Pesquisa em design: comida como interface de interação social Marcella Lomba Nicastro Universidade Positivo marcellaln@gmail.com RESUMO
INTRODUCTION
Este artigo descreve o estudo realizado sobre a história do restaurante e sua influência no modelo de serviços que conhecemos hoje, juntamente de uma pesquisa em profundidade com pessoas, para entender suas necessidades, comportamentos e experiências. O artigo conclui com a análise dos resultados encontrados, além de uma provocação estimulando novas pesquisas e maior exploração do tema sob o modelo de pensamento do design.
Cada vez mais o tema comida vem sendo destaque em diferentes canais e por diferentes motivos, desde programas de tv para estimular as pessoas a cozinhar e a se alimentar melhor, até mesmo por tecnologias que prometem facilitar seu dia a dia, como aplicativos de celular que te ajudam a escolher onde ir e equipamentos profissionais de cozinha para sua casa. Por outro lado, apesar da facilidade de comunicação e acesso a tecnologia que temos atualmente, os estabelecimentos que prestam serviços em torno da comida, como restaurantes, bares, lanchonetes e afins, ainda que com algumas evoluções ao longo dos anos, se mantiveram fieis a um formato tradicional de serviço, sendo a principal diferença de um estabelecimento para o outro, seu cardápio, decoração e preço. Mais recentemente, observa-se um movimento que propõe novas abordagens para as pessoas interagirem entre si e com a comida, abrindo a área para novas oportunidades de repensar os modelos atuais. Acreditando que o design centrado no usuário poderá desempenhar papel fundamental no entendimento, conceitualização e definição destas novas interações, este projeto de pesquisa é uma uma oportunidade para provocar a discussão a cerca do papel da comida como uma interface de interação social, tendo como principais objetivos: • Compreender a origem da gastronomia e dos restaurantes como conhecemos hoje • Identificar novos movimentos e modelos, bem como suas motivações • Entender o papel da comida no dia a dia das pessoas, explorando suas experiências e expectativas • Analisar e identificar oportunidades de interação através da comida
Keywords
Pesquisa em design, comida, design thinking, restaurante ABSTRACT
This paper describes a study about the history of the restaurant and its influence on food related services we know today, along with a in-depth research with people to understand their needs, behaviors and experiences around food. This paper concludes with an analysis of the results, as well as a provocation to further exploration of the topic through design thinking mindset. Keywords
Design research, food, design thinking, restaurant
CONTEXTO HISTÓRICO - RESTAURANTE
A origem dos restaurantes começa por volta do século 17, onde haviam tavernas ou estalagens conhecidas por suas mesas comunitárias para compartilhamento da bebida e do alimento, este que era muito simples, geralmente uma sopa enriquecida para restaurar a energia dos viajantes de passagem. Era um formato que exigia que a pessoa tomasse conhecimento de seus companheiros de mesa e interagisse com eles. Nesta época já haviam os cafés como espaço público para consumir bebidas e um almoço leve, porém, sua principal
característica era o estímulo a discussão e a troca de idéias sobre notícias, acompanhado de material de leitura como jornais. Os primeiros lugares conhecidos como restaurantes, foram instituídos por Messieurs Roze e Pontaillé, surgindo por volta do século 18 em Paris como conseqüência da revolução francesa, tornando-a um centro revolucionário, aumentando o fluxo de pessoas e a rotina da cidade. A alta taxa de desemprego dos cozinheiros das grandes casas da aristocracia, a queda das guildas que controlavam o comércio de alimentos e a fraqueza que assolava os sofredores delicados (um sintoma de sofisticação intelectual e acuidade emocional dos revolucionários da época), são um dos principais fatores que contribuíram para a abertura dos restaurantes. Séculos antes de um restaurante ser um lugar onde se ia para comer, um restaurant era algo de comer, um caldo restaurativo. Em sua forma inicial, portanto, o restaurante era um lugar em que se entrava não para comer, mas para se sentar e, debilitado, sorver um restaurant. Diferindo das estalagens, tabernas ou casas de pasto por suas mesas individuais, seus consomês salutares e seus horários livres, esses primeiros empórios de restaurants pouco tinham em comum com a imagem hoje evocada pelas palavras restaurante parisiense. [2] Os restauraters são pessoas habilitadas a preparar os verdadeiros consomés, chamados restaurantes ou caldos do príncipe, e que tem o direito de comercializar todos os tipos de cremes, sopas de arroz e vermicelli, ovos frescos, macarrão, capão guisado, geléias, compotas e outros pratos delicados e salutares.[2] De casa de saúde à restaurante como conhecemos atualmente, estes lugares permitiram a inovação e evolução da culinária como ciência e surgimento da gastronomia e toda sua arte do preparar, comer e servir o alimento, não somente pela comida em si, mas também pela experiência oferecida. Foram muito mais o estilo de serviço e o cardápio de caldos e cremes de arroz que distinguiram o restaurante de outros locais públicos onde já se serviam refeições. No restaurante, o cliente, homem ou mulher, desfrutava de um novo tipo de atendimento personalizado, que raramente (ou nunca) teria encontrado antes, de forma que, mesmo quando os restaurantes passaram a servir refeições completas, eles não se assemelhavam em praticamente nada a uma estalagem, taberna ou casa de pasto. Pelo contrário, o restaurante deu novo significado às emoções, expressões e ações individuais e elaborou toda uma nova lógica de sociabilidade e convivência. Embora servir pratos salutares fosse a raison d`être inicial do restaurante, seus fãs falavam com o mesmo entusiasmo sobre as muitas outras delícias que encontravam lá. [2] Os restaurateurs não se limitaram aos caldos e cremes de arroz por muito tempo, mas eles sempre se diferenciaram dos traiters pelo uso do cardápio, pela opção do serviço a qualquer momento e pela presença feminina entre os que tomavam caldos. De fato, o serviço de caldos refinados e saudáveis parecia exigir um novo fórum urbano, um novo
local de encontro social, um novo tipo de espaço público. A frágil clientela dos restaurateurs demandava uma série de atenções que não eram ouvidas na table d`hôte do estalajadeiro ou do cozinheiro, e essas novas formas de interação durariam muito mais tempo do que a moda da saúde debilitada que lhes deu origem. [2] O cardápio era uma ferramenta de individualização do pedido, permitindo que o cliente pudesse escolher o que desejasse e ao mesmo tempo planejar o quanto gastaria em uma refeição. Cada vez mais elaborado, a leitura do cardápio exigia que o cliente adquirisse uma consciência maior de paladar e conhecimento culinário para compreender os novos pratos criados pelos chefs. Um novo conceito de lugar público se criava, onde buscava-se experiências individualizadas e particulares, fazendo do modelo de serviço do restaurante único na época. O cardápio, o serviço e o ambiente, tudo tornava a experiência um evento para entreter, com o chef de cozinha sendo maior responsável ou estrela do espetáculo. Com sua mobília requintada, cardápios variados e horário de funcionamento flexível, os restaurateurs ofereceram a seus clientes “distrações para o espírito” e conforto para a digestão que apenas ligeiramente lembravam a camaradagem alimentícia da tradicional casa de pasto ou da hospedaria. O restaurante realçava o refinado, o inesperado e o indivíduo. [2] Muitos países interessados em conhecer o segredo no estilo de vida francês que tanto fazia sucesso, fizeram suas tentativas de implementar o modelo do restaurante, cada um seguindo caminhos distintos, conforme contexto histórico e repertório gastronômico. Na própria França, outras variações do modelo de restaurante foram surgindo, como os bistrôs, um formato de fast food do século 19, com a proposta de oferecer uma alternativa a refeição tradicional. INFLUÊNCIA DA CULTURA DO RESTAURANTE
Apesar da popularização e democratização do restaurante que vimos no último século e que levou a grande variedade de lugares que temos hoje, como cafés, bares, lanchonetes, etc, os novos modelos ainda estão sob a influência da herança cultural do tradicional restaurante, afetando as expectativas e como as pessoas se relacionam com ambientes gastronômicos. Ainda associamos o sair para comer fora, como um evento particular, especial, mas em um espaço público. Como consequência, ao longo do tempo foram surgindo serviços especializados em modelar lugares e ambientes para melhor refletir o conceito e imagem desejado pelos proprietários. Porém, utilizando-se dos antigos paradigmas de serviço e regras etiqueta, buscando oferecer uma experiência diferenciada para o cliente. TENDÊNCIAS
Por outro lado, o conceito do restaurante que pouco evoluiu nos últimos tempos, variando apenas em cardápio, decoração e preço, vem sendo confrontado com novos modelos inovadores, menos individualizados e principalmente, mais alinhados com as necessidades e
estilo de vida contemporânea, não se prendendo a um paradigma do século 18. Oportunidades estão surgindo para antigos e novos lugares, além de outros formatos e canais de interação com o universo gastronômico, diante de um mundo cada vez mais conectado, informado e multifacetado, que passou a questionar e redefinir o ecosistema que fornece a experiência com a comida. O tema ganhou destaque como alta cultura e está cada vez mais acessível. São diversos os livros, programas de TV, aplicativos de celular, lojas com produtos especializados, fotos nas redes sociais, novos lugares e cursos de gastronomia tanto para o hobista quanto para o profissional em treinamento. Através da análise de tendências futuras dentro do tema de comida, é possível extrair alguns exemplos de transformações que estão surgindo, como é o caso do estudo “What’s Cooking? Trends in Food” [7] realizado pelo grupo JWT Intelligence, que revela as principais macro-tendências: Foodie culture
Foodie é um termo utilizado para descrever pessoas apaixonadas pelo consumo de conteúdo relacionado a comida e bebida, inclusive pela prática de comer e cozinhar. A tendência Foodie Culture aponta a crescente geração de informação sobre comida como fotografias, avaliações e aumento na variedade de abordagens que propiciam maior envolvimento com preparo e consumo de comida, como restaurantes que estão integrando cada vez mais o espaço da cozinha com o salão. Outras ramificações dentro do foodismo é a valorização e afinidade por fornecedores locais, modelos de seleção e entrega por correio de alimentos especiais ou selecionados. Comida como um novo fator de impacto ecológico
Cada vez mais o impacto ambiental causado pelos sistemas de produção e distribuição de alimentos é alvo de preocupação, estimulando questionamentos sobre a qualidade, origem e impactos causados. Práticas mais inteligentes, sustentáveis e transparentes se tornarão comuns e necessárias para grandes e pequenos produtores, tendo um reflexo direto na comunicação e seleção da comida e lugares que a fornecem. Saúde e bem-estar
Como conseqüência de uma sociedade doente, vítima da industrialização e da falta de informação, é esperado que as pessoas desenvolvam uma maior consciência de saúde e bem-estar, influenciando práticas de comércio, percepção de valor-agregado e adoção de novos hábitos alimentares visando o benefício oferecido por estes alimentos. Nesta linha, destaca-se a evolução dos alimentos orgânicos, frescos e dos alimentos funcionais.
Interações inteligentes
Os aparelhos residenciais estão se tornando cada vez mais inteligentes e conectados com o mundo digital, influenciando com encontramos, como comemos e como preparamos nossa comida. A tecnologia de superfícies interativas está se popularizando, permitindo que novas oportunidades e formas de engajamento, mediada por estas interfaces surjam. Um restaurante pode oferecer a seus clientes uma interface interativa como alternativa para o tradicional cardápio, oferecendo maior conteúdo e até mesmo, podendo substituir um garçom ou servir de recurso de entretenimento. Revenda como o próximo lugar
Lugares como supermercados, empórios e outras lojas ou pontos de venda de alimentos, estão aos poucos sofrendo transformações conceituais, deixando de ser apenas um estabelecimento comercial, para oferecer experiências e serviços diferenciados para seus clientes. Destacam-se os lugares que oferecem compras e jantar preparado por profissionais com os ingredientes que você escolher, tudo no mesmo local, recriando a tradicional idéia dos mercados públicos. PESQUISA EM DESIGN
Diante deste cenário, o modo criativo de pensar do design pode desempenhar um papel importante, ajudando a entender e explorar novas perspectivas de interação entre as pessoas e a comida de forma mais holística. Comer sempre foi um comportamento muito além do aspecto nutricional, atuando como meio de interação social, identidade e entretenimento. O que se come é tão importante quanto quando se come, onde se come, como se come e com quem se come. Além de questões políticas e macroeconômicas, a alimentação revela a estrutura da vida cotidiana em um de seus núcleos mais íntimos e compartilhados. Necessidade e prazer, a alimentação reveste-se de significados múltiplos, constitui identidades regionais, nacionais, étnicas e religiosas. [1] Desta forma, para obter uma perspectiva local sobre o relacionamento das pessoas com comida e os aspectos sociais envolvidos, foi realizada uma pesquisa em design onde o usuário é colocando no centro do processo, identificando padrões de comportamento, necessidades e aspirações. Como metodologia base de todo o estudo, foi utilizada a Feel the Future [8], que compreende três fases: Discovery a fase inicial do projeto que consiste na pesquisa e levantamento de dados. Connect é a fase intermediária e corresponde a parte conceitual e de análise de todas as informações coletadas na fase de Discovery. E Construct é a fase de consolidação e finalização do projeto. Na fase de Discovery foram utilizadas as seguintes abordagens de pesquisa:
Pesquisa Secundária: levantamento e síntese do referencial teórico para entendimento do cenário e direcionamento do projeto, a partir de fontes de informação sobre história do restaurante, evolução da gastronomia, design de serviços de restaurantes, novas abordagens e tendências. Observação: através da imersão em ambientes como restaurantes, pizzarias, lanchonetes, cafés, bares, supermercados, mercados municipais, feiras livres e feiras gastronômicas, nas cidades de Curitiba e Campinas, foi realizada uma observação discreta e exploração de aspectos do lado do prestador do serviço como arquitetura do local, relacionamento com o cliente dinâmica do serviço e apresentação do produto; e aspectos do lado do cliente como relacionamento com o serviço, produtos e interações sociais. A observação foi uma ferramenta importante para identificar padrões de comportamento e oportunidades transversais aos locais, além de apoiar as descobertas da pesquisa secundária. Entrevistas contextuais: ferramenta que permite um amplo entendimento do contexto do usuário a partir do contato direto, com objetivo de identificar padrões de comportamento, necessidades e aspirações. Foram selecionados oito participantes a partir da segmentação por perfil, com base nas informações obtidas nas etapas anteriores, roteiro e objetivos da pesquisa: • Produtores - gostam de se envolver no processo de fabricação de comidas ou bebidas. • Consumidores - gostam de comer, beber e freqüentar os lugares em benefício próprio para entretenimento ou funcional. • Compartilham - possuem o hábito de compartilhar experiências em torno da comida, presencial ou digital. • Investidores - exploram a área como oportunidade de negócio. E como roteiro da entrevista, os seguintes tópicos foram abordados: Rotina alimentar, Compra de alimentos, Cozinhar em casa, Lugares que freqüenta, Influência tecnológica, Percepção das tendências e Aspirações. Após realização das entrevistas, todas as informações coletadas foram analisadas em conjunto na fase Connect, através da divergência e convergência dos padrões identificados. RESULTADOS E OPORTUNIDADES
Como resultado da pesquisa na fase de Construct, foram gerados seis grupos conceituais de insights sobre como as pessoas se relacionam com comida, ambientes, serviços e umas com as outras, considerando aspectos sociais e comportamentais, que poderão ser utilizados em futuros projetos como oportunidades de design. Almoço Executivo
O momento do almoço durante a semana possui um carater mais funcional e nutricional, sendo consequência da rotina de trabalho com pouco tempo disponível, não mais que uma hora, na maioria dos casos.
Em geral as pessoas optam por comer fora de casa, buscando lugares próximos ao local de trabalho e quase sempre frequentando os mesmos lugares, dentro de uma lista de lugares garantidos e certos, pela agilidade no atendimento, preço, qualidade e variedade de comida. Os restaurantes por quilo são os mais procurados, mas não são unanimidade, pois perdem no quesito qualidade, frescor e cuidado no preparo. Independente do tipo de lugar, as pessoas querem ter flexibilidade para escolher e montar o prato da forma que acharem melhor, dado as restrições e hábitos alimentares de cada um. A pausa para o almoço durante o expediente, é vista como uma oportunidade para descontração e para reforçar relações sociais com os colegas de trabalho. Desta forma, a escolha do lugar torna-se uma decisão do grupo, que em vista de se proteger de más escolhas, acaba frequentando quase sempre os mesmos lugares, com poucas variações ou descobertas. Quero Participar!
Foi-se o tempo que as pessoas tinham uma postura passiva e distante com quem prepara e serve a comida. Há um grande desejo em ter liberdade para participar do processo, indo desde a tomada de decisão, não estando preso a um cardápio fixo, até assistir ou participar do cozinhar em si. Participar é parte da diversão, servindo de distração e enriquecendo a experiência, além de permitir a personalização da receita, bem como do tamanho das porções. Ao se envolver com o processo, adquiri-se maior conhecimento, respeito e senso-crítico, sendo uma via de duas mãos, tanto para o cliente, quanto para o estabelecimento. Por outro lado, lugares que oferecem cardápios bem planejados e profissionais que saibam orientar o cliente, baseado em seus gostos e desejos, também são bem vistos, como uma forma de guiar a experiência. Escolha do lugar
Pode-se dizer que a experiência em torno da comida, iniciase muito antes, ainda na fase de escolha e tomada de decisão por onde ir, o que comer, o que fazer, etc. O contexto no qual a pessoa está realizando suas escolhas é fundamental e os fatores psicológicos são os principais influenciadores, como humor, fome, interesses sociais, tempo, dinheiro, distância e tipo de lugar. Estes fatores não só influenciam a decisão, mas também são levados para o momento da experiência na forma de pré-conceitos ou expectativas, que podem ser facilmente quebradas em virtude de uma má escolha ou má experiência. Em geral, decidir onde ir ou oque fazer é uma tarefa difícil, pois exige o balanceamento de um conjunto de requisitos contextuais, com destaque para o requisito social, que exerce a maior influência. A tecnologia não está presente no momento da tomada de decisão, mas como uma espécie de coleção de referências e indicações, para um dia serem pinçadas quando em um momento oportuno.
Quando se trata de conhecer lugares novos, as pessoas entrevistadas se mostraram bastante abertas e interessadas, porém, não há um hábito de buscar por novos lugares e frequentar um lugar só por que ele é novo. Em geral, decidem por ir em um lugar ainda não conhecido, depois que recebem alguma indicação confiável ou de credibilidade, sendo a indicação de um conhecido a mais importante. Logistica para cozinhar
Cozinhar em casa não é uma tarefa simples para a maioria das pessoas, pois exige planejamento, compra dos ingredientes, tempo de preparo e no final, lavar a louça. Novamente o contexto exerce forte influência nas escolhas e decisões, desde o cozinhar em casa para atender necessidades mais funcionais, até o cozinhar para amigos onde o foco é o entretenimento e o social. Em ambos os cenários exige-se um tempo de pensar oque fazer, como fazer e onde comprar que influenciam as escolhas. A maior dificuldade é o deslocamento para encontrar os ingredientes necessários e desejados, pois não é possível obter tudo em um só lugar. As vezes até é possível, mas não com a qualidade e frescor desejado. Como é o caso das redes de mercado em geral, que são vistos como lugares pouco prazerosos e apenas para comprar ingredientes industrializados. Sempre que possível, opta-se por fazer compras em lugares como feiras e mercados municipais, onde os produtos são de melhor qualidade, frescos e oferecem uma experiência mais rica e multi-sensorial, além de expor o contato direto com os produtores ou fornecedores, conferindo maior sinceridade e credibilidade. Ainda sobre o cozinhar em casa, muitas pessoas enfrentam outra dificuldade que é a falta de equipamentos e infraestrutura, como uma cozinha com espaço e utensílios adequados para cozinhar e receber pessoas. Nestes casos, isso não se torna um impedimento, mas afeta bastate a forma como as pessoas contornam os problemas, pois apesar de todas as dificuldades mencionadas, as pessoas são unânimes em dizer que gostam e preferem fazer algo em casa para receber amigos. O que é comida boa?
Entre as pessoas entrevistadas, cada uma com repertórios e níveis de exigência distintos, nota-se um padrão quanto ao que define-se uma comida boa e de qualidade: técnica e ingrediente. Para elas, uma comida de qualidade, é uma comida bem preparada, com capricho e cuidado, utilizando bons ingredientes e frescos. A receita não precisa ser sofisticada, mas se simples, que seja sincera. Para todos, cozinhar é uma atividade artesanal e comer é uma forma de prestigiar esta arte, onde a apresentação do prato e ambientação, devem ser condizentes com conteúdo que ele entrega, tudo está instrisicamente relacionado, principalmente quando analisando a relação custobenefício.
Novamente, o tipo de lugar exerce expectativas sobre as pessoas quanto ao nível de qualidade da comida, ou seja, nível de técnica utilizado e ingredientes. Estes são elementos chaves e diferenciais. A percepção de qualidade de uma comida é algo muito pessoal e consequência da educação e histórico culinário de cada um, porém, é uma caracteristica que evolui conforme os estímulos que recebe, se transformando e refinando o tempo todo. Não é sobre comida
Uma boa conversa, diversão, sedução, esses e outros itens fazem da comida um catalizador de experiências sociais, um convite para algo mais além de só comer. Não apenas a percepção de qualidade da comida, o mais importante é a percepção da experiência como um todo, considerando as interações entre os diferentes elementos do sistema, como ambiente, as pessoas e a comida em si. O rítimo do serviço é fundamental para garantir o aspecto imersivo, estando alinhado com as interações sociais que estão ocorrendo, sem causar ruídos que quebrem o clima. E o ambiente é o meio que fornece a infra-estrutura e os estímulos necessários para criar a imersão. O tipo de lugar influencia, mas em geral as pessoas entrevistadas dizem buscar lugares que permitam que elas se sintam mais a vontade, sejam reconhecidas e informal, ainda que com um caráter profissional. Além disso, as pessoas valorizam o engajamento progressivo com a comida e bebida, como o tradicional entrada, prato principal e sobremesa, inclusive, quando há surpresas ou cardápios especiais que surpreendem e as levam a conhecer algo novo. Há um forte desejo por lugares mais sinceros e verdadeiros, onde serviço, ambiente e a comida estejam alinhados e não sejam apenas imitações ou ambientes que passam uma imagem e entregam outro conteúdo. Por fim, pessoas se sentem mais a vontade cercadas de outras pessoas, mesmo que estranhos. Há um equilíbrio entre um lugar vazio e um lugar muito cheio que o torne agradável. Além de estarem mais abertas a interagir com estranhos em ambientes mediados por comida. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos estudos realizados, é possível compreender melhor o papel da comida e suas influências nas mudanças de comportamento da sociedade, bem como questionar novas abordagens para pensar os sistemas em torno da comida. Cada vez mais o que constitui nossa percepção de comida, está relacionada a fatores sociais, culturais e comportamentais, exigindo novas formas de pensar interações entre comida, pessoas e ambiente de forma holística. Desta forma, o modo criativo de pensar do design pode desempenhar um papel importante, ajudando a entender e explorar novas perspectivas de interação, onde a comida atua como um catalizador de experiências.
Espera-se que a partir deste estudo, novas pesquisas em maior profundidade sejam realizadas, estimulando uma maior consciência sobre pensar modelos de serviço em torno da comida como experiências centradas no usuário. REFERÊNCIAS
1. Carneiro, Henrique. Comida e Sociedade: Uma história da alimentação. Rio de Janeiro: Campus, 2003. 2. Spang, Rebecca L. A invenção do restaurante: Paris e a moderna cultura gastronômica. Tradução de Nota Assessoria - Rio de Janeiro: Record, 2003. 3. Symons, Michael. A history of cooks and cooking. University of Ilinois Press:Urbana IL, 1998. 4. Larousse Gastronomique: completely revised and updated edition. New York: Clarkson Potter, 2001. 5. Davidson, Alan. The oxford companion to food. Oxford:Oxford University, 1999.
6. Baraban, Regina S.; Durocher, Joseph F. Successful Restaurant Design. John Wiley & Sons: New York, 2010. 7. “What’s Cooking? Trends in Food” realizado pelo grupo JWT Intelligence. Disponível em http:// www.jwtintelligence.com/2012/02/whats-cookinglatest-report-tracks-trends-food/ 8. PUCHASKI, Kleber R. Feel the Future - Perceptions of branding and design towards product development in the motor industry. Tese de doutorado. Royal College of Art - Inglaterra, 2008 9. Ambrose, Garvin. Design thinking. Tradução: Mariana Belloli - Porto Alegre: Bookman, 2011.