São Camilo de Lellis No dia 12 deste mês (Domingo), a Igreja celebra a festa de São Camilo e lembra, também, o dia do doente. Essa é uma data muito particular para a pastoral da saúde, que deve aproveitá-la, em todas as paróquias, para celebrações especiais. Particularmente, rememorar a vida de São Camilo e aprofundar-se em sua visão sobre o atendimento aos enfermos será de grande valia para uma reflexão sobre a importância da missão assumida pelos agente de Pastoral da Saúde no atendimento aos enfermos. “O hospital foi o centro da vida de São Camilo: era para ele a cada de Deus e a cada do homem. Definia-o como um jardim, e no gemido dos doentes entreouvia uma melodia celestial. Entrar num hospital, para ele, significava esquecer qualquer outra preocupação e, quando se aproximava de um doente, servia-o como se fosse o único do mundo, com dedicação total”. Via no doente, sempre, a pessoa do próprio Cristo, e agradecia até ao enfermo a possibilidade de servi-lo, chamando-o mesmo de patrão. Aos que abraçarão, como ele, a missão de servir os enfermos, na Ordem que então fundou, recomendava: ponham o coração nas mãos. O agente de Pastoral tem em São Camilo um modelo perfeito. E deve Ter a convicção de que realiza uma ação meritória, do agrado especial do Pai, pois, como dizia São Camilo, exercitar a caridade junto aos enfermos é estar cuidando da “ menina dos olhos de Deus”. Novo Provincial Os Camilianos do Brasil, têm, desde maio último, um novo Provincial da Ordem. Trata-se do Padre Geraldo Bogoni, que substitui no cargo ao Padre Munaro. Padre Bogoni nasceu em Videira, Santa Catarina, em 10 de março de 1938, e fez sua profissão religiosa em fevereiro de 1957. A profissão perpetua foi feita em 1960. Ordenado sacerdote em 29 de junho de 1963, em São Paulo, também se graduou em Psicologia, pela Pontifícia Universidade de São Paulo. Entre seis vários encargos, foi capelão do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo por 13 anos (de 1964 a 1977), dirigindo também o Seminário Camiliano de Curitiba, de 1977 a 1984. Desde então era o superior da Comunidade e Mestre de Noviços da Ordem em São Paulo. Como Provincial, Padre Geraldo também assume a presidência de todas as entidades camilianas no Brasil, como a Sociedade Beneficente São Camilo. União Social Camiliana, Beneficência Camiliana do Sul, Instituto Brasileiro de Controle do Câncer, Cruzada Bandeirante, Clinica Infantil do Ipiranga e Associação Mens Sana, entre outras organizações. Conselho Municipal de Saúde A Pastoral da Saúde – Linha 6 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil remeteu este texto para todos os bispos e coordenadores diocesanos de Pastoral. Ele trata dos Conselhos Municipais de Saúde, e ressalta sua importância como instrumento de participação popular, conforme está previsto na Constituição de 1988, e também para a Igreja, por constituir uma boa mediação entre fé a vida dos cristãos, para sua presença atuante na sociedade. A participação nos Conselhos é uma grande e nova oportunidade, suja importância pastoral não pode ser ignorada por nós. Esta é a integra do texto: I – Introdução – este pequeno texto trata do Conselho Municipal de Saúde. O Setor de Pastoral Social da CNBB decidiu oferecer este subsídio para lembrar de Saúde tem como instrumento de participação popular, previsto na Constituição, e para a Igreja a importância pastoral de participação no mesmo. É necessário que nós, responsáveis pela pastoral, e cristãos, atuarem junto ao poder municipal para que seja criado, com a máxima urgência , este Conselho e, uma vez criado, ou se já existe, funcione segundo as atribuições que lhe são garantidas em Lei. Também nos cabe o dever de animar pessoas comprometidas com a pastoral a participarem ativamente do Conselho Municipal. II – O que é o Conselho Municipal de Saúde – A Constituição Federal de 1988, no art. 198, criou o Sistema Único de Saúde SUS, que, por sua vez, foi regulamentado pela Lei Orgânica da Saúde (Lei 8080, de 19/9/90) e pela Lei n.º 8142, de 28/12/90. Foi esta última lei que criou a Conferência da Saúde e o Conselho de Saúde como instância colegiada do SUS em cada esfera do governo: nacional, estadual e municipal. Portanto, o Conselho Municipal de Saúde é a instância local, núcleo fundamental de formulação de estratégia e de controle da execução da política de saúde, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros. Não é órgão que disputa ou subtrai o poder prefeito, mas soma-se ao mesmo para a discussão democrática da coisa pública. Constitui a base fundamental do processo democrático participativo do setor de saúde a nível dos municípios. A criação deste Conselho é regida por lei municipal, conforme a Lei Orgânica de cada município. III – Principais funções do Conselho Municipal de Saúde – 3.1. Função de deliberar: Compete a ele formular estratégias (linhas gerais das ações de saúde) e elaborar e aprovar o Plano de Saúde e seus
programas específicos. Após elaborado, o Plano Municipal de Saúde é encaminhado ao prefeito para ser homologado , e a Secretária da Saúde executará as deliberações. 3.2. Função de fiscalizar: Cabe ao Conselho Municipal de Saúde controlar e fiscalizar a execução do Plano e das estratégia ]; planejar e controlar a questão econômico-financeira (Fundo de Saúde); acompanhar e controlar o destino das verbas e a atuação do setor privado credenciado. 3.3. Função de transformar: O Conselho Municipal de Saúde representa uma peça fundamental para transformar o sistema de saúde no Brasil. Luta por: - garantia da descentralização financeira do setor; - regularidade e automaticidade do repasse dos recursos da União e dos Estados para o Município; - capacitação técnica e gerencial do setor; - transferência do comando do sistema de saúde para os municípios. Faz política do atendimento universal, igualitária, humanizado e de qualidade que, efetivamente, resulte em mais saúde para todos. 3.4. Função democrática: É no município que o cidadão sente suas necessidades e é ai que as decisões importantes sobre o funcionamento dos serviços de saúde devem ser tomadas, levando-se em conta a realidade local. Com a existência do Conselho Municipal de Saúde, além de poder diagnosticar as necessidades e determinar as prioridades de saúde, junto com os demais representantes, a verba da União não precisará mais passar pelo estado (diminuindo o jogo da politicagem e do desvio). O Conselho se deve dar dentro das regras democráticas, com a sociedade organizando-se e capacitando-se para uma participação crescente e politicamente amadurecida e com os governantes respeitando o jogo democrático. O trabalho dentro do Conselho é colegiado. Seus componentes não são remunerados pelas funções que exercem. Fixam suas deliberações a partir do debate interno e ouvindo pessoa se entidades convidadas a emitirem seus pareceres, como: manifestação política, consultoria técnica ou administrativas, estudos epidemiológico ou de investigação em serviços de saúde. 3.5. Função permanente: O Conselho deve reunir-se freqüentemente e não uma só vez ao ano. O Poder Executivo jamais pode desativá-lo. IV – composição dos Conselhos Municipais de Saúde – Esta se faz segundo o critério de paridade: - 50% de representantes do governo, prestadores de serviços, profissionais da saúde; - 50% de usuários: representantes de centrais sindicais, sindicatos, conselhos locais de saúde, associações de moradores, organizações de base da Igreja e outros movimentos populares. Aqui cabe um representante das Pastorais: Pastoral da saúde e/ou da Criança. V – Considerações finais – Todo cristão, querendo seguir a Cristo que disse “ Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10), encontra no Conselho Municipal de Saúde um instrumento para influenciar nas decisões de saúde do povo e para amenizar o seu sofrimento, cada dia mais agudo. De fato, a atuação da Igreja é intensa e viva quando agentes pastorais fornecem e viva quando agentes pastorais fornecem aos movimentos populares informações esclarecedoras da relação entre condições da vida e de saúde, sobre as desigualdades sociais e sobre a necessidade de buscar soluções coletivas para os males que afligem as camadas desfavorecidas da sociedade. Aproveitemos esta brecha importante para a pastoral social da Igreja. Informar-se e participar é dever de todo cidadão e de todo cristão consciente. Câncer: um desafio à Pastoral – I A palavra câncer é o termo popular que procura definir um conjunto de neoplasias malignas, isto é, doenças caracterizadas por um crescimento desordenado de células jovens, sem controle de mecanismo reguladores do crescimento celular. São mais de 200 diferentes formas de doenças neoplásicas englobadas na palavra câncer. Qualquer tipo de tecido do organismo humano pode ser origem ou local de neoplasia. As neoplasias evoluem de formas muito diferentes. Muitas crescem somente no local de origem. Outras espalham se pelo organismo,implantando-se em outros órgãos, e estas ramificações são denominadas, metástases. O conceito popular r tradicional a respeito do câncer é este: câncer é uma doença que causa muito sofrimento e morte certa em pouco tempo. Aliá, em determinadas realidades, nem se ousa falar em câncer, e sim refere-se a ele como sendo aquela doença. Em época de avanço da AIDS, já ouvi gente falar: “Padre, graças a Deus, não tenho câncer”. Neste contexto fala-se abertamente de câncer e menos de AIDS: as pessoas assumem mãos naturalmente o câncer do que a AIDS pelo fato de esta última traze implicações morais.
Geografia do câncer – Nos países desenvolvidos, as principais causas de morte são as doença do coração e cânceres. Nos do Terceiro Mundo, os cânceres ocupam a quinta ou sexta posição entre as 10 primeiras causas da morte. Na América Latina, Costa Rica, Chile e Argentina já apontam o câncer em segundo lugar como causa de morte. As localizações mais freqüentes do c6ancer nos homens são no pulmão, estômago, cólon e reto, cavidade oral, próstata e esôfago. Entre as mulheres, na mama, cérvix uterino, estômago, cólon e reto, pulmão, cavidade oral e esôfago. Existem muitas interrogações a respeito dos fatores etiológicos de várias localizações anatômicas de câncer. Nos países desenvolvidos, houve uma diminuição de mortalidade pelos tumores gástricos e cérvico-uterino, atribuída à melhora das condições de vida. Isto faz com que se relacione a maior freqüência destes tipos de câncer com situações sócio-econômicas precárias. Os cânceres de mama e pulmão estão aumentando em freqüência e mortalidade. Juntamente com aqueles de cólon, estão associados ao desenvolvimento e modificação de hábitos e comportamentos. Sabe-se que o hábito de fumar está relacionado com o surgimento do câncer de pulmão e vários outros, como de boca, pâncreas e bexiga. Prevenção do câncer – “Qualquer câncer pode ser controlado, desde que detectado bem cedo. Mas as pessoas procuram o médico tarde demais”, afirma o oncologista Sérgio Simon (“Veja”, edição de 12/02/92, pág 7). Os especialistas na área, os oncologistas, afirmam que, de todos os tipos de câncer, em todos os estados que se apresentam, 60% são curados atualmente. Os 40% não curados podem, em condições de atendimento especializado, ser controlados. Os profissionais da saúde deveriam esclarecer a população sobre as formas de detecção precoce, diagnóstico precoce e tratamento adequado. A divulgação de informações a respeito do câncer, pelos meios de comunicação, o diálogo entre médico-paciente-família fazem com que o atendimento ao doente seja como o de qualquer outro tipo de doença, e não cercado de segredos misteriosos, que, de boa fé, visam ajudar o doente, mas, na verdade, o isolam. Na suspeita de estar doente e perante o medo de ter câncer, não se deve adiar a procura do médico, e sim ir, logo no início, pois a probabilidade de cura é muito maior. Muitas pessoas morrem de câncer porque não tiveram acesso a exames para diagnosticar a doença. Só no Estado de São Paulo, morrem anualmente 1.400 mulheres de câncer de colo de útero. Se fizessem, todos os anos, o Papanicolau (exame citológico, que consiste em coleta da secreção vaginal e análise laboratorial), não morreriam. É um exame simples e que pode ser feito nos postos de saúde. No caso de câncer de mama, recomendam-se mamografia e os auto-exames (as próprias mulheres apalpam os seios à procura de nódulos). Certos tipos de câncer são encontrados em determinadas faixas etárias. Um jovem de 26 anos não precisa faze exames para procurar câncer na próstata, porque a doença incide sobretudo depois dos 50 anos. Novidades no tratamento – O que existe de novo, hoje, para combater o câncer é a abordagem multidisciplinar (profissionais das diversas especialidades dialogam, procuram um consenso de como cada um pode ajudar) que associa quimioterapia, radioterapia e cirurgias. É interessante notar a evolução das terapias nesse campo. No início do século, os médicos acreditavam que a cura do câncer estava ligada a uma boa cirurgia. Faziam-se grandes cirurgias. Nos anos 30, a radioterapia foi introduzida e, a partir daí, se passou a fazer quase só radioterapia. Nos anos 60, a quimioterapia ganhou sua vez, e está cedendo lugar, nos anos 80, nos países do Primeiro Mundo, à imunoterapia. Pesquisa mais recentes na área da genética estão à caça dos genes responsáveis pelo câncer, os oncogenes. Sensibilidade e amor pela verdade – Mais do que more de câncer, ganha corpo uma nova mentalidade: convive com ele. O medo tem que ser substituído pelo conhecimento. Infelizmente, no Brasil, o câncer ainda é sinônimo de morte. Pastoralmente falando, a abordagem junto ao doente de câncer tem a marca de uma presença sensível. Perceber que o doente se defronta com uma série de perdas: saúde, emprego, imagem corporal alterada, perda de amigos que por vezes se afastam, talvez a perda dos entes queridos e da própria vida. O agente de pastoral tem de ser um facilitador no sentido de ajudar o doente a elaborar a dor destas perdas, que são sentimentos normais, uma experiência universal. Além disso, respeitar as fases pelas quais o doente passa: revolta, depressão e apatia são muito comuns. Um outro aspecto muito delicado, ma importante, é a questão da verdade. Nunca devemos subestimar a capacidade de o doente saber o que realmente se passa com ele. Além disso, o doente precisa receber tratamento especializado e é normalmente encaminhada a um especialista, o oncologista, que, por sua
vez, o encaminha a uma instituição especializada. É praticamente impossível querer enganar alguém nessas condições. A verdade faz bem. É necessário ter muito tato e sensibilidade para trabalhar isso. A comunicação sincera leva o doente a saber o que acontece, a assumir o tratamento e a enfrentar a doença com serenidade. Nesse contexto, é preciso superar uma mentalidade que, aprioristicamente, vê a verdade como nociva e o paternalismo que sempre decide pelo doente (considerado, então, como menor de idade) e que nunca pergunta o que ele deseja saber. O doente tem direito de saber a verdade. Leo Pessini, sacerdote camiliano, capelão do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Aspectos religiosos da esterilização Não há ninguém no mundo, hoje, que negue a existência do problema demográfico, isto é, do crescimento demasiado rápido do contingente humano. Trata-se de um problema de humanidade no sentido mais amplo e profundo do termo. Envolve a vida e a sobrevivência da espécie e pode comprometer parte de seus valores fundamentais. O problema demográfico fundamenta-se em dois dados extremamente simples: de um lado, o planeta terra, habitat único do se humano, com espaço físico e recursos limitados; de outro, a humanidade, com sua capacidade inesgotável e sempre crescente de reprodução. Como o espaço físico da terra e seus recursos são limitados, ma indispensáveis à sobrevivência humana, são o que são, e embora possam vir a ser aproveitados da melhor forma possível, sem os desperdícios de hoje, continuarão sempre limitados, fica claro que a solução do problema demográfico só pode advir do segundo dado do próprio problema, isto é, diminuição do crescimento populacional. Esta é a única saída de que a humanidade dispõe, e é nessa direção que deve prosseguir em suas investigações, como de fato está fazendo. Buscar a solução no primeiro dado do problema – o espaço e os recursos geográficos – seria procurar paliativos de efeito temporários, nunca solução definitiva. O aproveitamento máximo do espaço geográfico e dos recursos disponíveis da terra será sempre insuficiente a longo prazo, pela razão já mencionada: a terra e seus recursos são limitados; a capacidade reprodutiva da humanidade, como um todo, é inesgotável e crescente. Por isso, a solução definitiva do problema deve sr procurada nesta ponta. Não existe outra saída. O problema demográfico deve ser encarado como universal. Não se trata de problema de um país ou de alguns países apenas. Envolve todo o espaço geográfico. Nem tampouco é apenas problema deste momento histórico da humanidade. Veio para ficar. Deve ser encarado como um problema que envolve e interessa também a humanidade do futuro. A solução não pode ignorar as realidades profundas do ser humano, tanto em seus aspectos biológicos propriamente ditos, quanto em seus aspectos psicológicos, culturais e espirituais. Para uma boa solução do problema requer-se uma visão antropológica correta. Albert Jacquard, em seu livro “Cinco bilhões de homens num barco”, fala de quatro revoluções demográficas na historia da humanidade. A primeira teria acontecido entre 400 e 500 mil anos atrás, quando o homem surgiu na face da terra. Durante esse longuíssimo período, a humanidade não foi além de algumas centenas de milhares de pessoas. A segunda revolução aconteceu por volta dos anos 40 e 35 mil A.C., quando a humanidade conheceu um extraordinário surto de crescimento, atingindo cerca de 4 ou 5 milhões de seres. E se estabilizou nesse ponto. Com a descoberta da agricultura, por volta do ano 10 mil A.C., irrompeu a terceira revolução demográfica e, em poucos milênios, a população humana passou de 5 a 6 milhões de seres para aproximadamente 100 milhões, e atingiu, no tempo de Cristo, entre 250 e 300 milhões. Esta cifra manteve-se quase estável durante o primeiro milênio de nossa era, quando entrou em processo de crescimento lento, mas constante, que levou a humanidade a atingir, no final do século XVIII, a quota de 800 milhões de pessoas. Foi quando, segundo Jacquard, começou a quarta revolução demográfica, que perdura até nossos dias. Deve seu início ao advento da industria, melhor conhecimento do funcionamento do organismo humano, o que possibilitou maior eficácia na luta contra as doenças e a mote. A melhoria das condições de higiene, da quantidade e da qualidade da alimentação, juntamente com a descoberta da vacina, fizeram recuar a mortalidade infantil. Ainda no século XVIII, de cada 100 crianças que nasciam, 25 morriam antes de completar o primeiro ano de vida, e 42 antes de completar o quinto. A partir de então, o processo d controle da mortalidade infantil e geral se acelerou. Hoje, na Europa, de cada 100 crianças que nascem, apenas uma more antes de completar os cinco anos. E a durante média da vida humana passou de 30 anos, no início do século XIX, para mais de 70, hoje.
Este fenômeno determinou o desequilíbrio demográfico até então mantido pelas simples forças naturais. A humanidade acabava de alcançar uma grande conquista, mas também começava a desencadear um grande problema. No final do século XVIII e início do século XIX, o problema demográfico foi levantado pela primeira vez, de forma científica, por Malthus. A sua advertência, porém, não mereceu a devida atenção. A humanidade continuou crescendo de forma acelerada, e hoje alcança a casa dos 5,5 bilhões de seres. Cabe ao homem, especialmente ao homem de hoje e das gerações imediatas, resolver o problema antes que seja tarde. A din6amica demográfica tem suas leis, e não basta apertar um botão para que tudo se resolva. Os demógrafos mais clarividentes estimam que, se a humanidade de hoje envidar todos os esforços cabíveis, poderá estabilizar-se em 11 ou 12 bilhões de seres, por volta do ano 2100. O crescimento demográfico, portanto, continuará por mais um século, com suas conseqüências positivas e negativas. Neste contexto, o homem não pode ser desconsiderado, pois constitui o epicentro do problema. O ser humano é um ser inteligente, consciente,livre, sujeito de direitos e de deveres inalienáveis. Direitos que preservam sua dignidade; deveres que salvaguardam a dignidade e os direitos de seus semelhantes, sob todos os 6angulos da vida e em todas as fases de sua exist6encia. Dignidade e direito de todo os seres humanos que já existem, desde a concepção até a morte, e dos que virão depois. A tudo isso acrescente-se que o se humano tem consciência de que a sua vida não se limita à transitoriedade da vida terrestre. Suas raízes remontam a um Criador, e reconhece que não é senhor absoluto de sua vida. No seu modo d proceder, deve sujeitar-se às exigências éticas que o ultrapassam. Tais exigências abrandem a totalidade do seu ser, biológico incluído, sem prescindir de sua capacidade de reprodução. É nesse ponto que a religião, filosofia e ciência se entrecruzam em seus esforços para compreender o ser humano, sua dignidade, seus direitos e seus deveres. Nem a religião, nem a filosofia, nem a ciência podem agir como compartimentos estanques. Cada uma tem seu campo específico, mas todas, em última análise, abordam o ser humano, seu bem-estar, sua harmonia interior, sua realização plena. Cada uma dá seu contributo neste sentido, mas também deve levar em conta o contributo que advém das outras. Ao longo de sua história, a humanidade jamais viveu em plena unidade religiosa ou filosófica. O pluralismo foi sua marca cultural. A ciência, por sua vez, dedica-se ao conhecimento das realidades cósmicas, leis e mecanismos que a regem, sem se preocupar com as realidades que as transcendem. Não é sua competência explicar tudo, nem lhe cabe decidir unilateralmente sobre tudo. Religião e filosofia têm valores a lhe oferecer. Em nenhum campo, a nossa geração está de posse de toda a verdade. Na solução dos problemas com que se defronta, portanto, sobretudo dos problemas que envolvem o ser humano em profundidade e o futuro da espécie, deve vale-se do que tem de melhor em todos os seus campos de conhecimento, e usa-los da forma mais integrada possível. As soluções unilaterais, apressadas e imediatistas podem redundar em agravamento de problemas. A Igreja Católica não ignora o problema demográfico e sua gravidade, nem se desinteressa pela sua solução. Antes, enviada esforços para que se encontre solução adequada, em consonância com a dignidade, consci6encia, liberdade, responsabilidade e legítimos interesses de cada um e de todos os seres humanos, considerados individualmente e coletivamente, tanto em sua realidade cósmica, quanto transcedente. A Igreja Católica parte da existência de um Deus Criador e Senhor de todas as coisas, que criou o homem à sua imagem e semelhança, destinando-o para si. Constituiu o ser humano como gerenciador da natureza, com amplo campo de iniciativa sobre ela, mas sem facultar-lhe o domínio absoluto. Há leis que o homem deve respeitar, jamais transgredir. A doutrina moral da Igreja Católica se fundamenta na Palavra Revelada – A Bíblia – e no conhecimento e reta aplicação das leis da natureza. Não exclui neste campo, como nos demais, a colaboração nem da filosofia, nem da ciência. Vale-se delas com atenção e const6ancia incansáveis. Não se atém, além disso, a um determinismo absoluto das leis da natureza. Reconhece, porém, que o Criador estabeleceu uma finalidade para todas as coisas, e que esta finalidade deve ser respeitada incondicionalmente pelo ser humano. A Igreja Católica sabe que nem todos concordam com suas posições de fundo. Mas respeita e acolhe as posições divergentes como incitamento para aprofundar o conhecimento e a compreensão da Palavra Revelada e das leis da natureza. A Igreja Católica não se julga de posse de todas as verdades da natureza, nem crê ter compreendido todo o conteúdo da Revelação. Está à procura da verdade plena, e neste sentido sente-se em comunhão com toda a humanidade e a seu serviço, pronta a colher os préstimos que outros lhe oferecem. Sabe e aceita que muitos discordem de sua intransigência quanto a seus princípios, sobretudo de respeito incondicionado à vida e à sua integridade, desde a concepção até a morte. Todos sabem que a concordância
fácil não oferece o conhecimento da verdade, nem a promoção plena do se humano. A concordância fácil pode, antes, significar superficialidade, preguiça mental ou mesmo indiferença face à verdade e ao bem. A posição intransigente da Igreja Católica quanto aos métodos artificiais de contracepção constitui um fator positivo para a humanidade. Incita a um conhecimento cada vez mais amplo e profundo do problema em todos os seus aspectos. O caminho pode ser longo, difícil, denso de percalços, mas não há por que desistir. Os fatos já demonstram que essa posição constitui-se num baluarte de proteção da vida, da sua integridade, da sua dignidade. Repito: a Igreja Católica não ignora o problema demográfico e sua gravidade, nem se desinteressa por sua solução, menos ainda desestimula quem se esforça por encontra-la. Não admite, porém, que se fira a dignidade do ser humano e que se transgridam as leis da natureza que lhe garantem tal dignidade. Para ela, ponto de partida e de chegada é sempre o ser humano, feito à imagem e semelhança de Deus. Esta posição da Igreja Católica é por muito considerada uma barreira para a solução do problema demográfico, barreira que obstacula os anseios e as necessidades reais das pessoas envolvidas diretamente, criando dramas de toda sorte. E as situações aflitivas são muitas. Não há como nega-lo. De fato, a igreja católica não encontra receptividade plena quanto ao uso de métodos contraceptivos nem mesmo entre seus fiéis, pois a maioria recorre a métodos por ela desaprovados. Todos sabem, põem, que a verdade não depende do consenso da maioria. Os cientistas lutam com isso no dia-a-dia de suas pesquisas. E forçoso reconhecer que a ligadura das trompas é amplamente usada no Brasil e no mundo como método contraceptivo, mesmo entre mulheres católicas. Basta lembrar que, nos EUA, 22,6% das mulheres que se valem de métodos contraceptivos recorrem à ligadura das trompas, com a vantagem de resolver o problema de uma vez por todas, sem as preocupações e os cuidados prolongados que outros métodos requerem. Na França, a ligadura das trompas é proibida por lei, por ser considerada mutilação física. A Igreja Católica exclui tanto a ligadura de trompas quanto a vasectomia, não é em primeiro lugar por serem métodos contraceptivos, mas por lesarem a integridade do ser humano e num ponto por demais significativo de sua integridade global. Não é apenas o problema demográfico que está em jogo, mas a integridade e dignidade do ser humano, com todas as conseqüências que disso decorrem. Devo reconhecer que a moral oficial da Igreja Católica quanto ao uso dos contraceptivos é a mais rígida e excludente do mundo, o que a deixa em posição desfavorável e até antipática perante a opinião pública mundial. Nem por isso, se sente no dever de abrir mão de suas posições. Muitos intelectuais católicos sentem e vivem o problema, e procuram uma saída. Quero citar apenas um exemplo entre muitos. É o da conhecida bióloga francesa, católica praticante e mãe de família, MarieClaire Orgebin-Crist, que diz: Para a Igreja, procriação e relação sexual não podem ser separada. Tal afirmação leva a condenar a contracepção e, mais recentemente, a procriação assistida. Numa recente entrevista ao jornal “Le Monde”, o Cardeal Ratzinger airmava: ‘A autoridade competente da Igreja tomou suas decisões. É a posição do Magistério sobre a qual já não se pode discutir’. A certeza, portanto é, absoluta. A posição da Igreja, contudo, está completamente fora da experiência vivida”. Mas a bióloga insiste em que, na busca da verdade, “cada qual deve obedecer a seu próprio ritmo interior, sobretudo respeitar integralmente sua própria verdade”. E continua: “Numa entrevista a Henri Tincq, o Cardeal Ratzinger declarou: ‘a Igreja Católica deve manter contato com os sábios, os intelectuais que pesquisam a verdade neste ou naquele setor da atividade humana, mas ao mesmo tempo manter-se fiel à sua própria verdade’. Para a comunidade científica, a exigência é a mesma. Exigência reconhecida por pascal: ‘É a adesão de você a você mesmo e à voz constante da razão,e não à dos outros, que o deve levar a crer’(Pensamentos, 12, 56) e o mesmo para Tomás de Aquino: ‘Crer em Cristo é bom e necessário para a salvação; contudo, só se pode crer se isto não for contra a razão. Se a razão acha que crer em Cristo é mau, isto o é efetivamente... Devemos afirmar muito simplesmente: cada qual deve obedecer à sua consciência, mesmo que errônea’ (Summa Theologica, Prima secundae, questio 19, Art. 5). A posição da Igreja nesse campo é tida pelos cientistas como autoritária e até arrogante, e sobretudo pouco, crível, pois é contrária ao código do cientista, que requer objetividade, tolerância, dúvida quanto à certeza e espírito comunitário” ( “Lê savant et la foi”, Flamarion, 1989, Paris). O Concílio Ecumênico Vaticano II relembra a importância da consciência como fator imprescindível do agir humano, consciência que não deve prescindir da busca da verdade com seriedade e responsabilidade, mas que, em última análise, será sempre partindo de sua consciência que, na prática, o ser humano deve decidir como proceder. “Os ditames da lei divina, o homem... os percebe e reconhece mediante a própria consciência. É obrigado a segui-la com fidelidade em toda a atividade para chegar a Deus, seu fim. Não pode, assim, se forçado a agi contra a própria consciência. Mas também não há de ser impedido de proceder segundo a consciência”( DH).
Não padece dúvida que o extraordinário pluralismo religioso e filosófico que afeta a humanidade de hoje acabou gerando grande confusão e desorientação no campo ético. As religiões de origem semítica – Judaísmo, Cristianismo e Islamismo -, que contam entre seus adeptos mais da metade da humanidade, continuam fiéis a seus princípio éticos, sobretudo de “fazer aos outros tudo quanto queremos seja eito a nós”(Mt 7,12) e de amar a todas as pessoas como amamos a nós mesmos. Sua aplicação é universal, vale para todos os problemas que afetam o ser humano. Não resta dúvida de que o fator religioso, profundamente sentido por nós, é a orça mais determinante na vida e no proceder humano. Tal fator não pode ser preterido, sobretudo quando se pretende elaborar leis que implicam a dignidade do ser humano. Júlio Munaro, Sacerdote Camiliano, Coordenador da Pastoral da Saúde da Arquidiocese de São Paulo. Morrer com dignidade Em nosso organismo há milhares de pequenos aparelhos funcionando ininterruptamente e sujeitos ao desgaste. Somos como uma bola, lançada numa superfície lisa: aos poucos, vai perdendo a velocidade até parar. A morte é o corolário natural da vida. Quando o organismo é atingido por doenças que causam alterações profundas em seus órgãos, as reações biológicas são alteradas e a vida encurtada. Aí entra a medicina para tentar remover esses fatores. A ciência moderna dispõe de aparelhagem ultra-sensível capaz de detectar esses agentes nocivos, dando ao médico a possibilidade de neutraliza-lo. Entretanto, essa mesma tecnologia acabou por deformar a conduta do médico ante o moribundo. Muitas doenças vão comprometendo cada vez mais órgãos vitais, até o momento em que o processo se torna irreversível. As falhas de uma parte lesam outras em cadeia, como um jogo de boliche, de tal modo que a máquina inevitavelmente terá de parar. É nesse ponto que, eu acredito, a medicina atual entra em conflito com o fator humano. O ato de prolongar artificialmente uma vida condenada, além de causar enorme sofrimento e desespero ao doente, desencadeia desumana agressão mental e emocional aos familiares, que, por razões de consci6encia e amor, e contra todas as evidências, tudo sacrificam na vã esperança de recuperar seu ente querido. É a tragédia da moderna tecnologia, impessoal, onde as pessoas são apenas um conjunto de números, de produtos químicos, cujas dosagens são mais importantes que o próprio dom da consciência. E lá vai o infeliz para uma UTI, onde aparelhagens filtram o sangue dos rins, que há muito já morreram, fazem respirar pulmões que não respiram, e alimentam artificialmente um corpo que já não absorve. Mas este não é o pior aspecto. O doente é subtraído do contato e carinho daqueles a quem amou e que espera ver em torno de si, ouvir suas vozes queridas no momento supremo em que se despede do mundo. Em vez do aconchego do lar, a pobre vítima está despida numa sala fortemente iluminada, dia e noite, amarrada como Cristo na cruz, onde seus companheiros dos últimos momentos são aparelhos barulhentos, pessoas estranhas e sem face, mascarados, vozes profissionais, a lhe espetarem os braços a todo instante e impiedosamente introduzir garganta a dentro grossos tubos por onde forçam o ar, e tiram-lhe o direito de falar e de gemer. Geralmente, o médico sabe que o paciente está próximo do fim, mas seu espírito de luta, o desejo de esgotar todos os recursos, leva-o a ignorar os fatores sentimentais. Outras vezes, é levado a continuar, pela pressão da família, da sociedade, de outros médicos e até pelo receio da interer6encia intempestuosa da imprensa e de autoridades judiciais. Os familiares devem discutir abertamente com o médico a situação real, e delegar-lhe o direito de dizer Vamos parar com tudo, devolver o enfermo à sua velha cama, para morrer no momento certo – e por que não? – com um pouco de dignidade, consciente e cercado de carinho daqueles por quem lutou e dedicou sua vida. Salomão A. Chaib, é médico e publicou este texto na edição de 8 de março de 1992 no “Shopping News”, de São Paulo. Civilização de morte, civilização de vida. Toda cultura compota fatores de promoção da vida e elementos que lhe são contrários. Crítica excessica seu alvo. Se nossa civilização evita ostentar a morte, talvez seja, entre outras razões menores, porque não considera mais a hora do óbito como fatalmente marcada e porque não possui mais consenso sobre o sentido da vida, isto é, certeza comum sobre o além. Isto leva a um relacionamento moral amiúde prejudicial à vida humana, sem que possamos denunciar um cultivo da morte como novo ídolo. Nos pontos em que nossa civilização está acusada de idolatrar a morte, não será antes por falta de rigor ético na
valorização da vida presente? Sem fazer o papel de advogado do diabo, uma reflexão mais matizada seria provavelmente mais eficaz. 1) Alvo freqüente são os armamentos: custam muito, e o dinheiro neles investidos serviria melhor à educação e saúde. As taxas mais exorbitantes de PIB (Produto Interno Bruto) gastas em armamentos encontram-se em países subdesenvolvidos. A autonomia e a paz são também valores sérios, mas toda ética é hierarquização de valores e prioridades. A banal experiência comprova que as importâncias poupadas no armamento não vão necessariamente ajudar a vida dos desprovidos da nação. 2) A severidade penal, justa mais rigorosa, pode chocar o cidadão acomodado e simplista, mas protege melhor a vida de todos. A frouxidão individual envenena as instituições, com ou sem retórica. Lemos: “Vivemos numa civilização tanática. Esta palavra grega quer dizer que cultivar a morte, que provoca a morte”. Mais do que a civilização anterior? E por que? Nossa civilização prolonga notavelmente a duração média da vida, ao ponto de permitir um crescimentos demográfico que inquieta não poucas pessoas informadas. O mesmo autor e outros acusam nossa civilização tanática de entreter uma “mentalidade assassina” na realidade, a pena de morte é raramente aplicada, nos últimos decênios era praticada em grande escala apenas em países marxistas ou mulçumanos, que nossos moralizadores evitavam criticar. Uma hipótese: não será que a onda de fundamentalismo e integrismo que agora permeia as grande religiões abraâmicas não tem por função preencher o vazio deixado pelo deslocamento da frente educativa para a frente do combate à modernidade tecnocientífica? 3) O aborto é lastimável, e como crentes, o condenamos, mas sua finalidade principal é mais a libertação da mulher que a morte do concepto: posição errada, mas que não vamos corrigir ao interpretar de maneira perversa as intenções alheias. Ao investigar, em 1975, as razões fornecidas pelas mulheres que resolveram abortar, o instituto Credoc recolheu as seguintes motivações: o problema do trabalho das mulheres, que cria antinomia prática entre obrigações ou desejos profissionais e criação de filhos; as dificuldades de alojamento; a insuficiência dos proventos econômicos ( e a falta de ajuda do pai); a insegurança, ora do emprego, ora da estabilidade do casal; a emotividade excessiva da prospectiva mãe, sua fadiga gerada por sucessivas gravidezes. O jornal alemão “A Tribuna da Alemanha” (29/1/1978, artigo de K. Nachrichten) completa: “Prioridade à prosperidade material, pílula, tendência à família restrita, hostilidade no tocante à criançada, mulheres ativas, condições desfavoráveis de hábitat, futuro incerto...” Esses fatores e outros convergem numa evolução que abrange o econômico, o social, a mentalidade e a religião, mas uma ventilação minuciosa permite atacar item por item muitos dos fatores negativos, resultando num ganho não atingível pela condenação maciça. As condições atuais da vida urbana fizeram quase desaparecer as famílias numerosas fora do campo e da miséria. Os pais estão justamente preocupados com o custo da formação que preparará seus poucos filhos a encontrarem um lugar codigno na sociedade: essa tendência, em si, não é para a morte, é para melhorar a qualidade da vida. O desejo de um mínimo de conforto para os seres humanos já nascidos é uma preocupação legítima, como qualquer autodefesa natural. Quem se sente visado na denúncia do culto da morte? Alguém? O problema real é de melhorar a eficácia dos meios que visam implementar o serviço dos vivos. 4) Sem justificativa alguma são os comprometimentos dos poderes públicos, da municipalidade, do Estado ou da Polícia, com associações de malfeitores cujo propósito é atender à vida, e à propriedade alheia. A priorização da vida humana é incompatível com a absolutização prática do sucesso político junto a uma população despreparada no discernimento de seu bem real. A gang pode manifestar certa generosidade no território, bairro ou favela, que está sob seu controle, sem que isso beneficie realmente a mesma população. A religiosidade que sacraliza a vida humana permanece o principal instrumento, em geral, do respeito à vida, mas a família, que costumava estruturar esta religiosidade, tornou-se vulnerável numa civilização individualista e gregária. Precisamos de creches não fictícias, próximas às
trabalhadoras, de trabalhos a tempo parcial, de facilitação da adoção refletida, de fiscalidade mais justa, de política social menos a serviço dos políticos. Enfim, considerando sem preconceito os regimes sócio-econômicos em funcionamento no mundo atual, e aceitando que nenhum seja perfeito, é cabível determinar o mais eficaz na difusão do bem-estar para o maior número. Tentar obstar seu funcionamento, por qualquer motivo que seja, não seria também uma maneira moderna de pecar contra a vida humana? Hubert Lepargneur, sacerdote camiliano, teólogo moralista.