da revisão criminal para apreciação do órgão do Ministério Público, se for o caso, deve o relator se pronunciar sobre eventual pedido de concessão de liminar, analisando se estão presentes (ou não) o fumus boni iuris e o periculum in mora.

Em que pese corrente doutrinária diversa, comungamos com o entendimento de que, na hipótese de pedido cumulativo de indenização por dano pelo erro judiciário, o órgão do Ministério Público, por imposição constitucional (art. 129, inciso IX, CF), nãopoderá defender os interesses patrimoniais doente público correspondente, devendo ser intimado orepresentante legal da União ou do Estado, conforme a origem da decisão rescindenda, para, na qualidade de terceiro interessado, habilitar-se na ação e, querendo, exercer o contraditório.

7º Análise pelo relator e pelo revisor

Após parecer, os autos seguem para exame, sucessivamente, em igual prazo, do relator e, emseguida, do revisor.

8º Julgamento

Ato contínuo, os autos seguirão para sessão de julgamento.

Na forma autorizada pelo art. 626 do CPP, o Tribunal, julgando procedente a revisão criminal, poderá:

192 O art. 623 do CPP, como reconheceu o STF (HC 73.212/SP), outorga capacidade postulatória ao próprio sentenciado, não havendo necessidade de a peça inicial ser subscrita por advogado. Entretanto, a Excelsa Corte, para conciliar a autodefesa com a defesa técnica, decidiu que, ajuizada a revisional diretamente pelo próprio acusado, deve oTribunal nomear profissional da advocacia para assisti-lo tecnicamente durante o procedimento.

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a) alterar a classificação da infração, absolver o réu ou modificar a pena, desconstituindoa sentença rescindenda (juízo rescindente - judicium rescidens) e proferindo decisão substitutiva (juízo rescisório – judicium recisorium); ou

b) exercendo somente o juízo rescindente (judicium rescidens), anular a sentença rescindenda ou o processo que a originou, determinando que o juízo de origem, inexistindo a ocorrência da extinção da punibilidade, prolate nova decisão ou refaçaos atos processuais a partir da nulidade.

Em nenhuma hipótese, contudo, poderá agravar a situação do sentenciado, direta ou indiretamente, em decorrência da aplicabilidade do princípio da proibição da reformatio in pejus.

Provida a revisional e ensejando, em consequência, a absolvição do condenado, serão restabelecidos todos os direitos perdidos com a condenação.

É que a imposição da pena criminal é o efeito principal da condenação, porém, outros efeitos decorrem da sentença condenatória transitada em julgado, por exemplo, inscrição do nome do réu no rol dos culpados, possibilidade de gerar reincidência, dever de indenizar o dano eventualmente causado, perda docargo, função ou mandato, suspensão dos direitos políticos, dentre outros.

Em se tratando de inimputável (art. 26, CP), o Tribunal, se for o caso, imporá a medida de segurançacabível (art. 627, CPP).

O Tribunal deverá comunicar o provimento da revisão ao juiz da condenação que, recebendo a certidão do acórdão que cassar a sentença condenatória, mandará juntá-la aos autos do processo, providenciando o inteiro cumprimento da decisão (art. 629, CPP).

6.2.9.

EFEITOS

Não é aplicável o efeito suspensivo à revisão criminal, sendo-lhe cabível o efeito extensivo, desde que a sua procedência ocorra por fundamento comum aos demais sentenciados, observadas as regras estabelecidas no art. 580 do CPP.

Logo, diante da ausência de efeito suspensivo, o seu ajuizamento não importará em interrupção da execução definitiva da pena.

6.2.10.

DIREITO À INDENIZAÇÃO PELO ERRO JUDICIÁRIO

É possível que o tribunal revisor, se o interessado a tiver requerido expressamente, reconheça-lhe, na própria revisão criminal, o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos com o erro judiciário (art. 630, caput, CPP).

Assim, transitado em julgado o acórdão de procedência da revisional, constitui-se título judicial apto à execução no juízo cível, após prévia liquidação, sendo devida:

a) pela União, se a condenação tiver sido proferida pela Justiça Federal, pela Justiça Militar da União, pela Justiça Eleitoral ou pela Justiça Comum do Distrito Federal e Territórios; ou

b) pelo Estado, caso tenha como origem decisão da Justiça Estadual.

Reconhecido o direito à indenização, caberá ao interessado promover a liquidação correspondente no âmbito cível (art. 630, § 1º, CPP).

Todavia, a indenização não será devida quando o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou de falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova emseu poder, uma vez que ninguém poderá se aproveitar da própria torpeza.

Quanto à vedação imposta pelo art. 630, §2º, alínea “b” do CPP do direito à indenização, se a condenação houver sido resultante de ação penal de iniciativa privada, concordamos com

219

o entendimento doutrinário majoritário, no sentido de que o dispositivo não foi recepcionado pela atual Constituição Federal, a qual, em seu art. 37, § 6º193, expressa a responsabilidade objetiva do Estado pelos danos causados por seus agentes.

In casu, a sentença, independentemente da titularidade da ação, foi proferida pelo Estado que,sedesejar,oportunamente, poderáingressarcomaçãoregressivacontraquemdeumargem aoerrojudiciário.

6.2.11. COISA JULGADA

O acórdão da revisão criminal faz coisa julgada, não sendo possível reiterar o pedido quando houver identidade de processos, ou seja, mesmas partes, mesmo pedido e mesma causa de pedir.

No entanto, nenhum obstáculo há para propositura de nova revisão criminal por fundamento diverso.

Será admitida, ainda, nova revisão criminal, com base na mesma causa de pedir (idêntico fundamento) da revisional anterior, quando fundada em novas provas, a teor da exegese do art. 622, parágrafo único do CPP.

6.3. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JURISDICIONAL PENAL

6.3.1.

NATUREZA JURÍDICA

Trata-se de ação autônoma de impugnação de natureza cível, com status constitucional194 eritosumário especial.

O mandado de segurança, como destaca Lima195, pode ter eficácia

a) mandamental: a decisão é exequível desde logo, sem necessidade de processo de execução. (ex.: decisão que determina o trancamento da ação penal promovida contra pessoa jurídica);

b) cautelar: quando fundada no periculum in mora e no fumus boni iuris (ex.: a fim de se atribuir efeito suspensivo a recurso que não o possua);

c) constitutiva: quando visar à criação, modificação ou extinção de uma determinada situação jurídica (ex.: invalidação de decisão que determina o sequestro de bemimóvel, porque foi demonstrada sua aquisição com recursos lícitos);

d) declaratória: na hipótese em que visar à declaração da existência ou inexistência deuma relação jurídica (ex.: reconhecimento do direito líquido e certo de acesso do advogado aos autos de inquérito policial).

A despeito de ser instituto regulamentado no âmbito civil, é perfeitamente cabível sua utilização para combater ato jurisdicional penal, eivado de ilegalidade ou de abuso de poder.

6.3.2. PREVISÃO LEGAL

Art. 5º, inciso LXIX da CF e Lei nº 12.016/09.

193 CF, art. 37, § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ouculpa.

194 “Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atri- buições do Poder Público;” (art. 5º, inciso LXIX, CF).

195 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal 3. ed. rev., amp. e atual. Salvador: Juspodivm, p. 1808.

220

6.3.3. PRAZO

O prazo máximo para oajuizamento do mandado de segurança, sob pena de decadência, é de 120 (cento e vinte) dias, contados da data em que o interessado tomou ciência do ato impugnado (art. 23 da Lei nº 12.016/2009).

O enunciado da Súmula 632 do STF, aliás, expressa: “É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança”.

6.3.4. LEGITIMIDADE

6.3.4.1. Legitimidade ativa

O legitimado ativo é o titular do direito líquido e certo violado ou ameaçado, podendo ser o órgão do Ministério Público, o querelante, o ofendido, o assistente da acusação, o acusado, o defensor outerceirosinteressados.

Quantoàcapacidadepostulatória,omandadodesegurançasomentepoderáserimpetrado por advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - OAB ou pelo órgão do Ministério Público.

6.3.4.2. Legitimidade passiva

A legitimidade passiva é da autoridade apontada como coatora, isto é, a autoridade que praticou o ato impugnado ou da qual emanou a ordem para a sua prática (art. 6º, § 3º da Lei nº 12.016/09).

Por outro lado, o enunciado da Súmula 701 do STF estabelece: “No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo”, isso porque a parte beneficiada com o ato impugnado deve ser chamada para compor o polo passivo do MS.

Nesse sentido, é o enunciado da Súmula 631 do STF: “Extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário”.

6.3.5.

CABIMENTO

Conceder-se-ámandadodesegurança paraproteger direitolíquidoecerto,nãoamparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público (art. 5º, inciso LXIX, CF).

Nos termos do art. 1º, caput da Lei nº 12.016/09, “Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direitolíquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justoreceio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais foremasfunções que exerça”.

Considera-se como direito líquido e certo aquele que é comprovado de plano, sem necessidade de dilação probatória.

Nos termos do art. 5º da Lei nº 12.016/09, não se admite mandado de segurança quando setratar de:

a) ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentementede caução;

b) decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;

c) decisão judicial transitada em julgado.

221

Nesse contexto, o mandado de segurança para combater ato jurisdicional que contenha manifesta ilegalidade ou abuso de poder é utilizado de maneira residual:

a) quando inexistir previsão legal de recurso para impugná-lo; ou

b) para conferir efeito suspensivo a recurso que não o possui. Nesse caso, interpõe-se simultaneamente o recurso cabível e o mandado de segurança em que se busca a concessão do efeitosuspensivo.

A título de ilustração, são situações usuais que permitem a utilização do mandado de segurança contra ato jurisdicional: a decisão que indefere a habilitação do assistente de acusação (art. 273 do CPP); o trancamento de ação penal promovida contra pessoa jurídica no âmbito dos crimes ambientais; mandado de segurança para conferir efeito suspensivo a agravo emexecução, dentre outros.

6.3.6.

PROCESSAMENTO

Respeitadas as particularidades contidas nos regimentos internos dos respectivos tribunais, em geral, segue-se oritoabaixo.

Sinopticamente:

1º Petição inicial

A petição inicial será apresentada em 02 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeirareproduzidos nasegunda,comaindicaçãodaautoridadetidacomocoatora ea pessoa jurídica que a integra, à qual se achar vinculada ou da qual exerce atribuições.

Quando o documento necessário à prova do alegado se achar em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. Se a autoridade que tiver procedido dessa maneira for a própria coatora, a ordem far-se-á no próprio instrumento da notificação. O escrivão extrairá cópias do documento para juntá-las à segunda via da petição (art. 6º, §§ 1º e 2º, Lei nº 12.016/09).

2º Distribuição ao relator

Consoante determinar o regimento interno do tribunal, distribui-se a petição inicial a umrelator.

3º Recebimento ou rejeição da inicial

Ao ser distribuída, a petição inicial seguirá para apreciação do relator que a rejeitará, por decisão motivada, quando não for o caso de mandado de segurança, faltar-lhe algum dos requisitos legais ou houver decorrido o prazo legal para a impetração.

Da decisão que rejeita a peça inicial, cabe agravo nos termos do art. 10, § 1º da Lei nº 12.016/09.

4º Deliberação sobre eventual medida liminar

Recebida a peça inicial, ojuiz deliberará sobre eventual pedido de concessão de medida liminar,podendo,casoacolhidaapretensão,serdeterminadaasuspensãodoatoquedeumotivo ao writof mandamus,quandohouverfundamentorelevante,equandodoatoimpugnado puder resultar a ineficácia da medida.

Deferida a liminar, os seus efeitos persistirão até a sentença, salvo se for revogada ou cassada.

222

Nos termos do art. 16, parágrafo único da Lei nº 12.016/09, caberá agravo da decisão dorelator que conceder ou denegar medida liminar, dirigido ao órgão competente do tribunal queintegre.

Será decretada a perempção ou a caducidade da medida liminar ex officio ou a requerimento do Ministério Público, quando, concedida, o impetrante criar obstáculo ao normal andamentodo processo ou deixar de promover, por mais de 03 (três) dias úteis, os atos e as diligências quelhe cumprirem.

5º Notificação e informações da autoridade coatora

Emseguida, proceder-se-á à notificação daautoridade apontadacomocoatora na petição inicial, enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de até 10 (dez) dias, preste as informações que entender cabíveis.

Não é uma ordem para prática de ato, mas simples citação.

6º Citação do(s) litisconsorte(s) necessário(s), se cabível

Tratando-sede mandadodesegurançaimpetrado pelaacusação, oacusadodeveráfigurar como litisconsorte passivo necessário e ser obrigatoriamente citado, sob pena de nulidade absoluta, à luz do enunciado da Súmula 701 do STF, a qual dispõe: “No mandado de segurança impetrado peloMinistério Público contra decisão proferida emprocesso penal, éobrigatóriaa citação do réu como litisconsorte passivo”.

O mesmo raciocínio deve ser aplicado em sentido contrário. Ou seja, quando o impetrantefor o acusado, será necessária a citação do órgão do Ministério Público e também do assistente de acusação, se houver.

Sendo a hipótese de impetração de mandado de segurança pelo ofendido contra ato judicial que nãoadmite sua habilitação como assistente de acusação, deverãoas partes da ação penal ser citadas como litisconsortes necessários.

Na ação penal de iniciativa privada, se um ato foi impugnado por meio de mandado de segurança, deverão ser citados, como litisconsortes necessários, tanto a parte adversa quanto o órgão do Ministério Público que atua como interveniente no processo.

7º Contestação pelo(s) litisconsorte(s) necessário(s)

A citação do(s) litisconsorte(s) necessário(s), quando cabível, é obrigatória, mas a apresentação de defesa do ato impugnado é facultativa.

Entretanto, caso opte por oferecê-la, o litisconsorte necessário deverá expor seus contraargumentos fáticos e jurídicos e promover a juntada de documentos que julgar pertinentes.

De fato, trata-se de oportunização aos interessados na decisão da apresentação de contrarrazões ao pedidoinicial.

8º Vista ao órgão do Ministério Público

Prestadas ou não as informações e decorrido o respectivo prazo, os autos serão encaminhados ao órgão do Ministério Público, que emitirá parecer no prazo regimental.

Devolvidos os autos, com ou sem parecer ministerial, o relator, em até 05(cinco) dias, pedirá dia para julgamento.

9º Julgamento

Os processos de mandado de segurança terão prioridade sobre todos os outros, salvo habeas corpus, devendo ser levados a julgamento na primeira sessão que se seguir à data em que forem conclusos ao relator, sendo dela as partes intimadas.

Todavia, o relator está autorizado a julgar monocraticamente o mandado de segurança no:

a) Supremo Tribunal Federal: se a matéria for objeto de jurisprudência consolidada doSTF (art. 205, RISTF);

223

b) Superior Tribunal de Justiça: quando a matéria for objeto de jurisprudência consolidada do STF ou do STJ (art. 214, parágrafo único, RISTJ).

Durante a sessão de julgamento do órgão colegiado, será facultada às partes a sustentação oral (art. 16, caput, Lei nº 12.016/2009).

Do acórdão proferido

a) por Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal, caso denegatória a decisão, caberá recurso ordinário constitucional para o Superior Tribunal de Justiça (art. 105, inciso II, alínea “b”, CF). Já a decisão concessiva permitirá a interposição de recurso especial (art. 105, inciso III da CF) e/ou de recurso extraordinário (art. 102, inciso II da CF);

b) pelos Tribunais Superiores, à exceção do STF, caso denegatória a decisão, comportará recurso ordinário constitucional para o STF (art. 102, inciso II, alínea “a” da CF).

Concessiva, permitirá apenas o recurso extraordinário para o STF;

c) pelo STF, incabível recurso, salvo as vias impugnativas internas.

6.3.7. COMPETÊNCIA

A competência para processar e julgar, originariamente, o mandado de segurança contra ato jurisdicional, em matéria criminal, segue o critério da hierarquia funcional da autoridade coatora e sua sede funcional, senão vejamos:

a) Supremo Tribunal Federal: atos do próprio Supremo Tribunal Federal (art. 102, inciso I, alínea “d”, CF);

b) Superior Tribunal de Justiça: atos do próprio Tribunal (art. 105, inciso I, alínea “b”, CF);

c) Tribunal Regional Federal: atos do próprio Tribunal ou de juiz federal (art. 108, incisoI, alínea “c”, CF);

d) Tribunal de Justiça: atos do próprio Tribunal ou de juízes de direito, exceto juiz de direito do Juizado Especial;

e) Turma Recursal: atos de juiz do Juizado Especial Criminal.

Para informação ao leitor, muito embora a autoridade apontada como coatora não pratique ato jurisdicional, compete,

a) ao juiz de direito ou ao juiz federal, julgar mandado de segurança impetrado em 1º grau, quando a autoridade coatora estiver sujeita à sua jurisdição (ex: delegado de polícia civil ou federal, respectivamente);

b) quanto aos membros do Ministério Público, consoante entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritário, com exceção de atos do Procurador-Geral da República, sujeitos ao STF por previsão constitucional (art. 102, inciso I, alínea ‘d”, CF), o processamento e o julgamento de MS contra atos por aqueles praticados, diante da ausência de previsão na Constituição Federal e na legislação federal infraconstitucional, dependerão do que estabelecer as Constituições Estaduais e as normas de organização judiciária. Inexistindo, também, nessas normas qualquer previsão sobre a matéria em foco, a competência será do juízo a quo no qual exercem a função pública que os levoua exarar o atoimpugnado.

Registre-se que, no processo de mandado de segurança, descabe a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, admitindose, porém, a aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé, tudo na forma prevista no art. 25 da Lei nº 12.016/09.

224

6.3.8.1. Previsão legal

• Art. 102, inciso II, alínea “a” e art. 105, inciso II, alínea “b”, ambos da Constituição Federal;

• Arts. 33 a 35 da Lei nº 8.038/90.

6.3.8.2. Cabimento

No âmbito criminal, caberá recurso ordinário para o

a) Supremo Tribunal Federal: da decisão denegatória de mandado de segurança proferidaem única instância pelos Tribunais Superiores (art. 102, inciso II, alínea “a” da CF);

b) Superior Tribunal de Justiça: da decisão denegatória de mandado de segurança, proferida em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais de Justiça dos Estados, do Distrito Federal e Territórios (art. 105, inciso II, alínea“b” da CF).

Por decisão denegatória, entende-se toda aquela que julga o writ improcedente, analisando ou não oseu mérito.

6.3.8.3. Prazo

O prazo para interposição do recurso ordinário em mandado de segurança é de até 15 (quinze) dias (art. 1.003, § 5º do CPC e art. 33 da Lei nº 8.038/90), sendo oseutermo inicial a data daintimação doimpetrante acerca doacórdão que denegou o mandadode segurança (art. 798, § 5º, CPP).

6.3.8.4. Processamento

Serão aplicadas, subsidiariamente, quanto aos requisitos de admissibilidade e ao procedimento no tribunal recorrido, as regras do Código de Processo Civil relativas à apelação (art. 34 da Lei nº 8.038/90).

O recurso ordinário deve ser apresentado pelo impetrante do writ, por petição dirigida ao presidente ou ao vice-presidente do Tribunal de origem, de acordo com o regimento interno da Corte, com as razões do pedido de reforma da decisão, nos termos do art. 1.028, § 2º do CPC.

Em seguida, será o recorrido intimado para, em até 15(quinze) dias, apresentar as contrarrazões (art. 1.028, § 2º, CPC).

Findo o prazo, com ou sem apresentação de contrarrazões, os autos serão remetidos ao respectivo Tribunal Superior, independentemente de juízo de admissibilidade no tribunal recorrido(art. 1.028, § 3º do CPC).

Distribuído o recurso, a Secretaria do Tribunal Superior, imediatamente, fará vista dos autos ao órgão do Ministério Público Federal para pronunciamento em até 05 (cinco) dias (art. 35, caput da Lei nº 8.038/90).

Conclusos os autos ao relator, este pedirá dia para julgamento.

6.3.8.5. Efeitos

O recurso ordinário terá efeito devolutivo, isto é, devolve ao Tribunal Superior a matéria que foi o objeto da sua impetração perante o Tribunal de origem.

Esse recurso não terá efeito suspensivo, o que significa que o ato inicialmente impugnado pelo mandado de segurança continuará a produzir seus efeitos.

Igualmente, não terá efeito regressivo, já que inexiste previsão de juízo de retratação.

Há possibilidade de efeito extensivo ao recurso ordinário, na forma do art. 580 do CPP, beneficiando os demais pacientes ou corréus.

225
EM MANDADO DE SEGURANÇA
6.3.8. RECURSO ORDINÁRIO

6.4.1.

NATUREZA JURÍDICA

A reclamação possui natureza jurídica de ação de conhecimento originária dos tribunais.

6.4.2.

PREVISÃO LEGAL

Arts. 102, inciso I, alínea “l”, 103A, § 3º, 105, inciso I, alínea “f” da Constituição Federal e arts. 988 a 993 do CPC196

6.4.3.

HIPÓTESES DE CABIMENTO

Nos termos do art. 988 do CPC, a reclamação será cabível para:

a) preservar a competência do tribunal;

b) garantir a autoridade das decisões do tribunal;

c) garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado de constitucionalidade;

d) garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resoluçãode demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.

Sob outro aspecto, na forma prevista no art. 988, § 5º do CPC, é inadmissível a reclamação proposta:

a) após o trânsito em julgado da decisão reclamada;

b) para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias.

A reclamação também não pode ser utilizada como sucedâneo recursal, assim como quando o ato reclamado for anterior ao provimento com efeito geral e vinculante.

6.4.4.

MOMENTO PARA APRESENTAÇÃO

Areclamação poderá ser apresentada a qualquer tempo.

6.4.5.

PROCESSAMENTO

O processamento da reclamação se dará perante qualquer tribunal, na forma do seu regimento interno, respeitadas as disposições contidas nos arts. 998 a 993 do CPC, competindo seu julgamento ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretende garantir (art. 988, § 1º, CPC).

De pronto, atente-se que, quando o ato questionado tiver sido produzido em processo ou procedimento de natureza penal, os prazos previstos para o procedimento da reclamação, embora dispostos no Código de Processo Civil, terão sua contagem efetivada de acordo com o art. 798 do CPP.

A reclamação pode ser apresentada pela parte interessada ou pelo órgão do MinistérioPúblico, obedecendo ao seguinte fluxo, sinopticamente:

226 6.4.
RECLAMAÇÃO
196 O atual CPC revogou as disposições contidas nos arts. 13 a 18 da Lei nº 8.038/90.

1º Petição inicial

A petição será dirigida à presidência do tribunal e devidamente instruída com a prova documental que a fundamente.

2º Distribuição ao relator

A petição, após autuada, será distribuída ao relator do processo principal, se possível.

3º Despacho do relator, fase de informações e contestação

O relator, na forma do art. 989 do CPC, ao despachar a petição inicial, deverá:

a) requisitar informações da autoridade a quem for imputada a prática do ato impugnado,a qual as prestará no prazo de até 10 (dez) dias;

b) se necessário, ordenar a suspensão do processo ou do ato impugnado para evitar dano irreparável;

c) determinar a citação do beneficiário da decisão impugnada, o qual tem até 15 (quinze)dias para apresentar a sua contestação.

Porém, qualquer pessoa poderá impugnar o pedido do reclamante (art. 990, CPC).

4º Oitiva do órgão do Ministério Público

Depois de decorrido o prazo para as informações e para o oferecimento da contestação pelo beneficiário do atoimpugnado, o órgão do Ministério Público, quando não for o reclamante, terá vista do processo pelo prazo de 05 (cinco) dias.

5º Julgamento

O tribunal, ao julgar a reclamação, se considerar o pedido procedente, cassará a decisão exorbitante de seu julgado ou tomará medida adequada à solução da controvérsia, determinando, o presidente da Corte, o imediato cumprimento da decisão, lavrando-se o acórdão posteriormente (arts. 992 c/c 993, ambos do CPC).

227
228

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