XXVII Domingo do Tempo Comum – Ano B 27 de setembro de 2015
Caríssimos Irmãos e Irmãs: Da Primeira Leitura escutamos: “Não é bom que o
homem esteja só...”; do Evangelho: “O homem não separe o que Deus uniu.” O ser humano não realiza sua vocação de criatura à imagem de Deus fugindo do encontro, da partilha e do diálogo com seu semelhante. Não fomos, pois, criados para nos especializarmos no exercício do monólogo; condição do solitário. Imagem de Deus, o ser humano foi feito para o diálogo e encontro face-a-face com o seu semelhante como acontece no seio da Trindade Santa. Deus, após ter visto que toda a criação não realizava essa exigência fundamen-
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tal daquele que plasmara à sua imagem, criou-lhe a mulher. Contudo, essa comunhão, encontro, diálogo e partilha se faz na alteridade. Um ser humano completa o outro , e de uma maneira única e específica no convívio marital entre um homem e uma mulher. Por isso que, até anatomicamente são distintos, consequentemente, também, na constituição da personalidade. Essa realidade impede que o amor entre um casal seja doentio, ou seja, autista, obrigando-os a constatar a realidade da alteridade tão necessária para que a vida aconteça: o outro existe; ninguém é extensão de ninguém, nem é clone de ninguém. A Santíssima Trindade é um só Deus em três Pessoas porque é amor. Assim também, na criação; Deus fez o homem e a mulher em pessoas distintas para viver em comunhão de amor. Mas essa comunhão é completa quan-
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do se torna também trindade, isto é, três pessoas numa comunhão de amor; homem, mulher e Deus. Assim como não há confusão entre as Pessoas Divinas, não obstante sendo um só Deus, assim também entre o homem e a mulher. Ambos foram criados à imagem de Deus, mas são pessoas distintas. Jesus retomando o texto do livro do Gênesis diz “o
homem deixará seu pai e sua mãe e os dois serão uma só carne.” (Mc 10,7) Não disse uma só pessoa; disse uma só carne. Por conseguinte, na união matrimonial há a fusão da carne para expressar amor e procriar, porém jamais fundem-se as pessoas. Estas continuarão sendo sempre o que são; envoltas, admiradas e protegidas em seus mistérios. Não é, pois, vontade de Deus que no matrimônio um se dilua no outro em nome do amor; aliás, em relacionamento humano al-
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gum. Isso, de fato, não é amor. Quando verdadeiro, respeita-se as diferenças não só física, mas também psíquica e espiritual. Perceber o outro como extensão de si próprio já é enfermidade desastrosa para o convívio humano. É perfeitamente natural e sadio que um cônjuge sinta, veja e analise tudo de forma distinta de seu parceiro conjugal. Discordar, sentir, discutir, apresentar propostas e soluções diferentes fazem parte do relacionamento de amor entre marido e mulher. Disso decorre o respeito necessário para amparar e sustentar o amor que é dinâmico, tendendo sempre a se aprofundar numa força espiral. Funde-se a carne, nunca as pessoas. Jesus quando critica os de seu tempo se remete à Lei prescrita no Livro do Deuteronômio: “Se um homem de-
pois de ter escolhido uma mulher e casado com ela, não se agradar mais dela, porque notou nela algum inconveni-
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ente, escreva-lhe uma certidão de divórcio, que lhe entregará em mão, e a despedirá de sua casa.” (Dt 24,1) Neste texto não vemos mais a igualdade entre homem e mulher; os direitos não são mais os mesmos; não há mais unidade nem compromisso de crescimento juntos no amor, pois a mulher é considerada inferior ao homem. Jesus percebendo a má intenção dos fariseus, como sempre, responde-lhes à pergunta sobre o divórcio retomando à pureza da origem da criação do homem e da mulher, excluindo todo o direito de separar o que Deus uniu. Entretanto, o Senhor considera que há uma outra forma do ser humano viver sem dividir seu corpo, expressando e vivenciando o amor de forma peculiar, quando alguém se faz eunuco pelo Reino. (Mt 19,12), como Ele próprio viveu.
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A Igreja ao proclamar a indissolubilidade do matrimônio, ancorada nas palavras de Jesus que acabamos de escutar, não o vê como uma lei implacável e torturante de um compromisso, mas como um dom divino, cuja vivência se faz na conquista cotidiana do exercício do amor. Há um apoftegma dos Padres do Deserto que se aplica, também à vida matrimonial: “para se encontrar água pura e cristalina
é preciso cavar o poço no mesmo lugar.” Pela desordem da natureza, fruto do pecado original, temos o desejo de amar, mas não é inato em nós a prática do verdadeiro amor, que é da natureza de Deus. Com o pecado, perdemos a semelhança de Deus, que é justamente a capacidade natural de amar. Precisamos, quer no matrimônio quer na vida de castidade pelo Reino, decidir amar, aprender a amar e perseverar no amor; amar como Deus ama.
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Quando a Igreja, por questões justas e razoáveis, assume que não se é mais possível a vivência do amor entre um homem e uma mulher no sacramento do matrimônio, não os abandona; acolhe-os como filhos amados dando-lhes espaço digno em seu seio, pois é sua doutrina que nenhum dos seus se perca:
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Pai, aqueles que me deste que-
ro que, onde eu estou, também eles estejam comigo...” (Jo 17,24) Que Deus nos abençoe a todos!
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