Morfologia Urogenital Aplicada à Urologia Pediátrica

Page 1

Morfologia Urogenital Aplicada à Urologia Pediátrica

Editores Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio


Morfologia Urogenital Aplicada à Urologia Pediátrica.

Editores Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio

1ª edição

Rio de Janeiro, Brasil 2014


Copyright 2014 - 1a Edição ISBN 978-85-917093-0-4

Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, guardada pelo sistema “retrieval” ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer meio, seja ele eletrônico, mecânico, fotocopia, gravação ou outro, sem prévia autorização por escrito dos editores.

Favorito, Luciano A. & Sampaio, Francisco J.B, eds

Janeiro;

Morfologia urogenital aplicada a urologia pediátrica - Rio de 2014, 160p.; il.

ISBN 978-85-917093-0-4

1. Urologia 2. Pediatria 3. Anatomia aplicada 4. Morfologia 5. Anatomia urológica

CDD-618.926 ______________________________________________________________________ Todos os direitos para a língua portuguesa são reservados para: Luciano Alves Favorito & Francisco J. B. Sampaio Unidade de Pesquisa Urogenital Av 28 de Setembro, 87, prédio da FCM, térreo 20562-030, Rio de Janeiro, RJ Website: www.urogenitalresearch.org ______________________________________________________________________

Projeto Gráfico, Diagramação e Tratamento de Imagens: MGSC Editora, Rio de Janeiro Coordenação editorial: Ricardo de Morais Revisão gramatical: Mariana Caser da Costa Impressão Athalaia Gráfica e Editora


Morfologia Urogenital Aplicada à Urologia Pediátrica Editores Luciano Alves Favorito

Professor Associado, Unidade de Pesquisa Urogenital, UERJ Livre-Docente em Urologia, UNIRIO Pesquisador 2 do CNPQ & Cientista Jovem do Nosso Estado, FAPERJ Título de Especialista em Urologia, Sociedade Brasileira de Urologia

Francisco J. B. Sampaio

Professor Titular, Unidade de Pesquisa Urogenital, UERJ Pesquisador 1A do CNPQ & Cientista do Nosso Estado, FAPERJ Membro Titular e 1º. Vice-Presidente, Academia Nacional de Medicina Título de Especialista em Urologia, Sociedade Brasileira de Urologia

- 2014 -


Auxílio Financeiro: Projeto Gráfico, Editoração, Fotocomposição e Impressão financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ


Editores Luciano Alves Favorito

Professor Associado, Unidade de Pesquisa Urogenital, UERJ Livre-Docente em Urologia, UNIRIO Pesquisador 2 do CNPQ & Cientista Jovem do Nosso Estado, FAPERJ Título de Especialista em Urologia, Sociedade Brasileira de Urologia

Francisco J. B. Sampaio

Professor Titular, Unidade de Pesquisa Urogenital, UERJ Pesquisador 1A do CNPQ & Cientista do Nosso Estado, FAPERJ Coordenador Geral, Pós-Graduação em Cirurgia, UERJ Membro Titular e 1º. Vice-Presidente, Academia Nacional de Medicina Título de Especialista em Urologia, Sociedade Brasileira de Urologia

Colaboradores Waldemar Silva Costa

Professor Associado, Unidade de Pesquisa Urogenital, UERJ Cientista do Nosso Estado, FAPERJ Orientador de Mestrado e Doutorado, Pós-Graduação em Cirurgia, UERJ

Marcelo Abidu Figueiredo

Professor Adjunto da Universidade Federal Rural do RJ Doutor em Cirurgia, UERJ Jovem Cientista de Nosso Estado, FAPERJ Pesquisador 2, CNPq

Marcio Luis de Paula Lobo

Título de Especialista em Urologia, Sociedade Brasileira de Urologia Urologista do Hospital Federal de Bonsucesso Mestre em Cirurgia, UERJ


Índice Prefácio ....................................................................................................................xi Capítulo 1 - Embriologia básica do sistema urogenital .....................................1 Luciano Alves Favorito Capítulo 2 - Migração testicular ..........................................................................14 Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio Capítulo 3 - Embriologia aplicada do pênis ......................................................30 Luciano Alves Favorito Waldemar Silva Costa Francisco J. B. Sampaio Capítulo 4 - Embriologia aplicada da bexiga e do úraco ...............................48 Luciano Alves Favorito Waldemar Silva Costa Francisco J. B. Sampaio Capítulo 5 - Estrutura da pelve renal aplicada à hidronefrose pré-natal .....63 Marcio Luiz de Paula Lobo Luciano Alves Favorito Marcelo Abidu Figueiredo Capítulo 6 - Anatomia aplicada do retroperitônio ............................................74 Francisco J. B. Sampaio Luciano Alves Favorito Capítulo 7 - Anatomia do ureter .........................................................................87 Luciano Alves Favorito Capítulo 8 - Anatomia aplicada da junção uretero piélica .............................98 Francisco J. B. Sampaio Luciano Alves Favorito Capítulo 9 - Anatomia da bexiga .....................................................................108 Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio


Capítulo 10 - Anatomia da próstata e vesículas seminais ...........................116 Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio Capítulo 11 - Morfologia aplicada do testículo e epidídimo ..........................130 Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio Capítulo 12 - Morfologia aplicada do pênis ....................................................143 Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio Capítulo 13 - Anatomia do útero ......................................................................154 Luciano Alves Favorito



Prefácio A Urologia Pediátrica é uma área peculiar e de grande importância maior, que é a Urologia. Para a formação de um urologista pediátrico é necessária uma especialização demorada e tecnicamente difícil. O conhecimento da embriologia e da estrutura dos órgãos dos sistemas urinário e genital é um dos tópicos mais importantes nesta área, pois auxiliam no melhor entendimento das anomalias congênitas destes sistemas. São raros na literatura estudos específicos em morfologia aplicada à urologia pediátrica. A ideia da realização deste livro é tentar preencher esta lacuna e estimular os jovens urologistas e cirurgiões a ingressarem nesta especialidade e, quem sabe, estimular uma maior dedicação e ingresso na pesquisa básica. Nos últimos 30 anos, a Unidade de Pesquisa Urogenital, UERJ (www.urogenitalresearch.org), tem se dedicado à Pesquisa Translacional em Sistema Urogenital Normal e Patológico em Pacientes e Cadáveres e também à Pesquisa Translacional em Urologia Infantil. Durante este período, temos promovido a formação de um grande número de Alunos de Iniciação Científica, Mestres e Doutores e, sempre que possível, tentamos inserir e estimular os clínicos e cirurgiões na pesquisa básica. Neste livro, vamos abordar os principais aspectos de interesse prático para o Urologista Pediátrico, baseados, principalmente, na pesquisa desenvolvida em fetos humanos e cadáveres, em nosso laboratório, que certamente alberga uma das maiores coleções existentes de fetos catalogados para o estudo do sistema urogenital.

Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio Editores


Capítulo 1

Embriologia Básica

do

Sistema Urogenital Luciano Alves Favorito

INTRODUÇÃO O conhecimento da embriologia básica dos sistemas urinário e genital é de grande importância para o entendimento das anomalias congênitas que os acometem. O presente capítulo tem como objetivo mostrar o desenvolvimento embriológico urinário e genital e sua associação com as principais anomalias congênitas. Desenvolvimento do Sistema Urinário

o mesonefro desaparece completamente, exceto por poucos elementos que persistem na maturidade. No mesênquima, situado na região lateral do mesonefro em desenvolvimento, surgem os ductos mesonéfricos, que avançam caudalmente e se fundem com a porção terminal da cloaca primitiva (5). A canalização dos ductos mesonéfricos forma uma unidade excretora que apresenta função transitória (Figura 1.1).

RIM

O sistema urinário se desenvolve a partir do mesoderma intermediário, que se estende ao longo de todo o comprimento da parede dorsal do embrião (1-3). Durante a vida intrauterina, o homem desenvolve três rins que, em ordem de surgimento, são: pronefro, Até o quarto mês, onefro e metanefro (rim definitivo). O pronefro desenvolve-se em torno da terceira semana de gestação, sofrendo degeneração apoptótica, desaparecendo até a quinta semana gestacional (4). O mesonefro surge na região média do embrião, em torno da quarta semana gestacional, originando estruturas tubulares. Até o quarto mês 1

Figura 1.1: À esquerda: desenho esquemático evidenciando o desenvolvimento do pronefro (pontilhado) e do mesonefro (área escura). À direita: esquema representativo do desenvolvimento do blastema metanefrogênico (seta maior) e broto ureteral (seta menor).

No início da quinta semana de desenvolvimento, os brotos ureterais se originam na porção distal


Embriologia Básica

dos ductos mesonéfricos e avançam para a porção mais caudal dos blocos do mesoderma intraembrionário, o metanefro (5,6). A fusão do broto uretérico com o blastema metanefrogênico, em torno do trigésimo segundo dia de desenvolvimento, inicia o processo de nefrogênese (6) (Figura 1.1). O broto ureteral estimula uma transformação mesênquimo-epitelial, que irá originar o rim metanéfrico. Essa transformação não ocorre na ausência do broto ureteral. Especula-se que moléculas produzidas no broto ureteral induziriam às modificações que ocorrem no blastema metanefrogênico (6). A bifurcação do broto ureteral determina o padrão do sistema pielocaliceal e os lóbulos renais correspondentes (3). Entre a sexta e a décima semanas, os rins embrionários ascendem pela parede abdominal posterior, até atingirem sua posição definitiva na região lombar (Figura 1.2). O mecanismo exato desta migração é desconhecido, mas postula-se que ocorra em virtude do crescimento diferencial entre a região sacral e lombar do embrião (3). Durante a sua ascensão, os rins modificam o sítio de origem da sua vascularização, até as artérias definitivas serem formadas na região lombar do embrião. Diversas anomalias podem ocorrer durante o processo de embriogênese renal: agenesia, displasia, anomalias císticas, anomalias de rotação, anomalias vasculares, anomalias

do

Sistema Urogenital

Figura 1.2: Desenho esquemático evidenciando a ascensão renal (setas), que ocorre entre a sexta e a décima semana de desenvolvimento.

de ascensão e anomalias de fusão. As anomalias de ascensão e fusão estão entre as mais frequentes (1-3, 5) e estão evidenciadas na Figura 1.3 (Figura 1.3). URETER O sistema coletor do rim e o ureter se originam a partir do broto uretérico, uma evaginação dorsal do ducto mesonéfrico, em torno do vigésimo oitavo dia pós-concepção, (1-3). O broto uretérico apresenta uma porção superior dilatada e uma porção inferior afilada. A porção dilatada do broto uretérico origina a pelve renal e a sua porção inferior origina o ureter (2). Desde o início do seu desenvolvimento até o trigésimo quinto dia pós-concepção, o ureter se

2


Embriologia Básica

do

Sistema Urogenital

A

C

B

A

B

C

D

Figura 1.3: A) Esquema evidenciando as principais anomalias de ascensão e fusão do rim. a) Rim em ferradura; b) Rim pélvico e c) Ectopia renal cruzada com fusão. B) Feto do terceiro trimestre gestacional portador de rim em ferradura. C) Feto do segundo trimestre gestacional com anomalia renal de ascenção – rim pélvico. D) Urografia excretora de paciente do sexo feminino com 12 anos de idade apresentando ectopia renal cruzada com fusão.

encontra patente em toda a sua extensão (3). No entanto, entre o trigésimo sétimo e o quadragésimo dia pós-concepção a luz do ureter se oblitera, ficando patente em sua porção média (3) (Figura 1.4). Após o quadragésimo dia, a luz se estende rapidamente em direção cranial e caudal e, novamente, o ureter fica patente (Figura 1.4).

3

As anomalias de desenvolvimento do ureter ocorrem em cerca de 10% dos pacientes urológicos (7). As anomalias mais comuns são as duplicações parcial e total, os orifícios ectópicos, as ureteroceles, a incompetência da junção uretervesical, causando o refluxo vésico-ureteral e as obstruções intrínsecas do ureter.


Embriologia Básica

A

B

C

D

Figura 1.4: Esquema evidenciando a obliteração e a recanalização do ureter durante o desenvolvimento embrionário. A) Broto uretérico se originando do ducto mesonéfrico, com 28 dias pós-concepção; B) Entre os dias 37 e 40 pós-concepção a luz do ureter é progressivamente obliterada C) A luz do ureter começa a ficar patente novamente, iniciando-se por sua porção média; D) Após o 40° dia pós-concepção a luz do ureter está novamente patente em toda a sua extensão.

Figura 1.5: Feto do segundo trimestre gestacional com duplicação completa do ureter esquerdo.

do

Sistema Urogenital

A figura 1.5 evidencia um feto do segundo trimestre gestacional com doplicação completa do ureter. As obstruções ureterais congênitas são mais frequentes na junção pielo-ureteral e na junção uretero-vesical. Segundo Alcaraz (8) as obstruções ureterais congênitas podem ser divididas em dois grandes grupos: obstruções ureterais intrínsecas e obstruções da junção ureterovesical. Este tipo de obstrução da junção ureterovesical ocorreria devido à persistência da membrana ureterovesical (membrana de Chwalla), que oclui essa região temporariamente entre o trigésimo sétimo e o quadragésimo terceiro dia pós-concepção (9). Com oito semanas pósconcepção o ureter é um tubo patente, no entanto sem musculatura lisa (3). O desenvolvimento da camada muscular do ureter se inicia após a passagem de urina por essa estrutura, fato que estimularia a miogênese, o que ocorre em torno da décima segunda semana pós-concepção (3). BEXIGA A cloaca primitiva é dividida pelo septo urorretal, processo que se estende da quarta até a sétima semana pós-concepção (1-3). A cloaca é dividida no canal anorretal, posterior e no seio urogenital, localizado anteriormente (Figura 1.6). A membrana cloacal é dividida também em duas porções, a membrana urogenital, anteriormente, e a

4


Embriologia Básica

Figura 1.6: Esquema evidenciando a divisão da cloaca, que originará o seio urogenital entre a quarta e a sexta semana de gestação. A) Cloaca primitiva; B) Divisão da cloaca pelo septo urorretal (setas); C) Término da divisão da cloaca com a formação do seio urogenital anterior e o canal anorretal posterior.

membrana anal, posteriormente. O seio urogenital, originado da cloaca primitiva, é dividido em três porções: vesical, pélvica e fálica. A porção vesical é a mais superior e a mais larga do seio urogenital. Inicialmente, ela é contínua com o alantóide cujo lúmen posteriormente se oblitera, originando o úraco (1-3). A segunda porção do seio urogenital, situada abaixo da porção vesical, é porção pélvica, que originará a próstata e porção membranosa da uretra (Figura 1.6). A porção distal do seio urogenital é a porção fálica, que é fechada

5

do

Sistema Urogenital

externamente pela membrana urogenital (Figura 1.6). Em torno da quinta semana de desenvolvimento, a porção do ducto mesonéfrico situada distalmente à origem dos brotos uretéricos se dilata e é absorvida pela região do seio urogenital (3). Os ductos mesonéfricos se fundem na linha média, originando uma região triangular, o futuro trígono vesical (10). A bexiga é, então, dividida sob o ponto de vista embriológico em duas porções: corpo vesical e trígono. O corpo vesical é derivado do endoderma da região vesical do seio urogenital. O epitélio desta região é derivado do endoderma do seio urogenital e a lâmina própria, as camadas musculares e a adventícia derivam do mesênquima esplâncnico adjacente (1-3). O trígono se origina da incorporação dos ductos mesonéfricos na base da bexiga em desenvolvimento (10). Inicialmente, esses ductos contribuem para a formação da mucosa do trígono vesical; no entanto, esse epitélio é substituído pelo epitélio endodérmico do seio urogenital (1-3). Diversas anomalias congênitas podem acometer a bexiga e as principais são as anomalias do úraco (originadas por falhas no fechamento do alantóide), as anomalias de septação, os divertículos congênitos de bexiga e a extrofia vesical.


Embriologia Básica

do

Sistema Urogenital

Desenvolvimento do Sistema Genital Masculino TESTÍCULO O testículo humano se origina a partir de um espessamento do epitélio celomático na região medial do ducto mesonéfrico. Durante o desenvolvimento embrionário, no segundo trimestre gestacional, o testículo atravessa a parede abdominal, passando pelo canal inguinal e chega até o escroto (Figura 1.7). Essa migração se inicia em torno da 24a semana e se completa por volta da 32a semana pós-concepção (11,12). Estudos prévios evidenciaram que todos os fetos com mais de 30 semanas pós concepção já tinham os testículos no escroto (Figura 1.7) (13). A primeira indicação de desenvolvimento gonadal ocorre na quinta semana de gestação, quando surge um espessamento do epitélio celomático na região medial do mesonefro, a crista genital. Neste local, cordões epiteliais (cordões sexuais primários) crescem para o interior do mesênquima subjacente, iniciando a formação da gônada indiferenciada (2). Na sexta semana de gestação, a gônada primitiva é constituída por um epitélio germinativo superficial e por um blastema interno. Na sétima semana, o fator de diferenciação testicular ou gene SRY, localizado no braço curto do cromossomo Y, determina o desenvolvimento da camada medular da

Figura 1.7: Esquema mostrando a cronologia da migração testicular. Os fetos com idade gestacional entre 10 e 20 semanas pós-concepção tinham a maioria dos testículos situados no abdômen; os fetos com idade entre 21 e 25 semanas pós-concepção tinham a maioria dos testículos situados no canal inguinal e todos os fetos com mais de 30 semanas tinham os testículos situados na bolsa escrotal (13).

gônada indiferenciada e sua transformação no testículo (14). Os cordões primários se condensam, ramificam e se anastomosam, dispostos de uma maneira radial e convergente em direção ao mesórquio, formando os túbulos seminíferos, túbulos retos e, posteriormente a rede testicular. Logo, perdem suas conexões com o epitélio superficial, devido ao desenvolvimento de uma cápsula fibrosa

6


Embriologia Básica

e espessa, denominada de túnica albugínea (2). As células germinativas primordiais migram, através de movimentos amebóides da porção caudal do saco vitelino para a crista genital. Esta migração está completa ao final da sexta semana gestacional (15). Posteriormente, elas se diferenciam em gonócitos, penetrando nos cordões sexuais que formarão os túbulos seminíferos. Alguns gonócitos se aderem à membrana basal dos túbulos e se diferenciam em espermatogônias fetais (16). As células de Sertoli se desenvolvem na sexta e sétima semanas gestacionais, a partir do epitélio de revestimento. Produzem o fator inibidor de Müller, que provoca a regressão do ducto paramesonéfrico (ducto de Müller) (14). No embrião masculino, as extremidades superiores dos ductos paramesonéfricos seriam responsáveis pela formação das hidátides sésseis de Morgagni, identificadas nos polos superiores do testículo e, atualmente denominadas apêndices testiculares (17). Por volta da nona semana de gestação, as células de Leydig, derivadas do mesênquima, produzem testosterona, que estimula a transformação do ducto mesonéfrico (ducto de Wolff) no trato genital masculino (11,14). Quando o mesonefro degenera, cerca de 5 a 12 túbulos mesonéfricos próximos ao testículo em diferenciação (túbulos epigenitais),

7

do

Sistema Urogenital

persistem, perdem seus glomérulos primitivos e se fusionam com a rede testicular, constituindo os túbulos eferentes (1,18). Essa fusão ocorre por volta da 12a semana de gestação, quando se inicia a canalização da rede testicular e dos túbulos mesonéfricos, que só se completará próximo à puberdade (1,2,14).

Figura 1.8: Esquema mostrando o desenvolvimento do testículo e a formação do epidídimo. T = testículo, G = gubernáculo, DW = ducto de Wolff, SU = seio urogenital.


Embriologia Básica

No terceiro mês de vida fetal, o testículo está em posição retroperitoneal na cavidade da futura pelve. O testículo se desenvolve na porção medial do mesonefro e está unido à área do futuro canal inguinal por uma coluna de mesênquima conhecida como gubernáculo testicular (2) (Figura 1.8). No segundo trimestre gestacional, o testículo e o epidídimo começam a migrar do abdômen até o escroto, completando este percurso por volta da 30a semana pós-concepção (13). EPIDÍDIMO E DUCTO DEFERENTE O epidídimo e o ducto deferente se originam a partir do ducto mesonéfrico. Os túbulos mesonéfricos (ductos epigenitais), devido à proximidade com as gônadas, em fase de diferenciação, se fusionam com os túbulos do testículo (Figura 1.8). Geralmente, 5 a 12 túbulos mesonéfricos se unem com a rede testicular, constituindo os túbulos eferentes (18). A porção dos ductos mesonéfricos adjacentes ao testículo torna-se alongada e convoluta, formando o epidídimo. A porção remanescente do ducto mesonéfrico forma o ducto deferente. Essa fusão urogenital ocorre em torno da 12a semana pós-concepção. Durante o quarto mês de desenvolvimento embrionário, os túbulos eferentes adjacentes ao testículo permanecem retos, en-

do

Sistema Urogenital

quanto os túbulos adjacentes ao ducto deferente se enovelam (3). O epidídimo apresenta, portanto, dupla origem embrionária: a cabeça originando-se da margem genital e o corpo e a cauda originando-se a partir da porção superior do ducto deferente que se enovela. Podem ocorrer más-formações congênitas na região dos túbulos eferentes, levando a uma disjunção entre o testículo e o epidídimo (19). Existem anomalias anatômicas, nas quais ocorre agenesia do corpo e da cauda do epidídimo, enquanto que a cabeça se encontra em sua posição habitual (20).

Figura 1.9: Anomalias de disjunção do epidídimo. A) disjunção de cauda epididimária; B) disjunção total entre o epidídimo e o testículo e C) disjunção total entre o epidídimo e o testículo, com o epidídimo situado mais caudalmente que o testículo.

8


Embriologia Básica

As anomalias de disjunção (Figura 1.9) ou atresia podem ser explicadas pela dupla origem embriológica do epidídimo, ou pelo acontecimento de alterações na vascularização do ducto mesonéfrico que ocorrem nesse período (19). Essas anomalias estão frequentemente associadas à criptorquidia (20) e são visualizadas também em pacientes com infertilidade. Em indivíduos sem criptorquidia e em fetos humanos sem anomalias congênitas (18), a incidência de anomalias epididimárias é pouco frequente (menos de 5% dos casos). PRÓSTATA E VESÍCULAS SEMINAIS O epitélio da uretra prostática próximo aos orifícios dos ductos ejaculatórios é derivado do endoderma da parte vesical do seio

do

Sistema Urogenital

urogenital. O epitélio do restante da uretra prostática é derivado do endoderma da parte pélvica do seio urogenital. Os ductos prostáticos primitivos desenvolvem-se na uretra prostática sob influência do mesênquima do ducto mesonéfrico (Wolff) (Figura 1.10). Os androgênios fetais começam a ser produzidos no testículo na oitava semana e são pré-requisitos para a atividade indutora do mesênquima. Entre a décima primeira e a décima segunda semana pós-concepção, o mesênquima ao redor da uretra prostática é estimulado pelos androgênios para induzir a proliferação do epitélio. Inicialmente, os ductos são sólidos e após, a trigésima semana, eles adquirem lúmen. No início, desenvolvem-se pequenas coleções de brotos celulares e depois surgem estruturas acinares (Figura 1.11). Finalmente, à medida que os

Figura 1.10: Desenho esquemático do desenvolvimento dos ductos prostáticos a partir da influência do mesênquima do ducto de Wolff.

9


Embriologia Básica

do

Sistema Urogenital

Figura 1.11: Desenho esquemático do desenvolvimento prostático, em uma fase mais adiantada, onde começam a se desenvolver as estruturas acinares.

ductos invadem o mesênquima ao seu redor, desenvolvem-se grupos lobulares de estruturas ácino-tubulares. Os ductos prostáticos surgem de três áreas no epitélio e No mesênquima, contíguo, na porção do seio urogenital, destinada a ser o assoalho da uretra prostática (13,5). Cada um dos três grupos de ductos irá drenar cada uma das três zonas da próstata. O primeiro grupo de ductos brota distalmente ao colículo seminal e torna-se zona periférica da próstata. O segundo grupo brota da uretra em duas fileiras, ao

lado e acima do local de saída dos ductos ejaculatórios, e tornar-se-á a zona central. O terceiro grupo, situado na região vesicoureteral, proliferar-se-á no interior da submucosa profunda, para formar os ductos e glândulas da zona de transição (21). PÊNIS O conhecimento da embriologia do pênis facilita o entendimento de diversas anomalias congênitas, como as hipospádias, as epispádias e a fimose. A descrição detalhada da embriologia do pênis será feita no capítulo 3.

10


Embriologia Básica

Desenvolvimento do Sistema Genital Feminino Ovário O ovário se desenvolve na cavidade abdominal, na região medial do ducto mesonéfrico, a partir de um espessamento do epitélio celomático, localizado nesta região, em torno da sétima semana de desenvolvimento (1-3). O ovário também apresenta uma migração; no entanto, a presença do útero impede que o ovário se desloque para fora da cavidade abdominal, fazendo com que o ovário se localize na região pélvica (10). Assim como no sexo masculino, existe uma estrutura mesenquimatosa ligada ao polo inferior do ovário. Essa estrutura une a extremidade inferior do ovário à região dos grandes lábios e é denominada de gubernáculo feminino ou ligamento redondo, que fará parte do canal inguinal da mulher (10). Útero, Tuba Uterina e Vagina O útero e as tubas uterinas são originados a partir dos ductos paramesonéfricos entre a décima e a vigésima semana de gestação (5). Esses ductos apresentam três porções: a) porção cranial, que se abre na cavidade celomática; b) porção horizontal, que cruza o ducto mesonéfrico e c) porção caudal, que se fusiona com a sua homóloga contralateral (1,5) (Figura 1.12). Com a migração do ovário, as duas primeiras porções originam a tuba

11

do

Sistema Urogenital

uterina e a porção distal fusionada forma o canal uterino (1) (Figura 1.12). Na ausência de testosterona, os ductos mesonéfricos degeneram, apresentando poucos resquícios, que são e o epoóforo o paraóforo, localizados próximo à tuba uterina, e os cistos de Gartner, próximos à porção superior da vagina (1). Na região da união dos ductos paramesonéfricos com o seio urogenital se desenvolve uma condensação tecidual chamada de bulbo sinovaginal (Figura 4.17). Entre a décima e a vigésima semana, o bulbo sinovaginal se desenvolve em direção ao períneo fetal, separando a vagina em desenvolvimento da uretra. Neste período, ocorre a canalização da vagina. O lúmen da vagina se mantém separado do seio urogenital por um fino tecido, chamado de hímen, que apresenta uma camada epitelial derivada do seio urogenital e uma fina camada de células vaginais. Os dois terços proximais da vagina são derivados dos ductos paramesonéfricos, enquanto que o terço distal tem origem no seio urogenital (Figura 1.18). A entrada da vagina e a genitália externa são derivadas do ectoderma (1,5). Genitália Externa No início do desenvolvimento a genitália externa é indiferenciada. A genitália externa feminina se desenvolve em virtude de estímulos hormonais entre o terceiro e o quinto mês de gestação (1). O tubérculo genital se alonga originando o clitóris, as pregas uretrais


Embriologia Básica

do

Sistema Urogenital

A

B

Figura 1.12: A) Desenvolvimento do trato genital feminino. a) Fusão dos ductos paramesonéfricos (seta maior) com o bulbo sinovaginal (seta menor); b) Formação da vagina e c) Aspecto final da genitália feminina após o término da canalização do útero e da vagina. B) Fotografia de feto feminino com 22 semanas pós-concepção evidenciando o útero e anexos já formados.

Figura 1.13: A genitália indiferenciada origina a genitália externa no sexo masculino (esquerda) e no sexo feminino (direita).

12


Embriologia Básica

não se fusionam e originam os lábios menores. As dobras genitais se alongam e formam os lábios maiores, o sulco urogenital se mantém aberto e forma o vestíbulo vaginal. A figura 1.13 mostra a origem da genitália externa indiferenciada nos dois sexos (Figura 1.13). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sadler TW: Langman’s Medical Embryology. 7th Ed., Williams & Wilkins, Baltimore, Maryland. 1995. 2. Moore KL: The Developing human. Clinically Oriented Embryology. Philadelphia, W.B. Saunders. 1977. 3. Maizels M: Normal development of the urinary tract. In: Campbell’s Urology, 6a. ed., New York, Saunders. 1992; pp. 1301. 4. Pole RJ, Qi BQ, Beasley SW: Patterns of apoptosis during degeneration of the pronephros and mesonephros. J Urol. 2002; 167: 269-71. 5. Thomas FMD, Rickwood AMK, Duffy PG: Essentials of paediatric urology. Martin Dunitz Ltda, 2002. 6. Glassberg KI: Normal and abnormal development of the kidney: a clinician’s interpretation of current knowledge. J Urol. 2002; 167: 2339-50; discussion 2350-1. 7. Motola JA, Shahon RS, Smith AD: Anatomy of the ureter. Urol Clin North Am. 1988; 15: 295-9. 8. Alcaraz A, Vinaixa F, Tejedo-Mateu A, Forés MM, Gotzens V, Mestres CA, et al.: Obstruction and recanalization of the ureter during embryonic development. J Urol. 1991; 145: 410-6. 9. Domenech G, Tejedo A, Vilanova J: Contribuition al estudio de la membrana ureteral de Chwalla. Su importancia clinica. Arch Esp Urol. 1973; 26: 355-9.

13

do

Sistema Urogenital

10. Park JM: Normal and anomalus development of the urogenital system. In: Campbell’s Urology, 8a. ed., New York, Saunders. 2002; pp. 1737. 11. Backhouse KM: Embryology of testicular descent and maldescent. Urol Clin North Am. 1982; 9: 315-25. 12. Heyns CF, Hutson JM: Historical review of theories on testicular descent. J Urol. 1995; 153: 754-67. 13. Sampaio FJ, Favorito LA: Analysis of testicular migration during the fetal period in humans. J Urol. 1998; 159: 540-2. 14. Rozanski TA, Bloom DA: The undescended testis. Theory and management. Urol Clin North Am. 1995; 22: 107-18. 15. Lamb DJ: Growth factors and testicular development. J Urol. 1993; 150: 583-92. 16. Kogan S, Hadziselimovic F, Howards SS, Snyder III HM, Huff D: Pediatric andrology. In: Adult and pediatric urology, 3rd ed. St Louis: Mosby Year Book. 1996. 17. Nöske HD, Kraus SW, Altinkilic BM, Weidner W: Historical milestones regarding torsion of the scrotal organs. J Urol. 1998; 159: 13-6. 18. Scorer CG, Farrington GH: Development and descent of the testis. In Congenital Deformities of the testis and epididymis: New-York: Appleton-Century-Crofts. 1971; pp. 1-27. 19. Barthold JS, Redman JF: Association of epididymal anomalies with patent processus vaginalis in hernia, hydrocele and cryptorchidism. J Urol. 1996; 156: 2054-6. 20. Hinman JR F: Penis and Male Urethra. In: Atlas of Urological Anatomy. W.B. Saunders Co., Philadelphia. 1993; pp. 418. 21. Baskin LS: Hipospadias. Anatomy Embriology and Reconstrutive techniques. Braz J Urol. 2000; 26: 621-9.


Capítulo 2

Migração Testicular Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio

INTRODUÇÃO 25 semanas pós-concepção, indicando que é neste período que a migração através do canal inguinal se intensifica. Neste mesmo trabalho, foi observado que todos os fetos com mais de 30 semanas pós-concepção já apresentavam os testículos situados no escroto; outros autores relatam que é a partir da 32ª semana que o testículo completa sua migração (1-3).

A migração testicular é dividida em duas fases. A primeira fase corresponde à migração do testículo do abdômen até o anel inguinal interno e a segunda fase compreende a passagem do testículo pelo canal inguinal, até a sua chegada definitiva no escroto (1). O momento do início da migração testicular é controverso. Backhouse (2) relata que esse processo se inicia em torno da 24ª semana pós-concepção. Trabalhos de Heyns (3) e de Sampaio e Favorito (4) demonstraram fetos com idade em torno de 17 semanas, que já haviam iniciado o processo de migração. Um aspecto que vários autores relatam é o fato de a passagem do testículo pelo canal inguinal ser um processo muito rápido (1-3). Heyns (3) encontrou apenas 2.6% dos testículos examinados em sua amostra situados no canal inguinal. No estudo de Sampaio e Favorito (4), numa amostra de 71 fetos humanos foram encontrados 20.5% dos testículos situados no canal inguinal, sendo que 73.3% destes testículos eram de fetos com idades compreendidas entre 21 e

TEORIAS DA MIGRAÇÃO TESTICULAR Várias teorias tentam explicar a migração do testículo durante o período fetal humano humano e as mais aceitas são as descritas a seguir: a) Aumento da pressão intraabdominal: Uma teoria antiga e bastante controversa da migração testicular é o papel da pressão intra-abdominal. A contração da musculatura da parede abdominal, o crescimento do fígado e dos intestinos, assim como o acúmulo de mecônio aumentam a pressão no interior

14

14


Migração Testicular

do abdômen fetal, o que, segundo alguns autores, favoreceria a migração do testículo (5-7). Outro fato que fala a favor desta teoria é a grande incidência de criptorquidia em pacientes com defeitos da parede abdominal, como a onfalocele, a gastrosquise e a síndrome de Prunne-Belly (1,8). Essa teoria, no entanto não explica os casos de assimetria, na migração testicular, onde um dos testículos migra normalmente, enquanto o outro fica situado no canal inguinal ou no abdômen (9). Um estudo interessante feito por Attah (6) demonstrou que a pressão intra-abdominal é um fator coadjuvante para a migração do testículo. Esse estudo feito em ratos está evidenciado na Figura 2.1. O autor realizou um experimento onde foram criados defeitos na parede abdominal anterior dos animais, associados ou não com a secção da porção proximal do gubernáculo. O que se evidenciou é que houve diminuição significativa da migração testicular apenas nos casos onde o defeito da parede abdominal foi acompanhado de secção do gubernáculo (Figura 2.1). Nos casos de defeitos isolados na parede abdominal, os testículos migraram em 96% dos casos. Esse experimento demonstra que a pressão abdominal atuaria apenas como uma força auxiliar na migração do

15

Figura 2.1: Esquema baseado no trabalho de Attah & Hutson de 1993, evidenciando a importância da pressão intra-abdominal e da porção proximal do gubernáculo na migração testicular. A) Todos os ratos com a porção proximal do gubernáculo e a parede abdominal íntegras tiveram os testículos com a sua migração completada. B) Nos casos onde a porção proximal do gubernáculo foi seccionada, 70% dos testículos completaram a sua migração. C) Nos casos onde a musculatura da parede abdominal foi seccionada, 96% dos testículos completaram a migração. D) Nos casos onde tanto a parede abdominal quanto a porção proximal do gubernáculo foram seccionados, apenas 42% dos testículos completaram a migração (T - Testículo; P - Processo vaginal e G - Gubernáculo).

testículo, enquanto que o gubernáculo e a patência do processo vaginal seriam de grande importância para a orientação do trajeto testicular durante a migração.


Migração Testicular

b) O fator endócrino: A migração testicular é um processo complexo mediado por fatores endócrinos e mecânicos. A integridade do eixo entre o testículo, o hipotálamo e a hipófise, que regula a produção da testosterona, é importante para o processo de migração testicular. A criptorquidia é um evento comum em patologias nesse eixo, como, por exemplo, o hipogonadismo hipogonadotrófico e a deficiência de 5-alfa-redutase (8). A testosterona parece desempenhar papel ativo na migração do testículo, induzindo o desenvolvimento de estruturas importantes para a migração testicular, como o processo vaginal, o ducto deferente, o epidídimo, o canal inguinal e o escroto. Outro mecanismo de ação da testosterona seria através de estímulo do nervo genitofemoral, que induziria a produção do peptídio relacionado ao gene da calcitonina (CGRP) que atua estimulando o desenvolvimento do gubernáculo testicular (Figura 2.2). As gonadotrofinas fetais e placentárias também estão implicadas no processo da migração testicular. Essas substâncias atuam estimulando a produção dos androgênios testiculares, que induzem o crescimento e o desenvolvimento do ducto deferente, do epidídimo, do processo vaginal e do próprio gubernáculo (1). É de conhecimento geral que o tratamento da criptorquidia com gonadotrofinas induz à migração do testículo em níveis

Figura 2.2: Esquema baseado no trabalho de Clarnette e Hutson, de 1996, evidenciando a ativação do núcleo do nervo genitofemoral pela testosterona produzida pelo testículo fetal e a consequente estimulação do nervo, com a liberação do peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP).

que variam de 25 a 55% dos casos (10,11). Outra substância endócrina envolvida na migração testicular seria a descendina (12). Essa substância secretada pelo testículo, independente dos androgênios, teria um papel importante no crescimento das células mesenquimais do gubernáculo. O gubernáculo seria, portanto, uma das estruturas fetais implicadas na migração testicular,mais modificadas pela ação hormonal (7).

16


Migração Testicular

c) O papel do nervo genitofemoral: Segundo essa teoria, os androgênios fetais masculinizam o núcleo espinhal do nervo genitofemoral e, em seguida, o próprio nervo (7). Essa masculinização resulta em um aumento do número de motoneurônios nessa região, com consequente aumento da secreção do peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP) (Figura 2.2). A importância desse mecanismo é corroborada por modelos experimentais em que a secção do nervo genitofemoral leva à criptorquidia (1). Os níveis aumentados de CGRP levam à uma contração rítmica do gubernáculo testicular que induziriam sua migração até o escroto (13). O sítio de ação do CGRP é a junção neuromuscular. Em animais experimentais como os roedores, por exemplo, existe musculatura em quantidade, fortificando essa hipótese (13); no entanto o gubernáculo humano é constituído ,basicamente, por uma matriz extracelular abundante, com grandes concentrações de glicosaminoglicanas (3,14). Portanto essa teoria de tração induzida pelo CGRP em humanos é discutível. d) O desenvolvimento do epidídimo, ducto deferente, vasos testiculares e processo vaginal: O crescimento e desenvolvimento do ducto deferente, dos vasos testiculares, do epidídimo e do

17

processo vaginal, mediados pelos hormônios, são necessários para que o testículo migre até o escroto. O processo vaginal, como foi visto no experimento de Attah (6), atua como um guia para que o testículo chegue ao escroto. Alterações no processo vaginal podem estar associadas à criptorquidia (7). Uma teoria interessante e controversa, proposta por Hadzelimovic (5), sugere que o epidídimo seria um dos responsáveis pela migração testicular, através de sua atividade peristáltica e secretora, no segundo trimestre gestacional. Existiriam mudanças no centro gravitacional do epidídimo, fazendo com que o testículo migrasse junto com ele. Essa teoria explicaria alguns casos de criptorquidia, como por exemplo, aqueles em que o epidídimo está situado mais inferiormente que o testículo (15). Algumas observações dão suporte à teoria descrita acima. O epidídimo precede o testículo no escroto; o epidídimo se encontra em uma posição privilegiada para influenciar a migração testicular; pois está anatomicamente conectado ao gubernáculo, que por sua vez, está fixado ao testículo e ao escroto. Alterações morfológicas e funcionais ocorrem no epidídimo na época da migração em determinadas espécies de animais (16). e) Gubernáculo testicular: John Hunter, em 1762 fez a primeira descrição detalhada de


Migração Testicular

uma estrutura que conectava o testículo ao escroto e direcionaria seu curso durante a descida. Utilizou, para denominá-lo, o termo “gubernaculum”, que significa leme, numa alusão à sua presumida função (1). EMBRIOLOGIA DO GUBERNÁCULO O início do desenvolvimento do gubernáculo no feto humano ocorre durante a sexta semana de gestação, no mesmo período em que as células germinativas primordiais estão chegando na crista genital (2). Na oitava semana de gestação, o testículo e o mesonefro estão ligados à parede posterior do abdômen por uma dobra de peritôneo. Conforme o mesonefro degenera, a porção desta dobra cranial ao testículo, denominada ligamento diafragmático, também involui, tornado-se a porção cranial do mesentério gonadal. A porção caudal ao testículo permanece e encontra uma faixa de mesênquima em desenvolvimento que se estende até as eminências genitais. Esta estrutura é denominada de ligamento gonadal caudal, que dará origem ao gubernáculo testicular (2, 17). Cranialmente, o gubernáculo se aproxima do ducto mesonéfrico e, distalmente, se dirige para a região inguinal. Neste momento, o futuro canal inguinal ainda é somente um espaço na musculatura

da parede abdominal anterior, onde existe apenas mesênquima. Nessa região, o ramo genital do nervo genitofemoral atravessa a parede abdominal e, em sua descida para o escroto, irá inervar o músculo cremaster e, posteriormente, no sentido caudal para cranial, promoverá o suprimento nervoso para o gubernáculo (2,5). Por volta da oitava semana de gestação, uma porção de epitélio inicia uma pequena invaginação a partir da cavidade celômica, em frente ao gubernáculo, penetrando lentamente em sua substância mesenquimal. Esta evaginação ocorre bilateralmente e é considerada o primórdio do processo vaginal (figura 2.3). Alguns autores consideram este fenômeno como “ativo”, envolvendo a invasão do gubernáculo por células mesoteliais (2), enquanto outros advogam a teoria do divertículo de pulsão, em que o processo seria “passivo” e secundário ao aumento da pressão intra-abdominal (3). O crescimento do processo vaginal divide o gubernáculo em três partes: a) gubernáculo propriamente dito, que corresponde à porção do gubernáculo revestida pela camada visceral do peritôneo do processo vaginal; b) gubernáculo vaginal, que corresponde à porção do gubernáculo que envolve externamente a porção parietal do processo vaginal e c) gubernáculo infravaginal, que corresponde à região caudal do gubernáculo, que

18


Migração Testicular

Figura 2.3: Esquema baseado no trabalho de Backhouse, de 1982, mostrando o gubernáculo e o processo vaginal em desenvolvimento

não foi invadida pelo processo vaginal (18) (Figura 2.4 e Figura 2.5 ). Tanto o gubernáculo como o processo vaginal se modificam em sincronia durante a migração testicular. A manutenção deste mesênquima indiferenciado ao longo do canal inguinal e do escroto é essencial para, chegado o momento adequado, ocorrer a extensão inferior do processo vaginal, que mergulha no trajeto definido e dilatado pelo gubernáculo, formando o canal por onde o testículo chegará ao escroto (2,3) (Figura 2.3 e Figura 2.6).

tôneo por todos os lados, exceto posteriormente, por onde correm os vasos testiculares e o ducto deferente. Macroscopicamente, ele lembra a geleia de Wharton do cordão umbilical. Histologicamente, é constituído por células indiferenciadas de formato alongado, cercadas por grande quantidade de material extracelular, onde não se consegue identificar células musculares lisas ou estriadas (3,19).

ESTRUTURA DO GUBERNÁCULO

A porção proximal do gubernáculo está aderida ao polo inferior do testículo e ao epidídimo (Figura 2.7). Durante a migração testicular,

O gubernáculo é uma estrutura cilíndrica, coberta por peri-

19

PORÇÃO PROXIMAL DO GUBERNÁCULO


Migração Testicular

Figura 2.4: Esquema baseado no trabalho de Wensing de 1988, mostrando o gubernáculo e o testículo. No lado esquerdo do esquema, o gubernáculo foi seccionado longitudinalmente e estão apontadas suas divisões após a formação do processo vaginal. 1 - testículo; 2 - gubernáculo; 2’ - gubernáculo propriamente dito; 2’’ - gubernáculo infravaginal; 2’’’ - gubernáculo vaginal; 3 - processo vaginal e 4 - artéria testicular (estudo feito em porcos).

Figura 2.5: Esquema basedo no trabalho de Backhouse, de 1960, evidenciando as porções do gubernáculo, vistas em cortes transversos (estudo feito em porcos). GPD - porção proximal do gubernáculo; GV - gubernáculo vaginal; PV - processo vaginal; GI - porção inferior do gubernáculo

estas estruturas se movem através do canal inguinal como uma só entidade (3,20). Johansen (19) considera, nesta mesma situação, o gubernáculo proximal como estando sempre aderido à extremidade do processo vaginal. Jackson (21), estudando 60 meninos submetidos à orquiopexia, encontrou o gubernáculo aderido ao

polo inferior do testículo em todos os casos, não citando sua relação com o epidídimo. Estudos mostram que alterações na inserção proximal do gubernáculo estão associadas com anomalias epididimárias e podem contribuir para a ocorrência de criptorquia (22). Attah (6), em uma ex-

20


Migração Testicular

Figura 2.6: Esquema baseado no trabalho de Sadler de 1995, evidenciando o desenvolvimento do processo vaginal e sua relação com o gubernáculo e o canal inguinal durante o período de migração do testículo. A - Feto no segundo mês de gestação; B - Feto no terceiro mês de gestação; C - Sétimo mês de gestação e D - após o nascimento.

periência com ratos, demonstrou a importância da integridade da porção proximal do gubernáculo para a migração testicular. A porção proximal do gubernáculo é importante por unir o testículo à região escrotal e servir como um guia para a migração testicular. Neste estudo, foi realizada uma secção da porção proximal do gubernáculo. Após esse procedimento, ape-

21

nas 26 dos 70 ratos (37%) tiveram a migração testicular completada. Dos ratos que completaram a migração, 24 apresentaram torção testicular. Esse estudo indica que a porção proximal do gubernáculo é importante tanto para orientar a migração testicular, como também para limitar a mobilidade e prevenir a torção do testículo. Abe (22), em um estudo feito em 44 pacientes com criptorquia,


Migração Testicular

A, A

B

B

C C

Figura 2.7: A) Esquema mostrando as relações entre o testículo, o epidídimo e a porção proximal do gubernáculo. T - testículo, E - Epidídimo e G – Gubernáculo. B) Fotografia dos testículos e epidídimos de um feto com 28 semanas pós-concepção, evidenciando a porção proximal do gubernáculo fixada ao testículo e ao epidídimo. C) Fotomicrografia de um feto com 22 semanas pós-concepção, evidenciando a porção proximal do gubernáculo fixada ao testículo e ao epidídimo. Tricrômico de Masson X40.

encontrou epidídimo alongado em 42,5% dos casos. Dos pacientes com epidídimo alongado, foram encontradas alterações na porção proximal do gubernáculo em 73,9% dos casos. Em estudos prévios, feito em fetos humanos, encontramos uma pequena incidência de anomalias epididimárias (2,75%) (9,14). Estudos prévios (23) em 140 fetos

D

E

Figura 2.8: Variações anatômicas da inserção proximal do gubernáculo. Tipo A - gubernáculo está unido ao polo inferior do testículo e ao epidídimo; Tipo B - gubernáculo está unido ao polo inferior do testículo; Tipo C - gubernáculo está unido ao polo inferior do testículo, ocorrendo disjunção total do epidídimo; Tipo D - gubernáculo se encontra unido à cauda do epidídimo e Tipo E - não ocorre inserção da porção proximal do gubernáculo nem com o testículo, nem com o epidídimo, baseado no trabalho de Favorito (23).

humanos foram feitos através da divisão entre as relações da porção proximal do gubernáculo com o testículo e o epidídimo em cinco grupos (Figura 2.8). No grupo A, o gubernáculo estaria unido ao testículo e ao epidídimo; no grupo B, o gubernáculo se encontraria unido apenas ao testículo, ocorrendo anomalia de disjunção epididimária ou epidídimo alongado; no grupo C, o gubernáculo se encontraria unido ao testículo,

22


Migração Testicular

ocorrendo anomalia de disjunção total entre o testículo e o epidídimo; no grupo D, o gubernáculo se encontraria unido apenas à cauda epididimária, ocorrendo também disjunção de epidídimo e, finalmente, no grupo E não haveria união entre a porção proximal do gubernáculo, o testículo e o epidídimo. A incidência de anomalias epididimárias e a distribuição anatômica da porção proximal do gubernáculo nos fetos são evidenciadas na Figura 2.8. Na maioria dos casos (98,9%), encontramos a distribuição anatômica do tipo A, e em 3 fetos visualizamos a configuração do tipo B, sendo as anomalias unilaterais. Não encontramos, nos fetos, as distribuições do tipo C, D e E. Em um dos 3 fetos com anomalia do tipo B, os testículos estavam posicionados no abdômen e o feto tinha 24 SPC; os outros dois fetos, com idades de 29 e 35 SPC, respectivamente, apresentavam os testículos no escroto. PORÇÃO DISTAL DO GUBERNÁCULO O local habitual de inserção do gubernáculo durante a migração testicular é variável. Estudos prévios demonstraram que, no período anterior ao término da migração testicular, o gubernáculo não apresenta fixação firme de sua porção distal na bolsa escrotal (3). Enquanto o testículo se encontra no abdômen, o gubernáculo apresenta uma firme fixação ao canal inguinal (11).

23

O local de inserção da porção distal do gubernáculo seria um dos fatores envolvidos na ectopia testicular (1,24,25). Estudos prévios relatam que a porção distal do gubernáculo apresentaria 6 extensões: abdominal, pubopeniano, femoral, perineal, escroto contralateral e escrotal (1,3,25). Especula-se que esses ramos da porção distal do gubernáculo existiriam durante o início do desenvolvimento fetal e desapareceriam durante o processo de migração testicular (1,3,25). Se algum desses prolongamentos da porção distal persistir, o indivíduo poderá desenvolver testículo ectópico (25). Diversas teorias tentam explicar a ectopia testicular, as mais aceitas são: a) falha no mecanismo de dilatação do canal inguinal pelo gubernáculo, o que faria com que o testículo ficasse livre durante sua migração, propiciando a mobilização excessiva para locais fora do seu trajeto normal (25); b) invasão do gubernáculo pelas fáscias da parede abdominal, próximas ao canal inguinal, o que levaria a um bloqueio na passagem do testículo em direção ao escroto, favorecendo seu desvio para um local ectópico (2) e (c) a existência de inserções distais múltiplas do gubernáculo testicular, que guiariam o testículo para os principais sítios ectópicos (1,3,24). A teoria mais aceita para explicar a ectopia testicular é a existência de inserções distais múltiplas


Migração Testicular

do gubernáculo. Segundo essa teoria, proposta por Lockwood, no século passsado (1), o gubernáculo apresentaria 6 locais de inserção

distal em ordem decrescente de incidência: escrotal, intersticial (abdominal), femoral, perineal, transverso (escrotal contralateral) e pubopeniano (1,24,25) (Figura 2.9).

B

A

C

Figura 2.9: A) Desenho esquemático evidenciando as seis extensões da porção distal do gubernáculo: 1) escrotal, 2) perineal, 3) femoral, 4) intersticial, 5) pubopeniana e 6) escrotal contralateral. T = testículo, G=gubernáculo, baseado no trabalho de Favorito (26). B) Desenho esquemático evidenciando os principais locais de ectopia testicular, que correspondem às inserções distais do gubernáculo. C) Fotografia de feto com 20 semanas de gestação, evidenciando a inserção escrotal do gubernáculo testicular.

24


Migração Testicular

As inserções distais múltiplas do gubernáculo existiriam durante o período fetal e, durante o processo de migração testicular, desapareceriam (1,2,24,25). A ectopia testicular pubopeniana é considerada a mais rara (1,25); no entanto, em trabalhos prévios em fetos, os únicos 2 casos de inserção anômala do gubernáculo estavam localizados na região pubo-peniana (26).

nalmente maiores à medida que o testículo inicia sua descida para o escroto. Simultaneamente, elas aumentam de diâmetro, fato considerado por Heyns (3) como um dos mais importantes para a dilatação do trajeto e passagem do testículo pelo canal inguinal. O crescimento do gubernáculo se dividiria em duas fases, obedecendo a estímulos hormonais distintos (6). Na primeira, haveria um aumento de seu volume e, na segunda, considerada sua regressão, uma diminuição coincidente com a descida completa do testículo (12). Na primeira fase ocorre grande multiplicação celular e acúmulo de glicosaminoglicanos, principalmente o ácido hialurônico, que atua como agente hidrofílico, e eleva a quantidade de água. Há aumento

Modificações estruturais do gubernÁculo durante a Migração testicular As diferentes partes do gubernáculo sofrem mudanças significativas no transcorrer da migração testicular. As porções vaginal e infravaginal tornam-se proporcio-

A

B

Figura 2.10. A) Fotografia de um feto com 20 SPC, evidenciando o aspecto do gubernáculo testicular após a abertura da parede abdominal. T - Testículo; E - Epidídimo; G - Gubernáculo e * - Anel inguinal interno. B) Fotomicrografia do gubernáculo de um feto do segundo trimestre de gestação, evidenciando a estrutura do gubernáculo. As setas demonstram fibras musculares na porção distal do gubernáculo. Tricrômico de Masson, aumento de 40X.

25


Migração Testicular

da substância extracelular, justificando a baixa densidade de células encontrada em alguns pontos (2,12). A presença de mioblastos se intensifica e ocorrem modificações na quantidade e disposição das fibras colágenas e do sistema elástico. (Figura 2.10). Na segunda fase o gubernáculo encolhe, reduzindo seu comprimento e seu volume, sendo normalmente acompanhado pela descida do testículo. Este fenômeno parece ser androgênio dependente e traduz uma grande degradação de glicosaminoglicanos antes acumulados no

Figura 2.11. Fotomicrografia do gubernáculo de um feto do terceiro trimestre de gestação, com o testículo já posicionado no escroto. Observamos a grande condensação estrutural do gubernáculo neste período. Reticulina de Gomori, aumento de 100X.

meio extracelular, com consequente desidratação deste espaço e condensação do gubernáculo (7,12) (Figura 2.11). Embora não se possa fazer uma estimativa quanto ao grau do encurtamento, alguns autores acre-

ditam que ele atue em conjunto com outros fatores, fazendo o gubernáculo tracionar o testículo para o escroto (9). A relação entre a regressão do gubernáculo e a descida testicular parece vital para a compreensão de como se dá o controle androgênico da migração testicular. Estudos demonstram casos onde ocorrem deficiência androgênica, falha na regressão do gubernáculo e criptorquia. Nesta situação, o gubernáculo atuaria como um obstáculo no trajeto da descida do testículo (7). Em estudos de nosso laboratório (27), evidenciamos algumas diferenças entre as porções proximal e distal do gubernáculo. Nos fetos com 15 e 16 semanas pós-concepção visualisamos uma maior quantidade de células musculares na porção distal do gubernáculo, dispostas em grupos isolados, enquanto que na porção proximal do gubernáculo, o tecido muscular está presente em menor quantidade e disposto perifericamente (figura 2.12). Com o aumentar da idade, o tecido muscular diminui em quantidade. Nos fetos com 28 e 29 SPC, a porção distal do gubernáculo apresentava uma grande quantidade de fibras elásticas e quase nenhuma fibra muscular foi evidenciada em toda a sua extensão. No início do período fetal (15 e 16 SPC), quando os testículos ainda se encontram no abdômen, o tecido conjuntivo é frouxo e pobre em colágeno. À medida que a idade gestacional aumenta

26


Migração Testicular

A

B

Figura 2.12 A) Fotomicrografia da porção distal do gubernáculo de um feto do terceiro trimestre gestacional, evidenciando os agregados de fibras musculares estriadas (Setas) nesta região. Tricrômico de Gomori em um aumento de 40X. B) Mesmo gubernáculo em um aumento de 1000X. As setas evidenciam as fibras musculares estriadas.

e o testículo migra da cavidade abdominal, o tecido conjuntivo vai se tornando cada vez mais denso e rico em colágeno (Figura 2.11). Em fetos com 28 e 29 SPC, o gubernáculo apresenta organização

27

muito densa dos feixes de colágeno e predominância de fibroblastos, com nítida orientação direcional de fibras e células. Igualmente, as fibras reticulares, que são dispostas de modo mais frouxo no gubernáculo de fetos no início do período fetal (15 e 16 SPC), apresentam uma disposição bastante densa em gubernáculos de fetos com 28 e 29 SPC. As modificações nos componentes teciduais do gubernáculo durante o período fetal são relatadas em vários estudos experimentais (22,28,29). O tecido muscular parece ser um dos fatores que atuam na tração que o gubernáculo exerce sobre o testículo durante a sua migração (1). Em nosso estudo, observamos que, no início do período fetal estudado, o tecido muscular está presente em maior quantidade e vai diminuindo com o passar do tempo, enquanto que o tecido elástico, presente em pequena quantidade no início do período fetal, aumenta muito em quantidade nos fetos com mais de 25 SPC. Nos fetos com 28 e 29 semanas pósconcepção os testículos já haviam completado a sua migração, estando situados no escroto. Nesse fetos a quantidade de fibras musculares no gubernáculo era muito pequena, enquanto que o tecido elástico estava presente em grande quantidade, principalmente na porção distal do gubernáculo (Figura 2.13). Observamos que, durante o período de migração testicular, o tecido conjuntivo do gubernáculo apresenta um remodelamento gran-


Migração Testicular

de, se tornando, no final da migração essencialmente uma estrutura fibrosa, rica em tecido colágeno e elástico. As alterações teciduais no gubernáculo testicular durante o período fetal sugerem que o gubernáculo parece ter um papel ativo na migração do testículo.

assim vista como uma patologia de múltiplas etiologias. O estudo das modificações estruturais do gubernáculo durante o período fetal humano poderá facilitar a compreensão do verdadeiro papel exercido pelo gubernáculo na migração do testículo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Figura 2.13: Fotomicrografia do gubernáculo de um feto do terceiro trimestre de gestação com o testículo já posicionado no escroto. Observamos a grande quantidade de fibras elásticas em todo o gubernáculo. Coloração de Weigert, aumento de 400X.

No conjunto, as modificações morfológicas da matriz extracelular do gubernáculo devem levar a uma diminuição do volume e do comprimento desta estrutura. Embora não se possa fazer uma estimativa quanto ao grau deste encurtamento, este deve, no entanto, atuar sinergicamente com outros fatores que fazem o gubernáculo tracionar o testículo para o escroto. A descida testicular é, portanto, um evento complexo e multifatorial, e a criptorquia deve ser

1. Heyns CF, Hutson JM: Historical review of theories on testicular descent. J Urol. 1995; 153: 754-67. 2. Backhouse KM: Embryology of testicular descent and maldescent. Urol Clin North Am. 1982; 9: 315-25. 3. Heyns CF: The gubernaculum during testicular descent in the human fetus. J Anat. 1987; 153: 93-112. 4. Sampaio FJ, Favorito LA: Analysis of testicular migration during the fetal period in humans. J Urol. 1998; 159: 540-2. 5. Hadziselimovic F: Mechanism of testicular descent. Urol Res. 1984; 12: 155-7. 6. Attah AA, Hutson JM: The role of intra-abdominal pressure in cryptorchidism. J Urol. 1993; 150: 994-6. 7. Husmann DA, Levy JB: Current concepts in the pathophysiology of testicular undescent. Urology. 1995; 46: 267-76. 8. Levard G, Laberge JM: The fate of undescended testes in patients with gastroschisis. Eur J Pediatr Surg. 1997; 7: 163-5. 9. Favorito LA, Sampaio FJB, Cardoso LED, Costa WS: Mecanismos envolvidos na migração testicular. Braz J Urol. 1999; 25: 409-14. 10. Gill B, Kogan S: Cryptorchidism. Current concepts. Pediatr Clin North Am. 1997; 44: 1211-27. 11. Favorito LA, Toledo Filho JS: Study of testicular migration after treat-

28


Migração Testicular

ment with human chorionic gonadotropin in patients with cryptorchidism. Braz J Urol. 2001; 27: 270-4. 12. Fentener van Vlissingen JM, Koch CA, Delpech B, Wensing CJ: Growth and differentiation of the gubernaculum testis during testicular descent in the pig: changes in the extracellular matrix, DNA content, and hyaluronidase, beta-glucuronidase, and beta-N-acetylglucosaminidase activities. J Urol. 1989; 142: 837-45. 13. Clarnette TD, Hutson JM: The genitofemoral nerve may link testicular inguinoscrotal descent with congenital inguinal hernia. Aust N Z J Surg. 1996; 66: 612-7. 14. Favorito LA, Silva Costa W, Cardoso LEM, Passos MARF: Estudo histoquímico e imuno-histoquímico do sistema elástico e do músculo liso do gubernáculo durante a migração testicular em fetos humanos. Braz J Urol. 1998; 24: 213-7. 15. Elder JS, Isaacs JT, Walsh PC: Androgenic sensitivity of the gubernaculum testis: evidence for hormonal/ mechanical interactions in testicular descent. J Urol. 1982; 127: 170-6. 16. Frey HL, Rajfer J: Role of the gubernaculum and intraabdominal pressure in the process of testicular descent. J Urol. 1984; 131: 574-9. 17. Barthold JS, Kumasi-Rivers K, Upadhyay J, Shekarriz B, Imperato-Mcginley J: Testicular position in the androgen insensitivity syndrome: implications for the role of androgens in testicular descent. J Urol. 2000; 164: 497-501. 18. Wensing CJ: The embryology of testicular descent. Horm Res. 1988; 30: 144-52. 19. Johansen TE, Blom GP: Histological studies of gubernaculum testis taken during orchiopexies. Scand J Urol Nephrol. 1988; 22: 107-8. 20. Beasley SW, Hutson JM: The role of the gubernaculum in testicular

29

descent. J Urol. 1988; 140: 1191-3. 21. Jackson MB, Gough MH, Dudley NE: Anatomical findings at orchiopexy. Br J Urol. 1987; 59: 568-71. 22. Abe T, Aoyama K, Gotoh T, Akiyama T, Iwamura Y, Kumori K: Cranial attachment of the gubernaculum associated with undescended testes. J Pediatr Surg. 1996; 31: 652-5. 23. Favorito LA, Sampaio FJ, Javaroni V, Cardoso LE, Costa WS: Proximal insertion of gubernaculum testis in normal human fetuses and in boys with cryptorchidism. J Urol. 2000; 164(3 Pt 1): 792-4. 24. Scorer CG, Farrington GH: Congenital deformities of the testis and epididymis. London: Butter Worths e Co, 1971. 25. Cromie WJ: Congenital anomalies of the testis, vas epididymis, and inguinal canal. Urol Clin North Am. 1978; 5: 237-52. 26. Favorito LA, Klojda CA, Costa WS, Sampaio FJ: Is there a relationship with anomalous insertions of the distal gubernaculum testis and testicular ectopia? Analysis in human fetuses and patients with cryptorchidism. J Urol. 2003; 170(2 Pt 1): 554-7. 27. Costa WS, Sampaio FJ, Favorito LA, Cardoso LE: Testicular migration: remodeling of connective tissue and muscle cells in human gubernaculum testis. J Urol. 2002; 167: 2171-6. 28. Heyns CF, Human HJ, De Klerk DP: Hyperplasia and hypertrophy of the gubernaculum during testicular descent in the fetus. J Urol. 1986; 135: 1043-7. 29. Heyns CF, Human HJ, Werely CJ, De Klerk DP: The glycosaminoglycans of the gubernaculum during testicular descent in the fetus. J Urol. 1990; 143: 612-7.


Capítulo 3

Embriologia Aplicada Do Pênis

Luciano Alves Favorito Waldemar S. Costa Francisco J. B. Sampaio

EMBRIOLOGIA DO PÊNIS

Perto do final do primeiro mês de gestação o intestino posterior e o futuro sitema urogenital, alcançam a superfície do embrião na região da membrana cloacal, em sua face ventral. A membrana cloacal é dividida por um septo em uma metade posterior , ou anal, e em uma metade anterior, ou membrana urogenital. Três protuberâncias aparecem em torno da membrana urogenital. A mais cefálica é o tubérculo urogenital. As outras duas, as protuberâncias genitais, margeiam a membrana urogenital a cada lado (Figura 3.1). Até este ponto, a genitália masculina e a feminina são basicamente semelhantes (fase indiferenciada) (1,2). Sob a influência da testosterona, em resposta à liberação do hormônio luteinizante pela hipófise, acontece a masculinização da genitália externa. Um dos primeiros sinais de masculinização é o aumento da distância entre o ânus e as estruturas genitais, seguido pelo 30

alongamento do pênis, formação da uretra peniana, a partir do sulco uretral, e desenvolvimento do prepúcio (Figura 3.2). O desenvolvimento do prepúcio se inicia a partir da décima terceira semana de gestação após uma invaginação circular do ectoderma que encobre toda a glande, em torno da vigésima semana de gestação (Figura 3.3) Existem três porções separadas da uretra masculina. A porção acima da abertura do ducto de Wolff (mesonéfrico) forma a uretra até o verumontanum inclusive, utrículo e seio urogenital. A segunda porção forma o segmento que se estende desde o verumontanum até a base da glande. O segmento glandar é formado separadamente. Existe um revestimento endodérmico até o alargamento bulbar do seio uro-genital. A partir deste ponto, a uretra é revestida por ectoderma (1-7). O seio urogenital começa no local de abertura dos ductos de Wolff e Muller

30


Embriologia Aplicada

do

Pênis

A

A

B

C

D

E

F

B

C

FIGURA 3.1: Origem da genitália masculina. A) estágio indiferenciado; B) Alongamento do tubérculo genital, para a formação do pênis; C) Genitália masculina totalmente desenvolvida.

(paramesonéfrico) e estende-se até a membrana uro-genital, que o separa da fossa cloacal acima. O alongamento deste seio acompanha o crescimento do tubérculo urogenital. Sob sua face ventral aparece um sulco longitudinal, que é o indício da segunda porção da uretra (1,2). A placa uretral endodérmica

31

Figura 3.2: Formação da uretra peniana, glande e prepúcio, vista em aspecto ventral. A) Placa uretral aberta; B) Fusão progressiva das dobras da placa uretral; C) Orifício uretral situado na região próxima do sulco coronal; D e E) Fusão das dobras prepuciais com a região da glande; F) Estágio final da formação do prepúcio e da uretra. Baseado em Stephens, 2002 (8).

invade a substância mesodérmica do pênis primitivo, que é coberta pelo epitélio ectodérmico exterior. O sulco uretral impressiona a placa uretral e o ectoderma de revestimento no sulco regride para expor o endoderma da placa uretral. As extremidades dessa placa uretral ficam unidas às margens ectodérmicas do sulco. O sulco aprofunda-se, formando o sulco uretral secundário (definitivo), que é revestido por endoderma e flanqueado pelas dobras uretrais. A uretra endodérmica situa-se dentro do mesoderma, que por sua


Embriologia Aplicada

FIGURA 3.3: Fotomicrografia em corte sagital da porção distal do pênis de um feto com 16 SPC, onde observamos que o prepúcio (P) cobre quase a totalidade da glande (G), à exceção da porção distal (setas).

vez, é envolvido pelo ectoderma. Após a fusão das dobras uretrais, o mesênquima no seu interior forma o corpo esponjoso (6,7). Iniciando próximo ao ânus, as dobras uretrais ectodérmicas fusionam-se sobre a placa uretral para formar a uretra peniana. A uretra distal (no sulco coronal) é a última a fechar-se. O local de fusão das dobras uretrais forma a rafe perineal (Figura 3.1). A goteira uretral fecha-se por envolvimento de suas margens, enquanto a membrana urogenital da fossa cloacal é fechada por detrás, formando um tubo uretral que é aberto na bexiga e na goteira uretral exposta. A

do

Pênis

invaginação epitelial da uretra proximal forma subsequentemente os lobos da glândula prostática (1,2). Aproximadamente ao mesmo tempo, a parede abdominal é fechada anteriormente, e o processo de fusão ventral total é completado em torno da 12a semana (primeiro trimestre). Neste momento, as pregas lábio-escrotais são evidentes e sua fusão na linha média forma a rafe mediana perineal, que se estende desde a região do ânus, através da linha média do escroto até o nível da glande (6,7). O segmento glandar da uretra que irá ser parte da fossa navicular, é formado mais tarde do que a uretra peniana e por um mecanismo diferente. Formandose um sulco na superfície inferior da glande, mas somente sua porção proximal é alcançada pela placa uretral endodérmica. Um tampão de ectoderma da extremidade da glande invade o mesênquima como uma intrusão ectodérmica (Figura 3.4). À medida que o ectoderma penetra na glande, desenvolve-se um lúmen (Figura 3.5). Ao mesmo tempo, as dobras uretetrais envolvem mais a placa uretral. O segmento ventral da intrusão ectodérmica fica situado dorsalmente à extremidade distal da placa uretral que avança (Figura 3.6). As dobras uretrais primárias proliferam e fecham-se sobre o sulco. A intrusão ectodérmica faz contato com a porção final da placa uretral, que forma o teto da

32


Embriologia Aplicada

uretra (Figura 3.6). O novo lúmen ectodérmico fica em continuidade com a porção proximal endodérmica da uretra. Assim, a parede dorsal da fossa navicular é formada de ectoderma e a parede ventral é formada de endoderma. Isto explica porque existe epitélio escamoso estratificado (do ectoderma) na porção mais distal da uretra (6,7). Nas hipospádias, a depressão uretral atrofiada, no local que seria o meato normal, é explicada por anormalidades da intrusão ectodérmica. Visto que esta é a última etapa na formação da uretra existe uma grande incidência de hipospádias com a abertura do meato na região subcoronal (1,2). Nos fetos com 14 semanas pósconcepção, as dobras uretrais ainda não estão fechadas e a placa uretral ectodérmica vacuolizada irá formar a uretra, glandar. Após a fusão das dobras uretrais, o mesênquima, no seu interior, forma o corpo esponjoso. Já nos fetos com 24 semanas pósconcepção, a uretra se encontra em posição definitiva com a fáscia peri-esponjosa e a albugínea formadas, além da presença de artérias cavernosas nos corpo cavernosos (Figura 3.7) EMBRIOLOGIA DO PREPÚCIO O prepúcio é um tecido mucocutâneo especializado, que cobre a glande do pênis e o clitóris. A função do prepúcio é a proteção local contra os efeitos irritantes da

33

do

Pênis

Figura 3.4: Estágio inicial da formação da uretra glandar.

urina e das fezes (8). O prepúcio masculino é formado por uma coalisão de ectoderma, neuroectoderma e mesênquima. Essa formação resulta em uma estrutura pentalaminar composta pelas seguintes camadas: mucosa com epitélio escamoso, lâmina própria, dartos, derme e uma camada cutânea externa (8). O desenvolvimento do prepúcio ocorre no final do terceiro mês de gestação e se completa no quinto mês de gestação em torno da décima oitava semana pós-concepção (1,9). A formação do prepúcio está diretamente relacionada com a formação da


Embriologia Aplicada

do

Pênis

Figura 3.5: Estágio intermediário da formação da uretra glandar.

Figura 3.6: Estágio final da formação da uretra glandar.

glande e da uretra glandar (10). Pacientes com anomalias na formação da uretra apresentam alterações na estrutura do prepúcio. A má-formação uretral mais comum é a hipospádia, com uma incidência de 1/125 a 1/250 nascimentos (11). Na hipospádia, além da posição ectópica do meato uretral, o prepúcio ventral não se desenvolve e os pacientes apresentam um excesso de prepúcio dorsal (Figura 3.8 ) (11). Para analisar a cronologia da formação do prepúcio, estudamos 12

fetos humanos com idade gestacional entre 13 e 19 SPC, peso entre 70 e 340 gramas e comprimento vérticecóccix entre 11 e 18,5 cm. A idade e as medidas de cada feto estudado podem ser vistas na tabela 1. Nos fetos com 13 e 14 SPC, o prepúcio não recobre totalmente a glande peniana. Na Figura 3.9 podemos observar, no feto com 13 SPC, que o prepúcio envolve a porção central da glande. Com 16 SPC, o prepúcio cobre quase que a totalidade da glande, à exceção de sua extremidade distal (Figura 3.3). Nos fetos com 18 e 19 SPC o prepúcio já cobre a glande

34


Embriologia Aplicada

Figura 3.7 – Corte transverso do pênis de feto com 24 semanas pós-concepção mostrando os corpos cavernosos superiormente com as trabéculas e as artérias cavernosas já formadas. Notar a túnica albugínea, em azul mais escuro, com o septo intercavernoso e o corpo esponjoso com a uretra, localizado inferiormente. Tricrômico de Masson X20.

em sua totalidade. O desenvolvimento do prepúcio e a formação do freio prepucial ocorrem junto com o desenvolvimento da uretra glandar. O desenvolvimento do freio prepucial está demonstrado na Figura 3.10. Com 16 SPC o freio do prepúcio ainda não está totalmente formado (Figura 3.10A e B), já nos fetos com 18 SPC, o freio prepucial termina o seu desenvolvimento se fixando na porção ventral da glande (Figura 3.10C e D). Em todos os pênis estudados, observamos a presença da lamela prepucial, um tecido mesenquimatoso que participa ativamente do desenvolvimento do prepúcio e da formação da uretra glandar. A

35

do

Pênis

lamela prepucial está presente em maior quantidade nos fetos onde o prepúcio não completou o seu desenvolvimento. Nos fetos com maior idade, existe uma menor quantidade de tecido mesenquimatoso no espaço prepucial. A Figura 3.11 mostra as características da lamela prepucial durante o segundo trimestre gestacional. Na figura 3.11A observamos a grande quantidade da lamela presente em um feto com 13 SPC; na figura 3.11B evidenciamos um feto com 16 SPC, também com grande quantidade de lamela preenchendo o espaço entre a glande e o prepúcio. Na Figura 3.11 C observamos o pênis de um feto com 16 SPC em corte transverso, cuja lamela prepucial se mistura com a placa uretral. Nesta etapa da formação da uretra glandar, a placa uretral é invadida pelo mesênquima do espaço prepucial, se canaliza e se une com a uretra peniana. Na figura 3.11D em um feto com 18 SPC, observamos a menor quantidade da lamela preenchendo o espaço prepucial. Com 13 SPC o prepúcio cobre a metade da glande; com 16 SPC, cobre quase toda a glande, menos a sua porção distal e, com 18 SPC, ele já se encontra totalmente desenvolvido. As principais características da hipospádia são a ectopia do meato uetral a curvatura em graus variados do corpo do pênis e a formação incompleta do prepúcio na região ventral do pênis (11,12).


Embriologia Aplicada

do

Pênis

Tabela 1: A tabela evidencia as medidas morfométricas e a idade gestacional dos fetos estudados. VC – Comprimento vértice cóccix; CT – Comprimento total do feto; cmcentímetros; G - gramas.

N° feto 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Idade (SPC) 13 14 16 16 16 16 17 17 18 18 18 19

Peso (G) 70 120 195 190 210 210 265 285 310 325 340 310

Figura 3.8 – Fotografia do pênis de um paciente com 2 anos de idade, portador de hipospádia subcoronal. Podemos observar a ausência do prepúcio ventral e a porção dorsal do prepúcio em excesso, o que é característico das hipospádias.

VC (cm) 11 13 14,5 14 15 15,5 16,5 17,5 17,5 18,5 18,5 18

CT (cm) 16,5 18,5 21 20,5 22,5 23 23,5 24,5 25 27 28 27

Figura 3.9: Fotomicrografia do pênis de um feto com 13 semanas pós-concepção (SPC), corado pelo Van Gieson em aumento de 40 vezes. Notar que o prepúcio (P) não cobre a totalidade da glande (G), se estendendo até a porção central da mesma (setas).

36


Embriologia Aplicada

do

Pênis

A

B

C

D

Figura 3.10: Nesta prancha fotográfica podemos observar cortes transversos da região central e distal da glande e do prepúcio fetal, observando a cronologia da formação do freio do prepúcio. A) Fotomicrografia de um feto com 16 SPC, corado pela hematoxilina e eosina, em aumento de 100 vezes. Na porção central da glande, mostrando a placa uretral (UP) e a uretra glandar (*) em formação, o freio do prepúcio (FR) ainda não completou o seu desenvolvimento. B) Fotomicrografia do mesmo pênis fetal da Figura 2A em maior aumento (200 vezes), corada pela hematoxilina e eosina. L – Lamela prepucial; FR – Freio do prepúcio. C) Fotomicrografia de um feto com 18 SPC, corado pelo Van Gieson, em aumento de 40 vezes. A porção central da glande evidencia que tanto o freio prepucial (FR), como a uretra glandar (*), já estão formados. D) Fotomicrografia de um feto com 18 SPC, corado pelo Van Gieson em aumento de 200 vezes, evidenciando o freio prepucial (FR) fixado à glande peniana. L – Lamela prepucial.

Essa associação da anomalia prepucial com a ectopia uretral confirma que o prepúcio e a uretra apresentam um desenvolvimento

37

simultâneo e dependente. Se por qualquer razão a uretra não se fecha, o prepúcio não completa o seu desenvolvimento e não cobre


Embriologia Aplicada

do

Pênis

A

B

C

D

Figura 3.11: Nesta prancha fotográfica, podemos observar as características do tecido mesenquimal (lamela prepucial), que fica localizado entre o prepúcio e a glande (espaço prepucial). A) Fotomicrografia do pênis de um feto com 13 SPC, corado pela hematoxilina e eosina, em aumento de 400 vezes. Notar a grande quantidade de tecido mesenquimal (*) que preenche o espaço entre o prepúcio e a glande do pênis (G). B) Fotomicrografia do pênis de um feto com 16 SPC, corado pelo Van Gieson, em aumento de 400 vezes. Podemos notar também uma grande quantidade da lamela prepucial (l) que fica situada entre o prepúcio (P) e a glande (G) nesta idade. C) Fotomicrografia do pênis de um feto com 16 SPC, corado pelo tricrômico de Masson em aumento de 100 vezes. Podemos observar a grande quantidade de tecido mesenquimatoso (Lamela prepucial – L) que se comunica com a região da placa uretral (UP), ainda não totalmente canalizada. * – Uretra glandar. D) Fotomicrografia do pênis de um feto com 18 SPC, corado pelo Van Gieson, em aumento de 400 vezes, evidenciando a lamela prepucial (L) em menor quantidade. G = Glande; FR = Freio prepucial.

38


Embriologia Aplicada

a totalidade da glande, sendo que, nesses casos, o freio do prepúcio também não se forma (9). A maioria das hipospádias é distal, com o orifício uretral situado na região subcoronal ou na região média da glande (11). Os eventos que levam à formação da porção distal da uretra se estendem do final do primeiro trimestre até o quinto mês de gestação (9,10). A nossa amostra é composta por fetos com idade gestacional entre 13 e 19 SPC, justamente o período mais importante para formação da uretra glandar e do prepúcio. Existem relatos de pacientes portadores de hipospádia com o prepúcio de formato normal, sem alteração de desenvolvimento (13) e existem também relatos de agenesia de prepúcio com formação normal da uretra (14). Essas situações são muito raras, em especial a agenesia de prepúcio (apostia) com a uretra normal, só existindo um caso descrito na literatura (1). O que habitualmente se observa nas hipospádias é que a anomalia uretral está associada à formação incompleta do prepúcio. O freio do prepúcio é um tecido mesenquimatoso, envolvido por epitélio que une o prepúcio com a região ventral da glande (1,9,16). O freio é formado pela união na linha média das dobras frenuloprepuciais. A região do freio prepucial divide a uretra glandar em dois segmentos: o proximal, derivado da uretra peniana,

39

do

Pênis

e o segmento distal, cuja origem é controversa. Existem duas teorias para a formação da uretra glandar, a da intrusão ectodérmica (1) e a teoria da diferenciação endodérmica (17), que é a mais aceita nos dias de hoje. Em nosso estudo, observamos que o freio prepucial não está totalmente formado nos fetos com 16 SPC; no entanto, nos fetos com 18 SPC, o freio prepucial já terminou a sua formação encontrando-se fixo à região ventral da glande, numa fase em que a uretra glandar proximal já terminou o seu desenvolvimento. A lamela prepucial é uma estrutura envolvida ativamente na formação do prepúcio, da glande e da uretra (1,9). Essa estrutura é formada por mesênquima, que preenche o espaço situado entre a glande e o prepúcio (espaço prepucial) e, em certas fases do desenvolvimento, se estende até a região da placa uretral. A lamela prepucial estava presente em todos os pênis fetais de nossa amostra, sendo que, nos fetos com menor idade (13 a 16 SPC), ela está presente em maior quantidade do que nos fetos com idade maior (18 e 19 SPC). Nossos achados parecem sugerir que nos fetos com maior idade gestacional, o espaço situado entre a glande e o prepúcio (espaço prepucial) apresenta uma menor quantidade de tecido mesenquimatoso, o que levaria progressivamente a


Embriologia Aplicada

uma fusão entre o prepúcio e a glande. Essa diminuição do tecido mesenquimatoso prepucial durante o desenvolvimento embrionário poderia explicar o fato de que, ao nascimento, existe uma fusão entre a glande e o prepúcio impossibilitando, na maioria dos casos, a exposição do prepúcio. Com o decorrer do tempo ocorre uma descamação desta fusão epitelial na maior parte dos indivíduos, permitindo a exposição da glande (17). A cronologia da formação do prepúcio no segundo trimestre de gestação que está resumida na tabela 2, é um processo rápido, que dura cerca de cinco semanas e está correlacionado com a formação da uretra glandar. No início do segundo trimestre, no feto com 13 SPC o prepúcio cobre a porção central da glande; com 16 SPC, período em que a uretra glandar está completando a sua formação (1,9,18), o prepúcio já se estende para a porção distal da glande, e nessa fase o freio do prepúcio ainda não está totalmente formado. Nos fetos com 18 e 19 SPC o freio já está formado e o prepúcio cobre a glande peniana em sua totalidade. Na décima terceira semana gestacional o prepúcio envolve apenas a glande até sua região central; o término da formação do prepúcio e do freio do prepúcio ocorre em torno da décima oitava semana gestacional. O tecido

do

Pênis

mesenquimatoso que preenche o espaço prepucial mostrou uma tendência a diminuir nos fetos com maior idade gestacional, levando a uma maior proximidade entre o prepúcio e a glande nos fetos com mais idade. ESTRUTURA DO PÊNIS E URETRA NO PERÍODO FETAL A cavidade do seio urogenital estende-se até a superfície da prega urogenital, formando uma membrana endodérmica linear, em torno da 6ª semana de gestação. Essa membrana é preenchida temporariamente por uma estrutura endodérmica chamada placa uretral, que se desintegra temporariamente para, então, se tornar mais aderida às estruturas da futura genitália. Em embriões masculinos, esta membrana é mais alongada e ampla, enquanto que embriões femininos possuem uma estrutura mais curta e de comportamento mais angulado. O que há em comum entre ambos os embriões é a presença de um broto ectodérmico no fim da placa uretral (1-3). O tubérculo genital alonga-se para formar o falo e um primórdio das glandes clitorianas e penianas é demarcado pela haste fálica, através de um sulco coronal. A aparência da genitália externa é semelhante para embriões de ambos os sexos até a 7ª semana de gestação (5). No 4º mês de gestação, os efeitos da diidrotestosterona nos

40


Embriologia Aplicada

embriões masculinos manifestamse por um aumento da separação do seio urogenital do canal anorretal. As pregas labioescrotais fundem-se medialmente para formar o escroto e as pregas uretrais fundem-se para dar origem à uretra peniana, que se encontra completamente formada Na Décima quarta semana pós-concepção. A uretra distal peniana é formada por uma combinação da fusão das placas uretrais e da interiorização das células ectodérmicas, localizadas no segmento distal da glande peniana. No adulto, esta diferença embriológica manifesta-se pela diferença dos epitélios, encontrados na uretra peniana em seu 1/3 médio e posterior, como sendo um padrão do pseudo- -estratificado, enquanto, que na uretra glandar, manifesta-se por um epitélio escamoso de revestimento. Especula-se que seja necessário um intenso mecanismo de interatividade entre o mesênquima uretral, hormônios

do

Pênis

e neurotransmissores, mediados pela ação dihidrotestosterona (19). Na ausência de di hidrotestosterona o períneo primitivo não se alonga e as pregas labiosescrotais não se fundem na linha média. O falo desloca-se inferiormente, formando o clitóris, e o seio urogenital definitivo tornase o vestíbulo vaginal. As pregas uretrais irão formar os pequenos lábios e os folhetos lábios-escrotais formarão os grandes lábios. Desenvolvimento fenotípico semelhante pode suceder-se em embriões com genótipos masculinos em que ocorra a ausência da 5 alfa redutase, ou naqueles com alterações do metabolismo da testosterona e da di-hidrotestosterona. Também se sabe, atualmente do papel determinante do gene HOX4 para a diferenciação fenotípica do sistema

Tabela 2: Etapas do desenvolvimento do prepúcio, freio prepucial, lamela prepucial e uretra glandar em fetos durante a décima terceira até a décima nona semanas pósconcepção (SPC).

IDADE

PREPÚCIO

13-14 SPC

Cobre porção central da glande

15-17 SPC 18-19 SPC

41

Cobre maior parte da glande Cobre toda a glande

FREIO DO PREPÚCIO

LAMELA

Em formação

Grande quantidade

Não começou Grande a se formar quantidade

Formação completa

Pequena quantidade

URETRA GLANDAR Em formação

Em formação

Formação completa


Embriologia Aplicada

urogenital em masculino (20). O desenvolvimento uretral acompanha-se, em paralelo com o da haste peniana; anatomicamente, a uretra é dividida em dois segmentos principais, o anterior e o posterior. O anterior apresenta um comprimento de, aproximadamente 15 cm e estende-se do meato uretral até a uretra bulbar. A uretra posterior é formada pelos segmentos membranoso e prostático. Possui íntima relação com praticamente todos os órgãos do aparelho genital masculino, compartilhando finalidades reprodutivas e de excreção urinária.

O segmento mais posterior da uretra masculina guarda relação, no seu desenvolvimento embriológico, com o do trígono vesical e da uretra prostática. O segmento anterior da uretra tem seu desenvolvimento intimamente relacionado com o do falo. Como o meato uretral não possui tecido de origem embriológica específica, o desenvolvimento da uretra pendular, em seu estágio inicial, pode possuir dois primórdios uretrais, sendo denominadas placas uretrais que se encontram em fundo cego. A análise da estrutura do pênis e da uretra no feto foi feita através do estudo histoquímico e imuno-histoquímico de pênis de fetos humanos do segundo trimestre

do

Pênis

gestacional e de pênis de fetos com anencefalia (Figura 3.12) (21). Não foram encontradas diferenças na concentração do colágeno em fetos anencéfalos e normais, o que sugere que, no aspecto do tecido colágeno, em específico, o desenvolvimento da haste peniana encontra-se semelhante em ambas as amostras. Estudos prévios de fetos humanos

Figura 3.12 – Fotografia do pênis de um feto do segundo trimestre gestacional.

normais comprovaram que a concentração de colágeno aumentou progressivamente e quase dobrou da 17ª à 33ª SPC, sugerindo que mudanças importantes da matriz extracelular da haste peniana ocorrem neste período gestacional. Tais mudanças seriam relacionadas ao processo erétil (Bastos, 2005).

42


Embriologia Aplicada

Estes resultados corroboram que, conforme ocorre a maturação da genitália fetal, há um aumento gradual na concentração do colágeno, ajustando a distribuição dos elementos da haste peniana para a ereção.

do

Pênis

A concentração das células musculares lisas decresceu com o avanço da maturidade fetal, tanto em fetos normais, quanto anencéfalos. Estes dados foram confirmados com a aplicação do estudo de regressão linear. Uma vez comparando sua

Ta

Ta

Cc

Cc

A

B

C

D

Figura 3.13 - Fotomicrografias demonstrando o tecido conectivo e o tecido muscular liso do pênis fetal. A) Pênis de um feto normal com 20 SPC. O corpo cavernoso (Cc) e a túnica albuginea (Ta) podem ser vistos. Tricrômico de Masson X200. B) Pênis de feto anencéfalo com 21 SPC. O corpo cavernoso (Cc) e a túnica albuginea (Ta) podem ser vistos, com uma distribuição tissular semelhante àdos fetos normais. C) Imunohistoquímica mostrando as células musculares lisas (seta) nas trabéculas cavernosas de um feto normal com 18 SPC. Imunomarcação para Miosina X400. D) Imunohistoquímica mostrando as células musculares lisas (seta) nas trabéculas cavernosas de um feto anencéfalo com 19 SPC. Podemos observar uma distribuição similar aos dos fetos normais. Imunomarcação para Miosina X400.

43


Embriologia Aplicada

densidade de área, houve um aumento não significativo para os fetos de controle em relação aos anencéfalos, o que poderia ser justificado pela menor faixa etária (Figura 3.13). Através do estudo imunohistoquímico e comparando-se a distribuição das células musculares lisas, foi possível observar que nos corpos cavernosos a prevalência destas está na luz dos sinusóides. No corpo esponjoso, as fibras musculares se dirigem mais excentricamente em relação à luz uretral. Esta distribuição divergente poderia ser justificada pela fisiologia de cada estrutura onde, nos corpos cavernosos é necessária uma maior distensibilidade para a manutenção do sangue nestes sinusóides. Nos corpos esponjosos, a distribuição excêntrica destas fibras musculares estaria relacionada ao movimento peristáltico eventual produzido pela uretra (22). Ainda em relação às fibras musculares, mas a diminuição de sua concentração justificase, também, pelo aumento da espessura da túnica albugínea, rica em colágeno, com o avanço da idade gestacional. Na avaliação do corpo esponjoso da uretra, não foram observadas alterações da densidade de área em relação ao colágeno e fibras musculares, uma vez comparados os grupos

do

Pênis

de fetos anencéfalos e de controle. Nas análises de regressão linear não houve mudança da densidade desses tecidos em relação ao avanço da idade gestacional. O epitélio uretral encontravase íntegro nas duas amostras. A marcação da elastina foi positiva para ambas as amostras apenas a partir da 22ª SPC. Todos estes dados legitimam a afirmação de que não houve diferenças evolutivas no desenvolvimento da uretra em fetos anencéfalos, onde este órgão em particular, poderia ser utilizado para futuros modelos de estudo. Não houveram alterações morfoestruturais nas genitálias de fetos anencéfalos quando comparadas aos de controle. Em tese, a fisiologia da ereção e a capacidade uretral em conduzir fluidos ao meio externo estariam mantidas. Estes dados sugerem que, com futuros estudos de biocompatibilidade, a uretra dos fetos ou dos recém-natos anencéfalos poderia ser utilizada na cirurgia reconstrutora uretral, em especial na população pediátrica (Figura 3.14). A preservação da genitália fetal pela exposição do sistema nervoso central ao líquido amniótico sugere que os mecanismos de maturação da genitália masculina seriam apenas dependentes da interação hormonal e molecular. A interação dos receptores estrogênicos e androgênicos em órgãos-alvo independentemente da interação do sistema nervoso central, é bem conhecida em

44


Embriologia Aplicada

do

Pênis

A

B

Figura 3.14 - Fotomicrografias demonstrando o tecido esponjoso e a luz uretral dos pênis

fetais. A) Pênis de um feto normal com 16 SPC. A luz da uretra e o epitélio uretral preservado podem ser observados. Tricrômico de Masson X200. B) Pênis de um feto com anencefalia de 21 SPC. A luz da uretra e o epitélio uretral preservado podem ser observados. Podemos notar que a distribuição tecidual é similar nos dois casos. Tricrômico de Masson X200.

V V

V V A

B

modelos de estudo com ratos (23); porém, estudos com humanos são pouco disponíveis na literatura. O desenvolvimento das fibras elásticas pode ter uma importante participação no mecanismo de

maturação da genitália fetal. A presença de elastina, confirmada através de métodos imunohistoquímicos, a partir da 22ª SPC, sugere que, com o decaimento da concentração das fibras musculares

Figure 3.15 - Fotomicrografias demonstrando a distribuição das fibras elásticas no pênis fetal. A) Imuno-histoquímica demonstrando as fibras elásticas (Setas) no corpo esponjoso de um feto normal com 20 SPC. Imuno-histoquímica para Elastina X400. B) Imunohistoquímica demonstrando as fibras elásticas (marrom) no corpo esponjoso de um feto com anencefalia de 22 SPC. Imuno-histoquímica para Elastina X400.

45


Embriologia Aplicada

decorrente do avanço da faixa etária, as fibras elásticas possuiriam uma participação maior no pool tecidual, estando presente no corpo cavernoso de fetos na 36ª SPC e ainda mais densa e organizada em recém-natos (24) (Figura 3.15). As fibras elásticas aumentam a sua concentração conforme ocorre a distensibilidade tecidual, fornecendo um dado indireto sobre a integridade da capacidade erétil em fetos e recém-nascidos normais. Entendemos que esta é uma séria restrição ao nosso estudo, uma vez que a nossa amostra era composta por fetos do segundo trimestre de gestação. Porém, nossos resultados são úteis para confirmar a manutenção da capacidade erétil no aspecto do desenvolvimento das fibras elásticas, uma vez que o desenvolvimento destas encontrase inalterado nos fetos anencéfalos. Não houve diferença na estrutura entre fetos normais e os enencéfalos. A presença da elastina em fetos a partir da 20ª SPC é um dado objetivo da manutenção da ereção nestes grupos. O aumento do tecido conjuntivo e das fibras elásticas com o decréscimo das fibras musculares no corpo cavernoso sugere que há uma gradual substituição tissular, conforme a maturação fetal ocorre. O desenvolvimento uretral encontra-se inalterado em fetos anencéfalos.

do

Pênis

Deverão ser realizados mais estudos, com a finalidade de avaliarse a compatibilidade tecidual dos fetos anencéfalos com indivíduos normais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Baskin LS: Hypospadias and urethral development. J Urol. 2000; 163: 951-6. 2. Duckett JW, Baskin LS: Hypospadias. In: Adults and Pediatric Urology. Mosby, St. Louis. 1996; pp. 2549. 3. Sadler TW: Langman’s Medical Embryology. 7th Ed., Williams & Wilkins, Baltimore, Maryland. 1995. 4. Moore KL: The Developing human. Clinically Oriented Embryology. Philadelphia, W.B. Saunders. 1977. 5. Maizels M: Normal development of the urinary tract. In: Campbell’s Urology, 6a. ed., New York, Saunders. 1992; pp. 1301. 6. Park JM: Normal and anomalus development of the urogenital system. In: Campbell’s Urology, 8a. ed., New York, Saunders. 2002; pp. 1737. 7. Baskin LS: Hipospadias. Anatomy Embriology and Reconstrutive techniques., Braz J Urol. 2000; 26: 621-9. 8. Sthephens FD, Smith ED, Hutson JM: Congenital anomalies of the kidney, urinary and genital tracts. Martin Dunitz Ltda. 2002. 9. Cold CJ, Taylor JR: The prepuce. BJU Int. 1999; 83(Suppl 1): 34-44. 10. Baskin LS: Hypospadias and urethral development. J Urol. 2000; 163: 951-6. 11. van der Werff JF, Nievelstein RA, Brands E, Luijsterburg AJ, Vermeij-

46


Embriologia Aplicada

Keers C: Normal development of the male anterior urethra. Teratology. 2000; 61: 172-83. 12. Altemus AR, Hutchins GM: Development of the human anterior urethra. J Urol. 1991; 146: 1085-93. 13. Retik AB, Borer JG: Hypospadias. In Campbell´s urology. 8a ed. New York, Saunders; 2002; pp. 2284-333. 14. Baskin LS: Can we prevent hypospadias? J Pediatr Urol. 2007: 3: 420-5. 15. van der Putte SC: Hypospadias and associated penile anomalies: a histopathological study and a reconstruction of the pathogenesis. J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2007; 60: 48-60. 16. Snodgrass WT, Khavari R: Prior circumcision does not complicate repair of hypospadias with an intact prepuce. J Urol. 2006; 176: 296-8. 17. Temiz A, Akcora B: A new term: complete preputial agenesis. J Pediatr Surg. 2007; 42: 1936-7. 18. Sommer JT, Stephens FD: Dorsal urethral diverticulum of the fossa navicularis: symptoms, diagnosis and treatment. J Urol. 1980; 124: 94-7. 19. Kurzrock EA, Baskin LS, Cunha GR: Ontogeny of the male urethra: theory of endodermal differentiation. Differentiation. 1999; 64: 115-22. 20. Moore, Keith L Persaud, T V N

47

do

PĂŞnis

Torchia, Mark G: Before we are born : essentials of embryology and birth defects . 8th ed. Philadelphia, Saunders/Elsevier. 2012. 21. Ravasi T, Suzuki H, Cannistraci CV, Katayama S, Bajic VB, Tan K, et al.: An atlas of combinatorial transcriptional regulation in mouse and man. Cell. 2010; 140: 74452. Erratum in: Cell. 2010; 16;141: 369. Kamburov, Atanas [added]; Kaur, Mandeep [added]; MacPherson, Cameron Ross [added]; Radovanovic, Aleksandar [added]; Schwartz, Ariel [added]. 22. Carvalho JP, Costa WS, Sampaio FJ, Favorito LA: Anencephaly does not cause structural alterations in the fetal penis.J Sex Med. 2012; 9: 735-42. 23. Takaki M, Suzuki H, Nakayama S: Recent advances in studies of spontaneous activity in smooth muscle: ubiquitous pacemaker cells. Prog Biophys Mol Biol. 2010; 102: 129-35. 24. Bastos AL, Silva EA, Silva Costa W, Sampaio FJ: The concentration of elastic fibres in the male urethra during human fetal development. BJU Int. 2004; 94: 620-3.


Capítulo 4

Embriologia Aplicada

da

Bexiga

e do úraco

Luciano A. Favorito Waldemar S. Costa Francisco J. B. Sampaio Embriologia da Bexiga A bexiga fetal é visualizada, aproximadamente a partir da décima semana gestacional, período em que se inicia a produção de urina. Estudos baseados em ultrassonografias relatam que o início da produção de urina durante o período fetal humano pode variar da 11ª até a 16ª semana de gestação (1,2). O aspecto da bexiga fetal e do úraco podem ser observados na Figura 4.1. O desenvolvimento

A

embriológico da bexiga é pouco conhecido, assim como a estrutura da bexiga durante o período fetal humano. A bexiga é formada a partir de células mesenquimais e do endoderma (3). A maior parte da bexiga urinária se origina da parte vesical do seio urogenital, enquanto que a área do trígono é derivada da absorção da região caudal do ducto mesonéfrico na bexiga em desenvolvimento (1,2)

B

Figura 4.1 - A) Fotografia da pelve de um feto fresco, com 20 semanas pós-concepção evidenciando a bexiga e o úraco. B) Fotografia de um feto formolizado com 32 semanas pós-concepção, evidenciando um corte transverso na altura da segunda vértebra sacral, onde podemos observar a posição da bexiga na pelve fetal.

48

48


Embriologia Aplicada

O colágeno e a elastina são componentes importantes da parede da bexiga, que participam do seu funcionamento. O colágeno proporciona resistência de tensão; em vez de, um acúmulo excessivo pode inibir a contratilidade da bexiga e a condução dos impulsos elétricos através da parede. A elastina, obviamente, proporciona, ao tecido elasticidade e pode ajudar na complacência. A quantidade de colágeno é aumentada na obstrução crônica de bexiga nos adultos humanos. Porém, um estudo sobre a obstrução de bexiga fetal humana mostrou que, embora a quantidade total de colágeno tenha aumentado, ela é proporcional à quantidade de músculo, o qual aumenta, também em resposta à obstrução (3,4). A bexiga fetal humana passa por uma série de transformações em seu desenvolvimento da décima terceira até a vigésima primeira semana gestacional, finalmente adquirindo um urotélio típico e uma camada muscular bem desenvolvida. Até a decima primeira semana gestacional, a parede da bexiga é formada por mesênquima e este, gradualmente, amadurece em tecido conjuntivo frouxo. O colágeno torna-se aparente por volta da décima terceira semana gestacional (3-5). No tecido muscular, o papel do colágeno é proporcionar sustentação, da mesma forma que os tendões no tecido esquelético. Desta maneira, como o músculo liso

49

da

Bexiga

não apresenta tendões, necessita de uma maior quantidade de colágeno. Se todo o colágeno for removido do tecido muscular liso, sua força de ativação será reduzida. De maneira interessante, o acúmulo anormal de colágeno encontrado em bexigas obstruídas pode diminuir a contratilidade muscular, além de afetar a complacência da bexiga (6,7). O músculo detrusor da bexiga é um dos que apresentam as camadas mais espessas de músculo liso. Ele é responsável pela principal função da bexiga, ou seja, armazenamento e eliminação da urina. Em algumas condições patológicas, como a HPB, válvulas posteriores de uretra, espinha bífida e danos no cordão espinhal, a organização e a função do músculo detrusor são profundamente alteradas. Essas alterações levam a complacência anormal de bexiga e subseqüente pressão intravesical elevada, a qual não sendo tratada ocasiona danos renais (8). Estrutura da Bexiga Fetal Para analisar a estrutura da bexiga fetal, estudamos 40 bexigas (20 do sexo masculino e 20 do sexo feminino) de fetos humanos normais, formolizados com causa mortis não relacionada ao sistema urogenital. Os fetos estavam em bom estado de conservação e não apresentavam más-formações congênitas aparentes. A idade dos


Embriologia Aplicada

mesmos era calculada em semanas pós-concepção (SPC), através da medida do tamanho do maior pé, com a utilização de um paquímetro de precisão. O tamanho do maior pé é considerado como o parâmetro mais fidedigno para o cálculo da idade gestacional (9-13). Também eram aferidos o comprimento total do feto e o comprimento vérticecóccix, com uma fita métrica, e o peso fetal com uma balança analítica de precisão. Todas as medidas foram feitas pelo mesmo examinador. Em seguida, as regiões abdominal e pélvica do feto eram cuidadosamente dissecadas, com o auxílio de um microscópio estereoscópico com aumento de 2,5X. A bexiga fetal era retirada juntamente com os rins e os ureteres. As bexigas eram separadas em duas partes, uma para as análises histológicas e outra para as análises bioquímicas. Para as análises histológicas, o material passou por processamento de rotina onde foi desidratado em banhos sucessivos de álcool, diafanizado em xilol e incluído em parafina. A partir daí, foram feitos cortes de 5 µm de espessura com intervalo de 200 µm entre eles. Através de métodos histoquímicos e imuno-histoquímicos foram estudados os seguintes componentes estruturais da bexiga: tecido muscular, tecido conjuntivo, fibras do sistema elástico e colágeno. Para a histoquímica os cortes foram

da

Bexiga

corados com Hematoxilina e Eosina para a verificação da integridade do material, Tricrômico de Masson para a observação e quantificação do tecido conjuntivo e do tecido muscular, Resorcina Fucsina de Weigert, com prévia oxidação pela oxona para a observação das fibras do sistema elástico. O tecido conjuntivo, o tecido muscular e as fibras do sistema elástico foram quantificados através de método estereológico. Eram corados cinco diferentes cortes, seguindo o mesmo intervalo de 200 µm. De cada corte, eram selecionados aleatoriamente cinco campos, e estes eram fotografados em um microscópio Olympus BX51, através de uma câmera Olympus DP70 acoplada a ele. As imagens eram capturadas para o software Image Pro e, após serem fotografadas eram analisadas através do software Image J. Neste software os tecidos conjuntivo e muscular eram quantificados por um sistema de contagem de pontos para a determinação da densidade volumétrica (Vv) de cada componente. As análises estatísticas foram feitas utilizando o teste T não pareado (p<0.05). Não foram observadas fibras do sistema elástico na matriz extracelular de nenhum dos fetos estudados. As fibras foram observadas apenas nos vasos sanguíneos. (Figuras 4.2). Quando correlacionamos a idade gestacional

50


Embriologia Aplicada

da

Bexiga

muscular. Quanto maior a idade gestacional, maior a quantidade de tecido muscular. Nenhum tipo de correlação foi observado nos fetos do sexo masculino. A imunohistoquímica mostrou uma grande quantidade de colágeno III em ambos os sexos, sem diferença aparente (Figura 4.4). Figura 4.2: Fotomicrografia da bexiga de um feto com 22 semanas pós-concepção, mostrando a presença de fibras do sistema elástico apenas na parede dos vasos da bexiga (seta). Resorcina Fucsina de Weigert com prévia oxidação X400.

com a quantidade de tecido muscular, não observamos nenhum tipo de correlação (r = 0.3211). Não foi observado em qualquer tipo de correlação entre o tecido conjuntivo e a idade gestacional (r = -0.5520). Não foram observadas dif e r e n ç a s estatisticam ente s i g n i fica tiva s com r elação a o tecido conjuntivo e ao tecido muscular quando os comparamos entre os sexos masculino e feminino. Nos fetos do sexo feminino,, foi observada uma correlação negativa entre a quantidade de tecido conjuntivo e a idade gestacional (Figura 4.3). Quanto maior a idade gestacional, menor a quantidade de tecido conjuntivo. Nos fetos do mesmo sexo, observou-se, também, uma correlação positiva entre a idade gestacional e o tecido

51

Embriologia e Estrutura do Úraco O úraco é uma estrutura fibrosa, derivada da involução do alantóide, que se estende do ápice da bexiga até o umbigo (14) (Figura 4.5). O úraco, após o nascimento, varia de 3 a 10 cm de comprimento e de 8 a 10 mm de diâmetro (15). É uma estrutura tubular, contendo 3 camadas: a mais interna, formada por epitélio de transição, a intermediária, de tecido conjuntivo e a mais externa de tecido muscular que é continuada com o músculo detrusor (16). Entre o quarto e o quinto mês de desenvolvimento fetal, a bexiga, que se situava próxima à região umbilical, migra até a pelve, indo se posicionar próximo ao púbis (14). Durante esse processo de migração da bexiga, a luz do úraco se estreita e, progressivamente se fecha, tornando-se um cordão fibromuscular, que une a cúpula da bexiga à cicatriz umbilical (14). Após o nascimento, essa estrutura vestigial passa a ser denominada de ligamento umbilical mediano (14).


Embriologia Aplicada

A

B

A

B

da

Bexiga

Figura 4.3 - A) Fotomicrografia mostrando a distribuição do tecido conjuntivo e do tecido muscular na bexiga de um feto do sexo masculino com 18 semanas pós-concepção. Tricrômico de Masson, 400x. B) Fotomicrografia mostrando a distribuição do tecido conjuntivo e do tecido muscular na bexiga de um feto do sexo feminino com 19 semanas pós-concepção. Tricrômico de Masson, X400.

Figura 4.4 - A) Fotomicrografia da imuno-histoquímica para colágeno tipo III. Bexiga de um feto do sexo masculino com 18 semanas pós-concepção, X400. B) Fotomicrografia da imuno-histoquímica para colágeno tipo III. Bexiga de um feto do sexo feminino, X400. Podemos observar que não há diferença aparente na distribuição do colágeno III entre os sexos.

O momento exato do fechamento da luz do úraco, bem como as dimensões deste lumen, não são conhecidos. As anomalias do úraco são raras, com uma incidência de 1:5000 nascimentos, sendo mais comuns no sexo masculino e geralmente

detectadas ao nascimento (14Essas anomalias podem 16). estar associadas com outras malformações urogenitais, incluindo o refluxo vesico-ureteral lesões ureterais obstrutivas, ectopia renal cruzada e hipospádia. As anomalias uracais mais comuns são: a patência

52


Embriologia Aplicada

da

Bexiga

anomalias uracais. Os estudos sobre a estrutura e a embriologia do úraco são raros (8). O conhecimento do momento preciso do fechamento da luz do úraco é inédito na literatura. Metodologia para estudo do Úraco

Figura 4.5: Fotografia do bloco urogenital de um feto masculino com 25 semanas pós-concepção. Podemos observar a localização do úraco (*).

total do úraco com fístula umbilical; patência parcial do úraco; a dilatação cística e a formação de divertículos uracais (17,18). Na população adulta, os tumores malignos de úraco são raros e se formam principalmente a partir do epitélio, sendo o adenocarcinoma o tumor mais frequente (18). Os homens são afetados por câncer de úraco duas vezes mais que as mulheres e cerca de 33% ocorrem em pacientes com menos de 55 anos (18). O conhecimento da estrutura e do desenvolvimento do úraco é importante para a compreensão das

53

Foram estudados 40 úracos, obtidos da cúpula vesical de 40 fetos, humanos (20 do sexo masculino e 20 do sexo feminino), com causa mortis não relacionada ao sistema urogenital. Após as medidas morfométricas, as regiões abdominal e pélvica do feto eram cuidadosamente dissecadas, com o auxílio de uma lupa estereoscópica com aumento de 2.5X. A bexiga fetal era retirada assim como os rins e os ureteres. A cúpula vesical, juntamente com o úraco e as artérias umbilicais, era separados da bexiga e fixados em solução de Bouin por 48 a 72 horas. O material era, então, processado por métodos histológicos de rotina e embebido em parafina, para a realização de cortes de 5 µm de espessura. Foram analisados, através de métodos histoquímicos, imuno-histoquímicos e bioquímicos, os components estruturais do úraco: tecido muscular, fibras do sistema elástico e colágeno. O tecido conjuntivo, o tecido muscular e as fibras do sistema elástico foram quantificados através


Embriologia Aplicada

de um método estereológico. Eram coradas cinco lâminas, seguindo o mesmo intervalo de 5 µm de espessura. De cada lâmina eram selecionados, aleatoriamente cinco campos, e, estes eram fotografados em um microscópio Olympus BX51 e através de uma câmera acoplada Olympus DP70, as imagens eram automaticamente transferidas para o programa Image J Pro, instalado em um microcomputador. Após serem fotografadas, as imagens eram analisadas através de tal programa. Neste programa as

Figura 4.6 - Fotomicrografia do úraco fetal demonstrando as técnicas de quantificação utilizadas no trabalho. Fotomicrografia do úraco de um feto com 14 SPC, em corte transverso, ilustrando a quantificação da luz do úraco (área em amarelo) feita pelo programa image J. Tricrômico de Masson X200.

fibras do tecido conjuntivo e do tecido muscular eram quantificadas por um sistema de contagem de pontos para determinação da densidade volumétrica (Vv) de cada componente. Já a área da luz do úraco era determinada pelo

da

Bexiga

contorno de todo o seu epitélio (Figura 4.6). Para a realização da imunohistoquimica foram utilizadas laminas silanizadas para uma melhor fixação do tecido. Foram utilizados os seguintes anticorpos: alfa-actina para a observação de miofibroblastos, anticorpo anticolágeno I e III, para análise do colágeno, e anti-elastina para a observação de fibras elásticas. Os fetos estudados apresentaram idade gestacional entre 13 e 20 SPC, peso entre 60 e 455 gramas e comprimento vértice-cóccix entre 7.3 e 19.3 cm. Sistema Elástico Não foi observada a presença de fibras do sistema elástico em nenhum úraco dos fetos estudados. Na figura 4.7, podemos observar uma fotomicrografia do úraco e das artérias umbilicais, coradas pela técnica de Weigert. As fibras elásticas são bem visualizadas na parede arterial e não são identificadas no úraco. Tecido conjuntivo O úraco tem uma quantidade maior de tecido conjuntivo em relação ao tecido muscular, tanto nos fetos masculinos, quanto nos femininos. Foi observada uma maior quantidade de tecido conjuntivo nos fetos do sexo feminino quando comparados aos do sexo masculino e esta diferença foi

54


Embriologia Aplicada

estatisticamente significativa (p = 0.0439). Ao compararmos a idade gestacional com a quantidade de tecido conjuntivo, observamos que, em ambos os sexos, existiu uma correlação positiva (fetos femininos: r = 0.9368; fetos masculinos: r = 0.1846), o que indica que quanto maior a idade gestacional, maior é a quantidade de tecido conjuntivo.

Figura 4.7 - Análise das fibras elásticas do úraco. Fotomicrografia de um feto com 13 SPC. Observamos o úraco e sua luz (U) e artéria umbilical em corte transverso e notamos que não houve marcação de fibras elásticas no úraco. Observamos a artéria umbilical com a presença de fibras elásticas (seta) em sua luz. Weigert X100.

Tecido Muscular Os fetos do sexo masculino apresentaram quantidade maior de músculo liso quando comparados com os fetos do sexo feminino, porém a diferença não foi estatisticamente significativa (p = 0.1475) (Figura 4.8). Ao compararmos a idade gestacional com a quantidade de tecido

55

da

Bexiga

muscular observamos que este diminui nos fetos com mais idade (fetos femininos: r = -0.8280; fetos masculinos: r = -0.6324). No entanto só observamos correlação inversa nos fetos do sexo feminino. Dessa forma, nos fetos do sexo feminino, quanto maior a idade gestacional, menor a quantidade de tecido muscular. Colágeno Nos fetos mais jovens ocorreu a predominância de colágeno tipo III (cor verde no picrosírius e marrom na imuno-histoquímica) e, nos fetos, mais velhos a predominância do colágeno tipo I (cor vermelha no picrosírius) (Figura 4.9). Concentração total de colágeno no úraco masculino (31919 µg/mg to 56792µg/mg, média=45656 µg/mg), e no feminino (33485 µg/mg to 48527 µg/mg, média=42308 µg/mg) não divergindo significativamente (p=0.5912). Nos fetos femininos, a concentração do colágeno total aumenta com a idade: já no úraco dos fetos masculinos, não ocorreu correlação com a idade. Luz do Úraco Quando comparamos a idade gestacional com a área do úraco, observamos uma correlação positiva nos fetos masculinos e femininos. Quanto maior a idade, menor era a luz do úraco (Figura 4.10A e B). A área da luz do úraco variou de 1676 µm2 (feto com 17 SPC) a 16301 µm2 (feto com 13 SPC). A luz do úraco


Embriologia Aplicada

A

da

Bexiga

B

Figura 4.8 - Análise do tecido muscular liso do úraco. A) Fotomicrografia do úraco de um feto feminino com 15 SPC. Podemos observar uma grande quantidade de tecido muscular liso (em vermelho). Masson X200. B) Fotomicrografia do úraco de um feto feminino com 20 SPC. Podemos observar a nítida diminuição na concentração de tecido muscular. Masson X200.

estava fechada nos fetos com mais de 18SPC. O epitélio de transição do úraco era bem identificado nos fetos até 17SPC, que tinham a luz uracal aberta (Figura 4.10C). Nos fetos com 18SPC ou mais, onde a luz uracal se encontrava fechada, o epitélio do úraco não foi visualizado (Figura 4.10D). Considerações sobre o Desenvolvimento do Úraco O alantoide surge no décimo sexto dia do período embrionário, como uma estrutura tubular fina derivada do saco vitelino. O alantoide é contínuo com a parede ventral da cloaca, de um lado, e com a parede abdominal (umbigo) do outro. A porção ventral da cloaca origina a bexiga depois da divisão da cloaca pelo seto urogenital;

portanto, inicialmente, a bexiga se estende até o umbigo (17). Com o crescimento da bexiga e sua posterior descida até a pelve, sua conexão apical ao alantoide permanece, originando o úraco, uma estrutura que, progressivamente, se oblitera com o desenvolvimento da bexiga. Existem controvérsias sobre a exata contribuição do alantoide e da porção ventral da cloaca na formação do úraco (19). O momento preciso do fechamento do úraco é controverso, sendo relatado entre a décima quinta e a vigésima semana pósconcepção (15-19). No entanto nenhum trabalho cita com exatidão a partir de qual semana gestacional a luz do úraco encontra-se obliterada. Em nossa amostra, nos fetos com menos de 16 SPC, o úraco apresentava sua luz patente e com área maior do que 8000 µm2 . Todos os fetos estudados com

56


Embriologia Aplicada

A

da

Bexiga

B

C

Figura 4.9: Análise dos tipos de colágeno do úraco fetal. A) Fotomicrografia do úraco de um feto com 13 SPC. Observamos a predominância de colágeno tipo III (cor verde). Picrosirius mancha reduzida X200. B) Fotomicrografia do úraco de um feto com 15 SPC evidenciando a grande concentração de Colágeno tipo III (cor marrom) nesta idade. Imunohistoquímica com anticorpo anti-colágeno III Reduzido X400. C) Fotomicrografia do úraco de um feto com 18 SPC, demonstrando a predominância do colágeno tipo I (cor vermelha). Picrosirius X200.

mais de dezessete SPC, tinham a luz do úraco obliterada, tanto no sexo masculino quanto no sexo feminino. A partir da 17ª SPC, quando a luz do úraco encontravase fechada, observamos uma diminuição do tecido muscular do úraco em ambos os sexos e uma maior quantidade de colágeno tipo I

57

no úraco a partir desta idade. Outra modificação que ficou evidenciada foi em relação ao epitélio de transição. Todos os fetos com mais de 17 SPC e que já tinham a luz do úraco fechada não apresentavam o epitélio de transição. No fetos com menor idade gestacional, o epitélio de transição era bem evidenciado


Embriologia Aplicada

A

B

C

D

da

Bexiga

Figura 4.10: A prancha fotográfica analisa a luz e o epitélio do úraco no período gestacional estudado. A) Fotomicrografia do úraco de um feto de 14 SPC, em corte transverso. Podemos observar a luz do úraco patente. Masson X200. B) Fotomicrografia do úraco de um feto de 17 SPC, em corte transverso. Notar que a luz do úraco está se fechando. Masson X200. C) Fotomicrografia do úraco de um feto de 14 SPC, em corte transverso. Podemos observar a presença do epitélio de transição na luz do úraco. Masson X1000. D) Fotomicrografia do úraco de um feto de 20 SPC, em corte transverso. Observamos que a luz do úraco se encontra totalmente obliterada e sem a presença do epitélio de transição. Masson X1000.

em toda a extensão do úraco. Essas alterações estruturais são sugestivas de uma modificação tecidual que originará um tecido fibrótico. Em nossa amostra, observamos que ocorreu uma predominância de colágeno tipo III no úraco dos fetos

mais jovens e uma predominância de colágeno tipo I nos fetos que já apresentavam a luz do úraco fechada. Esse achado confirma que ocorre uma grande modificação tecidual na bexiga fetal antes do fechamento do úraco. Através da quantificação bioquímica observamos

58


Embriologia Aplicada

um aumento nas concentrações de colágeno total nos fetos femininos com maior idade gestacional. Já nos fetos do sexo masculino não observamos uma correlação positiva entre a concentração de colágeno total e a idade. As alterações do sistema elástico estão envolvidas na formação de tecidos fibróticos, no entanto não foi observado em nenhum dos casos estudados em nosso trabalho a presença de fibras do sistema elástico no úraco. Isso pode indicar que este componente da matriz extracelular forma-se apenas a partir do terceiro trimestre gestacional na bexiga fetal. Estudos prévios evidenciaram a presença de fibras do sistema elástico em outros órgãos do sistema genitourinário em fetos humanos (20,21). Bastos (21) observou uma pequena quantidade de fibras do sistema elástico no corpo esponjoso de fetos com 15 SPC. Em fetos com 36 SPC, foram obsrvados trabéculas no corpo esponjoso delimitando um largo espaço vascular. As fibras do sistema elástico eram bem organizadas e desenvolvidas nos fetos mais velhos (21). Esse estudo indica que as fibras do sistema elástico no sistema urogenital fetal são mais evidentes e desenvolvidas no terceiro trimestre gestacional. Nossa amostra era composta de fetos do segundo trimestre gestacional, período onde provavelmente as fibras do sistema elástico ainda

59

da

Bexiga

estão se formando na bexiga fetal. As anomalias do úraco mesmo sendo raras acometem mais indivíduos do sexo masculino que do feminino (22). Em nosso trabalho observamos que existem algumas diferenças estruturais no úraco fetal entre os sexos em uma mesma idade gestacional. A mais relevante diferença estrutural é que a quantidade de tecido conjuntivo é significativamente maior nos fetos do sexo feminino quando comparados aos do sexo masculino. Além disso foi observada apenas no sexo feminino uma correlação positiva entre a quantidade de tecido conjuntivo e a idade gestacional. Isso significa que com o aumento da idade gestacional, ocorria também o aumento da quantidade do tecido conjuntivo no sexo feminino, o que não ocorria nos fetos do sexo masculino. É difícil especular se a menor quantidade de tecido conjuntivo presente nos fetos do sexo masculino poderia explicar a maior incidência de anomalias uracais em pacientes do sexo masculino. Seriam necessários estudos estruturais em pacientes portadores de patologias uracais de ambos os sexos, com a quantificação do tecido conjuntivo nesses pacientes para confirmar essa hipótese. O fechamento da luz do úraco ocorre na 17ª semana pósconcepção. Após o fechamento de sua luz notamos a ausência do epitélio de transição no seu


Embriologia Aplicada

interior, a diminuição na quantidade de tecido muscular e um aumento de colágeno tipo I, o que indica um remodalemento característico na formação de tecidos fibrosos. Não encontramos fibras do sistema elástico em nenhum dos fetos estudados. O úraco dos fetos femininos apresentou uma quantidade de tecido conjuntivo significativamente maior quando comparado com os fetos masculinos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sulak

2. 3.

4.

5.

6.

O, Cankara N, Malas MA, Koyuncu E, Desdicioglu K: Anatomical development of urinary bladder during the fetal period. Clin Anat. 2008; 21: 683-90. Yiee J, Wilcox D: Abnormalities of the fetal bladder. Semin Fetal Neonatal Med. 2008; 13: 164-70. Kim KM, Kogan BA, Massad CA, Huang YC: Collagen and elastin in the normal fetal bladder. J Urol. 1991; 146: 524-7. Newman J, Antonakopoulos GN: The fine structure of the human fetal urinary bladder. Development and maturation. A light, transmission and scanning electron microscopic study. J Anat. 1989; 166: 135-50. Jost SP, Gosling JA, Dixon JS: The morphology of normal human bladder urothelium. J Anat. 1989; 167: 103-15. Sebe P, Fritsch H, Oswald J, Schwentner C, Lunacek A, Bartsch G, et al.: Fetal

da

Bexiga

development of the female external urinary sphincter complex: an anatomical and histological study. J Urol. 2005; 173: 1738-42; discussion 1742. 7. De La Rosette J, Smedts F, Schoots C, Hoek H, Laguna P: Changing patterns of keratin expression could be associated with functional maturation of the developing human bladder. J Urol. 2002; 168: 709-17. 8. Baskin L, DiSandro M, Li Y, Li W, Hayward S, Cunha G: Mesenchymal-epithelial interactions in bladder smooth muscle development: effects of the local tissue environment. J Urol. 2001; 165: 1283-8. 9. Lissauer D, Morris RK, Kilby MD: Fetal lower urinary tract obstruction. Semin Fetal Neonatal Med. 2007; 12: 464-70. 10. Jung E, Won HS, Shim JY, Lee PR, Kim A, Kim KS: Successful outcome following prenatal intervention in a female fetus with bladder outlet obstruction. Prenat Diagn. 2005; 25: 1107-10. 11. Fägerquist M, Fägerquist U, Odén A, Blomberg SG: Fetal urine production and accuracy when estimating fetal urinary bladder volume. Ultrasound Obstet Gynecol. 2001; 17: 132-9. 12. Chang SL, Howard PS, Koo HP, Macarak EJ: Role of type III collagen in bladder filling. Neurourol Urodyn. 1998; 17: 135-45. 13. Hern WM: Correlation of fetal

60


Embriologia Aplicada

age and measurements between 10 and 26 weeks of gestation. Obstet Gynecol. 1984; 63: 26-32. 14. Mercer BM, Sklar S, Shariatmadar A, Gillieson MS, D’Alton ME: Fetal foot length as a predictor of gestational age. Am J Obstet Gynecol. 1987; 156: 350-5. 15. Platt LD, Medearis AL, DeVore GR, Horenstein JM, Carlson DE, Brar HS: Fetal foot length: relationship to menstrual age and fetal measurements in the second trimester. Obstet Gynecol. 1988; 71: 526-31. 16. Costa WS, Sampaio FJ, Favorito LA, Cardoso LE: Testicular migration: remodeling of connective tissue and muscle cells in human gubernaculum testis. J Urol. 2002; 167: 2171-6. 17. Favorito LA, Cardinot TM, Morais AR, Sampaio FJ: Urogenital anomalies in human male fetuses. Early Hum Dev. 2004; 79: 41-7. 18. Liu W, Li Y, Cunha S, Hayward G, Baskin L: Diffusable growth factors induce bladder smooth muscle differentiation. In Vitro Cell Dev Biol Anim. 2000; 36: 476-84. 19. Viana R, Batourina E, Huang H, Dressler GR, Kobayashi A, Behringer RR, et al.: The development of the bladder trigone, the center of the antireflux mechanism. Development. 2007; 134: 3763-9. 20. David TJ, McCrae FC, Bound JP: Congenital malformations associated with anencephaly in the Fylde peninsula of Lancashire.

61

da

Bexiga

J Med Genet. 1983; 20: 338-41. 21. Knox EG, Armstrong EH, Lancashire R: The quality of notification of congenital malformations. J Epidemiol Community Health. 1984; 38: 296-305. 22. Blatter BM, van der Star M, Roeleveld N: Review of neural tube defects: risk factors in parental occupation and the environment. Environ Health Perspect. 1994; 102: 140-5. 23. Salaman JR: Anencephalic organ donors. BMJ. 1989; 298: 622-3. 24. FIGO Committee for the Ethical Aspects of Human Reproduction and Women’s Health: Anencephaly and organ transplantation. Int J Gynaecol Obstet. 2008; 102: 99. 25. Calzolari F, Gambi B, Garani G, Tamisari L: Anencephaly: MRI findings and pathogenetic theories. Pediatr Radiol. 2004; 34: 1012-6. 26. Cook RJ, Erdman JN, Hevia M, Dickens BM: Prenatal management of anencephaly. Int J Gynaecol Obstet. 2008; 102: 304-8. 27. Stephens FD, Smith ED, Hutson JM: Morphology and embryology of the bladder. In Congenital anomalies of the kidney, urinary and genital tracts. 2a ed. London, Martin Dunitz, 2002; pp. 141-4. 28. Sulak O, Cankara N, Malas MA, Cetin E, Desdicioglu K: Anatomical development of the normal urachus during the fetal period.


Embriologia Aplicada

Saudi Med J. 2008; 29: 30-5. 29. Choi YJ, Kim JM, Ahn SY, Oh JT, Han SW, Lee JS: Urachal anomalies in children: a single center experience. Yonsei Med J. 2006; 47: 782-6. 30. Ashley RA, Inman BA, Sebo TJ, Leibovich BC, Blute ML, Kwon ED, et al.: Urachal carcinoma: clinicopathologic features and long-term outcomes of an aggressive malignancy. Cancer. 2006; 107: 712-20. 31. Okegawa T, Odagane A, Nutahara K, Higashihara E: Laparoscopic management of urachal remnants in adulthood. Int J Urol. 2006; 13: 1466-9. 32. McCrystal DJ, Ewing MJ, Lambrianides AL: Acquired urachal pathology: presentation of five cases and a review of the literature. ANZ J Surg. 2001; 71: 774-6. 33. Nascimento AF, Dal Cin P, Cilento BG, Perez-Atayde AR, Kozakewich HP, NosĂŠ V: Urachal inflammatory myofibroblastic tumor with ALK gene rearrangement: a study of urachal remnants. Urology. 2004; 64: 140-4.

da

Bexiga

34. Begg

RC: The Urachus: its Anatomy, Histology and Development. J Anat. 1930; 64: 170-83. 35. Cabral CA, Sampaio FJ, Cardoso LE: Analysis of the modifications in the composition of bladder glycosaminoglycan and collagen as a consequence of changes in sex hormones associated with puberty or oophorectomy in female rats. J Urol. 2003; 170: 2512-6. 36. Bergman I, Loxley R: Two improved and simplified methods for the spectrophotometric determination of hydroxyproline. Anal Biochem 1963; 35: 1961-5. 37. Cavalcanti AG, Costa WS, Baskin LS, McAninch JA, Sampaio FJ: A morphometric analysis of bulbar urethral strictures. BJU Int. 2007; 100: 397-402. 38. Bastos AL, Silva EA, Silva Costa W, Sampaio FJ: The concentration of elastic fibres in the male urethra during human fetal development. BJU Int. 2004; 94: 620-3. 39. Cilento BG Jr, Bauer SB, Retik AB, Peters CA, Atala A: Urachal anomalies: defining the best diagnostic modality. Urology. 1998; 52: 120-2

62


Capítulo 5

Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada à Hidronefrose Pré-Natal Marcio Luiz de Paula Lobo Luciano Alves Favorito Marcelo Abidu Figueiredo

INTRODUÇÃO As anomalias genitais e urinárias estão entre as mais frequentes malformações congênitas com uma incidência em torno de 0.9 a 4% (1-4). O uso da ultrasonografia pré-natal aumentou muito a precocidade e a qualidade do diagnóstico das malformações geniturinárias. Segundo estudos recentes, em torno de 1% a 2% das ultrasonografias realizadas no período pré-natal demonstram dilatação do sistema coletor renal (5-7). A hidronefrose é a alteração mais comum do trato urinário fetal, estando presente em aproximadamente 50% dos casos das anomalias urogenitais relatados (8). A hidronefrose de significado clínico tem uma incidência de 1/600, enquanto que a prevalência da hidronefrose detectada durante a gestação é de 1/50, o que indica que parte dos pacientes, melhora da hidronefrose com o tempo sem a necessidade de tratamento (9). O diagnóstico de hidronefrose fetal é feito pela ultrasonografia (USG) obstétrica, que utiliza, princi-

63

palmente, os seguintes parâmetros: a) Diâmetro anteroposterior da pelve renal (DAP); b) relação do diâmetro antero-posterior da pelve renal/diâmetro anteroposterior do rim e c) presença de dilatação calicinal (8,10). O DAP é o parâmetro mais utilizado na ultrasonografia para a avaliação da hidronefrose pré-natal (8,10). A ressonância nuclear magnética (MRI) é descrita como um meio alternativo para o estudo do trato urinário fetal (11). Estudos prévios relataram a importância da definição dos limites normais do rim fetal na MRI pré-natal (12), no entanto, ao contrário do que ocorre com a ultrasonografia, não são bem definidos quais os melhores parâmetros da pelve renal fetal que devem ser medidos na MRI para avaliação de hidronefrose. O estudo do crescimento do rim fetal é bem conhecido na literatura (12,13), todavia entanto o estudo dos diâmetros da pelve renal e seu desenvolvimento durante o período fetal humano não é descrito na literatura.


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

O objetivo do presente capítulo é avaliar os diâmetros da pelve renal fetal e fornecer um padrão normativo do seu crescimento durante o segundo trimestre do período gestacional em fetos humanos e correlacionar o desenvolvimento da pelve renal fetal com o crescimento do feto e com o crescimento eo do rim. Também avaliaremos alguns aspectos referentes à histologia da pelve renal durante o período fetal. METODOLOGIA DE ESTUDO Foram estudados 136 rins, obtidos de 68 fetos humanos (37 do sexo masculino e 31 do sexo feminino), com causa mortis não relacionada ao sistema urogenital. Os fetos estavam em bom estado de conservação e não apresentavam malformações congênitas aparentes. A idade dos fetos era calculada em semanas pós-concepção (SPC), através da medida do tamanho do maior pé, com um paquímetro de precisão (14-17). Também eram aferidos o comprimento total do feto e o comprimento vértice-cóccix com uma fita métrica e o peso fetal com uma balança analítica de precisão. Todas as medidas foram feitas pelo mesmo examinador. Após a realização das medidas fetais, a região abdominal e pélvica do feto era cuidadosamente dissecada com o auxílio de uma lupa estereoscópica com aumento

à

Hidronefrose Pré-Natal

de 2.5X. O rim fetal era retirado juntamente com os ureteres, a bexiga e os órgãos genitais (Figura 5.1A). O bloco urogenital era dissecado com a ajuda da lupa estereoscópica (Modelo Vasconcelos SP-BR), sob aumento de 16x / 25x. Após a limpeza do rim, realizamos as seguintes medidas morfométricas: 1- comprimento renal; 2- largura do hilo renal; 3- largura do polo superior do rim; 4- largura do polo inferior do rim e 5- espessura renal. Após a realização das medidas do rim, a pelve renal e os cálices maiores do sistema coletor eram cuidadosamente dissecados, com retirada do parênquima renal, se necessário, ao redor da pelve renal. Nos casos de pelve intrarenal a retirada de parte do parênquima era realizada, para a perfeita identificação da pelve e dos cálices maiores (Figura 5.1B). As seguintes medidas da pelve renal fetal eram aferidas com ajuda da lupa e do paquímetro digital de precisão (calibrado em milímetros) (Figura 5.1C): 1- largura da pelve renal (extremidade mais distal da pelve até a confluência dos cálices maiores) e 2- comprimento (altura) da pelve renal (distância compreendida entre a extremidade mais superior e a mais inferior da pelve) (Figura 5.2). A medida do diâmetro anterposterior da pelve não era possível de ser realizada em virtude da ausência de urina e consequente colabamento das paredes anterior e posterior da pelve renal.

64


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

à

Hidronefrose Pré-Natal

B

A

C

Figura 5.1: A) A figura demonstra o bloco retroperitoneal e pélvico retirado do feto para posterior dissecção, com o auxílio da lupa estereoscópica. B) Pelve renal dissecada para avaliação morfométrica. C) Medida da pelve renal feita com o auxílio de um paquímetro de precisão.

A

B

Figura 5.2: A) Rim fetal com a pelve renal dissecada, evidenciando o local da medida da altura da pelve renal. B) Rim fetal com a pelve renal dissecada, evidenciando o local da medida da largura da pelve renal.

65


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

Foram feitas correlações das dimensões da pelve renal entre os lados direito e esquerdo e entre os sexos, bem como foram feitas correlações entre as dimensões da pelve renal e os parâmetros fetais. Também foram realizadas correlações entre as medidas da pelve renal, o comprimento e a espessura do rim fetal. Os dados foram comparados usando os testes estatísticos ANOVA e teste T (p<0.05). Através de métodos histoquímicos e de microscopia eletrônica, foram estudados os seguintes componentes estruturais da pelve renal: tecido muscular, tecido conjuntivo, fibras do sistema elástico e colágeno. Para a histoquímica, os cortes foram corados com hematoxilina e eosina para a verificação da integridade do material, Tricrômico de Masson para a observação e quantificação do tecido conjuntivo e do tecido muscular, Resorcina Fucsina de Weigert, com prévia oxidação pela oxona para a observação das fibras do sistema elástico. O tecido conjuntivo, o tecido muscular e as fibras do sistema elástico foram quantificados através de método estereológico. Eram corados cinco diferentes cortes, seguindo o mesmo intervalo de 200 µm. De cada corte, eram selecionados aleatoriamente cinco campos e estes eram fotografados em um microscópio Olympus BX51, através de uma câmera Olympus DP70 acoplada a ele. As imagens eram capturadas para o software Image Pro e, após

à

Hidronefrose Pré-Natal

serem fotografadas, eram analisadas através do software Image J. Neste programa os tecidos conjuntivo e muscular eram quantificados por um sistema de contagem de pontos, para a determinação da densidade volumétrica (Vv) de cada componente. RESULTADOS OBTIDOS Os fetos estudados apresentaram idade gestacional entre 12 e 25 SPC, peso entre 60 e 950 gramas e comprimento vértice-cóccix entre 8.5 e 24cm. A média e o desvio padrão das medidas do comprimento, da largura e da espessura dos rins direito e esquerdo em ambos os sexos podem ser vistas na tabela 1. A tabela 2 evidencia a média e o desvio padrão da largura e da altura da pelve renal dos fetos estudados. Análise da Largura e da altura da Pelve Renal Quando comparamos a media da largura da pelve do rim direito masculino (3.61mm) e a média da largura da pelve do rim direito feminino (3.50mm) com suas respectivas medianas, 3.57mm e 3.43mm, observamos que não houve diferença estatística (p = 0.66). Da mesma forma quando comparamos a média da largura da pelve do rim esquerdo masculino (3.54mm) e do rim esquerdo feminino (3,40mm) com suas respectivas medianas, 3.20mm e 3.30mm, também observamos resultados sem significância estatística (p=0.6).

66


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

à

Hidronefrose Pré-Natal

Tabela 1. A tabela evidencia a média e o desvio padrão das medidas renais (comprimento, largura e espessura) dos fetos estudados, em milímetros (mm). RD = Rim direito; RE = Rim esquerdo. Comprimento do rim (mm) Fetos masculinos (n=37) Fetos femininos (n=31)

RD

RE

Largura do rim (mm) RD

Espessura do rim (mm)

RE

RD

RE

17.75±3.54 19.34±10.73

9.47±1.87

18.94±3.59

10.29±2.19 9.63±2.05 8.76±2.02 8.81±2.25

18.77±3.58

9.20±2.04 7.95±2.38 8.06±2.25

Tabela 2. A tabela evidencia a média e o desvio padrão da largura e da altura (comprimento) da pelve renal dos fetos estudados em milímetros (mm). RE = Rim Esquerdo; RD = Rim direito. Largura da pelve renal (mm)

Altura da pelve renal (mm)

RD

RE

RD

RE

Fetos masculinos (n=37)

3.61±1.1

3.54±1.3

4.26±1.1

4.23±1.0

Fetos femininos (n=31)

3.54±0.8

3.40±0.7

4.16±0.95

4.32±0.8

Através da análise de comparação entre as medias da largura da pelve do rim direito e do rim esquerdo masculino, podemos concluir que não existe diferença estatisticamente significante (p = 0.81). Em relação à largura da pelve dos rins do sexo feminino também não encontramos significância estatística com (p=0.63). Posteriormente procedemos à comparação das larguras da pelve entre ambos os sexos, não ocorrendo diferenças significativas. Quando comparamos a media da altura da pelve renal direita

67

masculina (4.26mm) e a media da altura da pelve renal direita feminina (4.16mm) com suas respectivas medianas, 4.27mm e 4.22mm, não houve diferença estatística (p=0.68). Da mesma forma, quando comparamos a media da altura da pelve do rim esquerdo masculino (4.23mm) com a do rim esquerdo feminino (4.32mm) com suas respectivas medianas, 4.20mm e 4.30mm, também encontramos resultados sem significância estatística (p=0.71).


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

Correlação entre as medidas da pelve renal e os parâmetros fetais Realizamos uma análise de regressão linear simples entre a largura e a altura da pelve renal direita e esquerda em ambos os sexos, correlacionando com a idade, o peso e o comprimento fetal. Observamos uma correlação linear positiva entre todos os parâmetros analisados, com valor do r variando entre 0.42 a 0.56 para a largura da pelve renal e entre 0.14 e 0.29 para a altura da pelve renal. Correlação entre as medidas da pelve renal e os parâmetros do rim fetal Realizamos uma análise de regressão linear simples entre a largura e a altura da pelve renal direita e esquerda em ambos os sexos, correlacionando-a com o comprimento e a espessura do rim fetal. Observamos uma correlação linear positiva entre todos os parâmetros analisados, com valor do r variando entre para a largura da pelve renal e entre para a altura da pelve renal. Estrutura da pelve renal fetal Não foram observadas fibras do sistema elástico na matriz extracelular de nenhum dos fetos estudados. As fibras foram observadas apenas nos vasos sanguíneos. Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas com relação ao tecido conjuntivo e ao tecido muscular, quando os com-

à

Hidronefrose Pré-Natal

paramos entre os sexos masculino e feminino. Quanto maior a idade gestacional, menor a quantidade de tecido conjuntivo. Nos fetos do mesmo sexo, observou-se também uma correlação positiva entre a idade gestacional, e o tecido muscular (Figura 5.3). Quanto maior a idade gestacional maior a quantidade de tecido muscular. A Microscopia eletrônica de varredura evidencia a distribuição das fibras colágenas na pelve renal fetal (Figura 5.4). COMENTÁRIOS FINAIS As alterações da morfologia do rim fetal são frequentemente detectadas pela ultrasonografia pré-natal (8,10). A dilatação da pelve renal isolada pode ser um sinal precoce de hidronefrose ou um indicador de outras anormalidades, como duplicidade pieloureteral (7). A hidronefrose é mais frequentemente avaliada pelo sistema de gradação da Sociedade Fetal de Urologia ou pela avaliação do diâmetro anteroposterior da pelve renal no plano transverso (10). O conhecimento dos padrões normais da anatomia renal durante o período fetal, é importante para o acompanhamento do feto durante a gestação e também para o acompanhamento pós-natal da hidronefrose e de outras anomalias renais, evitando um atraso diagnostico e facilitando o tratamento após o parto (18). O acompanhamento do crescimento renal durante a gestação é

68


EStRutuRa

Da

pElVE RENal aplICaDa

À

HIDRoNEFRoSE pRÉ-Natal

A

B

Figura 5.3: A) Fotomicrografia mostrando a distribuição do tecido conjuntivo e do tecido muscular na pelve renal de um feto do sexo masculino com 15 semanas pós-concepção. Tricrômico de Masson. X400. B) Fotomicrografia mostrando a distribuição do tecido conjuntivo e do tecido muscular na pelve renal de um feto do sexo feminino com 17 semanas pós-concepção. Tricrômico de Masson. X400.

Figura 5.4: Fotografia de uma microscopia eletrônica de varredura de uma pelve renal de um feto masculino com 16 semanas pós-concepção, evidenciando a distribuição das fibras do colágeno na pelve renal.

69


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

essencial para a monitorização das anomalias renais (1). O comprimento do rim fetal pode, inclusive, ser utilizado para estimar a idade gestacional (13,19). Estudos avaliando o comprimento longitudinal e transverso do rim fetal durante o período gestacional são bem conhecidos (13,19). Contudo estudos avaliando o desenvolvimento da pelve renal durante o período fetal humano não são relatados na literatura. O período de maior velocidade no crescimento do rim fetal é entre a 14ª e a 16ª semanas pós-concepção (19). É justamente nesse período, nos fetos com menos de 23SPC que existe maior dificuldade na avaliação da pelve renal pela USG (20). Nossa amostra é composta por fetos do segundo trimestre de gestação, período onde o crescimento do rim e consequentemente da pelve renal são mais intensos e suas medidas mais difíceis de serem padronizadas pelos métodos de imagem disponíveis. O método mais utilizado para a análise da hidronefrose pré-natal é a ultrasonografia sendo o DAP o parâmetro mais utilizado para o acompanhamento e estimativa do grau da hidronefrose (7,21). No entanto, apesar de pouco utilizados atualmente, o uso dos diâmetros transverso (largura) e logitudinal (altura) da pelve renal através da USG pré-natal já foram propostos para a análise da hidronefrose fetal, em conjunto com o DAP (22).

à

Hidronefrose Pré-Natal

Existem métodos alternativos para a avaliação do rim fetal durante o período gestacional, como a avaliação do volume da pelve renal através da ultrassonografia tridimensional (23) e a MRI (12,24). A MRI é um método que pode auxiliar muito a USG no estudo do trato urinário fetal (11,12), podendo trazer importantes informações, especialmente nos casos onde existe dificuldade em visualizar o feto pela USG, como no oligohidramnio e na megabexiga (11,25). Ao contrário da USG onde existe um parâmetro bem definido para a avaliação da hidronefrose (DAP), não existem parâmetros mormofétricos bem definidos para avaliar a pelve renal fetal na MRI. A realização das medidas da altura e da largura da pelve renal fetal e a confecção de um padrão normativo do desenvolvimento da pelve renal, feitas neste trabalho talvez possam servir como parâmetro para avaliação da pelve renal fetal na MRI. A medida da DAP não foi possível em nossa mostra, em virtude da ausência de urina nos rins fetais e consequente colabamento das paredes anterior e posterior da pelve renal. No entanto, a realização das medidas da largura e da altura da pelve renal foi realizada sem maiores dificuldades. Observamos que tanto a altura como a largura da pelve renal fetal apresentou correlação positiva com a idade, o peso e o

70


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

comprimento vértice-cóccix do feto. Também observamos uma correlação positiva do crescimento dos parâmetros da pelve renal com o comprimento e a espessura do rim fetal. A altura da pelve renal em nossa amostra, composta por fetos com idade entre 12 e 25SPC apresentam uma média entre 4.16 e 4.32mm, dependendo do lado e do sexo, no entanto sem diferença estatística. A largura da pelve renal apresentou uma média de 3.40 a 3.61mm, dependendo do lado e do sexo, também sem diferença estatística. A medida da DAP superior a 7mm nos fetos com mais de 18SPC, é fortemente indicativa de anormalidade do trato urinário (21). Com base em nossos achados, medidas na altura da pelve renal superiores a 6mm e medidas da largura superiores a 5mm nos fetos com menos de 25SPC devem ser acompanhadas, pois podem ser indicativas de hidronefrose. Essas medidas podem ser úteis para a avaliação da hidronefrose pré-natal, principalmente pela MRI. CONCLUSÃO As medidas da pelve renal apresentaram correlação positiva de crescimento com os parâmetros fetais e as medidas do rim. A altura média (4.16 a 4.32mm) e a largura média da pelve renal (3.40 a 3.61mm), obtidas nos fetos entre 12 e 25SPC, podem servir de parâ-

71

à

Hidronefrose Pré-Natal

metro para a análise do desenvolvimento da pelve renal e a avaliação de hidronefrose por métodos de imagem durante o segundo trimestre de gestação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Wiesel A, Queisser-Luft A, Clementi M, Bianca S, Stoll C; EUROSCAN Study Group. Prenatal detection of congenital renal malformations by fetal ultrasonographic examination: an analysis of 709,030 births in 12 European countries. Eur J Med Genet. 2005; 48: 131-44. 2. Bhat BV, Babu L: Congenital malformations at birth--a prospective study from south India. Indian J Pediatr. 1998; 65: 873-81. 3. Sthephens FD, Smith ED, Hutson JM: Normal Embriology of the upper urinary tract and Kidney, urinary and genital tracts, London : Martin Dunitz Ltda, 2002; pp. 283-92. 4. Favorito LA, Cardinot TM, Morais AR, Sampaio FJ: Urogenital anomalies in human male fetuses. Early Hum Dev. 2004; 79: 41-7. 5. Elder JS: Antenatal hydronephrosis. Fetal and neonatal management. Pediatr Clin North Am. 1997; 44: 1299-321. 6. Eckoldt F, Heinick C, Wolke S, Stöver B, Heling KS: Prenatal diagnosis of obstructive uropathies - positive predictive value and effect on postnatal therapy. Z Geburtshilfe Neonatol. 2003; 207: 220-4. 7. Ismaili K, Avni FE, Wissing KM, Hall M; Brussels Free University Perinatal Nephrology Study Group: Long-term clinical outcome of infants with mild and moderate fetal


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

pyelectasis: validation of neonatal ultrasound as a screening tool to detect significant nephrouropathies. J Pediatr. 2004; 144: 759-65. 8. Dicke JM, Blanco VM, Yan Y, Coplen DE: The type and frequency of fetal renal disorders and management of renal pelvis dilatation. J Ultrasound Med. 2006; 25: 973-7. 9. Riccabona M: Assessment and management of newborn hydronephrosis. World J Urol. 2004; 22: 73-8. 10. Coplen DE, Austin PF, Yan Y, Blanco VM, Dicke JM: The magnitude of fetal renal pelvic dilatation can identify obstructive postnatal hydronephrosis, and direct postnatal evaluation and management. J Urol. 2006; 176: 724-7; discussion 727. 11. Poutamo J, Vanninen R, Partanen K, Kirkinen P: Diagnosing fetal urinary tract abnormalities: benefits of MRI compared to ultrasonography. Acta Obstet Gynecol Scand. 2000; 79: 65-71. 12. Witzani L, Brugger PC, Hörmann M, Kasprian G, Csapone-Balassy C, Prayer D: Normal renal development investigated with fetal MRI. Eur J Radiol. 2006; 57: 294-302. 13. Sampaio FJ: Theoretical kidney volume versus real kidney volume: comparative evaluation in fetuses. Surg Radiol Anat. 1995; 17: 71-5. 14. Hern WM: Correlation of fetal age and measurements between 10 and 26 weeks of gestation. Obstet Gynecol. 1984; 63: 26-32.

à

Hidronefrose Pré-Natal

15. Favorito LA, Sampaio FJ: Anatomical relationships between testis and epididymis during the fetal period in humans (10-36 weeks postconception). Eur Urol. 1998; 33: 121-3. 16. Mercer BM, Sklar S, Shariatmadar A, Gillieson MS, D’Alton ME: Fetal foot length as a predictor of gestational age. Am J Obstet Gynecol. 1987; 156: 350-5. 17. Platt LD, Medearis AL, DeVore GR, Horenstein JM, Carlson DE, Brar HS: Fetal foot length: relationship to menstrual age and fetal measurements in the second trimester. Obstet Gynecol. 1988; 71: 526-31. 18. Woodward M, Frank D: Postnatal management of antenatal hydronephrosis. BJU Int. 2002; 89: 149-56. 19. Vlajkovic S, Vasovic L, DakovicBjelakovic M, Cukuranovic R: Agerelated changes of the human fetal kidney size. Cells Tissues Organs. 2006; 182: 193-200. 20. Anderson N, Clautice-Engle T, Allan R, Abbott G, Wells JE: Detection of obstructive uropathy in the fetus: predictive value of sonographic measurements of renal pelvic diameter at various gestational ages. AJR Am J Roentgenol. 1995; 164: 719-23. 21. Scott JE, Renwick M: Antenatal renal pelvic measurements: what do they mean? BJU Int. 2001; 87: 376-80.

72


Estrutura

da

Pelve Renal Aplicada

22. Gotoh H, Masuzaki H, Fukuda H, Yoshimura S, Ishimaru T: Detection and assessment of pyelectasis in the fetus: relationship to postnatal renal function. Obstet Gynecol. 1998; 92: 226-31. 23. Duin LK, Willekes C, Vossen M, Beckers M, Offermans J, Nijhuis JG: Reproducibility of fetal renal pelvis volume measurement using threedimensional ultrasound. Ultrasound Obstet Gynecol. 2008; 31: 657-61.

73

Ă

Hidronefrose PrĂŠ-Natal

24. Cerwinka WH, Damien GrattanSmith J, Kirsch AJ: Magnetic resonance urography in pediatric urology. J Pediatr Urol. 2008; 4: 74-82; quiz 82-3. 25. Cassart M, Massez A, Metens T, Rypens F, Lambot MA, Hall M, et al.: Complementary role of MRI after sonography in assessing bilateral urinary tract anomalies in the fetus. AJR Am J Roentgenol. 2004; 182: 689-95.


Capítulo 6

Anatomia Aplicada

do

Retroperitônio

Francisco J. B. Sampaio Luciano Alves Favorito

ANATOMIA DO RIM Os rins são órgãos pares, situados no retroperitôneo que repousam na parede posterior do abdômem. Têm uma forma característica, apresentando um polo ou extremidade superior e um polo ou extremidade inferior, uma borda convexa lateralmente e uma borda côncava medialmente. A borda medial tem uma depressão, o hilo renal, que contém os vasos renais e a pelve renal ou bacinete.

mediais e mais posteriores que os polos inferiores (Figura 6.1). O hilo renal está rodado anteriormente sobre o psoas,

POSIÇÃO DOS RINS Como os rins estão colocados na parede abdominal posterior, em contato com o músculo psoas maior a cada lado, os seus eixos longitudinais são paralelos à direção oblíqua do psoas (Figura 6.1). O psoas maior tem forma de cone, portanto os rins também são inclinados posteriormente sobre o eixo longitudinal; assim, os polos superiores são mais

74

Figura 6.1: Vista anterior dos rins em relação ao esqueleto. Os eixos longitudinais dos rins são oblíquos (setas), com os polos superiores mais mediais que os polos inferiores. A linha pontilhada marca o eixo longitudinal do corpo. Notar também que a superfície posterior do rim direito usualmente é cruzada pela 12a costela e a superfície posterior do rim esquerdo é cruzada pela 11a e pela 12a costelas.

74


Anatomia Aplicada

do

Retroperitônio

Figura 6.2: Vista superior de uma seção transversa dos rins ao nível da 2a vértebra lombar. Os rins são angulados entre 30 e 50o, posteriormente ao plano frontal (coronal). PF = Plano frontal do corpo; ER = Eixo frontal (coronal) do rim.

assim as bordas laterais dos rins estão posicionadas dorsalmente. Isso significa que os rins estão angulados entre 30 e 50 graus posteriormente ao plano frontal (Figura 6.2) ENVOLTÓRIOS RENAIS A superfície do rim é coberta por um lâmina de tecido fibroso, a cápsula renal (cápsula renal verdadeira). Cada rim é envolvido por uma massa de tecido adiposo (gordura perirrenal), localizada entre o peritôneo e a parede abdominal posterior (Figura 6.3). A gordura perirrenal é envelopada pela fáscia renal (fáscia renal de Gerota). A fáscia renal é circundada anterior e posteriormente por outra camada de tecido adiposo, muito variável em espessura, chamada

75

gordura pararrenal (Figura 6.4). As camadas anterior e posterior da fáscia renal (fáscia de Gerota) subdividem o espaço retroperitoneal em três compartimentos potenciais: a) o espaço pararrenal posterior, que contém apenas gordura; b) o espaço perirrenal, que contém as glândulas suprarenais, os rins e os ureteres proximais, junto com a gordura perirrenal; c) o espaço pararrenal anterior, que em contraste com os espaços intermediário e posterior, estende-se por meio da linha média de um lado a outro do abdômem e contém os cólons ascendente e descendente, a 2a porção do duodeno e o pâncreas (Figura 6.4) (1). Inferiormente, as camadas da fáscia renal terminam fusionando-


Anatomia Aplicada

A

do

Retroperitônio

B

Figura 6.3: Envoltórios renais. A) Fotografia de um feto fresco, do sexo masculino do terceiro trimestre gestational demonstando a posição do rim no retroperitôneo, em que podemos observar a fáscia renal e a gordura renal por transparência. B) Fotografia de um feto formolizado do segundo trimestre gestacional demonstrando o retroperitôneo onde podemos observar o rim e o ureter esquerdos sendo tracionados através da fáscia renal, que também envolve a glândula supra-renal.

B

A

Figura 6.4: A) Vista lateral de uma seção longitudinal por meio do retroperitôneo. As camadas anterior (A) e posterior (P) da fáscia renal estão indicadas. Pe = Peritôneo; R = Rim. B) Vista superior de uma seção transversa dos rins no nível da 2a vértebra lombar. Os três compartimentos do espaço retroperitoneal são mostrados. P = espaço pararrenal; I = espaço perirrenal intermediário; A = espaço pararrenal anterior.

se fracamente ao redor do ureter (Figura 6.4 e 6.5). Superiormente, as duas camadas da fáscia renal fusionam-se acima da glândula

suprarenal e terminam unidas à fáscia infradiafragmática. Uma camada adicional de fáscia separa a glândula suprarenal do rim (Figura 6.5) (1). Lateralmente, as

76


Anatomia Aplicada

duas camadas da fáscia renal fusionam-se atrás do cólon descendente e do ascendente. Medialmente, a camada fascial posterior é fusionada com a dos músculos espinhais. A camada fascial anterior mistura-se com

Figura 6.5: Vista anterior dos rins e da fáscia renal (fáscia de Gerota). As duas camadas da fáscia renal fundem-se acima da glândula suprarenal e terminam misturando-se com a fáscia infradiafragmática (seta longa). Notar um septo da fáscia separando a glândula suprarenal do rim (seta curta). D = músculo diafragma.

o tecido conjuntivo dos grandes vasos (aorta e veia cava inferior) (Figuras 6.2 e Figura 6.5). RELAÇÕES PARIETAIS DOS RINS Os rins repousam sobre o psoas maior e o músculo quadrado

77

do

Retroperitônio

lombar. Geralmente, o rim esquerdo é mais alto que o direito, sendo a superfície posterior do rim direito cruzada pela 12a costela e a do rim esquerdo cruzada pela 11a e 12a costelas (Figura 6.1). A superfície posterior do diafragma está unida à extremidade da 11a e da 12a costelas (Figura 6.6). Próximo à coluna vertebral, o diafragma está conectado aos músculos da parede posterior do abdômem e forma os ligamentos arqueados medial e lateral de cada lado (Figura 6.6). Desse modo, a superfície posterior

Figura 6.6: Vista inferior da cúpula diafragmática. As setas indicam as fixações do diafragma às extremidades da 11a e da 12a costelas. M = Ligamento arqueado medial; L = ligamento arqueado lateral; ql = músculo quadrado lombar; pm = psoas maior.


Anatomia Aplicada

do

Retroperitônio

do diafragma arqueia-se como uma cúpula sobre o polo superior de ambos os rins (2). RELAÇÕES VISCERAIS DOS RINS

O rim mantém relações com o fígado, o baço e os cólons. A relação do rim com o fígado apresenta importante prática em Urologia e Radiologia. O espaço entre o rim direito e o fígado é chamado de espaço hepato-renal (espaço de Morrison) e é bem visualizado em exames de imagem, principalmente quando existe líquido livre na cavidade abdominal (Figura 6.7). Devido às suas dimensões, o fígado e o baço podem estar posicionados póstero-lateralmente no nível da região surpra-hilar do rim (Figura 6.8). Assim, deve-se dar importância ao fato de que, em Endourologia, o espaço para acesso em uma punção renal alta é muito restrito. Se a punção intrarenal é feita quando o paciente está em inspiração média ou intensa, o risco de lesão do fígado ou do baço é elevado. Esse conhecimento é particularmente importante em pacientes com hepatomegalia ou esplenomegalia (1,2). Nesses casos, deve ser feita uma tomografia computadorizada antes de realizarmos uma punção renal. O cólon ascendente estendese da valva ileocólica até a flexura cólica direita (flexura hepática), onde torna-se cólon transverso. A

A

B

C

Figura 6.7: A) Vista superior de uma secção transversal na altura da primeira vértebra lombar de um cadáver congelado evidenciando a relação entre o rim e o fígado, onde podemos observar o espaço hepato-renal. Podemos visualizar também a relação entre o rim e o cólon direito. B) Vista inferior de uma secção transversa na altura da primeira vértebra lombar evidenciando a relação do rim direito com o cólon, que está localizado anteriormente ao rim. C) Vista inferior de uma secção transversa na altura da segunda vértebra lombar evidenciando a relação do rim esquerdo com o cólon, que está localizado anteriormente e lateralmente ao rim.

78


Anatomia Aplicada

A

B Figura 6.8: A) Vista inferior de uma secção transversal ao nível da região supra-hilar do rim (cadáver congelado). O fígado (F) e o baço (B) são posicionados pósterolateralmente em relação aos rins direito (RD) e esquerdo (RE). B) Secção similar à mostrada em A, realizada no nível da região infra-hilar. Inferiormente, o fígado (F) e o baço (B) são posicionados mais lateralmente em relação ao rim direito (RD) e ao esquerdo (RE).

flexura hepática do cólon (ângulo hepático) repousa anteriormente à porção inferior do rim direito (Figura 6.7B). O cólon descendente estende-se inferiormente à flexura cólica esquerda (flexura esplênica), ao nível da crista ilíaca. A flexura cólica esquerda repousa

79

do

Retroperitônio

ânterolateralmente ao rim esquerdo (Figura 6.7C). É importante considerar a posição retroperitoneal dos cólons ascendente e descendente. Em exames rotineiros de tomografia computadorizada (TC), foi observado o cólon retroperitoneal repousando em uma posição posterolateral ou retrorrenal. Nesses casos, existe um risco aumentado de lesão durante um acesso intrarenal percutâneo. O cólon retrorrenal está relacionado mais frequentemente aos pólos inferiores dos rins (2). Em estudo controlado por TC, o cólon retrorrenal foi observado em 1,9% dos casos, quando o paciente está em posição supina. Entretanto, quando assumia o decúbito ventral (posição mais frequentemente usada para o acesso renal percutâneo), o cólon retrorrenal foi observado em 10% dos casos (3). Assim em todo processo de punção renal, deve-se dar atenção especial ao exame sob fluoroscopia, com o paciente em decúbito ventral, para detectar a presença do colón retrorrenal. O exame fluoroscópico é especialmente importante na região dos polos inferiores dos rins. ANATOMIA VASCULAR A artéria renal é ramo da face lateral da aorta abdominal, se originando cerca de 1,5cm abaixo da artéria mesentérica superior. A artéria renal direita se dirige para o hilo renal e passa posteriormente à


Anatomia Aplicada

A

do

Retroperitônio

B

Figura 6.9: Artéria Renal. A) Fotografia de um feto do terceiro trimestre gestacional evidenciando o retroperitôneo onde podemos observar a artéria aorta abdominal dando origem a uma artéria renal para cada rim. B) Fotografia de um feto do terceiro trimestre gestational, evidenciando o retroperitôneo onde podemos observar a artéria aorta abdominal dando origem a duas artérias renais para o rim direito e uma artéria renal para o rim esquerdo.

veia cava inferior. A artéria renal esquerda é mais curta que a artéria renal direita. As variações da artéria renal principal são muito frequentes. A multiplicidade das artérias renais é mais comum que a multiplicidade das veias. A artéria renal principal também é mais prevalente que quaisquer outras artérias do mesmo calibre. Em uma grande série de pedículos renais analisados, foram encontradas variações da artéria renal em 30% dos casos (4,5).

(Figura 6.9). A artéria renal principal dividese em um ramo anterior e um ramo posterior, após dar origem à artéria suprarenal inferior. Enquanto o ramo posterior, (artéria retropiélica) prossegue como artéria segmentar posterior para suprir o segmento homônimo, sem ramificações significantes, o ramo anterior da artéria renal fornece três ou quatro artérias segmentares. Antes de entrar no parênquima renal, as artérias

80


Anatomia Aplicada

do

Retroperitônio

Figura 6.11: Desenho esquemático de duas pirâmides adjacentes e cálices menores, mostrando a vascularização renal desde o nível das artérias interlobares até o nível glomerular. ai = artéria interlobar (infundibular); aa = artéria arqueada; ail = artéria interlobular; af = arteríola aferente do glomérulo. Figura 6.10: Vista anterior de um desenho esquemático de um rim direito, mostrando os ramos da artéria renal e sua nomenclatura oficial, de acordo com as regiões do rim. AR = artéria renal; as = artéria segmentar; ai = artéria interlobar (infundibular); aa = artéria arqueada.

segmentares dividem-se em artérias interlobares (artérias infundibulares), que cursam adjacentes aos infundíbulos caliceanos e aos cálices menores, penetrando nas colunas renais entre as pirâmides renais (Figura 6.10 e 6.11) (1,2). À medida que as artérias interlobares progridem, próximo à base das pirâmides, elas dão origem (geralmente por dicotomia) às artérias arqueadas. As artérias, arqueadas dão origem às artérias interlobulares, que cursam para a periferia,

81

Figura 6.12: Fotografia de um cadáver formolizado do sexo masculino, mostrando a veia renal esquerda. Podemos observar a veia gonadal, a veia suprarenal esquerda, a artéria aorta abdominal e a artéria renal esquerda, em vermelho. Na figura também podemos ver o ureter esquerdo em amarelo, que apresenta duplicidade.


Anatomia Aplicada

fornecendo as arteríolas aferentes dos glomérulos (Figura 12) (3,4). Diferentemente das artérias, as veias intrarenais não apresentam um padrão segmentar. Além disso, em contraste com o padrão arterial, existe comunicação livre através do sistema venoso, ocorrendo amplas anastomoses entre as veias. Essas anastomoses, portanto, previnem o parênquima renal de congestão e isquemia em caso de lesão venosa. A veia renal direita é curta e geralmente desprovida de tributárias, enquanto a veia renal esquerda apresenta um trajeto mais longo, transitando posteriormente à artéria aorta que, geralmente, recebe três tributárias: as veias gonadal, supra-renal e lombar (2). DRENAGEM LINFÁTICA Os linfáticos intra-renais são divididos em plexo superficial e plexo profundo. O plexo superficial está localizado imediatamente abaixo da cápsula renal e é ligado aos linfáticos corticais. Em condições patológicas (pielonefrite, por exemplo), este plexo pode comunicar-se com um plexo extrarenal, localizado na gordura perirrenal, plexo esse que drena, por sua vez, para linfonodos da aorta na região lombar (6). O plexo profundo é subcortical e também piramidal (localizado mais profundamente). Esses plexos profundos são perivasculares e drenam juntos,

do

Retroperitônio

ao longo dos vasos arqueados e interlobares, convergindo para o hilo renal. Os canais coletores emergem do hilo renal e, se a artéria renal está presente, geralmente o canal linfático seguirá esse vaso. Existem de um a quatro canais linfáticos que emergem do hilo renal, anterior ou posteriormente à veia renal. Tais canais linfáticos podem anastomorsar, apresentando um aspecto plexiforme. Geralmente são periarteriais, formando um plexo anterior, quando proveniente da superfície ventral do rim, ou um plexo posterior, quando da superfície dorsal do rim. Em alguns casos, os canais linfáticos podem conectar-se diretamente a seus linfonodos, sem seguir os ramos arteriais (6). Os canais linfáticos do rim direito podem ser divididos em posteriores, médios e anteriores. Os vasos linfáticos posteriores seguem a artéria renal, posteriormente à veia cava. Tais vasos linfáticos alcançam os linfonodos aórticolombares, que estão localizados imediatamente abaixo da origem da artéria renal. Após, seguem e terminam nos linfonodos cava laterais e seguem o pilar direito do músculo diafragma para alcançar o canal linfático abdominal direito. Os canais linfáticos anteriores, cursando acima dos vasos, drenam nos linfáticos dorsais ou, quando cursam medialmente, terminam nos linfonodos précava. Algumas vezes, podem cruzar a veia cava para alcançar

82


Anatomia Aplicada

Figura 6.13: Vista inferior de um desenho esquemático, de uma secção transversa da região retroperitoneal. Os vasos linfáticos são demonstrados com linhas pontilhadas. Os vasos cursam para os linfonodos aórticos laterais, na região de origem da artéria renal. Notar os linfáticos da região posterior cursando para os pilares do diafragma, de onde podem alcançar os linfáticos do mediastino. VC = veia cava inferior; A = região renal anterior; P = região renal posterior; L2 = 2a vértebra lombar.

os linfonodos interaortocava superiores. Os linfáticos médios cursam entre a veia e a artéria renal, para alcançar os grupamentos linfáticos anterior e posterior (Figura 6.13 e Figura 6.14) (6). Os vasos linfáticos do rim esquerdo podem ser divididos em posteriores e anteriores. Os canais posteriores deixam o hilo renal e cursam dorsalmente aos vasos renais para alcançar os linfáticos do pilar do músculo diafragma. Os canais anteriores, cursando ventralmente à veia renal, alcançam os linfonodos localizados acima ou abaixo da origem da artéria renal, quando drenam o polo superior ou o polo inferior do rim, respectivamente. Existem também linfonodos que se originam no pólo inferior do rim para alcançar os linfonodos localizados na origem da artéria espermática, na

83

do

Retroperitônio

Figura 6.14: Drenagem linfática do rim direito. Os vasos linfáticos anteriores são demonstrados com linhas contínuas; os vasos linfáticos posteriores são demonstrados com linhas pontilhadas. VC = veia cava inferior; Ao = artéria aorta.

Figura 6.15: Drenagem linfática do rim esquerdo. Os vasos linfáticos anteriores são demonstrados com linhas contínuas; os vasos linfáticos posteriores são demonstrados com linhas pontilhadas. VC = veia cava inferior; Ao = artéria aorta.


Anatomia Aplicada

superfície lateral da aorta (Figura 6.13 e Figura 6.15) (6). É importante salientar que, em ambos os lados, a drenagem linfática da região posterior do rim (superfície dorsal) alcança diretamente os linfonodos dos pilares diafragmáticos, em contato com o hiato do nervo esplâncnico. A partir deste ponto, através do diafragma, esses linfáticos drenam nos linfonodos retroaórticos de T11 a L1 (linfáticos do mediastino) (Figura 6.13). Esse detalhe é fundamental na análise da disseminação das metástases do carcinoma de células renais.

do

Retroperitônio

A glândula direita apresenta um formato piramidal, com sua base estando em contato com rim, sua superfície posterior contato com o músculo diafragma e sua superfície anterior em relacionando-se com a área nua do fígado e com a veia cava inferior. A suprarenal esquerda apresenta um formato semilunar e se relaciona posteriormente com o diafragma, anteriormente com o pâncreas, baço e estômago (9).

ANATOMIA DAS GLÂNDULAS SUPRARENAIS As glândulas suprarenais (ou adrenais) são glândulas endócrinas, de coloração amarelada e pequenas, com peso entre 3 e 5 gramas. Durante o período fetal as glândulas suprarenais são muito grandes, apresentando o tamanho de cerca de 1/3 do rim (6.16). Após o nascimento a região cortical apresenta degeneração e a glândula diminui de tamanho. Apresentam duas regiões: o córtex, periférico, responsável pela produção de glicocorticoides e mineralocorticoides e a medula, central, responsável pela produção da adrenalina e noradrenalina (7,8). As glândulas suprarrenais ficam ficam localizadas entre a face superomedial da superfície anterior do rim e o diafragma. São envolvidas pela fáscia renal, estando situadas no espaço perirenal e envoltas por gordura (Figura 6.17).

Figura 6.16: Figura 6.16: Vista posterior do rim (R) e da glândula supra-renal (SR) direita de um feto formolizado do sexo masculino com 24 semanas pós-concepção. Podemos observar que a glândula supra-renal nesta idade gestacionnal é muito grande e corresponde a mais de 1/3 do tamanho do rim fetal. u = ureter.

A suprarenal é irrigada por 3 artérias e drenada por uma única veia. O conhecimento da anatomia vascular das glândulas tem grande interesse prático durante a remoção das mesmas, especialmente nas

84


Anatomia Aplicada

cirurgias laparoscópicas. As 3 artérias que irrigam a suprarenal são: Suprarenal superior, ramo da frênica inferior; suprarenal média, ramo direto da artéria aorta e suprarenal inferior, ramo da artéria

do

Retroperitônio

renal (Figura 6.18). Esta distribuição arterial é a mesma dos 2 lados (9). Existe uma única veia que drena a suprarenal, é a veia suprarenal, que, do lado direito é uma afluente da veia cava inferior e do lado esquerdo drena para a veia renal esquerda (Figura 6.19). A veia suprarenal é relativamente calibrosa e é um dos principais elementos a serem ligados durante as cirurgias de ressecção da glândula (7,8).

A B

Figura 6.17 – A) Desenho esquemático mostrando a relação das glândulas suprarenais (*). Do lado direito está evidenciada a relação da glândula suprarenal com o fígado (F) e com a veia cava inferior (V). Do lado esquerdo podemos observar as relações da glândula com o baço (B) e o Pâncreas (P). D – diafragma. B) fotografia de um corte transverso feito em um cadáver formolizado do sexo feminino na altura da décima segunda vértebra torácica em vista superior, evidenciando as relações da glândula suprarenal direita (seta).

85

Figura 6.18: Desenho esquemático mostrando a irrigação arterial da glândula supra-renal. 1 - Artéria suprarenal superior, 2 – Artéria suprarenal média e 3 – Artéria suprarenal inferior.


Anatomia Aplicada

do

Retroperitônio

Figura 6.19: Drenagem venosa da glândula supra-renal esquerda. VCI – veia cava inferior; VR – veia renal e * - veia suprarenal esquerda

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sampaio FJB. Anatomy of the kidney for endourology. In: Segura JW (ed.). Smith’s textbook of endourology. Part II: Percutaneous surgery. St. Louis: Quality Medical. 1996; pp. 150. 2. Sampaio FJB, Favorito L.A, Rodrigues HC: Anatomia do sistema urinário aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 1, ArtMed, Porto Alegre. 1999. 3. Hopper KD, Sherman JL, Luethke JM, Ghaed N: The retrorenal colon in the supine and prone patient. Radiology. 1987; 162: 443-6. 4. Sampaio FJ, Favorito LA: Ureteropelvic junction stenosis: vascular anatomical background for endopyelotomy. J Urol. 1993; 150: 1787-91.

5. Sampaio FJB. Renal arterial pedicle: anatomic analysis applied to urologic and radiologic procedures. In: Sampaio FJB, Uflacker R (ed.), Renal anatomy applied to urology, endourology and interventional radiology. New York, Thieme Medical. 1993; pp. 47. 6. Delmas V, Hidden G, Dauge MCI: Remarques sur les lymphatiques du rein: le premier relais nodal. Bull Soc Anat. 1989; 13: 105. 7. Gardner E, Gray DJ, O’rahilly R. Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. 8. Netter F: Reproductive System. Vol. 2. Ciba, New Jersey, USA. 1978. 9. Ortiz V, Kiehl R: Glándulas suprarenais. In: Petroianu A. Anatomia Cirúrgica. Guanabara koogan. 1999.

86


Capítulo 7

Anatomia

do

Ureter

Luciano Alves Favorito

ANATOMIA DO URETER O ureter é um conduto tubular, formado por musculatura lisa e com peristalse, que conecta a pelve renal com a bexiga, apresentando cerca de 22 a 30 cm de extensão (Figura 7.1). O ureter apresenta internamente uma camada mucosa constituída por epitélio pseudo-estratificado, o mesmo da mucosa da bexiga (1,2). A túnica muscular está disposta em 3 camadas: fibras circulares (mais internamente), fibras longitudinais internas e longitudinais externas (Figura 7.2). Externamente, é recoberto por uma túnica adventícia, em continuidade com a cápsula renal. RELAÇÕES DO URETER O ureter é inteiramente retroperitoneal e pode ser dividido em duas porções: abdominal e pélvica. Sua porção abdominal mantém uma relação

87

Figura 7.1: Trajeto do ureter desde sua origem, na pelve renal, até sua junção com a bexiga.

importante com o músculo psoas maior e a bainha que o recobre, passando anterior e medialmente a este músculo e ao nervo genitofemoral, tendo o


Anatomia

Figura 7.2: Fotomicrografia de um feto do sexo masculino do segundo trimestre gestacional, evidenciando as camadas do ureter. Tricrômico de Masson X40.

peritônio à sua frente. A hipertrofia do músculo psoas maior pode levar a alterações no trajeto ureteral, ocorrendo, nestes casos, um desvio lateral do ureter abaixo da pelve renal e um desvio medial na região abaixo da quinta vértebra lombar (3). À direita, o ureter está próximo da veia cava inferior e se relaciona com os vasos cólicos direitos e ileocólicos, passando distalmente a porção caudal do mesentério e do íleo terminal, antes de entrar na pelve. O ureter esquerdo, no início do seu trajeto , é coberto pela porção inicial do jejuno, relacionando-se com a aorta e com os vasos cólicos esquerdos; ao se aproximar da pelve, cruza o cólon sigmoide e seu mesocólon. As relações ureterais com os vasos colônicos e, especialmente o cólon sigmoide, têm grande importância nas cirurgias de ressecção intestinal. Ao longo do seu trajeto

do

Ureter

abdominal, em ambos os lados, o ureter tem um trajeto lateral aos vasos gonadais (4,5). O ureter, antes de penetrar na pelve, passa anteriormente aos vasos ilíacos. Assim, a manipulação endourológica de cálculos nesta região por ureterorrenoscopia deve ser feita com bastante cautela, já que perfurações do ureter nesta região, podem acarretar lesões vasculares graves. O URETER PÉLVICO A porção pélvica do ureter é acompanhada pela artéria ilíaca interna (hipogástrica) durante seu trajeto inicial. Ao penetrar na pelve menor, dirige-se ao espaço retrovesical e, no homem, é atravessado pelo ducto deferente, anterosuperiormente antes de alcançar a bexiga, lateralmente às vesículas seminais. Na mulher, a porção, pélvica do ureter penetra no paramétrio e situa-se numa pinça vascular constituída acima pela artéria uterina e por baixo pela artéria vaginal (Figura 7.3). Neste ponto, tumores de útero ou ovário, além do próprio útero gravídico, podem comprometer o ureter levando à obstrução urinária do lado acometido. Além disso, pode ocorrer lesão iatrogênica do ureter durante a realização de cirurgias pélvicas, principalmente histerectomias. Antes de penetrar na bexiga, o ureter passa anteriormente a vagina e sua lesão nesta porção durante cirurgias

88


aNatoMIa

Do

uREtER

O ureter não tem um calibre uniforme durante o seu trajeto, apresentando uma espessura que varia de 2 a 10 milímetros. Durante seu trajeto, existem três regiões onde o ureter apresenta um calibre reduzido: a junção pieloureteral, o cruzamento do ureter com os vasos ilíacos e a porção intra-mural do ureter (Figura 7.6). Esses pontos de estreitamento Figura 7.3: Desenho esquemático mostrando o cruzamento do ureter pélvico esquerdo com a artéria uterina.

ginecológicas, pode ocasionar a formação de fístulas ureterovaginais. A porção do ureter que atravessa a musculatura vesical é chamada de porção intramural; essa parte do ureter se dirige para o trígono da bexiga (Figura 7.4). A musculatura vesical que envolve a porção intramural do ureter e a bainha de Waldeyer, uma bainha fibrosa que envolve a porção final do ureter, fazem parte do mecanismo que impede o refluxo vésicoureteral (6). Várias condições podem levar ao refluxo, vésicoureteral, uma das causas mais comuns é a implantação anômala da porção intra-mural do ureter na bexiga. Nos casos de refluxo a morfologia do óstio ureteral no trígono vesical se encontra alterada (Figura7.5) (6).

89

Figura 7.4: Fotomicrografia de um feto do sexo masculino do segundo trimestre gestacional, evidenciando a porção intra-mural do ureter. Podemos observar a musculatura vesical ao redor do ureter terminal. hematoxilina e eosina X40.

ou constricções do ureter são os locais onde ocorre comumente a impactação de cálculos e coágulos e as regiões aonde a introdução da aparelhagem de ureteroscopia deve ser realizada com maior cuidado, para evitar perfurações (4).


Anatomia

do

Ureter

Figura 7.5: Desenho esquemático evidenciando as variações na morfologia do óstio ureteral no trígono vesical. A) Aspecto normal ou em cratera de vulcão. B) Orifício em estádio, geralmente situado mais lateralmente que o normal e relacionado ao refluxo. C) Orifício em ferradura, também relacionado com o refluxo. D) Orifício em buraco de golfe, situado mais lateralmente que o normal e também associado com o refluxo.

VASCULARIZAÇÃO, DRENAGEM LINFÁTICA E INERVAÇÃO O ureter é irrigado por várias artérias ao longo do seu trajeto. As principais artérias responsáveis pela irrigação da porção abdominal do ureter são: renal, gonadal, aorta e ilíaca comum (7). Os ramos da artéria renal que irrigam o ureter emergem próximo ao seio renal. Por esse motivo, nas nefrectomias realizadas para transplante renal, a dissecção dos vasos próxima ao seio renal e a retirada da gordura

periureteral podem comprometer a irrigação ureteral. As artérias responsáveis pela irrigação da porção pélvica do ureter são a ilíaca interna e alguns de seus ramos, como a vesical inferior, a uterina, a retal média e a vaginal (7,8,9). Vasos anômalos podem causar obstrução do ureter pélvico. Variações no curso normal de alguns ramos da artéria ilíaca interna (artérias vesical inferior e umbilical, principalmente) podem causar obstrução na junção ureterovesical com hidronefrose.

90


Anatomia

Figura 7.6: Constrições do ureter: A) Junção pielo-ureteral, B) cruzamento com os vasos ilíacos e C) porção intra-mural do ueter.

É de grande interesse cirúrgico o fato de que as artérias que irrigam o ureter abdominal chegam ao ureter por sua parede medial, enquanto que as artérias

91

do

Ureter

que irrigam o ureter pélvico chegam por sua parede lateral (Figura 7.7). Após chegarem ao ureter, todos os ramos arteriais apresentam um curso longitudinal no interior da adventícia, do ureter, formando um grande plexo anastomótico. Assim, a dissecção cirúrgica do ureter deve procurar preservar o máximo possível a adventícia afim de evitar a lesão secundária à isquemia (4). As veias e os linfáticos acompanham as artérias. Na pelve os linfáticos drenam preferencialmente para os linfonodos ilíacos internos, externos e comuns. No abdômen, os linfáticos do ureter esquerdo drenam para linfonodos paraaórticos esquerdos, enquanto que os linfáticos do ureter direito drenam para os linfonodos inter-aortocavais e paracavais direitos. Os linfáticos da porção superior do ureter e da pelve renal tendem a drenar para os linfáticos do rim homolateral. A disseminação linfática das lesões ureterais portanto depende do local acometido pela patologia (5). O ureter apresenta uma inervação autônoma abundante. Os nervos do ureter se originam a partir dos plexos celíaco, aórticorenal, mesentérico e dos plexos hipogástricos superior e inferior (4). A função exata da inervação autônoma do ureter não é muito clara. A peristalse ureteral não necessita do estímulo autônomo externo; no entanto esse movimento


Anatomia

do

Ureter

se origina e propaga através da musculatura lisa intrínseca do ureter, através de sítios específicos - os marcapassos ureterais - localizados nos cálices menores do sistema coletor. O sistema autônomo parece modular de alguma forma esse processo. Fibras nociceptivas do rim, pelve renal e ureter acompanham os nervos simpáticos. Em caso de irritação da mucosa ou distenção ureteral, como o que ocorre na obstrução por litíase, ocorre estímulo nociceptivo, resultando em dor visceral, refletida diretamente na distribuição somática correspondente ao segmento espinhal, originada da distribuição simpática do ureter e do rim (5). ESTRUTURA DO URETER

Figura 7.7: Origem das artérias que irrigam o ureter. As artérias responsáveis pela irrigação do ureter abdominal chegam ao ureter por sua parede medial. As artérias que irrigam o ureter pélvico alcançam o órgão por sua parede lateral.

Analisamos a estrutura do ureter em fetos humanos e em pacientes com refluxo vésicoureteral. Para analisar a estrutura do ureter fetal, estudamos 14 fetos humanos formolizados, com causa mortis não relacionada ao sistema urogenital (Sendo 7 do sexo masculino e 7 do sexo feminino). Os fetos estavam em bom estado de conservação e não apresentavam más-formações congênitas aparentes. A idade dos fetos era calculada em semanas pós-concepção (SPC), através da medida do tamanho do maior pé, com a utilização de

92


Anatomia

um paquímetro de precisão, visto que o tamanho do maior pé é considerado como o parâmetro mais fidedigno para o cálculo da idade gestacional. Também eram aferidos o comprimento total do feto e o comprimento vértice-cóccix, com uma fita métrica, e o pedo fetal, com uma balança analítica de precisão. Todas as medidas foram feitas pelo mesmo examinador. Em seguida, as regiões abdominal e pélvica do feto eram cuidadosamente dissecadas, com o auxílio de um microscópio estereoscópico com aumento de 2,5X. O ureter fetal era retirado juntamente com os rins e a bexiga (Figura 7.8). Os ureteres eram eram separados para as análises histológicas. O material passou por processamento de rotina, onde foi desidratado em banhos sucessivos de álcool, diafanizado em xilol e incluído em parafina. A partir daí, foram feitos cortes de 5 µm de espessura com intervalo de 200 µm entre eles. Através de métodos histoquímicos e imuno-histoquímicos foram estudados os seguintes componentes estruturais da bexiga: tecido muscular, tecido conjuntivo, fibras do sistema elástico e colágeno. Para a histoquímica os cortes foram corados com hematoxilina e eosina para a verificação da integridade do material, Tricrômico de Masson

93

do

Ureter

para a observação e quantificação do tecido conjuntivo e do tecido muscular, Resorcina Fucsina de Weigert, com prévia oxidação pela oxona para a observação das fibras do sistema elástico. O tecido conjuntivo, o tecido muscular e as fibras do sistema elástico foram quantificados através de método estereológico. Eram corados cinco diferentes cortes, seguindo o mesmo intervalo de 200 µm. De cada corte eram selecionados aleatoreamente cinco campos e estes eram fotografados em um microscópio Olympus BX51 através de uma câmera Olympus DP70 acoplada a ele. As imagens eram capturadas para o software Image Pro e, após serem fotografadas, eram analisadas através do software Image J. Neste programa, os tecidos conjuntivo e muscular eram quantificados por um sistema de contagem de pontos para a determinação da densidade volumétrica (Vv) de cada componente. As análises estatísticas foram feitas utilizando o teste T não pareado (p<0.05). Não foram observadas fibras do sistema elástico na matriz extracelular de nenhum dos fetos estudados. As fibras foram observadas apenas nos vasos sanguíneos. Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas com relação ao tecido


aNatoMIa

A

Do

uREtER

B

Figura 7.8: A) Fotografia de um feto do sexo feminino com 25 semanas pós-concepção, o abdômen foi aberto e o ureter foi identidicado e separado por uma pinça. B) Fotografia do bloco urogenital de um feto do segundo trimestre gestacional, evidenciando o ureter em toda extensão que foi submetido a estudo histológico.

Figura 7.9: Fotomicrografia do ureter de um feto do sexo feminino, do segundo trimestre gestacional, evidenciando a disposição do epitélio, tecido conjuntivo e tecido muscular na parede ureteral. Tricrômico de Masson X40.

conjuntivo e ao tecido muscular quando os comparamos entre os sexos masculino e feminino. A Figura 7.9 mostra o epitélio ureteral e a disposição do tecido muscular, e conjuntivo. Estudamos a estrutura do ureter em 2 pacientes com refluxo vésico-ureteral. O primeiro caso era de uma menina de 8 anos de idade, com duplicação pieloureteral e ureterocele à direita, com refluxo vésico-ureteral e perda de função do polo superior do rim (Figura 7.10A). A paciente foi submetida a nefrectomia parcial direita (Figura 7.10B) e a estrutura do ureter foi analisada através dos métodos

94


Anatomia

do

Ureter

A

B

C

D

Figura 7.10. A) Uretrocistografia miccinal evidenciando refluxo vésico-ureteral grau V + ureterocele a direita, em paciente do sexo feminino de 8 anos de idade. B) Fotografia da peça cirúrgica mostrando o polo superior do rim direito e o ureter. C) Fotomicrografia do ureter evidenciando um aumento na concentração de tecido conjuntivo e musculatura na parede ureteral. Tricrômico de Masson X40. D) Fotomicrografia da lâmina anterior em maior aumento, demonstrando o epitélio e a luz do ureter, além da grande quantidade de tecido conjuntivo. Tricrômico de Masson X200.

descritos anteriormente. Observamos um aumento no diâmetro da luz do ureter e uma grande quantidade de tecido conjuntivo e muscular na parede ureteral (Figura 7.10C e D). O segundo caso estudado foi o de um menino de 3 anos de idade, com o rim direito situado na pelve. O paciente apresentava refluxo vésico-ureteral e exclusão funcional do rim (Figura 7.11A).

95

O paciente foi submetido a nefrectomia (Figura 7.11B) e a estrutura do ureter foi analizada. Observamos também um grande aumento na concentração do tecido conjuntivo e da musculatura ureteral (Figura 7.11C e D). Esse estudo preliminar denonstrou que o refluxo vésico-ureteral leva a alterações significativas na estrutura ureteral.


Anatomia

do

Ureter

B A

C

D

Figura 7.11 A) Uretrocistografia miccinal evidenciando refluxo vésico-ureteral grau IV em paciente do sexo masculino, de 3 anos de idade, com rim pélvico. B) Fotografia da peça cirúrgica mostrando o rim direito e o ureter. C) Fotomicrografia do ureter evidenciando um aumento na concentração de tecido conjuntivo e musculatura na parede ureteral. Tricrômico de Masson X40. D) Fotomicrografia da lâmina anterior em maior aumento demonstrando o epitélio e a luz do ureter, além da grande quantidade de tecido conjuntivo. Tricrômico de Masson X200.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Wolf JS Jr, Humphrey PA, Rayala HJ, Gardner SM, Mackey RB, Clayman RV: Comparative ureteral microanatomy. J Endourol. 1996; 10: 527-31. 2. Abdel-Razzak OM: Ureteral anatomy. In: Smith’s Textbook of endourology, Quality Medical

Publishing. 1996; pp. 388. 3. Bree RL, Green B, Keiller DL, Genet EF: Medial deviation of the ureters secondary to psoas muscle hypertrophy. Radiology. 1976; 118: 691-5. 4. Kabalin JN: Surgical anatomy of genitourinary tract - Anatomy of the retroperitoneum and kidney. In:

96


Anatomia

Campbell’s Urology, 6a. ed., New York, Saunders. 1992. 5. Redman JF: Anatomy of the genitourinary system. In: Adult and Pediatric Urology, 3 ed, Mosby Year book. 1996. 6. Tanagho EA, Meyers FH, Smith DR: The trigone: anatomical and physiological considerations. I. In relation to the ureterovesical junction. J Urol. 1968; 100: 62332.

97

do

Ureter

7. Gardner E, Gray DJ, O’rahilly R: Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. 8. Netter F: Reproductive System. Vol. 2. Ciba, New Jersey. 1978. 9. Sampaio FJB, Favorito LA, Rodrigues HC: Anatomia do sistema urinário aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 1, ArtMed, Porto Alegre. 1999.


Capítulo 8

Anatomia Aplicada da Junção Ureteropiélica Francisco J. B. Sampaio Luciano Alves Favorito

ANATOMIA APLICADA DA JUNÇÃO URETEROPIÉLICA Desde a sua introdução, o tratamento endoscópico da estenose da junção ureteropiélica (JUP) – a endopielotomia – quase qsubstituiu a pieloplastia convencional (aberta) no tratamento das estenoses de JUP (1-6). A endopielotomia apresenta índices de sucesso comparáveis com a cirurgia aberta e pode ser aplicada tanto em patologias congênitas quanto nas (4-7). Atualmente, a endopielotomia é um procedimento comum tanto para as estenoses de JUP primárias, como para as secundárias (8). Mesmo com o grande sucesso da pieloplastia laparoscópica, a endopielotomia continua sendo o procedimento mais comumente realizado para esta patologia nos centros acadêmicos (9). Em virtude da endopielotomia ser baseada em uma pieloplastia entubada (incisão ureteropélvica com

98

colocação de stent por 1 a 6 semanas) (1,4-7,10), para obtenção de sucesso, o endoscopista precisa fazer uma incisão através de toda a espessura da região estenosada da JUP, até a visualização da gordura periureteral. Esta incisão profunda pode ser realizada através do trato da nefrostomia, ureteroscopia, ou cateter Acucise, podendo ser realizada com uma faca fria ou um probe eletrocirúrgico (11). A incisão da JUP até o espaço perirenal obviamente apresenta o risco de lesão de vasos retroperitoneais (12-14). Na verdade, a complicação mais significativa deste procedimento é a lesão vascular, seguida por hemorragia severa e/ou formação de fístula artériovenosa (2,3,5,15-19). Para proteger as artérias das lesões, é recomendado o exame da área intrarrenal a ser incisada por

98


Anatomia Aplicada

da

endoscopia, para avaliar a pulsação arterial e evitar incisão neste local. As pulsações arteriais, no entanto, não são sempre identificadas endoscopicamente durante a cirurgia, principalmente em virtude de hipotensão durante a anestesia (20). Como as veias não têm pulsação, o exame endoscópico da área da incisão não é efetivo para evitar lesão venosa (20,21). O risco de lesão de vasos de grande calibre durante a endopielotomia pode ser reduzido significativamente ou eliminado, se o endourologista conhecer a anatomia vascular tridimensional da JUP (13,14,22). Neste capítulo, mostraremos as bases anatômicas da anatomia vascular da JUP aplicadas à realização segura e efetiva da endopielotomia. Anatomia Vascular Foram analisados 146 moldes tridimensionais do sistema coletor junto com as artérias e veias intrarrenais através de técnicas de injeção-corrosão previamente descritas (14). Relações Vasculares Anteriores da JUP Em 65% dos casos, observamos uma artéria e/ou veia proeminente(s) em íntima relação com a face ventral da JUP (Figura 8.1, A, B e Figura 8.2). Nestes casos em 45%, a relação anatômica era com a artéria segmentar (Figura 8.3).

99

Junção Uretero Piélica

A

B

Figura 8.1 - A) Vista anterior de um molde do rim direito (sistema pielocalicinal junto com artérias intrarrenais) mostra uma íntima relação entre a artéria segmentar inferior e a face anterior da junção ureteropiélica - JUP – (seta), u = ureter. B) Vista anterior de um molde do rim direito (sistema pielocalicinal junto com veias) mostra uma íntima relação entre a veia que drena o polo inferior com a JUP (seta). VR = veia renal.

Em relação à seleção dos pacientes para o tratamento da estenose de JUP, existe uma controvérsia sobre a necessidade de diagnóstico pré-operatório dos vasos cruzados anteriores nesta região. Van Cangh et al (23) obtiveram angiografias préoperatórias antes da endopielotomia e observaram vasos cruzados em 39% dos pacientes com estenose de JUP. Esses autores concluíram que a presença de vasos anteriores cruzando a JUP com hidronefrose moderada ou severa resultava em índice de sucesso da endopielotomia de apenas 50% e 39%, respectivamente. Mais recentemente, Van Cangh et al (24) demonstraram que os fatores de


Anatomia Aplicada

da

Junção Uretero Piélica

A

Figura 8.2 - Vista anterior de um molde do rim direito (sistema pielocaliceal junto com artérias e veias) mostrando a face anterior da junção ureteropiélica em íntima relação com a artéria segmentar inferior (seta grande) e com uma tributária da veia renal (seta). A = artéria renal; V = veia renal; u = ureter.

risco significativos para a falha na endopielotomia são: vasos cruzados anteriores, grau de hidronefrose, comprimento da obstrução e função renal. Recentemente, Rehman e colaboradores (25) enfatizaram a importância da angiotomografia espiral para demonstrar a anatomia vascular antes do reparo aberto da estenose de JUP. Eles descreveram dois pacientes com falência no tratamento da estenose de JUP, onde os vasos cruzados não foram vistos durante a cirurgia retroperitoneal aberta.

B Figura 8.3 - Visão anterior de moldes do rim direito (A) e esquerdo (B) (sistema pielocalicinal junto com as artérias intrarrenais) revela uma íntima relação entre a artéria segmentar inferior e a face anterior da junção ureteropiélica (setas). u = ureter.

A laparoscopica transperitoneal com pieloplastia secundária desmembrada, com deslocamento posterior dos vasos cruzados, foi

100


Anatomia Aplicada

da

realizada com sucesso nos dois casos. Por outro lado, Smith (6) demonstrou que este tipo de estudo só se justificaria se existissem evidências de que os vasos cruzados seriam a causa da estenose de JUP, ou se existisse o risco de incisão dos vasos durante a endopielotomia. Mais recentemente, Gupta e Smith (26) mostraram que a presença de vasos cruzados, diagnosticada no préoperatório, não apresentava alteração significativa no tratamento realizado. Confirmando esses achados, Nakada et al (27) relataram que a tomografia computadorizada helicoidal (CT) detectou vasos cruzados anteriores ou posteriores em 38% dos pacientes após uma endopielotomia bem-sucedida. Na opinião dos autores, a influência adversa dos vasos cruzados não é justificativa suficiente para a realização no préoperatório de exames dispendiosos. Além disso, a documentação de vasos cruzados não é suficiente para confirmar que os vasos são a causa da obstrução. Nenhum dos meios de imagem disponíveis é capaz de distinguir se os vasos cruzados são a causa direta da obstrução da JUP (28,29). Portanto, na ausência de estudos prospectivos randomizados, comparando os resultados da pieloplastia aberta com a endopielotomia,

101

Junção Uretero Piélica

incluindo a investigação de vasos cruzados, é controversa a importância da visualização destes vasos antes da cirurgia. Cabe resaltar que no estudo de Van Cangh’s (23), 39% dos pacientes apresentavam um vaso cruzando a JUP anteriormente, e o autor considerou essa artéria como anômala. A consideração desses vasos como anômalos está em desacordo com nossos extensivos estudos da anatomia vascular intrarrenal (12-14,30). Analisando 280 moldes tridimensioais do sistema pielocaliceal em conjunto com as artérias e veias intrarrenais, nós descobrimos uma íntima relação entre uma artéria e/ou veia normal e a região anterior da JUP em 65.1% dos casos (Figuras 8.1 a 8.3) (14,30). Em 45.2% dos casos existia uma íntima relação entre a artéria segmentar inferior e a face anterior da JUP, quando este vaso passava em frente a essa região e se dirigia para o polo inferior (Figura 8.3) (14,30). Esse vaso não é acessório nem aberrante, mas a artéria segmentar inferior normal que mantém uma íntima relação com a face anterior da JUP sem comprimir a junção (14,30,31). A mera presença de vasos cruzados na JUP não significa que eles sejam necessariamente obstrutivos (6). Nós acreditamos que as artérias anômalas que cruzam a JUP e causam obstrução em 39% dos


Anatomia Aplicada

da

pacientes, como descrito por Van Cangh et al (23) é uma incidência muito alta. É provável que muitos desses vasos vistos em relação com a JUP durante a angiografia e descritos como anômalos, eram na realidade artérias segmentares. Elas podem não causar a obstrução, mas podem aumentar a dilatação de uma pelve renal redundante previamente obstruída por um defeito muscular primário. Nesta situação a pelve renal dilatada pode se abaular em cima dos vasos cruzados anteriores, levando a uma angulação que levaria a uma piora da obstrução (14). Portanto, o papel exato dos vasos cruzados na obstrução e no sucesso da endopielotomia ainda não foi determinado (6,26). Em relação à presença de artérias renais múltiplas, em 266 pedículos renais analisados, nós observamos uma artéria polar inferior cruzando a JUP anteriormente em apenas 6.8% dos casos (Figura 8.4) (32). Além disso, em poucos casos essa artéria polar inferior passava junto da JUP. Portanto, a presença de vasos anômalos cruzando a JUP e causando a obstrução é pouco comum. Para os pacientes com vasos cruzados e hidronefrose pequena ou moderada, é relatada a clipagem e secção da artéria cruzada por laparoscopia (23). No entanto nós

Junção Uretero Piélica

Figura 8.4 - Desenho esquemático da visão anterior do rim esquerdo mostra a artéria polar inferior (seta) cruzando a Junção ureteropiélica anteriormente (incidência de 6.8%).

enfatizamos que essa conduta deve ser evitada em virtude da perda de parênquima renal funcionante. Também é demonstrado que todas as artérias renais, inclusive as artérias múltiplas, são vasos terminais, portanto a ligadura desses vasos pode causar lesão renal (33). Como mostramos previamente, o suprimento arterial do polo inferior do rim (segmento inferior) representa de 7.4 a 38% da área de parênquima renal funcionante (área média do segmento inferior = 22.6%) (33). Em virtude disto, se for confirmado que a estenose da JUP é causada por uma artéria

102


Anatomia Aplicada

da

Junção Uretero Piélica

cruzada, a pieloplastia aberta ou laparoscópica com transposição dos vasos deve ser realizada, em vez da ligadura dos mesmos (vasos) (30). Relações Vasculares Posteriores da JUP Em 6.2% dos casos encontramos uma relação direta entre um vaso calibroso (artéria e/ ou veia) e a região dorsal da JUP (Figura 8.5). Em todos os casos onde a artéria cruzava a face dorsal da JUP (3.5%) os vasos eram a artéria segmentar posterior, também conhecida como artéria retropiélica (Figura 8.5 e Figura 8.6). Muitos autores recomendam que a JUP seja incisada ao longo da sua face pósterolateral, mas nossos achados evidenciam que esta incisão apresenta um grande risco de lesar os vasos retropiélicos. De fato, mesmo quando o procedimento é feito por um endourologista experiente a incidência de hemorragia severa quando a JUP é incisada na região pósterolateral é de 12% (5). Uma incisão posterior ou pósterolateral na estenose de JUP também apresenta a possibilidade de lesão da artéria segmentar posterior (artéria retropiélica) que, além de causar hemorragia significativa, pode levar à perda de grande porção do parênquima renal funcionante em virtude de infarto renal. É importante notar que em alguns indivíduos a artéria segmentar posterior pode

103

Figura 8.5 - Vista posterior de um molde do rim esquerdo (sistema pielocalicinal junto com artérias e veias intrarrenais) Uma tributária dorsal da veia renal (seta grande) e a artéria segmentar posterior (artéria retropiélica – seta) estão em íntima relação com a face posterior da junção ureteropiélica. A = artéria renal; V = veia renal; u = ureter.

ser responsável por até 50% da irrigação do parênquima renal (33). Além dos 6.2% dos vasos que estão em contato direto com a JUP por cruzarem sua face posterior, outros 20.5% dos casos são caracterizados por vasos cruzando acima da face dorsal da JUP, a uma distância menor do que 1.5 cm (Figura 8.7). Este fato é de grande importância para os cirurgiões que vão realizar uma endopielotomia pois para realizar a desobstrução, é geralmente preciso


Anatomia Aplicada

A

da

Junção Uretero Piélica

B

Figura 8.6 - A) Vista posterior de um molde do rim esquerdo (sistema pielocalicinal junto com artérias intrarrenais) evidencia a artéria segmentar posterior (artéria retropiélica) em íntima relação com a face posterior da junção ureteropiélica (seta). A = artéria renal; u = ureter. B) Vista posterior de um molde da vascularização arterial renal, onde os segmentos foram injetados de cores diferentes. Em vermelho observamos a área de irrigação do segmento posterior (P). A - segmento anterior e I - segmento inferior.

estender a incisão endoscópica até o tecido saudável por até 1 a 2 cm de cada lado (acima e abaixo) da área estenosada da JUP. Esses achados anatômicos confirmam que o risco de lesão de um vaso dorsal é especialmente grande em incisões pósterolaterais. O risco de lesão dos vasos que cruzam acima da JUP a uma distância menor do que 1.5 cm acima da JUP, é particularmente grande em casos de fibrose extensa da JUP pois, nestes casos é necessário fazer uma incisão longa, algumas vezes se estendendo até o parênquima renal (35,36). Portanto as incisões posteriores e pósterolaterais devem ser evitadas.

Figura 8.7 - Vista posterior de um molde do rim esquerdo (sistema pielocalicinal junto com artérias e veias intrarrenais evidencia a artéria segmentar posterior (artéria retropiélica), cruzando menos de 1.5 cm (0.5 cm) acima da face posterior da junção ureteropiélica (seta) . A = artéia renal; V = veia renal; u = ureter.

Incisões na Estenose de JUP baseada na anatomia vascular Nós recomendamos que a incisão profunda ao longo da estenose de JUP seja feita apenas lateralmente (Figura 8.8). Uma incisão neste sítio, chamado de área avascular da JUP, evita lesões em vasos importantes, localizados anteriormente, posteriormente ou a menos de 1.5 cm acima da JUP (13,14,31). Mesmo nos casos de fibrose extensa da JUP e nos casos onde os vasos são transpostos

104


Anatomia Aplicada

da

Junção Uretero Piélica

Figura 8.8 - Vista anterior de um desenho esquemático do rim esquerdo mostra a área a ser incisada na endopielotomia (seta); área avascular (ANV) da junção ureteropiélica.

Figura 8.9 - Observar a face cortante da faca de Sacks, posicionada lateralmente, sob controle fluoroscópico, durante o processo de endopielotomia.

posteriormente na pieloplastia desmembrada, a incisão lateral na área avascular na JUP é segura e dispensa uma avaliação angiográfica no pré-operatório. Uma artéria polar inferior que cruze a JUP anteriormente também ficaria protegida de lesão com esta técnica (16,32). A manutenção de uma orientação anatômica durante manipulação endoscópica muitas vezes é difícil. Consequentemente, é recomendável que o instrumental de corte seja posicionado lateralmente

sob fluoroscopia, antes de começar a incisão da JUP (Figura 8.9). Esta manobra assegura ao cirurgião que a incisão seja feita precisamente na região lateral – na área avascular da JUP (18,31,34).

105

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Badlani G, Eshghi M, Smith AD: Percutaneous surgery for ureteropelvic junction obstruction (endopyelotomy): technique and early results. J Urol. 1986; 135: 26-8. 2. Badlani G, Karlin G, Smith AD:


Anatomia Aplicada

da

Complications of endopyelotomy: analysis in series of 64 patients. J Urol. 1988; 140: 473-5. 3. Clayman RV, Picus DD: Ureterorenoscopic endopyelotomy. Preliminary report. Urol Clin North Am. 1988; 15: 433-8. 4. Clayman RV, Basler JW, Kavoussi L, Picus DD: Ureteronephroscopic endopyelotomy. J Urol. 1990; 144: 246-51; discussion 251-2. 5. Meretyk I, Meretyk S, Clayman RV: Endopyelotomy: comparison of ureteroscopic retrograde and antegrade percutaneous techniques. J Urol. 1992; 148: 775-82; discussion 782-3. 6. Smith AD: Editorial comment. J Urol. 1991; 146: 1495. 7. Kletscher BA, Segura JW, LeRoy AJ, Patterson DE: Percutaneous antegrade endopyelotomy: review of 50 consecutive cases. J Urol. 1995; 153: 701-3. Erratum in: J Urol. 1995; 153: 1955. 8. Streem SD: Preface - Contemporary intervention for UPJ obstruction: which one, when and how? Urol Clin North Am. 1998; 25: xiii-xv. 9. Marcovich R, Jacobson AI, Aldana JP, Lee BR, Smith AD: Practice trends in contemporary management of adult ureteropelvic junction obstruction. Urology. 2003; 62: 22-5; discussion 25-6. 10. Davis DM: Intubated ureterotomy: a new operation for ureteral and ureteropelvic strictures. Surg Gynec Obst. 1943; 76: 513-4. 11. Kausik S, Segura JW: Surgical management of ureteropelvic junction obstruction in adults. Int Braz J Urol. 2003; 29: 3-10. 12. Sampaio FJ: Relationship between segmental arteries and pelviureteric junction. Br J Urol. 1991; 68: 214-5. 13. Sampaio FJ, Favorito LA: Ureteropelvic

Junção Uretero Piélica

junction stenosis: vascular anatomical background for endopyelotomy. J Urol. 1993; 150: 1787-91. 14. Sampaio FJ: Vascular anatomy at the ureteropelvic junction. Urol Clin North Am. 1998; 25: 251-8. 15. Cassis AN, Brannen GE, Bush WH, Correa RJ, Chambers M: Endopyelotomy: review of results and complications. J Urol. 1991; 146: 1492-5. 16. Malden ES, Picus D, Clayman RV: Arteriovenous fistula complicating endopyelotomy. J Urol. 1992; 148: 1520-3. 17. Segura JW: Editorial comment. J Urol. 1992; 148: 782. 18. Streem SB, Geisinger MA: Prevention and management of hemorrhage associated with cautery wire balloon incision of ureteropelvic junction obstruction. J Urol. 1995; 153: 19046. 19. Wagner JR, D’Agostino R, Babayan RK: Renal arterioureteral hemorrhage: a complication of acucise endopyelotomy. Urology. 1996; 48: 139-41. 20. Sampaio FJB: Anatomic background for intrarenal endourologic surgery. J Endourol. 1992; 6: 301-4. 21. Sampaio FJ, Aragão AH: Anatomical relationship between the renal venous arrangement and the kidney collecting system. J Urol. 1990; 144: 1089-93. 22. Sampaio FJ: Endopyelotomy, guided by meticulous anatomy. Contemp Urol. 1994; 6: 23-6. 23. Van Cangh PJ, Wilmart JF, Opsomer RJ, Abi-Aad A, Wese FX, Lorge F: Long-term results and late recurrence after endoureteropyelotomy: a critical analysis of prognostic factors. J Urol. 1994; 151: 934-7. 24. Van Cangh PJ, Nesa S, De Groote P:

106


Anatomia Aplicada

da

Current indications for endopyelotomy. Braz J Urol. 2000; 26: 54-63. 25. Rehman J, Landman J, Sundaram C, Clayman RV: Missed anterior crossing vessels during open retroperitoneal pyeloplasty: laparoscopic transperitoneal discovery and repair. J Urol. 2001; 166: 593-6. 26. Gupta M, Smith AD: Crossing vessels. Endourologic implications. Urol Clin North Am. 1998; 25: 289-93. 27. Nakada SY, Wolf JS Jr, Brink JA, Quillen SP, Nadler RB, Gaines MV, et al.: Retrospective analysis of the effect of crossing vessels on successful retrograde endopyelotomy outcomes using spiral computerized tomography angiography. J Urol. 1998; 159: 62-5. 28. Frauscher F, Janetschek G, Helweg G, Strasser H, Bartsch G, zur Nedden D: Crossing vessels at the ureteropelvic junction: detection with contrast-enhanced color Doppler imaging. Radiology. 1999; 210: 72731. 29. Rouvière O, Lyonnet D, Berger P, Pangaud C, Gelet A, Martin X: Ureteropelvic junction obstruction: use of helical CT for preoperative

107

Junção Uretero Piélica

assessment--comparison with intraarterial angiography. Radiology. 1999; 213: 668-73. 30. Sampaio FJ: The dilemma of the crossing vessel at the ureteropelvic junction: precise anatomic study. J Endourol. 1996; 10: 411-5. 31. Sampaio FJB: Vascular anatomy at the ureteropelvic junction. Urol Clin North Am. 1998; 25: 251–8. 32. Sampaio FJ, Passos MA: Renal arteries: anatomic study for surgical and radiological practice. Surg Radiol Anat. 1992; 14: 113-7. 33. Uflacker R: eds. Renal Anatomy Applied to Urology, Endourology and Interventional Radiology. New York: Thieme Medical Publishers. 1993; pp. 90-6. 34. Motola JA, Badlani GH, Smith AD: Results of 212 consecutive endopyelotomies: an 8-year followup. J Urol. 1993; 149: 453-6. 35. Jarret TW, Smith AD: Endopyelotomy. In: Smith AD (ed.), Controversies in Endourology. Philadelphia, WB Saunders Co. 199; pp. 249-56. 36. Sampaio FJB: Percutaneous antegrade endopyelotomy: Choosing a calyx to access the UPJ. Contemp Urol. 1996; 8: 13-20.


Capítulo 9

Anatomia Da Bexiga

Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio

ANATOMIA GERAL DA BEXIGA Relações da bexiga A função principal da bexiga é o armazenamento e eliminação da urina. Seu aspecto é tetraédrico, apresentando um teto, duas paredes laterais, uma base ou assoalho, um ápice e o colo vesical (1,2). Do ápice da bexiga se origina o úraco, resquício embriológico do alantoide fetal, que se exsende até a região da cicatriz umbilical. No adulto, o úraco é coberto pelo peritônio, sendo denominado de ligamento umbilical mediano (Figura 9.1). A bexiga é recoberta superiormente pelo peritôneo, que se continua como lâmina parietal anterior em sua face ventral. Na face dorsal, o peritôneo que recobre a bexiga funde-se com o peritôneo visceral do recesso vesicorretal no homem e ureterovesical na mulher (Figura 9.2). As faces ânteroinferior e laterais da bexiga estão separadas das paredes pélvicas por um espaço preenchido por tecido gorduroso, o espaço de Retzius (35). A bexiga é composta por uma camada mais interna, formada por epitélio pseudoestratificado, abaixo da qual localiza-se a lâmina

108

própria, composta por tecido fibroelástico. Mais internamente, encontra-se a camada muscular lisa, geralmente dividida em longitudinal interna, circular média e longitudinal externa. Na região superior, essas três camadas misturam-se e suas fibras podem mudar de direção e de plano (Figura 9.3). Esse arranjo é importante para permitir boa complacência e bom esvaziamento vesical. Na região do colo vesical, as três camadas estão bem definidas e formadas por fibras mais finas que as do restante da bexiga. A camada média, no homem, continua-se na direção da uretra prostática até o nível do colículo seminal, para formar o esfíncter pré-prostático, muito rico em fibras adrenérgicas, no nível do colo vesical. As fibras da camada longitudinal externa formam uma alça ao redor do colo vesical, que também contribui para o mecanismo de continência nesta região (6,7). Na mulher, as fibras longitudinais internas convergem para formar a camada longitudinal interna da uretra feminina. Além disso, o colo vesical feminino tem menos fibras adrenérgicas que o masculino.

108


Anatomia Da Bexiga

A B

Figura 9.1: Úraco. A) Feto feminino do terceiro trimestre gestacional, evidenciando o úraco (U), que se estende do ápice da bexiga até a região da cicatriz umbilical. B) Em um feto do sexo feminino do segundo trimestre gestacional, o bloco urogenital foi retirado para estudo histológico e podemos observar a posição do úraco na bexiga fetal.

Figura 9.2: Pelve feminina de cadáver formolizado, evidenciando a relação da bexiga (B) com o útero (U).

Junção ureterovesical Neste ponto, o ureter perde sua camada de músculo circular. Cerca de 2 ou 3cm antes de penetrar na parede vesical, uma

109

bainha fibromuscular em forma de leque estende-se longitudinalmente pelo ureter e o acompanha até a região do trígono. Essa bainha é conhecida com bainha ureteral ou


Anatomia Da Bexiga

camadas: a) superficial, derivada da camada muscular longitudinal dos ureteres, que se estende pela uretra até o colículo seminal; b) uma camada profunda, continuação da bainha de Waldeyer e que se insere no colo vesical; c) uma camada de detrusor, formada pela longitudinal externa e circular interna da musculatura da bexiga (Figura 9.4) (8).

Figura 9.3: Desenho esquemático mostrando a direção das fibras do músculo detrusor da bexiga.

de Waldeyer. Em seu trajeto pelo interior da parede da bexiga, o ureter situa-se logo abaixo do urotélio e seu calibre diminui acentuadamente. Esse arranjo funciona como um mecanismo antirrefluxo, comprimindo o ureter contra as fibras do detrusor no momento em que a bexiga se enche. Trígono vesical É o triângulo formado pelos dois óstios ureterais e o orifício interno da uretra. As fibras musculares de cada ureter dirigemse ao ureter contralateral e ao orifício da uretra, formando uma bainha triangular e dando origem à barra interruretérica. A musculatura do trígono compõe-se de três

Vascularização da bexiga É derivada das artérias vesicais, ramos da ilíaca interna. As artérias obturatórias e glútea inferior também participam dessa irrigação. O plexo venoso vesical, que no homem, está em continuidade com o plexo prostático, drena para o sistema da ilíaca interna e para o plexo vertebral. A drenagem linfática se faz para linfonodos ilíacos internos e externos. NEUROANATOMIA DA BEXIGA A inervação da pelve é derivada dos seguimentos sacral e coccígeo da medula espinhal e da porção pelvina do sistema nervoso autônomo. A bexiga recebe inervação autonômica do plexo vesical e prostático. O esfíncter estriado da uretra é inervado pelo nervo pudendo. Serão descritas a seguir a anatomia do sistema nervoso autônomo e sua relação com a bexiga, o trajeto e áreas de inervação do nervo pudendo e

110


Anatomia Da Bexiga

as regiões localizadas no sistema nervoso central, envolvidas na inervação da bexiga. Nervo pudendo O nervo pudendo, oriundo do plexo sacral, é responsável pela maior parte da inervação do períneo (9). Contém fibras motoras sensitivas e fibras simpáticas préganglionares (9). Atravessa o forame isquiático maior, penetrando na pelve pelo forame isquiático menor, junto com os vasos pudendos internos, atravessando o canal pudendo (“canal de Alcock”). Na parede lateral da fossa isquior-retal, se divide, originando o nervo retal inferior, o nervo perineal e o nervo dorsal do pênis (clitóris) (Figura 9.5). O nervo pudendo é responsável pela inervação somática da musculatura esquelética que compõe o esfíncter externo da uretra (10). Sistema nervoso autônomo A inervação autonômica da bexiga e da uretra é oriunda dos plexos vesical e prostático, que se originam a partir do plexo hipogástrico inferior. A formação e a localização do plexo hipogástrico inferior são de grande importância para o entendimento das patologias que acometem a inervação da bexiga (8,10,11). O plexo hipogástrico superior, abaixo da bifurcação da aorta, se divide nos dois nervos hipogástricos inferiores direito e esquerdo (9) (Figura 9.6). O nervo hipogástrico

111

inferiorr atravessa o estreito superior de pelve e se une com os nervos esplâncnicos sacrais, originando o plexo hipogástrico inferior (9). As fibras simpáticas são derivadas dos segmentos medulares da T11 a L2 e se dirigem para o plexo hipogástrico superior; as fibras parassimpáticas são provenientes dos segmentos medulares de S2, S3 e S4 e chegam ao plexo hipogástrico inferior pelos nervos esplâncnicos pélvicos (Figura 9.6). Na porção parassimpática do sistema nervoso autônomo, os neurônios pré-ganglionares estão localizados na porção lateral da substância cinzenta intermédia da medula sacral, região chamada de núcleo parassimpático sacral. Os neurônios parassimpáticos pósganglionares se localizam na parede da bexiga e no plexo pélvico (11). O principal agente neuro-humoral do sistema parassimpático é a acetilcolina (ACh). Os receptores de ACh se localizam principalmente no fundo da bexiga e em menor quantidade na região da uretra posterior (10).

Quando os nervos pélvicos são estimulados, a ACh é secretada pelos neurônios pósganglionares, produzindo contração da musculatura da bexiga (10,11). Antes dessa contração, impulsos oriundos do nervo pudendo, relaxam o componente muscular do esfíncter uretral (10). O sistema parassimpático, portanto,


Anatomia Da Bexiga

Figura 9.4: Desenho esquemático com vista anterior do trígono vesical. B= bexiga; u= ureter; bu= bainha ureteral; ts= trígono superficial; tp= trígono profundo.

é responsável pela contração da bexiga durante a micção. O sistema simpático é formado por neurônios localizados nos seguimentos medulares de T-10 a L1. Os axônios destes neurônios fazem sinapses com a cadeia simpática que irá participar da formação do plexo hipogástrico superior (7,9). As fibras pósganglionares chegam à bexiga através do plexo hipogástrico inferior, onde atuam no colo vesical, na musculatura detrusora e na uretra posterior (10). O sistema nervoso simpático estimula tanto os receptores alfa como os receptores beta, localizados na unidade vésicouretral. Os receptores alfa se situam predominantemente na região

do trígono, colo vesical e porção proximal da uretra posterior (7-11). Os receptores beta-adrenérgicos se localizam principalmente no fundo da bexiga (10). O principal neurotransmissor deste sistema é a noradrenalina (NDR). Quando a NDR é secretada pelos neurônios pós-ganglionares e chega na região dos receptores alfa-adrenérgicos, na região do colo vesical e uretra posterior, ocorre uma contração muscular nestas regiões, aumentando sua resistência. O estímulo dos receptores beta no fundo da bexiga causa relaxamento da musculatura neste local (10,11). O sistema simpático, portanto, é atuante na fase de enchimento vesical e na contração da região

112


Anatomia Da Bexiga

do colo vesical. Sistema nervoso central Vários fatores estão envolvidos no processo da micção: (a) centros corticais; (b) várias regiões da medula espinhal; (c) propriedades intrínsecas da bexiga, uretra posterior e do esfíncter uretral. Descreveremos a seguir os

locais do sistema nervoso central, envolvidos na micção. Vias aferentes e eferentes, originadas do centro da micção, na medula sacral, se conectam com o tronco encefálico (10-12). Existem dois tractos ascendentes na medula espinhal: (a) tracto sensório pélvico, no funículo posterior (Grácil) e (b) tracto sacrobulbar, no funículo

Figura 9.5: Desenho esquemático mostrando o trajeto do nervo pudendo e sua área de inervação. As setas evidenciam o nervo. O esquema também evidencia a formação do plexo hipogástrico inferior. A seta mostra o plexo hipogástrico superior (seta), que se divide, originando os nervos hipogástricos direito e esquerdo (*). Os nervos hipogástricos recebem os nervos esplâncnicos pélvicos, formando o plexo hipogástrico inferior (estrela).

113


Anatomia Da Bexiga

Figura 9.6: Desenho esquemático mostrando a integração da bexiga, medula espinhal e centros supracorticais na micção, com destaque para as principais vias envolvidas no processo da micção.

lateral (Espino-talâmico Lateral) (Figura 9.6). Existem três tractos descendentes (via motora ou feixe corticorregulador): (a) tracto retíulcoespinhal lateral, que estimula a contratilidade vesical; (b) tracto retículo-espinhal anterior, que inibe o detrusor e (c) tracto retículoespinhal que estimula a contração do esfíncter externo da uretra (10). Esses tractos se dirigem para o tronco encefálico e diencéfalo, onde existem três centros relacionados com a miccção (10) (Figura 9.6): (a) centro facilitador na região anterior da ponte; (b) centro inibitório no mesencéfalo e (c) centro facilitador,

na região posterior do hipotálamo, no diencéfalo (10,12). A porção supramedial da região média do lobo frontal, a porção anterior do giro do cíngulo e o joelho do corpo caloso (Figura 9.6) fazem parte da porção final do ciclo miccional (10,12). Três circuitos estariam envolvidos na micção: (1) a distenção da bexiga leva ao transporte de estímulos, pelas fibras aferentes dos nervos pélvicos até a medula sacral; neurônios internucias nesta região da medula, que transmiterm esses impulsos e estimulam as fibras eferentes

114


Anatomia Da Bexiga

parassimpáticas, simpáticas e somáticas, que atuam na região do fundo, colo vesical e esfíncter externo da uretra, respectivamente; (2) outras vias intraespinhais levam mensagens para as áreas sacral e toraco-lombar do tronco encefálico e (3) comunicações no lobo frontal e temporal com o tronco encefálico atuam, facilitando ou inibindo os neurônios eferentes da medula espinhal (10). O conhecimento das vias descritas anteriormente, do local de origem e trajeto da inervação, bem como os centros supracorticais envolvidos na micção, facilitam o entendimento de diversas patologias relacionadas ao trato urinário inferior. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Favorito LA, Sampaio FJB: Anatomia aplicada da pelve em Garcia Marques: Técnica operatória e cirurgia experimental, capítulo 16, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 2005. 2. Sampaio FJB, Favorito LA: Anatomia do trato urinário em Bruschini, Truzzi e Srougi: Distúrbios urológicos da gravidez, capítulo 1, Manole, São Paulo. 2006. 3. Weingärtner K, Ramaswamy A, Bittinger A, Gerharz EW, Vöge D, Riedmiller H: Anatomical basis for pelvic lymphadenectomy in prostate

115

cancer: results of an autopsy study and implications for the clinic. J Urol. 1996; 156: 1969-71. 4. Gardner E, Gray DJ, O’rayhli R. Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. 5. Sampaio FJB, Favorito LA, Rodrigues HC: Anatomia do sistema urinário aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 1, ArtMed, Porto Alegre. 1999. 6. Gosling JA, Dixon JS, Humpherson JR: Gross anatomy of the kidneys and upper urinary tract. In: Functional anatomy of the urinary tract and integrated text and colour atlas. London: Churchill & Livingstone. 1983. 7. Hinman Jr F: Bladder, ureterovesical junction and rectum. In: Atlas of urosurgical anatomy. Philadelphia: Saunders. 1993; pp. 309. 8. Tanagho EA, Smith DR: The anatomy and function of the bladder neck. Br J Urol. 1966; 38: 54-71. 9. Gardner E, Gray DJ, O’Rahilly R: Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. 10. Bauer SB: Urodinamics in Children. In Pediatric Urologiy – Ashcraft. Philadelphia: Saunders. 1990; pp. 49. 11. Chancellor MB, Yoshimura N: Physiology and Pharmacology of the bladder and urethra. In: Campbell’s Urology, 8a. ed., New York, Saunders. 2002; pp. 831. 12. Martin JH: Neuroanatomy, Text and Atlas. Appleton & Lange. 1996.


Capítulo 10

Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio

ANATOMIA DA PRÓSTATA A próstata é um dos órgãos de maior importância para o urologista. É acometida com grande frequência por patologias como o câncer de próstata, a hiperplasia prostática benigna e a prostatite. O conhecimento da anatomia prostática é de extrema utilidade para a realização dos procedimentos cirúrgicos prostáticos. A próstata tem uma base, um ápice, face anterior, face posterior e duas faces ínferolaterais. As relações da próstata são: superiormente - a base da próstata é contínua com o colo vesical e a musculatura lisa passa sem interrupção de um órgão para outro. A uretra penetra na região central da base da próstata; inferiormente - o ápice da próstata repousa sobre a superfície superior do diafragma urogenital (Figura 10.1). A uretra deixa a próstata logo acima do ápice, sobre a superfície anterior; anteriormente -a superfície anterior da próstata está relacionada com a sínfise púbica, separada desta pela gordura extraperitoneal no espaço

116

retropúbico; posteriormente- a superfície posterior da próstata está intimamente relacionada com a superfície anterior do reto e separada deste pelo septo retoprostático (fáscia de Denoviliers) (1).

Figura 10.1: Corte sagital de uma pelve masculina, evidenciando as relações da próstata.

116


Anatomia

da

Próstata

SEPTO RETOPROSTÁTICO O septo retoprostático é uma estrutura fibromuscular que reveste a região posterior da próstata e as vesículas seminais (Figura 10.2). Apresenta múltiplas camadas, que estão fusionadas ao estroma prostático. Sua porção posterior é separada da parede anterior do reto por um plano de clivagem. Sua porção anterior é separada da fáscia genital, acima pelo espaço retovesical e, abaixo da cápsula prostática, pelo espaço

A

e

Vesículas Seminais

retoprostático. Apenas sua porção medial é fusionada com a próstata, sem a interposição de tecido adiposo, o que diminui a suposta função de barreira protetora à invasão retal no câncer de próstata, nesta região (2). É derivada da fusão das duas paredes do fundo de saco reto-prostático, se estende do ponto mais profundo do espaço peritoneal interprostato-retal até o assoalho pélvico, a camada posterior deste septo, na verdade é a própria camada fascial própria do reto (3).

C

B

Figura 10.2: A) Desenho esquemático de um corte sagital de uma pelve masculina, evidenciando o septo retoprostático (*). P=Próstata; R= Reto. B) Desenho esquemático de um corte frontal da pelve masculina, evidenciando a relação do septo retoprostático (*) com o reto (R) e a próstata (P). C) Fotografia da pelve de um feto masculino do terceiro trimestre gestacional, evidenciando a relação da próstata com o reto.

117


Anatomia

da

Próstata

LIGAMENTOS PUBOPROSTÁTICOS Os ligamentos puboprostáticos (também denominados de pubovesicais) estão localizados no espaço retropúbico e unem a bexiga ao púbis (Figura 10.3). A confusão entre os termos pubovesical e puboprostático é relativo à variação de tamanho, largura e configuração da próstata, principalmente no adulto. O colo e a base da bexiga são elevados pelo crescimento do adenoma na hiperplasia prostática benigna e a inserção do ligamento na bexiga fica escondido pelo crescimento e protrusão da comissura anterior (4). Estes ligamentos são formados por uma condensação da fáscia pélvica

A

e

Vesículas Seminais

e contém músculo liso que é contínuo com a camada longitudinal da parede da bexiga (4). ANATOMIA ZONAL DA PRÓSTATA De acordo com a divisão clássica que ainda hoje é adotada na maioria dos livros de Urologia e de Anatomia (Classificação de Lowsley), a próstata apresenta 06 lobos contínuos e não separáveis macro ou microscopicamente: lobo anterior, lobo posterior, lobos laterais direito e esquerdo, lobo médio-comissural, lobo médio subcervical (glândulas de Albarran) (Figura 10.4). Entretanto, é verificado que estes lobos aparecem como entidades distintas apenas naqueles indivíduos acometidos de hiperplasia prostática benigna e,

B

Figura 10.3: A) Desenho esquemático da região pré-vesical, evidenciando os ligamentos puboprostáticos (*). Notar a presença do ramo superficial do plexo venoso periprostático entre os dois ligamentos (v). B) Fotografia de um cadáver formolizado do sexo masculino, evidenciando os ligamento puboprostáticos.

118


Anatomia

da

Próstata

Figura 10.4: Classificação de Lowsley: A próstata apresenta 06 lobos: lobo anterior (a), lobo posterior (p), lobos laterais direito e esquerdo (lat), lobo médio-comissural (mc), lobo médio subcervical (glândulas de Albarran). U=uretra; de= ducto deferente.

mesmo assim, apresentando diversas variantes anatômicas (5). Diversos estudos de Mcneal modificaram o conceito clássico da divisão anatômica da próstata em lobos, visto que este autor confirmou que esta divisão existe em condições normais apenas durante o período fetal. Nos últimos anos, com base em diferenças histológicas, foi descrito que, no adulto, o tecido glandular da próstata representa 2 glândulas fusionadas em uma estrutura única. Estas duas porções foram denominadas de zona central e de zona periférica (Figura 10.5A) (6). A zona central consiste em uma porção de tecido glandular circundando os ductos ejaculatórios. Apresenta um ápice, localizado próximo ao colículo seminal

119

e

Vesículas Seminais

(veromontanum) e uma base, localizada superior e posteriormente ao colo vesical (Figura 10.5A). A zona central representa cerca de 20% da massa total de tecido glandular prostático. A zona periférica é a maior região da próstata e sua massa constitui cerca de 70% do total da massa glandular prostática. É representada por uma fileira dupla de ductos que têm origem no recesso pósterolateral da parede da uretra e irradiam-se lateralmente (Figura 10.5A). Estes ductos estendem-se como uma linha dupla contínua, desde o ápice da próstata até quase o colo vesical e, como são laterais e posteriores, não mantém, relação anatômica com o colículo seminal. Em conjunto, a zona central e a zona periférica totalizam 90% a 95% do tecido glandular prostático (6). A principal característica anatômica da uretra que está situada cranialmente à base do veromontanum é um esfíncter muscular cilíndrico que circunda a submucosa da uretra até a região do colo vesical. Quase todos os ductos localizados ao longo deste segmento uretral estão envolvidos por esse esfíncter, ficando restritos à área da submucosa. Sendo assim, o desenvolvimento pleno destas glândulas periuretrais é abortado pelo seu confinamento e representam em conjunto menos do que 1% do tecido glandular prostático.


Anatomia

da

Próstata

A região mais distal ao citado esfíncter periuretral apresenta ductos mais complexos e um sistema acinar maior do que aqueles descritos anteriormente; esta sub-região é conhecida como zona de transição da próstata e representa entre 5% e 10% do tecido glandular normal (Figura 10.5B). Embora pequena e insignificante do ponto de vista funcional, a região pré-prostática (glândulas submucosas periuretrais + zona de transição) é uma área de grande complexidade anatômica. A região esfincteriana descrita anteriormente pode ser analisada como uma intrusão do colo vesical em uma região glandular prostática. Neste ponto, os 2 tipos de tecido misturam-se e competem por espaço; como resultado, o tecido esfincteriano (originado no colo vesical) torna-se plenamente desenvolvido, enquanto o componente, glandular permanece atrofiado (6). Esta relação entre os tecidos de diferentes tipos e origens pode ser importante para o entendimento da patologia prostática benigna. Finalmente, uma região considerável da próstata denominada zona anterior (estroma fibromuscular anterior) é inteiramente não glandular, consistindo principalmente de fibras musculares lisas. A zona anterior não tem um papel importante na função prostática; entretanto, sua localização e extensão aumentam a dificuldade de visualizar e estudar o tecido glandular da região anterolateral da próstata (6).

e

Vesículas Seminais

Figura 10.5: Desenho esquemático eviden­ ciando a anatomia zonal da próstata segun­ do Mcneal. O esquema inferior evidencia apenas a zona de transição da próstata, todas as outras regiões foram retiradas. zp = zona periférica; zt = zona de transição; zc = zona central; za = zona Anterior; u= uretra; de = ducto deferente; u = uretra; de = ducto deferente.

ESFÍNCTER EXTERNO DA URETRA: O segmento da uretra localizado entre o ápice da próstata e o bulbo do pênis é revestido por um cilindro de orientação vertical chamado esfíncter estriado externo da uretra (7,8). Esta disposição do esfíncter é diferente da descrição clássica, que mostra o diafragma urogenital e o esfíncter como um plano horizontal, unindo os ramos

120


Anatomia

da

Próstata

isquiopúbicos, entre as fáscias superior e inferior do períneo (9). Na uretra membranosa, este músculo estriado forma um anel concêntrico de fibras circulares, sendo este mais espesso anteriormente, diminui de forma progressiva nas faces laterais, e permanece esparso posteriormente e com forma semilunar (Figura 10.6 e Figura 10.7). As fibras modificam suas direções de transversais (anteriormente) para longitudinais (lateralmente). Esta camada muscular está separada da mucosa uretral por glândulas submucosas e por músculo liso (10). A maioria dessas fibras possui disposição periférica, exceto na linha mediana anterior, onde algumas fibras são visualizadas dentro do lobo anterior vestigial. Estas fibras são misturadas com o estroma fibromuscular e glândulas, diminuindo em direção ao lúmen da uretra (10).

e

Vesículas Seminais

As fibras transversais que recobrem a face anterior terminam abruptamente a meio caminho entre o ápice da próstata e o colo da bexiga, um pouco acima do colículo seminal. Em alguns casos o músculo estriado continua avançando proximalmente de forma simétrica, como tratos distintos de fibras longitudinais primárias que cobrem as faces anterolaterais da próstata (Figura 10.7). O curso das fibras musculares estriadas e do lúmen da uretra mostra que, proximalmente a uretra cruza obliquamente um arco de músculo estriado. A contração ativa ou tônica desta musculatura aproxima as paredes anterior e posterior da uretra, próximo ao colículo seminal, fechando o colo da bexiga, ao mesmo tempo que é verificado um fechamento da uretra distal pela contração da porção circular. Em cortes transversais do ápice da próstata, o músculo

Figura 10.6: Desenho esquemático evidenciando o esfíncter estriado da uretra e sua relação com a próstata (amarelo).

121


Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

A

B

Figura 10.7: A) Fotomicrografia da próstata de um feto do primeiro trimestre gestacional, evidenciando a disposição do esfíncter estriado externo da uretra com a região anterior da próstata. Notar que as fibras estriadas do esfíncter (seta preta) são independentes da musculatura lisa (seta azul) (Tricrômico de Masson, X40). B) Fotomicrografia da próstata de um feto do terceiro trimestre gestacional, evidenciando que as fibras estriadas do esfíncter uretral (seta preta) não se misturam com a musculatura lisa (seta azul) (Tricrômico de Masson, X40).

estriado é circular, envolvendo toda a uretra, no terço médio se desloca lateralmente, já no colo da bexiga é visto apenas nas regiões pósterolaterais (7). Próximo ao colo vesical as fibras diminuem e desaparecem, porém poucas podem ser vistas misturadas com o músculo liso na face lateral do trígono vesical. Este músculo liso é o próprio esfíncter uretral interno, pois é formado a partir da parede anterior da bexiga e diminui gradualmente sobre a face anterior da próstata. Algumas de suas fibras provavelmente penetram no ligamento pubovesical ou puboprostático (10).

MÚSCULO RETOURETRAL O músculo retouretral se origina da face anterior do reto e se insere no corpo perineal. Esse músculo precisa ser dividido para se acessar o ápice prostático, durante as prostatectomias radicais por via perineal (11). O índice de lesão retal nesta via de acesso é em torno de 11 a 15% (11), fato que ocorre em virtude da origem e da disposição que este músculo mantém com o reto. O músculo retouretral apresenta duas extensões, uma lateral e outra posterior, que se fusionam na linha média e se inserem no corpo perineal (11).

122


Anatomia

da

Próstata

VASCULARIZAÇÃO DA PRÓSTATA ARTÉRIAS A próstata é irrigada pelas artérias vesicais inferiores e retal média, ramos do tronco anterior da ilíaca interna. A artéria vescial inferior é a artéria mais importante e, quando se aproxima da glândula, se divide em dois ramos principais: Artéria uretral e artéria da cápsula. A artéria uretral penetra na glândula através da junção prostatovesical, posteriormente e se relaciona com

Figura 10.8: Desenho esquemático demonstrando os ramos arteriais da próstata (*) que, em geral, são ramos das artérias vesicais inferiores.

o colo vesical, sendo responsável por grande parte da vascularização nos casos de hiperplasia prostática benigna. Quando o adenoma é ressecado, os principais pontos de sangramento se localizam no colo vesical, na posição de 4 e 8 horas (Figura 10.8) (11).

123

e

Vesículas Seminais

PLEXO VENOSO PERIPROSTÁTICO O plexo venoso periprostático é derivado da veia dorsal profunda do pênis. A veia dorsal profunda do pênis, que transita entre o arco púbico e o esfíncter estriado da uretra, entrando na pelve, onde origina três ramos: o ramo central superficial e dois plexos laterais (Figura 10.9). O ramo superficial se localiza entre os dois ligamentos puboprostáticos e drena a gordura retropúbica, a parede anterior da bexiga e a porção anterior da próstata. Os plexos laterais localizam-se lateralmente à próstata e recebem drenagem do reto, se comunicando com o plexo vesical. Existem cerca de três a cinco veias se originando do plexo lateral que drenam para a veia ilíaca interna. Existem comunicações destas veias com as veias emissárias dos ossos pélvicos e com o plexo vertebral, fato que estaria envolvido na disseminação dos tumores prostáticos (Figura 10.10) (11). Existem variações muito freqüentes na localização e distribuição das veias periprostáticas (12). DRENAGEM LINFÁTICA DA PRÓSTATA A drenagem linfática da próstata é feita principalmente para os linfonodos ilíacos internos. Esses linfonodos apresentam três cadeias


Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

B

A

C

Figura 10.9: A) Desenho esquemático evidenciando a formação do plexo venoso periprostático. Vs= ramo superficial; Vp= ramos laterais profundos. B) Desenho esquemático evidenciando a relação do plexo venoso periprostático com a região anterior e lateral da próstata. C) Fotografia de uma pelve masculina formolizada, evidenciando as veias do plexo periprostático coradas em azul.

principais: pré-sacral, obturador e linfonodos pudendos internos (Figura 10.11A). A drenagem linfática da próstata é feita para os linfonodos ilíacos internos, principalmente para os linfonodos obturatórios, que apresentam importância cirúrgica, pois é essa cadeia que deve ser retirada durante as prostatectomias radicais (Figura 10.11B) (13).

INERVAÇÃO DA PRÓSTATA E O FEIXE NEUROVASCULAR A inervação da próstata se origina do plexo hipogástrico inferior. O plexo hipogástrico inferior se origina a partir da união do nervo hipogástrico (ramo do plexo hipogástrico superior) com os nervos esplâncnicos pélvicos

124


Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

A

Figura 10.10: Desenho esquemático mostrando as comunicações existentes do plexo venoso periprostático com os outros sistemas venosos do corpo, destaque para o plexo venoso paravertebral.

– ramos parassimpáticos (14). Um dos principais ramos do plexo hipogástrico inferior é o nervo cavernoso (feixe neurovascular), responsável pela ereção. Existe uma íntima relação do nervo cavernoso com a superfície lateral da próstata, o que leva, com grande frequência, à lesões do nervo durante as prostatectomias radicais (Figura 10.12). A lesão deste nervo pode

125

B

Figura 10.11: A) Drenagem linfática da próstata. 1- cadeia de linfonodos ilíacos externos; 2– cadeia de linfonodos obturatórios e 3– cadeia de linfonodos pré-sacrais. B) cadeia de linfonodos obturatórios (LO).


Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

A

B

C

D

Figura 10.12: Dissecção em cadáver adulto formolizado, evidenciando a inervação da próstata. A) Plexo hipogástrico superior, situado abaixo da bifurcação da aorta abdominal. B) Ramo direito do plexo hipogastrico superior se dirigindo para o oco pélvico. C) Ramificações do nervo hipogástrico direito na pelve. D) Feixe neurovascular em contato com a região lateral da próstata.

levar à disfunção sexual erétil, e sempre que possível o mesmo deve ser preservado. VESÍCULAS SEMINAIS A vesícula seminal é um órgão anexo do sistema genital masculino, responsável pela produção de parte do líquido seminal. A vesícula seminal tem um formato alongado, piriforme, com uma extremidade superior alargada e uma extremidade inferior ou colo que se une ao ducto deferente (Figura

10.13). Apresenta várias cavidades no seu interior, sendo sua parede em grande parte (cerca de 80%) formada por musculatura lisa (15). São duas camadas musculares, uma longitudinal externa e uma circular interna. O conhecimento das relações das vesículas seminais tem importância cirúrgica e radiológica. Anteriormente a vesícula seminal se relaciona com a porção da bexiga correspondente ao trígono vesical. Em casos de cistos ou tumores da vesícula seminal, um dos acessos cirúrgicos utilizados é o

126


Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

Figura 10.13: Vista posterior das vesículas seminais. 1- ureter; 2- região posterior da bexiga; 3- vesículas seminais; 4- ductos deferentes; 5- ductos ejaculatórios; 6- próstata.

transvesical com abertura da região do trígono vesical e visualização das vesículas seminais. Posteriormente, a vesícula seminal é separada do reto pelo septo retoprostático (14). Através do toque retal e da ultrassonografia transretal podemos explorar as vesículas seminais. Lateralmente, as vesículas seminais se relacionam com o plexo venoso periprostático. A vascularização arterial das vesículas seminais é feita por ramos da artéria ilíaca interna, principalmente pela artéria do ducto defererente e pelas artérias vesical inferior e retal média. A drenagem venosa é feita

127

para o plexo venoso periprostático. A linfa da vesícula seminal drena para linfonodos ilíacos internos e a inervação é feita à partir de nervos do plexo hipogástrico inferior. DUCTOS EJACULATÓRIOS O ducto ejaculatório é formado pela união em ângulo agudo da vesícula seminal com o ducto deferente. Após um trajeto de 15 a 20 mm no adulto, o ducto ejaculatório desemboca na uretra prostática, em um pequeno óstio situado na parte anterior do colículo seminal à direita e à esquerda do utrículo prostático (Figura 10.14). O


Anatomia

da

Próstata

e

Vesículas Seminais

Figura 10.14: Fotomicrografia da próstata de um feto do terceiro trimestre de gestação, evidenciando a porção distal do ducto ejaculatório (seta) e sua proximidade com o utrículo prostático (*). Hematoxilina e eosina X100.

Figura 10.15: Fotografia de um cadáver masculino formolizado, evidenciando a porção intraprostática do ducto ejaculatório (*). P= próstata; B= bexiga.

128


Anatomia

da

Próstata

ducto ejaculatório pode ser dividido em 3 segmentos: proximal, medial e distal (15). O segmento proximal situa-se na junção com a vesícula seminal. O ducto é continuação direta da vesícula seminal, enquanto que a ampola do ducto deferente entra em ângulo agudo medialmente. As fibras musculares lisas da camada longitudinal externa da vesícula seminal se continuam com a parede do ducto ejaculatório. A porção intraprostática ou segmento medial, cursa a superfície posterior da próstata superficialmente por 10 a 15mm (Figura 10.15). A porção distal, situada na região central da próstata desemboca no colículo seminal (14). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sampaio FJB, Favorito LA, Rodrigues HC: Anatomia do sistema urinário aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 1, ArtMed, Porto Alegre. 1999. 2. Villers A, McNeal JE, Freiha FS, Boccon-Gibod L, Stamey TA: Invasion of Denonvilliers’ fascia in radical prostatectomy specimens. J Urol. 1993; 149: 793-8. 3. van Ophoven A, Roth S: The anatomy and embryological origins of the fascia of Denonvilliers: a medico-historical debate. J Urol. 1997; 157: 3-9. 4. Myers RP, Goellner JR, Cahill DR: Prostate shape, external striated urethral sphincter and radical prostatectomy: the apical dissection. J Urol. 1987; 138: 543-50. 5. Sampaio FJB: Neoplasia prostática: Conceitos anatômicos fundamentais para a compreesão da patologia

129

e

Vesículas Seminais

benigna e maligna. J Bra Urol. 1992; 18: 121-125. 6. McNeal JE, Redwine EA, Freiha FS, Stamey TA: Zonal distribution of prostatic adenocarcinoma. Correlation with histologic pattern and direction of spread. Am J Surg Pathol. 1988; 12: 897-906. 7. Oelrich TM: The urethral sphincter muscle in the male. Am J Anat. 1980; 158: 229-46. 8. Brooks JD, Chao WM, Kerr J: Male pelvic anatomy reconstructed from the visible human data set. J Urol. 1998; 159: 868-72. 9. Netter F: Reproductive System. Vol. 2. Ciba, New Jersey. 1978. 10. Manley CB Jr: The striated muscle of the prostate. J Urol. 1966; 95: 234-40. 11. Brooks JD: Anatomy of the lower urinary tract and male genitalia. In: Campbell’s Urology, 8a. ed., New York, Saunders. 2002; pp. 41. 12. Myers RP: Anatomical variation of the superficial preprostatic veins with respect to radical retropubic prostatectomy. J Urol. 1991; 145: 992-3. 13. Weingärtner K, Ramaswamy A, Bittinger A, Gerharz EW, Vöge D, Riedmiller H: Anatomical basis for pelvic lymphadenectomy in prostate cancer: results of an autopsy study and implications for the clinic. J Urol. 1996; 156: 1969-71. 14. Favorito LA, Sampaio FJB: Anatomia aplicada da pelve em Garcia Marques: Técnica operatória e cirurgia experimental, capítulo 16, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 2005. 15. Nguyen HT, Etzell J, Turek PJ: Normal human ejaculatory duct anatomy: a study of cadaveric and surgical specimens. J Urol. 1996; 155: 1639-42.


Capítulo 11

Morfologia Aplicada

do

Testículo e do Epidídimo

Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio

TESTÍCULO E BOLSA ESCROTAL

A bolsa escrotal é uma dobra de pele da região perineal, que abriga o testículo, epidídimo e os elementos do funículo espermático. A bolsa escrotal é dividida em dois compartimentos independentes por uma rafe mediana (Figura 11.1). Patologias infecciosas ou coleções líquidas, localizadas em um dos compartimentos

A

da bolsa escrotal, geralmente não se disseminam para o lado oposto devido à presença desta barreira anatômica (1). Abaixo da pele da bolsa escrotal, encontramos a túnica dartos, que é contínua com a fáscia perineal superficial e com a fáscia superficial do abdômem (Figura 11.2). A disposição dessa túnica explica a disseminação de urina, que ocorre nos traumas de uretra anterior para a parede

B

Figura 11.1: A) Desenho esquemático evidenciando a exposição da bolsa escrotal, com os diversos envoltórios (túnicas) testiculares e a relação entre o testículo e o epidídimo. B) Fotografia de um feto do terceiro trimestre gestacional, onde foi realizado um corte frontal da região genital. Podemos observar a rafe mediana separando a bolsa escrotal em dois compartimentos independentes.

130

130


Morfologia Aplicada

Figura 11.2: Esquema mostrando a disposição da fáscia perineal superficial, e sua continuidade com a túnica dartos da bolsa escrotal e com a fáscia superficial do abdômem.

abdominal anterior e períneo (2). Abaixo da túnica dartos visualizamos uma série de camadas que envolvem o testículo (Figura 11.1). Essas túnicas são derivadas da parede abdominal que o testículo atravessa durante a sua migração. A camada mais superficial é a túnica espermática externa, derivada do músculo oblíquo externo do abdome; a segunda camada é a túnica cremastérica, derivada do músculo oblíquo interno do abdômem; a terceira camada é a túnica espermática interna, derivada do músculo transverso do abdômem e a camada mais profunda, derivada do peritôneo, é a túnica vaginal (3). Após a migração do testículo, a comunicação entre o testículo e a túnica vaginal - se fecha; se isto não ocorre, o paciente pode

131

do

Testículo

e

Epidídimo

Figura 11.3: Desenho esquemático onde podemos observar a persistência do processo vaginal (esquerda) e o processo vaginal obliterado (direita).

desenvolver uma hérnia inguinal indireta (Figura 11.3). A túnica vaginal é dividida em dois folhetos, o parietal e o visceral, e situada entre eles, fica a cavidade da túnica vaginal. Em casos de implantação alta da túnica vaginal, o testículo fica livre dentro dela o que facilita a ocorrência de torção testicular. A torção testicular é uma anomalia anatômica, decorrente de alterações na túnica vaginal ou no epidídimo (4). Normalmente, o testículo se encontra fixo no interior da túnica vaginal. Em casos de implantação anômala da túnica vaginal, o testículo apresentaria uma mobilidade excessiva, condição denominada de testículo em badalo de sino (4). A região entre o testículo e o epidídimo é denominada de mesórquio (4-6). Nos casos de


Morfologia Aplicada

anomalias de disjunção epididimária ou de epidídimo alongado, condições muito frequentes na criptorquia (7-9), o mesórquio se encontra alargado, favorecendo a torção testicular, condição denominada de torção testicular por mesórquio longo (Figura 11.4). O terceiro tipo de torção testicular, de acordo com a anatomia da túnica vaginal e as relações entre o epidídimo e o

A

B

Figura 11.4: A) Paciente apresentando disjunção epididimária com mesórquio alongado. B) Torção testicular com 12 horas de evolução em paciente com mesórquio alongado, notar a ocorrência de necrose testicular. T- testículo; E– epidídimo; * - Mesórquio alongado.

do

Testículo

e

Epidídimo

testículo, é a torção extravaginal, torção que geralmente ocorre intraútero ou em recém-nascidos. Os três tipos de torção testicular podem ser vistos na Figura 11.5. Ao dissecarmos todas as túnicas descritas anteriormente, observamos o testículo, que apresenta: duas extremidades, uma superior e uma inferior; duas margens laterais e duas superfícies, uma anterior e uma posterior, que se encontra coberta pelo epidídimo. Na extremidade superior do testículo podemos observar o apêndice testicular. Os apêndices testiculares e epididimários já foram considerados anomalias anatômicas (10); no entanto, alguns estudos relatam que essas estruturas estão presentes na maioria dos indivíduos normais (11). Esses apêndices, quando são muito longos e de formato pediculado, podem torcer sobre o próprio eixo, causando sintomatologia muito dolorosa além de simular torção do cordão espermático (12,13). Existem também relatos de tumores originados nestas estruturas (14). O apêndice testicular é derivado da porção superior do ducto paramesonéfrico, também sendo conhecido como hidátide séssil de Morgagni (15). A parte do ducto mesonéfrico cranial ao testículo, pode formar a hidátide pediculada de Morgagni, atualmente conhecida como apêndice epididimário. Outras estruturas vestigiais derivadas desta porção do ducto

132


Morfologia Aplicada

do

Testículo

e

Epidídimo

B

A

C

Figura 11.5: Desenho esquemático evidenciando os tipos de torção testicular: A) torção intravaginal; B) torção extravaginal e C) torção por mesórquio longo.

B

A

C

Figura 11.6: A) O esquema evidencia a localização mais freqüente dos apêndices testiculares e epididimários. Ilustração baseada no artigo de Rolnick (2). Seta maior: apêndice testicular; seta menor: apêndice epididimário; Estrela azul: Paradídimo; Asteriscos: Vasos aberrantes de Haller Superior e Inferior. B) Apêndice epididimário (*) em paciente portador de criptorquia. C) Apêndice Testicular (*) em paciente portador de criptorquia.

133


Morfologia Aplicada

mesonéfrico são os “órgãos de Haller”, localizados na fissura entre o testículo e o epidídimo, consistindo-se de um grupo de vasos aberrantes superiores e inferiores, e o “órgão de Giraldes”, chamado de paradídimo ou corpo inominado, e localizado na porção distal do cordão espermático (11,15,16) (Figura 11.6). Nos apêndices testiculares corados com Masson foi demonstrado um estroma vascular revestido por epitélio pseudocolunar. O estroma consistia de tecido conjuntivo frouxo, contendo vasos sanguíneos, fibroblastos e números variados de ácinos (gland-like structures), que foram revestidas por epitélio colunar não ciliado (Figura 11.7A). Os apêndices epididimários eram vistos como estruturas vesiculares. A cavidade da vesícula foi revestido por epitélio colunar pseudoestratificado (Figura 11.7B). O epitélio não apresentou alteração aparente nos apêndices de pacientes com criptorquia e no grupo controle, como podemos observar (Figura 11.7C). O testículo é envolvido por uma túnica espessa com grande quantidade de tecido conjuntivo denso, a túnica albugínea, que envia septos para o interior do testículo, dividindo-o em lobos, onde estão situados os túbulos seminíferos contorcidos (Figura 11.8). Os túbulos seminíferos contorcidos chegam à região do mediastino testicular, se retificam e originam a rede testicular, de

do

Testículo

e

Epidídimo

A

0.5 µm

B

C

Figura 11.7: Análise do epitélio dos apêndices testiculares. A) Paciente de 13 anos de idade com criptorquia. Podemos observar o epitélio pseudoestratificado do apêndice testicular íntegro. Masson’s trichrome x400. B) Paciente de 13 anos de idade com torção; podemos observar o apêndice epididimário com uma cavitação revestida por epitélio em seu interior pseudoestratificado. Masson’s trichrome x400. C) Paciente de 13 anos de idade com hidrocele; podemos observar o epitélio pseudoestratificado do apêndice testicular íntegro. Tricrômio de Masson x400

134


Morfologia Aplicada

do

Testículo

e

Epidídimo

3

1

A

2

B

Figura 11.8: A) Fotografia do testículo de cadáver adulto formolizado, em que podemos observar que a túnica albugínea foi aberta e o parênquima testicular exposto. B) Visualização dos túbulos seminíferos contorcidos (1), túbulos seminíferos retos (2) e ductos eferentes (3).

onde partem os túbulos eferentes, que comunicam o testículo com a cabeça do epidídimo (1,3). VASCULARIZAÇÃO E DRENAGEM LINFÁTICA O testículo é irrigado por três artérias: artéria testicular, ramo direto da aorta; artéria deferencial e artéria cremastérica, ramos da artéria ilíaca interna. As três artérias que vascularizam o testículo penetram no órgão na região do mediastino testicular, onde se anastomosam amplamente. Um estudo prévio, feito em fetos humanos com o testículo posicionado no abdômen, evidenciou que, na maioria dos casos, o testículo é irrigado por três ou quatro artérias (Figura 11.9). Em apenas 23% dos casos o testículo era irrigado por 2 artérias (17). O conhecimento deste padrão de

135

vascularização é importante durante a realização da orquidopexia dos testículos posicionados no abdômen. Uma técnica muito comumente utilizada nesses casos é a cirurgia de Fowler-Stephens, em que se liga a artéria testicular, o testículo é mobilizado e sua vascularização fica mantida pela artéria deferencial e cremastérica. Um ponto importante para realização desta cirurgia é que se deve evitar uma dissecção testicular grande para não ocorrer desvascularização do órgão. O conhecimento da anatomia das veias que drenam o testículo tem importância clínica devido a uma patologia que acomete as veias testiculares e é uma das principais causas de infertilidade, a varicocele. O testículo é drenado pelo plexo pampiniforme, que na região do anel inguinal profundo, origina a veia testicular. A veia testicular esquerda desemboca na veia renal esquerda (Figura 11.10A) e a veia testicular direita desemboca diretamente na veia cava inferior (1).


Morfologia Aplicada

do

A

C

Testículo

e

Epidídimo

B

D

Figura 11.9: Desenhos esquemáticos da vascularização do testículo em posição abdominal em fetos humanos. A) Vascularização feita por três arterias: 1 originada da aorta, uma originada da ilíaca interna e uma originada da ilíaca externa; B) Vascularização feita por duas artérias: uma originada da aorta e uma originada da ilíaca interna; C) Vascularização feita por quatro artérias: duas originadas da aorta, uma originada da ilíaca interna e uma originada da ilíaca externa; D) Vascularização feita por quatro arterias: uma originada da aorta, duas originada da ilíaca interna e 1 originada da ilíaca externa.

As veias testiculares apresentam válvulas por toda a sua extensão. Na região da quarta vértebra lombar, as veias testiculares se dividem em dois

troncos, um lateral e um medial (Figura 11.10B e Figura 11.10C). O tronco lateral se anastomosa com veias retroperitoneais, principalmente colônicas e veias

136


Morfologia Aplicada

do

Testículo

e

Epidídimo

A

B

C

Figura 11.10: Anatomia das veias gonadais. A) Desenho esquemático evidenciando a veia testicular esquerda (TV) desembocando na veia esquerda (RV). A - aorta, VC - veia cava inferior, U - ureter e K - rim esquerdo. B) Desenho esquemático do trajeto abdominal da veia gonadal. Na região da quarta vértebra lombar a veia gonadal se bifurca em um tronco lateral, que se anastomosa com veias retroperitoneais e em um tronco medial que drena para a veia cava inferior. VG – veia gonadal, m – tronco medial; l – tronco lateral. C) Fotografia de um cadáver do sexo masculino evidenciando o trajeto da veia gonadal descrito anteriormente.

137


Morfologia Aplicada

capsulares renais; o tronco medial se anastomosa com veias do ureter; existem anastomoses entre os dois troncos venosos (1-3). A varicocele consiste na dilatação das veias testiculares, principalmente do lado esquerdo; seu tratamento é cirúrgico e consiste na ligadura das veias varicosas. Um dos fatores envolvidos na recidiva após a cura cirúrgica da varicocele é a distribuição anatômica das veias testiculares no retroperitôneo (18). A drenagem linfática da bolsa escrotal é feita para os linfonodos inguinais superficiais. O testículo direito drena para linfonodos retroperitoneais situados ao longo do pedículo renal e da veia cava inferior e entre a veia cava inferior e a aorta. O testículo esquerdo tem sua linfa drenada para linfonodos situados ao longo do hilo renal esquerdo e da artéria aorta (Figura 11.11). Um dos principais meios de disseminação dos tumores testiculares é a via linfática. O conhecimento da drenagem linfática do testículo e da bolsa escrotal tem implicação no diagnóstico e na terapêutica desses tumores (19). EPIDÍDIMO O epidídimo é o órgão responsável pela maturação, reserva e transporte dos espermatozoides. É a primeira porção da via eferente do testículo. Está localizado na face pósterolateral do testículo

do

Testículo

e

Epidídimo

Figura 11.11: Drenagem linfática do testículo. O testículo direito drena para linfonodos retroperitoneais situados ao longo do pedículo renal, da veia cava inferior e entre a veia cava inferior e a aorta. O testículo esquerdo tem sua linfa drenada para linfonodos situados ao longo do hilo renal esquerdo e da artéria aorta.

(Figura 11.1). Apresenta uma porção superior dilatada, a cabeça, uma porção central, o corpo, e uma extremidade inferior afilada, a cauda. A cabeça do epidídimo está diretamente ligada ao polo cranial do testículo pelos ductos eferentes. A cauda está ligada ao polo inferior do testíuculo por tecido areolar e por uma reflexão da túnica vaginal. Um recesso da túnica vaginal, o seio do epidídimo ou mesórquio, encontrase entre o corpo do epidídimo e a face lateral do testículo (2).

138


Morfologia Aplicada

do

Testículo

e

Epidídimo

A

B

Figura 11.12: Desenho esquemático evidenciando a classificação das relações anatômicas entre o testículo e o epidídimo. tipo 1 – epidídimo unido ao testículo pela cabeça e cauda; tipo 2 – epidídimo totalmente unido ao testículo; tipo 3 – disjunção da cauda epididimária; tipo 4 – disjunção de cabeça epididimária; tipo 5 – disjunção total do epidídimo; tipo 6 – atresia epididimária.

Turek (20) sugeriu uma classificação da relação entre o testículo e o epidídimo em seis

139

Figura 11.13: A) Paciente com criptorquia apresentando disjunção de cauda do epidídimo (anatomia do tipo III); B) Paciente com criptorquia, apresentando disjunção total entre o testículo e o epidídimo (anatomia do tipo V). T = testículo; E= epidídimo e * = gubernáculo testicular.

grupos (Figura 11.12): tipo I – epidídimo unido ao testículo e pela cabeça e cauda; tipo II – epidídimo


Morfologia Aplicada

totalmente unido ao testículo; tipo III – disjunção da cauda epididimária; tipo IV – disjunção de cabeça epididimária; Tipo V – disjunção total do epidídimo; Tipo VI – atresia epididimária. As anatomias do tipo I e II são consideradas normais e os demais tipos são anomalias anatômicas comumente encontradas em pacientes com criptorquia (Figura 11.13) (21,22). Shafik (23), num estudo de 38 cadáveres, relata a presença de três ligamentos epididimários. Os ligamentos unem respectivamente:

Figura 11.14: Ligamentos testiculares segundo Shafik (1987): 1 - ligamento superior do epidídimo; 2 - ligamento inferior do epidídimo; 3 - ligamento do ducto deferente.

o polo superior do testículo à cabeça do epidídimo, o polo inferior do testículo à cauda do epidídimo e o ducto deferente à cauda do epidídimo (Figura 11.14). Esses ligamentos são dobras da porção visceral da túnica vaginal, sendo importantes para a fixação do testículo e do epidídimo.

do

Testículo

e

Epidídimo

Os ductos eferentes do testículo, em número de 12 a 15, são retos e se tornam tortuosos após penetrar na cabeça do epidídimo. Nessa região formam massas em forma de cunha, os lóbulos do epidídimo (Figura 11.7), indo desembocar no ducto do epidídimo. Esse ducto é enovelado e forma o corpo e a cauda do epidídimo. O ducto epididimário aumenta de diâmetro e espessura à medida que se aproxima da cauda do epidídimo, onde se torna o ducto deferente. As convoluções epididimárias são mantidas por fino tecido areolar e por tecido fibroso (3). A cabeça e o corpo do epidídimo são supridos pela artéria epididimária, originada da artéria testicular, a uma distância variável do epidídimo. Esta artéria, geralmente, se origina na região do canal inguinal e forma um arco anastomótico com a artéria deferencial. A cabeça do epidídimo recebe suprimento arterial adicional da artéria testicular. Três artérias contribuem para a irrigação da cauda do epidídimo: a artéria epididimária, artéria deferencial e artéria testicular. Pode haver uma quarta artéria, ramo da artéria cremastérica, participando da irrigação desta região (17). As veias do corpo e cauda do epidídimo formam uma rede anastomótica chamada de veia epididimária de Hoeber. As veias principais do epidídimo se juntam com o plexo pampiniforme (1). A drenagem linfática do

140


Morfologia Aplicada

epidídimo é feita por duas vias: os linfáticos da cabeça e do corpo drenam para os linfáticos testiculares; os linfáticos da cauda drenam para os linfonodos ilíacos externos. Os nervos do testículo e epidídimo acompanham os vasos testiculares e são derivados do décimo e do décimo primeiros segmentos da medula espinhal, através dos plexos renal e aórtico. DUCTO DEFERENTE O ducto deferente é uma continuação do ducto epididimário que transporta os espermatozoides do epidídimo até o ducto ejaculatório. O ducto deferente se inicia na cauda do epidídimo, onde é tortuoso, ascende pelo lado medial do epidídimo onde é circundado pelo plexo pampiniforme, fazendo parte do funículo espermático. Continua

do

Testículo

e

Epidídimo

em direção superior para o anel inguinal externo e, nesta, região pode ser facilmente palpável. É o elemento mais posterior e de consistência endurecida no funículo espermático, sendo esse o local onde o ducto deferente é abordado durante as vasectomias (3). Após passar pelo canal inguinal, curva-se em torno da artéria epigástrica inferior e ascende anteriormente à artéria ilíaca externa, voltando-se posterior e inferiormente, cruzando os vasos ilíacos externos e penetrando na pelve (Figura 11.15). Cruza a face medial do ureter, atingindo a face posterior da bexiga, percorrendo em direção inferior e medial sobre a face medial da vesícula seminal. Nesta região, o ducto é dilatado e tortuoso, sendo denominado de ampola, se unindo ao ducto da vesícula seminal, formando o ducto ejaculatório. A irrigação arterial do ducto deferente é feita pela artéria deferencial, um ramo da artéria ilíaca interna; a drenagem venosa é feita por um plexo que se situa ao redor do ducto deferente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Figura 11.15: Trajeto do ducto deferente.

141

1. Sampaio FJB, Favorito LA, Rodrigues HC: Anatomia do sistema genital masculino aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 2, ArtMed, Porto Alegre. 1999. 2. Netter F: Reproductive System. Vol 2. Ciba, New Jersey. 1978. 3. Gardner E, Gray DJ, O’rahilly R: Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de


Morfologia Aplicada

Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. 4. Parker RM, Robison JR: Anatomy and diagnosis of torsion of the testicle. J Urol. 1971; 106: 243-7. 5. Scorer CG, Farrinton GH: Congenital anomalies of the testis: Cryptorchidishm, testicuar torsion, inguinal hernia and hydrocele. In: Campbell’s Urology, 4th ed, vol 2. Philadelphia: WB Saunders & Co, 1979. 6. Elder JS: Epididymal anomalies associated with hydrocele/hernia and cryptorchidism: implications regarding testicular descent. J Urol. 1992; 148: 624-6. 7. Gill B, Kogan S, Starr S, Reda E, Levitt S: Significance of epididymal and ductal anomalies associated with testicular maldescent. J Urol. 1989; 142: 556-8; discussion 572. 8. Gill B, Kogan S: Cryptorchidism. Current concepts. Pediatr Clin North Am. 1997; 44: 1211-27. 9. Marshall FF: Anomalies associated with cryptorchidism. Urol Clin North Am. 1982; 9: 339-47. 10. Johansen TE: Anatomy of the testis and epididymis in cryptorchidism. Andrologia. 1987; 19: 565-9. 11. Rolnick D, Kawanoue S, Szanto P, Bush IM: Anatomical incidence of testicular appendages. J Urol. 1968; 100: 755-6. 12. Vermeulen CW, Hagerty CS: Torsion of the appendix testis (hydatid of Morgagni) report of two cases with a study of the microscopic anatomy. J Urol. 1945; 54: 459-65. 13. Krukowski ZH, Auld CD: Torsion of the appendix epididymis in a maldescended testis. Br J Urol. 1983; 55: 244-5. 14. Kernohan NM, Coutts AG, Best PV: Cystadenocarcinoma of the appendix testis. Histopathology. 1990; 17: 147-54.

do

Testículo

e

Epidídimo

15. Nöske HD, Kraus SW, Altinkilic BM, Weidner W: Historical milestones regarding torsion of the scrotal organs. J Urol. 1998; 159: 13-6. 16. Favorito LA, Cavalcante AG, Babinski MA: Study on the incidence of testicular and epididymal appendages in patients with cryptorchidism. Int Braz J Urol. 2004; 30: 49-52. 17. Sampaio FJ, Favorito LA, Freitas MA, Damião R, Gouveia E: Arterial supply of the human fetal testis during its migration. J Urol. 1999; 161: 1603-5. 18. Wishahi MM: Detailed anatomy of the internal spermatic vein and the ovarian vein. Human cadaver study and operative spermatic venography: clinical aspects. J Urol. 1991; 145: 780-4. 19. Srougi M, Simon SD: Câncer Urológico. São Paulo, Platina. 1990. 20. Turek PJ, Ewalt DH, Snyder HM 3rd, Duckett JW: Normal epididymal anatomy in boys. J Urol. 1994; 151: 726-7. 21. Favorito LA, Sampaio FJ: Anatomical relationships between testis and epididymis during the fetal period in humans (10-36 weeks postconception). Eur Urol. 1998; 33: 121-3. 22. Favorito LA, Costa WS, Sampaio FJ: Analysis of anomalies of the epididymis and processus vaginalis in human fetuses and in patients with cryptorchidism treated and untreated with human chorionic gonadotrophin. BJU Int. 2006; 98: 854-7. 23. Shafik A: Epididymal ligaments: anatomy and function. Int J Fertil. 1987; 32: 324-30.

142


Capítulo 12

Morfologia Aplicada

do

Pênis

Luciano Alves Favorito Francisco J. B. Sampaio

INTRODUÇÃO

O entendimento da anatomia peniana é básico para a realização de diversas cirurgias em Urologia infantil como a postectomia, as hipospádias e as epispádias. O pênis é dividido em duas porções: a raiz, situada no espaço superficial do períneo, que é responsável pela fixação e estabilidade do pênis, e a porção livre, que forma a maior parte do órgão e é constituído por

três estruturas eréteis, os dois corpos cavernosos e o corpo esponjoso, que apresenta uma expansão distal coberta por pele, a glande do pênis (1,2) (Figura 12.1). A porção livre apresenta uma fixação à parede anterior do abdômen que é o ligamento suspensor do pênis (Figura 12.1). RAIZ DO PÊNIS

A

B

Figura 12.1: A) Desenho esquemático demostrando a raiz e a porção livre (L) do pênis. B) Fotografia do pênis de um cadáver adulto formolizado, evidenciando o ligamento suspensor do pênis (*).

143


Morfologia Aplicada

A raiz do pênis é formada por uma extremidade central dilatada, o bulbo, e duas porções laterais, os ramos ou pilares do pênis (Figura 12.2). O bulbo do pênis fica localizado no intervalo entre os dois ramos, estando fixado à superfície inferior da face inferior do diafragma urogenital, continuase anteriormente com o corpo esponjoso e é atravessado em sua porção central pela uretra bulbar, sendo envolvido pelo músculo bulboesponjoso (1,2). A contração do músculo bulboesponjoso auxilia o esvaziamento da uretra na fase final da micção e durante a emissão do líquido

do

Pênis

seminal. Os ramos do pênis são formações alongadas, intimamente aderidas à porção inferior do ísquio e do púbis, estando revestidos pelos músculos isquiocavernosos; a contração desses músculos é responsável pela compressão da raiz do pênis, levando a um aumento na pressão dentro do corpo cavernoso, o que aumentaria a rigidez peniana. A contração dos músculos isquiocavernosos atuaria aumentando a rigidez peniana, principalmente durante a penetração (3,4). PORÇÃO LIVRE DO PÊNIS

b p

B

Figura 12.2: A) Desenho esquemático evidenciando os corpos eréteis penianos. Na raiz do pênis podemos observar o bulbo (b) e os ramos ou pilares penianos (p). B) Corte sagital do pênis de um cadáver adulto formolizado, evidenciando a relação dos corpos cavernoA sos com o corpo esponjoso na região do sulco coronal.

144


Morfologia Aplicada

A porção livre do pênis é dividida em corpo e glande, região coberta por uma dobra cutânea denominada de prepúcio. A parte superior do corpo peniano é também chamada de região dorsal e a parte inferior, onde está localizada a uretra, de região ventral.

do

Pênis

a fossa navicular, segunda região mais dilatada da uretra, só perdendo para a uretra prostática (1,3). A fossa navicular é mais bem visualizada se realizarmos um corte sagital da glande (Figura 12.4). O prepúcio é um tecido mucocutâneo especializado e

GLANDE E PREPÚCIO A glande é a porção distal dilatada do corpo esponjoso (Figura 12.2), apresenta uma elevação que a separa do corpo do pênis, chamada de coroa da glande, e é separada do prepúcio pelo sulco balanoprepucial (1,3). O prepúcio apresenta uma extensão vascularizada da mucosa que se fixa na porção ventral da glande, denominada de freio do prepúcio (Figura 12.3). No ápice da glande está localizado o meato externo da uretra. Nesta região fica localizada FR

*

Figura 12.3: Corte transverso da glande em um feto do segundo trimestre gestacional, corado pelo van gieson, em um aumento de 40 vezes. Notar que a glande é formada somente por corpo esponjoso e circunda totalmente a uretra (*). O freio do prepúcio (FR) pode ser identificado nesta figura.

145

Figura 12.4: Corte sagital do pênis de um cadáver formolizado, evidenciando a fossa navicular (*) da uretra glandar.

muito inervado, que cobre e protege a glande (Figura 12.5). Ao nascimento, a glande não pode ser exposta, em virtude de sua face interna epitelial estar fusionada com a glande. Após os 2 ou 3 anos de idade, cistos de queratinização acabam por romper as aderências prepuciais e, juntamente com as ereções intermitentes, alargam o anel fimótico, expondo a glande. Cerca de 80 a 90% dos meninos não circuncisados são capazes de expor a glande após os 3 anos de idade (5).


Morfologia Aplicada

A fimose fisiológica acomete 96% dos recém-natos e diminui sua incidência com a idade. Aos 3 anos, 10% dos pacientes apresentam fimose e, aos 14 anos esta incidência atinge 1% (6) (Figura 12.5).

do

Pênis

anel, levando a formação de fibrose cicatricial e a impossibilidade de exposição da glande. Existem vários tipos de classificação da posição do anel fimótico (7-9) ,porém apenas Kayaba demonstra o formato e o grau de retratibilidade do prepúcio anatomicamente (10). Segundo essa classificação existem quatro grupos de acordo com o grau de retração

A

A

B Figura 12.5: Prepúcio: A) Fotomicrografia de um paciente com 10 anos de idade, corado pela técnica de Weigert, evidenciando as camadas do prepúcio. B) Fotografia do pênis de um paciente de 4 anos de idade, portador de fimose, com incapacidade de exposição da glande.

O processo natural do alargamento do prepúcio pode sofrer alterações mediante episódios de balanopostites e adelgaçamento e lesão do prepúcio por tração traumática do

B

C

D

Figura 12.6: Esquema baseado no trabalho de Kayaba (10), evidência os quatro tipos de prepúcio, de acordo com a posição do anel e sua capacidade de retração: grupo A - nenhuma retração do prepúcio; grupo B: exposição do meato ureteral; grupo C: exposição de metade da glande e grupo D: exposição da glande com aderências no sulco balanoprepucial.

146


Morfologia Aplicada

do prepúcio (10) (Figura 12.6). No grupo A o prepúcio não apresenta nenhuma retração; o grupo B apresenta apenas exposição do meato ureteral; no grupo C se consegue-se exposição de metade da glande e no grupo D a exposição da glande é incompleta em virutde da presença de aderências no sulco balanoprepucial.

do

Pênis

a

Corpo do Pênis O corpo do pênis é formado por três estruturas eréteis, que se ingurgitam de sangue durante a ereção: os dois corpos cavernosos e o corpo esponjoso. Os corpos cavernosos estão situados na região dorsal do pênis, ou seja, a região pósterosuperior, quando o pênis está em ereção. O corpo esponjoso é atravessado pela uretra e se situa na região ventral do pênis, ou seja, a região que está em contato com a região perineal quando o pênis está em estado flácido. O corpo esponjoso se continua numa região distal dilatada, a glande do pênis (3,11). Se fizermos um corte transversal no corpo do pênis (Figura 12.7), iremos observar que os corpos eréteis estão envolvidos por uma série de estruturas. Abaixo da pele observamos a tela subcutânea, chamada de fáscia superficial do pênis. A fáscia superficial apresenta uma pequena quantidade de fibras musculares lisas e é quase totalmente desprovida de gordura;

147

A

B Figura 12.7: A) Desenho esquemático de um corte transverso do corpo do pênis, mostrando a disposição dos corpos cavernosos e a túnica albugínea (a). B) Corte transverso do corpo do pênis de um cadáver adulto formolizado.

esta fáscia se continua com a túnica dartos da bolsa escrotal e com a fáscia superficial do períneo. Inferiormente à fáscia superficial do pênis, encontramos uma continuação da fáscia perineal profunda, a fáscia profunda do pênis ou fáscia de Buck. A fáscia de Buck é uma fáscia forte e membranácea, envolvendo ambos os corpos cavernosos e o corpo esponjoso (2,3,11).


Morfologia Aplicada

Sobre a fáscia profunda do pênis, encontramos um envoltório fibroso denso, a túnica albugínea do pênis. A porção da túnica albugínea que envolve os corpos cavernosos é mais espessa do que a túnica albugínea que envolve o corpo esponjoso (Figura 12.8). Da túnica albugínea partem numerosas trabéculas, que dividem o interior dos corpos eréteis em espaços cavernosos (11). A túnica albugínea, principalmente a porção que envolve os corpos cavernosos, tem papel importante na ereção peniana. A túnica albugínea dos corpos cavernosos é constituída principalmente de feixes colágenos espessos, contendo poucas fibras elásticas (Figura 12.8). Como a túnica albugínea se expande durante a ereção, o arranjo dos feixes colágenos deve ser feito de tal forma a permitir esta expansão. A espessura da túnica albugínea que em estado flácido tem cerca de 2 a 3mm em ereção essa espessura é de 0,5mm. A túnica albugínea é formada quase que inteiramente de fibras colágenas espessas. Desde a superfície profunda da túnica, colunas fibrosas penetram a substância do corpo cavernoso em diferentes profundidades. Tanto a túnica albugínea quanto as colunas fibrosas dela originadas possuem ondulações e suas fibras elásticas são escassas. A túnica albugínea é atravessada por vasos e nervos. que

do

Pênis

Figura 12.8: Pênis de um feto do terceiro trimestre gestacional cortado transversalmente, corado pela técnica de Weigert. Notar a distribuição da túnica albugínea ao redor dos corpos eréteis. Aumento de 40 vezes.

passam no interior de verdadeiros estojos da túnica albugínea, que impedem a compressão dos vasos e nervos durante a ereção. Apesar de a túnica albugínea ser feita quase que completamente de material não extensível, ela está apta a se expandir durante a ereção, devido às ondulações de suas fibras colágenas no estado flácido (12). ARTÉRIAS DO PÊNIS O pênis é irrigado pelas duas artérias pudendas internas, ramos da artéria ilíaca interna (hipogástrica). Após enviar seus vários ramos perineais, a artéria pudenda interna passa a ser

148


Morfologia Aplicada

chamada de artéria comum do pênis, que envia três ramos: a artéria dorsal do pênis, a artéria bulbouretral e a artéria cavernosa (Figura 12.9). A artéria cavernosa se situa no interior do corpo cavernoso, a artéria bulbouretral é responsável pela irrigação do corpo esponjoso e uretra e a artéria dorsal

Figura 12.9: Artérias do pênis. A) Ramificação da artéria pudenda interna, mostrando o trajeto dos ramos penianos. B) Corte transverso do corpo peniano, evidenciando a disposição das artérias do pênis.

do pênis fica situada entre a túnica albugínea e a fáscia de Buck. As artérias penianas se ramificam, originando artérias menores que se dirigem para os espaços cavernosos, as artérias helicinais (1-3,11). As artérias dorsais do

149

do

Pênis

pênis junto com a veia dorsal e os nervos dorsais do pênis formam um importante feixe vasculonervoso, que em muitas situações (cirurgias de hipospádia com plicatura) necessitam ser isolados para evitar lesões inadvertidas (Figura 12.10). As artérias cavernosas e seus ramos helicinais são envolvidas por uma bainha fibrosa. Estas bainhas estabelecem ligações com as trabéculas da túnica albugínea. A pressão durante a ereção é muito alta, as artérias se tornariam inabilitadas a funcionar, se não fossem envolvidas por

Figura 12.10: Pênis de um cadáver formolizado, evidenciando o feixe vasculonervoso dorsal isolado superiromente e a uretra separada dos corpos cavernosos inferiormente.

bainhas fibrosas. Este arranjo anatômico provavelmente previne o colapso das artérias durante a ereção, quando os elementos da trama fibrosa estão esticados. As artérias helicinais também podem estabelecer essas ligações, enquanto


Morfologia Aplicada

as arteríolas terminais abrem-se dentro dos espaços cavernosos. Feixes de músculo liso foram observados no interior das bainhas fibrosas das artérias cavernosas, correndo paralelamente ao eixo das artérias. Em alguns locais, estes feixes podem ser vistos perfurando a bainha fibrosa da artéria cavernosa e ganhando conexão com o tecido muscular do parênquima (3,11). Coxins arteriais foram descritos por Conti em 1952 e, com base nestes achados morfológicos, foi proposta uma teoria de regulação vascular que prevaleceu um longo tempo. Nos últimos anos alguns autores (13) colocaram em dúvida os achados anatômicos de Conti e propuseram que aquelas estruturas descritas eram alterações ateroescleróticas das artérias penianas. Em 1988, Conti (14) confirmou todos os seus achados anteriores e provou que os coxins realmente existem, não são alterações ateroescleróticas e sua teoria morfológica de regulação do fluxo sanguíneo no pênis voltou a vigorar. VEIAS DO PÊNIS A drenagem venosa dos corpos eréteis penianos se origina em pequenas vênulas, originadas dos espaços perisinusoidais, situados abaixo da túnica

do

Pênis

albugínea. Essas veias drenam para as veias emissárias, que atravessam a túnica albugínea e desembocam nas veias circunflexas, situadas lateralmente aos corpos eréteis (11). As veias circunflexas drenam para a veia dorsal profunda do pênis que, por sua vez, desemboca no plexo venoso periprostático (Figura 12.11). As veias circunflexas são providas de uma ou mais válvulas. A pele e a tela subcutânea do pênis são drenadas para a veia dorsal superficial do pênis, que

Figura 12.11: Veias do pênis. A) Formação do plexo venoso periprostático. B) Corte transverso do corpo do pênis, mostrando a disposição das veias.

desemboca geralmente safena magna.

na

veia

DRENAGEM LINFÁTICA DO PÊNIS

150


Morfologia Aplicada

O conhecimento da drenagem linfática do pênis é importante para a compreensão da disseminação dos tumores epidermoides deste órgão. A pele e o prepúcio drenam para os linfonodos superficiais da região ínguino, situados acima da fáscia lata. A glande e o restante do pênis drenam para linfonodos inguinais profundos, situados profundamente à fáscia lata, e para linfonodos ilíacos externos. De especial importânica na disseminação dos tumores de pênis é o chamado linfonodo sentinela de Cabanas,

A

do

Pênis

situado medialmente à crossa da safena (Figura 12.12), sendo o primeiro local de acometimento na disseminação linfoide dos tumores de pênis (15). NERVOS DO PÊNIS O pênis é inervado pelos nervos dorsais do pênis, que são ramos do nervo pudendo, inervando a pele e principalmente a glande; os ramos profundos dos nervos perineais, que entram no bulbo, e inervam principalmente a uretra e os nervos cavernosos do pênis, ramos do plexo hipogástrico inferior, responsáveis

B

Figura 12.12: A) Desenho esquemático evidenciando a localização do linfonodo sentinela de Cabanas. O linfonodo fica na interseção das duas linhas imaginárias que dividem a região inguinocrural em quatro quadrantes. B) Fotografia da região inguinocrural de um cadáver adulto do sexo masculino, evidenciando a distribuição dos linfonodos superficiais da região. 1 – crossa da veia safena magna; 2 - linfonodos inguinais superficiais; 3 – veia epigástrica superficial; 4 – veia safena acessória e 5 - veia femoral.

151


Morfologia Aplicada

do

Pênis

Figura 12.13: Desenho esquemático evidenciando a divisão do plexo hipogástrico superior (S) e a formação do plexo hipogástrico inferior (i) que origina o nervo cavernoso (em vermelho).

pela inervação autonômica do pênis, inervando os corpos eréteis penianos (3) (Figura 12.13). Os nervos cavernosos são muito importantes no processo da ereção. Eles apresentam características anatômicas diferentes dos outros nervos, estando localizados em túneis fibrosos nos quais numerosas bandas fibrosas estabelecem conexão (11). Durante a ereção, quando o corpo cavernoso

está repleto de sangue, desenvolve grande pressão, esses túneis fibrosos perineurais, que estão conectados a todos os elementos fibrosos do corpo cavernoso, inclusive a albugínea, tornam-se estirados e previnem a compressão dos nervos cavernosos durante a ereção. A pressão intracavernosa no estado ereto pode ser 10 vezes maior do que a pressão sistólica. No pênis

152


Morfologia Aplicada

flácido, os nervos são espiralados ou ondulados. Este espiralamento e ondulação dos nervos, exatamente como as artérias helicinais, permite o seu alongamento e ajuste às mudanças de dimensão do corpo cavernoso durante a ereção (11). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sampaio FJB, Favorito LA, Rodrigues HC. Anatomia do sistema urinário aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 1, ArtMed, Porto Alegre. 1999. 2. Netter F. Reproductive System. Vol. 2. Ciba, New Jersey. 1978. 3. Gardner E, Gray DJ, O’rayhli R: Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. 4. Claes H, Bijnens B, Baert L: The hemodynamic influence of the ischiocavernosus muscles on erectile function. J Urol. 1996; 156: 986-90. 5. Orsola A, Caffaratti J, Garat JM: Conservative treatment of phimosis in children using a topical steroid. Urology. 2000; 56: 307-10. 6. Shankar KR, Rickwood AM: The incidence of phimosis in boys. BJU Int. 1999; 84: 101-2. 7. Elmore JM, Baker LA, Snodgrass WT: Topical steroid therapy as an alternative to circumcision for phimosis in boys younger than 3 years. J Urol.

153

do

Pênis

2002; 168: 1746-7; discussion 1747. 8. Atilla MK, Dündaröz R, Odabas O, Oztürk H, Akin R, Gökçay E: A nonsurgical approach to the treatment of phimosis: local nonsteroidal antiinflammatory ointment application. J Urol. 1997; 158: 196-7. 9. Kikiros CS, Beasley SW, Woodward AA: The response of phimosis to local steroid application. Pediatr Surg Int. 1993; 8: 329. 10. Kayaba H, Tamura H, Kitajima S, Fujiwara Y, Kato T, Kato T: Analysis of shape and retractability of the prepuce in 603 Japanese boys. J Urol. 1996; 156: 1813-5. 11. Favorito LA, Sampaio FJB: Anatomia aplicada da pelve em Garcia Marques: Técnica operatória e cirurgia experimental, capítulo 16, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 2005. 12. Goldstein AM, Meehan JP, Morrow JW, Buckley PA, Rogers FA: The fibrous skeleton of the corpora cavernosa and its probable function in the mechanism of erection. Br J Urol. 1985; 57: 574-8. 13. Benson GS, McConnell JA, Schmidt WA: Penile polsters: functional structures or atherosclerotic changes? J Urol. 1981; 125: 800-3. 14. Conti G, Virag R, von Niederhäusern W: The morphological basis for the Polster theory of penile vascular regulation. Acta Anat (Basel). 1988; 133: 209-12. 15. Srougi M, Simon SD: Câncer Urológico. São Paulo, Platina. 1990.


Capítulo 13

Anatomia

do

Útero

Luciano Alves Favorito

ANATOMIA DO ÚTERO O útero é órgão responsável por abrigar o feto. Apresenta 3 camadas, a mais externa, o epimétrio, o miométrio, muscular, e o endométrio, camada interna, que se desprende durante a menstruação. Fica localizado na pelve, anteriormente ao reto e posteriormente à bexiga (Figura 13.1). Encontra-se em posição de anteflexão em relação ao eixo vaginal e fletido em relação ao seu próprio eixo (1,2).

RECESSOS E LIGAMENTOS

As vísceras pélvicas na mulher são cobertas por reflexões peritoneais, o que origina recessos de importância cirúrgica. Podemos observar três recessos na pelve feminina: 1) pré-vesical – entre o púbis e a bexiga; 2) vésico-uterino – entre a bexiga e o útero e 3) reto-uterino (Fundo de saco de Douglas) – entre o reto e o útero (Figura 13.2). O fundo de saco de Douglas apresenta grande importância em virtude de ser o ponto de maior declive da cavidade peritoneal da mulher, quando o indivíduo se encontra em posição ortostática, o que leva ao acúmulo de secreções neste espaço (sangue, pus, etc). O fundo de saco de Douglas pode ser puncionado através da região vaginal que circunda a porção inferior do Figura 13.1: Peça anatômica formoli- útero, o fórnix vaginal e que zada, evidenciando as relações ana- pode auxiliar no diagnóstico de tômicas do útero (U) com o reto (R) e determinadas patologias, como a bexiga (B). a prenhez ectópica (3,4). O peritôneo que recobre o útero é denominado de ligamento largo, sendo uma estrutura importante no

154

154


Anatomia

do

Útero

A

B

C

Figura 13.2: A) Desenho esquemático das relações do útero com as vísceras pélvicas, notar as reflexões peritoneais em destaque. B – bexiga; U– útero e FSD - fundo de saco retouterino (Douglas). B) corte sagital mediano da pelve feminina de um cadáver formolizado evidenciando o Fórnix vaginal (*). C) vista superior da pelve feminina de um cadáver formolizado. U- útero; * - Fundo de saco de Douglas; O- ovário; L – ligamento redondo.

revestimento e fixação do órgão. Abaixo do ligamento largo existe um tecido que apresenta diversos espessamentos, que servem para a estabilidade das vísceras pélvicas (3,5). Esse tecido é chamado de tecido conjuntivo pélvico subperitoneal e origina diversos

155

ligamentos, sendo os dois de maior importância para a fixação do útero o ligamento úteros-sacro e o ligamento cervical lateral (Figura 13.3). O ligamento cervical lateral (cardinal) envolve a região logo acima do colo do útero e apresenta


Anatomia

grande importância cirúrgica, em virtude de ser o local onde a artéria uterina se localiza antes de se dirigir ao útero, e é neste mesmo ponto que ocorre o cruzamento entre o ureter e a artéria uterina, relação anatômica de muito interesse durante a realização das histerectomias (6,7). Outro ligamento de importância para a fixação do útero e que também é seccionado durante as histerctomias é o ligamento redondo, um ligamento afilado que une a região do corpo do útero próxima a tuba uterina aos

do

Útero

grandes lábios, esse ligamento é o principal componente do canal inguinal da mulher e é homólogo ao gubernáculo no homem (Figura 13.4). O útero apresenta 4 porções: Fundo, Corpo, istmo e colo (Cérvix) (Figura 13.5). O fundo do útero é a região situada acima das tubas uterinas, o corpo corresponde a maior porção do útero, o istmo é um estreitamento situado entre o corpo e o colo e o colo uterino é a região mais inferior do útero, que se encontra envolvida pela vagina (1,2). Na região do colo uterino

Figura 13.3: Tecido conjuntivo pélvico subperitoneal e seus espessamentos. B– bexiga; U– Útero; R– reto; 1- Ligamento cervical lateral e 2– Ligamento útero-Sacro.

156


Anatomia

do

Útero

observamos o óstio uterino, que é o local de comunicação entre a cavidade uterina e a vagina. O colo do útero é a região de maior aplicação clínica em virtude de ser comumente acometida por patologias, como o carcinoma de colo de útero (3). Figura 13.4: Feto feminino do terceiro trimestre gestacional. Podemos observar o ligamento redondo (*) que se estende até a região dos grandes lábios.

Figura 13.5: Porções do útero: 1) Fundo; 2) Corpo; 3) Istmo e 4) Cérvix.

157

VASCULARIZAÇÃO E DRENAGEM LINFÁTICA A principal artéria responsável pela irrigação do útero é a artéria uterina ramo do tronco anterior da artéria ilíaca interna. A artéria uterina passa por sobre o ligamento cardinal e ascende pelas

Figura 13.6: Irrigação arterial do útero, notar que a artéria uterina (AU) é também responsável pela irrigação de parte da tuba uterina (T) e do ovário (O).


Anatomia

regiões laterais do útero para irrigalo (Figura 13.6). A artéria uterina participa também da irrigação das tubas uterinas, do ovário e de parte da vagina. A drenagem venosa é feita para as veias uterinas que

do

Útero

acompanham as artérias e se dirigem para as veias ilíacas internas (1,2). A drenagem linfática uterina apresenta grande importância nas cirurgias oncológicas. A parte superior do corpo uterino drena para linfonodos lombares, a parte

Figura 13.7: Drenagem linfática do útero. 1) Linfonodos Lombares; 2: Linfonodos ilíacos internos; 3) linfonodos ilíacos internos; 4) Linfonodos Sacrais e 5) Linfonodos Inguinais.

158


Anatomia

inferior do corpo para linfonodos ilíacos externos, o colo drena para linfonodos ilíacos internos, ilíacos externos e sacrais e a região próxima ao ligamento redondo drena para linfonodos inguinais superficiais (Figura 13.7).

do

Útero

4.

5.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sampaio FJB, Favorito LA, Rodrigues HC. Anatomia do sistema urinário aplicado à urologia, em Barata e Carvalhal: Urologia Princípios e Prática, capítulo 1, ArtMed, Porto Alegre. 1999. 2. Netter F: Reproductive System. Vol. 2. Ciba, New Jersey. 1978. 3. Favorito LA, Sampaio FJB: Anatomia aplicada da pelve em Garcia Marques:

159

6.

7.

Técnica operatória e cirurgia experimental, capítulo 16, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 2005. Sampaio FJB, Favorito LA: Anatomia do trato urinário em Bruschini, Truzzi e Srougi: Distúrbios urológicos da gravidez, capítulo 1, Manole, São Paulo. 2006. Weingärtner K, Ramaswamy A, Bittinger A, Gerharz EW, Vöge D, Riedmiller H: Anatomical basis for pelvic lymphadenectomy in prostate cancer: results of an autopsy study and implications for the clinic. J Urol. 1996; 156: 1969-71. Gardner E, Gray DJ, O’rayhli R. Anatomia - Estudo Regional do Corpo Humano. 3a. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 1972. Snell RS: Anatomia Clínica: para Estudantes de Medicina. 5ª ed., Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 1999.



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.