Maio/ Junho de 2014
Aventura, viagem e emoção.
O esporte do amanhã. O que são E-sports? Saiba mais sobre os esportistas e o esporte que mais cresceu nos últimos tempos.
Entrevista Carlos Burle bicampeão mundial de ondas grandes.
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Sumário Aventura - De novo, na África! Aventura - Recorde de asa delta E-sports - Esportistas do amanhã Viagem - Na terra dos devoradores de arroz Viagem - Luxo sob as estrelas Viagem - Férias na ilha deserta Duas rodas - De volta para a estrada Entrevista - Carlos Burle, bicampeão mundial de ondas grandes
Treinamento - Engula isso Treinamento - Hora do intervalo
O esporte do amanhã
O E-sporte do amanhã. Rodrigo Guerra Do UOL, São Paulo.
Oque são E-sports? Entenda agora sobre o esporte que mais cresce e já movimenta mais de R$500 mil no Brasil.
Normalmente, o programa de domingo de um jovem adulto é ir para a frente da telinha e assistir ao jogo de seu time de coração, ou ir onde tudo acontece, ao vivo e ao lado de outros milhares de fãs e gritar como louco a cada jogada. Não estamos falando de uma partida de futebol, mas sim dos esportes eletrônicos, ou e-sports, como são conhecidos. A fatia brasileira ainda é pequena se comparada com o cenário mundial. Por exemplo, a competição que mais movimentou dinheiro no ano passado foi o The International, de “Dota 2”, que distribuiu mais de US$ 2,8 milhões em prêmios. Segundo pesquisa do instituto SuperData, foram mais de US$ 25 milhões distribuídos nos mais variados campeonatos no ano passado. Não há dados oficiais de quantos campeonatos existem no mercado brasileiro, mas de acordo com os dados levantados pela reportagem de UOL Jogos, somando os principais campeonatos divulgados em 2013, foram distribuídos mais de R$ 500 mil em dinheiro vivo nos mais variados games como “Combat Arms”, “FIFA World”, “Dota 2” e, principalmente “League of Legends”, que sozinho deu mais de R$ 100 mil contando apenas o CBLoL, principal campeonato brasileiro do jogo. De acordo com Carlos, o dinheiro vem não só de campeonatos, mas também do salário de seu time, que na época era o SK Gaming (atualmente, “Ocelote” está no Gamers 2), dos patrocinadores, de seu canal no Twitch.tv e também de sua marca de acessórios para jogos. Nessa quantia, no entanto, não estão contabilizados os salários de jogadores, que são contratados e negociados - como acontece nos grandes times de futebol. Um deles é Carlos Rodriguez, ou “Ocelote” como é conhecido. Esse espanhol de 23 anos é gamer profissional de “League of Legends” e declarou ao jornal ABC da Espanha que fatura quase US$ 1 milhão por ano.
Em números gerais, estima-se que somados todos os campeonatos internacionais, oficiais ou não, tanto “League of Legends” quanto “StarCraft II” já distribuíram mais de US$ 11 milhões cada até o final de 2013. Esse dinheiro, é claro, vem de patrocinadores, direitos de transmissão e outras fontes.
O esporte do amanhã
Tão bom quanto jogar, é assistir.
“Paguei R$ 140 no pacote de ingressos para vir todos os dias e assistir ao ‘7W’ [sigla do time]. Combinei de ficar na casa de um amigo e ele veio comigo assistir aos campeonatos. Quero ver como ‘SEF’ [apelido do jogador Yann Moskovitz] se sai na ativa ao vivo. Vai ser demais!”, comenta Ricardo animado. Perguntado se o valor dos ingressos não estava muito caro, Ricardo respondeu com um sorriso no rosto “pagaria até mais só pra ver esses caras jogarem”.
O e-sport é um fenômeno da internet mundial e está em franca ascensão. Basicamente isso se deve aos sites de transmissão ao vivo como o Twitch.tv e o Azubu.tv, que funcionam como o YouTube, só que apenas para partidas ao vivo de videogames, sejam campeonatos ou disputas casuais entre amigos.
Diferente dos esportes tradicionais, não existe uma rivalidade tão forte entre torcedores e há espaço para torcer para mais de um time. “Eu torço pela Seven Wars, eles são muito bons nos jogos de tiro, mas gosto do estilo dos Boinas Verdes que também jogam muito”, conta Ricardo.
O mercado internacional de e-sports tem 71 milhões de espectadores, segundo o SuperData. De acordo com a pesquisa, um espectador assiste a 19 partidas por mês em média e passa cerca de 2 horas a cada vez que senta em frente ao computador para assistir aos campeonatos. Muitos desses aficionados são sulcoreanos, mas o brasileiro não fica muito atrás.
Eventos para reunir fãs in loco também é algo que se tornou recorrente e está chegando a um nível nunca antes visto. Em 2013, por exemplo, a Riot Games levou para o Staples Center, o estádio do time de basquete Los Angeles Lakers, a grande final do campeonato mundial de “League of Legends” e neste ano a final do campeonato brasileiro será no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro. A empresa espera levar mais de 10 mil fãs para o evento, um número recorde para o e-sport nacional.
No último domingo (04/05) aconteceu o X5 Mega Arena, campeonato que ocorreu no centro de exposições Imigrantes, em São Paulo, e o canal oficial do evento no Twitch.tv contabilizava mais de 40 mil espectadores simultâneos para assistir à final de “League of Legends”, a maior estrela do e-sport da atualidade. Há também espaço para quem quer assistir às partidas ao vivo diretamente onde estão acontecendo os confrontos. Esse é o caso de Ricardo Antunes, 26 anos, que veio de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, para a capital paulista para assistir às partidas do Seven Wars em “Combat Arms” no XMA.
Na Coreia do Sul, onde o e-sport é o ‘esporte nacional’, existe a Associação Coreana de E-Sports e até ‘estádios’ para os campeonatos. E não é só isso: lá existem quatro canais de TV onde são discutidos resultados de partidas de “StarCraft II”, “Dota 2”, “Counter-Strike” e “League of Legends”, além de transmitir os confrontos ao vivo. Segundo a pesquisa do SuperData, metade dos sul-coreanos jogam “StarCraft” e acompanham as partidas da mesma forma que nós, brasileiros, acompanhamos o Campeonato Brasileiro.
Até onde vai essa onda? Não é a primeira vez que os esportes eletrônicos estão ‘na moda’. O primeiro campeonato que foi transmitido foi o Starcade, uma competição de jogos de fliperama que foi ao ar nos EUA entre 1982 e 1984. Porém, o programa ainda era destinado a um nicho muito específico e acabou saindo do ar por falta de patrocinadores. Já nos anos 90, com a explosão das LAN Houses e jogos como “Counter-Strike”, o e-sport ganhou uma segunda chance. Porém, como as partidas não eram televisionadas e não existiam ferramentas para a transmissão das partidas pela internet o movimento não ganhou o grande público. O que falta para o e-sport se estabelecer de vez é sair do nicho gamer e passar a fazer parte do cotidiano do público geral – e o primeiro passo para isso já foi dado. Recentemente foi divulgado que a Major Gaming League, uma das principais associações de esporte eletrônico nos EUA, firmou uma parceria com a rede de televisão ESPN para transmitir o campeonato de “Call of Duty: Ghosts”.
Agora, com os sites de transmissão online e o investimento pesado das produtoras de jogos, o movimento está de volta e com todo gás. Segundo o Twitch.tv, o e-sport possui mais força que os esportes tradicionais devido ao alcance da internet. Segundo o site, as finais do mundial de “League of Legends” foram assistidas por 32 milhões de expectadores, enquanto a partida mais vista das finais da NBA foi vista por cerca de 26 milhões de pessoas no mundo todo. “As empresas que criam os jogos estão investindo pesado no e-sport, atraindo mais público, e o público está chamando a atenção de patrocinadores como a Coca-Cola, Intel e outras empresas. Quando dizem que e-sports é um fenômeno passageiro, nossa comunidade prova o contrário”, declarou a empresa em uma publicação em seu blog oficial. Começar a transmitir partidas de games em um canal de TV dedicado a esportes é um passo importante nessa direção, ainda mais quando falamos de “Call of Duty” – que é uma franquia recordista em vendas. Mas será que isso será suficiente para atrair a sua atenção, do seu pai, da sua irmã ou do seu tio? Isso só o tempo vai responder.
Duas Rodas
De volta para a estrada. Com o fim do inverno na Europa, começam as provas mais maravilhosas do ciclismo de estrada – veja aqui as novidades deste ano para as Grandes Voltas da modalidade. Por Leandro Bittar
Giro d’Italia De 9 de maio a 1º de julho. A PROVA Depois de uma edição épica em 2013, com muita neve e frio, a primeira grande volta ciclística do ano apresenta um percurso mais “humano” e um dia a mais de descanso (três, no total) ao longo de suas 21 etapas. A disputa da maglia rosa (camisa rosa de primeiro colocado) vai começar em uma sexta-feira, com um contrarrelógio por equipes em Belfast, na Irlanda do Norte, e termina 3.450 quilômetros depois, em Trieste, no nordeste da Itália. O traçado atende a todo tipo de ciclista, com oito etapas planas para os velocistas, três contrarrelógios (um por equipes, um individual e uma crono-escalada) e nove chegadas em subida. Mesmo assim, o campeão será um grande escalador. O temido Monte Zoncolan, com trechos de 25% de inclinação, na penúltima etapa, será o auge da disputa.
PORQUE ASSISTIR Più bella, più dura. A linda paisagem italiana, favorecida pela época do ano, ainda com neve nas montanhas, torna o Giro d’Italia uma das Voltas mais interessantes de se acompanhar, mesmo para quem não entende nada de ciclismo. As duras montanhas garantem embates acirrados até o final. Não à toa, a organização define esta prova como a mais dura e mais bela da modalidade. Se você só tiver uma chance para confirmar isso, assista à 18ª etapa (dia 29 de maio), que percorrerá os míticos Passo di Gavia e Passo dello Stelvio, antes da escalada final, no Val Martello.
OS CARAS O atual campeão Vincenzo Nibali (da equipe Astana) abdicou de defender o título para lutar pela camisa amarela do Tour de France (TdF). Assim a grande estrela do Giro deste ano é o escalador colombiano Nairo Quintana (da Movistar), vice-campeão do TdF e um dos mais empolgantes ciclistas da atualidade. Dois rivais na disputa pela camisa rosa são o colombiano Rigoberto Urán (da Omega Pharma Quick-Step) e o australiano Richie Porte (do Team Sky), que lutarão em benefício próprio depois de anos trabalhando para a dupla de britânicos Bradley Wiggins e Chris Froome (ambos vencedores do TdF). Correm por fora os veteranos Joaquim Rodriguez (da Katusha), Cadel Evans (da BMC) e Ivan Basso (da Cannondale).
MARCO PANTANI Este ano, a prova homenageia os dez anos da morte do ciclista Marco Pantani, o maior ídolo da história recente do país. O poderoso escalador será lembrado em duas montanhas duríssimas que brilhou: a Oropa (14ª etapa) e o Montecampione (15ª).
MARCO PANTANI Entre os melhores ciclistas do mundo, existem alguns ainda mais especiais. Um deles é Nairo Quintana. O jovem colombiano de 24 anos pode fazer história ao levar seu país ao topo do Giro pela primeira vez. Com uma grande equipe para ajudá-lo (a Movistar), Quintana pode surpreender. Um título em uma grande volta é um passo importante para ele se firmar como um dos grandes nomes do esporte – e, ele vencendo ou não, com Quintana o espetáculo é garantido.
Duas Rodas
BAROLO A volta italiana possui inúmeras referências da cultura italiana, e poucas coisas revelam tanto do país quanto sua gastronomia. O decisivo contrarrelógio individual na 12ª etapa selecionará quem está apto ao título deste ano; o vencedor dessa etapa será recebido na cidade de Barolo com um belo brinde do vinho mundialmente reconhecido pelo mesmo nome.
Onde Assistir: ESPN, Gazzeta.it e RAI Site Oficial: http://www.giroditalia.it
Onde Assistir: ESPN, TV5 e na internet. Site Oficial: http://www.giroditalia.it
Tour De France De 5 a 27 de julho. A PROVA
OS CARAS
A mais famosa volta ciclística do planeta começa na Inglaterra, em Yorkshire, e roda pela GrãBretanha até a terceira etapa, que terá final em Londres. Depois do enorme sucesso de 2007, quando três milhões de espectadores acompanharam o Tour na terra da Rainha, espera-se novamente um grande público graças ao sucesso recente dos “locais” Bradley Wiggins e Chris Froome, campeões em 2012 e 2013, respectivamente. Froome, aliás, é o grande favorito. O percurso lhe favorece, principalmente o crono individual de 54 quilômetros, na penúltima etapa. A grande preocupação será sustentar esse favoritismo durante três semanas (3.656 quilômetros totais), incluindo alguns dias críticos, como o quinto, que percorrerá trechos de paralelepípedos da prova Paris-Roubaix, e a 18ª etapa, que passa pelo mítico Col du Tourmalet e termina na escalada do Hautacam, montanha famosa por ter decretado o fim do domínio do espanhol Miguel Indurain no Tour de France, no ano 1990.
O britânico Chris Froome (Team Sky) é o grande favorito, porém o Tour de France reúne sempre os melhores ciclistas da temporada, e neste ano não será diferente. A ausência mais sentida será do vice-campeão de 2013, o colombiano Nairo Quintana (da Movistar). Joaquim Rodriguez (da Katusha), que completou o pódio em 2013, também não estará na disputa. Campeão do Giro no ano passado, Vincenzo Nibali (da Astana) é considerado o principal rival, seguido dos espanhois Alberto Contador (da Tinkoff) e Alejandro Valverde (da Movistar). Há ainda novos nomes que rejuvenesceram a lista dos “top 10” do evento, como os norte-americanos TJ Van Garderen (da BMC) e Andrew Talansky (da Garmin), que correm por fora na disputa por um lugar entre os melhores.
PORQUE ASSISTIR Não existe evento mais importante para ciclistas, equipes, patrocinadores ou qualquer outra pessoa ligada ao ciclismo de estrada. Só para se entender a dimensão desta volta, o campeão do Tour do ano passado recebeu da organização uma premiação cinco vezes maior do que o campeão do Giro (450 mil euros contra 90 mil euros), e todos os ganhos indiretos acompanharam aproximadamente a mesma proporção. O nível da disputa é altíssimo, o que, inevitavelmente, transforma a competição em um jogo de xadrez cheio de estratégias para ver quem é o melhor.
PAVÉS Vários trechos de paralelepípedo do percurso da mítica prova Paris-Roubaix, como o Carrefour d’Arbre, estarão no traçado da 5ª etapa deste ano, somando 15,4 quilômetros de trepidações e pânico para os líderes. Eles sabem que esse tipo de terreno aumenta os riscos de queda e pode tirá-los da disputa pelo título, como aconteceu em 2010, quando o luxemburguês Frank Schleck quebrou a clavícula e Lance Armstrong teve um pneu furado.
MULHERES Atendendo aos pedidos das ciclistas profissionais, a organização do Tour realizará uma disputa feminina antes da última etapa da volta francesa, na avenida Champs-Élysées, em Paris. Uma grande conquista para elas e um aquecimento mais do que especial para o encerramento da competição.
Duas Rodas
Vuelta a España
De 23 de agosto a 14 de setembro.
A PROVA Última grande volta da temporada, a Vuelta é a “prima pobre” entre as três. Na maioria das vezes com menos estrelas e mais jovens promessas, a competição tem um menor nível técnico. Porém se trata de um evento repleto de surpresas, ataques e reviravoltas. A edição de 2014 será a mais curta das grandes voltas, com 3.181 quilômetros e toda disputada em solo espanhol, com largada no Sul, em Jerez de la Frontera, e final no norte, em Santiago de Compostela. Sua característica mais marcante na história recente são as duras montanhas. Neste ano, por exemplo, serão 40 escaladas categorizadas e oito finais em subida. A última etapa será um contrarrelógio individual com dez quilômetros de extensão. Talvez seja pouco para alterar algo na classificação geral, no entanto vale lembrar que o campeão de 2013, o norte-americano Chris Horner, tinha apenas três segundos de vantagem para o rival Vincenzo Nibali no último dia de disputa pela camisa vermelha.
OS CARAS Por pura emoção. Nos três últimos anos, foi sem dúvida a grande volta mais emocionante na disputa pelo título, como o embate entre Froome e Cobo, em 2011, o ataque surreal de Contador em 2012 e a milimétrica guerra entre Nibali e Horner na última edição.
ANCARES Leopold König, Warren Barguil e Kenny Elissonde foram alguns dos jovens que venceram etapas na última edição, mostrando que a Vuelta tem se tornado um palco de promissores talentos.
PORQUE ASSISTIR Com o percurso selecionado e a agenda dos rivais definida, o grande favorito para a Vuelta 2014 é Joaquim Rodriguez (da Katusha). Aos 35 anos, ele tem a melhor oportunidade de sua carreira para realizar o feito, que escapou de suas mãos em 2012. Os compatriotas Alejandro Valverde e Alberto Contador despontam como principais rivais, porém a briga pelo título da Vuelta sempre guarda surpresas, como ocorreram durante as vitórias recentes de Juan José Cobo (2011) e Chris Horner (2013).
ATAQUES Uma série de fatores torna a Vuelta menos tensa que suas co-irmãs. Algumas equipes já cumpriram seus principais objetivos, outras já estão fisicamente no limite e várias estão pensando na temporada seguinte. Jovens nomes, atletas que tiveram imprevistos durante o ano (um acidente, por exemplo) e veteranos em busca de um último contrato disputam a competição de peito aberto, e o que se vê é uma briga mais acirrada do que nos demais eventos.
REVELAÇÕES A Vuelta sempre reserva uma subida colossal para a penúltima etapa. Este ano será Ancares, uma montanha com 17 quilômetros de extensão e 7% de inclinação média. Porém, como sempre dá para apimentar um pouco mais, a subida final será precedida de outras seis (!) montanhas categorizadas (geralmente são quatro categorias de dificuldade, além das ‘hors catégorie’, as mais longas e difíceis de uma competição).
Onde Assistir: ESPN, TV5 e na internet. Site Oficial: http://www.giroditalia.it
Entrevista
Carlos Carlos Burle, Burle, bicampeao bicampeao mundial mundial de de ondas ondas grandes grandes A REVISTA OUTSIDE SE ECONTROU COM O CAMPEÃO MUNDIAL DE ONDAS GRANDES, CARLOS BURLE. ELE CONTOU UM POUCO DA SUA TRAJETÓRIA DE SUCESSO, DENTRO E FOR A DO MAR.
Maior expoente brasileiro do surfe em ondas grandes, o pernambucano Carlos Burle esteve em Florianópolis na semana passada para cumprir compromissos com patrocinadores. Aos 46 anos, o surfista profissional passou sua experiência para os acadêmicos da UFSC em palestra realizada no Centro Sócio Econômico da universidade e prestigiou coquetel da Loja Uber Store, representante da marca Redley, na Capital. Entre um compromisso e outro, Burle ainda achou tempo para remar de stand up paddle em Jurerê, e pagar ondas nas praias de Garopaba e no Pico do Riozinho, no Sul da Ilha. Conversei com ele na sexta-feira à tarde e falamos sobre vários assuntos, como a experiência e a repercussão da sessão de 28 de outubro em Nazaré e a expectativa para a indicação para o Billabong XXL, o oscar das ondas grandes. Confira a primeira parte da entrevista.
Por Laura O’Donnel
Entrevista
Outside - Como foi essa experiência em Nazaré e ao que você atribui o fato da Maya Gabeira ter caído (falta de experiência, azar) e como foi lidar com essa situação? Burle – O nosso esporte não é como o de quadra ou automobilístico, que você pode ter a melhor equipe, o melhor equipamento e treina na hora que quiser. Nós dependemos da natureza, e no caso de ondas gigantes, mais ainda. E você tem que estar no lugar certo, na hora certa para aproveitar, para evoluir. E o que aconteceu naquele momento foi justamente isso. Eu estava com aquele time, com idade média de 25 anos. Eles querem evoluir, precisam, então ficam se masturbando mentalmente, vou pegar uma onda de 100 pés, vou pegar uma onda gigante e aconteceu. Eles estavam lá, tinha um mar gigante e para evoluir você tem que se expor. E a Maya está evoluindo, tem treinado bastante, mas ainda não chegou no auge dela, não tem toda a técnica. Ela tem muito trabalho físico e psicológico. Ela caiu naquela onda e eu acho que outros surfistas poderiam ter caído naquela onda também. Agora, a melhor coisa que ela fez foi pegar aquela onda, porque vai demorar
Ela precisou se expor numa situação que não conhecia para evoluir e ajudar na evolução do esporte
muito para ela pegar uma onda daquela, para passar por aquela situação, para aprender, para evoluir. O que aconteceu naquele dia foi justamente isso. Ela precisou se expor numa situação que não conhecia para evoluir e ajudar na evolução do esporte, não só na performance, como na segurança. Todo universo do surfe de ondas grandes parou para se perguntar “o que que uma mulher está fazendo ali dentro?”, “ela não tinha capacidade?”, vários comentários, mas ela mostrou que tem preparo físico, pois tomou duas ondas grandes na cabeça. Nunca ninguém havia passado aquilo e ela sobreviveu. Então, na realidade quem salvou a Maya foi a própria Maya. Eu estava ali, tive a atitude também para ajudar nesse resgate, as pessoas me ajudaram a leva-lá pra praia, mas basicamente isso, a gente precisa se expor. A condição podia ser melhor, poderia, se o investimento fosse maior, se tivesse helicóptero, um barco, mais jet skis, mais equipe, mas a condição perfeita não existe. Perfeito não existe. Acho que o mundo perfeito está no céu.
Outside – A repercussão foi tão grande quanto a onda surfada em Nazaré? Carlos Burle - Eu acho que o ingrediente da Maya (Gabeira) fez o diferencial. Tudo que aconteceu fez daquele dia um dia pra sempre, como escreveu o Tulio Brandão (colunista do site Waves). Acho que foi a história de surfe mais comentada no mundo porque aconteceu tudo, as ondas grandes, o que a Maya fez, surfou aquela onda enorme, as pessoas tem que se lembrar disso. Ela passou por aquela dificuldade porque ela surfou a maior onda já conquistada por uma mulher. Depois eu voltei para a água para ver o Gordo (Felipe Cesarano) e o (Pedro) Scooby porque eu estava de olho neles, e aconteceu aquilo. O Gordo pegou as ondas gigantes, o Scooby também e eu consegui pegar uma onda boa. Então foi um momento histórico para gente, para o Brasil e para o esporte. Então Nazaré trouxe tudo isso para minha vida, mais responsabilidade, comprometimento, mais prazer de fazer a coisa certa, mas também muita coisa ruim. Não é possível fugir dos seus obstáculos, do seu medo. Se eu fugir, ele vai aparecer de novo ali na frente. Aconteceu tudo aquilo com a Maya, eu vou pegar essa onda e acho que foi um presente que a natureza, que Deus me deu. Essa onda de Nazaré foi um presente.
Outside — Na palestra você disse que a repercussão na comunidade do surfe foi muito negativa. Porque? É muita vaidade, ego? Burle — É, eu acho que é muito ego, mas é o normal. O ego é importante para a evolução do ser humano. A competição vem do ego, um quer ser melhor do que outro. Agora, quando você coloca sua emoções e sentimentos acima do bem comum, acho que a coisa perde um pouco do sentido. Noventa por cento ou até mais da comunidade não entendeu. A recepção foi muito difícil, muitas
críticas, muita inveja porque a gente explodiu. Meu nome aqui no Brasil ficou fortalecido, o da Maya também. Mas os surfistas infelizmente tem uma mentalidade muito limitada, de tribo mesmo. Esse lance do localismo, do meu pico. Então tudo de bonito que o esporte tem – relação com a natureza, seu corpo, autoconhecimento saúde – que está na hora de compartilhar, tudo isso acaba. E você não compartilha só com surfistas, você compartilha com bodyboarder, banhista, kitesurfista, e o espaço é muito reduzido. E o surfista tem essa tendência de se proteger. A gente demorou um tempo para entender o que estava acontecendo. Você comentar e entender a situação de uma forma totalmente diferente é compreensível. Mas começaram a inventar um bocado de coisas. Inventaram que eu havia pedido para a minha assessoria para falar que a minha onda era maior. Tinha 500 pessoas em cima do cliff (rochedo), tudo acontecendo ao vivo, e aconteceu isso.
Entrevista
Outside — Houve um comentário de que o tornozelo da Maya havia sido quebrado quando você passou com o jet ski por ela, no momento do resgate… Burle — Milhões de coisas aconteceram que não fazem parte daquele dia e eu sei que isso é muito da mente do ser humano. Eles tentam criar desculpas para justificar de alguma forma a falta de sucesso, não sei. Isso me tira um pouco de tesão, porque será que não dá para entender que seria melhor que a gente trabalhasse junto, remasse junto para um lugar só. No fundo, se o meu maior competidor ganhar mais, eu ganho mais. O que a galera do surfe parece não entender é que quanto mais medíocre o esporte, quando menor o pensamento, pior para tudo mundo. Na hora de renovar contrato eu falo “olha você sabe quanto o Pato (Everaldo Teixeira) ganha, o Rodrigo (Resende), o Eraldo (Gueiros), o Danilo (Couto) ganha?. Se essa galera não ganhar bem, é ruim para mim. Eu não preciso apagar ninguém, para mim é o contrário, eu tenho que levantar todo mundo, entendeu. Se eu não tiver um paralelo de pessoas positivas, bem sucedidas, que eu possa me comparar, para mim é horrível. Agora minha maior felicidade é saber que a Maya está super bem, deu a volta por cima, apesar de ter recebido muitas críticas. Ela está sendo considerada uma super atleta, nomeada para prêmio e daqui a pouco você vão ver ela em várias campanhas na televisão e isso é bom para a gente. Isso é bom para o esporte da gente. O que eu faço tem tudo a ver com aquele pensamento de garoto quando saí de Recife, eu quero melhorar a imagem do esporte. O que eu faço em um quarto, diz respeito a mim. O nariz é meu eu faço o que eu quiser. Quando eu sou referência de um esporte eu tenho que ter cuidado o que eu falo, com as coisas que eu penso, com as minhas ações, quando eu estou no público. Eu estou representando meus patrocinadores, meu esporte e meu país. Essas coisas tem que ser levadas em consideração e parece que o surfe ainda tem aquele problema, geográfico, de localismo e tudo. Mas as coisas estão melhorando.
Se eu não tiver um paralelo de pessoas positivas, bem sucedidas, que eu possa me comparar, para mim é horrível.
Outside – A indicação para o prêmio Billabong XXL, o oscar das ondas gigantes, deve sair nos próximos dias. Qual a sua expectativa? Burle — Eu acho que eles vão colocar a gente como concorrente, mas eu não acho que a gente vai ganhar. Teve (o swell provocado pela tempestade) Hércules, e depois teve aquela onda do Andrew Cotton (também em Nazaré), e na realidade, a comunidade não quer me dar nada. Já foi um ano muito bom para a gente. Já foi um ano onde a Maya teve uma outra oportunidade de vida, não quero pedir mais nada, acho muito egocentrismo e egoísmo eu sair pedindo mais alguma coisa.
Outside - O Felipe Cesarano, o Gordo, um dos seus pupilos, fez um desabafo via Facebook, de forma respeitosa, falando que a onda surfada por ele é maior do que a sua. Como você recebeu esse desabafo? Burle — Totalmente natural. Eu acho que naquele dia tinha 10, 12 surfistas na água. Cada um vai achar que sua onda é melhor que a outra. Isso que é legal. O importante é que eu não falei que a minha onda era maior. Tinha 500 pessoas no cliff, no dia antes acho que tinha duas mil pessoas em um domingo de sol, só que o swell atrasou e bateu na segunda-feira, e as 500 pessoas que viram o que aconteceu falaram aquilo. O surfe é um esporte muito subjetivo e eu já estou meio velho para ficar com essa história. Mas está tranquilo, não muda a minha relação com ele. Acho até pior se ele achasse e não falasse e a coisa ficasse guardada. Ele foi verdadeiro.
Outside - Nesta temporada havaiana você teve a oportunidade de conversar com o havaiano Laird Hamilton, que o criticou via CNN pelo fato da Maya Gabeira ter surfado em Nazaré. Como foi esse encontro? Burle — Foi na casa dele, no mar, em Jaws (ilha de Maui). E foi interessante porque ele se mostrou maduro também. As vezes as pessoas até brigam, brigam por coisas que nem acreditam. Ele foi conversar comigo e eu disse que o comentário dele havia sido muito profissional, cada um fala o que pensa. Mas em contrapartida eu estou indo em um caminho que eu tenho certeza que é o correto, o caminho que eu plantei lá atrás quando eu ainda era surfista em Recife. Eu não quero que o esporte tenha essa imagem atrelada a vagabundos que não sabem se expressar.