Medeia Magazine - Setembro Outubro 2015

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AS MIL E UMA NOITES

A trilogia épica de Miguel Gomes retrato do Portugal presente

JACQUES TATI

Continua a animar o nosso Verão

A UMA HORA INCERTA Carlos Saboga fala-nos sobre o seu novo filme

RICKI AND THE FLASH Meryl Streep brilha no novo filme de Jonathan Demme

WOODY ALLEN

Está de volta em Homem Irracional com Joaquin Phoenix e Emma Stone

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EDITORIAL As férias acabaram, mas não, não vamos lastimar o fim do Verão, como canta a Bardot em "La Madrague". Porque o Verão continua por aqui. O Verão em festa com Jaques Tati “reentra” por este mês de Setembro e cremos que haverá mesmo Verão prolongado.

HOMEM IRRACIONAL IRRATIONAL MAN

DE WOODY ALLEN ESTREIA 17 SET

Dur: 96 min

COM JOAQUIN PHOENIX, EMMA STONE, ETHAN PHILLIPS, JAMIE BLACKLEY

O 45.º filme do realizador é uma comédia agridoce protagonizada por Joaquin Phoenix e Emma Stone, em que estão presentes muitas das características habituais do humor de Allen.

Nesta rentrée 2015 a Medeia Magazine abre-se a novos colaboradores. Bem hajam António Preto, Fátima Castro Silva, Leonor Pinhão, Nuno Galopim, Rui Alves de Sousa. Nas páginas centrais temos uma entrevista a Carlos Saboga, aclamado argumentista e realizador, que nos fala do seu novo filme, A Uma Hora Incerta, com estreia marcada para 15 de Outubro, e a quem dedicaremos uma programação especial. São muitos e bons os motivos que tem para múltiplas visitas às nossas salas: os melhores filmes e uma oferta diversificada, de realizadores consagrados e outros que quererá descobrir; realizadores, actores, artistas, personalidades que vêm apresentá-los e debatê-los. E já reparou que a sala 1 do cinema Medeia Monumental foi renovada? Sejam bem-vindos/as. Bons filmes!

Programação sujeita a alterações de última hora. Confirme sempre em www.medeiafilmes.com Equipa Director: Paulo Branco Coordenação Editorial: António Costa Edição e Textos: Renata Curado e Diana Cipriano Colaboração: António Preto Carlos Saboga, Fátima Castro Silva Leonor Pinhão, Nuno Galopim e Rui Alves de Sousa Design: André Carvalho e Catarina Sampaio Capa: As Mil e Uma Noites

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Mais uma vez, chegámos à altura do ano em que volta a estrear um filme do realizador de Annie Hall e Ana e as Suas Irmãs. Em cada novo projecto, Woody Allen não consegue parar de surpreender, e os últimos anos não têm sido excepção: vimos títulos singulares da sua filmografia mais recente a estrear entre nós nos últimos tempos, como é o caso da comédia nostálgica Meia-Noite em Paris e do poderoso drama social Blue Jasmine. E desta vez, em Homem Irracional, o “alvo” do cineasta é outro, mas as raízes da sua comédia, e da sua personalidade muito particular, não deixam de estar bem vincadas nas personagens desta nova narrativa neurótica. Com alguns elementos de thriller, Homem Irracional é protagonizado por Joaquin Phoenix, na pele de um professor de Filosofia que está a passar por uma crise existencial, que só volta a encontrar um significado para a sua vida ao apaixonar-se por Jill Polard (Emma Stone), uma das suas alunas. Uma relação que parece ter tudo para dar certo... ou talvez não. Pela segunda vez consecutiva, Emma Stone volta a colaborar com Woody Allen, depois de Magia ao Luar. Mas o realizador quis apostar num rumo diferente do filme anterior, aproximando-se de uma visão pessimista do mundo com algumas semelhanças a Blue Jasmine. Os diálogos voltam a ter o tom incisivo e impagável já tradicional dos filmes de Woody Allen, numa obra em que o humor se mistura com viragens inesperadas na história e na psicologia das personagens: “os diálogos de Allen são espirituosos, as situações dinâmicas da narrativa surgem em todos os lugares certos, e a sua grande observação dos princípios morais é tanto matreira como inquietante, dando origem a um saboroso twist Hitchcockiano no último acto”, apontou David Rooney do The Hollywood Reporter. Mais um ano, mais uma oportunidade para nos reencontrarmos com Woody Allen e a sua personalidade no grande ecrã, em mais um filme entusiasmante que promete dar que falar no início da temporada. Rui Alves de Sousa Prémios e Festivais:

Festival de Cannes


ESTREIAS CINEMA

BIRD PEOPLE BIRD PEOPLE

DE PASCALE

FERRAN

Dur: 127 min

BREVEMENTE

COM JOSH CHARLES, ANAÏS DEMOUSTIER, ROSCHDY ZEM, CAMÉLIA JORDANA

Nos arredores de Paris, num hotel junto ao aeroporto, um engenheiro informático do Sillicon Valley decide libertar-se da sua vida profissional e pessoal, numa tentativa de se livrar das pressões do seu quotidiano. Sete anos após a estreia de Lady Chatterley, chega às salas portuguesas o mais recente filme de Pascale Ferran. No início do filme conhecemos Gary, um engenheiro norte-americano que se encontra em Paris para uma reunião, antes de rumar ao Dubai, em negócios. À última hora Gary decide não apanhar o voo, largar o seu emprego e deixar a mulher. As suas decisões são tomadas e postas em prática a partir do quarto de hotel onde se hospedara. Ferran filma todas as acções do seu protagonista com enorme precisão, de forma imparcial e num estilo quase documental, da sua rotina de trabalho ao processo de abandono das suas obrigações profissionais e pessoais, culminando numa difícil conversa por videoconferência entre Gary e a mulher, em que a separação e o futuro de ambos

é discutido. Paralelamente, Ferran mostra a rotina de uma das empregadas do hotel, Audrey, uma jovem francesa, indecisa quanto ao próximo passo que definirá o seu futuro. A sua rotina é acompanhada de forma precisa e imparcial, tal como a de Gary. É aqui que a narrativa sofre uma inesperada viragem, que remete para o título do filme, e a realizadora aplica técnicas de filmagem inovadoras, convertendo uma história naturalista e (aparentemente) mundana, numa interessante fábula surrealista. Prémios e Festivais: Festival de Cannes – Un Certain Regard Nomeação para Prémio Louis Delluc

BELA JUVENTUDE HERMOSA JUVENTUD

DE JAIME ROSALES BREVEMENTE

Dur: 102 min

COM INGRID GARCÍA JONSSON, CARLOS RODRÍGUEZ, INMA NIETO

O realizador Jaime Rosales faz um retrato da juventude do seu país através de Natalia e Carlos, dois jovens com cerca de vinte anos, afectados pela crise económica. O grande tema que Jaime Rosales aborda em Bela Juventude é a crise económica, num filme que se situa no contexto espanhol actual, e nos jovens que procuram encontrar um emprego e um rumo para a sua vida. Natalia e Carlos têm pouco mais de vinte anos, estão apaixonados, não têm emprego, vivem na casa dos respectivos pais e não têm muita esperança em relação ao seu futuro. Como refere Carlos Boyero no jornal El País, Natalia e Carlos “são pessoas normais, não pedem à vida nada de especial, apenas um trabalho que lhes permita ter uma existência que não seja marcada pela angústia e pela falta daquilo que é essencial.” No entanto, este cenário altera-se quando Natalia descobre que está grávida, o que deixa o jovem casal sem saber o que fazer. Em Bela Juventude, voltam a estar em destaque os assuntos preferidos do cinema de Jaime Rosales, como o quotidiano e as suas rotinas. No entanto, este filme foi também um exercício de mudança, como afirma o próprio realizador: “Bela Juventude foi como um

exorcismo, mudou toda a equipa, rodeei-me de gente jovem. E através deles tentei ligar-me a algo que me inquieta, a crise, num mundo que me atrai muito, o dos jovens.” Serge Kaganski, na publicação Les Inrockuptibles, lembra-nos que a obra de Jaime Rosales representa “um cinema sempre em pesquisa formal, que não desdenha a experimentação e que já trouxe várias honras ao seu autor.” Bela Juventude é exemplo disso mesmo: venceu uma Menção Especial do Prémio do Júri Ecuménico no Festival de Cannes e a actriz Ingrid García Jonsson foi galardoada com vários prémios, entre eles o Prémio Melhor Actriz Nespresso na última edição do Lisbon & Estoril Film Festival. Prémios e Festivais:

Festival de Cannes – Menção Especial do Prémio do Júri Ecuménico – Un Certain Regard Lisbon & Estoril Film Festival – Prémio Melhor Actriz Nespresso – Ingrid García Jonsson

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EXIBIÇÃO CINEMA

CAÇA AO TESOURO Deste programa de curtas há só uma, L’Ecole des Facteurs, que é cem por cento Tati. Há duas que são co-realizações, outras duas são escritas e interpretadas por Tati mas entregues a outros realizadores e, por fim, a última curta é um adorável filmezinho de doze minutos assinado por Sophie Tatischeff, filha do realizador. Amando-se e conhecendo bem os filmes mais celebrados de Jacques Tati, estas seis curtas de autorias diversas atravessadas por um elemento comum, oferecem-se ao público familiarizado como uma entusiasmante caça ao tesouro. Como, por exemplo, o último plano de On Demande une brute, de 1934, porque nos diz como, muitos anos mais tarde, o senhor Hulot haveria de ficar para tio.

O nascer daquele personagem de meia-idade, solitário, anti-conjugal revela-se no mesmo personagem, mais jovem, casado, que não hesita em se esquecer da mulher na borda do passeio e entrar sozinho num táxi. O cinema de Tati começou por ser tagarela em assoalhadas estreitas e evoluiu para os grandes espaços e para uma linguagem singular, o único esperanto atingido pelo cinema, em que quem fala alto são os ruídos de fundo construídos sobre bandas sonoras que dissolvem qualquer tentativa de normalidade. Há bocadinhos disto tudo e ainda a palpitar nestas seis curtas marcadas, de uma maneira ou de outra, por Jacques Tati.

PROCURA-SE BRUTAMONTES On Demande une brute (1934)

A ESCOLA DOS CARTEIROS L’Ecole des facteurs (1946)

Realização: Charles Barrois | Elenco: Jacques Tati, Hélène Pépée, palhaço Rhum

Realização: Jacques Tati | Elenco: Jacques Tati, Paul Demange

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

DOMINGO ANIMADO Gai Dimanche (1935)

ESPECIALIDADE DA CASA Dégustation maison (1976)

Realização: Jacques Berr | Elenco: Jacques Tati, palhaço Rhum

Realização: Sophie Tatischeff | Elenco: Dominique Lavanant, Gilberte Genia

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

CUIDA DO TEU GANCHO ESQUERDO Soigne ton gauche (1936)

FORÇA, BASTIA Forza Bastia (1978)

Realização: René Clement | Elenco: Jacques Tati, Louis Robur, Max Martell

Realização: Jacques Tati e Sophie Tatischeff

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

VERSÃO DIGITAL RESTAURADA

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Leonor Pinhão


EXIBIÇÃO CINEMA

VERÃO COM JACQUES TATI A OBRA COMPLETA PELA PRIMEIRA VEZ EM PORTUGAL EM VERSÕES DIGITAIS RESTAURADAS

MARTA MONTEIRO

SARA-A-DIAS

CATARINA SOBRAL

EM EXIBIÇÃO NO ESPAÇO NIMAS, EM LISBOA E NO TM CAMPO ALEGRE, NO PORTO

JOÃO FAZENDA

MADALENA MATOSO / PLANETA TANGERINA

ANDRÉ LETRIA

O cinema de Jacques Tati teve desde sempre um estreita relação com a ilustração. Numa iniciativa única, e por ocasião da exibição da obra completa de Jacques Tati pela primeira vez em Portugal em versões digitais restauradas, a Leopardo Filmes propôs a alguns dos mais conceituados ilustradores portugueses a criação de cartazes originais e exclusivos para os filmes do cineasta francês.

Os ilustradores André Letria, Catarina Sobral, João Fazenda, Madalena Matoso, Marta Monteiro e Sara-a-dias aceitaram o desafio de ilustrar e criar um cartaz para cada uma das longas-metragens de Jaques Tati.

Estes cartazes estão em exposição no Espaço Nimas, em Lisboa, e no Teatro Municipal Campo Alegre, no Porto. Podem também ser adquiridos no Espaço Medeia Nimas.

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ESTREIAS CINEMA

RICKI E OS FLASH RICKI AND THE FLASH

DE

JONATHAN DEMME

ESTREIA 3 SET

Dur: 101 min

COM MERYL STREEP, KEVIN KLINE, MAMIE GUMMER, RICK SPRINGFIELD

O regresso de Jonathan Demme à ficção conta a história de uma estrela de rock, interpretada por Meryl Streep, confrontada com a família que deixara para trás para seguir o seu sonho musical.

Ao longo da sua vasta obra, Jonathan Demme tornou-se conhecido como um realizador que é também um grande director de actores. Desde o seu trabalho com Melanie Grifith e Jeff Daniels em Selvagem e Perigosa, Michelle Pfeiffer e Dean Stockwell em Viúva… Mas Não Muito, às inesquecíveis interpretações de Jodie Foster e Anthony Hopkins em O Silêncio dos Inocentes, ou ainda Tom Hanks e Denzel Washington em Filadélfia e Anne Hathaway em O Casamento de Rachel, Demme construiu personagens memoráveis.

nem uma coisa nem a outra. Streep não castiga Ricki pelo falhanço das suas ambições, mas demonstra um vazio e um arrependimento, mascarados por uma atitude displicente que gela o ar à sua volta. É uma grande interpretação, dura, matizada e cheia de interessantes tiques que não caem no overacting”, escreve Richard Lawson na Vanity Fair.

trabalhado o tema da enfant terrible que regressa a casa e é confrontada com as suas faltas; no entanto, Ricki e os Flash tem além disso uma forte dimensão musical, cimentada no talento e experiência de Demme como realizador de filmes-concerto como Stop Making Sense, com os Talking Heads, ou os vários filmes que fez com Neil Young, o que torna Ricki e os Flash numa viagem emocionante, divertida e emotiva.

“Streep tem uma interpretação fascinante, cuidada e triste, ao encarnar uma mulher que poderia ter sido uma grande estrela ou uma modesta mãe de Tendo já trabalhado com Meryl família” Richard Lawson, Vanity Fair Streep em 2004, no filme O Candidato da Verdade, em Ricki e os Flash Demme dirige a actriz num papel bastante diferente da matriarca prepotente que interpretava nesse filme. Ricki é uma roqueira envelhecida, que nunca alcançou o estrelato, mas que decidiu largar tudo para viver o seu sonho Rock ‘n' Roll. “Streep tem uma interpretação fascinante, cuidada e triste, ao encarnar uma mulher que poderia ter sido uma grande estrela ou uma modesta mãe de família, mas que acabou por não ser 6

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Ricki e os Flash conta ainda com interpretações de Kevin Kline (que volta a trabalhar com Streep trinta e três anos após A Escolha de Sofia) e Mamie Gummer, filha de Meryl Streep (no filme e na vida real). Kline e Gummer interpretam o exmarido e a filha de Ricki, e são dois espelhos do falhanço com que se vê confrontada ao regressar a casa. É ainda de sublinhar que este filme marca a primeira colaboração entre Jonathan Demme e Diablo Cody. Em Jovem Adulta (Jason Reitman, 2011) a argumentista tinha já

JONATHAN DEMME

Prémios e Festivais: Festival de Locarno – Filme de Abertura


ESTREIAS CINEMA

AS MIL E UMA NOITES VOL. 1, O INQUIETO ESTREIA 27 AGO

Dur: 125 min

VOL. 2, O DESOLADO ESTREIA 24 SET

Dur: 131 min

DE MIGUEL

GOMES

ESTREIA 1 OUT

Dur: 125 min

VOL. 3, O ENCANTADO

COM CRISTA ALFAIATE, ADRIANO LUZ, ROGÉRIO SAMORA, CARLOTO COTTA, LUÍSA CRUZ, TERESA MADRUGA, GONÇALO WADDINGTON, JOANA DE VERONA, JOÃO PEDRO BÉNARD

Uma hipnótica Xerazade conta-nos histórias do Portugal contemporâneo, num filme ciclópico, entre o fantasioso e o documental.

As Mil e Uma Noites de Miguel Gomes é um projecto desmesurado, difícil de resumir, mais difícil ainda de definir. E os problemas de classificação começam logo aqui: trata-se de um filme composto por três partes ou, como propõe o realizador, serão antes três filmes autónomos, com carácter próprio e tonalidades diferenciadas, afluentes num “filme-sequência” que resultaria do percurso do espectador através dos três volumes? A estrutura de tríptico reforça a paradoxal independência interdependente dos três painéis, cujos subtítulos fornecem indicações precisas para melhor compreendermos o funcionamento humoral do todo: o volume 1, O Inquieto, é o mais barroco e agitado, com mudanças rápidas de registo, desdobramentos de histórias com ramificações inesperadas que introduzem e condensam uma visão global do projecto; o volume 2, O Desolado, reage à primeira parte conferindo ao conjunto um centro de gravidade biliar, mais saturnino e pessimista; o volume 3, O Encantado, encerra a trilogia num tom aéreo, mais contemplativo do que narrativo, como repositório de toda a memória. […] Usando como pretexto a mecânica narrativa dos contos orientais, Miguel Gomes reuniu uma equipa de jornalistas encarregada de seguir a actualidade da imprensa – “a nossa epopeia é o jornal”... (Tretyakov) –, e seleccionar acontecimentos que seriam investigados no terreno e reescritos pelos argumentistas. […] Este é um filme onde, como se vê na sequência intitulada “As lágrimas da juíza”, contrariando o discurso dominante dos média, todos os acontecimentos se relacionam, onde, sem julgamentos (ainda que em graus diferentes...), todos participam numa mesma ecologia social, sendo simultaneamente responsáveis

e inocentes, onde o privado e o público se espelham e confundem, onde o anedótico tem repercussões políticas. Este é o filme que retrata uma miríade de personagens extravagantes – humanas, animais ou mesmo vegetais – para, como o propõe Miguel Gomes, se centrar naquela que é, em última instância, a sua verdadeira personagem principal: a comunidade. Retrato colectivo de uma comunidade diversa que, como nos painéis de Nuno Gonçalves, protagoniza as vicissitudes um tempo definido (hoje), mas também um impiedoso fresco que, como em NON ou a Vã Glória de Mandar, faz engrossar múltiplas temporalidades, razões passadas, receios e antevisões, num diário do presente como crónica legada a julgamentos futuros. Aproximações porventura grandiloquentes que demonstram, porém com toda a simplicidade, que só a partir do presente podemos desconstruir as fantasias da História, do mesmo modo que só a partir da exterioridade edénica da ficção se pode alavancar um olhar arquimédico sobre o presente. O que em Manoel de Oliveira constitui inversão do modelo épico é em Miguel Gomes representação da realidade vista do avesso, uma epopeia extraordinária de acontecimentos tristemente banais. Um filme povoado por histórias que seriam cómicas se não fossem tragicamente absurdas, combativo e revoltado sem ser militante, melancólico e romântico no modo como reclama a responsabilidade e a urgência de pensar a realidade. António Preto

Prémios e Festivais: Festival de Cannes – Quinzena dos Realizadores Festival de Cinema de Sydney – Melhor Filme

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ESTREIAS CINEMA

A UMA HORA INCERTA A UMA HORA INCERTA

DE

ESTREIA 15 OUT

Dur: 75 min

CARLOS SABOGA

COM PAULO PIRES, JOANA RIBEIRO, JUDITH DAVIES, PEDRO LIMA GREGOIRE LEPRINCE-RINGUET, FILIPA AREOSA, JOANA DE VERONA

ENTREVISTA A CARLOS SABOGA

P.: No seu filme anterior, Photo, em que fala dos anos 1960/70, vistos a partir de hoje, havia, digamos, um acerto de contas com a História recente de Portugal, em particular a última década da ditadura fascista, que poderíamos também ler como o seu acerto de contas com essa história. Agora, em A Uma Hora Incerta, vai lá mais atrás, ao Portugal salazarista de 1942, no período da Segunda Grande Guerra, num filme de época. Parafraseando Alexandre O'Neill, Portugal é uma questão que tem consigo mesmo? Carlos Saboga: Em todo o caso, para continuar a parafrasear O'Neill, não é o “meu remorso”. De facto, se os dois filmes que realizei decorrem ambos em Portugal, parece-me que, no fundo, tanto um como o outro questionam mais a época do que o país. Se alguma questão tenho ainda com Portugal não é certamente em termos identitários ou de acerto de contas. Terá sido. Mas após todos estes anos de separação, Portugal é, para mim, sobretudo uma língua e uma memória. Devo acrescentar que não sou do Benfica nem o fado é, de todas as músicas, a minha preferida. P.: A questão do exílio forçado, aqui através de dois refugiados de guerra franceses, volta a estar presente, agora de forma distinta. CS.: Talvez, sei lá, porque o exílio, forçado ou escolhido, é um ponto de partida dramaticamente interessante que permite ao autor um olhar, digamos, mais distanciado sobre as duas margens, a que se deixou e aquela a que se abordou. Mas suponho que a autobiografia não deva ser totalmente alheia a esta atracção pelos exilados com o vago perfume de deserção, de traição até... mais o consequente sentimento de culpa que os rói... P.: Naquele “mundo fechado”, onde todos parecem esconder um segredo, o inspector Vargas acaba por ter um comportamento diferente do que seria de esperar de um inspector-chefe da PIDE, ao contrário de Jasmim, o seu subalterno. Isso deve-se ao facto de ter saído do país, para combater na Flandres na Primeira Grande Guerra? A “outra guerra”, como Laura lhe chama, ao que ele responde, que há só uma guerra, contínua, e que não há nenhum sítio seguro. CS.: Acho que Vargas é, depois dos dois franceses, o terceiro exilado do filme, latente, mas radical, porque não acredita sequer que haja um porto de abrigo possível. É um morto em suspenso. Um “estrangeiro”. A experiência da Flandres, o sopro da morte no campo de batalha, parecem tê-lo convencido de que a guerra é a inelutável condição dos homens. É o que o leva provavelmente a fechar-se aos outros. E aos sentimentos. P.: Ilda, a filha adolescente, tem uma enorme vontade de viver, sempre atenta aos ruídos e aos sinais que vêm do exterior. Simultaneamente, sente uma enorme paixão pelo pai, também física, incestuosa, que ela própria revela quando fantasia ao ler o episódio das filhas de Lot do Velho Testamento. 8

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ESTREIAS CINEMA

CARLOS SABOGA

CS.: Ilda é o oposto de Vargas. É a sua vitalidade, a sua sede de reconhecimento por parte do pai que fazem avançar a acção. Nem a traição, nem o crime a farão recuar. P.: O título do filme, A Uma Hora Incerta, vai, de algum modo, no sentido de que o acaso acaba por ter muitas vezes um papel decisivo na vida de cada um. E que as vidas se resolvem nesses lugares de “passagem, ou a meio caminho” como foi Portugal para os refugiados de guerra naquele tempo, como é a passagem do hotel para o anexo, onde o filme se resolve. CS.: Porque não? Na realidade, o título roubei-o a um poema de Primo Levi, Ad ora incerta, roubado por sua vez ao provérbio latino Mors certa, hora incerta. P.: Tem uma longa e premiada obra como argumentista, e trabalhou com grandes realizadores. Disse numa entrevista que muitas vezes os argumentistas se sentem, de certa forma, frustrados porque o resultado nunca é como tinham idealizado no papel. No decorrer da rodagem e montagem deste filme o Carlos Saboga realizador alterou muito o que o Carlos Saboga argumentista tinha escrito? CS.: A letra foi relativamente alterada (a carne é fraca)... O espírito manteve-se inalterado. Devo acrescentar que, mesmo antes de ter realizado o meu primeiro filme, sempre considerei que os realizadores tinham todo o direito de chamar a si o que eu havia escrito. É a regra do jogo. Em contrapartida, parece-me menos legítima a ignorância geral com que a crítica contempla habitualmente o trabalho do argumentista. P.: Volta a trabalhar com Mário Barroso, que também já fizera a fotografia de Photo, e com o qual trabalhou como argumentista nas duas longas que Barroso realizou, Um Amor de Perdição, adaptação contemporânea da obra de Camilo, e O Milagre Segundo Salomé, adaptação do romance de José Rodrigues Miguéis, sobre o Portugal da Primeira República. A fotografia é extremamente importante na criação desta atmosfera opressiva que o país vivia.

Nascido em Portugal em 1936, Carlos Saboga foge a salto do país da ditadura de Salazar, nos anos 1960. França foi o primeiro lugar de exílio, seguiu depois para Itália, e, mais tarde, naturalizou-se francês. Tem trabalhado como argumentista e tradutor, foi jornalista e assistente de realização, e, de há uns anos para cá, realizador. Aclamado pela crítica internacional desde os anos 1970, várias vezes premiado, colaborou com diversos realizadores, entre eles Raúl Ruiz, Fernando Lopes, Mário Barroso, José Fonseca e Costa, Valeria Sarmiento, ou António-Pedro Vasconcelos. Em 2012 Carlos Saboga realizou a sua primeira longa-metragem, Photo, apresentada na Selecção Oficial em Competição no Festival de Roma, e estreada em sala em França e em Portugal. Chega-nos agora o seu novo filme, que escreveu e realizou, A Uma Hora Incerta, sobre dois refugiados franceses de passagem por Lisboa durante a segunda Grande Guerra, seleccionado para a Viennale (Vienna International Film Festival) 2015.

CS.: Trabalho com o Mário Barroso desde o fim dos anos 70, se contarmos as curtas metragens meio realizadas e os projectos frustrados. O seu papel nos dois filmes que realizei foi essencial.

Prémios e Festivais: Viennale – Festival Internacional de Cinema de Viena – Selecção Oficial

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ESTREIAS CINEMA

SE AS MONTANHAS SE AFASTAM MOUNTAINS MAY DEPART

DE JIA ZHANG-KE ESTREIA 24 SET

Dur: 131 min

COM ZHAO TAO, ZHANG YI, LIANG JING DONG

O novo e aclamado filme de Jia Zhang-ke percorre um período de 25 anos, explorando as relações entre diferentes personagens.

JIA ZHANG-KE Nascido na China em 1970, Jia Zhank-ke estudou na Beijing Film Academy. Uma das marcas mais distintivas da sua obra tem sido o esbatimento das fronteiras entre a ficção e o documentário. Desde o início da sua carreira que os seus filmes têm sido continuamente exibidos e premiados em festivais um pouco por todo o mundo. Dos mais recentes – ambos do catálogo da Leopardo Filmes e exibidos nos Cinemas Medeia –, Still Life - Natureza Morta (2006) ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza e 24 City (2008) foi apresentado Em Competição no Festival de Cannes. O filme anterior a Se as Montanhas se Afastam, China – Um Toque de Pecado (2013), venceu o prémio de Melhor Argumento no Festival de Cannes.

Em Se as Montanhas se Afastam, passamos por três momentos: 1999, 2014 e 2025. No final de 1999, Tao, uma jovem rapariga, é cortejada por dois amigos de infância, Zhang e Liang. O primeiro é empresário e tem reservado para si um futuro prometedor, ao passo que o segundo trabalha numa mina de carvão. Tao acaba por casar-se com Zhang, com quem tem um filho. Em 2014, divorciam-se e Zang parte para a Austrália com o filho. É aí que vamos encontrá-los em 2025. Jia Zhang-ke é ele próprio uma testemunha das grandes transformações que aconteceram na China e na sociedade chinesa, ao longo das últimas décadas. O realizador viveu na primeira pessoa o processo de mudanças sofrido pelo país, no período entre a Revolução Cultural e a abertura ao capitalismo, assistindo às alterações económicas e sociais. Como explica o autor de 24 City (2008) na sua nota de intenções, “O desenvolvimento económico da China começou a disparar nos anos 90. Viver neste ambiente económico mudou inevitavelmente a forma como

as pessoas lidam com as suas emoções. O impulso por trás deste filme é examinar o efeito de colocar as considerações financeiras à frente das relações emocionais. Se imaginarmos um momento daqui a dez anos no nosso futuro, como é que iremos olhar para o que se passa hoje? Como é que iremos compreender a ‘liberdade’?” Quando Se as Montanhas se Afastam foi exibido na última edição do Festival de Cannes, integrando a secção Em Competição, João Lopes escreveu que este filme é “um retrato das relações humanas no interior da China, em particular de uma certa juventude, no princípio, em 1999, e nessa medida uma interrogação sobre a evolução de um país cada vez mais ocidentalizado”. O crítico elogia ainda a teia de relações que é construída entre as personagens: “É um caso exemplar de um genuíno fresco histórico, muito complexo do ponto de vista social, psicológico, e também carregado de emoções.”

Prémios e Festivais:

Festival de Cannes – Selecção Oficial – Em Competição

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ESTREIAS CINEMA

A VISITA THE VISIT

ESTREIA 10 SET

DE M. NIGHT SHYAMALAN

Dur: 94 min

COM KATHRYN HAHN, OLIVIA DEJONGE, ED OXENBOULD

Com The Visit, M. Night Shyamalan regressa à matriz do seu cinema, de onde sobretudo despontaram O Sexto Sentido e O Protegido, num thriller em torno da visita, virada pesadelo, de duas crianças aos avós maternos. Depois do fracasso comercial e crítico dos seus últimos filmes, Shyamalan afastou-se de Hollywood, escreveu, produziu e rodou A Visita em Filadélfia, a sua cidade natal, em segredo e em apenas 30 dias, com uma pequena equipa e um elenco desconhecido. Este formato de filme indie de baixo orçamento, com a liberdade criativa inerente, a salvo da pressão dos estúdios e da opinião pública, permitiu-lhe reencontrar a sua marca autoral. Com A Visita, Shyamalan pretendeu recuperar o despojamento dos seus filmes iniciais e prosseguir a visão muito pessoal sobre o seu grande tema: a família. Do interior desse núcleo, aparentemente banal e protector, irrompe a estranheza e o medo, quando o comportamento errático e

demente dos avós põe literalmente em perigo a vida dos seus netos. “Sundowning” foi o título inicial deste projeto e remete para uma síndrome de confusão mental e agitação que se expressa ao final do dia em estados de demência. Neste drama familiar mascarado de filme de género, Shyamalan trabalha habilmente o humor e o horror, sobretudo através da montagem, sem recurso à música, apenas com os efeitos sonoros servindo como uma espécie de partitura. Além da leitura sobrenatural, habitual nos seus filmes, A Visita deixa também uma leitura bem terrena sobre o medo do envelhecimento e da deterioração mental, num filme que Shyamalan diz ser sobre “o perdão na família”. Fátima Castro Silva

OUT OF THE DARK OUT OF THE DARK

DE LLUÍS QUÍLEZ BREVEMENTE

Dur: 92 min

COM JULIA STILES, SCOTT SPEEDMAN, STEPHEN REA

Uma arrepiante história de terror, Out of the Dark transporta-nos para uma vila colombiana, onde um jovem casal norte-americano e a sua pequena filha descobrem que a casa para onde se mudaram está assombrada. Esta é a estreia de Lluís Quilez nas longas-metragens, após algumas curtas, e traz-nos um aterrorizador thriller sobrenatural protagonizado por Julia Stiles e Scott Speedman, para além de uma interpretação de Stephen Rea merecedora de destaque. Julia Stiles interpreta Sarah, que se muda com a família para uma pequena localidade na Colômbia, de modo a assegurar o futuro do negócio do pai (Stephen Rea). A casa onde se instalam estava inabitada até à sua chegada, e rapidamente se apercebem de que se encontra assombrada por fantasmas de crianças, que perseguem e capturam a filha do casal. A busca por Hannah irá levar este casal a descobrir um segredo assustador no passado da sua própria família, que evoca também a história do próprio país. Segundo Julia Stiles em entrevista à Empire, “Out of The Dark não é apenas sobre fantasmas, é também um filme um pouco político. É sobre pecados, injustiças que foram cometidas há anos…”.

Esta era também a ideia dos argumentistas Javier Gullón (O Homem Duplicado), David Pastor e Alex Pastor (Outro/Eu), que quiseram ligar o filme a alguns assuntos sociais, como as más práticas levadas a cabo pelas grandes empresas. A rodagem na Colômbia garante que os cenários naturais são aproveitados ao máximo pelo director de fotografia Isaac Villa e acrescenta uma particularidade descrita pela protagonista do filme: “Eu falo espanhol e parte do fascínio de ir para a Colômbia era poder trabalhar em espanhol. O realizador dava as ordens em espanhol e muitas vezes eu fazia a tradução para os actores que falavam inglês.”

Prémios e Festivais: Fantasy FilmFest – Berlim

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ESTREIAS CINEMA

SENTIDO DE HUMOR SICARIO - INFILTRADO LE SENS DE L'HUMOUR

DE MARILYNE CANTO BREVEMENTE

SICARIO

Dur: 88 min

DE DENIS VILLENEUVE ESTREIA 24 SET

Dur: 121 min

COM MARILYNE CANTO, ANTOINE CHAPPEY, SAMSON DAJCZMAN

COM EMILY BLUNT, BENICIO DEL TORO, JON BERNTHAL, JOSH BROLIN

Sentido de Humor marca a estreia da actriz francesa Marilyne Canto na realização de longas-metragens, num filme autobiográfico protagonizado por si.

O quebequense Denis Villeneuve aborda o tema da guerra ao narcotráfico, na fronteira entre os EUA e o México, em Sicário, um thriller de acção ancorado nas personagens interpretadas por Emily Blunt, Benicio Del Toro e Josh Brolin.

Antes de se aventurar na realização de uma longa, a actriz Marilyne Canto assinou já uma série de curtas-metragens, entre as quais Fais des beaux rêves (2005), filme que serve de inspiração a Sentido de Humor. Também interpretada pela actriz e por Antoine Chappey – seu companheiro na vida real –, aquela curta centra-se numa mulher em estado de choque após a morte do seu marido. Em Sentido de Humor, Marilyne Canto interpreta Elise, que vive sozinha com o seu filho Léo depois da morte prematura do marido. Nesta equação entra Paul (Antoine Chappey), com quem Elise mantém uma relação complicada, de amor e de rejeição, e de quem Léo se aproxima. Aos poucos, vai surgindo a possibilidade de formar uma nova família. Em parte, este é um filme autobiográfico para Marilyne Canto, como revela a actriz e realizadora em entrevista: “Tinha vontade de descrever com exactidão este sentimento porque o conheço. Eu queria descrever da forma mais sincera, mais rigorosa, o quanto é difícil amar de novo, ainda conseguir amar, depois de ter amado e ter sofrido uma perda. Mas o filme inspira-se também na vida, em acontecimentos observados, em elementos transpostos.” O resultado é “um drama alegre”, como o classifica Marilyne: “Mesmo que o assunto seja grave, eu não queria que o filme fosse dramático. Queria anunciar logo no título um drama com alegria.” E Serge Kaganski, na revista Les Inrockuptibles, resume desta forma Sentido de Humor: “Charme, discrição, inteligência, comédia e drama subtilmente misturados… este filme assemelha-se decididamente à sua autora. E faz de nós, mais do que nunca, aficcionados.” Prémios e Festivais: Festival de Locarno – Em Competição, Secção Cineastas do Presente

12 SETEMBRO | OUTUBRO 2015

Villeneuve volta a trabalhar em Hollywood, depois de Raptadas e O Homem Duplicado, e explora a mais perene das obsessões da psique americana: a violência. Sicário (palavra que, no México, significa assassino contratado) acompanha o trajecto moral da sua protagonista, uma agente do FBI que interroga a legalidade, a alienação e o niilismo da espiral de violência que a suga. É através do confronto entre o questionamento da personagem de Emily Blunt (papel que os produtores iniciais queriam que fosse reescrito para um homem) e a atitude moral das personagens masculinas, suas superiores hierárquicas – o cinismo de Josh Brolin, a velada sede de vingança de Benicio Del Toro – que em Sicário se trabalha a tensão entre idealismo e realismo, e se problematiza toda a atmosfera de medo, paranóia e retaliação num território sem lei. Villeneuve afirma que o seu filme não é apenas sobre os cartéis da droga. “Sicário é sobre a América, sobre como a América fantasia que pode resolver problemas para lá das suas fronteiras, sobre os danos colaterais que daí resultam e sobre as questões morais em torno disso. Passa-se na fronteira mexicana, mas poderia facilmente passar-se no Afeganistão, no Médio Oriente ou em vários países de África. Na América permitimo-nos fazer coisas que outros países não se permitiriam fazer. Sicário é um filme muito sombrio e bastante violento.” Fátima Castro Silva

Prémios e Festivais: Festival de Cannes – Selecção Oficial – Em Competição


ESTREIAS CINEMA

ELA É MESMO... O MÁXIMO SHE'S FUNNY THAT WAY

DE PETER

BOGDANOVICH

ESTREIA 8 OUT

Dur: 93 min

COM OWEN WILSON, JENNIFER ANISTON, IMOGEN POOTS, KATHRYN HAHN, WILL FORTE, RHYS IFANS

O mais recente filme de Peter Bogdanovich é uma comédia “screwball” (como os clássicos americanos do género dos anos 30 e 40) que recupera um guião escrito pelo realizador e a sua mulher, há mais de 10 anos.

Produzido por Wes Anderson e Noah Baumbach, Ela É mesmo... o Máximo marca o regresso de Bogdanovich ao seu campo preferido, o da comédia. O realizador dos filmes incontornáveis A Última Sessão e O Que Se Passa, Doutor? conta-nos a história de um triângulo amoroso em que, no centro, se encontra um dramaturgo que está a preparar um novo projecto. Uma comédia que homenageia a influência que os clássicos do género tiveram para Bogdanovich, e que tenta recuperar, para a modernidade, a essência e a originalidade do “screwball”, um estilo de comédias característico da “era dourada” de Hollywood, facilmente identificado pela vivacidade das interpretações, a química dos actores, os diálogos velozes e acertados, tudo ambientado com histórias de intrigas amorosas, de amores desencontrados ou de simples enganos entre casais, familiares e outros que tais.

Ao “screwbal” ficaram associados vários actores e actrizes, sendo Cary Grant e Katharine Hepburn dois dos nomes mais emblemáticos dessas comédias. O cineasta volta a apoiar-se numa dinâmica direcção de actores, algo que caracteriza os seus melhores filmes e a forma como as suas histórias conseguem cativar o espectador. E apesar de se mover através deste jogo com os clássicos, e de homenagear um legado tão

de grandes interpretações e é muito divertida”. Eis uma aposta cinematográfica, com contornos clássicos e actuais, que vai fazer as delícias dos espectadores e, principalmente, dos apreciadores de Bogdanovich. Uma comédia de enganos que se apoia numa fortíssima dinâmica entre os actores e os diálogos das suas personagens, e que não vai deixar ninguém indiferente. Rui Alves de Sousa

“[Ela É mesmo... o Máximo] está cheia de grandes interpretações e é muito divertida” Robbie Collin, The Telegraph

forte de Hollywood, Bogdanovich não deixou de fazer um filme com a sua marca pessoal. O realizador está de volta, assim, com uma comédia ligeira, mas bem articulada, que valeu os elogios rasgados de alguns críticos. Robbie Collin, do The Telegraph, disse que Ela É mesmo... o Máximo “está cheia

Prémios e Festivais: Festival de Veneza Festival de Toronto

SETEMBRO | OUTUBRO 2015 13


ESTREIAS CINEMA

PERDIDO EM MARTE THE MARTIAN

Dur: 130 min

DE RIDLEY SCOTT

ESTREIA 1 OUT

COM MATT DAMON, JESSICA CHASTAIN, KRISTEN WIIG

Como sobreviver num planeta sem vida? Em Perdido em Marte Ridley Scott adaptou ao grande ecrã o romance de Andy Weir sobre a luta pela sobrevivência de um astronauta acidentalmente deixado sozinho no planeta vermelho.

Nos últimos anos a ciência tem enchido nos jornais e revistas mais páginas sobre Marte do que a ficção científica. De resto, já este ano, o robot Curiosity (que caminha pela cratera Gale) confirmou que há ali água no estado líquido. Um novo filme de Ridley Scott, o mesmo de Alien, O Oitavo Passageiro e de Blade Runner, que após longo hiato regressou à ficção científica com Prometheus, promete contudo – e a menos que chegue uma descoberta surpreendente – ser um dos motivos pelos quais mais vezes falaremos de Marte nestes últimos meses de 2015. Adaptado de O Marciano, de Andy Weir (que está publicado entre nós pela Topseller), o filme acompanha

uma missão tripulada a Marte que se vê obrigada a partir antes do previsto quando uma violenta tempestade se abate sobre a sua base. Um dos astronautas, dado como morto, fica na superfície. E ao retomar os sentidos depois da bonança, dá por si não apenas só e inicialmente incapaz de comunicar, mas obrigado a uma luta pela sobrevivência, num planeta estéril, até que ali possa chegar uma outra nave terrestre. Com Matt Damon como protagonista, Perdido em Marte acompanha

RIDLEY SCOTT

a vontade do astronauta em não ceder, procurando como produzir comida, água e ar num habitat que não previa uma missão tão longa. Rodado entre um grande estúdio na

“O filme acompanha uma missão tripulada a Marte que se vê obrigada a partir antes do previsto quando uma violenta tempestade se abate sobre a sua base” Roménia e exteriores na Jordânia, o filme procura (como um livro) um sentido de verosimilhança para contar a história de um Robinson Crusoé marciano. E com uma diferença maior face à aventura do herói que Daniel Defoe inventou em 1719: este está a ser observado através da rede de satélites. E a um planeta de distância todos torcem para que seja bem sucedido. Nuno Galopim

14 SETEMBRO | OUTUBRO 2015


OUTRAS PROGRAMAÇÃO ESTREIAS

LANÇAMENTOS EM DVD PACK ROBERTO ROSSELLINI 4 FILMES COM INGRID BERGMAN

No mês de Outubro é editada a caixa Rossellini / Bergman, que celebra a colaboração entre o realizador italiano e a mais famosa actriz sueca, de quem se celebra o centenário do nascimento ao longo deste ano. Stromboli, Europa 51, Viagem em Itália e O Medo são os clássicos aqui apresentados em versões digitais restauradas. Uma edição essencial para compreender a importância de Rossellini na história do cinema e uma oportunidade para ver a actriz Ingrid Bergman em algumas das suas melhores interpretações.

NATIONAL GALLERY DE FREDERICK WISEMAN Festival de Cannes – Quinzena dos Realizadores Festival de Toronto – Selecção Oficial Festival de Nova Iorque – Selecção Oficial

A National Gallery em Londres é um dos maiores museus do mundo, com cerca de 2400 pinturas do séc. XIII ao séc. XIX. Quase todas as experiência da vida humana estão representadas nos seus quadros. Explorando a relação entre pintura e história, este filme mostra o público nas suas várias galerias, programas educacionais, académicos, cientistas e curadores, que estudam, restauram e planeiam as exposições.

O GRANDE MUSEU DE JOHANNES HOLZHAUSEN Festival de Berlim – Prémio Caligari

Um olhar particular sobre os bastidores do Kunsthistorisches Museum em Viena. A câmara viaja pelas magníficas galerias e corredores do museu, enquanto acompanha interessadamente curadores e peritos em restauro. Entre todos os que trabalham neste autêntico baú de tesouros existe uma relação de proximidade, que se estende aos seus patronos da Casa de Habsburgo. Para alguns a relação com a herança cultural é quase um casamento.

ENTERRAR A MINHA EX DE JOE DANTE Max é um apaixonado por filmes de terror e namora Evelyn. Decidem viver juntos, juram amor eterno, mas o que não esperavam era que uma pequena estátua na loja que Max gere tivesse a capacidade de realizar desejos. Isso faz com que Evelyn ressuscite como zombie, depois de ser atropelada por um autocarro. O problema é que, antes do falecimento de Evelyn, Max já queria terminar o namoro.

ESTREIA 24 SETEMBRO

THE WALK - O DESAFIO DE ROBERT ZEMECKIS A história verídica de um jovem sonhador, Philippe Petit, e um grupo de improváveis aliados que, juntos, conseguem o impossível: colocar de forma ilegal um cabo de aço no espaço entre as torres do World Trade Center, em Nova Iorque, e sobre ele caminhar, ou mesmo dançar, sem qualquer protecção.

ESTREIA 8 OUTUBRO

PAN: VIAGEM À TERRA DO NUNCA DE JOE WRIGHT Peter Pan é transportando para a mágica Terra do Nunca, onde encontra muita diversão e perigos vários. Descobre finalmente que o seu destino é salvar o local do terrível Barba Negra, contando com a ajuda do Capitão Gancho, para se tornar o herói que conhecemos.

ESTREIA 15 OUTUBRO

A COLINA VERMELHA DE GUILLERMO DEL TORO Quando o seu coração é roubado por um estranho sedutor, uma jovem é levada para uma casa no topo de uma colina de argila vermelha: um lugar repleto de segredos que a assombrarão para sempre. Entre o desejo e a escuridão, o mistério e a loucura, encontra-se a verdade por detrás de Crimson Peak. Cinema Medeia Monumental - Edifício Monumental

ESTREIA 22 OUTUBRO

Av. Praia da Vitória, 72 - 1050-183 Lisboa - Telefone: 213 142 223

Cinema Medeia Espaço Nimas

Av. 5 de Outubro, 42 B - 1050-057 Lisboa - Telefone: 213 574 362

SETEMBRO | OUTUBRO 2015 15


16 SETEMBRO | OUTUBRO 2015


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