Mercúrio do Porto

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Pub Sede: Pólo de Ciências da Comunicação: Jornalismo, Assessoria, Multimédia Universidade do Porto Praça Coronel Pacheco, 8 4050-453 Tel. 223 393 660 Fax. 223 393 668 ljcc06007@icicom.up.pt Sítio Online: http://mercuriodoporto.blogspot.com

Director: Adriano Cerqueira e-mail: adriano.jb.cerqueira@gmail.com

Janeiro de 2009 Edição n.º 1

Yazaki Saltano anuncia o despedimento de 145 trabalhadores É já o terceiro anúncio de despedimento colectivo, elevando para 1000 o número de desempregados da fábrica de Ovar em 2008

Em destaque, pág 2

Aves Madrugadoras do Parque Biológico de Gaia

Em Reportagem Anilhagem de Aves no Parque Biológico de Gaia

Há dois anos a funcionar no Parque Biológico de Gaia, a anilhagem de aves demarca-se como um dos mais fortes contributos para a preservação da ilha verde do Grande Porto. A prática de recolha para identificação e estudo de aves já decorre há vários anos no parque, mas apenas em 2006 é que Rui Brito e António Pereira, ornitólogos responsáveis pelo projecto, deram inicio a esta actividade de forma regular. pág. 4

Desporto

Em Entrevista Internacional Cultura

Bernardino Barros: “A vida de um homem é do FC Porto ao 1.º lugar escrever um livro, plantar uma árvore e ter um filho” Liga Sagres: Marítimo trava ataque

pág. 13

pág. 8

Paquistão: Cinema: Atentado Terrorista faz Antes de Amanhã de 53 mortos Gonçalo Galvão Teles é o grande premiado do Ovarvídeo 08 pág. 6

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Em Destaque

Yazaki Saltano anuncia o despedimento de 145 trabalhadores É já o terceiro anúncio de despedimento colectivo, elevando para 1000 o número de desempregados da fábrica de Ovar em 2008

Adriano Cerqueira A Yazaki Saltano de Ovar anunciou o despedimento colectivo de 145 trabalhadores. É já a terceira redução de postos de trabalho em 2008. Em comunicado, a direcção da empresa afirma que o terceiro despedimento colectivo dá-se “em resposta à crise financeira mundial e à quebra de encomendas de automóveis.” Américo Rodrigues, delegado do Sindicato das Indústrias Eléctricas, revela que com esta redução elevase para 1000 o número de trabalhadores despedidos este ano. “Este já é o terceiro despedimento neste ano de 2008. Neste momento a empresa oficialmente dispensou mais 145 trabalhadores, elevando para 1000 o número de trabalhadores dispensados no conjunto da totalidade dos despedimentos deste ano”, assegura.

O delegado sindical refere ainda que até Janeiro de 2009 podem ainda haver mais despedimentos: “No futuro perspectiva-se que este último despedimento colectivo, que é colocado até Janeiro, possam vir mais trabalhadores o que pode perfazer um número ainda maior.” Ovar é a freguesia do Distrito de Aveiro com maior número de desempregados No mês de Novembro estavam registados 825 desempregados no Centro de Emprego de Ovar, de um total de 9487 habitantes que perfazem a população activa da freguesia. Para Joaquim Barbosa, presidente da Junta de Freguesia de Ovar, esta situação é “preocupante”. “Hoje, infelizmente, o emprego não é uma situação estável, não só em Portugal, como em todo o Mundo e os portugueses em geral e os vareiros em

particular, têm que se habituar a viver com uma situação de emprego precário para toda a vida”, confessa. Os despedimentos na Yazaki Saltano vêm apenas agravar a situação de desemprego neste concelho do distrito de Aveiro. Joaquim Barbosa afirma que “a situação da Yazaki, é uma situação que não é única em Ovar. É uma multinacional que durante muitos anos foi um pólo de trabalho para muitos vareiros, e que hoje devido à conjuntura e à crise económica internacional está prestes a fechar as portas”. O presidente da junta conta ainda que “infelizmente há famílias inteiras, marido e mulher, que trabalhavam na Yazaki e neste momento estão desempregados e isso traz reflexos para a comunidade Vareira e para a freguesia de Ovar em particular”. Joaquim Barbosa acredita que a fábrica irá acabar por

“fechar as portas na totalidade”. “Julgo que ainda tem à volta de 400 funcionários a trabalhar, dos quais 20 ou 30% ainda serão de Ovar. Se a curto prazo a empresa fechar serão mais esses 80, 90 ou 100 funcionários de Ovar que se irão juntar a todos os outros que neste momento já estão desempregados”, explica. Comércio sente os efeitos da falta de emprego O comércio de Ovar é um dos sectores mais afectados pela crise de emprego da região. A diminuição do número de consumidores já levou ao encerramento de várias lojas. Joaquim Barbosa relembra as “falsas expectativas” criadas à volta da abertura do centro comercial. “Na altura a ideia que as pessoas teriam era que o Dolce Vita seria o Ovo de Colombo para resolver os problemas de emprego. Obviamente que um centro comercial que emprega 100

ou 150 pessoas não vai resolver os problemas do desemprego na freguesia”, reafirma. O presidente da junta diz ainda que “com essa mudança de clientes para o centro comercial, o pequeno comércio e o comércio tradicional em Ovar, sofreu”. Joaquim Barbosa afirma que “hoje começa a haver problemas no centro comercial, porque fecham muitas lojas e o pequeno comércio continua a ter problemas porque o poder de compra das pessoas diminuiu bastante”. Outrora motor de desenvolvimento e de crescimento económico do concelho, a empresa de peças de automóveis teve o seu ponto alto nos anos 90 quando chegou a empregar 3700 pessoas. Actualmente a Yazaki Saltano de Ovar emprega apenas cerca de 600 trabalhadores.


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Reportagem

Yazaki Saltano: A incerteza de um futuro

Outrora símbolo do desenvolvimento do concelho de Ovar, a Yazaki Saltano vive tempos atribulados. Para os trabalhadores a esperança da manutenção do emprego entra em conflito com o possível encerramento da fábrica está a passar algumas dificuldades. Dizem que é devido à crise mundial que também está a afectar a industria automóvel”.

Adriano Cerqueira Foi em 1992 que a Yazaki Saltano chegou a Ovar. Motor de desenvolvimento e crescimento económico do concelho, a empresa de peças de automóveis teve o seu ponto alto nos anos 90 quando chegou a empregar 3700 pessoas. Passados 16 anos o panorama é muito diferente. A empresa vive sob constante ameaça de encerramento e os anúncios de despedimentos colectivos aumentaram de frequência nos últimos anos. Só em 2008 a Yazaki terminou o contrato com 1000 empregados, restam agora pouco mais de 600. Anabela Neusa, operadora de produção, conta como é viver com um futuro de emprego incerto: “A incerteza é como o próprio nome diz. Quando uma pessoa tem um emprego cria expectativas, faz planos, como um grande número de trabalhadores, o que pesa mais são os compromissos que uma pessoa tem, como as prestações da casa. Essa incerteza deixa sempre a incógnita de conseguir cumprir com esse compromisso”. A incerteza não recai apenas sobre os empregados. Anabela partilha a angustia de gerir os assuntos familiares nesta situação. “A incerteza não se coloca só no próprio trabalhador. Vai-se vivendo um dia de cada vez, vendo as possibilidades dentro da gestão. Na hipótese de faltar o emprego, faltar o vencimento, os compromissos familiares vão deixar de ser cumpridos e isto cria muita angústia na gestão do dia-a-dia da família”, confessa. Apesar dos constantes anúncios de encerramento, a direcção da Yazaki Saltano continua a desmentir essa possibilidade. Confrontada com a opção de começar a procurar emprego noutro lado, Anabela prefere manter a confiança na empresa.

Américo Rodrigues, também ele recém desempregado da Yazaki Saltano, descreve o sentimento de incerteza vivido pelos trabalhadores: “Desde o primeiro despedimento que os trabalhadores têm visto o futuro da empresa muito negro. Já não acreditam que a empresa esteja em Portugal muito mais tempo. Têm vivido na incerteza de serem despedidos, isso provoca muitas alterações a nível de organização pessoal e de stress”. Instalações da Yazaki Saltano em Ovar “A Yazaki tem boa mão de Yazaki Saltano em Ovar, obra, os trabalhadores da para outros a empresa já faz Yazaki sempre cumpriram parte do passado. Após 15 objectivos, sejam eles de anos na Yazaki, Benjamim qualidade, de quantidade e Rodrigues viu-se confronmesmo prazos de entrega. tado com uma realidade Eu tenho que acreditar que diferente ao ver o seu nome a falta de trabalho não é na lista de despedimento. por falta de encomendas, é Benjamim descreve os apenas por falta de vontade efeitos do desemprego na e de investimento”. Anabela sua vida: “Estou no fundo reafirma ainda acreditar que de desemprego, estou a tirar seja possível “alternativas de um curso, a tirar o 9.º ano trabalho na Yazaki”. através das novas oportunidades. É frustrante, uma Já o ambiente entre os empregados é dividido. Entre pessoa está naquela, vai aqueles que se sentem mais à vontade, outros já começam a sofrer os efeitos do fecho da fábrica. “O ambiente... É um bocado estranho, há sentimentos de várias ordens. Há os trabalhadores que possam não ter compromissos e estão mais ou menos à vontade com a situação, e existem aqueles que realmente têm compromissos com datas fixas e que vivem numa ansiedade e numa angustia bastante grande. Muitos estarão certamente medicados. Existem aqueles que ainda não acreditam muito que seja possível a empresa vir a fechar, o que será uma realidade se realmente não houver alternativas de trabalho”, perspectiva Anabela Neusa. Enquanto uns ainda acreditam na permanência da

Américo Rodrigues: “Desde o primeiro despedimento que os trabalhadores têm visto o futuro da empresa muito negro”

embora, não vem, e depois acabamos por ter uma vida instável. Tenho uma casa para pagar, filha, mulher desempregada também... É complicado. Não é que nós já não tivéssemos a contar com alguma coisa, aquilo já não estava bem. O impacto foi mau, psicologicamente andei arrasado”. Sem perspectivas de emprego, não são os problemas económicos a única apreensão de Benjamim. A estabilidade familiar é agora a sua principal preocupação. “A minha mulher está

desempregada e também foi afectada por problemas psicológicos também. Para a minha filha não tenho passado muito essa imagem embora ela tivesse sentido. Tivemos que a privar de mais coisas”. Benjamim não olha com optimismo para as perspectivas de emprego. “É que não há muitas perspectivas de arranjar emprego com salários condignos para nós termos uma vida razoável”, confessa.

Já os trabalhadores da Yazaki vêem o fechar das portas como inevitável. Anabela Neusa, aponta a extinção de sectores como um dos claros sinais do eventual encerramento da fábrica: “Quando se encerram linhas, quando se encerram sectores, seja por falta de encomendas – que não é o caso –, seja por deslocalização, que é a realidade, quando não existem novos investimentos, as coisas fecham, não surgem outras, acaba por fechar, certamente”.

Trabalhadores não acreditam Agora do lado de fora, na permanência da empresa Benjamim Rodrigues em Ovar partilha da mesma opinião. O possível fecho e a Apesar da Yazaki o desmenincerteza de emprego tir, o recém desempregado dominam o pensamento dos não acredita que a empresa actuais trabalhadores da se mantenha em Ovar após Yazaki Saltano. Américo 2010. “Aquilo tem tudo para Rodrigues, delegado do ir fechar. Agora vieram mais Sindicato das Indústrias cento e tais, prevê-se, seEléctricas, afirma que os gundo dizem, que até 2010 funcionários ainda mano resto feche tudo. Embora tém a esperança, mas não a empresa venha dizer que acreditam que a empresa não, isso é só para não permaneça em Portugal dualarmar os trabalhadores”, rante muito tempo. “Os traconta. balhadores, neste momento, Em tempos um símbolo estão com a esperança de do desenvolvimento da cinão virem a perder o emdade, a Yazaki Saltano passa prego, mas não têm muita por um período de incerteza perspectiva que a empresa e indefinição. Casos com os se mantenha em Portugal de Anabela e Benjamim são por muito tempo”. O delcada vez mais comuns. Exegado sindical acrescenta emplos da crise que afecta o que “todo o grupo neste concelho de Ovar. momento em Portugal


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Em Reportagem

Aves Madrugadoras do Parque Biológico de Gaia Há dois anos a funcionar no Parque Biológico de Gaia, a anilhagem de aves é um dos mais fortes contributos para a preservação da ilha verde do Grande Porto. Adriano Cerqueira A prática de recolha para identificação e estudo de aves já decorre há vários anos no parque, mas apenas em 2006 é que Rui Brito e António Pereira, ornitólogos responsáveis pelo projecto, deram inicio a esta actividade de forma regular. “Há 25 anos que se faz anilhagem no parque, mas de há dois anos para cá decidiu-se fazer com carácter regular, para melhor conhecer a avifauna (população de aves)”, esclarece Nuno Oliveira, Presidente do Conselho de Administração do Parque Biológico de Gaia. Rui Brito explica que “qualquer projecto de anilhagem surge muito por parte dos anilhadores, propusemos ao parque começar a anilhar e o parque aceitou.” O biólogo de profissão salienta a importância da recém criada Associação Portuguesa de Anilhadores de Aves (APAA) já que esta “centraliza em si esse tipo de actividades e projectos, a nível de todo o país, de modo a alargar ao máximo a actividade”. “Até aqui não havia nenhuma organização, há a Central Nacional de Anilhagem (CNA) que é um organismo que faz parte do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB) que atribui as credenciais e gere as autorizações e as questões das anilhas, mas a nível da pró-actividade e da proposta de projectos não existia nenhuma entidade”, confessa. Para o desenvolvimento e manutenção do projecto o Parque Biológico de Gaia disponibiliza as instalações da Quinta do Chasco e um orçamento anual de cerca de 10 mil euros, destinados ao investimento em material e divulgação da actividade. Esta iniciativa também aposta na formação de futuros anilhadores. Joana Nunes, mestre em Ecologia Ambiental, é um desses casos. Explica que “para se

Gaivão com anilha prestes a ser libertado trabalhar a sério com pássa- e projectos da Estação de ros precisas de uma licença, Esforço Constante. Nós mas para isso é preciso começámos a vir ao início anilhar mais de 100 espécies só para ver como é que era diferentes,” acrescenta ainda e então propuseram-nos a que “o título de anilhador é possibilidade de fazer volunmuito importante no curtariado e de recebermos forrículo, já que é bastante mação. Aceitámos e temos difícil ser-se capaz de identi- vindo todos os primeiros e ficar pássaros rapidamente, terceiros sábados de cada e é claramente importante a mês para aprender mais e ajuda de pessoas para receber alguma formação. Vamos também tentar A actividade tem receber uma credencial que futuro nos permita ter a início uma hora no independência para sermos antes do nascer do anilhadores”, refere. Pedro Andrade também Sol é responsável pelo blogue especializadas para o estudo onde são colocadas todas as de conservação”. informações recolhidas após Entre os alunos a receber as sessões de anilhagem. “O formação, um dos membros projecto do blogue surgiu que mais cedo se iniciou no inicialmente para melhorar projecto é Pedro Andrade. O a divulgação da anilhagem. aluno, de Biologia da FacNormalmente esta também uldade de Ciências da Unié feita pela revista oficial versidade do Porto (FCUP), do parque que é a Revista conta que tomou conheciParques e Vida Selvagem. mento da anilhagem através Todos os sábados, no fim de de Jorge Gomes, responsável uma anilhagem, publicamos pela divulgação do parque os resultados, e mais algujunto dos visitantes. “Ele mas notícias e fotos, para, falou comigo e com o meu desta forma, o público em irmão, sobre a anilhagem geral saber o que é que nós

estamos a fazer.” Contudo, a recolha e identificação de aves é por vezes criticada pelo público não familiarizado com a actividade. O facto das aves sofrerem durante o processo é uma das acusações comuns. António Pereira assegura que as aves não sofrem qualquer tipo de dor enquanto são anilhadas. “As pessoas às vezes quando ouvem as aves a dar um

um grupo de estudantes em formação e de interessados em anilhagem, deslocam-se ao Parque Biológico de Gaia para iniciar a actividade. O processo começa cedo, com a montagem das redes sempre uma hora antes do nascer do sol. No total são quatro as redes espalhadas pelo complexo, as redes Matos, Amieiras, Ponte de Madeira e Tabua, todas elas baptizadas de acordo com as características do local onde são colocadas. As redes referidas são sempre montadas nos mesmos locais e posicionadas em zonas estratégicos do parque, desta forma torna-se possível a recolha de dados com exactidão sobre as espécies que nidificam no parque. Os dados sobre as espécies capturadas são depois analisados pela Estação de Esforço Constante, projecto com o principal objectivo de obter informação que possa ajudar a entender e a explicar as alterações nas populações de aves, através de um programa de capturas regulares durante a época de reprodução, em locais e habitats específicos. A recolha e análise de aves é relativamente simples, mas algo que exige o máximo cuidado. Entre intervalos de uma hora, o grupo deslocase a cada uma das redes para verificar se alguma ave

Jorge Gomes: “O Parque é uma ilha verde, onde as aves, insectos migratórios e toda esta natureza aqui se vem encaixar” grito de alarme pensam que é como os mamíferos que choram ou gritam, mas não, as aves não fazem isso, tentam é comunicar o que se está a passar. Os gritos de alarme servem para avisar as outras aves que existe algum perigo, mas ela própria não está em sofrimento”, explica. Todos os primeiros e terceiros sábados de cada mês, Rui Brito e António Pereira acompanhados por

foi capturada. Se tal acontecer, os animais são retirados com cuidado das redes para evitar qualquer sofrimento. Segundo António Pereira as redes são “bastante seguras”, “por vezes as aves ficam com a língua presa e ao tentarem se libertar sofrem ligeiros ferimentos, mas fora isso raramente se magoam”. Após o pássaro ser retirado da rede é colocado num saco opaco. Rui Brito diz que


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“as aves são transportadas em sacos opacos, para elas virem mais calmas e o menos stressadas possíveis”. O período de tempo entre verificações das redes é ocupado a processar os animais recolhidos. Primeiro procede-se à identificação da espécie e à colocação da anilha respectiva. As anilhas têm tamanhos específicos adaptados a cada espécie de ave. Há uma listagem de todas as espécies que podem ser capturadas, e a cada uma corresponde uma anilha específica. Cada anilha tem um código alfanumérico que serve como bilhete de identidade da ave que a recebe, o que permite a posterior identificação do animal no caso de ser recapturado ou encontrado morto. Quando a ave já se encontra anilhada é feita a recolha dos dados biométricos – peso, sexo, idade, envergadura da asa, comprimento do bico, nível de gordura e tipo de pelagem – e, finalmente, é libertada para o exterior. Questionado sobre a frequência de recaptura de pássaros já anilhados, Rui Brito responde que “é comum acontecer” e salienta que “o objectivo da anilhagem é exactamente recapturar aves, quer de cá (do Parque Biológico) – o que nos permite conhecer a história da ave e ir acompanhando-a – quer aquelas que vêm a migrar e que passam por cá”. Quanto ao sucesso dos controlos, Rui Brito afirma que “temos essencialmente aumentado o conhecimento sobre a avifauna do parque e descoberto algumas histórias engraçadas de aves que, nomeadamente, caiem sempre na mesma rede, à mesma hora, isto ao longo de dois anos”. O ornitólogo salienta que nos dois anos de existência da actividade já

Gaivão já anilhado surgiram resultados “muito interessantes”, como a descoberta de espécies que não se sabia que nidificavam no parque e a recolha de dados mais pormenorizados sobre a vida das espécies que habitam no Parque Biológico. Em paralelo com a iniciativa, Rui Brito e António Pereira colaboram com outros projectos associados à área. A recolha de carraças

estudo das espécies de aves é também um dos principais objectivos desta actividade. O próximo passo do projecto passa pela elaboração de um relatório com o balanço dos primeiros dois anos. “Vai ser feito um relatório e entregue aqui no parque, depois à partida seguir-se-á uma publicação referente a isso. A partir daí o parque fará a divulgação e a ideia

António Pereira: “É sempre bom ver que um dos objectivos a que nos propusemos, que foi conseguir divulgar a actividade e trazer mais pessoas, começa a ter os seus frutos” das aves que são enviadas para o Instituto Ricardo Jorge, encarregue de estudar as doenças trazidas pelas espécies migratórias e o estudo da história genética do Pisco de Peito Ruivo, que se insere numa colaboração entre vários países europeus, são as principais actividades associadas à anilhagem. A educação ambiental e sensibilização do público para a causa de preservação e

será publicar em algum jornal científico”, revela Rui Brito. No relatório vão constar todas as espécies capturadas desde Outubro de 2006 e dados relativos ao número de pessoas que participaram na formação de anilhadores. Jorge Gomes salienta a importância da iniciativa já que permite conhecer a população de aves e conservá-las numa área rodeada

de prédios. O responsável pela revista do Parque Biológico afirma que a reserva natural “é uma ilha verde, onde as aves, insectos migratórios e toda esta natureza aqui se vem encaixar,” salientando ainda a importância de se ter “noção do nosso património natural e da conservação destes espaços com os seus habitats naturais”. O Parque Biológico de Gaia promove projectos como a monitorização sistemática de invertebrados, peixes, vertebrados terrestres e plantas, nos quais a anilhagem de aves se insere, em simultâneo, como actividade científica de monitorização da avifauna e como actividade educativa. Nuno Oliveira acrescenta que “todo esse trabalho vai ser alargado a outros locais de Gaia”. Quanto ao futuro da anilhagem de aves, o Presidente do Conselho de Administração do Parque Biológico diz que passa por “continuar e alargar-se, quer em locais, quer em regularidade”. Já Rui Brito traça como meta

o “objectivo máximo” da Estação de Esforço Constante, que passa por ter o maior número de anos possível de anilhagem de forma a perceber as tendências populacionais. “A ideia é pelo menos 10 anos contínuos, para conseguirmos ter mais dados e mais pessoas de forma a criar mais grupos de anilhagem”, afirma. A anilhagem de aves é uma actividade de várias décadas que se destaca pela ajuda no estudo das populações de aves num dado local. Acerca da sessão de 18 de Outubro, António Pereira refere que “tivemos muitos participantes e é sempre bom ver que um dos objectivos a que nós nos propusemos, que foi conseguir divulgar a actividade e trazer mais pessoas para uma actividade que era algo restrita, começa a ter os seus frutos”.

Contactos: Parque Biológico de Gaia 4430-757 AVINTES Telf.: 227 878 120 Fax: 227 833 583 geral@parquebiologico. pt www.parquebiologico.pt Blogue da actividade: http://anilhagemdeaves. blogspot.com/ Estação de Esforço Constante: http://tornada.naturlink. pt/projectos.html Associação Portuguesa de Anilhadores de Aves: http://www.apaa.pt


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Internacional

Atentado Terrorista no Paquistão faz 53 mortos Embaixador da República Checa entre as vítimas mortais O Hotel Marriott em Islamabad foi alvo de um atentado terrorista. A explosão de um carro à porta do hotel da capital paquistanesa causou 53 mortos e 266 feridos. Entre as vítimas mortais encontra-se Ivo Zadrek, Embaixador da República Checa no Paquistão. O grupo terrorista “Combatentes do Islão” reivindicou a autoria do atentado. Ao início da noite um carro carregado com 600 Kg de explosivos embateu contra o portão do hotel Marriott causando a explosão que fez desabar o tecto de uma sala de banquetes. Na altura, estima-se que na sala, entre 200 a 300 pessoas celebravam o fim do mês do Ramadão. Entre os feridos encontram-se pelo menos 7 alemães e 2 norte-americanos. O condutor da viatura terá morrido no embate. A explosão foi a mais potente registada em Islamabad desde 2001. Para além da enorme cratera criada à porta do Marriott, registase a destruição de várias janelas e portas. Dezenas de carros que se encontravam no parque de estacionamento foram danificados Pub

Hotel Marriott de Islamabad após a explosão “Condeno nos termos mais e alguns focos de incêndio enérgicos o vil ataque terdeflagraram do hotel. rorista em Islamabad”, Como consequência do referiu Solano. atentado, os EUA suspenAsif Ali Zardari, presideram o serviço consular dente paquistanês, tinha no Paquistão. O Presidente norte-americano, George W. planeado um jantar no Marriot com o PrimeiroBush, condenou energicaMinistro, à hora do ataque mente o ataque, alertando terrorista, mas cancelou os para a contínua ameaça planos. terrorista. Horas antes, Asif Ali A União Europeia reagiu ao ataque terrorista através Zardari, viúvo da ex-Primeide Javier Solana, alto-comis- ra Ministra paquistanesa Benazir Buttho, tinha-se sário da Política Externa e comprometido a continuar a de Segurança Comum:

Foto: http://www.radioaustralia.net.au

luta contra os fundamentalistas islâmicos. Já em 2001, o então presidente Pervez Musharraf anunciou o seu apoio à guerra contra o terrorismo, desencadeada pela administração Bush, após os atentados de 11 de Setembro Este é o 3.º atentado nos últimos 7 anos a assolar o Hotel Marriot da capital paquistanesa. O Marriot tem 290 quartos e é muito frequentado por visitantes e residentes estrangeiros de Islamabad.

Quarteto para o Médio Oriente apela a “cessarfogo imediato” Adriano Cerqueira Esta posição, relativa aos incidentes na Faixa de Gaza, foi tornada pública após conversações entre o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki Moon, o chefe da diplomacia europeia, Javier Solana, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, e o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov. A União Europeia subscreveu a posição do Quarteto para o Médio Oriente, na reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros europeus, dia 30 de Dezembro em Paris. O ministro francês Bernard Kouchner salientou que a solução para esta crise não pode ser militar, apenas política, e que a UE está disposta a dar o seu contributo para uma saída pacífica. Apesar de alguns pontos de vista diferentes em relação ao conflito israelo-árabe, os diversos estados da União Europeia estão de acordo com a necessidade de haver um cessar-fogo, que permita a entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza. Israel equaciona 48 horas de trégua A presidência francesa da UE, que termina no final do ano, propôs uma interrupção dos ataques israelitas durante 48 horas, para fazer chegar à região palestiniana ajuda. Assessores do ministro da Defesa israelita, Ehud Barak, disseram que o governo do seu país está a estudar essa possibilidade. “A opção mais provável neste momento é uma invasão terrestre, mas o objectivo desta operação é um cessar-fogo duradouro. Se isso se conseguir sem uma invasão, melhor”, disse um assessor de Barak ao jornal norte-americano New York Times, que pediu para não ser identificado. O responsável sublinhou que para que isso aconteça, “o Hamas terá de concordar [com esta opção] e terá de haver um mecanismo de fazê-la funcionar”. Fonte: PortugalDiário


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I Congresso internacional de cIBERJORNALISMO

“A imprensa não vai desaparecer”, prevê Rámon Salaverría

Vencedores dos Prémios Ciberjornalismo

Convergência foi a palavra de ordem no primeiro dia do I Congresso Internacional de Ciberjornalismo Adriano Cerqueira e Ana Margarida Pinto A convergência nos meios de comunicação no contexto actual da Internet é já uma realidade em quase todo o mundo, mas os resultados da integração não são, para já, visíveis. A opinião foi expressa por Rámon Salaverría, jornalista e professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra, esta quinta-feira, no primeiro dia do I Congresso Internacional de Ciberjornalismo. Na apresentação “Uno para todos y todos para uno? Los medios de comunicación ante la convergencia digital”, Rámon Salaverría disse que convergência é “um fenómeno tendencial, um processo dinâmico”, enquanto “a integração é um dos seus eventuais resultados”. “Não há uma convergência empresarial, mas parece que ela tem que existir junto dos jornalistas”, criticou. Segundo o investigador, a Internet surge como um meio capaz de integrar a

Categoria Excelência Geral em Ciberjornalismo Publico.pt Categoria Breaking News Assalto ao BES (publico. pt) Categoria Reportagem Multimédia A morte lenta do gelo eterno (JN)

imprensa, a rádio e a televisão Para Salaverría, esta inevitabilidade não passa pela “morte do papel”. “A imprensa, como media, não vai desaparecer”, mas vai perder a sua hegemonia, previu. Segundo Salaverría, o importante não é o suporte, mas sim aproveitar todas as possibilidades do meio. “O jornalista é aquele que se dedica a informar e não

aquele que escreve em jornais”, disse, que sublinha também a tendência de produção de texto, imagem, infografia e vídeo por uma mesma redacção. Salários rondam os 1000 euros No congresso, o professor do curso de Ciências da Comunicação da Universidade do Porto Hélder Bastos apresentou o estudo

“Ciberjornalistas em Portugal”, onde traça o perfil dos jornalistas online. Entre os pontos abordados, salientam-se a média de salários superior a 1000 euros por mês e a predominância de licenciados da área da comunicação. O congresso prosseguiu no dia 12, com oradores como Mark Deuze e a entrega dos Prémios de Ciberjornalismo.

Categoria Videojornalismo Caminho onde o morto matou o vivo (PortugalDiário) Categoria Infografia Digital Assalto ao BES (Sol) Categoria Ciberjornalismo Académico Prostituição no Porto (JPN) Os troféus foram concebidos pela Escola Superior de Artes e Design - ESAD

Wagner James Au, o contador de histórias do Second Life Blogger já produziu trabalhos sobre o mundo virtual para a CNN, Salon e Wired Adriano Cerqueira “Hamlet Au” (a personagem virtual criada pelo norte-americano Wagner James Au) marcou presença no espaço da Universidade do Porto no Second Life para uma sessão de debate sobre jornalismo neste mundo virtual, integrada no I Congresso Internacional de Ciberjornalismo. Au é autor do blogue “New World Notes”, onde descreve histórias sobre pessoas e eventos do Second Life. Já colaborou com órgãos de comunicação social como a CNN, Salon e Wired sobre este tema.

Entre as histórias que descobriu, conta-se a de uma sem-abrigo na vida real com vastos conhecimentos de informática que conseguiu arranjar uma ligação Internet num edifício abandonado e que, através de um portátil, acedeu ao Second Life. Lá fez uma pequena fortuna em Lindens (a moeda do Second Life) e chegou mesmo a construir a sua própria mansão online. Outra história dos mundos virtuais referida por “Hamlet Au” foi a de um soldado americano que regressou incapacitado do Iraque e que agora

Wagner James Au e o seu avatar do Second Life, Hamlet Au Blogue New World Notes: http://nwn.blogs.com

dedica-se a tempo inteiro ao Second Life, desenvolvendo os seus próprios projectos sociais. O boom já passou Paulo Frias, professor da UP e moderador do debate, aproveitou para falar dos projectos promovidos pela universidade no Second Life, que passam por uma “ilha” (espaço virtual) a encontros entre comunidades lusófonas neste mundo virtual. Depois do boom de popularidade do Second Life, em 2007, com milhões de utilizadores a explorar este mundo virtual, hoje

em dia o panorama é muito diferente, diz Paulo Frias. Os curiosos afastaram-se e o Second Life é agora utilizado essencialmente para projectos de pesquisa e de investigação. “Há muita gente que diz que quando se entra no Second Life tropeça-se em investigadores”, confessa. Sítio do Congresso: http://cobciber.wordpress.com Live feed: http://twitter.com/obciber Blogue: http://blogciber.wordpress.com


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Em Entrevista

Bernardino Barros: “A vida de um homem é escrever um livro, plantar uma árvore e ter um filho” Jornalista, comentador, mas acima de tudo um apaixonado pelo desporto, Bernardino Barros confessa ser “um homem de paixões” Adriano Cerqueira Dos primórdios da sua carreira no Norte Desportivo, a editor da secção de desporto d’O Comércio do Porto, Bernardino Barros passa agora os seus dias entre o Porto e Vila Real, onde trabalha na organização de eventos. Apesar de nunca ter o jornalismo como a sua principal fonte de rendimento, Bernardino Barros está desde 1975 ligado ao meio. Iniciou a carreira no Norte Desportivo mas cedo ingressou n’O Comércio do Porto. TSF, Rádio Renascença, RTP, SIC, SportTV, NTV e Porto Canal, foram os restantes media por onde passou. Natural de Vila Real mudou-se para o Porto aos 3 anos, contudo nunca largou as raízes e considera-se mais transmontano que tripeiro. Tendo como cenário um pequeno café da zona de Cedofeita, onde reside, Bernardino Barros revela um pouco da sua história e dos seus sonhos para o futuro. Mercúrio do Porto: Está há muitos anos ligado ao jornalismo. O que o fez começar nesta profissão? Bernardino Barros: O impulso, não sei... Sempre gostei de escrever, sempre gostei de estar ligado ao desporto de algum modo. Quando tinha 20 anos surgiu a oportunidade de colaborar no Norte Desportivo, embora a maneira de trabalhar lá não me agradasse muito. Depois de lá estar a fazer um ou outro jogo da 1.ª divisão, fiz a proposta de fazer só Juniores e Juvenis, que era uma coisa que eles não tinham. Para mim era melhor estar fora a ver o jogo, a analisar, a escrever sobre ele do que estar fechado dentro de uma sala a tentar escrever sobre um jogo que não víamos, mas que ouvíamos nas rádios.

O Norte Desportivo, ao domingo saía com a constituição das equipas e com um resumo curto de cada um dos jogos que nós ouvíamos pela rádio. Foi aí que eu comecei, depois a partir daí surgiram novas oportunidades, mas nunca fiz da comunicação social o meu principal meio de sobrevivência. MP: Que outros empregos teve? BB: Fui durante 14 anos chefe dos serviços administrativos de um colégio particular no Porto, depois passei outros 14 anos numa multinacional alemã onde fui responsável pelo sector de carga aérea. A partir daí surgiu a hipótese de corresponder ao apelo de um amigo de longa data, o Rogério Gomes, que me convidou a ir para O Comércio do Porto como editor de desporto, e estive lá nos últimos 3 anos

de vida do jornal. Depois de fechar O Comércio do Porto, estive no Porto Canal, e apesar de fazer várias coisas paralelamente, agora dedicome à comunicação social. MP: Começou a sua carreira no jornalismo logo após o 25 de Abril. Como foi começar num ambiente de liberdade que antes não existia?

“Rádio, rádio, rádio... Rádio é diferente (...) podes estar nu a fazer rádio” BB: Foi giro. Acho que o jornalismo sempre esteve ligado a alguma contestação. O jornalista antigo era visto como um boémio, de cabelos compridos que andava sempre de boina, era o jornalista que escrevia e que estava até altas horas da madrugada, não só a escrever e a fechar o jornal, mas depois na

convivência com os amigos nas celebres tertúlias jornalísticas, e que durante o dia quase que só dormia. A seguir ao 25 de Abril, com o boom que se deu nos jornais, havia muita gente nas redacções e foi aí quando eu comecei. Foi a minha fase de aprendizagem, onde havia liberdade para se escrever, e onde creio que se ganhou na riqueza da linguagem. Contudo, acho que se perdeu um pouco aquela maneira rebuscada de dizer as coisas não dizendo. Também não posso fazer comparações com o que era antigamente, apenas o sei por aquilo que os meus colegas mais antigos diziam. Eu comecei com 20 anos, nessa altura eles é que me diziam como era o antigamente, o que eles sofriam, as provas que tinham de ser revistas, os textos que eram esmiuçados até ao pormenor, enfim, são coisas que

apenas ouvi contar. A vivência depois do 25 de Abril essa tenho-a, de redacções enormes, de redacções onde havia liberdade para escrever e então sim, ser criativo. MP: Porque optou pelo jornalismo desportivo em particular? BB: Porque sempre gostei de desporto. Na altura, tal como agora, o jornalismo desportivo é olhado quase como um parente pobre. No meu tempo dizia-se que quem vinha para jornalista desportivo era quem não sabia fazer mais nada, o que não é verdade. Quando comecei, para mim a referência era A Bola com tudo aquilo que lá havia escrito de autênticos senhores da comunicação social, o Vítor Santos, o Artur Santos, o Carlos Pinhão, todos eles com a sua maneira de escrever. O que escreviam não eram descrições, eram autênticos textos sobre jogos de futebol pelos quais me apaixonei, e como gostava de desporto consumia isso tudo. Surgiu então a possibilidade de colaborar no Norte Desportivo e foi uma oportunidade que aproveitei. MP: Considera esses jornalistas que referiu os seus mentores? BB: Não lhes chamo mentores, tenho-os como referências. Quando somos novos e começamos a ler e a interessarmo-nos pelo fenómeno vamos tendo algumas referências que são para mim, sem duvida nenhuma, os da antiga A Bola. O Aurélio Márcio, com quem trabalhei depois mais tarde na TSF onde ele foi também comentador de futebol e os outros que já referi, o Artur Santos que ainda hoje tem uma coluna sobre arbitragem, o Vítor Santos, o Carlos Pinhão, foram referências que me habituei a admirar a ler. Posso dizer que foi por


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Bernardino Barros em entrevista

Foi aos 20 que surgiu a primeira oportunidade de Bernardino Barros no ramo do jornalismo, quando começou a colaborar no Norte Desportivo causa deles que eu quis participar nessa tarefa que era o escrever sobre futebol, ou sobre desporto. MP: Como foi trabalhar com esses “senhores”? BB: Eram uns senhores. Eu andei anos a fazer o Norte Desportivo, depois fui para O Comércio do Porto onde era responsável pela página do basquetebol.

comentário para a TSF que eu não tenho ninguém!” Era o David Borges que estava a fazê-lo – o David Borges é outra das minhas referências a nível de jornalismo radiofónico – e ele precisava de alguém para o ajudar no relato. Eu disse “oh pá nunca fiz, mas faço” e foi aí que começou, acho que correu bem porque o

“Muitas das pessoas que não gostavam dele (Jorge Perestrelo) e que o criticavam na altura, depois de morto - e é isso que me vai acontecer com toda a certeza – acabaram por dizer que era um bom rapaz.” A minha convivência com eles foi mais tarde e só depois de estar dois ou três anos n’O Comércio do Porto é que comecei a fazer o futebol e a manter contacto com eles. Quando fui para a TSF, aí já a nível de comentário, convivi mais com o Carlos Pinhão e com o Artur Santos. Era diferente olhar prós “senhores”, a única descrição que eu tenho é a de olhar prós monstros a que nós nos habituamos, vê-los ali à nossa frente e saber que eles é que nos davam aquelas prosas maravilhosas que eu muitas vezes lia e relia, principalmente quando era o caso do Vítor Santos e do Carlos Pinhão que escreviam muitíssimo bem. MP: Como fez a sua transição do jornalismo escrito para a rádio? BB: As coisas surgem sempre por acaso, eu creio que não há nada premeditado. Sempre fui por etapas, sempre sonhei e sempre quis tocar quase todos os cordelinhos do jornalismo desportivo, quer a nível de rádio, quer a nível escrito, quer a nível de televisão, e fui projectando a minha vida nessa direcção. Houve um jogo particular, no estádio do Bessa, da selecção nacional de sub-21 que eu fui ver, onde encontrei um colega meu, o João Veríssimo, que veio atrapalhado atrás de mim a dizer “é pá ainda bem que chegaste eu cá tenho que arranjar alguém para fazer o

David Borges logo a seguir convidou-me para fazer o jogo do dia seguinte, também da selecção nacional no estádio das Antas. Passadas duas ou três semanas o David Borges ligou-me e perguntou se eu queria continuar e chegámos a um acordo. Foi aí o meu começo na rádio onde estive 14 anos. A partir daí abriram-se as portas para as televisões, passei por quase todas elas, passei pela RTP, onde me iniciei, depois passei pela SportTV e pela SIC. MP: Qual é que lhe agradou mais fazer? BB: Rádio, rádio, rádio... Rádio é diferente, eu gosto das três, mas a rádio dá-te uma outra liberdade, é por isso que eu digo que podes estar nu a fazer rádio, não tem qualquer problema. Estás na rádio, estás a falar e estás no improviso, e eu gosto disso. Gosto do improviso, gosto do risco, gosto de coisas que falham à ultima da hora e que depois temos que meter ali as nossas bruxas, como nós dizemos na gíria, encher os nossos chouriços. Rádio é o momento, rádio ouves, falasse, passou. Eu gosto disso, gosto do risco, gosto da adrenalina e a rádio para mim é sem dúvida nenhuma a minha grande paixão. MP: Qual foi para si o maior momento da sua carreira? BB: Ui... Sei lá, tive tantos! O FC Porto campeão

europeu em 87, estes últimos jogos também do FC Porto campeão europeu e vencedor da Taça UEFA. Jogos da selecção nacional, principalmente aqueles que tenho mais memória que foram os do Euro 2004. Também tenho recordação do jogo com a Holanda em que Portugal empatou 2-2 com um golo marcado por Figo a fazer o 2-2, não pelo próprio jogo em si, embora tivesse sido espectacular, mas pelo meu amigo e saudoso companheiro Jorge Perestrelo, que estava também a fazer o relato nas Antas e esse jogo empolgou-me pela maneira como ele fez o relato desse lance. São tantas recordações, muitas boas memórias, não tenho assim uma que se possa dizer “a mais marcante é essa.” MP: Como viveu o desaparecimento de Jorge Perestrelo? BB: Com muita mágoa, com muita pena, como é evidente... O Jorge Perestrelo é uma pessoa sui generis, o mundo girava à volta do umbigo dele, mas era um companheiro. Todos nós sabíamos aquilo que ele era, o culto dele era o eu, o eu e o eu e em caso de dúvida, eu, eu e eu, mas era assim, o Jorge era assim. Era frontal, era correcto, aquilo que pensava dizia nos olhos às pessoas. O Jorge era incapaz de ter um problema contigo e não o dizer. Convivi com ele 14 anos na TSF. Em duas ou três ocasiões ele pegava no telefone e ligava-me a dizer: “oh meu ouvi dizer que tu disseste isto assim e assim” e eu dizia que sim ou que não, e ele “ok, era só para saber”, como ele dizia, havia “gatos enfuscados” entre nós. O Jorge não era um “relatador” de futebol, era um artista, os jogos para ele eram um espectáculo e não apenas uma simples narração. Por isso é que tenho essa imagem do jogo com a Holanda, precisamente da grande penalidade, em que certa altura estamos na cabine das Antas a fazer o jogo e quando é a grande penalidade ele começa a

a dizer “eu não quero ver, eu não vou ver.” Eu de repente olho assim pró lado e digo “mas então este gajo não vai ver e vai relatar isto como é que é?” e ele estava perfeitamente a olhar pró jogo. Ele não estava a transmitir apenas um jogo de futebol, estava a transmitir toda a carga emotiva que iria aparecer na transformação ou não de uma grande penalidade que podia dar ou não o empate a Portugal. O Jorge era um amigo e acima de tudo foi isso que se perdeu. Muitas das pessoas que não gostavam dele e que o criticavam na altura, depois de morto - e é isso que me vai acontecer com toda a certeza – acabaram por dizer que era um bom rapaz. MP: Considera esse um dos piores momentos da sua vida? BB: Sim, sem dúvida. Não tenho dúvida absolutamente nenhuma que foi, até porque não perdi mais nenhum companheiro meu. Ele sabia receber como nós recebemos no Porto, quando eles aqui vinham

BB: Foi um momento triste, é sempre um momento triste quando acaba uma coisa da qual nós fazemos parte. Foi um momento conturbado, não tanto para mim, mas para muita gente que ali trabalhava foi um drama, porque não tinham horizontes de saída e esse é o grande trauma da profissão hoje em dia. Se antigamente ainda se podia saltitar de um jornal para outro, hoje estamos completamente engaiolados, porque temos três grandes grupos, e hoje em dia trabalhamos para todos. O jornalismo é assim, não há muito a fazer, não há muito por onde batalhar, mas na altura foi mau precisamente por causa disso. O próprio dia foi um dia muito triste, foi um dia muito sentimental porque havia gente que estava há muitos e muitos anos naquele jornal e a que lhe dedicaram uma vida. MP: Quais foram os melhores e os piores momentos da sua vida? BB: Costuma-se dizer que a vida de um homem é escrever um livro,

“Se não procurasse dar saltos, se não procurasse o risco, o fim poderia não ser o mesmo, portanto não estou nada arrependido daquilo que fiz.” eu ia buscá-los, jantávamos juntos, almoçávamos juntos, muitos poucos fizeram aquilo que o Jorge me fez quando ia a Lisboa. Quantas e quantas vezes fui fazer jogos a Lisboa e a única pessoa que se preocupava e que dizia “onde é que andas”, “oh meu anda cá ter comigo”, “vamos almoçar”, “vamos jantar”, era ele, era o único. Por isso lhe devo muito, porque retribuiu aquilo que eu também lhe dei aqui. Foi o único que desapareceu enquanto eu trabalhava, é por isso que me lembro e que fica uma mágoa muito grande de ver desaparecer um amigo e um talento do relato. MP: Estava n’O Comércio do Porto quando o jornal encerrou. Como viveu esse momento?

plantar uma árvore e ter um filho. A morte do meu pai foi o momento que mais me marcou, foi com ele que aprendi a ir ao futebol, que aprendi a ver o futebol e foi ele que me levou ao primeiro jogo de futebol e a morte do meu pai [pausa] marcou-me, obviamente. Já momentos alegres, há tantos, mas creio que o mais marcante foi o nascimento do meu filho e o poder acompanhá-lo durante este tempo todo conforme o tenho feito, apesar de todas as vicissitudes e de às vezes sermos obrigados a não estar presentes em algumas situações. Procuro estar presente, até pelo próprio percurso que ele tem, que é um percurso fantástico. Tem 16 anos, é um excelente aluno e é para isso que eu trabalho, para que ele tenha o seu sucesso. É ele o meu


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Bernardino Barros em entrevista

Bernardino Barros nasceu em Vila Real a 6 de Novembro de 1955. Aos 3 anos mudou-se para o Porto onde ainda hoje vive, mas é em Vila Real que deixou o seu coração momento mais feliz. MP: Sente que o seu pai foi o modelo no qual baseou a sua vida? BB: Pelas coisas boas e pelas coisas más... sim. O meu pai teve uma vida bastante atribulada, mas muito daquilo que não se deve fazer, aprendi com ele, e muito daquilo que se deve fazer, também aprendi com ele. O meu pai era caixeiro viajante, que é um homem que anda com as malas dentro do carro na área dos têxteis a visitar vários sítios e a vender. Essa foi a vida do meu pai durante muitos anos, saía à segundafeira e vinha à sexta-feira e por isso era um pai um pouco ausente. Quando estava connosco era um pai marcante porque deixava sempre todas as posições normais do dia-a-dia para a mãe, porque era ela que nos acompanhava quer a nível de estudos, quer a nível do resto, e ele tinha uma certa relutância em chegar a casa e ser o “castigador”. Por muito que a nossa vida profissional nos obrigue a estar ausentes, temos que estar sempre por perto. Na fase d’O Comércio do Porto, tinha que fechar o jornal e estava lá até à meia-noite, depois ia jantar e chegava a casa às duas da manhã, quando o meu filho já estava a dormir. Se eu fizesse a minha vida de jornalista normal não o via, de maneira que durante esses três anos levantei-me sempre às sete e meia da manhã, para o deixar no colégio às oito e meia e depois ir à minha vida, fosse ela qual fosse. Foram esses os ensinamentos, da ausência do pai durante a semana, não digo maus, mas menos bons. Mas também houve ensinamentos bons que o meu pai procurou dar ao longa da sua vida, principalmente a honestidade, a credibilidade, o sermos nós próprios, não tentarmos imitar ninguém, é isso que eu quero fazer e é isso que tenho feito. MP: Nasceu em Vila Real, mas veio aos 3 anos para o

Porto. Sente-se mais tripeiro do que transmontano? BB: Não, não, não. Gosto muito do Porto, foi a cidade que me acolheu, é a cidade onde eu trabalhei, onde eu estudei e é a minha cidade também, mas sou muito transmontano. As minhas raízes sempre foram essas, gosto daquela gente, gosto muito da maneira que ela pensa, da maneira que ela sente. Neste momento trabalho em Vila Real, numa empresa de organização de eventos, mas vou e venho quase todos os dias. Gosto de voltar às raízes e gosto de sentir aquele cheiro da montanha, o cheiro da lareira, o cheiro daquele fumo... É muito peculiar e muito tranquilo, não há tanta correria, nem tanto stress, como há aqui no Porto. MP: O que faz para descontrair? BB: Vejo muito cinema. Muito daquilo que eu aprendi a nível de línguas foi precisamente por ouvir os filmes e tentar tirar o sentido daquilo que eles diziam. Gosto muito de estar a ver o filme e a ouvir o diálogo comparando-o com aquilo que está a ser traduzido. Também gosto de ouvir

música e de ler. Já tive mais apetência para ler, desde há uns anos a esta parte quase que só leio aquilo que é obrigatório. Antigamente lia um livro numa noite, se ele me interessava. Nunca me hei-de esquecer que com 20 e poucos anos, em duas noites consegui ler A Viagem ao Mundo da Droga de Charles Duchaussois, um livro que me marcou na altura, estamos a falar há 30 anos atrás. É um livro que aconselho e que mesmo hoje é útil. Fala sobre a vivência de uma comunidade, mas principalmente de uma miúda que andou metida no mundo da droga – isto há 30 anos onde não se sabia o que era isso e onde não se falava disso. Hoje tenho vários livros em cima da mesinha de cabeceira, leio umas páginas de um e umas páginas doutro. Neste momento estou a ler uma colectânea de textos de um colega meu que trabalhou no Comércio do Porto comigo, Braga do Amaral que está na Régua, de onde é, à frente da revista Tribuna de Ouro e que fez uma compilação dos seus textos chamada Somos Nós. Também gosto de andar na net, é um vício hoje em dia, quem não anda lá?

MP: É co-autor do livro Mui Nobre e Sempre Invicto Clube do Porto, juntamente com Rémulo Jónatas. O que o levou a escrever esse livro? BB: Escrevi o livro porque quis fazê-lo e porque tinha que o fazer, foi uma aposta que fiz. Mas muito sinceramente não é o livro que eu queria escrever. Já tive um desafio por parte do meu amigo Francisco José Viegas. Nas nossas tertúlias depois do programa da NTV, comendo o nosso preguinho do Bonaparte na Foz, falávamos sobre tudo o que eu vivia à custa dos jogos, as peripécias, a ida prós jogos, as viagens, tudo isso. Numa ocasião ele disse: “isso é giro, escreve um livro sobre isso, sobre as tuas vivências, os teus 20 melhores jogos.” Um dia lá mais para diante quando já estiver de chinelinhos e MP: É um portista conroupão, sentado no sofá em fesso. É difícil manter a frente à lareira sou capaz imparcialidade quando está a de me debruçar sobre isso e relatar um jogo do seu clube? escrevê-lo. BB: É difícil, é, mas MP: Acha que conseguiu procuro fazê-lo. Nunca me concretizar os seus sonhos de preocupei com isso, nós infância? somos aquilo que somos, BB: Algumas coisas sim. podia ser da Académica, Quando chegamos a esta podia ser do Vila Real que idade olhamos para trás é a cidade onde eu nasci, e dizemos assim: “o que é podia ser de muitos clubes, sou do clube que sou. Quem que eu mudaria na minha vida?” Muito sinceramente, gosta de futebol, quem e apesar de ter feito algumas gosta de desporto, escolhe asneiras e de algumas atribum clube e gosta dele. A ulações que tive, não mudarpartir daí aconteça o que ia nada. Estou plenamente acontecer é o nosso clube, é satisfeito com aquilo que o clube que nós gostamos, fiz, com aquilo que alcancei, é o clube que nós amamos. Infelizmente neste país não é com aquilo que realizei e com aquilo que ainda quero possível para quem esteja a fazer. Ainda tenho muita trabalhar no meio assumir-se e dizer qual é o seu clube. ambição, apesar da idade, Normalmente quem assume ainda quero fazer muita coisa e quero ser aquilo que que tem um clube deixa de eu sempre fui, igual a mim ser ouvido da mesma maneira que o era antes. O meu próprio. Quando nós chegamos a esta altura, chegamos registo ao longo dos anos é este, há quem diga que goste precisamente aqui porque tudo o que se passou foi e quem não goste, mas eu vivido de um certo modo, também partilho a máxima se estivesse adormecido no de José Maria Pedroto que marasmo que estava, se não dizia: “não importa que procurasse dar saltos, se falem mal ou bem de mim não procurasse o risco, o fim o importante é que falem.” poderia não ser o mesmo, Mas creio que nós devemos procurar ser isentos e trans- portanto não estou nada arrependido daquilo que fiz. mitir a realidade.


Mercúrio do Porto · Janeiro 2009 · 11 Bernardino Barros em Entrevista MP: Que objectivos ainda espera alcançar? BB: Ainda quero viver muitos anos, tenho 53 mas quero viver muitos. Não quero ser pesado, não quero que as pessoas me chamem chato, mas ainda acho que tenho muito para fazer, muito para dar, muito para aprender e muito para viver. Sou um homem de paixões, a minha vida é uma paixão, eu gosto da paixão e só faço as coisas quando estou apaixonado. Está-me a dar um gozo bestial trabalhar lá em Vila Real na área de organização de eventos, dáme muita paixão fazer isso. Se calhar só por paixão é que vou a Vila Real quatro ou cinco vezes por semana. Ainda me falta escrever o tal livro, aquele dos meus 20 melhores jogos, estou a começar a pensar nisso a sério, vamos ver.

Douro e vouga

Gaia recebe espólio d’O Comércio do Porto Faro de Vigo assinou protocolo de cedência do arquivo do título histórico com a Câmara de Gaia

Adriano Cerqueira Foi assinado esta quartafeira o acordo de cedência do espólio do jornal O Comércio do Porto, encerrado em 2005, ao município de Gaia. O presidente da Câmara de Gaia, Luís Filipe Menezes, enquadrou o acto na necessidade de “guardar a memória daquilo que foi uma pedra [importante] da comunicação social” portuguesa. “É uma satisfação enorme chegar a este acordo. Sempre esteve nos objectivos da empresa que o espólio estivesse à disposição dos portugueses”, referiu, por seu lado, Isidoro González, do Faro de Vigo, diário espanPerfil hol proprietário do arquivo d’ “O Comércio do Porto”, Bernardino Barros cedo começou a trabalhar quando fundado em 1854. aos 18 anos ingressou nos “Temos que tratar este serviços administrativos espólio com cuidado e com do Externato D. Duarte. parcimónia”, salientou MeMas foi aos 20 que surgiu a nezes. Aproveitou a ocasião sua primeira oportunidade para expressar o desejo de no ramo do jornalismo, quando começou a colaborar no Norte Desportivo. A sua paixão pelo desporto, e em particular pelo futebol, aliada ao seu “bichinho” pelo jornalismo, fizeram-no abraçar esta oportunidade, onde ficou até 1979. Após um hiato de 6 anos “desligado” da imprensa, Bernardino Barros reemerge Adriano Cerqueira n’O Comércio do Porto em Com a inauguração do 1985. Seguiu-se a sua tranMar Shopping, em Matosição para a rádio, meio que sinhos, eleva-se para 31 o confessa ser a sua “grande número de centros comercias paixão”, primeiro na TSF e no Grande Porto. Apenas depois na Rádio Renascença, nos primeiros quatro dias, a sempre como comentador de nova superfície foi visitada futebol. Teve passagens ain- por mais de 200 mil pessoas. da pela RTP, SIC, SportTV, Vasco Santos, director NTV e Porto Canal, onde era geral do Mar Shopping refaté à bem pouco tempo ediere que a adesão do público tor de desporto. “é um garante que temos um Adepto confesso do FC espaço que vai ao encontro Porto, aos 53 anos, Bernar- das necessidades e desejos dino Barros continua a ser da população”. Mas há convidado para comentar também quem aponte para jogos de futebol nos mais uma possível saturação, a diversos media. Hoje passa prazo, deste tipo de espaços os dias entre o Porto e Vila comerciais, devido à oferta Real onde trabalha na orexcessiva. ganização de eventos. Tem Virgílio Borges Pereira, como ambição um dia poder escrever o livro dos seus “20 professor na Faculdade de Letras da Universidade do melhores jogos”. Porto, diz que “estamos

ter outro órgão de comunicação social no norte capaz de “influenciar a vida económica e cultural” da região e teceu duras críticas à centralização dos “instrumentos fundamentais, financeiros, culturais e sociais” em Lisboa. A partir do próximo mês, o arquivo vai ficar no renovado Arquivo Municipal de Gaia, onde ficará durante 10 anos, tempo previsto no acordo. A câmara poderá

utilizá-lo para exposições e publicações, cabendo-lhe assegurar a sua guarda e conservação, bem como a disponibilização ao público em geral para consulta. Jornal “congelado” Rogério Gomes, último director do jornal, afirmou que alguns empresários já tentaram reabrir o jornal, “mas infelizmente os proprietários não estão interessados em vendê-lo”. “Há gente interessada no

lançamento de um projecto de comunicação aqui no Norte, e O Comércio do Porto seria uma possibilidade. Não é um projecto moribundo, mas está, pelo menos, congelado”, disse. Fundado a 2 de Junho de 1854 O Comércio do Porto foi um dos jornais mais representativos da cidade do Porto. Após o 25 de Abril O Comércio do Porto chegou a ter uma tiragem de 120 mil cópias. Contudo, nos anos 90 teve uma contínua descida das tiragens e, em 2001, foi vendido ao grupo espanhol Prensa Ibérica. Apesar da tentativa de viabilização empreendida pelos seus novos proprietários, o jornal acabou por não se revelar economicamente viável, tendo publicado a sua última edição impressa em 30 de Julho de 2005.

“Mais cedo ou mais tarde”, grandes superfícies poderão entrar em crise Há 31 centros comerciais no Grande Porto. “Mais cedo ou mais tarde, estaremos a falar de crise dos grandes centros comerciais”, defende o sociólogo Virgílio Borges Pereira. a ver uma transformação profunda do comércio e do modo de comerciar nas cidades, que veio para ficar”. “Este modelo que se impôs traz a crise dos modos tradicionais de se fazer comércio, contudo, mais cedo ou mais tarde, estaremos a falar de crise dos grandes centros”, defende.

da Associação de Comerciantes do Porto, diz que “não é pelo facto de aparecer mais um shopping que a situação vai piorar. A luta é já entre os grandes e cabe ao pequeno comércio adaptar-se e especializar-se”. O futuro do pequeno comércio passa pelo acompanhamento da evolução tecnológica e pela captação e fidelização dos clientes. “A luta é já entre os “Quem se deixar morrer grandes e cabe ao no tempo, já mais poderá pequeno comércio sobreviver”, vaticina Artur adaptar-se”, diz com- Ribeiro. A criação de uma central de compras para erciante que o comércio tradicional consiga preços competitivos Pequeno comércio deve poderia ser um medida a adaptar-se seguir, propõe. Para Artur Ribeiro, dono “Morte lenta” dos pequenos de uma loja de música na empresários Rua de Cedofeita, no Porto, Já Laura Rodrigues, que já pertenceu à direcção

presidente da Associação de Comerciantes do Porto, afirma que a proliferação das grandes superfícies “diminui o preço de procura e o poder de compra, o que leva à morte lenta dos pequenos e médios empresários”. A líder associativa acusa os dirigentes políticos de “falta de bom senso” e reafirma que “a estabilidade das micro e médias empresas é que é fundamental para a criação de emprego e não a construção de grandes centros comerciais”.

Online: http://mercuridoporto. blogspot.com


12 · Mercúrio do Porto · Janeiro 2009

Douro e Vouga

Futuro do Carnaval revelado em noite de memórias Em noite de apresentação da edição 2009 do Carnaval de Ovar, a grande novidade veio da boca do Presidente da Câmara Municipal: o projecto da Aldeia do Carnaval é candidato ao Quadro de Referência Estratégica Nacional conforto (...), o Carnaval de Ovar atingiu um patamar alto e agora temos que renovar nos pormenores”, confessa. Já Manuel Oliveira reafirma o apoio da Câmara Municipal: “O Carnaval é um dos nossos cartões de visita e uma das nossas referências. A Câmara Municipal vai procurar manter as condições do ponto de vista estrutural para que haja grande qualidade.” Programação Carnaval 2009

Adriano Cerqueira Apesar do frio que se fazia sentir, o público não deixou de marcar presença. Já antes de se dar início à apresentação, a Praça das Galinhas encontrava-se cheia de curiosos que ansiavam por um pequeno vislumbre da próxima edição do Carnaval de Ovar. O tema desta noite era o Carnaval dos anos 70. Para recordar as memórias dessa década revolucionária foi exibido um documentário de Guilherme Terra que, entre imagens de arquivo e entrevistas a veteranos foliões, fez recordar o Carnaval de há 30 anos atrás. Mas não só de memórias se fez esta noite. O primeiro momento alto foi a entrega de prémios aos grupos vencedores do Carnaval de 2009 e a apresentação do respectivo troféu, de autoria de Georgina Queirós. A Costa de Prata na categoria de Escolas de Samba, os Bailarinos em Passerelle e os Pinguins em Carnavalesco, foram os galardoados da noite. Entre aplausos e assobios, os representantes dos vários grupos chamados ao palco, deixaram uma mensagem de bom Carnaval para 2009. Projecto da Aldeia do Carnaval definido até ao final do mês Os maiores aplausos da noite foram guardados para quando Manuel Oliveira, Presidente da Câmara Municipal (CM), subiu ao palco para entregar o prémio de melhor grupo Carnavalesco aos Pinguins. Entre desejos de sucesso para a edição 2009, o Presidente divulgou que “a aldeia do Carnaval foi já objecto de candidatura ao QREN (quadro comunitário de apoio).” Manuel Oliveira apelou ainda à “unidade e convergência”, já que “só em conjunto é que fazemos um Carnaval melhor.” O anúncio do Presidente foi ainda apoiado por Vítor Martins, membro da comissão administrativa da Fundação de

Foto de Márcia Benquerença (http://www.olhares.com/quazar)

Carnaval, que anunciou já estar “encomendado o projecto para a aldeia, e será discutido até ao final do mês.” O Presidente da CM referiu, em declarações ao Mercúrio do Porto, que “o terreno na zona industrial, já está em processo de aquisição.” Não só em vídeo se recordaram os anos 70. Alguns grupos responderam ao apela da organização e exibiram fantasias da época. As Palhacinhas foram o grupo que mais trajes trouxe ao palco. Corações alegres, bruxinhas ié-ié, palhaçada bombórrica, pomar das palhacinhas e formigas trabalhadoras foram as fatiotas apresentadas. Os Zuzacas fizeram-se representar por um dos conjugues do casal Pipoca. A Ria de Sonho da Arruela e o Lobo Mau dos Marados completam o desfile. A noite não ficou por aqui, ainda houve lugar para a apresentação do novo cartaz de Carnaval. O vencedor deste ano foi “A vitamina da Alegria” de Alexandre Rosas. O já cinco vezes vencedor, deixou um desejo de bom Carnaval. João Rey Silva e Frederico Pinto foram premiados com

menções honrosas pelos trabalhos que levaram a concurso. Artur Almeida é o novo monarca dos foliões A tarefa de guiar os fiéis súbditos do Carnaval Vareiro, coube este ano a Artur Almeida. Sua majestade não deixou de falar da crise, partilhando uma mensagem de esperança e folia para 2009. Entre pausas e improvisos aos quais a idade por vezes obriga, Artur Almeida deixou-se de formalidades e foi em tom de bom humor que falou ao agora “seu povo.” Em noite de recordações, el-Rei não deixou de falar da sua “mocidade” apelando aos jovens para a aproveitarem. Na sua mensagem final relembrou que “a carne não se conserva em água, mas sim em vinho!” Finalizadas as honras de corte seguiu-se a apresentação do programa para 2009. Entre os habituais grandes corsos de domingo e terçafeira de Carnaval, e as já típicas noites de Escolas de Samba e dos dominós, com a assídua presença de Quim Barreiros, foram várias as novidades para o próximo ano. Em 2009 o Carnaval vai ter “46 dias de folia”,

abrindo “as portas” no dia 10 de Janeiro com a cerimónia de abertura e encerrando a 24 de Fevereiro com a Festa dos Campeões e a divulgação dos grupos vencedores. Pelo meio inserem-se algumas novidades, como a exposição de dominós, decorados por vários artistas. O público também é chamado a intervir exibindo os seus dominós na já conhecida, noite de Quim Barreiros. Como é hábito, será também inaugurado na Praça do Tribunal, o monumento aos grupos de Carnaval. Dia 23 de Fevereiro reserva uma surpresa para os mais novos, com uma matiné, na Tentzone, apresentada pelo Avô Cantigas. A aposta no Carnaval Sénior mantém-se, e as expectativas passam por “atrair mais idosos a participar”, confessa José Américo, Presidente da Fundação de Carnaval. Terminado o primeiro olhar pela edição do próximo ano, e findadas as retrospectivas sobre os Carnavais de outros tempos fica o desejo de José Américo, cujas expectativas para 2009 passam pela “renovação, por manter o essencial e fazer melhor, inovando.” “Vamos procurar criar mais condições de

10 de Janeiro Cerimónia de Abertura Exposição de Cartazes de Carnaval 8 de Fevereiro Chegada do Rei 12 de Fevereiro Carnaval Sénior 13 de Fevereiro Carnaval das Crianças 18 de Fevereiro Noite Dominó Concerto de Quim Barreiros na Praça 21 de Fevereiro Desfile das Escolas de Samba 22 de Fevereiro Grande corso 23 de Fevereiro Carnaval dos mais novos, matiné infantil com o Avô Cantigas na Tentzone 24 de Fevereiro Grande Corso

Programação Tentzone 13 de Fevereiro Apresentação das Escolas de Samba 14 de Fevereiro Papo de Samba Duda Nobre 19 de Fevereiro DJ Alvim Noite das máscaras 20 de Fevereiro Per7ume 21 de Fevereiro Ena Pá 2000 22 de Fevereiro Orishas 23 de Fevereiro Yves Larock 24 de Fevereiro Divulgação dos Vencedores Festa dos Campeões


Mercúrio do Porto · Janeiro 2009 · 13

Desporto LIGA SAGRES

Marítimo trava ataque do FC Porto ao 1.º lugar Após pesadas derrotas com o Benfica e o Sporting, o Marítimo voltou às boas exibições ao empatar com o FC Porto no Dragão Marítimo permitiu o corte dos defesas do Porto. Os jogadores do Marítimo ainda reclamaram grande penalidade na sequência do lance, por alegada mão na bola de Bruno Alves. Hulk voltou a tentar a sorte, mas o 0-0 manteve-se até ao apito final. De salientar ainda a expulsão de Miguelito, que viu o vermelho directo por palavras proferidas a Duarte Gomes.

Adriano Cerqueira Os dragões dominaram o jogo e criaram vários lances de perigo, mas a boa exibição do guarda-redes Marcos, regressado após jogo de castigo, e a barra da equipa madeirense, mantiveram o nulo no final dos 90 minutos. O FC Porto entrou forte, com o primeiro remate de Lucho aos 25 segundos a levar perigo à baliza de Marcos. Hulk e Fucile também tentaram a sua sorte, sem grande sucesso. Até aos 15 minutos, o jogo era controlado pela equipa da casa, com o Marítimo a ter grandes dificuldades em sair do seu meio campo. Foi preciso esperar pela meia hora de jogo para ver um remate da equipa de Lori Sandri, através do pé de João Guilherme, a obrigar Helton a uma defesa apertada. O Marítimo continuou a crescer, criando perigo em lances de contra-ataque, mas o FC Porto manteve o domínio da partida. Apesar de uma primeira parte dominada pelos pupilos de Jesualdo Ferreira, aos 45 minutos o placar permanecia inalterado.

Foto ASF

A segunda parte trouxe um Marítimo mais atrevido e empenhado em virar o resultado a seu favor. Djalma entrou para o lugar de Bruno Fogaça, o que deu outro ânimo ao ataque da equipa madeirense. O jogo mostrava-se mais equilibrado com ocasiões de golo de parte a parte, mas foi o Porto que aos 58 minutos teve a grande oportunidade do jogo após remate perigoso de Cristian Rodriguez, forçando Marcos a aplicar-se para defender. O Marítimo respondeu aos 63

minutos com cabeceamento de Marcinho à barra, após a marcação de um livre. O aviso de Marcinho levou o FC Porto a aumentar o ritmo e a encostar o Marítimo à sua baliza, criando sucessivos lances de perigo para a baliza de Marcos. Aos 73 minutos, novamente Cristian Rodriguez volta a pôr em perigo a baliza dos madeirenses. Num jogo calmo em termos de arbitragem, surge o primeiro lance polémico, aos 77 minutos, quando Lisandro parece agredir

Miguelito, após sofrer falta do mesmo. Duarte Gomes, árbitro do encontro, nada assinalou. O FC Porto esteve perto de marcar num ressalto na área do Marítimo, após remate de Hulk que deixou Marcos fora do lance. Valeu aos comandados de Lori Sandri a atenção de Van der Linden, que tirou a bola da linha de golo. O Marítimo dispôs ainda de uma boa oportunidade quando Manu, em contra-ataque, se isolou frente a Helton, mas a hesitação do jogador do

complementando os conteúdos com áudio, vídeo, fotos e infografias, sem esquecer a importância do texto. Este novo sítio web vai apostar na cobertura aprofundada das diversas modalidades, não se centrando apenas no futebol. Duarte Monteiro assume “a multimedialidade como imagem de marca”. “Vamos apostar em reportagens vídeo semanais e usar o áudio não só como complemento do texto, mas também vamos dar destaque às frases fortes do dia”, revela. Para o recém licenciado, este jornal online procura “equilibrar a balança entre todos os diferentes suportes que existem”. “Há 4 jornais online, os 3

tradicionais (A Bola, Record e O Jogo) e o maisfutebol, o áudio quase não existe, e mesmo o vídeo, são vídeos soltos”, confessa. Ogolo.net irá contar com uma secção dedicada a blogues associados, aberta a qualquer utilizador interessado em participar. Também será dada importância à interactividade com os leitores, disponibilizando o contacto com os jornalistas da redacção por e-mail e através de um fórum de discussão. Quanto à escolha do nome, Filipe Dinis conta que “vemos o golo como um objectivo a alcançar, o golo é sempre aquilo que tu persegues, aquilo que queres alcançar”.

Este projecto é para os criadores o “perseguir de um sonho”. Duarte Monteiro afirma que “a grande dificuldade de entrarmos no mercado de trabalho é que levou a criar este projecto, pois se há altura para arriscarmos sem grande medo de falhar é agora”. Por enquanto o “plantel” d’ogolo.net é apenas composto pelos 3 fundadores, contando numa fase inicial com a boa-vontade de colaboradores dispostos a trabalhar sem vencimento. Contudo, o plano de futuro passa pela afirmação do site no panorama noticioso português e pela criação de emprego quer para eles, quer para os colaboradores. É prevista a colaboração com

Ogolo.net nasce a 1 de Janeiro Adriano Cerqueira O último dia do I Congresso Internacional de Ciberjornalismo acolheu a apresentação do mais recente projecto de jornalismo desportivo em Portugal, o ogolo.net. A ideia partiu de David Fernandes, Duarte Monteiro e Filipe Dinis, recém licenciados em Ciências da Comunicação, que decidiram apostar numa nova plataforma de jornalismo desportivo online, com a intenção de melhorar a cobertura desportiva, através do aproveitamento das potencialidades da web. Ogolo. net é um projecto de “multijornalismo” que aposta em conteúdos multimédia,

FC PORTO Helton, Fucile, Rolando, Bruno Alves, Pedro Emanuel (66’ Mariano), Fernando, Raul Meireles (84’Farias), Lucho, Rodríguez, Hulk e Lisandro. Suplentes: Nuno, Stepanov, Benítez, Guarín, Tomás Costa, Mariano e Farías. Treinador: Jesualdo Ferreira MARÍTIMO Marcos, Briguel, João Guilherme, Fernando Cardozo, Van der Linden, Bruno, Olberdam, Marcinho (76’ Vítor Júnior), Miguelito, Bruno Fogaça (45’ Djalma) e Baba (85’ Manu). Suplentes: Marcelo Boeck, Zé Gomes, Luís Olim, João Luiz, Vítor Júnior, Manu e Djalma. Treinador: Lori Sandri Cartões amarelos a Olberdam, Van der Linden, Hulk, Fucile, Babá, Cristian Rodriguez, Vítor Júnior, Marcos e Bruno. Cartão vermelho directo a Miguelito (90 m).

dois programas de rádio, um dedicado ao futebol e outro às modalidades, processo ainda em “fase de negociações”. Apesar do site ainda se encontrar em construção, “a bola já começa a entrar” a partir de 1 de Janeiro de 2009.


14 · Mercúrio do Porto · Janeiro 2009

Opinião EDITORIAL

Imprensa, que futuro? A morte da imprensa escrita pelas mãos da Internet há muito que é anunciada. O público perdeu a “paciência” para esperar pelo dia seguinte para ler em detalhe todas as incidências das notícias que marcam a actualidade. Há um crescimento da necessidade de informação no imediato, não apenas aquela correspondente à notícia em si, mas todos os elementos contextuais que a envolvem. Algo, que em toda a justiça, apenas a Internet pode fornecer, mas algo que também se pode revelar muito perigoso na ausência de um mecanismo que ordene e oriente a informação ao dispor do leitor/utilizador. O órgãos de comunicação social impressos tardaram a acordar para esta nova realidade – facto algo discutível visto ter sido rápida a sua adaptação aos novos media –, contudo, e tendo em conta apenas a realidade portuguesa, hoje em dia há quase que uma interdependência entre as versões online e offline dos principais órgãos impressos. Tal é visível mesmo nesta edição que marca o

Comentário

Adriano Cerqueira

De igual para igual A 12.ª jornada da Liga Sagres viu os três grandes empatar a zero na despedida de 2008. Académica, Marítimo e Nacional foram os responsáveis por impedir os avançados de Sporting, FC Porto e Benfica, respectivamente, de fazerem o gosto ao pé. A divisão de pontos, mais do que deixar tudo na mesma no topo da tabela, espelha a época dos três candidatos ao título e as poucas diferenças de desempenho entre eles. Separados apenas por três pontos, Sporting, FC Porto e Benfica são desta vez

nascimento do Mercúrio do Porto, que surge já com o anúncio e publicitação do respectivo blogue, revelando ao longo das próprias notícias referências a outros sítios web passíveis de interesse para o leitor. A verdade é que as versões online dos jornais já não são mais meros espaços para colocar cópias ou resumos das versões impressas, mas sim plataformas noticiosas que não se limitam a dar a informação na hora, mas que produzem os seus próprios conteúdos e que publicam infografias e reportagens multimédia usando técnicas e meios que a mera versão em papel não pode oferecer. Estaremos então a presenciar a inevitável transição do papel para o ecrã de computador? Rámon Salaverría afirma que não. Presente no I Congresso Internacional de Ciberjornalismo, o professor da Universidade de Navarra disse que a Internet surge como um meio capaz de integrar a imprensa, a rádio e a televisão, o que necessariamente não significa a “morte do papel”.

Salaverría acrescentou ainda que “a imprensa, como media, não vai desaparecer, mas vai perder a sua hegemonia”. Entre os temas discutidas no congresso, prevaleceu a ideia da necessidade da imprensa se reinventar e procurar um novo rumo para atrair novos leitores e para os fidelizar ao meio. É de sublinhar a palavra “novos”, já que são os jovens os primeiros a afastar-se dos jornais. Hoje crescese à volta de tecnologia, aprende-se em frente a ecrãs e quadros multimédia, os tempos do giz e da ardósia há muito que já passaram e agora coloca-se a questão de que destino dar aos manuais em papel. A desabituação do papel no acto de ensino leva um a pensar numa justificação plausível para convencer os jovens a consumir notícias em papel quando a sociedade quase que os força a abandonar esse meio. Contudo, é essa a tarefa da imprensa escrita. Tal não passa pela adopção de um design similar a uma página web, ou pela esperança do

surgimento de um novo tipo de papel multimédia com acesso à Internet e capaz de exibir conteúdos de som e vídeo, mas sim pelo reaproveitamento das qualidades que os jornais já possuem. Dar ênfase à exploração minuciosa e aos valores-notícia das temáticas abordadas no periódico, apostar no jornalismo de investigação, assegurar bons comentadores e analistas, nivelar pela qualidade e não cair na tentação do sensacionalismo, são estas as tarefas necessárias para salvar a imprensa escrita do pressagiado fim. Como novo projecto, o Mercúrio do Porto direcciona os seus objectivos nesse sentido, procurando ganhar o seu lugar no mercado através da qualidade do seu jornalismo, sem recorrer ao sensacionalismo e a tácticas de competição desleal. Contudo, para que esta visão se concretize é necessário que se criem as condições necessárias através de uma forte aposta na educação para os media e através da adequação do

mercado às necessidades de um público que exija qualidade. A história da imprensa viu muitos media a cair e outros a surgir para ocupar o seu lugar, viu a evolução dos novos media e a sobrevivência dos velhos. O mundo continuará a precisar de notícias e de alguém para descobrir, elaborar, estudar, trabalhar e fornecer os conteúdos, seja ao serviço do Mercúrio do Porto ou do Google News, resta apenas aos velhos media não perderem este próximo comboio pois pode não haver outro. Até que esse dia chegue a Internet continua a ter muito para aprender com a imprensa, mas chegou a hora da própria imprensa aprender alguma coisa com a Internet. Apostar na interactividade com os leitores, num design criativo e nas infografias são algumas das lições a retirar, e é em conta deste prisma que a redacção do Mercúrio do Porto se posiciona.

acompanhados pelo surpreendente Leixões que, após várias jornadas isolado na liderança, acabou por ceder o lugar ao Benfica. Contudo, a ténue vantagem dos encarnados apenas fortalece a ideia de que até ao momento nenhum dos grandes se pode afirmar como favorito à conquista do título. Apesar do Benfica ser o único entre os três que ainda não sofreu derrotas na liga, os sucessivos empates não permitiram que as águias voassem para longe dos seus rivais. As indecisões de Paulo Bento em relação a Miguel Veloso e Vukcevic, aliadas à onda de lesões e castigos que assolaram o Sporting neste início de época, impediram os verde e brancos de apresentarem alguma regularidade nas exibições. Já o FC Porto acusou algum nervosismo inicial, tendo conseguido estabilizar o seu desempenho nas últimos jornadas. Se cá dentro o impasse entre os grandes clubes ainda deixa os adeptos a sonhar com títulos, a história muda

de figura ao falar das competições europeias. 2008 prometia muito com a estreia do Vitória de Guimarães na Liga dos Campeões, mas o sonho dos vimaranenses morreu em Basileia, relegando a equipa minhota para a Taça UEFA. Na competição que para o ano tem já anunciada a mudança de formato e de nome, passará a chamar-se Liga Europa, o Vitória de Guimarães fez companhia a Marítimo e Vitória de Setúbal, como o trio de equipas eliminadas na primeira ronda. O Benfica também não se aguentou no barco por muito mais tempo. Após a desastrosa derrota com o Galatasaray na Luz por duas bolas a zero e a goleada sofrida diante do Olympiacos na Grécia, os encarnados depararam-se com a hercúlea tarefa de golear por oito bolas a zero o Metalist da Ucrânia, para se manterem em prova. Num jogo que bem podia ter terminado a zero, o Benfica foi derrotado pelos ucranianos com um golo de contra-ataque mesmo ao cair do pano.

Europa não é apenas sinónimo de triste fado para o futebol português. Pela primeira vez, Portugal vai ter duas equipas nos oitavos de final da Liga dos Campeões. FC Porto e Sporting conseguiram qualificar-se categoricamente para esta fase terminando em primeiro e segundo dos respectivos grupos. Também o Sporting de Braga conseguiu passar a fase de grupos da Taça UEFA, sendo agora o único representante luso nesta competição. Diferentes foram as sortes que sorriram aos três últimos “europeus” no sorteio das rondas a eliminar da Liga dos Campeões e Taça UEFA. O FC Porto é o que parece ter a tarefa mais facilitada. Os campeões nacionais vão medir forças com o Atlético de Madrid, na eliminatória que marcará o regresso de Maniche ao Dragão. Já o Sporting e o Braga têm uma tarefa “germânica” pela frente. Os leões voltam a encontrar o Bayern de Munich responsável pela eliminação do Sporting da Liga dos Campeões há duas

épocas, enquanto os minhotos medem forças com os belgas do Standard de Liège. O mês de Fevereiro ditará assim os destinos dos representantes da armada portuguesa nas competições da UEFA. De regresso a solo lusitano, os três grandes não vão esperar pelas uvas passas e pelo champanhe para preparar o ataque ao mercado de Inverno. Jesualdo Ferreira já sonha com reforços, enquanto Quique Flores preocupa-se em manter os jogadores do actual plantel. Para Paulo Bento restam as habituais fintas financeiras da endividada SAD leonina. Conseguirá algum dos três grandes destacar-se na luta pelo título, ou teremos um campeonato renhido até ao último segundo, com a possibilidade de um outsider como o Leixões ou o Sporting de Braga entrarem em jogo para marcar a diferença? Por enquanto saboreemos as rabanadas e os pães-de-ló, que em Janeiro há mais futebol.


Mercúrio do Porto · Janeiro 2009 · 15

Conversa Superior

Octávio Mateus: “A Paleontologia não é uma espécie em vias de extinção” Nascido num ninho de Dinossauros, assim que se autodescreve Octávio Mateus. Paleontólogo português com maior reconhecimento a nível mundial, Octávio Mateus fala nesta Conversa Superior sobre o panorama da paleontologia em Portugal Adriano Cerqueira Mercúrio do Porto: O que é que o levou a optar por essa área? Octávio Mateus: Eu nasci num ninho de dinossauros. Os meus pais já andavam no meio, foram eles que fundaram o Museu da Lourinhã. Desde muito novo eu estava no meio, fiz a minha primeira saída de campo aos 4 anos, a minha primeira escavação aos 7. Tinha 9 anos quando fiz a minha primeira boa grande descoberta de um dinossauro, que foi um grande dente de um dinossauro carnívoro. Portanto, desde muito cedo que me interessei pela paleontologia e segui naturalmente a minha carreira para a biologia, que sempre adorei, e depois fiz um doutoramento em paleontologia. MP: Como é ser paleontólogo em Portugal? OM: Ser paleontólogo em Portugal é cativante, é uma profissão maravilhosa mas com muitas dificuldades. Não há financiamento e dificilmente consegue-se fazer investigação de ponta com pouco financiamento. Precisamos de ter os ossos e de conseguir estudá-los, prepará-los e compreendêlos, o que se consegue fazer com pouco financiamento, mas se queremos fazer algo com mais tecnologia aí já temos dificuldades. Ser paleontólogo em Portugal é uma situação um tanto ou quanto dúbia, no sentido em que é aliciante, temos óptimo material, temos muito potencial científico por um lado, por outro, temos poucos apoios para dar conta desse potencial. MP: Faz parte do museu da Lourinhã, que outras iniciativas acha que valorizam a Paleontologia por cá? OM: Em primeiro lugar nós tentamos fazer bom trabalho científico, descobrir novos especímenes, novos

Foto: Octávio Mateus

fósseis, descrevê-los, publicálos e anunciá-los ao mundo – isso é uma faceta mais académica e mais científica –, em segundo lugar tentamos fazer uma boa divulgação para o público geral. Isso passa pelos museus, e o Museu da Lourinhã tem feito a sua quota parte. É preciso divulgar através de livros, de conferências, de palestras, tanto nos museus, como nas cidades e nas escolas. O próximo ano é o ano de Darwin, dos 200 anos do nascimento de Darwin e dos 150 da publicação do livro “Origem das Espécies”, o que é uma boa oportunidade para divulgar a paleontologia e a evolução nas classes de estudantes em Portugal. MP: Recentemente insurgiu-se contra a venda de uma cauda de Dinossauro no ocasião.pt. Como ficou resolvida a situação? OM: A meu conhecimento a cauda não chegou a ser vendida, portanto não sei o que se passa com aquele espólio. Sei que acabou por ter uma visibilidade

internacional porque a France Press apanhou essa notícia e acabou por sair em jornais desde o Canadá, à África do Sul, Inglaterra e Austrália. É tão insólito termos uma cauda de dinossauro à venda a quem der mais que, obviamente,

“Ser paleontólogo em Portugal é cativante, é uma profissão maravilhosa mas com muitas dificuldades” mereceu uma cobertura internacional. MP: O Museu da Lourinhã ou outra entidade vai ficar com a cauda? OM: O Museu da Lourinhã não tem sequer financiamento para propor ficar com a cauda. Segundo o que foi lançado na comunicação social o dono chegou a recusar uma alegada oferta de 100 mil euros o que é um valor absurdamente alto para aquele património. O dono acha que tem ali um

tesouro que julga seu mas que devia ser de todos. O Museu da Lourinhã não vai fazer nenhuma proposta pois não somos a favor da venda e compra de património paleontológico que devia ser de todos. MP: Por causa dessa situação teceu várias críticas ao governo por não haver apoio à paleontologia. O que comenta acerca disso? OM: Não fiz propriamente críticas ao governo, lamentei o facto de não haver legislação relativamente à paleontologia tal como acontece com a arqueologia. Na arqueologia não é permitido vender nem comprar material de interesse arqueológico como se fosse um bem qualquer indiferenciado, mas tal não acontece na paleontologia. Eu gostaria muito que houvesse uma legislação que protegesse o património que julgo ser de interesse público, portanto do interesse de todos. MP: Que medidas acha que deviam ser aplicadas para apoiar o património geológico e também paleontológico português? OM: Há várias faces de uma estratégia que podem ser tomadas. A primeira parte é a parte legal, a parte da legislação, que esteve a ser trabalhada numa equipa pelo Prof. Miguel Telles Antunes há uns anos atrás, mas quanto sei está tudo parado. Depois o que a paleontologia também requer é algum financiamento para se prosseguirem investigações no nosso país. Nós temos um património muito interessante entre os melhores no mundo, tendo em conta a nossa escala, portanto era bom termos um financiamento correspondente. Eu digo isto porque sinto na pele a falta de ajuda que a consigo muitos vezes mais facilmente no estrangeiro do que em Portugal.

MP: Que futuro vê para a Paleontologia em Portugal? OM: [Risos] A Paleontologia tem que conseguir cativar o interesse dos políticos para que haja uma aposta clara nesta área. Eles têm que perceber o potencial que temos. Comparando com os dinossauros por exemplo, nós temos cerca de 30 espécies de dinossauros o que faz de Portugal o 7.º país em número de espécies a nível mundial, o que é impressionante! Estamos à frente de países enormes como o Brasil e a Rússia, mas não temos estado a aproveitar todo este manancial. Os museus continuam a precisar de financiamento, no Museu da Lourinhã, por exemplo, só um terço do seu financiamento é que vem directamente do estado, e neste caso é da câmara municipal. Os outros dois terços são auto-sustentáveis a partir das receitas de visitantes, e ainda assim conseguimos fazer investigação científica, mas não é suficiente. É preciso algum apoio em áreas cientificas e esperemos que com estas novas candidaturas a projectos científicos que abriram na FCT (Fundação para Ciência e Tecnologia) a paleontologia seja mais contemplada. MP: Então não considera que seja uma espécie em vias de extinção? OM: Não, a Paleontologia não é uma espécie em vias de extinção, porque tem muito a dar. Com o potencial que tem podia ser de topo internacional e não é. Ás vezes a diferença é apenas uma pequena ajuda mais para tornar a paleontologia em Portugal uma das melhores a nível europeu.

www.museulourinha.org


16 · Mercúrio do Porto · Janeiro 2009

Cultura

Antes de Amanhã de Gonçalo Galvão Teles é o grande premiado do Ovarvídeo 08 A 13.ª edição do ovarvídeo chegou ao fim em noite de gala, com “Antes de Amanhã” de Gonçalo Galvão Teles a arrecadar o Prémio Cidade de Ovar de “grande qualidade” e as reacções de “grande carinho dos idosos, a agradecer o que tínhamos feito por eles”. No rescaldo final da 13.ª Edição Filipe Neves admite o balanço como “bastante positivo”, salientando a preocupação de dar uma identidade diferente ao festival, presente nesta edição.

Adriano Cerqueira O CineTeatro de Ovar acolheu mais uma edição do festival de curtas-metragens da cidade de Ovar. A cerimónia da entrega de prémios, que contou com a presença do Presidente da Câmara e da Vereadora para a Cultura, Conceição Vasconcelos, viu o velho anfiteatro ganhar vida com a exibição de algumas das mais recentes curtas-metragens do cinema português. Entre os nove prémios a concurso, o grande vencedor da noite foi para “Antes de Amanhã”, uma curta-metragem sobre a vida de um militante do Partido Comunista nos dias que antecederam o 25 de Abril de 1974. A perseguição pela PIDE, a clandestinidade e o sentimento de claustrofobia, retratados num filme que Filipe Neves, da organização do evento, considera “um filme extraordinário”. “O filme de Gonçalo Galvão Teles é o melhor filme do 25 de Abril alguma vez feito em Portugal, curtas ou longas metragens, um filme que consegue em 15 minutos dar a síntese de todo o sentimento antes do 25 de Abril é espantoso e ser apresentado aqui no Ovarvideo é algo bastante bom”, confessa. O realizador não pôde estar presente, mas em seu lugar recebeu o prémio o seu amigo, também cineasta, António Valente. O cineasta achou o filme “muito bom”. “O Gonçalo Galvão Teles é um bom argumentista, um bom realizador, e este filme marca de alguma forma a evolução da carreira dele”, elogia. Entre as inovações do 13.º Ovarvídeo, destaca-se a aposta em instalações vídeo, cujo premiado da noite foi Filipe Pais. Para Filipe Neves a aposta nas instalações vídeo é uma forma de “tirar o vídeo das salas de cinema e de interagir com outras linguagens”. Quanto

Premiados Prémio Cidade de Ovar Melhor Filme: Antes de Amanhã, de Gonçalo Galvão Teles Prémio do público Azeitona, dos alunos finalistas do mestrado em Cinema-Realização da Universidade da Beira Interior

aos restantes premiados, Fashion de Martha Appelt venceu o prémio Jovem Realizador; Deus Não Quis de António Ferreira, recebeu o prémio de melhor som; a melhor fotografia foi atribuído a Caravaggio de José Maria Vaz da Silva; Superfície de Rui Xavier foi o vencedor de melhor montagem e Procura-se Amigo de Vítor Moreira ganhou o melhor argumento. Na ausência de prémio para melhor curta de animação, foi atribuída uma menção honrosa a Ossudo de Júlio Alves. Para António Valente a “selecção foi muito boa, e o facto de serem só filmes portugueses significa que existe futuro para o cinema português”. Melhores condições para o 14.º Ovarvídeo Encerrado o Ovarvídeo 08, ficou no ar o desejo de melhores condições de exibição. Manuel Oliveira, Presidente da Câmara Municipal, afirma ter “esperança de que a próxima edição tenha melhores condições de realização” e que possa ser apresentada no novo Centro

de Artes de Ovar. “A meta cultural é bastante importante para o município, o Ovarvídeo é um festival não dirigida a massas, mas que valoriza a componente artística, da criatividade, multimédia e da inovação”, refere. O Presidente aponta ainda os recordes batidos em cada competição, como indicador do sucesso do certame. Manuel Oliveira assegura que o Ovarvídeo é “para continuar, e seguramente continuará a ser uma referência cultural no nosso muncípio”. Quanto à manutenção dos bilhetes gratuitos o Presidente da Câmara Municipal diz que “é para manter, mas pode ser pensado noutro contexto”. “Se conseguirmos dar mais qualidade, em cada ano fazer melhor do que se fez no ano anterior, numa ou outra vertente pode haver algum contributo por parte do público”, admite. Acção Social também marcou presença Entre as novidades do Ovarvídeo, Filipe Neves destaca as acções de

promoção social com matinés para crianças e idosos. “Decorreram acções de responsabilidade social tanto para as crianças do conselho como para idosos, o que foi muito positivo pois as crianças levaram a cultura para casa para falar com os seus pais”, revela. O membro da organização considera ainda que “os benefícios são muitos, as pessoas de Ovar deviam reparar em algumas das mais valias que criamos aqui”. Filipe Neves salienta ainda a exibição de filmes

Melhor Argumento: Procura-se...Amigo, de Vítor Moreira Melhor Montagem: Superfície, de Rui Xavier Melhor Fotografia: Caravaggio, de José Maria Vaz da Silva Melhor Som: Deus Não Quis, de António Ferreira Jovem Realizador: Fashion, de Martha Appelt Menção Honrosa Animação: Ossudo, De Júlio Alves

Cena de “Antes de Amanhã” de Gonçalo Galvão Teles A curta-metragem relata 24 horas na vida de Mário, um fotógrafo que se sente ameaçado e perseguido pela polícia política do antigo regime


Mercúrio do Porto · Janeiro 2009 · 17

Cultura CRÍTICA LITERÁRIA

Os Cínicos Não Servem Para Este Ofício - Conversas sobre o bom jornalismo, Ryszard Kapuściński

Adriano Cerqueira

“Hoje, se queremos perceber para onde estamos a ir, não é necessário olhar para a política, mas sim para a arte”, uma das visões de um licenciado em História que preferiu ver a História a acontecer, em vez de limitar-se a estudá-la. Apenas uma das percepções de Ryszard Kapuściński, incluídas em Os Cínicos Não Servem Para Este Ofício. Pub

O livro é uma compilação de três momentos em que Kapuściński, jornalista polaco, se encontrou do outro lado do microfone e do bloco de notas. A introdução, da autoria de Maria Nadotti, moderadora de dois dos encontros transcritos nesta obra, revela alguns pontos da personalidade e da vida do jornalista. A sua técnica de assimilação cultural e de dedicação a um lugar para poder relatar sobre o prisma real dos seus habitantes – como Kapuściński fez em África, ao passar cerca de 20 anos da sua vida nesse continente, “perdendo tempo” a conhecer as pessoas, o ambiente e a sua cultura – e a sua visão sobre o papel dos jovens no mundo actual e a maior paciência e importância que os mais velhos lhes devem dar, são algumas das ideias que se destacam na nota introdutória. O primeiro capítulo, intitulado “Ismael continua a navegar”, trata-se da transcrição de um encontro no VI Congresso “Redactor

Social”, em Itália, moderado por Maria Nadotti. Entre relatos da sua juventude, o experiente jornalista, retrata o jornalismo como profissão de “envelhecimento rápido”. Ao falar da sua experiência aos jovens presentes no congresso, Ryszard Kapuściński lamenta a presença de profissionais de outras áreas nas chefias das redacções. Para o autor isto impossibilita a passagem de conhecimento para os jovens que se iniciam na actividade. As novas tecnologias ao serviço do jornalismo e o crescimento dos grandes grupos media são outros dos temas em análise. É também neste capítulo que surge a questão que dá nome à obra. Este primeiro momento é marcado por um discurso fluído que cativa a atenção do leitor, criando expectativas goradas no capítulo seguinte. Os Cínicos Não Servem Para Este Ofício prossegue com uma entrevista de Andrea Semplici a Ryszard Kapuściński. Nela o jornalista

italiano opta por aprofundar a vivência do autor no continente africano. A entrevista possui algumas perspectivas interessantes, como as dificuldades de transmissão da informação para a Europa, as técnicas de assimilação cultural de Kapuściński e os relatos da sua vivência em tempo real de acontecimentos importantes da História de África, como a Conferência de Adis Abeba, onde 32 países assinaram a carta da Organização da Unidade Africana. Contudo, embora a temática seja importante para a contextualização da vida e personalidade do jornalista polaco, quebra o ritmo trazido do primeiro debate, o que pode desencorajar o leitor a virar a página. Já o terceiro e último momento da obra, faz reviver o ritmo e fluidez iniciais. Em debate com John Berger, romancista e crítico de arte, as diferenças e semelhanças entre os distintos tipos de escrita de ambos os autores, revelam uma apologética

discussão que prende o leitor até à última palavra. “O conto num dente de alho”, é o nome dado ao último acto do livro, em que John Berger, o “camponês”, e Ryszard Kapuściński, o “marinheiro”, salientam a importância da concentração e da atenção no relato literário e jornalístico, descurando a crítica ao estilo mais sedentário de Berger em contraste com o espírito aventureiro de Kapuściński. Os Cínicos Não Servem Para Este Ofício é, como referido no subtítulo, uma compilação de conversas sobre o bom jornalismo. Apesar dos interessantes relatos e das questões pertinentes que ao longo das páginas mostram a natureza do jornalismo puro, de investigação e de dedicação a um estilo de vida, a obra peca na estrutura e ordenação dos capítulos. Como afirma Kapuściński na descrição da importância do silêncio no discurso escrito, “é tudo uma questão de interpretação do texto”.


http://jpr.icicom.up.pt/porto_sonoro

Onde desembarca a tua música Pub

CRÓNICA

Adriano Cerqueira

Descansa em paz romancismo! Sim, o romance morreu. Já longe vão os tempos dos pequenos bilhetes nos cacifos, da obrigatória rosa vermelha e caixa de bombons, oferecidas à pretendente no primeiro encontro. Numa sociedade onde mal temos tempo para consumir toda a informação que nos é enviada a toda a hora, são as delicadas subtilezas do complexo acto de corte, e o próprio romance, que pagam a factura.

pois “temos que aproveitar o dia já que o amanhã pode não vir”. E quando o sol continua a nascer? Por que nos esquecemos de preparar para o longo prazo? Até o romance - se lhe podemos dar esse nome - foi reduzido à categoria das fast-foods. Não há tempo para poemas, para serenatas, para jantares à luz das velas, nem para simples passeios no parque. Não há tempo para conversar, não há tempo para exprimir, não há tempo para romantizar.

Em Foco

Estudantes desenvolvem projecto de investigação na Namíbia

Adriano Cerqueira BRinK ou Biological Research in Kuzikus (Pesquisa Biológica em Terá o mundo se esquecido do Kuzikus, Namíbia) é o nome do proamor? O romancismo pode estar jecto desenvolvido por Joana Nunes, morto, as máquinas que o sustinham Johanna Reinhard e Alison Skeats, há muito desligadas, mas o amor, esse estudantes da Universidade de Edimé o eterno cliché que anda lado a lado burgo, com o objectivo de documencom a humanidade e que a seu lado tar a fauna da inexplorada reserva permanece. Talvez com o tempo, e se natural de Kuzikus. ele houver, o romancismo renasça das Numa fase inicial o projecto escinzas como a majestosa Fénix que já tende-se por três meses com início foi. Mas hoje essas cinzas dispersamse, lançadas sobre a brisa outonal de marcado para Janeiro. O programa Todos os aspectos da vida são, cada um lago vazio, cujas margens viam é dividido em três fases, o mês de vez mais, meros espelhos do consum- passear casais de namorados, que há Janeiro é dedicado à montagem do ismo ao qual nos subjugamos. Tudo muito lá não regressam. acampamento e à organização das tem que ser vivido no aqui e no agquestões logísticas, em Fevereiro iniÉ este o preço que pagamos por ora, é tudo para consumo rápido, o ciam-se os trabalhos de investigação eterno usar e deitar fora, que para um mundo que, apesar de nos aproxi- com o estudo das espécies de aves naaqueles de consciência ecológica pas- mar, nos isola dentro de nós próprios. tivas, e em Março realiza-se um estusou a ser usar, reutilizar e reciclar. Criamos os nossos mundos, as nossas do semelhante sobre os mamíferos da Ter-se-á perdido o hábito de nos sen- segundas vidas onde procuramos aq- região. Estão também previstos protarmos à secretária, sentir o coração uilo que não temos na vida real. Mas jectos de investigação sobre os insecacelerar enquanto pensamos naquela tudo isso está à nossa espera, para tos e plantas nativas e sobre a vida que é capaz de iluminar qualquer lá das portas que encerramos à nos- aquática da reserva natural, com inídia por mais chuvoso que seja, pegar sa volta. Quando voltarmos a dar o cio em Agosto de 2009 prolongandonuma caneta e escrever-lhe sobre essa passo para lá do nosso ego, quando se até Outubro. mesma sensação. Não é necessário voltarmos a arriscar, a desafiar os Segundo Johanna Reinhard, “o ser-se dotado na escrita para escrever próprios conceitos que nos orientam deserto do Kalahari é uma das pou“amo-te”. Se as musas da inspiração no dia-a-dia, mas que no amor percas regiões completamente selvagens não acorrem aos vossos apelos, há dem todo o sentido, aí talvez o rodo mundo, e o parque natural de vários autores a quem recorrer, desde mancismo regresse. Kuzikus está praticamente inexploShakespeare a Jon Bon Jovi. O amor O vídeo não matou a estrela do rado pela ciência”. “O nosso objecpode ser complexo, mas quando al- romancismo, nem se pode colocar a tivo é documentar a vida selvagem guém o sente, nada é mais fácil do que culpa na Internet. A culpa é de nine promover a educação ambiental de escrever sobre ele. Ser-se adolescente, guém, ninguém que não recebe, que forma a conservar a biodiversidade viver rápido e morrer cedo, acla- não lê, que não escreve essas cartas do parque”, explica. mar aos céus pelo eterno carpe diem, de amor que já ninguém as têm. “Cartas de amor, quem as não tem?”, cantava Tony de Matos. Hoje posso-lhe responder numa simples palavra. Ninguém. Não porque tenham sido vítimas da evolução tecnológica, obrigadas a adaptar-se e a evoluir para e-mails de amor, ou SMSs de amor, mas porque ninguém tem tempo, ou não se dá ao tempo de se dedicar a um longo processo de romance, saboreando cada pequeno passo, cada momento, cada gesto, cada olhar, cada sentimento...

O BRinK é um projecto de voluntariado, aberto a interessados de diversas áreas que permite o livre desenvolvimento de projectos de estudantes. Johanna Reinhard afirma que o BRinK oferece “projectos orientados para estudantes que envolvem jovens investigadores em projectos individuais”. Já Joana Nunes traça como objectivo “inspirar os alunos para que saibam que é possível ir para África estudar”. Reinhard espera ainda que os estudantes “saiam daqui com a vontade e a paixão para fazer mais trabalhos de investigação”, acrescenta. O programa de investigação procura juntar uma pequena comunidade de pessoas, para que possam entre elas trocar ideias e também aprenderem com a experiência de cada um. “As pessoas vêem muitas vezes a investigação como um “bicho raro”, como algo assustador, e é importante mostrar-lhes o que realmente é”, diz Reinhard. Joana Nunes perspectiva um ano difícil mas com bons resultados. “O primeiro ano vai ser difícil, com muito trabalho, mas só pode melhorar. A ideia é muito boa e acredito no que estamos a fazer e nos nossos valores de conservação da vida selvagem e da biodiversidade na Namíbia”, assegura. http://brinknamibia.googlepages.com e-mail: brinknamibia@gmail.com


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