20154

Page 1

SOLENIDADE

DA

16

ASSUNÇÃO

DE

DE AGOSTO DE

NOSSA SENHORA

2015

Caros Irmãos e Irmãs: Hoje, celebramos a grande Solenidade da Santa Mãe de Deus, elevada aos céus em corpo e alma, pois a Nova Eva não conheceu a corrupção da carne como a antiga. Preparada desde a eternidade para ser o Trono de Deus e a Arca da Aliança, foi isenta do pecado e de sua conseqüência: a morte. No entanto, convém relembrar: o culto à Virgem Maria surgiu bem mais tarde em relação aos mártires e confessores da fé, devido à discrição dos Evangelhos sobre sua pessoa No entanto, muito cedo Maria esteve presente na piedade cristã. Prova disso é a oração “Sub tuum praesidium” (“Sob a vossa proteção”), que remonta ao século III. Contudo, foi com o Concílio de Éfeso (431) que a devoção Mariana se propagou, ao decretar Maria a verdadeira Mãe de Deus (Theotókos). Sendo proclamada a Mãe do Salvador, a reflexão teológica evolui chegando à compreensão da incorruptibilidade de seu corpo após a morte. Surge, então, no século V, uma festa chamada de Dormição da Virgem

1


Maria. Em Roma essa celebração fora introduzida pelo PP. Sérgio (687708). Apenas no ano 770 recebe o título de Assunção. A Igreja do Oriente, por sua vez, venerou Maria desde os tempos mais remotos como a “Arca viva da Aliança de Deus”. Diz S. João Damasceno: “Hoje a Arca Viva de Deus, que carregou o Salvador em seu seio, repousa no templo de Deus, que não foi construído por mão de homem. Davi, o seu antepassado, exulta; os anjos dançam em coro; os arcanjos celebram...os querubins entoam um cântico de louvor e os Serafins cantam o seu hino” 1 A liturgia eucarística, para esta grande Solenidade, oferece-nos dois formulários: um para a noite após as I Vésperas e outro para o Dia, este que celebramos. Mesmo não tendo celebrado a Missa da Vigília, vamos nos deter sobre a da Arca da Aliança (1Cr 15), figura da Virgem Maria; também presente na celebração de hoje, na Primeira leitura, com o Livro do Apocalipse. No Primeiro livro das Crônicas,2 a Arca da Aliança era sinal da presença de Deus; o lugar da presença de Deus; o Templo móvel de Deus enquanto peregrino no deserto. “Nós soubemos que a arca estava em Éfrata e nos campos de Iaár a encontramos” (Sl 131) Depois, Deus fixou sua morada no Templo de Jerusalém. “Então Salomão congregou em Jerusalém os anciãos 1

2

II Homilia de S. João Damasceno (+749) sobre a festa da Dormição.

1Cr 15,3-4.15-16;16,1-2

2


de Israel para trasladar da cidade de Davi que é Sião, a Arca da Aliança de IHWH” (1Rs 8, 6-7) Davi tinha dito da Arca: “Decidi construir um lugar tranqüilo para a Arca da Aliança do Senhor”. (1Cro. 28,2ss) No Novo Testamento, o lugar da morada de Deus é a humanidade de Cristo. Com a encarnação do Verbo (Jo 1,14), Deus se torna EmanuelDeus conosco. Mas, pela graça de Cristo, também a Virgem se torna morada de Deus, pois trouxera em seu ventre o Filho de Deus. Maria foi Arca da Aliança, sobretudo, porque foi plena de graça; esposa do Espírito Santo que a fecundou e da S.Trindade que a ornou de privilégios singularíssimos. A Arca continha as taboas da Lei onde estavam escritas as cláusulas do pacto entre Deus e o povo (Ex 31,18). Por isso era o testemunho da Aliança e era igualmente chamada Arca do Testemunho (Ex 25,22) Maria traz em seu seio Jesus Cristo, que é a Nova Lei, pois com seu sacrifício sancionou para sempre a Nova e Eterna Aliança. É a Palavra do Pai (Jo 1,1;14), é a sabedoria de Deus (1Cor 1,14), isto é, sua Lei Eterna. Pode-se dizer com propriedade, que Maria é verdadeiramente a Arca da Nova Aliança, viva , imaculada, porque é o Templo da Nova Aliança A Arca era o lugar do encontro entre Deus e o homem. Lugar onde se dialogava com Deus, como Moisés havia feito (Ex 25,22)

3


Também Maria foi escolhida como sede de encontro entre a divindade e a humanidade, na pessoa do Verbo. Com este mistério iniciouse o novo diálogo e a pacificação entre o Soberano Eterno e os seus súditos rebeldes. O Apocalipse nos apresenta a Arca da Aliança que aparece no santuário celeste, conforme a primeira leitura que ouvimos “Abriu-se o Templo de Deus que está no céu e apareceu no Templo a arca da Aliança.” No contexto litúrgico hodierno podemos tomar este fato, indicado por S. João, como imagem do Cristo e de Maria. Cristo foi a Arca da Aliança num sentido único e singular enquanto Nele habitou “corporalmente toda a plenitude da divindade” (Col 2,9). Maria foi a Arca de Cristo porque O hospedou temporariamente em seu seio, mas sobretudo porque O conservou sempre em sua alma como plenitude de graça: “Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo” (Lc 1,28) A humanidade de Cristo – Arca da Divindade – em sua ascensão encontrou lugar à direita de Deus na glória do Pai. Maria – Arca de Cristo – em sua assunção encontrou seu lugar à direita de seu Filho glorificado. Assim a trasladação da Arca da Aliança para Jerusalém tornara-se figura do ingresso de Cristo e de Maria na Jerusalém celeste. Caros irmãos e irmãs, a Solenidade de hoje, a Assunção de Maria aos céus, nos traz à lembrança que também nós, por vocação, somos Arca da Nova Aliança. 4


Pelo batismo, ao recebermos a Eucaristia e guardando no coração a Palavra somos, igualmente, Nova Arca da Aliança e como a Arca Viva, esperamos ser trasladados para a Jerusalém Celeste, lugar do nosso verdadeiro repouso. Maria foi cumulada de privilégios singulares em vista de sua missão: ser Mãe do Verbo. O cristão, também, foi cumulado de privilégios para viver sua missão na Igreja. E, somente, vivendo a vocação de ser Arca da Nova Aliança poderá cumprir a missão que lhe foi confiado. Termino nossa reflexão com um Apoftegma interessante, muito oportuno para a solenidade de hoje. Diz um Pai do Deserto: “se um monge está num lugar e não produz frutos do lugar onde se encontra, o próprio lugar onde se encontra o monge o expulsará.” Do seu lugar, a Virgem Maria deu o Fruto de seu ventre: Jesus Cristo. Nós, de onde estamos, somos convidados a dar frutos que são os dons do Espírito Santo: “amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio” (Gl.5,22)

Não deixemos que o

lugar eclesial no qual fomos chamados a viver – família, sacerdócio, vida monástica – nos expulse porque não damos os frutos que deveríamos dar. Não transformemos nossa vocação de Arca da Nova Aliança em cofre de falsos brilhantes, porque se essa é a nossa realidade, “no bolero da

5


vida” vamos experimentar um torturante “band-aid” apertando nosso calcanhar. Assim seja.

6


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.