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Recife I 27 de agosto de 2014 I quarta-feira

caderno C

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Arquitetura sem José Goiana

PERDA Natural de Floresta, Sertão de Pernambuco, o profissional deixa um legado importante, com obras que marcaram várias épocas

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Beleza e alegria faziam parte da sua personalidade e da sua obra. Ele cultuava as amizades como pintasse um quadro”, José Paulo e Maria Lecticia Cavalcanti

MEMÓRIA Zezito Goiana assinou, entre outros, o projeto do Atlante Plaza, e tinha na pintura a sua segunda grande paixão Adequação do projeto ao lugar, respeito às necessidade do cliente e ao seu orçamento, não fazer concessões a modismos e pensar na longevidade do projeto eram seus lemas. “O que diferencia arquitetura de escultura é o espaço interior. É preciso proporcionar conforto a quem mora, seja visual ou de proporções. O mais importante na arquitetura é o homem”, declarou numa entrevista concedida ao Jornal do Commercio. “O arquiteto é um prestador de serviço. Sua criatividade reside na capacidade de atender às necessidades de

TRUQUE A vidente charlatão (Emma Watson) seduz o mágico racionalista (Colin Firth)

O mágico niilista de Allen Luiz Carlos Merten Agência Estado

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ÃO PAULO – Outro dia, no Festival de Gramado, um grupo de jornalistas retomou a discussão sobre Woody Allen. Mia Farrow, a filha que acusa o ex-padrasto de abuso, ninguém presta É melhor repensar a história toda. O novo Woody Allen, Magia ao luar, que estreia amanhã, embute uma confissão de culpa. Allen não para de se justificar. Como diretor, ele mantém o ritmo binário dos últimos anos. Depois de um grande filme, outro fraco – depois de Meia-noite em Paris, as aventura romana. Depois de Blue Jasmine, Magic in the moonlight. O filme deve entrar num grande circuito – isso, naturalmente, se Sylvester Stallone e seus Bastardos inglórios deixarem. Mercenários 3 estreou em 800 salas. Não vão sobrar muitas para abrigar Magia ao luar. Woody Allen já fez muitos filmes sobre mágicos. Jogos de adivinhações permeiam seu cinema há anos. Na nova versão,

Novo filme do diretor embute confissão de culpa Colin Firth faz o mágico famoso – seu disfarce é de oriental – cooptado por amigo para desmascarar vidente que se imiscuir na casa de uma rica família na Côte d’Azur. O cara vive citando Hobbes e Nietszche para justificar seu niilismo. A humanidade não presta, o mundo é uma porcaria, Deus morreu. Ele chega com disposição de guerra santa para desmascarar a charlatã – até ser seduzido por ela. A garota sabe tudo, adivinha tudo, e ainda tem aquele sorriso. Nosso homem, que mantém uma ligação racional – e fria – com a mulher que parece perfeita para ele, desmorona. Quem saca tudo, é a velha tia. Num diálogo divertido, ela provoca o sobrinho até ele admitir que, sim, ama a garota. Mas co-

mo – o cínico niilista? O amor existe, nos tira do sério, nos leva a cometer coisas inomináveis. Magia ao luar tem uma primeira parte encantadora, enquanto Colin Firth se deixa seduzir e impregnar pelo charme de Emma Stone. Seus discursos racionalistas da segunda parte, quando começa a resistir – e faz descobertas que é bom não antecipar –, são menos interessantes. O final é pura justificativa do autor, que parece falar através do personagem. Trilha, fotografia, direção de arte, figurinos – Woody Allen muda as equipes, mas o romantismo permanece. Os casacos pieds de poule, os tons bege. Tudo isso é dele, sua marca. E ele continua sendo um grande diretor de atores, ou então, vai ver que é o que ele escreve – os diálogos – que facilita a vida dos grandes intérpretes. É pouco provável que Colin Firth venha a ser indicado para o Oscar, como Cate Blanchett foi (e venceu no ano passado). Mas o ator poucas vezes esteve tão bem. Ele mereceria, por Magia ao luar, o Oscar que ganhou por O discurso do rei.

quem o contrata”, defendia. “Se um arquiteto passasse a fazer só o que gosta, sem receber estímulo de necessidades exteriores ao seu desejo, ele acabaria por se repetir.” Essa era uma das lições que José Goiana procurava ensinar aos seus ex-alunos da disciplina planejamento arquitetônico, na Universidade Federal de Pernambuco, da qual estava aposentado Na 7ª Bienal Internacional de Arquitetura (BIA), realizada em novembro de 2007 no prédio da Fundação Bienal de São Paulo, no Parque do Ibirapuera, uma sala de 80 metros

quadrados foi inteiramente reservada para este pernambucano nascido em Floresta. O arquiteto José Goiana Leal, completava, então, 30 anos de escritório no Recife. Ele foi o escolhido para ilustrar com seus projetos o segmento Arquitetos Convidados Nacionais. Antes dele, dois nomes igualmente expressivos na profissão – Acácio Gil Borsói e Carlos Fernando Pontual – mereceram a distinção. A exigência era possuir uma obra consistente, que tivesse marcado com sua personalidade a paisagem na qual se inseria.

Ele era muito generoso ao ensinar. Transmitia aos mais novos não apenas lições de arquitetura, mas uma nova forma de ver o mundo”, Silvana Gondim

Vale pelos efeitos especiais Marcos Toledo

Warner Bros. Pictures/Divulgação

ralela como pintor de paisagens que, como bom arquiteto, procurava reformular o que não lhe parecia tão belo. “Nos anos 90, a concepção de ‘segunda casa’ mudou completamente. As pessoas não queriam mais passar seu tempo de lazer numa moradia de segunda categoria, um lugar onde se encostavam os móveis e objetos rejeitados pela ‘casa principal’”, explicava. “As pessoas começaram a querer projetos assinados e não uma improvisação. Elas entenderam que viver com conforto e beleza torna as pessoas mais felizes”.

Imagem Filmes/Divulgação

arquiteto José Goiana Leal faleceu na madrugada de ontem, aos 70 anos, tranquilamente, em sua residência, enquanto dormia. O velório, a partir das 11h, aconteceu no Cemitério Morada da Paz, sucedido pela cerimônia de cremação, às 15h. Também um artista plástico aplicado, Zezito, como era conhecido, pontuou a cidade do Recife com seus projetos, alguns deles ícones de várias épocas. Embora se tornasse mais conhecido por obras de grande porte, particularmente hotéis – Mar Hotel (1986), Sheraton Petribú (1991), Atlante Plaza (1997), Summerville (2000), Beach Class (2003) e Enotel (2006) –, Goiana colocava todo o seu coração quando era convocado a desenhar casas, que, na sua cidade idílica, seria a forma mais humanizada de convívio. Ele próprio, ao lado da família, a mulher Cristina e as filhas Georgina e Gisela, fizeram da moradia, em Candeias, que ele mesmo projetou, um dos últimos bastiões de resistência à verticalização. Curiosamente, foram os grandes projetos que, se no início lhe afastaram das obras mais simples, terminaram por reaproximá-lo do prazer de projetar residências. Verde e azul eram suas cores favoritas, e isso pode ser constatado em sua própria residência de praia, em Toquinho, na concepção de seus hotéis e resorts e até na sua atividade pa-

Fotos: Guga Matos/JC Imagem

Alexandre Belém/JC Imagem

Flávia de Gusmão

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clima, ironicamente falando, parece perfeito para a estreia de No olho do tornado (Into the storm, EUA, 2014), um dos longa-metragens que chegam amanhã aos cinemas brasileiros, curiosamente, na mesma semana em que ainda se fala do friozinho estranho que acomete o Recife e em que o mundo é assolado por tremores de terra e furacões, além de fortes estiagens. Em se tratando de blockbuster hollywoodiano qualquer alteração no tempo é sinônimo de filme-catástrofe enriquecido com os cada vez mais primazes efeitos especiais. No olho do tornado, no entanto, não avança além disso. Tecnicamente, até é possível entender a escolha do diretor Steven Quale. Assistente de James Cameron em Titanic (1997) e Avatar (2009), ele teve sua primeira chance como titular em Premonição 5 (2011), sua estreia em longa de ficção para a telona. De catástrofes, pelo menos, Quale parece entender. Isso fica comprovado nas cenas em que os personagens – uma equipe de documentaristas, uma especialista em tornados e os moradores de uma pequena cidade dos EUA – são postos à prova frente ao que seria o maior tornado registrado em todos os tempos. Mas fica por aí. O desenvolvimento dramático do filme – que possui apenas uma hora e meia de duração – é sofrível. A maior parte do elenco parece estar atuando em uma produção amadora ou naqueles longas low-budget feito para a TV. Entre os atores, destacamse Sarah Wayne Callies (dos seriados Prison break e The

FILME-CATÁSTROFE Personagens lutam contra fenômenos

Na narrativa e no desempenho dramáticos, No olho do tornado parece amador walking dead) e Richard Armitage (o Thorin da franquia O hobbit). Já no apoio figuram aspirantes a estrelas da ala Malhação de Hollywood, como Max Deacon, que atuou na premiada minissérie Hatfields & McCoys; Nathan Kress, da série infantojuvenil iCarly; e a bela Alycia Debnam Carey, que sobressai com caras e bocas. (A própria Sarah vive a mãe de

Keala Wayne Winterhalt, filha dela na vida real). Para não dizer que tudo em No olho do tornado é catastrófico, vale ressaltar que a narrativa é conduzida em formato semelhante ao de um documentário ou, mais precisamente, o de um reality show. E, pelo tratamento dado à forma como alguns personagens decidem seus destinos na trama, com muita boa vontade o espectador pode observar um tom crítico na abordagem do abuso de registros de situações reais com câmeras e telefones celulares. Dois dos personagens, encarregados da árdua missão de dar um toque de humor à produção, parece haverem saído de um episódio de Jackass. Para o caso de não ter algo melhor para fazer ou assistir.


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