TFG | As Bordas Em Paraisópolis - Marcelo Rizzo

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AS BORDAS EM PARAISร POLIS Marcelo Braganรงa Rizzo



Marcelo Bragança Rizzo

AS BORDAS EM PARAISÓPOLIS Monografia apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial para a conclusão do Trabalho Final de Graduação e obtenção do diploma de Arquiteto e Urbanista. Orientação: Prof. Dr. Carlos Leite de Souza São Paulo, 2014



Data de aprovação: Banca Examinadora:

Carlos Leite de Souza Orientador Universidade Presbiteriana Mackenzie

Daniela Cristina Vianna Getlinger Convidada interna Universidade Presbiteriana Mackenzie

Alan Silva Cury Convidado externo Pontifícia Universidade Católica de Campinas



“O mais importante não é a arquitetura, mas a vida, os amigos e este mundo injusto que devemos modificar.” - NIEMEYER, Oscar



AGRADECIMENTOS Agradeço a todos que me ajudaram a chegar aqui e que abrandaram as dificuldades na minha jornada. Ao meu orientador, Carlos Leite, sem quem eu não teria ampliado meu conhecimento e vivência como ampliei, me aproximando tanto do tema que aqui vos exponho. Ao professor Marcos Carrilho, cuja cobrança e experiência me permitiram entender e moldar um objeto arquitetônico completo. Aos outros docentes da FAU Mackenzie que fizeram, às vezes de maneira mais afável, às vezes “na marra”, com que eu me apaixonasse a cada ano pelo curso e pela carreira de arquiteto. Aos moradores de Paraisópolis, em especial Joíldo Santos, que me recebeu com tanta disposição na comunidade. Àqueles que me forneceram um ombro amigo ou um simples conselho que me foi de bom uso. Aos que me proporcionaram experiências profissionais nesses anos, meus colegas e chefes, com os quais amadureci e me tornei mais astuto. Aos amigos não arquitetos, que, mesmo sem entender muito, compreenderam minhas ausências e não deixaram de me incentivar. Aos colegas que me acompanham, de hoje em diante, na profissão e que, ao longo desses cinco anos, entenderam as dificuldades como ninguém, ofereceram ajuda quando necessitei e, não só aguentaram, mas viram graça nas minhas bobagens. E, enfim, à minha fundação: ao apoio do lar, o carinho de meus pais e meu irmão, que permitiu que eu me encontrasse, agora, concluindo mais uma etapa da minha vida,

Obrigado.



RESUMO Este trabalho trata sobre bordas urbanas, ou seja, duas ou mais realidades em coexistência num mesmo espaço; assim como, os demais conceitos aliados ao entendimento do assunto, como o de territórios híbridos e os “entre-lugares”. Além de uma apresentação teórica e conceitual que fundamenta o tema, analisa-se intervenções em diversos tipos de territórios que podem ser identificados como franjas urbanas, enxergados como áreas em constante mutação e expectantes de situações programáticas novas e não-ortodoxas. A pesquisa direciona-se, então, às bordas que se configuram entre a cidade formal e a cidade informal, particularmente o caso da favela de Paraisópolis e o bairro do Morumbi na cidade de São Paulo e a notável desigualdade social refletida na ocupação territorial dessa região da metrópole. Finalmente, faz-se a apresentação de um projeto arquitetônico para a área, livre de preconceitos e sem a pretensão ou garantia de solucionar quaisquer problemas de cunho social através da arquitetura, mas sim carregado de uma ideia de futuro, ainda que utópico, no qual ele possa se concretizar.

Palavras-chave: Bordas urbanas – Territórios híbridos – Territórios informais – Desigualdade – Integração – Paraisópolis – Morumbi


ABSTRACT This study is about urban edges or borders, that is, two or more realities that coexist in the same space; as well as other concepts that are essential to the understanding of the subject like hybrid territories and “entre-lugares” (or spaces-in-between). After a theoretical and conceptual presentation to support the subject, a search was made to find interventions in different types of territories that can be categorized as being in these urban fringes, defined as areas in constant mutation and expectant of new and programmatically non-orthodox situations. The survey was then directed to edges between the formal and informal city, particularly the case of one of São Paulo biggest slums neighborhood: the Paraisópolis community, as well as its proximity to the high standard neighborhood Morumbi plus the remarkable social inequality reflected in the territorial occupation of this part of town. Finally, an architectural design is presented as an intervention in the area, free of all prejudice and any presumption to solve socially natured problems through architecture, but leaning to an idea of a future, utopian as it is, in which the intention behind it can be achieved.

Keywords: Urban edges – Hybrid territories – Informal territories – Social inequality – Integration – Paraisópolis – Morumbi



SUMÁRIO 16

Introdução As bordas

20

Decifrando as Bordas

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Os territórios híbridos

30

A borda: formal x informal

33

Projetando nas bordas

42

As bordas em Paraisópolis

67

Paraisópolis e o bairro do Morumbi

67

Problematização: Bordas em conflito

74


Águas de transição: Piscinas Públicas

84

Uma nova porta de entrada para Paraisópolis

84

O Complexo Aquático Morumbi-Paraisópolis

96

Considerações finais

130

Bibliografia

134

Ilustrações: Créditos

140

FIG. 1 - Escadaria em Paraisópolis. Foto de Roberto Rocco, 2011. Fonte/Autoria: Roberto Rocco, TUDelft



FIG. 2 - A favela de Paraisópolis e o bairro do Morumbi ao fundo. Foto de Roberto Rocco, 2011. Fonte/Autoria: Roberto Rocco, TUDelft

INTRODUÇÃO


Meu interesse em desenvolver um trabalho que abordasse a problemática gerada pelas bordas urbanas surgiu a partir da minha experiência pessoal, mas também pelos pensamentos e juízos que me foram transmitidos ao longo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Durante esses cinco anos, meus mestres, professores e arquitetos, não me doutrinaram na mesma direção para a qual aparenta caminhar a arquitetura brasileira, que é aquela das grandes residências e dos apartamentos de luxo, somente. Longe disso, seja por docentes mais conservadores ou outros mais transgressores, creio ter sido sempre estimulado a pensar na cidade e seus cidadãos e a tecer o espaço urbano através da arquitetura; não a segregá-lo ou projetar para somente uma parcela de seus habitantes. Retomamos, diversas vezes, discursos modernistas sobre a arquitetura democrática, social e essencial, que relaciona forma e função, fundamenta-se nas plantas abertas à livre circulação do pedestre e permite o encontro social em seus ambientes. Com frequência, estudei verdadeiros gurus da arquitetura, alguns dos quais, infelizmente, vi falecer ao longo de minha formação, como o grande Oscar Niemeyer, com obras como a galeria do edifício Copan e o complexo do Ibirapuera, ou o saudoso Professor Luiz Telles e seu Centro Cultural São Paulo; aprendi com eles, através dessas e outras obras, a maneira como a arquitetura pode instrumentar a integração da cidade segregada.

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justifico

Dito isso, meu foco nos territórios informais e, particularmente, nas situações em que se conformam as fronteiras entre eles e a cidade convencional, devido à urgente releitura desses sítios, frente ao atual distanciamento entre os dois lados. Parece, para mim, clara a aplicação a essa realidade dos conceitos que entrei em contato na Universidade. Além disso, vivi grande parte da minha vida na região da Vila Sônia, próximo ao bairro do Morumbi e à favela de Paraisópolis, em São Paulo, vivenciando diariamente a situação próxima e aparente

de segregação social que ali ocorre, demarcada espacialmente pelo limite urbano que é a Avenida Giovanni Gronchi, um marco na região. Essa presença tão próxima sempre me gerou inquietação, o que fez com que eu quisesse me acercar mais do tema, entendendo-o melhor e investigando soluções que pudessem reverter seus aspectos negativos.


objetivo

É isso que com minha pesquisa: trazer à lume, assim como fazem Luis Kehl ou Paola Jacques Berenstein, uma visão otimista sobre os territórios informais e sua reinserção no tecido da metrópole; abandonar visões preconceituosas para com a favela e a ideia de que ela deva ser extinguida ou transformada em cidade formal; e, por fim, relacionar a situação escolhida aos pressupostos de autores como Igor Guatelli, Carlos Leite ou Rachel Coutinho Marques, que defendem intervenções inovadoras em territórios desconexos.

metodologicamente

, dividi minha pesquisa da seguinte maneira: procurei, em primeira instância, entender como caracterizar as franjas urbanas, segundo ideias e hipóteses de autores renomados. Busquei, então, compreender o que debatiam esses autores em relação ao tema e como isso se justapunha ao meu recorte ideológico e espacial. Concluí que existem poucas, mas algumas obras escritas que debatem o assunto exatamente como eu o afronto, porém fontes extensas sobre tópicos relacionados e similares que podem se aplicar ao meu trabalho. Em seguida, julguei de extrema importância o meu contato direto com o estudo de caso, fazendo visitas à região do Morumbi e à favela de Paraisópolis e realizando conversas com moradores e lideranças locais, entendendo os seus pontos de vista para, assim, formular meu posicionamento e opinião.

Em paralelo, desenvolvi, junto a este trabalho, um projeto arquitetônico, que buscou levar em consideração as teorias alçadas pelo meu estudo. O objeto, apresentado ao final desta monografia e que demarca sua conclusão, é um Complexo Aquático público na borda da favela de Paraisópolis com o bairro do Morumbi. Aspirando à articulação, não só do escasso espaço público identificado na região e do tecido fragmentado nos limites da favela, o projeto deseja, também, a articulação entre os usuários, os moradores da região, proporcionando a integração social através da arquitetura; almeja um projeto para todos.

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FIG. 3 - Visão aérea mostra a divisão de Paraisópolis e Morumbi. Fonte: Google Earth, 2012

AS BORDAS


DECIFRANDO AS BORDAS Neste capítulo, ocupo-me a debater a questão teórica mais importante desta monografia: os significados atribuídos ao conceito de bordas urbanas. Tentarei, doravante, não limitar a palavra “borda” a sua definição “dicionarística”1. Essa palavra está, na maior parte do tempo, associada aos limites, ao término de algo. Em um dicionário da língua portuguesa2, o termo “borda” é definido como a extremidade limítrofe de uma superfície, a orla do terreno ou do objeto designado. Entretanto, muito mais me interessa, neste trabalho, enxergar as bordas não só como o fechamento linear de um campo central, é preciso também olhar para fora da borda, para seus arredores. Assim, assumo que as bordas, no espaço arquitetônico, não são somente demarcadoras do fim. Elas podem, em outra instância, representar fronteiras, faixas de transição de realidade e espacialidade; tornam-se um espaço intermediário e de atravessamento que se configura entre duas ou mais existências, que não são, obrigatoriamente, de naturezas opostas, porém, certamente, não são iguais.

Os territórios em borda podem configurar barreiras e suturas no espaço urbano. Eles tornam-se, por muitas vezes, protagonistas na geração ou testemunhas de uma das principais problemáticas da cidade: sua segregação, sua “interrupção (...) como totalidade sistêmica”3. Se muito abrupta, essa faixa de transição faz com que o espaço público deixe de ser contínuo e social, passando a ser interrupto por realidades repartidas e, assim, segregador. Para Julio Arroyo, professor argentino de Arquitetura

que discute a questão das fronteiras internas na cidade contemporânea, esta é cindida em duas: a cidade central e “oficial”, seja ela em centros regionais, centros urbanos ou centros de bairro; e as cidades outras, seja a cidade periférica, a do subúrbio residencial, ou a marginal e pobre. Os terrenos ou elementos que demarcam física e simbolicamente essa repartição de cidade são as bordas.

(...) uma via marginal não só implica o limite entre a terra firme e a passagem à água como também um encontro entre cidade e natureza, por exemplo. Um corredor viário pode ser um elemento de associação entre duas vizinhanças enquanto que uma via férrea pode demarcar bairros irreconciliáveis entre si.3

1. Neologismo 2. Definição retirada do dicionário online Michaelis, consultado em 4 de junho de 2014, disponível em:<http://michaelis.uol.com.br> 3. ARROYO, Julio. “Bordas e espaço público. Fronteiras internas na cidade contemporânea”. Arquitextos, São Paulo, ano 07, n. 081.02, Vitruvius, fev. 2007. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/07.081/269> 20


Na cidade de Nova York, nos Estados Unidos, por exemplo, onde existe hoje o “High Line Park”, outrora existiu a “High Line”, linha férrea suspensa desativada em 1980. A intervenção arquitetônica para a reforma e reuso da linha de trem sem mais utilidade não deixa de ser uma intervenção em borda. A estrutura da linha férrea desativada contribuía fortemente para a criação de um lugar ermo em seu baixio, uma área alienada, degradada e marginalizada em relação aos seus arredores, constituindo uma imensa ruína, um genuíno vazio urbano (conceito que abordarei mais à frente) nos entremeios da cidade.

FIGs. 4 e 5 - Fotos da “High Line” ainda como linha férrea ativa. Autor desconhecido. Fonte: The High Line (org.)


A linha férrea original de 1934 atingia o bairro do “Soho”, porém, a parte sul foi demolida nos anos 60, o que em 1999, também parecia inevitável para a extensão restante, não fossem os esforços da associação formada a partir de uma reunião entre empreiteiros e moradores do bairro. A associação conseguiu provar que o parque seria capaz de gerar lucro, cobrindo os gastos com a sua reforma e melhoria. A criação do “High Line Park”, a partir de uma bem-sucedida inciativa público-privada, foi projeto, resultado de um concurso, de colaboração entre a James Corner Field Operations, o escritório Diller Scofidio + Renfro e, também, o paisagista Piet Oudolf. O parque criado é um exemplo de projeto sustentável concretizado por meio da participação da comunidade e é listado, hoje, como um dos mais frequentados por nova-iorquinos e por turistas. Seu sucesso resultou na transformação do bairro e no desenvolvimento econômico e imobiliário do seu entorno. A obra serviu para a revitalização da área, através do estabelecimento de um programa público, aberto e inovador, com a criação de um espaço de convivência em uma área antes abandonada e sem uso que era a estrutura da antiga linha férrea. Além disso, o distrito onde se encontra o parque elevado hoje é palco de novas obras arquitetônicas; o “High Line” tornou-se um agradável passeio que conduz o visitante sobre, em volta e por dentro de novas edificações de uma arquitetura “viva”; como a nova sede do Whitney Museum de Renzo Piano, ou o Standard Hotel, que pousa sobre o parque.

FIG. 6 - Foto do “High Line” sem uso, antes da reforma acontecer. Evidenciando o crescimento da vegetação espontânea e descontrolada. 22


antes

FIG. 7 – Foto do “High Line” sem uso, antes da reforma acontecer. Cartaz diz “Salvem os trilhos”, em inglês.

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FIG. 8 - Foto do “High Line� sem uso, antes da reforma acontecer.

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FIG. 9 – Foto do “High Line” sem uso. Foto de Joel Sternfeld, no ano 2000.

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depois


FIGs. 11 e 12 - - Fotos de Iwan Baan, 2014 do “High Line Park”. Fonte: The High Line (org.)

FIG. 10 - Foto aérea + implantação do projeto do “High Line Park”. Fonte: The High Line (org.)


FIGs. 13 e 14 - Fotos de Iwan Baan, 2014 do “High Line Park”. Fonte: The High Line (org.) É importante, no entanto, destacar que, apesar de tratar nesta monografia principalmente dos casos de segregação urbana, não abrevio, a eles, o conceito de bordas. A borda, ainda que seja responsável por demarcar um elemento separador, pode constituir e fortificar conexões entre áreas distintas. Há terrenos intermediários que protagonizam encontros harmoniosos de transição entre dois ou mais tipos de ocupação territorial, assim como intervenções arquitetônicas, como o próprio “High Line Park” e outras que tratarei sobre mais à frente, que buscam converter regiões desconexas em lugares de união e convivência para as distintas realidades que se encontram nos territórios cindidos pelas bordas.

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Afirmo, também, que por “bordas urbanas”, não me refiro tão somente às extensões periféricas das cidades. As bordas existem não só na periferia, mas também no centro da urbe ou em áreas afastadas, tanto nas mais nobres, como em áreas de média e baixa renda. Resumidamente, com o desinteresse da elite pelo centro histórico4 e a resultante criação de outras centralidades por todo o tecido urbano, criaram-se, também, bordas espraiadas por toda a cidade, decompondo as diferentes formas de ocupação do espaço. Ao longo da história, as bordas se formaram devido a essas ocupações controversas não só por parte dos cidadãos mais pobres e marginalizados, mas também por parte das mais

altas classes sociais. Alguns dos pretextos foram e ainda são, por exemplo, processos de especulação imobiliária, restrições de localização à ocupação e até à capacidade das áreas urbanas em absorver essas populações em seus processos de migração.


FIG. 15 - Imagem explicativa sobre os movimentos de pessoas e grupos, dinâmicas de segregação e produção das bordas urbanas. Fonte: CORRÊA, Roberto L. e LIMA, Deyglis Fragoso de.

A imagem acima serve para ilustrar como se deu a ocupação das diferentes áreas das cidades brasileiras, por grupos de classes média e alta e por grupos das classes menos favorecidas. Isso ocorreu principalmente a partir dos anos 1970 com maiores migrações da zona rural e a consequente firmação das periferias. Evidencia também o fenômeno chamado “urban sprawl”, ou seja, a urbanização espraiada pautada pelos interesses do mercado, porém, precária e incompleta devido à ocupação de áreas que não possuíam ou previam estrutura para a ocupação residencial, resultando numa diversidade de interesses e usos em conflito e, portanto, na formação das bordas.

4. De acordo com Flávio Villaça em seu texto para a revista Estudos Avançados em 2011, não existe “deterioração” do centro nas cidades brasileiras. A elite é a única culpada por ter removido seus comércios, escritórios e moradias do centro e ter causado sua “decadência”. 29


OS TERRITÓRIOS HÍBRIDOS A partir da ideia de um “entre-lugar”5, um território expectante que existe entre dois cenários distintos, é que se associa o conceito de bordas ao de territórios híbridos. O próprio conceito de hibridismo define algo que provém de naturezas divergentes. A essa palavra está acoplada uma ideia não de dualidade, mas sim de multiplicidade. Pode-se relacionar o hibridismo à arquitetura e urbanismo em diferentes escalas e maneiras. Em menor escala, existe o hibridismo quanto aos programas arquitetônicos: um edifício híbrido seria um

edifício de programas diversos, totalmente independentes entre si, porém articulados no mesmo espaço; ou então, por exemplo, o hibridismo dos materiais e tecnologias: o natural e o artificial usados simultaneamente. Já o hibridismo em escala global e local seria o território que partilha de duas ou mais identidades. Um território híbrido, então, pode ser o vazio sob um viaduto, um galpão industrial abandonado, uma área marginalizada segregada da cidade, etc.

A natureza híbrida do projeto contemporâneo refere-se à atual simultaneidade de realidades e categorias já não referidas a corpos harmônicos e coerentes, mas aos cenários mestiços de estrutura e identidades em coexistência comensal.6

5. GUATELLI, Igor. “Arquitetura dos entre-lugares – Sobre a importância do trabalho conceitual”. Editora Senac, São Paulo, 2012 6. GAUSA, Manuel (editor). “Metápolis Dicionário Arquitetura Avançada”. Instituto Metápolis Arquitetura Avançada. Barcelona. 2001. (Página 268). O termo refere-se ao comensal ou inserções de sobreposição entre os códigos de informação diferentes. 30

Todo território híbrido não deixa de estar, portanto, presente em uma borda. Todo espaço urbano no vazio entre duas ou mais realidades divergentes, seja pela diferença de classes sociais, de uso ou modo de ocupação, está numa borda e é híbrido. O território híbrido é complexo, não é dual, é reinventado. São sítios em constante transformação.


Professor e arquiteto Igor Guatelli, em sua publicação recente “Arquitetura dos entre-lugares – sobre a importância do trabalho conceitual” de 2012, discorre sobre os territórios híbridos. Guatelli afirma que o foco de interesse, na arquitetura, que antes era centrado no objeto, agora se desloca para os intervalos, para os vazios entre as coisas. Esse lugar intermediário está em permanente latência, à espera de novas relações. Pode-se dizer de um jeito simplificado, que, por não se localizar nem completamente de um lado nem do outro, ele acaba constituindo um campo de ação imprevista, uma abertura para uma nova forma de interpretação do lugar. Não há um pensamento pré-determinado sobre como ou o que será daquele espaço como ocorreria projetando-se de um dos lados da borda.

O território híbrido é uma peça aberta que anexa operações pós-estéticas que descobrem novos usos e oportunidades e ressignificações. Espaços mais fluidos, com maior liberdade de ação e possibilidades para momentâneas reconfigurações, e que nós poderíamos chamar de arquitetura infraestrutural. Uma arquitetura como estrutura de apoio e alimentação de um futuro. Khôra, espaços ‘entre’.7

7. GUATELLI, 2012

O grande problema é que, na metrópole contemporânea, os “entre-lugares” não são interpretados dessa maneira, não se explora o potencial de reconfiguração que eles representam, resultando na desarticulação do território. Nesses espaços, existem imensas áreas dispersas que se configuram como fraturas, como rupturas do tecido urbano. Essa fragmentação que configura os territórios híbridos não faz com que a cidade se complemente, mas acaba reforçando sua descontinuidade. 31


Essa desarticulação do território pode ser vista nos arquipélagos de bairros que se margeiam, fragmentos de todas as escalas, alguns inteiros e quase homogêneos, saídos de uma superposição de diferentes épocas históricas e estruturas urbanas, que se cruzam sem definir espaços homogêneos, sem limites claros. A fragmentação territorial compreende uma rede desconexa de vazios urbanos, terrenos vagos e enclaves territoriais. Misturam-se a cidade formal e a cidade informal, ilegal de modo aleatório e disperso. Coexistem zonas abandonadas e áreas de ocupação intensa e desordenada.8

É, então, nos entremeios desse território desarticulado que surgem esses vazios urbanos, os terrenos vagos. A ideia de terrenos vagos, por sua vez, vem do termo “terrain vague”, de origem francesa e conceituado por Ignasi de Solà-Morales. Esses terrenos vagos, segundo o autor, constituem uma ruptura no tecido urbano, porém, ao mesmo tempo, são cheios de expectativa, de

8. LEITE, Carlos e AWAD, Juliana Di Cesare Marques. “Cidades Sustentáveis, Cidades Inteligentes”. Editora Bookman, São Paulo, 2012 32

possibilidades e possuidores de forte memória urbana. Eles surgem a partir das mutações urbanas do território. São terrenos sem uso atual, mas com a possibilidade de futuro potencial. Normalmente, atribui-se como exemplo a esse conceito os galpões industriais abandonados devido ao processo de desindustrialização metropolitana do final do século XX, ou literalmente terrenos

baldios. Porém, considero também como terrenos vagos os interstícios residuais, que ainda conferidos de um uso corriqueiro, não realizam conexão de identidade com o cidadão, são, a ele, alheios e não participam da vida coletiva na metrópole.


A BORDA: FORMAL X INFORMAL Um tipo de borda que se destaca na estrutura do tecido urbano, sobretudo nas cidades brasileiras contemporâneas e para o qual o foco deste trabalho irá caminhar deste ponto em diante, é a estabelecida entre a cidade dita informal e a formal, que secciona a cidade entre regulamentada e marginalizada. Destaque, principalmente, devido ao fato de que essa situação

reflete diretamente um problema social: a desigualdade. Essa situação de borda é um reflexo recorrente do próprio crescimento das cidades, principalmente nas periferias. Segundo Villaça, a cidade formal sempre serviu às classes dominantes, portanto, o espaço legal urbano se organizou conforme seus interesses. Consequentemente, os cidadãos pertencentes a classes sociais

FIG. 16 - Foto em Petare, em Caracas, Venezuela. Imagem de Lurdes R. Basolí, 15 de abril de 2010. Fonte: BASOLÍ, Lurdes

menos privilegiadas não foram prioridade no pensamento da ocupação de novas áreas da cidade e acabaram se estabelecendo em áreas periféricas, de risco geotécnico, áreas que margeiam aquelas concêntricas geradas pela especulação imobiliária que convinha somente aos ricos. Alerto, contudo, que a intenção deste trabalho não é assumir uma posição univalente sobre os territórios formais ou informais. Discorrer sobre a borda urbana que deslinda a segregação entre favela e cidade formal resulta em uma tarefa delicada já que me encontro na dualidade entre a racionalidade rígida da arquitetura doutrinada na faculdade e a cultura singular que existe na ocupação informal, do inacabado, da espontaneidade da autoconstrução popular e principalmente, a inegável proximidade social entre seus habitantes. É importante, ainda que difícil para arquitetos e urbanistas formados sob uma doutrina mais conservadora, reconhecer o valor no modo “informal” de se construir a cidade. Usamos, sem muitos escrúpulos, a palavra “urbanização” para descrever a intervenção na cidade informal, quando, na verdade, o tecido da favela carrega, às vezes, muito mais o significado de urbe que a cidade convencional.

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É preciso reconhecer, primeiramente, que a usual ocupação próxima e compacta de seus moradores, ainda que, muitas vezes, territorialmente extensa, que se dá na favela, sem o luxo de jardins, portões ou porteiros, contribui de forma positiva para que se estabeleçam as relações humanas; os vínculos e laços entre os moradores são fortes e há um sentimento de pertencimento ao território que não existe nos condomínios de muros altos ou nos shopping centers, que presam pelo isolamento do usuário. Aspectos que poderiam existir para a cidade como um todo, como, por exemplo, a mistura de usos na ocupação territorial, a independência do automóvel e o já mencionado senso de comunidade.

9. BRILLEMBOURG, Alfredo; FRANÇA, Elisabete; ZACARIAS, Elton Santa Fé; KLUMPNER, Hubert. “São Paulo Archi-tecture Experiment”. SEHAB, São Paulo, 2010 10. JACQUES, Paola Berenstein. “Estética da Ginga – A Arquitetura das favelas a partir da obra de Hélio Oiticica”. Editora Casa da Palavra, 2001 11. Levi Strauss – “pensamento selvagem” dos povos primitivos 34

O processo de construção da cidade informal, por si só, é inovador e fragmentário, pois se transforma continuamente. A favela, ao contrário da cidade formal, surge através de processos “bottom-up” (de baixo para cima); processos ligados às necessidades imediatas de quem habita, que participa diretamente do processo de construção. Não há projeto, na maioria das vezes (processos “top-down”). Para Zachary Aders9, a favela está associada à arquitetura vernácula. Nela, levam-se em conta, na construção das habitações, os materiais de construção disponível, em resposta ao clima e à topografia local. Paola Berenstein Jacques, em sua obra “Estética da Ginga”10, fala sobre uma condição “fragmentária” dos barracos, nas favelas. Segundo a autora, a construção deles é contínua, nunca cessa e sempre conta com melhorias. Como arquitetos, poderíamos aprender muito com a construção informal e suas soluções de improviso. Ainda conforme Paola Jacques, os favelados são “bricoleurs”11, dão voltas e contornos, realizam a arquitetura do acaso, definindo-se pela instrumentalidade, não pelo projeto.

FIG. 17 - Foto da favela Rocinha no Rio de Janeiro ao lado do bairro de São Conrado, 2000. Foto de Alicia Nijdam. Fonte: NIJDAM, Alicia em Flickr


Por outro lado, também se verifica que, embora existam regras socialmente inclusivas na favela, a comunidade não é homogênea, nem igualitária. De acordo com Carlos Lessa, os que dispõem de algum poder “prosperam reexplorando os pobres na favela: o dono da birosca, a comissão de energia elétrica, o senhorio do barraco, etc.”12. Nos conformes da cidade clássica, repete-se a heterogeneidade e hierarquia das relações socioeconômicas. Deste modo, não acredito que o pressuposto deva ser que a cidade formal deve se tornar informal ou vice-e-versa. Ainda que apresente qualidades positivas, o território informal também é passível de melhoramentos. Mesmo sendo a representação de uma comunidade mais íntegra, além das carências de infraestrutura e salubridade de moradia, a favela ainda não constrói um espaço público de qualidade. A borda gerada entre favela e cidade, como produto de preconceito e questões ligadas a interesses políticos e sociais, é rígida, estigmática e ignorada, na maior parte das vezes. É crível sim que a cidade formal e a informal possam aprender uma com a outra, de forma mutualística. É preciso elaborar a melhor forma de se conectar física, econômica e socialmente ambas as partes.

12. LESSA, Carlos. “O Rio de todos os Brasis.” Rio de Janeiro, Record, 2005 13. VILLAÇA, 2011

É ainda mais conflitante e contrastante a segregação dessas sociedades, quando estas se localizam vizinhas de comunidades de classe média ou alta, o que ocorre em alguns lugares do mundo. Quando temos a oportunidade de observar do alto grandes cidades como Caracas, na Venezuela, a Cidade do México e Rio de Janeiro ou São Paulo, no Brasil - ser o ponto que vê, a “ficção do saber”, segundo Michel de Certeau - conseguimos perceber com maior clareza como nossas cidades são segregadas e segregadoras.

A concentração de uma determinada classe social em determinada região da cidade não significa que tal camada seja ali exclusiva.13

FIG. 18 - Foto em Santa Fé, Cidade do México



FIG. 19 (PÁG. 36) - Foto da borda Tijuana-San Diego, que separa os EUA do México. Caracterizada pela desigualdade entre os dois lados e o preconceito que lá existe. Fonte: National Guard Bureau

FIG. 21 - Mapa do Brasil com localização de aglomerados subnormais feito pelo IBGE, 2010. Fonte: FOLHA

FIG. 20 (PÁG. 36) - Foto do Morumbi e Paraisópolis. Fonte: MARUTA, Jorge, Jornal da USP 37


No Brasil, de acordo com dados fornecidos pelo Censo do IBGE do ano de 2010, em 323 municípios, 11 milhões de pessoas residem em favelas, ou “aglomerados subnormais”. A região Sudeste, a mais desenvolvida economicamente do país, é a campeã, em números. Isso demonstra a lógica anteriormente apresentada do surgimento das favelas estar, também, intrinsicamente pautado pelo interesse econômico e o crescimento urbano da cidade. Grandes

polos econômicos, como é o caso da região sudeste do Brasil, acabam se ampliando de maneira expressiva, economicamente, e gerando, simultaneamente, riqueza e pobreza, nos radicais mais extremos. Nestes polos, exprime-se grande necessidade de mão de obra e, incapazes de absorver o novo contingente populacional proveniente de outras regiões brasileiras, forçosamente, levam o pobre a ocupar terras de baixo interesse comercial ou de uso restrito pela legislação urbana.

Mapa das Favelas em São Paulo

FIG. 22 - Mapa de favelas por subprefeituras no município de São Paulo. Fonte: SEHAB 38

A maior cidade do Brasil e mais populosa da América latina não é exceção a esse fenômeno. São Paulo recebe, ainda que atualmente de maneira mais atenuada, migrações de áreas rurais de todo o país. 92% da população da favela de Heliópolis, por exemplo, é proveniente da região Nordeste14. Segundo a Secretaria Municipal de Habitação, cerca de três milhões de moradores da região paulistana vive em assentamentos precários (favelas, loteamentos irregulares ou cortiços). São, ao todo, 1500 favelas, 1060 loteamentos irregulares e 523 conjuntos habitacionais só na cidade de São Paulo.

14. SARDENBERG, Victor. “Processos emergentes em territórios informais”. Monografia para conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo para a Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2013, p. 21


Logo, é preciso encarar que essa circunstância não é simplesmente “reversível”. Quase 30% da população do maior munícipio do país está alojada nesses territórios; eles fazem parte da cidade e devem, assim como áreas consideradas mais “urbanas” usufruir de toda ela da mesma maneira, com os mesmos direitos a uma ocupação decente. As favelas, segundo Elisabete França15, estão “inseridas na estrutura da cidade como um de seus elementos morfológicos” e “definem seu partido urbanístico”. No mundo, cerca de um bilhão de pessoas vive em favelas e esse número tende a aumentar. A projeção, segundo Carlos Leite16, é de que, em 20 anos, as megacidades em países pobres vão abrigar 80% da população. Não se deve mais, hoje em dia, enxergar a favela como antigamente. O termo em inglês “slum”, na sua origem, estava associado a um tipo de estelionato ou prática criminosa17. Hoje em dia, deve-se combater essa visão que reforça o preconceito contra a favela e o favelado, abandonando a ideia de que estas regiões devam ser, de alguma forma, “higienizadas”. A extrema proximidade, em bordas urbanas, entre a cidade formal e informal, é motivo suficiente para reforçar o pensamento de reintegração dos tecidos informais à cidade, tanto social quanto urbanisticamente.

FIG. 23 - Distribuição de favelas, cortiços e loteamentos irregulares no município de São Paulo. Fonte: FRANÇA, Elisabete

15. FRANÇA, Elisabete. “São Paulo Architecture Experiment”, 2010, p. 11 16. LEITE & AWAD, 2012, p. 24 17. DAVIS, Mike. 2006, p. 32 39



FIG. 24 - Projeto da Sede de União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social, Franklin Lee (SUBdv). Segunda opção de terreno, na rua Laerte Setubal, que conecta a Av. Giovanni Gronchi à favela de Paraisópolis. Fonte: SUBdv

PROJETANDO NAS BORDAS


Levanta-se, então, a seguinte indagação: Como se desenvolve o projeto arquitetônico nestes territórios intermediários que são as bordas? E a resposta não é simples nem creio que eu a tenha descoberto ao longo da minha pesquisa. Acredito que não há, nem pretendo estabelecer, “modus operandi” de como executá-lo e não são muitos os resultados concretizados, nem se passou tanto tempo de sua conclusão para avaliar de forma válida sua repercussão no território. O assunto é, ainda de certa forma, recente. O que existe e que vou expor são experimentações arquitetônicas de situações similares, em essência ou ocasião, que caminham para que seja alcançada a melhor solução, aquela que peleja pela continuidade do espaço urbano como tecido e contra a ruptura da cidade em territórios desconexos e o consequente distanciamento dos seus cidadãos. Como já previamente dito, o território híbrido das bordas está em permanente latência; são sítios que dão abertura a novas possibilidades de ação. O simples fato de eles partilharem de realidades distintas e o choque de diferenças que neles existem, conferem a ele um caráter único que deve ser explorado. A execução de uma arquitetura de programa tido como “ortodoxo” seria, possivelmente, parcial e só serviria propósito a uma dessas realidades. Deve-se tomar o território híbrido como um espaço de todos e para todos.

Esses territórios estão em necessidade de reativação. “Inéditos”, de certa maneira, eles constituem um novo palco para a arquitetura. Função e forma não são abandonadas, mas sim enriquecidas. Possuem uma superfície geradora de conflitos, que está à espera de novas relações e constantemente em mutação. Rachel Coutinho Marques18 fala sobre fronteiras vivas; espaços de transição de estrutura social complexa e forte concentração demográfica; espaços permeáveis que permitem um intenso intercâmbio social, baseado na interação e integração dos cidadãos que ali habitam. De acordo com Marques, nessas fronteiras é que se torna possível o surgimento de novos espaços e novas culturas, a partir das subculturas divididas pelas barreiras e trincheiras. Carlos Leite, por sua vez, discorre sobre a “demanda dos urbanoides”19, cidadãos, atualmente, com o desejo de inovação, de compartilhar, de interagir. Tudo parece se conectar. Estamos “com a faca na mão”. É sob esse olhar que deve ser enxergada a intervenção nos territórios híbridos.

18. MARQUES, Rachel Coutinho (org.). “A cidade pelo avesso: desafios do urbanismo contemporâneo”. Editora Viana Mosley. Rio de Janeiro, 2006 19. LEITE, C. “TERRITÓRIOS HÍBRIDOS + REINVENÇÃO URBANA: AMERIKA”. VIRUS, São Carlos, n. 9 [online], 2013. Dísponivel em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus9/?sec=8&item=1&lang=pt> Acesso em 08 Mai, 2014 42


No final do século 20, devido ao crescente processo do mundo digital, viu-se o aparecimento de fortes ‘verdades urbanas’: ‘morte da distância’, ‘fim da geografia’, ‘fim da história’ e a ‘morte das cidades’. Passados quinze anos, o que se vê agora é quase o oposto. Mesmo sendo mais conectados digital e virtualmente, pessoas ao redor do mundo estão se encontrando fisicamente. Em cidades. Como nunca antes. Para fazer tudo, dos movimentos de ocupação (occupy), ao compartilhamento de conhecimento, cultura, emoções, trabalhos e ideias inovadoras.20 Os territórios híbridos, os “entre-lugares”, devem ser protagonistas de uma união de incompatibilidades, onde se conectam as diferenças; híbridos, neste sentido. “Onde o lugar não é diluído por completo nem o não-lugar é consumado de fato”21. O “não-lugar”, sobre o qual fala Ulisses Maciel em seu texto “(não) lugares, uma etnologia da solidão”, seriam o oposto do lar, o oposto do lugar, que, segundo Augé, possuem três características fundamentais: são identidários, relacionais e históricos.

Os não-lugares, por sua vez, configuram espaços em que os indivíduos encontram-se sozinhos, sem identidade, relação ou história para com o lugar. Shopping centers, supermercados, estações de metrô e aeroportos são alguns exemplos destes não-lugares. Igor Guatelli, que também debate as intervenções nos territórios híbridos, defende a ideia do movimento e das relações do usuário com o espaço. Ele também menciona a ideia de um projeto definidor de novos

usos, contrário à de um programa ortodoxo definido de acordo com usos adequados e apropriados ao tema. Além disso, Igor propõe questionamentos por parte dos próprios usuários do projeto, ou seja, que realizem, ou não, de forma total ou parcial, atividades novas, não previstas pelo programa inicial. Acima de tudo, fala-se de possibilidades programáticas. Os objetos arquitetônicos se abririam para além do programa dado ou sugerido. É aí que se instala a noção do vir a ser, o porvir.

FIG. 25 - “Parklets”, recentemente regulamentados na cidade de São Paulo. Prática inovadora e criativa que estende a calçada para parte da rua em que se estacionariam os carros, transformando o ambiente da calçada, impessoal, corriqueiro em ambiente de encontro e convívio. Foto de Fábio Arantes.

20. LEITE, 2013 21. MACIEL, Ulisses. “(Não) Lugares, Uma etnologia da solidão” 43


O programa em arquitetura passaria a ser entendido como programação de situações geradoras de acontecimentos. Seria uma condição mínima para a ativação de um suporte arquitetônico e um lugar.22 Um exemplo, numa escala menor, relativa ao projeto não à ocupação territorial, de um espaço “entre”, “híbrido” que poderia eventualmente ter se tornado um vazio urbano, mas demarca uma feliz conexão, é a Marquise do Parque do Ibirapuera, em São Paulo. A cobertura não funciona somente como conexão dos edifícios do parque, mas também como espaço de permanência e encontro. Os usuários da marquise não são necessariamente de mesma origem social, econômica ou ideológica e, ainda assim, encontram-se sob o mesmo pretexto e sentem-se livres para realizar as mais diversas atividades no espaço. O projeto é uma intervenção na borda em dimensão local, ou seja, entre edifícios com diferentes objetivos.

22. GUATELLI, 2012 44

FIGs. 26 e 27 - Fotos de diferentes públicos se apropriando do espaço coberto pela Marquise do Parque Ibirapuera. Autoria: Julia Chequer e Silva Junior, respectivamente. Fonte: Folhapress


Igor Guatelli também fala de uma estratégia para a reativação desses territórios: a mínima arquitetura para o máximo de urbanidade. De acordo com o autor, essa estratégia, o mínimo programático, o “grama do programa”, é oposta a construção de megaestruturas sobrepostas ao existente, de usos delimitados e condicionados, de “oásis multifuncionais”. Como exemplo, Igor apresenta uma intervenção em uma antiga casa de máquinas à margem do rio Main, em Frankfurt, Alemanha. O projeto do bb22 architekten transforma um espaço estreito, de três por dois metros de dimensões em um bar, que vira ponto de encontro social movimentado às margens do rio, abandonadas em outra instância.

FIG. 28 - “Main Café”, Frankfurt, Alemanha. Projeto do escritório bb22 architekten

Estes projetos, a meu ver, buscam inspiração na surpresa do informal, no social, projetos sem, necessariamente, um rigor formal, que não partem de uma definição projetual universalmente concebida, mas sim de baixo para cima, processos bottom-up. Projetos que levam em conta a usabilidade da arquitetura, seu frequentador e suas necessidades. A necessidade de reinvenção.

FIG. 29 – Área externa do “Main Café”, Frankfurt, Alemanha. Projeto do escritório bb22 architekten


Academia Cora Garrido Um projeto de intervenção em vazio urbano que merece ênfase neste texto é a academia Cora Garrido. O equipamento, idealizado por Nilson Garrido e Cora Batista, é inserido no baixio de um viaduto, um resíduo urbano coberto, fechado e sem acesso, nem uso. Híbrido, já que está entre o lugar fechado e a rua, aberta, corriqueira. O lugar é dedicado ao esporte e à cultura, é hospitaleiro; constrói um novo lugar de encontro, de contato social. O projeto conta

FIG. 30 - Academia Cora Garrido no baixio do Viaduto do Café. Fonte: vitruvius 46

Viaduto do Café, São Paulo, SP

com uma academia de ginástica, ringue de boxe, uma pequena biblioteca comunitária e uma escola infantil. É uma ideia inovadora, que reinterpreta um espaço vazio como um terreno para que se desenvolvam novas atividades. A localização também contribui para configurar o projeto como um ponto de parada com potencial para agregar qualidade de vida às pessoas que por ali transitam diariamente.


FIG. 32 - Academia Cora Garrido - “Diagrama de densidade de ocorrência”. Fonte: ROSA, Marcos L.

FIG. 31 - Academia Cora Garrido no baixio do Viaduto do Café. Fonte: vitruvius 47


Igor Guatelli fez um projeto para o local; segundo ele:

Em um projeto arquitetônico para o improvisado local, optou-se por acentuar a dupla condição do local através da criação de um lugar de multiplicidades, combinando espaços de maior especificidade programática, como uma Biblioteca e escola infantil, com espaços mais fluidos, de maior liberdade de ação e possibilidades de reconfigurações momentâneas. Ringues de Boxe deslizantes em trilhos, armários pivotantes, pavimento em radier, degraus como arena, mezanino, associados a uma absoluta transparência, garantem um espaço flexível e estimulante às ocupações espontâneas. Atores urbanos voluntários em parceria com arquitetos e poder público, talvez configurese aí uma nova modalidade de gestão urbana e engendramento de democracias locais.23

23. GUATELLI, Igor. “OS PROJETOS DE RECONFIGURAÇÃO DE TERRITÓRIOS URBANOS: CONDIÇÕES TEÓRICAS”, 2007. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FAU/Publicacoes/PDF_IIIForum_a/MACK_III_FORUM_IGOR_GUATELLI.pdf> Acesso em 06 de Novembro de 2014.

FIG. 33 e 34 - Imagens digitais renderizadas do projeto de Igor Guatelli para a Academia Cora Garrido. Fonte: vitruvius


FIG. 35 - Maquete do projeto de Igor Guatelli para a Academia Cora Garrido. Fonte: vitruvius


FIG. 36- Maquete do projeto de Igor Guatelli para a Academia Cora Garrido. Fonte: vitruvius


FIG. 37 - Cortes do projeto de Igor Guatelli para a Academia Cora Garrido. Fonte: vitruvius 51


Centro Cultural / UMCP “Paraisópolis: Escadão vai virar projeto social”. Era com essa chamada que o projeto de Franklin Lee, do escritório Subdv, para a nova sede da UMCP - União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis/Centro Cultural aparecia nas páginas do jornal do Estado de S. Paulo, em 2009. Inicialmente planejado para que fosse inserido na borda da favela de Paraisópolis em um grande escadão que a conectava à Avenida

FIG. 38 - Projeto da Sede de União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social, Franklin Lee (SUBdv). Opção inicial de terreno. Fonte: SUBdv 52

Paraisópolis, São Paulo, SP

Giovanni Gronchi, é outro trabalho que julgo extremamente conveniente apresentar nesta monografia e foi uma das principais inspirações para desenvolver o projeto arquitetônico que apresentarei ao final da mesma. Em uma legenda da manchete, lia-se: “Integração: Comunidade quer que vizinhos do Morumbi participem das ações do novo espaço”.

O projeto conta com salas de aula, quadra esportiva, anfiteatro e horta comunitária. Um espaço voltado à educação, à cultura, ao lazer e, principalmente, ao encontro público e social dos moradores da região.


A intenção do projeto é a de expandir uma escadaria já existente para além de seu programa básico. Nesse lugar de passagem e acesso, será proposto um espaço de encontro e convívio. A nova sede pretende reunir projetos sociais já existentes, como biblioteca, capacitação profissional, alfabetização de adultos e cursos pré-vestibular. Conforme Gilson Rodrigues, a intenção por trás do projeto era: “(...) aglutinar tudo e criar um espaço de encontro da comunidade. E, como tem o escadão, fazer com que os moradores vizinhos venham participar com a gente”. É importante ressaltar que não existem, na região, projetos que visam essa integração e há, apenas, duas escadarias que fazem a conexão entre a Av. Giovanni Gronchi (via de maior movimento da região e que a conecta ao sistema de transporte público da cidade) e a comunidade de Paraisópolis. Entretanto, por motivos que desconheço, o projeto mudou duas vezes de terreno e a localização final escolhida fica na margem da favela oposta à da Av. Giovanni Gronchi, próximo à Avenida Hebe Camargo, via perimetral nova que também funciona como conector da favela de Paraisópolis ao sistema de transporte metropolitano, como também ao novo Parque Paraisópolis (em projeto). Manteve-se a intenção de expandir a comunidade para seus arredores, mas ainda distante do principal eixo do Morumbi; barreira que um dia haverá de ser vencida.

FIG. 39 - Manchete do Estado de S. Paulo mencionando o projeto de Franklin Lee (SUBdv) para a nova sede da União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social. Fonte: SUBdv 53


Opção inicial de terreno para implantação do projeto. FIG. 40 – Projeto da Sede de União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social, Franklin Lee (SUBdv). Opção inicial de terreno. Fonte: SUBdv


Opção final de terreno para implantação do projeto. FIG. 41 - Projeto da Sede de União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social, Franklin Lee (SUBdv). Opção final de terreno, ao lado da Avenida Perimetral de Paraisópolis. Fonte: SUBdv


FIG. 42 – Planta do Projeto da Sede de União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social, Franklin Lee (SUBdv). Opção final de terreno, ao lado da Avenida Perimetral de Paraisópolis. Fonte: SUBdv FIG. 43 (PÁG. 57) - Cortes do projeto da nova sede da União de Moradores de Paraisópolis/Centro Cultural Social, Franklin Lee (SUBdv). Opção final de terreno. Fonte: SUBdv 56


57


Fábrica de Música do Grotão O projeto último que me deparei ao longo de meu estudo e achei apropriado apresentar é a Fábrica de Música, no Grotão, microrregião de Paraisópolis. O projeto é um complexo cultural local e é fruto de um workshop realizado na comunidade, em parceria com a Secretaria de Habitação do Município de São Paulo, no ano de 2011, no qual se propunham táticas de intervenção em áreas de ocupação críticas. A ideia é de autoria dos arquitetos Alfred Brillembourg e Hubert Klumpner do escritório Urban Think Tank e tem como prioridade equipar a área com infraestrutura, serviços e espaços públicos de convivência. Além de, claro, fazer conexão interna em condições mais adequadas que a das ruas irregulares através de uma grande escadaria.

Paraisópolis, São Paulo, SP

Ainda que não realize diretamente a conexão entre cidade formal e informal, estando localizada no centro da favela de Paraisópolis, a região do Grotão conecta-se a uma única via de grande circulação que integra a área ao sistema viário da cidade formal. Além disso, a área onde se insere o projeto é de grande desnível, difícil acesso e alto risco à ocupação, havendo a necessidade de remoção de moradias com frequência, resultando num vazio urbano em meio ao denso tecido de Paraisópolis. O projeto busca solucionar este problema, reintegrando a região aos seus arredores e estabilizando a situação de risco, mantendo topografia existente, vencendo-a por meio de rampas, escadas e elevadores, estabilizando-a de forma a conter as erosões e deslizamentos. Na porção mais alta do terreno, serão implantadas pequenas edificações de habitação para relocar o número de pessoas a ser removido da região de risco para a construção do projeto.

FIG. 44 (PÁG. 59) - Fábrica de Música do Grotão. Fonte: Urban Think Tank 58



FIG. 45 - Fábrica de Música do Grotão. Fonte: Urban Think Tank A Fábrica de Música do Grotão foi o projeto ganhador da categoria Ouro do Prêmio Holcim – Construção Sustentável 2010–2012 – América Latina, devido às diversas características ambientalistas de baixa tecnologia presentes no projeto. A Fundação Holcim, organizadora desta premiação, irá colaborar com o financiamento e construção do projeto. Segundo o júri da premiação:

24. Fonte: http://concursosdeprojeto.files.wordpress.com 60

FIG. 46 – Esquema de circulação e acessos em níveis múltiplos do projeto da Fábrica de Música no Grotão, Paraisópolis. Fonte: Urban Think Tank

É de alta qualidade a abordagem urbana utilizada na criação de uma densidade vertical no contexto da expansão de baixa densidade da favela e na abertura para espaços públicos ao seu redor, sob e dentro do edifício. Através do seu conceito integrativo e da introdução de instalações de ‘alto nível’ cultural com qualidade arquitetônica, o projeto tem o potencial de contribuir par ao enriquecimento da consciência social e da coesão na área. Além disso, a aplicação adequada de características técnicas possui um caráter exemplar e educativo.24


FIG. 47 - Corte perspectivado da Fábrica de Música no Grotão, implantada em área de grande desnível e risco à ocupação em Paraisópolis. Fonte: Urban Think Tank 61


FIG. 48 - Esquema dos elementos que comp천em o projeto. Fonte: Urban Think Tank 62


FIG. 49 - Implantação do projeto da Fábrica de Música no Grotão, Paraisópolis. Indicadas as principais ruas e ruelas que dão acesso ao projeto. Fonte: Urban Think Tank

FIG. 50 - Áreas de risco à ocupação em Paraisópolis. Área de inserção do projeto da Fábrica de Música destacada. Fonte: Urban Think Tank 63



FIG. 51 - “A Foto da Favela de Paraisópolis”, foto de Tuca Vieira. A favela de Paraisópolis ao lado de um edifício de alto padrão do bairro do Morumbi. Fonte: VIEIRA, Tuca

AS BORDAS EM PARAISÓPOLIS


dados gerais25 1km² de área 80-100 mil habitantes 15% analfabetos 3 1 1 UBS AMA CAPS 25 escolas

FIG. 52 - Vista aérea do Complexo Paraisópolis, seccionado nas microrregiões de Jardim Colombo, Porto Seguro, Antonico, Grotão, Grotinho, CentroBrejo e Palmeirinha. Fonte: FRANÇA, Elisabete.


PARAISÓPOLIS E O BAIRRO DO MORUMBI Passada, assim, a explanação teórica sobre as bordas urbanas, restrinjo-me, a partir deste ponto, à situação-recorte que escolhi como objeto de estudo e área de implantação do projeto arquitetônico. Paraisópolis, que já “ganhou o status de comunidade, mas não perdeu o estigma de favela”26 é, segundo o IBGE, a maior da cidade de São Paulo e a oitava maior do país. É importante advertir,

todavia, que estes dados são, possivelmente, incorretos. O levantamento do Censo Demográfico de 2010 indica que a população de Paraisópolis é de 42.826 mil habitantes, enquanto estimativas de entidades locais relatam que a população está entre 80 e 100 mil habitantes27. Ainda de acordo com o Censo, Heliópolis, outra grande favela de São Paulo, conta, no mesmo

levantamento, com 41.118 mil habitantes, enquanto fontes internas estimam cerca de 190 mil habitantes. O erro é justificado por Joíldo Santos, presidente em exercício e diretor de comunicação da União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis, em uma matéria para a página oficial da comunidade. O IBGE, aparentemente, não levou em consideração para o levantamento as microrregiões do Grotão, Fazendinha e Brejo, que, conforme Joíldo, abrigam cerca de metade da população de Paraisópolis. Além disso, ele esclarece que moradores de vielas apontaram que não foram visitados pelos recenseadores, resultando num levantamento impreciso da quantidade de moradores por domicílio.

FIG. 53 - Mapa de localização da favela de Paraisópolis no município de São Paulo. Fonte: FRANÇA, Elisabete.

25. (PÁG. 66) Fonte: Paraisopolis.org 26. Fonte: JUNG, Milton do Blog da Época SP – Adote São Paulo. “Morumbi quer mais segurança, Paraisópolis, respeito”. Disponível em: <http://colunas.revistaepocasp.globo.com/adotesp/2011/08/25/morumbi-quer-mais-seguranca-paraisopolis-respeito/> Acesso em 17 de Novembro de 2014 27. Informações retiradas da página oficial da Comunidade de Paraisópolis, em seção sobre Dados Demográficos. Disponível em: <http://paraisopolis.org/multientidades-de-paraisopolis/paraisopolis/> Acesso em 17 de no-vembro de 2014. 67


Paraisópolis localiza-se na subprefeitura do Campo Limpo, a com mais favelas da cidade de São Paulo, e presencia um dos mais complexos exemplos no Brasil de fronteira urbana. A comunidade está localizada no distrito da Vila Andrade, que abriga também bairros como o Real Parque e Morumbi, que se solidificaram como regiões residenciais de alto padrão. Para entender o surgimento de Paraisópolis, é necessário fazer reverência a um breve histórico que data da primeira metade do século XX. A

região é recente, abriga alguns dos últimos bairros a serem ocupados na metrópole, por se localizarem na margem oposta do Rio Pinheiros, em relação ao centro de São Paulo, sua origem. O arruamento da área em que hoje se encontra Paraisópolis foi originado em 1921, a partir de uma repartição, feita pela União Mútua Companhia Construtora e Crédito Popular S.A., de uma porção da antiga “Fazenda do Morumby28”, em 2.200 lotes com malha

viária ortogonal (as quadras possuíam 100 metros por 200 metros e ruas com 10 metros de largura). Contudo, os proprietários dos lotes, em sua maioria, os abandonavam pela dificuldade de ocupação devido à topografia e pela falta de infraestrutura no arruamento e no entorno. Muitos nem chegaram a tomar posse efetiva dos terrenos ou a pagar os tributos devidos. Dessa forma, facilitou-se a ocupação dos lotes por grileiros e posseiros29, intensificada no final da década de 60.

FIG. 54 – Imagem aérea das quadras levantadas, de forma incompleta, pelo Censo 2010 do IBGE. Fonte: Paraisópolis.org

28. Antiga grafia da palavra Morumbi 29. Grileiros, segundo o dicionário online Michaelis (consultado em 17 de novembro de 2014, disponível em <http://michaelis.uol.com.br>), são “indivíduos que, mediante falsas escrituras de propriedade, procuram apossar-se de terras alheias”. Enquanto posseiros são “aqueles que se encontram na posse clandestina ou ilegítima de certa área de terras particulares, ou devolutas, com a intenção de dono”. 68


De acordo com a Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo, esse processo de ocupação informal da área começou na década de 1950, com a transformação dos lotes em pequenas chácaras, principalmente por famílias japonesas que atuavam como grileiros. Já nos anos 60, deu-se a ocupação do bairro do Morumbi, com poucas casas e alguns bares, mas contando com a implantação de obras que incrementaram o interesse econômico pela região, como a construção do Estádio do São Paulo e a transferência do Governo Estadual para o Palácio dos Bandeirantes, além da criação dos cemitérios Gethsemani e Morumbi e a abertura de grandes vias de acesso ao bairro, como a Avenida Giovanni Gronchi. Nessa mesma época, foi elaborado, mas nunca saiu do papel, o primeiro Plano de Desenvolvimento Integrado de Santo Amaro (nome do antigo distrito ao que pertencia a região do Morumbi) que propunha a declaração da área como utilidade pública, visando uma futura urbanização.

30. Citação encontrada em: <http://www1.folha.uol.com. br/fsp/cotidiano/16345-paraisopolis-na-zona-sul-e-a-maiorfavela-paulistana.shtml>. Acesso em 17 de Novembro de 2014 31. Decreto Municial n° 42.871/2003. O referido Plano, após ser aprovado pelo Conselho Gestor da área, teve sua deliberação dada pelos Decretos municipais n° 46.018/05, n° 46.117/05 e n° 46.345/05. Fonte: CASTILHO, Juliana

Nos anos 1970, apareciam os primeiros barracos de madeira, no Jardim Colombo e Porto Seguro, favelas vizinhas a Paraisópolis. Também nesse momento, o poder público definiu que a ocupação da área seria restrita à habitação unifamiliar e de uso misto, criando condições para a implantação de um plano especial de ocupação a ser elaborado em cinco anos. Novamente, essas ações públicas não se concretizaram e entre 1974 e 1980 a ocupação informal se tornara mais intensa. Em 1980, a migração foi acelerada para a região, principalmente devido à facilidade de emprego no setor da construção civil, que crescia na região, pela grande especulação imobiliária do Morumbi. Segundo Maria Augusta Justi Pisani, arquiteta e professora: “A pessoa que precisa de dinheiro sabe que só vai ter se estiver perto de onde ele está”30. Entretanto, não houve um planejamento voltado ao atendimento da população mais carente da região que hoje é Paraisópolis, o que resultou em urbanização precária e condições mínimas de infraestrutura e serviços públicos. No final dos anos 90, verificou-se mais um aumento populacional devido, principalmente, à migração de moradores de favelas próximas, extintas pela Prefeitura. Durante esses anos, são ocupadas as microrregiões do Grotão e do Grotinho, regiões de risco geotécnico e difícil ocupação, que até então estavam sendo evitadas. Em 2002, o Plano Diretor Municipal estabeleceu a região como Zona Especial de Interesse Social – ZEIS-1; e um Decreto Municipal31 atribuiu à Secretaria da Habitação e Desenvolvimento Urbano, por intermédio da Superintendência de Habitação Popular, a elaboração e a implantação do Plano de Urbanização do Complexo Paraisópolis.

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Paraisópolis: linha do tempo 1948

FIG. 57 – Foto aérea do ano de 1987, década em que se tornou mais presente a ocupação informal da região pelo aumento da migração à região devido à eliminação de favelas em regiões próximas pela prefeitura e à facilidade de emprego que a região estava gerando pela crescente especulação imobiliária, construção civil. Fonte: FRANÇA, Elisabete.

1987

2000 1977 FIG. 55 – Foto aérea da região da Fazenda do Morumbi que viraria a tornar-se Paraisópolis, no ano de 1948, começando a dar início a sua ocupação. Nota-se já a presença da Avenida Giovanni Gronchi, mas ainda vê-se marcada a presença de vias não pavimentadas e pouca ocupação urbana e com densa vegetação, característica até hoje marcante no bairro. Percebe-se que a malha de vias já era demarcado, apesar de não ocupados os lotes, em sua maioria. Fonte: FRANÇA, Elisabete. FIG. 56 – Foto aérea de Paraisópolis em 1977. Já bem mais ocupada pela informalidade, pela ausência de políticas públicas que regulamentassem a ocupação da região. A malha viária se encontra ainda mais reticulada e mais próxima da situação atual. Fonte: FRANÇA, Elisabete. 70


2005

FIG. 58 (PÁG. 70) – Foto aérea dos anos 2000, regiões do Grotão e do Grotinho, mais frágeis à ocupação, começam a ser tomadas pela informalidade. Estavam sendo evitadas até então. Fonte: FRANÇA, Elisabete. FIG. 59 – Foto aérea da região de Paraisópolis, no ano de 2005. Ocupação muito parecida à foto anterior, ano de início das obras de urbanização. Observa-se poucas mudanças e poucas obras públicas na região. O bairro do Morumbi cresce cada vez mais. Fonte: Google Earth.

2014

FIG. 60 – Foto aérea do ano de 2014. Ano atual, é possível observar muitas obras resultantes do projeto de urbanização da favela, sobretudo em sua porção mais sudeste, pela implantação da Avenida Perimetral que fará a conexão da região ao Estádio do São Paulo, no Morumbi e ao futuro monotrilho da linha 17-ouro da CPTM. Nessa porção da favela concentram-se os projetos habitacionais, do futuro Parque Paraisópolis e do já muito frequentado CEU-Paraisópolis. Fonte: Google Earth.


Assim, com obras iniciadas somente em 2005, o projeto de urbanização de Paraisópolis vem batalhando para reintegrar a comunidade ao tecido urbano da cidade em meio a um cenário de grande desigualdade social. O plano, dividido em três partes, encontra-se desde 2010 na terceira e última fase. O plano já contemplou reformas e melhorias, como a implantação de viário, redes de distribuição de água e redes coletoras de esgoto, desocupação de áreas de risco, canalização de córregos e regularização fundiária; houve também a implantação de novos projetos destinados à habitação, à educação e, também, ao uso público, como é o caso do CEU-Paraisópolis (Centro Educacional Unificado), entregue em 2008, que, além de proporcionar estudo à grande parte da população, configurou-se como um dos poucos, se não único, edifício de grande porte destinado à cultura, lazer e esporte da região.

Existem, em Paraisópolis, 25 edifícios educacionais, dentre eles: quatro escolas estaduais, sete municipais e cinco creches principais. De acordo com Joíldo Santos, além da carência de espaços públicos destinados ao convívio e encontro social, sobretudo à noite, a maior preocupação da comunidade é acerca da construção de um hospital que sirva à região, já que o mais próximo é o Hospital Municipal do Campo Limpo, 5-6km distante da comunidade. Joíldo me conta, em uma visita que fiz a Paraisópolis, que o SAMU – Serviço de Atendimento Móvel de Urgência muitas vezes não adentra em certas ruas e vielas da comunidade. Há apenas três Unidades Básicas de Saúde – UBS, que atendem um número insuficiente de pessoas: 60 mil habitantes (todavia suficientes de acordo com os dados do IBGE). O levantamento populacional impreciso, ainda segundo Joíldo, acarreta problemas no aspecto da intervenção, já que a elaboração de políticas públicas leva em conta as estatísticas oficiais, permitindo que aconteçam algumas obras, porém deixando outras paralisadas, ou, até mesmo, nunca concretizadas, conforme o interesse público.

FIG. 61 (PÁG. 73) - Mapa de intervenções do Complexo de Paraisópolis, atualizado em 2013. Fonte: Paraisopolis.org 72



PROBLEMATIZAÇÃO: BORDAS EM CONFLITO Considerada a região com os mais altos valores de IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano32, o bairro do Morumbi, ainda que atualmente tenha se tornado mais acessível ao comércio e habitação em nível médio e popular, consolidou-se como e ainda carrega as chagas de um dos “bairros ricos” da cidade. Isso ocorre por que perduram, nele, os prédios de luxo, as mansões e os condomínios fechados, ilhados por muros e cercas, além de sistemas de vigilância e segurança privada. Distantes do centro da urbe, são habitações autossuficientes, providas de equipamentos de lazer dentro dos seus limites, eximindo seu morador da necessidade e da responsabilidade de conviver com a cidade, de conhecer os arredores do lugar onde vive.

32. Fonte: CASTILHO, Juliana Vargas de. “A Favelização do Espaço Urbano em São Paulo. Estudo de Caso: Heliópolis e Paraisópolis”. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2013 74

Os condomínios fechados privatizam o espaço público e este se torna mínimo, abandonado e quase inexistente em uma região em que esse tipo de morada é predominante. Segundo Jan Ghel, a desigualdade social e econômica contribui, sim, para altos índices de criminalidade, porém, simples soluções individuais na forma de tentativas privadas para proteger a vida e a propriedade não surtem efeito em locais onde a sensação de insegurança tem profundas raízes nas condições sociais. De acordo com Rachel Coutinho Marques, a solução é estudar as possibilidades de trocas locais, entre as áreas pobres e ricas, de forma aberta, múltipla e flexível. Não é possível somente alimentar o discurso da segurança e do medo. Dessa forma, os espaços

públicos são esvaziados e proliferam-se os muros, as grades e as comunidades fechadas, homogêneas.


Mais agravante ainda é constatar o fato de que o cidadão brasileiro, por vezes, ostenta a maneira como vive: isolado. O filme-documentário de Gabriel Mascaro chamado “Um Lugar Ao Sol” exibe entrevistas realizadas com moradores de apartamentos de cobertura em grandes metrópoles brasileiras, como São Paulo, Rio de Janeiro e Recife. Os entrevistados mencionam uma “sensação de domínio”, ao enxergar a cidade do alto; descrevem suas moradas como “ilhas” e acham ótimo que se sentem assim, reclusos. Uma moradora de uma cobertura no Rio de Janeiro, diz achar muito bonitas as cores que vê na favela quando ocorre algum tiroteio. Alguns exaltam a existência de dois andares nas coberturas, assim, não tem sua privacidade violada pelos seus vizinhos, ainda que do mesmo prédio, ou podem escapar dos barulhos que fazem as empregadas domésticas que ali trabalham, com panelas e louças. O distanciamento é extenso. De ambos os lados. O preconceito persiste e a vontade de ceder não é generalizada. O intento de integração existe, só precisa ser reforçado. O movimento “SOS Morumbi” foi criado pela população de classes média e alta da região que clamam por mais segurança no bairro. Incomodados com a presença de Paraisópolis, em sua maioria, às vezes referindo-se aos favelados como “moradores indesejados”33, reivindicam a instalação de uma base da Polícia Militar dentro de Paraisópolis, assim como aumento do número de policiais em toda a região. O contexto do Morumbi se assemelha à realidade carioca, em que moradas de luxo e favelas são vizinhas. Lá, foram criadas as UPPs – Unidade de Polícia Pacificadora, sob situação parecida, onde os ricos pediram este tipo de intervenção.

No entanto, os cidadãos devem se abster dos discursos generalizantes de ódio e preconceito, que aumentam o muro que separa Morumbi de Paraisópolis. “Um não existe sem o outro, menos ainda contra o outro”, diz Milton Jung. Desde sempre, os moradores de Paraisópolis, em maioria, convivem diariamente com os moradores do Morumbi, trabalhando em suas casas e nos comércios que frequentam, como porteiros, zeladores, faxineiros, seguranças, empregadas domésticas, cabeleireiros, com, claro, suas devidas exceções. Existem aqueles que não trabalham em regiões próximas e aqueles que trabalham dentro da própria comunidade. Mas a proximidade do emprego em condições simples e um lugar de fácil e barato acesso à moradia gera este tipo de situação cambial.

33. Citação obtida por Joíldo Santos, 2011. Fonte: Paraisopolis.org 75


Os moradores de Paraisópolis também são alvo da criminalidade, são reféns diários dela, inclusive. E sem muito direito a protestar, já que são frequentemente associados à ilegalidade, por seus vizinhos e pela mídia. Segundo Joíldo Santos, “Paraisópolis e o Morumbi precisam substituir os muros por investimentos sociais”. Ele aposta nos espaços públicos, nos investimentos em educação, saúde, esporte e moradia, através de, por exemplo, a continuidade do programa “Virada Social”, que em 2009 definiu 126 ações do Estado na comunidade, porém, foi interrompida e apenas 22 foram concluídas. Ele completa, afirmando que ações pontuais e emergenciais não são suficientes para resolver os problemas de desigualdade. “Problemas sociais se resolvem com políticas sociais e mais presença do poder público”.

FIG. 62 - “Desigualdade social, a origem de todo mal”. Pichação em muro na Avenida Giovanni Gronchi, que segrega a favela de Paraisópolis do Morumbi. Fonte: Paraisopolis.org


FIG. 63 - Foto de Parais贸polis e Morumbi ao fundo. Foto de Roberto Rocco, 2011. Fonte/Autoria: Roberto Rocco, TUDelft


FIG. 64 - Passeata em Paraisópolis, favelados exigem mais respeito do poder público para cumprimento de programa de urbanização. Fonte: Campanha Paraisópolis


FIG. 65 - Outra foto de Parais贸polis e o bairro do Morumbi ao fundo. Foto de Roberto Rocco, 2011. Fonte/Autoria: Roberto Rocco, TUDelft

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FIG. 66 - Foto de Parais贸polis e Morumbi. Fonte: Plataformaurbana.cl



FIG. 67 - Imagem renderizada do Complexo Aquático Morumbi-Paraisópolis (CAMP). Projeto arquitetônico a ser apresen-tado como produto final da monografia. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014

ÁGUAS DE TRANSIÇÃO: PISCINAS PÚBLICAS


UMA NOVA PORTA DE ENTRADA PARA PARAISÓPOLIS Finalmente, apresento a proposta arquitetônica que desenvolvi, como produto derradeiro desta monografia, para a região da fronteira entre a favela de Paraisópolis e o bairro do Morumbi: um complexo de piscinas públicas. O projeto foi desenvolvido, durante o último ano, com embasamento nos princípios teóricos que já expus ao longo deste trabalho. Faço a ressalva, todavia, de que me reservei o direito de fazer uso deles adaptando-os conforme julguei pertinente e cabível, ao invés de segui-los cega e literalmente, devido, ainda, ao próprio caráter experimental que esses conceitos carregam. A opção por inserir o objeto arquitetônico em questão em um terreno na Avenida Giovanni Gronchi fundamentou-se na identificação desta área como uma borda e o fato de que, assim como constatado nos primeiros capítulos, ela encontra-se segregada, partilhando de diferentes realidades e está à espera de novas relações e novos programas, para que os moradores de seu entorno possam conviver e coagir no mesmo espaço. A circunstância de borda urbana entre a realidade da comunidade

34. Informação fornecida em conversa com Joíldo Santos, em visita a Paraisópolis. 84

de Paraisópolis e o bairro classe média/ alta que a cerca é fisicamente demarcada pela avenida, como se pode observar através de fotos aéreas. Ao percorrê-la, não há indícios, nem ao menos, da existência da comunidade “informal” vizinha, que se esconde na baixada do relevo íngreme e que pode ser observada apenas pelos interstícios dos enormes prédios, galpões de concessionárias e estreitas ruas que a atravessam; além de alguns terrenos desocupados, como é o caso do escolhido para a implantação do projeto. Na via, são predominantes as arquiteturas voltadas ao público de médio e alto padrão. Além dos altos prédios residenciais, existem também alguns comércios dedicados ao abastecimento e passagem corriqueira, como concessionárias de automóveis, mercados, bancos, postos de gasolina, hotéis, vídeo-locadoras, academias privadas, entre outros. Na maioria das vezes, são os muros e limites dessas edificações que isolam a favela e impedem que ela se acerque da Avenida Giovanni Gronchi.

Além disso, deve-se ressaltar que a via é uma das mais importantes na região, seja para o transporte pedonal ou motorizado, coletivo ou individual; é um dos principais acessos ao bairro. Devido ao terreno muito íngreme, a entrada do pedestre em Paraisópolis é feita por somente duas escadarias, ativas, porém pouco expressivas e estreitas (uma delas recentemente adornada com projeto paisagístico da prefeitura que conferiu alguns programas em seu percurso – a escadaria Manoel Antonio Pinto), além das ruas que cruzam a avenida, de calçadas nada acessíveis. Uma dessas escadarias já foi, inclusive, fechada por moradores do Morumbi, que argumentavam que, ali, se configurava uma “válvula de escape” para bandidos34.


Isto é, ainda existe um grande preconceito e tabu em torno da presença de uma favela em meio a um bairro dominado por residências de alto e médio padrão. Como já dito, ela é, na maioria das vezes, associada aos núcleos de violência que ali se formaram, mesmo que seus moradores sofram, também, com essa situação. Os favelados são, acima de tudo, moradores e trabalhadores daquela área, assim como da cidade; não estão alheios ao espaço urbano e deveriam ter o direito ao livre “ir e vir” e usufruir de equipamentos públicos, culturais, de serviço e de lazer na região, além do próprio sistema de transporte urbano, sem serem excluídos e tratados como um “gueto”.

FIGs. 68 e 69 - Escadaria Manoel Antonio Pinto, uma das poucas que dão acesso a Paraisópolis pela Avenida Giovanni Gronchi. Fonte: Paraisopolis.org


Terreno de projeto

Espaços públicos em projeto

Espaços públicos existentes

Saúde

Limites favela

Principais vias Linha Esmeralda CPTM Linha Ouro CPTM (futuro) Linha Amarela Metrô SP (futuro) FIG. 70 - Localização do terreno de projeto em relação ao entorno bastante abrangente e o sistema de transporte urbano ao seu redor. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014 86


O terreno escolhido para a intervenção está na altura do número 3.500 da Avenida Giovanni Gronchi e faz esquina com a Rua Major José Marioto Ferreira. Ele está localizado no início da demarcação de Paraisópolis, por isso, deveria conformar-se ali, uma nova porta de entrada para a comunidade. O terreno final foi resultado da junção entre dois terrenos existentes: um abandonado, de frente para a avenida e outro tomado, em parte por um estacionamento de automóveis, em outra

por barracos da ocupação de Paraisópolis. Este segundo terreno já se incluía nos limites “oficiais” da favela e, portanto, não possuía delimitação; esta foi criada a partir dos alinhamentos vizinhos. Estes terrenos são, hoje, separados por uma rua estreita e curta, cortando parcialmente um único quarteirão, chamada Rua das Goiabeiras, de pouca utilidade aparente, mal asfaltada e servindo até sua metade como acesso a um edifício residencial vizinho. Através da união desses dois terrenos, gerou-se

um terreno de 4.392,3 m². A Rua das Goiabeiras foi fechada de maneira parcial, mantendo o acesso de automóveis somente ao prédio adjacente, e configurando, onde outrora passavam os carros, um acesso somente de pedestres para o interior do projeto. A transformação pode ser compreendida nas imagens a seguir:

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FIG. 71 (PÁG. 88) - Localização do terreno em relação ao entorno (Foto aérea). Fonte: Google Earth. Autoria: Marcelo Rizzo , 2014

FIG. 72 - Imagem atual. Dois terrenos separados pela (R. das goiabeiras) sem muito uso, pouco asfaltada e que servia de depósito de lixo. Serve como acesso do edifício residencial vizinho, somente. Não é relevan-ta para o trânsito local de automóveis. Terreno 1: comprado, porém abandonado há muito tempo. Terreno 2: estacionamento + barracos. Fonte: Google Earth. Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

FIG. 73 - Imagem pós unificação dos terrenos. R. das Goiabeiras fechada parcialmente, terrenos unidos e o caminho antigo da rua que agora atravessa o projeto somente como passagem para os pedestres serviu de orientação para as piscinas e o edifício em si. Fonte/ autoria: Marcelo Rizzo, 2014

4.392,3 m²


Ademais, a escolha por um terreno na Avenida Giovanni Gronchi foi oportunidade de contestar o que prevê a urbanização decorrente em Paraisópolis. O projeto em vigência, já aqui explanado (FIG. 61 – PÁG. 73), pouco propõe para o limite da favela que faz divisa com o bairro do Morumbi, em contraste com a quantidade de intervenções que se faz na borda oposta, ao sudeste, e conta com diversos conjuntos habitacionais, um CEU, uma nova via perimetral e um novo parque urbano. Isso deve ser motivo de debate frente à quantidade de terrenos disponíveis na Avenida em questão, como também aos que abrigam arquiteturas que pouco ou nada agregam, urbanisticamente, para a região: ao contrário, acabam segregando.

FIGs. 74, 75 E 76 - Fotos dos terrenos atualmente, 2014. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo


Reforço, porém, que se faz aqui uma suposição otimista para enfrentar a situação de segregação urbana e social Morumbi-Paraisópolis, sem garantia de sucesso ou de reverter quaisquer problemas sociais. A intervenção que apresento não se enquadra nos programas ortodoxos e recorrentes na área; difere das soluções, até então, adotadas no local. A partir dessa ideia, imagina-se que o fator inédito em questões de arquitetura e urbanidade para a região, ou seja, um edifício de repercussão e usabilidade imprevistas, desencadeie novas relações a fim de aproximar os moradores dos dois lados da borda. O principal partido arquitetônico para o meu projeto foi, portanto, incorporar um programa público e aberto que diferisse daqueles que são comumente repetidos ao longo da Avenida Giovanni Gronchi e pouco contribuem para sobrepor a segregação que ocorre nesta fronteira.

Ao criar áreas nas quais as pessoas se misturam, espera-se que pessoas diferentes possam conviver conjuntamente e que exista certo grau de tolerância. Isto é especialmente crucial em uma época em que o estado de bem estar está sob ameaça de reestruturação, e a fragmentação social tem se intensificado. O recente interesse na promoção dos espaços públicos urbanos pode ser interpretado como um interesse na reintegração das cidades fragmentadas.34

FIG. 77 - Foto dos conjuntos habitacionais novos ao longo da via perimetral Av. Hebe Camargo, obras da urbanização iniciada em 2005 e recentemente concluídas. Foto: Divulgação/2011

34. MADANIPOUR, Ali. “Public and Private Spaces of the City”, Routledge, 2003, p. 145. 91


A ideia de desenvolver um complexo de piscinas surgiu quando, ao pesquisar informações sobre Paraisópolis, me deparei com uma matéria do Blog da Folha do início do ano de 2014 – época em que se fez muito calor na cidade de São Paulo – que comentava o sucesso e lotação das piscinas do CEU-Paraisópolis, as únicas públicas da região, nesses dias mais quentes. O programa é atual, contemporâneo, não é muito extenso e permite o encontro popular de seus usuários. Através de referências e dos próprios ensaios projetuais, constatei que este tipo de programa requer, além de áreas técnicas e complementares, superfícies extensas, tanto para suas piscinas, como bordas e solários; e de preferência horizontalizadas. Deve haver, também, um controle de circulação, por questões de saúde e higiene dos usuários, mas nada que caracterize um espaço exclusor. Inspirei-me nas experiências menores e genéricas, como nos próprios CEUs e SESCs, ou no estádio do Pacaembu, por exemplo, que abrem suas piscinas ao público, permitindo que qualquer um (desde que se submeta a exame médico rotineiro) possa acessá-las; assim como, sobretudo como referências técnicas, nas experiências em maiores escalas, em projetos que se dedicam inteiramente a este fim, como os banhos cúbicos de Jean Nouvel ou o “Therme Vals” de Peter Zumthor. Esses últimos são grandes referências de centros aquáticos dedicados ao esporte, lazer e recreação conectados à água.

FIG. 78 - Matéria do blog da Folha sobre a lotação das piscinas do CEU-Paraisópolis. Fonte: Blog da Folha 92


FIGs. 79 e 80 - “Les Bains Des Docks” ou “banhos cúbicos”, obra de Jean Nouvel, em Le Havre, na França. Fonte: Dezeen


FIG. 81 - “Therme Vals” de Peter Zumthor, na Suíça. O projeto, assim como o que apresento, também se implanta em uma encosta íngreme. Fonte: Architecturez 94


No Brasil, não há ainda muitos projetos de complexos aquáticos e/ou balneários. Estes são mais presentes na Europa. Porém o conceito não difere muito das piscinas que existem em outros centros esportivos ou clubes. O conceito desses edifícios está enraizado na origem europeia, mais particularmente na antiguidade Romana. Lá se originaram e se popularizaram os balneários e as termas: grandes locais de encontro público, convívio e lazer, que tornavam o “banhar-se” em um verdadeiro ritual. A intenção de criar um espaço similar a estes na região que estudo nada mais é que proporcionar um lugar de encontro. É possível que os cidadãos, em sua maioria, ainda não estejam prontos para aceitar um sítio com essas configurações e isso não se concretize até, mais ou menos, os próximos 10 anos; mas é preciso acreditar e estimular cada vez mais espaços que gerem encontros, aproximação.

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0 COMPLEXO AQUÁTICO MORUMBI-PARAISÓPOLIS

PARÂMETROS DE CONSTRUÇÃO UTILIZADOS NO PROJETO: área terreno: 4392,3 m² área constr.: 5558,4 m² C.A.: 1,26 T.O.: 55% área permeável: 30% palavras-chave: piscinas esportivas / piscinas para o lazer / comércios: bar, restaurante, mini-mercado / posto de saúde / escadaria / conexão / público x privado x social FIG. 82 - Perspectiva geral do CAMP-Complexo Aquático Morumbi-Paraisópolis, sem seu entorno, somente nos limites do terreno. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014 96

FIG. 83 (PÁG. 97) - Localização do Complexo aquático em seu entorno imediato, próximo a dois núcleos de favela, uma via importante na região e a um espaço dedicado ao esporte, vizinho, o Play Tennis. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014



FIG. 84 - Perspectiva do portal de entrada do Complexo Aquático Morumbi-Paraisópolis voltado para a Avenida Giovanni Gronchi, mostrando o café que para ali se torna também, e o acesso ao terraço superior, através de rampas. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014. 98



A maior dificuldade do terreno escolhido seriam as condições topográficas que ele possui. Desde o nível mais alto, localizado na frente do terreno voltada à Giovanni Gronchi, ao nível mais baixo, existe um desnível de 18 a 19 metros. Tirando partido disso, projetei uma larga escadaria, ladeando a Rua Major José Marioto Ferreira, composta por degraus e rampas que a cruzam, vencendo o desnível e configurando, não só um grande recuo do projeto em relação à rua, mas também proporcionando a tão eminente conexão Morumbi-Paraisópolis. Nas paradas entre os degraus da escadaria, fazem-se acessos intermitentes diretos da rua aos diferentes níveis em projeto. A própria volumetria do projeto se dispõe intencionando essa reprodução natural da topografia do terreno, em forma de escada. Além disso, a volumetria seguiu a orientação da piscina esportiva que se inclina 30° a leste em relação ao norte geográfico, de modo a não atrapalhar a prática do esporte de natação. Mais ainda, esta orientação escolhida, determinou o desenho funicular da escadaria, ampliando a perspectiva da favela de Paraisópolis para o Morumbi, podendo dizer, de maneira poética: convidando um a olhar para o outro.

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FIG. 85 - Esquema de orientação do edifício. Volumetria está virada 30° ao leste em relação ao norte geográfico. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014


São, ao todo, 5.558,3 m² de área construída computável organizados em quatro pavimentos principais, além de dois pavimentos com estacionamentos de automóveis e uma cobertura com terraço público com áreas para o banho de sol, com espreguiçadeiras. O programa do projeto conta com espaços servidos e serventes. Os primeiros giram em torno, em sua maior parte, das piscinas, contando com: uma piscina esportiva com 3 raias semi-olímpicas, climatizada e coberta (telhado metálico com aberturas em “shed”); uma piscina descoberta dedicada ao lazer com 200 m² de superfície; e uma terceira, também de lazer, com superfície de área 180 m²; além de saunas, banhos ofurôs, duchas e decks circundantes para o banho solar. Outros espaços foram inseridos para complemen-

tar o programa e dar mais mobilidade e flexibilidade ao uso do edifício, que seriam: um café de 100 m² em área; um restaurante/bar com 100 m² em área que serve tanto acessos exclusivos ao bar e acesso por dentro das piscinas; um mini-mercado/ loja de conveniências de 500 m² em área (escolhi colocar um espaço com caráter de abastecimento pelo projeto configurar uma nova “porta de entrada” à favela); e uma academia popular com 500 m². Já os espaços serventes são configurados pelas áreas técnicas, administrativas, casas de máquina, circulações e um pequeno posto de saúde para prestação de primeiros socorros e exames médicos relacionados ao uso coletivo do projeto.

A circulação se faz, principalmente, por meio de dois núcleos principais de circulação com elevador e escada, sendo que só um deles interliga todos os pavimentos existentes; e algumas outras soluções parciais e secundárias somente com escadas e rampas, que conectam somente dois a três níveis.

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FIG. 86 - Esquema de uso das lajes em plantas isométricas e dos principais acessos e eixos de circulação. Fonte/ autoria: Marcelo Rizzo, 2014

uso das lajes

Eixo principal de circulação

FIG. 87 - Esquema do uso das lajes sobreposto ao corte A-A. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014

Acesso principal Av. Giovanni Gronchi Acesso pela R. das Goiabeiras Acessos em nível pela R. Major José Marioto Ferreira 102

ÁREAS DEDICADAS AO PROGRAMA DE PISCINAS

ÁREA DO POSTO DE SAÚDE

ÁREAS DE LIVRE ACESSO PÚBLICO

ÁREAS DE APOIO, SERVIÇO E ESTACIONAMENTOS

ÁREAS DE USO COMERCIAL

ÁREAS VERDES

NÚCLEOS DE ACESSO E CIRCULAÇÃO


FIG. 88 - Corte perspectivado sem escala indicando o uso das lajes por pavimento. Fonte/autoria: Marcelo Rizzo, 2014

A construção proposta é a de estrutura mista, de concreto e aço, bem como elementos em madeira, como “brise-soleil” e decks em madeira. O vidro é grande protagonista: as piscinas estão localizadas em níveis superiores em relação ao horizonte da favela de Paraisópolis, as peles de vidro,

associadas às lajes extensas das piscinas, permitem que se enxergue desde os arredores e interiores do projeto, as vistas para a favela de Paraisópolis, o verde abundante na região do Morumbi e o eixo da Marginal Pinheiros, ao fundo.

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FIG. 89 - Perspectiva ilustrada da piscina externa no complexo. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

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1.1 - TERRAÇO DESCOBERTO 1.2 - PLAYGROUND 1.3 - RESERVATÓRIOS

FIG. 90

1. PLANTA TERRAÇO l COTA 831,80 106



FIG. 92 - Perspectiva ilustrada da piscina esportiva dentro do Complexo Aqu谩tico Morumbi-Parais贸polis. Fonte/ Autoria: Marcelo Rizzo, 2014


FIG. 93 - Perspectiva ilustrada da piscina coberta interna de menor tamanho, para banho e lazer. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014


3.1 - DEPÓSITOS/DESPENSAS 3.2 - BANHEIROS PÚBLICOS 3.3 - CASA DE MÁQUINAS 3.4 - PROJ. INFERIOR PISCINA 3.5 - VESTIÁRIOS 3.6 - PISCINAS EXTERNAS

FIG. 94

3. PLANTA PAV. ACESSO R. DAS GOIABEIRAS l COTA 824,30 110


4.1 - MINI-MERCADO 4.2 - DEPÓSITO MERCADO 4.3 - POSTO DE SAÚDE 4.4 - ÁREAS DE DEPÓSITO 4.5 - REFEITÓRIO FUNC. 4.6 - ADM. / GERÊNCIA 4.7 - REUNIÕES 4.8 - ALMOXARIFADO 4.9 - SEGURANÇA 4.10 - CASA DE MÁQUINAS 4.11 - DECK

FIG. 95

4. PLANTA PAV. MINI-MERCADO l COTA 821,30 111


FIG. 96 - Perspectiva ilustrada do acesso ao projeto pela Rua das Goiabeiras. A rua foi fechada para autom贸veis, como solu莽茫o de partido arquitet么nico e transformada em acesso para o projeto feito por pedestres. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

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FIG. 97 - Perspectiva ilustrada de uma das piscinas, na qual desemboca o escorregador. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

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5.1 - VESTIÁRIOS 5.2 - AVALIAÇÃO FÍSICA 5.3 - ACADEMIA 5.4 - ADM. 5.5 - DEPÓSITO 5.6 - SALA MULTIUSO 5.7 - HIDROTERAPIA 5.8 - LANCHONETE

FIG. 98

5. PLANTA PAV. ACADEMIA l COTA 815,30 114


FIG. 99 - Perspectiva ilustrada da academia popular em um dos pavimentos do projeto. Os panos de vidro permitem a vista da favela, no entorno. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

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6.1 - ESTACIONAMENTO 1 10 VAGAS CARROS PEQ. 09 VAGAS CARROS MÉD. 06 VAGAS CARROS GDES.

7.1 - ESTACIONAMENTO 2 06 VAGAS CARROS PEQ. 12 VAGAS CARROS MÉD. 06 VAGAS CARROS GDES.

6.2 - CASA DE MÁQUINAS

7.2 - RESERVATÓRIOS 7.3 - ÁREA TÉCNICA

FIG. 100

6. PLANTA ESTACIONAMENTO 1 l COTA 812,30 116

7. PLANTA ESTACIONAMENTO 2 l COTA 809,30


FIG. 101 - Perspectiva ilustrada da piscina externa para adultos e crianรงas. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

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FIG. 102 - Perspectiva ilustrada do terraço superior descoberto, com espreguiçadeiras e acesso público. Fonte/ Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

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2.3 - PISCINA INTERNA 1 2.4 - PISCINA INTERNA 2 3.6 - PISCINA EXTERNA 4.1 - MINI-MERCADO 5.1 - VESTIÁRIOS

5.3 - ACADEMIA 6.1 - ESTACIONAMENTO 1 7.1 - ESTACIONAMENTO 2

FIG. 103

CORTE A-A 119


2.1 - CAFÉ 2.3 - PISCINA INTERNA 1 3.1 - COZINHA (CAFÉ) / DESPENSA 4.1 - MINI-MERCADO

FIG. 104

CORTE B-B

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1.3 - RESERVATÓRIO SUPERIOR 2.10 - COZINHA (BAR) 3.5 - VESTIÁRIOS 4.4 - DEPÓSITO 5.2 - AVALIAÇÃO FÍSICA 6.1 - ESTACIONAMENTO 1 7.2 - RESERVATÓRIO INFERIOR

FIG. 105

CORTE C-C

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FIG. 106

ELEVAÇÃO GIOVANNI GRONCHI

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FIG. 107

ELEVAÇÃO R. MAJOR JOSÉ MARIOTO FERREIRA

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Detalhe 01: Vazio Jardim FIGs. 108, 109, 110 e 111 - Plantas, cortes e vistas do Detalhe 01, vazio com jardim na área do café. Fonte/ Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

DET. 01: PLANTA VAZIO 124

DET. 01: CORTE A’-A’


DET. 01: CORTE B’-B’

DET. 01: ELEVAÇÃO 1 125


FIGs. 112, 113 e 114 - Cortes e vistas do Detalhe 02, assim como ampliação do detalhe do “shed”. Fonte/Autoria: Marcelo Rizzo, 2014

AMPLIAÇÃO 02-1: SHED 126


Detalhe 02: Piscina menor elevada

DET 02: CORTE SECCIONADO

DET 02: ELEVAÇÃO SECCIONADA



FIG. 115 - Foto aérea de Paraisópolis. Foto de Roberto Rocco, 2011. Fonte/Autoria: Roberto Rocco, TUDelft

CONSIDERAÇÕES FINAIS


Encerro

, destarte, minha monografia de conclusão de curso, confiante de que cheguei a qualquer lugar, díspar daquele em que me encontrava há cinco anos. Confiante, igualmente, de que abarquei os assuntos e problemáticas que me desafiei a abarcar no início deste ano. Esperançoso de que, em minha pesquisa, tenha se feito vivo o conceito de bordas urbanas, as diversas formas de interpretá-las e o caráter inovador que carregam as propostas de intervenção nestes territórios. Meu encanto com o assunto sempre partiu da investigação acerca de novas e criativas arquiteturas que vem surgindo nas mais amplas situações de urbanidades como formas de releitura desses lugares, modificando a maneira de se viver e de se conviver, almejando a maior integração e encontro humano em seus espaços.

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Iniciei meu estudo sem grandes referências e sem muita fidúcia de que encontraria o tema tratado da forma como eu o desejava, mas, com felicidade, realizei inúmeras conexões entre os diversos pensamentos que encontrei acerca do assunto, que sempre pareciam caminhar a uma similar direção, ainda que a passos distintos. Pude concluir que as regiões que optei por chamar de “bordas”, mas que se tornaram sinônimo, para mim, das fronteiras, dos “entre-lugares” e dos territórios híbridos; são os interstícios, os lugares entre as coisas, entre realidades distintas, que acabam sofrendo de abandono e estranhamento para com o resto da cidade, mas que, ao mesmo tempo, carregam imenso valor e significado, já que, é neles que se esperam novas relações e conexões, são eles o novo campo de ação, de inúmeras possibilidades.

Mais ainda, abandonei quaisquer preconceitos que eu pudesse ter para com os territórios informais. Faço, hoje, uso das palavras “favela” e “favelado”, sem estarem carregadas de nenhuma preconcepção ou diferenciação de qualquer região outra da urbe. Pelo contrário, aprendi a enxergar qualidade e valor nesse tipo de ocupação, que, agora ao fim do meu trabalho, já não consigo mais chamar de “informal”. Defendo, mais do que nunca, as identidades. As diferenças que nos tornam únicos. Não defendo, porém, a segregação. Acato o discurso dos espaços públicos, que possibilitam a integração social, o convívio humano. Eles negociam e permitem a geração de encontros físicos e sociais, sobretudo entre as favelas e bairros, sem pressupor que um necessite vir a ser o outro.


Termino

este trabalho certo de que cresci como profissional e como indivíduo. Espero que fique, aqui, marcado o meu esforço e minha dedicação. Contento-me em dizer que por ter realizado este trabalho, vivenciei momentos que, do contrário, jamais vivenciaria. Comecei a enxergar com outros olhos, mais experientes, ouso dizer, situações que outrora não eram claras para mim. Existiram, certamente, momentos de distração, de cansaço e de desdém, porém, com este volume concluído, posso afirmar que de nada me arrependo. Existirão, também, deslizes e desvios de tema que passaram despercebidos, pelos quais me desculpo, ainda que depois do tempo. Espero ter ficado clara a intenção por trás desta monografia e do projeto arquitetônico que apresento ao final dela, quão intensamente sua conexão com o tema.

A intervenção no território da borda Morumbi-Paraisópolis almeja a criação de um novo espaço público, disponível às duas realidades; acima de tudo, um espaço democrático, aberto e convidativo. Procura-se, através dele, desafiar as barreiras e os tabus acerca da construção na região, fugindo dos preconceitos sociais e econômicos que ali existem. Apoio-me num feliz otimismo de que um dia teremos mais sítios como este pela cidade e pelo mundo, em que o usuário, seja ele rico ou favelado, não sinta-se, ali, julgado pela sua individualidade, mas sim disposto a compartilha-la, bem como das de outros, compartilhar.

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BIBLIOGRAFIA


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