A Magia do Transmedia Storytelling - Harry Potter na Era da Convergência

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Lumos!



MARCELO OLIVEIRA RAMOS

A MAGIA DO TRANSMEDIA STORYTELLING HARRY POTTER NA ERA DA CONVERGÊNCIA

Projeto

Experimental

de

caráter

profissional, elaborado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social, habilitação em Publicidade e Propaganda, sob orientação da Profª. Ms. Edilene Maia

UNITAU 2015


Autor: Marcelo Oliveira Ramos Orientação: Edilene Maia Revisão: Eliana Vianna Brito Kozma Produção Gráfica e Diagramação: Marcelo Oliveira Ramos Capa: Marcelo Oliveira Ramos Impressão: Tachion Gráfica Digital

Ficha catalográfica elaborada pelo SIBi – Sistema Integrado de Bibliotecas / UNITAU R175m Ramos, Marcelo Oliveira A magia do Transmídia Storytelling: Harry Potter na era da convergência. / Marcelo Oliveira Ramos - 2015. 158 f.:, il. Projeto Experimental (Graduação em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda) – Universidade de Taubaté, Departamento de Comunicação Social, 2015. Orientação: Prof. Ms. Edilene Maia de Almeida Macedo. Departamento de Comunicação Social. 1. Narrativa Transmídia. 2. Harry Potter. 3. Cultura da Convergência. 4. Cinema. I. Título.


“– Me diga uma última coisa – disse Harry. – Isto é real? Ou esteve acontecendo apenas em minha mente? [...] – Claro que está acontecendo em sua mente, Harry, mas por que isto significa que não é real?” (Harry Potter e as Relíquias da Morte, p.590)


Ilustração: Kazu Kibuishi | J.K. Rowling


Dedico este livro Ă minha famĂ­lia, minha fonte inesgotĂĄvel de magia, e aos amigos e professores, que fizeram da faculdade minha Hogwarts.


Foto: Isis Oliveira Ramos


Vi Harry Potter deter o roubo da Pedra Filosofal. Fiquei aterrorizado com os sussurros que vinham da Câmara Secreta, mas feliz com seu desfecho. Senti pena do Prisioneiro de Azkaban, mas não antes de sentir medo. Torci por Harry Potter no Torneio Tribruxo, quando o Cálice de Fogo cuspiu seu nome, tão quanto pela vitória da Ordem da Fênix na batalha no ministério da magia. Fiquei surpreso com o Enigma do Príncipe e fiquei surpreso novamente. Coletei com Harry as Relíquias da Morte e vibrei com a vitória do bem sobre o mal. Com esse livro, amplio minha visão sobre uma série que marcou minha infância, juventude e, agora, minha fase adulta. Boa leitura! Marcelo Oliveira Ramos


Organizando as ideias Um primeiro passe de magia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 PARTE I | Harry Potter e o Fenômeno Pottermania: Do armário sob a escada para o mundo Uma Carta de Hogwarts . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Floreios e Borrões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Harry Potter e a Pedra Filosofal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Harry Potter e a Câmara Secreta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 Harry Potter e o Cálice de Fogo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 Harry Potter e a Ordem da Fênix . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Harry Potter e o Enigma do Príncipe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 Harry Potter e as Relíquias da Morte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 Cinema: a magia dos trouxas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 Dos livros para os roteiros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 Luz, câmera e ação! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 Atenção, maestro! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 As cores no mundo bruxo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 O amadurecimento de Harry Potter . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 Um adolescente como qualquer outro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Um filme de nuances políticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 Um tom de comédia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Quem gosta de despedidas? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 Rowling e o fenômeno mundial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73


PARTE II | A Magia do Transmedia Storytelling: A era da Convergência Cultural A mágica se multiplica pelo globo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82 Um passo de cada vez... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86 Convergência dos meios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87 Cultura participativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 O que é e como funciona a narrativa transmídia? . . . . . . . . . . . . . 93 Das páginas de livros para as páginas de roteiros . . . . . . . . . . . . . 96 Vamos jogar? E não me refiro a Quadribol . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100 De pecinha em pecinha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104 Girar e sacudir . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104 Um toque a mais de tecnologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106 Agarre a chave de portal: Vamos viajar! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108 Em época de convergência, Potter fora do online seria coisa de trouxa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118 Pottermore como ápice da narrativa transmídia em Harry Potter . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124 PARTE III | O Expresso Hogwarts vai além... O futuro, como será? O Espelho de Ojesed . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130 A mágica do bem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133 Animais Fantásticos e Onde Habitam . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135 Para os palcos de teatro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 138 A segunda fase do Pottermore . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139 E a viagem do Expresso Hogwarts continua... . . . . . . . . . . . . . . . . 143 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148 Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


Um primeiro passe de magia Você já parou pra perceber o quanto é difícil quebrarmos o gelo quando queremos conversar com alguém estranho que, de algum modo, chama a nossa atenção? A gente fica meio naquela – “e se a pessoa não gostar de mim ou me achar desinteressante demais?” Pois bem, sabe qual é a solução para esse problema? Iniciativa. E se você está lendo esse livro nesse exato momento, eu lhe digo: você a tem e fico feliz que a tenha usado para vir dialogar comigo. Posso dizer que temos algumas coisas em comum, não é verdade? Para você ter escolhido um livro sobre comunicação e com Harry Potter no título posso ser até mais categórico: temos muita coisa em comum. Meu contato inicial com a série foi em 2002, através do primeiro filme. O meu e de muitas outras crianças. Algumas já até conheciam a história antes de mim, já que o livro correspondente ao filme havia sido lançado em 1997. Comigo não foi nem através do cinema, para ser sincero, e sim por meio de um VHS roxo, no qual IV

líamos “Harry Potter e a Pedra Filosofal” em letras brancas. Uma produção cheia VOL II

de magia e encantamentos assim como 16


a série toda viria a ser nessa década que levaria para ser finalizada. Pelo menos nos cinemas. Coincidentemente, o final de um ciclo que marcou, particularmente, minha infância e adolescência calhou com o início de uma nova e importante fase do meu crescimento: o ingresso na faculdade de Comunicação Social. Nessa primeira etapa de vida, vivi junto com Harry Potter todas suas aventuras e experiências. Vi quando descobriu que era um bruxo e como sua vida ficaria de pernas para o ar depois dessa revelação. Assisti a sua primeira aula de voo e poções. Ah, poções. Lecionada pelo professor de pior temperamento que a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts poderia ter – Severo Snape (apenas um comentário que não poderia deixar de fazer). Acompanhei perdas de pessoas queridas, tão proporcionalmente doídas aos encantos intensos das primeiras paixões. Vi feitiços simples de levitação evoluindo para maldições consideradas imperdoáveis. Acompanhei um menino tornar-se homem.

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Lembro também que o que mais me encantava nesse universo era a magia em si e o fazer mágica. A cada movimento de varinha, seguido das palavras mágicas e um de feixe de luz, meus olhos brilhavam na mesma intensidade. Com os livros – confesso – tive contato bem tardio. Fui ler o primeiro exemplar em 2007, dez anos depois de seu lançamento oficial. Nesse intervalo, minha paixão pela série já existia e graças a uma amiga (Obrigado, Sara!) tive contato com a literatura de Rowling. Devorei os primeiros três livros em pouco mais de uma semana, pois eram os mais curtos e corri contra o tempo na leitura dos demais antes do lançamento nacional de Harry Potter e as Relíquias da Morte, em novembro daquele mesmo ano. Acompanhei com ansiedade e expectativas a publicação de pelo menos um livro. Um não. O livro. Era o desfecho de uma história de uma década e que já havia se tornado um fenômeno mundial.

Foto: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.

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E é nesse momento que faço a ponte entre Harry Potter e minha nova fase de vida que se iniciou com a faculdade e que já se finaliza, com esse livro, depois de quatro anos. Nesse tempo estudando comunicação, a gente aprende um bocado de coisa bacana e desenvolve um olhar crítico para tudo que envolva o ato de comunicar-se, seja qual for sua forma. De repente (ou nem tanto assim), Harry Potter começou a deixar de ser aquele menino raquítico, que morava dentro de um armário sob as escadas e se mostrou um grande projeto de comunicação. Uma autora, até então desconhecida, tornouse referência para milhares de crianças. Primeiramente no Reino Unido, depois EUA e dali para o mundo. Sua obra rompeu as barreiras estáticas de suas páginas e se tornou maleável em diferentes meios. Víamos Harry Potter no cinema, nos jogos, na mídia digital e até em parques de diversão. Como que aconteceu tudo? Bom, é isso que quero contar e mostrar para vocês com a ajuda desse livro, que será divido em três partes.

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Ilustrações: Marcelo ORamos


A primeira delas contará um pouquinho sobre quem é Harry Potter e seu universo mágico. Caso nesse momento você tenha em comum comigo apenas o interesse em comunicação e não conhece muito bem a série – não se preocupe. Esse primeiro momento o contextualizará na narrativa, desde a Pedra Filosofal até Relíquias da Morte, contando um pouquinho como era a vida do menino antes e depois de alguns acontecimentos importantes em sua vida. Você também encontrará algumas curiosidades da história, além de alguns detalhes do processo produção dos oito filmes. Na segunda parte, estudaremos como que um despretensioso romance, de autoria até então desconhecida, veio a se tornar um projeto de comunicação global - verdadeira febre entre crianças, jovens e adultos, com capacidade de manter o fôlego durante esses mais de dez anos. Vamos compreender como foi feita a adaptação de conteúdo dos livros para o cinema, do cinema para os jogos, para o online e outros meios. Será que há alguma diferença entre o Harry dos livros com os Harrys dessas outras plataformas? Por fim, o futuro, como será? Será que, com mágica, somos capazes de descobri-lo? Até esse exato momento, nada cientificamente foi comprovado, mas podemos fazer apostas em adjetivos que descrevam o futuro da série. Promissora? Talvez. Incerta? Pode ser. Inesquecível? Com certeza. A terceira parte desse livro discutirá um pouco sobre o futuro da marca Harry Potter, que promete novidades para os antigos fãs e muita magia para os novos. Espero que a sua leitura seja prazerosa tão quanto foi produzir esse conteúdo. Acho que nessa altura nem somos mais tão estranhos assim, e poderemos conversar super bem conforme avançamos na leitura. Já superamos aquela fase inicial de quebrar o gelo. O trem já esta partindo. Embarque agora na Plataforma 9 ¾ e boa viagem! Não sabe o que é e onde é? Siga em frente que tenho certeza de que descobrirá. 20


Ilustração: Universal Orlando Resort


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Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


Uma Carta de Hogwarts Ao completar onze anos, uma criança com o dom da magia em seu sangue recebe uma carta com instruções para que se matricule em Hogwarts, escola secular e tradicional no ensino de magia da GrãBretanha. Além das boas vindas, anexo à carta, há a lista de livros e materiais necessários para o início do ano letivo, como roupões, caldeirões e, claro, uma varinha. Encare a primeira parte desse livro como nossa carta de Hogwarts – o seu bem vindo ao universo Harry Potter. Caso você já seja como eu - um grande conhecedor do mundo criado por J. K. Rowling - redescubra comigo a história de um dos bruxos mais famosos do final da década de 90 e início dos anos 2000. Já se você nunca tenha ouvido falar de Harry Potter (onde você esteve nos últimos anos?), não se preocupe, pois esse capítulo lhe servirá de norte para entender um pouco da história criada por Rowling, antes de compreendermos como que essa se tornou mundialmente conhecida. Agarrem seus vira-tempos para que voltemos juntos alguns anos atrás e compreendamos um pouco não só da história de Harry Potter, mas como que um despretensioso romance literário transformou-se em um ousado e bem sucedido projeto de comunicação, capaz de atrair e conquistar fãs no mundo todo.

Os vira-tempos são artefatos mágicos capazes de transportar bruxos e bruxas num determinado espaço de tempo para que eventos possam ser alterados.. Foto: Divulgação

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J.K. Rowling já declarou, em diversas entrevistas, que não esperava que seu romance atingisse o elevado patamar de sucesso que o fez. Os primeiros esboços surgiram numa viagem de trem de Manchester a Londres, em 1990. Ideias variadas sobre um menino que se descobre bruxo e vai para uma escola de magia surgiram na cabeça da autora naquele momento. O mercado literário infantil britânico, na época, passava por uma espécie de estagnação criativa; era necessário sempre haver alguma lição de moral nas publicações e a concepção de um livro com mais de cem páginas e ainda por cima escrito por uma mulher soava desinteressante para muitas editoras. Besteira. Aliás, a abreviação para J.K. foi sugestão dos próprios editores que temiam a não aceitação do público infantil masculino por conta do livro ser escrito por uma mulher. Besteira maior ainda! Resumir uma história dividida em sete livros, com mais de 3000 páginas, 198 capítulos e um epílogo em algumas linhas é uma tarefa bem complicada, porém se Harry Potter, ainda criança, foi capaz de impedir o roubo da Pedra Filosofal em seu primeiro ano em Hogwarts, essa síntese para um comunicólogo que estudou comunicação por alguns anos deve ser uma tarefa bem simples, não é mesmo? 25

Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


Aos 11 anos, Harry Potter descobriu algo que mudaria por completo sua vida: ele era um bruxo e deveria estudar numa escola apropriada para desenvolver suas habilidades mágicas. O que ele não sabia é que, nesse mundo de magia, todos já o conheciam por conta de um trágico incidente que aconteceu quando ele era apenas um bebê – seus pais foram assassinados por Lorde Voldemort que, quando tentou fazer o mesmo com o garoto, o feitiço saiu pela culatra (se é que varinha mágica tem isso) e voltou contra o próprio feiticeiro das trevas, que enfraquecido, desapareceu. Harry ficou conhecido por todos no mundo bruxo como “o menino que sobreviveu”.

“Ele vai ser famoso, uma lenda. Eu não me surpreenderia se o dia de hoje ficasse conhecido no futuro como o dia de Harry Potter. Vão escrever livros sobre Harry. Todas as crianças no nosso mundo vão conhecer o nome dele 1.” A frase anterior pertence à Minerva McGonagall, professora de Hogwarts, e está logo nas páginas iniciais do primeiro livro. Engraçado é analisa-la hoje, pois parece que Rowling, subconscientemente, previa que o mundo conheceria sua criação. Se um dia a professora de adivinhações de Hogwarts precisar deixar o cargo, já temos uma substituta. A própria criadora daquele mundo.

1 Harry Potter e a Pedra Filosofal, p.15.

Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.

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Em Hogwarts, a Escola de Magia e Bruxaria, o jovem conheceu os colegas que se tornariam seus melhores amigos, Rony Weasley e Hermione Granger. Juntos, o trio solucionaria problemas e mistérios que assombravam o castelo e que, conforme os anos se passaram, mostraram-se fazer parte de uma conjuntura maior, expandindo-se para uma esfera social, assumindo caráter político e ideológico, afetando toda a comunidade bruxa e não bruxa. Sendo mais direto: Harry Potter fazia parte de uma trama que afetava a todos, e ele mesmo não sabia como reagir a isso. O espírito do conflito gira em torno do assassino de seus pais que, após o terrível crime, ficou conhecido como Aquele-Que-NãoDeve-Ser-Nomeado ou Você-Sabe-Quem. O tal vilão acreditava na supremacia do poder bruxo sobre aqueles que não tinham magia no sangue - os chamados trouxas e também sobre aqueles que eram mestiços: a mistura de sangue bruxo com sangue trouxa. Em outras palavras, Voldemort acreditava na supremacia dos puros-sangues. Não se surpreenda aqui caso faça uma relação direta ao nazismo de Hitler que acreditava na supremacia ariana - a relação de poder é a mesma. Conforme os anos se passaram e profecias se revelaram - “um não pode viver enquanto o outro sobreviver” - ,a história se desenrolou num combate incisivo entre Harry Potter e Voldemort até o momento crucial do confronto direto entre ambos quando a profecia se cumpriu. Desse enredo principal que envolveu os destinos de Harry Potter e Voldemort, além de toda comunidade bruxa e não bruxa, J.K. Rowling criou diversas subtramas que enriqueceram ainda mais esse universo e que deram mais credibilidade à história, no sentido de intensificar e tornar mais verossímil a leitura do leitor com aquele mundo.

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Uma coruja pra você

A ficção que esbarra na realidade A semelhança mais evidente entre o enredo de Harry Potter com o nazismo da Segunda Guerra é a ideia da existência de um grupo superior aos demais, com a crença de possuir autoridade suficiente para comandar e governar toda uma sociedade. Famílias inteiramente mágicas equivalem ao arianismo de Hitler. O pensamento preconceituoso do mundo bruxo é de tempos antigos; surgiu ainda na fundação da escola de Hogwarts, com um de seus fundadores dizendo que apenas alunos de sangue mágico e puro poderiam frequentar o lugar; mestiços seriam considerados indignos de tamanho privilégio, ideia que se assemelha ao antissemitismo do nazismo na Alemanha de 1950. Anos

após

pensamento

a seria

fundação

da

retomado

escola, pelos

esse jovens

Dumbledore e Gerardo Grindelwald. Para eles, era por direito que bruxos deveriam comandar os dois mundos: o mágico e o não mágico. Para tal criaram o slogan “Para um Bem Maior”. O mesmo fez Hitler ao utilizar da propaganda para defender e disseminar seus ideais. Felizmente, Dumbledore caiu em sã consciência e vendo o absurdo colocouse contra o próprio amigo, derrotando-o em 1945, mesmo ano da queda de Hitler. Coincidência? Não.

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Em entrevista, a própria autora justificou as relações entre Voldemort e o nazismo – “as pessoas gostam de se sentir superiores e se não podem se orgulhar de nada mais, se apegam a uma suposta pureza”. No nazismo, Adolf Hitler adotou a suástica como símbolo de seu governo. Voldemort? A Marca Negra, um símbolo de caveira com uma cobra saindo pela boca cravado nos braços de seus seguidores. A consequência das atitudes de ambos resultou na morte de milhões de inocentes: o nazismo, entretanto, vítimas reais. Infelizmente. É evidente que Rowling pincelou nas entrelinhas de seus romances referências diretas a Segunda Grande Guerra Mundial e o fez com maestria, desde a concepção dessa absurda ideologia até sua desconstrução, culminando na derrota no vilão. Ora, se Hitler foi derrotado, Voldemort não seria?

O correio no mundo mágico de Harry Potter é feito por corujas, que entregam todas as correspondências e encomendas de bruxos.

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Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


Floreios e Borrões Localizada no Beco Diagonal, onde podemos encontrar diversas lojas do mundo bruxo, a Floreios e Borrões é a livraria desse mundo. Nela encontramos todo tipo de publicação relacionado ao universo de feitiçaria e bruxaria. Livros de poções e de feitiços, tradutores de runas antigas, livros sobre herbologia, guias sobre animais fantásticos e onde encontrálos, sem mencionar as autobiografias e contos para crianças. Puxe uma cadeira e escolha um canto confortável da loja pra conhecermos um pouco mais detalhadamente a história de cada um dos sete livros. Eu sei que a loja está meio cheia, mas é quase 1º de setembro, que é quando começam as aulas em Hogwarts e muitos pais já estão garantindo os materiais de seus filhos.

Foto: Divulgação

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Ilustrações: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©


Harry Potter e a Pedra Filosofal Primeiro livro da coleção, Harry Potter e a Pedra Filosofal narra como e por que Harry começou a morar, ainda bebê, com a família Dursley, formada por Válter e Petúnia, seus tios, além do primo Duda. Tudo parecia normal, até Harry receber uma carta para estudar magia e bruxaria na renomada escola de Hogwarts, dirigida pelo maior bruxo de todos os tempos, Alvo Percival Wulfrico Brian Dumbledore. Lá, conheceu seus dois melhores amigos, Hermione Granger, filha de trouxas, uma menina muito inteligente para a idade - e Rony Weasley, um garoto de cabelos ruivos, sexto filho de uma família de outros seis irmãos, além de seus pais.

Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©

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Em Hogwarts, selecionado para a Grifinória e enfrentando as dificuldades comuns para um primeiranista, Harry aprendeu a jogar Quadribol, o esporte dos bruxos. Tudo parecia andar às mil maravilhas, quando um mistério tomou conta dos terrenos do castelo – alguém estava tentando roubar a pedra filosofal, um artefato mágico capaz de produzir um elixir que garante força e vida eterna a quem o ingere e que estava escondido no castelo. Determinado a capturar o ladrão e com a ajuda dos leais amigos, Harry analisa os acontecimentos e chega à conclusão de que um dos professores de Hogwarts é o responsável pelo ato. No entanto, o menino é surpreendido ao descobrir que quem menos esperava seria o verdadeiro culpado e o pior, que ele estava intimamente ligado a Voldemort, ajudando-o na tentativa de recuperar seus poderes enfraquecidos.

“O antigo estudo da alquimia preocupava-se com a produção da Pedra Filosofal, uma substância lendária com poderes fantásticos. A pedra pode transformar qualquer metal em ouro puro. Produz também o Elixir da Vida, que torna quem o bebe imortal.” Harry Potter e a Pedra Filosofal, p.160

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Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©


“Harry se viu parado no fim de uma câmara muito comprida e mal iluminada. Altas colunas de pedra entrelaçadas com cobras em relevo sustentavam um teto que se perdia na escuridão, projetando longas sombras negras na luz estranha e esverdeada que iluminava o lugar.” Harry Potter e a Câmara Secreta, p.227 Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©

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Harry Potter e a Câmara Secreta Em a Câmara Secreta, segundo romance, Harry retorna para Hogwarts um pouco mais experiente. Entretanto, com um pouco mais de dificuldade, pois os tios estavam decididos que ele seria um menino normal e nunca mais veria o castelo novamente. Por sorte, Potter foi salvo pelo melhor amigo. Uma nova série de mistérios envolveu Harry naquele ano, que quase não conseguiu iniciar seu ano letivo, pois o caminho habitual (através da plataforma 9 3/4 ) havia se selado. É nesse livro que o jovem bruxo conhece Dobby, um elfo doméstico que viria a se tornar seu grande amigo. As novidades em Hogwarts são poucas a não ser pelo fato de pessoas começarem a aparecer petrificadas. Uma ameaça rondava o castelo, e mensagens escritas com sangue começaram a aparecer nas paredes do castelo – “A Câmara Secreta foi aberta, inimigos do herdeiro... CUIDADO!”. Após

analisar

as

circunstâncias

e

estudar

os

terríveis

acontecimentos, Harry descobriu que quem estava por trás daquelas barbaridades era nada mais, nada menos que Lorde Voldemort, preso numa espécie de lembrança em seu diário de adolescência, peça fundamental da trama. O conflito entre os dois acontece na Câmara Secreta, a qual abrigava um basilisco, uma terrível serpente controlada por Tom Marvolo Riddle, nome de Voldemort quando jovem.

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Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban Harry Potter e o Prisioneiro de Azbakan, um livro não de conflitos diretos entre o menino que sobreviveu (assim Harry ficou conhecido) e Voldemort. Aliás, esse é o único livro que não trabalha diretamente com essa parte da narrativa, mas com importantes descobertas sobre o passado de Harry e que influenciarão seu futuro. A história conta sobre um suposto sanguinário assassino, Sirius Black, que fugiu de Azkaban, a cadeia mais bem protegida do mundo bruxo e que estaria atrás de Harry para também matá-lo. Após deixar a casa dos tios, farto de ser considerado um estorvo, Harry volta para o terceiro ano em Hogwarts, onde reencontra os queridos amigos, é apresentado ao novo professor - Remo Lupin - e também a animais mágicos, como Bicuço, um hipogrifo, ser metade cavalo e metade águia. Devido à fuga de Sirius, guardas de Azkaban estavam 24 horas por dias fazendo rondas pelo mundo bruxo em busca do fugitivo. A prisão, no entanto, não era protegida por pessoas, mas pelos terríveis dementadores, descritos como espectros negros capazes de roubar a felicidade de qualquer um e que afetavam a Harry mais que qualquer outra pessoa. No final das contas, a narrativa nos surpreende de diferentes formas. Quem estava considerado morto, na verdade, não estava. Quem era culpado era inocente, e o inocente não era tão livre de culpa assim. Descobrimos que um amigo querido passava por momentos terríveis e constantes a cada lua cheia e que graças ao vira-tempo de Hermione somado a astúcia de Dumbledore, algumas vidas são poupadas.

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“Sirius Black, provavelmente o condenado de pior fama já preso na fortaleza de Azkaban, continua a escapar da polícia, confirmou hoje o Ministério da Magia.” Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban, p.32

Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©


“As chamas dentro do Cálice de repente tornaram a se avermelhar. Começaram a soltar faíscas. No momento seguinte, uma língua de fogo se ergueu no ar, e expeliu um pedaço de pergaminho chamuscado — o salão inteiro prendeu a respiração.” Harry Potter e Cálice de Fogo, p.227

Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©

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Harry Potter e o Cálice de Fogo Em seu quarto ano, Harry presenciará Hogwarts sediando o Torneio Tribruxo, uma das maiores competições entre instituições de magia. Além de sua escola, participam Beauxbatons (França) e Durmstrang (Bulgária). As regras são simples: cada instituição tem o direito de ser representada por um aluno maior de 17 anos – o chamado Campeão. A escolha do representante? Essa fica por conta do Cálice de Fogo, um artefato histórico e mágico. Quem quisesse concorrer à vaga de campeão deveria colocar seu nome num pergaminho e depositá-lo dentro das chamas azuis do cálice. A preocupação com menores de idade tentando se inscrever era tamanha que feitiços de proteção em torno do Cálice foram criados por Dumbledore para impedir qualquer incidente. Muitos se inscreveram até o dia da seleção dos três campeões. As chamas azuis do cálice transformavam-se em vermelho rubi e o objeto cuspia o nome dos selecionados de cada escola. Fleur Delacour, como campeã de Beauxbatons, Vitor Krum – Durmstrang e Cedrico Diggory, Hogwarts. Tudo estava indo muito bem, quando, subitamente, o Cálice cuspiu outro nome – Harry Potter e ele, por conta de contratos mágicos estabelecidos com o Cálice, teve que competir como um quarto campeão. Os acontecimentos, claro, faziam parte de um plano maior, que seria desvendado ao final das três fases do torneio, que envolveram dragões, seres aquáticos e um labirinto. É nesse livro que o Lorde das Trevas, Voldemort, retorna fisicamente após um ritual no qual a presença do menino era fundamental. A partir desse momento, o mundo bruxo passaria por grandes transformações que ressoariam, inclusive, no mundo dos trouxas.

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Harry Potter e a Ordem da Fênix A volta de Você-Sabe-Quem é inquestionável. Pelo menos para Harry e para Dumbledore. No entanto, o até então atual Ministro da Magia, Cornélio Fudge, quer mascarar a volta de Voldemort. Imagine os problemas que ele, como representante de toda uma comunidade, enfrentaria? Qual a solução? Deslegitimar as palavras de Harry e denegrir a imagem forte de Dumbledore. As evidências da volta do Lorde eram evidentes, mas o ministro, cego pelo medo, não as queria enxergar. Assim como no passado, a Ordem da Fênix volta a se reorganizar. Um coletivo composto por bruxos e bruxas dispostos a enfrentar Lorde Voldemort. Dentre seus membros estão Lupin, Sirius, Snape, os pais de Rony, dentro outros. Um agravante ainda perturba a vida de Harry - sua relação com sábio diretor de Hogwarts estava abalada sem Harry nem ao menos saber o porquê, mas que no fundo se justificou pelo fato de Voldemort poder manipular a mente do rapaz.

“_ É o quartel-general da Ordem do Fênix disse os dois ao mesmo tempo. _ E alguém se importa de me dizer o que é a Ordem da Fênix? _ É uma sociedade secreta _ disse Mione. _ Dumbledore está no comando, ele é o fundador. São as pessoas que lutaram contra Você-Sabe-Quem da última vez.” Harry Potter e a Ordem da Fênix, p.122 40


Temendo essa possível manipulação, Dumbledore deseja que Harry aprenda a bloquear a própria mente e seus pensamentos, porém o movimento mostrou-se inválido. Atraído ao Ministério da Magia por conta de uma falsa visão de seu padrinho sendo torturado por Voldemort, Harry, acompanhado dos amigos, vai até o local e cai numa armadilha. A Ordem aparece para o resgate e um conflito contra os seguidores de Voldemort acontece. Dumbledore também surge no local e conflita diretamente contra o próprio vilão das trevas. Nessa batalha, um personagem querido é morto, e Harry cada vez mais se aproxima de seu destino final.

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Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©


Harry Potter e o Enigma do Príncipe Sexta publicação da saga, o Enigma do Príncipe, assim como o Prisioneiro de Azkaban, é um livro de descobertas, mas difere no ritmo de narrativa e acontecimentos. Nele somos convidados a descobrir sobre o passado de Voldemort graças a um trabalho de pesquisa realizado por Dumbledore, que começou a coletar importantes memórias de pessoas que tiveram contato com o vilão desde sua infância, quando ainda era conhecido apenas por Tom Marvolo Riddle, seu nome de nascença. O objetivo era descobrir algo que pudesse derrotar Voldemort.

Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©

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Conhecemos, então, seus pais e avôs, sua descendência com um dos fundadores de Hogwarts, seu desejo precoce por poder e soberania, além de diversos atos atrozes em busca da vida eterna. Descobrimos sobre as horcruxes, magia negra poderosa, que consistia em repartir alma em pedaços, garantindo assim vida eterna. Voldemort a realizara algumas vezes e para derrotá-lo era preciso encontrar cada horcrux e destruí-las. Lembra que Harry confrontou uma memória de Tom em A Câmara Secreta? O diário era uma dessas horcruxes. Harry teve que aprender a lidar com a morte precocemente. Mesmo não tendo consciência, presenciou o assassinato dos pais e, nesse ano, foi golpeado novamente pela perda de um grande nome que lhe dava toda segurança que precisava sentir pra se manter forte nesses anos todos. O professor que se mostrava como “amigo” revelou-se vilão e mudou toda a perspectiva do jovem bruxo em relação ao futuro. Voldemort se fortalece e recruta aliados. A guerra estava se aproximando e era eminente que aconteceria.

“Harry se abaixou para recolher o livro e, ao fazer isto, viu uma coisa escrita ao pé da quarta capa, na mesma caligrafia pequena e apertada que as instruções que tinham obtido para ele o frasco de Felix Felicis, agora guardado no malão em seu quarto, muito bem escondido dentro de um par de meias. Este livro pertence ao Príncipe Mestiço.” Harry Potter e o Enigma do Príncipe, p.143

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Harry Potter e as Relíquias da Morte Obstinado a encontrar todas as horcruxes e com o apoio dos melhores amigos, Harry, Rony e Hermione abandonam o último ano em Hogwarts em busca dos artefatos para destruí-los e assim derrotar o Lorde das Trevas. Relíquias da Morte é o desfecho desses sete anos de aventuras, conflitos e perigos. O castelo está sitiado, sob a influência de Voldemort, e assim permanece até certo tempo, quando a guerra acontece. As horcruxes iam sendo descobertas e várias tentativas de destruílas falhavam. Era necessária uma magia ainda mais poderosa para vencê-las. Nesse tempo de busca, o trio ainda depara-se com outro mistério – As Relíquias da Morte, que juntas davam ao seu possuidor o poder de comandar a morte. Eram elas - a Varinha Anciã, a Pedra da Ressurreição e a Capa da Invisibilidade. Através de subtramas, uma rede de associações narrativas foi construída pela autora e envolvia diversos personagens numa mesma relação. Uma verdadeira obra literária, digna de premiações. Por fim, o conflito acontece. Harry Potter e Voldemort duelam. Depois de muitas surpresas e baixas em ambos os lados da história, somente um sobreviveu, cumprindo assim a profecia que moveu a história nas sete obras. O livro encerra com um epílogo, 19 anos depois dessa batalha e nos mostra que “tudo estava bem”.

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“ _ A Varinha das Varinhas _ disse ele, desenhando uma linha vertical no pergaminho. _ A Pedra da Ressurreição. _ E acrescentou um círculo no alto da linha. _ A Capa da Invisibilidade _ terminou, circunscrevendo a linha e o círculo e, um triângulo, contemplando o símbolo que tanto intrigara Hermione._ Juntas _ disse ele _ , as Relíquias da Morte.” Harry Potter e as Relíquias da Morte, p.319

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Ilustração: Mary GrandPré© | J.K. Rowling©


Nesse ponto acredito que, se antes você não conhecia absolutamente nada sobre Harry Potter e seu mundo mágico, agora já tem alguma noção sobre seu enredo narrativo. E qual foi o reflexo dos livros de Rowling no mundo não bruxo? Em 1997 foi lançado o primeiro livro da série - Harry Potter e a Pedra Filosofal, um produto com pouco mais de 200 páginas e algumas ilustrações. Imagine, agora, você receber em mãos uma cópia manuscrita de um livro que viria se tornar um dos maiores sucessos da literatura mundial e, não sabendo disso, obviamente, a recusasse. O manuscrito de A Pedra Filosofal foi descartado por dez editoras diferentes, até que em 1996, a britânica Bloomsbury assumiu o projeto. E ainda bem! Nos anos seguintes se sucederam os demais lançamentos: Harry Potter e a Câmara Secreta (1998), Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban (1999), Harry Potter e o Cálice de Fogo (2000), Harry Potter e a Ordem da Fênix (2003), Harry Potter e o Enigma do Príncipe (2005) e Harry Potter e as Relíquias da Morte (2007). O sucesso da saga com números elevados de vendas e arrecadação são inegáveis. Foram mais de 400 milhões de cópias vendidas no mundo, traduzidas para 77 idiomas. Em 2007 a autora atingiu o ápice de arrecadação, 300 milhões de dólares, ficando entre os autores mais bem pagos do mundo.

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Uma coruja pra você

A Taça das Casas vai para J.K. Rowing “Enquanto estiverem em Hogwarts, os seus acertos renderão pontos para sua casa, enquanto os erros a farão perder2.”A fala anterior é de Minerva McGonagall, vice-diretora de Hogwarts. Ao final do ano, a casa que tivesse mais pontos acumulados receberia a Taça das Casas, um prêmio tradicional e secular de incentivo para um bom ano escolar. Se J.K. Rowling fosse uma estudante de Hogwarts, sua casa, com certeza, levaria sempre a Taça das Casas, pois seus méritos são inúmeros – recebeu muitos prêmios e honrarias por eles. Em 1999 e 2008 recebeu o Prêmio Autora do Ano e Lifetime Achievement Award pela British Book Awards. Em 2011 foi condecorada com a Ordem do Império Britânico (OBE), uma das cinco ordens da Mais Excelente Ordem do Império Britânico, destinada a civis e militares. Motivo? Pelos seus serviços prestados à Literatura Infantil. Rowling também recebeu títulos honorários em diversas Universidades, como a Universidade de Edimburgo e de Harvard, da qual foi oradora em 2008.

2 Harry Potter e a Pedra Filosofal, p.86

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Imagem: Warner Bros. Entertainment Inc.


Cinema: a magia dos trouxas O fenômeno literário despertou o interesse do cinema. Se o sucesso de Harry Potter já engatinhava com ajuda de seus primeiros livros, as telonas de projeção lhe proporcionaram correr a passos largos. Foram oito filmes produzidos, gerando mais de 24 horas de conteúdo para ser apreciado com aquele toque que o só o cinema tem. Sortudo daquele que teve o privilégio de acompanhar cada estreia numa sala de cinema. O cheirinho de pipoca se misturava com o da ansiedade. E mesmo sabendo que ansiedade não tem cheiro, ainda posso dizer que ela era tão saborosa quanto o sabor da pipoca. Foi em 2000 que o primeiro estreiou. A adaptação ficou por conta de uma das maiores produtoras de filmes do mundo - Warner Bros Pictures. Foram 10 anos de envolvimento com a série para o lançamento dos oito filmes e arrecadação ficou acima da casa dos oito bilhões de dólares. Haja espaço em Gringotes para guardar tanto dinheiro.

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Essa primeira adaptação do livro para o cinema foi o movimento de varinha inicial para a execução de um complexo feitiço: o de adaptação de linguagem e conteúdo entre diferentes meios, caracterizando aquilo que chamamos de narrativa transmídia, do inglês, transmedia storytelling.

É inegável dizer que os filmes de Harry Potter cativaram enormes públicos: fieis e sempre ansiosos por cada nova produção. Isso pode explicar as bilheterias individuais de cada filme sempre acima dos 700 milhões de dólares. A maior delas ficou com Relíquias da Morte - Parte 02, que superou a marca de 1 bilhão de dólares; a série tornouse, até meados de 2014, a maior franquia cinematográfica em termos de arrecadação em solo norte americano.

Daniel Radcliffe, ator que interpretou o papel de Harry Potter nos cinemas em 2001, promovendo o primeiro filme e em 2011, o último. 49

Fotos: Warner Bros. Entertainment Inc.


Assim como várias editoras descartaram a publicação do primeiro livro, a ideia de adaptação para os cinemas quase foi para o mesmo caminho. David Heyman, produtor de toda a série, havia aberto a Heyday Films, uma pequena produtora, e estava à procura de projetos literários que pudessem ser adaptados

para o cinema, que classificou com baixo

Daniel Radcliffe

potencial a adaptação de Pedra Filosofal. No

(Harry), J.K. Rowling,

final de 1997, Heyman deu mais uma chance ao

Emma Watson

manuscrito e percebeu que estava encantado.

(Hermione) e Ruppert

Após conversas com Lionel Wigram, amigo de

Grint (Rony) na

infância e na época executivo da Warner Bros

première mundial

em Los Angeles, estava certo: Harry Potter

de Harry Potter e as

estrearia nos cinemas.

Relíquias da Morte Parte 2.

Foto: Jon Furniss | Getty Images

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Foram quatro diferentes diretores para oito filmes. Contribuições particulares de cada um para que o universo de J.K. Rowling aparatasse sem estrunchar de um meio para outro. Aparatar? Sim, bruxos depois de alguns anos de prática aprendem a se deslocarem de um lugar para o outro, o que chamam de aparatação, quando chegam ao local, e desaparatação, quando partem. Se falharem nessa técnica, problemas podem acontecer; estrunchar é quando você deixa uma parte sua no local em que estava. Podemos dizer então que Harry Potter não estrunchou; muito pelo contrário, executou o feito com maestria. 150 pontos para Grifinória!

David Burron e David Heyman foram produtores da série; desde a Pedra Filosofal até as Relíquias da Morte. Heyman foi o responsável direto pela adaptação dos livros nos cinemas. 51

Foto: Warner Bros. Entertainment Inc.


Dos livros para os roteiros A pré-produção dos filmes já havia se iniciado após as negociações entre J.K. Rowling e os estúdios da Warner e de Heyman. A maior preocupação de Rowling na adaptação era manter intacto o tom britânico de sua história. Era necessária uma equipe que acreditasse no potencial da obra e que se envolvesse tão quanto a própria autora. Depois de muitos nomes e recusas, o roteirista Steve Kloves foi escolhido para adaptar o primeiro filme (e continuou no projeto até o final, com exceção de Ordem da Fênix, adaptado por Michael Goldenberg).

Foto: Revista Empire Online

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Luz, câmera e ação! O diretor. A responsabilidade de criar do zero todo aquele universo de Harry Potter deveria ficar nas mãos de alguém experiente, que conseguisse traduzir em imagens as centenas de milhares de palavras de Rowling. Vários nomes foram cotados, incluindo o famoso Steven Spielberg, mas foi pelas mãos de Chris Columbus que a mágica aconteceu. Dotado de um espírito jovial e entusiasta, o diretor de sucessos infantis como Esqueceram de Mim e Esqueceram de Mim 2 foi escolhido como o precursor no comando do transporte da escrita de Rowling para o visual do cinema.

Chris Columbus, responsável pela direção dos dois primeiros filmes da série, ao lado do produtor Heyman, em 2001. 53

Foto: Warner Bros Entertainment Inc.


Definidos o diretor e roteirista, a pré-produção continuava escalando profissionais competentes para o andamento do projeto. Para a direção de arte, o nome de Stuart Craig foi escolhido. Ele foi o responsável por dar vida a diversos cenários, desde a casa dos Dursley no primeiro filme até a casa dos Lovegood, no último longa. Teve os trabalhos indicados ao Oscar na categoria “Melhor Direção de Arte” em 2002 (HP2), 2005 (HP4), 2010 (HP7.1) e 2011 (HP7.2). Em parceria com Craig, Stephenie McMillan foi contratada como decoradora responsável por mobiliar todos os cenários criados pelo diretor de arte, resultando em ambientes detalhistas, com muitos objetos criados especialmente para a franquia. Um trabalho de muita pesquisa de referência, paciência e criatividade.

Foto: Jaap Buitendijk | Warner Bros Entertainment Inc.

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O Salão Principal, set de gravação utilizado em todos os sete filmes da série (Em Relíquias da Morte - parte 1, ele não aparece). As pedras usadas no chão, por exemplo, foram escolhidas para resistirem ao tempo; obra de Craig.

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Foto: Warner Bros. Entertainment Inc.


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À esquerda: alguns cenários utilizados na série Harry Potter. Abaixo: Craig posa ao lado da maquete de Hogwarts, em escala real, utilizada em todos os filmes da série. À direita: Daniel Radcliffe, como Harry Potter, posa para foto promocional.

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Fotos: Warner Bros. Entertainment Inc.


Sobre o elenco... Para qual papel você acredita que a equipe teve mais dificuldade de encontrar um ator correspondente? Sim, Harry Potter. O filme sobre um jovem bruxo ainda não havia encontrado seu protagonista alguns meses antes do início das gravações. Aos poucos, atores e atrizes consagrados do cinema e teatro britânicos foram aceitando papéis para personagens queridos por muitos fãs. Tivemos Maggie Smith como Professora McGonagall, Robbie Coltrane (Hagrid), Julie Walters (Sra. Weasley), Alan Rickman (Professor Severo Snape), além de Richard Harris como Dumbledore. Infelizmente, Harris faleceu depois do segundo filme, sendo substituído por Michael Gambson. E o trio principal - Harry, Ron e Hermione? Após vários testes com milhares de crianças que sonhavam com esses papéis, o diretor e equipe encantaram-se com Emma Watson e a acharam ideal para o papel de Hermione. O mesmo com Rupert Grint, que ficou com o papel de Rony Weasley. Estar no lugar certo na hora certa. A escolha do menino que deu vida a Harry Potter foi mais ou menos assim. Daniel Radcliffe, com nove anos, foi acompanhar os pais em uma peça de teatro em Londres, onde também estava presente o produtor David Heyman, que não conseguia tirar os olhos do garoto. Daniel já tinha experiência com teatro e até já havia participado de um filme. Seu nome até tinha sido citado entre alguns durante a pré-seleção, mas seus pais, temendo o tamanho da responsabilidade, não estavam dispostos a expor seu filho a um projeto de tamanha responsabilidade. Após muita conversa com os pais do garoto, os produtores definiram seu Harry Potter. Daniel, Emma e Rupert seriam responsáveis por darem vida para um dos trios mais amados da literatura e do cinema.

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Watson, Radcliffe e Grint, logo ap贸s a coletiva de impresa, na qual foram anunciados como Hermione, Harry e Rony. Em 2015, completou-se 15 anos do an煤ncio. 59

Fotos: Dave Hogan / Getty Images


Atenção, maestro! Quando

uma

música

trabalha

de

maneira tão simbiótica com um filme sabemos que ela foi bem sucedida, principalmente, quando, aleatoriamente, ouvimos um trecho e logo lembramos sua produção correspondente. Quem não se recorda dos temas de Tubarão (1975) ou então a famosa Marcha Imperial de Darth Vader na saga Star Wars? Parque dos Dinossauros e o clássico de aventura, Indiana Jones? John Williams, compositor de sucesso e renome mundial, foi o responsável por criar tema do menino bruxo. A trilha intitulada Hedwig’s Theme tornou-se a marca sonora de toda a franquia no cinema.

O tema musical da série contempla a coruja branca de Harry, Edwiges. Essa, por sua vez, é tida como o simbolo da infância e inocência de Harry durante seus primeiros anos no mundo bruxo.

Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.

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Posteriormente, novos nomes apareceram e enriqueceram ainda mais aquele mundo. William cuidou dos três primeiros filmes; em seguida vieram Patrick Boyle (HP4), Nicholas Hooper (HP5 e 6) e Alexandre Desplat (HP7.1 e HP7.2). E só pra ilustrar o quanto a escolha de John Williams foi certeira nessa fase de consolidação da série nos cinemas, ele também foi o compositor responsável pelas trilhas sonoras dos exemplos citados anteriormente. Haja criatividade musical!

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Foto: Divulgação


As cores no mundo bruxo Adaptar um romance para as telas é um desafio enorme; afinal são linguagens diferentes. Harry Potter ainda tinha mais um “agravante”: sua narrativa acontece num intervalo ininterrupto de sete anos. Desse modo, acompanhamos nos livros o crescimento das personagens principais, e o cinema mostrava-se na obrigação de representá-la. Aliás, muitos dos antigos leitores literalmente cresceram junto com os personagens, pois os livros foram também lançados ano após ano e que torna esse detalhe de produção essencial. Logo após o lançamento do primeiro filme, portanto, a gravação do segundo já havia se iniciado e assim foi até o último filme, de modo que realmente assistíamos na tela o crescimento e envelhecimento de todo elenco. Para o primeiro filme, era necessário um diretor com a sensibilidade e técnica de fazer o expectador mergulhar nesse universo mágico. Chris Columbus, em conjunto com toda equipe de produção conseguiu recriar fisicamente o mundo de Rowling em seus mínimos detalhes. Os dois primeiros filmes podem ser considerados os mais infantis da série, o que, de certo modo, explica a escolha por Columbus, que já havia consagrado no universo dos filmes infantis. Conforme os anos passavam, os perigos em Hogwarts com os rumores da volta de Voldemort iam tornando-se, gradativamente, maiores. Um diretor com uma visão além do fantasioso seria necessário, e Alfonso Cuáron seria o escolhido para a direção do terceiro capítulo da saga.

Ao lado, podemos acompanhar o crescimento do trio principal e o amadurecimento visual da série; a cada filme, o céu mais negro reforça o tom de perigos iminentes que se aproximam no mundo de Harry. 62


63 Imagens: Warner Bros Entertainment Inc.


O amadurecimento de Harry Potter O mundo mágico e colorido apresentado por Columbus em seus dois primeiros filmes foram dessaturados por Cuáron. A paleta de cores tornou-se levemente mais acinzentada, e a paisagem de Hogwarts mais bucólica. Em compensação, conhecemos mais profundamente alguns personagens, pois o diálogo torna-se mais utilizado durante a projeção, como a cena entre Harry e Lupin na ponte suspensa de Hogwarts.

Imagens: Warner Bros Entertainment Inc.

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Novos nomes foram escalados para novos personagens, como os de David Thewlis (Professor Lupin), Gary Oldman (Sirius Black) e Timothy Spall (Rabicho). O Prisioneiro de Azbakan é o livro que representa o fim da infância e a passagem para a adolescência e o modo pelo qual o diretor representa pode ser observado nas vestimentas dos atores, que antes eram vistos quase sempre com os uniformes de Hogwarts e agora usavam roupas mais comuns a qualquer adolescente, numa espécie de ressonância do mundo real no mundo bruxo e vice-versa. Há também a cena inicial do longa-metragem em que Harry brinca com sua varinha embaixo dos lençóis. Uma metáfora sutil com o crescimento do menino Potter. Cuáron é um diretor ousado. Cenas complexas, que seriam facilitadas com o uso de computação gráfica, foram feitas pelo diretor mexicano através de tecnologia de baixo custo e truques de câmeras. Os destaques ficam para a cena que Harry transforma, sem querer, a irmã de seu tio Valter em um balão, na qual a computação foi usada apenas para apagar alguns tubos e cabos; destaque também para o momento de transformação de um personagem em lobisomem: trabalho de dias para alguns minutos de projeção. 65

Foto: Warner Bros Entertainment Inc.


Um adolescente como qualquer outro Assumindo a responsabilidade de dirigir o quarto longa-metragem da série, Mike Newell, primeiro diretor britânico do projeto, adota o ritmo de urgência e violência, tanto que o filme já se inicia com um assassinato e nem sequer temos a participação dos Dursley, que durante os três filmes funcionavam como um elo entre Harry e o mundo real. O nome de Newell foi um dos primeiros cotados pelo produtor David Heyman para a direção dos primeiros filmes, mas por conta de estar envolvido em outro trabalho foi obrigado a negá-lo, tendo a possibilidade de abraçá-lo posteriormente. A ideia inicial do experiente diretor britânico era abordar o fim da infância de Harry e marcar bem o início de sua adolescência, mas convidado por Cuáron para assistir parte da montagem de Prisioneiro de Azkaban, viu que sua ideia já estava sendo utilizada pelo diretor mexicano e uma nova abordagem deveria ser feita. Dotado de um visual escandalosamente espetacular – a direção de arte de Harry Potter nunca decepciona – trabalhou na concepção e no visual de alunos de escolas

Foto: Warner Bros. Entertainment Inc.

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culturalmente diferentes de Hogwarts, além das três tarefas do Torneio Tribruxo e da Copa Mundial de Quadribol, que aconteceu semanas antes do início do ano letivo em Hogwarts. No entanto, tais eventos funcionavam apenas como propulsores de uma narrativa que tinha algo a mais por trás, tanto que Newell adotou a visão do filme como um thriller, uma espécie de suspense psicológico em que Harry está envolvido em algo maior e não sabe como que isso interfere na sua vida e mesmo com esse peso, Potter ainda traz nas costas conflitos normais de um adolescente de 14 anos, como brigas com o melhor amigo e dificuldades com a paixão. Novos

nomes

foram

encontrados

para diferentes personagens que surgiam conforme as páginas do romance de Rowling se desenvolviam nas telas, mas o destaque fica

para

Ralph

Fiennes,

responsável

pela versão palpável e humana de Lorde Voldemort. Testes foram realizados com o ator para lhe garantir o visual ideal de personificação do mal. O resultado foi a imagem de um bruxo instável,

capaz de

caminhar entre as emoções da cordialidade à maldade por mero prazer. Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado; Eis Lorde Voldemort. 67

Imagem: Warner Bros. Entertainment Inc.


Um filme de nuances políticas Trazendo

diferentes

diretores

ao

longo dos primeiros anos, Harry Potter foi concebido sob diferentes visões e muitos ficaram surpresos quando David Yates, sem experiência em grandes produções, assumiu o projeto no quinto filme. No entanto, para David Heyman, o nem tão inexperiente diretor era a escolha ideal, visto que já havia dirigidos séries televisivas britânicas cuja temática girava em torno da política, e a Ordem da Fênix é um filme com nuances políticas. Com roteiro desenvolvido por Michael Goldenberg, a mídia do mundo bruxo assume papel como personagem no filme, utilizada sempre para desmoralizar as palavras de Harry Potter e a imagem de Dumbledore. O ministro da magia, assustado, temia reconhecer a volta de Lorde Voldemort. Para ressaltar o clima de urgência, a projeção mantém a paleta de cores dessaturada utilizadas por Cuáron e Newell. É um filme em que Harry sente-se solitário, caminhando sozinho no escuro em meio a uma guerra iminente que foge de seu controle.

Foto: Levon Biss|Warner Bros. Entertainment Inc.

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Como sempre, novos nomes de atores são escalados para interpretarem novos personagens e dentre eles destaca-se o de Imelda Staunton, que deu vida a odiada Dolores Umbridge e Evanna Lynch, menina que deu a vida a Luna Lovegood, estudante de Hogwarts e amiga fiel de Potter. Na época de produção da Ordem da Fênix, a febre Harry Potter já estourava no mundo inteiro; quando abriram os testes para a escolha da menina que daria vida a Luna, os produtores esperavam cerca de 2000 inscrições para o papel, quando receberam mais de 15.000 mil nomes. Culminando num duelo entre dois bruxos de grandes nomes – Voldemort e Dumbledore – o desafio da equipe era fazer com que o confronto soasse verossímil e visceral. Por essa razão, utilizaram elementos como fogo, água, vidro e areia para conseguir o resultado esperado. O duelo aconteceu dentro do Ministério da Magia, um cenário concebido por Stuart Craig - diretor de arte – seu maior trabalho para a série. Não importava mais se as pessoas acreditavam ou não no retorno de Lorde Voldemort. Para Harry, o bruxo das trevas precisava ser detido, e seus próximos anos seriam intensos para completar a difícil tarefa.

Alunos de Hogwarts formam a Ordem da Fênix. 69

Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


Um tom de comédia David Yates retorna ao posto de diretor no sexto filme e assim permanece até o final da saga nos cinemas. Harry Potter e o Enigma do Príncipe é um filme diferente dos demais por abordar um tom de comédia romântica paralelo ao clima de guerra que se aproxima. O retorno de Voldemort é inquestionável, tanto que o filme iniciase com uma espécie de ataque terrorista por parte dos Comensais da Morte, seguidores do vilão, a Ponte Millenium, situada em Londres. Por conta do clima de guerra, Dumbledore precisa agir. Percebemos também uma aproximação entre o bondoso diretor e Harry Potter, que rompem aquela barreira meramente acadêmica e abraçam uma relação de amizade. Somos apresentados a novos personagens, o que demonstra a capacidade de expansão do universo de Rowling, sempre surpreendendo com algo essencial para a trama. Somos introduzidos a Horácio Slughorn, interpretado pelo britânico James Broadbent professor de poções - personagem essencial aos planos de Dumbledore. Se, num primeiro momento, nos envolvemos com os sentimentos juvenis de Harry, Rony e Hermione, em seguida somos surpreendidos com a carga emocional de outros. Draco Malfoy, rival trivial de Harry Potter nos primeiros filmes, agora é sobrecarregado com um emocional forte devido a uma tarefa que o próprio Lorde das Trevas o encarregou – assassinar Dumbledore. O jovem Malfoy é o tipo de personagem que queremos odiar, mas ao mesmo tempo sentimos pena, diante dos momentos em que o vemos sozinho na projeção, angustiado e com medo. Por fim, chegamos a um dos momentos mais tristes do filme em que damos adeus ao bruxo que entregou o bebê Harry Potter aos Dursley - Dumbledore é assassinado; não por Malfoy, mas por alguém que deixaria Harry perplexo e cheio de ódio e indignação. 70


Com a morte de seu mentor, Harry agora deve assumir o peso de destruir Voldemort, afinal, como já dizia a profecia revelada anos anteriores – um não pode viver enquanto o outro sobreviver.

Quem gosta de despedidas? Se Daniel Radcliffe, Emma Watson e Rupert Grint cresceram no decorrer de cada projeção, o mesmo pode-se dizer de boa parte de seu público, fenômeno que criou um elo único entre filme e telespectador. Dividido em duas partes, Harry Potter e as Relíquias da Morte conta, na primeira parte, a busca pelas horcruxes e como destruí-las e, na segunda, a guerra no mundo bruxo entre o bem e o mal. O universo de J.K. Rowling, mesmo na reta final, expande-se ainda mais. Conhecemos diversos novos personagens, como Xenólifo Lovegood, pai de Luna, o novo Ministro da Magia, Scrimgeour, dentre outros, todos fundamentais para o minucioso fechamento da trama. Embora dividido em duas partes, as gravações de Relíquias da Morte foram contínuas e duraram 18 meses. A produção discutiu muito o momento de parada entre a primeira e segunda parte para que uma não ficasse desconexa da outra. Funcionam bem separadas, mas são conectadas por um momento de triunfo de Voldemort. A tensão havia sido criada e ela interligava as duas produções. O maior desafio era arrematar pontos da narrativa que ficaram soltos durantes esses anos – aqui cito o que mais me encantou: a penseira, artefato mágico usado por Dumbledore pela primeira vez em O Cálice de Fogo muda bruscamente o visual no sexto filme, Enigma do Príncipe, mas que é consertada na segunda parte de Relíquias da Morte. 71


Das várias entrevistas que o trio principal concedeu a palavra família se destacou. Para eles, esse era o espírito quando se reuniam, ano após ano, desde 1999, quando iniciaram as gravações de A Pedra Filosofal até 2009, quando terminaram de gravar a última adaptação. Na despedida, claro, muitas lágrimas e choro. Era o final de um ciclo, de um era – a Era Harry Potter. É semelhante quando terminamos faculdade; estamos habituados a conviver com diversas pessoas e amigos, que elas tornam-se queridas demais para que nos afastemos. E é uma mistura de sentimentos que temos, satisfação e saudade, quando

A emoção tomou conta

vemos a projeção encerrar num plano fechado

dos últimos dias de

no rosto dos três protagonistas. Assim como

gravações de Relíquias

as últimas palavras do sétimo livro, naquele

da Morte, últimos filmes

momento percebemos que “tudo estava bem”.

da franquia. “Atenção, pessoal, digam adeus para seus professores de Defesa Contra as Artes das Trevas. Esse é o último dia de Alan e David Thewlis.”, diziam membros da produção conforme o ator que deixava o set de gravação.

Imagens (direita e esquerda): Warner Bros Entertainment Inc.


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Foto: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.

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Rowling e o fenômeno mundial Quando começou a escrever Harry Potter em 1990, J.K. Rowling jamais imaginaria que crianças e adultos esperariam ansiosos por suas novas publicações. É quase aquela sensação que a gente sente quando faz algo sem esperar nada em troca e o universo conspira de um modo que acontece justamente o contrário. No caso, Rowling deve ter se assustado bastante – ter o nome tirado do anonimato quase que do dia pra noite deve ser bem assustador. É claro que o feito não aconteceu tão assim, repentinamente. Lembram que os primeiros manuscritos de Harry Potter foram recusados por muitas editoras, né? Podemos

evidenciar

o

sucesso

de

Rowling mais a partir do segundo livro, A Câmera Secreta (1998), e do terceiro, Prisioneiro de Azkaban (1999). A Books of Wonder é uma das mais tradicionais livrarias infantis em New York e em 1999 o jornalista Stephen McGinty escreveu em seu artigo “Pottermania – Foco – Perfil – J.K. Rowling” como a escritora britânica deixava de ser uma simples autora em turnê com seu projeto literário para se tornar um grande fenômeno mundial. Em duas horas, autografou mais de 75


mil exemplares do seu terceiro romance. No local, crianças e adultos dividiam espaço com dezenas de fotógrafos e jornalistas. Outro

Alvo Dumbledore

resultado de seu sucesso - J.K. Rowling foi

sempre foi um bruxo

a única literata que conseguiu ocupar os três

muito respeitado

primeiros lugares de livros mais vendidos da

na comunidade

lista do jornal The New York Times, um dos

mágica de Harry

mais tradicionais da cidade americana. Nem

Potter. Após

A Vida e as mentiras de Alvo Dumbledore, por

certos incidentes,

Rita Skeeter, conseguiria tal proeza.

seu passado foi

Uma das coisas mais curiosas sobre a

completamente

série é que a ideia principal da história de

exposto no livro

Harry Potter surgiu numa viagem de trem que

“As Verdades e

a escritora fazia para Londres. O esforço para

Mentiras de Alvo

reter todo aquele universo que tinha acabado

Dumbledore”,

de brotar em sua imaginação foi grande,

escrito por Rita

visto que não havia sequer um lápis ou papel

Skeeter, uma repórter

em sua bolsa. Quando deu por si, Rowling

um tanto quanto

conseguia ver claramente a imagem de um

impertinente, que

menino magrelo e de cabelos bagunçados,

se formos fazer um

com cicatriz em forma de raio na testa,

comparativo com o

caminhando pelos corredores de um castelo

mundo real, funciona

- Hogwarts. Desse fato surge a ligação de

perfeitamente como

Harry ter que pegar um trem para chegar à

crítica aos grandes

escola de magia. As histórias de Potter não

portais de fofoca que

chegaram apenas em Londres junto com

noticiam sobre a vida

Rowling naquele dia e permaneceram por lá;

alheia de famosos sem

tempos depois percebemos que o destino da

se preocuparem muito

viagem rompia fronteiras e que cada casa

com a veracidade das

com um livro do menino bruxo tornou-se uma

informações.

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estação, no mundo inteiro. O menino que nos é apresentado vivendo sob as escadas na casa dos tios tornara-se conhecido no mundo todo. De Harry Potter e a Pedra Filosofal, no Brasil, até Hari Potta to kenja no ishi - no Japão. Rowling criou um fenômeno. Ela criou a “Pottermania”. A expressão é informal. Foi criada para designar a paixão que os fãs sentem pela história e os feitos que são capazes de realizar por ela. Há, inclusive, outro termo no fandom3 , ainda mais específico, para designar quem é muito fã e conhecedor da saga. São os potterheads. Esse livro, por exemplo, foi escrito por um. O termo vem do inglês. Potter, em referência ao menino e head, que quer dizer cabeça, ou seja, “Potter na cabeça”.

3 Fandom refere-se à comunidade de pessoas que, juntas, tem um gosto em comum por determinado cantor, série de televisão, livros ou filmes.

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Somente a Pottermania pode explicar as filas quilométricas que se formavam nas livrarias às vésperas dos lançamentos mundiais de cada livro. Somente ela explica as premières4 mundiais lotadas de cada filme, sem mencionarmos as sessões de pré-estreia individuais de cada cinema espalhados pelo mundo. A Pottermania que explica a expansão dos filmes para os games e para outros produtos licenciados, como jogos de tabuleiro, figure action5 e roupas.

4 Premières são eventos que contemplam qualquer inauguração de evento; no caso, a estreia de um filme. Contam com a presença de vários atores participantes do projeto, que são recebidos com tapete vermelho e multidões de fãs. O Brasil contou com a presença dos atores Matthew Lewis e Tom Felton para divulgar os dois últimos filmes da série. 5 Um figure-action é um boneco plástico, geralmente cópia fiel de algum personagem de filme, quadrinhos ou vídeo games. Podem ser articulados e interativos ou estáticos.

Foto: Joel Ryan|Associated Press

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Como o tempo passa pra todos, inclusive para o menino que sobreviveu, temos também os livros digitais, os chamados e-books, consequência das novas tecnologias que foram se desenvolvendo durantes os anos. Claro, sem mencionarmos os parques nos Estados Unidos e Japão e nos estúdios de gravações dos filmes que deram lugar a um museu na Inglaterra. Particularmente, estou ansioso esperando pelos quadrinhos e animações. Responsável por tudo isso? Sim, eu sei que o mercado ajuda muito, afinal, Harry Potter também é uma marca; mas se temos audiência ativa, temos Pottermania. Hogwarts tem aula de matemática ou estatística? Não. Podemos encontrar lições de poções, herbologia - a botânica bruxa -, feitiços e até transfiguração, que é quando transformamos algo em outra coisa completamente diferente, mas matemática não. Entretanto, vamos falar um pouco de números. O mercado estima que a marca Harry Potter valha, aproximadamente, 15 bilhões de dólares. Somando a renda das vendas de livros, arrecadação de cinema, parques temáticos e licenciados, Harry Potter já faturou mais de 20 bilhões de galeões de ouro, digo, dólares. Galeão é a moeda bruxa. No cinema, estima-se mais de 07 bilhões com os oito filmes. Sagas como Indiana Jones e Star Wars foram desbancadas pelo menino. Com licenciados, a receita ultrapassa 01 bilhão/ano. Só com vídeo games, Harry Potter obteve uma receita acima de 1,5 bilhão de dólares. Nos primeiros meses de funcionamento do parque The Wizarding World of Harry Potter, em Orlando, Potter fez mágica com a receita da Universal, dona do estabelecimento, aumentando-a em mais de 60% e dobrando a venda de produtos comercializados no local (Revista Exame, 2012).

Imagem: Divulgação

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Em 2007, Relíquias da Morte, o último livro foi publicado. Quatro anos depois, a segunda parte do filme de mesmo título foi lançada nos cinema. A partir de então, muito se discutiu sobre o futuro da série, que fechava um arco de 10 anos de produção para as telonas e quase 15 na literatura. Era comum na época os jornais e portais utilizarem-se da palavra “órfãos” para designar os fãs de Harry Potter naquele momento. Mas ficamos realmente órfãos? A resposta é não. Harry não somente sobreviveu ao terrorismo de Voldemort, graças ao amor incondicional de sua mãe, como também novamente o fez quando migrou para o digital, para a internet e para outros meios. Vamos ser poéticos – o amor, agora dos fãs, ainda mantêm Harry Potter vivo. Mas esse amor só é bonito nos romances mesmo. Na vida real, a explicação é outra. Harry

Potter

cresceu

num

período

de

convergência de mídias. Você se lembra do disco de vinil? E do VHS? Eles são dois exemplos de mídias obsoletas, que não conseguiram sobreviver com o tempo. Com o advento da internet, onde podemos encontrar livros completos, filmes, notícias, você acha que mídias tradicionais como livros, cinemas e jornais terão o mesmo destino que o vinil e o VHS? Bom, isso só o tempo pode dizer, mas nesse momento que a série vive tais mídias não tomam o lugar uma da outra, interagem entre si, convergem, permutando conteúdos e contando com a participação interativa de seus públicos. 80


A prova mais que concreta do fenômeno se deu em 2011 com o lançamento de uma plataforma online e totalmente interativa, o Pottermore, um projeto literário em forma de site, criado por J.K. Rowling e desenvolvido pela agência digital britânica TK_NK com patrocínio da Sony. Uma proposta, que além de vender os e-books e audiobooks, disponibiliza conteúdos adicionais sobre a série e seu processo criativo, todos produzidos por Rowling e desenrolados interativamente. A segunda parte desse livro se destinará para explicar tal fenômeno de convergência e como ele, naturalmente, acompanhou a série e sua expansão para diversas outras mídias. Bem vindo a narrativa transmídia e a Cultura da Convergência6.

Fila em uma livraria de São Franciso, Califórnia (EUA), para a compra do último volume da série, Harry Potter e as Relíquias da Morte, 5 minutos após sua publicação oficial, 2007.

6 Cultura da Convergência. Henry Jenkins. 2011.

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Foto: Zack Sheppard


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Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


A mágica se multiplica pelo globo Quando o assunto é criatividade, J.K. Rowling é exemplo. Pessoas podem gostar ou não de sua criação, pontuar altos e baixos, mas negar a capacidade de criação da autora é um ato questionável. No momento em que criou um universo narrativo tão amplo, com personagens de personalidades fortes e bem desenvolvidas, lugares inovadores, regras, conceitos, mecanismos, Rowling criou um fenômeno e embora não concebido originalmente como tal, hoje, Harry Potter é amado por muitos no mundo inteiro, sem distinção de idade, gênero ou classe social. Tão rico quanto esse universo é também o estudo que podemos realizar sobre o fenômeno que se transformou Harry Potter, pois mesmo sendo, em boa parte, alimentado pela demanda popular, o seu desenrolar, como vários produtos em diversos meios, pode ser considerado reflexo de uma nova cultura de consumo, a qual é descrita pelo professor de ciências humanas, Henry Jenkins (2011), como a Cultura da Convergência – a relação entre produto e consumidor deixa de ser estática. O consumidor, agora, além de desfrutar do produto, anseia participação e o produtor deve atender esse desejo. Essa segunda parte do livro será dedicada justamente ao estudo do fenômeno Harry Potter e seu desdobramento nos diversos meios, incluindo o digital, que para Jenkins (2011) é uma dos principais responsáveis por essa mudança de comportamento, não só para a série Harry Potter, mas de maneira global. A internet existe, hoje, não para substituir meios antigos, mas sim transformá-los e complementá-los; em consequência, o modo como interagimos com essa nova organização também se altera. 84


Você se lembra de quando te contei que Rowling e o produtor David Heyman fecharam contrato com a Warner Bros para produção dos filmes? Aquele momento representou para a série o início de sua expansão mundo afora. Tivemos o processo de adaptação do conteúdo dos livros para um meio completamente diferente – o cinema, de linguagem diferenciada. Não temos mais frases que formam um texto corrido impresso numa página. No cinema, temos a releitura dessa escrita para imagens, sons e cores. Juntamente com o aumento de audiência e público, a adaptação de livros para filmes representou o início de Harry Potter como um produto, “uma marca que converge”. Vamos entender por convergência o que Jenkins (2011) nos coloca como uma nova maneira de relacionamento entre as novas e velhas mídias, de modo que a relação entre o produtor de conteúdo e consumidor tornase imprevisível. Depois do cinema, Harry Potter migrou para os games de diferentes consoles (Play Station, Xbox, Games Boy, PC e outros), para o digital com o Pottermore, uma espécie de rede social destinada aos fãs, e inclusive para parques temáticos. Harry Potter e a Pedra Filosofal: capas do primeiro livro (versão britânica), filme e game. 85

Imagens: Divulgação


Após a produção dos primeiros filmes, a popularização da série cresceu exponencialmente e, por consequência, sua disseminação de conteúdo em diversos meios, de modo que cada adaptação interage entre si e não necessariamente dependa uma da outra (JENKINS, 2011). É mais importante que a experimentação da parte seja suficiente ao usuário do que a experimentação no todo. Uma pessoa que só leu os livros, assistiu aos filmes ou visitou os parques não necessariamente tenha que ter feito tudo isso para entender o que é o universo Harry Potter, pelo contrário, cada elemento diferente torna-se um ponto distinto de acesso para o indivíduo. Quando analisamos essa acomodação de conteúdos entre um meio e outro, estamos abordando um assunto relativamente novo. Vamos entender a parte de conteúdo por histórias ou o ato de narrar e essa permuta através de diferentes meios como transmídia. O resultado: narrativa transmídia, do inglês, transmedia storytelling. Esse fenômeno é, portante, resultado da Cultura da Convergência.

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O esquema acima representa o transmedia storytelling na série Harry Potter. Os livros são os textos canônicos (RYAN, 2013) que deram origem aos filmes, games, parques e, nos últimos anos, ao Pottermore, uma plataforma online de conteúdo e que será abordada mais adiante. O esquema deixa em aberto o futuro, pois a narrativa transmídia pode abarcar muitas outras mídias que, futuramente, poderão compôr o esquema.

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Ilustrações: Marcelo ORamos


Um passo de cada vez... Primeiro, vamos entender o que é a cultura de convergência e como ela se estabelece. Jenkins (2011) define como “o fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de mídia, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação”, que buscam pelo entretenimento onde desejam. E mais, o autor defende o processo não como tecnológico, mas como cultural. Resumidamente, convergência é o livro dando suporte ao cinema, que dá suporte ao parque temático em Orlando e esse, conecta-se novamente aos livros que são redescobertos dentro do Pottermore, onde podemos comprar suas versões digitais e auditivas. As mídias tradicionais trabalham em conjunto com as novas e o conteúdo é distribuído em todas elas. A diferença é que com a convergência conjunta entre as novas e velhas mídias estabelece-se um comportamento diferenciado para o consumidor, que não é mais passivo às informações e aos meios; ele quer ser atuante e é sempre ávido por interatividade, esteja onde estiver. A convergência acontece primeiramente no cérebro dos consumidores, que “são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em meio a conteúdos de mídias dispersos”. Por essa razão, por exemplo, que na época dos lançamentos de livros e filmes existiram muitos sites criados pelos próprios fãs que funcionavam como ponto de encontro, onde apreciadores e pottermaníacos poderiam discutir sobre a série tal como o que aconteceria na história, qual ator seria escalado para interpretar determinado personagem e assim por diante. Jenkins (2011) conclui que a cultura de convergência sustenta-se na relação de três conceitos diferentes: convergência dos meios de comunicação, inteligência coletiva e cultura participativa. 88


Convergência dos meios O termo refere-se ao fenômeno em que os meios de comunicação convergem para um ponto em comum, sendo a internet uma das principais responsáveis pelo ocorrido. Aqui sim o processo é tecnológico e não cultural como a Cultura da Convergência. Em um vídeo que diferencia narrativa transmídia da convergência dos meios, Matha Gabriel, Coordenadora do MBA em Marketing da HSM Educação, coloca tais processos como opostos. Ela cita o smartphone como convergência tecnológica. Nele tem-se acesso a notícias, fotos e vídeos, que antigamente precisavam cada qual de uma plataforma diferente para existir. Hoje, podemos acessar o Pottermore do smartphone, ler os livros, interagir, assistir aos filmes, esbarrar em uma publicidade online de viagem ao parque em Orlando; é tudo, tecnologicamente, integrado num só ponto.

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Foto: Viktor Hanacek | FreePik


Inteligência coletiva O termo foi criado por Pierry Levy, filósofo francês, e Jenkins (2007) utiliza-se de seu conceito para dizer que a narrativa transmídia é a estética ideal nessa era de convergência. Os participantes da inteligência coletiva reúnem informações e realizam um verdadeiro trabalho de perícia em cima delas em busca da solução de problemas ou direcionamento da narrativa. Dentro da série Harry Potter, por exemplo, fã sites brasileiros e internacionais produziam os chamados “quadro-a-quadro” de cada novo trailer quando um novo filme estava prestes a estrear nos cinemas. Desse dissecamento da imagem buscavam por informações ou pistas que lhes trouxessem alguma novidade sobre o que estaria por vir. O mesmo acontecia na época de publicações de novos livros. Especulações e rumores atravessavam os continentes através da internet e despertavam a curiosidade e espírito investigativo dos fãs para descobrir a veracidades de informações como qual e como seria o enigma do príncipe (sexto livro) ou o título dos próximos livros, por exemplo. Em outras palavras, inteligência coletiva é a parte (fã) que constrói um todo (universo de informações sobre a série), sempre de maneira colaborativa e conjunta.

Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.

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O seguinte screenshot (quando se tira uma foto de um vídeo ou da tela do computador) circulou nos fã sites de Harry Potter durante novembro de 2009. Ele foi feito de um especial de entrevistas sobre a série, quando os dois últimos filmes ainda não tiveram seu lançamento nos cinemas. A comunidade de fãs percebeu que, ao fundo do designer de produção, Stuart Craig, duas imagens conceituais mostravam dois objetos (circulados) de grande importância nas próximas produções e que ainda não haviam sido, oficialmente, reveladas. É o exemplo claro de quando Jenkins utiliza-se de Levy para afirmar que a Inteligência Coletiva é um trabalho de perícia realizado pela comunidade de fãs ou seguidores de uma série.

Quadro-a-quadro descritivo lançado pelo site Potterish, na noite posterior ao lançamento do trailer de Relíquias da Morte, em setembro de 2010. 91

Imagem: Potterish | Divulgação


Cultura participativa Cultura participativa refere-se à produção dos fãs através de curtas metragens, músicas e até mesmo histórias baseadas no universo bruxo de Rowling – as chamadas fan fictions (ficção de fã). Esse fenômeno, de acordo com Jenkins (2011), é possibilitado graças a maior possibilidade de participação que os meios oferecem a seus usuários. Agora, os fãs “podem capturar amostras de diálogos no vídeo, resumir episódios, discutir sobre roteiros, criar fan fiction, gravar suas próprias trilhas sonoras, fazer seus próprios filmes – e distribuir tudo isso ao mundo inteiro pela Internet”. O site Potterish é a maior referência nacional sobre Harry Potter produzida por fãs, sendo inclusive reconhecido e condecorado por ninguém menos que J.K. Rowling. Nele podemos encontrar uma sessão exclusiva para as ficções de fãs. Pelas estimativas do próprio site, são mais de 23 mil textos cadastrados e os comentários ultrapassam o meio milhão.

Foto: Alejandro Escamilla | FreePik

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Aliás, o próprio Potterish funciona como uma grande enciclopédia participativa e é reflexo da inteligência coletiva, pois construída pelos fãs, traz diversas informações sobre a série Harry Potter desde que foi fundado em 2002. Existem sessões exclusivas para cada plataforma da série – livros, filmes, Pottermore, parques – das quais podemos obter informações das mais variadas, desde boatos a confirmações feitas pela própria autora em entrevistas para portais e programas de televisão, que foram avidamente traduzidos do inglês para o português pelos fãs e disponibilizados na internet de forma gratuita. Se acessarmos ao Youtube e pesquisarmos por Harry Potter Fan Film, seremos direcionais para um resultado que aponta diversas produções independentes produzidas por fãs. The Greater Good Harry Potter - Dumbledore and Grindelwald, uma das mais populares, ultrapassa os dois milhões de visualizações.

Na foto ao lado, os fãs encenam como se fossem as personagens Dumbledore (cima) e Grindelwald (abaixo) em um duelo de poderes. Imagem: Divulgação


Thiego Novais há pouco mais de dois anos desenvolve um vlog sobre a saga, o Observatório Potter, que já ultrapassa os 200 mil inscritos. Formado em jornalismo, o jovem vlogueiro comenta sobre curiosidades da série, faz o levantamento do perfil de diversos personagens, além de discutir toda e qualquer novidade que envolva o mundo de Harry Potter e de Rowling. ✳Dos três fenômenos que sustentam a Cultura de Convergência, há um elemento fundamental e comum ente eles que desempenhou um papel fundamental para a existência da série Harry Potter durante todos esses anos: a figura do fã. É por conta dos fãs que o jovem Potter sobreviveu as mudanças no comportamento de seus consumidores, adaptando-se a uma nova realidade de comunicação e ampliando os portais de acesso ao mundo de Rowling, sempre de maneira inovadora e criativa, pois para o próprio Jenkins (2011) a redundância leva ao fracasso da franquia. Harry Potter atingiu um patamar que ler os livros ou só assistir aos filmes tornou-se insuficiente; seus

consumidores

querem

participar

desse mundo, direta ou indiretamente e a internet torna-se o um dos meios mais propícios e fundamentais para a produção amadora pelos fãs. Foto: Thiego Novais |Divulgação

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Agora que entendemos um pouco da Cultura de Convergência, vamos ao transmedia storytelling ou narrativa transmídia. Contar histórias e distribuir conteúdos em diferentes mídias não são coisas novas, mas juntar as duas técnicas em uma, de modo que ela possa oferecer bons resultados de comunicação e disseminação de uma ideia ou história, sim e é exatamente esse fenômeno que veremos a seguir dentro da série Harry Potter.

O que é e como funciona a narrativa transmídia? Para destrancar – Alohomora! Para esquecer – Obliavete! Para destruir a vida – Avada Kedavra! Um feitiço para cada ação.

Para Convergir – Transmedia Storytelling!

Quando existe a adaptação de conteúdo entre diferentes meios midiáticos presenciamos a narrativa transmídia. A definição de Jenkins (2011) para assunto que norteia boa parte dos estudos em cima do tema é uma história que “se desenrola através de múltiplas plataformas de mídia, com cada texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo”. Temos o cinema contribuindo nas telas com a reinterpretação das palavras de Rowling, o parque proporcionando a vivência dentro do universo dos filmes e dos livros, os games que oferecem jogabilidade e interação, além do Pottermore que amplia o universo narrativo com textos extras sobre personagens e fatos da série, escritos pela própria autora. Comentaremos cada plataforma isoladamente mais adiante. 95


Depois que os romances transformaram-se em filmes, encontramos Harry Potter nos videogames e até mesmo projetos mais ousados, como parques e sua rede social própria, o Pottermore, que é o exemplo concreto das palavras de Jenkins (2011), quando ele afirma que “na forma ideal de narrativa transmidiática, cada meio faz o que faz de melhor – a fim de que uma história possa ser [...] expandida pela televisão, romances e quadrinhos, seu universo possa ser explorado em games ou experimentado como atração de um parque de diversões”. A palavra chave entre o conceito anterior de Jenkins e o Pottermore, por exemplo, é a expansão. Conforme o usuário lê ou relê os capítulos de cada livro, desbloqueia conteúdos inéditos escritos pela própria J.K. Rowling. Mas aí surge uma pergunta: posso assistir aos filmes, sem ao menos ter lido os livros? Claro que pode! E visitar o parque só tendo lido os livros e não assistido aos filmes? Você deve! Rodolfo Oliveira, organizador do livro Caminhos Transmídia (2015), afirma que no transmedia storytelling “o engajamento com cada mídia aumenta a compreensão e o aproveitamento [e que] a elaboração da história em cada mídia deve ser autossuficiente”. Ele ainda diz que aproveitar ao máximo cada mídia deve ser mais importante que aproveitar o todo, ou seja, minha experiência no parque deve ser plena tão quanto possível em diversão e entretenimento que um parque temático pode me oferecer; eu não preciso ter lido os livros ou assistido aos filmes para essa experiência, mas por meio dela eu posso conhecer essas outras adaptações. O esquema a seguir ilustra como esse livro abordará a narrativa transmídia de Harry Potter até ela atingir seu ápice nos dias de hoje, com o Pottermore.

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Os livros são as principais e originais chaves de acesso ao mundo de Rowling, pois deles que nasceram todas as outras, filmes, games ou parque, o que Marie-Laure Ryan (2013) - pesquisadora independente no campo da narratologia e cultura digital - denomina texto canônico. Para ela, franquias como Harry Potter, que não foram previamente pensadas e concebidas como narrativa transmídia, são consequência de um “efeito bola de neve”. São séries que “começaram na mídia do romance e criado por uma única autoria e depois se expandiram pra filmes e jogos de computador [e consoles] graças à demanda popular”. A narrativa transmídia concebida desde seu início como tal é assunto para outro livro. 97

Ilustração: Marcelo ORamos


Das páginas de livros para as páginas de roteiros Nesse ponto da leitura, eu lhe proponho um rápido desafio: escrever num papel sua descrição física e psicológica de modo que pessoas diferentes, após a leitura desse descritivo, possam compartilhar de uma mesma visão sobre você. Complicado não? Desse pequeno exercício podemos imaginar a dificuldade que foi a adaptação dos romances de J.K. Rowling para o cinema e abarcar alguns conceitos importantes para construção de um universo narrativo, de modo que eu consiga identificar o Harry Potter ou qualquer outro personagem dos livros nos filmes.

“Era alto , magro e muito velho, a julgar pelo prateado dos seus cabelos e de sua barba , suficientemente longos para prender no cinto . Usava vestes longas, uma capa púrpura que arrastava pelo chão e botas com saltos altos e fivelas . Seus olhos azuis eram claros, luminosos e cintilantes por trás dos óculos em meia lua e o nariz muito comprido e torto , como se o tivesse quebrado pelo menos duas vezes. O nome dele era Alvo Dumbledore .”

O trecho acima (Pedra Filosofal, p. 12) é a primeira descrição de Dumbledore nos livros e como ela foi relida nos cinemas.

Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.

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Compreender

o

universo

narrativo

“é central para o fenômeno da narrativa transmídia, já que é ele quem amarra os vários textos do sistema” (Ryan, 2013), de modo que “a compreensão obtida por meio de diversas mídias sustenta uma profundidade de experiência que motiva mais consumo” (Jenkins, 2011). Quando assistimos às adaptações cinematográficas de Harry Potter, podemos enxergar duas coisas além da própria projeção: o trabalho de Rowling e a releitura desse trabalho pelos olhos dos diretores e da equipe de produção.

A figura do diretor é importante para ajudar que os atores encontrem o tom certo do personagem a quem está dando vida nas telonas. 99

Fotos: Warner Bros Entertainment Inc.


Um bom exemplo para o conceito anterior é a representação do estado psicológico do personagem. Nos livros, Rowling tem toda a liberdade para expressar em linhas o verdadeiro estado emocional de Harry Potter, enquanto o cinema mostra-se um meio mais limitado, pois é através do visual: cores, planos, iluminação – que o expectador precisa inferir e compreender o estado emocional do menino. E o mesmo pode-se dizer da própria aparência de Harry Potter ou de qualquer outro personagem. E não só de pessoas em si, mas de qualquer página escrita por Rowling; afinal, todo aquele universo mágico é novo, com exceção dos lugares reais dos quais ela se utiliza em algumas partes de sua história, como a estação King’s Cross em Londres, que dá acesso à plataforma de embarque 9 ¾ do mundo bruxo.

Em 2013, foi inaugurada uma seção especial Harry Potter na Estação King’s Cross, que se tornou ponto turístico e fotográfico em Londres por conta dos filmes. Foto: Londres Para Iniciantes

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Como você já deve ter lido a primeira parte desse livro, na adaptação dos livros para os filmes não me estenderei demais a fim de não parecer prolixo, embora a série tenha conteúdo suficiente para a produção de várias enciclopédias sobre esse processo de transposição de um meio para outro. O importante é termos definido que os filmes são os portais da sétima arte do mundo encantado de Harry.

Posters promocionais do primeiro ao último filme que circularam entre os anos de 2001 e 2011.

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Imagens: Warner Bros Entertainment Inc.


Vamos jogar? E não me refiro a Quadribol Quadribol, o esporte do mundo bruxo. O jogo é simples, mas nem por isso, fácil. São sete jogadores para cada time, três artilheiros, dois batedores, um apanhador e um goleiro. O objetivo é fazer o maior número de pontos possível arremessando a bola do jogo (goles) para dentro dos aros do time adversário. Tranquilo? Eu mencionei que o esporte é praticado em cima de vassouras e que outras duas bolas – balaços – são enfeitiçadas para que derrubem os jogadores? Pois é. Ainda temos a terceira bola, o pomo de ouro, que quando capaturada garante a vitória imediata para o time responsável pelo feito. Seria sensacional participar de uma partida dessas, né? Não só seria como é possível. Eu explico melhor.

Imagem: Eletronic Arts (EA Games) | WB Games

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Em 2003, em parceria com a Warner Bros. Entertainment Inc. e com J.K. Rowling, a Eletronic Arts (EA games) lançou Harry Potter: Copa Mundial de Quadribol, um jogo que simula o esporte do mundo bruxo numa competição que vai além dos terrenos de Hogwarts e conta com participações fictícias de diferentes países, como Espanha, Estados Unidos, Japão, dentre outros. Viu como é possível jogar quadribol? A primeira adaptação para o universo dos jogos, entretanto, já havia acontecido alguns anos antes, tornando-se assim mais um portal de acesso ao mundo da narrativa transmídia de J.K. Rowling. Harry Potter e a Pedra Filosofal (jogo) foi lançado em 2001 e assim sucessivamente, ano após ano, no mesmo ritmo de estreia dos filmes. A EA games foi a empresa responsável por todos os jogos baseados na série do cinema e dos livros. Proporcionar aos fãs da série um jogo sobre a história de Harry Potter é mergulhá-los em uma nova forma de experimentar e (re) descobrir a série, porém de maneira interativa e imersiva. O jogador controla Harry (ou outros personagens) e suas ações, mesmo que dentro das limitações da jogabilidade do game e depara-se com algumas diferenças entre os livros e filmes, mas que ocorrem por conta da plataforma em que se desenvolvem e não alteram a história principal em sua essência. Essas novas releituras incrementam ainda mais a vivência com a série. 103

Imagens: Eletronic Arts (EA Games) | WB Games


Vamos a um exemplo prático. A relação a seguir demonstra como um mesmo evento é recontado nos livros, filmes e jogos, conforme as necessidades e limitações de cada meio. No primeiro livro, Harry, Rony e Hermione querem impedir o roubo da Pedra Filosofal, que está escondida numa sala subterrânea em Hogwarts, cuja entrada é protegida por um enorme cão guarda de três cabeças. Assim que passam por ele, o trio encontra alguns obstáculos, que serviriam para proteger a pedra. Dentre eles, temos um teste de lógica. Várias poções, um enigma. Esse mesmo evento recontado nos três diferentes meios ficou da seguinte maneira: Evento (HP1)

Livro

Filme

Game (PC) A poção

Hermione

verdadeira é

resolve

apresentada

Enigma

pela lógica

dentre muitas

das poções

o enigma

outras. Elas

criado pelo

e Harry

mudam de lugar

Professor

consegue

O filme omite o

rapidamente, e

Snape para

prosseguir

evento.

o jogador deve

a proteção

para resolver

ser atento e

da Pedra

o último

descobrir seu

Filosofal.

obstáculo e

novo lugar. Se

resgatar a

errar, Harry

pedra.

morre e o jogo recomeça.

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Consegue perceber que, de um mesmo conflito dentro da história principal que são os livros, temos diferentes interpretações e experimentações? É claro que o exemplo acima é aleatoriamente ilustrativo, mas se repete por todas as adaptações, até Relíquias da Morte. Nos vídeo games, Harry depara-se com criaturas não existentes nos filmes, mas citadas nos livros e também participa de duelos que não estão presentes nem nos livros, mas que são totalmente verossímeis ao universo de Rowling. E é engraçado que, dentre os diferentes consoles, a jogabilidade também se altera. Se na versão para computador podemos jogar o enigma das poções, não podemos dizer o mesmo do vídeo game para Play Station 2 ou Xbox. Temos o mesmo universo sendo explorado de maneiras diferentes.

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Imagem: Eletronic Arts (EA Games) | WB Games


De pecinha em pecinha Quatro versões diferentes de jogos, baseados nas versões licenciadas de Harry Potter para a marca Lego, foram lançadas entre 2001 e 2011. Nelas, o universo de Rowling e dos filmes se desenvolvem com o visual característico da marca, que são pecinhas que podem ser facilmente montadas e desmontadas.

Girar e sacudir Que tal uma vivência um pouco mais imersiva no universo de Rowling? Lançado em 2009, Harry Potter para Kinect é um game desenvolvido pela Eurocom especialmente para o sistema Xbox 360 e que requer o dispositivo Kinect para funcionar. Tal tecnologia permite a interação real entre o jogador e a narrativa do game. Para que Harry lance determinado feitiço, por exemplo, o jogador deve realizar exatamente o mesmo movimento com os braços, simulando o uso de uma varinha e dizer em voz alta o nome do encantamento. Graças ao dispositivo, o jogador pode ter o rosto escaneado, criando um avatar-personagem exclusivo para o jogo. O desafio retrata momentos memoráveis para a série que vão desde a escolha da varinha, a seleção das casas, o clube de duelos e claro, a emocionante batalha entre Harry Potter e o terrível vilão, Lorde Voldemort.

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Em Harry Potter para Kinect, movimentos pré-determinados devem ser realizados para que a personagem do jogo complete a missão. Na foto acima, por exemplo, estão representados os atos de lançar feitiços e pular.

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Imagens: XBox Live | WB Games


Um toque a mais de tecnologia O ponto máximo da narrativa transmídia para Vicente Gosciola (2012) são os ARG – Jogos de Realidade Alternativa - que é quando a narrativa transmídia mistura espaços virtuais e reais. Para ele a narrativa extrapola a plataforma e se faz presente no mundo real, tornando o consumidor em vivenciador; “ele faz parte da história enquanto participa [...]”. O Wonderbook: Book of Spells, exemplo de AGR e resultado de uma parceria entre a Sony Computer Entertainment Inc. e J.K.Rowling, é mais uma das maneiras de acessar o mundo criado pela autora e um dos exemplos mais próximos das palavras de Gosciola, dentro da série Harry Potter. O dispositivo é uma extensão periférica do Playstation 3 e trabalha com realidade aumentada, oferecendo ao jogador a experiência única de aprender, conforme avança na leitura, os feitiços ensinados aos alunos de Hogwarts.

Foto: Divulgação

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“[...] é o mais próximo que um trouxa pode se aproximar de um livro de feitiços de verdade” são as palavras da própria autora no release de lançamento do produto à imprensa. Ela ainda complementa dizendo que o livro é uma ótima oportunidade de trazer a vida alguns de seus feitiços e as histórias por detrás de suas criações, comprovando a amplitude e capacidade de expansão de seu universo, até porque, dentro da narrativa ficcional de Harry Potter, o Livro de Feitiços por Miranda Goshawk é um exemplar localizado na sessão restrita da biblioteca do castelo e rapidamente citado no primeiro livro. Em 2013, também foi lançado o Wonderbook: Book of Potions, com o mesmo princípio de funcionamento do livro de feitiços.

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Imagens: Sony Computer Entertainment Inc


Agarre a chave de portal: Vamos viajar! Chaves de portais são objetos enfeitiçados que transportam instantaneamente bruxos para outro lugar já previamente pensado. Geralmente são utilizados objetos banais, como botas e escovas velhas, pois se forem encontradas por trouxas no mundo real passam despercebidas. Agarre a nossa chave (aliás, você já a tem em mãos), pois vamos viajar. Fazendo analogia às palavras de Jenkins (2011), “[Harry Potter] é entretenimento para a era da convergência, integrando muitos textos”; trata-se de uma obra tão ampla e rica, que uma única plataforma não é suficiente para contê-lo. Tão insuficientes são as mídias novas e tradicionais que algo maior precisou ser pensado para esse universo. Em 2010, uma parceria da Warner Bros. Entertainment Inc. e Universal Orlando Resort traria uma experiência completamente nova aos fãs de Harry Potter: a completa imersão presencial no universo literário de J.K. Rowling e com a mesma aparência dos filmes da Warner. Projetado como um parque dentro de um parque, O Mundo Mágico de Harry Potter teve suas construções iniciadas em dezembro de 2007.

Imagens: Warner Bros Entertainment Inc.

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Construção do parque Wizardry World of Harry Potter em Orlando, Flórida.

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Fotos: Muppy Lucky


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Foto: Heather Cuthill


A preocupação com a fidelidade e aparência do lugar era grande, afinal se o ambiente se destoasse da referência visual que os filmes foram para boa parte dos fãs, o local seria apenas mais um parque de diversões em Orlando e não o parque de Harry Potter. Por essa razão, Stuart Craig, diretor de arte dos filmes, foi contratado para coordenar o trabalho de construção. A intenção era clara: proporcionar uma experiência única no mundo mágico de Harry Potter, Rony e Hermione. Isso explica preocupações com os detalhes, como o verdadeiro sabor da cerveja amanteigada, bebida típica no vilarejo de Hogsmead e que eram recorrentes nos círculos de amizade dos alunos de Hogwarts, pois afinal ele só existia na cabeça da autora. Após vários testes de sabores com a própria Rowling, a bebida para o parque havia sido definida. Para ela, o sabor era um misto de açúcar mascavo, biscoito de manteiga e caramelo.

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As atrações giram em torno de eventos importantes na série, como o Voô do Hipogrifo7 , uma montanha russa infantil, o Desafio do Dragão7, baseado na primeira tarefa do Torneio Tribruxo do quarto livro – uma montanha russa mais radical - e Harry Potter e a Jornada Proibida7, um tour por dentro do castelo de Hogwarts que mistura experimentação presencial com hologramas de Harry, Rony e Hermione, Dumbledore, quadribol e muito mais, todos feitos com os atores originais dos filmes. O local ainda conta com várias lojas e restaurantes como o Três Vassouras, de comum aparição nos livros, onde os visitantes podem comprar suas cervejas amanteigadas, sucos de abóbora, uísque de fogo, além de experimentar a comida típica britânica. Nas demais lojas, os viajantes podem comprar camisetas e brinquedos licenciados, inclusive, claro, suas varinhas. Existem

as

atrações

musicais

e

de

dança com as garotas da Academia De Beauxbatons e os rapazes de Durmstrang, ambas as instituições que competiram com Hogwarts no Torneio Tribruxo do quarto livro. Ah, claro, sem esquecer o tradicional coral de sapo, que podemos assistir no terceiro filme da franquia – Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban. 115

Foto: Heather Cuthill


Tratando-se de um empreendimento milionário e que trabalha com entretenimento, novidades devem ser recorrentes para atrair novos visitantes e reconquistar os que já visitaram o lugar, tanto que em 2014 foi inaugurada a expansão do parque, com a abertura do Beco Diagonal e da estação King’s Cross, que se conecta a área do castelo pelo Expresso de Hogwarts. O destaque fica pelo Banco de Gringotes no Beco Diagonal, que possui um dragão em sua construção e que cospe fogo de verdade. Dentro, os visitantes podem experimentar o Harry Potter e a Fuga de Gringotes7, que faz a trajetória feita pelo bruxo quando fugiu das profundezas do banco no sétimo livro. Uma experimentação que leva a visita ao parque a outro nível. No mesmo ano, no outro lado do planeta, em Osaka – Japão, um segundo parque semelhante ao de Orlando, na Flórida, foi aberto para apreciação pelos países asiáticos. O local assemelha-se muito com a versão norte-americana, incluindo o castelo de Hogwarts e a vila de Hogsmead. Um dos grandes diferenciais talvez seja a presença do Lago Negro, que complementa o visual mágico de Hogwarts.

Foto: Heather Cuthill

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7 Tradução livre do autor - Flight of the Hippogriff. Dragon Challenge, Harry Potter and the Forbidden Journey, Harry Potter and the Escape from Gringottes são os respectivos nomes originais.

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Foto: Heather Cuthill


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Fotos: Heather Cuthill


Em época de convergência, Potter fora do online seria coisa de trouxa Perdoem-me o trocadilho, mas é verdade! Quando o último filme estreiou nos cinemas em 2011, os fãs da série Harry Potter definiamse como órfãos. Órfãos, pois não teriam mais aquela expectativa de espera como “mãe” e nem o entusiasmo filme após filme como “pai”. Estavam desolados; talvez essa seja a palavra mais ideal. Eu estava desolado. Entretanto, como um banho de água fria, essa sensação viria a se transformar novamente em ansiedade devido ao anúncio da autora sobre algo novo que estava por vir para o dia 31 de Julho de 2011.

Canal do YouTube da autora com contagem regressiva para seu misterioso anúncio aos fãs e à imprensa. Imagem: J.K. Rowling | Youtube

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Se tem uma coisa que J.K. Rowling faz bem, além de escrever, é aguçar a mente curiosa de seus fãs através de mistérios. E o que representa esses fãs para a série Harry Potter senão a própria chave de seu sucesso. A autora soube reconhecer essa importância e contou com a ajuda desses para o anúncio desse seu novo projeto. Nove coordenadas foram entregues para nove diferentes fã-sites. E aqui damos conta novamente que Harry Potter é ,sim ,um fenômeno global, pois a ação não se limitou apenas ao território britânico, origem da série; tivemos participações de sites outras nacionalidades, inclusive do Brasil. Cultura Participativa e Inteligência Coletiva, se recordam? Através do secretstreetview.com, os fãs pesquisariam no mapa as coordenadas divulgadas pelos fãs-sites e assim chegariam a lugares distintos e relacionados, de algum modo, com a série Harry Potter. Em cada um desses locais encontravam uma letra. A ideia era a seguinte: conforme os pontos de localização fossem liberados, os fãs coletavam as letras que formariam o nome do novo projeto.

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Imagens: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.


A primeira coordenada foi liberada pelo fã site britânico The Leaky Cauldron e guiava os fãs ao Museu das Bruxas de Salem, pois o Instituto de Bruxas de Salem visitou a Copa Mundial de Quadribol, descrita no quarto livro da série. No local foi encontrado o primeiro caractere – a letra E. O frenesi para a descoberta das demais coordenadas tomou conta da internet. Os fãs queriam saber do que se tratava a novidade. Uma a uma as pistas iam sendo liberadas e desvendadas, até que chegaram ao anagrama E T O P T O E R R M. Havia nove letras e a décima foi liberada pela conta de Twitter oficial do projeto, o @Pottermore. O mistério, do nome, pelo menos, estava resolvido graça à comunidade Harry Potter.

Foto: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.

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O primeiro anúncio da autora sobre o Pottermore aconteceu no dia 23 de Junho e muitos discutiam sobre o que poderia ser - um novo livro, uma nova enciclopédia, um jogo. Rowling, no entanto, afirmou que esclareceria tudo no dia 31 de Julho, aniversário de Harry Potter (e não coincidentemente, seu também). Chegada a data, mistério revelado: o novo projeto era uma proposta de redescoberta da leitura de Harry Potter na internet, de maneira interativa, através de conteúdos inéditos disponibilizados pela própria autora, além de jogos e, claro, venda dos livros em formato impresso, digital e auditivo. Olá, Convergência dos Meios de Comunicação! Audacioso e atual! O primeiro milhão de acessos ao portal, no entanto, seria um privilégio. O site abriria globalmente apenas em outubro, e quem quisesse essa garantia de poder acessar o Pottermore antes de qualquer pessoa deveria passar por mais um desafio: The Magical Quill: durante sete dias, pistas e enigmas (uma sobre cada livro) seriam liberados pela autora e guiariam aqueles que os solucionassem para alguma página ou site da internet, onde deveriam encontrar a Magical Quill, uma pena mágica de Hogwarts que registra em um livro o nascimento de todas as crianças com o dom mágico em seu sangue. Assim, ano a ano, a professora McGonagall pode verificar esse livro e enviar as cartas de Hogwarts para as famílias dessas mesmas crianças, quando completavam 11 anos.

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Imagem: Universal Orlando Resorts


Cerca de 142 mil acessos foram liberados por dia e no final dos sete dias somaria o 1 milhão prometido. A primeira pista, por exemplo, foi liberada dia 31 de Julho – “Quantas raças de coruja aparecem na entrada do Empório das Corujas? Multiplique por 49”. O resultado guiava os usuários para o site da Sony nos EUA, onde achavam a pena mágica flutuando no meio de outras diferentes penas. Eu participei desse caça ao tesouro e me lembro de exatamente como a comunidade Harry Potter estava desesperada para garantir o acesso antecipado no Pottermore. Inclusive, além do meu, garanti o acesso para outras amigas, incluindo o da Sara, aquela minha amiga que me apresentou os livros.

“Parabéns! Você encontrou a Pena Mágica”, dizia a página inicial do Pottermore quando o usuário encontrava a pena que lhe dava acesso exclusivo a plataforma.

Imagem: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.

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O empreendimento foi uma parceria da autora com a Sony Computer Entertainment Inc. e se define como um “site único e de acesso gratuito, que proporciona uma excitante experiência virtual em torno da leitura do seu mais gigantesco sucesso, a série Harry Potter”. Ao se cadastrar, os usuários, conforme avançam na leitura dos livros, liberam conteúdos. Um dos mais importantes, que dão continuidade a experiência estão nos primeiros capítulos de a Pedra Filosofal, pois nesse livro o usuário poderá comprar sua varinha para treinar feitiços e poções em Hogwarts, porém antes, claro, sendo classificado para uma das quatro casas. Conforme são bem sucedidos em suas tarefas, os usuários acumulam pontos para suas casas respectivas casas e, assim como nos livros, no final do ano a que estiver com a maior pontuação ganha a Taça das Casas.

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Imagem: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.


Pottermore como ápice da narrativa transmídia em Harry Potter De todos as plataformas em que podemos encontrar Harry Potter além dos livros, o meio em que originalmente foi concebido, o Pottermore pode ser considerado o ápice da narrativa transmedia e aqui resgato algumas ideias defendidas por Jenkins e te explico o porquê. Em um texto intitulado Por que o Pottermore importa...8, Jenkins (2011) elenca três razões que explicam a importância e potência da plataforma para a série: 1) Pottermore como narrativa transmídia; 2) Pottermore como e-books e por fim 3) Pottermore como relações de fãs. Para não ficar muito extenso tão quanto Hagrid, o meio gigante de quase 3 metros e Guardião Das Chaves de Hogwarts, optei por explicalas sem separa-las metodologicamente. Jenkins traz à tona a ideia de que com o lançamento do último filme nos cinemas, os fãs da série desapareceriam. O que não é real (olha eu aqui!); mas o autor aponta que houve sim uma queda na visibilidade desses fãs; o último livro, embora lançado em 2007, conseguiu manter o folego para o bruxinho até 2011 que foi quando a segunda parte de Relíquias da Morte estreiou mundialmente. A verdade é que fandons são capazes de se perpetuarem por muitos anos, vide os fãs de Senhor dos Anéis e Star Wars. Jenkins afirma que é capaz de identificar projetos transmídia por meio de dois fatores: “forte intertextualidade (isto é, o complexo entrelaçamento de textos através da troca de informações relacionadas com a história) e multimodalidade (isto é, a mistura de diferentes mídias e seus sucessos em desdobrar a história)” e o Pottermore, para Jenkins, trabalha nesses dois níveis. 8 Tradução livre do autor - The Reasons Why Pottermore Matters

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O site trabalha com produção e conteúdo feito pela própria J.K. Rowling que são redescobertos juntamente com os “textos canônicos” (Ryan, 2012), ou seja, os livros, porém de maneira digital. Essa é a intertextualidade e a multimobilidade que Jenkins aponta, pois todos os textos e artigos lançados na plataforma comunicam-se com o universo de Harry, contabilizando, em média, 100 mil palavras, algo em torno do tamanho de um livro e podem ser acessados de diferentes maneiras, sendo algo muito além de um simples e-book. Para Jenkins, Rowling sabe que oferecer apenas os e-books não seja uma experiência alucinante, mas quando o fez de maneira interativa, tornou a aquisição do produto digital num processo participativo, que já nos leva ao terceiro item apontado pelo estudioso americano - a relação com os fãs e ela é responsiva; conforme os conteúdos eram desbloqueados no site, o mapeamento de consumo era realizado e quando foi observado um público diferente do imaginado, uma segunda fase para o projeto foi preparada e será logo mais abordada nesse livro. Em época de convergência, Potter fora do meio digital realmente seria coisa de trouxa e que bom que Rowling é bem esperta para não é uma.

Foto:J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.

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Foto: Warner Bros. Entertainment Inc. | Mary GrandPré© | J.K. Rowling©

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✳✳✳Como pudemos perceber, Harry Potter tornou-se mais que um livro. Ele não foi suficiente para desdobrar todo seu rico universo. Ou melhor, foi, seria ofensivo com J.K. Rowling afirmar isso. A verdade é que os livros tinham um potencial de expansão tão grande que esse fato permitiu sua disseminação em vários outros meios. Pudemos ler como Harry derrotou Voldemort, assistir a seu primeiro beijo, jogar quadribol em Hogwarts, assim como visitar pessoalmente Hogwarts e suas redondezas. Claro, sem mencionarmos os segredos descobertos com a releitura da série no Pottermore. E esse fenômeno que fãs da série presenciam e vivem é a narrativa transmídia que Jenkins nos apresenta em seu livro Cultura da Convergência (2011). Uma história que é contada em múltiplas plataformas e recorrente nesse momento de convergência que vivemos. Não podemos esquecer que um dos principais objetivos da narrativa transmídia é manter a audiência. A série Harry Potter nasceu em 1997 e já sobrevive há alguns anos graças aos seus fãs. Mas o que o futuro reserva para a série? Como manter essa audiência? A terceira e última parte desse livro abordará um pouco dessa perspectiva de futuro, já que para os próximos já se planejam filmes baseados no universo de Harry Potter e até mesmo uma peça de teatro. 129


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Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.


O Espelho de Ojesed Apresentado em Harry Potter e a Pedra Filosofal, o Espelho de Ojesed é um artefato mágico capaz de refletir aquilo que mais desejamos em nossos corações, tornando-se assim um aparato muito perigoso por misturar realidade com traços de ilusão. Harry Potter, quando encarou o espelho pela primeira vez aos 11 anos, viu os pais ainda vivos parados ao seu lado, diferente do melhor amigo, Rony, que se enxergou jogador do time de quadribol de Hogwarts. Originado de um anagrama, Ojesed quando lido de trás pra frente forma a palavra desejo, o que já explica de maneira tola seu funcionamento. E se hoje, não o menino Harry Potter, mas a série, a marca se posicionasse em frente ao espelho, o que ela veria? Eu arriscaria dizer que o seu desejo hoje é se garantir nos próximos anos, ser lembrada, e a narrativa transmídia, com certeza, terá papel fundamental nesse processo.

Ilustração: Nesskain | Deviantart

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Henry Jenkins (2011) afirma que uma boa narrativa transmídia é aquela que consegue alterar um pouco o tom de seu conteúdo conforme a mídia que se encontra, com o objetivo de ampliar o alcance de seu público e que se houver material suficiente para cada tipo de consumidor – aquele que gosta de assistir, de ler, de jogar – “é possível contar com um mercado de intersecção que irá expandir o potencial de toda franquia”. Quando Rowling autorizou que sua criação se expandisse em vários meios, de diferentes maneiras e imersões, ela estava proporcionando exatamente o que Jenkins afirmou em seu livro: experimentações diferentes para públicos diferentes, mas juntos forneciam uma vivência completa e que continuará em processo nos próximos anos. Harry Potter é uma série que trabalha em cima da narrativa transmídia, mas ainda é cedo para afirmar que ela a usa em toda sua potencialidade; aliás, nem o próprio Jenkins (2011) é tão otimista ao afirmar que “poucas (ou nenhuma) franquia alcançam todo potencial estético da narrativa transmídia – ainda”. A tendência de um universo que se desenvolve em cima desse fenômeno, como afirma Marie-Laure Ryan (2013) é a expansão. O Wonderbook: Book of Spells é um exemplo prático desse processo, pois da citação de um nome no primeiro livro da série desenvolveu-se um produto presente na narrativa e totalmente original. Para a estudiosa, expansão do universo dentro da narrativa transmídia tem valor semântico, ou seja, de sentido; é preciso que o consumidor faça a ligação entre os diferentes portais de acesso ao universo de Rowling.

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Quando questionada se Rowling pretende escrever algum novo livro sobre Harry Potter, a autora dá voltas na resposta, afirmando que não pretende, já que a história dos sete livros está completa, mas que dizer “nunca” escreveria um novo livro sobre Harry Potter seria algo que ela não afirmaria com toda certeza. Em entrevista para a famosa apresentadora norte-americana (2010), Oprah Winfrey, a autora afirmou que poderia escrever um oitavo, nono ou até um décimo livro sobre a série, mas que no momento os sete já publicados são suficientes. Embora não tenha pretensões para novos livros, não significa que ela não tenha ideias de expansão da série em outros meios.

Foto: Harpo Productions Inc.

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A mágica do bem Aqui vou fazer uma leve viagem entre universos criativos apenas para emprestar uma famosa frase de Homem-Aranha de 1962, escrita por Stan Lee – “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”. Para o contexto desse livro, eu a parafrasearia da seguinte maneira: “com grandes sucessos vêm grandes responsabilidades”. J.K. Rowling escreveu, paralelamente a série Harry Potter, três outras obras que estão dentro do universo mágico do menino bruxo e que são citadas em determinados momentos da narrativa e as publicou em formato de livro com diferentes pseudônimos. Além de funcionarem como outro ponto de acesso à série Harry Potter dentro de sua narrativa transmídia, a renda de suas publicações foi totalmente revertida para instituições de caridade. Lançados em 2001, Quadribol Através dos Séculos por Kennilworthy Whisp e Animais Fantásticos e Onde Encontrá-los por Newt Scamander são publicações completamente distintas em suas abordagens, mas ligadas àquele universo de Rowling. O primeiro, como sugere o nome, conta um pouco da história do jogo bruxo desde sua criação, explicando suas principais regras, além de curiosidades. O segundo é uma enciclopédia que cataloga alguns dos animais existentes no mundo bruxo. Alguns deles estão presentes nos filmes, como o cão de três cabeças, o hipogrifo, a acromântura, dementadores, lobisomens, dentre outros. As arrecadações resultantes das vendas desses dois livros, na época, ultrapassaram os 17 milhões de libras, montante doado a Comic Relief, uma instituição britânica de caridade que usa do riso para combater a miséria. As edições foram republicadas em 2009 e, a cada venda que a editora Bloomsbury realiza, gera uma doação de £ 1,15 para a caridade. 135


A terceira obra, Os Contos de Beedle – O Bardo, desempenha papel muito importante dentro da narrativa de Harry Potter e as Relíquias da Morte e foi lançado pela autora, primeiramente em 2007, como uma versão limitada em 7 exemplares, todos escritos e ilustrados à mão pela própria autora. Um deles, que foi para leilão, foi vendido por mais de um milhão de dólares. Em 2008, o livro foi publicado para o público em geral e seus rendimentos foram para a Children’s High Level Group (que posteriormente mudou o nome para Lumos), que tem por objetivo “acabar com a institucionalização sistemática das crianças em toda a Europa procurando colocá-las em ambientes seguros e que lhes dê carinho”, como afirma o próprio site de Rowling.

Fotos: Divulgação | Amazon.com

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Animais Fantásticos e Onde Habitam Bom, foi preciso falar das três publicações anteriores, pois além delas comporem o universo transmídia da série, uma delas possibilitará a expansão do universo Harry Potter novamente para os cinemas. Foram confirmados para os próximos anos três filmes de Animais Fantásticos e Onde Habitam e que terão roteiro assinado pela própria autora, J.K Rowling. Tratando-se de um livro sem enredo narrativo, apenas catalogação de espécies mágicas, os fãs da série podem aguardar por uma história completamente inédita. Das poucas informações já liberadas até a o momento, sabe-se que a história se passará em Nova York, setenta anos antes do nascimento de Harry Potter; será que o cinema chama de prequelas ou spin off, uma história que acontece dentro de um universo já conhecido, mas em tempos diferentes e com novos personagens. Ryan (2013) utiliza dos estudos de Carlos Scolari para exemplificar os diferentes gêneros de expansões dentro de um universo narrativo. Animais Fantásticos e Onde Habitam funciona como narrativa de interstício, já que ela expande “o período abarcado pelo documento original”. A ideia é a produção de uma trilogia, que se confirmará caso o primeiro filme faça sucesso, e isso dependerá exclusivamente do conteúdo que será oferecido aos consumidores, ou melhor, como ele será distribuído. Jenkins (2011) afirma que em “a convergência das mídias torna inevitável o fluxo de conteúdo pelas múltiplas plataformas de mídia” e que o público sempre espera “por novos insights e novas experiências”. Obras redundantes, diluídas e com contradições grosseiras são falhas que o autor aponta como razões para que sequências e franquias tenham uma má reputação e com certeza, tratando-se de um negócio que já lhe garantiu milhões de dólares, a Warner Bros terá cuidado especial com esse spin off de Harry Potter. 137


O roteiro já foi finalizado por Rowling, e o projeto traz de volta nomes importantes do universo Harry Potter para a nova empreitada cinematográfica, como David Yates, diretor dos últimos quatro filmes da franquia e David Heyman, produtor desde o primeiro filme e praticamente o responsável por levar a história de Rowling às telas de cinema. Tratando-se de um projeto recente, os rumores e confirmações ainda podem surpreender os fãs. O importante é ressaltar que o universo de Harry Potter, nos próximos anos, estará mais vivo e movimentado desde o lançamento de Relíquias da Morte – parte 2 em 2011.

Exemplos da Cultura Participativa: sem muitas informações divulgadas, os fãs já começam a produzir conteúdo em cima do material oficial de J.K. Rowling.

Imagens: HogwartSite | Deviantart

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Para os palcos de teatro Em dezembro de 2013, J.K. Rowling publicou em sua página oficial do Facebook que estaria colaborando com os renomados produtores

britânicos

de

teatro

Sonia

Friedman e Colin Callende na produção de uma peça de teatro baseado na série Harry Potter. Em 2015, pouco mais de um ano de seu anúncio oficial e no dia em que a publicação de Harry Potter e a Pedra Filosofal completou dezoito anos, Rowling postou em sua conta de Twitter que a peça se chamará “Harry Potter e a Criança Amaldiçoada9” e não será uma prequela, como será Animais Fantásticos e Onde Habitam, ou seja, será uma parte da história que já conhecemos através dos filmes e livros, mas que ainda não foi contada. Mais um portal de acesso à série, agora pelos palcos.

9 Tradução livre do autor - The Cursed Child

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A segunda fase do Pottermore No dia 22 de setembro de 2015 foi ao ar a segunda fase da plataforma online destinada a série, o Pottermore. A reformulação, além de visual, aconteceu na própria mecânica do site. Em entrevista ao The Bookseller, empresa britânica voltada à venda de livros e editoria, a diretora executiva, Susan Jurevics, e a diretora de produto, criação e conteúdo, Anna Rafferty, ambas funcionárias do Pottemore, declararam que o principal motivo da transformação do projeto se deu pela mudança do público alvo.

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Foto: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.


Pensado primeiramente como uma plataforma destinada para crianças que leriam a série pela primeira vez, o funcionamento do site foi desenvolvido em torno delas, simples, com coletas de itens e pequenos jogos. No entanto, percebeu-se que o público da plataforma era composto mais por adultos e meninas. Os conteúdos serão mais facilmente encontrados e armazenados numa espécie de enciclopédia. Para Jurevics, “o Pottermore vai se transformar em um verdadeiro centro de informação — e será o coração autêntico.” Abaixo, o texto de Rowling, que anunciou a nova fase do projeto.

Bem vindos ao Pottermore 10 por J.K. Rowling Este é o meu cantinho mágico da internet. Um lugar onde você pode explorar os meus textos, ambos os que você já conhece e os novos, e onde você pode ler informações, artigos e novidades pela equipe do Pottermore. Novas informações serão reveladas sobre os personagens, lugares e a mágica que você está familiarizado, bem como apresentações para alguns novos personagens, lugares e conceitos. O Pottermore é um lugar onde você pode soltar a sua imaginação e permitir que ela te leve em aventuras; então, se você precisa de um pouco mais de magia na sua vida, você veio ao lugar certo.

10 Transcrição em português brasileiro: Amanda Mendes | Revisão: Pedro Martins, equipe Potterish

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Logo após o lançamento do Pottermore em 2011, o presidente e CEO da Starlight Entertainment (empresa de distribuição digital de conteúdos), Jeff Gomez, declarou (Forbes, 2011) que Rowling seria responsiva aos comentários de seus fãs e usuários da plataforma; a mudança da dinâmica do site nesse momento é um exemplo claro das falas de Gomez. O novo Pottermore, além de artigos inéditos sobre a série, trata notícias sobre o spin-off Animais Fantásticos e onde Habitam, além da peça de teatro, A Criança Amaldiçoada.

Tratamos nesse livro como transmedia storytelling desde os livros dando origem aos filmes, games, parques e claro, ao Pottermore. Para Gomez, a narrativa transmídia se define como uma técnica crescente em Hollywood que permite o desenvolvimento robusto dos universos narrativos através de múltiplas plataformas de mídia. Nada muito diferente do que vimos até aqui, não é mesmo? A diferença é que ele considera os filmes, games e parques como uma história recontada em outros meios, o que não deixa de ser uma narrativa transmídia. O diferencial que é contemplado aqui é que o Pottemore verdadeiramente traz a marca Harry Potter como um transmedia. Ele completa afirmando que a “transmedia é marcada pela interatividade11”, não apenas numa relação de público-autora, pois isso já existe, mas na sensação que essa interatividade poderá causar algum impacto no universo narrativo da história. Ele concorda com Jenkins ao afirmar que o site não é apenas para vender e-books, mas para expandir o universo original da série Harry Potter. E isso é fascinante.

11 Tradução livre do autor.

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E já que falamos de Jenkins novamente, multimobilidade é

um ponto importante para o teórico quando o assunto é transmídia. Percebemos que não falta intertextualidade dentro do Pottermore, mas quando ele foi projetado, a multimobilidade foi um pouco esquecida. Nessa segunda fase, todo o conteúdo e estrutura da plataforma foram pensados para serem acessados através de dispositivos móveis, como tablets e smartphones, o que representa para o meio um grande avanço no quesito acessibilidade. Agora podemos perceber um pouco mais claramente o porquê do Pottermore ser o ápice da narrativa transmídia na série. E isso tudo é magia como diz o título desse livro? Bom, a resposta tem seus dois lados: não, afinal, não se pode realizar magia fora de Hogwarts.

Foto: J.K. Rowling | Pottermor Ltd.TM Warner Bros.

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E a viagem do Expresso Hogwarts continua... A nossa viagem pelo universo de J.K Rowling e por seu universo está chegando ao fim. Pudemos perceber como que um despretensioso romance tornou-se um ousado e bem sucedido projeto de comunicação, disseminando, adaptando e expandindo seu universo para muitos meios completamente distintos um do outro e com potenciais próprios utilizados a favor de contar a história de Harry Potter. Se Rowling foi capaz de criar um mundo inteiramente mágico, tão cheio de magia podemos dizer foi esse processo de transmídia da série nessa era de convergência. Vamos agarrar novamente nossos vira-tempos e fazer uma breve volta ao começo desse livro para que compreendamos perfeitamente o que é a narrativa transmídia na era da convergência. Convergência, eis nosso primeiro fenômeno: processo tido por Jenkins (2011) como cultural – acontece na mente nas pessoas – e não tecnológico. Os diversos meios midiáticos juntamente com a distribuição dos conteúdos nesses meios convergem às mãos dos consumidores, que agora interagem, participam e modificam esse conteúdo. Por essa razão, Jenkins sustenta essa Cultura de Convergência em: 1) Convergência dos meios de comunicações, processo tecnológico - uma plataforma que engloba vários outros meios. 2) Inteligência Coletiva,

participação dos fãs

em um “trabalho de perícia” na busca de informações para o direcionamento na narrativa e 3) Cultura Participativa, em que o indivíduo produz em cima do universo narrativo, como as famosas ficções de fã. 145


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Como produto dessa Cultura de Convergência (veja bem, da Cultura de Convergência e não da convergência dos meios) temse a narrativa transmídia. Porque ela é resultado desse fenômeno? Por se tratar de uma técnica de distribuição de conteúdos dentre diferentes plataformas, de modo que esses conteúdos constituem um mesmo universo e que o acesso a ele fique nas mãos do consumidor. Logo, temos Harry Potter concebido como livro e depois lançado nos cinemas, games, parques e o ápice da sua transmídia, o Pottermore. São meios completamente distintos de acesso ao universo criado por J.K. Rowling, mas que cada qual, de maneira autossuficiente, imerge o indivíduo no mundo mágico de Harry, abrindo a ele a possibilidade de consumo dos demais conteúdos em outros meios, resultado numa experimentação máxima desse universo. Para a comunicação, o transmedia storytelling é um das estratégias utilizadas para manter a audiência e, como podemos observar, o futuro para o universo Harry Potter é promissor, com três novos filmes programados para os próximos anos, uma peça de teatro, e uma nova fase em sua plataforma digital. Com tantos empreendimentos, pode-se esperar que a marca Harry Potter divida-se com mais potencialidade entre diversos outros meios e mídias; com as novas mídias digitais associadas às tradicionais, as possibilidades de “magia” são infinitas. O trem já está chegando em seu destino final e assim como ele faz inúmeras viagens para levar os alunos de Hogwarts ano a ano ao castelo, não pense que nossa viagem acaba aqui. Se J.K. Rowling afirma que seu universo tem potencial para outras produções, esse livro também deverá sempre refazer essa viagem e eu espero que você também me acompanhe nas próximas.

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Imagem: Warner Bros Entertainment Inc.



Nox!

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Referências ANDRADE, Eluanda Almeida. O Fabuloso Destino de Amélie Poulain em cores, luz e sombra. 2013. 107f. Trabalho de Conclusão de Curso – UNITAU, Taubaté. A CONVERSATION BETWEEN JK ROWLING AND DANIEL RADCLIFFE. Warner Bros. Entertainment Inc. 53’03’’ . 2013. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=7BdVHWz1DPU>.

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BARBOSA, Daniela. 15 anos de Harry Potter e a mágica de criar um negócio de US$20 bilhões. Revista Exame: São Paulo. 2012. Disponível

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