Trabalho de Oficina

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CAUSOS DE SACO BARREIRO

AGRADECIMENTOS Agradecemos primeiramente ao professor Ricardo, que nos proporcionou essa construção de conhecimento muito rica, tanto nas suas aulas quanto sendo mediador da nossa visita à comunidade. Agradecemos à Comunidade Quilombola Saco Barreiro, na cidade de Pompéu, que nos recebeu de braços abertos, foram hospitaleiros e prestativos. Agradecemos ao presidente da comunidade, Wilton Almeida, por nos receber na sua casa, com tanto carinho, a Leandra, Igor e Alquelino pela boa conversa e por responder à todas as nossas perguntas e a todos os outros membros da comunidade, inclusive os que não estavam presentes. Vocês são incriveis, tornaram nossa visita em uma experiência enriquecedora e esperamos que tenha sido para vocês também. Atenciosamente,

Marina Salim, Michelle Dias, Neide Ferreira e Pedro Barata


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INTRODUÇÃO A comunidade SACO BARREIRO está localizada no município de Pompeu, á cerca de 180 km de Belo Horizonte. Hoje a comunidade acolhe 13 famílias e 66 pessoas que vivem basicamente do que produzem na comunidade. Localizada entre a tribo indígena dos Kaxixós e um canavial, atualmente a comunidade vive um grande impasse junto a Agropéu S/A, usina de cana de açúcar. Por conta da grande quantidade de agrotóxicos utilizados no cultivo da cana, os moradores vem sofrendo com doenças recorrentes, contaminação o solo e das águas. Este livro vem em contrapartida dos fatos atuais, mostrar as raízes da comunidade através das narrativas e causos que ouvimos durante a visita que ocorreu no primeiro semestre do ano de 2016.


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ÍNDICE CASOS DE DONA JOAQUINA: RELATOS QUILOMBOLAS..................4 CASO DO VIAJANTE COM FOME................................................................6 CASO DOS DOIS VIAJANTES E A HORTA.................................................7 MISTURA DOS PARENTES..............................................................................8 COMIDA DA ÉPOCA DOS ESCRAVOS.......................................................9 OS RITUAIS........................................................................................................10 O CEMITÉRIO DOS NEGROS E O CEMITÉRIO DOS BARÕES..........11 ESCRAVA ANASTÁCIA...................................................................................12 A LENDA DA ESCRAVA LAVÍNIA...............................................................13 A LENDA DA ESCRAVA MARIA..................................................................15 A LENDA DO ESCRAVO SEBASTIÃO........................................................17 A LENDA DA NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO...................................18 JOAQUINA E OS ESCRAVOS.......................................................................19 CASTRAÇÃO DO GENRO.............................................................................19 NEGRINHO DOS PASTOREIRO..................................................................20 FICHA TÉCNICA................................................................................................22


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CASOS DE DONA JOAQUINA: RELATOS DOS QUILOMBOLAS Beleza de flor, gênio de tempestade.

Joaquina Maria Bernarda da Silva de Abreu Castelo Branco Souto Maior nasceu na cidade de Mariana, à meia-noite de 20 de agosto de 1752. Treze dias depois foi batizada na Sé, pelo Cônego Francisco Xavier da Silva. Ao se aproximar da pia, já paramentado para o ato, o Cônego sorriu vendo a pagã: -É um botão- de rosa... (VASCONCELOS. 1966, p. 81). LEANDRA

Tempos de escravidão, tempos de covardia, é meu pai me contava quando eu era pequena, que Dona Joaquina era dura parque era uma mulher sozinha e teve que se tonar homem mu4


CAUSOS DE SACO BARREIRO lher, firme e grossa. Ouvi de uma pessoa chamada Claudionira que a Dona Joaquina era firme para se proteger dos homens que quisessem matá-la, foi um meio de ser respeitada. As terras eram dela, Pompéu antigamente era chamado de “Buriti da Estrada”, até na divisa de Pitangui, era tudo dela, ela doou para seus descendentes: Campos, Cordeiro, Valadares são da geração de Dona Joaquina, todos esses sobrenomes. Dona Joaquina dava repouso aos viajantes e os matavam e jogavam no porão, era o que meu pai dizia, mas eu me pergunto e o mal cheiro? Mas ninguém sabe explicar isso. A família Campos Reis é toda descendente de Joaquina, os maiores proprietários de terra de Pompéu. Eu vou passar essa história para meus filhos porque é uma história que não deve se acabar. Mulher temida pelos escravos, onde ela passasse os negros tinham que dar licença, os negros vivam de restos e sobras, trocavam os serviços por comida e as crianças não tinham estudo. Quando Dona Joaquina passava com sua carruagem na estrada os negros tinham que se esconder no mato, os negros eram transportados em carroças de boi, e se o negro caísse, era açoitado. As escravas que tinham leite e bons dentes, eram mucamas de casa e amamentavam os filhos do barão, seus próprios filhos eram amamentados quando dava, as escravas amamentavam os filhos umas das outras, “mães de leite”, por isso os escravos são todos “irmãos”. Contam que certo dia ela, Dona Joaquina gritou um negro, mas o negro não ouviu, então ela mandou decepar as duas orelhas do negro. Mas Dona Joaquina tinha seus escravos escolhidos, estes não iam ao tronco para não estragar a face da pele de uma coisa que era usado por ela, uns dizem que ela ficou viúva e nunca mais teve contato com outros homens. Penso! Porque os descendentes dela não falam? Deveriam falar sobre ela. “A dois anos atrás faleceu Dona Fia Vereda” gema de Dona Joaquina, o museu dela existe mais não tem um lado mais concreto sobre ela. 5


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CASO DO VIAJANTE COM FOME Chegou um homem, com fome na casa dela e perguntou a negra, hô negra não tem nada para comer aí? Eu estou com fome demais, estou viajando desde ontem, a negra falou: Eu não tenho ordem para dar comida para ninguém não, tem que perguntar a Dona, que era Dona Joaquina, a negra foi perguntar e Dona Joaquina falou chama ele lá, então pôs a panela no fogo tocou um vidro de pimenta dentro da panela, maceto até virar farinha, o homem teve que comer tudo, chegou até torcer a barriga, então ela era desse jeito, era ruim mesmo!

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ALQUELINO

CASO DOS DOIS VIAJANTES E A HORTA Ela tinha o costume de chamar o pessoal para mostrar a horta dela, era uma horta muito bem plantada e perguntava para o homem, o que ele achou de mais bonito na horta. Então o visitante respondia, que tem muita coisa bonita, o canteiro está bonito, os pés de alface estão bonitos, os de couve, mas depois dessa resposta Dona Joaquina mandava os negros dar um coro no viajante, daí ela levou outro viajante, antes sungo a saia e perguntou, o que ele achou de mais bonito? O viajante esperto respondeu eu achou bonito as pernas dela. Então Dona Joaquina mandou fazer para ele um banquete, mas se o viajante falasse que era a horta apanha. 7


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MISTURA DE PARENTES Aqui no quilombo todos são Almeida, eles os quilombos daquela época não quiseram se expandir e casaram-se primos com primos de até segundo grau e até mesmo irmão com irmã, e quiser se casar com alguém de dentro ou de fora é normal, esse caso de irmão com irmã, foi por causa de uma colcha de cama que o irmão tinha e a irmã queria a colcha, e em troca ela ficou com ele, eles tiveram um filho. Ficaram juntos não por sentimento mais por um bem material. Acho que se casavam entre eles para não perderem o pouco de terras que tinham.

IGOR

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COMIDAS DA ÉPOCA DOS ESCRAVOS Era época de muito sofrimento, de fome, os negros não tinham autorização para comer nada sem permissão da Sinhá. (...) viu então, de uma sacada, Veloso saindo com uma turma de negros, uns 20. Gritou para ser ouvida: - Onde vai com esses negros, Veloso? - Pra roça, Sinhá. - Por quê vão com freios? - Vão arrancar mendoim, Sinhá. Os escravos que arrancavam amendoim já maduro trabalhavam com freios de pau na boca. VASCONCELOS (1966, p. 131). É como eu te disse, para não morrer de fome, os negros comiam: Umbigo de banana refogado, folha da batata misturada 9


CAUSOS DE SACO BARREIRO com fubá fazia um engrossado, taioba, sobras do capado, estendia a tripa do capado no sol, o que hoje é comida sofisticada para uns, para negros era sobrevivência, como não podiam pegar o quiabo senão iriam para o tronco, então usavam as folhas. E isso ficou, minha avó nos dava, Xarope de casca de Jatobá, Chá de sabugueiro com bosta de porco é bom para sarampo, a gente não gostava de beber não sabe, mas se mão bebesse apanhava então a gente bebia assim mesmo né! Chá de Picão, esse é bom para o estomago.

OS RITUAIS

A bisavó sabia o terço da misericórdia dos negros. ” Que nos defenda dos piores inimigos”. O gongo. Ritual pela lua e pelo sol. Ritual da fogueira. No Mês de Junho pelo santo são João, e o chamado nego Velho, negro mais sábio de cura, o ritual é feito no ritmo da fogueira que era tirar a brasa da fogueira e jogava a brasa no copo de água, daí a pessoa tomava e estava curada. Era feita uma fogueira muito grande ele ia dando os passes. Existia muito benzedor antigamente, mais essa cultura não foi passada para a gente. Hoje a reza é coisa comum. Ninguém sabe mais. 10


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CEMITÉRIO DOS NEGROS E CEMITÉRIO DOS BARÕES A história conta que em certo dia Joaquina pediu para um de seus empregados: “Tomé : quero construir a quatrocentos metros do lado esquerdo do casarão, um cemitério com uma Capela e uma cruz de aroeira para a minha família (cemitério dos brancos). Do mesmo lado distante mil metros, um cemitério para os meus escravos (cemitério dos negros), cercado com lascas de aroeira, bem fundo, para que os tatus não comam os meus negros depois de mortos, e uma cruz do mesmo tamanho da cruz do cemitério da minha família”.

Wilton 11


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ESCRAVA ANASTACIA A escrava Anastácia seria filha de Delminda, uma bela princesa banto que foi trazida como escrava para o Brasil num navio negreiro e, depois de vendida, foi violentada por seu dono, engravidando. Anastácia, nome grego que signiica "Ressurreição, teria nascido em 12 de maio de 1741. Era uma mulata dotada de rara beleza, tinha os olhos azuis, era muito inteligente e tinha o dom da cura, apenas impunha as mãos e as doenças desapareciam. A beleza e bondade de Anastácia incomodavam as mulheres brancas, que com inveja começaram a persegui-la. Os homens a perseguiam, tentando roubar sua virgindade. Mas Anastácia era protegida pelo senhor Joaquim Antônio,, filho da senhora do engenho, Joaquina Pompeu, e não permitia que ningu´pem abussasse dela. Mas Joaquim estava há muito tempo apaixonado por Anastácia e começou a assediá-la, rogando um amor que lhe era negado.Então, seu amor transformou-se em ódio, e oaquim mandou que se colocasse em Anastácia uma máscara de folha de flandres, usada nas minas para que os escravos não engolissem as pepitas de ouro. Anastácia viveu assim amordaçada durante anos, só lhe sendo retirada a máscara para comer. Por fim a bela escrava adoeceu gravemente, e mesmo antes de morrer ainda curou seu algoz de uma doença pulmonar grave. Anastácia morreu vítima de gangrena em seu pescoço e boca. Então desde essa data se espalharam pelo país relatos de curas e graças alcançadas por sua intercessão.

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A LENDA DA ESCRAVA LAVÍNIA Na fazenda moravam os proprietários, os funcionários livres, feitores e os escravos. Entre os feitores havia um que tinha fama de ser muito mal. Quis o destino que ele que tanto maltratava os escravos se encantasse exatamente por uma moça cativa. Jovem, bonita e cheia de encantos, a escrava Lavínia enfeitiçou, sem querer, o cruel feitor. Lavínia tinha todas as tardes quentes de verão a tarefa de acompanhar as sinhazinhas até uma lagoa nas proximidades da fazenda, mas num local discreto, para banharem-se, e quando estas não procuravam por tal refresco, ela o fazia só. Em uma destas tardes, percebendo que se dirigia para a lagoa sem companhia, o feitor a seguiu. Já na lagoa, aproximou-se da moça e tentou agarrá-la. A escrava apavorada, tentando livrar-se de seu agressor, caiu na água e não sabendo nadar desapareceu. O feitor tomando ciência do que tinha acontecido voltou para a fazenda e nada contou. Á noite a Sinhá, preocupada porque a escrava não voltava, mandou buscá-la, mas voltaram sem notícias. Como era uma mucama de dentro de casa, a Sinhá ainda insistiu nas buscas, mas deram a escrava por perdida. Algum tempo depois, o feitor começou a ser assombrado pela lembrança de Lavínia, andava pelas proximidades do lugar onde ela havia se afogado e via seu vulto nu, lhe chamando para junto dela. Aos poucos foi enlouquecendo, aparentava estar ausente do mundo até que finalmente um dia caminhou até a lagoa e jogou-se no mesmo lugar onde a escrava havia morrido

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PARTE EXTERNA DA CASA DO WILTON

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A LENDA DA ESCRAVA MARIA Nos anos em que a escravidão era a responsável pela movimentação da economia francisquense, uma escrava chamada Maria, sem entender a razão pela qual foi tirada de sua gente, e trazida a um mundo estranho onde era espancada no pelourinho, o ódio crescia em seu coração. Maria teve um filho com um escravo da mesma fazenda, mas não queria que seu pobre filhinho tivesse o mesmo destino que ela. Ela estavadecidida a fugir. Um dia, antes do sol nascer, Maria juntou as poucas coisas que tinha naquela fazenda infeliz, e com seu filho nos braços, partiu rumo a liberdade. Mas seu senhor não estava disposto a deixa-la ir em paz. Maria estava desesperada. Para onde fugir? Avistou, ao longe, o Morro da Cruz, e partiu em sua direção. Ao pé da montanha, Maria decidiu que não daria chance ao senhor da fazenda de faze-la sofrer outra vez ou seu filho. Subiu a montanha, e lá de cima viu toda a Ilha. Uma bela visão. Abraçou seu filho com força, olhou uma vez mais ao seu redor e atirou-se no espaço vazio. Durante alguns segundos, parece que a paz reinou em sua vida, mas isso terminou no momento em que seu corpo tocou as pedras. O sofrimento acabara. O Criador, com pena da pobre escrava, transformou-a numa linda orquídea, que floresce todas as manhãs, quando um lindo beija-flor de assas douradas, seu filho, vem beijá-la com carinho.

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PARTE EXTERNA DA CASA DO WILTON

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A LENDA DO ESCRAVO SEBASTIÃO É a um agricultor de São José do Paraitinga (depois Salesópolis), feriu seu patrão em legítima defesa, foi processado e julgado. Outros informam que o preto avocara a si um assassinato, por mandado de seu senhor, o qual lhe garantira a absolvição e, como prêmio, a alforria. Entretanto, seja qual for a versão certa, o fato é que o preto Sebastião foi julgado e condenado à morte. E em cumprimento da sentença, foi enforcado em espetáculo público a que compareceu muita gente... O enforcamento do escravo Sebastião não foi o único na Mogi das Cruzes de antigamente. Nenhum outro, entretanto, teve a repercussão que o dele alcançou, transformando-se numa lenda que chegou ao nossos dias. Conta a lenda que no dia aprazado grande número de pessoas rodeava a forca, levantada no local onde hoje se encontra a Rua Dr. Cândido Vieira. A final, chega o condenado, o carrasco passa-lhe a corda no pescoço e dá o puxão de estilo. Mas a corda se rompe! Repete-se a cena. E a corda parte-se outra vez! Ainda uma terceira vez, diante dos assistentes incrédulos, corta-se novamente a corda! Quando os presentes exigiam que se suspendesse a execução, aos gritos de “É inocente!...”, passa pelo local um tropeiro, que oferece ao carrasco um laço trançado com tiras de couro, com o qual, finalmente, o escravo é enforcado diante da assistência já assombrada. Conta ainda a lenda que o tropeiro deixou o local e não andou muito, pois logo a seguir foi acometido de loucura e despenhou-se com o seu cavalo num precipício, tendo morte horrível.... A lenda do escravo Sebastião atravessou os anos até que em 1902 inaugurou-se, no próprio local da forca, a capelinha de São Sebastião, em memória do triste episódio. Até hoje, os devotos do patrono do enforcado dali vão solicitar suas graças acendendo inúmeras velas, numa cena que se repete há dezenas de anos e que revive, em cada chama, o drama que assombrou os nossos avós e que chegou até hoje, envolto 17


CAUSOS DE SACO BARREIRO na mesma aura de mistério e de piedade...

LENDA DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO Conta se que no inicio da formação da aldeia e, quando da construção da sua Igreja estava tudo acertado para que a sede da freguesia fosse na de Neves. Já lá estava todo o material necessário para a construção da Igreja e também a santinha. Nesse dia, a santinha desapareceu, aparecendo mais tarde no Rosário, em cima de uma oliveira. Os escravos foram buscar a santinha e levaram-na novamente para a de Neves. No dia seguinte e por mais três ou quatro dias aconteceu a mesma coisa. Tantas vezes isto aconteceu que decidiram levar o material para o Rosário e construir a Igreja a no local onde se encontrava a oliveira, onde se encontra o altar actualmente.

IGREJA DA COMUNIDADE

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JOAQUINA E OS ESCRAVOS Uma delas é que gostava de recrutar negros escravos para o seu deleite erótico. Naquele tempo os senhores podiam até fazer isso, mas nunca as mulheres. Dizia-se que dava ordens para que se colocasse o amante eventual “de molho” numa banheira, durante dias, antes dos seus serviços sexuais, a fim de retirar-lhe o “bodum”. Alguém chegou a vê-la enlaçada com um escravo à margem do córrego das Areias, em plena luz do dia, num lugar onde havia um monjolo. Segundo as más línguas, a engenhoca, com suas batidas intercaladas e constantes, ditaria o ritmo da cópula, enquanto transformava o milho em fubá. Ainda hoje, as pessoas da região contam risonhamente esta história concluindo quase sempre com uma frase inusitada: “Era uma pancada de lá e outra de cá! Na beira do corgo, êta mulher safada, Sô!”.

CASTRAÇÃO DO GENRO Certa vez, uma de suas filhas reclamou que seu marido a estava traindo com várias mulheres. Joaquina mandou chamar dois dos seus melhores peões que cuidavam das castrações dos garrotes e ordenou que castrassem seu genro sem que corresse uma única gota de sangue. Assim foi feito.

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NEGRINHO DO PASTOREIRO Conta a lenda que nos tempos da escravidão, havia um estancieiro malvado com negros e peões. Em um dia de inverno, fazia muito frio e o fazendeiro mandou que um menino negro de quatorze anos fosse pastorear cavalos e potros que acabara de comprar. No final do tarde, quando o menino voltou, o estancieiro disse que faltava um cavalo baio. Pegou o chicote e deu uma surra tão grande no menino que ele ficou sangrando. Disse o estancieiro: “Você vai me dar conta do baio, ou verá o que acontece.” Aflito, o menino foi à procura do animal. Em pouco tempo, achou o cavalo pastando. Laçou-o, mas a corda se partiu e o cavalo fugiu de novo. De volta à estância, o estancieiro, ainda mais irritado, bateu novamente no menino e o amarrou nu, sobre um formigueiro. No dia seguinte, quando ele foi ver o estado de sua vítima, tomou um susto. O menino estava lá, mas de pé, com a pele lisa, sem nenhuma marca das chicotadas. Ao lado dele, a Virgem Nossa Senhora, e mais adiante o baio e os outros cavalos. O estancieiro se jogou no chão pedindo perdão, mas o negrinho nada respondeu. Apenas beijou a mão da Santa, montou no baio e partiu conduzindo a tropilha. A partir disso, entre os andarilhos, tropeiros, mascates e carreteiros da região, todos davam a notícia, de ter visto passar, como levada em pastoreio, uma tropilha de tordilhos, tocada por um Negrinho, montado em um cavalo baio. Desde então, quando qualquer cristão perdia uma coisa, fosse qualquer coisa, pela noite o Negrinho procurava e achava, mas só entregava a quem acendesse uma vela, cuja luz ele levava para pagar a do altar de sua madrinha, a Virgem Nossa Senhora, que o livrou do cativeiro e deu-lhe uma tropilha, que ele conduz e pastoreia, sem ninguém ver. Quem perder coisas no campo, deve acender uma vela junto de algum mourão ou sob os ramos das árvores, para o Negrinho do pastoreio e vá 20


CAUSOS DE SACO BARREIRO lhe dizendo: “Foi por aí que eu perdi... Foi por aí que eu perdi... Foi por aí que eu perdi.”Se ele não achar, ninguém mais acha. REUNIÃO NA IGREJA

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FICHA TÉCNICA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Instituto de Ciências Humanas Marina Santos Salim (Pedagogia - 4º Período) Michelle R. de Araújo Dias (Pedagogia - 4º Período) Neide Elizabeth F. da Silva (Pedagogia - 4º Período) Pedro Henrique Barata (História - 4º Período) Trabalho “Causos de Saco Barreiro” realizado à partir da visita na Comunidade Saco Barreiro. Fotografias: Marina Santos Salim. Entrevistas realizadas por: Neide Elizabeth Ferreira da Silva, Marina Santos Salim e Pedro Henrique Barata. Entrevistados: Leandra Cristina, Igor Antonio, Wilton Almeida e Alquerino Almeida Seleção do material: Neide Elizabeth Ferreira da Silva e Michelle R. de Araújo dias. Edição do Livro: Marina Santos Salim.

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