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OPINIÃO
OPINIÃO
Impacto da Gestão Eficaz da Saúde e Segurança no Trabalho, na Competitividade das Empresas e na Economia Nacional – Números da OMS
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Hélio Matlonhane • Consultor e Gestor de Projectos da Insite Moçambique
Os acidentes de trabalho e doenças profissionais resultantes da actividade laboral sempre constituíram grande preocupação de sociedades, trabalhadores, empregadores e organizações de vários países e contextos socioeconómicos.
As condições de trabalho injustas e deploráveis fizeram com que, em Junho de 1919, fosse criada, em Versalhes, pela Conferência da Paz, a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Em 1998, através da Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho, os países-membros do tratado de Versalhes comprometeram-se a desenvolver o quadro legal em respeito aos princípios fundamentais no trabalho, assim como a eliminar as formas de trabalho forçado/ obrigatório, a abolir o trabalho infantil e a eliminar a discriminação no acesso ao emprego. Moçambique, como país ratificador das convenções da OIT, envidou os esforços que resultaram em alterações no seu quadro legal, tendo como premissa as convenções ratificadas e, também, a evolução económica, social e política do País.
Em Moçambique, a Lei do Trabalho - Lei n.º 23/2007 de 1 de Agosto - actualizada pela última vez em 2007, cujo capítulo VI é relativo à higiene, segurança e saúde dos trabalhadores, estabelece como premissa que o empregador deve proporcionar aos seus trabalhadores boas condições físicas, ambientais e morais de trabalho, informá-los sobre os riscos do seu posto de trabalho e instruí-los sobre o adequado cumprimento das regras de higiene e segurança no trabalho.
A Lei aplica-se às relações jurídicas de trabalho subordinado estabelecidas entre empregadores e trabalhadores assalariados, nacionais e estrangeiros, a laborar em associações, organizações não-governamentais e no sector cooperativo, de todos os ramos de actividade e indiferentemente da dimensão da Organização. Não obstante a preocupação e os esforços no sentido de aumentar a regulação do mercado e a protecção dos trabalhadores, as estimativas globais apontadas pelo Congresso ICOH 2022 (International Congress on Occupational Health – Congresso Internacional em Saúde Ocupacional), dão conta de 2,9 milhões de mortes anuais devido a acidentes de trabalho e doenças profissionais e, pelo menos, 402 milhões de lesões profissionais não fatais por ano. As estimativas conjuntas da OMS e OIT, através da avaliação da combinação de factores de risco e do impacto na saúde, referem que as doenças profissionais foram responsáveis por 81% de todas as mortes relacionadas com o trabalho, sendo os restantes 19% devido a acidentes ocorridos no local de trabalho.
A nível nacional, os dados estatísticos da Inspecção Geral do Trabalho (IGT) revelam que, em 2019, 523 acidentes de trabalho resultaram em incapacidade temporária, 41 em incapacidade permanente parcial, dois em incapacidade permanente total e sete em morte. Em 2021, 22 pessoas perderam a vida em resultado de 604 acidentes de trabalho, uma subida do número de óbitos em comparação com o ano anterior, em que ocorreram 16 mortes em 642 incidentes. Como principais causas, aponta-se a inobservância das regras de protecção e segurança no local de trabalho.
É fundamental ter em conta que a ocorrência de acidentes de trabalho e doenças profissionais, além de causar sofrimento humano imensurável, também implica grandes perdas económicas para as empresas e economia em geral, tanto pelos custos directos associados (custos com seguros, cuidados de saúde, perda de produção, reparações, redução da capacidade de trabalho, maior absentismo, pensões e indemnizações), como pelos indirectos/ocultos (perdas de produtividade associadas a incapacidade permanente, custos com rotatividade de pessoal, com perda de pessoal qualificado, clientes insatisfeitos, atrasos na programação dos trabalhos e danos à reputação), que contribuem igualmente para o impacto económico negativo. Estima-se que os acidentes e doenças profissionais contribuam para uma perda de 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) glo-
A implementação dos Sistemas de Segurança no Trabalho é um imperativo nas organizações
bal anual. Nos últimos dois anos, a pandemia do covid-19 agudizou as perdas económicas das empresas/da economia mundial e deu origem a inúmeros desafios novos relativamente à Saúde e Segurança no Trabalho (SST). O cenário parece, pois, indicar que as empresas devem estar cada vez mais preparadas para lidar com diferentes eventos e desafios com impacto em escala na Saúde e Segurança no Trabalho.
Face ao contexto descrito, compete às organizações repensar a Saúde e Segurança no Trabalho como factor diferencial, assegurando o cumprimento, além da conformidade com os regulamentos de SST, que é o mínimo necessário. Porém, a criação da cultura de prevenção e Segurança no Trabalho e a formação do trabalhador constituem ainda um desafio para muitas empresas, incluindo as que se encontram em países mais desenvolvidos.
A integração de sistemas de gestão de SST na estrutura de gestão da empresa é a chave para controlar os riscos e reduzir as doenças e acidentes relacionados com o trabalho, uma vez que promove uma abordagem pro-activa e preventiva da SST, com base na melhoria contínua.
Quaisquer medidas implementadas com esta abordagem contribuem não só para melhorar o desempenho em SST, como também noutros aspectos que refletem a produtividade e competitividade da empresa em processos de procurement dos chamados mega projectos (grandes investimentos) e na prestação de serviços a empresas com elevados padrões de exigência.
A nível internacional existem diversas normas para a implementação de Sistemas de Gestão da SST, sendo a ISO 45001:2018 uma das normas com maior expressão e reconhecimento. De acordo com dados da ISO de Setembro de 2021, existem mais de 250 mil sites certificados pela norma ISO 45001 no mundo, o que, considerando que a publicação da mesma ocorreu apenas em 2018 e que a certificação não é ainda um imperativo legal, pode ser um bom indicador do interesse crescente das Organizações pelo tema.
De facto, sublinhando-se que não é ainda um imperativo ou obrigação legal das empresas, a certificação da gestão da SST é uma componente estratégica e de gestão das Organizações. Promovendo uma abordagem proactiva e permitindo o reconhecimento da gestão por uma entidade terceira parte, que atesta que a organização busca continuamente a melhoria das condições de trabalho, contribui para o aumento da confiança dos clientes e das partes interessadas na empresa.
Em Moçambique, contudo, os dados recolhidos junto de 187 gestores num estudo sobre Higiene e Segurança no Trabalho realizado em 2017 dão uma indicação clara de que há poucas empresas que possuem um planeamento estruturado/sistematizado para a identificação de necessidades e realização de acções de formação sobre SST, envolvendo os trabalhadores na elaboração e cumprimento do plano definido.
Em termos legais, o envolvimento dos trabalhadores pode ser assegurado através da criação das comissões de SST (composta por representantes dos trabalhadores e da entidade empregadora), que têm como objectivo vigiar o cumprimento das normas de SST, investigar as causas de acidentes e incidentes, organizar métodos de prevenção e assegurar a higiene no local de trabalho.
Na perspectiva da norma ISO 45001, a consulta e participação dos trabalhadores no sistema de gestão de SST é igualmente um requisito crucial.
Partindo do pressuposto que não basta ter documentos devidamente estruturados se os colaboradores não os souberem interpretar, a formação e consulta e participação dos colaboradores são uma base fundamental para que as políticas, procedimentos de gestão de SST e operacionais sejam cumpridos. Liderança, compromisso e uma cultura positiva de SST, em que o ambiente de trabalho seguro e saudável é valorizado e promovido pela gestão e pelos trabalhadores, é fundamental para a implementação e manutenção da eficácia e eficiência de um sistema de gestão de SST.
Em locais de trabalho com uma forte cultura positiva de Saúde e Segurança no Trabalho, entre vários outros benefícios, as pessoas sentem-se confortáveis para contribuir sobre eventuais perigos e riscos no local de trabalho, assegurando a melhoria contínua das condições de trabalho. Consequentemente, verifica-se um aumento da motivação e compromisso dos colaboradores, da confiança dos investidores e da sociedade, da produtividade, do potencial de manutenção de clientes e da conquista de novos mercados. A gestão da SST agrega, pois, valor aos produtos e serviços da organização, aumentando a competitividade da empresa.
Em suma, dar a prioridade adequada à prevenção de acidentes e doenças profissionais e realizar investimentos adequados em Saúde e Segurança no Trabalho irá assegurar uma mão-de-obra saudável. Trabalhadores mais saudáveis e mais felizes irão, por sua vez, contribuir para uma maior produtividade, melhor qualidade e maior rentabilidade empresarial, gerando um ciclo de crescimento e evolução das empresas/organizações que conduzirá a economias mais sustentáveis.