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DICIONÁRIO INTERDISCIPLINAR DA PASTORAL DA SAÚDE

Entrevista com o Pe. Léo Pessini, um dos coordenadores da edição brasileira do Dicionário Interdisciplinar da Pastoral da Saúde, que acaba de ser publicado no Brasil pela Editora Paulus em parceria com a Editora do Centro Universitário São Camilo. Como nasceu o projeto do dicionário? Pe. Léo Esta obra foi originalmente publicada na Itália, por Edizioni Camilliani (Turim), para comemorar o décimo aniversário do início das atividades do

Instituto Internacional de Teologia

Pastoral da Saúde, o CAMILLIANUM, em 1997. É provavelmente a primeira vez que um conjunto tão numeroso de questões relacionadas com a saúde do ser humano, trabalhadas numa ótica da teologia cristã em diálogo com as ciências humanas e biológicas, seja abordada num projeto único. Trata-se, como falam os editores da edição italiana, de um primeiro trabalho num campo vasto e inexplorado, com mais de duzentos verbetes, elaborados por especialista na área com o objetivo de “aprofundar a reflexão sobre toda a ampla temática relacionada com o mundo da Saúde”.

Que contribuição esta obra traz para a teologia e para área da Saúde? Pe. Léo Sem dúvida,

trata-se de uma contribuição

importantíssima para a teologia pastoral em geral, mas especialmente para a Teologia Pastoral da Saúde, ainda em estado bastante incipiente em nossas terras. Diz o Pe. Ângelo Brusco na apresentação da edição original: “Como toda realidade complexa, o mundo da saúde não pede mais ação, mas sim mais reflexão, contemplação e discernimento” . Uma constatação:

a reflexão

teológica sobre a presença e ação da Igreja no mundo da saúde, aos


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longo dos séculos, ficou muito a desejar. Quer dizer, temos uma longa e heróica folha de serviços à humanidade, muita ação, mas com pouca reflexão. O dicionário neste sentido sem dúvida preenche uma lacuna. Além do mais, convivemos, com uma escassez gritante em termos de subsídios bibliográficos na área da Pastoral da Saúde. Faltava uma síntese, teórica e prática, orgânica e articulada que oferecesse uma visão global da questão teologia e saúde. Outra contribuição que o dicionário traz é uma forte chamada de atenção sobre a evangelização da cultura do mundo da saúde, para além do “sacramentalismo” frio e vazio, englobando a discussão bioética contemporânea, o desafio da humanização das estruturas da saúde, visão crítica sobre as políticas públicas de saúde e dicas preciosas de capacitação em termos de presença solidário no mundo da saúde.

Trata-se de mais um dicionário entre os outros da área teológica ou tem alguma característica própria?

Pe. Léo Acredito que a originalidade maior está na dimensão interdisciplinar, isto é, o diálogo, nada simples, entre a teologia (espiritualidade, pastoral, antropologia cristã), as ciências humanas (psicologia,

sociologia,

psiquiatria),

as

ciências

biológicas

(medicina, biologia, genética) e ciências sociais ( políticas públicas de saúde, justiça na alocação de recursos, etc). É claro que ,em se tratando de uma obra coletiva, com participação de muitos autores, percebe-se que nem todos os conteúdos abordados apresentam a mesma cientificidade desejada. Todos porém trazem uma informação básica e fundamental sobre a questão abordada e remete o interessado às indicações bibliográficas


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para um desejado aprofundamento. São inevitáveis num projeto deste estilo, algumas repetições e a diversidade de estilos.

A que público interessa esta obra?

Pe. Léo É importante frisar que o dicionário não é uma obra popular e para iniciantes na área da Pastoral da Saúde, que melhor se beneficiarão consultando textos e manuais introdutórios, que temos até em abundância em nosso meio. Trata-se de uma obra de referência, consulta e aprofundamento.

Levando em conta esta

característica fundamental, penso que será de extrema valia para os profissionais da saúde cristãos ( médicos, enfermeiros, nutricionistas, administradores hospitalares, etc,; estudantes de teologia, agentes de pastoral da saúde, enfim todos os que buscam dar as “razões de sua esperança”, para além da competência tecnico-científica, aliam também competência humana, marcada pela ternura samaritana.

Como o dicionário é estruturado?

Pe. Léo O dicionário se distende em três grandes áreas temáticas, que são a Teologia da Saúde, a Pastoral da Saúde e Ética da Vida e da Saúde (Bioética) e nele encontramos os verbetes dispostos na ordem alfabética de A a Z. Para uma compreensão orgânica os organizadores desta obra pensaram em verbetes estruturais ou fundamentais (em negrito), verbetes de aprofundamento (letra normal) e de informação (em itálico). Vejamos brevemente em que consiste cada parte desta obra: O primeiro momento corresponde à Teologia da Saúde abordando entre outros os seguintes temas básicos: Bíblia, antropologia (fé e graça), pessoa, corporeidade (sexualidade), mal, sofrimento (na Bíblia, fora do cristianismo, na literatura, no cinema,


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nas artes plásticas), morte, Jesus Cristo (cruz, mistério pascal), Saúde, salvação (curas, milagres) e ressurreição. O segundo grande momento trata do âmbito da Pastoral da Saúde propriamente dito, privilegiando temas tais como: história e conceitos, sua estruturação nos diversos países, os santos (as) da caridade (S. Camilo de Léllis, São João de Deus, São Vicente de Paulo...); aspectos históricos da assistência à saúde), Igreja (sacramentos – unção dos enfermos, eucaristia, reconciliação, liturgia, bênçãos) espiritualidade, sofrimento na perspectiva bíblicocristã, o bom samaritano, compaixão, oração, santos (as), a Relação Pastoral de Ajuda, a psicologia da saúde e da doença (psicoterapia, psiquiatria, psicopatologia e pastoral). A terceira parte trata especificamente de Ética da Vida e da Saúde (Bioética). São trabalhados alguns temas da ética cristã que sempre estão na pauta do dia de nossas discussões, entre outros: bioética (gênese, desenvolvimento e busca de uma perspectiva latino – americana) aborto, eutanásia-distanásia-mistanásia, suicídio, inseminação artificial, genética, clonagem, pesquisa em seres humanos, conceito de morte, paciente terminal, cuidados paliativos, transplantes, aids, profissões e códigos de ética dos profissionais da saúde, justiça e saúde, direitos humanos, humanização, ecologia e saúde, drogas psicotrópicas no Brasil, etc.

Como se iniciou o projeto de tradução e adaptação para o Brasil?

Pe. Léo O trabalho de tradução e adaptação à realidade brasileira começou em novembro de 1997 quando um grupo de camilianos liderados pelo Pe. Calisto Vendrame, ex-geral dos Camilianos e idealizador do Camillianum ( Roma) decidiu assumir o desafio de torná-lo realidade entre nós. Importante destacar estas


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pessoas:

Christian de Paul de Barchifontaine, Júlio S. Munaro,

Geraldo Bogoni, Hubert Lepargneur e Leocir Pessini. Estabelceu-se uma parceria entre Paulus Editora (coordenação gráfica e revisão)e a União Social Camiliana/Centro Universitário São Camilo com o engajamento de inúmeros especialistas nas várias áreas da saúde, que deram sua preciosa contribuição científica. Foram dois longos anos de trabalho ininterrupto, silencioso e invisível mas venceu a ousadia da esperança e o projeto que era sonho, finalmente tornou-se realidade.

O que a edição brasileira acrescenta de novo em relação à original?

Pe. Léo É toda uma nova perspectiva que se abre de ver a realidade brasileira e latino-americana a partir de nossos olhos e não a partir de um “olhar europeu” pura e simplesmente, o que caracterizaria uma simples tradução. A edição original reflete mais uma preocupação centrada no mundo eclesiástico, mais que cristão, com questões éticas e legislativas ligadas à Itália e Europa prevalentemente e com uma visão de Pastoral da saúde ligada ao mundo do enfermo, doença, sofrimento e morte. É a ótica da pessoa na cama. A edição brasileira abre-se mais para as questões ligadas com as políticas públicas de saúde, promoção da saúde, inculturação, questões de bioética com normatizações e legislação brasileira pertinente, saúde e ecumenismo, pluralismo multidisciplinar, questões que a sociedade secular levanta para o cristianismo na área da saúde, entre outros temas. No todo, são 34 verbetes novos e mais 14 atualizações, totalizando praticamente 200 páginas originais entre as 1447 do dicionário. Para uma visão completa das colaborações dos


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especialistas brasileiros basta ver na introdução do dicionário a página dos autores da edição brasileira e suas respectivas contribuições.

Então o conceito de Pastoral da Saúde é diferente na versão original e na versão brasileira?

Pe. Léo Diria que são complementares, mas sem ser excludentes, com ênfases distintos, priorizando o que é mais urgente em função das necessidades da realidade. Por exemplo na versão original a Pastoral da Saúde é entendida como sendo a “presença e ação da Igreja, para levar a luz e a graça do Senhor aos que sofrem e a quem a eles se dedica”. Esta ação aconteace de três maneiras na atuação

pastoral:

como

evangelização

(

no

campo

da

saúde/doença/vida e morte), como celebração ( sacramentos) e como testemunho ( diaconia – serviço e koinonia -comunidade). A versão brasileira, seguindo as diretrizes de ação da Pastoral da Saúde – CNBB entende a pastoral da saúde como sendo “a ação evangelizadora de todo o povo de Deus comprometido em promover, preservar, defender, cuidar e celebrar a vida, tornando presente no mundo da saúde a ação libertadora de Jesus, em três dimensões a saber: a) solidária: vivência e presença samaritana junto aos doentes e sofredores; b) comunitária: promoção e educação para a saúde; c) Político-institucional: atuação junto aos órgãos e instituições, públicas e privadas, que prestam serviço e formam profissionais na área da saúde. Em termos de América Latina e Brasil realidade de grandes contrastes e carências, marcada em geral pelo descaso dos governos em relação à saúde, a Igreja exerce um papel supletivo e a pastoral toma um forte acento de promoção da saúde, educação para a cidadania (direitos), envolvimento com as terapias alternativas, para além do atendimento espiritual e do trabalho evangelizador.


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Qual a sua mensagem final em relação a este projeto? Pe. Léo A minha esperança é que esta publicação, que custou tanto

esforço,

sacrifício,

empenho,

bem

como

expressivos

investimentos, tanto da Editora Paulus como do Centro Universitário São Camilo, possa ser de ajuda efetiva a todos os que amam a vida e trabalham na área da saúde, por profissão e vocação. Ela nasce do coração do carisma camiliano como serviço para toda a comunidade eclesial e sociedade. Nós camilianos estamos lançando esta obra no Brasil,

em comemoração dos 450 anos do nascimento de São

Camilo, que celebraremos no dia 7 de abril de 2000, dia Mundial da Saúde.

DICAS DE SAÚDE O TRATAMENTO DAS VARIZES O tratamento das varizes varia segundo a localização e a extensão das mesmas. Pode-se recorrer à terapia esclerosante que consiste na injeção de substâncias que obturam as veias pequenas. O tratamento ortopédico, consiste na utilização de meias elásticas que favorecem o retorno venoso. Como medidas preventivas pode-se utilizar extratos de melitoto, uma substância que fortalece as paredes das veias. De qualquer modo, as veias varicosas se beneficiam com exercícios e medidas de postura destinadas a reduzir a pressão venosa dos membros inferiores. FAVORECE A CIRCULAÇÃO Para além da utilização de medidas de compressão ascendente, os que sofrem de pernas cansadas devem fazer diariamente exercícios destinados a favorecer a circulação de sangue. Recomendam-se os seguintes exercício: Em posição sentado 1 – Separe as pernas, estique-as e levante-as simetricamente. Deve-se praticar este exercício dez a quinze vezes por dia. 2 – Mova alternadamente as pernas efetuando dez a quinze movimentos de pedais. 3 – Levante e estique as pernas e gire-as num sentido e no outro. 4 – Pedale numa bicicleta estática dez a quinze minutos diários. Em pé 1 – Efetue movimentos giratórios com as pernas e com os pés. 2 – Ande sobre os calcanhares. 3 – Ande no bico de pés.


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4 – Suba escadas várias vezes ao dia. Depois de fazer estes exercícios mergulhe alternadamente os pés em água fria e em água quente.

REPRODUÇÃO ASSISTIDA: UMA PERSPECTIVA JUDAICA RABINO HENRY I. SOBEL (Presidente do Rabinato – Congregação Israelita Paulista). Os avanços da Ciência em geral e da Medicina em particular, colocam o teólogo diante de novas situações e novos problemas, que precisam ser analisados e interpretados. Uma das questões mais debatidas hoje em dia – não só do ponto de vista religioso, como também em seus aspectos legais, éticos, morais e psicológicos – é a reprodução assistida. Obviamente, a inseminação artificial e a fertilização in vitro, da forma como são praticadas atualmente, não são mencionadas nos textos bíblicos. A legislação judaica contemporânea baseia-se em duas fontes da literatura antiga. A primeira é um trecho talmúdico do século 5º, que fala da possibilidade de uma mulher virgem ter engravidado após se banhar em águas nas quais um homem tenha emitido seu sêmen. A segunda fonte é a lenda de Bem Sira, citada com freqüência na literatura médica, registrada pela primeira vez pelo rabino Jacob Segal, por volta do ano 1400, em sua obra Likutei Maharil. Diz a lenda que Bem Sira foi concebido sem relações sexuais pela filha do profeta Jeremias, num banho; o pai teria sido o próprio Jeremias, o qual, coagido por um bando de malvados, havia ejaculado naquela água. Não vem ao caso se a fecundação nessas circunstâncias é possível do ponto de vista científico. O que nos interessa, sob a perspectiva religiosa, é que já nossos sábios antigos admitiam a idéia de uma concepção sine concubitu. Seja como for, a questão da reprodução assistida é bastante complexa do ponto de vista da lei judaica e as opiniões rabínicas são as mais variadas, desde algumas bastante conservadoras e rígidas, até as mais liberais e permissivas. Uma vez que cada situação particular envolve inúmeras considerações psicológicas e fisiológicas, não pode haver uma fórmula pré-fabricada. O ideal é que o rabino julgue cada caso individualmente, baseando sua decisão no parecer médico e nas circunstâncias específicas. Podem-se, porém, traçar alguns princípios gerais. Uma das objeções levantadas contra a inseminação artificial é que a emissão de espermas fora da vagina é um “desperdício”; e é, portanto, proibida pela lei judaica. A


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maior parte das autoridades rabínicas não considera válida esta objeção no caso da inseminação artificial com o sêmen do marido, pois esse sêmen não é desperdiçado. Pelo contrário, ele é usado para engravidar a mulher e cumpri o mandamento da procriação matrimonial. A única exigência rabínica é que tenha decorrido um certo prazo a partir do casamento e o casal não tenha conseguido conceber um filho pelos métodos naturais. Quando, porém, o esperma é de outro doador, e não do marido, a maioria dos rabinos é contra a inseminação artificial, pois existem neste caso inúmeras complicações religiosas, genéticas, legais, psicológicas e morais. O primeiro problema é que, se essa prática se difundir, ela pode acabar conduzindo ao incesto ( uma vez que o filho e a filha do mesmo pai, sem saberem do seu parentesco, podem vir a se casar), o que não só contraria as leis do judaísmo, como também acarreta sérios problemas genéticos. Há também a dúvida se a criança resultante da inseminação é legalmente herdeira do “pai biológico” ou do “pai social”, o que daria origem a desavenças familiares e complicações judiciais. Psicologicamente, a inseminação artificial que envolve um doador estranho traz muitos problemas ao casal. A mãe, por mais que queira ter seu próprio filho, acaba ficando com um sentimento de culpa, achando que, ao receber o sêmen de um estranho, traiu o marido. O marido, por sua vez, sente-se diminuído em sua masculinidade, por não ter desempenhado adequadamente suas funções de homem. Moralmente, o judaísmo condena esse tipo de inseminação artificial por ser uma prática que leva facilmente a abusos, tais como a utilização do sêmen de doadores física e intelectualmente superdotados, visando o “aprimoramento da raça”, como já previu Albous Huxley na década de 30, em seu livro Admirável Mundo Novo. Com o objetivo de criar “super-homens”, tal reprodução seletiva expõe a sociedade a sérios riscos de promiscuidade e corrupção; e, em última análise, promove a desumanização do homem. A fertilização in vitro levanta as mesmas questões que a inseminação artificial. O procedimento é autorizado pela maioria dos rabinos, inclusive da ala ortodoxa, desde que: 1º o óvulo seja da própria mulher; 2º o esperma seja do marido; 3º os médicos tenham comprovado que a mulher apresenta uma deficiência anatômica ou fisiológica que impede a fecundação normal. Existem algumas restrições


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técnicas quanto ao método de obter o sêmen para gerar o “bebê de proveta”, porém são facilmente contornadas. Eticamente, surge a pergunta se, com tantos menores abandonados, não seria mais justo adotar uma criança, quando a concepção pelos meios normais é impossível, em vez de recorrer à reprodução assistida. De fato, existem milhões de crianças desamparadas no mundo inteiro e este é um problema social da maior gravidade, que não pode nem deve ser ignorado. O judaísmo não é, de modo algum, insensível a esse drama. Muito pelo contrário, a Bíblia menciona diversas vezes que o órfão deve ser amparado. Entretanto, o primeiro mandamento da nossa Torá, cronologicamente falando, é “Crescei e multiplicai-vos” (literalmente Sede férteis e multiplicai-vos). (Gênesis 1:28). E isto significa que cada indivíduo tem o dever de criar outro e, assim, perpetuar a raça humana. E não apenas por motivos religiosos, como também do ponto de vista psicológico, é perfeitamente compreensível que uma mulher prefira gerar seu próprio filho a adotar uma criança alheia. A gestão é uma necessidade emocional instintiva, inerente à natureza feminina. Carregando em seu ventre uma nova vida, ela se sente mais mulher, ela se realiza. Além do mais, o filho adotivo só passa a fazer parte da família semanas ou meses após o nascimento, enquanto no caso da reprodução assistida, a mulher e o marido participam juntos da concepção, dos cuidados pré-natais, de toda a gravidez e do parto. Esta é uma vivência das mais gratificantes para o casal, que ninguém, em sã consciência, tem o direito de impedir. A FÉ PODE CURAR? Crer em Deus, ter esperança e acreditar na força da vida podem restaurar o corpo e a alma e restabelecer a saúde física e psíquica Dilene Ferreira

Acreditar em Deus faz bem. O sentido terapêutico da fé é inegável. As histórias de pessoas que derrotaram doenças, como o câncer e a depressão, estão aí para comprovar que a força individual e a influência positiva da fé podem levar ao alívio e à cura de problemas do corpo e da alma. No caso do câncer, vários pacientes e até mesmo alguns médicos já admitiram que a recuperação não


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depende apenas da química e da tecnologia. É preciso acreditar na possibilidade da cura. Com relação à depressão, a recomendação é a mesma. Trabalhando de acordo com os preceitos do catolicismo, o psiquiatra Paulo Maurício Pinto, membro da Associação Católica de Psicólogos e Psiquiatras de São Paulo, que reúne aproximadamente 300 profissionais, já ajudou vários de seus pacientes a escreverem um final feliz para histórias que poderiam ter tido um desfecho trágico. A receita é simples: “Além de orar por cada um de meus pacientes, de acordo com a abertura que eles me dão, chego a aconselhá-los a buscar ajuda também por meio da fé”, confessa. Para Paulo Maurício, independente da religião, a fé é uma forte aliada da medicina. “Sem dúvida, a pessoa que tem fé tem possibilidade de superar mais rápido os seus problemas. Mesmo nos casos de doenças consideradas graves ou incuráveis, se o paciente tem algo ou alguém em quem se apegar – e sobretudo se essa força vier de Deus -. comprovadamente ele adquire maiores chances de superar problemas físicos e emocionais. Quando não melhora com tanta facilidade de algum problema físico mais grave, embora continue com a doença, espiritualmente essa pessoa se sente melhor”. O psiquiatra conta que, na maioria das vezes, é procurado por pessoas católicas ou de outras religiões cristãs, e que os próprios pacientes costumam abordar o tema da fé. “Aí eu aproveito a oportunidade para falar de Deus e de Jesus Cristo e recomendar os sacramentos da Igreja como, por exemplo, a Confissão e a Eucaristia”, explica, acrescentando que costuma também aconselhar os pacientes a participarem de grupos de orações ou de algumas atividade da Igreja. Aos colegas de medicina, o psiquiatra lembra que na Bíblia, em Eclesiástico, 38, há uma passagem que diz que o médico deve orar pelos seus pacientes e interceder por eles: “Todos cairão um dia nas mãos dos médicos, e eles mesmos rogarão a Deus pelo alívio das dores de seus pacientes”. A FÉ NOS LEVA PARA FRENTE Mesmo afirmando não ter muito envolvimento com as correntes que trabalham com a “espiritualidade terapêutica”, a teóloga Maria Clara Luchetti Bingemer reconhece que a fé tem momentos em que ela nos faz admitir a nossa plena humanidade. “A fé nos dá condições


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de curar tudo aquilo que puxa a humanidade para traz”, assegura. Para a teóloga, esse é o sentido mais profundo de muitas curas que parecem puramente somáticas ou corporais, mas que na verdade são frutos de uma fé viva em Deus e em Jesus Cristo. “Quando um ser humano está sofrendo discriminação, ou está excluído de alguma maneira da sociedade, o simples fato de alguém que tem fé aproximar-se dele e lhe transmitir esse dom, que em última análise vem de Deus, mas que às vezes vem também por meio de outra pessoa, pode fazê-lo reintegrarse, superar a exclusão”. Maria Clara acredita que esse é um dos sentidos das curas ou “milagres” que Cristo faz no Evangelho. Para ela, quando Jesus cura o leproso, não cura só a doença corporal, ele reintegra aquela pessoa que estava excluída devido à sua doença à comunidade humana. Refletindo sobre o que acontece nos tempos atuais, ela lembra as centenas de casos de que a gente fica sabendo todos os dias, que mostram pessoas com doenças graves, como o câncer, quando têm fé, têm um prognóstico de cura muito mais favorável do que aquelas que são cépticas. “A fé faz a pessoa encarar o mundo de outra maneira, ter mais esperança, ser menos materialista e acreditar mais na vida”. EXPERIMENTAR DEUS O pároco da Paróquia de Santa Efigênia, em Belo Horizonte, padre Aloísio Jorge Pena Vitral, entende que a qualidade de vida da pessoa depende de seu acolhimento, de sua ternura perante a existência e a concepção que ela tem de Deus. “O nosso jeito de estar no mundo depende diretamente da forma como acolhemos essa presença no profundo de nosso ser”. Para ele, duas condições são extremamente importantes para explicar o sentido terapêutico da fé: Experiência e Relação. “A fé não é algo puramente conceitual. É algo que mexe mais com a existência do que com a nossa pura racionalidade. É a experiência que fazemos de Deus Pai como pessoa, de Deus Filho como pessoa e de Deus Espírito Santo que nos dá uma vida com qualidade”. Segundo padre Aloísio, a partir do momento em que uma pessoa tem fé diante da vida é uma postura de experimentação de ser amado por Deus e de poder amar a Deus e ao seu irmão. Acontece então um processo muito


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interessante: essa pessoa faz as pazes com as suas verdades, e aí vão desaparecendo as sombras e ela passa a acontecer a si própria, da maneira como é, ou seja, vai deixando de ser alguém puramente idealista, em busca de algo desejado pelo seu superego, para cair em seu eu real e lidar com a sua realidade. “Quando eu deixo de ser alguém alienado e me torno alguém ligado ao meu eu real, aí é que eu enxergo esse sentido terapêutico da fé”. O padre explica que no momento em que a pessoa percebe que o Evangelho significa Boa Nova, ou boa notícia, e deixa de ter uma concepção medrosa de Deus, ela ganha a oportunidade de perceber a fé como uma verdade que liberta. “Percebendo a fé, eu passo a perceber a boa notícia, a delicadeza da Eucaristia, e minha vida deixa de ser um drama para se tornar uma festa”.

FIM DO MEDO Por experiência não só própria, mas também de outras pessoa que conhece, o padre jesuíta Manuel Eduardo Iglésias vê na fé muito mais do que uma terapia. Ao ser questionado sobre o sentido terapêutico da fé, imediatamente ele se lembrou de um amigo, psiquiatra, que várias vezes lhe confidenciou que realmente a cura de uma pessoa, no fundo do fundo, provém de dentro e mais radicalmente, é a fé. Claro que sem desprezar a Psicologia, a Psicanálise e outras formas de tratamento que têm o seu valor. “Meu amigo tem essa convicção e eu, em minha modesta experiência, também a tenho porque, afinal, é a fé a adentrou no mistério de Deus e nesse mistério encontrar a vida em plenitude; então não há mais nada do que se possa ter medo”, reflete. De acordo com o sacerdote , quando uma pessoa se mostra firme na fé em Deus, a vida para ela vai ficando mais serena e as limitações vão se relativizando à luz de uma plenitude da qual ela pode mais ou menos participar. Eke explica que a fé é uma experiência de vida, muito mais do que uma teoria, do que uma súmula de doutrinas ou afirmações. Em sua trajetória como jesuíta, padre Iglésias pôde ver muitas pessoas superarem sérios problemas, de ordem física e psicológica, graças à sua fé em Deus e em seu Filho, Jesus Cristo. “À medida em que as pessoa adquirem uma experiência de fé mais rica e plena, os problemas vão se tornando menores e fica mais fácil superá-los. É incrível como a presença de Deus trabalha


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em cada um de nós. Ele só precisa da nossa colaboração e participação”.

PROCURANDO A FÉ MARIA EMÍLIA PINHO LUCCI Todos nós em alguma ocasião duvidamos da própria fé, e na maior parte das vezes saímos à procura dela. Muitas vezes vamos para longe, outras vezes ficamos desarvorados, pensando que para nós não há nenhuma manifestação, nenhuma “prova” da existência divina! Pensamos freqüentemente que somos incrédulos, talvez porque a nossa “prática” não seja igual a de alguns “modelos” (pessoas) que conhecemos; por outro lado, fantasiamos formas de sermos pessoas religiosas!. Talvez seja hora de parar para pensar! Você sabe parar? Parar de verdade, dar-se um tempo, confrontar-se? Talvez a sua dificuldade seja que a figura do “seu” Deus é uma “caricatura”, baseada numa autoridade terrena (um pai autoritário, um professor, um chefe, etc.). Que terrível mal entendido! Continue procurando respostas; mas não se desespere, pois você já esta seguindo a trilha certa; o caminho é longo, talvez fique o resto da vida atrás da verdade! Procuremos com atenção através dos irmãos, e as respostas virão; tentemos “olhar” com atenção para as pessoas, suas palavras e atitudes, pois através delas obteremos muitas respostas às nossas duvidas e temores. Pare e pense de novo com a “sua cabeça”, sem levar em conta a cor, a cultura, o partido político, a religião, etc. Quantas descobertas! Quanto tempo você perde com o preconceito, com a discriminação! As vezes esse “acordar” se dá através de algum acontecimento sério de sua vida; corre-se o risco da revolta, mas não se exalte, é quando estamos fracos que nos tornamos fortes, e essa força ninguém pode anular, é de Deus que ela vem! Deus está muito presente em nossas vida, o tempo todo, sorrindo e tendo paciência com as nossas limitações; é uma questão de querer tê-lo ao nosso lado, pois ele sempre lá esteve, nós é que nos “distraímos” -não tenha medo! O medo só existe pelo desconhecimento da presença! Deixe-se levar, feche os olhos, eleve seus pensamentos sem se preocupar se a prece é grande ou pequena, perfeita ou defeituosa, bonita ou feia! Não importa o que se diga, mas que se diga! Converse com ele sempre – triste ou alegre, zangado ou não, mas converse! Até que comece a haver intimidade, deliciosa intimidade! Não estamos mais sós, mas cheios de graça; o “nosso” Deus não é mais uma “caricatura”, é o nosso “Paizão”, amável, paciente com as nossas faltas, dando-nos a oportunidade de corrigir os erros, ajudando-nos a não ser escravos da culpa, levando-nos pela mão como se fôssemos pequeninos, sorrindo para nós e até brincando com as nossas travessuras. Ah! Meu Deus – obrigada Pai, pela alegria que sinto em viver a felicidade que vem de ti, obrigada. Amém


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Maria Emília Pinho Lucci foi Agente de Pastoral por muitos anos no Instituto do Coração em São Paulo. Falecida em 25 de dezembro de 1999.


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