Os homens (errados) da minha vida
1
De todas as coisas, eu espero que você p as, eu espero que você permaneça em que você permaneça em mim. De todas maneça em mim. De todas as coisas, eu mim. De todas as coisas, eu espero que todas as coisas, eu espero que você perm coisas, eu espero que você permaneça em eu espero que você permaneça em mim espero que você permaneça em mim. espero que você permaneça em mim. D espero que você permaneça em mim. D eu espero que você permaneça em mi coisas, eu espero que você permaneça todas as coisas, eu espero que você perm mim. De todas as coisas, eu espero que maneça em mim. De todas as coisas, eu que você permaneça em mim. De tod coisas, eu espero que você permaneça mim. De todas as coisas, eu espero qu você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você
permaneça em mim. De todas as coismim. De todas as coisas, eu espero as coisas, eu espero que você perespero que você permaneça em você permaneça em mim. De maneça em mim. De todas as m mim. De todas as coisas, m. De todas as coisas, eu De todas as coisas, eu De todas as coisas, eu De todas as coisas, im. De todas as em mim. De maneça em você perespero das as em (errados) ue
Os homens da minha vida
De t o das as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. 3 De todas as coisas, eu espero que você
Capa Marina Carvalho Pelorca Foto da capa Virginia Mesquita Revisão Jéssica Rezende Projeto Gráfico e Diagramação Marina Carvalho Pelorca Imagens Mariana Caldas / poeme-se
Os homens (errados) da minha vida
Sumรกrio 09 O Primeiro
13
O Desconhecido
17
O Dominador
29
O Desencanado
35
O do Tinder
41 O Modelo barman
49
O Louco da rua
57
Os descendentes de italianos
69
O Ruivo tatuado
77
O Editor
“Amores serão sempre amáveis”. (Chico Buarque)
O primeiro
Para escrever sobre os caras da minha vida, acho justo começar pelo primeiro. E não considero o primeiro aquele que tirou minha virgindade, mas o que me beijou pela primeira vez. O feinho, do ensino fundamental, que também era o meu melhor amigo, ex de uma amiga e paixãozinha de outra.
eu pode
r
crever página s ia es
udou a minha vida m e l e páginas sobre como e
...e como foi perturbadora nossa história no colégio, digna de um roteiro da Malhação. Contudo, o que acho mais relevante no primeiro cara é o que ele realmente significa para uma garota como eu. Foi com ele que eu comecei a ser mais vaidosa, me achar bonita e desejada. Mesmo com apenas 12 anos, o primeiro me despertou para uma realidade que eu não conhecia até então. Essa sensação de se apaixonar, de sentir ciúmes, medo de ser trocada e traída, e tudo o mais que faz parte de um relacionamento amoroso. Meu primeiro beijo foi horrível, ainda que eu gostasse tanto dele. E naquele momento eu pensei: “Por que as pessoas fazem isso? É nojento”. Mas eu queria agradá-lo, queria que ele gostasse de mim, então continuei beijando-o da melhor maneira que pude. Escrevi diversas cartinhas de amor. Conheci seus pais, sua casa, sua família. Virei madrugadas conversando com ele na internet. Algumas vezes até o acompanhei ao ponto de ônibus 99
depois da aula, e fiquei olhando enquanto ia embora. Foi com ele que fiz os primeiros planos sobre casamento e filhos. Senti pela primeira vez como era acariciar a pele e os cabelos de um homem. Me senti mais mulher por causa disso. Ele nunca colocou as mãos por baixo da minha blusa, ou tocou nos meus seios, e mesmo assim me fez sentir como se estivesse vivendo o romance mais completo, mais adulto do mundo. E eu não podia desejar nada além daquilo, pois eu não conhecia nada além do que ele me mostrava. Por muitos anos eu ainda desejei que ele fosse o último cara, aquele com quem depois de anos eu iria me reencontrar, casar e viver feliz para sempre. Afinal, primeiros amores servem pra isso não? Nos dar esperança em momentos de desespero e solidão.
Quando todos os homens são os homens errados... ...imaginar que sua vida está predestinada àquele amor de infância é bem consolador. Entretanto, não é real. Serei sempre grata por ter tido um primeiro tão especial, que me presenteou com pérolas para eu rir e recordar por toda a vida. Que me ajudou nos primeiros passos por essa estrada estranha dos relacionamentos amorosos.
10
11 11
“Seu eu não tenho a chave para abrir seu coração, espero bêbado, sentado na porta”. (Bruno Fontes)
O desconhecido
e Conv rsamos um pouco e nos beijamos. Juntos, beb
É uma péssima maneira de “nomear” aquele com quem perdi a virgindade. Mas vou mentir pra quê? Ele era e ainda é, depois de 7 anos, um completo desconhecido. Sei apenas seu primeiro nome. E ele certamente nem faz ideia que “tirou” minha virgindade. À todos que conto essa história há sempre duas únicas reações: 1- Não acredito, que louca! Como você fez isso? (Com tom de indignação e revolta); 2- Não acredito, que louca! Como você fez isso? (Com risadas e parabenizações do tipo “você é foda”). Era a cervejada do cursinho, abril, eu estava no primeiro colegial. Ir nessa festa era como meu propósito de vida. Não tinha nada mais que eu pudesse querer. Então menti para a minha mãe. Disse que ia dormir na casa de uma amiga que na verdade ia na festa e, escondida, fui com ela. Encontramos alguns conhecidos lá, mas a maioria do pessoal era de outras escolas e não conhecíamos quase ninguém. Então esse cara veio até mim. Bonito, cabelos e olhos escuros, alto, corpo definido, peitos e costas largos.
e mo s muita cerveja e algumas doses de vodka. 13
Estava me sentindo a pessoa mais incrível do mundo, descolada e popular, naquela festa no quintal da casa de alguém. Ele me chamou para ir lá fora, onde não estava tão lotado nem fazia tanto barulho para conversamos. Saímos na rua e encostamos no carro estacionado à casa ao lado. Sentei no capô enquanto falávamos. Começamos a nos beijar. Senti coisas até então desconhecidas. Ele apertava cada parte do meu corpo como se quisesse arrancar um pedaço, e fez o convite: - Vamos pro motel? - Pro motel? Não, eu não posso sair daqui, eu tenho que ir embora com a minha amiga. - Mas eu te trago de volta. Vamos, por favor, não estou conseguindo me segurar. - Não, eu não posso. Vamos voltar pra festa. O empurrei, mas ele tomou minhas mãos e voltou a me beijar. Estava tão escuro que eu mal conseguia enxergar seu rosto. Aos poucos voltamos àquele estado de excitação máxima. Ele ainda me perguntou uma última vez, sussurrando, se eu realmente não queria ir pro motel. Respondi que não e, como quem diz à si mesmo,
ele falou bem baixinho: “Então vai aqui mesmo”. E assim, sem me dar conta do que estava preste a acontecer, eu o deixei desabotoar minha calça, me deitar no capô daquele carro e entrar em mim. Foi a dor mais aguda que eu senti na minha vida. Pensei por um momento que estava sendo dilacerada. E o que pareceu uma eternidade, deve ter durado uns 5 minutos. Apenas o 14 14
tempo do alarme do carro disparar e nos fazer levantar rápidos e assustados, olhando em volta com medo de alguém estar vendo. Percebemos então que havia uma câmera, bem acima de nossas cabeças, e a inscrição: consultório de psicologia. Voltamos para a festa rindo de tudo aquilo. Quando finalmente fui embora com minha amiga, lembrei que não tínhamos nem trocado nossos números de telefone. Nunca o tinha visto antes e nunca mais voltei a vê-lo. Essa definitivamente não é a primeira vez que toda garota sonha, mas para mim funcionou. Se não fosse assim, talvez não fosse de nenhum outro jeito. E desde então eu defendo que só há duas maneiras de se perder a virgindade: com um namorado carinhoso de longa data, ou com um completo desconhecido que você nunca mais vai voltar a ver.
15
“Porque assim como o café, o amor não serve frio”. (Desconhecido)
me tr
at a pelo jeito q ue
e
le
Raiva
e tr ata
O dominador
apaixonada pelo jeito que ele m e t oluntariame n v n i e
Esse é o C. Um cara bem apessoado, corpo definidinho, com umas pintas charmosas espalhadas por aqui e ali, pele macia e lisinha. Nos conhecemos na rua em um sábado à noite. Eu estava com uma amiga e ele com mais três caras. Nossos olhares se cruzaram, rolou um flerte. Continuei andando e cochichei para minha amiga: - Você viu o grupinho que acabou de passar? Nada mal né? Rapidamente ela virou a cabeça para trás. - Onde? E a brecha estava dada. Eles também estavam olhando para trás e começaram a andar em nossa direção. Mas apenas dois nos interessavam: o C. e o amigo alemão dele. Conversamos um pouco sobre o que estávamos programando para aquela noite. Eles queriam ir para a Virada Cultural, uma pista de música eletrônica no centro da cidade. Nós avisamos que era furada e os chamamos para a Augusta. Eles insistiram na pista eletrônica, então eu insisti para que trocássemos nossos telefones, assim, quando se arrependessem de não terem ido com a gente, ainda poderiam nos encontrar. Depois de muitas cervejas, uma caipirinha, e umas doses de alguma cachaça, meu celular 17 17
apitou no terraço de um barzinho na baixa Augusta. Uma mensagem do C., avisando que ele e seu amigo gringo estavam indo nos encontrar. Demoraram, demoraram e quase se perderam, enquanto eu rezava para que os 5% restantes da bateria do meu celular não acabassem nunca. Quando chegaram, minha amiga soltou seu inglês perfeito pra cima do gringo e o fisgou na hora. Comigo foi um pouco mais devagar. Lembro até que demoramos para nos beijar, enquanto ele contava sobre suas viagens para a Austrália e Tailândia. Viramos mais umas doses de alguma outra cachaça e no fim da noite eu já estava bem tonta. Fizemos todo o trajeto da volta abraçados. Estávamos subindo a Augusta, umas 3h da manhã, quando ele soltou a pergunta clássica:
-E
agora, pra onde vamos?
Eu, como uma boa menina, respondi: - Pra minha casa. Tem uma cama de casal enorme, quentinha e macia que cabe nós dois. Não havia uma tática ou estratégia de conquista na minha cabeça aquela hora. Meu único pensamento era: “E se eu não vê-lo nunca mais? A única oportunidade de ficar mais tempo com esse cara pode ser essa. Arrisco ou deixo escapar?”. E para esses pensamentos, o velho ditado “quem não arrisca não petisca” sempre me encoraja. De todas as vezes que ficamos juntos, essa com certeza foi a melhor. Foi uma química, uma sintonia, espontânea, natural. Um pouco alcoolizada, é verdade, mas que eu chuto dizer que jamais senti outra igual. 18
Tudo se encaixava, os gestos, os movimentos, o ritmo. Como numa dança, ele me conduzia de tal maneira que eu parecia uma boneca manuseada pelas suas mãos. Depois, me puxou e dormiu abraçado comigo pelo resto da madrugada. De manhã, acordei e afastei um pouco seu corpo do meu. Ainda dormindo, ele esticou suas pernas à procura das minhas e as entrelaçou. Me senti amada por um homem que, praticamente, não conhecia. A primeira mensagem que ele me mandou no dia seguinte foi: - Posso falar? Sua boca é uma delícia. Nem dava pra acreditar. Deus! Como eu consegui encontrar esse homem na rua? Era bom demais.
do, e s
n ria
té
o, es friand e s
ef
A
q
do isso f u t oi ue
u um icebe o n rg. or et
Nos encontramos pela segunda vez durante a semana num barzinho na Paulista. Chamei uma amiga para fazer um happy hour e isso serviu de desculpa pra convidar o C. Ele já estava com um amigo num bar ali por perto e disse que iria nos encontrar. Formamos um belo par de casais e tudo ia bem até que, em determinado momento, eu me dou conta que o C. estava interessado pela minha amiga! E, ainda que discretamente, começou a cantar ela. No fim do bar, o amigo dele nos chamou para ir à sua casa, a dois quarteirões dali. Eu, como era de se esperar, topei na hora, mas 19 19
uere r.
po di aq
do q
ia e n ue eu pod ão
minha amiga desconversou, inventou uma desculpa e foi embora. Restando apenas três de nós, disse que também iria pra casa, mas eles insistiram no convite. - Gente, agora somos apenas três, o que vamos fazer em três pessoas? Não dá pra fazer nada. E o amigo do C. respondeu: - Calma, nós vamos beber ué, e conversar. Dei risada e caminhamos até sua casa. Nesta noite, ficou provado para mim que tudo aquilo que você pensa ser um diferencial em você, qualidades, talentos, que aumentam sua moral perante os outros, podem simplesmente não significar nada para quem não está prestando atenção. Quero dizer, quando chegamos na casa do amigo, bebemos e bebemos. Conversa vai, conversa vem, falamos sobre arte e eu contei que desenho. Mostrei algumas fotos: - Uau! Você é muito boa mesmo! Devia trabalhar com isso. Mais um tanto de conversa com o amigo, e eu: - Jura? Você toca violão? Eu também toco! Então ele buscou o violão e me pediu para tocar alguma coisa. Com muita relutância eu aceitei, e depois me envolvi tanto com o som que nem lembrei dos dois homens que estavam ali me observando. Quando terminei, levantei os olhos e os vi boquiabertos. O amigo me cobriu de elogios e eu pensei que havia conquistado o C. de novo, surpreendendo-o com esse lado diferente que ele desconhecia. Mais tarde, acabamos dormindo juntos lá mesmo, na casa do amigo. E novamente o C. fez tu 20 20
Puxou meu cabelo até doer, me deu uns tapas que arderam de verdade e me virou e revirou do jeito que queria. Terminamos, ele foi ao banheiro. Quando voltou, era minha vez: - Ei, dá pra eu sair sem roupa? Tem alguém no corredor? - Não, tem ninguém não, pode ir. Abri a porta e vi de relance o rosto do amigo, deitado sozinho na cama do quarto à frente. - Porra C.! Olha seu amigo ali deitado, ele quase que me viu nua! Eu te perguntei, poxa. Silêncio. Nem se deu o trabalho de me responder. Não dormimos de conchinha essa noite, nem abraçados nem nada. Na manhã seguinte, acordei cedo e me troquei pra ir embora. Enquanto me vestia, percebi que estava apenas com um brinco. O outro devia ter se perdido na cama. Procurei por cima, mas era difícil com ele ainda dormindo. Antes de sair, então, o observei. O rosto tombado e pressionado sobre o travesseiro parecia ligeiramente torto e caído. Do lado esquerdo do peito, a tatuagem brega, porém charmosa, dizia “Proud to be”. No braço direito, o tribal maori cobria uma faixa dos músculos. Gostaria de ter gritado:
- Seu babaca! Levanta! Demonstra alguma consideração por mim! 21
Em vez disso, apenas me aproximei, dei um beijo em seu rosto e pedi para procurar meu brinco quando acordasse. Sonolento, ele falou: - Ta bom, pode deixar, vou procurar. Depois desse dia, a única desculpa que eu tinha para vê-lo era o tal brinco, que ele encontrou e guardou. No início eu escrevia: - Oi C. tudo bom? Então, será que tem como me entregar o brinco essa semana? Passa lá em casa. E após algumas semanas, dizia simplesmente: “C.? Meu brinco?”. O cara era um babaca, mas criou um domínio sobre mim inexplicável.
Por mais que eu me vigiasse e tentasse me controlar para não procurá-lo, acabava cedendo. E certa sexta-feira, com o encorajamento de algumas cervejas num bar, mandei uma mensagem. Ele disse que me encontraria em casa, e lá eu fui esperá-lo. Peguei no sono e acordei com ele tocando a campainha. De calça jeans, sem blusa e sem sutiã, abri a porta pra ele resmungando: - Você demorou, heim. - Você estava dormindo? - Estava. Virei as costas e na escuridão andei de volta ao meu quarto. 22
As lembranças desse dia são apenas borrões, flashs, de cenas que não sei se vivi ou sonhei. A única realmente clara em minha memória é a sombra de sua silhueta contra a luz da janela, a luz que vinha da lua e dos prédios lá fora. As costas levemente curvadas, com os quadris inclinados para frente e os músculos do abdômen sendo cobertos por uma camiseta. Não podia enxergar seu rosto, mas sabia que ele estava se vestindo e indo embora. Ele percebeu que eu estava observando e justificou: - É que eu acordo cedo amanhã. Tenho um compromisso bem cedinho. - Sinta-se à vontade pra ir embora. Virei de costas para o outro lado da cama, fingindo que não ligava. Ele se inclinou e me deu um beijo no rosto de despedida. Sem me virar, com sinceridade e certa frieza, deixei escapar:
- Eu gosto de você. Ele retribuiu: - Também gosto de você. Algumas semanas depois voltei a cobrar meu brinco e, após mais algumas semanas, sou surpreendida ao chegar tarde em casa e receber a notícia do porteiro: - Alguém chamado C. passou aqui te procurando. Avisei que você não estava em casa. - E ele deixou alguma coisa pra mim, um brinco? - Não, ele não deixou nada não. Perguntei a ele se tinha mesmo passado em casa e se deixara meu brinco. Sim, havia passado, disse, mas não falou sobre o brinco. 23
- Bom, da próxima vez avisa, eu não estava em casa. Mas passa outro dia. - Depende - Depende do que? - É que eu passei pra te visitar também... - Hm, acho que entendi o que você quis dizer. Bem, avisa que eu fico te esperando. E pela primeira vez ele ainda tentou dar continuidade à conversa, dizendo que queria “fotos do que estava perdendo”. Aí mandei ele dormir. Mas eis que hoje ele veio aqui. Eu o tive em minhas mãos, em minha cama, com o seu perfume impregnando meus travesseiros.
Toquei em seus cabelos, em suas tatuagens, e... ...até descobri uma pinta nova, tímida, escondida num lugar improvável. E novamente ele foi embora. Dessa vez, pelo menos, devolveu meu brinco.
24
25 25
Quando for fazer amor
FAÇA
NU
Tire os diplomas
O S TAT U S Sucesso profissional Suas etiquetas de grife Tire a chave do carro Os cartões de crédito
TIRE TUDO Até sobrar a deliciosa apimentada humanidade. Zack Magiezi
“E se o silêncio nos dominar, amor, me beije”. (Desconhecido)
O desencanado
Pass a
Mais uma vez eu estava lá, sem saber direito o que queria, na dúvida entre ouvir o meu desejo e o que me ensinaram ser o certo - me “preservar”. E como em todas as outras vezes, minha pele gritou mais alto e venceu os argumentos da razão. E lá estava ele, deslizando suas belas mãos pela minha cintura e tirando minha blusa delicadamente para logo em seguida jogá-la ao chão. O que eu poderia fazer? Como resistir a uma pele cheirosa, a um pescoço que parece suplicar pelos meus beijos, a fios de cabelo macios e dourados? O único problema foi eu desejar ter isso todos os dias para mim. Esse homem, todos os dias só para mim. E logo me dei conta que, além de não poder tê-lo todos os dias, só meu ele nunca seria. Enquanto algumas atitudes masculinas são fáceis de interpretar, outras ainda me desafiam por completo. Quero dizer, eu o conhecei totalmente por acaso, e fugi, deixei de atender suas ligações várias vezes. Mas ele sempre voltou.
se ram-
meses, e novamente e le ressurgiu das cinzas,
como se estivesse por perto e nunca tivesse ido embora. Porque de fato é isso que ele mais faz: ir embora. Ir embora para Pudente, para Goiânia, para o Paraná, para o Rio... e para trezentas outras cidades que não são nenhuma das duas onde eu moro. E me intriga justamente: por que voltar? Algumas vezes, eu já tinha até 29
excluído seu número da lista de contatos, quando meu celular tocou e era ele ligando. Agora, chegamos àquele estágio que dá dó ter que permanecer distante: o estágio da intimidade. Aquele quando você já não fica tão nervosa pensando em coisas inteligentes para dizer, ou preocupada com a maquiagem e boas maneiras de se comportar. Você pode, inclusive, soltar um arrotinho discreto que ele nem vai notar. Conhecer outro cara e precisar passar por todos os estágios até aqui... Que preguiça! Sem falar que ele possui várias das minhas qualidades preferidas e que eu julguei nunca conseguir encontrar num mesmo homem. Nada demais, algo como meio louro, com uma barba mal-feita bem-feita, corpo magro com músculos e veias bem marcados, coberto por pequenas pintas. Que me surpreende com pequenos gestos, presta atenção e se lembra de tudo o que eu digo. Se veste bem, mora sozinho, tem carro, e elogia – sem saber – alguns detalhes do meu corpo que eu sempre considerei defeitos. Mas ele também tem suas falhas, como parecer um “bicho-grilo” de vez em quando, fumando um baseado atrás do outro e simplesmente não querer nada “fixo” ou “frequente” comigo. Quando eu conheci o E. foi uma faísca de 2min. Era final da festa, eu estava de saída.
Olhei para ele e pensei:
“por que não vi esse cara antes?”. 30 28
Cutuquei minha amiga e fizemos alguma gracinha que chamou sua atenção. Depois, bastou uma mera apresentação e estávamos nos beijando. Eu disse que precisava ir, ele pediu meu telefone. A partir daí começou uma longa e engraçada odisséia dos nossos (des)encontros. Ele, me fazendo convites em datas que eu nunca podia ir, e eu, procurando-o sempre no final das noites, quando percebia que ficaria sozinha ou precisaria de uma carona para voltar pra casa. Assim, duas vezes ele cruzou a cidade só para ir me encontrar na casa de uma amiga, passar um tempo comigo, interagir com a galera e em seguida me levar embora.
Só que ele namorava. É.
Namorava
E estava traindo ela comigo. Um ponto negativo. Porém, resolveu jogar limpo e me contar isso em primeira mão – o que é por si só um ponto positivo que anula o negativo anterior. Mas eu não queria me submeter a tal situação. Uma vez na posição da “outra” e eu seria sempre a segunda opção. Então me afastei. Parei de atender suas ligações e o ignorei por um bom tempo. Claro que eu tive vontade de procurá-lo, mas outras coisas ocuparam minha cabeça – e meu coração também – e acabei acreditando que isso era um ponto final, fim do caso. Meses depois, eu estava de bobeira algum 31
dia da semana na capital, quando ele me ligou. Tão natural, disse simplesmente: “E aí, tudo bom? Vai estar aqui no fim de semana? Vamos sair e tomar uma cerveja”. Já não estava mais namorando, então nos encontrávamos, saíamos três ou quatro vezes no mesmo mês, até chegar a hora de ele ir embora. Após meses, me ligava novamente e a situação se repetia, como se nunca tivéssemos perdido o contato. E isso eu preciso deixar bem claro, foi sempre ele quem me procurou, o que me faz sentir menos culpada por pensar em procurá-lo agora. Porque afinal, o que interessa num relacionamento? “Juntar meu corpo, teu corpo, num corpo só”, como já dizia Maria Rita. E devo ressaltar que isso não é fácil. Aliás, é extremamente difícil encontrar um corpo que junto do seu se torne um corpo só. O E. foi embora de novo. Dessa vez, por uns dois ou três meses. Mas eu sei que ele volta,
ele
32
sempre volta
.
31 33
“Porque a vida só se dá pra quem se deu”. (Vinícius de Moraes)
O do tinder a ma nei
. a nele v a t s go s i a de falar, eram as coisas que eu m ra
e
A voz
Tinha um olhar firme, fixo, com uma expressão séria e adulta. Até sua risada parecia séria, meio comedida e meio tímida, coisa de galã. O L. era um cara especial. Gostava de conversar e divagar sobre a vida. Chegamos a passar noites inteiras falando e falando, sem trocar um beijo sequer. Era como se ele preferisse separar as coisas, guardando os carinhos íntimos sempre para o fim, quando já tínhamos dito tudo o que tínhamos pra dizer. Nos conhecemos por meio de um aplicativo de celular, o Tinder. Após algumas semanas trocando mensagens, finalmente nos encontramos. Era segunda-feira, eu disse que estava em casa, entediada. Ele propôs irmos a algum bar, mas eu também não estava afim de sair. Sem problemas, ele disse: -Eu pego as cervejas e vou pra aí. Gostei da ideia, mas fiquei com medo. Pra confirmar se ele não era nenhum louco psicopata, pedi a uma amiga para “fuçar” em seu perfil nas redes sociais, ver se tinham amigos em comum ou outra coisa, já que estudavam na mesma faculdade. Confirmado isso, dei sinal verde pra ele vir. Pediu para que fosse esperá-lo na portaria, pois não queria correr o risco de errar o prédio. Assim, a primeira boa impressão foi causada enquanto ainda estacionava, um Veloster que fez 35
meu lado “maria-gasolina” vibrar de alegria. Mas quando ele saiu do carro, meu coração bateu mais forte. Gostei muito do que vi, muito mesmo. Moreno, com traços delicados, os olhos caramelos esverdeados e sorriso lindo. Era sorte grande. Ele chegou carregando uma caixa de papelão abastecida com seis long necks e uma garrafa de vinho. Subimos para o apartamento e começamos a beber. O papo fluía naturalmente, um assunto se emendava no outro sem intervalos. Parávamos apenas para ir buscar mais cerveja na geladeira. A certa altura, pedi licença para ir ao banheiro. Quando saí, ele estava de pé, parado, encostado na porta do meu quarto. Me aproximei, ele me beijou. Em seguida abrimos a garrafa de vinho, e apenas duas taças depois ele disse que estava com calor:
-Nossa, esse vinho deu um calor!
Você não se importa se eu tirar a
camiseta, né?
Num piscar de olhos, lá estavam eles, os gominhos do abdômen mais lindo e definido que eu já tinha visto. -Puta merda L.! Assim é apelação demais. Ele riu, me puxou e começou a me beijar. Na minha cabeça, as palavras “puta merda, puta merda!” continuavam se repetindo. Seguidas por “eu preciso ser forte, eu preciso resistir”. Mas não consegui sequer parar de deslizar a mão por aquele corpo todo malhado. 36 34
Questão de minutos, e quem estava sem blusa agora era eu. Terminamos o vinho assim, entre beijos e amassos, até finalmente nos despirmos das outras peças de roupa e deitar na cama. O cara era forte. Os músculos dos braços, das pernas, eram todos definidos, torneados, duros. A pele sem pêlo nenhum parecia de uma criança. E o seu gemido era tão estranho que me fazia querer gargalhar. Eu sabia que, por ter rolado na primeira noite, era provável ele não me procurar de novo. Mas continuamos conversando nos dias seguintes e combinamos de sair uma semana depois. Fomos em um barzinho perto da casa dele. Entre as duas cervejas que tomamos, conversamos sobre relacionamentos, namoros, conhecer pessoas novas. Falei da minha “preguiça” de sair com novos caras. De como acho mais fácil quando é com alguém que já me conhece e tem um mínimo de intimidade comigo, em que não rola aquele silêncio constrangedor. -É, você está certa, é mais fácil. Mas eu adoro conhecer pessoas novas. Quero dizer, olha nós dois aqui, estamos nos conhecendo ainda, é a melhor parte. Depois vai ficando chato e me cansa. Aliás, eu me canso muito rápido das pessoas, viu? Acho que é um dos meus defeitos.
O recado estava dado: logo menos ele se cansaria de mim. 37
Saímos dali e fomos para sua casa, um apartamento que dividia com o irmão mais velho, muito simpático por sinal. Como o L. gostava muito de vinhos, logo que chegamos ele abriu uma garrafa. Ficamos na sala por horas conversando, na companhia do irmão inclusive. Quando ele foi dormir, a conversa diminuiu o ritmo. Nos apoiamos na janela para ver a vista e, talvez por culpa da noite, das luzes, ou do vinho, nos tornamos mais reflexivos nesse momento. Compartilhamos ideias sobre o sentido da vida, sobre a necessidade do trabalho, sobre pessoas que são infelizes e não fazem nada. Soltei um bocejo. - Calma que daqui a pouco eu faço esse sono ir embora. Terminamos o vinho e fomos para o quarto. Novamente me espantei com a beleza do seu corpo, com a força dos seus músculos. E enquanto a cama ia sendo arrastada para longe da parede, eu tive a certeza de que nem seu irmão no quarto ao lado, nem o vizinho do andar de baixo estavam conseguindo dormir. Seus pais ia chegar bem cedo no dia seguinte, então ele se apressou em me levar embora assim que terminamos. A partir daí, fomos parando de nos falar. Quando eu tentava puxar conversa, ele dava respostas sucintas e monossilábicas que encerravam o assunto. Nos vimos pela última vez em uma festa de faculdade. Nesta noite, ele me pareceu um cara baixinho e carrancudo, sem o encantamento que antes me chamava a atenção. Nas vezes que nos esbarramos, ele parecia estar sempre sozinho, perdido. E quando 38
seu olhar cruzava o meu, demonstrava alívio de finalmente ter encontrado aquilo que procurava. Já no fim da festa, me chamou para ir à sua casa. Aceitei. Este foi seu último convite. Eu sabia que ele ia se cansar mesmo, só lamentei ter sido tão rápido.
37 39
“Você nunca será meu, e por isso terei você para sempre”. (Paulo Coelho)
O modelo barman
O W. era barman de uma balada. “Lindo” o define bem. Cabelos louro escuro, com o maxilar marcado, olhos cerrados, lábios sobressalentes e bem desenhados. Usava um quepe de marinheiro como uniforme, tornando-o ainda mais charmoso. Tomei o cuidado de ser atendida por ele todas as vezes que fui buscar bebida. Mas meus olhares indiscretos não surtiam efeito nenhum, ele simplesmente me ignorava. Estava dançando na pista com uma amiga, em um lugar onde podia ficar de olho no bar. Flagrei-o num olhar rápido e nervoso em minha direção. Olhei de volta por um bom tempo, em vão. Não olhou mais. Irritada com tanto descaso, comecei a falar sobre ele para a minha amiga, apontando e gesticulando. Passava o dedo na ponta do nariz, num gesto indicando que ele era “nariz empinado”, metido e cheio de si.
Lá pelas 5h tomei coragem para escrever um bilhete no guardanapo: - Te achei lindo, mas também acho que você é gay. Caso nao seja, me liga! E anotei meu número. Segurei o papel na mão até finalmente encontrar uma brecha para entregá-lo. Sabia que se desse diretamente para o W. ele jogaria fora sem nem ler. Decidi então entregar para a 41
faxineira que estava limpando o balcão. Ela estava prestes a pegar o bilhete quando outro barman apareceu, curioso pra saber o que estava escrito e para quem era aquele pedaço de guardanapo. - Para o barman mais gay deste lugar. Respondi. - O W.? Ele retrucou, e fiquei feliz por saber que mais alguém compartilhava da mesma opinião que eu. Em seguida tomou o papel da minha mão e começou a ler. Riu. - Por que você não entrega isso direto pra ele? - Ah ele é todo sério, não me dá moral nenhuma. - Espera aí. Para minha surpresa ele foi até o W., dizendo que tinha uma garota no balcão afim de trocar uma ideia. Com ar de “sacho cheio”, ele veio até mim, bem grosseiro, perguntando o que eu queria. Nesse momento tive a certeza de que não tinha a mínima chance. - Calma, eu só estava dizendo pro seu amigo o quanto te achei bonito, mas que você deve ser gay e tal, o que é uma pena, mas eu super entendo.
A princípio ele me olhou bem
sério,
depois acabou deixando escapar um
42 40
o.
s
orris
Conversamos e disse que eu parecia ser uma garota legal, mas que sabia que não tínhamos nada em comum. Ele curtia um reggae, um beck, e essa com certeza não parecia ser minha praia. - Poxa, eu acho que você está me subestimando, precisa me conhecer melhor. Fez olhar de desconfiado, meio de canto de olho, então finalmente cedeu. Pediu para eu espera-lo até o final de seu expediente, que seria dali 30 minutos, às 6h. Meia hora depois ele saiu do balcão e foi ao banheiro tirar o uniforme. Passou por mim na pista de dança, deu um tapinha no meu ombro e... foi embora. Sim, embora. Fiquei incrédula. Minha amiga, sempre muito otimista, sugeriu que talvez eles estivesse do lado de fora, me esperando. Mandou eu ir atrás. Eu fui. Cheguei lá fora e não o encontrei. “Foi embora mesmo”, pensei. Me virei e de repente o vi ali, sentado na sarjeta da calçada fumando um cigarro. Caminhei na sua direção, ele levantou. Trocamos algumas palavras e perguntei se ia para casa ou estava animado para fazer alguma coisa. - Não sei, podemos fazer algo. Ir para a sua casa talvez, pode ser? - É, pode ser. No táxi ainda continuou quieto e monossilábico. Já em casa, aos poucos, foi se soltando e se transformando numa pessoa completamente diferente.
Vimos os primeiros raios do sol na janela, 43
depois fechamos as cortinas e começamos a nos beijar. O W. tinha corpo típico de modelo. Alto, muito magro, com as costas largas e o abdômen bem definido, a pele clarinha coberta por fios dourados. Tirou minha roupa, me deitou na cama e falou: “Você é linda”. Havia tanta espontaneidade e sinceridade em suas palavras que nem consegui responder. Nos tocamos como se já nos conhecêssemos, com carinho, intimidade, sem pressa. E dormimos com a sua cabeça apoiada entre meus seios, enquanto eu lhe fazia cafuné. Acordamos poucas horas depois para ele me contar toda a sua história de vida. Me contou sobre o pai que morreu quando ainda era um bebê; sobre a avó que o ensinou a fazer crochet; a mãe e a tia que o apoiaram na mudança para a capital na busca pelo sonho de ser modelo; contou até sobre a ex-namorada, que continuava morando no interior. - Por que você me escolheu? - Hã? Como assim te escolhi? - De todos os barmans, por que você escolheu justo eu? - Não sei, achei você diferente. Ah, no escuro também pensei que fosse ruivo, e eu adoro ruivos. Era uma piada, mas ele não riu. Então perguntei se ele sempre saía com as garotas depois do expediente. Respondeu que não, que eu era a segunda pessoa com quem ele estava desde que mudara de cidade. - E por que você resolveu me dar uma chance? - Vi você gesticulando pra sua amiga que eu era “nariz empinado”, aí sei lá, achei que valia a tentativa. 44
Fiz café e tomamos seminus, debruçados na janela. Fui levar as xícaras na cozinha e quando voltei ele estava tocando o meu violão. De cueca apenas, sentado em minha cama, tirando uma música do Jack Johnson. Da porta, eu o observei até terminar a canção. Os cabelos brilhavam sob a luz do sol que entrava pela janela. Os ombros e o peito eram cobertos por delicadas sardas. Os olhos estavam fixados nos longos dedos que se alinhavam para formar diferentes acordes. Bonito de se observar. O W. nao era só mais um rostinho bonito. Ele tinha profundidade. Era possível se perder não somente em seu corpo, mas também em sua mente. Dois anos mais novo que eu, era curioso e gostava de aprender coisas novas. Além do crochet, do violão, ele desenhava e queria conhecer o mundo. Antes de ir embora, ainda tomamos banho e ficamos juntos mais uma vez. Depois, ele se despediu com um abraço e um beijo no rosto, saiu pela porta e não voltou mais.
45 43
enquanto você dormia liguei os pontos sardentos das suas costas na esperança de que a caneta esferográfica revelasse a imagem de algum ser mitológico de nome proparoxítono o mapa detalhado de algum tesouro submerso formasse quem sabe alguma constelação ruiva oculta
na epiderme e me deparei com o contorno de um polígono arbitrário que não me fornecia metáforas não apontava direções simplesmente dizia: você está aqui.
Gregório Duvivier
“Existe todo tipo de amor neste mundo, mas nunca o mesmo amor duas vezes�. (F. Scott Fitzgerald)
O louco da rua
Final da tarde, talvez 17h ou 18h de um dia nublado. Tinha acabado de chegar de viagem, estava indo para casa puxando minha mala de rodinhas, louca para tomar um banho e descansar. Há poucos metros de distância, um garoto vinha caminhando na minha direção, muito bonito. Admirei essa sua beleza por alguns instantes, e ele retribuiu o meu olhar com um simpático sorriso. Sorri de volta, mas continuei andando. Ele parou e segurou meu braço: - Eu te conheço? - Acho que não. - Mas o seu rosto me parece tão familiar. Tem certeza que não nos conhecemos? - Bom, eu pelo menos não estou lembrada de você. - Prazer então, eu sou o T. Parecia ser muito jovem, mais novo que eu até. Tinha qualquer coisa de criança em seu olhar, meio inocente, meio impaciente.
Um brilho de alguém qu e tinha pressa, ...que ansiava por uma aventura. Eu disse que era um prazer conhecê-lo, mas que precisava ir embora. Ele fingiu nem escutar, me chamou para tomar uma cerveja. Sua convicção era tamanha que fiquei sem reação. Então sorri, meio sem graça, e respondi que não costumava ir tomar cerveja com caras 49 45
desconhecidos que me paravam no meio da rua. Ele não se intimidou. - Exatamente, duvido que isso já tenha acontecido outras vezes com você. Não é todo dia que um cara te para no meio da rua e te convida pra tomar uma. Acredite, eu não sou de fazer isso também. Acho que temos uma ligação especial. “Ele está chapado, só pode”, foi o que pensei. Ligação especial? Cantada mais furada. Mas eu ri, apenas ri. Era uma situação tão absurda que eu não consegui fazer outra coisa. Não consegui responder não, ou dar as costas e sair andando. E ele continuou me encarando à espera de uma resposta positiva. Duvidei: - Você está falando sério mesmo? - É claro que eu estou falando sério. Vamos! Ali na esquina tem um barzinho. E começou a andar na direção do bar. Mas eu não podia ir com a minha mala. Pedi então que me esperasse, eu deixaria a mala no meu apartamento e voltaria em questão de minutos. Seu olhar mudou rapidamente. Ficou chateado, disse que eu o estava enganando, que não ia voltar mais. Retruquei que ele estava errado, que eu voltaria sim. Ele não acreditou e, por um impulso, chamei-o para ir junto. Eu morava ali do lado, ele poderia me acompanhar, eu deixaria a mala e depois voltaríamos para tomar a cerveja. Assim ele concordou. Quando finalmente sentamos no barzinho, pedimos duas cervejas e ele desatou a falar sem parar. Não me lembro bem do assunto.Tudo o que o T. dizia parecia papo de louco. Coisas sobre
a s t ro
l o g i a , g a l á x i a , un i v e r s o, h 50
o ró s c o
po.
A paixão com que falava é que me mantinha interessada. Até que ele soltou a frase: - Nós temos que dormir juntos essa noite. - O quê? - Nós dois, precisamos dormir juntos hoje. Não sei por que não levantei e fui embora nessa hora. Nada do que ele dizia era racional: nossos destinos estavam interligados, de uma maneira ou de outra acabaríamos nos encontrando na rua, era uma ação do universo, estava predestinado que íamos acabar juntos naquela noite. - Olha só amigo, você está muito enganado. Eu não vou dormir com você, eu não te conheço, não sei de onde você vem, pra onde você vai... Essa conversa toda é simplesmente absurda. Não faz sentindo algum. Ele não questionou uma palavra minha sequer. Pelo contrário, sorriu e afirmou com ainda mais veemência: - Nós vamos dormir juntos essa noite. Não me pergunte como, nem por que, mas eu o levei para minha casa depois disso. No fundo, talvez, eu realmente quisesse acreditar que o destino tinha armado uma surpresa feliz para mim. Que o acaso estava me presenteando com um romance.
Mas essas histórias só dão certo nos filmes. O T. era lindo. Tinha aquela ingenuidade infantil, os olhos azuis, cabelos louros levemente ondulados, a pele branquinha, ombros e costas 51
largos com um pouco de pelo no peito. Não tinha celular, não tinha computador, não tinha perfil nas redes sociais. Trabalhava fazendo bicos de modelo, era do interior e morava há pouco tempo na capital dividindo apartamento com um amigo. Enquanto conversávamos, ele tirou um embrulho de maconha do bolso e começou a bolar um. Contou sobre a sua aventura no morro de alguma favela, quando foi buscar a “mercadoria”. O amigo de um amigo tinha indicado o lugar, disse que era seguro, ele foi. Lá, no entanto, não foi bem recebido. Alguns caras o empurraram de um lado pro outro, gritando e xingando. Ele pediu para ir embora. Tinha ido até lá apenas pela indicação de um amigo, não queria confusão, queria comprar a maconha e ir embora. Fizeram-no gastar toda a grana que tinha, comprar uma quantidade bem maior do que a queria, e somente então o liberaram. No fim da história, já tinha terminado de fazer o beck, me ofereceu mas eu não aceitei. Fez um gesto de “tanto faz” com os ombros e começou a fumar. Quando acabou, me beijou e me deitou na cama. Em meio aos amassos, dei um jeitinho de apagar a luz. Mas ele acendeu de volta: - Não apaga a luz não, por favor. Eu quero te ver, você é linda. Cedi ao pedido meio encabulada. Ele me abraçava tão apertado, tão forte, que parecíamos nos fundir numa única pessoa, e ainda assim mal cabíamos naquela cama de solteiro. Durante o sexo, algumas pessoas
entimentos s m a d r transbo 52
Nem todas, mas algumas, enquanto transpiram, respiram, nos inundam com suas emoções. O T. era assim. Me afogava em carinho e carência, com sua paixão de menino, sincera, honesta, que não deseja nada em troca. Quando terminamos, apagamos a luz e ligamos a TV no “mudo”. Ele acendeu outro baseado, começou a falar, mas eu só consegui prestar atenção no crucifixo de ouro que balançava em seu pescoço. Estava sentado de frente pra mim, com as costas curvadas e o cabelo bagunçado. Toda vez que usava o isqueiro pra reacender o cigarro, a luz do fogo iluminava seu rosto e criava uma sombra sobre o crucifixo que me hipnotizava. As únicas palavras que ouvi foram: - Eu gostei de você. Quero ser o seu... Como dizem hoje em dia? Ficante? É. Quero ser tipo seu ficante fixo.
No dia seguinte,
acordei ao seu lado e me senti extremamente arrependida. Passei meu telefone antes dele ir embora, nos despedimos e jurei nunca mais vê-lo. Dois dias depois ele me ligou, de um orelhão. Queria me ver, passar na minha casa, dormir comigo. Eu disse que não podia, inventei uma desculpa. Após mais alguns dias ele me mandou uma mensagem. Avisou que estava com um celular novo, para eu ligar quando quisesse encontrá-lo. Uma semana se passou até eu sucumbir à vontade de vê-lo novamente. Estava triste, 53 49
tinha descoberto que meu ex-namorado estava saindo com outra garota. Não pensei duas vezes. Chamei e o T. foi dormir comigo. Parecia o garotinho mais feliz do mundo. Percebi que estava buscando algum tipo de “estabilidade” naquela vida instável dele. Senti pena. Sabia que não ia poder levar isso adiante. Não atendi suas 40 ligações durante a semana seguinte, e a seguinte, e a seguinte. Após um mês sem me ligar, decidi apagar seu número com medo de sofrer uma recaída. Hoje me arrependo. Fico me perguntando onde ele está, o que está fazendo, e torcendo para que um dia nos trombemos na rua novamente.
54
55
“O amor é finalmente um embaraço de pernas, uma união de barrigas, um breve tremor de artérias”. (Gregório de Matos)
Os descendentes de italianos
Atraída não por um homem, mas por um sobrenome.
Foi o que me aconteceu certa vez. Entrei de cabeça numa situação estúpida e doentia que não me renderia absolutamente nada – além de uma história pra contar. Primeiro conheci o M1, causador de todo o transtorno psicológico e quase bipolar que sofri. Ele era, como posso dizer... Um conquistador. Nos encontramos numa balada, na área comum e unisex que dividia o banheiro masculino do feminino. Eu estava encostada no espelho, dançando sozinha enquanto esperava uma amiga. Ele me viu no reflexo e ficou encarando por algum tempo. Não consegui desviar o olhar daqueles olhos azuis. Então ele se virou e veio na minha direção, me colocou contra a parede e me beijou antes mesmo que eu pudesse pensar. Só paramos quando minha amiga me cutucou para avisar que voltaria para a pista de dança. Eu disse que iria com ela. Ele perguntou meu nome, eu respondi e perguntei: - O seu? - É segredo. Ri e fui para a pista. No fim da noite ele já tinha meu telefone, mas eu ainda não sabia seu nome. Descobri dois dias depois, quando ele ligou para combinarmos de sair no final da semana seguinte. Nesse segundo encontro, percebi que não tínhamos nada em comum. Se ficássemos juntos seríamos aquele casal: a moderninha intelectual 57 53
da capital com o fazendeiro rico e caipira do interior - ou filho do fazendeiro rico, no caso. E mesmo eu tendo mentido muito mal sobre gostar de sertanejo e frequentar lugares como o Villa Country, ele voltou a ligar uns dias depois. Seus pais estavam viajando, a casa estava vazia – uma senhora casa por sinal – e sugeriu que alugássemos um filme e fossemos assistir lá. Mas eu não estava no clima, não estava afim e estava “naqueles dias”. Ou seja, acabamos com ele sem roupa e eu completamente vestida. Uma cena bem constrangedora para o M1: nu, em sua cama, apelando para todas as suas armas de sedução, com uma bela garota ao seu lado totalmente desinteressada. No fim, ele ficou, literalmente, na mão. Então vem a parte inexplicável da história, na qual, sem motivo nenhum, eu o procuro pra dizer que deveríamos sair e tentar de novo. Essa noite acabou sendo muito importante pra mim. Primeiro porque era a primeira vez que eu ficava com alguém depois do término do meu namoro; e segundo porque foi a primeira de muitas vezes em que, ao tocar seus braços e acariciar suas costas, desejei com toda a força do meu coração que ele pudesse sentir o tanto que eu realmente gostava dele naquele momento. Pois foi isso que me tornei desde então: uma amante de corpos. Não no sentido vulgar que possa parecer, mas no sentido mais poético da frase. Se decidi estar com alguém é porque
julguei esta pessoa, ainda que
por um curto período, 58
todo o meu carinho, amor, calor digna de
do meu corpo e coração.
Eu estive com o M1 outras vezes, até que ele simplesmente parou de me procurar. Obsessivamente louca, comecei a perseguir e vigiar sua vida pela internet. Em pouco tempo eu já sabia quem eram os pais, os tios, tias, primos e todos os amigos do M1. Onde ele estava, com quem estava e até quais eram seus planos para o próximo fim de semana. Foi o destino, porém, que se encarregou de me apresentar o V., seu primo mais bonito. O V. tem um jeitinho de menino e uma feição de homem feito que faz você querer tomá-lo no colo e se jogar aos seus braços ao mesmo tempo. Alto, grande, peito largo, olhos esverdeados, lábios grossos e bem desenhados. E mesmo quando rolava aquele silêncio constrangedor entre nós, eu sentia que havia algo que valia a pena. A maneira como conheci o V. confirma o tanto que as mulheres podem ser dissimuladas. Quando o avistei, reconheci imediatamente das fotos do M1. Era o primo mais bonito daquela enorme família italiana. Em questão de segundos, dezenas de planos e ideias passaram pela minha cabeça. Eu tinha que dar um jeito de conhecê-lo, de me apresentar, de, quem sabe, ficar com ele. Para mim, significava uma maneira de me reaproximar do M1. Encarei o V. até que me notasse e começasse a retribuir meu olhar. Ficamos assim 59
por algum tempo, então uma amiga me chamou para acompanha-la até o fumódromo. Era a deixa. Olhei para ele como quem diz “vem!”. E ele veio. Com dois amigos, me seguiu até a área externa do bar. Meu coração batia a mil! Sabia que ele estava interessado, mas tímido, olhava, olhava e não fazia nada. Quando percebi, seus amigos já tinham terminado de fumar e estavam indo embora. Eu tinha que agir. Tomei-o pelo braço e falei: - Não vai nem se apresentar?
E n tã
o e n t r a o p ap e l
d a mulh e
r dissimulada.
A cada pergunta que eu fazia (“de onde você é?”, “o que você estuda?”...) já conhecia as respostas. Revirara seu perfil no Facebook de um canto a outro e sabia todos – ou todos os possíveis – detalhes da sua vida. Assim, fui conduzindo a conversa, fingindo surpresa e interesse, pelo resto da noite. Dançamos, nos beijamos, e veio a hora de ir embora. Eu precisava de alguma coisa que me desse a oportunidade de vê-lo novamente, mas nem meu telefone ele pedira. E não poderia simplesmente adicioná-lo no Facebook considerando que nos víamos pela primeira vez naquela noite e eu não sabia seu nome completo. Então iniciei uma conversa mole sobre sobrenomes, falei da minha descendência e perguntei o dele. Agora sim, eu poderia ao menos adicioná-lo no Facebook. No dia seguinte, ele aceitou minha solicitação 60 56
de amizade. Cerca de 30 min depois disso, recebi uma msg no meu celular: - Oie, é o V. Chegou bem em casa ontem? - Cheguei sim. Mas como vc conseguiu o número do meu celular? - É segredo. Era óbvio, o M1 tinha passado. Combinamos de sair dois dias depois. Ele me levou ao cinema e depois a um bar. Era todo bom moço, andando de mãos dadas e me abraçando todo o tempo. Chegava a incomodar. Não parecia natural, espontâneo, e sim ensaiado, como quem não sabe o que fazer. No bar, depois de algumas cervejas, ele acabou se soltando e a conversa rendeu. Contou que no dia seguinte estava embarcando num mochilão pela américa do sul, com destino à Bolívia, Peru e Colômbia. Só voltaria dali três semanas. - Até lá você nem vai se lembrar mais de mim. - Claro que não, seria impossível esquecer você. Fiz cara de cética e pedi então que me trouxesse um presente: - Sabe aqueles gorrinhos que eles usam no Peru? São bem coloridos, às vezes tem até umas lhamas estampadas. Eu queria muito um desse. Pode trazer pra um mim? - Claro! Vou trazer um bem bonito pra você. Nos despedimos naquela noite e não nos falamos pelas próximas três semanas. Ficou claro que o meu plano inicial de reaproximação com o M1 não daria certo. Óbvio. Agora, o que me mantinha interessa61
da no V. era a curiosidade em saber se eles conversavam sobre mim, e, caso sim, o que exatamente diziam. Para a minha surpresa, ele me procurou assim que voltou de viagem, me chamando para sair. Combinamos de nos encontrar numa balada no fim de semana. Eu nem estava muito animada para ser sincera, ainda pensava no M1. Fomos embora quando já era madrugada. Entrei no carro do V. e seguimos em direção a minha casa. Ele estacionou um pouco antes da entrada, desligou o carro e começamos a nos beijar.
Entre amassos e risadas,seu olhar fIcou sério por
um instante: - Tenho uma coisa para você. - Pra mim? - É, da viagem. Então ele esticou o braço até o banco de trás e pegou uma sacola. Me entregou. Mesmo curiosa, eu hesitei em abrir o embrulho, olhando para ele em busca de uma confirmação. - Vai, abre! Abri, e meu sorriso se esticou de uma orelha a outra. Era o gorrinho mais lindo que eu já tinha visto. Tipicamente peruano, como eu havia pedido. Preto e cinza, com pequenas lhamas desenhadas. Não podia acreditar que ele realmente tinha se lembrado. Agradeci cobrindo-o de beijos. 62
Depois desse dia eu não pensava mais no M1, o V. era o único cara que eu queria. Passamos a nos falar com frequência, mas os encontros se tornaram difíceis depois do retorno às aulas. Estudávamos em cidades diferentes, muito distantes, e ele vivia em plantões nos finais de semana. Assim, a euforia do início foi se acabando e já não estávamos mais envolvidos como antes. Cerca de 4 meses depois, ele reatou o namoro com a ex. Fiquei mal, muito mal. Não havia nada que eu pudesse fazer. Já não tínhamos tanto contato e não nos víamos mais. O melhor era esquecê-lo de vez.
iz por um longo tempo. sim o f s Ea
Até que, em um sábado, quando fui ao bar com umas amigas, encontrei o terceiro e último elemento dessa história, o M2, irmão mais velho do V., também primo do M1. Fiquei em choque num primeiro momento, acreditando que o V. também deveria estar lá, ou quem sabe até o M1. Mas, para a minha sorte, o M2 estava acompanhado apenas de alguns amigos. De qualquer forma, sua presença me incomodava. Nunca havíamos nos encontrado, mais uma vez o reconheci pelas fotos postadas, e não podia evitar de ficar observando-o. Nossos olhares se cruzaram várias vezes. E várias vezes tentei me convencer de aquilo não era um flerte. O bar estava lotado, todos de pé curtindo a banda, dançando e bebendo. A certa altura, eu e minhas amigas decidimos ir ao banheiro. Para isso, porém, teríamos que passar pelo M2, e, com toda aquela lotação, nós praticamente “trombamos” com ele. 63 59
Durante esse pequeno instante, ele chegou bem perto do meu ouvido e disse meu nome. Olhei surpresa: - Você me conhece? - Mas é claro, você é famosa, sabia? Isso não era um elogio. Soou como: “eu, meu irmão e meu primo nos reunimos só para falar mal de você”. Preferi não responder, segui direto para o banheiro. Na volta, contudo, a curiosidade tomou conta, e parei para conversar com ele. Percebi então que o M2 não estava ali para bater-papo comigo, para falar do irmão ou do primo. Desde o começo, quando me viu, me reconheceu e me classificou como presa. Esperava apenas o momento certo para dar o bote.
Suas investidas eram claras, quase obscenas. Mexia no meu cabelo, pegava na minha cintura, acariciava meus ombros. E para fugir do assunto irmão-primo, ele fingiu que era outra pessoa. Mentiu seu nome e disse não conhecer nenhum V. ou M1. Claro que aquilo era uma piada, que ele sabia que eu sabia, e eu sabia que ele sabia. Mas achei divertido. “Por que não?”, pensei. O M1 era caso encerrado mesmo, o V. estava namorando. Eu não tinha nada a perder. Ficamos. Foram apenas alguns beijos em que o V. reinava nos meus pensamentos. O M2 parecia um projeto que fora aperfeiçoado no irmão mais novo. Também moreno, tinha os olhos escuros e o formato do rosto ovalado, muito diferente do maxilar marcado e os olhos verdes do caçula. Mas beijava tão bem quanto. 64
No dia seguinte, me dei conta da besteira que tinha feito. Três homens da mesma família. Que obsessão era essa! Tudo bem que o sobrenome italiano deles era lindo, e eu me peguei várias vezes desejando tê-lo combinado ao meu nome. Mas já estava passando dos limites. Ou eu escolhia um, ou não teria nenhum. Foi então que, mesmo namorando, resolvi procurar o V. Eu iria viajar dali algumas semanas e disse que gostaria de retribuir o presente que ele me trouxera de viagem. Claro que ele concordou, e combinamos de nos encontrar assim que eu voltasse para o Brasil. Jamais falamos sobre seu irmão, ou mesmo sobre o M1. Quando eu perguntava sobre a namorada, ele logo mudava de assunto, dizendo que não tínhamos que falar sobre isso. E dessa forma voltamos a nos ver, a conversar, com muito mais intensidade do que antes. Ficávamos no bar até fechar, e então comprávamos mais cerveja e íamos nos sentar em alguma praça. Toda essa intimidade só poderia resultar em uma coisa: sexo. Era a última etapa que faltava para nós. E já não dava mais para adiar também, nos conhecíamos há mais de um ano. Assim, no nosso último encontro, fomos para o motel. Um momento que tinha tudo para ser perfeito, se... Ele não fosse TÃO ruim de “serviço”. Algumas coisas não precisam de detalhes ou explicação, são ruins e ponto. É o caso do sexo com o V. Ruim. 65
Depois disso, desisti de vez do sobrenome italiano. Nada de primos, irmãos, nem parentes distantes. Se reconheço alguÊm de alguma foto, sai o c o r r e n d o .
66
63 67
“Amadureci vendo as pessoas que amo me trocando�. (Clarice Linspector)
O B. é o
O ruivo tatuado
tipo de cara esti loso que quase toda
ta deseja. o r a g
Ruivo, com a pele coberta por sardinhas e tatuagens, músculos definidos, alto e imponente. Quando ele chega, sério e carrancudo, parece bandido. Mete medo. Então ele abre a boca, e o timbre desafinado combinado ao sotaque caipira desmonta toda essa pose. Nosso primeiro e, diga-se de passagem, único encontro foi em um barzinho ali na Paulista. Nos conhecemos online, conversamos um bocado por mensagens, trocamos fotos, vídeos, etc, até que finalmente ele decidiu que já era hora de sairmos. Eu cheguei primeiro, embora estivesse atrasada em relação ao horário que combinamos. Peguei uma mesa e logo em seguida ele chegou. Lindo. Diferente. Único. Foram as palavras que passaram pela minha cabeça. Ele me cumprimentou, sentou, começou a falar e estragou tudo. Metade do charme dele estava relacionado àquela aparência de “bad boy”, e quando ele falava parecia mais um sertanejo do interior, puxando o “r” e errando na concordância de número das palavras. Conversamos sobre várias coisas, o papo estava rendendo. Até que um carro passou na rua tocando um funk no último volume. Ele interrompeu o que falava: - Um minuto à minha zona leste. 69
E cantou o funk em voz alta (!!!). Fiquei chocada. Ele percebeu meu olhar de repreensão e justificou: - Não tem como você morar na zona leste e não gostar de funk, faz parte cara, é minha vida, não posso fazer nada. Procurei ignorar essas palavras puxando outro assunto. Ele era muito bonito, e eu
estava decidida a relevar
quase
tudo...
...em troca de um beijo daquela barba ruiva. Estávamos sentados um de frente para o outro. Depois de algum tempo, algumas cervejas, ele me chamou para sentar ao seu lado, e então eu soube, ele ia me beijar. E que beijo! Eu passava a mão em sua nuca, deslizando pelos ombros e descendo até os braços. A textura meio áspera da pele por conta das sardas me seduzia, eu não queria mais largá-lo. Quando ficou tarde, eu disse para continuarmos bebendo na minha casa. Ele aceitou e pedimos a conta. Meros cinquenta reais, que eu propus dividirmos. O garçom trouxe a maquininha e eu passei minha parte no cartão de crédito. Na vez dele: - Putz! Hoje é que dia mesmo? 12? Nossa meu pagamento só cai dia 15. Não sei se vou ter saldo. Mas tenta aí garçom. “Não autorizado”, foi a mensagem que apareceu. O B. então começou a tirar dinheiro da carteiro. Duas notas de cinco, quatro de dois e uma moeda de um real. Era tudo o que ele tinha. - Nossa que vergonha B., vou ter que pagar 70 66
sua parte. Ta vendo isso garçom? Hoje em dia é a mulher que sustenta a casa mesmo. Eu disse eu tom de brincadeira para descontrair a situação. Mas ele não estava nem um pouco encabulado. Ainda teve a audácia de dizer: - Eu não sabia que você bebia tanto, ué. Seguimos a pé para a minha casa abraçadinhos. Uma vez lá, lembrei que seu pai era italiano e logo lhe servi uns licores que trouxera de uma viagem à Itália. Conversamos mais um pouco e de repente ficou claro. Não poderia dormir com ele na primeira noite. Ele parecia ser exatamente o tipo de cara machista, que julga as garotas por atitudes assim e some.
Se eu o quisesse, teria que bancar um pouco a “difícil”. Contudo, ele já estava na minha casa, meio tarde para voltar atrás na decisão de transar na primeira noite. Mesmo assim eu tentei. Na minha cama, começamos a nos beijar e dar início a uma longa série de amassos. Mas sempre que a coisa ficava “quente” demais, eu interrompia, falava alguma coisa, levantava para ir ao banheiro. Ele percebeu, foi ficando irritado. Numa última apelação, me colocou sentada em seu colo. Prendeu-me em seus braços, se levantou, me jogou contra a parede com força e me beijou com mais força ainda. Parecia cena de cinema. Aquele ruivo todo tatuado, a essa altura já sem camisa, me segurando em seu colo, em pé contra a parede. Eu sentia seus músculos se contraindo, do abdome, dos braços, das costas. Ouvia sua respiração ficando cada vez mais 71
ofegante, descompassada, enquanto minhas unhas riscavam sua pele por todos os lados. Quando ele me jogou de volta na cama já não podia mais resistir. Decidida, comecei a desabotoar sua calça, enfiei minha mão e... hã... bom... é... broxei. Era tão pequeno que desanimei na hora. Voltei à estratégia inicial, levantei e disse que ia buscar água. Ele, porém, já tinha se cansado. - Quer saber? Não vai dar pra gente ficar se cutucando a noite inteira. Eu vou embora. - Então você está indo embora porque eu não quero transar com você? Hm, que bom. - Não é por isso, mas eu vou ficar aqui pra quê? Não estou bêbado suficiente pra passar a madrugada conversando com você. Nem insisti que ficasse. O acompanhei até a porta e fim. Nunca mais nos falamos. Seu corpo e seu rosto, pelo contrário, estão sempre presentes em minhas fantasias.
72
69 73
Decidi recomeçar
a história.
Entretanto,
preferi
substituir o “era uma vez” pelo “é dessa vez”. Lucas Aurélio
“Amar é mudar a alma de casa”. (Mário Quintana)
O editor
Sem pressa, fo i conq uistando seu esp a ço
ou d e
ma
Ele che g
...
, sn inho
...ganhando um cantinho no meu coração, ocupando meus pensamentos. Quando conheci o D. jamais pensei que chegaríamos onde estamos hoje. Ele não é lindo, ou sarado, ou estiloso. Não faz meu tipo. Mas tem lá seu charme, com grandes olhos azuis, a barba bem cuidada, a pele clara e cheia de pintinhas coberta por pelos louros quase ruivos. Na primeira vez que nos encontramos, ele foi até um bar na Paulista me ver. Quando fomos embora, me acompanhou até em casa e eu o convidei para subir. Estava nervosa, estava bêbada e, o pior, estava carente. Queria sentir o peito e os braços de um homem. A barba arranhando a minha pele, as mãos apalpando meu corpo. Qualquer um servia. E naquele momento, o D. era esse qualquer um. Deitamos na cama e me atirei pra cima dele. Dei todas as investidas e insinuações possíveis. Ele permaneceu quase indiferente, correspondendo apenas aos meus beijos. Até que se levantou, disse que era tarde, precisava ir embora. E foi. Me deixando incrédula, na vontade e certa de que não iríamos voltar a nos ver. Mas voltamos. Saímos para jantar numa hamburgueria na Oscar Freire. Conversamos a noite toda. Ele pediu sobremesa, pagou a conta sozinho e eu 77
soube que era um cara diferente. O D. nao era um garoto igual a esses que eu estava acostumada a sair, que queriam somente alguém para transar. Com quase 30 anos, era maduro, homem, não queria sexo casual com um desconhecida. Queria algo mais, algo que naquele momento eu não queria. Por isso me afastei e não nos vimos por meses. Um dia, decidi procurá-lo e voltamos a sair. Depois de uma noite, em especial, tudo ficou diferente. Eu estava em casa, entediada. Ele, num bar com uns amigos. Falei para comprar uma cerveja bacana e ir me encontrar.
-É sério? Eu vou heim. -É serio! Mas não esquece da cerveja. Quase duas da manhã, ele chegou com 6 long necks de Brooklin. Ficamos na sala bebendo e conversando. De repente, a luz estava apagada, eu estava sentada em cima dele e não conseguia parar de beijá-lo. Entre um carinho e outro, fez pequenas revelações. Que não acreditava que voltaríamos a nos ver, que eu era uma grande incógnita e chegou até a falar de mim para algumas amigas, pedindo conselhos de como proceder. De alguma forma, isso mexeu comigo. Decidi que ele merecia uma chance, uma chance de verdade. Dormimos juntos nesse dia, mas nao transamos. Nao queria me precipitar mais e resolvi que ia esperar o máximo que pudesse. Fui chata e difícil por um bom tempo. Mesmo assim, a primeira vez rolou quase sem querer. Depois que saímos à francesa de uma 78 72
festinha em casa para o meu quarto. Eu estava tao cansada, bêbada de sono e álcool, que nao tive forças nem para negar nem para cooperar. Só lembro de virar para o lado e dormir. A segunda vez, comigo mais sóbria, mais disposta, me fez apaixonar. Paixão de pica. Eu nem lembrava quando tinha me sentido tão conectada assim a alguém pela última vez. Ou quando havia tido um orgasmo tão bom. Agora, a textura do seu cabelo ainda está nos meus dedos. O cheiro da sua pele nao sai da minha cabeça. Sinto falta do peso do seu corpo sobre o meu, e da pressão dos seus braços me envolvendo. Agora, eu fico pelos cantos toda confusa, pensando nessa história que ainda não acabou.
79
De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas as coisas, eu espero que você permaneça em mim. De todas
“Para escrever sobre os caras da minha vida, acho justo começar pelo primeiro. [...] aquele com quem depois de anos eu iria me reencontrar, casar e viver feliz para sempre. Afinal, primeiros amores servem pra isso não? Nos dar esperança em momentos de desespero e solidão. QUANDO TODOS OS HOMENS SÃO OS HOMENS ERRADOS, imaginar que sua vida está predestinada àquele amor de infância é bem consolador. Entretanto, não é real. Serei sempre grata por ter tido um primeiro tão especial, que me presenteou com pérolas para eu rir e recordar por toda a vida. Que me ajudou nos primeiros passos por essa estrada estranha dos relacionamentos amorosos”.