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Hipertensão Arterial: silêncio perigoso De acordo com dados do Ministério da Saúde, o Brasil tem hoje 16 milhões de hipertensos. A pressão alta atinge pessoas de todas as idades, porém é mais comum naquelas que têm acima de 50 anos. De cada duas pessoas desta idade, uma sofre de hipertensão. A pressão alta não apresenta nenhuma sintomatologia e por isso as pessoas não têm o hábito de medi-la constantemente. Por outro lado, é uma doença que é possível controlá-la, mas em geral não tem cura. As causas da hipertensão ainda não são totalmente conhecidas, mas sabe-se que geralmente é um problema hereditário ou provocado pelo stress. A elevada ingestão de sal, a vida sedentária, a obesidade, os fumantes ou excesso de bebidas alcoólicas podem ser condições que predispõem a elevação dos níveis de pressão arterial. Colesterol

O colesterol é uma gordura que o corpo humano necessita para funcionar normalmente, mas quando alcança níveis elevados, pode causar prejuízos à saúde. Os níveis de colesterol no sangue dependem da quantidade produzida pelo próprio organismo e da quantidade de gordura ingerida em alimentos de origem animal. Assim como a hipertensão, o colesterol alto não apresenta sintomas. Dessa forma, é importante acompanhar periodicamente seus níveis no sangue, através de exames específicos. Quando há excesso de colesterol no sangue poderá ocorrer depósito nas artérias, levando à obstrução e podendo provocar infarto. O colesterol alto, o hábito de fumar e a pressão alta são as causas mais freqüentes do infarto. Quando o colesterol não está no nível desejável, deve-se reduzir a ingestão de alimentos ricos em gordura saturada e colesterol. EVITE: carnes gordurosas, vísceras (fígado, corsação), embutidos (linguiça, paio, salsicha), frios (mortadela, salame, presunto), frutos do mar. Leite e iogurtes integrais, creme de leite, queijos amarelos, cremosos. Gema de ovo. Massas de bolo com gema de ovo, sorvete com leite, chocolates, coco, creme chantilly. Manteiga, creme de leite, óleo de coco e de dendê, maionese, gordura animal (toucinho, banha) e principalmente frituras. PREFIRA: peixes, frangos sem a pele, carnes magras. Leite e iogurte desnatado, queijo branco ou cottage ou ricota. Clara de ovo. Frutas e verduras frescas. Massas de bolo sem gema, sorvetes e doces de frutas. Cereais integrais, pães pobres em gordura, massas sem gema de ovo, ervilha, feijão, lentilha, arroz. Margarina, óleos vegetais (soja, milho). O SENTIDO TERAPÊUTICO DA FÉ João Batista Libânio Nada tão arraigado ao nosso imaginário religioso quanto a certeza de que a fé cura. Sobretudo em Minas. Ninguém se submete a uma operação, ninguém que esteja doente deixa de fazer pedidos de oração. Isso brota até de lábios descrentes. Está fundo no nosso coração.


Que há de verdade e que há de ilusão? Quando se faz uma pergunta, tem-se na cabeça já uma forma de resposta. É dentro desse quadro que as idéias se entendem. A fé cura? Imaginamos Deus como um Ser todo poderoso que está a intervir continuamente no mundo como um agente maios, soberano, não preso a nossos limites. A medicina já não consegue vencer um câncer. Reza-se a Deus, qual médico divino, cura-o. Alguém vai fazer uma viagem. Reza-se; Deus, qual motorista divino, dirige o veículo para evitar qualquer desastre. Vai-se fazer um exame difícil. Reza-se; Deus, de preferência o Espírito Santo, qual sábio onisciente, ilumina o aluno para responder às perguntas. Posta a pergunta dessa forma, levamos um susto. Tememos dizer que a fé cura uma doença, que protege de um acidente, que facilita uma prova escolar. Apareceria um Deus no nosso meio como um de nós, no mesmo nível de nossas ações e, às vezes suprindo nossa ignorância, nosso descuido, nossa preguiça. Se esta é a pergunta, a fé não cura, não protege, não cria conhecimentos na hora do exame. Outra é a pergunta. A ordem do mundo está aí. Deus escreveu nele as leis de sua sabedoria e misericórdia, não de uma maneira estática, fixista, no início, deixando depois tudo rolar sem que continuasse seu ato criativo. Mas mantém com o mundo uma relação criativa. Não como um agente igual a nós. Nem no mesmo nível de nossas ações, concorrendo conosco. Não. Age sobre as causas humanas que, sem perder diretamente sobre o nosso mundo visível, sensível. Coloca todas as realidades na sua existência. Sustenta-as no próprio ser. Do contrário. Desperta em todas elas suas forças, provoca o desenvolvimento de suas virtualidades, mantendo com elas uma relação única, original, transcendental. Relação que só Deus pode estabelecer. Dessa relação surgem maravilhas que não sabemos explicar nem entender. A fé é a tomada de consciência de tal ação de Deus. E, em dado momento, percebemos algo de maravilhoso. A medicina se cala. As ciências permanecem perplexas. Ninguém jamais decifrou esse mistério da permanente relação de Deus com o criador. É milagre e não – milagre. Não é milagre, porque Deus não faz nada de novo do que sempre está a fazer. Sempre em relação infinita, profunda, íntima com todo o criado, sustentando-o na existência , atraindo-o em direção a uma plenitude, que Teilhard de Chardin tão belamente chamou de “Ponto Ômega”. Santo Tomás fala de Deus “como íntimo às criaturas”. Santo Agostinho, de maneira poética, referiu-se a Ele como “mais interior do que há de mais íntimo em mim mesmo, mais alto no que há de supremo em mim”. É de estranhar-se então que esta presença de Deus provoque contínuas maravilhas? E cada maravilha que a fé descobre é verdadeiro milagre. A fé cura, a fé transporta montanhas, a fé faz coisas sublimes, não arrancando Deus de seu esconderijo, não acordando-o de algum sono letárgico, mas sabendo do que Deus está sempre a fazer. Viver nessa fé é a atitude mais cristã. Não é buscar novidades diferentes, mas familiarizar-se com o agir transcendente, permanente, real de Deus, como Deus, em toda a realidade. É um agir único, incomparável com qualquer ação humana. Por isso, não pode nunca ser diretamente constatado pelas nossas ciências, mas aceito na fé. A fé cura. NOVA EVANGLEIZAÇÃO: SERÃO SUFICIENTES “NOVOS DISCURSOS? TADEU DOS REIS ÁVILA Todos nós sonhamos com uma Igreja que evangelize mais com gestos do que com palavras, pois acreditamos que a Nova Evangelização não se reduz apenas à questão de novas técnicas e estratégias de convencimento do público no tangente 1as da fé cristã. A Nova Evangelização necessita de evangelizadores, de Agentes de Pastoral que tenham feito uma profunda experiência de Deus, para que possam anunciar com entusiasmo a Boa


Nova. Essa experiência a fazemos lendo e meditando a Palavra de Deus e deixando-se interpelar por Ela. Não basta conhecê-la apenas no nível intelectual. É preciso que a palavra penetre em todo o nosso ser para que em todo nosso agir possa transparecer a figura e o modo de ser de Jesus de Nazaré. Os santos que revolucionaram o mundo conheciam muito pouco teologia e outras ciências. Por outro lado, eram especialistas nas obras de misericórdia. Basta ler a vida de São Camilo, São Vicente de Paulo, Luiz Guanela, Madre Tereza de Calcutá e tantos outros. Por estes exemplos percebemos que para fazer o bem é preciso saber unir conhecimento científicos à prática. São Camilo sabia muito pouco de oratória e Sagrada escritura, mas tornou-se um mestre na escola da caridade, pois estava convencido de que tudo o que fizesse ao doente era o próprio Cristo que fazia. São Vicente de Paulo já era sacerdote quando se converteu , descobrindo que cada mendigo escondia Jesus Cristo. É conhecido até aquela história contada por seus biógrafos de que um dia São Vicente se encontrava todo absorvido em oração diante de Jesus sacramentado quando veio um irmão chamá-lo dizendo que um irmão chamá-lo dizendo que havia um pobre chamando-o na portaria. E ele, olhando para Jesus no sacrário disselhe: “Senhor, deixo-te aqui na Sagrada Eucaristia para encontrar-me contigo na pessoa do mendigo que me chama”. Madre Tereza de Calcutá que todos admiramos, durante uma viagem em 1946 sentiu-se chamada por Deus para se dedicar aos pobres e miseráveis. Dizia ela: “O chamado foi uma ordem. Eu deveria abandonar o conforto do meu convento, renunciar a tudo e seguir Cristo nas favelas, viver com os mais pobres entre os pobres”. Hoje Deus continua suscitando pessoas para serem sinal de amor e misericórdia aos que sofrem . O Agente de Pastoral da Saúde toca o coração do evangelho ao se preocupar com os pobres e excluídos. Ao procurar atualizar os gestos de Jesus que teve uma preocupação toda especial para com os enfermos, está evangelizando e tornando visível o Reino de Deus no mundo. Não devemos ficar só na expectativa ou ver as situações que pedem de nós uma ação concreta e passar adiante, como fizeram o sacerdote e o levita na parábola do Bom Samaritano. Eles tiveram medo de se comprometer ou quem sabe de se atrasarem para as orações no templo, ou até mesmo de sujarem suas mãos e roupas. Somente o Samaritano foi capaz de ver, comover-se e agir diante daquela situação que exigia uma atitude. O Brasil é considerado um grande hospital onde são poucos os que têm acesso às modernas técnicas de tratamento de doenças incuráveis e é de pasmar que ainda se morre de doença que hoje são curáveis; mas por não ter como custear um tratamento, vidas humanas são ceifadas ainda jovens. A propósito, no Brasil a vida vale muito pouco. Basta dar uma olhada nos noticiários para se ter uma idéias. É diante de tantos sinais de morte que nós, cristãos que somos, devemos dar uma resposta. Não vale mais a explicação de que tudo acontece por vontade de Deus, pois ela já não “cola” mais. Deus criou o homem para a felicidade e 90% do sofrimento hoje é causado pelo egoísmo da má distribuição de rendas. Como cristãos, Agentes de Pastoral, não podemos ficar passivos aguardando a chegada de um “salvador da pátria”. Procuremos, a partir da realidade concreta de nossa comunidade, organizarmos com o intuito de promover a vida, promovendo a saúde. Pense na parábola do Bom Samaritano e em seus três personagens: o Sacerdote, o Levita, o Samaritano. Com sinceridade, responda para si próprio: com qual dos três você se


identifica mais? Sabemos quem foi o próximo do homem caído e sabemos qual foi a ordem de Jesus: “vá e faça o mesmo”. Portanto, sejamos bons Samaritanos, misericordiosos como o Pai celeste é misericordioso. Desse modo estaremos fazendo a Nova Evangelização acontecer através de gestos concretos e não através de discursos vazios que não levam a nada.

VALOR DA COMUNICAÇÃO Comunicação implica receptividade ao universo, às suas criaturas e às situações que se apresentam. Para haver verdadeira comunicação, é preciso fé na capacidade de o ser humano evoluir. Sem essa fé na capacidade de transformar, nem uma palavra renovadora poderia ser emitida. Comunicação pressupõe união de esforços em busca da Realidade, de uma Verdade maior. Para ser fluida, cada ser precisa ir ao encalço da própria realidade interna, manifestando verdade e honestidade consigo mesmo e com o mundo onde vive. Quando a pessoa quer aperfeiçoar a comunicação, em geral se empenha em aprimorar sua fala e expressão, esquecendo-se de que é preciso apurar sobretudo a capacidade de ouvir. Uma comunicação fluida só se estabelece se há esforço consciente para ouvir. Nunca se deve ouvir apenas o que é de interesse próprio. A auto concentração é incompatível com a comunicação, pois torna o ser inapto a escutar o outro. Para a comunicação se aprofundar, é preciso saber colocar-se no lugar dos demais. Assim crescem a fraternidade e a compaixão. Se durante a comunicação houver dispersão, se a atenção for posta em coisa à parte, ela será deficiente. Uma comunicação eficiente não pode ser excessivamente sintética nem complexa. Antes de transmitir uma mensagem, é preciso estar seguro de seu conteúdo. Evita-se assim o descrédito por difundir informações contraditórias. Uma comunicação transcende as palavras; compõe-se também das atitudes, dos gestos, do tom de voz, da expressão física, das escolhas e das metas dos interlocutores. Deve-se organizar o conteúdo a ser transmitido e buscar a forma de comunicá-lo corretamente. Cada ato em favor da boa comunicação é um avanço para se chegar à harmonia. Numa comunicação viva, deve-se entrar em detalhes apenas quando indispensáveis. A comunicação raramente se circunscreve a um instante: inicia-se antes da palavra e prossegue além dela. A comunicação requer ações coerentes com o que é transmitido. Não se deve difundir algo que não faça parte da própria vida, sob pena de desgastar a mensagem. Comunicação é um exercício de compartilhar que se estabelece quando há disponibilidade para a compreensão. A comunicação em bases espirituais sempre levará à dissolução de limites individuais em busca de uma integração de metas. A Unidade antecipa o que as palavras devem dizer, criando um sagrado estado de comunhão. Comunhão e comunicação são termos que possuem a mesma raiz.


A ARTE DE SER PESSOA SOLIDÁRIA FREI BERNARDO 1. Aprende a escutar atentamente e a entender o que o outro pretende transmitir. 2. Esforçar-se por acolher o outro como ele é, de forma serena, empática e confiante. 3. Dispõe-te a aprender com todo os outros, evitando os preconceitos injustos. 4. Como a vida é uma caminhada, põe-te a caminho dos objetivos com os outros, como eles precisarem. 5. Não resistas a mudançad ajustadas à tua realização integrada para bem servires. 6. Estima e estimula os outros partilhando, sem calculismos infantis, o que tens e o que és. 7. Torna-se disponível, servindo a quem precisa sem busca de compensações egoístas. 8. S6e dedicando e desenvolve a capacidade de perdoar com simplicidade e sem medida. 9. Expõe a tua opinião refletida com transparente lealdade e sem manipulação. 10. No serviço dos outros, procura ser sensato e serviçal, sem manipulação. 11. Não ponhas rótulos às pessoa , aceita-as como são, diferentes e complementares. 12. Não te precipites no julgamento dos outros, tenta colocar-te no lugar deles. 13. O diálogo supõe uma janela aberta para partilhar com verdade e discrição. 14. A vida é curta e o tempo é precioso, não percas com mesquinharias; seria “pecado”. 15. Para partilhar o que és, e o que tens, não rotules e aprende a sorrir oportunamente. 16. O diálogo de janela aberta e coração limpo é um processo para seres feliz, pela partilha total. 17. Desenvolve a auto-imagem realista e habitua-te a adaptar-te às diversas circunstâncias. 18. Desenvolve os critérios de discernimento para decidir a agir bem, no tempo oportuno. 19. Aprende a ser realista, a bem distinguir o que é evidente e razoável. 20. Atento ao essencial, aprende a distinguir o que é definitivo do que é provisório, desenvolvendo as caraterísticas do amor cristão, sempre aberto ao futuro, que começa agora, e a viver na esperança, com inteligência e coração despertos.

Variações sobre a morte MIGUEL REALE Depois que Nuce me deixou sozinho em nossa longa-breve história de amor, o mundo passou a ter outro sentido, ficando martelando em meus ouvidos a recordaão dos versos de Giacomo Leopardi: “a um tempo stesso Amore e Morte? Ingenerò la sorte”. Acrescenta o poeta que o primeiro efeito da perda de uma pessoa querida, que verdadeira e profundamente se amou, é o desejo de morrer. Em verdade, a primeira vontade é a do reencontro que somente a morte possibilita, resultando dessa aspiração a crença ou o reforço da crença da crença na imortalidade da alma. O paradoxo da existência humana é que nada é tão certo quanto a morte, sobre cujo significado, no entanto, reina a incerteza, a começar pela afirmação de que ela representaria apenas um fim material inevitável. Norberto Bobbio, com cujas idéias tantas vezes conicido, pertence à espécie infeliz dos homens para os quais, após a morte, não há senão il buio, a escuridão. Creio, ao contrário e é o amor a fonte primordial dessa crença, vencedora de todas as perplexidades racionais, que a alma se desprende do corpo e passa para outra forma de existir, isenta de materialidade e, como tal, mais pura.


Dir-se-á que se trata de mera conjetura, mas esta é também um forma de verdade, a que nos resta quando falham as tentativas da razão para explicar os fatos com base no explêndido leque de sua metodologia. Se até no domínio das ciências exatas se admite, hoje em dia, que sobre certos problemas fundamentais somente pode haver meras conjeturas, que dizer do magno problema da morte? O segundo efeito da morte de uma pessoa querida é deixar de vê-la como um dano irreparável, uma ameaça que pesa sobre todas as criaturas. Nada como a perda de uma pessoa querida para nos reconciliarmos com a morte, deixando de temê-la para serenamente esperá-la a fim de restabelecer-se o elo perdido. Não que o desaparecimento corpóreo possa por termo ao vínculo de um amor que dia a dia veio aprofundando suas raízes, mas é o corpo , que perdura, o obstáculo a atingir a verdade última, para a qual a razão não consegue das respostas válidas. Mas, insuficiente a razão, sobrevem a fé pelas vias o amor. A morte não representa, portanto, o termo final da pessoa que nos deixou, pois de sua memória emerge a obrigação de viver como se ela ainda estivesse presente, substituindo-a por inteiro. Essa é a herança mais alta, a única que tem valor real. A morte é, assim, um comando de amor, para os que sobrevivem, uma exigência para que se dê continuidade àquilo que antes se fazia, ao trabalho que não pode nem deve ser interrompido. Amoroso trabalho se torna, então, binada a nossa ocupação, como se dois passassem a trabalhar, um a inspirar e o outro a fazer. Quando quem morre se despede de uma família, na qual era o centro de referência e de cuidados, pode-se dizer, em suma , que se herda o amor familial como um acréscimo do ser. O desolado amante sente, então, imperiosa necessidade de amar, de maneira diversa e mais profunda, filhos, netos e bisnetos, com ardor devotado à aquela que foi chamada a outra vida. Sim, porque a primeira conseqüência da morte é, repito, robustecer-nos a crença num ente que subsiste numa duração pura, que é a forma humana da eternidade divina, outra conjetura a juntar-se ao nosso mar de conjeturas. Por outro lado, a morte, que constitui uma fratura na teia de nossos sentimentos, nos ensina a ver o mundo com outros olhos. Aprende-se a viver com lágrimas nos olhos quando menos se espera, ao acontecer algo, por ínfimo que seja, capaz de suscitar uma lembrança. Surge uma vida substancialmente dupla, uma perdida nas preocupações da existência quotidiana, outra presa a uma visão transcendental, na qual só têm sentido os valores essenciais, a espera a todo instante convertida em esperança. Não é exagero afirmar que sem a morte não teria significação a vida. Imagine-se homem imortal, para quem infância, juventude, maturidade e velhice seriam palavras desprovidas de sentido, um tempo sempre igual, no qual não haveria lugar nem para a esperança, nem para a saudade. A temporalidade existencial tem por si mesma um sentido de provisoriedade, o outro lado de nossa finitude, constituindo-se um liame essencial entre a duração e o sentido da vida, o que tem sido bem percebido pelos filósofos da saudade, a palavra que misteriosamente engloba o passado e o futuro. Sentir saudade de um ente amado é uma forma de ressuscitá-lo, de fazê-lo presente em nossos empenhos quotidianos. Se o destino, no dizer do mais merencório dos vates, acima invocado, gera, a um só tempo, Amor e Morte, não é menos verdade que o amor faz perdurar a imagem ou figura de quem cerrou para sempre os olhos, inserindo-a no âmbito da consciência de quem saudosamente a recorda. Se não descesse sobre meus olhos a luz da fé, na certeza de um


futuro reencontro, já bastaria o liame da saudade para endourar de espiritualidade o inexorável fato de a morte, libertando-a da escuridão. Embora possa parecer pretensão absurda, talvez se pudesse proclamar: “Felizes os que amam, que deles é o reino da morte.” Foi talvez por isso que, ao pé da sepultura de Nuce, senti o invencível impulso de declarar, como numa prece, o que depois compus nestes versos: “Não mais porás teus olhos em meus olhos, mas nos veremos pelo tempo afora pelos olhos de nosso eterno amor”.

Migeul Reale, jurista, filósofo, menbro da Academia Brasileira de Letras, foi reitor da USP. (Artigo extraído do jornal Estado de São Pulo em 12 de junho de 1999)

COMO CUIDAR DE ALGUÉM COM AIDS FREI PEDRO BENÍCIO FERREIRA LOPES OFM- CAP Existem muitas doenças graves no nosso dia-a-dia, mas a AIDS trouxe novos desafios para todos os envolvidos – não penas os indivíduos com a moléstia, mas também seus amigos parceiros e familiares. Pessoas no melhor momento de suas vidas adoecem, reduzindo a fase mais produtiva e as perspectivas de vida longa podem ser gravemente comprometidas. Nesta situação, não podemos abandonar as pessoas à solidão, mas solidalizar-nos com elas; é a oportunidade de sensibilizar a humanidade para a solidariedade. Quando alguém seu conhecido adoece, especialmente com uma doença estigmatizante com AIDS, você pode talvez sentir-se incapaz de ajudá-lo ou sem competência. Se essa pessoa for um bom amigo, você talvez diga: Telefone se precisar de alguma coisa. Então, por medo ou insegurança, você receia que o chamado venha. Aqui vão umas sugestões que podem ajudá-lo a ajudar alguém doente. - Não fuja de seu amigo. Esteja próximo a ele. Seja o amigo, a pessoa querida que você foi, especialmente agora que é tão necessário. - Toque seu amigo. Um simples aperto de mão ou abraço vai dar-lhe a certeza de que você gosta dele. Não tenha medo... abraços são reconfortantes. - Telefone e pergunte se você pode fazer-lhe uma visita. Deixe a decisão para seu amigo. Se ele não puder ou não quiser vê-lo naquele dia, visite-o noutra ocasião. Sua amizade e presença podem ajudar a afastar o medo, a solidão. - Telefone, ofereça-se para levar uma comida preferida ou ir à sua casa prepara um prato. Combine uma hora para fazerem a refeição juntos. É agradável ter um amigo à mesa. - Ofereça-se para ajudar a resolver alguns problemas de rotina (idas ao banco, imobiliária, correio etc.) - Telefone ao seu amigo e pergunte se precisa que lhe faça alguma compra. - Não esqueça a data de aniversário do seu amigo, e convide-o para festas. - Se seu amigo estiver hospitalizado, fale com seu companheiro ou com seu acompanhante. Eles também precisam de consolo de vez em quando, pois seu companheiro ou acompanhante também pode estar sofrendo. Ofereça-se para cuidar da


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pessoa com AIDS, para que aqueles que o amam e cuidam possam também ter uma folga. Convide-os para sair e dar uma voltinha. Lembre-se de que eles precisam de alguém para conversar. Seu amigo pode ter um filho. Pergunte pelas crianças. Ofereça-se para trazer as crianças para uma visita. Seja criativo. Traga livros, revistas, fitas com músicas, um pôster para a parede, um bolo feito em casa, doces para compartilhar. Tudo isso traz calor humano e alegria. Combine com outro amigo que ele não vê há algum tempo para fazerem uma visita juntos. Não se acanhe de perguntar a respeito da doença, mas tenha sensibilidade de perceber se seu amigo quer falar sobre isto ou não. Você pode saber, perguntando: Você gostaria de falar de como está se sentindo? Como todo mundo, uma pessoa com AIDS, tem bons e maus dias. Nos dias bons, trate seu amigo como qualquer outro. Nos maus dias, porem, com maior amor e carinho. Você pode levar seu amigo a algum lugar. Condução pode ser necessária para o tratamento...o mercado ou banco...o médico ou talvez o cinema. Que tal uma volta pela praia? ou parque? Diga-lhe que sua aparência está boa, mas somente se for verdade. Se a aparência do seu amigo mudou, não ignore o fato. Seja gentil, mas nunca minta. Procure seu amigo para ajudá-lo a tomar decisões. Doenças podem causar perda de controle sobre muitos aspectos da vida. Facilite ao seu amigo a oportunidade de tomar decisões, não importa quão simples ou bobas possam parecer a você. Diga-lhe o que você gostaria de fazer para ajudá-lo. Se seu amigo concordar, faça. Mantenha todas as promessas que fizer. Lembre-se: raiva e frustração são muitas vezes descarregadas sobre aqueles a quem amamos mais, pois sabemos que é mais seguro e que seremos compreendidos. Saiba que se ele descarregar sua raiva e frustração sobre você é porque ele confia na sua amizade. “Fofocas” podem ter o seu lado bom. Mantenha o seu amigo informado sobre o que se passa com as pessoas e seus interesses. Seu amigo pode estar cansado de falar de médicos, sintomas e tratamentos. Quais são as últimas notícias? Converse sobre os últimos acontecimentos. Ajude seu amigo a sentir que o mundo não está se afastando. Ofereça-se para fazer serviços domésticos, talvez cuidar da roupa, lavar a louça, regar as plantas, alimentar e cuidar dos animais de estimação. Entretanto, não faça o que seu amigo for capaz de fazer. Pergunte antes de fazer qualquer coisa. Seu amigo é religioso: ofereça-se para levá-lo à Igreja dele, ao culto. Não faça sermões ou não se irrite se seu amigo lida com a doença de modo que você julga inadequado. Talvez você não compreenda seus sentimentos e por que ele toma certas decisões. Ajude o seu amigo a compreender qualquer sentimento de culpa em relação à doença. Lembre ao seu amigo que ser hemofílico, viciado, homossexual não causa AIDS. O que provoca AIDS é um vírus. Você não precisa falar o tempo todo. Sua presença já é significante, mesmo se for para ouvir música, ver televisão, folhear revistas. Muita coisa pode ser dita sem palavras. Não confunda a aceitação da doença com derrota. Esta aceitação pode libertar seu amigo e dar-lhe uma noção das responsabilidade.


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Converse sobre o futuro, o amanhã, a semana que vem, o próximo ano. É bom olhar o futuro sem negar a realidade de hoje. A esperança é importante. Mantenha uma atitude positiva. É contagiante. Por fim, cuide de você mesmo. Reconheça suas próprias emoções e viva-as. Divida sua dor, raiva, sentimentos de incapacidade ou qualquer outro com seus amigos. Conseguir o apoio que você precisa nesta crise vai ajudá-lo a estar próximo do seu amigo. Frei Pedro Benício Ferreira Lopes é padre da Ordem dos Frades Menores - OFM-


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