reinvenção do cotidiano

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reinvenção do cotidiano

trabalho final de graduação ­faculdade de arquitetura e urbanismo da universidade de são paulo | FAUUSP junho 2016 luiza santos noia orientação de luís antônio jorge


agradecimentos à Luís Antônio Jorge, pela cuidadosa orientação, me conduzindo neste trabalho com uma sensibilidade e calma inspiradoras. Antônio Carlos Barossi e Silvio Oksman, professores presentes na banca, por aceitarem o convite e ­enriquecerem­­ o debate. Silvio Oksman e Beatriz Vicino, pelas conversas e material do escritório gentilmente cedido. Todos os ex-trabalhadores da antiga An­tarctica que com suas histórias motivaram este trabalho. Em especial João Paulo, Percival, Orlando, Alcides e Luís pelas inúmeras conversas, pelo tempo dedicado em me ajudar, pelo interesse estusiasmado. Abílio, Evani e João, Anibal, Roseani, Odair, Ricardo, Tiago, José e Sverre, tão atenciosos. Meu mais sincero obrigada. FAU, pela reinvenção de mim. Esses anos me trouxeram belíssimas experiências, inúmeras oportunidades e pessoas que me ensinaram de diversas maneiras. Agradeço a todos que fize­ ram parte deste caminho: amigos, colegas, professores e funcionários.

Priscila e Beatriz, por terem me acompa­nhado desde o primeiro dia, ensinando e aprendendo junto. Rodolfo, pela beleza da memória que se reinventa constantemente. Kim, pela cumplicidade tão natural. Martijn, por ter me levado aos projetos que mais me inspiraram. Gabriela, por me trazer alegria aqui e mundo afora. Enzo, pelos sorrisos involuntários que provoca em mim, me motivando, me acalmando. Sempre acreditou, seu ­apoio­foi fundamental nessa reta final. Dimitri, pela fiel companhia, a mais quentinha. Marina, minha metade, meu porto seguro. Aos meus pais, Ênio e Cida, meus maiores orgulhos, a quem dedico todas minhas conquistas.

Dedico este trabalho ao meu avô Davino, em memória, por também ter feito parte da história da Antarctica.


. o. i. ii. iii. iv. v. vi. vii.

índice introdução paisagem em formação: moóca companhia antárctica paulista fábrica de cervejas outras paisagens reinvenção conclusões bibliografia

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o. introdução “Poderia falar de quantos degraus são feitos a rua em forma de escada, da circunferência dos arcos pórticos, de quais lâminas de zinco são recobertos os tetos; mas sei que seria o mesmo que não dizer nada. A cidade não é feita disso, mas das recordações entre as medidas de seu espaço e os acontecimentos do passado. (...) A cidade não conta seu passado, ela o contém.” ÍTALO CALVINO. As cidades invisíveis

Sempre me encantou a mutabilidade da arquitetura no tempo, a percepção de que ao envelhecer, o edifício se transforma e assim nos revela - ou ao menos nos faz imaginar - uma história, e suscita na memória dos que nele viveram diferentes lembranças. Esta é, na verdade, uma das maneiras que mais gosto de explorar a cidade, buscando as narrativas por trás das construções materiais. Afinal de contas, a cidade é uma mistura de histórias de diferentes autores e múltiplas temporali­dades, onde cada geração se apropria de alguns elementos, descarta outros e cria novos, transformando significados. “Toda cidade é, assim, ao mesmo tempo, histórica e contemporânea, uma obra aberta e permanentemente em transformação.” (MAGNANI, 2006, p.65) Partindo desse interesse inicial, cresceu a vontade de trabalhar com espaços de memórias. No bairro da Móoca foi onde encontrei muitas memórias

querendo ser contadas, e muitas pessoas querendo compartilhar suas histórias, pela dimensão afetiva que estabeleceram com o lugar. Estudar a constituição da memória é importante, porque está intimamente ligada à construção da identidade. Para Le Goff (apud BITENCOURT,1997), a memória acaba por estabelecer um “vínculo” entre as gerações humanas e o “tempo histórico que as acompanha”. Esse vínculo, que se torna afetivo, possibilita que essa população passe a se enxergar como “sujeitos da história”, que possuem assim direitos e deveres para com a sua localidade. A Móoca conta parte da história da minha própria família: é onde meu pai e meu avô trabalham há mais de 20 anos, em um dos galpões antigos da Rua Borges de Figueiredo. Não por acaso, a relação com o trabalho é tão presente no bairro. Praticamente não conseguimos falar da Móoca sem falar da indústria e do operário. Um dos palcos do processo de industrialização da cidade de São Paulo, a Mooca ainda hoje contém inúmeros remanescentes desse período, que sofrem constante ameaça por pressão do mercado imobiliário e por falta de políticas efetivas de preservação do patrimônio. A defesa do patrimônio industrial explora as relações entre memória, território, seus habitantes e seu trabalho. Estas são relações que me interessam.

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A antiga fábrica da Companhia Antarctica Paulista foi o local encontrado para aprofundar essas relações. Abandonado desde 2000, o conjunto chama a atenção pelos edifícios em ruínas que se destacam na paisagem. Próxima à estação da Móoca, a antiga fábrica de cervejas reúne inúmeras histórias. Pude entrar em contato com alguns grupos de ex-operários, que mantém laços de amizade e identidade, unidos pelo sentimento de pertencimento àquele lugar até hoje. O processo de conhecer um lugar que nunca vivi veio principalmente dessas conversas com pessoas que passaram grande parte de suas vidas trabalhando na fábrica. No ato de ouvir suas pequenas histórias, surge o exercício de interpretar o existente, e de recriar no imaginário uma atmosfera que ali já existiu. São lembranças individuais, carregadas de julgamentos pessoais, e interpretações subjetivas, mas que revelam diferentes pontos de vista de uma memória coletiva.

“Nos registros e resgates da memória, reconstruímos fatos peculiares e indi-

viduais que nunca podem estar isolados dos fatos sociais que a constituem. É a própria matéria prima para a reconstrução da identidade cultural” (CARTA, 1982). Admitindo a memória como construção do presente (BOSI,1994), os depoimentos se apresentam como instrumento de pesquisa, pois detêmse sobre diferentes temporalidades que subsistem num dado lugar como forma de analisar suas práticas sociais, mesclando campos disciplinares como história, antropologia, sociologia, geografia, entre outros. As narrativas dão conta de transmitir o cotidiano passado, tão importante para a compreensão das dinâmicas existentes em um determinado lugar e tempo. O indivíduo não é tido como centro e foco de análise, mas parte-se do pressuposto de que são as relações sociais que determinam o indivíduo e não o inverso, por isso, só se pode apreendê-lo a partir de suas práticas sociais. Como explica Certeau (2007), de modo analítico e sensível em “A Invenção do Cotidiano”, a individua-

lidade é percebida como o local onde se organizam a pluralidade da vivência social. Nesse sentido, a memória individual dos trabalhadores da antiga fábrica se mostrou instrumento valioso para se pensar numa proposta de intervenção, permitindo olhares particulares e poéticos de um cotidiano passado. É interessantíssimo nas lembranças, o registro do espaço em outros tempos, e o encontro de lembranças a partir do espaço. Se naquele lugar não vivi, pelo menos de algumas memórias posso dizer que agora compartilho. “É preciso reconhecer que muitas de nossas lembranças ou ideias, não são originais: foram inspiradas nas conversas com os outros. Com o correr do tempo, elas passam a ter uma história dentro da gente” (BOSI, 1994. p.407). Das pequenas histórias individuais de seus trabalhadores, compreendi parte da história da fábrica, da história do bairro, e da história da cidade. Visitei a fábrica guiada por essas pessoas, que me fizeram ver com seus olhos.

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i. 8

“A Móoca é um bairro onde os sentidos se afloram, bastando ficar atento aos cheiros que marcam a vida em alguns pontos do espaço comum: cheiro de diesel das locomotivas, de carvão das padarias, do malte e cevada da Cervejaria Antárctica, de fumo, de café torrado. Da mesma maneira para os sons: máquinas das gráficas e tecelagens, dos gritos da torcida no estádio da rua Javari, do trem correndo sobre os trilhos, do apito das fábricas, das pessoas conversando”. (MENEGUELLO et al., 2007) A Móoca é um bairro único na cidade, porque tornou-se um lugar onde as memórias e identidades ganham materialidade. Como explica Bosi, um bairro não se define apenas pelos seus aspectos morfológicos e arquitetônico, mas pela sua biografia. Caminhar pelo Móoca é, além de uma experiência sensorial, uma passagem pela sua história, apreendida nas construções, nos nomes das ruas, nas festas populares, nas comidas típicas, no sotaque de seus moradores. O próprio nome Móoca vem do tupi guarani, dado pelos primeiros habitantes indígenas da região. “Moo” significa “fazer” e “oca” significa “casa”, remetendo às primeiras casas de barro que foram levantadas na região, com a chegada dos brancos. Eram “insignificantes casas de sapê, que à esmo erguiam-se no meio de espessos

paisagem em formação: moóca matagais”. (PINTO, 1900 apud SOUZA, 2010, p.7) Até meados do século XIX, São Paulo se limitava ao triângulo do centro histórico, com características econômicas e sociais meramente rurais. As terras para além do Tamanduateí eram isoladas do centro pelo obstáculo natural do rio, onde apenas as pontes do Carmo e do Fonseca faziam sua transposição. O interesse de ocupação dessas áreas se perdia em meio às constantes inundações das várzeas do rio. É apenas com a chegada do transporte ferroviário em 1867 que o tecido urbano surge efetivamente na região, começando a moldar o bairro que conhecemos nos dias atuais. Vinculada ao desenvolvimento da economia cafeeira, a Estrada de Ferro São Paulo Railway é traçada junto às várzeas dos rios, fazendo a ligação Santos-Jundiaí. As novas estações começam a concentrar atividades urbanas, estabelecendo-se novos eixos de expansão da cidade, agora conhecida como metrópole do café. A estação do Brás é inaugurada em 1867, e a da Móoca em 1898 , atraindo a ocupação da nova indústria, devido não somente à facilidade de transporte, mas também pela topografia regular que possibilitava a construção de grandes complexos industriais e aos baixos preços dos terrenos, numa área ainda sem infraestrutura (ANDRADE:1990). Aos poucos as antigas


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> mapa (1) Mooca, 1890. Fonte: Jules Martin


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< mapa (2) Mooca, 1905. fonte: SMDU


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> mapa (4) Mooca, 1930. fonte: SMDU


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< mapa (4) Mooca, 1955. fonte: SMDU


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> mapa (5) Mooca, 2015. fonte: Google Earth


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chácaras de sapê foram dando lugar a loteamentos para as fábricas e seus operários, e recebendo alguma urbanização. Passando pela atual Rua do Gasômetro, podemos lembrar que por ali ficava a antiga várzea do Carmo, aterrada em 1872 para receber o Gasômetro que deu nome à mesma rua e inaugurou o serviço público de iluminação à gás na região. Avançando para a Rua dos Trilhos, mal nota-se que ali chegou em 1895 o ramal ferroviário que ligava o centro ao Hipódromo. Inaugurado em 1877 e frequentado pela alta elite, o clube de corridas paulistano se estabeleceu ali até 1941, quando foi transferido para o Jockey Club na Cidade Jardim. Apesar de demolido nos anos 1950, a Rua do Hipódromo manteve seu nome (e sua memória). Já na Avenida do Estado, mal vemos mas sentimos o desagradável cheiro do rio Tamanduateí, canalizado em 1893 na tentativa de diminuição das inundações nas várzeas (RUFINONI, 2004). Se hoje considerada dentro dos limites do centro expandido, naquele momento a região permanecia isolada do centro urbano, tanto geograficamente, pela barreira do rio Tamanduateí e da própria ferrovia, quanto socialmente, por abrigarem a população trabalhadora mais pobre e marcada pela diversidade étnica, já que a maioria eram imigrantes. De origem ita-

liana no geral, os imigrantes vinham para a cidade atraídos por melhores condições de vida, com subsídio do governo brasileiro, e se estabeleciam nos bairros operários, principalmente Brás e Móoca, devido à localização das fábricas e da Hospedaria do Imigrante, hoje Museu da Imigração. Além de importantes no crescimento da cidade, esses imigrantes moldaram as dinâmicas culturais nesses bairros. Grande parte dos que chegavam na cidade eram artífices, comerciantes ou engenheiros, e além do trabalho na fábrica, iniciaram pequenos comércios, que resultaram nas cantinas e pizzarias que atraem moradores da capital até os dias atuais. Provocaram ainda a influencia na criação de sindicatos e grupos de articulação do operariado, que culminaram com a Greve de 1917, onde o berço da mobilização foi a Móoca e o Brás. A língua, as tradições religiosas e os costumes regionais construíram uma identidade no bairro, que ainda hoje permanece em detalhes: no sotaque mooquense, nas festas de San Gennaro, no cannoli vendido na porta do estádio do Juventus, na Rua Javari. A multiplicação de fábricas nos primeiros anos do século XX foi decisiva para a definição da paisagem nos bairros operários. As construções industriais localizam-se de forma mais densa ao longo da faixa ferroviária, enquanto nas imediações formam as áreas residenciais dos operários. O


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^ inundações na móoca, 1917. fonte: Museu da Cidade rio tamanduateí, 1919, antes de ser canalizado. fonte: Museu da Cidade > rua do hipódromo, 1924. fonte: site Saudades de Sampa corrida no hipódromo, 1924. fonte: site Saudades de Sampa vista aérea da móoca, 1935. A paisagem definida pelas chaminés das fãbricas fonte: site Saudades de Sampa

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tecido urbano do bairro, que se manteve até hoje, tem uma configuração clara: ao longo da linha férrea encontram-se lado a lado conjuntos fabris, numa sucessão contínua, formando extensas quadras, onde o fundo das construções se dá para a ferrovia e o acesso pelas ruas paralelas, como o caso da Rua Borges de Figueiredo e Avenida Presidente Wilson. Nas ruas adjacentes, as quadras são menores, com construções mais baixas, de histórico uso residencial e comercial. Em algumas ruas ainda podemos reconhecer as típicas construções operárias, como algumas construções remanescentes na Rua Cavalheiro Rodolfo Crespi, antiga vila operária do Cotonifício Crespi (MARTINS, 2010) ou na rua Barão de Jaguara, onde encontramos casas populares projetadas por Gregori Warchavchik em 1929. E nesse passeio pela Móoca, fica impossível não reparar no abandono de muitos galpões e antigos edifícios industriais. As fábricas começaram aos poucos a serem desativadas na Mooca, estimuladas pela desvalorização do transporte ferroviário. Na década de 1950 intensificam-se investimentos em políticas voltadas ao rodoviarismo como tentativa de solucionar os problemas de trânsito num centro saturado, onde o planejamento urbano não acompanhou o crescimento da cidade. Com um centro congestionado e uma ferrovia esquecida, o crescimento das indústrias se tornou inviável, com va-

lorização dos terrenos e aumento dos impostos territoriais. Algumas indústrias vão aos poucos se deslocando para outras áreas da cidade, onde surgem novos polos industriais próximos às novas rodovias. Com esse processo de saída das fábricas para regiões mais afastadas, a Mooca foi aos poucos se degradando. A construção da Radial Leste, iniciada em 1957 e concluída na região 10 anos depois, acelerou esse processo. A implantação da nova via segregou os bairros do Brás e Mooca, historicamente contínuos, não só geograficamente, mas pela forte relação de vizinhança, com os mesmos grupos sociais habitantes: operários na maioria imigrantes (MIRANDA, 2002). Na década de 1970 inicia-se ainda um processo de mudança da dinâmica industrial. A crise do petróleo faz com que o país acumule dívidas, resultando na abertura do mercado às importações e consequente estagnação da indústria paulista. Além disso, a produção fabril se altera com a evolução da tecnologia. O desenvolvimento da informática reflete nas lógicas de comunicação e maquinários das industrias. Apesar do esvaziamento de áreas industriais, essa mudança faz com que as empresas mantenham na capital os setores administrativos e de apoio, mesmo com a saída da produção para áreas periféricas. A cidade de São Paulo vai tornando-se aos poucos o centro administrativo das grandes


empresas, cujas atividades se concentram na prestação de serviços. Apesar da nova fase de desenvolvimento econômico em São Paulo, os bairros industriais como a Mooca não acompanham esse processo, resultando no abandono de inúmeras fábricas, degradando os edifícios e seu entorno, além de serem objeto de especulação imobiliária. Nos últimos anos tem se notado o interesse do mercado nos terrenos das antigas indústrias, uma vez que os grandes lotes, localizados em áreas com infraestrutura urbana, possibilitam a construção de empreendimentos de conjuntos residenciais, hipermercados e shopping centers. Sem levar em conta o valor dessas construções, muitas já foram demolidas, ou sofreram completa desca­racterização, modificando a paisagem do bairro e sua memória. Em 2002, o Plano Diretor Estratégico incluiu alguns terrenos das antigas fábricas como Zona Especial de Preservação Cultural, e também previu a criação de uma Operação Urbana para elaboração de planos urbanísticos e diretrizes de desenvolvimento

nos bairros da região do Tamanduateí. O projeto, ainda em desenvolvimento, tenta reverter alguns pontos problemáticos, buscando reequilibrar a relação entre emprego e habitação, historicamente existente no bairro, e reverter outros pontos problemáticos como questões de áreas verdes, equipamentos públicos, drenagem e mobilidade. Apesar das tentativas do Plano Diretor, bem como tombamentos pontuais por parte de órgãos públicos de preservação, a pai­sagem da Mooca vem se descaracterizando. Neste cenário de uma arena de debates entre aqueles que defendem a preservação e a especulação imobiliária, os moradores da Mooca assistem a invasão e saque de seu patrimônio abandonado e em deterioração. Se as indústrias marcam a história e o crescimento da cidade de São Paulo, possibilitando sua ascensão à condição de maior metrópole do país, mesmo que hoje se viva uma nova etapa de desindustrialização e do capital financeiro, não há justificativas para a destruição dos pilares que sustentam a memória de sua evolução e sua identidade.

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(1) anúncio do Jornal A Provincia fonte: cervisiafilia.blogspot. Antarctica Paulista, fábrica na Água Branca, 1900. fonte: Fundação Zerrener

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< (2) Decreto no 217. Coleção de Leis do Brasil - 1891, Página 419 Vol. 1 pt. II (Publicação original) fonte: cervisiafilia.blogspot Parque Antarctica, 1921. fonte: palmeiras.com.br


ii.

companhia antárctica paulista

A história da Antarctica Paulista começa em 1885, quando a empresa é fundada por Joaquim de Salles, e outros sócios1. Localizada no bairro da Água Branca, num complexo de edificações na rua Turiassu, bem próxima às estradas de ferro Inglesa e Sorocabana, a fábrica funcionava como abatedouro suíno, com preparação de presuntos, conservação de carnes, além da fabricação de gelo e banha (SANTOS, 2004). A fabricação de cerveja inicia-se com a entrada do cervejeiro alemão Louis Bücher (SANTOS, 2004) na sociedade, fundando a Companhia Antarctica Paulista em 15 de maio de 1891, com a publicação do decreto do governo autorizando seu funcionamento2. Nesse momento, começa a crescer na cidade a produção da bebida, com a abertura de outras cervejarias, como a Fábrica de Cerveja Guanabara em 1886 e a Bavária em 1892 (SOUZA, 2010). Entre outros acionistas da Antarctica estavam João Carlos Antônio Zerrenner, de origem alemã, e Adam Ditrik von Bülow, dinamarquês, ambos proprietários da empresa Zerrenner, Bülow & Cia., exportadora e corretora de café. Além do mercado do café, os empresários importavam maquinários da Alemanha para modernizar a produção da indústria nacional, vendendo máquinas para produção de cerveja à Companhia Antarctica.

Na virada do século, a empresa entra em crise, devido às dívidas contraídas por causa das importações. Nesse momento Zerrenner e Bülow decidem trocar seu crédito por ações da empresa, tornando-se acionistas majoritários e assumindo o controle da fábrica (FREYRE, 1966). Sob nova direção, a Companhia Antarctica cresce consideravelmente nos anos que se seguiram, abrindo o complexo industrial ao público em 1902, conhecido como o Parque Antarctica, com jardins planejados, passeios, lagos, parques infantis, pistas de atletismo, quadras de tênis e campo de futebol, caracterizando-se como o principal espaço de lazer da cidade. O intuito de atrair a população para um local de lazer era divulgação da cerveja, até então pouco popular. Com o crescimento da fábrica, a Companhia adquire a compra da Cervejaria Bavária em 1904, mudando a sede para a Mooca. O prédio principal do conjunto da Mooca foi construído em 1890 como sede da Cervejaria Bavária, e foi uma das primeiras fábricas a se instalar na região. Seu primeiro registro data de 1892, com a inauguração do complexo publicado no jornal Estado de São Paulo em 21 de outubro:

O edifício principal, de cinco pavimentos, é dividido em tantas secções quantas são as phases do fabrico. As machinas productoras de gelo,

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Vista da fábrica de cervejas, tirada de um dos edifícios do conjunto da fábrica de refrigerantes, do outro lado da avenida Presidente Wilson. Ao fundo, nota-se as chaminés de outras fábricas, característica marcante da antiga paisagem do bairro da Móoca. 1940 fonte: arquivo do grupo GP Antarctica

< Vista aérea da fábrica de cervejas, em 1930. Nota-se o des­ taque do edifício da fábrica da Antactica na paisa­gem da Móoca. fonte: SMDU


elemento essencial ao fabrico, conforme as prescripções da sciencia, para a temperatura em diferentes gráus, são do sistema Linde [...] cada uma com dois compressores, que servem para resfriar duas camaras de fermentação de 520 metros quadrados; uma ante câmara e 12 camaras adegas, com 2025 metros quadrados. No local onde se acham colocadas as caldeiras há também uma bomba de Worthing para a fabricação de gelo. A chaminé da casa de caldeira tem 35 metros de altura. D’esta dependência passaram os visitantes para um vasto salão onde se acha instalada a machina motriz de força, peça construída na importante fabrica de Gesellschaft fur Lindes Eeismaschiner em Wiebaden. Próximo a esta está uma outra machina que fornece o ar necessário para a pressão na conducção da cerveja aos barris. A Sudhaus, isto é, o compartimento destinado à fabricação de cerveja, tem 4 caldeiras construídas na fábrica de F. Pest de Berlim. Próximo à Sudhaus há um grande e seguro elevador para o transporte dos depósitos. Existem no estabelecimento cerca de 50 tanques de fermentação, e mais 4 de maior volume para destinados a fins diversos. Quatro são os celeiros, contendo cada um cerca de 30 barris e produzindo ao todo 50 mil litros. Os celeiros, bem como os depósitos de fermentação, têm em geral uma tem-

peratura de 4 graus acima de zero. Ao lado da fabrica estão situados os armazéns para o engarrafamento da cerveja, cuja conservação é feita pelo moderno systema de Hausteur. Já se acham prontos 30 mil litros de cerveja, dispondo a fabrica de grande número de barris e garrafas para a exportação do líquido.” O prédio foi construído muito próximo à estação, e se destacava na paisagem da região, ainda desocupada. O arruamento da rua Bavária foi feito posterior à construção do prédio principal, dando o mesmo nome da cervejaria à rua. A proximidade com a estação permitiu a autorização para a construção de um ramal da linha férrea dentro do terreno da fábrica, facilitando a importação de produtos, principalmente o maquinário originário da Alemanha, além do escoamento. Ainda sem abastecimento da rede de água e esgotos, a fábrica captava água do Tamanduateí para o resfriamento dos canos na máquina de gelo, e de poços artesanais para produção de cerveja (RUFINONI, 2004). Os anos que se seguiram foram de crescimento e expansão da empresa. Em 1910, a companhia compra o terreno vizinho da fábrica e inicia a expansão na rua Bavária. Em 1911, a empresa abre a primeira filial em Ribeirão Preto. Os anos seguintes são realizadas inúmeras obras de expan-

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Foto de uma das turmas formadas na Escola Técnica da Antarctica, tirada no pátio da fábrica de cervejas fonte: arquivo do grupo GP Antarctica

< Fachada da Escola Técnica da Antarctica, na Móoca, em 1955 fonte: Fundação Zerrener Alunos da Escola Técnica do curso de Mecânica, 1955 fonte: Fundação Zerrener


são do complexo fabril localizado na Mooca, de acordo com a ampliação da produção. Além da compra dos terrenos vizinhos, na Avenida Presidente Wilson (antiga rua Bavária), entre os anos 1910 e 1913, totalizando uma área de 30 mil metros quadrados, a empresa passou a ocupar também os loteamentos do outro lado da rua, se estendendo até a Avenida do Estado, num total de 150 mil metros quadrados, além de outros terrenos na região, como um lote de 16 mil metros quadrados na Rua da Mooca, destinado à moradias operárias e área de lazer aos funcionários, adquirido no ano de 1911 (Jornal O Estado de São Paulo, 25 de setembro de 1931). Além dos investimentos para a expansão da fábrica, a companhia comprou algumas propriedades espalhadas pela cidade, destinadas a serviços, não somente para os funcionários da empresa, mas à toda população. O Parque Antarctica, vendido em 1920, funcionava até então como parque público, um dos principais pontos de lazer de São Paulo, e onde também ocorriam partidas de futebol dos grandes clubes paulistas. Além do parque, a Companhia era proprietária do Casino Antarctica, localizado no Anhangabaú e do Cine Central, construído na Avenida São João (Jornal O Estado de São Paulo, 9 de fevereiro de 1941). Em 1920, a produção anual de cerveja chega 250 milhões de litros. A par-

tir de 1930, a Antarctica, juntamente com a Brahma, passa a eliminar quase todos os concorrentes no setor de produção de cervejas (SANTOS, 2004). O crescimento da empresa deu início a um processo de compra de outras cervejarias e empresas do setor de bebidas e alimentícios, abrindo inúmeras filiais pelo país. Com a morte dos dois principais acionistas, Adam von Bülow em 1923 e Antonio Zerrener em 1933, e sua esposa Helena Zerrener em 1936, inicia-se uma série de disputas pela direção da empresa. Assim é criada a Fundação Antonio e Helena Zerrener (FAHZ), em 1938, para administrar a herança da família, e consequentemente a Companhia Antarctica, sob direção de Walter Belian. Este último dirige a empresa até sua morte em 1975, sendo sucedido por sua irmã, Erna Belian. Além da administração da empresa, a Fundação começou um programa de assistencialismo, idealizado pelo casal Zerrener. Em 1938, o primeiro posto de atendimento médico aos funcionários da empresa é criado pela FAHZ. Em 1943, o primeiro centro educacional para os antarcticanos, chamado Escola Pré-Vocacional Getúlio Vargas, localizado na Água Branca. Futuramente, a escola foi transferida para um terreno na Mooca, mais próximo da fábrica, mudando o nome para Escola Vocacional Antarctica, mais tarde reconhecida como escola técnica pelo governo federal,

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em 1955, tornando-se Escola Técnica Antarctica, com cursos de Eletrotécnica, Mecânica, Construção de Máquinas e Motores, Desenho de Máquinas e Química Industrial, Aproveitamento de Materiais, e Corte e Costura. Em 1945, nasce o Hospital Santa Helena, também propriedade da fundação, no bairro da Liberdade. Em 1960, a empresa já tem filiais espalhadas pelo país: no Rio de Janeiro, Bahia, Recife, Belo Horizonte, Santos, Campinas, RIbeirão Preto e Porto Alegre, além da compra das cervejarias Bavária, Bohemia, Columbia, Catarinense e Adriática, e as empresas Cia Progresso Nacional, Cornflakes S/A e Dubar S/A, também do setor de bebidas. Com o tempo os lucros da empresa foram diminuindo, assim como os dividendos das ações da Fundação, principalmente na década de 1990. A crise culminou com a fusão da Antarctica com a Brahma, em 1999, fundando a Ambev, quando a sede foi transferida para Jaguariúna, no interior do estado. Parte dos galpões de engarrafamento ainda foi alugada para a Distribuidora Unidas, funcionando até 2004 no local, quando toda a distribuição das bebidas passou a ser feita pela Ambev. A partir de então os edifícios foram completamente esvaziados, permanecendo sem uso desde então. . Em 2007, foi aberto o processo de tombamento do conjunto pelo Compresp (órgão de preservação municipal), ainda em andamento.

> mapa (1) 1905 SMDU mapa (2) 1930 SARA BRASIL mapa (3) 2000 base CESAD com funções dos edifícios remanescentes da fábrica. (elaboração da autora)


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LEGENDA 1890-1920 1920-1950 35 39

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fábrica de cervejas 1 portaria 2 adega 3 expansão da adega 4 engarrafamento 5 casa de máquinas 6 chaminé 7 casa de fabricação e depósito de cevada 8 silos 9 girador 10 adega 11 engarrafamento 12 depósito de vasilhames 13 fábrica de licores

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1950-1970 1970-2000

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fábrica de refrigerantes 14 fábrica de gelo e casa de máquinas 15 depósitos de automóveis 16 refeitório 17 oficinas 18 controle de balança 19 vestiários 20 escritórios 21 fábrica de gás carbônico 22 fábrica de essências

23 portaria 24 tratamento de resíduos industriais 25 depósito de açúcar 26 depósito de produtos gerais 27 engarrafamento 28 fábrica de refrige­rantes 29 engarrafamento e caldeira 30 laboratório 31 depósito de malte 32 depósito geral 33reservatório de água 34 almoxarifado 35 depósito 36 reservatório de água 37 reservatório de água 38 associação recreativa e cultural ARCA 39 fábrica de refrige­rantes 40 ginásio 41 bocha 42 residências 43 centro de computação 44 garagem 45 garagem 46 escritório de obras 47 vestiários 48 ambulatório 49 deposito de gelo 50 cobertura 51 reservatório de água 52 guarda 53 depósito de vasilhames 54 depósito de vasilhames


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< Vista aérea da fábrica de cervejas, em 2005. fonte: Google Earth

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> Vista aérea da fábrica de cervejas, em 2009. Com o processo de verticalização do bairro nas últimas décadas, a presença de prédios multiplica-se no bairro. Nesta ima­ gem, também conseguimos enxergar a fábrica como um todo, da ferrovia até a avenida do Estado. fonte: Google Earth a seguir 1960. No primeiro plano, a fábrica de refri­ gerantes, e ao fundo, a fábrica de cervejas fonte: arquivo grupo GP Antarctica


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Vista do conjunto na década de 1920, com o edi­ fício das adegas ao fundo (parte ampliada em 1912). A foto foi tirada da rua que existia no terreno onde foi construída a fábrica de refrigerantes, no lado par da Avenida Presidente Wilson. fonte: arquivo do grupo GP Antarctica

> Foto aérea do edifício das adegas, 2007. Nesta imagem percebe-se a dimensão da empena cega na fachada voltada para a rua, no bloco onde localizava-se o frigorífico. O bloco com janelas em todos os andares foi construído posteriormente (sem registro exato). fonte: Jornal O Estado de São Paulo


iii. fábrica de cervejas O conjunto fabril da Móoca foi durante um século a sede matriz da Companhia Antarctica Paulista, até seu fechamento em 2000. Ao longo desses anos, uma série de modificações foram feitas no conjunto, conforme as necessidades da empresa. Algumas plantas foram encontradas no Acervo do Arquivo Histórico Municipal e no Arquivo Geral do município, com os projetos de ampliações e construções de novos edifícios. A partir de sua análise foi possível estudar a configuração dos edifícios ao longo do século XX. Procurou-se focar a atenção nas construções no terreno entre a Avenida Presidente Wilson e a ferrovia, onde aqui será proposto um projeto de intervenção. Neste terreno localizava-se a fabricação de cervejas. Dos edifícios remanescentes, os mais antigos são os da Adega, construídos em 1892 para a fábrica da Bavária:

“O predio não tem estylo, porém é alto, vasto, vistoso e todo construído de tijolos. Em frente fica-lhe o escriptorio, em bonito chalet e nos fundos passa-lhe a Estrada de Ferro Ingleza, com a qual tem communicação. A fabrica occupa uma extensão de 250 metros de frente por 100 de fundos e o escriptorio e mais dependencias uma extensão de 80 metros por 120. A parte mais alta do edifício tem 30 metros e a chaminé 36. [...] A fabrica possue um desvio da linha Ingleza que possibilita transportar de Santos

para o quintal da fabrica todos os productos importados, principalmente cevada, garrafas, carvão e os machinismos, cujos volumes dão muitas vezes de um peso excessivo. Além disso, um girador, que a fabrica mandou construir, divide o desvio em cinco partes, nas quaes as respectivas mercadorias podem ser carregadas nos seus depósitos. (PINTO, 1900 apud RUFINONI, 2004. p. 171) Conforme descrição de Alfredo Pinto, o edifício principal tinha sua fachada de tijolos, o que foi modificado posteriormente, provavelmente com as obras de ampliação da adega, em 1912. Não foram encontrados registros do conjunto pertencente à Bavária, sendo somente nas plantas de 1912 que o edifício original aparece parcialmente, onde a reforma foi executada. O conjunto das adegas é um dos mais altos do terreno. Era o prédio onde se realizava o depósito frigorífico, e devido ao isolamento térmico, há poucas aberturas no edifício, que se destaca na paisagem como um volume maciço. O desvio da linha ferroviária, também mencionada na descrição, era dividido em cinco partes, para permitir tanto o despacho do produto final quanto o abastecimento de cevada, garrafas, carvão e maquinário. A divisão do girador pode ser vista na implantação geral do conjunto de 1935. Posteriormente, essa estrutura foi demolida, e

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no local foi construído novas edificações. Em 1910, a Companhia compra o terreno vizinho, ao norte, construindo outros edifícios destinados às oficinas, serralheria, depósitos e fábrica de licores (conforme implantação de 1910). Em 1911, tem-se o primeiro registro da construção de uma residência operária no terreno da Companhia, com sete quartos ao total. A construção também previa uma loja voltada para a avenida Bavária, onde provavelmente era feita a venda dos produtos recém fabricados. O edifício foi demolido em 1973. Em 1912, outro terreno adjacente é adquirido, ao sul do lote original, estendendo os limites da fábrica até a Estação da Móoca. Neste local são construídos uma nova casa de máquinas (em 1913) , o depósito de cevada e a nova casa de fabricação (em 1914), a chaminé e um novo girador, que fazia a conexão com o ramal da ferrovia para recebimento de matéria-prima, que já era diretamente armazenada no depósito de cevada. Depois de desativado o ramal ferroviário, em torno da década de 50, foi construída uma estrutura octogonal de 2,5 metros de altura ao seu redor, onde a vegetação tomou conta. Apesar de totalmente descaracterizado, a estrutura marca o antigo local do girador, remetendo a um momento his-

tórico e uma lógica de produção. Todas as construções neste terreno adquirido em 1912 são ainda existentes, apesar de terem sofrido algumas modificações ao longo do tempo, praticamente mantém a implantação dos edifícios no início do século XX. A casa de máquinas (construída em 1913) foi ampliada em 1930, seguindo a mesma modulação do edifício original, mas substituindo a estrutura de concreto por metálica. A fachada nova foi feita igual à anterior, mas sem acabamento, ficando em tijolo aparente, provavelmente por motivos de economia. Parte do edifício foi demolida parcialmente, deixando uma ala descoberta, em ruínas. A casa de fabricação e o depósito de cevada, também localizadas nesta porção do terreno são um dos edifícios que mais chamam a atenção na paisagem, principalmente para os usuários do trem da CPTM, uma vez que esse conjunto se volta para a ferrovia. Construído em 1914, também se destaca por ser um dos poucos edifícios altos construídos em tijolo, sem revestimento e pintura clara conforme as outras edificações. Em 1935, este conjunto também recebeu novos anexos conforme as necessidades da fábrica. Outro elemento presente ainda neste terreno é a portaria principal do conjunto. Construída em 1929, o edi-


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<

A fábrica na década de 30, vista da avenida Presidente Wilson. Apesar de construídos em anos diferentes, a linguagem arquitetônica da Portaria (1929) e da casa de máquinas (1913) seguiu os moldes do edifício das adegas (1912). fonte: site Saudades de Sampa

> Fotos atuais do conjunto. Aqui nota-se que os vo­ lumes da portaria e da ampliação das adegas foram mantidos, enquanto o edi­ fício da casa de máquinas foi parcialmente demolido. fonte: Chico Saragiotto


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<

Conjunto do depósito de ceva­ ­da e casa de fa­bricação, bombardeado na Revolta de 1924. fonte: site Saudades de Sampa

< Mesmo conjunto atu­ al­ mente, visto da rua de saída da estação da Móoca. fonte: Chico Saragiotto > Vista da plataforma de embarque da estação da CPTM, atualmente. Destaca-se na paisagem o edifício em tijolos, em meio aos galpões adicionados posteriormente. fonte: Chico Saragiotto


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<

Vista da fachada voltada para a ferrovia. No primeiro plano, encontra-se o galpão de engarrafamento, construído em 1914. fonte: site São Paulo Antiga

< Na imagem, o edifício em tijolos é o galpão de engarrafamento original de 1914, e o conjunto adjacente, com acabamento, são as ampliações feitas em 1949 e 1953. fonte: Chico Saragiotto


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Vista de dentro do terreno, próximo à ferrovia, separada pelo muro. fonte: Chico Saragiotto

< Imagem das ampliações feitas para o galpão de engarrafamento e depósito de vasi­lhames, vista da ferrovia. fonte: Chico Saragiotto


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fício além de funcionar como acesso principal ao conjunto, abrigaria os escritórios administrativos da empresa. Construído com o mesmo estilo arquitetônico das adegas (1912) e da casa de máquinas (1913), esta edificação conecta esses edifícios, fechando o terreno conforme o alinhamento da rua. Os edifícios localizados no alinhamento da ferrovia eram destinados ao envase e depósito dos produtos finais. Originalmente, o primeiro galpão de engarrafamento, construído em 1914, localizava-se atrás do edifício das adegas e se estendia até o depósito de cevada. Com algumas modificações nos anos seguintes, parte da construção foi demolida, e outros dois anexos foram construídos para depósito de vasilhames, o primeiro em 1949, e o segundo, ainda maior, em 1953. O terreno ao norte do lote original da Bavária (adquirido em 1910) é o que sofreu maiores modificações ao longo do tempo. Para a construção de edifícios cada vez maiores, os antigos eram demolidos sistematicamente. A única exceção foi a fábrica de licores. Sem registro exato, acredita-se que foi construído ainda em 1910, ano em que este terreno foi adquirido pela empresa. Um dos edifícios mais baixos do conjunto, um sobrado com estruturas de madeira e construção em tijolos, sofreu grande modificação interna, quando foi transformado em

vestiário para os funcionários, e após o fechamento da fábrica, quando o espaço foi alugado para abrigar uma das distribuidoras da Ambev. Parece ainda mais escondido devido ao grande porte de suas construções vizinhas, erguidas de maneira conflituosa ao lado da fábrica de licores: dois imensos galpões construídos em 1972, destinados ao depósito e engarrafamento de produtos, quando o despacho era realizado por caminhões. As ultimas construções realizadas no local datam de 1983. São as novas adegas, que continham os tanques em aço inox, aparentes na fachada da Avenida Presidente Wilson. Os tanques eram utilizados para o processo de fermentação do produto. Removidos em 2004, hoje só restam as estruturas de concreto que os sustentavam. O prédio dos silos também construído neste ano, servia para o depósito de cevada, uma vez que o edifício que servia para esta finalidade, construído em 1914, foi modificado para ampliação das salas de cozinhamento e filtração. A partir dessas pesquisas, realizadas nos arquivos municipais e com ajuda dos estudos elaborados pelo escritório Oksman, foi possível compreender a lógica de construção do conjunto ao longo tempo, e as funções dentro da fábrica, essenciais para a compreensão do lugar e sua história.


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<

Antiga fábrica de licores, construída em 1910, assim que o terreno ao norte foi adquirido, atualmente tomado pela vegetação. fonte: arquivo do escritório Oksman Arquitetos

< Na imagem, a construção em tijolos, isolada em meio aos enormes galpões construídos ao seu redor. fonte: Marcio Saviano


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<

Ruínas da estrutura que sus­ ten­ tava os tanques de fermentação, construído em 1983. fonte: Bernardo Borges

< Momento em que os tanques de aço inox foram retirados da fábrica já desativada, 2004. fonte: arquivo pessoal Orlando Gerodo


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Detalhe interno do edifício dos silos, construído em 1983. fonte: arquivo escritõrio Oksman

< Vista da fachada voltada para a ferrovia, com o prédio dos silos ao lado do depósito de cevadas (de 1914). fonte: arquivo escritõrio Oksman


CRONOLOGIA DOS EDIFÍCIOS < 1891 configuração do conjunto da fábrica da Bavária, comprada pela Antarctica em 1904

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casa de fabricação

chaminé

adegas

casa de máquinas engarrafamento

fábrica de licores oficinas

oficinas

compra do terreno ao norte e construção de vo­ lumes novos < 1910

girador

residência e loja ampliação das adegas

implantação do conjunto com construções de 1911 e 1912 < 1912


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chaminé

casa de caldeira

casa de máquinas

depósito de cevada e casa de fabricação girador

compra do terreno ao sul e construção de volumes novos > 1914

câmara frigorífica casa de máquinas II

portaria principal

construção de novos edifícios >1929

breuagem ampliação da casa de máquinas

ampliação de edifícios existentes com anexos > 1935

depósitos e tanque


44 < 1949 início das demolições para construção de galpões maiores.

novo galpão de engarrafamento

demolição de edifícios para a construção do depósito de vasilhames < 1953

depósito de vasilhames e oficina mecânica

galpão galpão demolição de edifícios no norte do terreno para a contrução de dois galpões < 1972


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tanques de fermentação

silos

galpão demolição de parte do galpão de engarrafamento ­ para novas construções > 1983

tanques de aço inox removidos em 2004

> 2016 situação atual, edifícios

remanescentes


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<

Antiga fábrica de tambores, antes da intervenção de Lina. fonte: Peter Sheier

< SESC Pompéia, 2009.

fonte: https://monolitho.files.wordpress.com/2009/10/materia3_grelha-pompeia.jpg?w=600


iv.

outras paisagens

O conceito de paisagem é crucial para o trabalho. A paisagem é dinâmica, porta-se como uma expressão das práticas humanas em conjunto com ações da natureza e é capaz de narrar a história daquele espaço. Toda paisagem tem significado cultural. Para Lewis, (LEWIS, 1979 apud FORTUNATO, 2012) as paisagens podem ser lidas e decodificadas, pois fornecem elementos indispensáveis para a compreensão da cultura local. O autor ainda afirma que toda alteração significativa na paisagem implica recíproca alteração significativa na cultura. Nesse sentido, intervenções em áreas cuja paisagem é determinante para a apreensão de sua memória e identidade, como a Móoca, correm o risco de transformar a cultura local. Assim, o bairro que carrega o estigma de tradicional, numa rede de relações afetivas entre seus moradores, pode convergir em um espaço urbano estereotipado. Procurou-se então estudar alguns projetos que ilustrassem o tipo de intervenção que foge desse perigo. De diferentes escalas e contextos, os projetos que inspiram este trabalho tem um ponto de encontro entre si: o “fazer fazendo” (JORGE, 1999): o modo como os espaços abandonados foram encontrando novo significado durante o processo de compreensão do local, fundamentais para a manutenção da cultura e da paisagem.

A principal referência projetual encontra-se no SESC Pompéia de Lina Bo Bardi. O que mais me encanta neste projeto foi seu processo de concepção enquanto uma experiência prática do envolvimento do arquiteto com técnicos, artistas e, sobretudo, operários. O projeto e o programa foram formulados juntos e indissociáveis, onde “a barreira que separava o virtual do real não existia. Era arquitetura de obra feita, experimentada em todos os detalhes” (FERRAZ, 2008). O projeto do SESC é brilhante pela dimensão do componente popular, a formulação de uma atmosfera abrangente e inclusiva, organizadas num ambiente que reproduz a cidade, que contempla e interessa às diversas faixas etárias e às diversas classes sociais. Lina propõe a reabilitação de uma antiga fábrica transformando-a em um centro cultural, no sentido primeiro da palavra “cultura”, enquanto manutenção das dinâmicas e relações sociais cotidianas. Lina conseguiu preservar a memória da cidade industrial e ao mesmo tempo adequar o prédio às novas necessidades. Da mesma forma, o projeto holandês do Strijp-S, na cidade de Eindhoven, transforma a antiga área do complexo industrial da Phillips em um novo polo cultural para a cidade. A região foi ocupada na década de 1920, pela empresa que ao longo dos anos 30 e 40 foi se expandindo, com a construção de inúmeros edifícios para a

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produção industrial e localização de escritórios, chegando a ocupar uma área de 31 hectares. O projeto de reabilitação da área combina preservação do patrimônio com o desenvolvimento de novos edifícios, na busca de um novo significado para o lugar. O novo programa “não é sobre dormir e trabalhar, mas sobre passar tempo junto”, como definem os arquitetos do escritório WEST 8. A ideia era fornecer espaços para a realização de atividades, que fossem apropriados pela população, aproveitando as camadas culturais existentes historicamente na área. Apesar de projetos arquitetônicos individuais para cada edifício do conjunto, a atmosfera urbana é única. Com habitações, estúdios de trabalho, comércio, atividades esportivas e facilidades culturais, o projeto reúne usos públicos e privados, com elementos permanentes e transitórios, traduzindo a dinâmica das cidades. Por fim, o projeto do NDSM, também holandês, reativa uma área industrial <

<

SESC Pompéia, vista interna. fonte: Leonardo Finotti SESC Pompéia, vista geral. fonte: https://monolitho.files.wordpress. com/2009/grelha-pompeia Strijp-s, vista geral da praça principal do conjunto. fonte: http://www.west8.nl;strijp_s Strijp-s, com detalhe da intervenção em estruturas metálicas azuis fonte: http://www.west8.nl;strijp_s Strijp-s, restaurante em um dos antigos galpões da fábrica fonte: http://www.west8.nl;strijp_s NDSM, vista geral do conjunto fonte: ndsm.nl

historicamente ligada à fabricação de navios. Abandonada nos anos 1980, a área foi reabilitada nos anos 2000. A principal característica do projeto é o caráter de experimentação. O projeto de reutilização da área foi realizado por um grupo de profissionais de diferentes áreas, que tinham o intuito de transformar o local em um polo cultural e artístico. O novo programa consiste em estúdios, oficinas, espaço para eventos, residência para artistas, e restaurantes. Com cinco edifícios tombados, a ideia era manter as construções com o mínimo de intervenção, preservando a atmosfera da indústria naval. Além disso, outro fator relevante para projeto era reutilizar a maior quantidade possível do material encontrado no local, evitando desperdícios. Assim surgiram soluções inéditas, onde containers tornaram-se divisórias dos estúdios, peças de navios foram transformadas em mobiliário, e um dos poucos guindastes que sobrou no local foi convertido em um hotel.

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v.

reinvenção

a) diretrizes Muitas vezes não entendido como registro histórico, os edifícios industriais sofrem intervenções equivocadas, ou são simplesmente ignorados e demolidos, num contexto de debate ainda recente no Brasil acerca da preservação dessas construções. Uma discussão mais aprofundada sobre o tema da arqueologia industrial e os rumos da questão da preservação do patrimônio industrial foge ao objetivo deste trabalho, no entanto, à luz destes princípios, coube uma reflexão sobre os critérios para a manutenção e demolição de edifícios no conjunto.

< Chaminé vista pelas janelas do depósito de cevada. fonte: Bernardo Borges

A Companhia Antarctica Paulista é um dos exemplares de como a paisagem no Bairro da Móoca foi moldada. Assim, para além de estudar seus edifícios individualmente, a escala urbana e a relação com seu entorno são também fundamentais para a elaboração de uma proposta de intervenção no local. A forma como os edifícios foram implantados, a relação com a ferrovia e com a rua, os cheios e vazios no terreno fazem mais sentido quando se estuda a história da fábrica. O conjunto é testemunho do processo de industrialização da cidade de São Paulo. Com construções de diferentes épocas, diferentes estilos, técnicas construtivas e tipologias arquitetônicas, os edifícios eram construídos de acordo com uma exclusiva finalidade:

o funcionamento da indústria. E é por este motivo que devem ser entendidos em conjunto. As construções eram feitas conforme as necessidades da fábrica e de acordo com a dinâmica da produção de cerveja. No entanto, entende-se que, do ponto de vista urbano, o conjunto está inserido em uma grande quadra impenetrável, que se fecha para a cidade. Para uma intervenção que resgate a vida urbana no local, se faz necessária a criação de aberturas na quadra, estimulando seu acesso e circulação, bem como a proposição de programas voltado ao uso público. Assim, concluiu-se que algumas diretrizes deveriam ser seguidas. Dentre as quais: a proposição de uma melhor conexão entre os lados da ferrovia; a abertura de entradas à quadra, permitindo uma nova relação, mais permeável, com a cidade; a definição de programas compatíveis com a preservação dos edifícios; a manutenção das relações de volumetria, mesmo com a adição de novas construções e das relações de circulação, relacionadas com o funcionamento da atividade produtiva; e por fim, a preservação de visuais, que remetam à paisagem industrial histórica do ­bairro­. A partir dessas diretrizes, considerou-se para o projeto de intervenção, a manutenção de edifícios importantes para a apreensão do conjunto in-

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SUBTRAÇÕES


dustrial como um todo. A partir de estudos que aprofundaram a questão da inserção desses bens no espaço ao longo do tempo, suas relações com a estruturação da cidade e do bairro, e sua articulação com aspectos sociais, econômicos, e culturais, foi possível moldar um plano de massas para a área. Tendo em vista sempre a clareza histórica para que cada fragmento se tornasse reconhecível dentro da trama, algumas subtrações se fizeram necessárias, como forma de somar qualidade urbana àquele espaço. Chamamos de subtrações que somam. b) partido A partir da definição do conjunto de edifícios a serem preservados, seguindo os critérios já citados, o partido de implantação foi estabelecido. O lote da fábrica forma uma quadra muito particular, extensa e estreita, estabelecida pelos limites da linha ferroviária, da estação de trem, do viaduto e da avenida Presidente Wilson. A quadra se coloca como um elemento único na malha urbana, mas ao mesmo tempo pode ser lida como um pequeno bairro, onde haveriam ruas internas passando entre seus edifícios, diferentes fluxos, praças, a transição entre o público e o privado. O primeiro desafio foi reconectar esta quadra murada à cidade. Dois eixos

de circulação foram estabelecidos, criando o que seriam as pequenas ruas desse lote. A primeira é definida pela entrada da portaria principal, e atravessa a linha do trem por uma passarela, conectando os dois lados da ferrovia. Essa rua se alarga, formando uma praça onde era o pátio principal da fábrica. Dessa praça se tem visão de quase todos os edifícios que completavam o processo produtivo da cerveja: do depósito de cevada até o galpão de engarrafamento. A segunda rua, sai do meio da praça e se estende em direção ao viaduto, ligando o lote no sentido norte-sul. Ao sul, a quadra agora incorpora a rua da estação de trem. Ao norte, um bosque faz a proteção da barreira imposta pelo viaduto. Uma outra passarela é proposta, como forma de ligá-lo diretamente ao terreno. c) programas

“...a vida no bairro da Móoca sempre foi muito provinciana. Em certo sentido, é como se fosse uma cidade dentro de São Paulo, quem viveu por lá ou continua fiel às suas ruas estreitas e nostálgicas sabe bem o que é não querer de maneira alguma deixar as tradições morrerem.” (ALVES,1998 p.65 apud FORTUNATO,2012) Nesse exercício de criar novos percursos para a quadra, os programas deviam complementar essa narrativa. Os edifícios do conjunto apresentam

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características que contribuem para a implantação de diversos programas, devido aos pés direito altos, estrutura modular e com dimensionamento para grandes sobrecargas exigidas pela atividade industrial. A proposta de reconversão de usos da fábrica teve como ponto de vista a preservação do patrimônio como manutenção e atribuição de novos significados, num sentido de inserção e continuidade. Assim, a proposição de novos programas esteve muito atrelada às conversas com os antigos trabalhadores. Das narrativas que transmitiam o cotidiano passado, compreendi parte das dinâmicas existentes naquele lugar. A reinterpretação do local e de sua cultura foram os eixos que direcionaram o projeto. Observando os valores contidos por trás do patrimônio arquitetônico (as memórias e identidades sociais) atentou-se para a importância de restabelecer o ambiente familiar da fábrica e a atmosfera provinciana da Móoca, retomando alguns elementos das cidades tradicionais: as relações de vizinhança e a multifuncionalidade. Morar, trabalhar, estudar, cuidar, jogar e entreter deveriam assim estar presentes nesse novo cotidiano, reinventado. d) edifícios Definidos os percursos, as relações urbanas que a quadra deveria ter, e já com algumas sugestões de usos ba-

seadas nos depoimentos dos trabalhadores, era necessário olhar para cada edifício e estudar os tipos de programa que poderiam melhor se adaptar a eles, com intervenções respeitosas. Da metodologia de projeto, dividiuse em quatro blocos: começando do mais público em direção ao mais privado, primeiro o entreter, reunindo a praça e os programas do centro cultural, depois o trabalhar, estudar e cuidar, que deram origem ao escritório, à creche e à biblioteca, em seguida o jogar, com o centro esportivo, e por fim o morar. Cada edifício tem sua particularidade, e assim sendo, soluções distintas. Mas buscava o tempo todo olhar para a escala do detalhe e voltar para a escala urbana, a parte influenciando o todo, de modo que se mantivesse uma mesma linguagem no conjunto. Quando um bloco era pensado, seguiamos com o bloco seguinte, mas era sempre necessário voltar, rever, modificar e às vezes refazer. Os programas também não se dividiram por edifício, necessariamente. Alguns prédios invadem os outros com seus usos, outros, num mesmo edifício compartilham programas diferentes, reforçando o fato de que foram pensados enquanto espaços contínuos.


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diagramas


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legenda 1 praça 2 passarela ferrovia 3 portaria principal 4 centro cutural 5 arena 6 anfiteatro 7 eventos 8 gramado 9 escritórios 10 creche 11 biblioteca 12 passagem 13 comércio 14 habitação 15 labirinto 16 campo society 17 quadras 18 sede centro esportivo 19 bosque 20 passarela viaduto

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IMPLANTAÇÃO

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CASA DE FABRICAÇÃO & DEPÓSITO DE CEVADA Os dois edifícios foram concebidos em conjunto, em 1914. O volume mais baixo destinava-se à casa de fabricação, com a sala de cozimento e os filtros e, o volume maior, ao depósito de cevada. Com pés-direitos diferentes nos dois primeiros pavimentos, os volumes se encontram no subsolo e nos pavimentos superiores, e compartilham a caixa de circulação vertical. Com estrutura de madeira e treliças metálicas na cobertura, seus fechamentos são de tijolo aparente. As fachadas se escondem devido à construção de anexos interligados ao conjunto. Neste conjunto propõe-se um uso público, animando a praça: o centro cultural. Seu uso ainda remete ao antigo clube ARCA (Associação Recreativa e Cultural Antarctica), dedicado a atividades de lazer dos antigos trabalhadores. O centro cultural prevê espaços expositivos, salas de leitura e estúdios para usos diversos como aulas de dança e música, além de um anfiteatro e uma arena, onde shows e eventos poderiam ocorrer. A maioria dos anexos foi removida, já que caracterizavam-se por construções provisórias. Assim, a fachada original do conjunto fica livre, permitindo sua leitura. < Sala de co­zinhamento, na casa de fabricação. 2014. fonte: Bernardo Borges

Os prédios encontram-se numa cota mais elevada em relação ao térreo. Para garantir acessibilidade, foram

colocadas rampas de acesso nas duas entradas para o conjunto, uma pela praça principal e outra na fachada voltada para a ferrovia, próxima à passarela. Nesta fachada ainda foi ampliado um pequeno terraço que já existia, criando uma pequena área externa, onde as mesas do café poderiam ficar. No térreo, há ainda uma rampa ligando o salão principal com o bloco do anfiteatro, que fica na cota do térreo, a 1,5 metro mais baixa que a do conjunto. Os blocos de circulação vertical que unem os volumes foram mantidos, concentrando os elevadores, escadas e banheiros. Assim, esse bloco de serviço fica concentrado no perímetro do edifício, permitindo a criação de um espaço interno amplo, onde compreende-se a modulação da estrutura como um todo. Na antiga casa de fabricação, localizar-se-iam as salas para os usos específicos, como estúdios e ateliês, de acordo com o programa do centro cultural.

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diagramas


perspectiva geral

“Fundamos o clube ARCA (Associação Recreativa e Cultural Antarctica) em 1958. Nessa época eu trabalhava há só quatro anos na empresa, mas fiquei muito animado com a ideia. A intenção da criação da associação era organizar atividades de lazer para os trabalhadores. A ARCA era o clube do pessoal da Companhia, ficava localizado na Rua da Moóca. Lá existia um campo de futebol, quadra de futebol de salão, um salão de festas, bocha, e judô. O pessoal gostava de ir às quartas à noite no bailinho da ARCA, que acabou ficando famoso no bairro com o tempo. Vinham pessoas de todo o lado, adoravam os bailes. Foi uma época totalmente especial para quem pode vivenciá-la como eu.” Alcides

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A

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PLANTA TÉRREO centro cultural

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legenda 1 recepção 2 hall 3 salão principal 4 café 5 terraço 6 guarda-volumes 7 circulação 8 exposição (SILOS) 9 anfiteatro (CALDEIRAS) 10 arena (GIRADOR) 11 chaminé 12 gramado

CORTE AA PERSPECTIVADO centro cultural sem escala


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< Sala de co­zimento, na casa de fabricação. fonte: arquivo do escritório Oksman Tanques da sala de co­ zimento fonte: arquivo grupo GP Antarctica < Buracos onde ficavam os tanques na sala de cozimento. fonte: arquivo do escritório Oksman


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Detalhe da estrutura de concreto dos silos. fonte: Bernardo Borges < Pavimento tĂŠrreo dos silos. 2014. fonte: arquivo escritĂłrio Oksman


SILOS Uma das alterações no depósito de cevada foi a construção dos silos, com registro de 1983. O prédio consiste em um volume fechado, com aberturas somente no pavimento térreo e na cobertura. Apesar da brutalidade dos quase 30 metros de empena cega voltadas para a praça principal, o edifício é mantido pois remete à lógica de produção da antiga fábrica. Aqui propõe-se um espaço expositivo, parte do centro cultural. Poderia ser o centro de memória da antiga fábrica, com exposição de sua história. Após a transferência da fábrica para Jaguariúna, os próprios trabalhadores se organizaram para a instituição de um pequeno museu, que ficava em um dos edifícios da fábrica de refrigerantes, mas que foi extinto pela Ambev posteriormente. O material presente neste museu ainda existe, guardado em um dos depósitos de uma creche da prefeitura, na Móoca, e que pode-

ria ser transferido para o centro cultural. O prédio dos silos foi construído como anexo da casa de fabricação, e assim compartilha com este sua circulação vertical. O mais interessante do edifício são os espaços internos, conformados pelos silos de concreto que atravessam todas as lajes do prédio, onde era armazenada a cevada para a produção de cerveja. Os blocos de concreto agora funcionariam superfície expositiva. Em alguns pavimentos foram removidos, criando espaços mais amplos e flexíveis para as exposições. A cobertura foi retirada, criando um terraço-mirante no último pavimento, com vista panorâmica. Os antigos silos se tornam tubos de luz, iluminando os pavimentos por onde passa. Onde foi interrompido, sua presença ainda é marcada pelos buracos na laje, cobertos com vidro.

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perspectiva geral


“Foi idealização nossa, de fato. Sugerimos à diretoria um arquivo, uma espécie de museu histórico, em 1959 e ela concordou, e saiu uma autorização, que fica inclusive exposta. Tem quase 40 anos desse acervo, inauguramos em 59. Cada sala tem sua parte interessante, as fotografias, propagandas, curiosidades. Tem toda a história da Antarctica, desde quando começou na Água Branca. A sala número 1 é a sala principal, a sala dos fundadores, dos diretores antigos, é a sala nobre. Essa escrivaninha aqui, era de um dos fundadores, o comendador alemão, ela tem 106 anos. Aqui é a sala número dois. Esta sala tem as vitrines com copos, bandeiras, vasilhames antigos, todas as marcas das cervejas e os logotipos, e também tem a parte esportiva, os troféus e as taças dos campeonatos, fotos dos jogos. Essa foto aqui é do jogo de solteiros versus casados, em 1935, eu joguei esse jogo. E esse outro cartaz, é do ano que meu pai entrou na empresa, em 1910. E por último, tem a sala maior de todas, que tem as ferramentas, máquinas antigas, barris. Tem até as maquinas registradoras do Bar e Restaurante Pinguim, que era da Antarctica, ficava lá na Avenida São João. Tem muita coisa, nós nem temos espaço suficiente pra expor tudo”. Hedemir (depoimento gravado em 1997)

CORTE TRANSVERSAL silos

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CASA DE CALDEIRAS

GIRADOR

O edifício da casa de caldeiras foi erguido próximo à nova chaminé (de 1914), sem registro exato do ano de sua construção. Em uma das reformas, um anexo foi construído ligando a casa de caldeiras ao depósito de cevada. Ao longo dos anos, mais anexos foram feitos entre as duas construções, dificultando a leitura de ambos.

Também não se sabe o ano exato em que o girador foi construído, mas já aparece nas plantas de 1914. Apesar de já existir um outro girador, a construção deste foi feita após a compra do terreno ao sul, quando a fábrica sofreu um processo de ampliação e transferência de parte da produção para essa porção do lote. O novo girador fazia a conexão com o ramal da ferrovia para recebimento de matéria-prima, que já era diretamente armazenada no depósito de cevada. A estrutura octogonal de 2,5 metros de altura ao seu redor foi construída após a desativação do ramal ferroviário. A partir daí funcionava como tanque de óleo para a casa de caldeiras. Com o abandono da fábrica, o local foi tomado por vegetação. Apesar de totalmente descaracterizado, a estrutura marca o antigo local do girador, remetendo a um momento histórico onde a ferrovia definia a lógica de produção.

Este edifício se caracteriza pelo pé direito alto, de cerca de 13 metros de altura, com um vão livre de 12 metros. O espaço amplo sugeriu o programa de um anfiteatro, associado ao centro cultural. Uma conexão entre os dois volumes é prevista, ligando o salão principal ao anfiteatro, por meio de uma rampa, solucionando a diferença de cotas de nível entre os dois blocos.

< Interior da casa de caldeiras. fonte: Bernardo Borges

Optou-se por deixar o espaço intacto, preservando sua característica de galpão, de maneira em que cadeiras pudessem ser colocadas na ocasião de eventos, ao contrário, o ambiente funciona como um grande salão. As grandes aberturas permitem a entrada de luz no edifício, mas poderiam ser fechadas com painéis de madeira escuros para eventos que exigissem maior restrição de luminosidade.

No projeto, propõe-se a utilização desse espaço como arena. As paredes do octógono receberiam as arquibancadas, enquanto o centro seria o palco, criando uma atmosfera mais íntima entre a plateia e os protagonistas.

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““A empresa-família era assim: você entrava, trabalhava, fazia amigos, arrumava uma namorada lá dentro, se casava, convidavam você pro casamento, você via novas famílias se formando, convidavam você pra ser o padrinho dos filhos do companheiro. Então, o trabalho não era um trabalho cansativo, apesar de ser aquele serviço pesado, bem ruim mesmo, por exemplo eu trabalhava nas caldeiras, era aquele óleo preto, graxa pra todo lado, que judiava da gente, mas eu era feliz de trabalhar ali. Você pode perguntar pra quem for, não só pra mim, tenho certeza, qualquer um que trabalhou na Antarctica vai falar bem. E antigamente as caldeiras eram a lenha, só depois que trocaram para à gás. Eu trabalhei com caldeira a óleo, óleo preto BPF, que usam pra fazer asfalto. Ele era aquecido a 250 graus pra poder passar na bomba, e depois era queimado. Então tem aquela chaminé lá na fábrica, é ali que ficavam as caldeiras, ali que eu trabalhava.” Percival

CORTE TRANSVERSAL chaminé - casa de caldeiras - girador

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perspectiva geral


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< Interior da casa de caldeiras. fonte: arquivo do escritório Oksman < Vista da chaminé, ao lado do edifício da casa das caldeiras fonte: Bernardo Borges


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CASA DE MÁQUINAS A casa de máquinas data de 1913. Originalmente, tinha estrutura metálica e fechamento de tijolos. Sua ampliação de 1930 seguiu o estilo arquitetônico e alinhamento das adegas e da portaria principal, moldando a fachada para a avenida Presidente Wilson. A fachada do conjunto antigo é de tijolo aparente, enquanto a fachada voltada para a rua tem revestimento e pintura. A estrutura nova é de concreto, mas segue a modulação do volume original, com grandes vãos livres. O último pavimento se encontra demolido, bem como a cobertura da torre norte, configurando um salão em ruínas. Aproveitando o grande espaço livre e o pé-direito alto, aqui propõe-se sua utilização como salão para eventos. O salão descoberto foi transformado em um jardim, e o último pavimento, um terraço que abrigaria um restaurante.

< Casa de caldeiras, salão principal do térreo. fonte: Bernardo Borges

Ainda é previsto um novo anexo, para abrigar as áreas de serviço e cozinha, e conformar a esquina que dá acesso à estação da CPTM. O novo bloco segue o gabarito do conjunto original. Estudou-se uma fachada neutra, com poucas aberturas, para não interrom-

per o ritmo das fachadas existentes, e de modo que explicitasse a presença deste elemento como intervenção posterior, mas ao mesmo tempo dialogando com as duas texturas presentes nas fachadas: os tijolos da casa de maquinas de 1913 e o acabamento com revestimento e pintura da ampliação de 1930. Na cobertura foram criadas jardineiras que funcionam como guarda corpo. Uma estrutura leve de deck de madeira é prevista para cobrir as vigas aparentes que sobraram quando a cobertura foi removida, moldando o piso do terraço. Além disso, um pergolado foi colocado sobre os pilares que sobraram, cobrindo a área do bar, e ligando os blocos existentes ao volume novo proposto.

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diagramas


CORTE LONGITUDINAL

FACHADA SUL avenida presidente wilson

FACHADA NORTE ferrovia

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legenda 1 hall de entrada / recepção 2 acesso restaurante 3 circulação entre salões 4 banheiros 5 guarda-volumes 6 circulação de serviço 7 salão principal 8 área externa - jardim

PLANTA TÉRREO salão de eventos

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“Onde eu trabalhava, na casa de máquinas, tinha máquina de 1928, depois eles tiraram, era um compressor de frio a vapor. Era uma fábrica bem antiga mesmo. Inclusive teve uma época que teve uma explosão lá dentro, um compressor de amônia explodiu, matou um companheiro nosso, parou a Presidente Wilson todinha, porque era uma máquina muito velha. O maquinário era velho, a fábrica era velha. A fábrica era de 1889, quando começou a República. E a Antarctica ainda foi vítima da Revolução de 1924. Lá nos prédios tem marca de bala dessa Revolução até hoje. No pátio, tem umas casas mais antigas, com buraco de bala, que ficou lá. Ali é um museu, trabalhar lá era conhecer a história da cidade mesmo.” Ricardo

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perspectiva geral


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< Salão descoberto da torre norte, que foi parcialmente demolida, onde no projeto ficaria o jardim. fonte: Bernardo Borges < Salão principal com uma das máquinas antigas, citada por Ricardo. f­onte: arquivo grupo GP Antarctica <

a seguir Último pavimento da casa de máquinas, onde no projeto ficaria o restaurante. fonte: Bernardo Borges




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ADEGAS

O edifício das adegas é o mais antigo do conjunto. Construído em 1892 para abrigar as adegas da Cia. Bavária, sempre foi o prédio mais alto da fábrica. Não foram encontradas as plantas originais do edifício, somente o registro da ampliação que sofreu em 1912, já sob administração da Companhia Antarctica. Nessa expansão, foi construído um novo bloco, em direção a Avenida Presidente Wilson, mantendo a mesma linguagem do edifício existente, unidos por um corredor de circulação. A ampliação também previa uma torre para as prumadas de escadas e elevadores.

< Fachada da avenida Presi­ dente Wilson, com adegas , portaria principal e casa de máquinas fonte: Marcio Saviano

O edifício se destaca pela peculiaridade de não ter aberturas por conta de seu uso original, com isolamento térmico. Um dos protagonistas das fotos antigas, o edifício recebia o logo da antiga fábrica na empena cega voltada para a avenida, uma vez que seu volume robusto se impõe na paisagem local. Posteriormente, o conjunto sofreu mais uma ampliação, sem registro exato. O novo bloco manteve a mesma linguagem arquitetônica, mas é reconhecível pelas aberturas em todos os pavimentos.

No projeto, pensou-se num edifício de escritórios para este conjunto. Como as paredes são estruturais, com cerca de 1,3 metros de espessura, foram criados buracos nas lajes para solucionar a ausência de aberturas, de forma a permitir a entrada de luz zenital e melhor ventilação. Os vãos se alargam conforme a altura aumenta, facilitando a iluminação dos pavimentos inferiores. As salas dos escritórios estão voltadas para este vazio central, recebendo luz. Os eixos de circulação foram baseados na configuração existente do conjunto. Um eixo é estabelecido pelo corredor principal, que liga os blocos de 1892 e o da ampliação de 1912. As prumadas dos elevadores encontramse nas extremidades deste eixo, uma já existente, e outra adicionada no projeto. O segundo eixo, perpendicular ao primeiro, é definido pelo corredor da entrada diretamente da avenida Presidente Wilson.

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diagramas

CORTE AA TRANSVERSAL

CORTE BB LONGITUDINAL bloco de 1892

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“Vivi 40 anos de minha vida na CAP. Ingressei na empresa em 1º de dezembro de 1960, na época com 14 anos. Todos que ingressavam com essa idade começavam como contínuo, hoje o que chamam de ‘office boy’, e que internamente eram conhecidos como “picão”. Ficávamos inicialmente prestando serviços na Portaria Geral, onde atendíamos todos os departamentos, e assim além de conhecer a companhia como um todo, todos acabavam conhecendo nosso trabalho. Assim quando houvesse a necessidade de alguma tarefa ser feita, o chefe do departamento solicitava ao chefe da Portaria Geral, na época o Sr. Straub, que pedia a algum picão. Dessa maneira, todos tinham suas oportunidades, e podiam ser promovidos de picão para auxiliar de escritório e assim por diante”. João

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FACHADA 1 voltada para a praça

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legenda 1 recepção 2 circulação 3 jardim 4 banheiros 5 copa

PLANTA TÉRREO escritórios 0

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CORTE AA PERSPECTIVADO

sem escala


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GALPÃO DE ENGARRAFAMENTO Os galpões pertenciam à fábrica da Cia. Bavária, desde 1892, sendo um dos primeiros edifícios do conjunto. Destinados à função de engarrafamento das cervejas, eram ligados aos prédios de despacho e descarga de garrafas, onde chegava o ramal da ferrovia. Construído em alvenaria de tijolos e estrutura metálica, os edifícios seguem o alinhamento da ferrovia. Correspondem a dois volumes, um mais baixo próximo à ferrovia e outro mais alto, colado ao primeiro. Os galpões de despacho com os quais faziam ligação foram demolidos em 1945. Nesse mesmo ano, foi construído no local um novo edifício, ampliando o setor de engarrafamento. Em 1983, parte do galpão, que chegava até o depósito de cevada, foi demolida para a construção dos silos.

< Galpão de engarrafamentos, de 1949 fonte: Chico Saragiotto

Nesses galpões ficariam uma biblioteca e uma creche. A creche localiza-se no volume mais baixo do conjunto, no térreo. A porção do terreno entre o galpão e o muro que o separa da ferrovia, vira um jardim com playground para as crianças. Foram estabeleci-

das duas entradas, uma voltada para a praça e outra mais reservada, para a passagem, onde se concentram as áreas administrativas e para funcionários. O programa da creche ainda prevê um pátio interno, refeitório, brinquedoteca e salas de atividades. A biblioteca segue a mesma lógica de duas entradas. A voltada para a praça abriga um café, onde as mesas possam se estender para o ambiente externo, e o acesso voltado para a passagem que chega diretamente no salão da biblioteca. Seu programa ocuparia ainda os pisos superiores dos galpões, e do edifício da passagem. Neste último, que apresenta poucas aberturas, destinouse as áreas administrativas e arquivo. No pavimento superior do conjunto, ficariam as salas de estudos e mesas de leitura, aproveitando a iluminação zenital existente.

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diagramas

“Como funcionário da Antarctica meu pai tinha muitos benefícios à família. Sempre comento com meus amigos e familiares que são tantos que parece mentira. Vou tentar relacionar todos, lembre-se que era extensivo a mulher e filhos: assistência médica em qualquer especialidade que se possa imaginar, por exemplo, as consultas com o oftalmologista, nós já saíamos com os óculos prontos. Exames laboratoriais de qualquer tipo, medicamentos gratuitos, assistência odontológica, creche para os recém-nascidos, que permaneciam lá durante todo o expediente que a mãe, funcionária e na maioria das vezes casada com um empregado da companhia. E quando crescia, as crianças ainda tinha onde estudar, a Escola Técnica da Antarctica. A família estava sempre por perto, era ótimo para os funcionários.” Luis


“Quando eu entrei na escola eu tinha 11 anos. A escola era mantida pela Fundação Antônio Helena Zerrener que era detentora da maioria das ações da Antarctica. E a fundação tinha como objetivo o cuidado dos funcionários e filhos dos funcionários. Porque os pais trabalhavam na fábrica o dia inteiro, tinham que cuidar dos filhos deles.” Orlando

perspectiva geral

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PLANTA TÉRREO creche e biblioteca

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legenda 1 praça 2 café biblioteca 3 balcão de informações 4 banheiros biblioteca 5 portaria e secretaria 6 refeitório 6 circulação de serviço 7 banheiros creche 8 pátio interno 9 brinquedoteca 10 salas 11área externa - jardim 12 área administrativa 13 passagem 14 passarela

perspectiva geral


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< vista interna do último pavimento fonte: Chico Saragiotto > Fachada voltada para a praça f­onte: arquivo escritório Oksman


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DEPÓSITO DE VASILHAMES Esse conjunto de galpões corresponde a dois volumes. Um menor, construído em 1945, para a expansão dos galpões de engarrafamento, e onde ficavam as máquinas, oficina mecânica e caixotaria. E o maior, de 1953, com a função de depósito de vasilhames. Ambos os prédios tem estrutura de concreto, com a modulação de aproximadamente 5,5 x 6 m. Apesar de construídos em épocas diferentes, os edifícios tem praticamente a mesma lógica estrutural e ambos seguem os níveis dos pavimentos do galpão de engarrafamentos de 1892, o que permitia a circulação interna entre os três. Os galpões foram ainda construídos de acordo com o alinhamento da ferrovia, percebido pela implantação do depósito de vasilhames, criando uma fachada única voltada para a orla ferroviária.

< Interior do depósito de vasilhames fonte: Bernardo Borges

Nesse conjunto propõe-se a implementação de habitações, em memória à demolida “vilinha da Antarctica”, como a chamavam seus moradores. Assim como era comum entre as industrias da Mooca, a fábrica da Antarctica construiu uma vila operária para alojar seus trabalhadores. O primeiro registro da construção de uma residência para operários da companhia data de 1914, dentro do terreno da fábrica de cervejas, mas posteriormente o edifício recebeu outra função. Sem registro exato, um conjunto de casas foi construído nas proximidades da rua da Móoca, mantendo

funcionários de diversas especialidades próximos à atividade produtiva. Representando as classes sociais trabalhadoras, marginalizadas tanto social quanto espacialmente na cidade, esse tipo de construção foi desvalorizado, e muitas das vilas operárias foram demolidas, como é o caso da vila da Companhia Antarctica. Apesar da dificuldade de preservar a história da classe operária e dos lugares significativos dela, hoje esse quadro tem aos poucos se modificado, com o tombamento de outras vilas e casas operárias. Para a reconversão dos edifícios ao uso habitacional, pensou-se em apartamentos que seguissem a malha da estrutura. Assim, foram criadas diferentes tipologias, modulares, de acordo com os vãos entre pilares: um módulo corresponde a um apartamento-estúdio de 40 m2, dois módulos, a um apartamento de 80 m2 com dois dormitórios e três módulos, um apartamento de 120 m2 com três dormitórios. Como o primeiro pavimento dos galpões apresentam pé-direito de 6m, pensou-se em apartamentos do tipo duplex. No térreo, também foram previstas habitações na fachada voltada para a ferrovia, formando pequenos quintais privados no terreno entre o edifício e o muro. Na fachada voltada para o centro do lote, ficariam pequenos comércios e os acessos para as habitações dos pisos superiores.

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Para solucionar as circulações e problemas de iluminação e ventilação, foram criadas aberturas nas lajes dos pavimentos de habitação, onde concentraria-se as prumadas de elevadores e escadas. O conjunto foi separado em seis blocos, com acessos separados, facilitando a organização dos apartamentos. Outra intervenção, foi a modificação das fachadas, de acordo com a necessidade de iluminação e ventilação para os ambientes das habitações, mas aproveitando as aberturas já existentes. Atentou-se para a manutenção das janelas dos pisos com pé-direito duplo, onde localizariam-se os apartamentos duplex. Algumas varandas poderiam ainda ser adicionadas, criando um novo ritmo nas fachadas.

diagramas


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“São vinte e cinco anos que vivo fora do Brasil e cada vez que retorno, de cima do viaduto eu vejo com enorme tristeza um mundo que desapareceu. Naquela “vilinha da Antarctica” vivi minha infância e adolescência e só sobraram as três arvores centrais, aonde se reunía a garotada e que hoje, a causa do muro, em nem posso me aproximar.” Abílio

perspectiva geral


PLANTA TIPO habitações

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PLANTA TÉRREO habitações e comércio

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legenda 1 comércio/serviços 2 acessos habitações 3 circulação vertical 4 casa 5 quintal 6 depósitos

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FACHADA SUL voltada para avenida Presidente Wilson

CORTE LONGITUDINAL habitações


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“Mais ou menos no ano de 1950, meu pai começou a trabalhar na Cia Antarctica Paulista como mecânico de manutenção e recebeu uma casa de número 27 na Avenida Presidente Wilson, a famosa vila da Antarctica. Não me lembro exatamente quantas casas eram, penso que em torno de cinquenta. Eram destinadas para moradia dos funcionários dos setores de manutenção, e alguns da administração, pagava-se na época um aluguel simbólico, de valor muito baixo. A intenção era ter as pessoas dos serviços essenciais por perto no caso de emergência, pois a produção era prioridade.” Luis

CORTE TRANSVERSAL habitações

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< Galpão de engarrafamento, visto do conjunto das adegas f­onte: arquivo escritório Oksman > Fachada voltada para a ferrovia. O espaço entre o edifício e o muro ficariam os quintais das casas. f­onte: arquivo escritório Oksman


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TANQUES DE FERMENTAÇÃO Este edifício foi construído para abrigar os tanques de fermentação, com primeiro registro de 1983. Caracteriza-se por uma estrutura de concreto modular, que recebia os tanques cilíndricos de aço onde a cerveja ficava armazenada. Os tanques foram removidos em 2004, deixando o edifício descoberto e em ruínas. Os pilares de concreto revestidos de azulejos, em sequencia, formam diferentes perspectivas, longínquas, nesse espaço que se estende por 60 metros no terreno, convidando o visitante a explorar e entender este espaço. Se precisasse defini-lo, diria que é uma espécie de labirinto, um bosque urbano em ruína.

< Estruturas de concreto revestidas de azulejo, em processo de deteorização após a retirada dos tanques fonte: Bernardo Borges

Um dos espaços mais instigantes do conjunto, por si só já interessante, este local pedia uma intervenção no limiar entre arquitetura e arte. Aqui é proposto um uso lúdico. A maior brincadeira é olhar para cima e enxergar o céu. A protagonista desse espaço é a luz solar, que invade o ambiente pelos furos circulares na laje, onde encaixavam-se os antigos tanques. Se desloca e brinca pelas ruínas ao longo do dia,

dependendo da inclinação dos raios de sol. Pensou-se em pequenas soluções que poderiam ser dadas para os módulos da estrutura, animando o passeio. Ora no nível do térreo, ora no do primeiro pavimento, ora no meio do caminho. A mudança de cota permite novos olhares, outras formas de perceber o espaço. As possibilidades são inúmeras. Uma chapa metálica moldaria o conjunto, nos limites do que eram antes as paredes de um edifício. Fecha-se para a Avenida Presidente Wilson, porque é preciso se preparar para entrar nesse playground, mas sem deixar de convidar o pedestre. A divisória segue a mesma altura da paginação dos azulejos, deixando à mostra a laje, que flutua, apoiada sobre os pilares. As entradas são laterais. Este elemento destoa do conjunto. No caminho entre o entreter (centro cultural) e o jogar (centro esportivo) surge também o brincar. Entre o fluxo intenso da praça e o caminhar de volta para casa, uma pausa nesse cotidiano.

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perspectiva geral

FACHADA SUL voltada para avenida Presidente Wilson


perspectiva módulos

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balança

banco alto

rede

CORTE LONGITUDINAL

banco

espelho d’água

redes

escada marinheiro

banco / palco

escada caracol

feixes de luz

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FÁBRICA DE LICORES O edifício foi originalmente construído para abrigar a função de fábrica de licores. Sem registro exato de sua construção, acredita-se que foi erguido logo após a compra do terreno norte do lote, em 1910. Com a expansão da fábrica para a porção sul do terreno, este volume ficou isolado do processo produtivo. Assim, foi internamente reformado para abrigar banheiros e vestiários de funcionários. Caracteriza-se por um dos volumes mais baixos do conjunto, com apenas dois pavimentos, em contraposição aos grandes volumes dos galpões que o cercam. Antigamente, nesta porção do terreno encontravam-se construções mais baixas, que recebiam as funções de oficinas e depósitos. Em 1972, essas construções foram demolidas para dar lugar aos dois grandes galpões ainda existentes.

< Fachada dos fundos, da antiga fábrica de licores. fonte: arquivo escritório Oksman

Após o fechamento da fábrica, a casa ainda recebeu a sede de uma das distribuidoras da Ambev, utilizando a construção como escritórios, e os galpões para estacionamento das carretas e armazém. Nesta época, sofreu uma reforma para adequar os espaços a escritórios, quando foram adicionadas novas aberturas, seguindo a linguagem original da construção. Nesta porção do lote, propõe-se um uso esportivo. Conversando com os trabalhadores da antiga fábrica ficou evidente a importância que o espor-

te, em particular o futebol, tinha no cotidiano dos operários. O futebol de várzea surge como elemento de cultura popular no começo do século XX e passa a moldar a sociabilidade entre os bairros operários. Assim nasce o “futebol de fábrica”, incentivado pelas próprias indústrias, como forma de cooptação do trabalhador, que acabava “ vestindo a camisa da empresa”, literalmente. Na antiga fábrica da Antarctica não era diferente, o futebol aparece como forma de lazer e entretenimento entre os trabalhadores, que jogavam campeonatos internos e competições entre outras industrias da cidade. Assim, o projeto procura retomar este uso, propondo um pequeno centro esportivo nessa porção norte do terreno. Na antiga fábrica de licores, encontraríamos os vestiários, academia e refeitório e, na área externa que a circunda, as quadras: duas poliesportivas, uma quadra de tênis e um campo de futebol. Na extremidade do terreno, ainda é proposto um bosque: uma área verde densa, protegendo as quadras do viaduto.

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perspectiva geral


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““ Minha paixão pelo esporte nasceu jogando na várzea durante a infância. Na Antarctica, jogava no time TIP TOP (nome de uma das cervejas que a fábrica produzia). Éramos o campeão dos campeonatos internos da Companhia, com mais de 20 equipes participantes. Naquela época, os diretores organizavam o campeonato e cabia aos funcionários montarem os times, de acordo com as amizades, e os setores que trabalhavam. Depois que a gente criou a ARCA, em 1958, a primeira atividade foi a formação de um time na Antarctica, selecionando os melhores jogadores do campeonato interno. Isto porque havia um campeonato amador entre as indústrias do estado de São Paulo, o ACEA. Participei como capitão da conquista do título da ACEA, vencendo na final a poderosa equipe das IRF Matarazzo por 4x1, lá no estádio Rodolfo Crespi.” Alcides

“Sempre gostei muito de esportes, lá na Antarctica eu costumava jogar na quadrinha com os colegas do trabalho. Foi ali que nasceu minha paixão por futebol. Hoje, mesmo depois de aposentado, eu estudo Educação Física de manhã e dou aulas de futebol para crianças à tarde. Sou um dos mais velhos da turma, claro, mas estou realizando um sonho. Desde aquela época peguei gosto pelo esporte.” Percival


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legenda 1 recepção 2 administração 3 vestiários

4 acesso academia (piso superior) 5 lanchonete 6 cozinha 7 bosque

PLANTA TÉRREO centro esportivo

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8 acesso viaduto 9 quadras poliesportivas 10 quadra de tênis 11 campo society

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vi.

conclusões

Nesse momento último e único da graduação, o processo de projeto foi cheio de altos e baixos, ora cheio de animação, ora cercado de angústias e desgaste, como não poderia deixar de ser em um ano de imersão no tema. Em uma dessas inconstâncias e cansaços, alguém me perguntou por que eu fui escolher uma fábrica tão grande. A única resposta que consegui pensar foi que ela é quem me escolheu. Primeiro vieram as memórias que se tinham daquele lugar, para depois descobrir como era sua materialidade, organização e dimensão. Afinal, o edifício é também poesia solidificada pela memória que se tem dele. Escolhi essa poesia. E agora no fim deste processo, posso dizer que a fábrica tomou um lugar dentro de mim e faz parte de minha própria memória. Tanto, que no fim deste um ano, descobri que meu avô Davino (em memória) trabalhou ali, no setor de engarrafamento, na década de 1940. Me sinto feliz de alguma forma ter prestado esta homenagem à ele, ainda que sem querer. ... A arquitetura está carregada de significados manifestos pela memória ou pela imaginação. E foi principalmente assim que escolhi compreender a fábrica de cervejas da Antarctica. Primeiro pelas memórias, a partir dos depoimentos de pessoas que me contavam com tanto afeto sobre a fábrica, compartilhando pequenas histórias,

singelas, mas demonstrando a importância que os anos vividos ali tiveram em suas vidas. Aos poucos, essa partilha foi moldando em mim uma afeição por aquele lugar. Em segundo, por meio da imaginação, uma vez que nunca pude passar os limites dos muros que cercam a fábrica. Sem poder visitá-la e explorar seus inúmeros edifícios, tive que me entregar ao esforço de imaginar para tentar entender os espaços que ali existem. É claro que as limitações são inúmeras quando se projeta em um lugar sem visitá-lo, especialmente quando falamos de patrimônio industrial. O conjunto deve ser compreendido inteiramente para assim serem propostas intervenções respeitosas. Sem presenciar suas particularidades de formas, texturas, cores, ruínas e atmosferas, como poderia fazer um projeto factível? Deveria procurar outra fábrica, onde a visita fosse possível? Uma das coisas que mais me encantava era a possibilidade de encontrar no local pequenos detalhes, que pudessem ser incorporados, que transformassem o caminho do projeto e até mesmo o guiasse. Essa dúvida assombrou grande parte do processo. Quando finalmente aceitei a impossibilidade da visita ao local, ative-me ao material que tinha: o levantamento técnico, as fotografias, os documentos do Arquivo Municipal e Acervo His

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tórico, os depoimentos. E o que faltasse, caberia a mim imaginar. A imaginação beberia do real o tempo todo, fugindo da possibilidade de virar uma grande fantasia. Concluí que percepção, memória e imaginação estão em constante interação. Quando conversava com os antigos trabalhadores, eles lembravam, juntos imaginávamos o que foi aquele lugar e logo vinham ideias do que poderia vir a ser. Quando via uma imagem de um dos muitos espaços da fábrica, ora sabia exatamente onde a foto tinha sido tirada, encaixando-se perfeitamente no que havia imaginado, ora a descoberta demorava, ou não vinha sozinha, era necessário consultar alguém e surgia como uma surpresa. Aos poucos fui entendendo e desbravando aquela quadra que à primeira vista parecia uma fortaleza murada. ... Voltando à questão da dimensão da fábrica. Com um terreno de cerca de 35 mil metros quadrados, em um ano de trabalho seria impossível conhecer e projetar para os 70 mil metros quadrados de área construída de seus edifícios remanescentes. Uma das possibilidades era escolher um edifício e projetá-lo detalhadamente. Mas como fazer essa escolha, em que

se pautaria sua justificativa? Todos os prédios a mim se mostravam interessantes, cada um com suas características únicas, resultante de suas antigas funções, com estilos diferentes e espaços instigantes. Todos possibilitam igualmente intervenções criativas, ao mesmo tempo em que colocam desafios para sua execução. Entendi que os prédios se estendem uns aos outros, porque a função original de cada um se complementava. E por isso deveriam ser lidos e pensados como um todo, numa narrativa única. Os novos programas se complementariam, assim como funcionava a antiga fábrica e as novas funções criariam um novo cotidiano. Acabei projetando não um edifício, mas um mini -bairro. E assim sendo, é claro que não daria para resolver todas as questões de projeto de cada prédio, em um ano de trabalho, sozinha e nem tinha essa pretensão. Procurei propor para cada elemento soluções possíveis e cabíveis dentro dessa nova narrativa. A parte construindo o todo, e o todo nunca deixado de lado. Não é um trabalho acabado. Mas sim um começo, rascunho do que poderia ser sua nova história, uma das tantas possíveis.


vii.

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