A TERRA COMO MERCADORIA e controversia sobre a sua desmercantilizaçaõ

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ITEMIZAÇÃO 1. APRESENTAÇÃO DA TEMATICA...............................................................Pag 4 2. O MUNDO ATUAL NEOLIBERISTA E A SOCIEDADE DE MERCADO.........................................................................................................................Pag 5 2 a . A SOCIEDADE DE MERCADO.....................................................................................................................Pag 6 2 aa. Somos homens economicos? .................................................................................................................Pag 6 2 ab. Karl Polanyi e o pensamento anti liberalista na Grande Transformação..................Pag 6

2 b. A GRANDE TRANSFORMAÇÃO.................................................................................................................. Pag 7 2 ba. Primeira parte// O sistema internacional ........................................................................................Pag 7 2 bb. Segunda parte // Ascensão e queda da economia de mercado .............................Pag 9 Mercantilizaçaõ de trabalho, terra e dinheiro e modelos alternativos.... Pag 9 Os primeiros estudos sobre a sociedade de mercado ......................................Pag 14 O duplo moviemento: liberalismo // contramovimentos sociais de desmercantilização............................................................................................................... Pag 15 2 bc. Terceira parte // Transformação em progresso..................................................................... Pag 19

2 c. A ATUALIDADE DE POLANYI ..................................................................................................................Pag 20 2 ca. Burawoy e o desenvolvimento do pensamento Polanyiano ........................................Pag 20 2 cb. A crise atual e possibilidades de superação do capitalismo financeiro ..............Pag 20

3. SOBRE A MERCANTILIZAÇÃO DA TERRA .......................................Pag 22 3 a. BREVE HISTORICO DA MERCANILIZAÇÃO DA TERRA ..........................................................Pag 24 3 aa. A privatização da terra com os cercamentos.............................................................................. Pag 24 3 ab. Fases historicas da mercantilização da terra ...............................................................................Pag 25 3 ac. Primeiros contramovimentos para a desmercantilização.................................................. Pag 25 3 ad. Caminhos atuais de mercantilização da terra .............................................................................Pag 26 3 b. O DUPLO MONOPOLIO DA TERRA: TERRA NATUREZA // TERRA ESPAÇO.......Pag 27

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4. TERRA COMO NATUREZA......................................................................... Pag 28 4 a . O DRAMA DA MERCANTILIZAÇÃO DA NATUREZA ................................................................Pag 29 4 aa. Financiarização neoliberalista e green economy como falsa estrategia ecologica .............................................................................................................................................................................Pag 31 4 ab. Mercantilização da natureza na Latinoamerica e no Brasil ...............................................Pag 33 4b. UMA NOVA MENTALIDADE PARA A DESMERCANTILIZAÇÃO DA NATUREZA .........................................................................................................................................................................Pag 35 4 ba. A hipotese do bem viver e os direitos da natureza com o novo ecossocialismo................................................................................................................................................................Pag 36 4 bb. Movimento para os bens comuns..........................................................................................................Pag 37 4 bc. Ecovillas ou comunidades sustentaveis..........................................................................................Pag 39

5. TERRA COMO ESPAÇO URBANO ...........................................................Pag 41 5 aa. Renda imobiliaria da terra urbana mercantilizada, Imóveis como mercadoria hibrida e preço do solo localização ..............................................................................................................Pag 42 5 ab. Localização e espoliação.......................................................................................................................... Pag 44 5 ac. Reprodução do capital no meio imobiliario urbano ..............................................................Pag 45 5 ad. Formas sociais de produção do espaço urbano, mercantis e não.......................... .Pag 45 5 ae. Desigualidade e produção não mercantil do espaço urbano na Latinoamerica e em São Paulo hoje ...................................................................................................................................................Pag 48 5 af. Privatização dos espaços publicos urbanos................................................................................. Pag 51 5b. UMA NOVA MENTALIDADE PARA A DESMERCANTILIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO.............................................................................................................................................Pag 52 5ba. Urbanização popular e luta a mercantilização da terra .....................................................Pag 53 5 bb. Desmercantilização estatal 1 // Estatuto da cidade ..........................................................Pag 55 5 bc. Desmercantilização estatal 2 // Função social da propriedade................................. Pag 57

6. CONCLUSÕES..................................................................................................... Pag 59 7. BIBLIOGRAFIA E SITOGRAFIA essenciais......................................... Pag 61

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OBJETIVO

Objetivo da pesquisa é o entender as problemáticas ligadas a visão mercadorial capital-liberalista da terra como bem de compra venda, entender como aconteceu a sua mercantilização historicamente e os mecanismos atuais no capitalismo financeiro. Com essas bases, ver o que significaria e qual sentido teria a desmercantilização da propriedade da terra na sociedade atual, na ótica de superação do homem econômico.

OBJETO

Objeto do trabalho configura-se então antes que tudo como o estudo das ideias do

Karl Polanyi expressas no texto principal dele ‘A grande transformação’, no qual ele faz uma análise do nascimento e do desenvolvimento da sociedade de mercado autorregulado, explicando entre as várias mudanças acontecidas a mercantilização da terra. O estudo do texto do K.P. vá ajudar no ter uma visão geral e abrangente dos mecanismos capitalistas liberais nos quais insere-se a problemática da terra como mercadoria, ou seja, repropor Polanyi é essencial para entender o contexto socioeconômico no qual a terra é vista como mercadoria. Compreender o desafio da mercantilização da terra não é simples porque insere-se em dinâmicas maiores, mais complicadas e abrangentes e porque o capitalismo sempre masque-a os seus mecanismos profundos de funcionamento, rendendo de difícil inteligibilidade processos essenciais para a compreensão da temática. A partir então de um resumo critico dos pontos essenciais da Grande Transformação, sublinhando a atualidade desse texto, vou fazer uma tentativa de explicar o que hoje em dia significa mercantilização da terra e desmercantilização da sua propriedade. Em particular vou tentar de tratar essas temáticas juntas a questão do duplo

monopólio da terra: terra natureza e terra espaço, que correspondem a duas dimensões da propriedade da terra, entendendo então a desmercantilização dum lado como uma modalidade possível de resistência ao capital, luta social popular anticapitalista e do outro como luta a exploração da natureza.

PROBLEMÁTICA

A problemática atrás desse tema é o atual esgotamento do mundo moderno causado

do economicismo mercantilista e dos limites humanos da economia de mercado autorregulado capitalista: esterilização, aniquilamento, normalização dos homens, destruição da natureza.

JUSTIFICATIVA

Hipótese final em discussão: Como a desmercantilização da terra emanciparia as pessoas (e as cidades, as moradias) da lógica do capital e da lei do valor. Então o ponto final no qual mira a se inserir a minha discussão é o estudo de possíveis vias a reabsorção do sistema econômico na sociedade, superando a visão do homem

econômico, em favor do homem social e da reintrodução da perspectiva ética na economia.

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O MUNDO ATUAL NEOLIBERISTA E A SOCIEDADE DE MERCADO

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A SOCIEDADE DE MERCADO e a sua incompatibilidade com a natureza humana ‘’A questão fundamental é: qual ‘e o escopo da vida?

Ser mais humanos ou produzir mais? ‘’ Erich Fromm Somos homens econômicos?

Nas ideias Aristotélicas, o homem é um animal político, um ser que é conduzido da sua mesma natureza a viver numa dimensão comunitária, a criar sociedades, portanto também é um ser moral. Todavia o Ocidente moderno repudiou essa visão em favor do novo homo econômicos, o homem que visa somente ao útil imediato, que vive a vida como troca de bens e serviços regulados do interesse e do ganho. Isso dissolve a comunidade, que é algo que se creia fora e muitas vezes numa logica oposta àquela das barganhas, e é contrário ao conceito mesmo de sociedade, ou seja a condição inicial do homem ligado aos seus pares num sistema de princípios, valores, limites, regras. Mestres do homo econômicos foram Bernard de Mandeville, o anglo holandês de começo XVIII sec. autor da Fabula das Avelhas, que fala duma sociedade na qual os vícios são acolhidos como publicas virtudes se permitem ganhos e enriquecimento, e Jeremy Bentham, o inglês contemporâneo de Smith e Ricardo para o qual o útil é a única razão de ação para os homens. O universo moral do Adam Smith se pode reduzir a frase ‘não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro que esperamos o nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelos próprios interesses. ’ O sistema que estes homens teorizaram virou realidade. Chama-se sociedade de mercado, na qual a totalidade da experiência humana é constringida na distopia do homem econômico. Ciclicamente existiram contra movimentos se opondo a lógica do ganho, reações das sociedades, comunidades, nações ao predomínio sufocante do mercado assim chamado autorregulado (dirigido, na verdade, dos gigantes oligopólios capitalísticos transnacionais).

Karl Polanyi e o pensamento anti liberalista na Grande Transformação Uma das figuras que volta hoje a ser de grande interesse na economia social é aquela do Karl Polanyi, autor dum dos textos mais importantes da primeira metade do XX século, A grande transformação (1944). Húngaro de nascimento, judeu, se formou na Viena de fim império e nos anos 20 criou a disciplina da antropologia econômica, que, desde posições não marxistas, o pus em total conflito com o liberalismo. Base do pensamento dele é que a grande transformação capitalista, a utopia liberal, é tendência irresistível a mercantilização de cada relação, e o mercado, autorregulado e perfeito (e grande quanto o planeta), das ideias de Smith e David Ricardo, os clássico e neoclássicos seus contemporâneos, é o fim e ao mesmo tempo o meio para subordinar a vida social a lógica da acumulação. A gigante operação de engenharia, de reconfiguração do pensamento humano ao serviço duma oligarquia orientada ao domínio. Polanyi foi também um estudioso das economias pré-industriais, as quais baseavam se na interação entre homem, natureza, cultura, e nas quais a economia era parte do tudo, inclusa, incorporada na experiência da civilidade (conceito de embedness). A grande transformação é o êxito do derrube desse equilíbrio, com a consequente hegemonia da razão econômica.

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Então, na visão polanyiana, não é verdade que a sociedade de mercado é natural evolução da economia na civilização humana: a sociedade de mercado (na qual não é mais o mercado a ser imergido na vida social, mas a vida social a ser submergida no mercado) é um produto totalmente innatural, excepcional, O mercado autoregolavel é uma instituição que anula a substancia natural da sociedade até destruir homem e ambiente, mas um mundo que baseia se na expectativa que os seres humanos se comportam na maneira de chegar ao máximo ganho monetário, no qual também trabalho, terra e dinheiro são objetos de mercado e todo tem um preço, parece a Polanyi como uma construção distopica em contraste com a natureza do homem. A Grande Transformação é um livro complicado, que trata questões de grande amplitude e profundidade, não é uma monografia histórica, nem um mero tratado de economia política, contém vários conceitos de âmbito antropológico e etnográfico, mas também explicações de economia teórica. Na leitura do texto, se clarifica também o conceito essencial na minha monografia do duplo movimento de mercantilização e desmercantilização da sociedade, a qual, segundo Polanyi, tem que reagir ao mercado para não ser aniquilada na sua essência mais profunda. Vou repropuser aqui os pontos chaves do livro, seguindo o desenvolvimento em capítulos propostos do Polanyi, focando-me em particular nas temáticas relativas a mercantilização e a distopia do modelo de mercado.

Metrópole das mercadorias- Bienal de Veneza-Andrea Branzi 2010

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A GRANDE TRANSFORMAÇÃO as origens da nossa época

RESUMO DOS CONCEITOS PRINCIPAIS DO TEXTO

PRIMEIRA PARTE // O SISTEMA INTERNACIONAL ‘’A peculiaridade da civilização cujo colapso testemunhamos foi, precisamente, o fato dela se basear em fundamentos econômicos. ’’ (Pag. 46) No começo do seu texto Polanyi explica as bases da civilização do século XIX, que ele afirma residir em 4 instituições: *Mercado auto regulável- *Equilíbrio de puder- *Padrão internacional do ouro, que simbolizava uma organização única na economia mundial- *Estado liberal Segundo Polanyi fonte e matriz do sistema da nova civilização foi em particular o mercado auto regulável, que ele apresenta como uma estrutura institucional que nunca esteve presente a não ser em nosso tempo, e algo de extremamente perigoso que implica um preciso da sociedade de se defender, sendo que:

‘’tal instituição não poderia existir em qualquer tempo sem aniquilar a substancia humana e natural da sociedade, ela teria destruído fisicamente o homem e transformado seu ambiente num deserto. ’’ (Pág. 18) Ele explica assim as rações daquela que ele chama a queda da nossa civilização (ou seja, o drama da segunda guerra mundial) como baseadas na ideia ocidental de mercado auto regulável. Polanyi começa a sua narração da paz de 100 anos que se tive entre o 1815 e o 1914: um período excepcionalmente longo sem guerras, no qual as tensões na política internacional eram resumidas com as rivalidades imperialistas nas colonias.1 Polanyi explica aqui como o sistema de equilíbrio de puderes que instaurou se nesse século na Europa e permitiu a paz foi na moral a manifestação ao nível político das vontades do mercado auto regulável que viu na época a sua expressão na haute financie, que não era submetida a nenhum governo, cujo objetivo de manter a paz era somente para permitir o desenvolvimento de negócios pacíficos. O objetivo da haute financie era- e eu adiciono também hoje em dia é- o lucro, e a paz foi somente um efeito secundário desse preciso, sendo que o comercio dependia agora de um sistema monetário internacional ou seja do padrão ouro, que não podia funcionar numa guerra generalizada. Então mercado auto regulável sob a forma do capitalismo financeiro que, pelo meio do equilíbrio de puder, mirava ao mantimento do padrão ouro, numa situação de liberalismo político e econômico. Mais simplesmente podemos afirmas que a organização da paz repousava sobre a organização econômica: se se retirasse esse sistema econômico o interesse pela paz teria desaparecido de política. Ao mesmo tempo, todavia negócios e finanças foram responsáveis por muitas guerras coloniais. O imperialismo econômico não era nada mais que uma luta entre potencias pelo privilégio de estender seu comercio aos mercados politicamente desprotegidos. O equilíbrio de poder chegou a seu final no momento no qual o Concerto de Europa foi substituído por aliança e contra aliança, mas a verdadeira causa disso foi a dissolução da organização econômica, as rivalidades colônias e a competição crescente para os mercados exóticos.

‘’O colapso do padrão ouro internacional foi o elo invisível entre a desintegração da economia mundial na virada do século e a transformação de toda uma civilização na década de 30’’. (Pag.36) Por trás do colapso do sistema econômico internacional existia um longo desenvolvimento no interior dos países mais avançados que tornou o sistema do padrão ouro anacrônico. A primeira guerra e os tratados após somente diminuíram aparentemente a tensão, agravando na verdade os obstáculos políticos e econômicos a paz: com o desarmamento unilateral das nações derrotadas foi impedida a reconstituição do equilíbrio de poder. 1. Os conflitos internos a Europa foram resolvidos na primeira metade do século pelo meio da Santa Aliança, que suprimiu a liberdade em nome da paz, e na segunda metade do século foi o assim chamado Concerto da Europa, o melhor a finança internacional e os sistemas bancários nacionais a ela alheados a garantir o se manter da paz

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Aconteceu uma serie continua de crises monetárias que causaram o colapso final, com o desaparecimento das moedas nacionais, a pauperização da classe média, a fuga de capitais. As pessoas começaram a ver o dinheiro estável como necessidade suprema e a crença no padrão ouro, na tentativa de restabelecer um equilíbrio econômico internacional, tornou se religião, comum aos homens de todas as nações, as classes, religiões, filosofias sociais. Mas chegou o momento no qual se revelou a impossibilidade disso: no 1930, depois do crack financeiro do 1929, foi a década da mudança verdadeira, com o abandono do padrão ouro, ultimo vestígio da economia mundial tradicional, pelos Estados Unidos e a GB, os planos quinquenais na Rússia, o lançamento do New Deal, a Revolução Nacional socialista na Alemanha e o colapso da Liga das Nações. A queda do padrão ouro trouxe a destruição completa das instituições da sociedade do século XX, e os estados liberais foram substituídos em muitos países para ditaduras totalitárias. Então, no enquanto a primeira guerra mundial ainda era fiel ao tipo do século XIX, um conflito acionado pela queda do equilíbrio de poderes, a segunda guerra mundial foi causada pela derrota total da utopia liberal dum mercado autorregulado, e nisso percebemos a periculosidade desse modelo, que, ao contrário de quanto achava Polanyi, voltou a se instaurar novamente na sociedade do segundo pôs guerra e numa maneira ainda mais poderosa e abrangente.

SEGUNDA PARTE ASCENSÃO E QUEDA DA ECONOMIA DE MERCADO Na segunda parte do texto Polanyi explica detalhadamente o surgir e se desenvolver do mercado autoregolavel e daí de como nasceu o padrão ouro e o se afirmar do conceito de liberalismo econômico no curso da história. Ele fala também dos contra movimentos da sociedade que se tinha que defender desse moinho satânico, como ele define o mercado, o qual causou uma catastrófica desarticulação nas vidas das pessoas comuns e do tecido social, assim como da relação homem natureza. (As divisões não correspondem exatamente aos capítulos, mas aos núcleos temáticos que individuei.)

1) MERCANTILIZAÇÃO DE TRABALHO, TERRA, DINHEIRO E MODELOS ALTERNATIVOS Polanyi começa a explicação dos acontecimentos que levaram a sociedade a ser uma sociedade de mercado a partir próprio da questão da terra e sua privatização e mercantilização, que aconteceu com os cercamentos dos campos abertos feudais (enclosures) e as conversões das terras aráveis em pastagens (para alimentar a indústria lanígera), no período dos Tudors na Inglaterra. Os cercamentos foram também uma constrição para os camponeses a venda do trabalho deles para receber um salário para sobreviver, uma vez que foram privados das terras comuns onde trabalhavam e onde tinham a própria casa eles se viam com efeito constringidos a venda do trabalho, portando a um incremento da população disponível para assalariamento (acumulação primitiva). Os cercamentos causaram assim uma grande perturbação da ordem social, com a destruição de leis e costumes tradicionais e também da ordem natural, com o começo da mercantilização da terra natureza. 1 Os Tudors tentaram impedir essa transformação social pelo meio de leis anticercamento, que obstruíram em parte esse movimento, diminuindo o seu ritmo, e ajudando os despojados a se ajustar assim as novas condições econômicas e sociais. A política anticercamento dos Tudors e dos primeiros Stuart foi um protesto contra o princípio do uso lucrativo da propriedade fundiária. Assim Polanyi já dá a primeira prova do feito que, já desde o começo da formação duma economia de mercado, foram necessários contra movimentos para balançar a sociedade e não conduzi-la a uma total destruição, assim a Inglaterra suportou os cercamentos somente graças as leis conservadoras dos Tudors e Stuarts. Cerca de 150 anos mais tarde, Polanyi fala que aconteceu uma catástrofe similar, porém muito mais grave: a revolução industrial com o desenvolver-se das assim chamadas cidades industriais, onde os

1. No feudalismo a terra e o trabalho eram parte da organização social. A terra, era a base do sistema militar, jurídico, administrativo e político, seu status era determinado por regras legais e costumes. As questões da posse e sua transferibilidade, os direitos de propriedade, as utilizações possíveis eram sujeitas a um conjunto de regulamentações institucionais.

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trabalhadores dos campos se desumanizavam virando habitantes das favelas, as famílias estavam no caminho da perdição e também a natureza era invadida da escorias e refugos das industrias. Assim Polanyi apresenta o cercamentos e a revolução industrial como apena o começo de uma revolução extrema que conduziu a uma total transformação e desarticulação do sistema social e ao nascimento da nova sociedade de mercado, ou seja, baseada na economia de mercado auto regulável capitalista e no seu credo totalmente materialista. O passo sucessivo no estabelecer-se desse sistema foi a constatação que a introdução de maquinas complicadas era rentável somente no caso da produção de uma grande quantidade de mercadorias, e isso era possível tendo três pressupostos: uma saída da produção certa, uma produção continua e uma também certa entrada de matérias primas. Ou seja, todos os elementos envolvidos no processo deviam ser a venda. O trabalho e a natureza deviam se tornar mercadorias subjetiveis de compra venda, que Polanyi chama de fictícias porque não são reais mercadorias no sentido de coisas produzidas para a venda. A ampliação do mecanismo de mercado aos componentes da indústria do trabalho, terra e dinheiro foi, portanto, a consequência da introdução do sistema fabril.

‘’acontece porem que o trabalho e a terra nada mais são do que os próprios seres humanos nos quais consistem todas as sociedades, e o ambiente natural no qual elas existem. Inclui-los no mecanismo de mercado significa subordinar a substancia da própria sociedade as leis do mercado. ’’ Pág. 93 E também, sendo agora a motivação de lucro a principal, todas as transações se tornaram monetárias, portanto, também o dinheiro, sendo componente da indústria virou então a ser mercadoria fictícia. Os preços da mercadoria fictícia de trabalho terra e dinheiro desde então foram chamados de salário, aluguel e juros. Salario= preço para o uso da forca trabalho, que constitui a renda daqueles que a vendem Aluguel= preço para o uso da terra e constitui a renda daqueles que a fornecem Juro= preço para o uso do dinheiro, renda daqueles que estão na posição de fornece lo.

‘’Trabalho é apenas um outro nome para atividade humana que acompanha a própria vida que, por sua vez, não é produzida para venda, mas por razoes inteiramente diversas, e essa atividade não pode ser destacada do resto da vida, não pode ser armazenada ou mobilizada. Terra é apenas um outro nome para a natureza, que não é produzida pelo homem. Finalmente, o dinheiro é apenas um símbolo do poder de compra e, como regra, ele não é produzido mas adquire vida através do mecanismo dos bancos e das finanças estatais. Nenhum deles é produzido para a venda. A descrição do trabalho, da terra e do dinheiro como mercadorias é inteiramente fictícia.’’ Na descrição da terra, trabalho e dinheiro como mercadorias fictícias feita pelo Polanyi, podemos encontrar um paralelo com a formula trinitária do Marx, o qual liga capital com lucro, terra com renda, e trabalho com salário, explicando essas correspondências como base da coisificação das relações e ocultamento do processo de produção social. Então, pelo meio da mercantilização de homem, natureza e dinheiro, começa a se desenvolver uma um sistema econômico controlado, regulado e dirigido apenas por mercados, no qual a produção e distribuição dos bens é confiada a esse mecanismo auto regulável. Polanyi explica porque chama esse sistema de mercado autorregulado: ele diz que, uma vez afirmado, tem que se lhe permitir de funcionar sem qualquer interferência, os preços devem ter a liberdade de se auto regularem, e são os preços e nada mais que dirige a economia. Daí o autor diz como aconteceu o passo crucial que transformou mercados isolados numa economia de mercado e mercados reguláveis num mercado auto regulável, fazendo referência aos conceitos de mercados internos, locais e ao comercio exterior. 2. O nascer de mercados nacionais e extranacionais fiz sim que, até o final do século XVIII, a produção industrial na Europa ocidental já era um mero acessório do comercio, com investimentos a longo prazo. 2. Efetivamente os mercados que envolviam nações não tinham nenhuma conexão com os mercados internos e, como, na Europa Ocidental, o comercio interno foi criado por intervenção do estado, no enquanto que as cidades levantaram todos os obstáculos possíveis a formação daquele mercado nacional ou interno pelo qual pressionava o atacadista capitalista, mercado que teria levado a inclusão do campo no comercio indiscriminado com a cidade.

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Camponeses deixando a sua casa e terras depois dos cercamentos, 1700

Um retrato das primeiras cidades industriais e suas favelas Victorian London streets with terraces, Gustave Doré, 1872.

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Polanyi prossegue explicando como, porem a economia seja sempre existida, o conceito de economia de mercado, na qual o ganho e o lucro feitos nas trocas são conceitos base da vida, jamais existiu. Isso não significa que nunca existiram mercados, mas os mercados antes tinham um papel muito menor do que acontece hoje em dia. Polanyi ilustra o conceito do Homem Econômico das ideias de Adam Smith, segundo o qual seria natural a propensão do homem a barganhar, permutar e trocar, desde as épocas primitivas, e a essas ideias ele opõe-se com convenção, compartilhando as teses do Max Weber e explicando como nunca na história uma economia foi regida e controlada por mercados, e como a psicologia do homem primitivo mais que capitalista era comunista, assim que foi somente nos últimos séculos que o conceito de barganha adquiriu tal importância. O autor explica como uma das descobertas mais importantes feitas nas pesquisas históricas e antropológicas foi que a economia do homem está como regra normalmente submersa nas relações sociais, e as suas ações não derivam no começo da salvaguarda do seu interesse na posse de bens materiais, mas para salvaguardar sua situação social. Então, em toda a história da humanidade o sistema econômico sempre foi dirigido por motivações não econômicas, e as noções de lucro, de trabalho remunerado e até de riqueza (não seja para objetos que ressaltassem o prestigio social) era desconhecida. E’ sem dúvida uma verdade que as motivações dos indivíduos humanos só excepcionalmente são determinadas pelas necessidades do desejo-satisfação material, e que o feito que a sociedade hoje é organizada a partir dessa motivação é uma peculiaridade inquietante e innatural. Polanyi explica que, numa economia não de mercado a produção e distribuição se garantem então pelo meio de dois princípios: reciprocidade e redistribuição, conceitos que são ligadas a simetria e centralidade na organização das comunidades. Esses princípios são importantes de compreender porque poderiam voltar a ser chaves numa economia mais humana, num processo de desmercantilização de homem e natureza e de oposição a privatização da sociedade com fins econômicos especulativos. Assim a reciprocidade é definível como um intercambio regulado moralmente, sem competição nem busca de ganho. Baseia-se na simetria das doações e numa ideia de convivência social comunitária não mercantil, mas fundamentada em algo mais perto a solidariedade. A redistribuição se tem quando existe uma centralidade que organiza o excedente como reserva para garantir a reprodução da comunidade, aliviando as desigualdades econômicas presentes. Assim podemos afirmar que, nas sociedades pré-industriais, o sistema econômico era mera função da organização social e baseava-se, em última instância, em atos isolados de dar e tomar. 3

‘’A produção e distribuição dos bens era assegurada através de uma grande variedade de motivações individuais, e o lucro não era uma das principais, as quais eram em vez os costumes, as leis, a magia, a religião. ’’ Pag. 75 Assim como a reciprocidade é auxiliada por um padrão simétrico, a redistribuição é facilitada da centralização, Polanyi diz que o princípio da permuta, da barganha depende, para sua efetivação do padrão de mercado, que é capaz de criar uma verdadeira instituição especifica, o mercado, da qual a sociedade vira a ser acessório. Então a situação subiu uma mudança radical:

‘’em vez da economia estar embutida nas relações sociais, são as relações sociais que estão embutidas no sistema econômico. ’’ Pag. 77

3. Quero sublinhar algo que talvez poderia criar confusão: Polanyi explica bem que o ponto não é que essas sociedades eram melhores da atual porque vigorava o princípio de doar, o princípio de armazenar e redistribuir, que esses princípios se encontram nas sociedades compostas dos membros livres assim como naquelas dividas entre dominantes e dominados tipo na sociedade Babilones. Então as motivações para a reciprocidade e para dar para o chefe da comunidade podem ter sido muito diferentes, até fruto de constrições e escravismo, o que Polanyi quer, todavia, deixar bem claro é que o que importa nessa análise é como a economia estava submergida nas relações sociais, e o fim ultimo nunca era uma barganha em si, mas sempre um fim social.

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A Speenhamland law, que foi ativa na Inglaterra desde o 1795 até o 1834, é apresentada do Polanyi como um dos mecanismos que ajudou a adiar a criação de um mercado do trabalho na Inglaterra da revolução industrial, coisa que no final inevitavelmente aconteceu como necessidade da sociedade de mercado. 4. A Speenhamland law consistia em um sistema de abonos em aditamento aos salários, de acordo com o preço do pão, para assegurar aos pobres uma renda mínima, e assim o direito a viver (uma sorta de antigo redito de cidadania, que acabou de ser introduzido na Itália no começo desse ano). A divisão territorial do trabalho, em combinação com as flutuações do comercio, era responsável pela desarticulação das ocupações, tanto na aldeia como na cidade, o que resultava no rápido crescimento do desemprego. O desemprego urbano recaia principalmente sobre a aldeia natal, a qual frequentemente retomava aqueles que ficavam sem trabalho, transformando ainda mais as comunidades rurais. Assim teriam que ser adotados métodos que protegessem o setor rural contra uma desarticulação total, impedindo o êxodo da mão de obra e elevando os salários agrícolas sem sobrecarregar os fazendeiros. Este artificio foram as Speenhamland Law. Todavia os efeitos dessa lei se mostraram o contrário do que esperado: ou seja, criaram uma condição de absurdo e uma degradação da dignidade das classes dos trabalhadores. Sendo que nenhum trabalhador tinha interesse a fazer um bom trabalho porque a sua renda teria sido a mesma em qualquer caso, a produtividade caiu drasticamente. Isso conduziu dum lado a uma queda no respeito próprio dos homens comuns, num processo de degradação humana e social, e do outro o resultado foi o baixar-se dos salários a nível inferior ao de subsistência (sendo que a paroquia balanceava a parte faltante dos salários). Então essa iniciativa para o direito a viver tornou se no final uma monstruosidade social e foi atropelada da vitória final da sociedade das maquinas, assim que já no 1931 ficou claro que era melhor parar com esse sistema de proteção social inadequado a época e aos problemas da nova sociedade: era impossível voltar a situação anterior e negar o mercado do trabalho. As Speenhamland foram abolidas e os homens catapultados nas engrenagens da sociedade de mercado, condenados a pobreza nas favelas, empregados ou desempregados a secunda das flutuações do comercio global: era o nascimento da moderna classe trabalhadora.

‘’’Separar o trabalho das outras atividades da vida e sujeita-lo as leis do mercado foi o mesmo que aniquilar todas as formas orgânicas da existência e substitui-las por um tipo diferente de organização, uma organização atomista e individualista. ’’ Pag. 198 Assim surgiu a liberdade de contrato, e foram destruídas as relações não contratuais entre indivíduos e foi estabelecido um mercado do trabalho humano. O estágio final, diz Polanyi, foi com efeito a liquidação dos mecanismos da sociedade que recusavam a permitir que o indivíduo passasse fome. O aumento dos comércios, o desenvolver se das cidades industrias viu o aparecer das problemáticas do pauperismo e da pobreza difusa. A pobreza começou ad aparecer como fenômeno, sem ter uma compreensão clara do como isso estava acontecendo, depois dos cercamentos da terra, e daí para frente o problema ficou cada vez mais grave. Paradoxalmente, como afirmava John M Farlane, o maior número de pobres não se encontrava em nações barbaras, mas próprio naquelas teoricamente mais desenvolvidas e ricas. A questão da pobreza era estritamente ligada a emprego e desemprego, e foi enfrentada sob vários pontos de vista. 5

4. Antes da S.L. existia um sistema paternalístico dado dos estatutos e da Poor Law do 1662, que previa a servidão paroquial dos trabalhadores da terra e leis contra a vagabundagem, o melhor, contra as libres deslocações dos camponeses das várias paroquias. 5. Polanyi lembra a visão dos quacres, o estabelecimento da Labor Exchange como agencia de emprego, o College of Industries de Bellers, (corporação dos trabalhadores para conjugar os esforços e se ajudar mutuamente). Ainda ele explica o plano Panoptico de Bentham aplicado as Casas de Industrias, na qual o liberal previa a exploração dos pobres assistidos, e classificados escrupulosamente entre vítimas de uma estagnação casual, estagnação periódica, e mão de obra superada para novas tecnologias. O autor apresenta também a teoria de Daniel Defoe, o qual insistia que se os pobres fossem assistidos socialmente eles não trabalhariam por salários e se fossem empregados em manufaturas publicas criariam somente um maior desemprego para as manufaturas privadas.

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2) OS PRIMEIROS ESTUDOS SOBRE A SOCIEDADE DE MERCADO Na verdade ‘’a condição subdesenvolvida do sistema de mercado ocultava as suas inerentes fraquezas. Tanto a nova riqueza como a nova pobreza não eram ainda bem compreendidas. ’’ O significado da pobreza foi compreendido quando, no século XIX, Ricardo e Hegel descobriram, de ângulos opostos, a –existência de uma sociedade que não estava sujeita às leis do estado, mas, ao contrário, sujeitava o estado as suas próprias leis. 6. Mas foi com a teoria de Townsend que se reconheceu pela primeira verdadeira vez essa nova sociedade de mercado: teoria dele é que é a quantidade de alimentos que regularia o número da espécie humana, no sentido que é a fome que incita as pessoas ao trabalho. A sociedade vira assim a ser composta de duas raças, proprietários capitalistas e trabalhadores, incitados ao trabalho do preciso animal da fome. Assim os economistas abandonaram os fundamentos humanistas de Smith em favor da visão fria e desumana de Townsend, a qual se adicionaram a lei populacional de Malthus e a lei dos rendimentos diminuídos apresentada por Ricardo. Assim emergiu a sociedade econômica, como algo de separado do estado político, que tenha que contribuir ao seu funcionamento, na qual as leis do comércio eram lei divinas e vigorava o princípio da utilidade e a noção de lucro.

‘’Nenhuma avaliação de salários, nenhuma assistência social para os desempregados capazes, mas também nenhum salário mínimo, nem a proteção ao direito de viver.’’ Agora que a sociedade econômica tomava forma, era um fato indubitável que, década após década, o nível material da existência do trabalhador pobre não melhorava em nada, talvez se tornava cada dia pior. Polanyi fala depois de Robert Owen, que foi o único a se opor as ideias de Townsend, Malthus, Bentham, Burke (ideias a base da força adquirida pelo liberalismo econômico). Owen rejeitava a abordagem liberalista e individualista, dizendo que era desfavorável a felicidade individual e social, e a sua crença era na origem social das motivações humanas, Owen compreendeu que a pobreza, a pauperização das classes não era o único problema, que além das questões materiais estava um profundo problema social de transformação dos homens em seres rudes e brutais, causando a destruição de todas as relações com a natureza e entre os homens na qual estava embutida a experiência econômica anterior. Ele então clamava como necessário um mecanismo institucional de proteção da sociedade.

‘’A causa da degradação não é a ecploração econômica, como se presume muitas vezes, mas a desintegração do ambiente cultural da vitima. O processo econômico pode fornecer o veiculo da destruição, mas a causa imediata da ruina não é essa razão econômica- ela está no ferimento letal infligido as instituições nas quais a sua existência estã inserida. O resultado é a perda do auto-respeito e dos padrões.’’

6. Já Adam Smith tinha reconhecido o estudo da riqueza como campo autônomo, e fazendo isso, tornou se o fundador de uma nova ciência, a economia. Todavia Smith, clarifica Polanyi, não percebeu que são os interesses econômicos dos capitalistas que organizam a lei da sociedade, não viu a mão oculta que ‘’tenta nos impor os ritos do canibalismo em nome do interesse próprio’’. Na ótica de Smith então a economia era ainda submetida a razão da humanidade, a dignidade do homem como ser moral.

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3) O DUPLO MOVIMENTO: LIBERALISMO // CONTRA-MOVIMENTOS SOCIAIS DE DESMERCANTILIZAÇÃO No começo do 1900 o mercado já compreendia todo o planeta, numa universalidade sem paralelos na história. Então era cada vez mais necessária uma reação a esse movimento que estava atacando no profundo o tecido e a moral da sociedade.

‘’a ficção da mercadoria menosprezou o fato de que deixar o destino do solo e das pessoas por conta do mercado seria o mesmo que aniquilá-los. ’’ Foram, e ainda são, então necessários mecanismos de proteção políticos, sociais e culturais, para evitar o desmoronamento da sociedade e da terra toda, para não permitir: -Que os seres humanos sucumbam sob os efeitos do abandono social -Que a natureza seja reduzida a seus elementos mínimos, -Que as paisagens sejam desintegradas, os rios poluídos e destruído o poder de produzir até alimentos e matérias primas -Que a administração do poder de compra por parte do mercado liquidaria empresas de continuo.

‘’nenhuma sociedade suportaria os efeitos de um tal sistema de grosseiras ficções, mesmo por um período de tempo muito curto, a menos que a sua substancia humana natural, assim como a sua organização de negócios, fosse protegida contra os assaltos desse moinho satânico. ’’ Assim Polanyi introduz a explicação dos contra movimentos: uma rede de medidas e políticas integradas em poderosas instituições destinadas a cercar a ação do mercado relativa a trabalho, terra e dinheiro: pelo meio de leis fabris e sociais mirava se a proteger os trabalhadores industriais, e com leis para a terra e tarifas agraria o objetivo era proteger os recursos naturais e a cultura do campo. Ao mesmo tempo era também necessário proteger a sociedade da mercadoria dinheiro pelo meio de bancos centrais e um sistema monetário: ‘’por mais paradoxal que pareça, não eram apenas os seres

humanos a os recursos naturais que tinham que ser protegidos contra os efeitos devastadores de um mercado autoregolavel, mas também a própria organização da produção capitalista. ’’ Assim gerou se aquilo que Polanyi define como duplo movimento: de um lado o princípio do liberalismo econômico (classe média burguês), que era para o mercado auto regulável e tinha como princípios o laissez faire e o livre comércio, do outro o princípio da proteção social, cuja finalidade era preservar homem, natureza e organização produtiva com legislações protetoras e pelo meio de associações (classe trabalhadora e aristocracia fundiária). Duplo movimento que clarifica a imperfeição do sistema de mercado autoregulado O liberalismo econômico é definido do Polanyi como o princípio organizador da sociedade de mercado, como a fé na salvação do homem pelo meio do mercado auto regulável que se difundiu a partir do 1830. Dogmas clássicos do liberalismo são então: o feito que o trabalho deve encontrar seu preço no mercado, que o dinheiro deveria sujeitar-se a um mecanismo automático de criação e que os bens devem ser livres de fluir internacionalmente. Ou seja, o mercado do trabalho, o padrão ouro e o livre comercio. Podemos afirmar que o estabelecer-se da economia laissez-faire foi o produto da ação deliberada do estado sujeitado aos capitalistas liberais: ou seja foi algo de imposto a sociedade. Polanyi sublinha esse feito, e ao mesmo tempo fala de como em vez o contra movimento que se opôs ao mercado autoregolavel a partir do 1860 fu uma tendência espontânea da sociedade. 7. A tendência coletivista emergiu desde que o sistema do livre mercado estava afetando cada vez mais os interesses sociais vitais, esse contra movimento tive uma natureza puramente pratica e pragmática. Foi assim que a Inglaterra vitoriana, a Prussia de Bismarck, a França da Terceira Republica e o Imperio dos Hasburgs passaram para um período de legislação antiliberal em relação a saúde pública, condições fabris, comercio municipal, seguro social, subsídios vários ecc.

7. Porém todos os liberais da época a imputavam a uma conspiração coletivista, e também depois eles continuaram a reafirmar que todos os males da época foram causados de essa interferência com a liberdade de emprego, comercio e moedas.

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As medidas do contra movimento não eram revoltas a objetivos meramente econômico como aumentar os ganhos de alguma classe, assim que, a grande maioria dessas intervenções não teve qualquer influência direta nos rendimentos (leis sobre a saúde, a habitação, as amenidades, as bibliotecas públicas, as condições fabris e ao seguro social), essas intervenções miravam a melhorar a forma de vida dos homens e reabilitar seu meio ambiente pelo meio do controle público e a volta a supremacia da esfera política sobre aquela econômica. A tendência ao protecionismo foi geral em todos os países da Europa.

‘’Foram precisamente os interesses sociais, e não os econômicos, de diferentes segmentos da população que se viram ameaçados pelo mercado, e pessoas pertencentes a vários estratos econômicos inconscientemente conjugaram forças para conjurar o perigo. ’’ Pag. 188 No campo da desmercantilização do trabalho Polanyi lembra os movimentos cartista e owenista, em particular o owenismo foi o principal contramovimento do homem ao mercado. Owen com efeito foi quem afirmou o princípio da cooperação ou sindicato, para resolver o problema da máquina sem sacrificar a dignidade do homem, assim ele foi o iniciador do movimento sindicalista moderno. Ou seja, o owenismo insistia em métodos de reconstrução da sociedade que transcendiam a economia de mercado, com a recusa da divisão entre esfera econômica e política e os princípios de ganho e lucro como forças organizadoras da sociedade. Assim foram criados os Villages of cooperation, a Operative Builders Union o Trade Union e as Regeneration Societies. O movimento cartista por seu lado foi um esforço político que tentou de ganhar influência no governo para exigir um sufrágio popular efetivo (menos do 15 por cento dos homens adultos tinha direito ao voto, e os trabalhadores industriais não eram entre eles). O cartismo foi o maior esforço político da época para criar uma democracia popular, mas não consegui o objetivo e, em breve tempo, foi esquecido. Também Polanyi lembra as diferencias entre a situação dos trabalhadores industriais na Inglaterra e no continente, onde eles viraram a ser alheados da classe média na lota a aristocracia e ao episcopado e, pelo meio desta aliança ganharam a possibilidade da participação política e tornaram-se operários sindicalizados, escapando a catástrofe cultural que segui na esteira da Rev. industrial na Inglaterra. Assim fica claro que o trabalhador continental não precisava de proteção contra o impacto da revolução industrial, mas, todavia, a precisava contra a ação normal das condições fabris e do mercado de trabalho, o que ele conseguiu com a ajuda da legislação: no continente os sindicatos foram criados dos partidos políticos da classe trabalhadora. Mas no final, os métodos de autoproteção da classe trabalhadora inglesa e continental tiveram o mesmo resultado: conseguiram a ruptura do mercado autorregulado do trabalho com a criação de leis (legislação social, leis fabris, seguros de desemprego, sindicatos) que interferiam com as leis de procura e oferta do mercado e pelo meio da participação a política, para resguardar o caráter humano da suposta mercadoria. (A este ponto Polanyi trata da mercantilização da terra numa maneira mais profundada, sendo essa a temática central do meu trabalho vou destacar a analise dele no começo da parte sucessiva do meu texto, no enquanto vou aqui prosseguindo no resumo dos dados mais importantes da Grande Transformação.) Polanyi a seguir foca-se nos mecanismos de proteção que se instauraram para defender o sistema produtivo e as empresas comerciais que o mercado mesmo poderia destruir. Por essa razão foi criado o Banco Central, que contrastava o auto regular-se do padrão ouro internacional e a ideia de separação entre esfera política e econômica com o nascimento da política monetária. Os riscos maiores das empresas residiam na possibilidade de uma queda dos preços, eventualmente exigida para manter câmbios estáveis, que podia causar o risco da liquidação: ’’se os lucros dependem

dos preços, então os ajustes monetários dos quais os preços dependem tem que ser vitais para o funcionamento de qualquer sistema motivado pelo lucro’’ Pag.228 A ideia do padrão ouro baseava-se na utilização de notas bancarias cujo valor derivava da possibilidade de adquirir, com essas notas, a real mercadoria do ouro em quantidade equivalente. As notas bancarias seriam então somente símbolos da real mercadoria, diferentes para cada pais.

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A contrastar a ideia de padrão ouro os bancos centrais estabeleceram moedas convencionais nacionais, que faziam do banco central um para choque entre a economia interna e externa, com o objetivo de garantir uma solida finança domestica de um lado e uma estabilidade externa do meio circulante do outro. Assim podemos perceber algo que na época não era percebido, sendo um ponto cego da mentalidade de mercado: a importância do meio circulante a estabelecer a nação como unidade decisiva econômica e política. Uma das funções dos Bancos Centrais foi aquela de distribuir a deflação, devida a falta de dinheiro, levemente sobre toda a comunidade de negócios. Com a crise do 1929, o mantimento do padrão ouro se demostrou impossível, e cada vez mais virou imperativa a necessidade de um meio circulante interno estável Polanyi diz depois que, com a desintegração do padrão ouro, o dinheiro mercadoria deixou de existir e surgiu o conceito de economia do poder de compra, na qual a função do dinheiro é comprar bens que dispõem de etiquetas de preços. Ele individua nesse capitulo, com o fracasso do padrão ouro, a morte do sistema do mercado autoregolavel e uma superação do liberalismo econômico. Todavia talvez é esse o único ponto no qual Polanyi errou: ele viu a fine do mercado autoregolavel e do liberalismo, quando em vez hoje em dia a sociedade é mais mercantilizada que nunca, todo é mercadoria, até os pensamentos, a propriedade intelectual: não morreu o liberalismo e não acabou a economia de mercado, mas ao contrário voltaram no segundo dopo guerra ainda mais enraizados na sociedade, ou melhor, dominando ainda mais as sociedades e as relações humanas. Hoje em dia a moeda não é mais representativa ou fiduciária, mas chamamos de moeda convencional, ou seja, cujo valor é totalmente desvinculado da presença de metais preciosos.

Uma manifestação histórica do sindicado dos metalúrgicos de São Paulo

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A constitucionalidade da terceirização como radicalização da mercantilização do trabalho

Trabalhadores de São Paulo em protesta contra a desocupação e precariedade.

A situação dos Bancos Nacionais (nascidos como públicos) hoje em dia no mundo: Azul: privados Vermelho: publicos

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TERCEIRA PARTE TRANSFORMAÇÃO EM PROGRESSO A queda do padrão ouro e com isso da economia de mercado foi combatida até o final do liberalismo econômico: num esforço de restaurar a auto regulação do sistema se tinha que eliminar todas as políticas intervencionistas que interferiam com a liberdade dos mercados de terra, trabalho e dinheiro. O objetivo era aquilo de restaurar o comercio mundial, mas isso se tornava possível somente com a restauração da confiança nas moedas. Primeiro passo era então a restauração do sistema monetário internacional, e todas as questões sociais tinham que ser subordinadas a isso. Se desenvolveu uma ideia deflacionista, segundo a qual os governos tinham que cortar preço dos artigos monopolizados, reduzir as tabelas salariais e cortar os alugueis. Embora os liberais sempre se tinham opostos ao intervencionismo, em favor do livre mercado, agora eles tiveram que favorecer intervenções do estado para resgatar a moeda solida e o sistema de mercado mesmo. Mas o resultado foi que não se consegui a restauração dos mercados livres e também foram sacrificados os governos livres. Depois da primeira guerra mundial se criou na Rússia uma economia socialista, com a coletivização das fazendas e então a superação da economia de mercado por métodos cooperativos em relação a terra. Polanyi considera o socialismo russo como uma transformação universal, com a destruição do absolutismo, do domínio feudal da terra e da opressão racial. 8. Coisa diferente aconteceu em vez em vários países da Europa: numa situação na qual ambos os sistemas econômicos e políticos estavam ameaçados de uma paralise total, e com o colapso do padrão ouro, o medo atingiu as pessoas e assim se abriu a porta para a época fascista e nazista. O fascismo foi substancialmente uma resposta à crise do capitalismo liberal e ao preciso das pessoas de figuras fortes e certas a leva-las da insegurança total na qual tiveram caído. Mas o fascismo em vez desnaturalizou as pessoas, negando a ideia de fraternidade em todas as maneiras pelo meio de atos de conversão de massa. Em comum fascismo e socialismo tiveram o abandono dos princípios do laissez faire em favor da autarquia. Aqui a conclusão do Polanyi: a morte da civilização moderna foi devida ao conflito insanável entre o mercado e as exigências elementares de uma vida social. Polanyi exprime uma visão positiva, otimista em relação ao futuro da humanidade, ele afirma que são em desenvolvimento uma grande variedade de formas de impedimento porque o sistema econômico deixe de organizar a sociedade, e fala de fim do mercado auto regulável com a fim da mercantilização de terra, dinheiro, trabalho, mas a visão dele com as décadas se revelou falsa: o capitalismo financeiro e a globalização são hoje as bases do mundo econômico e social e a mercantilização de trabalho e terra nunca tive um alcance maior. Polanyi anuncia a fim da sociedade de mercado e o nascimento de uma sociedade nova, na qual vai existir uma colaboração econômica dos governos e a liberdade de organizar a vida nacional, imagina uma sociedade na qual irá acontecer um fortalecimento dos diretos humanos, validados pela lei, fala, antecipando uma questão hoje em dia globalmente discutida, do direito a cidade e do direto a não conformidade. Ele afirma que o fim da economia de mercado pode se transformar numa era de liberdade sem precedentes, uma sociedade justa e livre, mas ele fala também que, porque isso se realize, é necessário suprimir vários obstáculos morais: liberdade não é defesa da livre impressa e liberdade não significa ausência de regulamentações

‘’Nenhum motivo especificamente humano é econômico.’’ Frank H.Knight

8. Aqui Polanyi explica o que significa para ele socialismo. O socialismo é a tendência da sociedade industrial de transcender o mercado autoregolavel, e subordina-lo a uma sociedade democrática, seria o resultado do esforço de fazer da sociedade uma relação de pessoas humana, ou seja, de voltar a verdadeira natureza da sociedade e fazer que os ganhos monetários privados não sejam a principal razão do trabalho.

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A ATUALIDADE DE POLANYI

e o preciso de voltar a combater as logicas de mercado ‘’E’ na verdade este tipo de sociedade dos consumos, cheia de geladeiras, televisões, carros, coisas, a felicidade? Não, a verdade é que todos realizaram que é o demônio, é o oposto. Este tipo de felicidade é altamente infeliz. Talvez, a nossa cultura, a nossa filosofia, a filosofia ocidental, mancou o objetivo. Atenção, não é verdade que o homem que vive segundo esses esquemas é feliz’’ Paolo Villaggio 1975 Burawoy e o desenvolvimento do pensamento Polanyiano Uma das interpretações recentes do texto do Polanyi que achei interessante para a temática da mercantilização da terra é aquela feita pelo sociólogo marxista britânico Burawoy no 2010. Ele acha que, o que aconteceu desde a segunda metade dos anos 70 foi uma nova onda de fundamentalismo liberalista. Burawoy explica com efeito como a reincorporação dos mercados na sociedade depois da segunda guerra mundial, que aconteceu com o nascimento do modelo do welfare state na Europa e o continuo do New Deal nos Estados Unidos, viu uma contraofensiva dos capitalistas em relação a trabalho, ambiente e normas de circulação do dinheiro desde a crise do petróleo dos anos 70 (Polanyi não pressupôs que poderia ter acontecido tal recuperação do liberalismo). Então Burawoy apresenta um modelo no qual, cada sucessiva onda de mercantilização é acompanhada por uma nova combinação de mercadorias fictícias: na primeira onda aconteceu a mercantilização do trabalho, terra e dinheiro. No modelo do Burawoy são supostas então vagas cada vez mais profundas de mercantilização, e um efeito de tal intensificação seria o envolvimento também de processos de informações e da consciência científica, que viram a ser hoje em dia as novas mercadorias. Outros objetos chave da nova onda de mercantilização seriam, na visão do Burawoy, os direitos sobre os recursos naturais (a agua, as fontes de energia, os produtos geneticamente modificados, até as emissões de carbono). Os novos instrumentos financeiros, ajudam por exemplo na criação de mercados para as fontes de energia. Assim, pode se ipotizar que a crise do futuro vai ser o fruto de crises ambientais e desastres em larga escala (mudanças climáticas, tsunami, terremotos, dificuldades de eliminação dos resíduos...). Por isso o tema da desmercantilização da terra é, na minha visão, hoje mais atual que nunca.

A crise atual e possibilidades de superação do capitalismo financeiro neoliberal 9 Chegando aos nossos dias, após a crise financeira econômica (melt down) do 2007/2008, está ficando cada vez mais claro que precisamos da ocorrência contra esse modelo desumano para reconstruir uma antropologia de signo oposto ao atual modelo de capitalismo financeiro, tecnocrático e sobretudo de molde liberal, que move se na direção da privatização do mundo, desconstrução dos estados, desmantelamento das proteções sociais e no ataco a cada princípio ético, espiritual, civil fruto da concepção aristotélica herdada do pensamento Cristiano. Depois do melt down foram com efeito redescobertos Marx, Keynes e Polanyi, realizando como a alienação típica da produção nas fabricas, invadiu e regra cada relação humana cada vez mais. A crise do 2008 abre a oportunidade de animar a reação de uma humanidade expropriada e reduzida a mercadoria e soberanismo e populismo podem e devem hoje alimentar movimentos sociais de combate para re-apropriacao da identidade. O mercado autorregulado é imoral, recusa cada pertença, quebra cada ligação comunitária, despreza cada relação não baseada na troca em dinheiro, reconhece o preço, mas ignora o valor. E’ precisa uma rehumanização integral contra a privatização e mercantilização do mundo e o seu consequente esgotamento. Uma das hipóteses é de promover o soberanismo, que parte da ideia simples da reivindicação da superioridade da política sobre a economia, do interesse público sobre aquilo privado, individuando numa especifica instituição, o Estado nacional, o instrumento mais adapto para reagir a desagregação social, a desumanização, ao comando impessoal da razão financeira. 9. Por neoliberalismo se entende uma abordagem de política econômica entendida como proposição do liberalismo, favorável ao mercado autorregulado e que vê a ação política pública como limitação do direito à vida, propriedade e liberdade

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O soberanismo não limita se a reivindicar o rolo central do estado e das instituições públicas e a contrastar a práxis libretista no campo financeiro, jurídico, tecnológico, mas trabalha para recuperar a dimensão comunitária, indenitária e spiritual dos povos. Também segundo estudiosos da economia como Rifkin a era do capitalismo financeiro e do mercado autorregulado vá ter que acabar, em favor da afirmação em escada global dum sistema econômico que ele define dos commons colaborativos, no qual a gestão e o controle centralizado do comercio van ceder lugar a uma produção paritária e distribuída a escala lateral. Transformação que tem que ser acompanhada por uma transformação cultural com o desenvolvimento de uma consciência biosferica. Existem muitas teorias sobre um futuro de decrescimento dos mercados, da desejável diminuição de mercadorias e capitais, do preciso de uma nova lógica da repartição, sobre uma possível sociedade a custos marginais zero. Nos parágrafos a seguir vamos nos focar em particular numa das mercadorias fictícias definidas do Polanyi, vamos falar da questão da terra, da sua mercantilização e das possibilidades de desmercantilização da mesma para o bem-estar de homens, comunidades e ecossistemas.

O absurdo do mercado do carbono como maneira para criar ganhos sobre a questão ambiental.

O recente desastro ambiental em Brumadinho MG, fruto de uma gestão privatizada e mercantilista da natureza

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SOBRE A MERCANTILIZAÇÃO DA TERRA

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Breve histórico da mercantilização da terra ‘’Aquilo que chamamos terra é um elemento da natureza entrelaçado com as instituições do homem. Isola-la e com ela formar um mercado foi talvez o empreendimento mais fantásticos dos nossos ancestrais. ‘’ Pag. 214 A grande Transformação

A PRIVATIZAÇÃO DA TERRA COM OS CERCAMENTOS No começo da segunda parte do seu livro, Polanyi explica como teve começo a privatização da terra, privatização que é a base da concepção mercantil (e de toda a civilização contemporânea), ou seja, é um dos mecanismos que torna possível a transformação de algo em mercadoria. Com efeito a terra, com a constituição da moderna propriedade, começou a ser objeto de poder econômico, a ser instrumentalizada como capital fictício. Polanyi explica como nas comunidades ancestrais terra e trabalho eram juntos na esfera da vida comunitária, a terra era ligada as organizações sociais de parentesco, vizinhança, a tribo, a aldeia. A função econômica era somente uma das funções vitais da terra, que dá estabilidade as comunidades humanas, é local de vida dos homens e condição da sua segurança, é a paisagem e as estações do ano. No enquanto a criação de um mercado imobiliário foi parte vital do conceito utópico de uma economia de mercado. Foi abaixo dos Tudor na Inglaterra que surgiu o capitalismo agrícola e a necessidade de um tratamento individualizado da terra, com conversões e cercamentos. Os cercamentos consistiam substancialmente em transformar uma terra que até aquele momento era terra comum em privada. Os cercamentos da terra introduziram o conceito de renda da terra: a terra mercantilizada tem preço, a renda capitalizada, sem ter valor, sem ser uma mercadoria real. (A terra agora cercada valia duas ou três vezes a não cercada, o rendimento elevou se principalmente onde a terra era alugada.) Os cercamentos causaram uma perturbação da ordem social, com a destruição de leis e costumes tradicionais: os pobres se viam roubados das terras comuns, viam a suas casas demolidas e não tinham mais acesso à terra, assim se viam constringidos a venda do trabalho, portando a um incremento da população disponível para assalariamento (acumulação primitiva). Polanyi explica também como, com os anos, os cercamentos viraram a ser mais propriedades de agricultores e mercadores que dos nobres. Os Tudors tentaram impedir essa transformação social pelo meio de leis anticercamento, que obstruíram em parte esse movimento, diminuindo o seu ritmo, e ajudando os despojados a se ajustar assim as novas condições econômicas e sociais sem danificar fatalmente a sua substancia humana e econômica.

The finest nobles and the gentlemen, not to mention several saintly abbots, are no longer content to lead lazy, comfortable lives, which do no good for society -- they must actively do it harm, by enclosing all the land they can for pasture, and leaving none for cultivation. So what happens? Each greedy individual preys on his native land like a malignant growth, absorbing field after field, and enclosing thousands of acres with a single fence. Result -- hundreds of farmers are evicted. They're either cheated or bullied into giving up their property, or sistematically ill-treated until they're finally forced to sell. Whichever way it is done, out the poor creatures have to go, men and women, husbands and wives, widows and orphans, mothers and tiny children... Out they have to go from the homes they know so well, and they can't fiind anywhere elso to live. Thomas More Utopia, Penguin:15-6

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FASES HISTORICAS DA MERCANTILIZAÇÃO DA TERRA No XVIII surgiu o capitalismo industrial, que precisava de locais para o alojamento dos trabalhadores e para as indústrias mesmas, A ascendência das cidades industriais também afetou o uso da terra, pela nascente exigência ilimitada de alimentos e matérias primas. Essas evoluções históricas foram nada mais que fases da subordinação do planeta as exigências da sociedade industrial.

‘’O primeiro estágio foi a comercialização do solo, mobilizando o rendimento feudal da terra. O segundo foi o incremento da produção de alimentos e de matérias primas orgânicas, para atender as exigências, em escala nacional, de uma produção industrial em rápido crescimento. O terceiro foi estender esse sistema de produção excedente aos território além-mar e coloniais. Com esse último passo, a terra e a sua produção se inseriram finalmente no esquema do mercado autoregolavel.’’ Polanyi Mais no detalhe as etapas históricas da mercantilização da terra foram: Comercialização do solo com liquidação do feudalismo, eliminando todas as reivindicações das organizações de vizinhança e parentesco, que isentavam a terra da comercialização e hipoteca e criavam impedimentos a uma liberdade de tratamento da propriedade da terra, Esse objetivo foi atingido com vaias medidas: desde a guerra e conquista até ações legislativas como os cercamentos e por pressão administrativa. Ao mesmo tempo temos que lembrar o processo de secularização das terras da Igreja, que foi uma das maneiras principais de privatizar a terra agrícola na Europa. Assim, além do Enclosure Act referente os cercamentos, Polanyi se refere por exemplo ao Code Napoleon, o qual instituiu formas de propriedade para a classe média, transformando a terra em mercadoria e tornando a hipoteca um contrato privado. 2) O segundo ponto é explicado do Polanyi como a subordinação da terra as necessidades de uma população urbana em continuo crescimento, ou seja, para a produção de alimentos, que tinham que ser livremente comerciados, assim do compensar a diferente distribuição geográfica das terras produtivas. Isso era uma novidade: nunca antes os bens alimentares elementares foram parte de um mecanismo internacional de compra venda: os excedentes eram dados para o aprovisionamento dos vizinhos e os mercados eram com base local. 3) Todavia o nascimento das cidades industriais mudou profundamente a situação, estendendo a mobilização dos produtos das regiões vizinhas para os países do outro lado do globo e assim, com o livre comercio dos bens básicos para a vida, as pessoas se sujeitaram as casualidades da interdependência num mercado planetário. (Mobilização universal da terra).

1)

Polanyi chega ad afirmar, em maneira quase profética das situações globais atuais que:

‘’O argumento econômico podia se ampliar facilmente, de forma a englobar as condições de segurança e estabilidade ligadas a integridade do solo e dos recursos (...) até mesmo o clima do pais, que podia sofrer com o desnudamento das florestas, as erosões e as dunas, tudo aquilo que, em última análise, depende do fator terra. ’’

PRIMEIROS CONTRA-MOVIMENTOS PARA A DESMERCANTILIZAÇÃO O papel da lei comum, no caso da terra, foi diferente que para o trabalho: desde o século XVII a lei comum da terra atuava como preservadora do passado, e o feudalismo e conservadorismo fundiário tinham entre os objetivos a volta ao passado, e graças a isso contribuíram a restringir os efeitos danosos da mobilização da terra, constrastando a avançada da privatizações das terras rurais, estabilizando assim o campo europeu e enfraquecendo o fluxo em direção das cidades.

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As classes fundiárias, aliadas ao clero, estavam prontas a qualquer solução reacionária para sair do impasse ao qual podia conduzir a economia de mercado e a visão liberalista, assim, transformaram-se em defensoras da terra e dos cultivadores, guardiões do habitat do homem. A isso temos que adicionar que, partir dos anos 70, com o começo do momento coletivista de contramovimento, voltaram a ser votados estatutos para proteger habitações e ocupações das classes rurais. Também se desenvolveram esforços para assegurar salubridade nas moradias das pessoas mais pobres (o direito a uma casa digna) e para fornecer lotes de terra para os trabalhadores industriais para fugir as favelas das metrópoles nascentes. No continente europeu os efeitos piores da urbanização foram parados das leis estatuarias e com a ação administrativa, e, nos campos, foram aplicadas leis do trigo para proteger o campesinato da avalanche de produtos que estava invadindo a Europa. Olhando além do oceano, Polanyi explica como também a revolta contra o imperialismo pode ser considerada como um ato de proteção a mercantilização da terra, e uma tentativa dos povos colonizados de se proteger das distorções sociais. Nos anos 20, após a primeira guerra mundial, aconteceu, em muitos países da Europa, um fenômeno particular de reagrarianização da Europa central, que começou pelo medo bolchevique da importância cada vez crescente dos trabalhadores industriais pelo meio de sindicatos na vida política. Assim os camponeses adquiriram importância, e, com o protecionismo agrário, exerceram pressão dobre a classe urbana, mostrando um dado curioso que é o feito que os estratos sociais ligados a terra estavam inclinados a um compromisso com o sistema de mercado em caso de emergência. Além disso a grande guerra havia levado a uma crença na importância militar da autossuficiência agrícola, assim a autarquia, que desde o começo foi um dos obstáculos ao mercado livre porque limita a interdependência das nações e então dificulta o livre comercio, se uniu ao medo do bolchevismo na reagrarianização da Europa.

CAMINHOS ATUAIS DE MERCANTILIZAÇÃO DA TERRA Hoje em dia existem vários conceitos a base daquilo de mercantilização, como elencado do Noel Castree (geografo britânico), o qual individua: privatização, alienabilidade, individuação, abstração, valorização, deslocamento. • Privatizar é assinar um título legal a entidade ou processos: qualquer bem, na sociedade de mercado, tem que ser possuído de alguém para ser objeto de barganhas. A privatização da terra, fundamento da economia de mercado, foi a base de mudanças nos direitos de acesso no uso da terra. • A alienabilidade é a capacidade de um dado bem de ser separado do seu vendedor e assim ser objetos de trocas. • A individuação é o ato representativo de separar um bem do seu contesto pelo meio de limites legais ou materiais. Isso pode incluir o dividir um ecossistema em propriedades legalmente definidas e comerciáveis para específicos serviços e recursos. • A abstração que é a assimilação de uma coisa num tipo de processo mais amplo. Pelo meio da abstração funcional, por exemplo, são assimilados tipo de ecossistema diferentes, ou ainda esse conceito é a base dos mercados do carbono. • Por valorização podemos entender a manifestação de todas as expressões de valor pelo meio duma troca monetária. A monetarização é o fundamento do capitalismo, ou seja o render coisas mesuráveis e trocáveis, permitindo a separação de produção, circulação e consumo em grandes limites temporais e espaciais. • O deslocamento enfim envolve algo que parece como algo diferente de si mesmo. Ou seja, estamos nos referendo ao conceito do fetichismo das mercadorias do Marx: pelo meio da separação espaço-temporal entre produtores e consumadores, a história e as relações das mercadorias é obscurecida, são tornadas invisíveis as relações sociais e o enraizamento da produção.

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O duplo monopólio da Terra: Terra natureza // Terra espaço Desde a análise de como historicamente aconteceu a mercantilização da terra, como presentado do Karl Polanyi, podemos individuar dois campos de monopólio do mercado sobre essa mercadoria fictícia; estamos falando do duplo monopólio da terra como natureza e como espaço. O monopólio da terra natureza, ligada ao conceito de renda fundiária e extrativa, representa a exploração dos recursos naturais do planeta. O monopólio da terra como espaço configura-se em vez como questão central no campo urbano, onde a terra é principalmente considerada como base da localização dos imóveis. Nesse caso falaremos de renda imobiliária (gerada pelo preço de monopólio) capitalizada (valor dependente da hipotética utilização futura). Vou, portanto, prosseguir na dissertação subdividindo a analise em dois campos: aquilo da terra natureza e da terra espaço, analisando para cada um dos dois as questões atuais sobre mercantilização e possibilidades e maneiras para se voltar a uma desmercantilização.

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TERRA COMO NATUREZA

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O DRAMA DA MERCANTILIZAÇÃO DA NATUREZA ‘’Hoje podemos dizer que a mais significativa divisão entre os seres humanos, não baseiase na nacionalidade, na raça, na religião, mas é em vez uma divisão entre quem que dedicam a vida a explorar a terra deleteriamente, destruindo-a, e quem se dedica a preservar a terra no seu esplendor.’’ Teólogo Thomas Berry Falar de terra como natureza é falar de algo extremamente complicado, é discutir do nosso planeta ao nível dos ecossistemas, dos recursos, da utilização das energias. As teorias da política ecológica e da geografia marxista veem a natureza como socialmente produzida, ou seja, não identificam uma separação clara entre natural e social. Isso é expressão também das comunidades pré-industriais: um tempo o homem e o seu ambiente de vida eram uma coisa única, a ligação entre as comunidades e os ecossistemas era muito mais forte e, como também se pode perceber no texto do Polanyi, é desde a industrialização e o surgir do domínio do mercado que a terra no sentido de natureza está sendo depauperada dos recursos, ameaçada da poluição, do desmatamento e os ecossistemas estão em crise para o aquecimento causado das nossas fabricas. A mercantilização da natureza é algo de absurdo sendo que na verdade não faz sentido atribuir um preço a coisas quais paisagens, recursos e serviços ecossistêmicos que são únicos e não substituíveis, portanto incalculáveis. Assim o valor monetário atribuído a esse tipo de bem é arbitrário, e não segue as mudanças na qualidade e quantidade, mas em vez as preferencias e os precisos do mercado. Através da mercantilização, as entidades e serviços naturais tornam-se com efeito veículos para a realização do lucro, meios de acumulação de capital e produção de mais valia sob a forma de renda fundiária e extrativa (10) (11) pelo meio da exploração com a agricultura, as mineiras ecc, a natureza é sujeitada às pressões do mercado, onde a eficiência se sobrepõe a outras preocupações. Harvey, com efeito declara que há algo "inerentemente antiecológico" na mercantilização capitalista, a qual ignora e simplifica relações complexas, obscurecendo origens e estreitando as coisas para um único serviço: criar lucro. O tratamento das coisas naturais no mercado autorregulado leva a uma homogeneização e simplificação do biofísico: os componentes são frequentemente dependentes uns dos outros e o resultado de interações entre fatores bióticos e não-bióticos no espaço e em múltiplos níveis. O reducionismo imperante leva a uma ineficiência na promoção da biodiversidade, uma vez que, à medida que os ecossistemas são simplificados e transformados em produtos básicos, eles não podem mais sustentar um conjunto tão diversificado de organismos quanto conseguiriam a pré-modificação. Com a expansão do capitalismo cada vez mais coisas, antes externas ao sistema do mercado, estão sendo englobadas nisso, inclusive novos elementos da natureza, quais a agua, a energia, as emissões. Está acontecendo, para permitir essa nova mercantilização da natureza, um importante processo de privatização cada dia mais intensa do ambiente, como no caso das redes hídricas, dos recursos petrolíferos, a venda a cessão de porções de costas e de áreas protegidas a privados. 10. A mais valia que é obtida numa qualquer atividade econômica capitalista é a concretização do conceito de extração do excedente, ligado ao funcionamento ao nível global do capitalismo e as formas de reprodução e produção do capital. A acepção da mais-valia e extração do excedente está então associada, à exploração da mão de obra assalariada, em que o capitalista recolhe o excedente da produção do trabalhador (sob forma de lucro), mas também a exploração da terra (renda) e a exploração financeira dos bancos (juro). 11. Renda fundiária: preço do uso da terra, e então parte do produto que reverte ao proprietário, seja que ele a cultive diretamente seja que a alugue, a compenso das qualidades naturais e ‘indestrutíveis’ do solo. Sendo que a terra é um fator de produção irreproduzível, a renda da terra pode ser considerada como o custo de uso de um fator de produção escasso e então como fenômeno sujeito a lei de demanda e oferta dum mercado baseado na propriedade individual. Renda extrativa: deriva da possibilidade de extração mineraria na terra em questão.

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Hoje em dia somos na frente de um verdadeiro biocidio e geocidio, ou seja, estamos matando a natureza, e a situação fica cada vez mais dramática, no silencio quase total (que, todavia, parece ter sido quebrado nos últimos anos) das mídias cartáceos e televisivos, que são nas mãos dos grupos econômicos financeiros. Se comparamos a idade da terra de 4,6 milhões de anos a 46 anos, nos seriamos presentes, como seres humanos, apenas desde 4 horas e a revolução industrial teria tido lugar um minuto atrás. Nesse minuto destruímos o 50% dos ecossistemas naturais. Mas parece que ainda não temos realizado a gravidade da situação. É claro que o ambiente natural é algo de essencial para a vida dos homens, e é de extrema importância entender que temos que nos obrigar a proteger a natureza (aquilo que hoje em dia podemos chamar de patrimônio natural) da sua exploração capitalista, tendo conto que, como fala Neil Smith, conhecido geografo e antropólogo,

"[n]o part of the earth’s surface, the atmosphere, the oceans, the geological substratum, or the biological superstratum are immune from transformation by capital." Além das questões mais praticas acima brevemente lembradas, quero explicar um outro drama envolvido na mercantilização da natureza: um drama ético e moral. Um único valor monetário nega a multiplicidade de valores que poderiam ser atribuídos à natureza no âmbito de sistemas não monetários de importância cultural e social. O meio ambiente pode expressar as relações entre gerações, não é somente os meios de subsistência, mas é também algo de sacrado, que tem uma mais valia não monetária, mas cultural e antropológica. Assim dividir um valor social comunitário - uma floresta, por exemplo - em direitos de propriedade privada pode minar as relações e a identidade de uma comunidade.

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FINANCIARIZAÇÃO NEOLIBERALISTA E GREEN ECONOMY COMO FALSA ESTRATEGIA ECOLOGICA Queria agora discutir um pouco dum fenômeno que tive começo nos anos 80, no âmbito do neoliberismo, estou falando da ideologia dum ambientalismo de mercado, segundo o qual os bem ambientais têm que ser munidos todos de preço, ou seja financiarizados, para uma melhor defesa do ambiente ’’selling nature to save it’’. Segundo essa concepção absurda privatizar e colocar no mercado os recursos naturais seria a maneira melhor, do ponto de vista racional, de gerir e conservar o ambiente. Na verdade, isso contribui a sua transformação em mercadoria ainda mais. Na natureza, a prática da “financeirização” vincula os direitos fundamentais do ambiente saudável e o direito à vida ao criar mecanismos de pagamento por tudo aquilo que a natureza produz gratuitamente. A natureza nos fornece água, ar, terra, minérios, biodiversidade (florestas, fauna e flora) e não cobra por esse benefício providencial. No entanto, para que possamos ter água em quantidade e qualidade, ar puro para respirar, terra boa para plantar, plantas medicinais para curar, rios e mares para nos banhar e nos abastecer, com a “financeirização da natureza” teremos que pagar para ter o que sempre tivemos por direito inalienável. Os que propõem a “financeirização da natureza” argumentam que, sem pagar, não é possível manter as florestas em pé, ter rios limpos, ter a cidade limpa de resíduos sólidos, possuir terra sem agrotóxico e químicos, ter o ar respirável sem reduzir gases tóxicos, enfim, afirmam não ser possível preservar e conservar o meio ambiente sem que os bens comuns (água, minério, solo, ar, biodiversidade) se tornem produtos financeiros, coisas que é totalmente errada, uma maneira do capitalismo de mascarar o feito que a verdade está do lado exatamente oposto: no deprivatizar e tornar publicos . Assim são justificados o roubo de terras de povos indígenas e tradicionais, a expulsão de campesinos, o controle da água e do ar por oligopólios, a produção de alimentos industrializados, institucionalizando a “dependência da sobrevivência” da espécie humana e demais seres vivos. Esses falsos ambientalistas alegam que estão financiando a transição de uma economia marrom (degradadora) para a “economia verde”, com as novas fronteiras da mercantilização do ecoturismo e do bioprospecting. Indo mais a fundo na questão, podemos começar a ver como os mecanismos perversos do capitalismo estejam mascarando uma outra questão critica: paradoxalmente o movimento ambientalista, que deveria ser um aliado a socialdemocracia no combate ao neoliberalismo e ao capitalismo financeiro, torna se um meio de expansão do capitalismo também nesse campo. Ou seja, está acontecendo uma financiarização também da crise ecológica, que em vez deveria ser o imput para uma mudança de paradigma. Citando david Harvey, estamos na frente de:

"new wave of ‘enclosing the commons that employs environmentalism in the service of the rapid expansion of capitalism.’’ A ditadura financeira decidiu de fazer da crise ecológica na verdade uma outra questão de barganhas, com a assim chamada green economy, com a criação de um mercado do carbônio internacional(12), a produção agroflorestal de bio carburantes e a geo engenharia. Chegamos atè o ponto que hoje em dia existem aplicativos (es. Treedom) para plantar arvores com abonamento pago para salvar (? De verdade) o planeta. 12. O comércio de emissões, incorpora a mercantilização da natureza na medida em que permite o comércio de poluição e emissões dentro de um determinado limite para um ambiente específico. Em vez de simplesmente proibir ou permitir a poluição e outras externalidades negativas, o cap and trade essencialmente permite que os membros de uma indústria comprem e vendam unidades de emissão com um máximo definido para a indústria como um todo. Embora existam várias perspectivas sobre se o comércio de emissões é eficaz na redução de emissões ou poluição, é pertinente entender que esse conceito absorve as emissões de uma empresa ou indivíduo e as apresenta como algo que pode ser comprado ou vendido em um mercado especializado.

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A green economy, atribuída as logicas do mercado autorregulado, é uma falsa solução. Pior é que não podemos esperar soluções dos nossos governos, prisioneiros dos grupos financeiros dum lado e agroindustriais do outro. O que deveria ser feito é rediscutir o nosso modelo de desenvolvimento e o nosso estilo de vida, empenhar-se ao nível pessoal e comunitário a viver com mais sobriedade e reduzir a impronta ecológica das cidades do planeta que hoje é muito além das possibilidades de suportarão da natureza (continuando nesse estilo estamos consumando num ano os recursos naturais que a terra produz em um ano e meio), tendo conto que, quanto mais uma economia produz, mais polui. Para ter uma ideia da produção global de lixo, é bastante considerar que, desde os anos 50 nos oceanos estão sendo criadas ‘naturalmente’ ilhas de plástico e resíduos que são as lixeiras maiores do mundo. Hoje existem no pacifico duas maxis ilhas de resíduos com superfície dobra daquela dos EU (M. Erikson). Esse fenômeno, chamado de pacific trash vortex, foi descoberto do oceanógrafo americano Ch. Moore, e está levando a formação de um sexto continente artificial.

Uma história pessoal.... De recente, passeando para as ruas de Lisboa, eu tinha sede, e acabei comprando uma garrafa de agua de um quiosque, um amigo que estava comigo me disse que aquela garrafa de plástico podia resumir alguns dos males do mundo. A agua que é natureza mercantilizada, embotelhada e assim vendida com um preço seu no mercado, no enquanto que a nascente muitas vezes presente também em âmbito urbano são esquecidas e deixadas a si mesmas, e em vez de favorecer uma distribuição livre e gratuita desse bem que deveria ser comum e em vez é privatizado. Além disso o elemento do plástico, que é um material não sustentável o qual ameaça o ambiente e a natureza pelas grandes quantidades nas quais é produzido e não reciclado, mas, todavia, que continuamos a produzir e consumar e publicitar para a sete de ganho e o mecanismo capitalista que não pode parar. Aquele dia não compramos mais garrafas de agua. A enchemos nos banheiros públicos com a agua da pia.

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MERCANTILIZAÇÃO DA NATUREZA NA LATINOAMERICA E NO BRASIL "Se a Natureza se opõe lutaremos contra ela e faremos com que nos obedeça". Simon Bolivar, 1812

“Foi se retirando cada vez mata e um temor foi se apossando homens chegassem um dia do Sequeiro Grande. Profetizara conta para esse dia. A todos dizia que essa mata era moradia árvore era sagrada, e que, mão nela, os deuses se vingariam As terras do Sem-Fim - Jorge Amado vez mais para o fundo da apossando dele: o de que os dia para derrubar a mata Profetizara desgraças sem todos que lhe vinham ver ele moradia dos deuses, cada se os homens pusessem a vingariam sem piedade”. Amado 1943 A América Latina entrou a fazer parte do mercado mundial como fornecedora de recursos primários há mais de 500 anos. Desta região saiu o ouro, a prata e as pedras preciosas que financiariam a expansão do império espanhol, mas, sobretudo, o surgimento do capitalismo na Europa central. E desde então estas terras americanas, sobretudo as do Sul, assumiram uma posição submissa no contexto internacional ao se especializar na extração de recursos naturais para o mercado mundial. Conseguida a independência da Espanha e Portugal os países da América Latina seguiram exportando recursos naturais, ou seja, Natureza, do mesmo modo que o haviam feito na época colonial. A posição passiva de aceitação deste posicionamento na divisão internacional do trabalho e a ilusão do extrativismo todo-poderoso, plasmado há mais de dois séculos seguem vigentes em muitos países latino-americanos, ricos em recursos naturais, tanto é que parece quase impossível imaginar-se um caminho de libertação desta "maldição da abundância" dos recursos naturais (Ver Schuldt 1995; Acosta 2009). A Natureza, em suma, segue sendo assumida como um elemento a ser domado, explorado e certamente mercantilizado, e os recursos naturais, são vistos como os pilares para a construção do desenvolvimento dos estados. Assim, para a América do Sul e Central se define uma especialização em commodities agroindustriais, apresentando características do antigo modelo agroexportador. Falando do brasil as coisas não são diferentes: ‘’ O País tem sido importante por financeiros, fundos de estrangeiros, para cultivo de celulose e madeira e biocombustível; ou, especular com um recurso torna cada vez mais mundial” (BENETTI, 2011). A disponibilidade de terras, águas e minerais são ainda os principais atrativos para novos investimentos externos que se orientam fundamentalmente para o agronegócio e para a extração mineral, seja através da aquisição e/ou invasão de terras, ou associação com o latifúndio já estabelecido. Hoje, entre as questões essenciais em discussão com o novo governo, com efeito entram também aquelas da financiarização do ambiente e do preocupante desmantelamento em ato do sistema de fiscalização ambiental e licenciamento ambiental. 13. Hoje, com o novo governo, a atribuição de avaliar e deliberar sobre o licenciamento ambiental por exemplo dos quilombos e Terras Indígenas (TIs), que são os lugares onde a terra é ainda protegida e incorporada na sociedade em vez que no mercado, é agora tarefa de um dos 13. A fiscalização consiste no dever que o Poder Público tem de fiscalizar as condutas daqueles que se apresentem como potenciais ou efetivos poluidores e utilizadores dos recursos naturais, de forma a garantir a preservação do meio ambiente para a coletividade. A fiscalização é necessária para reprimir e prevenir a ocorrência de condutas lesivas ao meio ambiente. Por suo lado o Licenciamento Ambiental é um dispositivo que integra o primeiro e que foi contemplado pela Lei nº 6938/81, sua finalidade tem por base o controle prévio à construções, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades que utilizem recursos ambientais, e também os capazes de causar degradação ambiental, bem como serem efetiva ou potencialmente poluidores.

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superministérios do novo governo, o da Agricultura (Mapa), que tem todos os interesses em abrir essas terras a agricultura e extração, ou seja, proceder com o desmatamento e os horrores naturais. Enquanto isso, o Brasil continua a ser um dos países de maior concentração de terra do mundo. Apenas 93 mil latifúndios - ou 1,6% do total de propriedades - concentram 47% da área total dos imóveis rurais, quase 30% do território brasileiro.

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UMA NOVA MENTALIDADE PARA A

DESMERCANTILIZAÇÃO DA NATUREZA Tire as construções da minha praia Não consigo respirar As meninas de mini saia Não conseguem respirar Especulação imobiliária E o petróleo em alto mar Subiu o prédio eu ouço vaia

Lucro Máquina de louco Você pra mim é lucro Máquina de louco Bayana System- Lucro

Falando agora de desmercantilizaçaõ da natureza, a primeira coisa a qual sento de sublinhar é que os povos indígenas tradicionais, os campesinos e as populações carentes do sertão, que sabem lidar com o ambiente natural e sua diversidade, têm muito a nos ensinar, sem nunca terem precisado de agentes financeiros, especialistas ou consultores ambientais para lhes vender pacotes de produtos e serviços. Re-aprender a ter uma relação não mercantil com a natureza a aquilo que a terra nos dá é na minha opinião o primeiro passo no caminho para mudar as coisas: é precisa uma mudança drástica de mentalidade, se não queremos matar a terra e nos mesmos. O objetivo tem que ser a sustabilidade das nossas acoes, e gerir elas também em função da capacidade de carga e resiliência da Natureza e não somente dos nossos interesses antropocêntricos. O desenvolvimento convencional, ta levando a uma rua sem saída. A crise provocada pela superação dos limites da Natureza implica necessariamente também aços institucionais e da organização sociopolítica. Tenhamos presente que, "na crise ecológica

não apenas se sobrecarregam, distorcem, esgotam os recursos do ecossistema, mas também os "sistemas de funcionamento social’, ou, dito de outra maneira: exige-se muito das formas institucionalizadas de regulação social; a sociedade converte-se em um risco ecológico" (Egon Becker, 2001).

Assim, por um lado, os países empobrecidos e estruturalmente excluídos deverão buscar opções de vida digna e sustentável, que não representem a reedição caricaturizada do estilo de vida ocidental. No enquanto, por outro lado, os países "desenvolvidos" terão que resolver os crescentes problemas de iniquidade internacional que eles provocaram e, em especial, terão que incorporar critérios de suficiência em suas sociedades antes que tentar sustentar, às custas do resto da humanidade, a lógica da eficiência entendida como a acumulação material. Quer dizer, os países ricos devem mudar seu estilo de vida que coloca em risco o equilíbrio ecológico mundial, pois desde esta perspectiva são, de alguma maneira, também subdesenvolvidos ou "mal desenvolvidos" (Tortosa). A tarefa parece simples, mas é extremamente complexa. Em vez de manter o divórcio entre Natureza e ser humano, é preciso proporcionar seu reencontro. Vou agora apresentar vários caminhos que estão se desenvolvendo nesse sentido e que achei de relevância para a monografia: primeira a hipótese do bem viver e os direitos da natureza, em segundo lugar o movimento para os bens comuns e enfim vou fazer um breve parêntese sobre a concepção de vida das comunidades sustentáveis ou ecovillas.

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A HIPOTESE DO BEM VIVER E OS DIREITOS DA NATUREZA COM O NOVO ECOSSOCIALISMO “A natureza ou Pacha Mama, onde se reproduz e se realiza a vida, tem direito a que se respeite integralmente sua existência e a manutenção e regeneração de seus ciclos vitais, estruturas, funções e processos evolutivos. Toda pessoa, comunidade, povo ou nacionalidade poderá exigir da autoridade pública o cumprimento dos Direitos da Natureza. Para aplicar e interpretar estes direitos, serão observados os princípios estabelecidos na Constituição.” Constituição equatoriana A hipótese do bem viver e os direitos da natureza são questões enfrentadas na Constituição equatoriana desde o 2008, a partir, não a caso, do resgate de uma visão do mundo dos povos indígenas ameríndios, e são ainda novidades ao nível internacional. O Bem Viver propõe uma vida em harmonia dos seres humanos entre si e destes com a natureza, com uma reaparição dos princípios de reciprocidade, relacionalidade, complementaridade e solidariedade entre indivíduos e comunidades. Nesse contexto entram os Direitos da Natureza, numa nova perspectiva biocentrica (nb: diretos da natureza, não sobre a natureza!) Ambos, bem viver e direitos da natureza, podem ser vistos como alternativas ao sistema de mercado, e não apena a isso, mas à própria lógica do sistema capitalista. A força inovadora dessas ideias deveria se expandir em todo o globo: com efeito se está começando a falar de Declaração Universal dos Direitos da Natureza e também tem sido proposta a criação de uma institucionalidade internacional que julgue os crimes contra a natureza, da qual o governo boliviano de Evo Morales tem sido o principal impulsionador, com a convocação em 2010 da Conferência Mundial dos Povos sobre Mudanças Climáticas e o Direitos da Mãe Terra e tendo obtido na ONU a declaração da água como um direito humano fundamental. Na verdade, a palavra usada no Equador nem é natureza, mas Pachamama, mãe terra, um conceito quéchua que dificilmente é traduzível em línguas ocidentais: e isso é espelho do feito que, em relação a essa temática, o ocidente eurocêntrico super desenvolvido está muito desprevenido, sendo que parece que esqueceu faz tempo o que pachamama significa de verdade.

“O bem viver propõe uma cosmovisão diferente da ocidental, posto que surge de raízes comunitárias não capitalistas. Rompe igualmente com as lógicas antropocêntricas do capitalismo enquanto civilização dominante e com os diversos socialismos reais que existiram até agora – que deverão ser repensados a partir de posturas sociobiocêntricas e que não serão atualizadas simplesmente mudando seus sobrenomes.’’ Alberto Acosta, politico do Equador

A ideia dos direitos da Natureza significa uma troca entre a predominância de economia e ecologia, e então o desenvolvimento de um novo modelo de progresso e também uma outra forma de organização social, que utilize estes recursos de uma forma compartilhada e sem visar o lucro que caracteriza a sua exploração sob o jugo capitalista. Isso nos remete a teoria do ecossocialismo, visto como uma ideia política que se contrapõe não apenas ao sistema capitalista, como ao chamado socialismo real que manteve uma lógica produtivista e predatória da natureza, como demostram também os resultados de vários governos teoricamente progressistas na America Latina dos últimos anos, os quais não conseguiram contrastar o neoliberalismo e acabaram com o se sujeitar a ele.

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Segundo Michel Lowy:

“O projeto ecossocialista implica uma reorganização do conjunto do modo de produção e de consumo, baseada em critérios exteriores ao mercado capitalista: as necessidades reais da população e a defesa do equilíbrio ecológico. Isto significa uma economia de transição ao socialismo, na qual a própria população – e não as leis do mercado ou um “burô político” autoritário – decide, num processo de planificação democrática, as prioridades e os investimentos. Esta transição conduziria não só a um novo modo de produção e a uma sociedade mais igualitária, mais solidária e mais democrática, mas também a um modo de vida alternativo, uma nova civilização, ecossocialista, mais além do reino do dinheiro, dos hábitos de consumo artificialmente induzidos pela publicidade, e da produção ao infinito de mercadorias inúteis.”

Manifesto do fórum internacional pelos direitos da Mãe Terra do 2018, a São Paulo

MOVIMENTO PARA OS BENS COMUNS Outro conceito básico no combate a mercantilização da natureza é aquilo de bens comuns. O movimento bens-comunista sublinha a necessidade de constituir espaços institucionais para limitar as desigualdades e garantir o acesso ótimal, livre e participativo a essa categoria de bens, chamados de bens comuns, nos quais entram, em primeiro lugar, os recursos naturais e paisagísticos, que nessa ótica deveriam ser geridos das comunidades. (Duvidas que me surgem são sobre como essa categoria de bens seria então salvaguardada dum sovraconsumo das comunidades ou ao contrario duma subutilização). Os bens comuns veiculam uma visão do mundo e uma ideia de sociedade diferentes daquela evocada dos conceitos tradicionais de Estado e Mercado. Para o desenvolvimento do benscomunismo é todavia necessária uma ação politica estadual, e, para explicar melhor toda a questão vou levar dois exemplos italianos que achei interessantes e clarificadores

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(estranhamente) de como, pelo meio de uma legislação inteligente e da intervenção popular, se pode com efeito ajudar na desmercantilização de bens, lugares e serviços. Na Itália, no 2007, foi feita uma proposta para um decreto de lei, o decreto Rodotá, a qual foi rapidamente boicotada de todas as maiorias parlamentares, era uma proposta para introduzir novas categorias no ordenamento jurídico, para suprir a falta implícita na macro categoria dos bens públicos. Tratava-se das categorias dos bens comuns, que inclui os recursos naturais, os bens arqueológicos e paisagísticos, dos bens sociais, ou seja, instrução, pesquisa, trabalho, saúde, e dos bens soberanos como infraestruturas estratégicas e serviços públicos essenciais, dando atuação a constituição e em resposta ao neoliberalismo e ao capitalismo financeiro. Apesar essa lei ter sido oficialmente esquecida, na verdade, nos dez anos atrais, essa proposta cresceu, pelo meio da ação dos cidadãos, dos administradores locais e virou a ser uma proposta para lei de iniciativa popular esse 12 de janeiro do 2019. Essa proposta de lei baseia se numa ideia de princípio de organização da sociedade baseado em relações solidais, orientadas a reciprocidade e mutualidade polanyianas, é ou seja um projeto político para a saída do despotismo proprietário, do individualismo egoísta e do economicismo imperante. Falando mais no especifico dos bens comuns, trata-se de bens a titularidade difusa, e são incluídos nessa categoria os recursos naturais como rios, lagos, o ar, os parques e as florestas, as áreas montanas, os glaciers, as costas, a fauna e flora selváticas, as áreas paisagísticas. Numa palavra a natureza. Mas também os bens arqueológicos, culturais e ambientais. Todos esses bens foram definidos como coisas que exprimem uma utilidade funcional no exercício dos direitos fundamentais e o livre desenvolvimento das pessoas, e que portanto devem ser salvaguardadas entre as gerações. Assim a lei mira a tutela desses bens e a garantia de uma possível fruição coletiva, com fortes limitações a concessão a privados. Outra lei que posso lembrar, sempre no contesto italiano, mas esta vez mais para as áreas agrícolas e rurais, é aquela da proteção e reconhecimento dos domínios coletivos do 2017. Com as palavras domínios coletivos podemos entender, geralmente, uma situação jurídica na qual uma determinada extensão de terreno é objeto do gozo por parte de uma coletividade, usualmente com uso agro-silvo-pastoral. As dificuldades de enquadramento sistemático dos domínios coletivos derivam da irredutibilidade deste instituto a atual concepção privatista: são substancialmente algo que sobreviveu aos cercamentos das terras dos quais fala o Polanyi, e, por isso, um importante ponto de defesa do território a sua mercantilização. Com a lei do 2017 os domínios coletivos são declarados como elementos fundamentais para o desenvolvimento das coletividades locais, como instrumentos para a tutela do patrimônio ambiental, como bases territoriais de instituições históricas e, portanto, essenciais na salvaguarda do patrimônio cultural e como fonte de recursos renováveis de valorizar e utilizar por parte das comunidades locais.

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ECOVILLAS OU COMUNIDADES SUSTENTAVEIS ‘’Nunca vamos muder as coisas combatendo contra a realidade existente. Para mudar algo, constroi um novo modelo, que faça a realidade obsoleta. ’’ Buckminister Fuller, pensador

Entre as tentativas de encontrar uma solução, uma possível reconexão com a natureza sobre plano social, arquitetônico, holístico, espiritual, econômico, são da colocar as experiências das Ecovillas. Por quanto usualmente trata-se de realizadas pequenas, eu queria as lembrar sendo que, no final, casa mudança importante começa com pequenos atos, e sendo que, muitas realidades pequenas interconectadas podem contribuir a uma mudança social maior. É muito complicado dar uma definição correta e unívoca de ecovilla: podemos com efeito afirmar que, para a pluralidade de realidades existentes e a moltitude de diferenças reencontráveis entre essas, não existe uma definição estandardizada do termo. Todavia, na maneira mais geral, podemos falar de pequenos estabelecimentos, micro sociedades a dimensão humana, nas quais as atividades são integradas duma maneira não danosa com o mundo natural, centros abitados moderno nos quais, por escolha, os homens vivem em harmonia e cooperação com a natureza, experimentado novas tecnologias e novas habilidades para criar um estilo de vida mais sustentável e pacifico. Mais em breve, são comunidades eco sustentáveis intencionais, nas quais é presente uma atividade de produção de comida interna e as pessoas vivem dum estilo de vida de cooperação. Assim, no enquanto para muitos as ecovillas são somente uma das últimas visões utópicas sobre a maneira, pratica e conceitual, de viver e conceber a vida, um sonho não realizável na época contemporânea e um paradoxo na organização social, outros pensam as ecovillas como a maneira mais natural de viver e a mais correta do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, arquitetônica e social. Desde o 1990, apercebeu-se que existiam várias realidades independentes, com tradições e aspectos variados, mas todas acomunadas de uma exigência de uma nova modalidade de viver.

Ecovillas no mundo hoje em dia

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Assim foi preparado um recenseamento de todas as realidades comunitárias existente no planeta e, um ano depois foi organizado um encontro entre os representantes de algumas dessas realidades. Assim, nasceu, entre os primeiros 15, o termo de ecovilla, e no 1996 nasceu a GEN, Global Ecovillages Network, com o objetivo, não lucrativo, de relacionar as ecovillas do mundo para favorecer uma troca de ideias, informações e competências. Vou reportar a seguida os pontos basicos das carta dos intentos da GEN: 1. A humanidade pode viver bem sobre a terra pelo meio do processo de apoio a auto realização individual e a cooperação interdependente. 2. Reconhecemos que, pelo meio do saneamento, do apoio e proteção a saúde e integridade do ambiente é possível começar a mudar comportamentos, ações, estilos de vida, individualmente e em grupo. 3. Aspiramos a uma vida de trabalho honesta e gratificante, de relações sociais de amor e simplicidade na abundancia 4. Apoiamos o movimento que desenvolve comunidades ecológicas e de autossubsistência local, as quais sejam sustentáveis do ponto de vista social, ambiental, econômico e espiritual. 5. Reconhecemos a nossa dependência da pluralidade e diversidade e trabalhamos para garantir a sobrevivência de todas as espécies e culturas 6. Trabalhamos para a salvaguarda dos direitos humanos e para obter igualdade e justiça sociais 7. Adotamos métodos de projetação territorial e de desenvolvimento que respeitam e protegiam a saúde dos ecossistemas naturais, como a permacultura, a bioedilizia, e a conservação do habitat das espécies animais selváticos 8. Promovemos a pesquisa e utilização de substancias e tecnologias não tossicas, seja na agricultura, seja na indústria, em pequena escala, individualmente e localmente, e em grande escala se possível 9. Achamos que o escopo do genro humano seja aquilo de realizar uma visão de sustentabilidade e de meter a fruto a própria criatividade porque a terra não somente sobreviva, mas floresça e prospere.

Algumas casas na ecovilla de Granara, na Itália, fruto da recuperação dum velho povoado abandonado

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TERRA COMO ESPAÇO (URBANO)

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RENDA IMOBILIARIA DA TERRA URBANA MERCANTILIZADA, IMOVEIS COMO MERCADORIA HIBRIDA E PREÇO DO SOLO-LOCALIZAÇÃO “A questão da renda fundiária parecia fora de moda; porém, ela conserva sua importância. Ela se amplia mesmo, pois os terrenos disponíveis para a construção da cidade industrial, seus preços, a especulação que se apossa deles, são do domínio dessa teoria, aparentemente marginal em relação à do lucro e do salário” (Lefebvre, 2001a, p. 162)

Falar de terra como espaço para mim significa focar-se na questão da terra urbana, no qual caso não é mais relevante a capacidade da terra de produzir recursos naturais ou de ser cultivada, mas o que passa a ser central é o espaço em si, espaço disponível para ser construído ou espaço já construído. Entre outros autores, além de K.Polanyi, que falam da mercantilização da terra, podemos citar a esse proposito Henry Lefebvre e o seu pensamento crítico sobre a produção de espaço como novo objetivo do capitalismo financeiro. Lefebvre explica como acontece o envolvimento do espaço na reprodução social capitalista: o capital instrumentaliza o espaço, e, pelo meio da produção e consumo do urbano, assegura a reprodução das relações capitalistas. Assim a construção da cidade se concretiza na mercantilização das propriedades imobiliárias, ou seja, num processo de privatização do espaço, e mesclam-se os ganhos de exploração do trabalho com os ganhos de valorização, capitalização e especulação na instrumentalização do espaço. Dois conceitos que acho essenciais para entender esse processo de mercantilização da terra urbana são aquilo de renda imobiliar, e então o significado da palavra imóvel, e de preço ligado a localização, que vou portanto tentar de abordar. A definição mais básica de renda imobiliar é: a renda que deriva do dar a outros o respetivo de um direito real de aproveitamento (uso, habitação...) pelo meio do negócio jurídico da alienação. A renda decorre, portanto, do caráter exclusivo da propriedade imobiliária. É prerrogativa do proprietário exigir um pagamento daqueles que necessitam da terra para alguma atividade. Se o uso for temporário, o proprietário cede a terra em arrendamento pela sua exploração provisória, recebendo para isso a renda do seu arrendatário. Se o uso for definitivo ou exigir um longo período, o proprietário vende a terra, integralizando de vez toda a renda. Em ambos ocorre uma cobrança diante de um direito de uso futuro da propriedade, a renda se torna participação nos lucros que podem ser obtidos naquele imóvel. Assim podemos afirmar que, a propriedade imobiliária, através da renda, é expressão mais acabada do capital fictício. Desde o 1960/1970, a teoria da renda da terra (marxista, hoje reinterpretada em chave atual do David Harvey) com sua variante na teoria urbana, a renda do solo urbano, foi de grande importância para explicar a distribuição de investimentos ou mesmo os padrões espaciais e a divisão funcional de atividades nas cidades. Para explicar o conceito de renda imobiliária no campo urbano, temos também que sublinhar o caráter particular do que chamamos de imóveis: trata-se de mercadorias hibridas, sendo dadas de um produto construído, o edifício, que pode ser uma mercadoria produzida para venda ou não, e de um lote de terra sobre o qual a construção tive lugar, terra que como já lembramos várias vezes é uma mercadoria somente na nossa sociedade de mercado (mercadoria fictícia). Nesse contesto é fácil entender como o preço da terra, o aluguel, possa ser definido como a renda capitalizada obtida na melhor comercialização do imóvel, ou seja, o feito do terreno urbano ser edificável gera um aumento do seu valor de mercado, maior valor que se obtém pelo trabalho excedente no momento da construção do edifício (olhar parágrafo seguinte: valorização e

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capitalização). Na mesma maneira o valor de mercado dos edifícios é excessivo em respeito aos custos de construção porque há que se remunerar também a terra. Por essa valorização em excesso o campo imobiliário resulta desregulado. Também é coreto sublinhar que na verdade a mercantilização da terra é algo de diferente da mercantilização dos edifícios: a primeira é ligada ao ganho imobiliário rentista, algo de parecido aos juros de rendimento dos ativos financeiros, a segunda ao lucro do capital industrial do empresário de construção. Por isso a redução dos custos de produção do edifício não leva a redução do preço final da habitação, ao contrário usualmente um barateamento da construção tende a aumentar o custo da terra. Hoje em dia, um novo conceito que se faz estrada nesse campo complementado o conceito de renda imobiliar, é aquilo de preço do solo urbano como ligado a distribuição espacial da atividade humana e não somente preço como forma capitalizada da renda da terra. Assim o preço da terra seria concebido como a forma predominante em que o pagamento por localização se materializa no capitalismo contemporâneo. A localização de um imóvel depende menos de condições dadas, naturais, e mais dos investimentos públicos e privados em meios de transporte, acesso, desenvolvimento regional, oferta de serviços em sua vizinhança etc. Assim na verdade deveríamos falar de uma localização relativa, ou seja, que muda conforme o desenvolvimento dos vínculos entre a propriedade e seu entorno imediato, próximo ou mais distante. Em parte decorrente dos investimentos públicos em infraestrutura, a melhoria da localização pode resultar também de investimentos dos proprietários dos terrenos, reorganizando sua logística, melhorando a infraestrutura nas proximidades e investindo em meios de transporte mais rápidos e eficientes. Esse resultado é também o ponto de partida para uma investigação da organização espacial da produção capitalista em que terra, enquanto recurso natural, dá lugar à localização em um espaço socialmente produzido. Dessa maneira podemos afirmar que ‘Localização’ e ‘espaço’ só adquirem especificidade enquanto suporte às atividades econômicas. Vou concluir com uma citação do David Harvey, da sua obra Os Limites do Capital, que acho que bem resume todas a questões das quais tentei acima de falar, e numa maneira mais técnica:

’’A renda é a base do preço da terra e opera alocando capital e trabalho na terra, orienta a localização da produção, troca e consumo futuros, fixa a divisão geográfica do trabalho e a organização espacial da reprodução social. Isto se aplica unicamente na medida em que a terra se converte em uma forma pura de capital fictício. Os títulos de propriedade da terra devem ser trocados livremente como um bem financeiro puro. A renda é então assimilada a uma forma de juros que se identifica especialmente com os atributos da localização. ’’ Harvey

Valores do aluguel de um apartamento em vários bairros da zona oeste de São Paulo: relação preço da terra//localização (serviços e qualidade dos espaços urbanos)

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LOCALIZAÇÃO E ESPOLIAÇÃO Um conceito a base da compreensão dos mecanismos de mercantilização e financiarização da terra espaço urbana em relação a localização é aquilo de espoliação. Espoliação é literalmente um termo jurídico que define: um ato de privar alguém de algo que lhe pertence ou a que tem direito por meio de fraude ou violência; esbulho. Em setor urbano, podemos falar de espoliação referendo nos ao processo de elevação do preços e otimização da renda imobiliária, numa associação da atividade de construção e financeira na privatização dos espaços. Desde os anos 70 até hoje, o que aconteceu no regime do capital foi um aumento de poder do capital financeiro fictício, ligado ao preço da terra e a sua espoliação e uma paralela e interessante diminuição (o que não significa desaparição) da exploração do trabalho, que em vez apresentava-se como caractere típico do capitalismo ‘industrial’, no qual o elemento do trabalho era aquilo mais importante, rolo que hoje em dia recobre a terra. Podemos identificar 3 tipos de espoliação: - Urbana: é conexa ao feito que, hoje em dia um terreno para construir a própria moradia na cidade é muito caro para muitas pessoas, que resolvem ir mais longe da cidade para ter terreno livre, de graça, mas vivendo assim numa condição de ausência de equipamentos, de serviços, de espaços públicos, uma ausência de cidade. (Tema também conexo aquilo de segregação social). Sendo assim a espoliação urbana refere-se à ausência ou precariedade de serviços de consumo coletivo que, conjuntamente com o acesso à terra, se mostram socialmente necessários à reprodução urbana dos trabalhadores - Imobiliária: é conexa ao tema da verticalização dos prédios de apartamentos nos lugares centrais da cidade, com apartamentos chamados de cortiços, nos quais cada família ocupa somente um quarto (situação típica das megalópoles) e paga por isso um aluguel altíssimo, a fronte de uma situação de moradia muito precária, mas perto de todos os serviços e da vida urbana. - Financeira: es. Pagar um bem (que inclusive pode ser um imóvel) em maneira rateada, mas no final ter pagado muito mais do efetivo valor do bem. No campo mobiliar hoje a espoliação financeira está juntando-se com os outros dois tipos. NB: Hoje em dia está aumentando o número de pessoas que nem conseguem alugar um cortiço, nem autoconstruir uma casa na extrema periferia, então chegam a ser moradores da rua

Interior de um cortiço no centro de São Paulo: forma de espoliação imobiliária

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REPRODUÇÃO DO CAPITAL NO MEIO IMOBILIARIO URBANO A mercantilização da terra no setor urbano a leva essa a ter um preço, a renda capitalizada (e preço de localização), mas como a terra insere-se nos mecanismos de reprodução do capital, alimentando o crescimento do mercado autorregulado? Isso acontece, no caso da terra urbana, pelo meio de capitalização e especulação: -VALORIZAÇÃO: aumento de valor, e consequente aumento de preço, em função da exploração do trabalho: por exemplo o aumento de valor de um terreno depois que sobre disso foi construído um prédio -CAPITALIZAÇÃO: valorização hipotética, sem trabalho, mas em função de cálculos. No caso imobiliar tem a ver com a mercadoria da terra e o seu aumento de preço (renda) em função de um hipotético valor futuro. Ou seja, a terra vira a ser considerada como capital, como uma mercadoria não produzida, portanto, pode se definir como capital fictício, o qual é em função da utilização futura. Com efeito, na verdade quando se paga para acesso à terra, não se paga para a terra mesma, mas sim para a renda capitalizada territorial que essa vai dar. No caso urbano o preço que a demanda está disposta a pagar por terrenos com mais direitos de construir ou alternativas de uso mais amplas, aumenta se comparados a terrenos que não tenham tais prerrogativas uma vez que o produto que ali pode ser produzido poderá render ao produtor maiores lucros. Em outras palavras, um terreno no qual o maior e melhor uso permite ao comprador um leque de alternativas produtivas mais rentáveis terá uma demanda disposta a pagar um preço maior por seu uso e sua aquisição. (Referência ao parágrafo precedente e ao conceito de imóveis como mercadoria hibrida) -ESPECULAÇÃO: aumento de preço que depende da quantidade da mercê e do número dos compradores, então baseia se na relação domada oferta. Na medida em que a demanda por espaços para construção aumenta, os mais bem localizados atraem a maior parte deste aumento e seus preços tendem a subir. Em outras palavras, o crescimento espacial de uma cidade acentua as diferenças de distância entre os vários terrenos e sendo a preferência da demanda (demanda crescente) pelos mais bem localizados haverá um sobre preço em relação aos demais. Um erro muito comum que se faz é acreditar que a indústria da construção seja como uma indústria fabril, mas mais especulativa, o que não é verdade porque o valor do produto imobiliário é muito mais dependente do que não é capital (localização, relações sociais, transformações urbanas) que do que é capital.

FORMAS SOCIAIS DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO, MERCANTIS E NÃO MERCANTIS Mas todas as formas de construção e aproveitamento do solo urbano inserem-se nessa lógica de mercantilização da terra? O conceito de renda é sempre presente no ato de construir? A resposta é não, e por uma razão ligada a particularidade da indústria de canteiro, e então ao conceito de imóveis e de terra urbana. No caso da indústria da habitação, da construção temos que ter a mente que é preciso ir além da mera visão industrial fabril, que, não é tão importante como uma visão social. Ou seja, no enquanto na indústria normal temos um desenvolvimento meramente técnico e de racionalização dos processos, que conduz a uma eliminação das velhas tecnologias em favor das novas, que asseguram uma produção cada vez mais em grande escada e cada vez mais accessível, isso não acontece na construção porque o desenvolvimento dela baseia se no desenvolvimento da sociedade do ponto de vista social mesmo. Isso significa que, no caso da indústria da construção temos que começar a pensar duma maneira diferente, admitindo assim uma movimentação diferente do capital envolvido.

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Com efeito, a indústria da construção presenta um desenvolvimento social antes que técnico, para o qual não existe uma concorrência, isso ajuda a explicar o manter-se das de modalidade de produção do espaço urbano não mercantis fruto da autoconstrução e da apropriação do espaço sem ato de compra venda, então sem troca de capital, sem renda imobiliar e sem ativação do mercado, e a convivência dessas com modalidades de mercado e sob encomenda. Autor principal para citar a esse propósito é Jaramillo, nos cujos textos encontramos uma distinção, uma articulação das 4 principais e diferentes formas de produção do espaço urbano: 1) DOMESTICA ou não mercantil ou autoconstrução 2) POR ENCOMENDA (// prato a lá carte) 3) DE MERCADO (//prato feito) 4) ESTATISTA Observação de grande importância é o feito que a 1 e a 4 são sim formas de produção capitalistas, mas não instauram relações capitalistas de exploração do trabalho ou renda capitalizada, não tendo como objetivo a reprodução do capital. Assim podemos dizer que, no enquanto que a produção de mercado e por encomenda geram mais valia com um processo de valorização, capitalização e especulação e os terrenos envolvido nessas formas passam a presentar uma renda capitalizada, isso não acontece no caso da produção estatista e a doméstica, as quais com efeito não contribuem a produção de valor, mas sim de antivalor. O antivalor lembramos que é, todavia, essencial também nos mecanismos de mercado de hoje em dia porque, sem antivalor, não existiria o valor mesmo, por isso a produção doméstica e estatal são sim formas de produção capitalistas, se analisadas ao nível global, mas não creiam relações capitalistas ao nível local, o que de grande importância numa concepção de desmercantilização e luta a privatização da cidade. Por produção de anti valor podemos entender uma redução do custo de reprodução da mão de obra industrial. O que significa substancialmente que se reduz o custo de moradia dos trabalhadores. Assim a modalidade de construção doméstica produz antivalor sem capital, pelo meio do sob trabalho (que seria como um trabalho totalmente excedente), a estatista pelo meio da desvalorização do capital. A produção estatista existe não somente porque é uma modalidade pelo meio da qual se reduz o custo de reprodução da forca trabalho, mas também se reduz o custo de reprodução do capital mesmo. Em cada uma das formas de produção encontramos uma combinação dos conceitos de terra, trabalho e técnica, por exemplo no caso da produção doméstica o trabalho é feito pelo usuário, que é quem possui a terra, e as técnicas (na América do Sul), são usualmente taipa, pau a pique em âmbito rural e a alvenaria nas cidades; na produção sob encomenda, o trabalho é feito dá um empreendedor, a terra é do usuário e as técnicas podem ser várias, a segunda da vontade do usuário; na produção de mercado o que muda em respeito a aquela sob encomenda é a propriedade da terra que é do mercador, que também escolhe as técnicas; enfim na produção estatista o trabalho pode ser feito por ditas convencionadas e a propriedade da terra é do estado, ou seja publica . Analisando o desenvolvimento e a difusão na história das diferentes formas de produção do ambiente construído, podemos notar como, antes do XIX sec. não existia, no Brasil, outra forma de produção que aquela domestica não mercantilista, sendo que ainda não existia um mercado capitalista que envolvesse a terra. O desenvolvimento do mercado da terra e do capitalismo aconteceram depois da introdução da propriedade provada (particular) do solo, pelo meio das leis da terra em âmbito rural, e, com a passagem desde a questão rural até a questão urbana e todos os conseguintes problemas jurídicos, pelo meio do direito urbanístico (o que por exemplo em Salvador aconteceu somente no final do 1900!). A produção por encomenda na América Latina começou a ser importante só no XX sec., com o grande processo de transferimento das pessoas pelas cidades (Relação com trabalho escravo, e, com o acabar do escravismo, com a nova forca trabalho branca europeia imigrada, es. Italianos), mas ainda com um grande percentual de pessoas que auto constroem a casa deli.

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A produção de mercado por sua vez adquire importância com a verticalização das cidades, depois das guerras mundiais. Hoje em dia, na América Latina predomina ainda a produção doméstica e na Europa é em vez muito mais presente a estatista, no Brasil a produção estatista configura se como uma mistura de produção sob encomenda e real produção estatista. Nisso podemos ler uma diferencia presente entre o capitalismo europeu evolvido e o capitalismo menos evolvido do latino américa O objetivo dessa panorâmica sobre as formas sociais de produção do espaço urbano era mostrar como nas cidades permanecem fortes modalidades de usar a terra espaço que são aos limites do capitalismo, que fogem das logicas mercantis e nisso está uma grande potencialidade por um combate a mercantilização do espaço no âmbito duma luta social antiliberalista.

Habitações fruto do programa estadual minha casa minha vida: Produção estatista não mercantil

Habitações autoncstruidas: produção doméstica duma favela a São Paul

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DESIGUALIDADES E PRODUÇÃO NÃO MERCANTIL DO ESPAÇO URBANO NA LATINO AMERICA e EM SÃO PAULO HOJE Fazendo referência a quanto afirma o Pedro Pirez num suo texto do 2003 (La urbanización y la política de lós serviços urbanos em América Latina ), a urbanização da Latino America foi o resultado da incorporação das suas sociedades na divisão internacional do trabalho, coisa que causou uma transferência do excedente as economias centrais e uma subordinação a elas, frenando o desenvolvimento das forças produtivas e levando a uma incorporação muitas vezes precária das pessoas no mercado da força trabalho. No enquanto que terra, infraestruturas, serviços são incorporados a mercantilização universal e hegemônica do capitalismo, acontece que uma parte importante da população urbana não consegue o acesso a esse tipo de bem, por falta de recursos monetários suficientes. Consequência disso e dos processos de urbanização que seguem a lógica capitalista do ganho, foi o surgir no tempo do fenômeno, de grande importancia na latino américa, mas também em outros países em via de desenvolvimento, da urbanização popular. Definição poliédrica que inclui uma pluralidade de situações, in primis a autoconstrução de casas e inteiros bairros das cidades. Isso da lugar as assim chamadas cidades informais, nas quais hoje em dia vive cerca de lá metade de lá população nas grandes cidades da América latina. A produção informal de solo acessível aos grupos de baixa renda, por meio de ocupações, loteamentos irregulares, acontece usualmente na periferia, onde faltam infraestruturas básicas. Esse tipo de urbanização, é, portanto, precária, e somente depois o começo das ocupações acontece usualmente uma tentativa, igualmente popular, de construir os suportes urbanos. Hoje em dia, não tendo outras alternativas mais de 1 milhão de pessoas no mundo mora em habitações informais. Essa situação é aceitada hoje como normal, como algo de imutável na ordem socioeconômica global. Mas não é. Paralelamente aos bairros informais nas cidades podemos encontrar áreas ricas urbanizadas nas quais predominam a produção por mercado e encomenda, numa imagem do urbano que revela a sua poliedricidade e a riqueza de contrastes e desigualdades fortes e bem marcadas, como fruto de uma visão mercadorial do solo urbano e uma subordinação dos governos e dos órgãos direcionais urbanísticos as logicas das incorporadoras privadas e, mais em geral, do ganho e do liberalismo. Vou tomar como exemplo a cidade de São Paulo, a qual bem reflete as questões problemáticas consequência da visão da terra urbana como algo para desfrutar para produzir ganhos e para privatizar, com um ativo imobiliário, e ao mesmo tempo para fornecer um exemplo de quanto acima apresentado para a questão da urbanização popular. A visão mercadorial da terra fiz que o crescimento de São Paulo tivesse sido guiado mais das regras de especulação imobiliária que das regras da política pública urbana. O processo de reprodução da vida social ocorre na cidade de forma profundamente desigual, transformando-a no lugar da especulação financeira e capitalização imobiliária, com os bens comuns sujeitos às regras do mercado. As consequências perversas desse processo estão na precariedade das condições de moradia, no adensamento das periferias, na apropriação desigual do espaço, no desemprego estrutural, nas precárias relações de trabalho, na pobreza, na violência urbana que alimenta o medo e a insegurança e na devastação ambiental. Todo isso é claramente legível no aspecto físico da cidade: com efeito verificou se um duplo processo de desenvolvimento urbano, com uma forte verticalização do centro, do aspecto – americanização- e uma crescimento periférico horizontal, explicáveis sobre a base do valor da terra, maior nas áreas mais centrais e menor na periferia (logica da localização). Muitas vezes, para desfrutar ao máximo a possibilidade de ganho imobiliar, preferiu se demolir os prédios existentes e construir sobra, por isso o aspecto da cidade muda rapidamente e permanecem pouco signos do seu histórico. Por exemplo o governo até tentou de obstaculizar

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o processo de demolição das vilas da Avenida paulista, mas consegui preservar somente poucos palácios, como Casa das Rosas. Com efeito o que acontecia era que os proprietários, para esfugir as regras, demoliam as vilas na noite. Mas é de um ponto de vista social que as consequências do crescimento urbano incontrolado se revelam mais dramáticas: assistiu se a um fenômeno de segregação sócio espacial, para o qual periferia urbana é sinônimo de periferia social: quem mais pode em termos de possibilidades de compra, melhor se localiza em respeito aos serviços urbanos. Uma grande parte da população nem tem os meios suficientes para entrar no mercado oficial da terra e da habitação, e os governos nunca conseguiram dar respostas adequadas, sofrendo mais que guiando o crescimento da cidade. Assim, para muitas pessoas a única alternativa habitacional é na ilegalidade e fora do sistema de mercado, no se apropriar de uma porção de terreno e ali construir a própria casa: trata se de feito da já citada produção doméstica, em autoconstrução. Nasceu uma verdadeira cidade clandestina, que opõe se a cidade oficial e para a qual não existem serviços e direitos urbanos. As duas cidades estão uma do lado da outra, mas presentam aspectos contrastantes, de riqueza e pobreza, de relações mercantis e não mercantis, de legalidade e ilegalidade. O arranha céu dum lado e a alvenaria das favelas do outro. A cidade rica é mais conectada com as outras megalópoles que não com os próprios arredores pobres. A cidade informal é em vez fortemente legada a terra, porque existe uma luta cotidiana de pertença e ocupação do solo, não somente nos atos de construção da própria casa, mas também de urbanização informal pelo meio de criação de ruas. Uma cidade autoconstruída, autoprojetada e autopianificada e um eterno não acabado. Também as cores das construções revelam essa diferença: o cinza e o azul do concreto e dos vidros dos arranha céus, e do outro lado a cor vermelho tijolo das autoconstruções, que lembra a cor da terra. A São Paulo se calcula que a cidade não mercantil represente mais que o 60% do total construído, mais que o 10% dos habitantes mora em favelas. Nos últimos anos a situação, em vez de ser melhorada, parece ter ficado pior, com o recrudescimento de situações de expulsão de pessoas de suas moradias. Travestidas de desenvolvimento econômico, tanto a especulação imobiliária quanto a implantação de grandes empreendimentos urbanos que recriam a despossessão e perpetuam privilégios nos seus planos tecnocráticos, potencializam as violações dos direitos humanos, deslocando grupos vulneráveis e discriminados em razão da origem social e econômica para longe dos centros e de áreas valorizadas. As políticas de “higienização” ou gentrificação (14) (com a revitalização de bairros ou áreas da cidade valorizadas pelo capital) e a violência (com a criminalização dos movimentos sociais) empurram famílias e grupos sociais para as periferias urbanas cada vez com mais força. Falando em vez do extremo oposto de grande riqueza, segundo a mapa da desigualidade de SP do ano passado, no município 1% dos proprietários – 22.400 pessoas – concentra 25% de todos os imóveis registrados na cidade, o que significa 45% do valor imobiliário municipal – R$ 749 bilhões. Considerando somente estes dados, estes proprietários possuem, em imóveis urbanos, uma média de R$ 34 milhões por pessoa, em torno de 600 vezes a média nacional de distribuição de patrimônio

14. Trata se do processo que é a base do crescimento e enriquecimento de partes mais centrais da cidade, onde os moradores originais veem o aumento dos preços de aluguel a tal ponto da não conseguir mais morar ali, e outro fenômeno é aquilo dos cortiços, habitações coletivas em aluguel com cômodos muito pequenos e pessoas condensadas em espaços desumanos

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riqueza e pobreza, cinza e cores. São Paulo acima e Rio de Janeiro abaixo

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PRIVATIZAÇÃO DOS ESPAÇOS PUBLICOS URBANOS Existem outros problemas ligados a mercantilização do espaço urbano além dos processos de segregação sócio espacial e gentrificação, Harvey, no seu Social Justice and the city, critica a perversidade do processo da privatização dos espaços: com efeito é próprio na privatização cada vez maior e mais abrangente que reside a maior ameaça dos mecanismos de mercado, e assim o risco de aniquilar o homem, lembrando as afirmações do Polanyi. A propriedade privada é hoje em dia um sistema de medição do ser humano e uma extensão da personalidade. O confim entre o que uma pessoa chama de –mi mesmo- e o que ela chama de seu é difícil da definir. Tudo é objeto de privatizações, inclusive os espaços, os serviços os bens que usualmente somos costumados a considerar como públicos. O que está acontecendo, e isso não somente na brasil, mas em todo o mundo neoliberal, é uma liquidação do patrimônio público dos hospedais, das redes de socorro, da edilícia residencial publica, das escolas, dos aeroportos, até das áreas dos parques urbanos e dos centros históricos. Hoje em dia, quando se fala de revalorização de partes das cidades fala se com efeito de revalorização financeira, de venda a asta do espaço público. Chegamos ao paradoxo que cidade é em venda e faz vender, assim a inteireza da cidade vira a ser concebida como mercadoria, não é mais somente o singular lote de terra, mas todo o organismo urbano a se mercantilizar e virar uma enorme mercadoria. Com efeito realizou-se e ainda se está realizando ao redor do mundo, sem que as normas sobre os bens públicos fossem em grau de colocar obstáculos, a entrega a monopólios privados de atividades, lugares e serviços antes geridos do público. Pelo meio das privatizações realizou-se a transferência do que antes era de propriedade de todos os cidadãos pelo meio do estado, nas mãos de poucos privados, a vantagem dos ganhos e barganhas deles. Na Europa fenômeno comum a proposito é a submissão do patrimônio público histórico ao mercado, pelo meio da venda ao aluguel para eventos de edifícios e lugares históricos de grande importância para a memória e a população a empresas privadas, assim hoje por exemplo Palácio Itália a Roma, lembrança do período fascista, vira a ser Palácio Fendi, da famosa casa de moda. Também fruto desse tipo de políticas, em muitas cidades, o centro histórico vira a ser tratado como centro comercial, com uma sorta de privatização das praças públicas e uma deportação dos habitantes dos arredores em quarteirões dormitório na periferia (es Siracusa) e uma disneylandização dos centros.

A lado, estudo das privatizações no Brasil no 2018

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UMA NOVA MENTALIDADE PARA A

DESMERCANTILIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO

‘Declaramo-nos prontos a viver numa sociedade a qual escolha de permanecer abaixo da sua capacidade de produzir bens, velocidade, serviços e que prefira cultivar a arte de morar em amizade e cordialidade com a natureza. ’’ 4/5/92 INCAD international network for cultural alternatives to development. Introduzindo o tema da desmercantilização da terra como espaço urbano quero uma outra vez sublinhar, que, também nesse caso, e´ precisa uma mudança de paradigma cultural, ou seja enfrentar a situação do degrado urbano desde um ponto de vista ético e não somente econômico. Existe uma clara necessidade de reimpuser um controle social ao mercado com um outro contramovimento no estilo daqueles descritos do Polanyi que se afirmaram depois do 1860. E ‘preciso desmercantilizar as relações sociais e redescobrir o lado social de cada atividade, assim como o valorizar os bens e espaços públicos e protege-los da privatização. As cidades deveriam ser o lugar de todos, é hoje é super importante garantir uma maior justiça social também porque o rolo das metrópole na vida da espécie humana é hoje em dia central: no mundo já foi superada a percentagem do 50% de pessoas que moram em cidades, e até o 2050 vamos chegar ao 66% de população urbana. No Brasil as áreas consideradas urbanas no Brasil representam menos de 1% do território nacional (0,63%) e concentram 160 milhões de pessoas, ou seja, 84,3% da população brasileira. Fica então claro o papel primário que as metrópoles vão jogar no futuro da humanidade.

“Nosso grande desafio no planejamento urbano, não só em São Paulo, mas

em toda cidade brasileira, é desmercantilizar a terra urbana”

Nakano, diretor do Departamento de Urbanismo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano.

Mas como fazer isso? A temática apresenta-se talvez ainda mais complicada da tarefa de desmercantilização da natureza, sendo que inclui a questão da vida e moradia da maioria das pessoas do planeta. A via está hoje aberta a caminhos emancipatórios de contraposição a ideia de mercado como orientação única na produção do espaço imobiliário. Todavia é muito difícil pensar no concreto a como isso poderia ser feito, uma ideia seria aquela de seguir caminhos emancipatórios para os movimentos sociais que lutam para o direito a moradia, contra as remoções, para o direito a cidade para todos. Ou seja, ativar um novo contramovimento antiliberalista, ou melhor, anti aniquilamento dos homens, partendo com efeito daquelos lugares nas cidades onde as consequências da privatização, do aumento dos preços dos imóveis como consequência de exploração e espoliação (e também especulação), mais em breve, da mercantilização da terra como espaço, são mais graves, conduzindo milhões de famílias a uma vida às margens da sociedade de mercado. Isso pode ser o começo do re-nascimento de uma sociedade não somente mercantil,

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sendo que é agora já bem claro que a sociedade de mercado, impietosamente, não va garantir uma sobrevivência dignitosa para todos nos. Vou propuser aqui dois pontos de vista, dos olhares que acho van ter que, em alguma maneira que não sei hoje dizer, se unir na luta democrática e antiliberalista. Então dum lado vou falar da questão dos processos de urbanização popular como possível caminho para a desmercantilização dos terrenos urbanos e na criação de relações de trocas não mercantis. Ou seja, a construção domestica como forma de luta social popular anticapitalista. Mas do outro lado vou falar do papel do estado, da importância das funções legislativas e dos órgãos de planejamento urbano, assim como das associações populares, citando os conceitos chave de direito a cidade (fazendo referência ao Estatuto das cidades brasileiras), de função social da terra e desabsolutização da propriedade. Lembrando sempre que trata se de ações e iniciativas que não podem acontecer sem uma paralela desmercantilização dos homens e das relações humanas.

URBANIZAÇÃO POPULAR E LUTA A MERCANTILIZAÇÃO DA TERRA ‘’A partir dessa persistência de relações não mercantis e no imediato não capitalistas, se abriria uma brecha para a superação das relações capitalistas. ’’ Paulo Xavier A habitação é hoje em dia o epicentro de todas as exclusões e, portanto, é preciso começar da essa para reavaliar o viver urbano. Com a base das ideias polanyianas podemos afirmar que a imposição da economia de mercado, e a consequente privatização do solo urbano, é o real fundamento da atual problemática habitacional nas megalópoles do mundo todo, assim a questão fundiária é o cerne da produção do espaço desigual das cidades brasileiras. Um bom ponto de partida no pensamento sobre a desmercantilização é a produção doméstica ou autoconstrução, porque como afirmamos configura-se como algo fora dos mecanismos de produção capitalista de mais valia: ou seja, a construção domestica é já um ato de desmercantilização porque representa a persistência de relações não capitalistas na produção da cidade, diferentes das produções imobiliária com objetivo de ganho.

‘’Los procesos de urbanización popular tienen una significación desmercantilizadora de los bienes urbanos, permitiendo su acceso sin la necesidad de contar con los recursos monetarios que exige el mercado formal.’’ Pedro Pirez ‘’O universo da moradia precária é estratégico para denunciar o conjunto da produção da cidade no capitalismo periférico e por meio dele denunciar também as especificidades do processo de acumulação. ’’ Maricato, 2011 A cidade informal é caracterizada para uma situação de ilegalidade fundiária e urbanística, além duma precariedade da edilícia e do urbanismo. O feito das favelas ser fruto duma apropriação da terra, que seja privada ou publica, de maneira não mercantil leva nós a afirmar que essas são parte dum processo de desmercantilização social, as fronteiras com o capital. O princípio da desmercantilização social baseia-se na existencia duma importante porção da superficie da cidade urbanizada fora do mercado e do estado. Nas cidades informais, nas quais o valor de troca não é assim importante como o valor de uso, acontece um fenômeno de primaria importância de sobrevivência, ou melhor, de ressignificação de formas preexistentes não mercantis de apropriação da terra e produção de moradia, formas costumeiras pautadas em relações sociais que não tinham como objetivo a produção de mais valia. Assim nesses espaços surgem de novo as relações sociais que Polanyi tinha descrito como típicas das sociedades não de mercado, relações de reciprocidade, solidariedade, com redes

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sociais pautadas na confiança e lealdade, e uma externalidade comunitária representada das relações de dom e contra dom. Além disso está a questão mais concreta de como a apropriação dos terrenos privados para a produção não mercantil, não somente significa um não inserir-se desse tipo de construção no mercado (todo o trabalho de construção doméstica é trabalho excedente não remunerado, e sem objetivo de lucro), mas que mesmo a terra ocupada sai dessa maneira do controle da capitalização porque fica impossível para os proprietários originais vede-la e comercializa-la: é então supresso o ganho pelo meio da renda. Também dessa maneira assicura-se a impossibilidade do uso da terra como reserva de valor para venda futura (ou seja se va a constrastar ou entresouramento do capital no meio urbano). As terras sujeitas a apropriação coletiva então são terras retiradas do circuito de acumulação do capital, da possibilidade de funcionar como valor de troca. Isso é exatamente o que aconteceu no caso da favela de paraisopolis em São Paulo, instalada em lotes de propriedade privada que agora foram perdidos dos proprietários. Outro elemento sobre o qual queria focar a atenção é o feito que a presença de insediamentos informais interfire mesmo na formação do preço dos terrenos ao redor deles, sendo que hoje em dia vale o já explicado principio do preço como espelho da localização, e que a presença duma favela é sempre sinônimo de pobreza, miséria, marginalidade. Todavia isso não significa que é bom incentivar a apropriação de terrenos e a construção de favelas, porque tem o lado ao reves da medalha: a cidade informal no final nutre a cidade formal pelo meio do fernecimento de manodobra a baixo custo e com baixo custo de reprodução, é exatamente um espelho da situação do capitalismo primordial na europa, onde, nas cidades industriais nascentes, a classe dos trabalhadores acabava morando em situações de favela. Mais simplesmente, é bom lembrar que, a produção de não valor é sempre parte da produção de valor. Outro ponto critico é que, acontece não poucas vezes, que as ocupações são feitas sobre terenos públicos, que podem ter sido em vez destinados a criação de parques, de equipamentos. Nesse caso não existe nenhum fenomeno de desmercantilização, somente uma troca de função. Eu personalmente acho que, uma via para a desmercantilização social esta sim nesses lugares, mas no sentido que temos que tomar ato que não é possivel continuar dessa maneira na gestão da propriedade das terras, as favelas devem ser um imput para reacordar as cosciencias e lembrar nos as relações não mercantis que podem voltar a ser parte do fundamento da sociedade.

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DESMERCANITLIZAÇÃO ESTATAL 1// ESTATUTO DA CIDADE Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: (...) IIi – Gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais CONCIDADES/ Ministério das Cidades 2009

Vou abordar agora a temática da desmercantilização da terra pelo meio da ação política, sendo que acho importante enfatizar o rolo essencial dos arranjos institucionais, considerando não somente os direitos e garantias, mas, sobretudo, o entrelaçamento do Estado com o mercado e a família na provisão de políticas sociais, que podem contribuir a uma ação de desmercantilização social estatal. Antes que tudo vou lembrar um princípio importante, aquilo do welfare state ou estado de bemestar social, no qual, na minha ideia, tem que se basear essa onda de desmercantilização. Esplico melhor: para welfare state entede-se a condição, típica dos modernos estados de direito baseados na igualdade. Do conceito de estado de bem-estar social deriva a tentativa de reduzir as desigualdades econômicas, e fornecer, a todos, assistência sanitária, publica instrução, previdência social, acesso aos recursos culturais, defesa do meio ambiente. Esse tipo de serviços é errogado pelo meio de contas públicas que derivam da extraída dos impostos (que deveria ser proporcional ao redito), e a subsequente redistribuição de parte da mais valia. No âmbito do welfare state brasileiro, um papel importante é a meu aviso recoberto do Estatuto das cidades, que é um instrumento com potenciais muito grandes para implementar os Planos diretores numa ótica de desmercantilização e democratização socioespacial das metrópoles do Brasil, porem hoje em dia ainda poucos instrumentos dos Planos Diretores foram efetivamente implementados. O Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001) estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bemestar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. O desafio desse instrumento legislativo é promover a regularização fundiária das áreas informais, garantir investimentos públicos onde eles não existem, universalizar o acesso à moradia, criar restrições à especulação imobiliária para que a moradia seja usada como um bem fundamental à existência humana etc. Os Planos Diretores têm instrumentos para isso, por exemplo; mas o que se verifica é que eles se tornaram, mais uma vez, leis que não saíram do papel: um bom objetivo para os anos futuros seria com efeito de render efetivos esse tipo de princípio. Efetivamente nos Planos Diretores foram aplicados apenas naquilo que diz respeito aos interesses do mercado. Em geral os agentes imobiliários conseguiram aprovar índices mais elevados nas áreas de seus interesses, e em muitas cidades o principal instrumento que está sendo utilizado é a operação urbana, que promove a parceria do poder público com o setor privado. E ‘preciso romper com essa lógica e transformar o planejamento num processo vivo e

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politizado no bom sentido da palavra, para que os sujeitos das cidades se reconheçam e possam pensar seus antagonismos. No Estatuto da metrópole está descrito o conceito essencial de direito a cidade, no art. 2 incisos I e II. O direito a cidades é compreendido como:

“O direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações” (art. 2o , inciso I) Pode-se dizer, então, que o direito à cidade é um direito difuso e coletivo, de natureza indivisível, de que são titulares todos os habitantes da cidade, das gerações presentes e futuras. É o direito de habitar, usar e participar da produção de cidades justas, inclusivas, democráticas e sustentáveis. A interpretação do direito à cidade deve ocorrer à luz da garantia e da promoção dos direitos humanos, compreendendo os direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais reconhecidos internacionalmente a todos. O Estatuto da Cidade, mais no concreto, criou diversos institutos jurídicos e políticos, visando combater processos promotores das desigualdades urbanas, como parcelamento, edificação e utilização compulsórios. São esses institutos: o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) progressivo no tempo (15) com desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública; o direito de preempção (16); o direito de superfície (17); a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso (18); a transferência do direito de construir. O direito à cidade, além da sua proteção no Estatuto da Cidade, tem referência em documentos produzidos em fóruns internacionais da sociedade, como a Carta Mundial pelo Direito à Cidade (Fórum Social Mundial Policêntrico, 2006), a Carta-Agenda pelos Direitos Humanos nas Cidades (CGLU-2009), a Carta da Cidade do México pelo Direito à Cidade (2009), a Carta do Rio de Janeiro sobre o Direito à Cidade (2010), entre outros. O direito à cidade foi abordado em documentos técnicos para fundamentar a Nova Agenda Urbana (NAU) para a Conferência Habitat III, como elemento da Policy Unit I. Concluindo essas considerações, como a aplicação do direito a cidade e do estatuto das metrópoles ajudaria na desmercantilização? Colocando o interesse público antes do privado, os precisos da sociedade antes daqueles do mercado, o bem-estar das pessoas mais pobres antes do enriquecimento ao infinito dos mais ricos. Ajuda a entender que as cidades são um bem comum e devem ser livres de discriminação, mas, repito, é precisa uma atuação pratica dessas ideias, sendo que hoje em dia:

‘’No Brasil, o reconhecimento legal e institucional do direito à cidade contrasta com a realidade urbana cotidiana de negação de direitos; em especial, aos “invisíveis” ao processo de planejamento e produção do espaço urbano. Fatores como gênero, raça, idade, etnicidade e renda distribuem desigualmente os ônus e os benefícios da urbanização entre os indivíduos no território’’ (Gorsdorf et al., 2016). 15. A Emenda Constitucional 29/2000 estipulou que o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana teria características de progressão ("IPTU Progressivo"), determinando que o imposto poderá: I – Ser progressivo em razão do valor do imóvel; e II – Ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. 16. Direito de preempção é a preferência que tem o Poder Público municipal para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares. 17. O Direito de Superfície é uma concessão atribuída pelo proprietário do terreno a outrem, para construção e utilização durante certo tempo, salvo para realização de obra no subsolo a não ser que inerente ao objeto da concessão, que pode ser gratuita, ou mediante pagamento de valor fixo à vista ou parcelado. 18. A Outorga Onerosa do Direito de Construir, também conhecida como “solo criado”, refere-se à concessão emitida pelo Município para que o proprietário de um imóvel edifique acima do limite estabelecido pelo coeficiente de aproveitamento básico, mediante contrapartida financeira a ser prestada pelo beneficiário.

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DESMERCANITLIZAÇÃO ESTATAL 2// FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE ‘’Sem dúvida, a propriedade não é sagrada, como afirmava a Declaração de 1789. É um direito fundamental que não está acima nem abaixo dos demais. Deve, como os demais, sujeitar-se às limitações exigidas pelo bem comum. Pode ser perdida em favor do Estado quando o interesse público o reclamar, como a vida tem de ser sacrificada quando a salvação da pátria o impõe. Pode ser recusada quanto a certos bens cujo uso deva ser deixado a todos, quando a exploração deles não convém que se faça conforme a vontade de um ou de alguns cidadãos’’. Manoel Gonçalves Ferreira Filho Um outro conceito de qual hoje esta se falando bastante, e que é estritamente conectado com a questão do direto a cidade é aquilo de função social da propriedade, que por sua vez é ligado também ao conceito de desabsolutização da propriedade privada dos imóveis em ato nos últimos anos. Antes que tudo vou lembrar que a propriedade privada é o elemento a base da gestão mercadorial da terra, então, um ataque a essa significa uma barreira ao avanço do mercado autorregulado e um passo no sentido da desmercantilização. A propriedade privada, desde o seu surgimento, que lembro, aconteceu muito recentemente duma maneira legalmente regulada na America Latina portuguêsa, constantemente foi objeto de tensões sociais e econômicas, sendo fonte geradora de conflitos entre as pessoas, bem como entre estas e o Estado, de sorte que o direito sempre buscou meios para defendê-la e pacificála. Até alcançar o conteúdo atualmente vigente no atual ordenamento jurídico brasileiro, a propriedade passou por profundas transformações, sofrendo a influência direta do regime econômico e das forças políticas dominantes para a sua conformação. Falar de função social da propriedade é uma mudança de paradigma, desde a propriedade no seu caráter eminentemente individualista e absoluto típicos das concepções liberais, a um novo ponto de vista que a concebe como embutida de um vetor socioeconômico, caracterizado pelo aponto do cumprimento de uma função social legitimadora do título dominial. Com efeito, a constituição da República no Brasil assegura o direito de propriedade, contudo, estabelece, ao mesmo tempo, o cumprimento de sua função social como requisito básico. Em outras palavras, as faculdades de usar, gozar, dispor e reaver a coisa conferidas ao seu proprietário só têm validade se este atribuir uma destinação útil ao bem, corporificada, por exemplo, no seu uso como habitação, ou ainda na concretização de investimentos de caráter produtivo ou cultural. Em uma realidade na qual milhares de pessoas não dispõem de uma porção de terra para viver com dignidade ou mesmo extrair o seu sustento, é inconcebível a proteção sem nenhuma utilidade. No regramento da propriedade urbana, a Constituição preceitua cumprida a sua função social quando satisfeitas as exigências fundamentais de ordenação da sociedade expressas no plano diretor (artigo 182, § 2º). Plano diretor que por sua vez deveria basear-se no Estatuto das cidades e então na garantia do direito a cidade para todos. O exemplo talvez mais significativo de como a propriedade privada é hoje em dia maiormente limitada do poder público é a desapropriação. Trata-se do procedimento através do qual o Poder Público compulsoriamente despoja alguém de uma propriedade e a adquire, mediante indenização, fundada no interesse público, afetando assim o caráter perpétuo atribuído à propriedade.

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CONCLUSÕES

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A modernidade hoje dominante é aquela que vê no dinamismo internacional e cosmopolita do capital privado a sua anima, na qual a política é utilizada para atirar investimentos e o individualismo é imperante,

Hoje estamos caminhando com efeito na rua do esgotamento do mundo moderno causado do economicismo mercantilista e dos limites humanos da economia de mercado capitalista: esterilização, aniquilamento, normalização dos homens, destruição da natureza.

A única maneira para pensar o futuro é se opuser, se subtrair a interiorização obsessiva do primado da economia, indo na direção duma cultura postutilitarista e post economicista.

Temos hoje em dia tentar cada um de desmercantilizar a nossa existência aplicando o princípio do antiutilitarismo e voltando a experiência de troca não mercantil, que dá vida a elementos imprevisíveis para o mercado, imprevisíveis porque tipicamente humanos e não baseados na lógica do mero ganho.

Temos que parar nessa corsa fole ao consumo, para evitar a destruição do nosso ambiente e uma degeneração das nossas cidades em lugares de guerra entre classes sociais.

O que se está demandando é uma nova criação, que coloque ao centro da vida humana outras significações em respeito à expansão de produção e consumo.

Deveríamos querer uma sociedade na qual os valores econômicos parem de ser centrais, na qual a economia volte a ocupar o lugar de simples meio na vida e não de fim último.

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BIBLIOGRAFIA E SITOGRAFIA essenciais

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Polanyi, Karl. A grande transformação. Rio de Janeiro: Campus, 1980. Polanyi, Karl. A nossa obsoleta mentalidade mercantil

Polanyi, Karl. On belief in economic determinism In: The Sociological Rewiew, vol. XXXIX, 1947, p. 96-102. Armando de Melo Lisboa. A atualidade de Karl Polanyi para a reconstrução do pensamento

econômico

Arnault Skornicki. La société contre le marché. Un inédit de Polanyi laviedesidees.fr Pereira, Paulo Cesar Xavier. Mercantilização da terra e do trabalho. Um problema insolúvel?

Nuno Miguel Cardoso Machado- Mestrado em Sociologia Económica e das Organizações.

Sociedade vs. Mercado – Notas Sobre o Pensamento Económico de Karl Polanyi Stefano Di Ludovico. Karl Polanyi: l'attualità di un economista inattuale

Camila Rodrigues Aldigueri, Metamorfose da terra na reprodução da cidade e da favela em

Fortaleza (tese usp)

https://www.ilsaggiatore.com/rassegna/repubblica-e-sole-24-ore-karl-polany-e-il-suosaggio-per-un-nuovo-occidente/ https://hal.archives-ouvertes.fr/hal-00743274/file/05-Attualita-di-Karl-Polanyi.pdf https://reporterbrasil.org.br/2014/08/reporter-brasil-reune-especialistas-para-debate-sobrea-privatizacao-do-espaco-publico/ http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/caracteriza%C3%A7%C3%A3o-dafun%C3%A7%C3%A3o-social-da-propriedade-urbana https://br.boell.org/pt-br/2015/08/22/financeirizacao-da-natureza-na-america-latina-etema-de-conferencia-na-amazonia

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