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Uma Lenda – Uma Mensagem Os Membros de uma tribo do continente africano contam a lenda de uma jovem que morava no céu. Aconteceu, certa vez, que os membros da tribo perceberam que sua vacas inexplicavelmente começaram a dar menos leite do que o normal esperado. Eles não entendiam porquê. Um jovem se oferecei como voluntário para ficar, à noite, em vigília, e descobrir o que estava acontecendo. Após várias horas de espera em vigília, na escuridão da noite, escondido em meio aos arbustos, ele viu algo extraordinário. Uma jovem belíssima, numa carruagem lunar, chegava do céu carregando um enorme balde. Elegantemente, ordenhou as vacas, encheu o balde de leite até a borda, subiu na carruagem, e desapareceu no céu.O jovem, um tanto atônito, quase não acreditava no que tinha presenciado. Na noite seguinte, armou uma rede perto do local onde estava as vacas e, quando a jovem veio do céu para apanhar o leite, ficou presa na armadilha. ”Quem é você?”, ele perguntou. A jovem, surpresa, explicou que era membro de uma tribo que residia no céu, e que lá não havia alimentos. Seu trabalho era vir para a terra, à noite, e encontrar comida. Ela implorou ao jovem que a libertasse da rede, pois faria tudo o que ele pedisse. O jovem respondeu que a libertaria somente se ela concordasse em se casar com ele. “Eu me casarei”, respondeu ela, “mas, primeiramente, preciso voltar para casa, por três dias, para me preparar. Em seguida, virei para desposa-lo”. Ele concordou. Após três dias, ele voltou, carregando consigo uma grande caixa. E disse ao jovem: “Serei sua esposa e torná-lo-ei feliz, mas você deve me prometer que nunca abrirá esta caixa”. Por várias semanas, eles viveram felizes, juntos. Um dia, quando sua esposa estava fora de casa, ele, cheio de curiosidade, abriu a caixa, e não viu nada nela. Quando a mulher voltou e viu seu marido olhando estranhamente para ela, disse: “Você olhou na caixa... Eu não posso mais viver com você”. “Por que?”, perguntou o homem, “o que existe de tão terrível em abrir e encontrar uma caixa vazia!” Ela respondeu: “Não estou deixando-o porque você abriu a caixa. Até pensei que isso provavelmente aconteceria. Estou deixando-o porque você disse que ela estava vazia. Ela não estava vazia, e sim cheia do céu. Ela continha a luz, o ar e o perfume de minha casa no céu. Quando fui para casa, pela última vez, enchi aquela caixa com tudo o que tinha de mais precioso, que me lembrasse de onde vim. Como posso ser sua esposa se o que existe de mais precioso para mim é vazio para você!?!” Tradução de texto de Harold Kushner, em “Who needs God”( Quem precisa de Deus). Um movimento pelos deficientes No Brasil, mais de 10% da população possui algum tipo de deficiência. A grande maioria enfrenta dificuldade e sofre discriminações causadas pela sociedade de injusta que privilegia o bem-estar de uns poucos e marginaliza a grande maioria. Contrariando a proposta da sociedade, as pessoas deficientes se organizam, buscando valorizar a pessoa do deficiente e não a deficiência da pessoa. A Fraternidade – A Fraternidade Cristã de Doentes e Deficientes é um movimento internacional ecumênico, de apostolado leigo fundamentado no espírito evangélico, no qual os próprios doentes e deficientes assumem sua direção, organização e difusão.


A Fraternidade nasceu na anca, em 1942, por inspiração e apostolado de Monsenhor Henry Fraçois, como resposta concreta à situação de vida dos doentes e deficientes de sua cidade, que se encontravam marginalizados pela sociedade, quer como mutilados de guerra, quer como vítima de pestes, epidemias e outros males. Proposta – A Fraternidade reúne doentes e deficientes, colocando-os em contato uns com outros, não para conservá-los prisioneiros de seu mundo particular e separa-lo da vida, mas reunindo-os lá onde se encontram, buscando integrá-los na vida social, ajudando-os a encontrarem o seu espaço, libertando-os da mentalidade de assistidos e proporcionandolhes confiança em si, passando a ser participantes ativos. A Fraternidade não é uma associação, mas um movimento que está organizado em núcleos, que se localizam nas cidades, nos bairros ou paróquias. Os núcleos são agrupados por sub-regionais ou dioceses, e estas em regionais ou Estados, e a reunião deste forma a Coordenação Nacional. Em todo os níveis, existem as equipes de coordenação, compostas por coordenadores, vice-coordenadores, conselheiro e vice-conselheiro. Objetivos – São objetivos da Fraternidade:  despertar no deficiente o valor da vida, e faze-lo descobrir suas capacidades e dons;  promove a integração do deficiente na família, na comunidade e sociedade;  formar núcleos onde ocorram trocas de experiências, estudos, reflexões a partir da realidade de cada um;  formar lideranças para o Movimento. A Fraternidade se fundamenta em sete princípios:  fundamenta-se profundamente no espírito da fraternidade evangélica;  dirige-se todos os doentes e deficientes, sem discriminação alguma;  fomenta uma grande união pessoal e comunitária ente doentes, deficientes e colaboradores,que os ajudam a realiza suas atividades;  pretende o desenvolvimento integral dos doentes e deficientes, tanto no sentido humano como no espiritual;  contribui para que os doentes e deficientes se integram na sociedade;  é animada por equipes de coordenadores, doentes e deficientes;  receber orientação cristã, especialmente dos conselheiros. No Brasil – A FDC chegou ao Brasil no dia 12 de junho de 1972, trazidas pelo então seminarista Vicente Masip, em São Leopoldo, RS. Logo espalhou-se por outros Estados. Atualmente está presente em 16 Estados, formando 10 Regionais, com mis de 240 núcleos e grupos, envolvendo em sua atividade evangelizadora aproximadamente 25.000 pessoas, entre doentes, deficientes e colaboradores. Em São Paulo, o Movimento chegou em 1977, e conta hoje com 24 núcleos e grupos no Estado. Nestes 20 anos, temos muitos avanços a comemorar:  a pessoa deficiente está conseguindo mudar a imagem deturpada que a família, a Igreja e a sociedade tinham dela;  milhares de deficientes constituem família, atuam no mercado de trabalho,na vida social e política, engajando-se na comunidade movimentos populares e partidos políticos.


A Fraternidade já tem, portanto, muito o que comemorar, Mas ainda enfrenta desafios, para que os deficientes e doentes conquistem a cidadania plena, com:  a eliminação das barreiras arquitetônicas (escadas e portas estreitas) que impedem a participação dos deficientes e doentes;  o acesso a equipamentos de órteses e próteses (pernas mecânicas, aparelhos), muletas, bengalas e cadeiras de rodas;  vê reconhecida plenamente a missão de seus conselheiros como evangelizadores. Para ajudar o doente de Alzheimer Com sede em São Paulo (na Av. Indianópolis, 2.343, 11-275.0827, CEP 04063-004), funciona a ABRA – Associação Brasileira de Alzheimer, com o objetivo de reunir portadores da doença ou seus familiares, interessados em conhecer mais sobre ela. O slogan da entidade já dá a idéias bem cala do que pretende: “Associando-se à ABRA, você não estará sozinho, nunca mais”. Embora, como seria de esperar, se exija o pagamento de uma mensalidade, é possível a alguém solicitar (e obter) a libertação temporária desse pagamento, quando justificado, em troca de algum tipo de colaboração que possa ser prestada à entidade. O que é – A doença de Alzheimer é uma doença progressiva, de causa e tratamento desconhecido. Acomete o cérebro, causando fundamentalmente perda de memória, séria deterioração intelectual e distúrbios de comportamento. Foi descrita pela primeira vê em 1907 pelo médico neurologista alemão Alois Alzheimer. Muitas vezes erroneamente rotulada de esclerose, é uma forma de demência, cuja causa não se relaciona com a circulação ou com a aterosclerose. E devido a uma perda acelerada e morte de células nervosas (neurônios), acarretando uma atrofia do cérebro, além de outras microscópicas características. É uma forma de demência responsável por mais de metade dos casos, enquanto que as demências devidas à aterosclerose representam apenas um quinto das demências. À medica que a idade avança, a doença de Alzheimer torna-se mais freqüente, porém pode se iniciar já partir da quarta década de vida. Os sintomas – No começo, os doentes apresentavam pequenos esquecimentos, normalmente aceitos pelos familiares como processo do envelhecimento, que progressivamente se vão agravando. Os pacientes tornam-se confusos e, por vezes, agressivos, passam a apresentar mudanças em suas personalidades, apresentam distúrbios de comportamento e terminam por não reconhecer os familiares e até si mesmos, quando colocados frente a um espelho. À medida que a doença evolui, os pacientes tornam-se cada vez mais dependentes de cuidados de terceiros (os cuidadores), apresentam dificuldades de locomoção, tornam-se mudos, e comunicação se inviabiliza, e passam a necessitar de cuidados e supervisão integral, até mesmo para as atividades elementares do dia-a-dia, como alimentação, higiene, vestir-se etc. A Causa – A causa da doença de Alzheimer não é conhecida. Existem várias teorias sendo estudadas. Atualmente, de concreto, porém, aceita-se que seja uma doença determinada geneticamente e que se relaciona diretamente com a idade.


Se bem que existe de fato uma forte correlação entre a doença de Alzheimer e a idade, ela é uma entidade própria, que não deve ser confundida como integrante do processo de envelhecimento. O diagnóstico – Não há um teste específico que estabeleça de modo inquestionável. Ele é feito por exclusão de outras doenças que apresentam os mesmos sintomas. Esse fato é de extrema importância, uma vez que algumas dessas doenças são curáveis: depressão, hipotireodismo etc. Alguns exames, como tomografia computadorizada, eletro encefalograma e testes de laboratório são utilizados para se estabelecer essa diferenciação. Os testes e avaliações cognitivas e psicológicas são úteis e de fundamental importância no transcorrer da investigação. O diagnóstico definitivo, de certeza, só é possível de ser estabelecido a partir do exame microscópico do tecido cerebral, normalmente após a morte, pela necropsia. A avaliação me’dica periódica é necessária, e determina de que maneira a doença está evoluindo. O tratamento – Não há, até o momento, nenhum medicamento específico de ação efetiva. Se bem que não haja cura nem como se prevenir, é possível , a partir de um abordagem médica e social adequadas,conferir ao paciente e familiares uma melhor condição de vida. O tratamento ou gerenciamento das alterações de comportamento, distúrbios do sono, agitação etc. é perfeitamente exeqüível por intermédio de uma série de medicamentos das e estratégias específicas ou pelo uso de medicamentos. A manutenção da saúde do indivíduo é fator fundamental, e toda e qualquer alteração deve ser imediatamente detectada e tratada. Os familiares – a doença afeta os familiares de modo devastador. As dúvidas e incertezas com o futuro, a grande responsabilidade, a inversão dos papéis, onde dos filhos passam a ser os pais e vice-versa, além da enorme carga de trabalho e tensão, acabam por gerar no núcleo familiar intenso conflito e angústia, com as inevitáveis conseqüências. A sensação de esta só, isolado, desamparado e a pergunta “por que isso está acontecendo comigo?” submete os cuidadores a uma enorme pressão psicológica, acarretando graves estados de desequilíbrio emocional com depressão, queda da resistência física, ficando mais predispostos a infecções, isolamento social, problemas de ordem conjugal, maior incid6encia de acidente domésticos etc. O que pode ajudar – A grande arma no enfrentamento da “questão Alzeheimer” é a informação, aliada à solidariedade. À medida que se conhece melhor a doença, seus sintomas, evolução e características, vários recursos e estratégias podem ser utilizados com sucesso, fazendo com que a carga do cotidiano fique mais leve, e o futuro mais previsível e menos ameaçador. A trova de sentimentos e experiências com outros familiares e uma orientação técnica correta contribuem de forma significativa no alívio da sobrecarga que é imposta aos familiares vitimados. Se você é um técnico que deseja dar a sua contribuição e manter-se atualizado, se você é um familiar que quer ajudar a ser ajudado, associe-se à ABRA.

Por que não Cireneu?


Freqüentemente, quando recordamos o caminho do Calvário feito por Jesus, temos presente as seguintes personagens: Jesus, Maria, alguns discípulos, aqueles que o seguiam e os que o crucificaram. Existe, porém, outra personagem, que também participou desse caminho, e que tem seu nome escrito na Bíblia e na história. É Simão Cireneu, um desconhecido camponês. Neste artigo, quero lembrar todos os “Cristos” desconhecidos e sofredores, que atravessam o calvário do sofrimento. Mas quero lembrar também os desconhecidos “Cireneus”, enfermeiros, médicos, agentes de pastoral, enfim, todos aqueles que ajudam esses “Cristos” doentes a atravessar o calvário da dor. 14.1. Amar sim, sofrer não Deus envia seu Filho ao mundo, para salvar a humanidade. Jesus é a humanidade. Jesus é a encarnação do amor do Pai. Os homens não aceitam o projeto de Deus de Deus, e acabam crucificando Jesus Cristo. O que era um ato de amor acabou tornando-se sofrimento. Tendo presente esta verdade, nós, apressada e miopemente, concluímos que Jesus veio para sofrer. Esquecemo-nos de que Jesus veio para amar. E foi justamente no caminho do amor que ele encontrou o sofrimento. O mandamento por ele deixado não é o mandamento do sofrimento, mas do amor: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (cf. Jo 13,34). Entretanto, ainda hoje ouvimos dizer que “é preciso sofrer muito aqui na terra para ganhar o céu”. Para ganhar o céu, não é preciso sofrer, e sim amar. Podemos lembrar aqui a famosa frase de Santo Agostinho: “Ame e faça o que quiser”. Já disse o escritor Harold Kushner: “Se o sofrimento é a vontade de Deus, todos aqueles que cuidam dos sofredores estão contra sua vontade”. 14.2. Cireneu, hoje Ao lermos com atenção o trecho do Evangelho que narra o caminho do Calvário, percebemos a presença de Simão Cireneu. No entanto, muitas vezes, somos incapazes de perceber os “Cireneus” que estão em nosso meio, e que nunca são visitados ou mencionados na TV, revista ou jornais. Simão Cireneu estava cansado, pois voltava do campo, após um longo dia de trabalho, foi interpelado a sair de si e ajudar. Mesmo num momento difícil, foi capaz de buscar forças para ajudar aquele que também estava cansado e carregado de sofrimento. Hoje, temos muitos “Cireneus” labutando anonimamente, em constante vigília no Getsêmani. Não dormem como os discípulos. Por vezes acontece aos profissionais da saúde o mesmo que aconteceu com Simão Cireneu. Depois de um longo plantão, estão cansados. Afinal, são pessoas que dão o melhor de si, e muitos se esquecem disso. No entanto, mesmo cansados, são interpelados a prestar ajuda àquele que ainda está no calvário, sufocado pelo peso da cruz. Nesse momento, esquecem o cansaço, o salário minguado, e vão ao encontro daquele que necessita. Que recompensa recebem? Nenhum agradecimento? Se não formos capazes de ler aquilo que muitas vezes não é dito, podemos até pensar que Jesus foi mal-agradecido, pois o Evangelho não relata nenhum tipo de agradecimento


verbal a Simão Cireneu. Mas nem só as palavras mostram o agradecimento. Exemplo disso é o relato da tradição cristã, que diz que Verônica, compadecida de Jesus, pegou uma toalha e lhe enxugou o rosto. Gesto que não alterou em nada a sorte de Jesus. Ele ficou tão agradecido, que, na mesma hora, deixou seu rosto estampado na toalha. Alguns podem chamar de lenda esse episódio. Não importa. O que importa é vermos um coração que sente e socorre, e a resposta de uma alma que agradece. Hoje, acontecem muitos episódios como esse. Socorro e auxílio que prestamos às pessoas num leito de dor podem, muitas vezes, não mudar em nada sua sorte. Esses sofredores podem não ter forças nem palavras para agradecer verbalmente. O agradecimento pode vir na forma de um sorriso, um aperto de mão, um olhar, entre outros gestos. E nós, muitas vezes, somos incapazes de perceber esses gestos. Não devemos, porém, alegrar-nos ou entristecer-nos por esses fatos. Devemos, sim, alegrar-nos porque os nossos nomes estão escritos no céu. Cristo, hoje – Quando relembramos Jesus Cristo, quase sempre temos presente a imagem de que, para ele, tudo era fácil. Esquecemos facilmente o lado humano. Jesus, no caminho do calvário, estava suado e ensangüentado, maltrapilho, esmagado pela dor e pelo sofrimento. Era difícil para as pessoas perceberem que aquele era o Cristo. Muitos só o descobriram depois de sua morte. Hoje, o Cristo está em nosso meio (cf. Mt 25,31-46). São os sofredores e doentes que encontramos no leito de dor. São os adoecidos por causa da pobreza. Esses “Cristos” que gritam por socorro, dignidade, solidariedade e calor humano. Pessoas que querem ser gente, sujeito de sua situação. Para vermos esse Cristo, é preciso que saiamos de nosso comodismo, e encontrá-lo na realidade em que ele está. Não numa situação em que gostaríamos que ele estivesse. É olhar ao nosso redor, e não simplesmente buscar o Cristo do alto. Caso contrário, também nós descobriremos que aquele sofredor é a própria figura de Cristo, depois de sua morte. Se isso acontece, estamos cometendo os mesmos erros que nossos antepassados cometeram. Esperaram um Cristo divinizado, e ele veio como homem. É com este Cristo que nos defrontamos diariamente. Abramos os nossos olhos, e ajudemo-lo a carregar a cruz. O encontro de Jesus e Simão Cireneu – O hospital é um lugar onde se dá o encontro de desconhecimento – situação semelhante à do caminho do Calvário. Jesus, o sofredor, é, para a grande maioria, um desconhecido. Nem mesmo Simão Cireneu o conhecia. É um simples camponês que é interpelado a prestar ajuda. É a típica realidade hospitalar: o paciente chega ao hospital, que é um ambiente desconhecido, como desconhecidas são as pessoas; a família, muitas vezes, está longe; os amigos, não raro, o acabam abandonando, como fizeram Pedro, negando Jesus, e Judas, traindo-o. Em meio a esses acontecimentos, surge a ajuda de pessoas desconhecidas. São os profissionais da saúde e agentes da Pastoral, que, a exemplo de Simão Cireneu, agem mais por compaixão do que por obrigação de circunstâncias. É o estranho que se torna próximo, que cura as feridas, que tenta trazê-lo de volta para a sociedade. Enfim, que ajuda a atravessar o calvário da dor. Mesmo sendo estranho, o auxílio de Simão Cireneu, embora não tenha alterado o rumo dos acontecimentos, amenizou muito o sofrimento de Jesus. Seu ato, talvez, fosse mais completo, se descobrisse que aquele a quem ajudava era o Cristo.


Caminho a seguir – Para todos aqueles que cuidam da vida e da saúde das pessoas, principalmente num ambiente hospitalar, o episódio do Calvário é uma experiência diária, e são muitos os que se dedicam e se jogam de corpo e alma, ajudando os outros “desconhecidos” a atravessar o calvário do sofrimento humano. É evidente que todos nós, como pessoas humanas que somos, gostamos de ver o agradecimento a nossas ações. No entanto, no hospital, muitos não voltam para agradecer. Alguns não conseguem atravessar o calvário do sofrimento, e acabam morrendo pelo caminho. Para outros, essa experiência foi tão dolorida, que não encontram coragem para voltar e rever outra vez esse caminho. Enquanto profissionais e/ou agentes de pastoral, não devemos entristecer-nos, pois a melhor propaganda de nosso trabalho não são os meios de comunicação que fazem. É você mesmo, com seu trabalho e dedicação, pois os doentes jamais se esquecem daqueles que os ajudaram, como Jesus jamais deve ter esquecido a ajuda do Cireneu. A gratuidade do amor nos impele a ser sensíveis diante do sofrimento do outro, ajudando-o a carregar a cruz no calvário da doença. Anísio Baldessin, Diácono Camiliano, capelão do Hospital das Clínicas de São Paulo. Uma reunião importante para a Pastoral Realizou-se,nos dias 31 de julho e 1º de agosto ultimo, no Noviciado Camiliano de Cotia, em São Paulo, importante reunião dos integrantes da Coordenação Nacional da Pastoral da Saúde-CNBB. O objetivo do encontro foi analisar a atual realidade da Pastoral da Saúde no Pais, partilhar experiências vividas e acertar detalhes do trabalho comum com vistas ao futuro. Participaram do evento, que se desenvolveu em clima fraterno e dialogal, os Padres Christian de Paul de Barchifountaine, coordenador nacional , Leo Pessini, Ademar Rover e Julio S. Munaro, e as Irmãs Cacilda Hammes (Florianópolis, SC), Lúcia Herta Rockenback (Tubarão, SC), Maria Scheibel (Porto Alegre, RS) e Maria das Graças Noronha (CRB Nacional-Rio de Janeiro) e dr. Celerino Carriconde (Recife, PE). Entre os vários pontos tratados, discutiu-se a preparação do III Encontro Nacional de Pastoral da Saúde, a se realizar no período de 20 a 22 de novembro próximo, em Cotia. Ali deverão reunir-se os coordenadores regionais da Pastoral da Saúde da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil para apreciar o tema Pastoral da Saúde: comunhão / ação transformadora. Os objetivos básicos do encontro são coordenar e articular as forças existentes na área da saúde; trocar experiências e reforçar as iniciativas na área da Pastoral; refletir sobre a mística da vida; celebrar a caminhada e a partilha, e traçar linhas de ação para o trabalho. A oportunidade também foi aproveitada para uma avaliação sobre a IX Conferência Nacional de Saúde, promovida em Brasília, de 9 a 14 de agosto passado (seja texto sobre o assunto na página 6 esta edição), bem como definir critérios para o melhor aproveitamento do espaço que a Pastoral da Saúde passará a ganhar, no próximo ano, na publicação semanal “O domingo”, em sua coluna catequética. “O Domingo” e largamente utilizado nas celebrações dominicais em todo o País e passará a divulgar a Pastoral.

IX Confer6encia Nacional de Saúde Na semana de 9 a 14 de agosto último, realizou-se em Brasília, DF, a etapa nacional da IX Conferência nacional de Saúde, reunindo mais de 3000 delegados e participantes. Foi o


resultado de um processo social que, durante dois anos, envolveu centenas de milhares de pessoas, a través das Confer6encias Municipais e Estaduais de Saúde, que elegeram democraticamente, na etapa estadual, os seus delegados e representantes. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil foi representada através de delegado e participante estaduais e por delegados e participantes nacionais; Bispos, Pastoral da Saúde, Pastoral da Criança e outras. A participação da sociedade organizada, incluindo a Igreja Católica, faz parte da estratégia de garantir os direitos da cidadania. As posições defendidas pela CNBB durante a Conferência, decididas em reunião prévia, realizada nos dias 8 e 9 de agosto, em Brasília, foram as seguintes:  defesa e garantia dos direitos básicos da cidadania à saúde, conforme expresso no Artigo 196 da Ocnstituição Federal;  defesa do Sistema Único de Saúde, definido e consagrado na Lei n.º 8.080, de 19 de setembro de 1990;  defesa da municipalização da saúde, como forma de colocar ao lance das comunidades o controle social da saúde;  defesa de uma reforma tributária, que descentralize a aplicação dos recursos financeiros e orçamentários, permitindo ao município a execução das ações de saúde do interesse de seus habitantes;  defesa da inclusão da questão da Seguridade Social no temário da IX Conferência Nacional de Saúde, por considerar que as garantias do exercício pleno da cidadania requerem a previsão e provisão de uma situação de seguro social capaz de integrar socialmente os menos favorecidos;  defesa da adoção de políticas econômicas que, através de uma distribuição eqüitativa da renda, sejam capazes de promover o desenvolvimento econômico e social, assim eliminado as causas da pobreza, de tal forma que os custos sociais das crises econômicas e das políticas de ajuste não recaiam sobre as populações mais vulneráveis: pelo fim da recessão e do desemprego, pelo fim do arrocho salarial, por uma reforma agrária justa, por moradia para os sem-teto;  defesa da extensão do benefício das medidas de saneamento básico, compatível com a preservação do meio ambiente, das ações básicas de saúde e educação para a participação em saúde a todas a comunidades urbanas e rurais de todo o País;  defesa do respeito à vida, desde a concepção, com especial atenção à gestação e ao pato, e à integridade física e mental das crianças e adolescentes, durante todas as fases de seu desenvolvimento;  adoção de medidas preventiva contra a violência e mais tratos às gestantes, às crianças e adolescentes, iniciando-se com a efetiva implantação da Lei n.º 8069/90;  defesa da participação popular no controle social da saúde, através dos Conselhos Muicipais de saúde (leis n.ºs 8080 e 8142);  defesa dos direitos da mulher, no que se refere ao domínio e conhecimento de seu próprio corpo e da sua inserção na sociedade;


defesa de uma política de regulação da fertilidade, inserida num contexto eticamente aceitável, de dimensão humana, baseado na livre escolha do casal e que valorize os métodos naturais;  defesa – a partir da consideração de que “o dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade”, conforme expresso no parágrafo 2º do Artigo 2 da Lei n.º 8080 – da participação efetiva da família, da comunidade e da sociedade nas ações da saúde, educação em saúde e nutrição;  defesa do direito à informação e à educação em saúde, como fundamento da participação dos indivíduos, das famílias e da sociedade no controle social da saúde e na definição da responsabilidade de cada um no processo saúde-doença;  defesa do direito dos povos indígenas a uma atenção integral à saúde, de forma diferenciada, determinada em função das especificidades éticoculturais e por sua situação sanitária, garantindo o sistema tradicional de cada povo indígenas e o acesso ao Sistema Único de saúde, através dos distritos Sanitários Indígenas, assegurada a participação e representatividade das organizações e comunidades indígenas em todo o processo. Durante sua participação no Painel IV (Controle Social na Seguridade Social e no Sistema Único de Saúde), no dia 13, Dom Francisco Austregésilo de Mesquita enfatizou, além desses 16 pontos, a necessidade de a sociedade se opor à privatização da saúde e da previdência social, bem como ao pretendido ajuste fiscal. Christian de Paul de Barchifontaine, sacerdote camiliano, coordenador nacional da Pastoral da Saúde da CNBB.

Comercialização do corpo A comercialização do corpo ou de certas partes do corpo comporta várias facetas. Deixando de lado tanto a prostituição e o proxenetismo quanto a escravatura, não totalmente eliminada no Brasil, diversas modalidades interessam a nossa rubrica. Pessoas em grande miséria propõem ceder um rim ou uma córnea em troca de uma importância em dinheiro que lhes assegure alguns meses de vida. Não sendo regulados, tais anúncios passam impressos, mas proposições verbais sem rastro devem ser mais freqüentes. Se uma sociedade reprova tais propostas, não deveria ajudar de uma maneira ou outra cidadão tão necessitados? O tratamento laboratorial de células humanas destinadas menos à investigação científica do que à criação de novos produtos farmacológicos levanta a questão da propriedade dessas células. Lembramos que, de 1976 a 1983, o médico de Jonh Moore, leucêmico, colheu células para tentar elaborar remédios que, parece, frutificara, inesperadamente no mercado. J.M. acabou reivindicando a propriedade de suas células e derivados. O médico foi condenado pela justiça norte-americana, por não ter informado o paciente de modo a obter um consentimento explícito respeitando um negócio então aleatório. Afinal, o consentimento do paciente à retirada de célula abrange ou não a exploração comercial que delas poderá advir? No caso Moore, o pesquisador descobriu por acaso, posteriormente, as propriedades especiais das células retiradas.


O problema do sangue não está menos na ordem do dia, a demanda mundial superando a oferta, gerando alternativas controvertidas. Uma diretriz da Comunidade Econômica Européia assimila o sangue humano a uma matéria-prima qualquer, candidata ao mercado, eventualmente com vistas à fabricação de produtos, farmacêuticos ou não, Essa postura, entretanto, não é compartilhada pelos franceses, cujo ministro da Saúde, o humanista Bernard Kouchner (“Médicos sem fronteiras, Médicos do Mundo”), declarou: “A Europa dos ricos não comprará o sangue dos pobres”. Nada a ver com certa demagogia acerca de dívidas externas. A postura envolve a delicada questão da retribuição aos doadores de sangue. Respeitáveis democracias, como a Grã-Bretanha e a Alemanha, retribuem seus doadores não sem motivos: comprovou-se menos oneroso na Europa retribuir aos doadores do que mobilizar voluntários benévolos através de campanhas de informação e coletas. Reconhece-se que o sangue é menos caro que os sangue gratuito. Motivos, quer por uma tendência a se distinguir e contestar, que por escrúpulos éticos que escapam aos outros, os franceses não concordam e mantém em princípio (apesar de eventuais falhas na prática) a norma do voluntariado anônimo: “O princípio de não comercialização do corpo humano, decorrente do respeito da dignidade da pessoa humana, funda o sistema rances. Esse é caracterizado pelo anonimato, pela gratuidade e pelo voluntariado,quer se trate de dom de órgão ou de produtos do corpo humano, sangue e células” ( relatório do senador Frank Serusclat). Acresce que se suspeita da qualidade do sangue cedido por indivíduos atraídos pela retribuição: da motivação de generosidade de pessoas sadias, não se arrisca passar à motivação de mal-nutridos, com saúde precária, necessitando uma remuneração imediata que não supõe competência alguma? A questão social permanece mesmo em presença de testes que selecionam as qualidades do sangue. Os franceses invocam um principio caro de sua bioética, contestado por outros, segundo o qual o corpo humano ou qualquer de suas partes não deve entrar no mercado. Realistas ou não, tal idealismo é moralmente exigente, na prática; 1) a França tem cerca de 4 milhões de doadores voluntários, para prestações sangüíneas mais ou menos regulares; 2) esses doadores, em patê sócios de grupo motivadores, são moralmente constrangidos a se absterem de drogas perigosas e a manterem uma vida sexual padronizada. Isso sem prejuízo para o controle oficial, que será doravante exercido por uma agência Nacional do Sangue, de recente reformulação e rigorosa fiscalização. Resta um terreno de grave divergências internacionais, o da patenteabilidade da matéria orgânica viva, dos seres vivos ou partes deles, ou derivados, genéticos ou não, de sua ADN. Limitamo-nos ao campo do corpo humano. A pressão realista dos norteamericanos exerce-se no sentido da maior patenteabilidade possível, não sem motivos: o auto-financiamento de pesquisas famarcológicas, biomédicas, ao passo que os mais idealistas franceses pressionam em sentido contraio. Na I Conferência Norte-Sul sobre o Genoma Humano (Caxambu, Brasil, maio de 1992), foi de fato discutida a questão da patente dos genes seqüenciados. O norte0americano J. Craig Venter já tinha entrado com pedido de patente por mais de 3000 genes humanos identificados por sua equipe. Contrário a esse processo de privatização manifestou-se James Watson, co-descobridor da estrutura do DNA. Do seqüenciamento ou mapeamento até o isolamento de um gene corre mais água debaixo das pontes, e mais ainda antes que o isolamento de um gene muito distinto genética, fonte de eventuais lucros. As devidas opções são mais urgentes nos países desenvolvidos muito engajados nas pesquisas fundamentais, mas seria ilusório imaginar que o Brasil possa se manter


idenfinidamente neutro, ainda que as práticas precedam as posturas e declarações oficiais,q eu exigem madura reflexão e experiência das implicações. Cabe à Igreja incentivar essa reflexão, não ocultar seus valores e princípios (seu modo de entender a dignidade humana que todo mundo invoca), mas também não efetuar as opções que cabem à sociedade civil, representada pelo seu governo, ele mesmo reflexo do ethos nacional. Hubert Lepargneur, sacerdote camiliano, teólogo moralista, comunidade de São Paulo. O médico e o carroceiro Licença, meus ouvintes, por favor, prestem atenção. Vou lhes contar um caso de maldade e judiação. É um caso verdadeiro. Feitiço contra o feiticeiro. Se resume esta lição. Um doutor de hospital, ambicioso por dinheiro, desprezava o enfermo do destino traiçoeiro. Para acudir a nobreza sempre fugia da pobreza, de gari a carpinteiro. Meu amigo, numa tarde bem fresca e ventosa, uma menina inocente, tão meiga e mimosa, cheia de malícia crua, brincava numa rua traiçoeira e criminosa. O seu pai, saindo de casa, um forte abraço lhe deu e disse: - fique, filhinha, pro hospital lá vou eu trabalhar, dando duro, pa ganhar o seu futuro, como papai garantiu o meu. Depois de uma hora, começou a bola chutar e, sem nenhum receio, ela foi correndo buscar. E quando a bola pegava, num impulso ela gritava, começando a desmaiar. Desmaiou porque um carro, correndo muito, nela bateu, e o motorista, assustado, foi-se embora, não atendeu. A menina, desmaiada, toda ferida e machucada, pobrezinha, quase morreu. Nisso, um moço carroceiro, passando ali, a pegou, colocou-a e sua carroça e para um hospital caminhou. Chegando lá. Disparado, logo na porta foi barrado pelo dono, que falou: - Seu moço, não tenho tempo aqui estou muito ocupado, não atendo a menina, porque não faço fiado. De graça não vou trabalhar, gastei muito pra me formar, não sujo a mão com pé-rapado! Ele nem olhou para a menina, que na carroça gemia. Disse apenas pra sair, porque o caminho entupia. E zombava feito nobre: - Zelar de doente pobre e caçar pneumonia! Nisso, o pobre carroceiro outro hospital dói procurar, mas não encontrou só um que o pudesse ajudar, quando logo percebeu que a criancinha morreu ao seu lado, sem se tratar. Chorando, ele voltou para a casa entregar aquela menina linda, que não mais há de brincar. Ao chegar na casa dela, sua mãe, toda amarela, começava a gritar; Meu Deus, que mal que eu fiz para poder merecer a morte de minha filha, que pouco pôde viver? Por que, meu Deus, é assim, não era este o fim que eu rezei para ela ter! Nisso, a vizinhança o pai da menina chamou. E logo ele veio. Já na porta se deparou com a menina estendida, toda quebrada e ferida. Quase que ele se matou. Chorando com a mulher ele logo perguntou: - Mas, depois do acidente ninguém a ajudou? Disse a mulher: - Um carroceiro acudiu-a bem ligeiro, ma de nada adiantou. O moço é gente humilde está lá fora, rezando. Ele me disse que, ao chegar num hospital, foi entrando, mas logo foi barrado. O dono não fazia fiado para ele, que estava ajudando.


O médico disse à esposa: - Já sei o que aconteceu: o doutor do hospital que a nossa filha não atendeu é o ambicioso desgraçado que está ao vosso lado. Querida, esse doutor é eu! Não sabia que era a filhas, nossa filhinha querida, que, por estar com um pobre, por mim não foi atendida. Morreu em desespero, porque eu, por dinheiro, não ouvindo um carroceiro, lhe tirei a própria vida! Agnaldo Divino Gonzaga, seminarista camiliano, agente de Pastoral da Saúde do Hospital das Clínicas.


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