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A Solidariedade de Presença Uma das preocupações presentes nas pessoas que visitam os doentes é o que dizer. Existem frases prontas e repetidas que, proferidas com o objetivo de ajudar a pessoa que sofre, na verdade mais conforta quem está falando. Mais do que aliviar as dores do outro, busca um alívio para o próprio desconforto pessoal (“pimenta nos olhos do outro é colírio no seu”). Entre as muitas expressões utilizadas, selecionamos dez mais comuns, e um agente de Pastoral consciente terá muito cuidado em servir-se delas: É vontade de Deus (Deus sabe o que faz). É muito fácil dizer isso. A expressão corta qualquer possibilidade de comunicação. Talvez seja difícil para nós sentirmo-nos impotentes diante de um sofrimento, uma perda. Então responsabilizamos Deus. O que dizer para uma mãe que perde seu filho atropelado por um motorista bêbado? É vontade de Deus? Este é o caminho certo para levar as pessoas a se revoltarem contra Deus. Seria mais honesto reconhecer que não compreendemos o porquê de certos sofrimentos. Deus dá somente o que podemos suportar. Uma versão popular deste dito é “Deus dá o frio conforme o cobertor”. Como podemos dizer com certeza que é esta a forma como Deus age? Nem sempre é tão fácil de se saber ou descobrir o que Deus quer de nós em situações de sofrimento. Deus prova aqueles que ama. De fato, esta expressão está na Bíblia, no Antigo Testamento. Muitos dizem “como o ouro se purifica no cadinho... assim você no sofrimento”. Este pensamento facilmente reflete a imagem de um Deus sadomasoquista, que se alegra com os sofrimentos de seus filhos. Santa Teresa Dávila, uma grande Doutora de Igreja, já disse: “Se esta é a maneira que ele trata os seus amigos, não me admiro que tenha tão poucos...” Deus escreve certo por linhas tortas. Há quem diga que existe uma razão para tudo. Estas expressões podem trazer à tona idéias de predestinação, bem como soluções e explicações para o sofrimento na base da aceitação passiva, isto é, resignação a um destino já traçado, do qual não podemos sequer pensar em escapar. Isto pode levar a pessoas a se revoltar e posicionar-se defensivamente, pois sua liberdade foi ferida. Pode existir uma razão, mas com que certeza podemos afirmar categoricamente que é assim? Coragem, você tem de se forte. Este pensamento na verdade quer transmitir otimismo, mas em muitas circunstâncias pode levar a uma negação dos sentimentos do doente. Se a pessoa tem fé, então a lógica é que a pessoa não pode queixar-se, revoltar-se etc. Trata-se aqui de negar a humanidade. Negam-se os sentimentos, as emoções e a própria humanidade de Jesus. É bom lembrar que a fé ajuda a viver e conviver, mas não é seu objetivo primeiro eliminar o sofrimento. “Jesus, cura, aleluia”. Sim, Jesus curou muitos doentes, restituiu a saúde a cegos, coxos, mudos e paralíticos, como nos é relatado nos evangelhos. Não é sabedoria negar a realidade da doença. Milagres acontecem, sim, mas não somos nós que temos o poder de realiza-los. Esta questão é com Deus, podemos na verdade ser seus instrumentos. Muitas vezes, a promessa da cura fácil é uma forma de o agente se proteger ou mesmo negar a realidade do sofrimento do outro e não estar com ele na Sexta-Feira da paixão (dores, sofrimentos, medos, insegurança). Pula-se logo para o Domingo da Ressurreição (saúde, festa alegria etc). Nega-se, assim, uma faceta do mistério pascal, que é eito da Sexta-Feira Santa e se fica somente no Domingo da Ressurreição. Só quem está com a pessoa no dia do sofrimento descobre a verdadeira alegria para celebrar e proclamar a Ressurreição.


É preciso sofrer muito para ganhar o céu. É bom lembrar que Jesus não veio até nós para nos ensinar a sofrer, mas como amar e viver em fraternidade. O sofrimento é uma realidade que está aí. Faz-se presente na pobreza, no desemprego, na favela, na fome, na perda de alguém querido etc. Na grande maioria, é o próprio homem o causador do sofrimento. Mas e o sofrimento do inocente? Sim, é um mistério, difícil de entende-lo e muito mais de explica-lo. Trata-se de um encontro difícil com a nossa imperfeição humana. O sofrimento está aí não para ser explicado mas para ser eliminado. Não podemos nos conformar passivamente que o mundo é “um vale de lágrimas”, mas o caminhar para a terra prometida da alegria, da esperança e da saúde. Você não morre até que não chegue a hora. Outras expressões utilizadas são: “Finalmente descansou”; “graças a Deus, oi melhor para ele”; “Deus levou”. Estas expressões podem provocar sentimentos fortes no senti que Deus rouba pessoas queridas. É verdade que são eufemismos que suavizam a dureza cruel de uma realidade profunda da vida, que é a morte. Nos bastidores do hospital, fala-se em “alta celestial”. Com o tempo passa, não se preocupe. Na verdade, não é tempo que cura as feridas, mas o que na verdade ajuda e é fator de cura interior é o que fazemos com o tempo. Nesta perspectiva, é o remédio , o tratamento, a fé, o amor, a reconciliação, o envolvimento em atividades voluntárias, tudo isto é fonte de cura. Por si só, o tempo é neutro. Onde existe vida existe esperança. Positiva em si mesma, esta expressão pode justificar um tratamento continuado que, por vezes, mais que preservar vida, prolongar sofrimento inúteis. O fato é que, onde existe vida, existe também desespero, revolta, tristeza, dor etc. O otimismo exagerado pode comprometer a realidade dos fatos. A esperança faz com que até o momento da morte se transforme numa realidade de vida nova. A esta altura podemos nos perguntar: o que dizer então? É difícil saber exatamente se não conhecemos a pessoa. Não existe uma fórmula mágica, infalível. Mais fácil é tomar consciência do que não se deve dizer, comentários tais como: Nossa, como você emagreceu... você está amarela...nunca devem ser utilizados. Geralmente o que não gostaríamos de ouvir, não deveríamos dizer aos outros. Cada situação é completamente diferente da outra, bem como cada pessoa é totalmente original. Não podemos dizer ou ler a mesma coisa para todos, como se todos estivessem sentindo ou passando pela mesma situação. A criatividade do amor nos faz ver o que é mais conveniente e apropriado em cada circunstância. O mais importante é ser presença viva do amor de Deus. O silêncio é uma forma profunda de comunicação e respeito. Na hora do sofrimento, dificilmente lembramos o que as pessoas dizem, mas quem esteve ou não presente. Neste processo de comunicação, o doente não é simplesmente objeto de nossa ação pastoral, mas sujeito que também nos evangeliza. PARA REFLETIR EM GRUPO 1. Como nos comunicamos com os doentes? 2. Por que o mais importante é estar presente e não simplesmente saber ou não o que dizer? 3. Partilhar as alegrias e dificuldades encontradas nas visitas.


Entre por esta porta entreaberta Este não é um livro para se ler apressado, embora o tempo se escoe rápido assim que você conhecer as primeiras páginas. E o relato muito pessoal de alguém que passou por uma rara experiência. Igualmente, não é um texto onde se deva procurar apuro de linguajem, rebuscadas construções literárias e devaneios poéticos. É vida, e vida sofrida, um tanto em meio a mil incertezas, outro tanto em disposição para enfrentar um futuro em que poucos apostavam. É assim este «Porta entreaberta», escrito com o coração por Maria Beatriz Brescia Zuliani, uma quintanista de Medicina, prestes a formar-se e próxima do casamento, que viu ruírem não apenas os seus sonhos, mas a própria vida, ao entrar em coma, aos 22 anos de idade, em maio de 1979. O livreto é desses que se devoram: quem inicia a leitura quer chegar a fim, não motivado pela curiosidade de saber no que deu a extraordinária luta dessa moça por sua própria vida, mas como e porque, contra todas as evidências, ela buscou viver. E viver para enfrentar mil lutas, que muitos assinalavam perdida antes mesmo de iniciada. Não há como tentar fazer um resumo de seu relato, todo pessoal, intimo, revelador. «Porta entreaberta» è para ser lido e meditado por quem deseja conhecer a heróica batalha travada por Bia - seu apelido familiar - para sobreviver. É uma confissão, mas sem pieguismo, uma volta ao período difícil de alguns anos, em busca da recuperação, desprovida a narrativa de sentimentalismos estéreis. Maria Beatriz não é católica. Importa pouco que seja. Mas encontrou na oração segundo seu próprio relato - «a maior arma para traduzir meu pensamento lógico e daquilo que estudava». Deve ter orado muito, e com toda a sua alma, refazendo a caminhada de sua vida, para reaprender a andar, falar, ler, escrever e até ver, embora o problema de saúde, originador de seu coma, não lhe tivesse tirado de todo a visão. Há no livreto de Maria Beatriz lições a aprender. E muitas. As dadas por ela própria, seus familiares e profissionais de saúde que com ela conviveram e a estimularam no processo de retorno á vida. Mas há principalmente a própria Maria Beatriz, que não se deixou abater pelo infortúnio e soube buscar em si mesma as forças para o seu hoje de esposa e mãe, que ainda luta para «caminhar sem medo – uma obrigação nossa porque estamos vivos», como afirma. Embora a autora afirme haver escrito para que sua história «sirva de alerta e consolação para aqueles que se arriscam de vários modos, desprezando a saúde física e mental» e, ainda, para contribuir para o conhecimento da situação vivida por quem escapa ao coma, ela faz muito mais. E abre uma porta a quem se encontra nesse limiar nebuloso entre a vida e a morte – uma situação real para qualquer um de nós. E deixa, desde as primeiras linhas do que escreveu, a grande lição: «Honestamente creio em Deus. Seu caminho nunca se fechou, bem como minha esperança nunca terminou. Ele sempre acreditou em sua obra, e eu sou também sua obra. O céu sorriu muitas vezes e nunca me esqueceu». Será difícil encontrar o livreto de Maria Beatriz em livrarias. Por isso, se indica o endereço da própria autora: rua Sabará, 210, apto. 144, Bloco B, São Paulo, SP, 01239.


Ação Dirigida às Gestantes No Norte e Nordeste do País, há uma preocupação especial na formação de parteiras e treinamento das que já exercem essa atividade, como curiosas. É o que dá conta Antônio Longato, coordenador de Atividades de Pastoral da Saúde Comunitária dos Hospitais do Norte e Nordeste da Sociedade Beneficente São Camilo. Torna-se difícil aos brasileiros moradores em cidades dos Estados mais desenvolvidos do Pais imaginar as dificuldades vividas nas regiões do interior do Norte e Nordeste brasileiros, no que se refere ás questões da saúde. Especialmente em relação aos problemas de gestação, parto e primeiros meses de vidas crianças, são muitos os tabus a vencer, tão arraigados estão na cultura popular hábitos alimentares, receios infundados e temores absurdos, que comprometem o desenvolvimento infantil e afetam igualmente a saúde das mães. Por isso, é exatamente nos albores da vida que os Centros de Saúde Comunitária e Hospitais da Saciedade Beneficente São Camilo no Norte e Nordeste se aplicam com particular empenho. A formação de parteiras leigas e rurais é considerada de suma importância.- Isso significa propiciar-lhes conhecimentos técnicos e científicos que evitem mortes prematuras, ainda comuns nessas regiões. Busca-se, assim, capacitá-las a prestar melhor assistência á população feminina, no pré-natal, partos, puerpério e no atendimento aos recém-nascidos, para reduzir os riscos materno-infantis. Observa-se que cresce a conscientização nesse particular, por parte das parteiras e curiosas. Um dos relatórios acentua: «Damos palestras todos os dias, nas enfermarias, para grupos de 14 e até 20 puérperas, soÍ1re alimentação e repouso no puerpério, asseio das mamas, aborto, planejamento familiar ou espaçamento dos filhos, vantagens do leite materno, como evitar diarréias, alimentação da mãe para aumento do leite materno etc. «Inicialmente, a conversa é informal. A partir das informações que colhemos, surge o assunto do dia. Já conseguimos que mães que nunca amamentaram ou cujos filhos morriam de diarréia agora amamentem seus filhos, que se livram de doenças e passam a ter ótimo desenvolvimento. O acompanhamento da mãe e da criança é fundamental para esse desenvolvimento. Com o pré-natal, estamos atingindo uma grande massa dessa população carente e sem informação. Esse trabalho está crescendo a cada dia. » Outro relatório revela que, por vezes, é preciso agir até com aparente rudeza. Como se lê: «O trabalho, além do costumeiro, foi sobre aleitamento materno, no qual se pôs mais ênfase. Algumas parteiras dizem que só aceitam fazer o parto quando a gestante já tem feito consulta com o médico, e este diz que está tudo bem. Interrogam as mães para saber se vão aceitar e cumprir as determinações dadas por elas, como alimentar-se sem os costumeiros tabus e se o nenê irá tomar leite do peito pelo menos por seis meses. Se a mãe não cumprir essas determinações, pode providenciar outra parteira. Só assim aceitam fazer o parto. Trabalhos como esses vale a pena continuar fazendo, pois as parteiras sentem necessidade dele.» Por vezes, também há revezes a admitir. Como assinala um outro relatório, que ressalta a vingança da natureza contra quem a ofendeu. Eis o relato: «Em nosso trabalho de pastoral, deparamos com muitas situações dramáticas e desumanas, onde é deixado de lado o amor à própria vida. Iniciando o mês de agosto, chegou uma primípara em nosso hospital, na qual fora feito um parto cesariano, de que nasceu uma criança do sexo feminino, pesando 3,800 quilos, com estatura de 50 centímetros. A mesma, apesar de ter uma estatura normal, era anencéfala, sem a mínima


condição de sobrevivência. E a gente questionava: Será erro da'natureza? Será que Deus permitida um fato desses? «Aguardamos conversar com a mãe. Segundo informações dela, quando tomou conhecimento de que estava grávida, deu a noticia para o namorado. Foi quando ficou totalmente abandonada por ele. Desesperada, sem ter o que fazer e sem mãe para lhe dar algum apoio, não sabendo assumir o filho sozinha, com um mês e poucos dias, começou a tomar drogas e injeções, até o quarto mês, para provocar o aborto. Tudo quanto suas amigas lhe ensinavam, ela tomava. Mas nada resolveu seu desespero. A criança, que ainda era feto, resistiu até quatro dias depois de seu nascimento, sem alimentar-se, pois não conseguia deglutir. Sentia choques constantes como quando era atingida por drogas, no ventre da mãe. «A mãe foi conscientizada do que tinha feito e lhe fizemos um apelo para nunca mais tomar tão cruel decisão. Também lhe pedimos para nunca aconselhar ninguém a cometer um crime dessa natureza.» Até hoje, já se formaram nos hospitais da Sociedade Beneficente São Camilo do Norte e Nordeste mais de dois mil agentes de saúde e parteiras leigas, que agora atuam em suas comunidades. Os agentes de saúde, no término de cada curso, também recebem uma maleta contendo o material básico para sua atuação, com equipamentos simples, medicamentos etc. As parteiras são verdadeiros anjos enviados aos lugares mais distantes, para prestação de serviços inestimáveis, em comunidades onde acontecem fatos que, para nós, das cidades grandes, parecem inverossímeis. E alguns até curiosos: relatou, por exemplo, a coordenadora de Santarém que uma parteira, moradora na selva amazônica, foi solicitada a fazer o parto de uma... vaca. E se deu muito bem. AIDS e Aborto Não há consenso entre juristas e médicos a propósito da conceituação do aborto. As divergências têm início quanto ao emprego correto do vocábulo. Há os que defendem a utilização da palavra abortamento, entendendo ter mais significado técnico do que aborto, pois aquela indica a conduta de abortar; esta o produto morto ou expelido. Apesar dessa discordância, prevalece a expressão aborto na legislação em vigor. No sentido etimológico, a palavra aborto provém de “ab”, que significa privação,e de “ortus”, nascimento. Sinteticamente, aborto, consiste na interrupção do produto da concepção.É a morte do ovo, embrião ou feto. Para fins de situar a matéria em exame, vale destacar didaticamente as espécies de aborto, a seguir relacionadas. Aborto acidental – Advém de traumatismo, independe de culpa ou dolo e é, portanto, impunível. Aborto legal ou consentido – Há duas formas de aborto legal: a) aborto necessário ou terapêutico, quando praticado por médico, para salvar a vida da gestante; b) aborto sentimental ou humanitário, permitido para a mulher vítima de estupro, com suporte no argumento de não se afigurar humano impor-lhe trazer nas entranhas um ser que não foi gerado pelo amor e que só recorda o momento de pavor vivido, como desumanos também constituirão as obrigatoriedade de alimentar e criar ente. Aborto eugenésico – Ocorre esta espécie quando há sério e grande perigo para o filho, seja em virtude de predisposição hereditária, seja por doença da mãe durante a gravidez, seja ainda por efeito de drogas por ela tomadas, no evoluir desse período, tudo


podendo acarretar, para aquele, enfermidades psíquicas ou corporais e deformidades, entre outros distúrbios. Não é esse aborto admitido por nossa lei. Aborto social ou econômico – Cogitado em casos de família numerosa, para não agravar a situação social. Também não dá previsão legal específica para essa prática. Objetividade jurídica Vários diplomas legais em nosso país tutelam a vida em formação ou elaboração. A Constituição – Não há como deixar de considerar, em primeiro lugar, o direito à vida, inato e fundamental, pois dele dependem todos os demais, como o aproveitamento de qualquer bem. Daí a nossa Carta Magna ressalva-lo no Artigo5º. Partindo desse preceito, sem dúvida o aborto é considerado crime na lei maior. Entretanto, os defensores da discriminação da prática de aborto encontram no Artigo 226, parágrafo 7º, dessa Constituição, a brecha para a argumentação favorável ao aborto voluntário, pois o texto aventa a possibilidade de o planejamento familiar ser livre decisão do casal. Também, os partidários do aborto propugnam que essa prática deve ser realizada pela rede pública de serviços de saúde nos âmbitos federal, estadual e municipal, invocando o Artigo 196 da Constituição, segundo o qual a saúde é um direito de todos e um dever do Estado. Código Civil – Diante do Direito Civil, o feto é considerado expectativa de ente humano, pois na proteção dos superiores interesses individuais e sociais o direito nem sempre se vincula a conceitos biológicos. Nessa linha, o Código Civil põe a salvo direito do nascituro, ressalvando situações em que o infans cenceptus apresenta-se como pessoa: a) Artigo 353 – legitimação de filho apenas concebido; b) Artigo 375, parágrafo único – reconhecimento de filho antes de nascer; c) Artigo 462 – curatela de nascituro; d) Artigo 1.768 – capacidade de nascituro de adquirir por testamento. Código Penal – Nosso Código Penal considera o aborto delito doloso contra a vida. Nos artigos 124 e 127 estão detalhadas todas as modalidades de aborto criminoso. No Artigo 128, o Código Penal trata do aborto legal e, como subespécies deste, do necessário ou terapêutico e do relacionado com gravidez resultante de estupro. O fundamento do aborto terap6eutico é o estado de necessidade previsto nos Artigos 19 e 20, sendo que este último aponta quatro condições indispensáveis par configurar a situação em apreço;  existência de perigo atual para interesse juridicamente protegido;  não ter esse perigo sido provocado voluntariamente por quem invocar a justificativa;  inevitabilidade do perigo;  proporcionalidade entre a conduta do agente ao salvar o direito e a natureza do perigo que se lhe deparava. No caso, há dois interesses em conflito: a vida biológica do feto e da mãe; a lei decide-se por esta. E, ao médico, cabe a enorme responsabilidade de pronunciar-se acerca da necessidade e do momento da intervenção. Código de Ética Médica – (Resolução n.º 1246do Conselho Federal de Medicina, de 8 de janeiro de 1988).


O Artigo 43 do Código de Ética Médica veda ao médico: “descumprir legislação específica nos casos de transplantes de órgãos ou tecidos, esterilização artificial e abortamento”. Nem sempre as duas únicas condições de permissibilidade de aborto são respeitáveis. Até nos cursos médicos são enfatizados os fatores teratogênicos, exemplificados por rubéola e irradiação, como justificativas de ordem científica para interrupção da gravidez. Seria tipicamente o aborto eugenésico, mas lei vigente proíbe essa prática. Na verdade, em termos de ética médica, no que tange ao aborto, ainda é seguida a linha do Decreto n.º 20931, de 11 de janeiro d 1932: “Artigo 16. É vedado ao médico: f) dar-se a prática que tenham por fim impedir a concepção ou interromper a gestação, só sendo admitida a provocação do aborto e o parto prematuro, uma vez verificada por junta médica, sua necessidade terapêutica”. AIDS e gravidez Do ponto de vista biológico, após competente investigação científica, prevalece o entendimento em seguida especificado. As mulheres acometidos de síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) ou com infecção por vírus da imunodeficiência humana (HIV-1 e HIV-2), comprovada sorologicamente, não pioram da moléstia e nem sofrem aceleração do déficit imunológico quando engravidam. Apesar de ser conhecida a ação imunodepressora da gestação, está comprovado que não há interferência no curso natural da enfermidade ou da condição infecciosa. Em suma, a gravidez em mulheres com AIDS não constitui fator de agravamento ou de maiores riscos em face à participação dos vírus citados. Os perigos de transmissão da virose par ao feto são a;tos e, em comparação com outras doenças pré e perinatais, a probabilidade é maior. As estatísticas indicam que, em média, 50% das crianças nascidas de mães comprometidas adquirem a infecção. Destas, um grupo significativo apresentará embriopatias, que implicam em calcificações cerebrais, retardo mental e até traços faciais característicos. Algumas crianças infectadas podem desenvolver a doença mais tarde, cerca de quatro ou cinco anos após o nascimento, enquanto outras já evidenciam manifestações quanto decorridos seis e oito meses. As crianças que ao nascer têm anticorpos anti-HIV não se encontram necessariamente infectadas, já que é viável passagem passiva desses componentes séricos e o diagnóstico apropriado envolve a realização de testes mais precisos e caros, como a detecção do antígeno ou a reação da polimerase, para demonstração de material genético do vírus nas células dos filhos. De outro lado, se o exame de sangue para anti-HIV é negativo ou passar a ficar assim após 15 meses, nem por isso as crianças estão a salvo da infecção, já que as técnicas referidas no item anterior têm a capacidade de revelar vírus em algumas. Sem dúvida, a infecção e a AIDS dela conseqüente vieram, de forma inopinada, golpear a dinâmica da interação mãe/família/filho. No caso das mães com a síndrome, surge o questionamento acerca de quem vai criar o seu filho, uma vez que o tempo de vida das mesmas é curto. Quando às mães soropositivas, a previsão não é igual à alisiva às mulheres hígidas, no que diz respeito a esse aspecto. Assim, o ônus de criar essas crianças recairá sobre as famílias ou o Estado.


Neste momento criuciante, em que a AIDS avança desafiando todos os mecanismos de controle existentes, indubitavelmente os programas de planejamento familiar poderiam ser acionados para integrar as trincheiras das medidas preventivas, com orientações específicas aos grupos de risco, abrangendo doente ou apenas soropositivos. Desse modo, seriam evitados abortos clandestinos. As questões que a AIDS suscita afiguram-se um verdadeiro acinte ao princípio da reserva legal. Criam-se a todo instante situações que o legislador jamais logrou fixar em fórmulas. O legislador está de pernas curtas para acompanhar a velocidade com que despontam os problemas trazidos pela AIDS. Para as inúmeras situações surgidas, esgotando-se os meios interpretativos da lei, tem-se procurado suprir as lacunas, recorrendo-se à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito, com o fito de equaciona os conflitos. Sucede que, estando em foco o aborto, essa integração da norma ao fato real não é possível, de vez que as condutas pertinentes estão adstritas aos limites expressos no texto legislativo. A título ilustrativo, se invocarmos a figura do aborto necessário ou erap6eutico, não terá lugar enquadramento n hipótese em tela, porquanto esse tipo, legal, somente é permitido quando a vida da mãe está em perigo. Também, não há como lançar mão do aborto eugenésico. Nossa lei não o admite, com base a falibilidade do prognóstico quando ao efeito pernicioso no ente em formação. Essa prática é comparável à eutanásia ou homicídio compassivo. Concluindo, não há previsão legal para a prática do aborto em gestantes infectadas pelo HIV ou com AIDS estabelecida. Por compromisso com a coerência, cumpre salientar que descabe tratar da apresente problemática no contexto do movimento para a legalização do aborto voluntário que, sem dúvida, escora-se em outras razões. Então, por carência de amparo legal, ainda permanece o conceito de Altavilla (Altavilla, Eurico – Trattato di Diritto Penale, 1934): “... pode a mãe dilacerar, como queira, seus membros, mas não pode golpear o embrião que amadurece em seu centre”. Vicente Amaro Neto, Diretor Superintendente do Hospital das Clínicas, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Campanha da Fraternidade – 90 Tendo como tema «A fraternidade e a mulher», a Campanha da Fraternidade deste ano propõe a toda a comunidade eclesial uma revisão de como se vê, em nosso meio, a mulher. No entanto, como enfatiza o texto-base da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, já disponível, a escolha do lema «Mulher e homem: imagem de Deus» pretende, desde logo, estabelecer que se busca «conscientizar que mulher e homem juntos são a imagem de Deus e que Deus entregou sua criação a ambos». Essa conscientização se faz necessária, porque é idéia geral que apenas o homem seja considerado imagem de Deus, «apresentado geralmente com características masculinas». Propositadamente, por isso, o lema da campanha menciona a mulher em primeiro lugar. Um segundo objetivo da CF-90 é «ajudar a ver como, na realidade, a mulher não é reconhecida e tratada como igual ao homem». O texto tem farta documentação


evidenciando a discriminação da mulher, nos mais diferentes campos de atividade (e até mesmo na igreja), situação que perdurou durante séculos e ainda deixa suas marcas fortes. Um terceiro objetivo buscado é «enfocar, de novo, a vocação inicial da mulher e do homem: construir juntos uma sociedade». Esse aspecto é fundamente abordado no textobase, que insiste em deixar claro não ser a CF-9tl uma campanha só da mulher, mas igualmente do homem, pois «a conversão de ambos não visa só a situação da mulher na sociedade, mas também na Igreja». Os três tempos Homem e mulher têm a mesma grandeza e não há razão para complexos e discriminação - acentua a CNBB, insistindo em que, «em igualdade com o homem, a mulher deve assumir um papel cultural de relevância na sociedade nova que está sendo gestada». Sociedade que, como se destaca no texto-base, vem sendo construída sob o signo da tecnologia fria e da dureza da máquina, e que se está destruindo pela violência contra as pessoas e a própria natureza. Razões mais que suficientes para exigir a participação feminina, cuja «presença e atuação trarão o indispensável equilíbrio humanizante». Para chegar a isso, a Campanha da Fraternidade deste ano propõe o clássico esquema de «ver,julgar e agir» em relação aos problemas que suscita. No primeiro passo sugerido pela CF, deve-se avaliar a situação da mulher nos seus diferentes papéis: na família, no mundo do trabalho, na criança, na cultura e na arte, na política e nos meios de comunicação social. Ganha também capitulo próprio no texto-base a atuação da mulher na Igreja. Como de hábito no material que promove a campanha, cada um dos enfoques é discutido a partir de levantamentos, sempre que possível com base estatística, que demonstram diversas situações de posicionamento inadequado da mulher, por pressão de uma sociedade ainda não conscientizada da igualdade de direitos. A segunda etapa do trabalho proposto - julgar - analisa as questões levantadas á luz da Palavra de Deus e dos documentos da Igreja, evidenciando a necessidade de conversão para uma vida cristã, em que mulher e homem possam ser a imagem de Deus. No momento de agir - objetivo último de todas as CF - propõe-se a prática de «gestos concretos de fraternidade, de exercício de pastoral de conjunto, em prol da transformação de situações injustas e não cristãs». Fundamentalmente, o que se busca é que a CF-90 não seja uma «campanha de mulheres para mulheres e, sim, uma campanha para mulheres e homens juntos descobrirem a situação pecaminosa manifestada nas muitas formas de discriminação». Ou uma conversão comunitária que produza a transformação social desejada para a verdadeira libertação da mulher e mudança das estruturas sociais. Várias são as pistas para as reuniões de grupos de debate e reflexão, enfocando os diferentes aspectos levantados na primeira fase do processo (ver), a visão cristã da situação ~julgar) e os diversos caminhos que podem ser abertos para o encaminhamento dos problemas no rumo de sua solução (agir), através da organização de grupos e comunidades. O cartaz O simbolismo do cartaz que identifica a Campanha da Fraternidade deste ano é explicado no texto-base. O cartaz retrata um vitral de igreja. Como todo vitral, ele só é percebido quando visto de dentro do templo.


Eis o que diz o texto-base a propósito: «É só numa visão de fé, dentro do mistério da criação, que mulher e homem aparecem em sua real dignidade e missão: unidos e companheiros na transformação do mundo para a glória de Deus. A mulher, em pé, expressa toda a esperança de libertação, de caminhar rumo a tempos melhores. Mas nessa caminha não está só. Caminha junto com o homem. O vitral, feito de muitos pedaços e cores, representa no conjunto a criação. E no centro da criação estão a mulher e o homem iluminados pela luz que vem do alto e os impele a juntos procurar um mundo melhor». Tempo para tudo Reserve tempo para trabalhar; é o preço do êxito. Reserve tempo para pensar; é a fonte do saber. Reserve tempo para se divertir; é o modo de manter a juventude. Reserve tempo para ler; é a base do crescimento. Reserve tempo para ser amigo; é o caminho da felicidade. Reserve tempo para sonhar; é o meio de se ligar a uma estrela, o carro em que se viaja na terra. Reserve tempo para amar e ser amado; é o privilégio dos seres humanos. Reserve tempo para ser útil aos outros; a vida é demasiado curta para sermos egoístas. Reserve tempo para rir; é a música da alma. Reserve tempo para comunicar a Boa Nova; é a utopia do Mestre que vale a pena levar á plena realização. Do jornal «Missão Jovem» Medicina Popular e Pastoral A nova acolhida das terapias paralelas apresenta dois eixos: o movimento espontâneo dos desenganados da medicina oficial e a estratégia da Organização Mundial da Saúde (OMS). l) «As pessoas não procuram um curandeiro por serem ingênuas, estúpidas ou supersticiosas, embora possam sê-lo, mas porque esperam que ele lhes possa providenciar alguma coisa que o médico revelou-se incapaz de lhes fornecer» (Dr. Inglis, The case for unorthodox medicine, N.Y., pág. 53). Neste sentido, o recurso do desenganado não prejudica nem a medicina oficial nem o interesse dos médicos, ainda que os poderes públicos devam proteger a população contra os charlatães. 2) Revertendo a tradicional repulsão da Faculdade contra todo tipo de clinica exercida fora de seu controle, a OMS, conscientizada de não poder dominar as patologias mais comuns em escala universal com os recursos da Faculdade, recomendou uma colaboração critica mas leal com as terapias tradicionais, dando prova dum empirismo bem inspirado. Valorização da medicina popular pelas comunidades de base. As Comunidades Eclesiais de Base, preocupadas com o bem-estar do povo, encontraram as práticas tradicionais sem pagar a ninguém e amiúde promoveram-nas. O fenômeno é muito mais amplo que o caso brasileiro, mas é nítido entre nós, sobretudo em contexto de carência de estruturas públicas de atendimento sanitário. O povo nem sempre deve esperar que tudo lhe seja outorgado pelo Estado, em geral representado por políticos que pensam primeiro em si. Dever-se-ia discriminar entre as


práticas de terapias paralelas, o que aqui não cabe. Alguns métodos tradicionais ou exóticos estão em fase de aculturação ou até assimilação oficial (fitoterapia, talassoterapia, acupuntura, quiroprática, bioenergia, shiatsu (com seu derivado doin), iogas, iridologia; a homeopatia, rainha inconteste das terapias supletivas, já è uma especialidade médica reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina – Resolução 1.000/80). A literatura já é considerável na matéria, ora original ora traduzida para o português. Requerem tratamento diferenciado as práticas carismáticas, mágicas ou religiosas. Medicina popular (MP) não é Pastoral da Saúde (PS), mas apenas cuidado com as pessoas, enfocando sua saúde. MP serve para informar e curar os indivíduos do ponto de vista biofisiológico, isto é, mediante o corpo, a prevenção, a alimentação e higiene, exercícios e remédios. PS serve para esclarecer as mentes, ajudar espiritualmente as pessoas, mediante enfoque ético-religioso, cultual (isto é, em vista do fim último). Mesmo com prováveis interferências, os pontos de vista permanecem distintos. Insistimos sobre esta diferenciação. MP visa preservar o equilíbrio de nosso ser corporal, fortificar os músculos, nervos, órgãos em geral, que nos permitem trabalhar á vontade, evitar ou superar doenças ou tormentos que nos pegam de surpresa e afligem. PS visa preservar do pecado,liberar da culpa nosso ser espiritual,inserir numa comunidade de oração e caridade, fortificar nossa esperança que, por ser escatológica, não se ativa menos em prol da justiça social e da solidariedade. Uma coisa é favorecer iniciativas que, como a informação sobre terapias ao nosso alcance, são capazes de melhorar a vivência de muitos; outra coisa é conceder ao acessório profano um preponderante em nome da religião, tornar uma atividade secular o eixo do apostolado cristão. MP não faz apelo a poder especial da hierarquia eclesial ou do sacerdote; é um desempenho no qual os leigos são livres e responsáveis sem pedir licença. Procuram o que serve nos tesouros escondidos da natureza e da cultura. A Pastoral, pelo contrário, exerce-se em nome do bispo, que, talvez, não entende de ervas ou oligoelementos. É preciso desmitizar práticas da Medicina Natural (MN). Mas suas remotas origens, medicina e religião têm raízes culturais comuns com a magia. Basta evocar os capítulos do livro de Claudine BreletRueff sobre As medicinas tradicionais sagradas: o xamanismo, a medicina das pirâmides, dos ritos agrários, diagnósticos, a medicina alquímica, dos antropósofos, dos vedas, os sacerdotes médicos da América pré-colombiana, o tão e a acupuntura, as respirações sublimes, as medicinas africanas. Com o Dr. Simon Schraub, pela primeira vez um professor de cancerologia debruça-se para analisar a demanda de cancerosos a medicinas paralelas sem preconceito de luta (La magie et la Rison. Médecines paralléles, psychisme et cancer, 1987): «Entendo por magia tudo quando não é provado; entendo por razão aquilo que é cientificamente demonstrável». As receitas da MN pertencem ao tesouro cultural das diversas sociedades, apresentando óbvia diferenciação (com base á diversificação do ambiente natural e do gênio próprio das populações), mas não constituem o monopólio de nenhum grupo e não devem ser utilizadas em prol ou contra qualquer religião que seja. Mas os milagres não são operações religiosas no campo da terapia e instrumento de proselitismo? De fato, a inovação do milagre desempenhou enorme papel no lançamento das novas religiões e seitas, ainda que hoje o mundo secular tenha aprendido a ser mais critico e desconfiado. O assunto exigiria tratamento próprio. Aqui desejamos apenas chamar a atenção sobre o fato de que as virtudes curativas de produtos naturais ou de manipulações


adequadas não são milagrosas: constituem um saber acessível para quem se interessar nelas. Explicações racionais tendam a substituir crenças míticas a respeito de sua eficácia. Hubert Lepargneur, Sacerdote camiliano, teólogo-moralista.


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