VISITA DO DOENTE NO HOSPITAL E A EVANGELIZAÇÃO PE FIRMINO W. PASQUAL 1. RELACIONAMENTO Quase todo o trabalho de evangelização no ambiente hospitalar é realizada através da relação interpessoal do agente de Pastoral da Saúde durante a visita ao doente. A comunicação torna-se mais perfeita na medida que consiga centrar-se não tanto no conteúdo das mensagens, mas muito mais nos sentimentos e nas emoções do doente. O ato de se comunicar não existe pela simples razão de se comunicar, mas o homem, na comunicação, deseja revelar-se ao outro, e espera que também o outro se revele, isto é, deve estimular idéias, emoções e sentimentos das pessoas que se comunicam. A comunicação com os doentes não é fácil, pois este se encontra num estado debilitado física e psicológicamente. Seu estado emocional está abalado, a incerteza e a angústia penetram no fundo do seu ser. A missão do agente é compreendê-lo e levá-lo a compreender-se a si mesmo através do diálogo interpessoal. É importante que o agente seja capaz de captar as emoções, os sentimentos e as mensagens subjacentes na comunicação com o doente. Com isso leva o paciente a um estado benéfico de paz, segurança e otimismo. A palavra certa na hora certa é transformadora. Às vezes esquecemos que o corpo é o primeiro meio de comunicação que, por dom de Deus, a pessoa recebe para se comunicar com seus semelhantes. Além da fala e com a fala, constantemente nos comunicamos com todo o corpo: rosto, olhar, lábios, mãos, pés, movimentos, estado de tensão, estado de relax, tom de voz... Para o bom entendedor, todo o corpo fala e transmite os sentimentos, as emoções, enfim a interioridade da pessoa. Escutar é uma arte, uma habilidade que se adquire com a prática pastoral. Encontrando alguém que o escute com paciência e o compreenda com disponibilidade de tempo, o doente abre prazerosamente seu coração e partilha seus problemas e sentimentos. Quantas pessoas têm a necessidade, sobretudo nas horas difíceis, de alguém que as escute e entenda suas emoções e preocupações. Neste encontro realiza-se um efeito terapêutico que traz grandes benefícios ao doente e o trona capaz de se compreender, tomar decisões próprias e de se abrir para o seu Deus Salvador. 2. EVANGELIZAR A postura de quem vai evangelizar não é a mesma de quem segue um caminho de sacramentalização. A pessoa que vai sacramentalizar coloca-se numa atitude de perguntar: Quem deseja receber os sacramentos? A confissão? A comunhão?
Dizemos que, sobretudo num ambiente heterogêneo de hospital, essa forma de proceder não tem mais valor porque supõe pessoas que já convertidas e participantes da comunidade. Ora, só falando dos católicos, sabemos que apenas 10% possuem esta maturidade de vida cristã. Que dizer da presença dos não católicos? Estando num mundo secularizado e pluralista. A maioria das pessoas não vivem no caminho da fé e a presença de outros credos na sociedade é uma constante. Desde o Concílio Vaticano II, a Igreja falou e fala da necessidade presente de evangelizar. O próprio documento da CNBB, que apresenta o Plano de Evangelização da Igreja para 1995-1998, se intitula “Diretrizes gerais da ação evangelizadora da Igreja no Brasil”. Há uma afirmação clara na necessidade de evangelizar e já estão sendo apresentadas pistas bastante significativas de como evangelizar. 3. HOSPITAL Em primeiro lugar, o hospital não é mais o lugar só para morrer, mas sobretudo para recuperar a saúde. Dos internados, talvez 10 não conseguem a recuperação da saúde física e vão a óbito. É mais um lugar de diagnósticos e de tratamento. Tratando-se de evangelização no ambiente hospitalar, temos uma série de exigências próprias do lugar e das pessoas atingidas pela doença. Num trabalho de pastoral relacionado com doentes, a primeira peculiaridade é que os doentes estão lá não para cumprir uma necessidade religiosa, mas para uma exigência premente de busca de saúde. As pessoas ficam poucos dias ou transitam pelo hospital para receberam os meios de se restabelecer ou de prevenir as moléstias possíveis. Isso significa que na pastoral hospitalar não se pode planejar ou querer programar uma catequese prolongada. Outras peculiaridade que alta aos olhos do observador é o ambiente heterogêneo das pessoas. O hospital é uma cópia da sociedade e não de uma paróquia. Acolhem lá pessoas de todos os níveis sociais e raças: professores, médicos, administradores, enfermeiros, pretos, brancos, amarelos, pessoas ricas, pobres, da classe média; católica, crentes, espíritas, budistas, ateus e atoa. Além do mais é todo o hospital, a saber, funcionários, visitantes e doente, como também as próprias estruturas que precisam ser atingidas para que se tornem mais humanas e cristãs. Nesta realidade tão diversificada, a evangelização tem que seguir um caminho ecumênico e pluralista. O relacionamento é feito com todos partindo das pessoas onde vivem, pensam e se encontram. O respeito pela convicção pessoal é fundamental. Não é lugar de proselitismo, mas há espaço para atuar: todos podem amadurecer na própria fé assumida com sinceridade. Os cristãos podem se encontrar junto à pessoa de Jesus Salvador e, os que crêem, mas não são cristãos, podem se encontrar junto a um Deus cheio de
misericórdia, de perdão e de paz. Não é um lugar cheio de catequese, mas de amadurecimento na fé e de busca de salvação: encontrar-se com Deus. O objetivo da ação pastoral não são só os doentes, mas todos os que trabalham no hospital, isto é, o mundo hospitalar. 4. COMO EVANGELIZAR Sem muitos rodeios, podemos dizer que evangelizar é oferecer o primeiro anúncio. Através do diálogo interpessoal do testemunho de vida, apresenta-se o Deus de Jesus Cristo para todos os que não são cristãos, mas vivem sua fé e a própria pessoa de Jesus Cristo para todos os que se dizem cristãos, católicos ou não, mas não vivem a fé. O objetivo é que cheguem a um encontro pessoal com Deus ou com Jesus Cristo. Para isso é muito importante ter tido uma experiência pessoal de salvação. Para os católicos praticamente, que são poucos, e os convertidos, deve-se administrar os sacramentos. O anúncio de Jesus Jesus é que nos revela a verdadeira face de Deus que é Pai, através da pregação do Reino de Deus. Muitas vezes supomos a fé onde ainda não existe. O que importa é que a pessoa assuma dentro de si a nova vida revelada por Jesus. É necessário que haja um encontro real e pessoal com Deus. Para Jesus é a pregação do reino de Deus o objetivo primordial: “converteivos, porque está próximo o Reino de Deus”(Mt 3,2). Jesus envia seus apóstolos para pregarem: “Está próximo o Reino dos Céus” (Mt 10,7). O Reino de Deus significa a soberania de Deus, ou melhor, a ação divina que o homem dá sua resposta pela conversão, pela fé e começa a mudar sua vida. Algumas características do Reino de Jesus Deus é Pai amoroso para com todos e a posse do Reino é gratuita: não se faz pelas obras, mas é um banquete destino para o qual todos somos convidados. As maravilhosas parábolas falam tão bem do Reino! No Reino, o valor pessoa humana é primordial. Quando Jesus curou o homem da mãos paralisada, colocou-o no centro da sinagoga para significar que ele, pessoa humana, é o centro (Mc 3,1-6). No Reino, o valor fundamental é o amor e amor aberto a todos os pecadores. É um Reino universal, isto é, para toda a humanidade (Mt 28,19). O único obstáculo é o pecado, a auto-suficiência, as riquezas egoístas, a maldade. O anúncio dos apóstolos é a pessoa de Jesus
O reino de Deus se personaliza na pessoa de Jesus. Jesus morto, ressuscitado e glorificado é que nos salva, ou melhor já nos salvou. Os discursos, contidos nos Atos dos Apóstolos(2,14-39;3,12-26;4,9-12;13,16-41), apresentam a Boa Nova da salvação: Jesus é quem salva. A primeira meta de todo evangelizador é ter uma experiência pessoal de salvação. O dom do espírito A força dos apóstolos era a presença do Espírito Santo: “Recebereis a força do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e me sereis testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia, na Samaria, até as extremidades da terra”(At 1,8). Os apóstolos acreditaram que o espírito fazia presente e tornava eficaz, em todo o lugar e tempo, a salvação realizada por Jesus Cristo. É o Espírito quem revela a verdade completa sobre o plano de salvação e que dá testemunho d Jesus como único Salvador. Às vezes pensamos, que somos nós! O grande protagonista da evangelização é o Espírito Santo. Fé A fé é a resposta que o homem dá a deus: “Crê e te salvarás tu e tua casa (At 16,31). A fé não é um sentimento ou um ato intelectual, mas a aceitação pessoal da salvação que Jesus nos oferece. Jesus morto na cruz por nós já nos mereceu a salvação. Pela fé fazemos chegar a salvação até nós, nos apropriamos dos méritos de Jesus que nos salvou (E 2,8-9; Gl 2,16). Não nos salvamos pelas obras, mas pela fé: “Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado”( Mc 16,16). A fé implica em três modos de ser: a) crer que a pessoa de Jesus nos salva, estabelecer um novo mundo de se relacionar e comprometer-se com Ele. b) confiar não em si, mas em alguém que tem o poder de realizar a salvação. c) depender, obedecendo-o, pois nos ama e deseja o melhor para nós. Tornamonos servos de Deus. O ANÚNCIO HOJE A primeira meta de todo evangelizador é ter uma experiência pessoal de salvação. É necessário “ter nascido de novo”( Jo 3,3) como exigia Jesus ao sábio Nicodemos. A pessoa não se torna um mestre, mas sim uma testemunha: proclama Jesus e dá testemunho do que “viu e ouviu” (At 4,20). Não só sabe e fala que Deus é amor, mas já tem sido experiência pessoal e incondicional de ser amado ( Mc 5,20). Somente quem teve experi6encia de salvação pode dar testemunho eficaz do poder do Evangelho.
Apresentamos o conteúdo esquemático da Boa Nova da salvação ao homem de hoje. a) O amor de Deus – Ele nos ama com amor pessoal e incondicional: “Com amor eterno eu te amei”( Jr 1,3). Deus nos ama não porque somos bons, mas porque Ele é bom: “Deus é amor”(1Jo 4,8). É importante transmitir o amor que nós sentimos. b) O pecado – Somos pecadores já nascemos sem a graça divina “em pecado minha mãe me concedeu” ( Sl 50). Conscientes em não confiar em Deus e não depender Dele: “Todos pecaram e estão privados da glória de Deus”(Rm 3,23). Não podemos nos salvar por nós mesmos: “O salário do pecado é a morte” (Rm 6,23). c) A salvação de Jesus – Jesus já nos salvou a todos morrendo na cruz por nós. “Deus tanto amou o mundo, que enviou seu Filho Único... não para condenar o mundo, não para que o mundo se salve”( Jo 3,16-17). É no encontro pessoal com Ele que somos justificados. “Jesus, Nosso Senhor, foi entregue por nossos pecados e foi ressuscitado para nossa justificação (Rm 4,24-25). d) O dom do Espírito Santo – Jesus se faz presente em nossas vidas por meio de seu Espírito. “dar-vos-ei um coração novo e infundirei um Espírito novo” (Az 36,26). O espírito Santo é o intercessor que nos introduz na vida da Trindade, para a realização do projeto de Deus, na salvação filial e na glorificação dos filhos de Deus (cf. Rm 8,19-27). e) A conversão e a fé – É a aceitação do dom da salvação. Jesus já nos ganhou a Nova Vida. “Pela graça fostes salvos, por meio da fé, e isso não vem de nós, é dom de Deus”( Ef 7,8). É necessário confessá-Lo como Salvador pessoal e renunciar a qualquer outro meio de salvaçào: “O que não nasce de novo, não pode ser o Reino de Deus”( Jo 3,3). f) A alegria da vida cristã – A vida divina é um tesouro que uma vez encontrado, deixamos tudo por causa dele (cf. Mt 13,44-48). A resposta do Espírito, fruto da ação salvífica de Deus em todo o ser humano, ocasiona uma grande alegria. É a alegria evangélica que brota mais do dar do que do receber (At 20,35). A pessoa está em harmonia no seu íntimo, esperançosa no seu ser e por isso sente-se feliz como nas bemaventuranças de Jesus. Pe. Fermino W. Pasqual – Capelão da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
UTI ESPERANÇA OU MEDO Na década de 40, surgiram os primeiro embriões da Unidade de Tratamento Intensivo. Só que, em lugar do termo UTI, recebiam o nome, de salas de recuperação pós-operatória. Até porque limitavam-se a acomodar pacientes recém-operados, para que os médicos pudessem tê-los sob vigilância permanente durante os primeiros momentos da recuperação. Um detalhe importantíssimo as diferenciava dos grandes centros de tratamento intensivo atuais: a vida desses pacientes dependia, apenas, da atenção humana. Os aparelhos para respiração artificial só surgiram anos mais tarde, durante a epidemia de poliomielite ocorrida entre 1948 e 1953, na Califórnia e na Escandinávia. Estes, por sua vez, representaram um grande salto para a recuperação dos pacientes. No começo dos anos 60, mais um avanço na área da medicina intensiva: a criação do monitor cardíaco, um pequeno aparelho capaz de registrar o ritmo e a freqüência dos batimentos do coração. Graças a esse simples aparelho, foi possível controle das arritmias cardíacas (devido a distúrbios elétricos no coração, enfartes doenças de Chagas...), que conduzem à morte súbita. Com o desenvolvimento desse recurso, reduziu-se em 30% a taxa de mortalidade por essas causas. Mas isso era apenas o começo de uma escalada rumo ao desenvolvimento e aprimoramento de diversos equipamentos capazes de salvar vidas, que oram ocorrendo ao longo do últimos 30 anos. Como resultado, hoje as UTIs dispõem de um conjunto impressionante de recursos que dão ao paciente em estado grave a chance de driblar a morte e concentrar forças para se recuperar. Entre eles, respiradouros de última geração – com sistema de alarme que impede qualquer tipo de falha, mecânica ou humana – e balões intraaórticos, capazes de revezar com o próprio coração a tarefa fundamental de bombear o sangue para o organismo. Enfim, as UTIs atuais contam com o que a medicina tem de mais sofisticado e mais eficiente para a manutenção da vida. Porém, fora ao atentado ao bolso que o paciente pode vir a sofrer, é o próprio cenário da UTI o que mais apavora. Apesar de uma internação em unidade de tratamento intensivo muitas vezes representar a única chance que o paciente tem de sobreviver, não se pode chamar de uma experiência agradável. Na maior parte das vezes, o doente se sente devassado pelo vaivém de enfermeiras e médicos (e pelo outros pacientes que podem estar morrendo ao seu lado), pelas picadas e pelos tubos que entram pelo seu corpo, amedrontado e... solitário. Mas par compensar essa estranha
realidade temporária, algumas UTIs no Brasil seguindo exemplos dos melhores centros de terapia intensiva do exterior, começam a partir em busca de um atendimento mais humanizado. Esse é o último approach que faltava nas UTIs, superando até mesmo os avanços tecnológicos. Até porque, a maneira pela qual o paciente é tratado conta muitos pontos para o seu restabelecimento. Pensando nisso os hospitais pretendem derrubar de vez o conceito generalizado de que UTI é um corredor da morte, uma espécie de cemitério de elefantes onde os velhos vão morrer mais ou menos em paz – só que cercados por uma parafernália de tecnologia de última geração. Conceitualmente, a UTI se destina a pacientes potencialmente recuperáveis. Dr. Elias Knobel, autor de um manual que hoje é a bíblia de conduta de tratamento de pacientes graves, assim define a função essencial de uma UTI: Dar ao paciente grave o tratamento com todos os recursos disponíveis, evitar sofriemnto, manter a dignidade. Se possível, recuperá-lo. Em primeiro lugar – diz o Dr. Elias Knobel -, deve-se levar em conta o pressuposto fundamental da terapia intensiva: tratar de pacientes potencialmente recuperáveis. Segundo: na dúvida, tratar. Terceiro; pacientes jovens são os que têm melhor potencial e merecem teoricamente, o maior investimento de recursos. Mas é o tino do especialista, na hora da avaliação do potencial de recuperação de um paciente, que no fundo vai determinar a destinação de uma soma maior ou menor de recursos para ele. “Nas UTIs , as exceções fazem a regra. Ou seja: casos considerados perdidos acabam surpreendendo! Extraído da revista: SAÚDE PARA TODOS, abril 1996 – ano 1- n.º 12.