guerra fria
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História em Foco, Ano 6 - nº 15 - 2019
A corrida espacial, armamentista e cultural do conflito
2
Crise dos mísseis
Os dias em que o mundo esteve prestes a explodir
Muro de Berlim
Há 30 anos, sua queda simbolizou o fim da Guerra Fria e da Alemanha dividida
Capitalismo x socialismo
A guerra ideológica travada entre EUA e URSS dividiu a política internacional e tem consequências até os dias de hoje
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extremos
dois lados da
mesma nação Durante 28 anos, o Muro de Berlim separou famílias, culturas e ideologias
Imagem Benny Thaibert/Shutterstock Images
Texto e entrevistas Gabriel Jaquer/Colaborador design Josemara Nascimento
ALEMANHA OCIDENTAL
ALEMANHA OCIDENTAL BERLIM
D
e um lado, um dos mais bem sucedidos exemplos de socialismo real, pressionado firmemente pelo receio das grandes potências capitalistas do Oeste. Do outro, uma nação em meio a um milagre econômico impulsionado pelos Estados Unidos, cercada da hostilidade soviética. Os dois extremos de Berlim entre os anos 1961 e 1989 representam, em menor plano, toda a complexidade da disputa entre as duas potências que mudaram o mundo – e quase trouxeram o fim dele. 12 • História em foco
Imagem Anibal Trejo/Shutterstock Images
Símbolo da Guerra Fria
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha foi dividida e ocupada pelas potências vencedoras. Do lado oeste, França, Reino Unido e Estados Unidos ficaram encarregados de desnazificar, desmilitarizar, descentralizar a economia e reeducar os alemães à democracia, enquanto a União Soviética cumpria o mesmo papel no leste alemão. A única exceção foi Berlim, capital situada no lado oriental do país, que, no entanto, também foi dividida entre as quatro potências. Em 1961, a República Democrática Alemã (RDA), alinhada aos soviéticos, encontrou uma saída para o êxodo de civis que partiam da capital socialista sediada em Berlim Oriental para o lado oeste da cidade, sob domínio da República Federal da Alemanha e aliada aos blocos capitalistas do Ocidente. Trincheiras, grades e arames farpados foram os meios provisórios, que, em meses, se tornaram a grande fortaleza de concreto que visava impedir a passagem, ou fuga, da estagnada RDA para a bem sucedida Alemanha Ocidental – que devia o progresso econômico ao Plano Marshall dos Estados Unidos. Isso não quer dizer, porém, que Berlim Oriental era uma cidade sem condições de manter sua população com qualidade de vida. Segundo o artigo A Queda do Muro de Berlim: Um estudo com fontes brasileiras, do historiador Carlos Federico Domínguez Avila, no qual são analisadas cartas de embaixadores brasileiros na Alemanha da época, “para os diplomatas brasileiros lotados em Berlim Leste, a RDA era – ou parecia ser – um dos mais bem-sucedidos exemplos de socialismo realmente existente no Leste Europeu”. As disparidades começaram logo
no pós-guerra, com o Plano Marshall dos Estados Unidos. “Os norte-americanos emprestaram dinheiro, financiando a reconstrução de países europeus, que poderiam ser seduzidos pelas ideias comunistas, para causar uma proximidade entre esses com o bloco norte-americano”, elucida o professor Felipe Soares. Esse apoio não se estendia aos países alinhados com a nação comunista. Dessa maneira, todo o território da Alemanha Ocidental era impulsionado pelo progresso do consumismo capitalista, enquanto o lado Oriental, ainda que estável, permanecia estagnado sem previsão de avanço.
Abrindo caminho
O processo de reunificação alemã foi lento, penoso e dependia não só da colaboração quase impossível entre os EUA e União Soviética, como também do fim da barreira que separava os lados leste e oeste de Berlim. De acordo com os relatos de diplomatas brasileiros presentes no artigo de Carlos Federico Domínguez Avila, um papel importante na reaproximação dos territórios foi desempenhado, mesmo que sem intenção, por Erich Honecker, presidente da Alemanha Oriental à época. Isso porque, em meio à estagnação econômica dos blocos alinhados à União Soviética, Mikhail Gorbatchov implantou duas famosas reformas que visavam dar mais liberdade às empresas estatais, mudar os quesitos para se considerar uma indústria como bem-sucedida, entre outros meios de tentar progredir economicamente. Os comunistas mais conservadores, como Honecker, consideravam essas medidas um afastamento dos ideais originais. O então presidente da RDA rejeitava tais reformas, o que não
agradava parte do próprio governo, assim como Gorbatchov e a população alemã-oriental. O êxodo de indivíduos era outra preocupação na Berlim Oriental, especialmente pela abertura, no dia 2 de maio de 1989, da fronteira austro-húngara, que possibilitava a ida legal dos alemães até a Hungria para, então, fugir ilegalmente à Áustria, e de lá para a Alemanha Ocidental.
Cai o muro...
Todo esse cenário, no entanto, era ignorado por Honecker, que, segundo os relatos brasileiros, planejava um grande festejo em comemoração aos 40 anos da fundação da República Democrata Alemã, em outubro de 1989. O aniversário seria marcado, também, pela transição do governo para Egon Krenz. Esses fatores combinados colocavam a RDA em um momento delicado, que foi aproveitado pela população no levante inédito de diversas manifestações pelas cidades da Alemanha Oriental. Assim, Krenz assume o governo e, ainda no discurso de posse, admite a necessidade de reformas econômicas, assim como o problema do êxodo – e a abertura das fronteiras para viagens ao exterior. Em nove de novembro de 1989, foi anunciado que, naquela mesma noite, os habitantes da RDA poderiam transitar livremente aos países exteriores, o que causou aglomeração de mais de 100 mil pessoas nas adjacências do Muro, no lado oriental, segundo os relatos dos diplomatas. O Muro de Berlim passava a ser apenas um símbolo. A partir de então, o governo da RDA perde a soberania absoluta – foram abertas eleições democráticas, com formação de partidos de oposição – e se aproxima da RFA, História em foco • 13
extremos que propõe uma sequência de acordos visando ajudar o desenvolvimento da Alemanha Oriental e, no prazo de três anos, a reunificação das nações alemãs.
... E a URSS
Cicatrizes
Os professores Felipe e Cleber concordam que muitos dos conflitos que acontecem atualmente são sequelas do período da Guerra Fria. Além disso, várias consequências indiretas podem ser notadas em todo o mundo. “A América Latina, por exemplo, passou por ditaduras militares aparelhadas pelos Estados Unidos, que tiveram como principal motivação o medo do comunismo”, esclarece Cleber Eduardo, que afirma também que a estagnação econômica do leste europeu, à época, pode ser sentida até hoje.
Felipe Soares dá como exemplo os conflitos na Síria, que, segundo o professor, muitos consideram um resultado dos embates por influência no território, disputado entre EUA e Rússia. “Na guerra da Síria, a Rússia apoia o presidente Bashar Al-Assad, e os americanos apoiam os rebeldes que querem tirar o presidente Assad”, pontua. As disputas entre Coréia do Norte e Sul são outro exemplo, visto que o país foi dividido durante a Guerra Fria, de acordo com o professor. “Por mais que a Guerra Fria tenha acabado, os conflitos e as zonas de influência, bem como as relações diplomáticas, ainda se ordenam dentro de uma questão binária de alinhamento aos EUA ou à Rússia, que é a herdeira direta de toda a história da União Soviética”, completa Felipe.
Imagem In Green/Shutterstock Images
“Quando cai o Muro, a alternativa socialista já não era mais uma possibilidade”, aponta Cleber Karls. Para o professor, a queda da União Soviética se deve, principalmente, pela incapacidade em lidar com as adversidades de seu sistema e manter os ideais propostos pelo comunismo. “O sonho de uma sociedade igualitária, democrática e proletária deu lugar a um Estado burocratizado, violento, opressor e que não conseguiu apresentar alternativas às crises como fez o adversário capitalista”. “O muro de Berlim caiu, as es-
truturas do partido comunista já não davam mais conta de governar todo o bloco soviético, então temos a derrocada do socialismo real no mundo, especialmente com a queda da União Soviética”, finaliza Felipe Soares.
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CONSULTORIAS Cleber Eduardo Karls, doutor em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor e coordenador do curso de História EAD da Universidade Veiga de Almeida (UVA); Felipe Soares, professor de história no colégio Sepam e Sepam Vestibulares, em PontaGrossa (PR). Fonte A Queda do Muro de Berlim: Um estudo com fontes brasileiras, artigo de Carlos Federico Domínguez Avila publicado na Revista de Sociologia e Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR).