Revista CUCO - português

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A poética dos começos

Revista

Ano 1 No 1 2014

Edição Mario de Ballentti Design Gráfico Libretos/Clô Barcellos

Gardia Vargas

Revisão Press Revisão

A Revista Cuco – a linguagem dos bebês no teatro é fruto de uma ideia sobre as crianças, sobre as experiências que podemos proporcionar a elas e sobre os encontros entre profissionais e conhecimentos distintos. Queremos, com esta publicação, compartilhar das marcas que constituíram a construção de um espetáculo para crianças bem pequenas. Os diálogos que aqui são realizados demonstram o imenso potencial do encontro entre a arte e a pedagogia e nos convidam a entrar nos mistérios do universo dos bebês para descobrir com eles a poética dos começos e da primeira vez. Vida longa ao espetáculo... vida longa aos pequenos que chegam na cena humana!

Sumário 4 Caixa do Elefante Centro Cultural de Projetos e Pesquisas

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Rua Comendador Azevedo, 445/02 Bairro Floresta Porto Alegre/RS CEP 90220-150

Um espetáculo guiado pelo olhar dos bebês

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CNPJ 08.316.467.0001-57

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Nasce o espetáculo para bebês

Os bebês no teatro Uma experiência sensível a crianças e adultos

Os bebês e o tempo de suas experiências

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A poética do espetáculo é motivada por uma das primeiras experiências lúdicas e estéticas dos bebês, o jogo entre o “esconder e o revelar”.

O espetáculo nasceu como nasce um bebê: curioso para descobrir os mistérios do mundo. Sua poética é motivada por uma das primeiras experiências lúdicas e estéticas das crianças bem pequenas, brincar entre o esconder e o revelar, propondo um universo em que a surpresa do começo, da chegada, da primeira vez, transforma a manipulação de objetos do cotidiano em pequenas histórias.

Fabrício Simões

A atmosfera espetacular do Cuco propõe que as fronteiras do tempo, das formas e dos sentidos se intercambiem entre o real e o imaginável, entre o possível e o inacreditável. Por isso, o espaço criado para acolher as crianças não só é configurado como um ambiente de cuidado e conforto, mas também de acolhimento das fantasias e surpresas que esta brincadeira ficcional de criar e dar sentidos sobre o mundo faz emergir na chegada dos bebês ao seu primeiro teatro. Para os bebês, as crianças e os adultos que vivenciam esta experiência, o ritmo do espetáculo gera a possibilidade de colecionar sensações, imagens e narrativas fantásticas. Desta ma-

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Fabrício Simões

uagem dos bebê ro g n eat s i t n o l a

Nasce o espetáculo para bebês


neira, acreditamos que isso possa se converter em uma rica forma de conhecer o mundo.

Paulo Fochi

Para a Caixa do Elefante – teatro de bonecos, este espetáculo configura-se como um meio de se aproximar das linguagens dos bebês, de reconhecer as suas ações e formas singulares que utilizam para participar e usar a cultura da qual fazem parte. O teatro que estamos realizando propõe um diálogo com a linguagem dos bebês, colocando-os como protagonistas e centro do processo de criação, mesmo quando, na condição de espectadores junto a seus pais, atuam como foco desta experiência estética e cultural.

Marcas e impressões de grandes espectadores “Cuco, espetáculo para bebês, é surpreendente, original, estimulante e delicado. São dois espetáculos ao mesmo tempo: o que acontece no centro da roda, com as atrizes, música e adereços, e o que acontece na plateia, pelas sensações das crianças e seus pais, encantados diante do que se desenrola. Mais um grande espetáculo da Cia Caixa do Elefante e um presentão para as crianças bem pequenas. O teatro, as crianças e nós, que trabalhamos pelas crianças, comemoramos e agradecemos.”

Fabrício Simões

Gabriel Junqueira Filho Dr. em Educação, professor na UFRGS “CUCO, teatro para bebês? Mas do que se trata? Bebês? Teatro? Mas eles nem sequer falam! Não param quietos, nem entendem bem a nossa língua! Acompanhar esse evento é uma experiência ímpar, é lidar com um fascínio que oscila entre se encantar com a proposta e suas possibilidades de dar visibilidade às descobertas dos bebês de maneira criativa e profunda e, ao mesmo tempo, se deleitar com a fruição dos atores. Mas o que encanta mesmo é o brilho nos olhos dos espectadores: crianças e pais, avós. Adultos e pequenos envolvidos numa só linguagem... Parabéns, Mário e Paulo e toda a equipe.”

“É interessante perceber como os adultos, pais, avós, dindos e dindas, manifestam também nos seus olhares e gestos uma perplexidade frente ao protagonismo de seus filhotes e de sua postura de plateia teatral (e eles não têm mais do que dois anos...).”

Marita M. Redin, Dra. em Educação, professora na Unisinos

Maria da Graça Souza Horn, Dra. em Educação e escritora

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p e s t á e c u l o m guiado U Gardia Vargas

Mário de Ballentti

A montagem do Cuco vem em resposta a uma dívida de anos que o teatro para infância tem com as crianças pequenas e com os bebês

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Durante a temporada de O Cavaleiro da Mão de Fogo a presença dos pais com crianças de colo na plateia sempre me causou um certo incômodo. Sabia que o espetáculo de marionetes de fios e sombras muitas vezes assustava os mais pequenos já na abertura, ao escurecer a sala com os acordes musicais. Não havia nada de errado com a premiada trilha sonora ou com os bonecos, mas, sim, uma falta de atenção especial a este público iniciante de teatro. Percebia que a montagem não conversava com os bebês e me sentia traindo esta plateia que, não raras vezes, saía chorando do teatro por falta de conhecimento dos pais e insensibilidade da produção, preocupada em sempre atender ao maior número de público, sem observar as especificidades de cada faixa etária. A montagem do Cuco – a linguagem dos bebês no teatro vem em resposta a uma dívida de anos que o teatro para a infância tem com as crianças pequenas e com os bebês. Um trabalho que se iniciou há mais de dois anos, quando começamos a formar uma equipe que se propusesse a parar e refletir sobre uma nova produção teatral para o público infantil. Para formação deste grupo de trabalho, procurei me cercar de profissionais que estivessem comprometidos até a raiz dos cabelos com a linguagem da criança. Conheci Margarida Rache, responsável pela cenografia e adereços, há muitos anos. Fomos sócios de uma Escolinha de Arte em Rio Grande, quando saíamos do curso de Arte Educação da FURG. Nossa


FABRÍCIO SIMÕES

Paulo Fochi

s ê b e b s o d r a h pelo ol

Viajamos para Itália e Espanha para assistir aos espetáculos voltados para bebês e visitar as escolas de educação infantil referenciais na Europa

experiência com ateliê infantil acompanhava os ventos das Escolinhas de Arte do Brasil, movimento político e cultural muito importante para introdução das artes no currículo escolar. Para composição da trilha sonora, Marcelo Delacroix emprestou sua larga experiência e sensibilidade como músico e professor de música para criança. E não podia faltar um iluminador fotógrafo: Fabrício Simões, para pensar uma luz acolhedora para este espaço de brincadeira. Mas antes de toda esta turma, a companhia do pedagogo Paulo Fochi foi a figura mais importante para a elaboração deste trabalho. Viajamos para Itália e Espanha para assistir aos espetáculos voltados para bebês e visitar as escolas de educação infantil de Barcelona e Réggio Emilia, referenciais na Europa. Sua larga experiência e conhecimento na pesquisa acerca dos bebês e das crianças pequenas nos asseguraram a realização de um trabalho sério e responsável. Para atuar neste espaço, contei com a parceria de duas profissionais dedicadas: Ana Luiza Bergmann, atriz (UFRGS/DAD) com estágio no Théâtre du Soleil com Ariane Mnouchkine, em Paris, e Bruna Baliari, atriz e psicóloga (PUCRS), mestre em Saúde e Bem-Estar Comunitário (UAB), especializada em teatro físico (Lecoq) na Escola Internacional de Teatro Berty Tovías (Barcelona). Enfim, este mix de gente grande, curiosa como as crianças, resultou neste espetáculo que agora, depois do parecer de inúmeros bebês de várias creches e escolas de educação infantil, trazemos ao também exigente e respeitoso público de teatro para sua apreciação. Abraço fraterno do diretor!

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Os bebês no teatro Uma experiência sensível a crianças e adultos Paulo Sergio Fochi * A experiência que compartilho é resultado de um percurso de pesquisa para a concepção de um espetáculo para bebês que participei, em parceria com a Cia. Caixa do Elefante, de Porto Alegre, que foi batizado com o nome de Cuco: a linguagem dos bebês no teatro. Esta experiência artística, nascida para aproximar bebês e crianças pequenas com as formas comunicativas da linguagem teatral, traz, no cerne da sua pesquisa, a investigação das possíveis relações dessas crianças com a linguagem

Fabrício Simões

teatral como parte de seu processo de comunicação e relação com o mundo. A poética do espetáculo é motivada por aquela que parece ser uma das primeiras expe­ riên­cias lúdicas e estéticas dos bebês, o jogo entre o “esconder e o revelar”, o cuco, um universo em que a surpresa do começo, da chegada, da primeira vez, transforma a manipulação de objetos do cotidiano em pequenas histórias que acontecem no acolhimento de uma cama acolchoada:

lugar que abriga fantasias e sonhos para uma criança colecionar. A palavra neste espetáculo é guardada, não porque se duvide que os bebês não consigam compreender, mas pela crença de que a criança se comunica por diversas linguagens, por cem, diria Malaguzzi. São variadas as formas como os bebês entram em interação e, por isso, compõem a complexa gramática que significa adentrar na produção de um espetáculo para crianças pequenas. Assim, esse projeto é cheio de perguntas com pouquíssimas respostas, e se configura em uma experiência de “dar e receber”, a qual exige dos atores que abram mão de suas certezas para criar novos horizontes. Ao longo da primeira temporada do espetáculo, percebeu-se que os bebês se comunicam com os atores de outra forma, ou seja, com os olhos, com as mãos, com o silêncio, com expressões, enfim, com o corpo todo. Então, para tê-los por perto, descobriu-se a necessidade de apren-

* Mestre em Educação

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der a fazer as narrativas também desta forma. Por isso que o grupo, a cada espetáculo, cria uma espécie de “estudo de caso”, a fim de decifrar códigos que até então pareciam indecifráveis: tempo, ritmo, quantidade de narrativas, som, cores, luz, formato do teatro, tudo para poder adentrar e criar a atmosfera teatral para os pequenos. A pesquisa sobre a linguagem que deve ser construída para a especificidade dessa faixa etária também pode travar importantes debates sobre a linguagem da atuação que é feita para crianças de outras idades, que, muitas vezes, traz estereótipos sobre a infância e sobre as crianças de modo caricato, mas, ao contrário, podendo revelar uma atitude de atenção do ator, reivindicando um estado de concentração e percepção sobre essa experiência com as crianças. A ida dos bebês ao teatro também chama a atenção, porque a função desse espectador bebê é substituída por uma função de “participante” em relação aos artistas e à peça e, nesse exercício de participação da criança, os adultos acabam se tornando outro tipo de espectador, aquele que assiste, mas que também inclui, na obra, as “atuações” dos bebês. Portanto, o papel dos adultos é fundamental para o engajamento da criança no contexto artístico. Costumo dizer que existe algo muito interessante no teatro que é feito para bebês, pois convida o adulto a compartilhar dessa experiência, ou seja, a função realizada pelo adulto tem, a princípio, consequências importantes, pois a forma com que o adulto se comporta durante a peça permite às crianças viverem experiências distintas.

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Dou como exemplo alguns momentos que percebia os pais preocupados com o silêncio dos filhos, em que tentavam então antecipar cenas, fazendo sons e gestos para “animar” os bebês. Estamos muito acostumados a receber produtos ditos culturais para as crianças que são, em sua grande maioria, minimizados, explicativos e recreativos. Em consequência disso, temos como a “boa resposta” as crianças pularem, baterem palmas, e repetirem em coro as palavras que os adultos esperam ouvir. Tão presente é isso que os momentos que as crianças se encontravam naquilo que, atualmente, parece ser o ato mais complexo e difícil de experimentar, o da contemplação, muitos pais faziam gestos apontando, balançando, ou verbalizando “incentivos” para os bebês darem as respostas já convencionadas. Um olhar atencioso logo percebe que o bebê se faz público de um modo muito peculiar, sua resposta ao espetáculo é distinta, acontece com beijos, com frases que produzem uma espécie de “narrativa” das ações das atrizes, com sorrisos, com silêncio, e com diferentes posturas corporais, nas quais, muitas vezes, parecem espelhar as posições que são feitas em cena. E dessa experiência dos bebês no teatro, também podemos tirar proveito para aprender a observá-los, experimentando outros modos de narrar a eles sobre o seu entorno, sobre o mundo. Diferentemente do que se possa imaginar, os bebês são capazes de assistir a um espetáculo tranquilo, sem apelos estereotipados, sem pala-


A poética do espetáculo é motivada pelo jogo entre o “esconder e o revelar”

vras, e que dura mais de trinta minutos. Neste espetáculo em especial, ao final, os bebês começam a compor a cena e experimentar os elementos do próprio cenário, participando da obra. O que antes era palco para as atrizes vira palco aos bebês, e talvez essa seja uma outra forma de experimentar o teatro, no qual seja lícita a experiência não só de observar, mas também de manipular e atuar com os materiais antes assistidos. Na verdade, fazer teatro para crianças envolve uma intensa qualidade de envolvimento humano e é, certamente, uma tentativa de superar as barreiras da idade e de estabelecer um contato consciente com “um público que, talvez, tenha menos convenções do que os outros, porque dificilmente aplaude ou ri, quando deve, mas que é capaz de surpreender com seu silêncio inesperado e improvisar tantos beijos que nos são presenteados” (FRABETTI; MANFERRARI, 2006, p. 94). Sobretudo, o que faz deste espetáculo enveredar para um campo onde o sensível, o belo, e o respeito à criança sejam a pauta do processo artístico, sem dúvida, é fruto da imagem de criança e, neste caso, especificamente de bebês, que esse coletivo comunga. E a imagem que compactua­ mos é aquela do bebê capaz, de um bebê que, desde que chega à cena humana, comunica-se e

relaciona-se com os contextos que participa, de um bebê capaz de compreender – e, neste caso, não nos interessa saber em que grau de consciência – o seu entorno. É importante sublinhar que a dimensão deste projeto foi alcançada graças ao contexto já apresentado neste artigo. O que de antemão fica evidente é a percepção de uma criança não abreviada, uma prática que observa, na própria criança, a sua especificidade, reforçando a crença de que, desde muito pequenas, as crianças são moldadas pela experiência, mas também dão forma a ela. Espera-se, por fim, estar compartilhando com educadores, com pedagogos, com pesquisadores, com artistas e com pais caminhos que são considerados instigantes e que provocam, diariamente, a reflexão sobre o papel do professor de educação infantil, reflexão essa que suscita um estranhamento interno e conduz à desnaturalização do cotidiano que, comumente, é oferecido aos bebês.

Referências FRABETTI, R.; MANFERRARI, M. Um alfabeto di 21 lettere: Appunti da um percorso tra il nido e il teatro. Bolonha: Pendragon, 2006. MALAGUZZI, L. Histórias ideias e filosofia básica. IN: EDWARDS, Carolyn; GANDINI, Lella; FORMAN, George. As cem linguagens da criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.

Mais informações

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Fabrício Simões

Os bebês e o tempo Vivemos hoje uma relação intensa do tempo das nossas experiências, com a sensação de que cada minuto exige uma decisão e promete alguma forma de satisfação. Essa necessidade de retornos imediatos acaba por nos tornar dependentes das experiências intensas e breves e da busca pelo instantâneo, tornando o homem contemporâneo tão imerso na temporalidade dos relógios de máxima precisão que já não parece possível outra forma de viver que não seja com pressa.

Mas o quanto desta nossa ansiedade cabe passar aos nossos bebês? Quando assisti pela primeira vez ao Cuco, juntamente com duas turmas de bebês da escola Baby House, tivemos todos, adultos e crianças, uma experiência direta com a temporalidade, com a possibilidade da observação, duração, sensação e experimentação. Sem nada dizer, sem nada sugerir, sem nada prever, ficamos ali nos

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permitindo vivenciar junto com os bebês aquela experiência de corporeidade e de novidade. No tempo do consumo, no Ocidente e agora também no Oriente, são escassas as oca­ siões que nos permitem outras formas de vivenciar os ritmos do corpo e as emoções que surgem das experiências vividas. Sentimos a falta do tempo do compreender, a partir do qual pode emergir o desejo de conhecer, experimentar, tocar, ouvir. O Cuco oferece aos bebês, de forma muito sensível e elaborada, essa experiência de uma outra temporalidade, de repetição, de silêncio, de espaço para que algo surja. O que surge não é palpável, pois as experiências não são mensuráveis e nem possíveis de serem captadas em toda sua essência, mas precisam ser vividas pelos bebês como uma outra possibilidade de uso do tempo. Para além de qualquer ordem arranjada, a criança consegue transcender e subverter a ordem do tempo linear: na imaginação, na reinvenção do brincar, no jogo de subjetivação e subjetividade que ela


de suas experiências Gardia Vargas*

constrói ao imprimir um outro olhar para além da ordem estabelecida que, mesmo se tratando de bebês, nada mais é do que uma ordem da disciplina e da norma. Ela faz isso porque ainda é capaz de denunciar que o rei está nu, de fugir ao sempre igual, de se desviar do traçado. Poderíamos atentar para o que os bebês narram e fazem, propondo-nos a modificar a lógica que vimos praticando com eles. Os pais, professores, mídia e sociedade em geral pouco acreditam na potência dos bebês e, devido a isso, estão sempre propondo, intervindo, fazendo por eles, falando por eles e até pensando por eles, em gestos que se antecipam às suas ações e “atropelam” suas formas de desvendar o mundo. Dar tempo aos bebês, sem antecipações ou interrupções desnecessárias, significa saber esperá-los ali, onde se encontram em sua forma de conhecer o mundo e aprender. A relação do tempo com as experiências vividas dos bebês é fator fundamental a ser observado, pois o tempo * Dra. em Educação

perpassa as ações e organizações de vida que oferecemos a eles. Estamos nós, adultos, dedicando aos bebês e às crianças a tributação injusta do tempo, do devir mensurável e numerável, um tempo objetivado, fragmentado e manipulável do qual nascem o relógio, as horas e a sincronização coletiva. Nessa forma de compreensão da temporalidade, a duração das experiências é fugaz e nem sempre respeita as subjetividades e os desejos que devem mover a curiosidade pelo novo, pela descoberta. O que reclamam os bebês, quando observamos suas experiências, é um outro tempo, da experiência interior, o tempo subjetivo, a forma individual que cada um de nós tem de viver um tempo aparentemente igual. O que poderia pontuar como importante sobre o tempo e os bebês em suas experiências de primeira vez, de recém-chegados ao mundo, é que não podemos partir do tempo cronológico – próprio dos adultos para compreender e acolher essas experiências. Precisamos atentar na pers-

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“Ontem choveu no futuro”, nos diz o poeta Manoel de Barros. O paradoxo do poeta possibilita perceber a inversão das coisas, os seus desvios. Convida a ver o que talvez não víssemos habitualmente, buscando desestabilizar as nossas crenças e inventar o impossível. É desse lugar que precisa-

mos pensar os bebês e as crianças bem pequenas. O Cuco oferece essa oportunidade para os adultos: deixar surgir a emoção silenciosa que experimenta e acolhe o inesperado, o imprevisível junto dos bebês. Precisamos, pois, interromper nosso desejo de saber e poder, deixando de querer definir o que serão ou o que farão os bebês e passando a viver o encontro com eles, permitindo que sejam o que são. O que o Cuco propõe é que se viva a complexidade do/no cotidiano, na diversidade e riqueza que nos apresentam os bebês.

Aproveite o espetáculo Algumas dicas para você experienciar um momento singular com seu bebê:

Durante o espetáculo, não será permitido fotografar. Aproveite para curtir com o bebê. O celular também não será necessário. Mantenha-o desligado. Na sala de espetáculo, não entre com bebida ou comida. Se durante o espetáculo o bebê manifestar alguma indisposição, leve-o para fora da sala e aguarde ele ficar bem. Aproveite bem o espetáculo. Essa pode ser uma grande experiência para estar junto com seu bebê.

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pectiva de um tempo, próprio das crianças, um tempo que permite observar, imaginar, decidir e agir. Se não tivermos a necessidade de sempre estarmos propondo e direcionando as decisões e ações dos bebês e das crianças, poderemos, quem sabe, pensar em outras maneiras de experienciar a temporalidade junto deles.




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