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ESCUTAR E CON-SENTIR + Dom Beto Breis, OFM Bispo Diocesano de Juazeiro

No dia 18 de março, Véspera da Festa de São José, Padroeiro da Paróquia e do município de Sento Sé, visitamos comunidades dessa extensa rede de comunidades para escutar os gritos e as reivindicações dos que sofrem com os efeitos e impactos da presença da Empresa Tombador Iron Mineração Ltda. E com os temores do que poderá surgir ainda mais. Tal Empresa desde 2021 atua na extração e produção de granulado e finos de hematita (minério de ferro) de alto teor (67% Fe) numa pequena serra (Serra da Bicuda) distante 22 quilômetros da sede do município. Se São José sentiu-se impelido pelos sonhos que lhe indicavam as pro-vocações de Deus, são aqui os “pesadelos” enfrentados por tantas famílias de 12 comunidades que nos interpelam e desafiam. Fomos acompanhados por quem já apoia a luta e a resistências desses moradores: membros da Comissão Pastoral da Terra (CPT), pesquisadores/ professores da Fiocruz e da UNIVASF (Universidade Federal do Vale do São Francisco), Padre Claudimiro (vigário da Paróquia) e o seminarista Danilo. Registro a seguir algumas falas, sinalizando entre aspas as que consegui anotar com literalidade. Importa ecoar seus gritos e lamúrias, pois não faltam os que lhe são indiferentes ou impõe ameaças de retaliações porque não permanecem calados e isolados. Fica evidente que as chagas profundas e extensas abertas por ocasião da construção da Barragem de Sobradinho permanecem dolorosas e são reabertas com força diante de outros empreendimentos em nome do “Desenvolvimento” que exclui o respeito com a vida humana e o cuidado com a Criação. Infelizmente essa realidade não é isolada e única. Comunidades como Angico dos Dias, em Campo Alegre de Lourdes, sofrem há anos com os desmandos da Mineradora Galvani. E a CBPM1 já festeja os passos para uma Província Mineral que abrangerá grande parte do território de nossa Diocese de Juazeiro. A propósito, temos informações de que o Estado da Bahia se destaca na oportuna flexibilização das leis ambientais. As frases e citações seguirão a ordem das exposições, sendo um primeiro grupo aquelas acolhidas pela manhã, na Comunidade de Pascoal/Limoeiro, e, a seguir, aquelas na Cmunidade do Tombador (à tarde).

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A Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM) é a empresa de pesquisa e desenvolvimento do Estado da Bahia, indutora destes processos no setor mineral do estado. Sua atuação é centrada na ampliação e aprimoramento do conhecimento geológico do território baiano, na identificação e pesquisa de seus recursos minerais e no fomento ao seu aproveitamento, atraindo, para este fim, a iniciativa privada. Fundada em 18 de dezembro de 1972, a CBPM é reconhecidamente uma das mais dinâmicas empresas no cenário da pesquisa mineral no Brasil. O acervo de dados e informações geológicas, geradas e difundidas por ela ao longo da sua trajetória, contribuiu para tornar a Bahia um dos estados brasileiros mais bem estudados e conhecidos geologicamente, pondo em destaque a grande diversidade de seus ambientes geológicos, ricos em depósitos minerais. (fonte: http://www.cbpm.ba.gov.br/institucional/missao-visao-valores/)

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PASCOAL/LIMOEIRO  Sentimento de medo. “Parecia um boato” (a chegada da empresa mineradora), mas o que “nossos pais passaram na época da construção da Barragem enfrentamos agora”. “Tenho o sentimento de que somos invisíveis”. Estradas sem estruturas para caminhões bitrens, que muitas vezes passam em comboio.  “Moramos aqui há tantos anos e chegam se achando donos. Parece que os inoportunos somos nós.... Não estou feliz no que é meu.... Nos documentos deles aqui não tem ninguém. É o que somos para eles: ninguém”  O líder da comunidade Ademir (falecido em 2015) já alertava os moradores prevendo dores e sofrimentos “tapando as variantes”.  Há indícios de que estão construindo uma barragem de rejeitos. Brumadinho e Mariana servem de alerta para nós.  “Prefiro acreditar no poder da união do povo. Meus pais perderam tudo com a barragem. Não vamos desistir, pois eu quero viver aqui... Fé em Deus e no poder da luta do povo. A gente quer ser feliz aqui”.  “Daqui não saio” (idosa octogenária)  “A gente vivia sossegado (pescando, tirando casca de angico…), mas hoje o desassossego é grande”. Tenho um filho de oito anos: “queria que ele tivesse o sossego que eu tive quando era criança...” (...) Os motoristas dos caminhões não nos respeitam.  “Essa indignação minha vem desde quando era criança. Tinha oito anos na época da construção da Barragem. A água do rio estava podre devido a tantas plantas e animais mortos”. Água era inapropriada para consumo. Devia-se esperar alguém com canoa para pegar agua corrente no meio do rio. “Mamãe fervia a água, mas tão grande era a sede que a gente bebia a água assim mesmo, morna.”. Gosto horrível. “Chega hoje uma mineradora…”. (...) “Onde Deus está? Porque tanta injustiça, tanta coisa errada? Até já pedi perdão a Deus por isso. ”  “Nossa luta não começou agora. No início ninguém acreditava”. Poucos se uniam. Agora 90% da população acordou ...”A comunidade desperta agora”.  “Sinto-me estranho na minha própria casa”. Sem segurança para ir de moto a Sento Sé.  “Muitos se acomodam diante das dificuldades e da força dessa Empresa. E o desenvolvimento prometido não chega: “cadê os empregos? ”. Somos descartados. “Nada do que foi prometido aconteceu de fato”. “A gente se fortalece com o apoio de quem não é daqui”. “O povo da cidade julga e não acredita nas causas das comunidades. Dizem que é ‘politicagem’”.  “Estão nos expulsando” a partir do momento em que as famílias perdem os bichos que criam e o que produzem” (por exemplo, acerolas).  “A cada dia a indignação cresce mais. ” Pessoas da comunidade são manipuladas e desconstruir não é fácil.  Nos doze (12) dias (de manifestação) “ninguém veio” (Prefeita, vereadores...). “As autoridades quando acordarão? ” “Também outras comunidades não acordaram ainda. ” Do 2


“Não dá mais para aguentar”: poeira e explosões somos nós que enfrentamos. “Eles (Mineradora) se acham donos”. TOMBADOR  Há quase 50 anos “a Chesf fez promessas, mas enganou e iludiu. Pessoas ficaram sem casas... “Não somos animais, merecemos respeito”. (...) Hoje não temos mais alegria”.  “Fomos surpreendidos pela gestão municipal, que não ouve as comunidades”.  “Corremos o risco de morrer de silicose”2. A estrada piorou muito depois que chegou a Empresa” (lama ou poeira)  Tomaram posse das nossas terras. “Pobres não têm vez, dizem as pessoas... Não somos nada”3.  Medo dos rejeitos, que poderão “estrondar” no São Francisco. Montes altos de terras surgidos recentemente indicam que tem barragem sendo feita. Pó de pedra nas casas.... Estão desmatando. Por outro lado, “nenhum do povoado foi empregado... Para nós, só prejuízo”.  “Tenho medo de ter que sair daqui. Minha mãe morreu esperando indenização da Chesf”. Quase meio século depois da Barragem de Sobradinho a maioria das pessoas já morreu. A relocação das famílias é um trauma. Hoje chegam outros modelos de desenvolvimento prontos. “Não respeitam as terras dos nossos antepassados”.4  “Se alguém tira a vida do outro vai preso. E essas mineradoras? ”. A Empresa Tombador Iron está em expansão.5  “Jesus está no meio de nós. Ele está do lado dos pobres.  Eles dizem que aqui não mora ninguém. Mas a gente produz, faz troca de sementes...  As manifestações que paralisaram a estrada foram 178 horas de um movimento ordeiro, pacífico. Mas nenhuma autoridade apareceu. “Mas a luta não está perdida”.  “Lembro-me da época da construção da Barragem, pois era criança: animais mortos nas águas; nos colocaram na caatinga sem morada”. Barracas de lona preta.6  “A Chesf jogou nós igual a porcos. Bolos de barro e lonas de galé”7

Juazeiro, 20 de março de 2023

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A silicose é uma doença pulmonar causada pela inalação contínua e constante da sílica cristalina. Frase repetida em baixo tom por diversos dos moradores presentes. 4 São Comunidades de Fundo de Pasto, comunidades tradicionais que se baseiam no uso comum da terra e preservação da Caatinga. Ver https://www.brasildefatope.com.br/2022/03/23/voce-sabe-o-que-sao-ascomunidades-de-fundo-e-fecho-de-pasto 5 Nesse momento alguém sussurrou: “Até o nome da nossa comunidade roubaram! ” 6 O senhor que deu esse testemunho o fazia entre pausas por causa do choro. 7 Barro para que fossem feitas as casas de taipa (pau a pique). 3

Do 3


ANEXOS Fotos do dia 18 de março que mostram a situação da estrada em dia de chuva

Do 4


Do 5


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