Hapvida jc 20 01 2015

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jornal do commercio 5

Recife I 20 de janeiro de 2015 I terça-feira

cidades

Fotos: Edmar Melo/JC Imagem

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REDE LOTADA No Imip, chegam a todo momento gestantes de outras cidades e há até fila na porta

A dor do parto está mais longa Na última semana, o secretário estadual de Saúde, José Iran Costa Júnior, montou um comitê, com técnicos da secretaria, para agilizar um diagnóstico e apontar soluções rápidas para melhorar a assistência ao parto. Como há contingências nos orçamentos estadual e federal para este ano, o desafio é identificar alternativas que, segundo ele, possibilitem “gastar melhor” o dinheiro do SUS. “A saúde materna é uma prioridade do governo estadual, tanto que dos seis novos hospitais previstos por essa gestão, quatro são voltados à mulher”, garante o secretário, no cargo desde o dia 2. A curto prazo, explica, o objetivo é fazer convênios e ajustar as maternidades para diluir a demanda. A médio e longo estão a regulação dos serviços e a construção de novas maternidades, já planejadas e parte com construção iniciada no governo anterior, do mesmo partido (PSB). Se ouvir o movimento de mulheres nessa fase de diagnóstico e busca de soluções rápidas, José Iran receberá considerações mais focadas na forma de planejar e executar a assistência. “A situação continua a mesma, pois o modelo de atenção centrado no médico (onde não tem médico suficiente, pediatra e anestesista) ainda é o vigente!”, alerta Sandra Valongueiro, da coordenação do Comitê de Estudos da Mortalidade Materna. Para ela, os investimentos em melhoria “estão focados em estrutura física e muitos de forma inadequada, sem obedecer espaço para acompanhantes e com pouco investimento em pessoal”. Paula Viana, da ONG Grupo Curumim, cobra mais rigor na supervisão dos profissionais. “A maioria dos médicos, por exemplo, trabalha sem respeitar os protocolos do Ministério da Saúde. Não há supervisão, controle ou acompanhamento do desempenho profissional da rede publica e privada. Cada um que chegue no plantão e faça da sua cabeça”, afirma.

Fiz pré-natal no Imip e quando voltei à emergência pela terceira vez, já parindo, não havia vaga, só consegui o leito depois que o bebê nasceu”, contou Inaílda Tavares

Veronica Almeida valmeida@jc.com.br

A

dona de casa Inaílda Tavares, 42 anos, moradora de Águas Compridas, em Olinda, grávida do quarto filho, precisou se deslocar ao Recife para cumprir pré-natal de alto risco e buscar a emergência, como fez semana passada, quando começou a perder líquido amniótico. Acabou parindo na triagem do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), nos Coelhos, e só seis horas depois conseguiu um leito. A transformação da Maternidade Brites de Albuquerque, na sua cidade, em serviço de alto risco, anunciada há quase dois anos e que evitaria o deslocamento, ainda é uma obra em fase inicial. Os trabalhos começaram em meados de 2014 e dificilmente ficarão prontos este ano, como chegou a ser previsto. Para piorar, a rede de assistência, que já não dava conta do serviço, nos últimos dois meses ficou mais restrita com o fechamento da maternidade do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco, e de mais duas menores, em Camaragibe e em Moreno, no Grande Recife. Diante dos problemas, o Comitê Estadual de Mortalidade Materna, fórum com participação do movimento de mulheres e profissionais de saúde, solicitou audiência com o secretário estadual de Saúde, José Iran Costa Júnior, no cargo há pouco mais de 15 dias. Sandra Valongueiro, da coordenação do comitê, afirma que o objetivo é construir parceria para reduzir a mortalidade materna, ainda alta, alimentada pelas deficiências do sistema. São cerca de 70 mortes anuais por cada 100 mil nascidos vivos. A Secretaria Estadual de Saúde não revela quantos leitos foram fechados recentemente, mas o Conselho Regional de Medicina e o Sindicato dos Médicos informam que ao mesmo tempo em que o Hospital Regional de Vitória, na Mata Sul, ganhou uma maternidade para partos complexos e um serviço conveniado, no Recife, passou a reforçar a rede, escalas foram sendo desfalcadas em outros serviços, estaduais e municipais. Dirigentes, médicos e enfermeiros de grandes maternidades confirmam o caos instalado nos últimos dias. “A crise é perene, a superlotação das grandes maternidades de alto risco, no Recife, passou dos 200%, algumas chegam a ter ocupação

quatro vezes maior em determinados dias. As mulheres estão amontoadas. É triste a situação”, descreve, emocionada, Cláudia Beatriz, obstetra e dirigente do Sindicato dos Médicos. Ela se queixa da falta de uma política de Estado. “Os novos serviços só enxugam gelo, não existe organização da rede por território e as escalas dos hospitais regionais não estão completas nos sete dias da semana”, denuncia. “O Mãe Coruja (programa estadual) e a Rede Cegonha (federal) funcionam mais no papel”, critica. Assim como Inaílda, que, sofrendo dores, ficou esta semana esperando atendimento num banco de madeira, na entrada da emergência do Imip, e por pouco não pariu numa cadeira, centenas lotam as triagens dos Hospitais Agamenon Magalhães, Barão de Lucena e Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (Cisam). “Há mulheres que chegam em trabalho de parto, dão à luz e não têm o direito de sequer descansar numa cama, por absoluta falta de espaço”, afirma o diretor do Cisam, Olímpio Moraes Filho. Lá, o calvário das mães também se revela em outro momento. Miquelaine Belo, 16 anos, residente em Buenos Aires, Zona da Mata, teve bebê em novembro e desde então percorre três vezes na semana 80 quilômetros para ver, no Recife, a filha prematura, internada na UTI da Maternidade da Encruzilhada. Como tem outra criança de 3 anos, fica se dividindo. “Não vejo a hora de levar minha filha pra casa.” A curto prazo não há expectativa de reabrir totalmente a Maternidade do Hospital das Clínicas. Segundo a direção do HC, até o dia 28 devem ser ajustada a estrutura física, em atendimento ao controle de infecção hospitalar e exigências da Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária. “Após a vistoria, a expectativa é que a maternidade abra para partos de baixo risco”, informa. É que médicos da UTI Neonatal se aposentaram nesse intervalo e a recomposição do quadro, por concurso, só deve acontecer em março. Antes disso, só se o Estado ceder profissionais para o hospital federal. Estão fechados 30 leitos do alojamento conjunto, mais 16 de UTI e UCI neonatais. Quanto à Brites de Albuquerque, em Olinda, a secretária municipal de Saúde, Tereza Miranda, explica que dos R$ 8 milhões necessários à construção de quanto novos anexos, apenas R$ 1 milhão foi liberado pelo Estado. A capacidade será ampliada em quatro vezes mais. Segundo ela, cerca de 600 partos ainda são feitos por mês na cidade, no hospital conveniado Tricentenário. Sérgio Bernardo/JC Imagem

Secretário tem desafio de “gastar melhor”

SUS Fechamento de maternidades no interior e capital, plantões furados e obras inacabadas prolongam sofrimento de mães e bebês

CONTRASTE Enquanto a UTI do Cisam vive lotada, a ampliação da Maternidade Brites, em Olinda, segue com atraso


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