Além de Dois

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Belo Horizonte, Junho DE 2015

Dossiê Prazer

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Além de dois Casa de swing acolhe os mais variados fetiches e desperta a curiosidade de muitos fotos: isabelle boaventura

Mariana Gualberto Primeira quarta-feira do mês, antes do quinto dia útil, e, numa avenida discreta na região da Pampulha, a noite promete ser agitada. Às 22h30, um número considerável de carros – em sua grande maioria, modelos populares – já ocupava as imediações do recinto, cujas portas haviam sido abertas apenas 30 minutos antes. A fachada da casa de swing é bem discreta, sem letreiros luminosos que possam remeter ao tipo de entretenimento ali firmado. Apenas uma longa parede cor creme e dois seguranças conferem as bolsas das mulheres e revistam os homens, procedimento comum em toda casa noturna. Já do lado de dentro, o visitante passa pela chapelaria, onde, se desejar, pode deixar os pertences. É nessa hora, também, que as comandas de consumo são entregues, em três tipos: feminina (R$ 22,50), casal (R$ 45) e homem sozinho (R$ 250). Comandas à mão, apenas uma larga e preta porta separa o visitante das atrações. Mais um par de seguranças surge do outro lado da porta, a observar, com atenção, o que acontece naquela

área. O primeiro espaço conta com uma grande boate, um scotch bar, um palco e uma cabine de DJ. Tudo muito semelhante às casas noturnas convencionais; a única diferença são os dois pole dances que compõem a decoração – um no palco e outro na pista de dança. O flyer do dia promete shows com strippers masculino e feminino, além da apresentação de uma banda pouco conhecida. Ao lado da cabine do DJ, uma escada leva a certa área mais reservada, com inúmeras mesas, outro scotch bar, uma entrada com atendente e três cortinas negras, que escondem outros ambientes. A área da recepcionista refere-se ao “território” dos quartos privativos: os casais que almejam privacidade podem pagar, à parte, por

um ambiente individual. Já as cortinas têm placas de identificação, onde se pode ler: cinema erótico, labirinto e sala erótica. Até por volta da meia noite, o ambiente se assemelha às boates convencionais, com muitos casais espalhados pelas diversas áreas. Bastante conversa, drinks, cervejas e danças. Cerca de 70 pessoas curtem a noite; homens trajando camisas polo, calças jeans e tênis, enquanto as mulheres, sem exceção, do alto de seus imponentes saltos, usam vestidos curtos que, de tão justos, chegam a confundir-se com a própria pele. Alguns poucos casais estão ali, notoriamente, pela primeira vez. Espiam todas as cortinas, cochicham, dão voltas sem largar as mãos e observam

Os shows de striptease são o que faltava para a desinibição dos frequentadores da casa. Poucos minutos depois da saída do policial, por volta das 2h, as pessoas começam a desaparecer da boate

muito. Outros são frequentadores assíduos da casa: chegam, cumprimentam os outros e batem papo com todos os funcionários do recinto, além de transitar com segurança e imponência por todos os cantos. Esses, aliás, andam em grupos. Na casa de swing, também existem os nichos – sendo que o daqueles é, certamente, o dos “populares”. Homens e mulheres em igual número tomam conta dos cantos por onde passam. Eles riem alto, brindam aos desejos, dançam e se beijam, trocando, a cada enlace, de par amoroso. Respeito é valor que impera ali. Fica claro que a interação entre os casais ocorre apenas entre aqueles que já se conhecem. Nunca há abordagens constrangedoras ou invasivas; nem mesmo o toque ou o verbo são usados de forma impositiva. Naquela casa, todos são livres e estão seguros em seu próprio espaço (essa talvez seja a diferença mais gritante se olharmos as boates convencionais). Após o show da banda contratada, o DJ anuncia que, em instantes, começará o striptease feminino. Nessa hora, o grupo dos populares está próximo a um dos pole dances e propõe que


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uma das meninas do círculo suba no “queijo”. A morena de corpo esguio, cabelos longos e vestido curto acata ao clamor dos amigos. Ela sabe o que está fazendo... Com total domínio da arte, a mulher roda, desce e sobe pelo mastro, em apresentação digna de Kate Moss no clipe de I don`t know what to do with myself, dos White Stripes. Outras meninas se empolgam e começam a se revezar no pole dance, no meio da boate, ainda que sem a desenvoltura quase profissional da morena do queijo. Das três que se revezam no espaço, duas estão sem calcinha e se insinuam para os homens e mulheres a seu redor, de olho na dança e no exibicionismo. Por volta de 1h, as mulheres deixam o pole dance. É hora de a profissional assumir o palco! Uma stripper loira, com seios fartos, aparece. Vestida com o clássico fetiche de colegial, e ao som de Tainted Love – na voz de Marilyn Manson –, ela rapidamente se desfaz de todas as peças de roupa. O show é interativo: alguns homens são chamados ao palco e agraciados com danças sensuais, já com a mulher toda nua. Enquanto isso, suas parceiras vibram ao assistir à cena. Depois de a loira deixar o palco, surge um policial negro, alto e cheio de músculos para brincar com o imaginário feminino. O homem demora mais para tirar toda a roupa e permanece a maior parte do tempo de cueca. Ele desce do palco algumas vezes, para “prender” o que chama de “suas fugitivas”. Em seguida, carrega as mulheres e as leva ao palco, onde danças sensuais as esperam. A última prisioneira, que já havia se exibido no pole dance instantes antes, não conteve o apetite apenas com as insinuações e, com o consentimento do striper, dá outro show: estrela o garganta profunda da noite. Os shows de striptease são o que faltava para a desinibição dos frequentadores da casa. Poucos minutos da saída do policial, por volta das 2h, as pessoas começam a desaparecer da boate. Dirigem-se às salas escondidas pelas cortinas. O cinema erótico parece não ter caído no gosto dos frequentadores. Poucos casais adentram o recinto, e, ainda assim, permanecem ali por poucos minutos. A enorme tela e o som de alta qualidade, a evidenciar os gemidos dos atores, parece menos interessante do que outros ambientes. A sala erótica contém um sofá de canto, que contorna toda a área. Casais mais reservados usam o espaço para trocar “amassos” íntimos. Trata-se do ambiente das preliminares. Sob a penumbra do dark room, veem-se, apenas, luzes vermelhas no chão. O cheiro remete a tangerina. Os grandes queridinhos do público são os quartos privativos e o labirinto. Um grupo de cinco pessoas

Dossiê Prazer (três mulheres e dois homens) que permaneceu junto por toda a noite, mais discreto do que “popular”, se dirige à recepcionista dos quartos privativos. Entram todos. Uma das mulheres, ao lado do marido, diz que não poderá demorar muito, já que, no dia seguinte, tem que levar o filho ao colégio, ainda pela manhã. Já no labirinto, para onde todos têm acesso livre, o fluxo é alto. Pessoas entram por uma extremidade da boate e saem pela outra, passando por inúmeras cabines eróticas. O ambiente é preto e exala um cheiro característico, ou certa mistura de odores. O som é igualmente peculiar... Não é possível ouvir a música da boate, mas, tão somente, gemidos, estalos de tapas e sussurros. Pelos corredores estreitos, o trânsito de curiosos é intenso. As cabines têm sempre um buraco, que fica à altura do quadril, o chamado glory hole, onde os homens podem colocar o pênis para o deleite de outrem. Há, ainda, uma fresta de vidro retangular, em altura maior, equivalente ao olhar de uma pessoa de estatura mediana: por meio dele, as pessoas que transam podem ser observadas. Em uma das cabines, inúmeras pessoas se aglomeram e disputam lugar no campo de visão retangular. Ali dentro, duas mulheres e um homem transam e riem para os que olham. Os três caíram no gosto dos voyeuristas de ambos os sexos. Noutra cabine, essa maior, com grande sofá ao centro, um casal transa, enquanto outro apenas os observa, romanticamente abraçado de pé. A essa altura, já por volta das 3h, as pessoas não parecem dispostas a ir embora.

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Catalizador de curiosidades Aos 21 anos, a estudante A. G., que não quis ser identificada, foi, pela primeira vez, a uma casa de swing. O dia em si é fruto de acordo tácito firmado com uma amiga, em meio à descontração de certa conversa entre mulheres. “Estávamos conversando sobre inúmeros aspectos relacionados ao sexo: ficar com mulher, trocar de casal e transar com mais de um cara na mesma noite. Aí, despretensiosamente, ela me propôs: a primeira vez que eu for à casa de swing, eu quero que seja com você”, relembra. Tempos depois da descompromissada conversa, chega o fatídico dia, ainda que sem muito planejamento prévio. A. G. conta que a amiga – que iria trabalhar até mais tarde naquele dia –, havia ligado propondo que fossem a uma casa de swing com dois amigos dela, depois do expediente. A. G., então, concretizou o acordo, que, até o presente momento, era apenas tácito. Por volta das 23h30, lá estava ela, a entrar no carro de um dos rapazes, ao lado da amiga e de outro moço. O grupo seguiria, então, rumo à Pampulha, sede da casa escolhida. Os desejos sexuais de A. G. não incluíam, especificamente, a troca de casais, mas o swing era um balizador para outras experiências que ela desejava ter – principalmente, a de transar com uma mulher. “Foi tudo muito diferente, algo que eu nunca

imaginaria fazer. Gostei muito, mas foi uma noite muito louca, porque ficamos o tempo todo bem soltos. Nós quatro estávamos muito tranquilos”, garante. O voyeurismo foi algo que não assustou A. G., que afirma ter lidado bem com o fetiche. Algo que tranquilizou a estudante foi o comportamento das pessoas a seu redor. “Eu me acostumei facilmente com ao vê-las transando na minha frente. Na casa, existem regras. É tudo bem seguro e ninguém te aborda ou te assedia”, pontua. Por volta das 2h, A. G. e cia. seguem a uma das cabines, onde as pessoas transam e podem ser observadas, através de uma fresta de vidro na porta. Naquele momento, ela se descobre fã de outra prática: o exibicionismo. “Começamos a transar e a fazer trocas entre nós. Em pouco tempo, surgiram pessoas para ver. É muito excitante você saber que há pessoas te assistindo. Não sei explicar o porquê, nunca tinha imaginado sentir prazer em ser observada”, afirma. A experiência abriu outras portas para A. G., que, em novas oportunidades, praticou ménage a trois, sem a necessidade de um ambiente como a casa de swing para balizar seus desejos. Entretanto, a estudante garante que a experiência revelou-se satisfatória: “Foi tudo bem tranquilo. Gostei demais e iria de novo, sem sombra de dúvidas”.


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