Inconfissões

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GRUPO DE PESQUISA PIPOL Projetos Integrados de Pesquisa On Line UNESP - DEPTO DE DESIGN

Caroline Apolinรกrio Gomes Marina Ling Wang

Projeto de Conclusรฃo de Curso de Design Orientador: Prof. Dr. Dorival Campos Rossi


“Lá onde outros propõem suas obras, eu não pretendo fazer outra coisa senão mostrar meu espirito.” O Umbigo dos Limbos Antonin Artaud





Esse projeto surgiu do anseio de explorar o que existe dentro de nós. Entender melhor quem somos, o que vivemos e o que sentimos. Qual o sentido da vida? Qual o seu objetivo? O que é sagrado? Do que o espírito é feito? O que nos faz continuar a viver? E pelo que vale a pena morrer? Queremos expor nossos questionamentos, nossos medos e nossos desejos. Durante todo o desenvolvimento do projeto nos vimos imersas numa profunda investigação pessoal, onde através do autoconhecimento adquirido pouco a pouco, conseguimos dar forma ao que chamamos de “Inconfissões”. Queremos fazer um convite ao que existe em nossa mente, ao que nos constroi como seres humanos.

O projeto se dá através de uma instalação performática, explorando tanto o nosso corpo - através da performance - como nossa mente - através da instalação. O corpo foi escolhido como base do trabalho por ser uma extensão direta da nossa mente. É através da consciência corporal que nos conectamos com o nosso universo mais íntimo. Nessa busca pelo que somos, voltamos ao útero de nossas mães, reviramos nossa infância, passamos por aqueles momentos que queremos esquecer e por fim, chegamos ao momento presente. Toda essa investigação foi essencial para tornar o projeto real e acima de tudo, verdadeiro.

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Como o próprio nome diz, trata-se de tudo aquilo que nos inspirou durante toda a construção do projeto, servindo como base e dando forma ao que foi se concretizando em “Inconfissões”.

uma vez que uma de suas intenções é justamente explorar esse organismo complexo, formado por dualidades e “desconexões” - formando o que conhecemos como ser humano.

Ao invés de dividir os conceitos, resolvemos deixá-los da forma como foram surgindo para nós, pois encontramos dificuldades ao tentar separá-los em tópicos.

Tinhamos em mente alguns pequenos sketchs do que queriamos explorar primeiramente o nosso próprio eu, seguido dos sentimento que nos envolvem para posteriormente conectá-los ao teatro, corpo, mente, cenário e design.

Todo esse emaranhado de pensamentos está intimamente ligado, separá-los seria como colocar cada uma de nossas ideias em gavetas isoladas, o que contradiz o projeto,

Dessa forma começamos nossa pesquisa pelas bases de alguns desses conceitos e assim a coisa toda foi se desenrolando e ganhando vida própria.

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* Estados Alterados de ConsciĂŞncia


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Retrato feito pelo próprio Antonin Artaud, no ano de 1946, em Paris - época em que estava internado no hospício

Uma das inspirações iniciais foi Antonin Artaud, artista francês ligado ao movimento surrealista, que lutou contra o formato tradicional do teatro de sua época.

Artaud usa o teatro como uma forma de externalizar a crueldade presente no ser humano, chega até a comparar o teatro com a peste:

A partir do Teatro da Crueldade, o artista questiona a forma de diálogo do teatro e a racionalidade da sociedade ocidental, critíca a expressão corporal subordinada ao texto, alegando que dessa forma as emoções seriam superficiais e sistemáticas, sem um verdadeiro envolvimento.

“Como a peste, o teatro é, portanto, uma formidável convocação de forças que conduz o espírito, por exemplo, à origem de seus conflitos.”

Artaud busca um aprofundamento maior, o teatro puro. Pregava o uso de elementos que hipnotizassem o espectador, fazendo com que não houvesse distância entre o ator e a platéia. Todos seriam atores e todos fariam parte de um todo. Essa forma de teatro valoriza todo o processo - como um ritual. Artaud propõe que o palco seja uma “reprodução de sonhos e exposição dos mistérios da alma humana”.

“O espectador que vem ao nosso teatro deve ser avisado na entrada que somos capazes de fazê-lo se levantar e sair apavorado de sua cadeira. O espectador deve estar convencido de que nós somos capazes de fazê-lo gritar.”

O Teatro da Crueldade proposto por Artaud em nada tem haver com crueldade no sentido literal da palavra, a crueldade está na forma como o autor (encenador) é exposto à platéia, fazendo com que o mesmo seja tão verdadeiro a ponto de ser perturbadora. Não existem máscaras, é a exposição do serator que está em “jogo”.

O ato de “encenar” traz à tona todas as forças profundas e ocultas que nos constroem, Artaud afirma que essa “explosão” pode ser cruel. Dessa forma, ele compara a externalização de nossas forças mais profundas com a peste, que leva o homem a se ver exatamente como ele é, sem máscaras, exteriorizando todos os sentimentos por pior que sejam. Atravéz de Antonin Artaud conhecemos um importante diretor de teatro e dramaturgo da mesma época Nicholas Evreinov - que aborda algumas questões importantes do nosso projeto. Para Evreinov “Todo o mundo é um palco, e todos os homens e mulheres meramente atores” - dessa forma ele afirma que estamos constantemente encenando, mesmo estando sozinho “O homem não atua somente quando


ele se sabe visto pelo outro. Ele continua a ‘atuar’, mesmo sozinho, inteiramente abandonado a si mesmo. E mesmo, nesses momentos ele é não somente ‘ator’, mas ainda, ‘autor’ e ‘diretor.’” Quando estamos de frente para um espelho não buscamos a verdade, estando diante de nós mesmo colocamos uma máscara, buscando um consolo, um distanciamento do nosso próprio ser. Evreinov vai mais a fundo e chega a dizer que mesmo quando estamos dormindo, encenamos através dos sonhos, buscando uma realidade imaginária. Artaud e Evreinof nos instrigou a pesquisar mais sobre a alma humana, a essência dentro de cada um. A questão das máscaras, das formas de atuação que passam a fazer parte do artista. Outras figuras importantes nessa pesquisa sobre teatro foram Eugenio Barba e Jerzy Grotowski – fundadores do Odin Teatret , na Noruega no ano de 1964. Para fundar esse novo grupo de teatro, Barba convida alguns alunos que foram reprovados na Escola de Teatro de Oslo – e desde então, há 50 anos o gupo se mantém quase o mesmo.

enciar seu pensamento e sua maneira de fazer teatro. Para que o ato se torne verdadeiro, Grotowski propõe o seu desnudamento, onde passariam “.. por uma imersão desse artista em si mesmo, quando ele vai investigando questões próprias que possam alimentar seu processo criativo, para então serem devolvidas à cena, transmutadas em composição poética.”

Sendo assim, o desnudamento do ator está ligado a retirada de suas máscaras e ao esforço pela aceitação pessoal, que quando buscadas por um intérprete tanto no processo, quanto diante do público, visa um encontro real consigo mesmo. Essa forma de trabalho pessoal do ator estaria diretamente ligada ao seu desempenho expressivo.

Para fundar o Odin Teatret, Barba busca referências no Kathakali – o teatro tradicional indiano – que passa a influInconfissões 13


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Dessa forma, fomos em busca de artistas que usam sua arte – através do corpo - para explorar seu interior, que expõem suas dúvidas, inseguranças, medos e conseguem através disso chegar mais afundo dentro de seu próprio eu. Kazuo Ohno foi um desses artistas que conseguiu explorar sua dor de uma forma muito poética. Junto de Hijikata criaram o estilo de dança-teatral Butoh. Segundo a pesquisadora e doutora em dança da Universidade Federal de Viçosa (UFV) - Solange Pimentel, o butoh “são os ‘demônios’ de significado universal: o sexo, a raiva, o disforme, emoções vivas enclausuradas nas mentes japonesas que não se ousava tocar.” Para Kazuo Ohno: “Butoh” é a volta às origens, aos mistérios da vida ‘Eu não estou interessado em uma bela estrutura de dança nos moldes tradicionais. A Dança é um caminho de vida, não uma organização de movimentos. Minha arte é uma arte de improvisação. É muito perigosa. Eu tento revelar com meu corpo todo peso e mistério da vida, seguir minhas memórias até o útero de minha mãe.“


O Butoh busca nas vanguardas européias como no expressionismo, no cubismo, no surrealismo e nas próprias danças japonesas - Nô e Bugaku - sua essência. Dessa forma, segue fora dos padrões convencionais, não possui movimento estereotipados e nem técnicas específicas.

É importante ressaltar que o Butoh foi criado no pós-guerra, carregando o sofrimento do povo japonês daquela época.

Sua preocupação vai além da estética, o butoka se preocupa em externalizar seu eu, mostrar a individualidade de cada ser, se desmascarar diante de si mesmo e de todos mergulhando profundamente em seu subconsciente, em um processo levado ao extremo. Para Solange “Há um efeito de vertigem no olhar. A obra é uma espécie de moldura para a autocontemplação de um olhar que encara o vazio existencial. O trabalho exige uma autoconsciência, ao mesmo tempo ampla e localizada, muito difícil pelos paradoxos constantes. É necessário luz para se ver o oculto, e este oculto está dentro de cada um.”

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Paralelamente ao Butoh, a professora de pós-graduação da PUC/SP - Christine Greiner, debate em seu livro “O Corpo” questões voltadas à estética, política e à experiências artísticas envolvendo o corpo.

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“O corpo é um contexto sensitivo, uma transição espaço-temporal onde percorrem informações de origem interna e externa”

Christine nos mostra um cenário onde o corpo não é apenas recipiente e transmissor de informações, ele é o transformador delas, o ponto de contato entre o que já está registrado e o que é novo. Um corpo que está em contínuo processo de transformação. Em seu livro, Christine afirma que o “si-mesmo” também conhecido como “self” - “não diz respeito apenas ao interior de um corpo, mas às conexões com o exterior …”. A autora faz referência a Antonin Artaud ao propôr “o avesso da representação” - que consiste em um em novo modelo de corpo – “anarquista, não-orgânico, acefálico e vital”. Com essa mudança, deixa evidente o conceito de “corpo sem orgãos” do mesmo ator, “... o corpo sem orgãos de Artaud referia-se ao abandono dos automatismos (…) um conjunto de práticas que constituiriam uma experiência limite… O corpo pode ser vivo mas não necessarimente orgânico e é nesse sentido que se distingue da metáfora do corpo-organismo.”

Com a ajuda da professora Helena Katz, Christine desenvolve “A Teoria do Corpomídia” – que como o próprio nome diz, faz uso do corpo como sendo a própria ferramenta de linguagem e forma de expressão. Segundo Katz, o corpo: “está em permanente processo de evolução com o ambiente natural e cultural em que se encontra. O objetivo da teoria é trabalhar com todos esses trânsitos, fluxos simultâneos, compreendendo o corpo como ativador de mediações.”

Assim, o corpo ganha uma nova visão - ao mesmo tempo em que não se pode separar corpo e mente - é preciso entender que o mesmo não é apenas um envólucro. Esse corpo, da mesma forma que a mente, possui memórias. Cada um de nós possui uma conexão interna-externa ao corpo, o “self” - é nele que se encontra registradas as experiências já vivenciadas e onde também se inserem as novas. Segundo Christine, o centro da memória corporal se encontra no cérebro, porém, esse centro ativa diferentes partes do corpo, portanto “ a memória não é somento mental, mas corporal”. Ainda em seu livro - “O Corpo” Christine discute a questão do corpoartista, qual a função desse corpo?


Através da dança ela explica um pouco mais essa função: “dançar é entrar num universo simbólico de representação e tradução do conteúdo do corpo”

assim, afirma que o corpo biológico e o corpo cultural são inseparáveis. “Eles forman uma rede de fenômenos complexos que acontecem de forma contínua, interdependentes, sem um marco inicial ou final. Cada situação cotidiana pela qual o corpo passa se reflete nele de uma forma singular e, consequentemente, essa singularidade se coloca na hora que o corpo dança. É uma mistura de subjetividade com cultura.”

O estudo sobre o corpo feito por Christine Greiner se mostrou muito completo, abordando desde áreas biológicas e fisiológias até questões filosóficas. O que mais nos chamou a atenção foi a forma como a mesma conecta o corpo físico com o mental e de como essa conexões se mostram nas artes. A dança é um dos exemplos mais usado pela autora, mas a mesma faz referência as artes cênicas, a performance

e artes plásticas. Por fim, deixa claro que seu conceito de arte, vai muito além do campo visual, explorando o corpo como uma ferramenta multisensorial. Pensando no corpo como uma ferramenta de linguagem, seguimos nossa pesquisa partindo para performance um estilo de manifestação artística que surge nos anos 70 e tem suas origens ligadas aos movimentos vanguardistas do início do século XX. Inconfissões 17


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pesquisador e performer brasileiro, diz em seu livro “Performance como linguagem” que

Em “Arte da Performance” de Roselee Goldberg, a autora usa o termo “arte conceitual” para explicar um pouco melhor sobre o assunto, que seria o lugar onde as ideias são mais importantes que o produto - dessa forma, esse novo estilo de arte vem para concretizar esse conceito. Para Goldberg a performance é vista como um

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“meio de expressar ideias, dar vida a ideias formais e conceituais das quais se baseiam as criações artísticas”,

cada performer cria sua própria definição do que é essa arte ao longo de seu processo artístico e modo de execução. Mesmo depois de várias décadas de sua criação, a performance ainda encontra dificuldades para ser traduzida em palavras. Renato Cohen,

“a performance se colocaria no limite das artes plásticas e das artes cênicas, sendo uma linguagem híbrida que guarda caracteristicas da primeira enquanto origem e da segunda enquanto finalidade”

Nesse sentido, conseguimos perceber que a performance, sendo uma linguagem híbrida, tem como caracteristica juntar diferentes formas de expressão, colocando o corpo como objeto central, uma vez que esse não é apenas a ferramenta para transmitir a mensagem, ele próprio é a mensagem. Cohen faz referência ao surrealismo para explicar melhor o funcionamento da performance. Através da collage (técnica bastante utilizada nessa vaguarda), observa-se uma ligação com a psicologia de Freud - “A collage seria o melhor veículo para explicar o funcionamento do mundo dos sonhos, o inconsciente, e a chave desse enigma se encontraria nas collagens de Max Ernst.”


Antonin Artaud usa o termo “potências vitais” em seu livro “O Teatro e seu Duplo”

“O princípio da realidade já diz respeito a toda uma ‘realidade’ cotidiana, e é esse o erro, a nosso ver, de todo um teatro racionalista que repete esse caminho, não libertando, como diz Artaud, as ‘potências vitais’ do homem. A arte e todo processo de salto de conhecimento deve constituir-se de uma parcela de não intencionalidade, de não deliberação. É necessário penetrar o desconhecido para se descobrir o novo.”

Dessa maneira, Cohen nos mostra que a performance pretende lidar com o corpo de uma forma mais intensa, saindo do cotidiano e entrando nas profundezas de cada indivíduo. “A utilização da collage, na performance, reforça a busca da utilização de uma linguagem gerativa ao invés de uma linguagem normativa: a linguagem normativa está associada à gramatica, à fala encadeada e hierarquizada (...). Isso tanto ao nível do verbal quanto ao nível do imagético. Na medida em que ocorre a ruptura desse discurso, através da collage, que trabalha com o fragmento, entra-se num outro discurso, que tende a ser gerativo (no sentido da livre-associação).”

Para esclarecer um pouco melhor, abaixo segue uma tabela retirada do livro “Performance como linguagem” que faz um comparativo do teatro com a performance.

(Alguns conceitos usados nesse tabela foram adaptados a partir do artigo de Richard Schechner - “Post Modern Performance”, 1979. )

Continuando esse mesmo raciocínio, Cohen fala do teatro -


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A performance basicamente se difere do happening por ser mais cuidadosamente elaborada e não envolver necessariamente a participação dos espectadores, pode ou não possuir um roteiro e acontece com ou sem a presença de um público. Além disso a passagem do happening para a performance se deu pelo aumento da esteticidade.

Nesta mesma tabela, Cohen coloca o happening - estilo antecessor da performance. As pesquisas de Renato Cohen relacionadas a performance, deixaram as palavras de Christine Greiner ainda mais evidentes, o corpo mais uma vez é usado como uma ferramenta fundamental. Paral tal, é importante pensar na forma como esse corpo será usado, como o mesmo será explorado? O que será explorado? Assim como no Butoh, uma dança baseada nas emoções pessoais, que deixa de lado a coreografia tradicional, abrindo espaço para um treinamento individual mais intenso, Pina Bausch também possui caracteristicas bem interessantes nesse aspecto.

Alemã, nascida na década de 40, Pina Bausch revolucionou por completo o universo da dança, alterando os padrões tradicionais do ballet. Conhecida como criadora da Dança-Teatro “contemporânea”, sendo essa, a união da dança com alguns elementos do teatro, Pina faz uso de uma forma diferente de treinamento, indo além de ensaios e coreografias, ela instiga seus alunos a irem a fundo dentro de si, a se conhecerem e se questionarem.

Em suas peças nota-se que os dançarinos não dançam apenas, mas correm, gritam, riem, derramam água e jogam terra no chão do palco, dão piruetas velozes e esticam as pernas para o alto. Essas ações fazem parte da vida do próprio ser humano, que são, por sua vez, constituido por medos, amores, tristezas e fúrias. A partir desses estímulos do corpo de cada um é que Pina consegue explorar e criar o que será apresentados em seus trabalhos. No processo criativo, Pina costuma fazer perguntas aos dançarinos sobre o que sentem e pensam, e trabalha em cima destas questões. Uma coisa que ela sempre dizia era “confie em si mesmo, se enxergue e se sinta”. Um exemplo desse método é a peça “Nelken”(“Cravos”) na qual cada membro do grupo conta a história do seu primeiro amor de uma forma bem pessoal, e isso transparece em seus trabalhos, ganhando um caráter único, tocando e emocionando a todos que presenciam suas obras.


O filme “Pina Bausch” de 2011, é uma homenagem feita por seus alunos à dançarina que morreu em 2009. Nele, são apresentadas vários trabalhos e fica nítido o quão grande é o envolvimento dos dançarinos. Trata-se de um filme muito expressivo, onde toda a energia dos artistas é transmitida através do corpo e da alma.

Falando um pouco mais sobre performance - uma das bases que mais estudamos - não podemos deixar de falar de uma das nossas grandes inspirações durante todo o projeto - Marina Abramovic, uma artista que iníciou sua carreira nos anos 70 e continua em atividade desde então. Considerada a “avó da performance”, seus trabalhos exploram os limites do corpo, as possíbilidade da mente e a relação do artista em cena com a plateia. Marina atinge a consciência corporal explorando seu corpo de diversas formas, entre elas, por atos repetitivos e/ou de longa duração. Através de movimentos cotidianos - como andar, sentar, se levantar - a artista explora seu Inconfissões 21


consciênte e inconsciênte. A mente é a responsável pelo corpo, e quando esse corpo dói (pelos movimento repetitivos, posições incomodas, ferimentos…), Marina se utiliza dessa dor para canalizar ainda mais suas energias internas, elevando e alterando seu estado mental.

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Mais a frente falaremos sobre Estados Alterados de Cosciência - Marina desenvolveu alguns métodos que também possibilitam isso.

Uma palavra que define seu trabalho é intenso. Ao assistir suas performances conseguimos sentir sua energia transbordar, percebemos a total doação da artista naquele momento. Foi em 1974 que Marina Abramovic marcou sua entrada no intenso mundo vivo e visceral da performance, através de uma série de peças que concretizava seu conceito sobre corpo, resistência, cumplicidade e perda de controle, a passividade de cada um e o perigo envolvido em todo processo. Nesses trabalhos, Marina explorava os limites da auto-descoberta, para si e seu público. Tempo, calma, energia, dor e a consciência elevada eram consequencias dos trabalhos de longa duração. Em Rhythm 0 - sua primeira performance de longa duração, a artista permaneceu completamente passiva por seis horas em frente a uma mesa com 72 objetos dos mais variados tipos (açucar, mel, flores em contraponto a facas, chicotes, tesoura e até uma arma). Nesse trabalho, Marina foi o objeto de exploração. A forma como a

perfomance seguiria estava nas mãos do público, não havia um controle da situação. Durante essas seis horas de trabalho, Marina foi criticada e defendida pelos participantes. Atitudes como tirar sua roupa, beija-la, desenhar em seu corpo e até apontar uma arma carregada em sua cabeça, fizeram parte da performance. A artista chegou a dizer que em algumas situações, como a de Rhythm 0 - quando se da liberdade, as pessoas se tornam animalescas, tendo atitudes extremas. Após as seis horas de performance, ainda em silêncio, Marina calmamente quebrou seu estado de transe e caminhou diretamente para a mutidão, que rapidamente se desfez. Esse trabalho, assim como alguns outros da mesma época, Marina queria testar a si e ao público, ao quebrar a “quarta parede” - ela coloca o público no lugar de interactor (termo usado no Work In Progress - que falaremos mais a seguir), esse público agora não é mais passivo, ele faz parte de todo o processo de construção do trabalho presente.


Em 1976, com um trio de performances, Marina tinha como proposta sua limpeza física e mental. Para isso ela esgotou suas três principais faculdades de expressão - voz, linguagem e corpo. Em “Freeing the Voice”, Marina, fica deitada de costas em um colchão e grita com toda sua força até que sua voz acabe - esse ato levou 3 horas. Em “Freeing the Memory”, a artista fala cada

palavra que conhece, sem repetir, até ficar sem palavras e com sua consiência completamente em branco - esse esgotamento de espírito levou 1h30. E por último, “Freeing the Body” ainda em 1976 - com o corpo completamente nú e o rosto coberto por um lençol, Marina dança por 6 horas seguidas ao ritmo de bongo até seu corpo entrar em colapso.

“Freeing the Memory”


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Fotos dos participantes que se sentamram com Marina na perfomance “The artist is present”

Ao longo dos anos, Marina foi ganhando espaço e pôde desenvolver ainda mais suas características como performer. Em 2002 - “Ocean View” a artista passa 12 dias vivendo em exposição da Sean Kelly Gallery - em Nova York. Nesse periodo de 12 dias, Marina não se permitiu comer ou falar. Sua moradia consistiu em três plataformas elevadas um deles com uma casa de banho, uma com uma pequena mesa e cadeira e o terceiro com uma pequena cama e outra cadeira. Sua rotina consistia em beber água, tomar banho três vezes ao dia e não mais que sete horas de sono. Os degraus que ligaram as plataformas ao chão foram substituídos por escadas com facas, para evitar a descida. Seu mais recente trabalho é de 2010, “The artist is present” - foi apresentado no MoMA, e como o próprio nome diz, a artista estava presente o tempo todo. Durante todo o horário de funcionamento do museu, por pelo menos oito horas por dia, seis dias por semana, ela estava sentada em uma cadeira, imóvel. Qualquer visitante do museu poderia se sentar na frente da artista, olhando em seus olhos, durante o tempo que quisesse. Ao todo foram mais de 750 mil visitantes e 736 horas de trabalho que Marina Abramovic esteve presente,

naquele momento, sentindo o desejo do público e olhando profundamente para cada um que sentasse em sua frente. Com esses exemplos de alguns trabalhos, podemos perceber que para Abramovic, um dos elementos mais importantes é o tempo. Para ela, o tempo explora tanto o performer como as próprias ações realizadas durante esse processo - ações consideradas banais e cotidianas ganham uma visão diferente, tornando cada momento do trabalho individualizado. Através dessa mudança de percepção, intérprete e público podem efetivamente pisar “fora do tempo” - permitindo a ambos refletir sobre questões mais profundas da alma humana.


Algumas das caracteristicas exploradas por Marina Abramovic também faz parte dos estudos de Renato Cohen - a interação direta do público, colocando-os no papel de “construtor” da performance - faz parte do que Cohen chama de Work in Progress. Já falamos sobre ele mais acima ao explicar do que se trata a performance e agora vamos retoma-lo pois seus estudos sobre Work in Progress também são bem completos.

Em seu livro “Work in Progress na cena contemporânea”, Cohen, diretorcriador do teatro experimental, sempre ligado a inovações multimídias, - classifica o work in progress como sendo: “uma nova forma de trabalhar a performance”... “ um teatro contaminado pelas outras mídias (dança, música, artes-plásticas, instalação), tomado pelo hibridismo fugindo as categorizações, se tornando assim um plano de criação intermídias, processual e instável.” “uma cena polifônica e polissêmica apoiada na rede do hipertexto”

O work in process carrega a noção de trabalho e de processo. O trabalho se define em dois momentos: um de obra acabada como resultado - produto; e outro, do percurso, processo - obra em feitura. Assim sendo, work in process significa trabalho em processo, sendo esse, a junção de várias linguagens - é a fuga do racional, do verbal, do linear. Um jogo dialético entre visível e invisível, o oculto e o evidente, o explicável e o inexplicável. “Ocean View”

“É hipertexto, você entra num lugar e já cai em outro.” Inconfissões 25


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as seguintes características principais que o diferenciam de outras formas de procedimento criativo: • não parte de condições estabelecidas a priori (texto, autoria, mapa de personagens); •opera-se através da hibridização e superposição de conteúdos e estruturas; -organiza-se por meio de leitmotiv ou linhas de força em que a ação dos performers em laboratórios interfere na construção do roteiro / storyboard;

O discurso verbal/textual e hierarquico do autor, dão espaço para novos movimentos, gestos e ações físicas. O corpo, assim como todos os adereços, figurinos, luz, cenário, não são meramente ilustrativos - eles fazem parte de todo o progresso. O corpo em cena, assim como todos os demais elementos são também os definidores do teor da obra. (Se refletirmos um pouco, veremos que não é tão distante de Artaud há nos anos 50, ao propor o “Teatro da Crueldade”). O work in process aparece primeiramente em manifestações parateatrais, nas performances, happenings, eventos, cena multimídia e também nas linguagens de trânsito, como aquelas encontradas na dança-teatro de Pina Bausch. Essa processo de criação e também de encenação, tem, segundo Cohen,

• implica em iteratividade e sucessivas mutações, evitando cristalizar-se enquanto produto final; • substitui a narrativa clássica, temporal e causal, pela organização espacial sincrônica, desmanchando o paralelismo entre sentido e representação.

Silvia Fernandes, pesquisadora de artes cênicas que participa do livro de Renato Cohen, diz que tais procedimentos substituem o desenvolvimento dramático clássico do teatro, “... uma arte que recusa a forma acabada e faz sua ontologia no território obscuro da subjetividade.”

Estamos diante de um novo cenário, o qual Samuel Beckett nomeou de “nova consciência contemporânea”, onde a “harmonia, balanço e proporção dão lugar a desarmonia e narrativas sem significado fechado”

O mais importante dentro do work in process é a interação do público com o performer pois o espectador além de fazer parte da obra, dára a direção e sentido do roteiro da peça. Sendo assim, há o intuito de provocar um tipo especial de apreensão, através de uma cena que promova algo que poderia ser descrito nas seguintes palavras de François Jullien - filósofo contemporâneo que se debruça sobre a noção de sabedoria: “.. em vez de forçar o pensamento, ela se infiltra nele e, nele se dissolvendo, o ‘banha’ e contamina.”

Paralelamente aos estudos sobre o corpo e performance como forma de expressão, encontramos um designer brasileiro que serviu para abrir ainda mais nosso campo de visão. Nos voltamos agora para uma pesquisa mais “plástica” - voltada para imagem.

Samuel Beckett foi um dramaturgo e escritor irlandês, considerado como um dos escritores mais influentes do século XX.


referência ao passado daquele local, “A Mente” - parte referente ao trabalho feito em cima do conceito de loucura e “Os Paciente” - que homenageia os moradores do hospital.

Flávio Wild é um design gráfico, fotógrafo e escritor brasileiro que nos ajudou a concretizar todo esse amontoado de ideias que tinhamos em mente e ainda não sabiamos muito bem o que fazer com eles. Autor de “Porões da Mente” - projeto apresentado durante o evento de performances da 3ª Bienal de Artes Visuais do Mercosul em 2001 e, mais tarde, premiada na 6ª Bienal de Design Gráfico - foi uma ambientação feita nos porões do Hospital Psiquiatrico São Pedro - em Porto Alegre. Nesse trabalho é possível perceber a junção de todo o contexto histórico daquele local com o momento presente. Flávio dividiu seu projeto em três partes, sendo elas: “A História” - em

Foi somente ao organizar seu trabalho na forma de um projeto conceitual e com ajuda de registros fotográficos, que Flávio conseguiu suas premiações. Segundo ele, se não fossem as pranchas impressas e o apelo conceitual que se seguia, “Porões da Mente” seria visto como arte, e não como design. “Eles quase não premiaram [Porões da Mente] porque acharam – ‘não, isso daqui é arte. Tá fora. Tá fora do design’ – mas acabaram premiando porque, no fim da discussão, eles chegaram a conclusão de que era arte, sim; mas, como tinha uma linha conceitual e o trabalho estava fundamentado em uma linha conceitual muito forte (...) então, eles consideraram que era design, sim. Porque tinha essa questão conceitual que era mais forte do que, simplesmente, um desenho aleatório de projeto.”

Dessa forma, quando Flávio diz que “o trabalho estava fundamentado em uma linha conceitual muito forte”, considera-se que “a arte e o design não são os limites de Porões da Mente, mas Inconfissões 27


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campos de existência e testemunho. O apriore da obra foi um compromisso com a memória do HPSP, dessa forma, a arte é o campo de emergência de Porões da Mente e o design surge como um campo de sobrevida.” Flávio diz que sua trajetória profissional influenciou muito no resultado desse trabalho. “Eu tenho formação de arquiteto; disso, vem a questão de trabalhar o espaço. Em 1990, desde que eu comecei a trabalhar com design, eu trabalhei com design na área da cultura; relacionado a espetáculos e a eventos artísticos: cenário de teatro; direção de arte para publicidade; créditos de abertura e vinhetas para cinema.”

Wild passou dois meses coletando dados e materiais, ao final desse periodo conseguiu juntar um acervo de registros históricos formado por fragmentos do local e da opnião de outras pessoas que conheciam o hospital, juntou objetos que estavam jogados em desuso e aproveitou também sua arquitetura, que se encontrava abandonada e em ruínas. O que achamos mais interessante no trabalho de Flávio Wild é a forma como o designer consegue transformar


em algo concreto todas as memórias que estavam aprisionadas nos porões daquele hospital, trazendo a tona o que já havia caido no esquecimento. Flávio cria ambientes sinestésicos - a partir do jogo de luzes, cores, sons, imagens e objetos que já se encontravam no local, fazendo com que as pessoas adentrem num novo plano, se sentindo como parte daquilo. Segundo o próprio autor “... é um caminhar meio dificultoso (...) dramático”. Um reporter chamado Hélio Barcellos - que esteve presente na apresentação do trabalho - diz que “Porões da Mente” é capaz de:

“proporcionar ‘lembranças delirantes’ de um enclausuramento que o público nunca teve, mas que é parte da memória coletivas dos pacientes.”

A junção de todos esses elementos concretizou o trabalho de Flávio Wild como sendo um encontro com a “memória” do local, dos pacientes que ali viveram e também dos visitantes, que mergulharam em uma obra de arte viva, um organismo que quase se poderia sentir seus batimentos cardíacos.

Gostariamos de expor mais algumas de nossas referências de forma mais geral, são inspirações que nos guiaram tanto pela estética ou pelo conteúdo.

Um pouco mais de performances Berna Reale é uma performer paraense que tem como foco de suas obras a violência. “Aquilo que mais te incomoda, aquilo que faz tu pensares sobre o mundo é o motor pra fazer arte. No meu caso, o que mais me incomoda é a violência. Me incomoda muito a questão do ser humano não se ver no outro, e o que me assusta é a violência se tornar íntima”

Em 2009, Berna ficou conhecido pela performance “Quando todos calam”, que retratava bem a dimensão visceral de seu trabalho: nua, ela passou uma tarde deitada em frente a um supermercado em Belém, coberta por carne crua e rodeada por urubus. Inconfissões 29


Inspirações

Sua exposição “Vazio de Nós”, contém cinco performances em forma de vídeo realizadas entre 2011 e 2013 em Belém, os quais criticam as injustiças e desassistências sociais que produzem um enorme contingente de indivíduos sem sonhos, habitantes de zonas marginalizadas constituintes de uma geografia global da exclusão. São elas: Limite Zero, Palomo, Soledade, Americano e Ordinária.

“Ordinário” - Berna aparece recolhendo e transportando cerca de 40 ossadas de vítimas anônimas de homicídios na área metropolitana da capital. Tais restos mortais, de pessoas dadas como desaparecidas, geralmente são encontrados por agentes policiais em cemitérios clandestinos e levados para depósitos, diante da ausência de reclamação de exames de DNA. A coloração e a forma dos ossos podem indicar sexo, idade e tempo de falecimento da vítima. Para usar esse material, foi necessário um minucioso trabalho de limpeza e catalogação com a ajuda de um biólogo posto que, após a performance, as ossadas retornaram aos depósitos para permanecer por mais alguns anos antes de serem enterradas para sempre pela polícia.


“Americano”, a única ação realizada longe da via pública, foi filmada no Complexo Penitenciário de Americano, no município de Santa Izabel do Pará. Usando vestes esportivas masculinas, a artista mostra-se como um indivíduo andrógino a percorrer um local de confinamento e castigo carregando uma tocha.

“Soledade” - se passa na periferia de Belém, numa rua homônima que integra uma das rotas do tráfico de drogas na região. Em iniciativa ousada, foram criados e amestrados 10 leitões para puxarem, protegidos por coletes acolchoados, uma biga construída especialmente para eles, que leva a performer em postura soberana, e alheia ao caos.

“Palomo”, filmado num amanhecer no centro da cidade, comenta o abuso de poder institucionalizado na nossa sociedade. Montada sobre um cavalo branco tingido com tintura vermelha apropriada, a performer aparece usando roupas negras e uma focinheira, objeto intimidante e que ao mesmo tempo refreia a voz e a violência do animal que a usa.

“Limite Zero”, discute a banalização da morte fazendo analogia com o procedimento do abate em série de animais, e posterior transporte das carcaças assépticas para o consumo humano.

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La Fura dels Baus é um grupo catalão fundado em 1979, Barcelona, conhecido por seu teatro urbano e uso de técnicas incomuns, embaçando as fronteiras que separam platéia e ator.

Inspirações

Samira Br é uma artista nascida e crescida na cidade de Bauru, em “Eu Nasci Aqui” ela resgata vivências da casa onde nasceu na década de 70. A primeira vez que a artista apresentou sua peça foi realmente na casa onde nasceu, sendo essa, uma apresentação única, um híbrido de sons, cores, fotografias, objetos pessoais e cartas de quando era adolecente misturadas a vídeomappings e outras projeções. O trabalho da artista é bem pessoal, retratando os caminhos percorridos por ela durante várias fases de sua vida,

ressignificando cada um deles. O fim desse trabalho se dá uma purificação, Samira mergulha em uma bacia imersa por lama e começa a se “lavar”, como um verdadeiro resnascimento. A performance “Eu Nasci Aqui” foi posteriormente adaptada e apresentada em outros locais. A casa onde Samira nasceu foi demolida após o espetáculo.

O trabalho se constitui no uso de pontos de encontro incomuns, música, movimento, aplicação de materiais naturais e industriais, incluindo novas tecnologias e a participação ativa do público no espetáculo. La Fura Del Baus começou com espetáculos de rua, e em 1983 ganha maior visibilidade com sua peça Lenguaje Furero onde os artistas e os público conseguem se conectar em uma mesma “entidade” durante o desenrolar do espetáculo, criando sua própria essência dramática. A imersão em Lenguaje Furero se inicia com alguns exercícios de desinibição que liberam os vícios inerentes em cada participante, abrindo-os para as novas propostas do grupo. Suas obras são baseadas nessa junção de linguagens e interação entre o ator e o espectador. Ao longo dos anos, a compania tem também atraído, cada vez mais, um público que não é usualmente frequentado do teatro.


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O Manifesto do grupo Derevo foi traduzido do russo para o inglês, e porteriormente do inglês para o português, sendo assim, pode haver alterações se comparado ao texto de origem.

Derevo é um grupo russo fundado em 1988, por Anton Adasinskiy.

A commedia dell’arte foi uma forma de teatro popular improvisado, que começou no séc. XV na Itália e se desenvolveu posteriormente na França e que se manteve popular até o séc. XVIII. Esta forma ainda sobrevive através de alguns grupos de teatro.Suas apresentações eram feitas pelas ruas e praças públicas. Ao chegarem à cidade pediam permissão para se apresentar, em suas carroças ou em pequenos palcos improvisados.

Ao se definirem, evitam usar as palavras “teatro” e “ator”, sendo algumas vezes encaixados na categoria de “clows” (palhaços) por vários críticos ao redor do mundo, e também dançarinos, porém, ainda que a preparação física, o sincronismo musical e a utilização do corpo para a criação de uma ordem plástica tornem seus espetáculos verdadeiros balés, essa classificação pode ser equivocada, dessa forma, o que realmente podemos afirmar seria apenas a sua origem, que se dá através do circo russo, a commedia dell´arte e o butoh. Em “Ketzal”, espetáculo apresentado em São Paulo em junho de 2007, praticamente anula a vocação “clownesca”

da companhia, aproximando-a mais de questões relativas ao universo da dança. Para desenvolver esse tema que versa sobre as culturas maia e asteca, a movimentação resgata elementos rituais indígenas. A utilização de luz e projeções - marca de outras montagens - e a própria coreografia reciclam velhos temas já visitados muitas vezes pelo próprio Derevo: temas ligados à criação do mundo, à natureza e à relação da humanidade com o planeta. Bailarinos vestindo saias encharcadas criam chuvas horizontais, chegando a respingar água na platéia. Ao lado, segue alguns trechos do Manifesto do grupo Derevo


Os membros do Derevo acreditam que o homem mantém a cabeça para baixo. Eles também acreditam na importância do engatinhamento de uma criança; o início de um movimento; o início de um som; imobilidade; sonhos; o equilíbrio de um sonâmbulo. eles percebem que os homens vivem em um estado de guerra permanente com o mundo que deu origem a ele e que ele é perdendo esta guerra a cada momento; que o homem vive uma vida curta e brutal; que há pessoas que encontraram paz e que levam vidas belas e eternas, mas suas vozes são silenciosas. “Nós não estamos confiantes de qualquer coisa, mas há algo que nos faz viver nossas vidas juntos. acreditamos que os livros antigos e amizade com os animais são importantes; que o horizonte está sempre em seus pés, e que o céu começa do chão. “ Inconfissões 35


Inspirações

Por mais de 20 anos o francês Olivier de Sagazan, desenvolveu uma técnica híbrida que integra pintura, fotografia, escultura e performance. Seu trabalho possui um aspecto forte, denso, expressivo, e segundo alguns críticos da área como sendo “inimitável”. Em sua série performativa existencial Transfiguration, que começou em 2001, Sagazan constrói camadas de argila e pintura em seu rosto e corpo para transformar, desfigurar e desmontar sua própria figura, revelando um ser humano animalesco que busca romper com a mundo físico, ao mesmo tempo que é inquietante e profundamente comovente, este novo corpo quebra as fronteiras entre os sentidos físicos, intelectuais, espirituais e animalescos do ser humano.

Assim como as performances, suas esculturas são inacreditáveis. Sagazan consegue concretizar através delas toda a escuridão existente dentro do ser humano. Possuem um caráter sombrio e poético ao mesmo tempo. Olivier afirma: “Estou interessado em ver até que grau as pessoas acham que é normal, ou até mesmo banal, estar vivo”.

O trabalho de Olivier nos tocou imensamente, e como já dito anteriormente, além de serem obras muito expressivas, sua arte é única, não encontramos nada a qual podéssemos compará-lo. Todo seu trabalho nos serviu de grande inspiração.


Após as pesquisas relacionadas a Olivier Sagazan, encontramos uma artista que possui algumas característcas semelhantes. A essência das esculturas de Olivier carrega o mesmo peso “mórbido” que os fantoches de Ilka Schönbein. Ilka Schönbein é uma titereira - manipuladora de marionetes, atriz e bailarina alemã, formada em “eurytmic dance” de Rudolph Steiner - defensor da aliança da alma e do gesto ao invés da técnica. Em “Winterreise” - A Viagem de Inverno, 2003 - podemos perceber, através de fantoches, bonecos, máscaras e próteses as confusões e conflitos de existência dentro do ser humano. Suas peças são bem viscerais e intensas. Ilka expõe a dor existente dentro de casa um de nós. Inconfissões 37


Javier Pérez é um designer e artista plástico de origem espanhola, dono de um amplo acervo de trabalhos que vão desde desenhos, esculturas, fotografias, videos e perfomances. O artista também é fonte de inspiração quando se fala em instalação - pois é através de instalações que Javier concretiza e expõe suas obras. Os seus trabalhos são caracterizados por um certo sincretismo , tanto no método e os materiais utilizados. Com seu trabalho, Javier Pérez revela suas dúvidas e reflexões sobre a humanidade , através de uma linguagem cheia de intensa metáfora e imbuído de um forte simbolismo. Suas obras contêm uma dialética intrínseca, mostrando o quão fraco pode ser o limite entre conceitos aparentemente opostos, como o natural e o cultural, o interior e o exterior ou a vida e a morte. Foi através da uma série de obras chamada “Dessins”, exposta em 2012 na Suiça, que conhecemos esse artista. Na mesma hora em que vimos os desenhos, nos identificamos. Em “Dessins” Javier expõe desenhos de corpos sobre seus próprios corpos, como um ato de “desdobramento” - um renascimento. Ele explora o interior do ser humano.


Ellen Roger também foi uma artista que nos inspirou quando falamos de expor nosso interior. Amante da fotografia analógica com foco em moda, seus trabalhos retraram sonhos, podendo ser considerados atemporais. Ellen diz que não se apega a temas específicos, sua base é a investigação pessoal, os efeitos sobre a mente, religião e ocultismo. “Eu gasto meu tempo fazendo experiências em procedimentos fotográficos alternativos e pesquisando ideias claustrofóbicos de repressão com estruturas narrativas também.” Ellen nos serviu como inspiração pela forma como explora suas fotografias, são trabalhos intensos e misteriosos. As cores que usaram, em tons envelhecidos também nos guiaram para a construção do nosso projeto.

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Inspirações

Paralelamente a todos os conceitos envolvendo o corpo performático, fizemos uma outra pesquisa que também nos guiou pelos caminhos do autoconhecimento - base de grande parte do nosso projeto. Essa pesquisa está relacionada com os Estados Alterados de Consciência.

Estados Alterados de Consciência, como o próprio nome diz, são estados mentais capazes de alterar nossa consciência e percepção como um todo, levando a um encontro pessoal, despertando os mistérios que guardamos dentro de nós, nos colocando assim, diante de nosso próprio ser.

Aldous Huxley, em seu livro “As portas da percepção” de 1954, o autor descreve suas experiências ao tomar mescalina, afirmando que essas drogas poderiam reduzir o processo de filtragem ou “abrir as portas da percepção” do nosso cérebro, nos colocando assim diante de uma nova visão sobre o mundo que nos rodeia. “O espaço e as dimensões tornam-se irrelevantes, parecendo que a percepção se alarga de uma forma espantosa e mesmo humilhante já que o ser humano se apercebe da sua incapacidade para fazer face a tantas impressões.”

Além de drogas como a mescalina, o LSD, a psilocibina, etc, em seu livro, o autor cita outras formas para se abrir as portas da percepção, como : períodos prolongados de silêncio e isolamento,

jejuns prolongados, autoflagelação (muito usado por Marina Abramovic) e meditação. Castañeda em seu livro “A Erva do Diabo” - fala sobre atingir os EAC através das plantas de poder, das quais fez uso durante o período que passou com o índio Yaqui de Sonora (México) conhecido por Don Juan. Algumas das caracteristicas dos Estados Alterados de Consciência: • Alterações do Pensamento • Sentido Alterado do Tempo • Medo de Perder o Controle • Transformações na Expressão Emocional • Transformações na Imagem Corporal • Alterações da Percepção • Transformações dos Significados

Pesquisamos sobre rituais espirituais, que façam ou não o uso de plantas de poder, um deles, o Temazcal, achamos muito interessante, pois apesar de não se utilizar de nenhum “meio” para atingir essa expansão corporal, ela é conquistada pela forma de como esse ritual acontece.


Extase, nirvana, nagual, samadhi, alfa, transe, satori, consciência cósmica, supra-consciência, entro outros, também são nomes para o mesmo fenômeno.

Também chamado de “Tenda do Suor”, é um banho de vapor com uma profunda conotação espiritual. Nele, intervêm os quatro elementos: a Terra, que nos apoiamos; o Fogo, onde as pedras são aquecidas; a Água, colocada sobre estas; e o vapor, representando o Ar. São utilizadas, também, plantas medicinais. Trata-se de uma tradição milenar usada por várias etnias ameríndias com o objetivo de curar, limpar e purificar corpo e espírito. Seu uso através da história tem sido tanto terapêutico como ritual em cerimônias. O ritual acontece após o aquecimento de várias pedras em uma grande fogueira, sendo elas então levadas a uma tenda em formato de um útero. No interior da cabana, os participantes, envoltos em um clima de profundo amor

e reconhecimento ao sagrado da vida, entoam cantos tradicionais e tocam tambor. O vapor d’agua mesclado com o perfume das ervas medicinais contribuem para a saúde do corpo, de uma forma natural, desobstruindo os poros da pele, dilatando os vasos sanguíneos, proporcionando, assim, eliminação de toxinas e melhoras ao aparelho respiratório e imunológico. Os ensinamentos ancestrais dão conta que somente podemos seguir um belo caminho quando estivermos livres de antigas memórias que nos aprisionam. Um dos propósitos do temazcal é este, o resgate do passado e a vivência do “agora”, para que possamos projetar uma boa vida, para nós e as futuras gerações. Inconfissões 41


Inspirações

É utilizada tradicionamente em paises como Equador, Peru, Colômbia, Bolívia e no Brasil por grande parte dos tribos índigenas da região.

A ayahuasca é uma bebida produzida a partir de duas plantas amazônicas - sendo um cipó e uma folha - para fins ritualísticos e é também e utilizada na medicina tradicional dos povos da Amazônia. A ayahuasca não é um alucinógeno, seu uso é religioso e ritualístico, dessa forma, é classificada como um enteógeno. Seu objetivo é de induzir visões pessoais e estados alterados pela ingestão dessa substância. Seu uso produz uma ampliação da percepção que faz com que se veja nitidamente a imaginação e acesse níveis psíquicos subconscientes e outras percepções da realidade, estando sempre consciente do que acontece.

No Brasil, seu uso se dá através de rituais xamânicos e pelo Santo Daime. Santo Daime - É uma doutrina espiritualista brasileira, fundada no começo do século XX, no Acre, por Raimundo Irineu Serra - conhecido por Mestre Irineu. Sua base se dá pelo uso sacramental da ayahuasca. A doutrina não possui proselitismo, sendo a prática espiritual essencialmente individual, tendo o autoconhecimento e internalização os meios de se obter a sabedoria. Os daimista, como são chamados os frequentadores dessa religião, ao participar dos cultos e ingerir o Santo Daime iniciam um processo de auto conhecimento, que visa corrigir os defeitos e melhorar-se sempre, para que possa um dia alcançar a perfeição.


O xamanismo é uma filosofia de vida muito antiga, que visa o reencontro do homem. Com os ensinamentos e fluxo da natureza e com seu próprio mundo interior. É um conjunto de ensinamentos milenares que, através da tradição de tribos indígenas do mundo todo, foram sendo passadas até os dias de hoje. Os trabalhos com a ayahuasca (com outras plantas de poder) são realizados ao redor de uma fogueira, onde homens e mulheres ficam em lados opostos, equilibrando a energia do local. A ingestão da bebida se dá por algumas doses ao decorrer do ritual, podendo esse ser de cura, de concentração, de autoconhecimento, entre outros.

Apesar de algumas diferenças entre as duas correntes abordadas sua essência é a mesma, o autoconhecimento que o ayahuasca, assim como outras plantas de poder, podem propiciar. O estado mental que se consegue chegar com a ingestão dessa bebida é comparado com o mais alto grau de meditação, com a diferença que o ayahuasca “pula” a etapa de treinamento para se atingir tal estado. Os próprios praticantes xamânicos chegam a dizer que é possível chegar a esse EAC sem o uso dessas plantas, porém, o caminho percorrido para tal fim pode levar mais de meio século de treinamento, dessa forma, essa bebida serve como “ponte” para atingir quase o “inalcansável”.

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uma percepção sutil do nosso ser e do que se encontra ao nosso redor, participamos de treinamentos corporais e de expressões criativas. Além disso participamos também de rituais em busca do autoconhecimento e continuamos a escrever tudo aquilo que sentimos, tentando assim, explorar ao máximo nossas emoções e pensamentos através das palavras.

TRANSFORMAMOS NOSSO QUESTIONAMENTO EM ARTE

Como já mostramos todas as inspirações que nos guiaram até aqui, nesse capitulo abordaremos o processo de como tudo foi se construindo a partir dos conceitos. A forma que escolhemos para mostrar nossa construção não é linear, pois o processo todo não foi linear, podendo até ser chamada do caótico. Ao mesmo tempo que pesquisamos sobre artistas e escritores de teatro/ performance, assistimos filmes que falavam do insconciênte e dos sonhos, fizemos experimentos em busca de

Por fim, depois de quase 9 meses de imersão total no projeto e inúmeros processos de criação e percepção, conseguimos estruturar o que hoje recebe o nome de “Inconfissões”. Uma das primeiras coisas que fizemos foi a criação de um Diário de Bordo, como o próprio nome diz, trata-se de um diário onde relatamos todas as atividades feitas dia a dia, assim como as novas ideias que surgiam e as pessoas com que conversavamos. Essa ideia surgiu durante uma conversa com o nosso amigo e professor de teatro Prof. Fábio Valério - que além de nos orientar em todo o processo, foi também uma presença essencial para que acreditássemos no que estávamos fazendo. Esse diário também serviu posteriormente como base para estruturar todo o relatório. Inconfissões 45


Nessa mesma época marcamos uma reunião com o orientador Prof. Dr. Dorival Rossi - que depois de ouvir a ideia do nosso projeto inicial, nos mostrou um outro caminho a seguir. A princípio ficamos receosas, pois parecia que teríamos que abrir mão do que já haviamos feito, porém, após pesquisar melhor suas referências, percebemos que poderíamos deixar nosso projeto ainda mais completo. Assim, o Prof. Dorival nos ajudou a expandir nossas mentes.

O sketchbook completo encontrasse no link:

http://issuu.com/marinawang8/docs/ pensamentos_soltos_300-certo

Como o projeto se trata de um tema pessoal, chegamos na seguinte conclusão: nada mais pessoal que um sketchbook, um diário. Aquele caderninho onde você escreve tudo que lhe vêm a mente, confissões, desejos tão íntimos que não queremos que mais ninguém leia. Por quê não construir um sketchbook em conjunto onde jogamos esses pensamentos soltos? A partir dessa conversa criamos “Pensamentos Soltos” onde nossas confissões se misturam, perdendo-se de seu dono e fazendo parte de um universo maior. Percebemos também que as coisas que alí escrevemos fazem parte de todo ser humano e não apenas de nós duas, são esses questionamentos, reflexões e medos que nos moldam como seres humanos.


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Processos

Mais uma vez recorremos ao prof. Fabio Valério e a Lidiane Marques, dançarina e integrante do Protótipo Tópico (grupo de experimentos cênicos de Bauru) para expor nossas ideias, comentamos sobre ter assistido ao filme da Marina Abromavic - “A artista presente”, que além de mostrar uma artista inspiradora é ainda muito experimental, disso tiramos idéias de experimentações para sair da nossa zona de conforto.

Não sabíamos ao certo quais seriam os tipos de sentimentos e sensações que seriam despertados com essas experiências (nem ao certo se realmente teriam algum efeito). Nossa intenção era justamente a de nos jogarmos em situações desconhecidas, desconfortantes e supostamente ridículas para que assim, pudessemos sentir cada uma das possíveis reações que nosso corpo esboçasse.

Os experimentos que fizemos com a intenção de nos tirar da nossa zona de conforto, são exercícios que não fariamos normalmente pelos mais variados motivos (falta de tempo, disposicão, medo, comodismo…). Seu intuito era vivenciar outros estados do nosso próprio corpo, ampliando a percepção corporal para que dessa forma consigamos alcançar um conhecimento pessoal maior.

E porque essas experimentações para o TCC? Porque percebemos que não nos conhecemos tão bem até vivenciarmos situações realmente estranhas. Quando somos imersos no desconhecido é que realmente começamos a enxergar nossa essência, o nosso eu mais profundo.


No Escuro E se um dos seus sentidos não existisse mais? A partir dessa pergunta percebemos que a ausência da visão aparentemente seria a que mais nos causaria estranhamento, pois somos seres visuais, trabalhamos com imagens, vendemos imagens, e acima de tudo, vendemos a nossa própria imagem. O mundo é feito de estética e plasticidade. Tudo é imagem, desde propagandas até a nossa própria imagem perante os outros. E como seria quebrar essa visão? Como seria viver através dos outros sentidos e instintos? O exercícios proposto era simples, andar 30 minutos de olhos fechados no calçadão do centro de Bauru com apenas um cabo de vassoura para guiar, durante esse tempo a outra pessoa ficaria observando o processo e sempre tomando cuidado para interferir o mínimo possível. E se for necessário, como no caso de atravessar a rua, ou mesmo se a pessoa tiver com dificuldades de seguir a direção certa, intervir apenas o necessário, com poucos toques e falas. Nesse exercício percebemos uma dilaceração do tempo, como 30 minutos se tornou uma eternidade. Quando estamos num estado de “pânico”, ou como no caso uma sensação do desconhecido, incômodo, distorcemos o tempo e o espaço a nossa volta. Percebemos que com a ausência da visão, mesmo que por pouco tempo, nossos outros sentidos foram aguçados - a audição nos guiou. Da mesma forma que as informações visuais são muitas - ainda mais no centro da cidade - as informações sonoras também, porém não reparamos tanto no dia a dia. As conversas das pessoas ao nosso redor se tornou mais nítida, o barulho dos carrinhos de ambulantes foram mais fortes, assim como as TVs ligadas e as ruas, que mesmo longe, pareciam bem próximas. Percebemos que o nosso senso de direção muda completamente, não conseguimos seguir em linha reta - e ambas acharam que estavam em linha reta. Sendo assim, para nós ficou ainda mais claro como a percepção de mundo muda de uma pessoa para outra, nesse caso, naquele momento em que estávamos de olhos fechados - aquela era nossa verdade - porém, quando abrimos os olhos, vimos que a “realidade” não era a mesma.. Porém, não há como dizer que alguma delas estava errada, eram simplesmente diferentes. Por fim, nos demos conta de que meia hora não é o suficiente, por isso decidimos repetir o experimento por 24h.

Imagem ausente Assim como no exercício de andarmos no escuro, esse também tem a imagem (visão) como foco. Porém, na experiência anterior percebemos as modificações do nosso corpo/mente através de uma imposição “externa” - a ausência da visão/luz. Nesse, o foco é interior. Como somos pessoas muito ligadas a imagem - ainda mais em uma profissão como o design - onde muitas vezes nos apoiamos nessa plasticidade- pensamos em uma forma de abdicar um pouco disso. Quebrar com esse ritual de beleza da qual fazemos parte assim que saimos da cama. Ausentar a necessidade de ser bonita, de agradar aos outros, de passar maquiagem no dia a dia. Como seria viver sem o nossa própria imagem? Nossa proposta era ficar durante 2 semanas sem ver a nossa própria imagem. Tiramos os espelhos do banheiro, do quarto e evitamos o próprio reflexo no dia a dia. Achamos esse exercício um dos mais difíceis - incômodo. Mesmo tirando os espelhos de casa, percebemos que a cidade é repleta de reflexos, e automaticamente, estamos acostumados a nos olhar, seja no vidro de um carro na rua, na tela do computador, do celular ou na vitrine de uma loja. Dessa forma, tivemos que nos policiar durante todo o dia. Ao mesmo tempo, a ausência da nossa imagem causou um certo desconforto, não sabiamos se estávamos bem arrumadas ou não, a ausência da maquiagem para uma festa causou insegurança, não colocamos uma roupa diferente nos apoiamos do que já sabiamos que funcionava. Essa ausência da imagem trouxe também uma certa perda de identidade, sentimos a constante necessidade de nos olhar. Com isso, percebemos também que essa necessidade de se arrumar, se maquear é mais para os outros, do que para nós mesmos. Como se realmente estivessemos nos arrumando para as outras pessoas, nos moldando.


Processos

Jejum A ideia dessa experiência era perceber como nosso corpo trabalha sem a ingestão de alimentos por 24h. Qual seria a sensação que isso gera? Quando o corpo não se alimenta, a energia é canalizada para a mente. Pessoas que fazem jejuns afirmam sentir um controle maior sobre o corpo, até mesmo para conseguir saciar a fome ou a vontade de comer. Aldous Huxley diz que jejuns prolongados também são capazes de nos levar aos Estados de Consciência Alterada - técnica muito utilizada por Marina Abramovic. Achamos complicado, principalmente nos horários dos quais estamos habituados a comer - no almoço, por exemplo - é como quebrar um ritual. Porém, percebemos que depois do ápice, a fome passa (ou estabiliza), a mente controla o corpo. Algo interessante de se relatar foi a necessidade bocal que sentimos, não tanto pela fome, e sim por colocar algo na boca. Foi um dia diferente, um pouco “desregrado” - não comer nos levou também a não ter esse espaço de tempo das refeições - um momento geralmente calmo, onde você pensa no seu dia, por exemplo. Por fim, ficamos mais sensíveis as percepções sobre o próprio corpo e as coisas em nosso torno e ao final do dia nos sentimos muito mais exaustas.

Um dia de silêncio Com esse experimento tinhamos a intenção de passar o dia não só em silêncio, como também em reclusão, nos ausentando da comunicação, de mundo digital, celular, televisão.. até mesmo tentando não ler, escrever ou desenhar. Passar um dia só consigo mesma. Como seria passar um dia inteiramente apenas com você e sua mente, apenas contemplando que existe ao nosso redor? Que sensações, pensamentos, emoções isso traria? O resultado foi um pouco diferente do esperado, nós não conseguimos ficar o dia todo reclusas, sentimos a necessidade de se comunicar - mesmo sem usa a fala. Evitamos escrever ou usar gestos, mais isso acabou acontecendo. Uma coisa que achamos engraçado é que sem querer acabamos soltando algumas palavras quase que involuntariamente. Foi interessante perceber também o tanto que a fala é a base da nossa comuniação.. ao tentar nos comunicarmos através de gestos ou expressões, nos sentimos limitadas, como se não estivessemos conseguindo dizer o que queríamos.


Professor Rani Guerra

Vivenciando nosso palhaço interno Participamos de uma Oficina de Clown ministrada pelo professor Rani Guerra - oficina organizada pelo Festival de Artes Cênicas de Bauru. Nessa oficina tentamos trazer à tona um pouco mais da nossa essência, expondo o “palhaço” que existe dentro de cada um. Trata-se de um trabalho desafiador, a oficina foi desafiante. O trabalho de clown expõe justamente o que escondemos, os defeitos, o desajeitado, fazendo com que essa situação aparentemente “ridícula” seja transformada no seu “palhaço” interno. Todos temos uma parte “palhaço”, porém são poucos os que vão atrás de descobrir isso. É uma exploração bem pessoal, não existe uma metodologia certa, cada um descobre seu caminho, a forma como trabalha. Trata-se mais uma vez, do autoconhecimento. Percebemos que apenas com o uso do corpo e das expressões faciais podemos dizer muitas coisas, transbordando sensações e emoções internas., ao mesmo tempo, descobrindo esse nosso “palhaço” interno conseguimos despertar sensações e emoções nas pessoas que estão a redor sem que para isso seja necessário dizer uma palavra. As aulas foram muito divertidas e muito inspiradoras para continuar essa pesquisa nesse universo clown.


Processos

Troca de casas Como o próprio nome diz, fizemos esse experimento para literalmente sair da nossa zona de conforto, nosso quarto, a nossa casa - onde por mais bagunçada que esteja - é o nosso canto, aquele lugar de refúgio, onde conseguimos ter um momento de paz e se fechar dentro de si. A proposta era trocar de casa por uma semana, levando apenas a roupa do corpo, escova de dente, algumas roupas íntimas e o computador (que nos traz à zona de conformo novamente, porém, devido aos trabalhos pessoais de cada uma e os softwares usados, achamos melhor leva-lo também). Ao decorrer da primeira semana percebemos que essa experiência seria mais intensa do que imaginávamos, e que teríamos que nos doar mais, participar mais das atividades da nova casa, como almoçar com as pessoas da casa e ter aquele momento no fim do dia onde todos se juntam na sala para conversar. Decidimos então aumentar para duas semanas essa experiência. Durante esse tempo percebemos o quão apegadas somos as nossas coisas, coisas que passam desapercebidas no dia a dia. Mesmo as coisas mais banais tomaram uma proporção maior, como a roupa, a pasta de dente, a altura da cama e algo que fez uma tremenda diferença para nós duas - a luminária que fica ao lado da nossa cama. Percebemos que a luminária ao lado da cama faz parte do nosso ritual na hora de dormir. Uma usa a luminária com uma luz mais forte para poder ler, escrever e desenhar antes de dormir, e a outra, deixa a luminária acessa a noite toda para não dormir totalmente no escuro, ou seja, é uma luz mais fraca, que não serve para ler ou escrever. Esse foi um incômodo recíproco, mudou um pouco o nossa noite. Assim como o exercício do espelho, nesse também sentimos um pouco essa “falta de identidade” - as fotografias na parede representavam coisas das quais não fizemos parte, a rotina da casa era diferente - houve um afastamendo de nós mesmos, das coisas das quais somos apegadas - da nossa essência. Acho que na volta, demos mais valor aos pequenos pedaços que nos controem e as pessoas que escolhemos como nossa família fora de casa. Foi uma experiência muito interessante, ao mesmo tempo que sentimos falta das nossas coisas e nos sentimos desconfortáveis no começo, aos poucos fomos nos adaptamos com essa nova realidade que era proposta.

Pelos pêlos A partir desses experimentos que fizemos, percebemos que a estética foi uma das coisas mais trabalhadas - uma das coisas que mais nos “incomodou” - a ausência do espelho, abdicando também da maquiagem, das roupas que mais gostamos, a troca de casa, onde sentimos uma certa “falta de identidade” pessoal. Enfim, percebemos que “desapegar” não é tão simples assim, a nossa imagem - principalmente a que passamos para os outros se tornou ainda mais evidente, o quanto nos preocupamos com isso ficou claro. Dessa forma, resolvemos explorar mais esse lado. Até que ponto somos como queremos ou estamos apenas flutuando? Os padrões de beleza e estética estabelecidos sabe-se lá de onde, fazem sentido? Como seria quebrar um pouco isso? Com isso, paramos de depilar. Uma atitude simples. Porém, alguns meses depois, percebemos que incomodou não só a nós mesmas, por não estarmos acostumadas a ver nossos pêlos crescerem, como incomodou ainda mais aos pessoas ao redor. Percebemos, principalmente no começo, um desconforto muito grande, mais aos poucos nos “acostumamos” com essa nova situação. Algo interessante foi ver a atitude das pessoas diante nossa experiência. Por fim, achamos essa vivência muito válida. Foi uma questão muito mais interna do que esperavamos. É importante ressaltar que não temos a intenção de mudar o conceito de beleza (ou até mesmo de higiene) de ninguém, apenas mostrar que ter pêlos, não é, ao menos não deveria ser, algo repugnante. Deveria ser encarado como algo indiferente, assim como o tamanho dos cabelos e das unhas de alguém.


Ainda dentro dessas experimentações e vivências, buscando um conhecimento maior acerca do nosso ser, participamos de alguns rituais que trabalhem o “autoconhecimento” através da conecção com seu eu interior e a espiritualidade, conectando-se também com o universo e a natureza.

Temazcal Primeiramente estavamos dentro de uma toca circular de 5 metro de diâmetro com cerca de 30 pessoas com um buraco cavado ao meio, todos com poucas vestes pois sabiamos que o ambiente ia ficar muito quente e que iriamos soar muito. A primeira leva entrou 7 pedras muitos quentes a qual a moça recitava algumas palavras sagradas, ao mesmo tempo que jogava ervas em cima, saiam faiscas no ar, fechava-se a porta e começava o ritual com vários cantos indígenas junto ao som de tambores. Eram 4 levas de pedras, totalizando 30 no final do processo, e cada vez direcionava o canto pra um dos pontos cardeais na terra. Aos poucos sentimos um leve calor que cada vez mais aumentava até a primeira gota de suor, no momento, nem percebi quer era um gota, tinha achado que era um dedo passando pelo meu corpo. Foi interessante nesse aspecto que sentia cada particula do seu corpo, assim como a gota de suor e por onde ela percorria. No meio do ritual, através dos cantos, senti uma forte vibração, uma energia potencializada. Cheguei a ter ilusões de ver vultos dançando em cima daquelas pedras fervendo no ritmo dos sons dos tambores. Ao sair daquele ritual, senti o meu corpo limpo, purificado e leve. Senti o quão grande é a energia da natureza que nos rodeia, desde do ar que respiramos, até da lua cheia. Tive uma clareza sobre as coisas em nossa volta.

Ayahuasca Eu participei de dois rituais envolvendo o uso de ayahuasca - Santo Daime (trabalho de concentração) e Xamanismo Gnóstico (trabalho de cura). Apesar de terem suas diferenças, o chá é usado com o mesmo fim, conhecer e entender o seu interior. Em ambos, o chá é servido em algumas doses durante o trabalho, sentamos em forma de círculo e homens e mulheres ficam separados. No Daime, ao centro desse círculo encontra-se uma mesa na forma de estrela de 6 pontas e algumas velas e no xamanismo existe uma fogueira ao centro. Senti sensações diferentes nos dois trabalhos, porém, ambos foram muito introspectivos e intensos. Explicar o que eu senti, o que passou pela minha cabeça, é algo quase inexplicável. Uma expansão da minha mente, da minha consciência. Passei por alguns momentos tumultuados dentro de mim, conflitos internos foram jogados na minha cara. A ayahuasca trás a tona tudo aquilo que escondemos de nós mesmos. Eu desci dentro de mim, vi coisas ruins, indigestas (literamente) e voltei. É como uma viagem dentro do seu interior, passando por tudo, desconstruindo o que parece sólido e na volta você consegue ter um entendimento melhor do porque de tudo isso. É uma descontrução do ego - uma quebra. No xamanismo ouvi uma coisa muito interessante “a ayahuasca é para todos.. mas não é para qualquer um” .. É preciso estar preparado para o que você pode encontrar. Achei uma experiência sensacional. Sai de lá bem comigo mesma, me sentindo leve, viva.


Processos

Trabalho com o corpo Paralelamente a essas experimentações - que fizeram parte de toda a construção desse projeto - não poderiamos deixar de explorar o corpo cênico, uma ferramenta essencial para todo o trabalho. Dessa forma, fizemos aula de treinamento físico no Teatro Municipal com o prof. Fábio Valério. Essas aulas foram muito importantes para treinar o nosso corpo e movimentos diferentes do cotidiano. Com esses treinamentos percebemos que estavámos despreparadas fisicamente. Essas aulas foram importantes também pois eram delas que tirávamos várias idéias para o nosso treinamento pessoal e que consequentemente ajudou na construção da nossa performance. Ao final do projeto participamos mais uma vez de um curso com o prof. Fábio Valério - o curso teve como foco a “preexpressividade” do ator - aquilo que antecede o ato - a intensão, esse curso foi baseado nos estudos de Eugenio Barba e Grotowsky.

Eugenio Barba faz uso de técnicas como energização, dilatação, oposição, equilíbrio e corpo decidido onde através do cansaço exaustivo que provém desses exercícios conseguimos alcançar um estado de consciência corporal maior, entrando num processo criativo. É a partir desse momento que conseguimos desenvolver e desenhar nosso corpo de uma forma cada vez mais expressiva, saindo também dos movimentos cotidianos. Esse curso foi mais uma vez fundamental para conseguirmos ter segurança ao executar nossas performances. Além dos treinamentos no teatro, nos encontrávamos semanalmente para fazer a nossa própria pesquisa corporal. Nesses encontros, fazíamos exercícios de aquecimento e alongamento para desinibir o corpo, e conseguir dar andamento ao nosso processo criativo. Usamos várias metodologias diferentes Em alguns treinamentos usamos trechos escritos por nós, em outros, usamos músicas e mentalizamos algum sentimento tentando entrar dentro de nós. Passamos pelo nosso nascimento, infância, momentos importantes ao longo de nossa vida até chegar no presente. O Butoh foi um grande aliado, nos inspiramos muito nessa técnica.


Essas são algumas das fotos que encontramos no caminho percorrido até nossa infância.

Inconfissões 55



sobre performance, Fernanda Vasconcellos percebemos que não era um local muito interessante para a nossa proposta - pois mantinha o formato convencional do teatro - precisávamos quebrar com a quarta parede.

Ainda sim, percebemos uma grande dificuldade para realmente fazer algo nosso, orgânico. Dessa forma, mudamos um pouco o foco do projeto e resolvemos dar um destaque maior para o que realmente estava nos envolvendo - o cenário. Assim, resolvemos criar uma instalação performática - um lugar onde todos os elementos tem o mesmo peso, o cenário, a iluminação, a presença humana - todos fazem parte de um organismo vivo, está tudo interligado. A base do projeto continou sendo a mesma - a investigação pessoal. Com o projeto melhor definido, passamos agora a nos focar no local de apresentação. Inicialmente pensamos no Guilhermão e a partir de uma conversa com uma amiga e pesquisadora

Passamos então a pensar no bosque da UNESP (em frente a biblioteca), ideia que se manteve por um tempo e após algumas outras conversar e reflexões percebemos que aquele local, ainda que estéticamente muito agradável, desperta um sentimento em cada uma das pessoas que passam por lá - é um local de passagem, cheio de memórias. Queríamos um local que não remetesse a nada, um lugar sem memória.

decidimos cortar por completo toda a energia elétrica do local - fazendo uso de tochas e velas para iluminação e som ao vivo ao invés de um amplificador. Ao cortarmos a energia elétrica, percebemos que a nova forma de iluminação e a música transformou o projeto quase que numa espécie de ritual. Um ritual onde o que é será explorado são nossas vivências, memórias e sentimentos enquanto seres humanos. Um momento onde estaremos presentes uma única vez. Um ritual de encerramento de um ciclo, um fechamento de toda essa fase que vivenciamos durante 5 anos.

Passamos então dois dias passeando na Unesp procurando um local para fazer a nossa instalação performática, nesse passeio descobrimos uma fa culdade muito maior que imaginávamos. Passamos por lugares onde nunca tinhamos passados antes. Quase que por impulso, entramos no meio do mato por meio dessa trilha e achamos um clarão, nosso local foi descoberto. Como o lugar é afastado e no meio do mato, teríamos que puxar uma extensão de pelo menos uns 200 metros - o que se tornou meio inviável com roteiro que tinhamos planejado e pela falta de habilidade nessa área. Sendo assim, Inconfissões 57



Essas são algumas questões abordadas por Hijikata - um dos fundadores do Butoh. São perguntas sem uma respostas correta. Trata-se acima de tudo, do conhecimento que cada um carrega sobre si mesmo. E é seguindo essa linha que conseguimos construir “Inconfissões”.

O que aconteceria se fosse possivel colocar uma escada dentro do corpo para descer até o fundo? Há um ponto, na profundidade sem medida, em que o visível se deteriora. A dança poderia existir para rejeitar este estado interno do corpo? E caso fosse possivel fazer ísso, seria, finalmente indentificável que o olho não serve só para ver, a mão não foi feita exclusivamente para tocar e todos os órgãos não podem ser restritos às suas funções e organizações? Como nasce o sofrimento, a vontade e a expressão?

Sendo assim, para que fosse possível a concretização desse projeto passamos por diferentes tipos de processos tanto internos (descobrimento do nosso próprio ser - abordado no capítulo anterior), como externos - de colocar a mão na massa e literalmente construir o que queremos passar. Aos poucos esboçamos um roteiro, que dia após dia foi ganhando forma, e finalmente se tornou real. Depois de meses quebrando a cabeça, conseguimos um nome - Inconfissões - a própria palavra já diz o seu significado - confessar o inconfessável, no nosso caso, expor o que existe dentro de nós, aquilo que nos mostramos. Inconfissões 59


Será através de sensações que “Inconfissões” irá se concretizar.

Construção

A apresentação se inicia já no ponto de encontro, onde através da caminhada até a trilha as pessoas começam a mergulhar em nossas entranhas, passando por momentos mais tranquilos, até chegar ao caos existente dentro de nós.

Como seria um convite a nossa mente?

Ao chegar no final do trajeto, as pessoas não encontrarão lugares para se sentar, sendo instigadas a se mexer, a explorar o ambiente. Não será uma apresentação onde você se senta e espera algo acontecer. O público, assim como os demais elementos, também faz parte do processo.

Essas questões, pensadas à partir das expostas por Hijikata, nortearam a construção do projeto. Após inúmeras conversas percebemos que a melhor forma de expressar tudo isso, seria através da criação de uma instalação performática, pois assim conseguiríamos explorar tanto o corpo (performático) como a mente (instalação). O projeto é como um ritual, onde do começo ao fim as pessoas estão imersas no nosso universo particular, permitindo assim sentir-se dentro de nós.

lementos Todos os e úsicos e trilha, os m cartas – a própria a luzes, as s, to n e m ru s significaseus inst l, os objeto a c lo ão o n s jogada a exploraç les, junto d e arte s p o d o to rã – se tivos mance) o rf e (p o orp ssuindo do nosso c anismo, po rg o o sm e do está de um m rtância - tu o p im a sm a me . interligado


Dividimos essa imersão em alguns momentos, tudo começa no ponto de encontro que leva até a entrada da nossa mente - envolta a memórias vivas da nossa infância – depois de passarem por esse trajeto, as pessoas adentram na clareira onde encontram as inconfissões; nesse mesmo local acontece a performance que levará ao momento final de construção. Apesar de guiarmos o público, não se trata necessariamente de algo linear e nem pontual, cada momento está ligado ao que o antecede e ao que vira depois, o tempo que tudo isso levará depende de como essas coisas acontecem, não sabemos ao certo qual será a reação das pessoas envolvidas e será a partir dessas reações que o projeto tomará forma.

optamos por criar algo caótico, até mesmo aflito, cheio de elementos, sons, sentimentos. Será através do caos que representamos um pouco de como nossa cabeça funciona nos momentos de confusão – nossos medos e inseguranças não ficam separados em gavetas onde você escolhe qual delas vai abrir, sentimos tudo ao mesmo tempo, alegrias, tristezas, medos e desejos. Utilizamos alguns objetos significativos para nós, como gaiolas, velas, escada e balanço, esculturas de gesso e armários que guardam memórias.

Optamos por ter figurinos diferentes, pois apesar de fazermos parte de um mesmo organismo, temos personalidades distintas que influenciam diretamente no que vamos passar através do nosso corpo. Os sentimentos que queremos passar também são distintos, são inquietações que existem dentro de nós, a forma como o corpo se expressa é muito particular e por isso, optamos por manter essa nossa individualidade. No centro da clareira – referente a parte mais profunda do nosso ser – Inconfissões 61


Construção


Olivier Sagazan e Ilka Schõnbein foram duas grandes referências para a criação das esculturas de gesso, através da pesquisa que fizemos sobre esses artistas conseguimos concretizar um pouco mais do que passava em nossas cabeças. Para fazer as esculturas usamos o nosso corpo como base e através do gesso conseguimos moldá-lo. Depois do gesso seco, passamos algumas camadas de cola com papel higiênico para ficar mais rígido. Para finalizar usamos pó de bambu com cola e por último passamos spray automotivo preto ou ouro velho, dependendo da instalação. As esculturas fazem parte da instalação, algumas ficam na trilha e outras dentro da clareira. Cada uma delas representar algum momento de nossas vidas.


Construção

Luminárias feitas de arame, papelão e revestidas com elanca pintadas de café e barro.

Como já dito no capítulo anterior, não será usado energia elétrica, dessa forma, a música acontece ao vivo, podendo sofrer alterações conforme a interação do público. A música não será apenas um plano de fundo, ela é viva, orgânica, os própro músicos serão também performers, a presença de cada instrumento é essencial para o desenvolvimento de todo o projeto, servindo como um guia.

Tochas feitas de bambu cedido da area agrícola da UNESP

Usamos os escritos do nosso scketchbook - Pensamentos Soltos - para fazer parte da instalação. Imprimimos os escritos e passamos café para ficar com um aspecto de velho, alguns rasgamos ou queimamos as laterias.

As máscaras foram para os músicos. Através de uma máscara simples branca, cortamos o nariz original e adicionamos um novo, maior e mais pontudo. Usamos papel cartão e durex para modelar. Por fim, usamos spray preto para o acabamento.



Produção do teaser - uso de barro. O teaser foi gravado por nós e editado pelo nosso amigo Thomas Musmann, a qual temos que agradecer imensamente por todo a ajuda.


Essas são algumas das fotos da apresentação que fizemos no Espaço Protótiipo no mês de feveiro apresentamos alguns pequenos scketches do que seria nossa performance. Nos serviu também para passar uma segurança no que estavamos fazendo.


Construção

Como foi o processo de trabalhar em dupla Marina Bom, antes mesmo de chegar o tempo de fazer o tcc, decidimos fazer juntas, algo relacionado ao teatro. Durante o processo de construção da nossa performance, teve momentos que realmente pensei em desistir, pela minha insegurança de usar o corpo como forma de expressão, pensando em pular para fazer algo mais fotográfico, o que é minha base de conforto. Tivemos momentos que afetaram nossa amizade, pois ficamos mais estressada e impaciente uma com a outra, mas lavando a roupa suja as coisas melhoraram. Ao mesmo tempo em que as vezes era difícil trabalhar com a Cazão por ser algo tão pessoal e por termos uma convivência de quase “irmãs”, por outro lado, houve momentos que uma instigava a outra, acrescentava idéias, momentos de desesperos que a outra confortava e falava que ia dar tudo certo. Bom, foi uma convivência bastante intensa, assim como todo o processo de autoconhecimento têm sido. De uma forma geral, acho que toda essa convivência com a outra nos fortaleceu na amizade e aprendemos a lidar e aceitar com as coisas que nos incomoda. E acho que se este projeto não fosse feito com a Cazão, a qual sempre fomos amigas e compartilhamos as mesmas idéias, não teria sido o mesmo projeto mirabolante que foi.


Carol Desde que viemos para Bauru eu a Marina tivemos uma sintonia muito grande e com o tempo isso foi se tornando algo além da faculdade.. Em uma viagem que fizemos em 2011 tivemos a primeira ideia de um possível TCC, depois disso, mudamos algumas vezes (pensamos até mesmo um documentário com foco social) e aos poucos entendemos que o que nos conecta é a forma como expomos nossos pensamentos através das artes, e a constante busca pessoal. Existe uma liberdade muito grande e sem julgamentos. Isso tudo possibilitou que o projeto ganhasse a forma que tem hoje, onde uma consegue explorar o que a outra tem de mais íntimo, ao mesmo tempo, também tivemos momentos de confrontos, mas sempre resolvidos da melhor forma possível. Aos poucos, o projeto foi tomando forma e percebemos que apesar de sermos muito diferentes, estavámos em busca da mesma coisa – o conhecimento interior. Foram nove intensos meses de projeto, porém, já possuíamos uma forma de trabalhar que vinha desde o começo da faculdade. Assim, conseguimos caminhar. Foi uma dinâmica muito interessante, um organismo formado a partir da junção de dois elementos distintos que juntos encontraram o equilíbrio. Por fim, se esse projeto não fosse realizado em dupla, acho que nunca teria encarado algo desse tipo. A Marina me ajudou a resolver e entender algumas questões muito pessoais minhas e me passou segurança para que conseguissemos chegar até o final. Alguns dos nossos maiores atritos foram justamente por eu ser uma pessoa mais “pé no chão” e a Marina estar sempre sonhando, mas acho que se não fosse essa dualidade, o projeto não teria a forma que tem hoje.



É dificil expressar com palavras a gratidão que temos por cada uma das pessoas que se envolvou em tudo isso, acreditando naquilo que nós mesmos as vezes não acreditávamos. A energia que cada um colocou no projeto foi essencial para que isso se tornasse real.

Primeiramente temos que agradecer ao nosso professor e amigo Fábio Valério, por nos acompanhar desde o terceiro ano de faculdade na busca pela consciência corporal, por nos desafiar e acreditar que seria possível. Agradecer também aos conselhos, referências e pela ajuda no desenvolvimento da nossa performance. Ao Prof. Dr. Dorival Rossi pela liberdade criativa que tivemos, pela ampliação da nossa mente à partir de suas referências, por também nos desafiar e dizer que tinhamos que fazer aquilo que acreditávamos, não se limitando a opinião de outras pessoas. Ao coordenador cultural da USP de Bauru - Francisco Peres - por disponibilizar seu tempo nos dando referências de surrealismo e loucura ainda no comecinho do projeto. Inconfissões 71


Agradecimentos

A Lidiane Marques por ouvir todo nosso roteiro quando ainda não estava pronto e nos dar varias ideias de experimentações. A Fernanda Vasconcellos que nos tirou a ideia de apresentar no Guilhermão, pelos livros emprestados e pelas referências de Work in Progress. A Tom Pina por disponibilizar seu tempo e desenvolver o logo e as aberturas de capítulos, mas que por outros motivos acabaram não sendo usadas. A todos os músicos envolvidos nesse projeto: José Orlando, Wallace de Souza, Sergio Júnior, Túlio Carvalho, , Lucas Ezias, Urias Guedes, Lais Marinho e Antonio Thomé. O envolvimento de cada um de vocês foi essencial para a realização de tudo isso. Obrigada pelo tempo e energia que disponibilizaram, tanto nas reuniões como nos ensaios, e principalmente por acreditam que era possível e fazerem de seus instrumentos sua própria voz. A Dora Bonadio, Eduardo Gooda e Thomas Musmann por darem andamento ao Boitatá quando estávamos enlouquecendo, pelas conversas filosóficas e por sempre estarem dispostos a nos ajudar e apoiar em tudo que precisássemos. Queremos agradecer especialmente ao Thom, que foi uma peça essencial no andamento do projeto,


tanto no seu desenvolvimento como no dia, por acreditar e ser esse irmão tanto nas horas boas e principalmente nas horas que estávamos desacreditadas. E por produzir o teaser nas últimas semanas do projeto. A Gabriela Mendonça que disponibilizou a sua boa vontade, dando idéias e ajudando a por a mão na massa, tornando possível a concretização da instalação. A Érika Apolinário que nos ajudou, desenhando e costurando as ideias do nosso figurino inicial. Ao pessoal das nossas casa - Narceja e a Mazé - que conviveram intensamente com as nossas mudanças de casa, bagunças no quintal e viveram parte deste projeto. Aos companheiros Augusto Cesar e Gabriel Fernandes que mesmo com toda a correria, trocando nossas noites de filmes pelo relatório, aceitando e vivendo nossas loucuras, nos acompanharam durante todo o processo, acreditando que era possível e acima de tudo por nos aguentaram com muito amor e carinho. A todos os professores que durante esses 5 anos de faculdade nos fizeram crescer, nos deram conselhos e acreditaram em nosso potêncial. Agradecer inclusive pelas noites em claro fazendo

trabalho, pelos momentos de questionamento sobre o curso e por nos fazer per ceber a dimensão que o nosso curso de Design tem, só bastava que nos encontrássemos dentro dele. Vocês serviram como nossa inspiração em muitos momentos, nos fazendo crescer e amadurecer como profissionais e como seres humanos. Queremos também agradecer a todos os amigos que fizemos durante essa fase de nossas vidas. Conhecer pessoas diferentes de nós, de outras cidades e outros países foi maravilhoso. Levaremos isso para a vida toda. A fase que vivemos durante a faculdade, o que aprendemos aqui, como pessoas, não é fácil de se traduzir em palavras. Por fim, precisamos agradecer as nossas famílias, pois sem eles não seria possível a realização de tudo isso, o apoio, carinho e compreensão pelos finais de semanas que não voltamos para casa foi essencial. Tudo que somos hoje se deve à vocês. Obrigada! Inconfissões 73



ANTONIN ARTAUD O teatro e o seu Duplo http://www.itaucultural.org.br/ aplicexternas/enciclopedia_teatro/index. cfm?fuseaction=conceitos_biografia&cd_ verbete=13540 http://www.oquenosfazpensar.com/adm/ uploads/artigo/teatro_artaudiano_ou_metafisica_ da_carne/n5andre.pdf KAZUO OHNO Butoh - A dança da escuridão - Solange Pimentel http://www.mimus.com.br/solange2.pdf http://www.youtube.com/watch?v=2tlp12vv0Jg https://www.youtube.com/watch?v=9ms7MGs2Nh8

CHRISTINA GREINER O corpo Entrevista: http://redeglobo.globo.com/globouniversidade/ noticia/2012/03/entrevista-christine-greiner-pesquisa-danca-elinguagens-corporais.html Inconfissões 75


Referências

RENATO COHEN Work in Progress na cena contemporânea Performance como linguagem http://www.luizcarlosgarrocho.redezero. org/a-composicao-cenica-e-o-ritornelo/ FLÁVIO WILD Porões da mente Monografia sobre o projeto: http://www.pergamum.udesc.br/dadosbu/000000/000000000009/000009F1.pdf

MARINA ABRAMOVIC Filme “A artista está presente” Livro: Seven http://www.marinaabramovicinstitute.org/noqt http://www.youtube.com/watch?v=bI8zl6UuSOs http://www.youtube.com/watch?v=POJpUeKHj5o


Estados Alterados de Consciência ALDOUS HUXLEUY As Portas da Percepção CARLOS CASTANEDA A erva do diabo

JORGE GLUSBERG A arte da performance

PINA BAUSH FIlme: Pina http://www.caleidoscopio.art.br/cultural/danca/dancacontemporanea/pina-bausch.html http://www.storm-magazine.com/novodb/arqmais.php?id=600 http://www.dw.de/pina-bausch-tudo-é-dança/a-1682335-1 Inconfissões 77


ReferĂŞncias

BERNA REALE http://www.pipa.org.br/pag/berna-reale/ http://bravonline.abril.com.br/materia/nossa-aposta-berna-reale http://gotaz.com.br/o-vazio-de-nos/ http://dasartes.com/2012/mar-apresenta-primeira-individual-de-berna-reale/ DEREVO http://www.derevo.org

FURA DEL BAUS http://lafura.com

JAVIER PEREZ http://javierperez.es/

ELLEN ROGER http://www.lomography.com/magazine/lifestyle/2011/04/22/ ellen-rogers


SAMIRA BR https://www.facebook.com/events/167842096743523/?source=1 http://www.arteum.com.br/arte_integra.php?id=2547

OLIVIER SAGAZAN http://nefdesfous.free.fr https://www.youtube.com/watch?v=6gYBXRwsDjY ILKA SCHONEINS https://www.youtube.com/ watch?feature=player_detailpage&v=eUjbQ_BifVs

Inconfiss천es 79



De uma hora para outra estamos do outro lado do palco, interpretando sem saber o quê. Um ponto fraco em mim ressurge. As coisas perdem o sentido. Suspirar e nunca terminar. Despertar a consciência calada. Arranco todos os pedaços para que EU não exista mais. E o que sobra, é a nudez, de uma forma completamente vazia.. O que em mim vale a pena expor?



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