Farmacia caseira

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SEMANA DE MUSEUS 2017 Volume II


Notas da coordenadora: 1) Das plantas medicinais muito se tem falado, escrito e receitado. Milhares de plantas foram utilizadas pelas populações, em formas de chá, ungüentos, cataplasmas, pós, tinturas, xaropes, óleos, garrafadas, emplastros, ao longo dos séculos; 2) Gestores públicos, associações e particulares preocupam-se em divulgar que, apesar do conhecimento em plantas medicinais, ainda ignoramos muito dos benefícios e perigos; 3) A Comissão Setorial Municipal de Arquivo e Patrimônio está realizando um trabalho de registro de PATRIMÔNIO IMATERIAL E DE CONHECIMENTOS POPULARES NO USO DE ERVAS MEDICINAIS. As versões (Volume I e II) não pretendem competir – em hipótese alguma – com publicações científicas e indicações farmacológicas. A FARMACIA CASEIRA – USOS E COSTUMES POPULARES – registra o uso popular (nem sempre preciso na indicação nem da denominação das plantas).

A Fundação Cultural “Benedicto Siqueira e Silva” não se responsabiliza pelas indicações das plantas medicinais, usos, costumes e benzimentos. O trabalho não é científico e refere-se, apenas e unicamente, a relatos orais de moradores. NOTA: os relatos de “uso, costumes, benzimentos e indicações das diversas plantas medicinais” foram registrados por Maria Aparecida Fonseca Ribeiro (membro da Comissão Setorial de Arquivo e Patrimônio) e obtidos em conversas informais. São registros de patrimônio imaterial dos costumes populares de moradores de vários bairros do município de Paraibuna/SP.

Maio 2017 Diagramação: Ana Prado


PLANTAS MEDICINAIS Um pouco da historia “... O uso de plantas como medicamento é provavelmente tão antigo quanto o aparecimento do próprio homem. A preocupação com a cura de doenças sempre se fez presente ao longo da história da humanidade. Bem antes do surgimento da escrita, o homem já utilizava ervas para fins alimentares e medicinais. Buscando as espécies vegetais mais apropriadas para sua alimentação ou para cura de seus males, nossos ancestrais foram descobrindo as que serviam para se alimentar, se medicar, as que eram venenosas e as que causavam efeitos alucinógenos. Um tratado médico datado de 3.700 a C., escrito pelo imperador chinês Shen Wung, é um dos mais antigos documentos conhecidos sobre as propriedades medicinais das plantas. Os egípcios, 1.500 a.C. já utilizavam ervas aromáticas na medicina, na culinária e, principalmente, em suas técnicas para embalsamar os mortos. Os sumérios da Mesopotâmia possuíam receitas valiosas que só eram conhecidas por sábios e feiticeiros. Na Índia, aproximadamente no ano 1.000 a. C., o uso de ervas era bastante difundido. Durante a Idade Média, o cultivo das ervas utilizadas como alimentos, bebidas e remédios, ficou a cargo dos monges que as plantavam ao redor dos mosteiros e igrejas...” (1) (1)Fonte: GASPAR, Lúcia. Plantas medicinais. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/ pesquisaescolar/>. Acesso em: 16/04/2017.

PRESTE BASTANTE ATENÇÃO! Todos os tratamentos naturais, por mais que pareçam inofensivos, podem ser bastante perigosos. Portanto, o melhor a se fazer é consultar um especialista e conversar sobre a possibilidade de investir nos remédios da natureza. Deixe claro todo seu histórico médico e fale sobre a planta que lhe chamou atenção. O médico indicará as doses corretas durante o tratamento.


INDICE DOS ASSUNTOS

PÁGINAS

Conversa com Dª Izaltina ............................................ João Batista Toledo ..................................................... Irmã Maria Inácia Leite ................................................ Benzimentos – Orações – Registro de Bens Culturais. Edilce Joana dos Santos Nogueira .............................

4, 5 e 6 7e8 9 e 10 12 e 13 14, 15 e 16

INDICE PLANTAS MEDICINAIS/ BENZIMENTOS/ORAÇÕES Alecrim ........................................................................ Alfavaca ...................................................................... Alfavaca-anis .............................................................. Alfavacão .................................................................... Alfazema ..................................................................... Almeirão ...................................................................... Arnica .......................................................................... Arruda ......................................................................... Assa-peixe .................................................................. Babosa ....................................................................... Bálsamo ..................................................................... Bicarbonato de sódio ................................................. Boldo-da-china ........................................................... Boldo-de-arvore-necroton .......................................... Brotos de goiabeira .................................................... Cânfora ...................................................................... Cará-moela ................................................................ Caruru ........................................................................ Erva-cidreira .............................................................. Erva-de-bicho ............................................................ Erva-de-Santa-Maria .................................................

4e7 7 e 10 7 4 4 7 10 5e7 10 5 5e7 10 7 10 7 5 8 5 8 8 10


Fortuna ...................................................................... Hortelã ......................................................................... Hortelã gorda (hortelã-do-norte) .................................. Insulina vegetal ............................................................ Limão ........................................................................... Manjericão ................................................................... Manjerona .................................................................... Marcelinha ................................................................... Ora-pro-nobis ............................................................... Picão ............................................................................ Poejo ............................................................................ Quebra-pedra ............................................................... Sálvia ............................................................................ Sordinha ....................................................................... Tansagem (tanchagem) ................................................ Terramicina ...................................................................

5 5 e 10 5 10 8 5e8 5 11 11 11 8 5e8 5 5 5e8 5

Garrafadas .................................................................... 6 Benzimento: para acalmar ........................................... 13 Benzimento: contra doenças do................................... 14 Benzimento: cortar íngua ............................................ 15 Benzimento: crianças com vermes .............................. 15 Benzimento: cura do ar ................................................ 14 Benzimento: curar verrugas ......................................... 16 Benzimento: fechamento de corpo ............................... 15 Benzimento: quebranto ................................................ 6 e 15 Benzimento: torcicolo-torcida no pé ............................. 15 Orações: São Bento-Confiança-Agradecimento ........... 16 Xarope ........................................................................... 8


CONVERSA COM Dª IZAL TIN A IZALTIN TINA Em Paraibuna é costume muito popular a indicação de plantas medicinais por moradores antigos da região e por outros que aprenderam com as famílias (de fora do município) a lidar com plantas caseiras que nascem naturalmente nas hortas ou são plantadas para tal finalidade.

IzaltIna Cardoso da sIlva sIlva, 76 anos, 12 filhos, 16 netos e 9 bisnetos. Simples, sábia e cativante, além das ervas medicinais, possui canteiros de couve, cebolinha, diversos tipos de temperos e plantas. Também gosta de flores e as cultiva em vasos, canteiros, bacias, qualquer tipo de vasilha. Recebida em sua casa simples, limpinha e chão de “caquinhos” organizados, tivemos uma ótima conversa. Nascida no Bairro Morro Azul aprendeu com a mãe a lidar com as plantas medicinais. Ensinou que os chás são fervidos juntos com as plantas e devem ser tomados frios e sem açúcar (exceção ao alfavacão). Para os olhos é infusão em água fria. • Alecrim: usado como tônico cardíaco. Também serve para condimentar carnes e peixes e fazer tempero com alho e sal. • Alfavaca: contra hepatite e males do fígado. Usar três colheres de alfavaca em um copo d’água. Esfriar e tomar. • Alfavacão: contra a tosse fazer chá e adoçar. Tomar frio. • Alfazema: chá indicado para “juntar leite” em mães lactantes. Também serve para evitar gases nos bebês.

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• Arruda: contra problemas nos olhos (quando olhos ficam vermelhos). Colocar de molho em água fria por, mais ou menos, meiahora. Lavar os olhos. Igual procedimento com as pétalas de rosa branca. • Babosa: cortar a folha e colocar a “baba” sobre as feridas (provoca ardência). • Bálsamo: usada contra dores de estômago (bater com leite e folha de couve). • Cânfora: para dores no estômago e musculares. Usar em chá. • Fortuna: as folhas são usadas para curar feridas e “puxar pus” dos tumores/abcessos. Dar uma “amassada” na folha e colocar sobre o local ferido. • Hortelã: em chá para acalmar. • Hortelã gorda (hortelã do norte): fazer chá contra azia e queimação (ou mascar a folha). Ainda pode ser usada para tempero em carnes vermelhas. Devido ao sabor intenso deve-se tomar cuidado com a quantidade. • Manjericão: além de ser usado como antibiótico (chá) podese juntar ao sal e alho, socar e fazer um ótimo tempero (muito aromático). Manjer ona • Manjerona ona: para uso como condimento (em carnes). Quebra-pedra: contra problemas nos rins. Juntar à caninha• do-brejo e ferver. Deixar esfriar. Beber o dia todo. Repetir se necessário. • Sálvia: usar chá para dores no estômago e cólicas estomacais. • Sordinha: chá contra infecções. • Tansagem: contra infecções. • Terramicina: usado (chá) como antibiótico em dores na garganta.

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As “garrafadas” são outra especialidade dessa senhora calma e tranqüila que, além de ensinar, as prepara a quem se interessar. Indicadas para colocar em “cortados”, mancha roxa, picada de insetos (abelhas) e dores em geral. Adicionar em álcool, por dois meses, as seguintes plantas (um punhado de cada): confrei, alecrim, terramicina, tansagem, piracá, arnica, manjericão. As plantas não devem estar úmidas. Dª Izaltina, além das habilidades com as plantas medicinais, ministra benzimentos (benzimento da brasa). Aprendeu com a “comadre Maria” e, sempre que pedem, aplica em crianças e adultos para cura de doenças, inveja, mau-olhado, “quebranto” e susto. Para fazer tal benzimento há de se ter um fogão a lenha: Pegar um carvão em brasa e colocar em um copo d’água. Com outra brasa faz o sinal da cruz e invoca Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora das Graças e Nossa Senhora dos Prazeres. Depois, nova brasa para São Benedito “tirar as doenças, inveja, mau-olhado, quebranto e susto”. Por último, mais uma brasa invocando o Divino Espírito Santo para tirar tudo que a criança (ou adulto) tenha de ruim...”lavai com o sangue de Cristo...”. Faz-se o sinal da cruz na testa da criança ou adulto. Após as invocações a criança (ou adulto) deve ingerir três colheres da água do benzimento. Após esse ritual, abrir torneira de água corrente e jogar a água do copo (em cruz), pedindo para levar ao mar. Dª Izaltina acrescenta que, se o carvão afundar no copo de água, a criança ou adulto deverá voltar para fazer novo benzimento até que o carvão fique na boca do copo. Reforça que esse benzimento é indicado para criança com “bicha” (vermes), mau-olhado, inveja, “zoio gordo”.

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JoÃo BatIsta tolEdo

Dono de uma portentosa voz de radialista, aposentado, 68 anos, reagiu com timidez ao ser questionado sobre o uso de ervas medicinais. Aos poucos, foi “se soltando” e contou que é aposentado, trabalhou muito na vida e, sem “letra nenhuma” (alega ser analfabeto), trabalhou com muita responsabilidade e coordenou pessoal na Pousada da Cesp. É católico fervoroso e gosta de rezar o “terço da misericórdia” às segundas-feiras no cemitério (vai de túmulo em túmulo com um grupo de 20 a 30 pessoas). Também visita todos os dias o Lar Vicentino de Idosos para as mesmas preces. Teima em tocar gaita (comprou o instrumento em Aparecida) e está tentando aprender sozinho. Em seu pequeno terreno tem inúmeras plantas medicinais e convencionais das quais foi “desfiando” as utilidades:  Alecrim: em chá para “abrandar” sinusite.  Alfavaca: em chá contra dores na garganta e para colocar em carnes.  Alfavaca-anis: contra bronquite.  Almeirão: ótimo em saladas (se cozinhar “perde” as vitaminas.  Arruda: banhos para feridas nas nádegas de crianças e adultos e “chá de quarentena” para tirar a “ruindade” durante a dieta (após o parto).  Bálsamo (folhas): usar contra gastrite e dores de estômago. Mascar a folha ou amassar (usar com água, se preferir).  Boldo-da-china: contra dores estomacais (se comer algo que faz mal).  Brotos de goiabeira: usar em chá quando a barriga está “meio mole” (diarréia).

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 Cará-moela: comer cozido ou assado. É um depurativo.  Caruru: plantinha cheia de vitamina. Comer “abafado” ou em salada.  Erva-cidreira: para pessoas nervosas.  Erva-de-bicho: contra hemorróidas. Fazer banho de assento ou amassar bem e passar enquanto durar o desconforto.  Limão: contra gripes e resfriados misturar ao café (!) ou tomar o suco.  Manjericão: em chá contra resfriados. Ótimo tempero para peixes assados e cozidos.  Poejo: em chá contra a gripe e descongestionante das vias respiratórias.  Quebra-pedra: indicada como chá na cura de pedra nos rins.  Tansagem (tanchagem): usar as folhas em salada. Em chá é indicado contra gripe.  Xarope contra tosse persistente: limão cortado em fatias, folhas de anis, gengibre cortado, folhas de laranjeira do céu, erva-cidreira e alecrim. Ferver bem, colocar açúcar, “curar” e fazer o xarope.

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IrMÃ MarIa InÁCIa lEItE, 77 anos, nasceu em Lajinha/MG e entrou na Ordem de São Vicente de Paulo em 1965. Andou por esse “Brasilzão a fora” em missões: já morou em Petrópolis e Bom Jardim (RJ), em Colatina (ES); esteve em Chapadão do Sul (MS); do Rio de Janeiro foi para Rondônia (Rio Crespo próximo a Ariquemes). Voltou para o Rio e, há três anos, vive em Paraibuna. Desenvolveu gosto pelas plantas medicinais desde os doze anos. Encontrou, um dia, a Sra Valdeci reclamando da tosse constante dos filhos pequenos e ensinou chá com diversas plantas que cessaria o desconforto: levante, cambará, flor de mamão macho, alfavaca, poejo, assa-peixe e arnica. Acertou em cheio! No uso de ervas medicinais também seguiu exemplo de casa: o avô tratava-se com homeopatia e a mãe e a tia se valiam dos benefícios proporcionados pelas plantas. É massoterapeuta tendo feito o curso em Valença/RJ (não atua mais). Percorremos a horta com lindos canteiros de alface, pomar com belos pés de caqui, poncã, mexirica, tangerina cravo e inúmeras plantas medicinais pelo milharal (acompanhadas pelo Sr Nardo que conhece bem as plantas). A nossa conversa transcorreu tranquilamente misturando ervas medicinais, temperos e receitas, além de experimentarmos diversas frutas durante a caminhada na horta.

Fez as seguintes sugestões:  Alfavaca: indicada contra tosses. Vai bem para temperar carnes e/ou legumes (principalmente chuchu e abobrinha).  Arnica: em chá contra gripes e resfriados.  Assa-peixe:  Contra gripe fazer chá das folhas.

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 Aplicar em cortes: lavar com sabão, amassar bem as folhas e colocar sal no sumo que se formar. Aplicar no local do corte (é antiinflamatório natural).  Para temperar peixes: usar somente os brotos e cortar bem fininho.  Bicarbonato de sódio contra caspa e seborreia: misturar uma colher de chá no caldo de um limão espremido (se o limão for grande usar apenas a metade) e adicionar a um litro de água. Após lavar os cabelos, enxaguar e aplicar a mistura obtida. Manter, sem lavar, até o dia seguinte. Aplicar mais vezes se for necessário.  Boldo-de-árvore (necroton ou boldo baiano): contra má digestão e sensação de “empachamento” (empanzinamento).  Erva-de-santa-maria:  Contra vermes e contra gripes indica o chá das folhas;  Usar sobre os ferimentos (os resultantes de pancadas). Amassar bem e colocar sobre o local afetado;  Doenças respiratórias: lavar bem a planta e reservar. Colocar um punhado da planta em uma caneca e adicionar água ou leite fervendo. Coar e tomar.  Hortelã: contra vermes.  Insulina vegetal (também conhecida como diabetil, tinta-dosgentios, uva-brava, uva-do-mato): contra glicose alta.  Marcelinha:  Contra dores de cabeça (chá);  Colocar no álcool: indicado contra dores (artrose).  Ora-pro-nobis: cortar bem fininho e fazer omeletes. Refogar antes de colocar no angu ... rola bem!!!! É muito nutritivo além de saboroso.  Picão: usa-se contra a hepatite. ADVERTÊNCIAS: - todo chá serve somente por 24 horas; - sempre procurar um médico antes de automedicar-se

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BENZIMENTOS E ORAÇÕES O Decreto n°3.551/2000 instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, criando o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial, viabilizando a efetiva proteção administrativa dos bens culturais intangíveis que se relacionam à identidade e a ação de grupos sociais. Patrimônio cultural imaterial é uma concepção que abrange as expressões culturais e as tradições que um grupo de indivíduos preserva em homenagem à sua ancestralidade, para as gerações futuras. São exemplos de patrimônio imaterial: os saberes, os modos de fazer, as formas de expressão, celebrações, as festas e danças populares, lendas, músicas, costumes e outras tradições. O procedimento adotado para o registro de bens culturais em livros se assemelha ao processo de tombamento, nos chamados Livros de Registro, mas não produz os efeitos restritivos que são próprios daquele. A proteção que o registro é capaz de oferecer se expressa mediante o reconhecimento da existência e valor de determinada manifestação cultural. Registrar documentalmente a existência da manifestação cultural é ato protetivo na medida em que constitui prova capaz de dar suporte a ações que visem a impedir posterior utilização indevida dos conhecimentos e práticas envolvidos na manifestação cultural. A Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, aprovada pela Unesco em 17 de outubro de 2003, assim define patrimônio cultural imaterial: “ Entende-se por ‘patrimônio cultural imaterial’ as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares que lhe são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural. Este patrimônio cultural imaterial, que se transmite de geração em geração, é constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.” (UNESCO, 2006).

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Desde tempos imemoriais a humanidade cercou-se dos mais diversos ritos e crenças: da adoração ao sol e outras forças da natureza, a sacrifícios de animais para acalmar os “espíritos” ou invocar saúde e prosperidade. Os costumes fortes e arraigados nas comunidades durante a idade média, ocultos durante os períodos de perseguição, ainda alimentam as crenças num PODER MAIOR! ... nem mesmo a modernidade e a intensa globalização destruíram as práticas transmitidas por gerações... Não existem, atualmente, tantas ocorrências de “benzimentos”, “orações por intenção de...”, mas é como se as atividades estivessem “descansando” para florescer em algum momento. Os ritos seculares fortalecem nossas crenças e ajudam a nos situar nesse universo tão controvertido. Os conhecimentos populares transmitem-se através dos tempos! As brasas da FÉ, da CONFIANÇA, da CRENÇA estão presentes na mente humana prontas para vir à tona no melhor momento!

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EdIlCE Joana dos santos noguEIra noguEIra, 63 anos, tem 11 filhos (três naturais e 8 “do coração”), 17 netos e 3 bisnetos. É natural de Ibitiara/BA e mora, há 40 anos, em área rural de Paraibuna. Gosta da roça “por causa da tranqüilidade e paz de espírito, da conversa com Deus a olho nu, do poder plantar e preservar a vida natural”. Aprendeu com a avó índia, com os pais e por vontade própria. Tem conhecimento de benzimentos e rezas para muitas finalidades. Também faz “garrafada” – para uso externo - conforme os pedidos e doenças. Sente que tem o “dom”. Atuou como parteira desde os 14 anos. É uma mulher guerreira, crente nas forças do BEM e hábil na interpretação das dificuldades das pessoas que se aproximam em busca de algum conforto aos seus anseios ou cura de seus males. É direta na resposta quando percebe intenções fugidias ou se esmera na busca do alívio e confortos esperados. Os conhecimentos em ervas medicinais, suas propriedades e benefícios, são de grande valia no momento dos “benzimentos” pois sugere, conforme as necessidades, o uso dessa ou daquela planta. Acredita no poder da cura, no bem a ser feito ao próximo e na recuperação física, mental e espiritual do ser humano. Acredita que pessoas como ela têm o DOM e o receberam para fazer o BEM. Em uma conversa introspectiva e singular, Edilce revelou as intervenções e indicações possíveis para os diversos males ou expectativas:

PARA ACALMAR Colocar a pessoa sentada e de olhos fechados para relaxar. Unir o pensamento com Deus e “deixar acontecer” que será curada. Recitar a Oração ao Divino Espírito Santo “Vinde Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do Vosso Amor. Enviai o Vosso Espírito e tudo será criado e renovareis a face da terra. Oremos: Ó Deus que instruíste os corações dos vossos fiéis com a luz do Espírito Santo, fazei que apreciemos retamente todas as coisas segundo o mesmo Espírito e gozemos da sua consolação. Por Cristo Senhor Nosso. Amém” Se for preciso faz-se a imposição de mãos e faz-se o gesto de “expulsar” o que está atrapalhando.

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CURA DO “AR” Esta situação ocorre quando a pessoa toma algo muito quente e sai no vento frio ou toma chuva. Pode acontecer quando alguém termina de comer e olha no espelho. Acontece, também, quando há reflexo no vidro do carro (sol bate e, repentinamente, reflete no rosto). Outra situação que pode acontecer: a pessoa toma banho quente e se resfria repentinamente ou toma “golpe de ar”. Tratamento indicado: toma-se um pano branco (limpo e sem uso) e dobra-se em quadrado. Enche-se um vidro com água deixando-o destampado. Colocase o pano sobre a “moleira” da pessoa sentada debruçando o vidro sobre o pano. Reza-se a oração “Salve Rainha” sinalizando em forma de triângulo e fazendo o sinal da cruz em cada ponta do triângulo (através da ponta livre entrará o ar sadio).

CONTRA DOENÇAS DO CÂNCER, FALTA DE TRABALHO, DECISÃO JUDICIAL E INIQUIDADES DENTRO DE CASA: Oração a São Pelegrino - “Glorioso Santo que, obedecendo à voz da graça, renunciastes generosamente às vaidades do mundo para dedicar-vos ao serviço de Deus, de Maria Santíssima e da salvação das almas, fazei que nós, também desprezando os falsos prazeres da terra, imitemos o vosso espírito de penitência e mortificação. São Pelegrino, afastai de nós a terrível enfermidade, preservai-nos a todos nós deste mal, com vossa valiosa proteção. São Pelegrino, livrai-nos do câncer do corpo e ajudai-nos a vencer o pecado, que é o câncer de alma. São Pelegrino socorra-nos pelos méritos de Jesus Cristo Senhor Nosso. Assim seja”.

PARA CRIANÇAS COM VERMES Fazer chá de hortelã ou pacová (uma semente moída) em 1/2 copo de água. Amornar e reservar. Escreve-se o nome da criança num papel branco dobrando “de comprido”. Em outro papel (mesmo formato e tamanho) escreve-se “Divino Espírito Santo”. Por último, um papel com os nomes das três pessoas da Santíssima Trindade. Colocar o papel com o nome da criança no fundo de uma xícara (por dentro). Sobre o nome da criança coloca-se o papel com os nomes das três pessoas da Santíssima Trindade (na diagonal). Sobre os dois papeis colocar o escrito “Divino Espírito Santo”. Verter o chá reservado sobre os papeis depositados no fundo da xícara e, sobre eles, imediatamente, três brasas acesas. Coloca-se a mão sobre a criança e recita-se: “Eu te curo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Se for “bicha” (verme) se torne em água e do Divino Espírito Santo venha a virtude”. Após a oração a criança deverá tomar algumas colheres do chá adoçado.

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“FECHAMENTO DE CORPO” Tirar os sapatos e tudo o que estiver amarrado ao corpo. Relaxar e, com as palmas da mão voltadas para cima, fazer o sinal da cruz recitando a oração: “a Cruz de Cristo que eu trago sobre mim quem nela morreu responde por mim”. Terminar a oração com as mãos apoiadas nos ombros.

“FECHAMENTO DE CORPO” (oração poderosa) “Em nome do poder do Pai, do amor do Filho e a sabedoria do Espírito Santo eu entrego a Jesus, à sua Santíssima Cruz e ao Santíssimo Sacramento e as relíquias que tem dentro e as três missas do Natal para que nada desse mundo nem do outro me possa fazer mal. Virgem Maria esteja comigo, Anjo da Guarda me guarde e me livre das astúcias do satanás. Assim seja”.

“CORTAR” ÍNGUA Colocar a pessoa sentada e pedir que levante uma das pernas com o pé descalço. Passar o tição em forma de cruz na sola do pé. Enquanto assim procede deve-se soprar três vezes falando: “Pai, Filho e Espírito Santo, íngua, inguá, sai do tutano e vai para o osso. Sai do osso e vem para a carne. Sai da carne e vem para a pele. Sai da pele e vai para o fundo do mar... com o poder de Deus e do Espírito Santo”. Cuidados: após o benzimento a pessoa não poderá colocar o pé no chão frio e nem ficar descalço.

CONTRA “QUEBRANTE” (QUEBRANTO) Colocar um copo de água (tampado com gaze, pano fino limpo ou peneirinha fina) para “pousar no sereno”. Na manhã seguinte, escrever o nome da criança em um papel e colocar no fundo (por dentro) de um prato de vidro. Colocar três folhas de arruda sobre o nome da criança. Pegar o copo de água “serenada” e derramar sobre o prato. Pingar cinco gotas de óleo ou azeite sobre a água vertida. Observar que se forma uma bolha. Se “espatifar” (separar-se em bolhas) é porque a criança está com “quebrante”. Em seguida, toma-se as três folhas de arruda, molha-se na água do prato e respinga em cruz sobre a criança, recitando: “Tua mãe te teve, dois te atraíram, eu com três TE RETIRO”

PARA TORCICOLO OU TORCIDA NO PÉ Colocar a pessoa sentada, relaxada. Toma-se o pé que tem o problema e recitase: “Tutano ferido, carne esmagada, nervo torto, eu costuro em nome de São Frutuoso”. Recita-se três vezes aplicando pressão na planta do pé.

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CURAR VERRUGAS Parar perto de um pé de guanxuma (guanxima). De costas para a planta, passar a mão (naquelas que têm os botõezinhos de flor), de baixo para cima e esfregar o que pegou no “nada” (o nome da “tal” não pode ser citado).Recita-se: “você fica ai que volto já”. Nunca mais passar no local!

ORAÇÃO A SÃO BENTO: (manter a oração junto ao corpo ou rezar nos momentos de dificuldade) “Que a Cruz Sagrada seja a minha luz, que não seja o dragão o meu guia! Retira-te, satanás, nunca me ofereça coisas em vão. Se é mal que tu queres me oferecer beba tu mesmo o teu veneno. Em nome de Jesus. Amém”.

ORACÃO DA CONFIANÇA: “Confio em Deus com toda a minha força porisso peço a Deus que ilumine os meus caminhos concedendo-me aquela graça (... dizer a graça) que eu tanto desejo. Amem”.

ORAÇÃO DE AGRADECIMENTO: “Pelos meus braços perfeitos, quando há tantos mutilados, obrigado Senhor. Pelos meus olhos perfeitos, quando há tantos sem luz, obrigado Senhor. Pela minha voz que canta, quando há tantas que são mudas, obrigado Senhor. Pelas minhas mãos que trabalham, quando há tantas que mendigam, obrigado Senhor. É maravilhoso, Senhor, ter um lar para voltar, quando há tantos que não têm onde ir, obrigado Senhor. Sorrir, quando tantos choram, obrigado Senhor. Amar, quando há tantos que odeiam, obrigado Senhor. Sonhar, quando há tantas pessoas que se revolvem em pesadelos, obrigado Senhor. Viver, quando há tantos que morrem antes de nascer, obrigado Senhor. Sobretudo ter pouco a pedir e tanto a agradecer. Muito obrigado Senhor!” A ORAÇÃO DEPENDE MUITO DA FÉ... NO QUE A PESSOA ACREDITA! DEVE-SE TER FÉ PARA SER CURADO! Nota: todas as rezas, benzimentos e orações são patrimônio imaterial de um povo, da comunidade de uma região e não têm conotação política nem fazem parte de quaisquer seitas.


IzaltIna Cardoso da sIlva sIlva, 76 anos, 12 filhos, 16 netos e 9 bisnetos. Nascida no Bairro Morro Azul aprendeu com a mãe a lidar com as plantas medicinais. Ensinou que os chás são fervidos juntos com as plantas e devem ser tomados frios e sem açúcar (exceção ao alfavacão). Para os olhos é infusão em água fria.

JoÃo BatIsta tolEdo tolEdo, dono de uma portentosa voz de radialista, aposentado, 68 anos. Em seu pequeno terreno tem inúmeras plantas medicinais e convencionais das quais foi “desfiando” as utilidades.

IrMÃ MarIa InÁCIa lEItE, 77 anos, nasceu em Lajinha/MG e entrou na Ordem de São Vicente de Paulo em 1965. Desenvolveu gosto pelas plantas medicinais desde os doze anos. É massoterapeuta tendo feito o curso em Valença/RJ (não atua mais).

EdIlCE Joana dos santos noguEIra, 63 anos, tem 11 filhos (três naturais e 8 “do coração”), 17 netos e 3 bisnetos. Aprendeu com a avó índia, com os pais e por vontade própria. Tem conhecimento de benzimentos e rezas para muitas finalidades. Também faz “garrafada” – para uso externo - conforme os pedidos e doenças. Atuou como parteira desde os 14 anos.



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