TFG | Percurso no Brás: reconexão e memória

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PE RC URSO N O BR ÁS Reconexão e memoria

Trabalho Final de Graduação apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial para à obtenção do grau de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

São Paulo 2020

Marina Longo Parsekian Universidade Presbiteriana Mackenzie Orientadora de monografia: Luciana Monzillo de Oliveira Orientador de projeto: Carlos Henrique Heck

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Dedico este trabalho à minha família, que me ajudou imensamente durante estes cinco anos de faculdade. Aos meus amigos, que tornaram minhas idas ao Mackenzie infinitamente mais felizes. À minha namorada, que de tanto me ouvir falar sobre este trabalho quase decorou minhas falas. Aos professores que fizeram parte do meu processo de formação, e, em especial, aos meus dois orientadores, Luciana e Heck, que apoiaram a minha proposta desde o início.

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Resumo

Abstract

Presentemente, na cidade de São Paulo, os antigos bairros industriais que fizeram parte do processo de formação da metrópole paulista estão passando por um período de transformação. A paisagem industrial, embora ainda esteja presente em algumas regiões da cidade, perdeu seu propósito inicial em decorrência da migração destas indústrias para regiões mais distantes da capital. Galpões fabris, vilas operarias e cortiços abandonados ou subutilizados são comumente encontrados durante a visita a estas regiões, edificações descaracterizadas e desconexas do tecido urbano. Tal fenômeno acarretou na perda de identidade dessas regiões, que já não comunicam efetivamente sua história e memória através de suas edificações.

Currently, in the city of São Paulo, the old industrial districts that were part of the process of forming of the metropolis are undergoing a period of transformation. The industrial landscape, although still present in some regions of the city, has lost its initial purpose due to the migration of these industries to more distant regions of the capital. Factory warehouses, working villages, and abandoned or underutilized tenements are commonly found during the visit to these regions, uncharacterized and disconnected buildings from the urban fabric. Such a phenomenon resulted in the loss of identity of these regions, which no longer effectively communicate their history and memory through their buildings.

O presente trabalho procurou analisar o bairro do Brás, com enfoque para a área com início no Largo da Concordia e término no Museu da Imigração, através de seu viés histórico, urbano e arquitetônico, trazendo como proposta de intervenção um percurso linear que evidencie os pontos históricos do recorte escolhido e interligue duas regiões segregadas pela barreira urbana da malha ferroviária, reconectando o bairro com sua identidade e memória. Palavras-chave: Ressignificação

Memória,

Identidade,

Arquitetura,

The present work sought to analyze the Brás neighborhood, focusing on the area starting at Largo da Concordia and ending at the Immigration Museum, through its historical, urban and architectural bias, bringing as a proposal of intervention a linear path that highlights the aspects of the historical points of the chosen path and interconnect two regions segregated by the urban barrier of the railway, reconnecting the neighborhood with its identity and memory. Keywords: Ressignification.

Memory,

Identity,

Architecture,

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Sumário 0. Introdução Objetivos Metodologia

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1. Contextualização 1.1 – Contexto Histórico 1.2 - Pré-existências / Pontos históricos 1.3 – Análise urbana do bairro

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2. Conceituação 2.1 - Memória e identidade 2.2 – Acupuntura Urbana

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3. Referencias projetuais 3.1 – Praça das Artes 3.2 – Sesc Pompeia 3.3 – Bridge City

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4. Proposição projetual 4.1 – Partido / Projeto urbano 4.2 – Processo projetual 4.3 – Programa 4.4 – Edificação Proposta

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5. Considerações Finais 6. Referências

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Introdução

arquitetônicas em relação as pessoas que a vivenciam, a memória coletiva das cidades e a construção de identidade de uma região.

O interesse pela região do Brás não é exclusivo a este trabalho e se iniciou durante o sétimo semestre da faculdade de Arquitetura e Urbanismo dentro da disciplina de projeto VII. Durante este período, foi desenvolvido um projeto de intervenção próximo à área que será discutida mais adiante e, apesar de terem sido levantadas soluções concretas para a região, deixou questões mal resolvidas e pontas em aberto. O bairro, por possuir um caráter multicultural e por possuir questões complexas a serem discutidas, torna-se um território muito suscetível a intervenções e abordagens diversas e isto despertou um desejo em dar continuidade ao estudo da área, para que pudesse ser feito de de maneira mais profunda, tomando escolhas projetuais mais contundentes.

A ideia do projeto surgiu de maneira espontânea. Por mera curiosidade, ao passear pelas ruas do Brás através da ferramenta do Street View , foi simulado o percurso que teria que ser realizado para ter acesso ao Museu da Imigração saindo do metrô Brás, o principal modal de transporte público mais próximo ao equipamento. Extraordinariamente, foi descoberto que tal percurso é mais de três vezes maior à distância linear entre as duas edificações. Esse foi o ponto de partida para que se iniciasse o estudo da Rua Dr. Almeida Lima, localidade da intervenção proposta que se manteve, em essência, até o final.

Dessa forma, antes que um programa projetual do TFG fosse escolhido, a área a ser estudada foi definida. A escolha de trabalhar com a temática da memória também não foi exclusiva à esta monografia e iniciouse a partir de uma pesquisa acerca da Vila Itororó, antigo cortiço que, na época do estudo realizado, se encontrava em processo de restauração. A leitura de autores relacionados a temática da memória, como Maurice Halbwachs e Aldo Rossi, ampliou o campo de visão acerca do valor representativo das edificações

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Objetivos

Metodologia

O objetivo desta pesquisa é analisar o bairro do Brás no âmbito geral em seus aspectos históricos, morfológicos e urbanos, entendendo suas principais problemáticas e potencialidades. A partir disso, compreender um recorte específico do bairro, que abarca a região próxima à estação do Metro Brás e o Museu da Imigração, a partir de suas especificidades.

A metodologia desta pesquisa foi dividida da seguinte forma:

A partir das informações coletadas propor uma intervenção para a área em questão abarcando primeiramente aspectos da escala urbana do recorte e, segundamente, um projeto arquitetônico de um Centro Cultural que funcione como conexão e continuidade da Rua Dr. Almeida Lima. Tal projeto objetiva, para além de facilitar a fruição de pessoas na região, trazer uma maior proximidade da população local em relação ao Museu da Imigração.

1. Levantamento de dados teóricos a partir da leitura de artigos, livros e teses de mestrado e doutorado. 2. Estudo de projetos com temáticas semelhantes ao proposto neste trabalho; 3. Elaboração de mapas temáticos para uma maior compreensão da área de intervenção (equipamentos públicos, edifícios tombados, zoneamento, transportes); 4. Pesquisa histórica do bairro do Brás a partir da leitura de artigos e livros; 5. Visita à área de intervenção e ao Museu da Imigração; 6. Análise dos dados obtidos; 7. Redação preliminar da pesquisa; 8. Discussão dos resultados; 9. Redação final e formatação; 10. Elaboração da proposta projetual embasada nos objetivos e dados levantados.

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Contextualização do território 1.1 - Contexto histórico 1.2 - Pré-existências / Pontos históricos 1.3 - Análise urbana do bairro

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1.1 - Contexto histórico

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região que abrange o Largo da Concórdia até o Museu da Imigração, área em que o projeto proposto se insere, está localizada em uma zona central da cidade de São Paulo, no bairro do Brás. Este tem caráter primordial na formação histórico-cultural da metrópole paulista durante seu período de desenvolvimento industrial. A origem do Brás tem relação com o português José Brás, proprietário de uma chácara na região, que construiu a igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinho. Em suas redondezas desenvolveu-se um povoado que deu origem ao bairro. Em 8 de junho de 1818 o Brás foi alçado à categoria de freguesia, entretanto a proximidade à área alagável do rio Tamanduateí impedia seu crescimento e o isolava da cidade (FOLHA DE S. PAULO, s/d). A partir da segunda metade do século XIX, impulsionada pela cultura do café, São Paulo ampliou seu desenvolvimento urbano e industrial através da incorporação dos trilhos ao espaço urbano pela ferrovia da São Paulo Railway, que ligava Santos a Jundiaí. A estação Roosevelt (hoje estação Brás) foi inaugurada em 1867, e a indústria e o pequeno comércio se desenvolveu nas proximidades dos trilhos (Figura 1).

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Figura 1 - Mapa da área do Brás em 1881, em vermelho destaque para a estação e a linha ferroviária Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.


Para além da indústria, a crescente economia urbana atraiu para a região diversos serviços. A partir dessa época, a área começou a se tornar o principal destino dos imigrantes, em sua maioria italianos, recém-chegados à cidade em busca de empregos nas indústrias têxteis e alimentícias. O primeiro grande grupo estrangeiro a chegar, em fins do século XIX, foi o italiano: entre 1888 e 1900 passaram por São Paulo quase 900 mil imigrantes, dos quais 70% eram provenientes da Itália. (...) A cidade na virada do século já contava com uma população de 250 mil habitantes, dos quais mais de 150 mil eram estrangeiros. (ROLNIK, 2002, p.16)

Segundo Rolnik (2002, p. 16), “casas coletivas e pensões, vilas e sobrados de aluguel abrigavam os recém-chegados e ofereciam oportunidades de renda para aqueles que já haviam acumulado pequenos capitais”. Tais edificações, assim como as antigas indústrias, compõem ainda hoje a paisagem do bairro. Anteriormente localizada no Bom Retiro, instalou-se na região uma hospedaria que funcionava como abrigo temporário para imigrantes, que hoje comporta o Museu da Imigração (Figuras 2 e 3), um dos pontos focais da intervenção proposta.

Figuras 2 e 3 - Vista geral da edificação e planta baixa; foto da antiga hospedaria Fonte – Disponível em: <https:// http:// museudaimigracao.org.br/sobre-o-mi/historia>. Acesso em: 20 de jun. de 2020.

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O Largo da Concórdia, que hoje funciona como ponto de comércio informal, começou a se formar entre 1830 e 1840, paralelo ao projeto de urbanização do bairro. O antigo Teatro Colombo (Figura 4), construído em 1908, localizava-se na frente do largo, todavia em 1966 o edifício foi totalmente destruído por um incêndio.

A partir do século XX o Brás mudou seu perfil pois na década de 1940 recebeu milhares de migrantes nordestinos chegados à cidade em busca de melhores condições de vida. Na década de 1970, com a construção das estações de metrô Brás, Dom Pedro I e BresserMooca, milhares de pessoas foram desabrigadas (FOLHA DE S. PAULO, s/d). A construção dessas novas linhas de metrô criou uma barreira urbana, isolando ainda mais as partes do território, que já sofria desse fenômeno por conta das linhas de trem. Este isolamento pode ser constatado a partir da análise do mapa de cheios e vazios (Figura 5) da área conforme levantamento da situação atual. As áreas mais próximas às linhas de metrô e trem são aquelas que apresentam a maior quantidade de espaços vazios, galpões abandonados e ruas sem saída, localidades que exibem maior grau de deterioração e abandono na região. Quando comparado com o mapa de 1930 (Figura 6) essa característica fica ainda mais evidente, inúmeras quadras foram descontinuadas e devastadas de suas edificações.

Figura 4 – Foto do antigo Teatro Colombo, localizado no Largo da Concórdia. Fonte – Disponível em: <http://salasdecinemadesp.blogspot.com/2008/02/ antigos-cinemas-e-teatros-do-bairro-do.html>. Acesso em: 20 de jun. de 2020.

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Os trilhos, outrora responsáveis pelo deslocamento e pela comunicação entre os agentes econômicos e populações, hoje desintegram a paisagem pela imobilidade, conformando, junto com os elementos industriais esvaziados de função, extensas barreiras físicas que segmentam ainda mais a apreensão da paisagem urbana. (MOREIRA, 2008, p.98)


Figura 5 - Mapa de cheios e vazios do Brás em 2016. Em amarelo foi destacada a malha ferroviária. Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.

Figura 6 – Mapa do Brás em 1930. Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.

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Contemporaneamente, o Brás é uma das áreas de comércio popular de maior importância em São Paulo. O bairro atualmente ainda funciona como um local de acolhimento aos que chegam à metrópole paulista, contando com imigrantes hispanoamericanos, haitianos e coreanos. Isso dá ao Brás um caráter multicultural de muita riqueza. Segundo dados recentes da Polícia Federal (G1, 2017), o número de imigrantes registrados aumentou 160% em dez anos, 117.745 estrangeiros deram entrada no país em 2015 em relação a 45.124 em 2006. Em 2015 os haitianos lideraram o ranking de chegada ao país com 14.535 registrados, os bolivianos seguem em segundo lugar com 8.407 registros. Todavia, nas últimas décadas o bairro sofreu um processo de esvaziamento em decorrência do deslocamento das indústrias para áreas mais afastadas de São Paulo. Como consequência a área estudada apresenta “rastros” desse uso industrial que atualmente perderam sua significação e se encontram obsoletos e abandonados.

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Gráfico 1 – Número de imigrantes registrados pela PF por ano Fonte – Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/06/em-10anos-numero-de-imigrantes-aumenta-160-no-brasil-diz-pf.html>Acesso em: 15 de ago. de 2019.


Figura 7 – Principais nacionalidades dos imigrantes vindos para o Brasil. Fonte – Disponível em: <http://especiais.g1.globo.com/mundo/2016/mapa-da-imigracao-no-brasil/>Acesso em: 15 de ago. de 2019.

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1.2 - Pré-existências / Pontos históricos

A

Figura 8 revela alguns dos principais pontos históricos presentes no percurso proposto, detalhado a partir do capítulo 4. O projeto teve como

Figura 8 - Mapa da área de intervenção destacando os principais pontos históricos. Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps.

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objetivo evidenciar e ressaltar tais elementos como forma de retomada à identidade do bairro, tal conceito será explorado no capítulo 2.


O primeiro ponto estudado foi o Largo da Concórdia e o Theatro Colombo, ambos presentes desde o início da formação do bairro. O Largo começou a ser formado entre os anos 1830 e 1840, localizado nos limites da antiga chácara do português José Brás, fundador do bairro. Por volta de 1850 seu traçado foi finalizado. No ano de 1949 foi inaugurado o viaduto do Gasômetro funcionando como uma solução para a travessia dos trilhos, anteriormente realizada através de uma porteira (Figura 9). O viaduto fragmentou o largo em duas partes, dificultado a fruição de pedestres na região, modificando o traçado original e contribuindo para a degradação das edificações no entorno. Já o Teatro (Figura 10) foi inaugurado em 20 de fevereiro de 1908, tinha capacidade para 1968 lugares e era considerado o teatro com melhor acústica da cidade. Era conhecido como local de reunião das classes operarias por apresentar preços mais acessíveis aos espetáculos. Em 19 de julho de 1966 o edifício sofreu com um incêndio e teve sua estrutura completamente destruída. A estação Roosevelt (antiga estação Norte) foi inaugurada em 1875, e funcionava como ponto de embarque e desembarque para o Rio de Janeiro e algumas regiões de São Paulo. Funcionou como a principal porta de entrada de imigrantes, em sua maioria de origem italiana, vindos para o trabalhar nas fábricas da região. Atualmente a estação é dirigida pela CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e mudou seu nome para Estação Brás.

Figura 9– Foto da antiga porteira do Brás. Fonte – Disponível em: <https://www.saopauloantiga.com.br/as-porteiras-dobras/>Acesso em: 20 de jun. de 2020.

Figura 10 – Foto do Teatro Colombo no Largo da Concórdia. Fonte – Disponível em: <https://museudeteatro.files.wordpress.com/2010/02/ digitalizar0011-copia.jpg/>Acesso em: 20 de jun. de 2020.

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cultural que deu início às reflexões e intervenções deste trabalho, inicialmente funcionava como uma hospedaria de imigrantes. Sua principal função era de acolher e encaminhar os imigrantes aos novos empregos. Na década de 1930 a edificação passou a abrigar também os migrantes de outros estados brasileiros. O edifício foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat) no ano de 1982 e em 1993 foi transformado em Museu.

Figura 11 – Foto da estação Roosevelt. Fonte – Disponível em: < https://noticiando.net/estacao-roosevelt/> Acesso em: 20 de jun. de 2020.

Outro importante ponto histórico encontrado na região são os próprios trilhos da antiga São Paulo Railway, que ligavam Santos a Jundiaí. Tal paisagem ferroviária foi levada em consideração durante a concepção do projeto arquitetônico proposto neste trabalho, uma vez que contribuiu para o desenvolvimento do bairro e ainda hoje funciona como um importante modal de mobilidade urbana estabelecendo conexões com as zonas norte e leste da metrópole paulista. A história do Museu da Imigração, equipamento

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O processo de pesquisa histórica dos equipamentos presentes no recorte da área de intervenção não apenas auxiliou a compreensão o bairro de maneira mais ampla, como também contribuiu para com que as decisões projetuais fossem mais bem definidas e fundamentadas. Assim sendo, os antecedentes aqui exibidos fazem parte, mesmo que indiretamente, da intervenção que será apresentada.


1.3 - Análise urbana do bairro

U

ma das metodologias utilizadas para atingir o plano urbano e o projeto descritos nos capítulos a frente foi a análise dos mapas temáticos que englobam o entorno próximo: uso do solo, transportes, edifícios tombados e zoneamento. A região em que a área a de intervenção está inserida se encontra próxima ao centro do município, localidade que apresenta uma grande quantidade de centros culturais, mas apesar disso, como pode-se observar na Figura 12, o Brás possui apenas dois equipamentos relacionados à cultura: o Museu da Imigração e o Catavento Cultural. Em contrapartida a localidade apresenta uma grande quantidade de usos educacionais, destacando-se a Universidade Anhembi Morumbi e o Senac. Tanto o Museu da Imigração quanto a Universidade, encontram-se no eixo da área de intervenção, tendo seu acesso dificultado por conta da barreira física da linha ferroviária da CPTM e a linha aérea do metrô. Essas duas barreiras dividem o bairro em vários fragmentos, dificultando o acesso a pé dos pedestres aos equipamentos a partir dos pontos de transporte público, abundante na região, conforme a Figura

13. As proximidades dos trilhos também criam pontos de ruas sem saída que acumulam lixo e viram locais para estacionamento de caminhões de carga e ônibus turísticos, condição encontrada na área de intervenção. A localidade apresenta três estações de metrô: Pedro II, Brás e Bresser-Mooca; e três corredores de ônibus em suas principais vias: Av. Alcântara Machado, R. Gasômetro e Av. Rangel Pestana. Conforme o Gráfico 2, os principais meios de transporte utilizados pelos moradores do Brás são os coletivos com 32,5% e a pé com 42%. Estabelecendo um paralelo com os outros bairros, o Brás apresenta uma das menores taxas de utilização de transporte individual, com 24,9% (SÃO PAULO, Município, 2016). Esses dados ressaltam a importância de que esses dois modais sejam priorizados ao pensar as diretrizes para um projeto urbano para a região.

Gráfico 2 – Participação do número de viagens diárias dos residentes por modos de transporte principal, 2007. Fonte: SÃO PAULO, Município, 2016, p. 38.

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Figura 12 - Mapa de equipamentos públicos. Fonte – Elaborado a partir de base do Geosampa.

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Figura 13 - Mapa de transportes. Fonte – Elaborado a partir base do Geosampa.

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A Figura 14 apresenta a localização dos imóveis tombados na região, sendo grande parte deles compostos de antigas vilas operárias e antigas fábricas, edificações que fizeram parte do processo de formação do bairro e ainda hoje fazem parte da paisagem urbana da região. Próximo à área de intervenção a única edificação tombada é o Museu da Imigração, apesar de apresentar outras edificações do mesmo período que sobreviveram ao tempo. A Figura 15 representa o mapa de uso do solo da área, Como pode-se observar, o uso predominante do recorte é o comércial. Este fato reafirma a tese de que o bairro sofreu um processo de transformação do seu uso original fabril, apesar de ainda possuir alguns galpões industriais em funcionamento. O Brás está inserido em uma Macroárea de Estruturação Metropolitana (Figura 16), ou seja, áreas próximas aos principais eixos de transporte que estão potencialmente aptas ao adensamento construtivo e populacional. São territórios passiveis a futuras transformações e projetos urbanos. A Figura 16 mostra o perímetro das áreas de zoneamento da área. A região de intervenção apresenta zonas que permitem uma taxa de adensamento elevada: a zona ZEU (Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana) permite um CA (Coeficiente de Aproveitamento) de até 4, ou seja, é possível construir uma área de até 4 vezes a área do lote. A zona de ZEIS – 3 (Zona Especial

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Figura 16 - Mapa de eixos de estruturação urbana. Macroárea de Estruturação Urbana em vermelho. Fonte – Disponível em: <https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/estruturacaoterritorial/eixos-de-transformacao/arquivos/> Acesso em: 20 de jun. de 2020.

de Interesse Social) possui o CA de 2 e é reservada para empreendimentos com função social (SÃO PAULO, Município, 2014). No projeto proposto, apesar da taxa alta de adensamento construtivo da região, as intervenções não atingiram o máximo de área permitida construída para que não fossem muito altas e respeitassem o gabarito médio das edificações do entorno, que apresentam em torno de dois até cinco pavimentos.


Figura 14 - Mapa de edificações tombadas (em azul). Fonte – Elaborado a partir base do Geosampa.

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Figura 15 - Mapa de uso do solo Fonte – Elaborado a partir de base do Geosampa.

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Figura 17 - Mapa de zoneamento. Fonte – Elaborado a partir base do Geosampa.

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Conceituação

2.1 - Memória e construção de identidade 2.2 - Acupuntura urbana

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2.1 - Memória e construção de identidade

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talo Calvino, em sua obra “As cidades invisíveis”, descreve as cidades por qual Marco Polo percorreu. Quando o personagem chega até a cidade de Zaíra discorre sobre a importância das marcas do tempo na constituição da identidade do espaço. A cidade se embebe como uma esponja dessa onda que reflui das recordações e se dilata. (…). Mas a cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da mão, escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das escadas, nas antenas dos para-raios, nos mastros das bandeiras cada segmento riscado por arranhões, serradas, entalhes, esfoladuras. (CALVINO, 1972, p. 14)

O bairro do Brás está inserido em um contexto de descaraterização dos signos de sua paisagem urbana. Seu passado, contido nas antigas arquiteturas industriais, vilas operárias e hospedarias, está sendo paulatinamente apagado e perdendo seu significado para aqueles que o vivenciam na vida cotidiana. Tais espaços tornaram-se “território de ninguém”,

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isolados do contexto urbano. “São lugares mudos, não mais comunicantes, ressentidos pela ausência de pessoas, aguardando por um novo propósito e forma de ocupação” MOREIRA (2008, p. XX). Sua identidade, assim como a do próprio bairro, foi enfraquecida fazendo com que a região perdesse suas principais referências históricas e culturais. Em “Signos de uma paisagem (des)construída” (2008), Polise Moreira discute acerca da importância da identificação e apropriação coletiva do ambiente urbano para que este seja preservado. A apreensão e percepção da paisagem urbana está ligada ao imaginário individual dos que a vivenciam. Cada usuário possui seu próprio repertório de imagens constituídas de memórias vividas e experiências cotidianas. Nesse contexto, o esvaziamento e descaraterização do Brás também transforma o próprio imaginário coletivo e seu entendimento do bairro. Uma paisagem não mais comunicante não estabelece mais relações de identificação com os usuários perdendo, assim, sua capacidade de ser lida como uma unidade. O bairro torna-se, dessa forma, um compilado de fragmentos não relacionáveis entre si. A falta de uma identidade coletiva com o espaço


urbano, segundo a autora, faz com que os usufrutuários dos espaços públicos não os vejam como pertencentes a eles, e dessa forma, não se sentem responsáveis por seu cuidado e proteção. Kevin Lynch, em A Imagem da Cidade, corrobora para discussão desse mesmo ponto de vista acentuando a importância da legibilidade das cidades. Para o autor, nossa capacidade de orientação nos espaços depende de imagens passadas construídas a partir de experiencias vivenciadas no ambiente urbano. Segundo ele: A necessidade de reconhecer e padronizar nosso ambiente é tão crucial e tem raízes tão profundamente arraigadas no passado, que essa imagem é de enorme importância prática e emocional para o indivíduo. (LYNCH, 1997, p.4)

O conjunto de ícones referenciais presentes nos ambientes organizam nossa orientação espacial e, para além disso, fazem parte do imaginário sentimental dos indivíduos que os vivenciam. Tais ícones se destacam na paisagem urbana e possuem uma identidade própria, como é o caso do edifício escolhido para ser o enfoque da proposta projetual, o Museu da Imigração. Segundo Lynch, o conceito de identidade está ligado à capacidade de diferenciação de um objeto em relação a outros. Ou seja, sua unicidade ou individualidade.

Aldo Rossi, ao discutir o conceito de Fatos Urbanos, reforça o mesmo ponto de vista. Os Fatos Urbanos podem ser definidos como elementos presentes na cidade (ruas, bairros, monumentos) que possuem o caráter de singularidade. Eles se destacam por sua forma, desenho e memória e, nesse sentido, são detentores de fragmentos da história da cidade. “(..) as cidades se oferecem a nós através dos fatos urbanos determinantes, em que é preeminente o elemento histórico” (ROSSI, 1995, p. 193). Para Rossi, a cidade é um artefato, ou seja, uma construção do homem através do tempo e, nesse sentido, a arquitetura é entendida como fruto da coletividade, inseparável da vida civil. A partir dessas definições o autor introduz o conceito de memória coletiva, ou seja, a memória comum à um grupo de pessoas, compartilhada através do tempo. Os fatos urbanos nascem da vida inconsciente e constituem esse imaginário da memória coletiva. Sobre o conceito mencionado acima o autor cita o sociólogo Maurice Halbwachs. Em seu livro “A Memória Coletiva”, no capítulo “Memória Coletiva e Espaço”, Halbwachs aborda a relação entre a espacialidade e a construção de identidade. Para ele, as memórias estão, em grande parte das vezes, atreladas à espaços físicos por estes possuírem uma característica de permanência no tempo.

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Assim, não há memória coletiva que não aconteça em um contexto espacial. Ora, o espaço é uma realidade que dura (...). É ao espaço, ao nosso espaço – o espaço que ocupamos, por onde passamos muitas vezes, a que sempre temos acesso e que, de qualquer maneira, nossa imaginação a cada instante é capaz de reconstruir – que devemos voltar nossa atenção, é nele que nosso pensamento tem de se fixar para que essa ou aquela categoria de lembranças reapareça. (HALBWACHS, 1968, p. 170)

A partir dessas constatações é possível reafirmar a importância da preservação da paisagem histórica presente no Brás. A intencionalidade do projeto apresentado é de evidenciar as arquiteturas e espacialidades já existentes na área, integrando-as às novas intervenções propostas.

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2.2 - Acupuntura urbana Sempre tive a ilusão e a esperança de que, com uma picada de agulha, seria possível curar doenças. O princípio de recuperar a energia de um ponto doente ou cansado por meio de um simples toque tem a ver com a revitalização deste ponto e da área ao seu redor. (LERNER, 2003, p. 4)

Assim se inicia Acupuntura Urbana de Jaime Lerner, um livro que reúne um compilado de pequenas intervenções urbanas e como estas podem influenciar a recuperação do entorno de áreas “feridas”. Segundo o autor o planejamento urbano é um processo, não consegue gerar transformações imediatas, mas é preciso um “pontapé inicial” para que as mudanças ocorram. Essa foi a metodologia utilizada no Programa Centro Aberto da Prefeitura de São Paulo. O projeto foi iniciado em abril de 2013 e teve como objetivo reativar espaços públicos subutilizados da cidade através de pequenas intervenções, como instalações de decks com espaços de permanência, parquinhos, faixas de travessia com proteção para pedestres e mobiliários móveis, para além de promover atividades temporárias como bandas, performances e exibições de filmes. O projeto se inseriu na região central de São Paulo, localidade que sofreu ao longo da segunda metade do século XX um processo de desvalorização e degradação, sintomas correlatos ao que ocorre na região do Brás. “O centro passou a ser um lugar de passagem e não um espaço de estar, que convide à convivência e ao desfrute de seus potenciais e qualidades históricas” (Prefeitura de São Paulo, 2013)

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O programa contou com um processo participativo da população através de oficinas e workshops e, a partir dessa coleta de informações, os projetos foram formulados. A intencionalidade foi de transformar espaços preexistentes através da renovação de suas formas de uso e, dessa forma, torná-los mais seguros e inclusivos, para além de reforçar a identificação da população em relação ao Centro. Segundo gráficos elaborados pela prefeitura (SÃO PAULO, Município, 2015; Figura 18), a média de permanência de pessoas no Largo do São Francisco aumentou, nos dias úteis de, 58 para 129 pessoas, com

os picos de movimento concentrados na hora do almoço e no final do expediente, chegando em quase 200 pessoas. Já nos finais de semana a média passou de 41 para 81 pessoas na localidade. Esses dados comprovam a eficácia das medidas tomadas como forma de reativar áreas públicas subutilizadas da cidade. Os projetos propostos, todavia, se concentraram no centro antigo de São Paulo, não abrangendo outras

Figura 18 – Gráficos do movimento de pessoas no Largo do São Francisco. Fonte – Disponível em: <https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/projetosurbanos/centro-aberto/> Acesso em: 20 de set. de 2019.

Figura 17 – Fotos do Programa Centro aberto. Fonte – Disponível em: <https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/projetos-urbanos/centro-aberto/> Acesso em: 20 de set. de 2019.

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regiões próximas que sofreram do mesmo processo de desvalorização. Apesar de terem sido apresentadas propostas para a expansão do programa, nenhuma delas foi implementada no presente momento. A figura 19 mostra, em azul, os pontos em que as novas intervenções seriam implantadas, destacando-se duas delas próximas ao bairro do Brás, região em que o projeto proposto neste trabalho se insere. Visto isso, a metodologia do centro aberto serviu de apoio para se pensar no plano urbano proposto, uma vez que poderia servir como uma forma de expansão do programa centro aberto, dialogando com as outras propostas já realizadas anteriormente.

Figura 19 – Pontos de inserção das novas intervenções. Fonte – Disponível em: <https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/projetosurbanos/centro-aberto/> Acesso em: 20 de set. de 2019.

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Referências projetuais 3.1 - Praça das artes 3.2 - Sesc Pompéia 3.3 - Bridge City

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3. Referências Projetuais

3.2

N

este capítulo foram escolhidas três referências projetuais, cada uma enfocando em um aspecto diferente que contribuiu para formação das decisões projetuais. Embora possuam propostas bem distintas, os três projetos estão inseridos e contextos similares: regiões consolidadas do tecido urbano que contam com a presença de pré-existências e, assim sendo, são intervenções pensadas para localidades específicas, assim como o presente trabalho.

3.1

3.3

40


3.1 - Praça das Artes Brasil Arquitetura

A

Praça das Artes, localizada na quadra 27 (segundo o número de cadastro de imóvel da prefeitura) de São Paulo, faz parte de um programa de retomada e requalificação do centro histórico. Anteriormente abandonado a partir da década de 60, o centro da cidade é a uma das maiores referências comum entre os paulistanos, segundo Carlos Augusto Calil (2013) “todo cidadão tem duas referências: seu bairro e o Centro histórico”. A perda dessas referências é também uma perda de identidade coletiva. O processo histórico de renúncia do Centro também abriu mão de uma série de espaços e edifícios públicos de alta qualidade arquitetônica e urbanísca. A importância do projeto em vista transcende o espaço da materialidade: é uma retomada da memória da cidade.

Figura 20 – Croqui da entrada da Praça das Artes Fonte – Elaboração própria.

Nesse sentido, o estudo do conjunto cultural auxiliou na constituição do projeto proposto neste trabalho na medida em que também foi constituído dentro de um contexto de preexistências. A Praça das Artes não agride o entorno construído, possui caráter mais horizontal apresentando um gabarito mais baixo que o de seus vizinhos. Sua volumetria foi moldada a partir da morfologia dos vazios da quadra 27, se encaixando nas edificações que a circundam (Figura 21).

41


O projeto foi apresentado em 2006 com o objetivo de requalificar a área próxima ao Conservatório Dramático e Musical, e criar um espaço de apoio cultural agregado ao Theatro Municipal (Figura 23). Foram propostos uma serie de edifícios suspensos de uso cultural, assim abrindo espaço para uma grande praça central integrada às ruas que a envolvem que funciona como anexo ao vale do Anhangabaú (Figura 25). O programa da praça é focado no estudo e prática ligados à música e à dança com caráter público convidativo que permeia o conjunto (BRASIL ARQUITETURA).

Figura 21 – Inserção da edificação perante as pré-existências. Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps.

Figura 22 – Foto da Praça das Artes. Fonte – Disponível em: <https://www.archdaily.com/339274/praca-das-artesbrasil-arquitetura?ad_source=search&ad_medium=search_result_all/> Acesso em: 20 de set. de 2019.

42

Figura 23 – Localização do projeto em relação ao Theatro Municipal e o Vale do Anhangabaú. Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps.


Figura 24 – Planta de situação Fonte –Disponível em: <https://www.archdaily.com/339274/praca-das-artesbrasil-arquitetura?ad_source=search&ad_medium=search_result_all/> Acesso em: 20 de set. de 2019.

Figura 25 – Setorização do projeto. Fonte – Elaborado a partir de base do Archdaily

43


3.2 - SESC Pompéia Lina Bo Bardi

O

SESC Fábrica da Pompéia, localizado no bairro Água Branca em São Paulo (Figura 26), começou a ser projetado em 1977, e teve sua conclusão no ano de 1986. Foi idealizado pela arquiteta Lina Bo Bardi, com colaboração dos arquitetos André Vainer e Marcelo Carvalho Ferraz. Este se utiliza de um antigo conjunto de galpões de uma fábrica de tambores para a constituição de um espaço público juntamente com um centro cultural. Agregados a eles, Lina Bo Bardi implantou mais duas edificações que complementam o programa do conjunto. A arquiteta observou durante suas visitas ao local que os galpões já eram utilizados como forma de lazer pela população e se apropriou de tais atividades que já ocorriam no dia-a-dia local, incorporando-as ao projeto. Segundo o relato de Lina Bo Bardi: Na segunda vez que estive lá, um sábado, o ambiente era outro: não mais a elegante e solitária estrutura Hennebiqueana, mas um público alegre de crianças, mães, pais, anciões passava de um pavilhão a outro. Crianças corriam, jovens jogavam futebol debaixo da chuva que caía dos telhados rachados, rindo com os chutes da bola na água (...). Pensei: isto tudo deve continuar assim, com toda esta alegria. (FERRAZ, 2008, p. 220 apud MARQUES; FLORES, 2014, p. 10).

44

Figura 26 – Localização do SESC Pompéia Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps.

Figura 27 – Foto do Sesc Pompeia. Fonte – Archdaily.


A circulação do conjunto é constituída por dois eixos principais (Figura 28) que dão acesso às diversas atividades contidas nos galpões e às duas edificações novas propostas pela arquiteta. As torres se conectam através de um sistema de passarelas em diferentes disposições. As aberturas dos prismas possuem uma configuração disforme e coloração vermelha, criando um contraste em relação a materialidade da edificação, sobretudo de concreto. O projeto estudado, proposto pela arquiteta, traz à tona reflexões acerca do trabalho com pré-existências,

sobretudo as industriais. É um exemplo de como ressignificar espaços que acabam perdendo seu sentido original de existência com o passar do tempo, tornandose muitas vezes ociosos. No caso do SESC Pompéia, Lina se utiliza de atividades que já existiam na região e as potencializa através do projeto. Já na intervenção deste trabalho, presente em uma antiga área de indústrias do Brás, a intencionalidade foi de preservar o máximo possível as preexistências locais e implantar uma edificação que não agredisse o entorno construído, conseguindo mesclar-se à paisagem industrial. Figura 28 – Planta baixa do complexo e corte. Fonte – Elaborado a partir de base do Archdaily.

45


3.3 - Bridge City Bernard Tschumi

O

projeto, de autoria do arquiteto Bernard Tschumi, localizado na cidade suíça Lausanne (Figura 29), foi ganhador de um concurso internacional promovido pela prefeitura da cidade e constitui-se de um masterplan para melhorar a antiga zona industrial da cidade, marcada por galpões subutilizados e uma topografia acentuada.

Figura 29 – Localização do projeto. Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps

46

Tschumi apresentou um esquema de “Cidade Ponte”, criando um esquema de quatro pontes (Figura 30 e 31) que interligam os dois lados do rio Flon. Tais pontes abrigariam residências, lojas, um teatro e um auditório para a Universidade de Arte e Design de Lausanne. Todavia, o projeto não foi concretizado devido à forte oposição dos proprietários da propriedade e partidos políticos (EPFL News).

Figura 30 – Cortes do projeto Fonte – Disponível em: < http://www.tschumi.com/projects/31/> Acesso em: 15 de out. de 2019.


indústrias. Isto faz com que o plano não se aproxime da intencionalidade da proposta projetual do Brás, descrita a partir do capítulo 4, mesmo que pertença à um contexto urbano muito semelhante. Assim sendo, a solução estrutural utilizada pelo arquiteto foi a mais amplamente analisada durante o estudo do projeto em questão.

Figura 31 – Perspectiva do projeto. Fonte – Disponível em: < http://www.tschumi.com/projects/31/> Acesso em: 15 de out. de 2019. Edições da autora.

Figura 32 – Perspectiva da área. Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps.

Ao invés disso foi construída uma ponte de pedestres interligada à uma nova estação de metrô (Figura 32). Tal ponte conta com um vão de aproximadamente 86 metros, vencido através do uso de uma treliça metálica acoplada à uma viga vagão, juntamente com um pilar de sustentação intermediário e um sistema de circulação vertical interligado à estação de metrô (Figura 33). Ainda que o masterplan original proposto por Tschumi apresente uma solução inteligente de interligação de dois pontos segregados da cidade propondo novas formas de ocupação da antiga zona industrial, o meio empregado não se preocupou em manter as preexistências da região, indicando a demolição de quase todas as antigas

Figura 33 – Perspectiva da área. Fonte – Elaborado a partir de base do Google Maps.

47


48


04

Proposta projetual

4.1 - Partido / Projeto urbano 4.2 - Processo projetual 4.3 - Programa 4.4 Edificação Proposta

49


4.1 - Partido / Projeto Urbano O projeto, localizado no bairro do Brás (Figura 34), começou a ser pensado a partir de um estudo de uma área escolhida e não de um programa arquitetônico específico. O interesse pelo Brás se deu principalmente

Figura 34 – Localização do Brás em relação ao município de São Paulo. Em amarelo, as linhas de metrô e trem. Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.

50

por ser um território em processo de transformação, fato que decorre da migração das antigas fábricas para regiões mais afastadas de São Paulo. Isso criou diversas áreas ociosas de galpões e vazios urbanos, descaracterizando-o e tornando-o propenso a possíveis intervenções e projetos urbanos. Escolhido o bairro a ser trabalhado, o segundo passo foi fazer um recorte de uma área de interesse a partir de uma problemática específica, tarefa de certa complexidade visto as inúmeras possibilidades temáticas que a região proporciona. Até que, em certo momento, ao estudar os equipamentos relevantes presentes na localidade, chamou atenção o ponto em que o Museu da Imigração estava inserido. Sua proximidade aos trilhos da CPTM e à linha aérea do metrô, dois elementos que funcionam como barreiras lineares para pedestres, o isolam do contexto urbano, dificultando seu acesso para potenciais usuários. Uma simulação no Google Maps de trajetos a pé originários da estação Brás até o Museu da Imigração apresenta dois resultados (Figuras 35 e 36), ambos com mais de 2 quilômetros de caminhada devido à falta de transposições disponíveis para a travessia dos trilhos. Isso comprova a situação de segregação do equipamento, visto que, a distância linear da estação até o museu é de aproximadamente 700 metros.


Figura 35 e 36 – Simulação do percurso a pé até o Museu da Imigração partindo da saída do metrô Brás. Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.

51


Outro fato relevante a se levar em conta é que esta região próxima ao Largo da Concordia é a que apresenta a maior quantidade de imigrantes e refugiados morando e trabalhando em relação ao restante do bairro. A figura 37 mostra a localização dos cortiços da região, edificações muitas vezes habitadas por imigrantes por não necessitarem de documentação para serem ocupadas e se encontrarem próximas à oferta de emprego. Os cortiços possuem esta relação com a população de baixa renda, com os imigrantes e com os setores mais antigos da cidade, onde as atividades comerciais e fabris estão concentradas. Cortiço ainda é a principal alternativa de acesso à habitação em setores centrais para diversos grupos sociais, sejam eles brasileiros que trabalham neste setor da cidade; (...) sejam imigrantes que procuram as pensões para morar, pois não possuem documentação para alugarem um imóvel. (SIMONE, 2014, p.186)

Esta ocorrência também ficou mais evidente durante a visita à região em um domingo à tarde, dia em que os comércios fecham. Ao transitar pelo local, grande parte das pessoas ali presentes falavam diferentes línguas e apresentavam diferentes etnias.

52

Figura 37 - Mapa da localização dos cortiços na área de intervenção. Fonte – Elaborado a partir de base do HabitaSAMPA.


Dessa forma, diante a relevância do Museu da Imigração no processo de formação do bairro, que ainda hoje acolhe e serve de moradia para imigrantes e refugiados, a proposta projetual constitui-se de um percurso linear ligando o Largo da Concordia até o Museu, a partir do qual seja possível reconectar duas regiões do Brás segregadas pelas barreiras físicas do trem e do metrô e, dessa forma, estabelecer uma relação mais próxima dos moradores locais com o Museu. Uma metodologia semelhante à citada no capítulo 2 foi utilizada para pensar o percurso linear proposto. A ideia consistiu em propor pequenas intervenções que respeitem as preexistências e reativem áreas obsoletas do bairro.

Figura 38 – Foto da empena cega. Fonte – Google Maps.

O percurso proposto encontra-se na Rua Dr. Almeida Lima, que sofre com um processo de abandono por apresentar uma grande quantidade de galpões subutilizados, possuir uma ampla empena cega (Figura 38 e 39) que ocupa quase 200 metros de extensão e ter seu limite delimitado pelos muros da CPTM que resguardam os trilhos. A empena cega, para além de suscitar um sentimento de insegurança para os transeuntes que a percorrem, concentra grande quantidade de lixo e entulho, o que dificulta o trânsito de pedestres na calcada subjacente a ela. O primeiro passo para a elaboração do Plano Urbano foi o mapeameto das áreas subutilizadas suscetíveis

Figura 39 – Foto da Rua Dr. Almeida Lima Fonte – Google Maps.

53


a intervenções. Como mostra a Figura 40 (página 55), as duas primeiras quadras do percurso (pensando no sentido da saída do metrô até o Museu) possuem usos comerciais consolidados, que foram preservados. O restante das quadras apresenta grande quantidade de galpões obsoletos e áreas de estacionamento (Figura 38), esses foram os espaços escolhidos para abrigar as intervenções. Outro ponto selecionado para o projeto foi o Largo da Concordia, que tem sua importância ligada à formação do bairro e, atualmente, encontra-se esvaziado. A Rua Dr. Almeida Lima é cortada pelos trilhos da CPTM e pela linha de metrô suspensa, gerando dois pontos de ruas sem saída. Esses pontos atualmente servem como estacionamento de ônibus de turismo e caminhões de

Figura 38 – Ponto da Rua sem saída utilizada como estacionamento. Fonte – Google Maps.

54

carga e descarga. Analisando essa desconexão entre os dois lados do território, para esta área foi pensado um projeto de edifício ponte, dando continuidade à linearidade da rua. Após esta análise inicial foram definidas as diretrizes a serem seguidas no projeto urbano (Figura 41, página 56) e, a partir destas, foi elaborado um primeiro mapa de intervenções (Figura 42, página x), estabelecendo as edificações a serem retiradas, áreas que abrigariam os projetos e modificações na paisagem. Para o Largo da Concórdia e a saída do metrô foi definida a instalação de decks de madeira modulares para que seus traçados originais não precisassem ser modificados e pudessem, assim, serem geradas mais áreas de permanência. Para a empena cega já citada anteriormente, foram pensados módulos comerciais efêmeros que pudessem ser apropriados pelos comerciantes informais locais trazendo maior movimento para a região e potencializando essa atividade já presente no bairro. Para o lote que abrigava um extenso estacionamento foi proposto um edifício multifuncional com o térreo comercial, seguindo o padrão das duas quadras adjacentes a que este se insere. Seguindo para a próxima quadra, para o lote de esquina, foi proposto um pocket park, já que a região carece de áreas livres e permeáveis. Para a quadra próxima aos trilhos da CPTM e a linha de metrô foi proposto um edifício ponte, cujo projeto será detalhado nos capítulos seguintes.


Edificações relevantes

Galpões subutilizados

Comércios

Estacionamentos / Vazios

Figura 40 - Mapa de análise da área de intervenção. Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.

55


Figura 41 – Diretrizes projetuais. Fonte – Elaboração própria da autora.

56


Edificações relevantes

Edificações removidas

Figura 42 – Mapa com primeiras intervenções. Fonte – Elaborado a partir de SÃO PAULO (Município), s/d.

57


Ainda analisando o contexto do entorno, a Figura 43 apresenta um corte da Rua Dr. Almeida Lima, feito objetivando obter uma melhor compreensão do gabarito das edificações que compõem a paisagem do percurso. Como pode ser observado, as quantidades de pavimentos são em torno de 3 a 4 andares na região anterior à linha férrea. Já a região mais próxima ao museu, posterior a travessia dos trilhos, apresenta uma maior verticalização devido a presença de edifícios residenciais com cerca de 20 pavimentos cada um. Esse processo de verticalização

pode ser observado em diversas outras quadras próximas à linha suspensa do metrô, atual linha vermelha, que percorre a zona leste da cidade. Como foi visto, a área de intervenção está localizada em uma Macroárea de Estruturação Metropolitana e, por conta disso, está propensa a sofrer um processo de adensamento e verticalização no futuro. O projeto proposto, todavia, procurou respeitar o gabarito médio do bairro com edificações de caráter mais horizontal que se encaixam de forma mais harmoniosa à paisagem, levando em conta as características locais.

Caixa econômica Largo da Concórdia

58

Comércios


Visto as análises realizadas, foi elaborado um masterplan (Figura 44) mais detalhado das intervenções propostas, já com o desenho de implantação das novas edificações, diagramas perspectivados simplificados dos quiosques modulares e decks de madeira, e um corte da rua mostrando o funcionamento de todas as propostas agrupadas.

Edifícios residenciais Figura 43 – Corte urbano da Rua Dr. Almeida Lima Fonte – Elaboração própria da autora.

Galpões industriais

Trilhos da CPTM e linha áerea do metrô

59


60

Figura 44 – Plano Urbano consolidado. Fonte – Elaboração própria da autora.


4.2 - Processo projetual Como já foi colocado, o projeto arquitetônico consiste em um centro cultural anexo ao museu da imigração, que, a partir de uma passarela aérea, conecta os dois lados da Rua Dr. Almeida Lima separados pelos trilhos dos trens da CPTM e pela linha suspensa do metrô. A realização de tal conexão foi a principal problemática enfrentada para o desenvolvimento do projeto por conta da extensão do vão a ser vencido, que possui aproximadamente 72 metros. Para além disso, foi constatado que a altura da linha de metrô chega à altura de 12 metros na região estudada, dificultando ainda mais a realização da travessia. Assim sendo, como pode ser observado na Figura 45, os primeiros croquis de estudo foram feitos em corte, já simulando uma possível solução estrutural para a ponte, a locação dos núcleos de circulação vertical e a quantidade e distribuição dos pavimentos. É interessante observar que estas primeiras ideais, apesar de terem se transformado ao longo do processo do projetual, se mantiveram bastante similares ao projeto já consolidado.

Figura 45 – Croquis de estudo. Fonte – Elaboração própria da autora.

61


A Figura 46 mostra o primeiro desenho de proposição de ocupação do térreo, nela já pode-se observar estudos do fluxo dos pedestres, possíveis usos para as volumetrias do conjunto e a inserção urbana do projeto em relação às pré-existências. A ideia consistiu em definir usos que proporcionam um maior movimento de pessoas para a região, como restaurantes e comércios, juntamente com o acesso principal do centro cultural e espaços livres de praças. Já partindo para o estudo dos volumes da edificação, a Figura 47 foi desenvolvida para a segunda entrega da disciplina de projeto do TFG I e consistiu na primeira solução tridimensional desenvolvida, juntamente com os usos de cada uma das volumetrias. A partir desse estudo já é possível observar a relação da edificação com seu entorno construído. As volumetrias foram concebidas a partir dos vazios existentes, se acomodando ao contexto preestabelecido da área. Nesse sentido, pode-se observar o modo como a referência da Praça das Artes, citada nos capítulos anteriores, auxiliou na concepção projetual do complexo.

Figura 46 – Croqui de estudo. Fonte – Elaboração própria da autora.

Figura 47 – Primeiro estudo volumétrico Fonte – Elaboração própria da autora.

62


Figura 48 – Croqui de estudo. Fonte – Elaboração própria da autora.

63


4.3 - Programa O programa do complexo cultural foi pensado, primeiramente, visando criar um espaço de apoio ao Museu da Imigração que incluísse em seu acervo permanente os novos movimentos migratórios presentes em São Paulo. Paralelamente, foram incluídos usos que trouxessem um maior movimento para a região, além de áreas de permanência que estimulassem o encontro de pessoas. Por fim, foram adicionados usos de caráter educacional que servem de apoio para a Universidade Anhembi Morumbi e aos moradores locais. Como pode ser observado na Figura 49, o programa foi dividido em blocos e possui cinco eixos principais: 1. Centro Cultural – Neste bloco se encontra a entrada principal do complexo, nele estão presentes os usos relacionados às áreas de exposições, um pavimento com salas para workshops e oficinas e um auditório para 150 pessoas. 2. Comércios e Restaurante – Como foi visto, objetivando um maior movimento para a área, foram implantadas áreas comerciais no térreo do complexo. A inclusão do restaurante foi pensada para manter o movimento durante a noite.

64

3. Administração – A administração está localizada no primeiro pavimento e tem sua entrada restrita, não podendo ser acessada pelas escadas rolantes. 4. Passarelas – O programa das passarelas objetivou a diversificação de usos nestes espaços, para que não funcionassem apenas para o fluxo de pessoas. Assim sendo, abrigam recintos que podem servir como ambientes de permanência, observação da paisagem ferroviária e realização de exposições temporárias. 5. Biblioteca - O espaço da biblioteca ocupa o volume mais próximo à Universidade Anhembi Morumbi, abrigando, para além da área de armazenamento de livros, um mezanino com áreas de estudos, acessado através de uma arquibancada que também serve como área de leitura.


Figura 49 – Diagrama de usos. Fonte – Elaboração própria da autora.

Figura 50 – Diagrama de usos em corte. Fonte – Elaboração própria da autora.

65


4.4 - Edificação proposta - Circulação e fluxos O corte perspectivado representado pela Figura 51 foi elaborado com o intuito de elucidar de forma mais clara o funcionamento da circulação vertical principal, realizada através de escadas rolantes. Como pode-se observar pelo desenho, ambos os lados possuem dois lances de escadas rolantes apesar de possuírem três pavimentos a

serem vencidos, isso faz com que a circulação seja mais fluida e rápida para os transeuntes. O primeiro lance do lado esquerdo da edificação passa direto pelo primeiro pavimento, por este possuir um caráter mais privativo, e termina seu percurso no segundo piso, já o lance seguinte percorre apenas um pavimento dando acesso à passarela. Prosseguindo para o lado direito do projeto, o sistema se inverte: o primeiro lance de escadas dá acesso ao primeiro pavimento, onde se encontra o controle de acesso da biblioteca, já o segundo lance percorre dois pavimentos até o piso da passarela.

Figura 51 – Corte perspectivado. Fonte – Elaboração própria da autora.

66


Procurou-se também separar a circulação vertical que dá acesso a passarela da que contempla as áreas expositivas, como revela a Figura 53. Desta forma os pedestres que queiram utilizar a edificação apenas como uma travessia podem fazêlo sem ter que passar por todas as exposições e controles de acesso, tornando o fluxo mais fluido. Todavia, caso o transeunte queira acessar as exposições através do primeiro lance de escadas rolantes também é possível através da passarela de pé direito duplo que conecta os dois volumes.

Já passando para o esquema de fluxos, representado pela Figura 52, o projeto foi pensado para funcionar como uma continuidade linear da Rua Dr. Almeida Lima, assim sendo, o fluxo principal se encontra paralelo a mesma. O outro fluxo encontra-se perpendicular ao eixo principal, mantendo a fruição interna da quadra que já existia.

Figura 52 – Diagrama de fluxos Fonte – Elaboração própria da autora.

Figura 53 – Diagrama de circulação vertical. Fonte – Elaboração própria da autora.

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- Materialidade e relações com o entorno

O projeto proposto tomou como partido a utilização de referências que fizeram parte da construção da identidade e história do bairro do Brás. Como foi discutido nos capítulos 1 e 2, o bairro sofreu um processo de descaracterização com a perda de propósito das edificações industriais que compõem a sua paisagem. A preservação desses símbolos é importante na medida em que fortalece as relações de identidade entre a população residente e o bairro como um todo.

Museu da Imigração, anteriormente também composta por tijolos a vista, fato interessante que foi descoberto somente após a pesquisa histórica da edificação fosse realizada. A Figura 56 mostra a cronologia de modificações feitas na fachada do edifício. Esta descoberta contribuiu para reafirmar a escolha dos materiais presentes no projeto proposto.

Dessa forma, a partir de um passeio pelo bairro através do Street View do Google Maps foram coletadas algumas imagens de edificações industriais presentes no entrono do projeto (Figura 55), para que estas pudessem auxiliar o processo de construção da materialidade do projeto. Como pode ser visto na imagem, as fachadas possuem alguns elementos comuns entre grande parte das edificações, dentre eles a utilização dos tijolos a vista e o vidro como os materiais predominantes, a estrutura parcialmente visível, em alguns casos identificada pela cor branca, e com um ritmo regular e a utilização de formas simples geométricas em sua composição. A última imagem do conjunto de fotos foi a única não retirada do Google Maps e revela a fachada original do

68

Figura 54 – Elementos em comum observados na arquitetura industrial Fonte – Elaboração própria da autora.


Figura 55 – Fachadas das edificações industriais. Fonte – Google Maps e Museu da Imigração. Disponível em: <https:// http://museudaimigracao.org.br/sobre-o-mi/historia>. Acesso em: 20 de jun. de 2020.

Figura 56 – Cronologia das fachadas do Museu da Imigração. Fonte – Disponível em: <https:// http://museudaimigracao.org.br/sobre-o-mi/historia>. Acesso em: 20 de jun. de 2020. Intervenções da autora.

69


A partir do que foi colocado, as perspectivas representadas pelas Figuras 57 e 58, já do projeto consolidado, revelam aspectos da materialidade que se relacionam com a estética industrial do entorno. Os materiais utilizados foram, primordialmente, os tijolos, o vidro e o metal. A estrutura metálica, com pintura em branco, foi mantida vezes parcialmente visível através da transparência do vidro semiopaco, vezes totalmente exposta e segue um ritmo de regularidade no projeto. Os tijolos foram mantidos a vista e estão presentes em todos os volumes propostos. Especificamente na passarela, a intercalação entre painéis de alvenaria exposta e vidro contribuem para que o passeio do pedestre possua mais pontos de interesse, criando jogos de luz e sombra e alternâncias entre opacidade e transparência. O vidro utilizado tem o nome de Uglass e, para além de possuir uma maior proteção solar e sonora, traz uma transparência mais interessante para o projeto, revelando sua interioridade parcialmente. As perspectivas também mostram a relação do projeto com os edifícios do entrono imediato, se encaixando aos vazios proporcionados pelos galpões ociosos retirados e mantendo seu gabarito próximo ao encontrado no restante do bairro.

70


Figura 57 – Vista aérea do projeto (face oeste) Fonte – Elaboração própria da autora.

Figura 58 – Vista aérea do projeto (face leste) Fonte – Elaboração própria da autora.

71


- Plantas, cortes e vistas

Figura 59 – Implantação. Fonte – Elaboração própria da autora.

A-A

C-C

B-B

D-D

Figura 60 – Corte B-B Fonte – Elaboração própria da autora.

749.00

745.50

741.00

72

736.50

732.00

CORTE B-B


Figura 61 – Planta do primeiro pavimento. Fonte – Elaboração própria da autora.

A-A

C-C

B-B

D-D

Figura 62 – Corte A-A Fonte – Elaboração própria da autora.

749.00

745.50

741.00

73

736.50

732.00

CORTE A-A


Figura 63 – Planta do segundo pavimento. Fonte – Elaboração própria da autora.

A-A

C-C

B-B

D-D

Figura 64 – Corte C-C Fonte – Elaboração própria da autora.

749.00 DETALHE 3

745.50

741.00

74

736.50

732.00

CORTE C-C


Figura 65 – Planta do terceiro pavimento. Fonte – Elaboração própria da autora.

749.00

745.50

741.00

736.50

732.00

CORTE D-D

Figura 66 – Corte D-D Fonte – Elaboração própria da autora. A-A

C-C

B-B

D-D

75


Figura 67 – Planta de cobertura. Fonte – Elaboração própria da autora.

76


Figura 68 – Perspectiva explodida Fonte – Elaboração própria da autora.

77


- Estrutura e detalhes

A escolha do sistema estrutural a ser utilizado ocorreu já nos primeiros esboços de concepção do projeto. Em decorrência do vão de 72 metros a ser vencido foi necessário a utilização de um sistema treliçado metálico, material utilizado em todo o restante do projeto. A modulação utilizada no projeto foi de 6.5 metros por 10 metros, assim sendo, foram utilizadas vigas metálicas em perfil “I” de 0.5 metros de altura e pilares em perfil “H” com largura de 0.3 metros. O pré-dimensionamento das estruturas foi feito com base no livro “A concepção estrutural e a arquitetura”, escrito pelo engenheiro Yopanan Rebello. A treliça utilizada na passarela possui 4.5 metros de altura e foi primeiramente pensada sem os montantes verticais. A Figura 69 mostra um ensaio feito para a disciplina de Experimentação comparando dois tipos de treliça: uma delas com os montantes verticais e outra sem. O resultado obtido a partir de um teste de cargas foi de que a treliça com os montantes aguentou cerca de 50% mais cargas até alcançar o seu rompimento. Isso fez com que se optasse pela utilização das barras verticais no projeto.

78

Figura 69 – Treliças já rompidas utilizadas no ensaio. Fonte – Arquivo pessoal.

Foram elaborados três detalhes construtivos. Como pode se observar na Figura 70, a treliça proposta para a passarela também contou com dois tipos de fechamento: em vidro e em alvenaria de tijolos. Tal escolha se deu pelo fato de a passagem aérea estar muito próxima à passagem de trens, que causam muitas vibrações e ruídos. Neste detalhe também é possível observar a solução encontrada para as aberturas na treliça que dão acesso aos balanços de observação da paisagem: a treliça atua como uma estrutura mista, nestes pontos em que as diagonais foram retiradas funcionando como uma viga vierendeel. Para isso, foi necessário dobrar o raio dos montantes em perfil tubular.


FECHAMENTO EM UGLASS PERFIL METÁLICO TUBULAR R=0.50 M

LAJE STEEL DECK

ALVENARIA DE CERÂMICA

DIAGONAL (ANGULAÇÃO 45º)

MONTANTE (H=4.50 M)

BANZO INFERIOR

DETALHE 2 - PASSARELA

Figura 70 – Detalhe da treliça. Fonte – Elaboração própria da autora.

79


A Figura 72 mostra o detalhe da fachada, como já foi colocado um dos materiais utilizados foi o Uglass, que consiste em um sistema de vidros em formato de U que se encaixam entre si, possuindo diversas configurações diferentes (Figura 71). A configuração utilizada no projeto foi a de dupla camada, por possuir uma proteção solar e isolamento acústico mais elevados. As placas de vidro possuem 250 milímetros de comprimentos e 4.5 metros de altura e são encaixadas entre si a partir de um selamento de silicone.

PLATIBANDA PISO PROTEÇÃO MECÂNICA REGULARIZAÇÃO FIXAÇÃO

PERFIL METÁLICO “H”

U GLASS

PISO LAMINADO

CONTRAPISO

LAJE STEEL DECK PERFIL METÁLICO “I”

Figura 71 – Tipos de configurações do Uglass. Fonte – Disponível em: <https://www.uglass.com.co/instalacion-en-divisionesy-fachadas.html> Acesso em: 02 de jul. de 2020. DETALHE 2 - FACHADA

Figura 72 – Detalhe da fachada. Fonte – Elaboração própria da autora.

80


Por final, a Figura 73 mostra a solução empregada no pilar em arvore que apoia um dos lados da passarela. Foi utilizada uma base de concreto, juntamente com perfis

tubulares metálicos soldados às vigas. O pilar proposto procurou se adaptar as formas triangulares já utilizadas no restante da edificação através das treliças. TRELIÇA METÁLICA

LAJE STEEL DECK PERFIL METÁLICO “I” LIGAÇÃO VIGA-PILAR

PERFIL METÁLICO TUBULAR

LIGAÇÃO ARTICULADA

BASE DE CONCRETO

DETALHE 3 - PILAR Figura 73 – Detalhe do pilar. Fonte – Elaboração própria da autora.

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- Renders

ELEVAÇÃO 2

Figura 75 – Elevação (face oeste) Fonte – Elaboração própria da autora.

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Figura 74 – Render do projeto. Fonte – Elaboração própria da autora.


Figura 76 – Render do vazio interno da quadra. Fonte – Elaboração própria da autora.

ELEVAÇÃO 1

Figura 77 – Elevação (face leste) Fonte – Elaboração própria da autora.

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Figura 78 – Render da entrada da biblioteca. Fonte – Elaboração própria da autora.

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Figura 79 – Render do projeto. Fonte – Elaboração própria da autora.

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Figura 80 – Render da passagem aérea. Fonte – Elaboração própria da autora. Figura 81 – Render da passarela com pé direito duplo. Fonte – Elaboração própria da autora.

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5. Considerações finais O presente trabalho objetivou trazer à tona a discussão acerca do processo de perda de identidade que o bairro do Brás sofreu a partir do século XX e sugerir uma solução materializada através de um projeto urbano e arquitetônico. Através de intervenções simples, o projeto urbano buscou a reativação de um território descaracterizado e ocioso. Apesar de apresentar uma proposição delineada especificamente para o recorte escolhido, o processo metodológico seguido para chegar até uma proposta projetual pode servir como base para auxiliar futuras novas intervenções em outros territórios com outras configurações. O projeto descrito fez parte de um processo de pesquisa. É a concretização de uma série de leituras, estudos e análises e, neste sentido, a pesquisa realizada possui o mesmo peso que as propostas em si.

As problemáticas presentes no Brás, contempladas por este trabalho, como a ociosidade de edifícios históricos, a presença de barreiras urbanas no território e a perda de identidade de bairros antigos da cidade não são exclusivas à área de intervenção, estão presentes em outras regiões não apenas de São Paulo como do mundo. Dessa maneira, o trabalho realizado buscou contribuir para a discussão da temática, possibilitando que novas intervenções sejam pensadas a partir de uma metodologia que considere a história e entorno dos territórios.

Os estudos acerca da história do bairro, assim como as análises urbanas e leituras teóricas, assumiram um papel de extrema importância na medida em que auxiliaram diretamente o fazer projetual e definiram um partido a ser seguido.

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