Escute... - Sobre cegueira e cinema

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ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Manoela Meyer Soares de Freitas

ESCUTE... SOBRE CEGUEIRA E CINEMA

São Paulo, 2014


ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Manoela Meyer Soares de Freitas

ESCUTE... SOBRE CEGUEIRA E CINEMA

Trabalho apresentado ao Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, formulado sob a orientação do Prof. Dr. Renato Levi Pahim, para a Conclusão de Curso de Jornalismo.

São Paulo, 2014 2


“O som é o inevitável no cinema” Lucrécia Martel

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AGRADECIMENTOS

São muitas as pessoas que me ajudaram de maneira indireta para que esse projeto acontecesse. Mas aqui, nesse espaço limitado/limitante, deixo meu profundo MUITO OBRIGADA àqueles que acreditaram na ideia e me ajudaram a construí-la diretamente:

Ao meu orientador, Renato Levi, que topou assim de cara costurar comigo esse documentário;

Às integrantes da banca, Angélica Muniz Valente e Lívia Motta, tão pacientes na espera de poder entender o que quis dizer com o projeto;

Ao meu namorado, Otavio Carvalho. Sem ele, não haveria tanto e tão bom som nesse trabalho. E nem em minha vida;

À minha família. Mãe, pelo apoio eterno. Chico, pelas ideias e correções. Márcia e Pilar, por terem aberto casa e coração;

Aos amigos que contribuíram com grandes sacadas, correções e traduções: Luiza Coelho, Nora Benevides, Philipe Damasio Figueiredo, Daniela Bernardi, Tais Hirata, Clara Roman, Frederico Zanatta, Rodrigo Fuji, Meno Del Picchia, Raphael Zarella e Jonathan Brito;

Ao pessoal da OSCIP Mais Diferenças, especialmente Pedro Berti e Ana Rosa Bordin, pelas muitas conversas que se desdobraram em tantas contribuições;

À Fundação Dorina Nowill, em especial Maria Regina Lopes, Flavio Coelho, Cléo Acevili, Daniel Lima e Filipe Pereira, por todo o trabalho a que se prestaram para me ajudar;

Ao 47º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em nome de Marcos dos Santos, Simone Spíndola e Tiago Secura. E em especial à Dolores Tomé, sua equipe de acessibilidade e sua turma de espectadores ultra-participativa;

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À Laure Bacque e Cleo Araujo, por abrirem as portas do cinema Reserva Cultural;

Aos responsáveis pela Paróquia Santo Agostinho;

Ao Canal Futura, ABTU e Globo Universidade por acreditarem na ideia e permitirem que ela fosse financiada e divulgada por todo o Brasil;

E por último, mas imensuravelmente cruciais, aos meus entrevistados. Sem vocês, nada haveria. Antonio Balbino, Bell Machado, João Júlio Antunes, Irineu da Costa Cruz, Luis Mauch, Mario Fiorani, Markiano Charan Filho (e sua mãe d. Maria), Milene Cristina, Mirco Mencacci (e sua esposa Cecilia) e Rubens Rewald.

Termino meus agradecimentos com um trecho do poema Sobre Importâncias de Manoel de Barros, xará que tanto soube traduzir em palavras o que se vê e o que se sente: Um fotógrafo-artista me disse outra vez: Veja que pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais importante do que o sol inteiro no corpo do mar. Falou mais: (...) Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.

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RESUMO

O documentário Escute... – Sobre Cegueira e Cinema tem como objetivo discutir as relações entre o cinema e as deficiências visuais. Aborda a maneira com que as obras audiovisuais são apreendidas por pessoas com deficiência visual, além de apresentar reflexões sobre a própria visão, a indústria cinematográfica e a audiodescrição, um recurso de acessibilidade que descreve detalhes relevantes de elementos visuais.

Palavras-chave: deficiência visual; cinema; audiodescrição

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SUMÁRIO

IDEIAS INICIAIS _______________________________________________________________ 8 Sobre imagem e áudio no cinema _______________________________________________________________ 9 Sobre cegueira e visão ________________________________________________________________________ 13 Sobre audiodescrição _________________________________________________________________________ 15

ESCUTE... ___________________________________________________________________ 18 Sinopse _____________________________________________________________________________________ 18 Ficha Técnica ________________________________________________________________________________ 19 Personagens _________________________________________________________________________________ 20

MEMORIAL __________________________________________________________________ 21 BIBLIOGRAFIA E FILMOGRAFIA _______________________________________________ 29 APÊNDICE ___________________________________________________________________ 32 Perguntas ___________________________________________________________________________________ 32

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IDEIAS INICIAIS

Eram os anos 30, de seca, Lampião e cantoria. Em suas andanças pelo sertão nordestino, o repentista Aderaldo Ferreira de Araújo carregava na mala um gramofone e um projetor de filmes. Parava nas cidadezinhas para fazer exibições de filmes mudos, musicando e narrando o que era projetado. À época, tinha em torno de cinquenta anos. Não enxergava desde os dezoito. Com a alcunha de Cego Aderaldo, é considerado um dos mestres da poesia popular nordestina.

Não há um marco oficial que estabeleça quando a relação entre cinema e cegueira teve início. Mas é bem possível especular que já nas primeiras exibições do cinema mudo, na virada do século 19 para o 20, havia alguém sussurrando detalhes das imagens em movimento ao pé do ouvido de uma pessoa com deficiência visual. Aliás, de acordo com Machado (1997), “as primeiras imagens cinematográficas eram consideradas ‘confusas’ demais (...) para um público ‘virgem’, de formação pequeno-burguesa”, e por isso eram necessários “conferencistas” que tinham como principal função explicar o filme, orientar o olhar para os pontos importantes da imagem no desenvolvimento da narrativa. Para ele, a arte cinematográfica seria muito mais sonora em sua concepção do que se imagina.

Foi a partir do meu interesse em investigar as propriedades e interferências do som no cinema que decidi trabalhar com um público que eu já sabia que frequentava as salas de exibição e dependia exclusivamente do áudio para assistir1 a um filme. As pesquisas iniciais a respeito da deficiência visual e do audiovisual acabaram me levando também a questões sobre a própria visão, a indústria cinematográfica e a Audiodescrição (AD), um recurso de acessibilidade que traduz imagens em palavras – como já o faziam à sua maneira, Cego Aderaldo e os conferencistas do chamado Primeiro Cinema.

Além do registro das falas, ideias e percepções dos entrevistados, o documentário é também baseado em metáforas visuais e sound design especialmente criado para contextualizá-las. O material também foi audiodescrito, não só para torná-lo acessível mas para que pessoas videntes pudessem ter contato com o recurso. Com base na literatura consultada para realizar o trabalho, optei por utilizar o verbo “assistir” em vez de “ver”, para ressaltar que outros sentidos além da visão compõem a experiência com um filme. 1

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Sobre imagem e áudio no cinema

Não foram poucas as vezes que ouvi que o áudio seria a área menos privilegiada em produções cinematográficas. Autores como Mary Ann Doane e Noël Burch fazem parte dos teóricos que apontam a subutilização do som na estrutura narrativa de filmes, ao longo da história do audiovisual. Para Burch (2011), mesmo os filmes mais ousados do cinema contemporâneo apresentam trilhas sonoras medíocres, que não estão à altura da riqueza que a música é capaz de prover. Essa “deficiência” seria resultado da própria definição do cinema, como arte essencialmente visual. Chion (1994) diz que um filme mudo é tão legítimo quanto um filme sonoro. Seria possível dizer o mesmo de um filme sem imagens? Para ele, mesmo experiências como Wochenende (Walter Ruttman, 1931) na qual uma trilha sonora foi aplicada em uma película virgem revelada sem exposição, não poderiam ser consideradas como cinema. Estariam mais próximas do rádio ou mesmo da música concreta.

Essas reflexões cruzam com parte das minhas indagações a respeito da experiência cinematográfica que os cegos têm. Há filmes (seriam filmes?) como Blue (Derek Jarman, 1993) e Branca de Neve (João César Monteiro, 2000) que não têm imagens em movimento, mas foram exibidos em salas de cinema.

No caso do último, o espectador é confrontado com uma tela preta durante quase todo o tempo. Em artigo sobre o filme, Andrade (-) afirma que a tela escura é, na realidade, o registro de três formas de opressão: da tela do cinema pelo projetor, do espectador pela tela e da tela pelo nosso olhar. Também diz que com esse “vácuo”, o diretor estaria querendo revelar a beleza e encanto do texto e falas, como se isso fosse suficientemente rico para o espectador. Lendo opiniões postadas por espectadores no site IMDb.com (Internet Movie Database), muitos afirmaram que estar diante de uma tela que não se altera seria permitir que a imaginação faça o trabalho de criar as cenas. Outros criticaram a ausência de imagens dizendo que, dessa forma, não há filme ou até que a tela escura o torna “inassistível”, “claustrofóbico”.

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Quanto à Blue, foi o último filme do artista Derek Jarman, quando sofria com as consequências da AIDS, o que incluiu a perda de sua visão e reflexões sobre sua morte iminente, sua ausência e sua invisibilidade perante o mundo e a si mesmo. Ele registrou tudo em película, 35mm: uma imagem azul – como a última cena que ele mesmo viu -, perpétua, e efeitos sonoros que incluem a narração não-linear de diversas vozes sobre situações relacionadas a seu estado terminal. “Do fundo do seu coração, reze para ser libertado da imagem. (...) Ela é uma prisão para a alma, sua herança, sua educação, seus vícios e aspirações, suas qualidades, seu mundo psicológico”. Esses são trechos extraídos do filme. Para Jarman, apresentar uma tela inteira azul aos espectadores seria também uma alternativa ao pandemônio de imagens em que vivemos. Seria como abrir a porta da alma a infinitas possibilidades que poderiam se tornar tangíveis. Um estímulo à visão da mente, para o crítico Martin Teller (2014).

[Blue é] um cinema que transcendeu suas próprias imagens. Eventualmente o efeito da monótona tela azul seria como estar dentro da cabeça de Derek Jarman, vendo o que ele vê (nada), ouvindo o que ele ouve, tanto por fora quanto por dentro (...). (MINIMA, -. Tradução minha2)

Quando estava entrevistando meus personagens, fiz questionamentos relacionando a cegueira a essas experiências cinematográficas ou a vendar os olhos, como algo que seria capaz de colocar um vidente na mesma situação que um cego. Todos foram enfáticos em dizer “não!”. Em suma, para eles, a sensibilidade e repertório perante o áudio são diferentes para quem não enxerga. Mas em nenhum momento disseram que o fato de irem ao cinema sem enxergar tornaria a experiência algo diferente de assistir a um filme.

Isso me levou a refletir sobre a questão das condições psicológicas do ambiente cinematográfico, sobre a importância dessa experiência como ato social e, principalmente, sobre o papel crucial do som no filme.

A explosão do cinema como fenômeno predominantemente auricular (em vez de visual), está naqueles gêneros musicais que foram esquecidos pelas histórias do cinema, mas que tiveram alcance e repercussão em sua época e cuja memória é necessária recuperar para contrapor um ponto de vista mais complexo àquela concepção catastrófica sobre um pretenso fracasso do cinema como arte sonora, ou 2

A cinema that has transcended its own images. Eventually the effect of the droning blue screen is that you are inside Derek Jarman´s head, seeing what he sees (nothing), hearing what he hears, both outside and inside (…).

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àquela concepção preconceituosa de uma suposta natureza visual do cinema (MACHADO, 1997)

O autor faz referência ao início do cinema sonoro – dotado de som gravado e sincronizado à imagem – que essencialmente se voltou ao registro de curtas performances musicais, sejam as de artistas populares, óperas ou sinfonias orquestrais. Esse fato tem ligação com a criação do fonógrafo por Thomas Edison, em 1877, invenção revolucionária mas, à época, incompleta. Para o público, escutar algo sem uma referência visual era uma experiência estranha. Foi isso que motivou a busca por uma tecnologia capaz de não só gravar sons, mas também registrar visualmente de onde eles eram produzidos. “Nos primórdios do fonógrafo visual, o cinema simulava a sala de concertos”, diz Machado (1997). Como não havia maneiras de editar o disco onde o som era gravado, se houvesse algum erro todo o material era jogado fora. Por isso, a maior preocupação na hora do registro era o áudio. A imagem, na maior parte das vezes em um plano fixo e bem simples, era limitada pelo tempo de execução da música. Mesmo no caso do cinema dito “mudo”, ao longo de seus 30 anos de história ele sempre foi acompanhado de um enorme aparato que o tornava audível: instrumentistas, cantores e até orquestras inteiras que executavam partituras musicais pensadas para sua exibição. A sonoplastia era executada ao vivo, em espaços projetados para isso. Não apenas música, mas efeitos sonoros e dublagem de vozes. Nem mesmo com a adesão das técnicas de gravação sonora aos filmes de longa-metragem – até então mudos - a ideia de um “cinema de adesão irrestrita à música, de supremacia da trilha sonora, continuaria viva na imaginação cinematográfica, produzindo coisas como (...) Entuziazm (1930) de Dziga Vertov e Fantasia (1940) de Walt Disney” (MACHADO, 1997).

No entanto, é inegável a importância que a imagem cinematográfica foi adquirindo ao longo das décadas. Os avanços tecnológicos permitiram inovações narrativas, melhores resoluções, maior apuro na direção de arte e fotografia. O áudio passou a coadjuvante da discussão, quase sempre percebido em sincronismo com a imagem de sua fonte. Para Flores (2007), os sons, quando apresentados dessa forma, são suscetíveis de serem reduzidos a meros efeitos de redundância, resultando numa insistência dos mesmos significados que a própria cena traz.

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Mas será que os avanços na captação da imagem também não teriam sido acompanhados por ganhos no áudio? O sound designer de cinema Mirco Mencacci, que também é cego e participa do documentário, afirmou em uma das entrevistas que as tecnologias permitem cada vez mais se debruçar sobre a espacialidade no som. Ajudam a trabalhar com mais precisão a altura, direção, profundidade, camadas e composição da trilha sonora. Esta “topografia sonora” que dá tridimensionalidade à imagem plana da tela, teria suas raízes na própria experiência cotidiana que temos com o som, que nos chega por todos os ângulos e nos ajuda em nossa localização e no dimensionamento dos ambientes (PESSOA, 2011).

No entanto, de nada adiantam os avanços tecnológicos se as próprias relações de trabalho dentro da rotina de produção de uma obra não se modificam. Segundo Eikmeier (2010), sonoplastas e músicos costumam aparecer só no final, quando a história já está pronta, gravada. No próprio roteiro não costumam aparecer referências a questões sonoras. Mesmo os sets são construídos sem grandes preocupações com a captação do áudio - iluminação que gera ruídos e gerador muito próximo são situações recorrentes.

Para Chion (1994), nossa relação com os sons no cinema não apenas está como é subordinada pela imagem, o que justificaria o desconforto causado pelas imagens que não se relacionam de maneira imediata ao som, não-diagéticas. E vice-versa. No entanto, seria por meio de uma “incongruência com o que vemos e ouvimos, na qual o som não dialoga diretamente/ sincronicamente com o que vemos, que haveria a justaposição de novos sentidos, de contrapontos” (PIPANO, 2011).

Uma vez que a conexão som e imagem faz parte do cinema de forma orgânica, a experimentação de formas, estilos e propostas poéticas deve incluir o material sonoro como elemento passível e potente de articulações expressivas, assim como os elementos imagéticos. (PESSOA, 2011).

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Sobre cegueira e visão

Antes da fotografia, do cinema e da televisão, os livros e a cultura oral dos contadores de histórias permitiam que a imaginação criasse as imagens. Hoje, em tempos de globalização, busca-se o frisson da “experiência real”, a sensação de interatividade, de ser simultaneamente ator e espectador em eventos de todas as naturezas ao redor do mundo. O ímpeto de imaginar o que nunca foi visto ou o que não se pode ver vem se perdendo. (MAYER & SÁ, 2009)

Segundo dados do Censo Demográfico 2010, 45,6 milhões de pessoas - ou 23,9% da população brasileira – declararam ter algum tipo de deficiência. Dentre todas, a mais comum é a visual. São 35,7 milhões de pessoas (18,7% da população) convivendo diariamente com alguma deficiência visual. Dessas, aproximadamente 506 mil são incapazes de enxergar e outras 6 milhões de pessoas possuem grande dificuldade permanente de enxergar - a chamada baixa visão.

A deficiência visual engloba um universo grande de especificidades. Há a perda total e a parcial da visão. Ela pode ser congênita ou adquirida – e essa também depende da idade em que ocorre. Também distingue-se em dois grupos: baixa visão ou visão subnormal – quando há comprometimento do funcionamento visual dos olhos mesmo após tratamento e correção – e cegueira – a pouquíssima capacidade de enxergar, ou perda total da visão.

Há ainda casos como a agnosia visual, na qual a deficiência não está ligada a algum problema nos olhos. São pessoas que têm acuidade visual, percepção cromática e outras capacidades cognitivas intactas, mas que são incapazes de reconhecer ou identificar determinadas coisas que veem, por conta de algum problema no processamento cerebral da informação. A dislexia – ou “cegueira para palavras” –, por exemplo, entraria nesse grupo.

A comunidade científica credita à visão o título de sentido mais desenvolvido dos primatas. Segundo Imbiriba et al. (2010), seria a porta de entrada pela qual uma parcela significativa do conhecimento nos chega. No entanto, a ausência ou a perda desse sentido não deve ser vista como um fator limitador na forma como as pessoas se relacionam com o mundo. O corpo humano, em especial o cérebro, é capaz de compensar parte dessa deficiência.

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A chamada plasticidade neuromodal é uma propriedade intrínseca desse órgão, que capacita o sistema nervoso a adaptar-se a pressões ambientais, mudanças fisiológicas e experiências variadas (PASCUAL-LEONE et al, 2005). Seria o caso de pessoas cegas, que utilizam áreas cerebrais comumente associadas ao processamento de informações visuais para outras funções, como o tato e a audição.

Essa plasticidade é surpreendentemente eficiente. Segundo Pascual-Leone et al (2005), bastariam cinco dias de olhos vendados para que sujeitos videntes passassem a recrutar o córtex visual primário para o processamento tátil e auditivo, de modo semelhante ao que pessoas com deficiência visual fazem. A diferença é que essas mudanças funcionais seriam mais reforçadas e muitas vezes, irreversíveis, no caso de alguém privado da visão por muito tempo. Não à toa, comumente cegos possuem uma memória verbal e uma audição mais aprimoradas.

Há evidências crescentes de que são extraordinariamente ricas as interconexões e interações das áreas sensitivas do cérebro, portanto é difícil dizer se alguma coisa é puramente visual, puramente auditiva ou puramente qualquer coisa. O mundo dos cegos pode ser especialmente rico desses estados intermediários — o intersensitivo, o metamodal —, estados para os quais não possuímos uma linguagem comum. (SACKS, 2010)

Como será que o cérebro de uma pessoa com deficiência visual reage frente ao audiovisual? Essa maior percepção auditiva seria responsável por uma experiência diferenciada em uma sala de cinema? Apenas o sentido da audição seria estimulado? Essas são algumas perguntas que levantei nas entrevistas do documentário.

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Sobre audiodescrição

A maior parte das pessoas com deficiência visual está excluída do cenário cinematográfico. São inúmeros os motivos. A começar pela própria família, que muitas vezes trata a deficiência como um impeditivo para uma vida social e cultural plena, isolando o indivíduo dentro de casa e privando-o de experiências ricas e socialmente significativas. Pesa também o lado financeiro, pois deficiências em geral têm grande relação com baixo poder aquisitivo e exclusão social (METTS, 2000). A grande concentração de salas de cinema nos centros urbanos também dificulta o acesso para quem mora afastado. Políticas públicas e outras iniciativas que promovam inclusão e autonomia, que facilitem o acesso, também são insuficientes.

Quanto a esse último aspecto, um dos principais recursos de acessibilidade para pessoas com deficiência visual é a Audiodescrição (AD) que consiste basicamente na descrição verbal de elementos visuais, tais como a ação, a linguagem corporal, as expressões faciais, os cenários e os figurinos. No caso específico do cinema, também pode incluir questões técnicas, linguísticas e fílmicas, específicas de cada obra.

A prática de descrever o mundo visual para pessoas não-videntes não é algo recente. Mas apenas na década de 70 ganhou contornos mais acadêmicos, com as ideias desenvolvidas pelo norte-americano Gregory Frazier em seu mestrado. Na década seguinte a AD passou a ser efetivamente utilizada, especialmente nos Estados Unidos e Inglaterra, em algumas peças de teatro, visitas a museus e programas televisivos.

A primeira exibição de filme com AD nos EUA foi Tucker (1988) de Francis Ford Coppola. O trabalho coube ao AudioVision Institute, fundado por seu irmão, August Coppola, juntamente com Frazier. Outras exibições pioneiras foram as de dois trechos de filmes sobre o assunto, no Festival de Cannes de 1989 e, no mesmo ano e também na França, Indiana Jones e a Última Cruzada (1989).

No Brasil, o recurso foi utilizado em público pela primeira vez em 2003, no Festival Internacional de Filmes “Assim Vivemos”. Em 2005 chegou ao mercado, em DVD, o primeiro filme audiodescrito do país, Irmãos de Fé (Moacyr Góes, 2004), seguido pelo DVD do filme

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Ensaio Sobre a Cegueira (Fernando Meirelles, 2008). A procura pela AD tem aumentado nos últimos anos, especialmente nos circuitos de festivais e mostras de cinema. No entanto, o recurso ainda é desconhecido por parte da própria população com deficiência visual e ainda não está amplamente disponível, especialmente pela quase ausência de políticas públicas que estimulem sua utilização. Para David et al (2012), a ausência de filmes audiodescritos nos circuitos de cinema é possivelmente uma das fortes causas do desinteresse de muitos cegos por esta arte.

Os especialistas admitem que nenhuma AD é capaz de contemplar as preferências de todos os espectadores. Em tese, a descrição é um processo infinito, mas nem tudo que poderia ser descrito, o será. Desse modo, uma pergunta que ressoa insistentemente durante o processo de elaboração da audiodescrição de um filme diz respeito ao que é relevante de ser descrito. A instrução ‘descreva o que você vê’, regra frequentemente ensinada no treinamento de audiodescritores, não responde à pergunta. (DAVID et al, 2012)

No entanto, apesar das inúmeras possibilidades para se audiodescrever um filme, há algumas orientações cruciais que os audiodescritores devem manter em mente. Primeiramente, a AD deve ser pensada como um recurso que interfira o mínimo possível na obra. Por isso, deve-se evitar algumas situações, como sobrepor as descrições às falas dos personagens, antecipar situações do filme, desfazer ambiguidades propositais, exagerar na quantidade de descrições, descrever por meio de interpretações que atribuam juízos de valor. Respeitar a linguagem própria do filme e permitir que o espectador tenha contato com a trilha sonora original e com os silêncios do filme é muito importante. Afinal, todo filme possui múltiplos planos de sentido e comporta diferentes interpretações. O espectador com deficiência visual não pode ser privado disso. O ideal também é que o próprio processo de criação da AD inclua o público a que se destina, com a consultoria de pessoas com deficiência visual devidamente preparadas.

Além da autonomia, a AD também auxilia na aquisição de conhecimentos sobre o mundo visual, especialmente aqueles ligados a normas de interação social, como a linguagem corporal, estilos de roupa, etc. (PACKER, 1996). O cinema, por si só, é uma ferramenta de inclusão social por retratar a cultura dos países, revelar sua arte e sua política. Conjugada à filosofia, ajuda a pessoa com deficiência visual a refletir, a reconstruir seus conceitos e a ampliar seus interesses. (MACHADO, 2010)

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De acordo com Motta e Filho (2010), não é apenas o publico com deficiência visual que se beneficia do recurso. Ele aumenta o entendimento de outros grupos, como pessoas com deficiência intelectual, idosos, disléxicos, autistas e analfabetos.

Os países que atualmente mais investem em AD são os Estados Unidos, Inglaterra, França, Espanha, Alemanha, Bélgica, Canadá, Austrália e Argentina (FRANCO E DA SILVA, 2010).

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ESCUTE...

Sinopse

A experiência de um cego que é cineasta. Um cinéfilo que deixou de frequentar o cinema depois de perder a visão. O casal com deficiência visual que não vê qualquer impedimento para deixar de frequentar. A reação de cegos a filmes audiodescritos. Este é um documentário sobre percepções de pessoas com deficiência visual a respeito de estética, imaginação e sentimentos no cinema.

Também são discutidas questões sobre o cinema como espaço social e cultural, o funcionamento perceptivo e cerebral de videntes e cegos, além de tecnologias e impasses da chamada Audiodescrição – um recurso que descreve detalhes relevantes de imagens para quem não as vê.

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Ficha Técnica

Escute... (HD, 48 min, 2014) Direção, Produção, Roteiro e Fotografia Manoela Meyer Fotografia Adicional Otávio Carvalho Som Direto Manoela Meyer e Otávio Carvalho Trilha Sonora Kezo Nogueira, Meno Del Picchia, Otávio Carvalho e Rodrigo Fuji Edição de Som Otávio Carvalho Montagem e Finalização Manoela Meyer Roteiro de Audiodescrição Ana Rosa Bordin Rabello e Manoela Meyer Narração de Audiodescrição Benedito Sverberi e Raphael Zarella Legendas Giselle Lima e Manoela Meyer Intérprete de LIBRAS Félix Oliveira Janela de LIBRAS Paulo Castro Tradução Italiano/Português Damasio Figueiredo, Frederico Zanatta e Nora Benevides Performance sensorial Luiza Coelho

Entrevistados Antonio Balbino Bell Machado João Júlio Antunes Irineu da Costa Cruz Luis Mauch Mario Fiorani Markiano Charan Filho Milene Cristina Mirco Mencacci Rubens Rewald

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Personagens

Na ordem em que aparecem no filme:

João Julio Antunes, 48 anos, cego desde os 30. Cineasta e consultor de audiodescrição. Mora em Brasília.

Markiano Charan Filho, 50 anos, cego desde bebê. Diretor da ADEVA (Associação de Deficientes Visuais e Amigos). Mora em São Paulo.

Mirco Mencacci, 53 anos, cego desde os quatro. Sound designer de música e cinema. O filme Vermelho Como o Céu (Cristiano Bortone, 2006) é inspirado em sua vida. Mora em Lari (Itália).

Irineu da Costa Cruz, 48 anos, cego desde os 44. Engenheiro aposentado. Mora em São Paulo.

Milene Cristina, 37 anos, baixa visão de nascença. Formada em Rádio e Televisão, cantora e consultora de audiodescrição. Mora em São Paulo.

Luis Mauch, fundador da OSCIP Mais Diferenças, que trabalha com inclusão das pessoas com deficiência. Mora em São Paulo.

Bell Machado, filósofa, professora de história do cinema e audiodescritora. Mora em Campinas.

Mario Fiorani, neurocientista da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), especialista em visão. Mora no Rio de Janeiro.

Rubens Rewald, professor de roteiro do Curso Superior do Audiovisual da USP (Universidade de São Paulo) e cineasta. Mora em São Paulo.

Antonio Balbino, cineasta. Mora em Brasília.

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MEMORIAL

Escute... foi idealizado em 2013, a partir de reflexões sobre a importância do som para o cinema, como anteriormente descrito. A pesquisa ocorreu durante o primeiro semestre de 2014, as filmagens entre julho e outubro e a pós-produção durante outubro e novembro do mesmo ano. O documentário foi filmado em São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Brasília (DF) e Campinas (SP).

As entrevistas foram conduzidas de acordo com um roteiro de perguntas, específico para cada personagem, mas tendo como base os temas abordados na parte introdutória do trabalho (um exemplo de roteiro de perguntas encontra-se no apêndice). Inicialmente não havia um roteiro geral. A estrutura narrativa do documentário foi criada apenas a partir da decupagem do material gravado. Além das entrevistas, o trabalho inclui trechos autorizados de obras audiovisuais e recursos de acessibilidade – no caso, AD e closed caption.

O processo de decupagem e organização do material foi feito um pouco "às cegas". Editei inicialmente com base nas vozes, e não nas imagens. As transcrições de todas as entrevistas foram usadas para construir um primeiro roteiro. Após isso, coloquei cada um dos trechos selecionados na timeline de edição e passei a apenas escutá-los, desligando a banda de imagem. Minha intenção ao fazer isso era que a narrativa estivesse fortemente vinculada ao que era dito, mesmo correndo o risco de selecionar cenas mal captadas. Entonações, sotaques, ruídos, pausas, respirações, escolha de palavras. Foi isso que considerei como essencial. O trabalho só não foi completamente “cego” porque eu já conhecia previamente o material – áudio e vídeo.

Só depois desse primeiro corte é que voltei a atenção para a imagem em si. Em parte porque também queria encontrar trechos visuais, sem fala, que pudesse usar como “imagem de cobertura” para os momentos de AD – isso porque tive dificuldade para encontrar soluções que permitissem incluir esse recurso de acessibilidade ao filme, sem quebrar seu ritmo, sem torná-lo didático ou estranho.

No entanto, em muitos momentos eu percebia que tendia a buscar a melhor imagem, em detrimento do próprio conteúdo, daquilo que realmente havia proposto como importante para o

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discurso do filme. Foi um processo de confronto com meus próprios critérios, que dessa forma comprovei serem ainda tão apegados à estética.

Entendi também que não seria possível experienciar um filme da mesma forma que um cego. Ao fechar meus olhos, não conseguia excluir as imagens da mente. Ela continuava lá, em parte porque estou fadada a sempre tentar formar uma imagem mental a partir de tudo que ouço/cheiro/sinto. Como vidente, estou em constante busca da visualidade do invisível. Porque me parece que é dessa forma que funcionamos, subordinados à primazia visual. No entanto, com relação à apreensão de nossas experiências, recorro à reflexão sugerida pelo neurocientista Mario Fiorani, no documentário, de que, no fim, tudo não passa de conceitos. Tanto para o vidente, quanto para o cego. É o conceito de um filme, por exemplo, que fica registrado na mente. Com certeza ter passado por esse processo de montagem “às cegas” me deixou mais perceptiva, mais sensorial. O áudio ganhou outra dimensão. Nos momentos em que há ausência de imagens, por exemplo, tentei permitir que o espectador multiplicasse suas maneiras de experienciar o filme através da trilha sonora. Optei em trabalhar a trilha sonora com base em ruídos – ou seja, tudo que não é voz nem música. Destaco um momento em especial do trabalho que foi um dos responsáveis pela minha maior atenção à riqueza dos sons ambientes. Durante a conversa na cozinha, quando Markiano explicava sobre a importância de ouvir os tiros sendo disparados nas celas, no filme Carandiru (Hector Babenco, 2003), torcedores do Brasil começaram a soltar fogos de artifício por causa do início de um dos jogos da Copa do Mundo. Parecia algo combinado. Fogos que lembravam tiros. Enquanto filmava e escutava tudo aquilo acontecendo, ficou claro para mim como ruídos poderiam também responder por sentidos dramáticos. Mesmo nesta situação, em que tudo não passava de uma feliz coincidência.

Usei especialmente o trabalho e reflexões do artista e estudioso estadunidense John Cage (1912 – 1992) para construir essa atmosfera sonora do filme. Além de sua música experimental, que utiliza objetos, sons e instrumentos de maneiras não convencionais, me chamou atenção suas próprias impressões sobre seu trabalho. A título de exemplo, cito uma sobre sua obra mais emblemática, a 4’33”:

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Não há o tal do silêncio. O que eles pensavam que era silêncio [em 4’33”], porque eles não sabiam como ouvir, estava cheio de sons acidentais. Você podia ouvir o vento agitando lá fora durante o primeiro movimento [na estreia]. Durante o segundo, pingos de chuva começaram a cair no telhado, e durante o terceiro as próprias pessoas fizeram todo tipo de sons interessantes enquanto conversavam ou saíam. (KOBLER, 1968. Tradução minha3)

A captação do documentário foi feita em double system (som e imagem registrados em suportes independentes). No caso do som direto, foi primordialmente feita por meio de microfone direcional [the t.bone EM 9900] sustentado por boom, conectado a um gravador digital portátil [Zoom H-4N]. Apenas as entrevistas de Mario Fiorani e Rubens Rewald foram captadas com microfone de lapela com fio [Audio-Technica ATR3350]. No caso de Mirco Mencacci, entrevistado via Skype, a captação foi feita por um gravador digital [Sony IC Recorder] conectado ao computador. A preferência pela captação por microfone direcional com boom deu-se por conta da melhor capacidade de manter o timbre original de voz; menor risco de ruídos (lapela capta mais facilmente ruídos como o atrito da roupa do entrevistado, por exemplo); possibilidade de manter o entrevistado mais à vontade, sem equipamentos presos a ele; e da espacialidade, por capturar com mais naturalidade características acústicas do ambiente. A edição do áudio foi feita inteiramente no Pro Tools.

Quanto à imagem, foram usadas duas câmeras DSLR: Canon EOS Rebel T3i com lente Tamron AF 17-50mm F/2.8 e Panasonic Lumix GH4 com lente Panasonic Lumix G X Vario 1235mm F/2.8. Para a filmagem eram usadas à mão ou apoiadas em tripé. A edição foi feita no Adobe Premiere CS6 e o tratamento de cor no DaVinci Resolve 11.

A AD e o closed caption foram elaborados com a colaboração de profissionais da OSCIP Mais Diferenças. Para a inclusão das legendas, o software usado foi Subtitle Workshop. A captação das vozes dos narradores foi feita no estúdio Submarino Fantástico, em São Paulo.

No caso específico da AD, minha intenção era de que ela não fosse tratada como um recurso “à mais”, mas que fizesse parte da própria estrutura narrativa do filme. Esse pressuposto é colocado There’s no such thing as silence. What they thought was silence [in 4’33”], because they didn’t know how to listen, was full of accidental sounds. You could hear the wind stirring outside during the first movement [in the premiere]. During the second, raindrops began patterning the roof, and during the third the people themselves made all kinds of interesting sounds as they talked or walked out. 3

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em prática logo no começo do filme, com a inclusão da AD das imagens que supostamente acompanhariam os relatos iniciais. A tela preta, com apenas pequenos flashes, foi também a estratégia que encontrei para forçar os espectadores videntes a se concentrarem apenas na narração, para que estivessem igualados em termos de recursos aos espectadores com deficiência visual, para que também tivessem a tarefa de imaginar, de completar os espaços sugeridos pelo áudio. Outra tática usada foi a de não incluir os créditos dos personagens em barras de GC (Gerador de Caracteres), mas sim, incorporadas à AD.

Durante a elaboração do roteiro e edição do material, intervalos silenciosos foram incluídos especificamente para a AD. Entretanto, há alguns silêncios que foram mantidos sem narração, pela questão dramática. Esse processo de escolha, entre o que deveria ou não ser audiodescrito foi revisto durante a roteirização da própria AD, com a orientação da audiodescritora Ana Rosa Bordin. Cito como exemplo a cena em que Markiano interrompe sua resposta para perguntar se o fato de terem acendido a luz não atrapalharia a gravação. Após a pergunta, ele fica em silêncio, sem retornar a seu raciocínio anterior. Esse silêncio era muito importante e simbólico, e a ideia original era que fosse mantido sem AD. Ana Rosa questionou, dizendo que esse momento silencioso não diria nada para um espectador cego, se ele não fosse informado de que a tela continuava mostrando Markiano. Tive que concordar.

Em suma, foi muito desafiador lidar com descrições como substitutos das imagens. Afinal, até que grau elas são equivalentes, suficientes? E, no fim, será que isso importa? Desde o início do projeto mantive uma enorme curiosidade sobre como a imaginação das pessoas com deficiência visual atuaria em cenas sem diálogos, como preencheriam as lacunas, como costurariam sentidos. Como construiriam seu conhecimento com base em elementos que não podem tocar?

Todas essas questões nortearam parte de minhas perguntas. E, a partir delas, obtive respostas confrontadoras, como as da audiodescritora Bell Machado: A gente tem um problema muito grande que é – e isso se aplica em todas as esferas – querer saber exatamente como é que a pessoa cega imaginou aquilo que eu estou descrevendo. Mas isso é um problema meu. Assim como eu contar uma história pra você, que enxerga, você vai imaginar isso do seu modo. Então é claro que tem que ter uma objetividade, você tem que ter um respeito. Mas não interessa como o outro vai imaginar, se vai ser exatamente do jeito que eu estou aqui explicando, do jeito que essa imagem está aqui. (ESCUTE..., 2014)

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***

Por ser adepta da ideia de que um documentário não é a realidade em si, mas uma representação/reflexão sobre a mesma, procurei também explorar elementos e composições que pudessem levar o espectador a uma experiência mais sensorial, mais condizente com os discursos dos personagens. Isso fica mais explícito na montagem feita com o filme Los Guardo di Michelangelo (Michelangelo Antonioni, 2004) e cenas que captei do interior da Paróquia Santo Agostinho, em São Paulo, como representação das camadas de som construídas por Mirco Mencacci para a trilha do filme de Antonioni. Ou na sequência de imagens em close de partes do corpo, enquanto os personagens refletem sobre percepção e sentidos. Para Guimarães (2007), “não é o cineasta que faz o filme, mas o filme que faz o cineasta. Ao fazer um filme, algo está nos fazendo e algo está se fazendo para além de nosso fazer”. Para mim, essa frase expressa boa parte de todo o processo de Escute.... Desde o início estive disposta a rever/repensar personagens e assuntos que seriam tratados, a qualquer momento. A linha condutora seria a percepção diante do cinema, e isso trouxe uma grande complexidade de assuntos. E de maneiras de trabalhar.

A construção do roteiro se pautou primordialmente nos personagens com deficiência visual. Com base em suas ideias fui costurando o discurso dos outros participantes. São os deficientes visuais que abrem o documentário, com sucintas impressões a respeito do tema principal do trabalho. Logo depois, seguem-se cenas mais extensas sobre cada um deles, para só então os outros personagens serem apresentados.

Nunca havia tido contato com pessoas com deficiência visual. Inicialmente achei que o trabalho correria de maneira usual. Mas o fato de estar lidando com personagens que, por exemplo, não sabem quando estou ou não gravando algo – até que sejam informados por mim – foi suficiente para alterar algumas abordagens. Alguns momentos que recordo incluem as Autorizações de Uso de Imagem, que exigiam a presença de alguém de confiança que pudesse ler e indicar onde o participante deveria assinar; a explicação de onde e para onde olhar ao longo da conversa; uma interação entre entrevistador e entrevistado durante a gravação que não poderia contar simplesmente com gestos – o que normalmente acontece, para evitar interferências sonoras na captação. Ao mesmo tempo, me surpreendia com determinadas percepções que eles faziam: o ouvido atento para

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os movimentos que denunciavam onde eu estava posicionada, ou interferências como alguém acendendo o interruptor de luz ou tentando desligar um celular que está vibrando.

Faço minhas as palavras dos diretores do documentário John Hull: Notes on Blindness (Peter Middleton e James Spinney, 2013): “Como cineastas também achamos que abordar este material [narração em fitas cassetes de John sobre sua cegueira] em um meio visual era uma iniciativa parcialmente paradoxal”4 (MIDDLETON & SPINNEY, 2013). Sempre perguntava aos meus entrevistados com deficiência visual sobre o que achavam de estar participando de um trabalho audiovisual, se tinham algum conhecimento sobre o assunto, se se importavam com o “estar na tela”. Tentei incluir as respostas sobre essa suposta contradição por todo o documentário – como quando Milene fala sobre fazer um filme que não fosse escuro, mas colorido; ou quando Markiano pergunta sobre para onde deveria olhar quando fosse filmado. Há uma cena em particular, no entanto, que acho emblemática. No primeiro dia em que gravei o casal, o Brasil ia jogar pela Copa do Mundo. Depois de muito papo na cozinha, Markiano e Milene foram para a sala na hora em que o jogo começou. Ligaram a tv para assistir, mesmo com um rádio na cozinha. Perguntei porque fizeram isso. Recebi a seguinte resposta de Markiano:

Não é que eu prefira ver [jogo] pela tv do que pelo rádio. É mais pela questão social, de todo mundo estar junto, assistindo. Até por uma questão de comodidade. Gosto de ficar na sala. Apesar da narração do rádio ser mais completa. Mas dá para ter entendimento do jogo. Depende também do narrador.

*** Sempre que revejo a conversa que tive com o ex-engenheiro Irineu, tenho a sensação de que esta foi a mais representativa em termos de refletir o que a cegueira significa para a maioria das pessoas que a adquirem de maneira tardia.

Não queria que meu documentário tratasse a deficiência visual como uma tragédia, mas era necessário pontuar as dificuldades/limitações que ela traz para pessoas que estão em um mundo tão voltado para a visão. Quando Irineu falou que deixou de frequentar o cinema, mesmo com toda a

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As filmmakers, too, we found that approaching this material in a visual medium was a partly paradoxical enterprise.

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sua família mantendo o hábito; quando puxou conversa sobre a depressão que enfrentou durante os primeiros anos da cegueira, tão recentemente adquirida; quando topou conversar comigo sabendo que seria o único personagem que não estava enfrentando todas as barreiras impostas pela deficiência para fazer seu direito à cidadania valer; quando tudo isso aconteceu, eu concluí que, sim, seu discurso era muito necessário. Porque tudo o que não desejo é que meu documentário passe a ideia de que seja fácil transpor todas essas limitações.

No entanto, achei necessário deixar que as ideias finais do trabalho falassem a respeito de novas apreensões e sobre desafiar-se – seja uma pessoa com deficiência, seja um realizador de cinema - em relação a tudo que nos parece estabelecido. Algo como Sacks (2010) propõe a respeito de John Hull, após ler seu livro autobiográfico: “A cegueira, para ele, tornou-se ‘uma dádiva misteriosa, paradoxal’. Não se trata de mera ‘compensação’, ele ressalta, e sim de toda uma nova ordem, um novo modo de ser humano.”

*** “Quando um olho enxerga outro olho é capaz de ver a si próprio.” (Sócrates segundo Platão, em Alcibiades. Tradução minha5)

Optei por finalizar o vídeo com a minha imagem como uma forma de sinalizar: “sim, essa é a minha versão sobre o assunto”. Não achei necessário incluir a resposta que dei na hora em que Milene me “entrevista”. Até porque a resposta foi repensada tantas outras vezes ao longo desses meses de trabalho, que a maneira mais sintética de apresentá-la seria o filme em si.

Além disso, achei pertinente marcar a presença da câmera como o objeto que tanto interferiu em todo o processo do trabalho. Além da interferência já esperada por ser um equipamento de registro não-cotidiano para a maioria dos entrevistados, no caso específico deste documentário, sua presença precisava ser anunciada muitas vezes, por conta da cegueira de certos personagens. Muitas vezes eu flagrava momentos íntimos, poéticos, que aconteciam porque simplesmente meus personagens estavam mais à vontade, desavisados de que eu e minha câmera estávamos também ali. Sempre que isso acontecia, por uma questão ética, eu tratava de alertá-los sobre minha presença. Não achava justo que não soubessem, quando qualquer pessoa vidente saberia. Afinal, não importa

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Then an eye viewing another eye (…) will thus see itself

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se se enxerga ou não, um entrevistador e uma câmera alteram o discurso, o palavreado, a linguagem corporal, a concentração de quem é registrado.

Para os cegos, as pessoas não estão presentes a menos que falem. Muitas vezes continuo a conversar com um amigo que enxerga e acabo descobrindo que ele não está mais lá. Ele talvez tenha ido embora sem me avisar. Talvez, pensando que a conversa terminou, tenha se despedido com um aceno de cabeça ou um sorriso. Do meu ponto de vista, ele subitamente desaparece. Quando você é cego, uma mão subitamente toca em você. Uma voz subitamente lhe dirige a palavra. Não há uma antevisão, uma preparação. (...) Sou passivo na presença daquilo que me aborda. (...) A pessoa normal pode escolher com quem quer falar quando anda na rua ou no mercado. As pessoas já estão lá para ela; têm presença antes que ela vá cumprimentá-las. (...) Para um cego, as pessoas estão em movimento, são temporais, vêm e vão. Surgem do nada; desaparecem. (HULL, 1991)

O momento em que dois de meus personagens –Markiano e Milene – manipulam meu principal instrumento de trabalho e lançam para mim suas questões sobre o próprio filme, foi um dos mais marcantes. Essa inversão entre entrevistado e entrevistador aparece em muitos outros trabalhos – como “Cabra Marcado Para Morrer” (Eduardo Coutinho, 1984), “Casa de Cachorro” (Thiago Villas Boas, 2001) e “Filme Para Poeta Cego” (Gustavo Vinagre, 2012), para citar alguns – , mas para mim continua sendo algo único e rico. Afinal, o documentário não é só um processo colaborativo entre a equipe. Ele depende dessa relação (muitas vezes íntima, mesmo que efêmera e entre desconhecidos) entre quem está na frente e quem está atrás da câmera. No caso deste trabalho, como realizadora me empenhei para que em todos os momentos os entrevistados estivessem tão à vontade que pudessem, inclusive, sugerir e dar palpites quanto aos temas, cenários e abordagens previamente estabelecidos. Isso me interessava, porque dessa forma conseguiria enriquecer minha pesquisa. Muitas ideias que aparecem no trabalho final derivam dessas trocas. Uma, por exemplo, foi a sugestão de João Júlio Antunes de ser filmado durante o Festival de Cinema de Brasília. Eu sequer sabia que esse evento era audiodescrito há alguns anos, e lá pude conversar com muitos dos envolvidos nesse processo, que me trouxeram ainda mais informações sobre o assunto.

*** Ainda durante a edição do material, o projeto foi selecionado no edital “Curtas Universitários 2014”, promovido pelo Canal Futura, ABTU (Associação Brasileira da Televisão Universitária) e Globo Universidade. A versão que será apresentada, nesse caso, terá apenas 13 minutos de duração. O roteiro está sendo elaborado.

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APÊNDICE

Perguntas

Essas foram as perguntas elaboradas para nortear a entrevista feita com o cineasta João Júlio Antunes, a título de exemplo:

1. Poderia se apresentar e dizer desde quando você é cego? 2. O que é cinema para você? 3. Você frequenta salas de cinema? Como é tratado? 4. Faz diferença assistir a um filme no cinema? 5. Como você descreveria uma sala de cinema? E sua sensação lá dentro? 6. Algum aspecto positivo e algum negativo nessa experiência no cinema? 7. Você acha que cada vez tem mais cegos frequentando cinemas? 8. Desde quando começou a trabalhar com cinema? O que já realizou? 9. Conhece outros cegos que tenham sido ou são cineastas? 10. Como é a reação das pessoas quando você fala com o que trabalha? Já sofreu preconceito ou descrédito? 11. O mercado cinematográfico está aberto para pessoas com deficiência? 12. Você acha que tem algum diferencial por ser cego, ao ver um filme? E ao trabalhar como diretor? 13. Tem alguma coisa que você descobriu sobre o cinema só quando já estava já no set? 14. Você consegue descrever como uma cena vai se construindo na sua cabeça? Os elementos surgem de uma só vez? Aos poucos? 15. Você “enxerga” o filme por imagens, com cores? Há rostos, há cenários preenchidos? 16. O que é cor para você? Como lida com essa questão na hora de filmar? 17. O que é o belo para você? 18. Quando você ouve uma audiodescrição, como ocorre a montagem da cena na sua cabeça? (Os elementos aparecem em algum contexto? Soltos no espaço? Apenas o que é

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descrito aparece ou você consegue resgatar imagens anteriormente descritas para compor a nova cena? Elementos como luz e cor também aparecem?) 19. Como você lida com a audiodescrição de coisas que às vezes não conhece? 20. Como o mercado enxerga a audiodescrição? 21. Você já assistiu a algum filme com poucos diálogos, sem audiodescrição? Como lida com isso? 22. O que é o silêncio nos filmes para você? O que acontece em sua mente quando há intervalos entre falas ou trilha? 23. Só fechar os olhos seria suficiente para um vidente ter uma experiência parecida com a sua, ao assistir a um filme? 24. Conseguiria propor uma experiência que possa transmitir como é estar no SEU lugar para quem vai assistir a esse documentário? 25. Por que você topou participar do documentário? 26. Como você imagina que esse documentário vai ficar?

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