Revista MoV.Cidade nº 01 - O Vazio
CIDADES
ARTE
Instalação “Para Manoel...”, 2019 . Bordados, desenhos, brinquedos, objetos e carimbos. Trabalho produzido durante a Residência Artística “Territórios”, no Sesc Teresópolis/RJ. Fotografia: Emmanuel Chaves.
Miudezas, bordados, casas, causos e outras coisas Por Rick Rodrigues
Toda minha obra é criada em João Neiva, interior do Espírito Santo, onde nasci, cresci e vivo. Essa produção tenta abarcar as memórias da infância, familiares e cotidianas, histórias de chão, sonhos, desejos, perturbações, forças, fragilidades e afetividades; na tentativa de cada vez mais extrapolar as fronteiras do meu lugar de origem – mesmo permanecendo nele.
A CASA
A casa é o signo que permeia toda a poética visual, seja nos desenhos, gravuras, fotografias, bordados, palavras e frases suspensas, miniaturas, dobraduras de papel, brinquedos e objetos garimpados e de colecionismos, que são os principais meios pelos quais me expresso. No ensejo de desvelar as diversas narrativas e simbologias das casas, permito-me mergulhar nas lembranças das residências dos meus avós, dos quintais da primeira infância e os mundos oníricos
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construídos em meus retraimentos do mundo real. Atravessadamente, nessa busca, encontro coisas que são casas de outras coisas (caixas, cofres, armários, cômodas, gavetas, bolsos, sacolas...); também as casas móveis (caracol, tartaruga, etc.); casas que lidam com a metamorfose, como o casulo que abriga a lagarta e que, posteriormente, vira uma borboleta; as casas fantásticas, aquelas idealizadas pelas crianças e de direito universal; e os corposabrigos-casas. Tem casa vazia. Tem casa cheia. Tem um vazio aqui dentro e lá fora. Tem muita gente sem casa. E o que mais tem é casa sem gente. Tem quem more no próprio corpo. Tem quem não habite o próprio corpo. Ser a própria casa. Ser o próprio mundo. Casa é um direito. Casa é um privilégio. O termo casa está em voga. De
repente, em escala mundial, foi preciso, obrigatoriamente, reinventar os espaços, afetos, moradas, corpos, encontros, abraços, quartos, varandas, jardins, ruas, praças, cidades, amanhecer, anoitecer... quem instituirá o novo mundo? A casa será garantida a todos? E no velho mundo, quem tem casa? É tempo de habitar! É tempo de habituar. Habitar-se.
Rick Rodrigues (João Neiva/ES, 1988) é artista plástico e mestre em artes, pela UFES. Faz parte do coletivo artístico Almofadinhas. Já esteve em mais de 50 exposições coletivas e 8 individuais.