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ImprEssão
BELo HorIzontE, outuBro dE 2014
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Da Lama ao Caos comemora 20 anos em 2014, o primeiro álbum da nação Zumbi continua a encantar MARiAnA guAlbeRtO
Mariana Gualberto “Emergência! Um choque rápido ou Recife morre de infarto!”. O trecho faz parte do manifesto Caranguejos com Cérebro, percursor do movimento Manguebeat, uma autêntica antena parabólica enfiada na lama do mangue de Recife, para conectar as boas vibrações do regional com o mundo. O texto, escrito em 1992 pelo músico pernambucano Fred Zero Quatro, da banda Mundo Livre S/A, desnudou a realidade, mostrou problemas e passou por três ideias de mangue: o conceito, a cidade e a cena. Clamou, ainda, pela desobstrução das artérias bloqueadas de Recife, para que o sangue voltasse a circular por suas veias. Vários mangueboys e manguegirls se identificaram, e a descarga inicial de energia na lama foi dada: emergiu dali uma cena cultural carregada de vitalidade e raízes. Em 1994, Chico Science & Nação Zumbi – uma das bandas com forte ligação ao manifesto do mangue –, lançou o emblemático álbum Da Lama ao Caos, ícone do movimento Manguebeat. Com 14 faixas que transpiram Recife, exalam o mangue e apresentam críticas sociais em suas letras, o disco se tornou um marco, conquistando fãs, mesmo após 20 anos, em meio “a rios, pontes e overdrives”. A ferida da desigualdade social, de “sempre uns com mais e outros com menos”, é a temática central do dis-
nação Zumbi agita o público no festival natura Musical
co, trabalhada em forma de poesia e musicalidade marcante, que mistura sons e gêneros, dando a luz a algo único. Talvez pela singularidade do projeto, associada ao fato de tratar de um assunto que continua a assolar brasileiros de todos os cantos, de dentro e de fora do mangue, Da Lama ao Caos conta com reconhecimento
crítico tão positivo, e suas canções ainda façam multidões pularem nos shows. “Viva, Zapata! Viva, Sandino! Viva, Zumbi! Antônio Conselheiro, todos os Panteras Negras! Lampião, sua imagem e semelhança. Eu tenho certeza, eles também cantaram um dia”. Chico Science nos deixou em 1997, após um acidente automobilístico em Pernambuco. Desde então, a banda atende simplesmente por Nação Zumbi. Mas, nos palcos, os integrantes permanecem presenteando os fãs com canções escritas na era de Science, com toda a efervescência social típica daquele começo marcante. “E com o bucho mais cheio, comecei a pensar que, eu me organizando, posso desorganizar. Da lama ao caos, do caos à lama, um homem roubado nunca se engana”.
Hits do mangue No dia 14 de setembro deste ano, Nação Zumbi se apresentou em BH, durante a quarta edição do Festival Natura Musical. A banda pernambucana, sob o comando vocal de Jorge du Peixe, valorizou o passado e apresentou um repertório que percorreu diversas fases do grupo. Começando por sucessos do último disco de estúdio, lançado em 2014, foi feita uma linha do tempo decrescente no palco. Os fãs se deliciaram com sucessos dos álbuns Nação Zumbi (2014), Fome de Tudo (2007), Futura (2005), Nação Zumbi (2002), Rádio S.Amb.A. (2000), CSZN (1998), Afrociberdélia (1996) e Da Lama ao Caos (1994). O fervor do público crescia conforme a banda se aproximava de seus sucessos nos anos 1990. Os pulos e o canto em coro da plateia se faziam uniformes em hits como A Cidade e Maracatu Atômico. Já as canções do álbum Nação Zumbi (2014), encantavam de forma mais sucinta. As pessoas mantinham-se vidradas, apreciando as letras – sempre muito bem construídas –, ainda pouco memorizadas. Eram poucas as vozes que acompanhavam Jorge Du Peixe em Um Sonho e Cicatriz.