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jornal do commercio 3

Recife I 12 de novembro de 2014 I quarta-feira

cidades

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Frente para barrar epidemias SAÚDE Recife tem 17 bairros com alto risco de surto de dengue. Esses locais também estão mais vulneráveis à febre chicungunha

q Mais na web Vídeo com Jailson Correia em www.jconline.com.br/cidades

Fotos: Hélia Scheppa/JC Imagem

O berço do Aedes também é no lixo

Sérgio Bernardo/JC Imagem

A ameaça da febre chicungunha, transmitida por mosquitos transmissores da dengue, vai exigir dos pernambucanos mais educação ambiental diante das dificuldades ainda reais de abastecimento d’água e furos nas ações municipais de controle de insetos e limpeza urbana. O lixo é adequado à formação de criadouros. Disperso no quintal ou na rua, pode juntar água e ajudar a proliferar o Aedes. “Tanques e baldes já são focos naturais, em razão da intermitência de água, como a causada pela seca no Sertão ou problemas de abastecimento na região metropolitana. Mas os resíduos sólidos reforçam o problema, aumentando os riscos”, alerta Claudenice Pontes, coordenadora do Combate à dengue e chicungunha em Pernambuco. Um estudo feito este ano pelo Estado apontou que ao menos 20% das prefeituras tinham déficit no número de agentes de endemias. Um caso de chicungunha importado da República Dominicana foi confirmado mês passado, no Estado. Por enquanto, não há transmissão local da nova doença. Todos os 11 suspeitos registrados neste segundo semestre foram descartados por exames feitos no Laboratório de Saúde Pública (Lacen), embora os pacientes devam ser acompa-

nhados por mais seis meses. Mas o risco de a doença se instalar é real. No Brasil o Ministério da Saúde já contabilizou mais de 800 casos em três diferentes regiões, inclusive no Nordeste (Bahia). “Eu faço a minha parte. Deixo tudo limpo. Reclamo quando deixam lixo na rua”, conta a dona de casa Gretchen Rodrigues, 62 anos. Ela mora na Rua Frei Cassimiro e não se conforma quando pessoas do bairro deixam sacos de lixo no canteiro nos dias em que não há coleta. No Recife são coletadas por dia 2,5 toneladas de lixo e o que as equipes mais encontram são garrafas pet vazias, justamente as que podem acumular água e virar foco do Aedes aegypti. “Além do lixo, há quem junte entulhos no quintal, como restos de telhas e madeira e eletrodomésticos sem uso. Sem proteção, transformam-se em criadouros na primeira chuva”, avalia Eudes Coutinho, coordenador do Centro de Vigilância Ambiental de Olinda, onde a estratégia para baixar a infestação dos imóveis para menos de 2% tem sido a ação integrada da saúde com a limpeza urbana. Para quem guarda entulhos no quintal, ele recomenda o uso de uma lona com declive, para evitar que a água da chuva fique empoçada.

entrevista k Leda Regis

FOCOS Na Rua Frei Cassimiro, Santo Amaro, há quem jogue lixo no canteiro depois da coleta. Em Olinda, agentes de endemias borrifam veneno em pontos estratégicos e encontram entulhos em quintais, que acumulam água da chuva. Gretchen mantém casa limpa para afastar mosquito

“Os mosquitos se adaptaram às casas” A bióloga Leda Regis, da UFPE e pesquisadora da Fiocruz aposentada, acompanhou nos últimos 30 anos o comportamento dos vetores da dengue. Afirma que a chicungunha era previsível e que os mosquitos estão cada vez mais robustos JC – Por que os Aedes aegypti e albopictus não nos deixam? LEDA REGIS – Eles têm aparência frágil e, de fato, para matar um mosquito que ameaça beber nosso sangue basta ser rápido e atingi-lo com a palma da mão. Mas constituem populações robustas. Têm alta capacidade reprodutiva, ovos com casca protetora, ciclo de vida rápido e se estabelecem nos ambientes urbanos, espalhando ovos em locais difíceis de serem encontrados. Após milhões de anos de evolução estão adaptados às condições ambientais da casa humana. Sequer foram abalados depois de quase duas décadas de combate contínuo, com grandes contingentes de trabalhadores e toneladas de larvicidas no País. JC – A população e os gestores podem ajudar? LEDA – Medidas necessárias parecem evidentes: atualização dos métodos de monito-

Divulgação

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ezessete dos 94 bairros do Recife apresentam risco muito alto de desenvolver epidemia de dengue entre o final de 2014 e início de 2015. Por extensão, estão mais vulneráveis à transmissão também de chicungunha, doença que só atingiu comprovadamente um morador até o momento, infectado fora do País, na República Dominicana. No território crítico, distribuído entre o Norte, Sul e Oeste da cidade, mais de 3,9% dos imóveis estão infestados pelo Aedes aegypti. Nele há bairros populosos, como Nova Descoberta, Vasco da Gama, Cohab e Jordão. O perigo, na verdade, estende-se à maioria da cidade, mas numa intensidade menor em outros locais. O mapa de risco por distrito sanitário e bairro foi divulgado na tarde de ontem pela Secretaria Municipal de Saúde, durante apresentação do Plano de Contingência e Enfrentamento à Dengue e Chicungunha. Recife está entre as capitais brasileiras consideradas em estado de alerta para a dengue, conforme o Ministério da Saúde. Em média, 2,3% dos prédios da cidade têm foco do mosquito transmissor. O mapa de infestação piorou nos últimos meses e a alternância entre sol e chuva pode favorecer a proliferação de mosquitos capazes de transmitir as duas doenças. Desde o início do ano foram 2.249 casos suspeitos de dengue, confirmando 490, dos quais seis acabaram em morte. O número é menor que o do mesmo período de 2013, quando 1.208 pessoas tiveram a doença comprovada. Neste semestre, a capital notificou quatro suspeitas de chicungunha, mas só uma foi confirmada, a de um morador de Santo Amaro que foi infectado na República Dominicana e apresentou sintomas durante visita ao Ceará. Não há ainda transmissão do novo vírus na cidade. Um segundo suposto caso, também de Santo Amaro, foi descartado e outras duas suspeitas, de pessoas que residem na Várzea, estão em investigação, embora os primeiros testes tenham resultado negativo. Na primeira quinzena de dezembro, as regiões com maior risco de transmissão das duas doenças receberão ações mais intensivas dos 943 agentes de saúde ambiental e atividades integradas com a limpeza urbana, informou o secretário de Saúde, Jailson Correia. Por enquanto, não haverá ampliação do orçamento nem novas contratações de agentes. Segundo o secretário, convocações do último concurso foram além do número inicialmente definido. Estão programadas a distribuição de 25 mil telas para proteção de caixas d’água, além das 70 mil entregues este ano, e produção de cartilhas educativas. “É fundamental a participação da comunidade nessa batalha contra a dengue. Ela deve ajudar mantendo os reservatórios d’água tampados e não deixando lixo exposto”, enfatizou Correia. Pessoas com febre acima de 38,5 graus, dores nas articulações e manchas vermelhas na pele devem procurar o serviço de saúde mais perto de casa, como unidades de Saúde da Família, Upinhas e Upas. Equipes serão treinadas para o diagnóstico de chicungunha, muito parecida com a dengue.

ramento e de combate aos mosquitos, incorporando avanços científicos; maior ênfase à necessidade da proteção individual (roupas adequadas, repelentes, janelas teladas, ar condicionado, etc) em áreas de risco e sobretudo das pessoas infectadas, principalmente nos 4 ou 5 dias após o aparecimento dos sintomas. É uma ação de responsabilidade social visto que os vírus chicungunha e dengue se multiplicam nas pessoas infectadas, que se tornam fontes de disseminação ao serem expostas às picadas de mosquitos. E, finalmente, a medida mais eficaz, a vacinação. JC – Em algum momento se pensou na nova doença? LEDA – O vírus chicungunha foi isolado em 1953 na Tanzânia (África) e acreditase que circulava em ciclos endêmicos há séculos. Em 2004, expandiu-se a transmissão para a Ásia, ilhas do Pacífico e Índico. Em 2007, foi registrada transmissão na Itália, iniciando a circulação no Sul da Europa. Em 2013, chegou ao Caribe e agora nas Américas, incluindo o Brasil.


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