Comemoração dos Fiéis Defuntos 02 de novembro de 2015
Caríssimos Irmãos e Irmãs: Recordar e rezar por aqueles que adormeceram no sono da morte foi sempre uma atividade da Igreja desde o seu início. Em seu Grande Retorno – a volta para a Terra onde corre o leite e o mel – após ter o Cristo ressuscitado dos mortos e quebrado as férreas fechaduras dos portais da eternidade, que estiveram fechadas após a expulsão de nossos velhos pais do paraíso, a Igreja carrega consigo todos os seus mortos enquanto se encaminha para o festim eterno. Ela assim o faz como o fizeram os filhos de Jacó na volta para Canaã, levando os ossos de José sepultados no Egito. Por isso, em cada Eucaristia fazemos a memória e o sufrágio por todos os falecidos, já sepultados nas águas lustrais do batismo.
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Entretanto, não havia um dia específico para a Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos. Apenas no século IX que muitos mosteiros começaram, de forma regular, a celebrar a Comemoração de seus Defuntos. Recordavam-nos, porém, porque inscritos em seus necrológios. Santo Odilon, quinto abade de Cluny (994-1049) prescreve, então, para todos os mosteiros cluniacenses um decreto ordenando a seus monges fazer memória de todos os defuntos conhecidos e ignorados num mesmo dia. Nesse momento, a Congregação Cluniacense constava com 1.200 casas. Para tal celebração, Santo Odilon escolhe o dia sucessivo à festa de Todos os Santos. Essa tradição litúrgica perdura até nossos dias na Igreja latina. Eis um extrato do decreto do Abade Odilon para todos os seus mosteiros.
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“Como em todas as igrejas da cristandade vem celebrada a Primeiro de novembro a festa de Todos os Santos, assim em nossas casas se celebrará a Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos, do início do mundo até o fim do mesmo, da seguinte maneira: nesse dia, após o Capítulo Conventual, o celeireiro dará a todos os pobres que se apresentarem uma esmola de pão e vinho, como se faz na Quinta-feira Santa... à tarde, todos os sinos soarão e cantar-se-ão Vésperas pelos defuntos. No dia seguinte, após as Laudes, todos os sinos tocarão novamente e se recitará o Ofício pelos Defuntos. A Missa matutina será celebrada solenemente... Todos os irmãos devem oferecer privada e publicamente a missa pelo repouso das almas de todos os fiéis. Oferecer-se-á, ao meio dia, a refeição a 12 pobres. A fim de que este decreto permaneça perpetuamente em vigor, desejamos e ordenamos que seja observado neste lugar e em todos os demais que dependem desta abadia; e, se alguém tomar como exemplo esta nossa instituição, gozará por isso de todos os sufrágios. E como a memória de Todos os Santos se recorda a cada ano, assim ordenamos e tenhamos a solicitude em orar por todos os nossos irmãos que militaram no serviço de Deus sob a Regra de São Bento...” 1 A celebração da Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos aconteceu, pela primeira vez a 2 de novembro de 998. 1
DACL, vol 6/1, Letouzey et Ané, Paris 1920
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A iniciativa do abade S. Odilon teve aprovação imediata do papa Silvestre II (990-1003). Tal costume se espalhou por toda a Igreja latina. A 30 de junho de 1570, o papa Pio V promulgou tal celebração e publicou-a no Missal Romano. O decreto de S.Odilon nos recorda o antigo costume de dar aos pobres o “refrigerium”. Enquanto rezamos pelos defuntos devemos não descurar do cuidado dos vivos, sobretudo dos mais pobres. No atual Missal, o de Paulo VI, promulgado a 3 de abril de 1969, encontramos a seguinte exortação: “ Até quando o Senhor Jesus virá em sua glória, e, destruída a morte, ser-lhe-ão submetidas todas as coisas, alguns de seus discípulos são peregrinos na terra; outros, que passaram desta vida, estão se purificando; outros, enfim, gozam da glória, contemplando a Deus. Portanto, a união daqueles que estão a caminho, com os irmãos falecidos, de maneira alguma se interrompe, antes, vê-se fortalecida pela comunhão dos bens espirituais”. Essa é a doutrina da Igreja sobre a comunhão dos santos, que professos no Credo.
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Estamos celebrando o mistério pascal, na certeza de que, aqueles que se tornaram pelo Batismo membros do Cristo crucificado e ressuscitado, através da morte, passem com Ele à vida sem fim. A visita ao nosso cemitério, levando a luz do Ressuscitado, através de nosso Círio Pascal aos nossos irmãos que aguardam o último dia, seja para nós – que celebramos o Sacramento da vida, a Eucaristia – uma tomada de consciência de que a caridade é um escopo em nossa vida e o festim da gloriosa Jerusalém o fim último pelo qual fomos criados e redimidos em Cristo Jesus. Que Deus nos abençoe a todos!
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