ERRADICAR A POLIOMIELITE Luciano Mendes de Almeida Até o ano que vem a poliomielite pode ser vencida no Brasil. Depende apenas da mobilização da sociedade para a vacinação infantil. Estamos bem lembrados, sem dúvida, da Campanha do Soro Caseiro, que conseguiu, graças á adesão do povo, atingir o Brasil inteiro e salvar dezenas de milhares de crianças. A desidratação mata 164 crianças por dia, conforme indicação do Ministério da Saúde. A campanha levada adiante pelo Ministério da Saúde teve a colaboração da Sociedade Brasileira de Pediatria, da Unicef, do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs e das comunidades católicas através da Pastoral da Criança. O trabalho em conjunto alcançou resultados altamente positivos. A Pastoral da Criança já atinge 186 dioceses e, dentro em pouco, estará atuando nas demais. Pesquisa recente realizada pelo lbase a respeito do soro caseiro constatou que, em 2.612 comunidades carentes do Maranhão, Ceará, Pernambuco e Bahia, 77% dos entrevistados já conheciam o soro caseiro. A pesquisa envolveu 350 mil domicílios. É agora indispensável convocar as mesmas comunidades para uma nova campanha nacional, em favor da erradicação da poliomielite e da vacinação universal contra o sarampo, tétano, difteria, coqueluche e tuberculose. Outros países conseguiram essa meta. Assim, Costa Rica, Cuba, EI Salvador, e em breve a Argentina e México. A colaboração da inteira sociedade é indispensável. No Brasil, em 1980-81, a aplicação da vacina atingiu 100% o das crianças entre 0 e 4 anos. De 1984 aos dias de hoje, houve uma queda notável (e 12 % no comparecimento. E isto que agora requer da sociedade empenho maior para que nenhuma criança fique sem os benefícios da imunização. Conforme o Ministério da Saúde, nosso país dispõe de vacina em quantidade suficiente, possui redes de distribuição e equipes habituadas para aplicar a vacina, mesmo em ambientes rurais e na selva. Resta agora que a mobilização do povo venha ao encontro desta disponibilidade técnica. Sem dúvida, não faltará a colaboração da TV, do rádio e outros meios de comunicação, nem a contribuição das Igrejas e demais instituições. É neste sentido que as comunidades católicas devem cumprir com entusiasmo a sua missão. O santo padre João Paulo II, em audiência a 19 de janeiro de 1989, falando à Unicef e á Pastoral da Criança do Brasil, declarou que é necessário encontrar a solução para o escandaloso problema da mortalidade infantil. A vida é dom de Deus. A criança tem direito a ser ajudada para conservar e desenvolver este dom. Não é justo que, pela ignorância dos pais ou omissão da sociedade, o dom precioso da vida fique ameaçado, acarretando a morte de tantas crianças no Brasil. Aqui fica o apelo para uma campanha solidária em bem da saúde da criança brasileira. Estamos no 30º aniversário de Declaração Universal dos Direitos da Criança. Intensifiquemos nossos esforços em bem de uma vacinação que cubra todo o território nacional e se torne um dever assumido por todos, daqui para frente. Que este apelo possa atingir de modo especial a consciência dos cristãos, na certeza de que a promoção integral da pessoa humana obriga-nos diante de Deus a defender o dom sagrado da vida desde o primeiro momento da concepção e a promover este mesmo dom para que alcance a criança o desenvolvimento físico e espiritual a que tem direito.
O DOM DE ESCUTAR Arthur L. Foster A importância de escutar é sentida em todos os setores de nossa vida e cultura: nos relacionamentos familiares, na psicoterapia, na educação, nas relações comerciais etc. Parodoxalmente ouvido não é tão freqüente, e as pessoas pagam consideravelmente bem pelo privilégio de conversar com um profissional que é educado na arte de ouvir. É como se todos reconhecessem intuitivamente a necessidade profunda de ser ouvido, enquanto relativamente poucas pessoas se dispõem a ouvir o outro profundamente ou o suficiente para satisfazer a esta aspiração humana. Quais são as razões desta necessidade profunda de ser ouvido? Primeiramente, existe nossa solidão inescapável como seres humanos. Somos criados pessoas no, pelo e para relacionamentos. Nossa natureza social exige que nos relacionemos. Não podemos ser pessoas humanas, sem o cuidado dos o outros para nosso bem-estar psíquico e espiritual. Precisamos que os outros nos dêem espaço em suas vidas, bem como de seu precioso tempo. Escutar alguém é responder a este anseio profundamente humano. Ouvir é o dom que tira a pessoa de sua solidão sufocante e a coloca numa experiência maior de espaço e tempo. Em outras palavras, é a dorça que nos tira da alienação. Um segundo aspecto da busca de ser ouvido é a necessidade de afirmação. É impossível estar certo de que alguém existe realmente, se este alguém nunca foi ouvido. Neste sentido, escutar é um dom criativo e poderoso. Ele transforma o seu interior em ser, e a constante experiência de ser ouvido, uma garantia do próprio valor como pessoa. Podemos nos admirar do que dizia o teólogo Paul Tillich: “Acredito que o primeiro ato de amor em todo relacionamento humano é o mútuo escutar-se, ouvir não somente as palavras e expressões, mas para além do que está escondido nele. Isto pode nos colocar próximos da impenetrável interioridade da pessoa. Uma terceira raiz de nosso desejo profundo de ouvir é a nossa busca de auto-compreensão. A introspeção solitária, enquanto nos pode dar alguma distância no processo de nos entender, tem seus limites. Este fato é exemplificado pela experiência muito comum de lutar sozinho com um problema complexo sem se ajudar. Ao verbalizar o problema para outro ouvir, a pessoa freqüentemente descobre a solução, no próprio ato de dizer ao outro, e este apenas ouvir e nem sequer esboçou qualquer resposta. As pessoas, por vezes embaraçadas, se admiram de como isto não pudesse ser resolvido sozinho. Esta experiência mostra que somos sociais e relacionais. Fomos criados na “conversação de gestos significativos”, diz George Herbert Mead, um psicólogo social. A mútua troca de linguagem , o falar e o ouvir são essenciais para o crescimento humano. A quarta razão para valorizar o escutar está ligada ao nosso desejo de crescer e de aperfeiçoamento. Sem a ajuda de um ouvinte, é quase impossível estarmos seguros de nós mesmos e dos outros. Quando pessoas significativas, como pais ou professores, simplesmente nos julgam ou nos advertem , sem ouvir nosso ponto de vista, tornamo-nos invariavelmente defensivos e nos escondemos atrás de fachadas, máscaras, posturas e vários outros tipos. Ao contrário, quando somos recebidos, aceitos e compreendidos como somos, nossa inflexibilidade e meios defensivos de perceber, pensar, sentir e agir começam a desmoronar e serem substituídos por comportamento mais adequados e flexíveis. Portanto, ouvir é uma condição poderosa da personalidade mudar, tanto para as pessoas como para os grupos. O escutar é uma resposta a uma profunda necessidade humana. Um curioso paradoxo deve ser notado. As pessoas são ambivalentes no processo de escutar. Isto quer dizer que valorizamos muito o sermos ouvidos, mas ao mesmo tempo está presente o medo. A razão desta ambivalência
não é difícil de detectá-la. Queremos mudar, mas somos aterrorizados pela mudança. Desejamos nos compreender, mas temos receio de que, neste processo de auto-compreensão, não gostemos de nós mesmos. Desejamos fugir da solidão, mas nos retraímos do impacto e perigo de nos expor na comunhão com os outros, que inevitavelmente acontece, em outras palavras, experimentamo-nos como sendo conhecidos e compreendidos ao escutar o outro, ou então como uma Experiência que nos amedronta. Como sabermos que não seremos rejeitados quando nos tornarmos visíveis? Outro problema curioso que precisa ser reconhecido é o fato da dificuldade de escutar as outras pessoas. Algumas vezes é quase impossível ouvir. Entre muitas razões apontamos algumas: . escutar, da parte de um pai, professor, ministro ou conselheiro, exige uma vontade genuína de respeitar a outra pessoa. Isto significa uma abertura real para ser surpreendido por ele. O fato triste é que tal respeito freqüentemente não acontece; . escutar exige coragem. A coragem de ser vulnerável ao ponto de vista do outro. Se você realmente escuta, você deve sentir a convicção e perspectiva do outro e, portanto, mudar a sua, se necessário. Uma vez que somos resistentes a mudanças, é muito mais fácil voltar-se para a outra pessoa com conselhos prematuros, generalizações fáceis e apressadas ou com julgamentos; . escutar é tanto mais necessário quanto mais difícil é atingi-lo. Isto significa que, quando as emoções estão mais altas, as diferenças são mais agudas; . escutar significa ceder á exigência absolutista e idolátrica de estar sempre certo. Escutar envolve o reconhecimento de que todo conhecimento, crença c ação são sempre uma perspectiva, parcial e condicionada. Portanto, ouvir em profundidade exige deixar de lado o desejo de nos justificar como sendo a verdade em pessoa. O autêntico ouvir é possível então; . escutar implica dinâmica mutualidade. Escutar nunca è uma ação passiva ou parcial. Pelo contrário, requer a presença total no ouvinte ao entrar sensivelmente no mundo do outro. Isto è uma ação poderosamente transformadora para ambos, quem é escutado e quem escuta. Portanto, há uma reciprocidade no seu impacto. Significa mudança e envolvimento numa profundidade maior. Sentimos este fato e, não raras vezes, fugimos de tal papel serviçal. Resumindo, mostramos algumas dimensões da importância de escutar em nosso dia-a-dia, incluindo o fato que è um sinal da presença do amor de Deus em nossas vidas. Também examinamos as resistências profundas do escutar que todos experimentamos. Concluíndo, apontaremos três tipos de escutar que são profundamente necessários: Precisamos escutar a voz dos outros. Isto é verdade não somente individualmente, mas também corporativamente. Na Igreja, precisamos ouvir a voz do mundo e entrar num diálogo franco Igreja-mundo. A nível de relações internacionais, as nações precisam ouvir mais sensivelmente as perspectivas de cada uma. Deve-se criar urgentemente estruturas para tal ouvir corporativo, em quantidade e qualidade, se nossa civilização quiser sobreviver. Necessitamos escutar mais de perto a voz de nós mesmos. É difícil nos presentear com o ouvir nossas profundezas, intuições e ser. Se quisermos ser mais unos e humanos, devemos aprender a nos ouvir, ao invés de suprimir e reprimir a verdade que está tentando aparecer na superfície. O famoso psicólogo Carl Rogers diz o mesmo, quando fala do conceito de congruência, que significa estar em sintonia consigo mesmo e expressar adequadamente o significado na situação de ouvir. Finalmente, vamos precisar ouvir, se quisermos sentir a presença c o poder de Deus em nossas vidas. Isto requer o desejo de ser surpreendido por Deus e discernir sua palavra tornando-se clara de maneiras imprevisíveis, através do silêncio, das artes, da natureza e outros sinais dentro de nossa realidade.
COMO AJUDAR NA HORA DA DOR É bom, de inicio, refletirmos um pouco sobre qual o significado da doença, sobre o que ela provoca e, em seguida, como ajudar a pessoa que passa por essa experiência. A doença, em maior ou menor gravidade, é sempre uma lembrança de nossa mortalidade e fragilidade, é um momento de profunda sensibilidade. Ela nos mostra que não somos totalmente independentes e auto-suficientes, mas que dependemos uns dos outros. Sentir-se dependente não é uma sensação agradável. Não deixa á vontade quem depende e incomoda quem ajuda. Na maioria das vezes, essa experiência é sentida como uma crise. A doença faz-nos sentir o corpo. Isto não é nada agradável, mas é sofrimento. O sofrimento de não poder comer e beber, de não poder fazer o que se quer e de não poder ir aonde bem entender. A doença nos impede de trabalhar, nos tira do convívio familiar e dos amigos, nos isola. Qualquer doente sofre de solidão. Por mais que os outros se esforcem para compreendê-lo, ninguém sentirá o que ele sente. Além de todos esses sofrimentos, o doente, por vezes, tem de se defrontar com um ainda maior: o medo de morrer. Ninguém gosta de dizer adeus para ninguém, ainda mais quando é para sempre. Nunca estamos suficientemente preparados para este momento. Quando acontece, mesmo esperado, é sempre uma espécie de surpresa. Por mais fé que se tenha na vida eterna, a passagem é sempre dolorosa. Diante de todo esse quadro que a doença apresenta, o que nós podemos fazer para que as visitas aos enfermos sejam produtivas? Primeiramente, devemos confortar, desenvolvendo nossa habilidade de escutar. Ter ouvidos capazes de responder, comunicando compreensão, amor, solidariedade. Alguém já disse que temos dois ouvidos e uma boca, significando com isso que deveríamos ouvir duas vezes mais do que falamos. Na prática, parece que falamos mais do que ouvimos. É importante prestar atenção em não ser um visitador-repórter, que só faz perguntas para matar a curiosidade. Ouvir sim, não só com os ouvidos, mas também com os olhos, com as mãos, com o coração. Ouvir não somente o que é dito, mas principalmente o que não é dito e nem precisa ser verbalizado. Precisamos ser excelentes leitores da linguagem corporal. Ouvir é criar um clima em que as pessoas partilham o sentido de seus dias: os medos, esperanças, dores, desapontamentos e alegrias. Junto com o ouvir, é importante tornar-se irmão do doente; relacionando-se a partir de sua situação humana concreta, procurando responder às suas necessidades e não impondo as nossas. É fundamental respeitar os valores da pessoa. Muito fácil é assaltar a pessoa espiritualmente, impondo nossos valores. Propor sim, impor nunca! Junto com a capacidade de ouvir e ser irmão da pessoa no calvário de sua doença, devemos ser orientadores espirituais. Neste papel, é preciso que a gente perceba como o doente entende e interpreta a sua experiência de estar doente e como relaciona isto com sua fé em Deus. Neste contexto aparecem muitas visões, nem sempre cristãs, da doença, tais como: castigo ou punição, teste, destino, fatalidade, expressão de nossa finitude etc. Também surgem muitas visões de Deus: uns se sentem desapontados («sempre fui tão bom, por que Deus permite que isto aconteça comigo?»); outros, esquecidos («rezo tanto, mas ele não me
ouve!»); outros barganham («se eu melhorar, vou fazer muita caridade»); outros ainda se revoltam («se Deus é Pai, por que o sofrimento de seus filhos queridos?») e, finalmente, muitos aprofundam sua fé em Deus e retornam a ele («se não fosse minha fé em Deus, eu não teria escapado de morrer...» Aqui é importante trabalhar estas experiências, não reforçando a idéia de que Deus quer o sofrimento. O sofrimento, é muito difícil entendê-lo, muito mais explicá-lo. Podemos confirmar a fé onde ela está presente, desperta-la onde está dormindo e reforçá-la onde está crescendo. Um outro aspecto importante da visita é de facilitar o relacionamento do doente com o seu próprio mundo interior (ajuda-lo a se encontrar consigo mesmo), com sua família (a hora da doença é, muitas vezes, um momento de união para a família) e com a própria comunidade. Finalmente, não podemos esquecer o aspecto dos sacramentos e da oração. É bom ajudar o doente a oferecer a Deus suas preocupações, esperanças e medos. Rezar a partir desta situação de sofrimento. A oração adquire um aspecto profundo de vida. Os sacramentos - Eucaristia, Reconciliação, Unção dos Enfermos - são fonte de graça e saúde. Oferecê-los quando a pessoa estiver em condições de recebê-los. É levando em conta todos esses aspectos que podemos ser instrumentos de cura e solidários, sacramentos vivos de fraternidade. Para reflexão em grupo Partilhar as experiências positivas e as dificuldades encontradas na visita aos enfermos.
AÇÕES DE SAÚDE ALÉM DO HOSPITAL Dá-se se seqüência neste número à publicação dos textos elaborados pelo prof. Antônio Longato, coordenador de Atividades de Pastoral da Saúde e Saúde Comunitária dos Hospitais do Norte e Nordeste as Sociedade Beneficente São Camilo. Na edição anterior, a matéria foi publicada na página 4. Foi uma expert em saúde comunitária quem afirmou: “cuidar da saúde é mais importante do que cuidar da doença”. Esta é uma decorrência de elementos viciados colocados no início da construção do ser humano. Embora, por natureza, o homem seja limitado, Deus não cria imperfeições. Quem as faz é o próprio homem que, já no começo da vida, coloca os germes das futuras doenças, como o álcool , o fumo, os tóxicos, a sífilis, a fome etc. , que provocam má formação congênita. Cuidar, pois, da prevenção de futuras doenças é um trabalho de necessidade vital para a saúde do povo. Espalhar os conhecimentos mais elementares de saúde para uma população carente é uma tarefa humana e patriótica. Infelizmente, é com tristeza que vemos o nascer de muitas obras governamentais e particulares ficarem só no papel ou em campanhas publicitárias. Os Centros de Saúde Comunitária do Norte e Nordeste, da Sociedade Beneficente São Camilo, procuram semear os princípios de saúde nas pessoas, nos grupos, nos povoados e bairros. Agem em lugares os mais abandonados e se integram com outras entidades para uma ação mais profunda e eficiente. É um trabalho de difícil aceitação, pois quebrar tabus alimentares e higiênicos não é tarefa simples, embora de suma importância. O dr. David Morley, no artigo “O hospital na saúde comunitária”, sintetiza o nosso raciocínio, afirmando: “Todos os hospitais são erguidos nas comunidades e existem em função da comunidade. Entretanto, um número demasiadamente grande de hospitais continua a ignorar o que
acontece fora de suas paredes”. Em outro trecho, diz: “Nossa primeira tarefa não pode restringir-se à cura das doenças atuais de nossos pacientes, mas deve colocar ao seu alcance conhecimentos e serviços, de modo que possam ajudar-se a si mesmos” (“Saúde na comunidade – um desafio”, Edições Paulinas). Em alguns extratos de relatos feitos por diferentes centros de saúde de comunitária, orientados pela SBSC no Norte e Nordeste, o leitor poderá ter idéias do que neles se faz e com que resultados. Em Balsas, MA, diz a coordenadora de Saúde Comunitária local, Berenice O. Miranda, que se trabalha basicamente com a população dos bairros e interior, “pessoas de nível sócio-econômico muito baixo, com muita miséria, fome e doenças causadas por este desnível , principalmente entre menores de cinco anos”. O número de mortes de crianças por desnutrição é muito grande no primeiro ano de vida. Revela Berenice que “a maioria do pessoal é analfabeta, não tem emprego, pão nem teto. Quase todas as famílias têm elevado número de filhos. Os maridos, por falta de terra e trabalho, vão para outros Estados, à procura de melhorias nos garimpo, fazendas etc. Muitos não voltam, ficando a cargo da mulher a responsabilidade dos filhos. Suas casa, quando as têm, são pequenas e feitas de palhas, em sua grande maioria. Há falta de energia elétrica nos bairros, de água tratada e de saneamento básico. O povo veio do interior, deixando a terra agregada dos patrões”. Diz ainda Berenice que a situação do pessoal do interior é basicamente a mesma, com a diferença de que alguns têm atividade na terra, plantando o suficiente para comer. Vindo para a cidade, piora a sua situação e a dos bairros, pois é aí que ficam alojados, sem emprego e casa, com alimentação insuficiente, gerando-se assim doenças que levam à morte. Conclui a coordenadora de Saúde Comunitária de Balsas: “o trabalho é feito sem apoio de outros órgãos, apesar de vários pedidos oficiais, ficando a nosso encargo (paróquia e hospital) a responsabilidade do mesmo”. De Grajaú, MA, Maria Isabel Costa, também coordenadora, informa que Formosa, Alto Brasil Barraca e Sítio do Meio, comunidades atendidas pelo serviço, distam 120 quilômetros de Grajaú, e tiveram dias 9 a 11 de março, para uma ação em conjunto. Em outra comunidade, como Dom Pedro e Presidente Dutra, a 300 quilômetros de Grajaú, também se realizou o mesmo trabalho. E ele dá resultados gratificante, informa Maria Isabel, Exemplificando com o caso de Enoc, um prematuro que nasceu com 1.200 gramas apenas. “Uma líder da Pastoral, dona Nayde, assumiu Enoc como seu próprio filho. Foi orientada sobre como deveria cuidar dele. Nayde e a mãe de Enoc se empenharam e envolveram toda a comunidade, onde 24 mães se propuseram a doar leite materno diariamente. Assim , com dedicação, amor e carinho de dona Nayde e da mãe, Enoc é, hoje, um menino gordinho, de 7 quilos, feliz e satisfeito. É importante ressaltar que Enoc não foi hospitalizado, apesar de seu peso ínfimo”. Em Itapipoca, CE, o trabalho também mostra resultados apreciáveis. Na linha de orientação , desenvolvem-se palestras para puérperas sobre alimentação , aleitamento materno, cuidado higiênicos com o bebê, curativos higiênicos com o bebê, curativos do umbigo, banho de sol e planejamento familiar. Na pediatria, cuidados para se evitar a diarréia, indicação do leite materno como o melhor alimento e remédios para as crianças pequenas, conseqüências do fumo, ensinamentos sobre verminoses etc. Enfatiza-se sempre que o hospital funciona como órgão público e a ele não cabem somente os cuidados da equipe hospitalar, mas de todo o povo, para que seja bem preservado. O relatório indica também que foram preparadas duas atendentes, nas clínicas cirúrgicas e pediátricas, com aulas e estágios durante três meses seguidos. Quanto à resposta do povo, diz a coordenadora local que “nosso trabalho vem sendo bem aceito e estamos sentindo que está abrindo a visão de muita gente. Com o uso de remédios caseiros para os pacientes internados no hospital, estamos fazendo com que o povo acredite mais ainda na
cura por meios naturais”. E conclui: “Conseguimos diminuir o índice de mortalidade infantil, que era quase freqüente na pediatria. Estes são os frutos que já estamos colhendo e fazem com que nos empenhemos cada vez mais na luta pela defesa da vida. Também é uma maneira de ajudar nosso irmão a libertar-se do comodismo e não permitir que multinacionais se enriqueçam à custa da saúde do povo”.
VOCAÇÃO E MISSÃO DOS LEIGOS No Sínodo dos Bispos, em 1987, foi apreciado um documento, intitulado Christifideles Laici, discorrendo sobre a vocação e missão dos leigos na Igreja. No texto, os leigos são comparados aos trabalhadores da vinha, de que fala o Evangelho de Mateus, no capitulo 20, versículos 1 e 2 («11 Reino dos Céus é semelhante a um proprietário, que saiu muito cedo, a contratar trabalhadores para sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e mandou-os para a vinha»). Nos vários aspectos abordados pelo documento, o Sínodo contemplou especificamente, nos itens 53 e 54, temário especial para os profissionais da saúde e agentes de Pastoral. Esses tópicos dão ensejo a que se reflita, com muito proveito, sobre a verdadeira e gratificante vocação e missão dos profissionais e agentes. 53 - Doentes e atribulados – O homem é destinado á alegria, mas todos os dias experimenta variadíssimas formas de sofrimento e de dor. Na sua mensagem final, os padres sinodais dirigiramse aos homens e as mulheres atingidos pelas mais diversas formas de sofrimento e de dor com estas palavras: «Vós, os abandonados e marginalizados pela nossa sociedade de consumo, doentes, deficientes físicos, pobres, famintos, emigrados, refugiados, prisioneiros, desempregados, crianças abandonadas, pessoas sozinhas e idosas; vós, vitimas da guerra e de toda espécie de violência da nossa sociedade permissiva: a Igreja participa do vosso sofrimento que conduz ao Senhor, que vos associa á sua Paixão redentora é vos faz viver à luz da sua Ressurreição. Contamos convosco para ensinar ao mundo inteiro o que é o amor. Faremos tudo o que nos é possível para que encontreis o lugar a que tendes direito na sociedade e na Igreja». No contexto de um mundo tão vasto como é o do sofrimento humano, consideramos em especial os que são vitimas da doença nas suas diversas formas: com efeito, os doentes são expressão mais freqüente e mais comum do sofrer humano. A todos e a cada um se dirige a chamada do Senhor: também os doentes são mandados como trabalhadores para sua vinha. O peso que fatiga os membros do corpo e que perturba a serenidade da alma, em vez de os impedir de trabalhar na vinha, convida-os a viver sua vocação humana e cristã e a participar do crescimento do Reino de Deus com modalidades novas e mesmo preciosas. As palavras do apóstolo Paulo devem tornar-se o seu programa e, ainda mais, a luz que faz brilhar aos seus olhos o significado de graça da sua situação: «Completo na minha carne o que falta á Paixão de Cristo, em favor do seu corpo, que é a Igreja» (Cl 1,24). Precisamente ao fazer tal descoberta, o apóstolo encontrou a alegria: «Por isso, alegro-me nos sofrimentos que suporto por vossa causa» (Cl 1,24). Do mesmo modo, muitos doentes podem tornar-se veículos da «alegria do Espírito Santo em muitas tribulações» (1Ts 1,6) e ser testemunhas da Ressurreição de Jesus. Como afirmou um deficiente físico na sua intervenção na aula sinodal, «é de grande importância sublinhar o fato de que os cristãos que vivem em situações de doença, dor e velhice não são convidados por Jesus apenas a unir a sua dor à Paixão de Cristo, mas também a receber
desde já em si mesmos e a transmitir aos outros a força da renovação e a alegria de Cristo Ressuscitado (cf. 2Cor, 4, lo-11; lPd 4,13; Rm 8,18ss). De sua parte - como se lê na Carta Apostólica Salvificio Doloris -, a Igreja, que nasce do mistério da Redenção na Cruz de Cristo, deve procurar encontrar-se com o homem, de modo especial na estrada do seu sofrimento. Nesse encontro, o homem «torna-se o caminho da Igreja», sendo este um dos caminhos mais importantes. Ora, o homem que sofre é caminho da Igreja, por ser, antes de mais, caminho do próprio Cristo, o bom samaritano que «não passa adiante», mas «se compadece, aproxima-se... liga-lhe as feridas... e cuida dele» (Lc 10,32-34). A comunidade cristã continuadamente escreve, de século em século, na imensa multidão das pessoas que estão doentes e que sofrem, a parábola evangélica do Bom Samaritano, revelando e comunicando o amor de Jesus Cristo que cura e consola. Fê-lo mediante o testemunho da vida religiosa consagrada a serviço dos doentes e mediante ação incansável de todos os agentes de saúde. Hoje, também nos próprios hospitais e casas de saúde católicos, geridos por pessoal religioso, torna-se cada vez mais numerosa, e por vezes até total e exclusiva, a presença dos fiéis leigos, homens e mulheres eles mesmos, médicos, enfermeiros, agentes de saúde, voluntários, são chamados a tornar-se imagem vida de Cristo e da sua Igreja no amor para com os doentes e os que sofrem; 54 - Ação pastoral - E necessário que esta preciosíssima herança, que a Igreja recebeu de Jesus Cristo,«médico do corpo e do espírito», não só não esmoreça, mas se valorize e enriqueça cada vez mais com a recuperação e o decidido arrojo de uma ação pastoral em favor dos doentes e dos que sofrem. Deve ser uma ação capaz de garantir e promover atenção, proximidade, presença, escuta, diálogo, partilha e ajuda concreta ao homem, nos momentos em que, por causa da doença e do sofrimento, são postas á prova não só a sua confiança na vida, mas também a sua própria fé em Deus e no seu amor de Pai. Este esforço pastoral tem sua expressão mais significativa na celebração sacramental com e em favor dos doentes, como fortaleza na dor e na fraqueza, esperança no desespero, lugar de encontro e de festa. Um dos objetivos fundamentais desta renovada e intensificada ação pastoral - que não pode deixar de envolver, e de forma coordenada, todos os componentes da comunidade eclesial - é considerar o doente, o deficiente físico, o que sofre, não simplesmente objeto do amor e do serviço da Igreja, mas sim sujeito ativo e responsável da obra de evangelização e de salvação. Nesta perspectiva, a Igreja tem uma boa nova a dar no seio da sociedade e da cultura que, tendo perdido do sofrer humano, «censuram»todo o discurso sobre essa dura realidade da vida. E a boa nova consiste no anúncio positivo para o homem e para a própria sociedade, chamado, como è, a tornar-se uma forma de participação no sofrimento salvífico de Cristo e na sua alegria de Ressuscitado e, portanto, uma força de santificação e de edificação da Igreja. O anúncio dessa boa nova será crível, quando não ficar simplesmente nos lábios, mas passar para o testemunho da vida, tanto em todos aqueles que com amor cuidam dos doentes, dos deficientes físicos, dos que sofrem, como nestes mesmos, tomados cada vez mais conscientes e responsáveis do seu lugar e da sua missão na Igreja e para a Igreja. A renovada meditação da Carta Apostólica Salvifici Doloris, de que recordamos as linhas conclusivas, poderá ser de grande utilidade para que a «civilização do amor» consiga dar flores e nos mil frutos no vasto mundo da dor humana. E preciso, portanto, que aos pés da cruz do Calvário se juntem idealmente todos os que, sofrendo, acreditam em Cristo e, de modo particular, aqueles que sofrem por causa da sua fé nele, que foi crucificado e que ressuscitou, para que a oferta dos seus sofrimentos apresse o cumprimento da oração do mesmo Salvador pela unidade de todos (cf. Jo 17,11-22).
Juntem-se lá também os homens de boa vontade, pois na cruz está o «Redentor do Homem», o Homem das Dores, que carregou em si os sofrimentos físicos e morais dos homens de todos os tempos, para que no amor possam encontrar o sentido salvador do seu sofrimento e as respostas válidas para todas as suas interrogações. Com Maria, Mãe de Cristo, que estava ao pé da cruz (Jo 19,25), nos detemos junto de todas as cruzes do homem hoje... E pedimos a vós todos os que sofreis que nos apoieis. Precisamente a vós, que sois fracos, pedimos que vos tomeis uma fonte de força para a Igreja e para a humanidade. No terrível combate entre as forças do bem e as do mal, de que nos dá espetáculo o nosso mundo contemporâneo, vença o vosso sofrimento em união com a cruz de Cristo. Como se pode ver, o discurso da Pastoral da Saúde, e sobretudo do ICAPS, vem de encontro ás conclusões do Sínodo de 87. Torna-se cada vez mais necessária a conscientização de todos os batizados, para uma convivência harmônica. Retomemos a imagem bíblica da videira e dos ramos. Ela leva-nos, de forma imediata e espontânea, á consideração da fecundidade e da vida. Radicados e vivificados pela videira, os ramos são chamados a dar frutos: «Eu sou a videira e vós, os ramos. Quem permanece era mim e eu nele dá muito fruto»(Jo 15,5). Dar fruto é uma exigência essencial da vida cristã e eclesial. Quem não dá fruto não permanece na comunhão:«Toda a vide que em mim não dá fruto (o meu Pai) corta-a» (Jo 15,2). A comunhão representa a fonte simultaneamente, o fruto da missão: a comunhão é missionária e a missão é para a comunhão. O Senhor confia aos fiéis leigos, em comunhão com todos os outros membros do povo de Deus, uma grande parcela de responsabilidade. «Os sagrados pastores conhecem, com efeito, perfeitamente quanto os leigos contribuem para o bem de toda a Igreja. Pois eles próprios sabem que não foram instituídos por Jesus Cristo para se encarregarem por si sós de toda a missão salvadora da Igreja para com o mundo, mas que o seu cargo sublime consiste em pastorear de tal modo os fiéis e de tal modo reconhecer os seus serviços e carismas, que todos, cada um segundo o seu modo próprio, cooperem na obra comum» (ibid,30). Não è nenhum exagero dizer-se que toda a existência do fiel leigo tem por finalidade levá-lo a descobrir a radical novidade cristã que promana do Batismo, sacramento da fé, a fim de poder viver as suas exigências segundo a vocação que recebeu de Deus. Para descrever a figura do fiel leigo, vamos agora considerar de forma explícita e mais direta, entre outros, estes três aspectos fundamentais: o Batismo regenera-nos para a vida dos filhos de Deus, une-nos a Jesus Cristo e ao seu Corpo que è a Igreja, unge-nos no Espírito Santo, constituindo-nos templos espirituais. Finalizando: torna-se urgente o aprofundamento da Pastoral da Saúde, sobretudo da comunhão entre os irmãos para um profícuo trabalho em prol da vida e da saúde, com o grande dom que Deus nos deu, que é a vida.
CORRIGIR O TEMPO? Hubert Lepargneur O tempo tem a ver com a vida moral, desde que somos agentes históricos, como diz nossa gíria; ele se relaciona ainda mais com a espiritualidade ( como vivenciar o tempo interior? ) e com a saúde ( como gerir o tempo biológico?). Neste último campo, o tempo faz crescer e permite
corrompe, fere e mata. Haveria, portanto, bastante para refletir dentro do triângulo tempo, ética e saúde. É um lugar comum reparar que nossa época, em comparação às anteriores, evita considerar a morte. Não constitui, esta atitude, uma seqüência lógica numa civilização que se distancia do religioso, mais preocupada em promover uma imagem atraente do presente que se tem? A moderna comunicação por imagens favorece, por razões estéticas, comerciais e de cultura secular, a divulgação do belo, do jovem, do forte. É isto que atrai; portanto, é isto que se vende. E nós, que freqüentamos hospitais e asilos, enfrentamos antes o feio, o velho, o fraco. Destarte, o hospital não é a melhor vitrina duma sociedade, embora nem as oficinas de conserto deixem de se modernizar, porque seus serviços são indispensáveis. Como estranhar que a ética da sombra e da crise nem sempre se apareça com a ética da praia e da festa? A ética sanitária sabe situar-se dentro de seu contexto real, sem fazer do feio, do velho e do fraco ideais que não são; descobre, antes, os valores que esta situação pode favorecer. Conhecemos a palavra de São Paulo sobre o homem interior (ele, nós) que se edifica, enquanto o ser exterior ( como disse o Apóstolo), o ser psico-biológico (como se diria hoje), se deteriora. Não se antecipou sobre a exata tarefa do agente pastoral sanitário? Introduzir beleza onde a natureza ou qualquer ocorrência falhou, insuflar vida, esperança, força, quando os recursos biológicos declinam, parece lutar na contramão do tempo; será corrigi-lo? Os Jogos Olímpicos ofereceram um cenário de destaque para comparar o super-homem promovido (belo, jovem, forte) não apenas com o cidadão comum, mas ainda com o futuro de não poucos destes superatletas, oportunidade aliás aproveitável apenas por iniciados dos bastidores da saúde olímpica. O próprio fundador, involuntário, da maratona não morreu ao chegar, entregando a saúde com a mensagem? Destacamos a questão moderníssima do doping, último tabu do mundo esportivo e portanto, menos simples que certas informações notificadas sobre a desqualificação do sprinter e bode expiatório Bem Johnson. Lado uso – Não se faz mais um atleta com arroz-feijão, como antigamente. Biologista e médicos esportivos, o dr. Fr. Bollocq afirma qur todos os esportes são atingidos pelo doping e que os controles são inadaptados : “Na maioria dos países em competição, os esportivos são preparados para serem negativos nos dias de controle; o sistema os protege durante o resto do tempo. Um suplemento hormonal artificial (anabolismo, corticóides, testerone sob controle médico) é doravante indispensável a fim de compensar os enormes desperdícios de seis horas de treino intensivo diário e permitir uma luta com armas iguais”. Não mensionamos esta postura para assumir uma posição técnica em ética esportiva, mas para lembrar a importância da informação atualizada antes de repetir juízos éticos válidos em antigos contextos. Lado Abuso – O espaço falta para evocarmos sequer o pouco que conhecemos das enfermidades dos ex-campeões drogados. Na URSS, em 1986, Youri Vlassov (ex-campeão de halterofilia), presidente as federação soviética de sua especialidade, decidiu excluir 35 halterófilo qu eusavam doping; foi logo substituído. Entre ex-atletas suicidas, prematuramente mortos ou gravemente enfermos, mas conhecidos: K. Andersen (Dinamarca), K.O. Kangasniemi. (Finlândia), R. Rysslaere (Bélgica), J. Farago (Hungria), D. Singh (Grã-Bretanha), B. Dressel ( República Democrática Alemã) etc. e os desconhecidos. De qualquer maneira, a perspectiva da ação em contexto sanitário é obviamente dupla: frear o efeito corruptor do tempo (ou reverter processos danosos reversíveis) e desenvolver a força latente do espírito, na medida em que vem se afirmando sua independência da matéria. Com razão, vão acrescentar: é mais fácil dizer do que fazer. Além do mais, aceitar trabalhar, lúcida e solidariamente, num setor da vida humana que não é valorizado enquanto não ostenta particularmente o belo, o jovem e forte. Nem sequer a alta
tecnologia médica está nas mãos do simples agente pastoral. O campo da AIDS fornece exemplo da rapidez com que pode perder o sustento que a sociedade proporciona ao belo, jovem e, portanto, produtivo, na hora em que se passa pelo outro lado. A ética cristã pede, com efeito, reação aos movimentos espontâneos criticáveis. Corrigir nossa época? Corrigir o tempo? São Paulo prefere falar em «redimir o tempo».